Você está na página 1de 3

Uma habilidade que se tornou empreendedorismo

 
Humberto Mayrink, de 54 anos, policial civil aposentado depois de 30 anos de serviço,
sendo 26 na área administrativa. Casado com Adriana, de 55 anos, há mais de três
décadas, e pai de Davi, de 25, e Vitória, 20, começou a trabalhar aos 16 anos, como
office-boy de um escritório de advocacia e, hoje, vive o sonho de “tocar uma obra” sem
ser engenheiro civil, aplicando habilidade e competência adquiridas nas 20 reformas que
fez em sua casa e no talento para gestão e lidar com pessoas adquirida ao longo dos
cargos que exerceu. 

“Aposentei em 2015 e foram nove meses de lua de mel. Depois, apavorei, não
conseguia ficar sem ocupação. Um dia, o encontro com um médico sem tempo para
acompanhar a obra da sua casa mudou minha vida. Ele perguntou se eu não poderia
cuidar do andamento da construção e assim vivo desde 2016, gerindo reformas. Tenho
experiência em gestão de pessoas e financeira, adoro reformar e deu certo. Fiz uma
equipe de três pessoas, que não me abandona nunca, tem os agregados esporádicos,
como o especialista do gesso, o pintor, o eletricista, o bombeiro, e vivo um sonho, uma
nova fase. Tive a chance de unir o útil ao agradável, uma ocupação na área que gosto”.
 
Agora, o dia a dia de Humberto é dos mais corridos e prazerosos também: “Estou indo
de uma loja de material para outra, para lá e para cá, acompanhando o serviço, o
planejamento, o resultado, uma atuação dinâmica. Tem o ganho financeiro, o dinheiro é
importante, mas a qualidade de vida se sobrepõe. Preciso estar em movimento, a
inquietude me motiva, quero descobrir e fazer coisas novas, me movimentar é um
prazer. Uma casa nunca é igual a outra, projetos diferentes, desafios e o mais incrível é
pegar um lote com mato e entregar a chave da casa para o proprietário entrar. É
empolgante”. 
 
"ser aposentado, não significa parar. Tem de encontrar o que gosta e em primeiro lugar
está a satisfação. E com o conhecimento e sabedoria colhidos ao longo dos anos, a
experiência dos meus 54 anos, colecionei vivências e aprendizados que me direcionam
nesta nova fase. Digo que minha careca faz jus a ter respeito pela minha calvície e
aconselho aos aposentados encontrar uma ocupação que os mantenham em movimento,
que lhes tirem da inércia. Sempre tem um caminho a percorrer enquanto vivemos, é
continuar o percurso, seguir em frente, sonhando e realizando”.

Projeto de aposentadoria: ateliê de artesanato como


passatempo e renda extra
 
“Aposentar não é parar de trabalhar, é trabalhar de forma diferente, dentro do seu
tempo, de sua expectativa e organização. Sem bater ponto, sem chefe. Muitos imaginam
que não existe vida para além do mundo formal do trabalho, mas há. Minha vida pós
aposentadoria é mais que um sonho, mais do que imaginei, me sinto livre, me descobri
em outras coisas, com outro foco”, a fala inspiradora e estimulante é de Simone Passos
de Castro e Santos, de 55 anos, sanitarista, servidora pública, graduada em farmácia
pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que se aposentou em 2022, depois
de 32 anos de trabalho, em dois empregos.
 
Assim que se formou, Simone foi trabalhar na saúde pública e não saiu mais:
“Acreditando no SUS como um grande sistema de saúde, levo o que vivi para minha
vida. O SUS é parte da minha história. Fiz duas especializações, um mestrado e, ao
longo do tempo, casei com o Renato, estamos juntos há 29 anos, e tivemos dois filhos,
Thiago e Pedro. Trabalhava em dois lugares, vida corrida e sempre tive o desejo de
chegar o meu momento da aposentadoria, a expectativa de quando chegaria a minha
hora de organizar a vida pessoal”.
 
Simone é de uma família, tanto do lado materno quanto paterno, de pessoas com
habilidades manuais. Assim, um cômodo da casa foi transformado em um ateliê de
artesanato, com máquina de costura, tecidos, aviamentos e linhas para crochê.
Inspiração que, em especial, ela herdou da avó Lula de Castro, que bordava, pintava,
costurava, fazia escultura e ainda trabalhava fora, numa época que não era comum.
 
Simone conta que abriu sua lojinha no Instagram como um projeto: “na pandemia, fiz e
dei de presente de aniversário para uma amiga enfermeira, Melina, uma toca de
confeiteiro, já que ela faz confeitaria. Ela gostou e me disse que não se encontrava por
aí quem fazia domas e aventais. Tive o clique, abri uma conta no Instagram e nasceu o
“Simon de Castro – Costura Criativa”. Comecei a produzir e fiquei impressionada com
a resposta. Daí surgiu meu projeto de aposentadoria. Fiz um projeto tanto na
organização e construção do ateliê e da página na rede social quanto dei atenção para a
minha saúde mental, com a terapia, uma aliada nesse processo, me cuidando e
preparando de forma geral”.
 
Assim, ela não se contém de satisfação ao ser uma das mais recentes aposentadas do
Brasil: “Quando chegou, foi maravilhoso e comemoro até hoje. Já tinha uma clientela
do ateliê formada, passei a fazer aula de costura, particular e depois coletiva, comecei a
ler mais livros, fiz duas tatuagens e comecei a dançar wake-Up, na Casulo, uma escola
de dança voltada para mulheres maduras e até já fiz apresentações em outros espaços e
praças da cidade. Além disso, adotei um cachorro maltês, o Oto, e continuo com minha
corrida de rua, que sempre fiz”.
 
Simone enfatiza que imaginou que sua pós aposentadoria “seria o momento de libertar
minhas amarras e tem sido assim. Como servidora pública, aposentou com seu salário
sem perda financeira e, sem querer esbanjar, consegue ter uma condição de escolher o
que quer e não quer fazer. Afinal, ela se planejou para isso. 
 
“Para ter uma aposentadoria de qualidade tudo depende da forma que leva. Tive receio
de perder contatos, senti medo da falta daquele dia a dia, mas sou comunicativa e hoje
tenho formado novo ciclo de amigos, conhecido pessoas, seja na costura, na aula de
dança ou a relação com um cliente que se torna amizade. Agora, sou dona do meu
tempo, tenho disponibilidade para fazer o que gosto. Odeio cozinhar e continuo sem ir
para a cozinha. Não é porque sou aposentada que vou virar a faz tudo dos outros”,
completa a aposentada. 
 
Da correria na cidade grande para o descanso no interior
 
Com 15 anos de aposentadoria, Marina Esteves da Mota, de 84 anos, só se aposentou
porque a idade se impôs. A carreira profissional foi vivida no Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) e encerrada aos 69 anos, em 2008. Ela atuou na pesquisa
do censo econômico, como telefonista, na contabilidade e no setor de material: “Só
parei porque a idade determinou. Sou de Rio Vermelho, no Vale do Jequitinhonha,
região do Circuito dos Diamantes, perto de Diamantina, do Serro, Conceição do Mato
Dentro. Sempre sonhei, um dia, voltar para o interior, mas para uma roça, lidar com a
terra. Achava impossível, depois de viver tantos anos na capital, casar, ter filhos. Mas,
hoje, o sonho é realidade.  A transição começou em 2012, quando me dividia entre a
cidade e o interior”.
 
Mas desde 2018 Marina Esteve vive na “Grotinha”, nome que deu à sua roça, uma
“terrinha de seis alqueires”, que herdou da mãe, Maria Josefina, dona da Fazenda
Batatal, em Rio Vermelho. “É o meu recanto. Aqui, tenho minhas vaquinhas, o leite
direto da teta da vaca, meu pomar, horta, gosto muito de plantar, lidar com a terra, e
algumas criações, porco, galinha. Um pequeno paraíso. Deixei a área de números,
estatística, pesquisa para trás. Era um ofício que fazia com prazer, mas meu coração
sempre esteve na terra. Ao aposentar, sentia falta dos colegas, era uma turma boa, mas a
qualidade de vida, a tranquilidade, o ar puro, a simplicidade e estar perto da família,
irmão, primos, é minha aposentadoria dos sonhos. Voltei para o berço. E vivo na
companhia da minha filha, Adriana. Meu filho, Délio, mora em BH, mas sempre que
pode aparece, e os netos”, conta a aposentada de 84 anos.
  
Marina Esteves tem alegria na fala ao revelar que também tem uma mina d’água na
Grotinha: “Água limpinha, tem ainda fogão a lenha, ovo caipira, verduras e legumes
naturais, orgânicos, gosto de fazer doces, biscoitos, bolos e, na capital, ainda que
sempre gostei de cozinhar, era uma correria, trabalhava o dia todo. Agora, o prazer é
outro. Vivo o meu sonho todos os dias, uma aposentadoria de paz e recomendo que
todos encontrem o que lhes vão fazer felizes. Não pode é ficar parado”.
 

Você também pode gostar