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Química e Ciência dos Materiais

Introdução à Ciência dos Materiais

Unidade Curricular de Química e Ciência dos Materiais

Introdução à Ciência dos Materiais (Cont.)

Tópicos:
- Tensão e Deformação
- Plasticidade
- Recozimento

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 1


Química e Ciência dos Materiais
Introdução à Ciência dos Materiais

Sumário:

Tensão e Deformação:
Tensão normal e de corte, deformação elástica e propriedades do
domínio elástico
Plasticidade:
Deformação plástica por escorregamento e maclagem, deformação a frio
e a quente: encruamento e recozimento

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Tensão normal
 De acordo com a forma/orientação
do esforço (força ou momento) a
um determinado corpo, assim as
solicitações se classificarão como
axiais (tracção ou compressão), de
flexão (simplesmente apoiada ou
encastrado), de torção, de corte ou
ainda combinações destes esforços
simples (figura)

 A tensão resultante das referidas


acções exteriores pode ser
definida como sendo uma medida
da intensidade das forças
interatómicas ou componentes
dessas forças que resiste à
mudança de forma de determinado
corpo.

Sebenta de Materiais II - IST, Ensaios Mecânicos, AE do IST

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Tensão normal

 Considere-se o esforço axial FBC aplicado à barra BC


(figura em cima)

 O esforço axial FBC representa a resultante das


forças internas que se encontram distribuídas em
toda a área A da secção transversal da barra BC
(figura em baixo), sendo a intensidade média
dessas forças distribuídas igual à força por
unidade de área na secção, ou seja, FBC /A
 O facto da barra BC ceder ou não sob a acção da
carga aplicada depende da capacidade do
material resistir à intensidade do valor
correspondente das forças internas distribuídas,
FBC /A. Assim, a cedência da barra dependerá da
força FBC, da área da secção transversal A e das
características do material que a constitui

Beer, F., Johnston, R., Dewolf J.( 2003). Mecânica dos Materiais, Ed. McGraw-Hill de Portugal

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Tensão normal
 A força por unidade de área, ou a intensidade das forças
distribuídas sobre uma dada secção, é designada por tensão
nessa secção, sendo representada pela letra grega σ (sigma). A
tensão num elemento da área da secção transversal A sujeito a
um esforço axial P (figura) é então obtida através do quociente
do valor P do esforço pela área A:
P
s
A
 Utiliza-se um sinal positivo para indicar uma tensão de tracção
e um sinal negativo para indicar uma tensão de compressão

 A tensão s, em unidades SI, é expressa em N/m2, designada pascal (Pa), com P em newtons (N) e A em
metros quadrados (m2). No entanto, na prática, são usados múltiplos desta unidade, nomeadamente, o
quilopascal (kPa), o megapascal (MPa) e o gigapascal (GPa). A unidade usual na apresentação dos
resultados é o megapascal
1 kPa = 103 Pa = 103 N/m2
1 MPa = 106 Pa = 106 N/m2 = 1 N/mm2
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1 GPa = 109 Pa = 109 N/m2

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Tensão normal

 As forças FBC e F´BC aplicadas nas extremidades B e C actuam segundo


o eixo da barra BC. Deste modo, a barra está sujeita a um esforço axial

 Na barra BC o esforço axial é normal (perpendicular) à secção


transversal e a correspondente tensão é denominada por tensão normal.
Então, a equação referida anteriormente (s=P/A) exprime a tensão
normal num elemento submetido a esforço axial e representa o valor
médio da tensão na secção transversal

 A tensão normal poderá ser de tracção ou de compressão. A tensão de tracção é resultante da


aplicação de forças exteriores que tendem a aumentar o comprimento segundo a direcção de
solicitação e a reduzir a área da secção recta no plano perpendicular àquela direcção; a tensão de
compressão resulta de forças que tendem a reduzir o comprimento segundo a direcção de solicitação
e a aumentar a área da secção recta no plano perpendicular àquela direcção

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Tensão de corte
 A tensão de corte resulta de forças opostas que tendem a fazer escorregar ou
deslizar uma parte do material em relação a outra

 Quando duas forças P e P´ são aplicadas perpendicularmente ao eixo de uma


barra AB (1ª figura), surgem tensões distintas da tensão normal. Seccionando a
barra AB no ponto C, entre os pontos de aplicação de cargas (2ª figura),
obtém-se o diagrama da parte AC (3ª figura). Conclui-se que têm que existir
forças internas no plano da secção e que a sua resultante tem que ser P. Estas
forças internas distribuídas são denominadas tensões de corte ou tensões
tangenciais e o valor da sua resultante, P, é a força de corte na secção.
Dividindo a força de corte, P, pela área da secção transversal, obtém-se a
tensão de corte média na secção, representada pela letra grega t (tau):

P
t
A
 De realçar que o valor da tensão de corte é o valor médio ao longo da
totalidade da secção
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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação ou extensão longitudinal
 Todos os materiais se deformam quando sujeitos a acções
exteriores. O valor dessa deformação ou alongamento Δl,
dependerá do tipo de material, das dimensões do corpo e da
intensidade das acções

 Considere-se uma barra BC, de comprimento l e secção


l0 lf
transversal uniforme de área A, suspensa na extremidade
(figura (a)). Ao aplicar uma carga P à extremidade C, a barra
aumenta de comprimento (figura (b)), dando origem ao
alongamento Δl.

Δl
 A deformação ou extensão longitudinal numa barra submetida
a um esforço normal é definida como o alongamento por
unidade de comprimento inicial da barra. Representando a
deformação ou extensão longitudinal pela letra grega e
(epsilon), vem:
l l f  l0
e 
l0 l0 Beer, F., Johnston, R., Dewolf J.( 2003). Mecânica
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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação ou extensão de corte
 Considere-se o elemento cúbico de lado unitário (1ª figura)
submetido exclusivamente às tensões de corte txy e tyx
(txytyx) aplicadas em faces do elemento perpendiculares ao
eixo x e ao eixo y, respectivamente. Observa-se que o
elemento se deforma num paralelepípedo oblíquo de lados
unitários (2ª figura). Dois dos ângulos formados pelas quatro
faces submetidas a tensões sofrem uma redução de π/2
para π/2-gxy, enquanto que os outros dois sofrem um
aumento de π/2 para π/2+gxy. O ângulo gxy (expresso em
radianos) define a distorção relativa entre as direcções x e y

 Se a deformação der origem a uma redução do ângulo


formado por duas faces com normais dirigidas segundo os
eixos positivos (conforme representado na 2ª figura), a
distorção gxy diz-se positiva, caso contrário, diz-se negativa

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação ou extensão de corte
 A figura representa as extensões de corte ou distorções angulares g provocadas pelas tensões de
corte. O alongamento dx é medido paralelamente à tensão que a provoca, mas a deformação de
corte é calculada em relação à dimensão perpendicular à direcção da força. Considerando q o
alongamento angular, a deformação de corte poderá igualmente ser calculada pela tangente deste
ângulo. Assim:
dx
g  tan q
h0

 Para pequenas deformações a extensão de corte é


aproximadamente igual ao ângulo q, razão pela qual pode
ser expressa em radianos
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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 Um corpo solicitado por uma acção exterior F diz-
se que está no domínio elástico se, após retirar a
força aplicada (tensão nula), recuperar completa e
instantaneamente a sua forma e dimensões
originais
tracção compressão
 Um cristal de comprimento l0, por exemplo,
sofre um alongamento Δl em tracção (figura de
cima), que equivale a um aumento da distância
interatómica. Este aumento, que ocorre de a
para b, para valores superiores aos de
equilíbrio (figura de baixo), origina forças de
atracção ΔF até conseguir equilibrar a
solicitação exterior

 A extensão Δl/l0 é equivalente a Δr/r0, em que


Δr corresponde ao afastamento dos átomos em
relação à posição interatómica de equilíbrio r0

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 A diminuição da distância interatómica (em compressão) origina o
aparecimento de forças repulsivas de restituição. Em qualquer dos
casos, após retirar a força exterior, os átomos regressam à sua
posição de equilíbrio, ou seja, de energia mínima, sem ocupar novas
posições, razão pela qual a deformação é reversível (1ª e 2ª figuras)
 A deformação elástica é o resultado de um pequeno alongamento da
célula unitária na direcção da carga tractiva ou uma pequena
contracção na direcção da carga compressiva (3ª figura)
 Na prática, em metais e cerâmicas, as deformações elásticas
raramente produzem extensões nominais superiores a 0,5%

 Da 2ª figura da página anterior poder-se-á observar que para


pequenas variações de r em torno de r0, a curva F(r) é
praticamente uma recta. A força requerida para deformar
elasticamente um material varia nesse caso linearmente com o
deslocamento, ou ainda, a tensão nominal será directamente
proporcional à extensão nominal (lei de Hooke: σ=Ee,
chamando-se à constante de proporcionalidade módulo de
elasticidade ou módulo de Young E, sendo quantificado
usualmente em GPa (109 Pa).
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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 A diminuição da distância interatómica (em compressão)
origina o aparecimento de forças repulsivas de restituição. Em
qualquer dos casos, após retirar a força exterior, os átomos
regressam à sua posição de equilíbrio, ou seja, de energia
mínima, sem ocupar novas posições, razão pela qual a
deformação é reversível (figuras ao lado)
 A deformação elástica é o resultado de um pequeno
alongamento da célula unitária na direcção da carga tractiva
ou uma pequena contracção na direcção da carga
compressiva (figura em baixo)
 Na prática, em metais e cerâmicas, as deformações elásticas
raramente produzem extensões nominais superiores a 0,5%

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 De acordo com a figura pode ser observado que para pequenas
variações de r em torno de r0 (a), a curva F(r) é praticamente
uma recta. A força requerida para deformar elasticamente um
material varia, neste caso, linearmente com o alongamento.
Como a tensão traduz uma força por unidade de área e a
deformação longitudinal o quociente entre o alongamento e o
comprimento inicial, há uma relação de proporcionalidade
directa entre a tensão e a deformação (extensão) - lei de Hooke:

s Ee
E = s/e - módulo de elasticidade longitudinal ou módulo de Young,
expresso normalmente em GPa (109 Pa)

 A maior ou menor aptidão de um dado material se deformar no domínio elástico quando sujeito a uma
determinada força designa-se por rigidez. Então, se Ematerial A > Ematerial B, o material A diz-se mais rígido
que o material B. A rigidez é portanto um conceito do domínio elástico não existindo qualquer medida
estabelecida se o material se encontrar fora daquele domínio

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 O comportamento elástico, por vezes, aparece na literatura impropriamente associado tanto a um
comportamento linear como à inexistência de absorção de energia durante o ciclo de carregamento e
descarregamento da tensão. Por exemplo, o ferro fundido cinzento ou o betão têm comportamento não
linear (mesmo quando o nível de tensão é reduzido) encontrando-se, no entanto, todos no domínio
elástico (figura à esquerda)
 Assim, no caso do material apresentar um comportamento não linear no domínio elástico, são
necessárias novas definições para o módulo de elasticidade (figura à direita). O módulo de elasticidade
pode ser determinado pelo declive da linha OA (tangente na origem), pelo declive da curva no ponto B
(tangente à tensão b) ou pelo declive da linha OC (secante à tensão c)

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 Qualquer alongamento ou contracção da estrutura cristalina numa dada direcção, devido a uma força
uniaxial, produz um ajuste ou acomodação nas dimensões perpendiculares à direcção da força. No caso
da aplicação de uma força de tracção observa-se uma pequena contracção na direcção perpendicular. A
relação negativa entre a deformação transversal e a deformação longitudinal é chamada coeficiente de
Poisson :
e transv Nota: Para a maioria dos metais o valor de  é de,
  aproximadamente, 1/3; para os restantes materiais estruturais
e longit utilizados em engenharia o valor de  varia entre 1/6 e 1/3

 Analogamente ao modo como se definiu o módulo de elasticidade (a partir de tensões e deformações


normais), é possível definir o módulo de elasticidade ao corte ou módulo de elasticidade transversal, G:

t
G
 O módulo de elasticidade ao corte é g
uma constante elástica de um
material em estado de tensão de
corte simples, resultante do
quociente entre a tensão de corte e
a distorção correspondente (figura)

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Introdução à Ciência dos Materiais:
tensão e deformação
Deformação elástica e propriedades do domínio elástico
 Apesar do módulo de elasticidade ao corte, G, ser diferente do
módulo de elasticidade longitudinal, E, os dois estão relacionados
pela expressão:

E  2G (1   )

 O valor de G é aproximadamente 35% de E

 A 1ª figura representa um conjunto de átomos na sua posição de


equilíbrio. Após a aplicação de tensões de corte no domínio elástico o
material sofre uma determinada distorção (2ª figura). A 3ª figura
representa a aplicação de tensões de corte mais intensas que
originam uma deformação não elástica, mas sim uma deformação
plástica (a abordar na secção seguinte)

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Introdução
 A plasticidade é a propriedade de um corpo não recuperar a sua forma e dimensões primitivas, quando
deixa de actuar a solicitação que produziu a sua deformação, ficando permanentemente deformado

 Durante a deformação plástica, os átomos do material metálico são deslocados permanentemente das
posições originais e passam a ocupar novas posições. A capacidade que alguns metais apresentam de
sofrerem grandes deformações plásticas sem que ocorra fractura (ductilidade) é uma das mais
importantes propriedades de engenharia dos metais. Por exemplo, a grande deformabilidade plástica dos
aços permite que certos componentes de um automóvel, como guarda-lamas, capotas e portas, possam
ser obtidos por estampagem mecânica, sem que ocorra fractura do material

http://malveira.olx.pt/portas-opel-corsa-d-iid-20952616 http://argoncilhe.olx.pt/capot-mercedes-w245-classe-b-iid-49536284

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica de monocristais metálicos
 Porque surge a deformação plástica em
metais?
Ao deformar plasticamente um
monocristal de zinco, ou seja, ao
aumentar, por exemplo, a força de
tracção até que haja uma alteração
permanente da forma (deformado para
além do limite elástico), examinando a
superfície ao microscópio, observa-se a
existência de pequenos degraus devido
à formação de bandas de
escorregamento (figuras (a) e (b))
Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

 As bandas de escorregamento são provocadas pelo escorregamento (deformação devida às tensões de


corte) dos átomos do metal que se encontram em determinados planos cristalográficos designados por
planos de escorregamento. Os átomos movem-se segundo um número inteiro de distâncias atómicas ao
longo do plano de escorregamento, produzindo um degrau na superfície. A superfície do monocristal de
zinco deformado ilustra a deformação das bandas de escorregamento já que, nestes cristais, o
escorregamento está limitado aos planos basais da estrutura HC (figuras (c) e (d))
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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica de monocristais metálicos

 Nos monocristais de metais dúcteis


com estrutura CFC, tais como o cobre
e o alumínio, o escorregamento ocorre
em múltiplos planos de
escorregamento e, como
consequência, o aspecto das bandas
de escorregamento à superfície
destes metais, quando deformados, é
mais uniforme. Observando a
superfície deformada plasticamente
destes metais com uma ampliação
maior, constata-se que, no interior das
bandas, o escorregamento ocorreu
segundo muitos planos de
escorregamento (figura). Estes
degraus estreitos designam-se por
linhas de escorregamento
Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica de cristais metálicos pelo
mecanismo de escorregamento (principal)
 Um grande número de átomos num cristal
metálico não deslizará simultaneamente
provocando deformação plástica (figura). Com
efeito, se a deformação plástica se devesse a
tal mecanismo, seria necessário uma tensão de
corte da ordem de G/30, tendo por base uma
estimativa baseada na energia de ligação entre
os átomos. Na prática, o valor da referida
tensão na maioria dos materiais metálicos
Sebenta de Materiais II - IST, Ensaios Mecânicos, AE do IST
cristalinos é da ordem de G/1000
 Cálculos efectuados com base no modelo referido mostram que as resistências mecânicas dos cristais
metálicos deveriam ser cerca de 100 a 10000 vezes superiores aos valores observados. Assim, nos cristais
metálicos reais de grandes dimensões, este mecanismo para o escorregamento atómico não é o correcto
 Deste modo, o mecanismo responsável pela deformação plástica não é o deslizar em bloco de um plano
em relação a outro. Para que os cristais metálicos de grandes dimensões se possam deformar por acção
de tensões de corte mais baixas, tem que existir uma grande densidade de defeitos cristalinos conhecidos
por deslocações. As deslocações permitem explicar a discrepância entre a tensão de corte teórica
necessária para deformar plasticamente um cristal perfeito e a tensão de corte experimental medida
aquando da deformação plástica de um cristal com defeitos
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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Escorregamento
 As deslocações são criadas em grande número (~106
cm/cm3), à medida que o metal solidifica e, quando o
cristal metálico é deformado, são criadas muitas mais,
pelo que um cristal fortemente deformado pode conter
uma densidade de deslocações de cerca de 1012 cm/cm3
 Na figura mostra-se como, por acção de uma pequena
tensão de corte, uma deslocação cunha pode originar uma
unidade de escorregamento. Para que o escorregamento
ocorra é necessária uma tensão relativamente baixa, uma
vez que, em cada instante, apenas um pequeno grupo de
átomos escorrega sobre os outros
 Uma situação semelhante ao movimento de uma
deslocação num cristal metálico por acção de uma tensão
de corte, é o movimento de um tapete, com uma
ondulação, sobre um pavimento. Ao puxar uma das
extremidades do tapete pode ser impossível deslocá-lo,
devido ao atrito entre o pavimento e o tapete, no entanto,
fazendo uma ondulação no tapete (análoga à deslocação
no cristal), este pode ser movido, empurrando
progressivamente, ao longo do pavimento, a ondulação Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
nele existente Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Sistemas de escorregamento
 As deslocações provocam deslocamentos atómicos em planos
e direcções cristalográficos de escorregamentos específicos.
Os planos de escorregamento são geralmente os mais
compactos e são também os que se encontram mais afastados
uns dos outros. O escorregamento é mais fácil nos planos mais
compactos, já que, para provocar o deslocamento dos átomos
nestes planos, é necessária uma tensão de corte mais baixa do
que nos planos menos compactos (figura de cima). Contudo, se
o escorregamento nos planos compactos estiver restringido, por
exemplo, devido a tensões locais elevadas, então os planos de
compacidade mais baixa podem tornar-se activos. O
escorregamento segundo direcções compactas é igualmente
Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
favorecido, já que, quando os átomos se encontram mais Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill
próximos uns dos outros, é menor a energia necessária para
mover os átomos de uma posição para outra

 O conjunto de um plano de escorregamento com uma direcção de escorregamento designa-se por sistema
de escorregamento. Nas estruturas metálicas, o escorregamento ocorre em determinados sistemas de
escorregamento que são característicos de cada estrutura cristalina

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Sistemas de escorregamento
 Na tabela estão representados os planos e direcções de
escorregamento predominantes nas estruturas cristalinas
CFC, CCC e HC
 Nos metais o escorregamento ocorre, preferencialmente,
em planos e direcções de máxima compacidade atómica.
Na estrutura cristalina CFC existem quatro tipos diferentes
de planos de escorregamento e cada plano contém três
direcções de escorregamento. Assim, 4 planos de
escorregamento x 3 direcções de escorregamento = 12
sistemas de escorregamento (tabela)
 A estrutura CCC não é uma estrutura compacta, uma vez
que os planos de escorregamento não são de máxima
compacidade atómica, como acontece na estrutura CFC. No
entanto, a direcção <111> da estrutura CCC é tão compacta
quanto a <110> da CFC e a <1120> da HC. Assim, o
escorregamento nos metais CCC exige tensões de corte
mais elevadas do que nos metais CFC. Os planos {110} são
os que têm a maior densidade atómica e, frequentemente, o
escorregamento tem lugar nestes planos
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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Sistemas de escorregamento
 Contudo, nos metais CCC também ocorre escorregamento nos planos {112} e {123}. Como existem seis
tipos diferentes de planos de escorregamento de maior densidade atómica e cada um deles contém duas
direcções de escorregamento, há 6 x 2 = 12 sistemas de escorregamento

 Na estrutura HC, os planos basais são os de máxima compacidade atómica, sendo os planos de
escorregamento habituais nos metais HC, como Zn, Cd e Mg, que têm razões c/a elevadas (tabela).
Contudo, nos metais HC com valores baixos da razão c/a como Ti, Zr e Be, o escorregamento também
ocorre frequentemente em planos prismáticos e piramidais. Como existe apenas um plano de
escorregamento de máxima compacidade atómica (basal), onde cada plano contém três direcções de
escorregamento, há 1 x 3 = 3 sistemas de escorregamento. A existência de um número limitado de
sistemas de escorregamento nos metais HC limita a sua ductilidade

 Certos metais apresentam planos de escorregamento adicionais à medida que a temperatura aumenta. A
temperaturas elevadas, o alumínio apresenta escorregamento segundo o plano {110}, enquanto que, no
magnésio, acima de 225ºC o plano piramidal {1011} exerce um papel importante na deformação por
escorregamento. Em todos os casos as direcções de escorregamento permanecem as mesmas, apesar
dos planos de escorregamento variarem com a temperatura

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Tensão de corte (tangencial) crítica em monocristais metálicos
 A tensão necessária para provocar o
escorregamento num monocristal de um metal puro
depende principalmente da estrutura cristalina do
metal, das características da sua ligação atómica,
da temperatura a que é deformado e da orientação
dos planos de escorregamento activos em relação
às tensões de corte. O escorregamento inicia-se no
interior do cristal, quando a tensão de corte no
plano de escorregamento, segundo a direcção de
escorregamento, atinge um determinado valor,
designado por tensão tangencial resolvida crítica tc
 Na tabela indicam-se os valores da tensão
tangencial resolvida crítica de alguns monocristais
de metais puros, à temperatura ambiente. Os
metais como Zn, Cd e Mg têm tensões tangenciais
resolvidas críticas baixas, que variam entre 0,18 e
0,77 MPa. Os metais puros CFC, como Ag e Cu,
têm valores baixos de tc, respectivamente, 0,48 e Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
0,65 MPa, devido à existência de múltiplos sistemas Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill
de escorregamento
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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Lei de Schmid

 A relação entre a tensão uniaxial que actua sobre


um monocristal cilíndrico de um metal puro e a
correspondente tensão tangencial (ou de corte)
que actua no sistema de escorregamento no
interior do cilindro pode ser deduzida do seguinte
modo:
 Considere-se uma tensão uniaxial de tracção σ a
actuar sobre um cilindro metálico (figura).
 Designando por A0 a área da secção perpendicular
à força axial F e por A1 a área do plano de
escorregamento, ou área de corte, sobre a qual a
força de corte resolvida Fr está a actuar. Podemos
definir a orientação do plano e a direcção de
escorregamento pelos ângulos  e , em que  é o
ângulo entre a força uniaxial F e a normal ao plano
de escorregamento de área A1, e  é o ângulo
entre a força axial e a direcção de escorregamento
Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

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Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Lei de Schmid
 Para que a deslocação se mova no sistema de escorregamento, a força axial aplicada terá de originar,
segundo a direcção de escorregamento, uma tensão tangencial resolvida superior a um determinado
valor. A tensão tangencial resolvida (ou tensão de corte) é dada por:
força de corte F
tr   r
área de corte (área do plano de escorregamento) A1
 A força de corte resolvida Fr está relacionada com a força axial F por Fr = F cos . A área do plano de
escorregamento (área de corte) é A1 = A0 / cos . Dividindo a força de corte F cos  pela área de corte
A0 / cos  obtém-se a equação
P cos  P
tr   cos . cos   s cos . cos 
A0 A0
cos 
que traduz a lei de Schmid
 A equação fornece a tensão de corte no plano de escorregamento que actua segundo a direcção de
escorregamento. Esta tensão é máxima quando  ==45º, pois assim tc  1/2 P/A0 = 1/2 σ. Se o eixo de
tracção for normal ao plano de escorregamento ( = 90º) ou se for paralelo a este ( = 90º), a tensão
de corte resolvida é zero, o que significa que para estas orientações o escorregamento não ocorre. Os
cristais próximos a estas orientações tendem a fracturar em vez de escorregar

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 28


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica pelo mecanismo de maclagem (secundário)
 Um segundo mecanismo de deformação
plástica que é importante nos metais é a
maclagem. Este mecanismo ocorre quando uma
região do cristal tem a sua orientação alterada,
estando esta relacionada com a orientação da
restante rede cristalina de maneira definida e
simétrica. A região maclada é uma imagem de
espelho da matriz cristalina, sendo o plano de
simetria que as separa chamado plano de macla

 Na figura é ilustrado o aspecto atómico da maclação. A figura (a) representa uma secção perpendicular à
superfície numa rede cúbica com um plano de baixo índice paralelo ao do papel e inclinado em relação
ao plano de polimento. O plano de macla é perpendicular ao papel, apresentando o cristal maclação em
torno deste plano (figura (b)). A região à direita do plano de macla não sofre deformação, enquanto que à
esquerda, os planos atómicos são deformados em corte de forma a que a rede formada através do plano
da macla seja uma imagem de espelho da rede original do cristal. Numa rede cristalina simples como
esta, cada átomo na região maclada movimenta-se através da aplicação de tensões de corte, numa
quantidade proporcional à sua distância do plano da macla. Na figura (b), os círculos abertos
representam os átomos que não se moveram, os círculos pontilhados indicam as posições originais da
rede que mudaram de posição e os círculos cheios as posições finais na região maclada

Fátima Barreiros/Paulo Novo Dieter, G.E. (1981). Metalurgia Mecânica, Química e Ciência dos Materiais 29
Ed. Guanabara Koogan, SA
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Maclagem
 A maclagem, tal como o escorregamento, ocorre numa direcção específica, chamada direcção de maclagem.
Contudo, no escorregamento, todos os átomos de um dos lados do plano de escorregamento se movem a
mesma distância, enquanto que na maclagem os átomos se movem distâncias que são proporcionais às
respectivas distâncias ao plano de macla (figura da esquerda)
 Analisando ainda a figura (b) anterior, deve notar-se que a macla é visível na superfície polida em virtude da
variação de nível da superfície, produzida pela deformação, e também devido à diferença de orientação
cristalográfica entre as regiões deformada e não-deformada. Se a superfície fosse polida até à secção AA, a
diferença de nível da superfície seria eliminada, no entanto a macla permaneceria visível por possuir uma
orientação cristalográfica diferente daquela da região não-maclada
 Na figura da direita, esquematiza-se a diferença básica entre o efeito do escorregamento e o da maclagem na
topografia da superfície de uma material metálico deformado. O escorregamento origina um conjunto de
degraus (linhas) (a), enquanto a maclagem origina pequenas regiões bem definidas no cristal deformado (b)

Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e


Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 30
Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Maclagem
 A maclagem envolve apenas uma pequena fracção do volume total do cristal metálico e, por isso, a
quantidade total de deformação que pode ser originada é muito pequena. A maclagem não é um
mecanismo de deformação dominante nos metais que possuem muitos sistemas de escorregamento,
ocorrendo geralmente quando estes sistemas são restritos ou quando, por algum motivo, a tensão de
corte crítica é aumentada, tornando a tensão de maclagem inferior à tensão necessária ao
escorregamento
 Contudo, o principal efeito da maclagem na deformação é que as alterações de orientação que são
provocadas podem fazer com que novos sistemas de escorregamento fiquem com uma orientação
favorável no que respeita à tensão de corte, permitindo assim a ocorrência de escorregamento adicional.
Das três estruturas cristalinas habituais nos materiais metálicos (CCC, CFC e HC), a maclagem é mais
importante na HC, devido ao pequeno número de sistemas de escorregamento existente nesta estrutura.
Não obstante a contribuição da maclagem, os metais HC, como o zinco e o magnésio, são menos dúcteis
do que os metais CCC e CFC, que têm mais sistemas de escorregamento
 Nos metais HC a deformação por maclagem ocorre à temperatura ambiente, enquanto nos metais CCC,
como Fe, Mo, W, Ta e Cr, sucede a temperaturas muito baixas. No entanto, à temperatura ambiente
também se observa deformação por maclagem em cristais metálicos CCC quando submetidos a
velocidades de deformação muito elevadas. Os metais CFC são os que têm menor tendência para
apresentarem maclas de deformação, se bem que estas possam ser originadas quando os metais são
submetidos a tensões suficientemente elevadas e a temperaturas suficientemente baixas

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 31


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica de metais policristalinos
 A maior parte das ligas de engenharia são policristalinas.
De facto, os monocristais de metais e de ligas metálicas
são fundamentalmente utilizados em investigação, sendo
raramente usados em aplicações de engenharia. Os
limites de grão aumentam a resistência mecânica dos
metais e ligas, uma vez que actuam como obstáculos ao
movimento das deslocações, excepto a temperaturas
elevadas, em que se tornam regiões menos resistentes.
Na maior parte das aplicações em que a resistência
mecânica é importante, é desejável um tamanho de grão
pequeno e, por isso, a maior parte dos materiais
metálicos é produzida com grão fino. Na figura
comparam-se as curvas de tensão-extensão obtidas em
ensaios de tracção de amostras de cobre mono e
policristalino, efectuados à temperatura ambiente.
Qualquer que seja a extensão, o cobre policristalino é
mais resistente do que o cobre monocristalino. Para a
extensão de 20%, a resistência à tracção do cobre
policristalino é de 276 MPa, enquanto que a do cobre Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
monocristalino é de 55 MPa Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 32


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação plástica de metais policristalinos
 Durante a deformação plástica dos materiais metálicos,
as deslocações que se movem num determinado plano
de escorregamento não podem passar em linha recta, LINHAS DE ESCORREGAMENTO
directamente de um grão para o outro
 Como mostram as figuras à direita, as linhas de
escorregamento mudam de direcção nos limites de
grão. Assim, em cada grão, as deslocações movem-se
em planos de escorregamento preferenciais que têm
orientações diferentes das dos grãos vizinhos. Na
figura de baixo, mostra-se um limite de grão de grande
desorientação, que funciona como obstáculo ao
movimento das deslocações e que faz com que as www.em.pucrs.br

deslocações se empilhem no limite de grão

Fátima Barreiros/Paulo Novo Budinski. K.G., Budinski, M.K. (2005). Engineering Materials Química e Ciência dos Materiais
33
– Properties and Selection. Pearson Education, Inc.
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Encruamento

 Uma das principais características da deformação plástica dos metais é o facto da tensão de corte
necessária para produzir escorregamento aumentar continuamente com a deformação plástica. O
aumento da tensão necessária para produzir escorregamento, devido à deformação plástica prévia do
material, é chamado encruamento
 O encruamento é causado pela interacção entre deslocações umas com as outras e com barreiras que
impedem o seu movimento através da rede cristalina
 Um dos primeiros conceitos para explicar o encruamento é baseado na ideia das deslocações se
empilharem nos planos de escorregamento, quando bloqueadas pelas fronteiras de grão. Estes
empilhamentos produzem uma tensão de reacção que se opõe à tensão aplicada no plano de
escorregamento
 O próximo passo é identificarmos as barreiras ao movimento das deslocações nos monocristais.
Partículas microscópicas de precipitados e também átomos de solutos podem agir como barreiras, no
entanto devem-se encontrar outras barreiras efectivas nos monocristais
 Estas barreiras surgem porque as deslocações que se movimentam em planos de escorregamento que
se intersecionam podem-se combinar umas com as outras produzindo novas deslocações que não
estejam em direcções de escorregamento. Estas deslocações de baixa mobilidade que se formam a
partir de reacções entre deslocações são chamadas deslocações bloqueadas.

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 34


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Encruamento
 Uma vez que estas deslocações bloqueadas não se encontram no plano de escorregamento de baixa
tensão de corte, elas actuam como barreiras à movimentação de outras deslocações, até que a tensão
atinja um nível suficientemente elevado capaz de romper o bloqueio
 Um outro mecanismo de encruamento, além dos expostos em cima, ocorre quando as deslocações que
se movimentam no plano de escorregamento são cortadas por outras deslocações que intersecionam o
plano de escorregamento activo
 O encruamento implica assim uma mútua obstrução das deslocações que escorregam nos sistemas de
escorregamento que se interceptam. Isso pode ocorrer (1) através da interacção dos campos de tensão
das deslocações, (2) através de interacções que produzam deslocações bloqueadas e (3) através da
interpenetração de um sistema de escorregamento por outro que resultam na formação de degraus de
deslocações
 Devido à deformação a frio, são geradas novas deslocações que irão interactuar com as previamente
existentes. Como a densidade de deslocações aumenta com a deformação, o movimento das
deslocações através da “floresta de deslocações” torna-se cada vez mais difícil (diminui a capacidade de
deformar plasticamente) e, por isso, o metal encrua (isto é, endurece por deformação e aumenta a sua
resistência mecânica) com o aumento da deformação a frio
 No caso de metais policristalinos para além dos obstáculos supracitados, os limites de grão também
constituem barreiras significativas ao movimento das deslocações como referido anteriormente
Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 35
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Encruamento

 Quando os metais dúcteis como o cobre, o alumínio e o ferro a


recozidos são deformados a frio à temperatura ambiente,
ocorre o seu encruamento devido à interacção das
deslocações
 Na figura, mostra-se como uma deformação a frio de 30%,
realizada à temperatura ambiente, provoca um aumento da
resistência à tracção do cobre não-ligado, de cerca de 200
MPa para 320 MPa. Conforme se pode observar, associado ao
aumento da resistência à tracção ocorre, contudo, uma
diminuição da ductilidade. A deformação a frio faz com que a
ductilidade do cobre não-ligado diminua de 42 para 10%

 O encruamento ou endurecimento por deformação constitui um dos métodos mais importantes para
aumentar a resistência mecânica de alguns metais. Por exemplo, utilizando apenas este método, pode
aumentar-se consideravelmente a resistência mecânica do cobre e do alumínios puros. Assim, pode
produzir-se arame de cobre trefilado a frio com diferentes resistências mecânicas (dentro de certos limites),
bastando variar a percentagem de encruamento

Fátima Barreiros/Paulo Novo Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e Química e Ciência dos Materiais 36
Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Endurecimento de metais por solução sólida
 A resistência mecânica dos metais pode ser
aumentada por endurecimento por solução
sólida. A adição de um ou mais elementos a
um metal pode provocar o aumento de
resistência mecânica deste devido à
formação de uma solução sólida. A
estrutura das soluções sólidas
substitucionais e intersticiais já foi abordada
anteriormente. Quando os átomos
substitucionais (soluto) se misturam, no
estado sólido, com os átomos de outro
metal (solvente), criam-se campos de
tensão em torno dos átomos de soluto.
Estes campos de tensão interactuam com
as deslocações e tornam mais difícil o
movimento destas (figura); portanto, a
solução sólida é mais resistente
mecanicamente que o metal puro

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 37


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Endurecimento de metais por solução sólida
 O endurecimento por solução sólida é afectado por dois factores importantes:
1. factor tamanho relativo. As diferenças de tamanho entre os átomos de soluto e de solvente
afectam o endurecimento por solução sólida, devido a distorções que são originadas na rede
cristalina. As distorções da rede tornam o movimento das deslocações mais difícil e daí o
endurecimento da solução sólida metálica

2. Ordem a curta distância. Nas soluções sólidas, a mistura


dos átomos só raramente é aleatória; pelo contrário, ocorre
uma espécie de ordem a curta distância ou o agrupamento
de átomos idênticos. O movimento das deslocações é
dificultado por estas estruturas de ligação
 Como exemplo de endurecimento por solução sólida,
considere-se uma solução sólida com 70% pond. Cu 30%
pond. Zn (latão para cartuchos). A tensão de rotura do
cobre não ligado com 30% de deformação a frio é de cerca
de 330 MPa (figura). Contudo, a tensão de rotura da liga
com 70% pond. Cu-30% pond. Zn com 30% de deformação
a frio é cerca de 500 MPa. A ductilidade diminui de cerca de
Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
65% para 10% Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 38


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Recozimento
 As propriedades e a estrutura do metal alteradas pelo
trabalho a frio podem ser recuperadas ou devolvidas ao
estado anterior ao encruamento, mediante um tratamento
térmico de recozimento. O aumento da temperatura implica
um acréscimo na agitação das deslocações e, deste modo,
origina um incremento do movimento destas, levando à
união de algumas e à aniquilação de outras (diminuição do
número de deslocações)
 Durante o processamento e fabrico de metais e ligas é, por
vezes, necessário reaquecer o material deformado a frio para
o amaciar e, com isso, aumentar a sua ductilidade. Se o
material metálico for aquecido a uma temperatura
suficientemente elevada, durante um dado intervalo de
tempo, a estrutura do material deformado a frio sofrerá um
processo complexo que integra três estágios: (1) restauração
ou recuperação, (2) recristalização e (3) crescimento de
grão. Na figura estão esquematizadas as modificações
estruturais que ocorreram com o aumento da temperatura,
assim como as correspondentes alterações das Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e
propriedades mecânicas Engenharia de Materiais, Ed. McGraw-Hill

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 39


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Recozimento
 Analise-se agora mais detalhadamente as modificações
estruturais, começando com a estrutura dos materiais
metálicos fortemente deformados a frio
 Quando o material é fortemente deformado a frio, parte da
energia dispendida durante a deformação plástica é
armazenada no material sob a forma de deslocações e
outros defeitos, tais como defeitos pontuais. Assim, um
material metálico encruado tem uma energia interna
superior à do material não deformado
 A força motora para este processo é a energia armazenada
na deformação (figura)
 Uma vez que a ductilidade é restaurada, pode seguir-se
nova deformação a frio – interesse industrial:

Def. a frio  Recozim.  Def. a frio  Recozim. …

grande deformação total por alternância da


deformação a frio com o recozimento Sebenta de Materiais II - IST, AE do IST

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 40


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Recozimento
1º Estágio - Recuperação

 Quando um material metálico encruado é aquecido na gama de temperaturas em que ocorre a


recuperação, que é imediatamente abaixo da gama de temperaturas de recristalização, as tensões
internas do material são aliviadas (as tensões internas podiam ser causa de fractura ou corrosão sob
tensão

 Durante a recuperação, é fornecida energia térmica suficiente para que as deslocações se rearranjem em
configurações de menor energia. A recuperação de muitos metais deformados a frio (por exemplo,
alumínio puro) origina o estrutura de subgrão com limites de grão de pequena desorientação. A energia
interna do material metálico recuperado é inferior à do material deformado a frio, uma vez que durante o
processo de recuperação muitas deslocações são eliminadas ou movem-se para configurações de mais
baixa energia. Durante a recuperação, a resistência mecânica do material metálico deformado a frio
diminui ligeiramente, mas a ductilidade aumenta, geralmente, de modo significativo

 Este 1º estágio recupera as propriedades elásticas, restaura a condutibilidade eléctrica e aumenta a


resistência à corrosão

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 41


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Recozimento
2º Estágio - Recristalização
 A recristalização consiste na
obtenção de uma nova estrutura
resultante da nucleação e
crescimento de novos cristais,
iguais em composição e tamanho,
com poucas deslocações (menor
estado energético nos novos
grãos)
 Após um intervalo de tempo
suficientemente longo à
temperatura a que a
recristalização ocorre, a estrutura
deformada a frio é totalmente
substituída por uma estrutura de
grão recristalizado, como se
mostra na figura

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 42


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
2º Estágio - Recristalização

 Com o estágio de recristalização:


- elimina-se grande parte das deslocações;
- recuperam-se as propriedades mecânicas iniciais (diminui a dureza, diminui a resistência mecânica e
aumenta a ductilidade);
- origina uma estrutura de grão fino

 Para se processar a recristalização é necessário um mínimo de deformação a frio (~30% nas ligas
ferrosas)

 Por exemplo, uma chapa de latão com 85% Cu-15% Zn, de 1mm de espessura, que foi laminada a frio
com 50% de redução sofre, por recozimento a 400ºC durante 1h, uma diminuição de tensão de rotura
de 520 para 310MPa. Por outro lado, o recozimento provoca um aumento de ductilidade da chapa de 3
para 38%

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 43


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Parâmetros que afectam a recristalização

 Os principais factores que afectam o processo de recristalizaçãoi em metais e ligas são: (1) a deformação
a frio prévia do material metálico, (2) a temperatura, (3) o tempo, (4) o tamanho de grão inicial e (5) a
composição do metal ou liga
 Podem fazer-se as seguintes generalizações acerca do processo de recristalização:
1. Para que a recristalização ocorra é necessário que a deformação do material metálico seja superior a
uma percentagem mínima
2. Quanto mais pequena for a deformação (acima de um valor mínimo), maior será a temperatura
necessária para que ocorra a recristalização
3. Aumentando a temperatura de recristalização diminui o tempo necessário para a completar
4. O tamanho de grão final depende essencialmente da deformação prévia. Quanto maior for a
deformação, menor será a temperatura de recozimento necessária à recristalização e menor será o
tamanho de grão recristalizado
 A temperatura de recristalização não é uma temperatura definida abaixo da qual a recristalização não
ocorre, mas refere-se à temperatura à qual um material altamente encruado se recristaliza completamente
ao fim de uma hora. Em princípio a temperatura de recristalização é 0,4 a 0,6 da temperatura absoluta de
fusão (Kelvin)

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 44


Introdução à Ciência dos Materiais:
recozimento
Recozimento
3º Estágio – Crescimento de grão
 Os grãos do material não distorcido crescem por
migração das fronteiras (crescimento de uns
grãos à custa dos vizinhos) (figuras em baixo)
 Este estágio não é necessariamente precedido
pela recuperação e recristalização
 Uma microestrutura de grão grosso é geralmente
indesejável, embora em certos casos possa ter
vantagem (temperabilidade, maquinabilidade e
ductilidade – grão maior aumenta a ductilidade)

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 45


Introdução à Ciência dos Materiais:
deformação a frio e a quente
Deformação a Quente
 O esforço mecânico que leva à deformação plástica
pode ser realizado em condições diferentes de
temperatura, desde a ambiente até temperaturas
elevadas, no entanto, inferiores à temperatura de
fusão. Distingue-se o trabalho mecânico a frio do
trabalho mecânico a quente, pela sua realização a
uma temperatura inferior ou superior à temperatura
de recristalização (característica de cada metal)
 A deformação a quente é a deformação plástica que
ocorre a uma temperatura superior à temperatura de
recristalização

 Na deformação a quente, o encruamento (predominante a baixas temperaturas) é constantemente


suplantado pela recuperação e recristalização - fenómenos termo-activados (que predominam a altas
temperaturas). A estrutura cristalina deforma-se plasticamente e permanece deformada enquanto o metal
está submetido ao trabalho mecânico, ficando totalmente recozida assim que este cessar. Este processo
de deformação plástica origina um grande aumento de ductilidade e uma diminuição da resistência
mecânica (figura)

Fátima Barreiros/Paulo Novo Sebenta de Materiais II - IST, AE do IST Química e Ciência dos Materiais 46
Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade e recozimento
Deformação a Quente

Sebenta de Materiais II - IST, AE do IST

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 47


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Deformação a Quente

Sebenta de Materiais II - IST, AE do IST

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 48


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade

Vantagens e limitações da deformação a frio e da deformação a quente


 Deformação a frio

Vantagens
- Possibilidade de deformação e aumento de resistência mecânica
- Bom acabamento superficial e boas tolerâncias finais
- Método relativamente económico (energia)
- A anisotropia e as tensões residuais originadas podem ser benéficas quando controladas

Desvantagens
- Para grandes deformações requer recozimentos intermédios
- Grandes esforços – máquinas de grande capacidade
- Moroso (sob o ponto de vista industrial)

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 49


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade

Vantagens e limitações da deformação a frio e da deformação a quente

 Deformação a quente

Vantagens
- Menores esforços
- Maior rapidez de execução
- Não necessita de tratamentos térmicos intermédios

Desvantagens
- Temperaturas elevadas – consumo de energia
- Risco de oxidação – pior acabamento superficial
- Perigo de fractura por choque térmico

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 50


Introdução à Ciência dos Materiais:
plasticidade
Aplicações tecnológicas da deformação plástica
Classificação quanto às condições de realização: Classificação quanto à forma do material deformado:
- a frio - de chapa (“sheet forming”)
- a quente - em massa (“bulk form”)
- deformação superplástica
Exemplos:

estiramento extrusão embutidura

forjamento laminagem

dobragem quinagem corte

Fátima Barreiros/Paulo Novo Sebenta de Materiais II - IST, AE do IST Química e Ciência dos Materiais 51
Introdução à Ciência dos Materiais:
questões
Questões de auto-avaliação

1. Descreva o processo de escorregamento tendo em conta a existência defeitos lineares.

2. Indique, justificando, quais as estruturas cristalinas que possuem mais facilidade em se


deformar plasticamente, tendo em conta o número de sistemas de escorregamento
existentes em cada estrutura e o nível de tensão aplicada.

3. Indique as principais diferenças entre as deformações a frio e a quente, através da


aplicação dos conceitos de encruamento e recozimento, explicando estes fenómenos e
as propriedades mecânicas resultantes.
Soluções:
1. Ver págs. 19 a 23
2. Ver págs. 24 a 26
3. Ver págs. 32 a .50
Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 52
Introdução à Ciência dos Materiais:
referências
Referências
• Smith, W.F. (1998). Princípios de Ciência e Engenharia de Materiais, Editora McGraw-Hill de Portugal:
Amadora.

• Smith, W.F. (1996). Principles of Materials Science and Engineering, third edition, McGraw-Hill, Inc.: New
York.

• Shackelford, J.F. (2000). Introduction to Materials Science for Engineers, 5th edition, Prentice-Hall, Inc.:
New Jersey.

• Beer, F., Johnston, R., Dewolf J.( 2003). Mecânica dos Materiais, Ed. McGraw-Hill de Portugal

• Dieter, G.E. (1981). Metalurgia Mecânica, 2ª Edição, Editora Guanabara Koogan, SA: Rio de Janeiro.

• Budinski. K. G., Budinski, M.K. (2005). Engineering Materials – Properties and Selection. Eighth edition,
Pearson Education, Inc.: New Jersey

• Sebenta de Materiais II - IST, Ensaios Mecânicos, AE do IST

• http:// www.dem.ist.utl.pt

• http://www.em.pucrs.br

Fátima Barreiros/Paulo Novo Química e Ciência dos Materiais 53

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