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LINGUÍSTICA E A LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

Pós-Graduação
APRESENTAÇÃO DA PROFESSORA

A Professora Kelly Priscilla Lóddo Cezar é Doutora pelo Programa de


Linguística e Língua Portuguesa da Universidade Estadual Paulista Júlio de
Mesquita Filho - Campus de Araraquara (CONCEITO 6-CAPES), com período
sanduíche na Faculdade de Letras de ÉVORA (2012). Atuou como professora-
pesquisadora na Casa Pia de Lisboa e na Associação Norte Paranaense de Áudio
Comunicação Infantil (ANPACIN). É Graduada e Mestre em Letras pela
Universidade Estadual de Maringá/PR. É participante do Grupo de Pesquisa
FONAC, liderado pelo Prof. Dr. Luiz Carlos Cagliari (UNESP-Fclar). É representante
discente da Comissão para implantação do curso de licenciatura em Letras/Libras
(UNESP/Fclar). Tem experiência na área de Linguística Aplicada ao ensino
fundamental com especialidade em ortografia atuando nos seguintes temas:
ortografia, língua de sinais, fonética e fonologia.
Atualmente é Pós-doutoranda na Universidade Estadual do Oeste do Paraná
(UNIOESTE).
ORGANIZAÇÃO DA DISCIPLINA

A partir das colocações apresentadas, o presente módulo: LINGUÍSTICA E A


LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS tem como foco apresentar as principais
questões de descrição linguística que envolve as línguas de sinais, em especial, a
Libras.

Para tanto, objetiva-se


 Iniciar as discussões acerca da estrutura e do funcionamento
linguístico das línguas sinalizadas utilizando a Linguística como norte.

Junto a isso,
 Observar a teoria sobre o estatuto das línguas sinalizadas na
linguística perpassando os principais autores.
 Compreender as concepções de linguagem na língua oficial do pais e
suas implicações para o ensino da Libras: uma analogia possível.
 Compreender os aspectos fonéticos-fonológicos da Libras.
 Compreender os aspectos morfológicos da Libras.

VAMOS LÁ!!!!!
UNIDADE 1 – LINGUÍSTICA E A LÍNGUAS DE SINAIS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
 Compreender os aspectos linguísticos das línguas de sinais.
 Observar o estatuto linguístico das línguas de sinais.
 Entender a diferença entre uma língua oral-auditiva e o uma sinalizada.

LINGUÍSTICA E A LÍNGUAS DE SINAIS


A linguística enquanto ciência autônoma teve seu início no século XX com a
publicação da obra “Curso de Linguística Geral”, do suíço Ferdinand de Saussure.
Trata-se de uma obra póstuma que foi organizada por seus alunos. A publicação
desse material foi para além da linguística, atingindo a Antropologia, Psicanálise,
Psicologia, Filosofia, entre outras. Nesse momento, a linguística tinha como estudo
científico a linguagem verbal humana (oral e escrita), mas como toda ciência, desde
sua formação, sofreu reformulações teóricas abrindo novos campos de investigação,
tais como: Sociolinguística, Psicolinguística, Linguística Cognitiva, entre outras
(Marcuschi, 2002),
Torna-se relevante destacar alguns momentos de concentração dos estudos
linguísticos, sendo a fonologia nos anos 30, a morfologia nos anos 40 e início dos
anos 50 e a sintaxe e a semântica no final dos anos 50 e 60. Momentos esses em
que a concepção de língua se sobrepunha ao conceito de linguagem. Em outras
palavras, a língua era o foco de estudo e concebida como um “código ou um sistema
de sinais autônomo, transparente, sem história ou fora da realidade dos falantes”
(Marcuschi, 2005), ou seja, a língua era analisada e vista “em si” e “por si” mesma.
É a partir dos anos 60 que nos estudos linguísticos a atenção maior recai
sobre a linguagem. Isso resultou em uma direção sobre os aspectos de uso e de
funcionamento linguístico com implicações que são próprias de produção real das
línguas, das atividades discursivas e como os fatores nela estão envolvidos
(contexto, falante, ouvinte, referente, entre outros).
Assim, os fenômenos linguísticos passaram a ser vistos como fenômenos
sócio-cultural fundamentalmente heterogêneo e em constante processo de
mudança. Essa forma de ver os fenômenos linguísticos ampliou a concepção e
definição de língua.
É nesse novo cenário linguístico que os estudos da linguagem e da surdez
adentraram nas investigações linguísticas. Em nível mundial, o linguista norte-
americano Willian Stokoe publica a descrição linguística sobre a língua de sinais
americana, 1960.
As línguas de sinais são uma forma de linguagem verbal, pois se refere a um
sistema linguístico autônomo, organizado do ponto de vista lexical (vocabulário),
gramatical (regras de funcionamento) e funcional (regras de uso). Apresentam-se
em uma modalidade diferente das línguas orais, visto que são línguas espaço-
visuais. Elas são expressas com as mãos e com os braços; entendidas através do
campo visual e se desenvolvem pela visão e utilização do espaço (QUADROS,
2005; FERREIRA; 2008).
De acordo com a literatura especializada, as línguas de sinais foram
reconhecidas enquanto língua pela linguística por possuírem características
especificas das línguas orais, ou seja, possuem regras linguísticas e são
estruturadas em todos os níveis (lexical, morfológico, semântico e sintático) e por
possuírem um sistema independente das línguas orais.
Quadros e Karnopp (2004) salientam que as línguas de sinais são
consideradas naturais por terem surgido da necessidade de o homem comunicar-se,
refletindo dessa forma a capacidade humana de se comunicar. Assim, elas
evoluíram dentro das comunidades surdas, sendo transmitida de geração para
geração. Além disso, atendem os traços estruturais que uma língua natural
apresenta, sendo: a flexibilidade, a versatilidade, a arbitrariedade, a
descontinuidade, a criatividade, a dupla articulação, o padrão de organização dos
elementos e dependência estrutural.
Do ponto de vista linguístico, Quadros e Karnopp (2005), baseadas nos
estudos de Willian Stokoe (1960/1970), salientam que a primeira grande contribuição
para análise linguística do pesquisador norte-americano foi observar que os sinais
não eram imagens, mas símbolos abstratos e complexos, com uma complexa
estrutura interior. Buscou descrever a estrutura da língua de sinais americana (ASL).
Para isso, analisou de forma detalhada os sinais e pesquisou as partes constitutivas.
A partir dessa descrição e em analogia com a língua oral, apresentou que o
sinal apresenta três partes independentes: 1) localização; 2) configuração de mão e
3) movimento e que cada parte possui um número limitado de combinações.
As definições apresentadas pelo linguista serviram de modelo e de
instrumento para descrever outras línguas de sinais e considerá-las línguas. A partir
desse estudos, outras pesquisas sobre língua de sinais foram surgindo com a
mesma perspectiva: estatuto das línguas de sinais definidas como língua, enfocando
seu aspecto gramatical, linguístico, cultural, entre outros. A Língua Brasileira de
sinais foi uma delas.
No Brasil, em termos linguísticos, os estudos iniciaram na década de 80,
quando a professora Lucinda Ferreira Brito descreveu duas línguas de sinais
brasileiras (Libras e a língua de sinais Urubu-Kaapor). Em seguida, na década de
90, produções acadêmicas (FELIPE, 1998; KARNOPP, 1994; 1999; QUADROS;
1997; 1999; FERREIRA, 2010) contribuíram para a sustentabilidade da Libras.
A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é uma língua de sinais nacional e
natural utilizada pela comunidade surda brasileira. Foi reconhecida pela Lei Federal
nº. 10.436, de 24 de abril de 2002, mais conhecida como Lei da Libras. Essa Lei foi
regulamentada por meio do Decreto 5.626/2005 que apresenta um planejamento
linguístico, prevendo a educação bilíngue de os surdos (Libras como L1 e Língua
Portuguesa como L2), a formação de professores de Libras, de tradutores e
intérpretes de Libras e Língua Portuguesa e de professores de Língua Portuguesa
como segunda língua. Dentre as leis e decretos promulgados na última década
esses motivaram a ampliação do campo de atividades referentes aos surdos.

CONTRASTE ENTRE LIBRAS E LÍNGUA PORTUGUESA: UMA ANALOGIA


POSSÍVEL

Libras: é uma língua visual-espacial; baseada nas experiências visuais das


comunidades surdas, mediante as interações culturais surdas; apresenta uma
sintaxe espacial incluindo os chamados classificadores; utiliza a estrutura de foco
por meio de repetições sistemáticas; utiliza as referências anafóricas por intermédio
de pontos estabelecidos no espaço que exclui ambiguidades; não tem marcação de
gênero; atribui um valor gramatical às expressões faciais; coisas que são ditas nas
línguas de sinais não são ditas usando o mesmo tipo de construção gramatical da
língua portuguesa. Assim, há vezes que uma grande frase é necessária para dizer
poucas palavras em uma ou outra língua; a escrita não é alfabética.

Língua portuguesa: é uma língua oral-auditiva; baseada nos sons; usa uma sintaxe
linear, utilizando a descrição para captar o uso de classificadores; este processo não
é comum na Língua Portuguesa; utiliza referências anafóricas, mas algumas frases
apresentam ambiguidade; o gênero é marcado a ponto de ser redundante; atribuir
um valor gramatical às expressões faciais não é considerado como relevante,
apesar de poder ser substituído pela prosódia; a escrita é alfabética.

Resumo

Ao se observar as diferenças entre as produções na língua portuguesa e na


língua brasileira de sinais percebem-se uma série de diferenças. A seguir serão
listadas algumas delas:

 A língua de sinais é visual-espacial e a língua portuguesa é oral-auditiva.

 A língua de sinais é baseada nas experiências visuais das comunidades


surdas mediante as interações culturais surdas, enquanto a língua portuguesa
constitui-se baseada nos sons.

 A língua de sinais apresenta uma sintaxe espacial incluindo os chamados


classificadores. A língua portuguesa usa uma sintaxe linear utilizando a
descrição para captar o uso de classificadores.

 A língua de sinais utiliza a estrutura tópico-comentário, enquanto a língua


portuguesa evita este tipo de construção.

 A língua de sinais utiliza a estrutura de foco através de repetições


sistemáticas. Este processo não é comum na língua portuguesa.
 A língua de sinais utiliza as referências anafóricas através de pontos
estabelecidos no espaço que exclui ambigüidades que são possíveis na
língua portuguesa.

 A língua de sinais não tem marcação de gênero, enquanto que na língua


portuguesa o gênero é marcado a ponto de ser redundante.

 A língua de sinais atribui um valor gramatical às expressões faciais. Esse fator


não é considerado como relevante na língua portuguesa, apesar de poder ser
substituído pela prosódia.

 Coisas que são ditas na língua de sinais não são ditas usando o mesmo tipo
de construção gramatical na língua portuguesa. Assim, tem vezes que uma
grande frase é necessária para dizer poucas palavras em uma ou outra
língua.

 A escrita da Língua de sinais não é alfabética.

QUESTÕES IMPORTANTES

As línguas sinalizadas conquistaram seu espaço nos estudos científicos sobre


a linguagem. Entretanto, ainda há muito o que se discutir acerca disso, visto que
ainda existem muitos equívocos seu respeito.
As línguas de sinais cumprem todas as funções de uma língua natural,
mesmo assim ainda sofrem preconceito e são desvalorizadas diante das línguas
orais, em detrimento, muitas vezes, do grau de iconicidade que ela apresenta. As
línguas de sinais expressam conceitos abstratos e permitem discutir sobre política,
economia, matemática, física e psicologia, entre outros. Existe um grande mito em
que as línguas sinalizadas são universais. Ao se acreditar nessa assertividade
observamos que há uma falta de conhecimento no termo língua, visto que quando
compreendemos o que venha a ser língua jamais cometemos esse equívoco.
Mesmo assim, vale a pena destacar que como se trata de língua – língua de sinais -
cada país possui sua própria língua de sinais, assim como possui sua própria língua
oral. Portanto, a língua de sinais brasileira é diferente de qualquer outra língua
sinalizada.
Os movimentos surdos conseguiram mostrar que a língua de sinais é a
principal marca da comunidade e nela e por ela observamos a cultura surda,
portanto está sujeita às representações sociais. As línguas de sinais são tão ricas e
complexas gramaticalmente como qualquer língua falada. A grande diferença como
marcada no item acima são suas características linguísticas diferentes das línguas
orais. Isso causa uma grande estranheza nas pessoas que não compreendem a
diferença dessa linguística dessas línguas. Torna-se importante destacar que assim
como qualquer outra língua, as línguas de sinais também apresentam variação
linguística em suas manifestações.
Em função de as línguas de sinais estarem imersas em um país que tem uma
língua majoritária – e a mesma ser de cunho oral, há uma tendência de considerar a
língua de sinais como subordinada à língua oral majoritária do país. Essa forma de
conceber a língua trata-se de um grande equívoco. Como percebemos acima, as
estruturas linguísticas são independentes das línguas orais dos países que são
produzidas. A falta de compreensão desses elementos linguísticos faz com que as
metodologias de ensino aplicadas apresentem falhas na passagem do
conhecimento, em especial, nas metodologia de avaliação da produção escrita do
aluno surdo.

SAIBA MAIS
http://www.editora-arara-azul.com.br/ebooks/catalogo/completo_port.pdf
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. A década de 1960 foi uma década bem marcada por estudos novos, visto
que rompia uma linha de pensamento. Explique quais os motivos pelo qual os
estudos sobre as línguas sinalizadas começaram a ganhas espações neste
momento histórico.

2. Pesquise sobre a vida e obra de Willian Stokoe.

3. Descreva os aspectos linguísticos gerais das línguas sinalizadas.

4. Realize uma diferença sobre as línguas orais e sobre as línguas


sinalizadas.
UNIDADE 2 – CONCEPÇÕES DE LÍNGUA/LINGUAGEM E SUAS IMPLICAÇÕES
NO ENSINO

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
 Observar a língua escrita majoritária – Língua portuguesa e seus principais
problemas.
 Compreender que a língua portuguesa escrita é a segunda língua (L2) dos
surdos.
 Entender os principais problemas que pairam as concepções de linguagem
sobre o ensino de língua portuguesa para auxiliar a compreensão das
produções de alunos surdos.

CONCEPÇÕES DE LÍNGUA E DE LINGUAGEM

Uma das disciplinas mais temidas pelos alunos e, por outro lado, mais
valorizada pelos pais e pelos professores é a Língua Portuguesa. Entre os alunos do
ensino fundamental, é comum o questionamento sobre por que e para que são
obrigados a frequentar essa disciplina com uma carga horária equivalente a outras,
como a Matemática, consideradas mais importantes para sua formação escolar.
Para muitos desses alunos, a aprendizagem formal da língua portuguesa é similar à
aprendizagem de uma língua estrangeira que é usada apenas no ambiente escolar
ou em situações muito especiais com as quais não se identificam. Aparentemente,
seu comportamento deve-se ao fato de não compreenderem a função das
variedades e modalidades linguísticas.
Além desses problemas enfrentados junto aos alunos, a aprendizagem de
Língua Portuguesa, apesar das medidas educacionais implementadas nas últimas
décadas, continua sendo uma das preocupações dos educadores brasileiros.
Depoimentos de professores e de pesquisadores têm mostrado o agravamento do
desempenho dos alunos do ensino fundamental e médio nessa disciplina. Segundo
os dados do SAEB - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (INEP,
2002), os alunos vêm apresentando defasagem cada vez maior entre a série em que
se encontram e os conhecimentos de Língua Portuguesa que dominam.
Por outro lado, ensinar Língua Portuguesa aos próprios falantes parece uma
contradição, pois se acredita que quem domina a forma oral de determinada língua
tende a dominar a correspondente forma escrita. De acordo com os Parâmetros
Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998), o motivo real do ensino da gramática
tradicional - o porquê, o para quê e o como - apresenta lacunas teóricas e práticas
que merecem reflexão por parte dos professores. O baixo desempenho dos alunos
pode ser explicado pela ineficácia das metodologias de ensino desta disciplina, em
especial, quando se refere à língua falada e às regras gramaticais (BRASIL, 1998;
BATISTA, 1997; TRAVAGLIA, 1996).
Assim, os conteúdos ensinados, o enfoque que se dá a eles, as estratégias
de trabalho com seus alunos, a bibliografia utilizada, o sistema de avaliação, o
relacionamento com os alunos, tudo corresponderá ao caminho que o profissional
optou.
Nesse sentido, ao discutir uma alternativa de ação para a crise de ensino
instalada no país, desde há 30 anos, particularmente a de Língua Portuguesa,
Geraldi (1984), propõe uma questão prévia a respeito do processo ensino-
aprendizagem, sendo: para que ensinamos o que ensinamos? e sua correlata
para que as crianças aprendem o que ensinamos?
Conforme o autor, no caso específico da língua materna, a possível resposta
envolve a articulação metodológica entre uma concepção de linguagem e sua
correlação com a postura educacional, uma vez que aliada aos métodos escolhidos
pelos professores para o ensino está a forma como o profissional concebe a
linguagem e a língua, uma vez que ao conceber a natureza fundamental da língua
modifica significativamente como se estrutura o trabalho com a língua em termos de
ensino. A concepção de linguagem é tão importante quanto a postura que se tem.
Atendo-se a considerar o aspecto relativo à concepção de linguagem, propõe, três
formas de concebê-la: 1) Expressão do pensamento; 2) Instrumento de
comunicação e 3) Processo de interação.
A primeira concepção de linguagem (linguagem como expressão de
pensamento) é um princípio sustentado pela tradição gramatical grega, passando
pelos latinos, pela Idade Média e pela Moderna, teoricamente só rompida no início
do século XX, de forma efetiva, por Saussure (1969). Preconiza que a expressão é
produzida no interior da mente dos indivíduos. E da capacidade de o homem
organizar a lógica do pensamento dependerá a exteriorização do mesmo (do
pensamento), por meio de linguagem articulada e organizada. Assim, a linguagem é
considerada a “tradução” do pensamento. A concepção em questão fundamenta os
estudos tradicionais de língua. Parte da hipótese de que a natureza da linguagem é
racional, por entender os homens pensarem conforme regras universais.
Quando um professor adota a primeira concepção de linguagem acaba por
considerar que a expressão de seus alunos julgará a forma como pensam, ou seja,
se não se expressarem bem, logo não pensarão bem e vice-versa. Dessa forma,
observa-se que o profissional ao adotar essa concepção estará diretamente atrelado
aos estudos linguísticos tradicionais resultando em um ensino tradicional ou
normativo, a saber, em um ensino mecanizado e cristalizado dependente
unicamente de leis psicológicas individuais em que os homens organizam seu
pensamento dependerá da exteriorização dessa forma de pensar via uma linguagem
articulada e organizada.
A língua é um veículo para exteriorização do pensamento. O pensamento é
uma faculdade inata do ser humano pré-existente à linguagem. Dessa forma, os
indivíduos podem pensar sem fazer uso dela (GERALDI, 1996). Junto a isso, a
forma de pensar decorre que o pensamento tem uma forma lógica que por sua vez a
linguagem deve tê-la, já que ela se espelha a nível interior do próprio homem.
Também não leva em consideração o interlocutor, pois o que postula é uma relação
entre sujeito pensante e a língua. Além disso, aprender a falar bem e escrever bem
e conhecer a forma da língua significa aprender a exteriorizar bem o pensamento.
Esta concepção de linguagem praticamente não admite a variação
lingüística, já que a esta variação deveriam corresponder “variações” de
pensamento corresponde à forma “correta” do pensamento. Admite que existam
línguas melhores e línguas piores. Esta concepção iluminou os estudos tradicionais
de gramática e que subjaz, ainda de maneira desorganizada às gramáticas
escolares. Ficando muito atenuado o preconceito linguístico, já que todos os homens
teriam a mesma “forma” linguística inata.
Na linguagem como instrumento de comunicação, fruto basicamente do
pensamento estruturalista, a segunda concepção de linguagem vê a língua como um
código (conjunto de signos) que se combinam de acordo com certas regras, que
permite a um emissor a transmissão de uma determinada “mensagem” a um
“receptor”, desde que ambos tenham domínio deste código. Naturalmente, as
possibilidades de comunicação serão maiores à medida que o receptor e emissor
tiverem um maior domínio do código.
A grande ruptura à concepção de linguagem como expressão do pensamento
é observada em Saussure (1969) ao estabelecer a dicotomia Langue/Parole. Em
oposição à Parole, manifestação individual concreta dos falantes, sujeita a
variações, a Langue é conceituada como um sistema de signos, de caráter social,
homogêneo, abstrato internalizado na mente dos falantes.
Essa concepção admite a possibilidade de variação linguística, uma vez que o
critério de avaliação passa a ser a comunicabilidade e não mais a sua adequação a
uma forma de pensamento. Além disso, ela postula que a língua (código) é um
produto social e histórico (portanto, não mais objetivo ou psicológico) ainda que este
produto nunca seja tomado em sua concretude, a partir de seus usos reais, mas sim
a partir de performances individuais, cujas eventuais idiossincrasias ou “falhas” não
interfeririam na estrutura mesma da língua.
Uma vez que o sujeito não interfere na estrutura linguística e que precisa dela
para se comunicar, uma decorrência básica para o ensino é a necessidade do
treinamento do indivíduo no domínio do código. O aprendizado linguístico, neste
caso, dependeria fundamentalmente do desenvolvimento de sua capacidade de
discriminação perceptiva e do volumo de informações a que tiver acesso. Muitos
manuais didáticos atuais de ensino de português trazem implicitamente esta
concepção de língua. Poucos ainda estão preocupados com os processos
psicológicos envolvidos na aprendizagem da escrita ou textos às consequências que
a noção de treinamento que traz ao ensino.
Esta concepção acerta (evolui, se diferencia) ao considerar que a
comunicação é uma das funções essenciais de linguagem, mas equivoca-se ao
considerar todos os aspectos da linguagem neste nível. Com isso, perdem-se os
caracteres subjetivos e interativos constitutivos da linguagem.
Já se o professor obtiver sua prática voltada a segunda concepção de
linguagem (instrumento de comunicação), a concepção de língua é vista como um
código, vale dizer, como um conjunto de signos que se combinam segundo regras, e
que é capaz de transmitir uma mensagem, informações de um emissor a um
receptor. Esse código deve, portanto, ser dominado pelos falantes para que a
comunicação possa ser efetivada como o uso do código que é a língua é um ato
social, envolvendo consequentemente pelo menos duas pessoas, envolvendo
consequentemente pelo menos duas pessoas, é necessário que o código seja
utilizado de maneira semelhante, preestabelecida, convencionada para que a
comunicação se efetive.
Dessa forma, “o sistema linguístico é percebido como um fato objetivo externo
à consciência individual e independente desta. A língua opõe-se ao indivíduo
enquanto norma indestrutível, peremptória, que o indivíduo só pode aceitar como tal”
(NEDER, 1992).
Essa concepção levou ao estudo da língua enquanto código virtual, isolado de
sua utilização na fala (Saussure) ou no seu desempenho (Chomsky). Isso fez com
que a Linguística não considerasse os interlocutores e a situação de uso com
determinantes das unidades das unidades e regras que constituem a língua, isto é,
afastou o indivíduo falante do processo de produção, do que é social e histórico na
língua. Essa é uma visão monológica e imanente da língua, que a estuda segundo
uma perspectiva formalista – que limita esse estudo ao funcionamento interno da
língua – e que a separa do homem no seu contexto social. Essa concepção está
representada pelos estudos linguísticos realizados pelo estruturalismo (a partir de
Saussure) e pela transformalismo (a partir de Chomsky) que adota as ideias de
Frigotto.
Para essa concepção o falante tem em sua mente uma mensagem de
transmitir a um ouvinte, ou seja, informações que quer que cheguem ao outro. Para
isso, ele a coloca em código (codificação) e a remete para o outro através de um
canal (ondas sonoras ou luminosas). O outro recebe os sinais codificados e os
transforma de novo em mensagem (informações). É a decodificação.
A terceira concepção vê a linguagem como forma de interação. O
pressuposto central desta concepção é a impossibilidade de pensar a linguagem
sem considerar a relação do (s) sujeito (s) com a língua e suas condições de uso.
Muito mais do que permitir a transmissão de informações, nas quais os sujeitos
atuariam como máquinas de codificação, a linguaguem é vista como um espaço e
resultado de interação humana. Ao usá-la o sujeito prática ações que não
conseguiria praticar a não ser falando, mais do que isto, ele age sobre o ouvinte,
constitui com este compromisso, muda ou tenta modificar seu comportamento.
Nessa concepção o que o indivíduo faz ao usar a língua não é tão-somente
traduzir e exteriorizar um pensamento, ou transmitir informações a outrem, mas sim
realizar ações, agir, atuar sobre o interlocutor (ouvinte/leitor). A linguagem é, pois em
lugar de interação humana, de interação comunicativa pela produção de efeitos de
sentido entre interlocutores, em uma dada situação de comunicação e em contexto
sócio-histórico e ideológico. Os usuários da língua ou interlocutores interagem
enquanto sujeitos que ocupam lugares sociais e “falam” e “ouvem” desses lugares
de acordo com formações imaginárias (imagens) que a sociedade estabeleceu para
tais lugares sociais, como diz Neder (1992), a verdadeira substância da linguagem
não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas, nem pela
enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico e de sua produção,
mas pelo fenômeno social de interação verbal, realizada pela enunciação ou pelas
enunciações. A interação verbal constitui, assim, a realidade fundamental da
linguagem.
A língua torna-se um espaço de ação, enquanto a linguagem é objetiva e
constitui o espaço em que os sujeitos interagem. Ela é o efeito de interação do
locutor e do receptor produzido através do material de um determinado complexo
sonoro. Tem como característica colocar em evidência o caráter político e ideológico
que implica a eleição de qualquer variedade linguística como aquela que deve ser
ensinada. Torna claro que a aprendizagem de uma língua (ou de uma variedade
linguística) não se dá por treinamento, mas pelo seu uso real em situações
interlocutivas variadas, nas quais os falantes e ouvintes são muito mais do que
emissores e receptores de mensagens.
Por fim, coloca o professor e o aluno frente a frente, não como oponentes,
mas como participantes do jogo interlocutivo, o que significa que são sujeitos
construindo um conhecimento, isto é, conceber a linguagem como forma de
interação significa entendê-la como um trabalho coletivo.
No ensino, A terceira concepção de linguagem implicará em uma postura
educacional diferenciada, uma vez que situa a linguagem como lugar de constituição
das relações sociais, onde os falantes se tornam sujeitos. A língua só tem existência
no jogo que se joga na sociedade, na interlocução. E é no interior de seu
funcionamento que se pode procurar estabelecer regras de tal jogo.
Estudar a língua é, então, tentar detectar os compromissos que se criam por
meio da fala e das condições que devem ser preenchidas por um falante para falar
de certa forma em determinada situação concreta de interação. Nessa perspectiva é
muito mais importante estudar as relações que se constituem entre os sujeitos no
momento em que falam do que simplesmente esclarecer classificações e denominar
tipos de sentenças.
Dessa forma, o diálogo em sentido amplo é que caracteriza a linguagem.
Essa concepção é representada por todas as correntes de estudo da língua que
podem ser reunidas sob o rótulo de linguística da enunciação. Aqui estariam
incluídas as correntes e teorias tais como a Linguística Textual, Teoria do Discurso,
Analise do Discurso. Análise da Conversação, Semântica Argumentativa e todos os
estudos de alguma forma ligados à Pragmática.
A terceira concepção de linguagem é uma possibilidade possível de
embasamento para o ensino de língua materna, no entanto conhecer as três
concepções de linguagem é tarefa fundamental. Travaglia (1996) observa que as
concepções de linguagem, de leitura e de gramática adotadas por muitos
professores continuam fundamentadas em um método tradicional de ensino de
Língua Portuguesa. Assim, o professor não cede espaço à atividade de reflexão do
aluno em decorrência da ênfase dada ao método tradicional de compreensão e
estudo gramatical de textos. Segundo Travaglia (1996), esse desempenho pode ser
explicado, entre outros aspectos, pelas concepções de língua/linguagem, leitura e
gramática adotadas por muitos professores, as quais continuam fundamentadas em
métodos tradicionais de ensino de língua portuguesa. Dessa forma, não cede
espaço à atividade de reflexão aos alunos.

CONCEPÇÃO DE LÍNGUA E LINGUAGEM PARA O ENSINO DE LÍNGUA


PORTUGUESA ESCRITA PARA SURDOS

O trabalho escolar com os gêneros textuais é uma extraordinária


oportunidade de se lidar com a língua em seus mais diversos usos. Nenhum fazer
linguístico está fora de algum gênero, pois todo discurso se manifesta por meio de
diferentes gêneros textuais: “eventos linguísticos que se caracterizam muito mais por
suas funções comunicativas do que por suas peculiaridades linguísticas e
estruturais” (MARCUSCHI, 2002, p.55).
Essa maneira perceber e trabalhar com a língua vai ao encontro da
necessidade que as línguas naturais apresentam, em destaque, das línguas de
sinais. Assim como toda língua natural, elas surgiram da interação entre pessoas e
atendem às necessidades e desejos da comunidade de surdos. Partindo dessa
premissa, gêneros textuais se apresentam como um dos recursos de ensino
aprendizagem mais eficaz para o ensino da língua portuguesa escrita para os surdos
e para promover a reflexão sobre o funcionamento da língua brasileira de sinais
(CEZAR, 2015).
Criar eventos, propostas, sequências didáticas, adequação de materiais de
ensino a partir da relação efetiva da comunicação entre a língua brasileira de sinais
(Libras) e a língua portuguesa escrita pode minimizar a artificialidade da escrita em
contextos escolares.
No que tange as principais dificuldades conceituais e práticas sobre escrita
relatadas pelos professores e alunos surdos na eficácia do uso dos gêneros textuais
no ensino de reflexão sobre a língua brasileira de sinais utilizo os resultados de
minha pesquisa de pós-doutoramento (CEZAR, 2015).
Esses resultados foram relacionados com os pressupostos teóricos atuais
sobre o bilinguismo, com a finalidade de trazer uma discussão em que se relacione a
formação de professores de surdos a partir de uma perspectiva interdisciplinar
pautada em uma pedagogia culturalmente sensível e na visão ampliada de
educação linguística para além das línguas, tendo como processo norteador, a
educação bilíngue (MAHER, 2007; LADSON-BILLINGS; 1990), bem como os
resultados das pesquisas anteriores de Silva; Pires-Santos (2012; 2008). Essa forma
de abordar a língua e seus aspectos linguísticos para os surdos demonstra ir para
além das concepções de língua e de linguagem postas no sistema educacional
brasileiro.

SAIBA MAIS
http://wwws.fclar.unesp.br/agenda-pos/linguistica_lingua_portuguesa/3077.pdf
ATIVIDADE DE AUTOESTUDO

1. Aponte as principais características da primeira concepção de linguagem.

2. Aponte as principais características da segunda concepção de linguagem.

3. Aponte as principais características da terceira concepção de linguagem.

4. Aponte as principais dificuldades que os alunos surdos e os alunos ouvintes


apresentam quanto a língua portuguesa escrita.
AULA 3: ASPECTOS LINGUÍSTICOS: FONOLOGIA DA LIBRAS

OBJETIVOS
 Descrever os aspectos fonéticos-fonológicos da Libras.
 Compreender a estrutura e funcionamento na execução dos sinais.

PALAVRAS INCIAIS

A fonética e a fonologia das línguas de sinais são áreas da linguística que tem
objeto de estudo as unidades mínimas dos sinais que não apresentam significado
isoladamente. Por terem o mesmo objeto de estudo são disciplinas correlacionadas,
no entanto o mesmo objeto é analisado de forma diferente.
Na fonética, a principal preocupação é DESCREVER as unidades mínimas
dos sinais. Descreve as propriedades físicas, articulatórias e perceptivas de
configuração e orientação de mão, movimento, locação, expressão corporal e facial.
É a área que investiga o aspecto material das unidades mínimas das línguas
de sinais, por exemplo, descrever a seleção dos dedos (número de dedos
selecionados), a configuração dos dedos (mão aberta ou fechada, dedos flexionados
ou estendidos, contato e abertura entre os dedos). As bases visuais relacionadas
com a percepção e as bases fisiológicas relacionadas com a produção.
Estuda as unidades mínimas dos sinais independem da função que eles
possam desempenhar em uma língua determinada. As unidades básicas da fonética
são descritas entre colchetes [ ].
A fonologia é um ramo da linguística que objetiva identificar a estrutura e a
organização dos constituintes fonológicos, propondo modelos descritivos e a
explanatórios. 1) determinar quais são as unidades mínimas que formam os sinais 2)
estabelecer quais são os padrões possíveis de combinação entre essas unidades e
variações possíveis no ambiente fonológico (QUADROS, 2005).
Estuda as diferenças percebidas e produzidas relacionadas com as
diferenças de significado: OPOSIÇÃO: QUANTO À CONFIGURAÇÃO DE MÃO:
FAMÍLIA E REUNIÃO; QUANTO AO MOVIMENTO: TRABALHAR E VÍDEO;
QUANTO À LOCAÇÃO: SÁBADO E APRENDER.
Estuda a CONFIGURAÇÃO DE MÃO, LOCAÇÃO, MOVIMENTO,
EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS E ORIENTAÇÃO DE MÃO segundo a função que
eles cumprem em uma língua específica, as unidades relacionadas às diferenças de
significado e a sua inter-relação significativa para formar sílabas, morfemas e sinais.
As unidades mínimas da fonologia são os fonemas que, por convenção, são
representados entre barras inclinadas //. Cada língua apresenta um número
determinado de unidades mínimas cuja função é determinar a diferença de
significado de um sinal em relação ao outro sinal.

Unidades Mínimas: fonemas e os sinais.

Os fonemas:
 /a/ /ê/ /i/ /ô/ /u/ /ã/ /e/ /i/ /o/ /u/ /é/ /ó/
 /p/ /b/ /m/ /f/ /v/ /t/ /d/ /n/ /nh/ /l/ /lh/ /r/ /rr/ /z/ /s/ /j/ /x/ /g/ /q/

DESCRIÇÃO:

SOM [b]: é articulado com uma corrente de ar pulmonar, egressiva, com


vibração das cordas vocais, com uma obstrução do fluxo de ar seguida de uma
explosão. (MASSINI-CAGLIARI; CAGLIARI, 2002, p. 105.)

SINAIS:
DESCRIÇÃO:

(CAPOVILLA & RAPHAEL, 2001, p. 806.)


ASPECTOS FONOLÓGICOS DA LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS

Como as línguas orais, também as de sinais contam com um conjunto de


regras que responde pela formação dos sinais.
Para entender melhor, vamos pensar na língua portuguesa oral. Na formação
de uma palavra, eu devo combinar consoantes e vogais. No entanto, há regras de
combinação. Por exemplo, se eu tenho uma consoante, o segundo elemento da
palavra pode ser uma vogal ou outra consoante. Neste caso, só poderá ser a
consoante /r/ ou /l/. Se eu escolher uma consoante, o terceiro elemento será
obrigatoriamente uma vogal, já que na língua portuguesa não há possibilidade de
três consoantes juntas.
Os sinais, na Língua Brasileira de Sinais - Libras, são formados a partir da
combinação do movimento das mãos com um determinado formato em um lugar
específico, podendo este ser uma parte do corpo ou um espaço em frente ao corpo
(FELIPE, 2001).
Em outras palavras, na formação dos sinais da LIBRAS, os seguintes
parâmetros são considerados: Configuração das mãos, localização, movimento,
orientação das palmas das mãos, traços não-manuais.

PARÂMETROS PARA FORMAÇÃO DOS SINAIS

CONFIGURAÇÃO DE MÃOS: refere-se à forma que assumem as mãos na


produção dos sinais.
FAMÍLIA
LOCALIZAÇÃO: é o lugar, no corpo ou no espaço, em que o sinal é articulado.

(FERREIRA BRITO, 1990, p. 33)

MOVIMENTO: envolve os movimentos que as mãos fazem na produção dos


sinais.
ORIENTAÇÃO DAS PALMAS DAS MÃOS – é a direção para a qual a palma da
mão aponta na produção do sinal.

• PARA CIMA
• PARA BAIXO
• PARA O
CORPO
• PARA FRENTE
• PARA
ESQUERDA
• PARA DIREITA

(QUADROS, KARNOPP, 2004, p.59)

TRAÇOS NÃO-MANUAIS – envolve expressão facial, movimento corporal e


olhar.

MEDO
RESTRIÇÕES FONOLÓGICAS NA PRODUÇÃO DE SINAIS COM AS DUAS
MÃOS

Na produção de sinais com as duas mãos, se operam:

 condição de simetria:
FAMÍLIA, TRABALHAR, BRINCAR

 condição de dominância:
ÁRVORE, CURSO
SAIBA MAIS
http://revistas.iel.unicamp.br/index.php/seta/article/viewFile/1934/1507

ATIVIDADES DE AUTOESTUDO

 Descreva qual é o objetivo dos estudos da fonética e da fonologia das línguas


de sinais.

 Qual é a unidade mínima de significado das línguas sinalizadas.

 Exemplifique com dois conjuntos o par mínimo das libras.

 Apresente um exemplo de sinal sem movimento.


Aula 4: ASPECTOS LINGUÍSTICOS: MORFOLOGIA DA LIBRAS

OBJETIVOS
 Descrever os aspectos morfológicos da Libras.
 Compreender a estrutura e funcionamento da morfologia na execução dos
sinais.

PALAVRAS INICIAIS

A Morfologia é o estudo da estrutura interna das palavras ou dos sinais, e


dos processos de formação de novas palavras e sinais. Tem como objeto de estudo
a unidade mínima de significado, o morfema. Os sinais pertencem a categorias
lexicais ou a classe de palavras. As línguas de sinais têm um léxico e um sistema de
criação de novos sinais em que as unidades mínimas com significados (morfemas)
são combinadas.
Nas línguas de sinais os processos combinatórios (palavras complexas)
resultam frequentemente de processos não-concatenativos em que a raiz é
enriquecida com vários movimentos e contornos no espaço de sinalização (KLIMA,
BELLUGI, 1979). Nas línguas de sinais, as configurações de mãos juntamente
com as localizações em que os sinais são produzidos, os movimentos e as direções
são as unidades menores que formam as palavras.
A morfologia e, especialmente, a sintaxe dessa língua parecem também ser
organizadas nesse espaço. Portanto, a formação das palavras e das frases na
língua brasileira de sinais apresentam restrições espaciais.
A morfologia e a sintaxe das línguas de sinais determinam a estrutura interna
das palavras e das frases que reflete o sistema computacional da linguagem. Os
sinais manuais são frequentemente acompanhados por expressões faciais que
podem ser consideradas gramaticais.

SISTEMA MORFOLÓGICO

Como a língua portuguesa, a Libras conta com um léxico e com recursos que
permitem a criação de novos sinais. Diferentemente das línguas orais, em que
palavras complexas são, muitas vezes, formadas pela adição de um prefixo ou
sufixo a uma raiz, nas línguas de sinais, frequentemente a raiz é enriquecida com
vários movimentos e contornos no espaço de sinalização (Klima e Bellugi, 1979). O
sistema morfológico, na Língua Brasileira de Sinais, estuda a criação de sinais, as
categorias gramaticais e as flexões.

CRIAÇÃO DE SINAIS

Derivação de nomes de verbos e vice-versa por meio de mudança no


movimento – mais curto e repetido nos substantivos.

Exs CADEIRA – SENTAR; OUVIR – OUVINTE; PENTEAR– PENTE.

Composição de dois sinais:


ESCOLA (CASA + ESTUDAR), ALUNO (ESTUDAR + ALTURA DO ALUNO).

Incorporação de argumento:
LAVAR O CABELO; LAVAR PRATO E LAVAR ROUPA.

Incorporação de numeral:
DIAS, HORAS
Incorporação da negação:

CONHECER- NÃO CONHECER; ENTENDER- NÃO ENTENDER.


QUERER – NÃO QUERER; SABER-NÃO SABER. TER-NÃO TER

CATEGORIAS GRAMATICAIS
Verbos – dividem-se em três classes:

Verbos simples – são verbos que não se flexionam em pessoa e número e não
incorporam afixos locativos.
CONHECER, APRENDER, GOSTAR
Verbos direcionais (com concordância) – são verbos que se flexionam em
pessoa, número e aspecto, mas não incorporam afixos locativos.
DAR, PERGUNTAR, OLHAR

Verbos espaciais – são verbos que têm afixos locativos.


IR, CHEGAR, POR.

PRONOMES
Os pronomes são expressos por meio dos sinais de apontar com o dedo
indicador. Quando o enunciador (pessoa que fala) aponta para si (olhando para o
receptor), esse sinal é interpretado como “EU”.
O apontar para o interlocutor (olhando para o receptor) é interpretado como
“TU” ou “VOCÊ”.
O apontar para uma outra pessoa que não está na conversa, olhando para o
receptor ou para um local estabelecido no espaço, é interpretado como “ELE”,
“ELA”.

CLASSIFICADORES
Os classificadores são formas que, substituindo o nome que as precedem,
podem vir junto com o verbo para classificar o sujeito ou o objeto que está ligado à
ação do verbo (Felipe, 2001).
Morgan (2005) refere que, nas narrativas, um classificador é, muitas vezes,
usado para manter a referência a objeto ou personagem previamente mencionado
por meio de um sinal.
Em relação às formas dos classificadores, Ferreira-Brito (1995) refere que a
configuração de mão em V pode ser usada para se referir a pessoas, animais ou
objetos; em C, para qualquer tipo de objeto cilíndrico, e em B, para superfícies
planas, por exemplo.

FLEXÕES VERBAL E NOMINAL NA LIBRAS

Flexão verbal
A flexão de número nos verbos refere-se à distinção para um, dois, três ou
mais referentes. Assim, o verbo que apresenta concordância direciona-se para um,
dois ou três pontos estabelecidos no espaço ou para uma referência generalizada
incluindo todos os referentes integrantes do discurso (Quadros e Karnopp, 2004).
A flexão de aspecto está relacionada com as formas e a duração dos
movimentos.
Os aspectos pontual, continuativo, durativo e iterativo são obtidos por meio de
alterações do movimento e/ou da configuração da mão (Ferreira-Brito, 1995).
A Libras apresenta, ainda, em suas formas verbais, a marca de tempo de
forma diferente de como acontece na língua portuguesa. O tempo é marcado por
meio de advérbios de tempo que indicam se a ação está ocorrendo no presente
(hoje, agora), se ocorreu no passado (ontem, anteontem), ou se ocorrerá no futuro
(amanhã, semana que vem). Para um tempo verbal indefinido, usam-se os sinais
passado e futuro (Felipe, 2001). Para expressar a ideia de passado, o sinal de já,
antecedendo o verbo, ou o meneio afirmativo com a cabeça, concomitante à
realização do sinal, é muito utilizado.

FLEXÃO NOMINAL

Diferentemente da língua portuguesa na modalidade oral, que apresenta


flexão de gênero modificando os nomes, na Libras a indicação de sexo é marcada
por um sinal que indica marca de gênero feminino ou masculino, antecedendo o
nome.
Nos substantivos, a flexão de plural é obtida, na maior parte das vezes, pela
repetição do sinal, pela anteposição ou posposição de sinais referentes aos
números, ou pelo movimento semicircular, que deverá abranger as pessoas ou os
objetos envolvidos (Brito, 1995).
SAIBA MAIS

ATIVIDADES DE AUTOESTUDO

 Descreva qual é o objetivo dos estudos da MORFOLOGIA das línguas de


sinais.

 Qual processo de combinação de sinais que você mais achou interessante.


Dê um exemplo e o explique.

 Exemplifique com dois conjuntos morfológicos a criação de um sinal.

 Apresente um exemplo de sinal com flexão nominal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Infelizmente chegamos ao fim de uma discussão maravilhosa. Trabalhar com


os aspectos linguísticos da Libras sempre nos traz muitos conhecimentos novos e
desafiadores.
As temáticas aqui apresentadas nos auxiliam ater uma criticidade sobre os
fatores linguísticos sobre as línguas sinalizadas, e nos faz refletir sobre os principais
mitos que envolvem uma língua que tem um outro processo que não é o prototípico
das línguas orais – línguas dominantes.
Iniciamos brevemente sobre como se deu o estatuto linguístico das línguas
sinalizadas no mundo e assim as línguas de sinais de cada país começaram a
ganhar espaços jamais alcançados. A partir de leis e decretos, no caso do Brasil a
Lei 10436 3 o Decreto no. 5626 são duas conquistas que faz com que a libras vai
para além do reconhecimento da língua quanto aspecto linguístico, mas também
leva-se em conta a cultura e a historicidade. Dessa forma, o processo ensino-
aprendizagem da língua portuguesa como L2 torna-se um tema de extrema
relevância e compreensão para os equívocos linguísticos apresentados nas
produções formais escolares, nas quais muitas vezes os professores que vão fazer a
correção desconhecem dos fatores estruturais (linguísticos) que envolvem as duas
línguas – língua portuguesa oral (língua oral-auditiva) e a libras como língua visual
espacial.
O aprendiz surdo tem o direto garantido para que suas produções formais
escritas venham a ser consideradas e avaliadas na língua 2. Isso implica que os
professores formadores terão de ter conhecimento sobre os aspectos que envolvem
as duas línguas para que a avaliação venha ser mais próxima da realidade histórica
e social do aprendiz surdo. Nesse sentido, que o decreto no. 5626 acaba por ser
colocado em questão, já que os professores (licenciaturas) têm recebido em seu
processo de formação conhecimento sobre à libras. A partir das colocações
apresentadas, o presente módulo: LINGUÍSTICA E A LÍNGUA BRASILEIRA DE
SINAIS teve como foco despertar as principais questões de descrição linguística que
envolve as línguas de sinais, em especial, a Libras com o objetivo maior de leva-los
a uma criticidade sobre os fatores linguísticos e educacionais das duas línguas em
que os alunos surdos se deparam o tempo todo.
Espero que a disciplina tenha despertado um interesse a todos. Obrigada!!!!
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