Você está na página 1de 5

O Segredo do Controle

Rodrigo Lang

Quem me conhece sabe que sou fã de automobilismo. Desde pequeno sou


viciado em velocidade e já percorri o mundo competindo, de forma amadora,
corridas com carros Fórmula 3000.

Os anos de velocidade me trouxeram diversos aprendizados, como o foco e a


disciplina, e me renderam também alguns ídolos – que me inspiram e fazem
querer me tornar melhor a cada dia.

O maior ídolo que tenho em minha vida é um personagem muito conhecido de


nós brasileiros: Ayrton Senna. Sem dúvidas, ele está presente mais do que
ninguém nas minhas referências profissionais. Um segundo atleta, automobilista,
que muito me inspira é Mario Andretti.

Para quem não conhece, Mario é um ex-piloto italiano, naturalizado norte-


americano. É considerado uma das maiores lendas do automobilismo nos EUA,
e um dos poucos pilotos americanos a obter sucesso também no exterior: foi
campeão mundial de Fórmula 1 em 1978, se tornando o único norte-americano
a se sagrar campeão na categoria. Além disso, ele é um dos dois pilotos no
mundo que conseguiram ganhar corridas na Fórmula 1, Fórmula Indy, World
Sportscar Championship e Nascar. Isso torna Andretti uma lenda.

Mas por que estou falando tanto deste piloto?

Existe uma citação dele que passei anos refletindo sobre e que gostaria de dividir
com vocês. Vamos analisá-la um pouco?

“Se você está no controle, você não está indo rápido o suficiente ..."

Gosto de pessoas com personalidade forte. Admiro e reconheço nisso um valor,


mas não posso deixar de destacar que, após anos com essa frase na cabeça,
BBI of Chicago
www.bbiofchicago.com
concluí uma coisa: é uma bela frase de impacto, mas também é uma das frases
mais hipócritas que já pude ouvir. Ser um profissional de alto impacto exige
controle. Controle minucioso de todos os detalhes. Exige densidade de leitura
sobre fatos, dados e cenários.

Quando desenhamos, no BBI of Chicago, a nossa própria metodologia de


negociação à luz das maiores escolas de Negociação do Mundo, tínhamos a
certeza, oriunda de anos de experiência em consultoria, de que seu sucesso em
influenciar pessoas e ser bem-sucedido em negociações depende de três pilares
fundamentais:

a) Seu conhecimento profundo em técnicas de influência e negociação;

b) Sua capacidade de leitura do processo de negociação;


c) Seu track record como negociador.

O ponto “a” é o mais fácil de ser trabalhado. Meus anos de experiência em


educação mostram que, com poucas horas de capacitação, podemos transferir
as principais ferramentas do mundo na arte de negociação até para alguém com
pouca experiência no processo. Pensando nisto, estruturamos o treinamento que
vem sendo considerado, por dezenas de empresas onde foi aplicado, referência
em negociação na América Latina. Porém, as horas exaustivas de conteúdo e
simulações, mesmo profundas, não conseguem desenvolver o ponto “b” e “c”,
que são fundamentais para que você se torne um excelente negociador.

Como então proceder?

Para esta discussão, vou recorrer a Daniel Kahneman, teórico israelense de


economia comportamental e primeiro psicólogo a ganhar o Nobel da Economia.
Este grande pesquisador, que tanto admiro e que me inspirou a estudar a fundo
competências comportamentais, foi pioneiro em combinar economia com a
ciência cognitiva para explicar o comportamento aparentemente irracional da
gestão do risco pelos seres humanos.

BBI of Chicago
www.bbiofchicago.com
Kahneman é autor de um dos livros mais fantásticos que li nos últimos tempos,
que se chama “Rápido e Devagar - Duas Formas de Pensar”. Nele, o ganhador
do Nobel demonstra as duas formas de se pensar do ser humano: o sistema
rápido (intuitivo) e o sistema devagar (racional).

Algumas características importantes que Daniel Kahneman destaca em seu livro:

• Todo ser humano possui os dois sistemas no seu cérebro: o rápido e o


devagar;
• Ambos podem rodar em paralelo;
• Entretanto, você nunca pode rodar mais de uma atividade em cada
sistema;

Estes três pontos nos fornecem a base para uma grande e rica discussão que
quero iniciar com vocês. Primeiramente, entretanto, vamos entender melhor o
que é cada um dos sistemas com um exemplo simples: dirigir um carro.

Provavelmente você já teve a experiência de dirigir um veículo ou conhece


alguém que já viveu essa experiência. Vamos tomar como exemplo a primeira
vez que você fez o caminho da sua casa até o seu trabalho. Provavelmente foi
um processo altamente racional: você colocou o caminho no GPS e seguiu
atentamente a todas instruções até chegar ao seu destino, evitando multas e
contratempos. Certo? Posso apostar com você, todavia, que agora você não
utiliza mais o GPS ao ir para o trabalho, e até me arriscaria a dizer: em algum
dia de folga, um sábado por exemplo, você já se pegou fazendo
automaticamente o caminho de casa para o trabalho, mesmo sem querer.

O que aconteceu aqui? O processo de ir de casa para o trabalho, que antes era
um processo racional, agora é um processo intuitivo. Ou seja, seu cérebro
utilizava o sistema devagar e agora utiliza o sistema rápido. E isso faz você dirigir
melhor até o trabalho, pois você consegue liberar o sistema devagar para
processar as decisões novas que chegam a você durante o trajeto como, por
exemplo, aquele caminhão que freou de forma inesperada na sua frente.

BBI of Chicago
www.bbiofchicago.com
Por que eu estou dividindo isso com vocês? Para mostrar que toda atividade é
passível de migração do sistema devagar para o sistema rápido. E, se queremos
ser experts em um processo, temos que fazer essa conversão.

Volto ao exemplo do automobilismo. Um piloto deve ter todas as suas técnicas


de pilotagem armazenadas e rodando no sistema rápido. As decisões não
podem ser pensadas de forma consciente e o sistema devagar deve estar
disponível para variáveis novas que aparecem durante a corrida. Se o piloto
pensasse de forma consciente em cada decisão a ser tomada, ele seria
significativamente mais lento e improdutivo.

E como eu converto um processo do sistema devagar para o sistema rápido?


Treino. Horas de treino e prática. E isso me leva ao meu maior ídolo.

Para quem não sabe, Ayrton Senna era considerado imbatível em dias de chuva.
E qual a razão dele performar a um nível absurdamente superior aos outros
pilotos quando chovia? Senna era viciado em treinos. E mais: ele tinha um
segredo. Senna solicitava aos seus auxiliares para o acordar caso chovesse
durante a noite. Isso com uma única finalidade: treinar. Ele sabia que treinar na
chuva era um evento raro e, com isso, somente ele, entre os pilotos de sua
geração (lembrando que na época não existiam simuladores), acumulou horas
de treino em chuva para poder pilotar em pista molhada usando o sistema rápido.

E como podemos usar esse conhecimento para negociação?

Se queremos ser negociadores de alto impacto, temos que converter todas as


técnicas de negociação que aprendemos para o sistema rápido, tornando quase
intuitivo o processo de negociar e, assim, liberando o sistema devagar para as
novas informações e conteúdos que irão surgindo durante a negociação. E como
podemos fazer isso? Com treino. Por isso, minha dica é: se quiser ser o melhor
negociador que você pode se tornar, não fuja jamais de um conflito que possa
ser resolvido com negociação. Somente assim você vai desenvolver os itens “b”

BBI of Chicago
www.bbiofchicago.com
e “c” que listamos acima.

Negociar por Princípios e com técnica não é algo intuitivo, mas temos que tornar.
Ao contrário do que Mário Andretti falou, é possível estar no controle e ser o mais
rápido possível.

Desse modo, termino esse artigo citando o maior de todos os tempos. Mário que
me desculpe, mas quando se fala de alta performance, Senna sempre estará
com razão:

"Você treina o corpo para fazer o que você quer e não o que ele quer. E você
treina a mente para a mesma coisa".

Rodrigo Lang, sócio-fundador do BBI of Chicago.


Foi fundador de um dos maiores grupos de educação do Brasil no início dos anos
2000. Com vasta experiência em consultoria em mais de 30 países, Lang
desenvolveu uma dasmetodologias consideradas referência no mundo da
negociação

BBI of Chicago
www.bbiofchicago.com

Você também pode gostar