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A Grande Mentira - Expondo As Ra - Dinesh D'Souza
A Grande Mentira - Expondo As Ra - Dinesh D'Souza
1a edição 2019
ISBN: 978-85-85034-13-9
***
___________
C999g D´Souza, Dinash 1961 -
A grande mentira: expondo as raízes nazistas da esquerda /
Dinash D´Souza ; [tradução: Elmer Pires]. - São Paulo: Trinitas,
2019.
Tradução de: The big lie: exposing the Nazi roots of the American
Left.
Bibliografia: p. 263-[296]
ISBN 9788585034139 (ebook)
Reductio Ad Hitlerum
Os temas nazismo e fascismo devem ser abordados com o maior
cuidado, não só por envolverem sofrimento e perda de um grande
número de vidas, mas também porque os termos em si têm sofrido
abusos e sido deturpados sôfrega e promiscuamente em nossa
cultura. Não posso melhor ilustrar essa realidade do que com a
reação de várias personagens de Hollywood perante a eleição e
posse de Trump.
“Eu sinto Hitler andando pelas ruas”, disse a atriz Ashley Judd. O
cantor John Legend afirmou que a retórica “nível Hitler” de Trump
poderia transformar a América na Alemanha nazista. De acordo com
um tuíte feito por RuPaul, em 8 de novembro de 2016, “a América
ganhou uma gigante suástica tatuada na testa”. A atriz Meryl Streep
disse que sua crítica a Trump produziu uma resposta “aterrorizante”.
“Isso prepara você para todo tipo de ataques e exércitos dos
camisas pardas [...] e você só pode fazer isso se você sente que
deve fazer [...] Você não tem muita opção”.6
Essa é Streep fazendo sua melhor cópia de Dietrich Bonhoeffer.
No entanto, exatamente de que forma esses tais de camisas pardas
a estavam atacando? Acontece que esses ataques foram feitos no
Twitter e em outras mídias sociais. Ninguém a espancou de
verdade. Os verdadeiros camisas pardas já o teriam feito. Da
mesma forma, RuPaul bem provavelmente sabe que, na Alemanha
nazista, um drag queen como ele teria sido enviado para algum
campo de concentração e morto por eutanásia. Se ele realmente
acreditasse que a América havia se transformado na Alemanha
nazista, o que se esperaria senão sua saída imediata do país? De
alguma forma, RuPaul sabe, assim como todos nós sabemos, que
ele está perfeitamente seguro aqui.
Alguns conservadores permanecem tranquilos enquanto a
esquerda rotula Trump de fascista. O historiador Victor Davis
Hanson recorda, perplexo, que Ronald Reagan e George W. Bush
foram ambos, em algum dado momento, ligados pela esquerda a
Hitler. Daniel Greenfield devolveu a analogia de Hitler para
Goldwater e Nixon em seu artigo na FrontPage Magazine intitulado
“Todo Presidenciável Republicano é Hitler”. Um outro livro meu, The
End of Racism [O Fim do Racismo], perturbou tanto David
Nicholson, do The Washington Post, que ele chegou a ouvir “o
pesado marchar de coturnos, embora taciturnos e distantes, ainda
se aproximando constantemente”.7 Esses exemplos confirmam o
ponto de Hanson, de que comparar uma coisa aos nazistas
geralmente não significa nada a não ser representar aquilo que a
esquerda desaprova vigorosamente.
Estudiosos têm se queixado de que termos como ‘nazista’ e
‘fascista’ praticamente perderam significado na cultura popular. Há
muitos anos, o filósofo Leo Strauss, ele próprio refugiado da
Alemanha nazista, lamentou por aquilo que chamou de Reductio ad
Hitlerum, com isso pretendendo expressar a tendência de querer
refutar aquilo que desaprova associando-o a Hitler. O raciocínio é o
seguinte: Hitler não gostava de arte moderna, então a crítica à arte
moderna é um mal reminiscente dos nazistas. Hitler detestava o
comunismo, portanto os anticomunistas continuam seguindo o
método de Hitler. Tudo isso, lembrou Strauss, não passa de pura
tolice.
Na Califórnia, onde a pura tolice abunda, ouve-se falar da “dieta
nazi”, do “saudável nazi” e dos “surfistas nazi”. Nesses casos, o
nazismo parece tomar uma acepção positiva, indicando
compromisso rigoroso. O historiador Anthony James Gregor, um dos
principais estudioso do fascismo italiano, diz que o fascismo é
comumente atribuído a pessoas declaradamente cristãs, pessoas
que buscam por tributações menores, que se opõem a
regulamentações governamentais abusivas, que se mostram céticas
quanto ao aquecimento global e que parecem indiferentes ao
destino das espécies ameaçadas de extinção. “Infelizmente”, ele
escreve, “o termo fascismo foi dilatado a ponto de seu uso cognitivo
tornar-se mais do que suspeito”.8
Mas a acusação de fascismo e nazismo contra Trump e os
republicanos não pode ser tão facilmente descartada. Na verdade,
ela não está na mesma categoria que o emprego metafórico, os
tropos desdenhosos comparando Reagan a Hitler ou Bush a Hitler.
Em primeiro lugar, a acusação contemporânea está bem mais
generalizada. Tanto antes quanto depois das eleições, a analogia
nazista não foi apenas um escárnio, mas também foi empregada
como descrição. A analogia é, agora, a estrutura central da
cobertura sobre Trump dada pela mídia, pela academia e por outros
meios, da imigração à política externa e ao comércio, tudo está
agrupado sob essa mesma bandeira.
Para o escritor Chris Hedges, a presidência de Trump é “o ensaio
geral para o fascismo”, significando, provavelmente, que o fascismo,
ainda embora não esteja presente, está prestes a se apresentar. Na
mesma linha, Ben Cohen viu em Trump “os primeiros passos de um
Estado fascista”. Deepak Malhotra insiste na revista Fortune que
Trump representa “o espectro do fascismo domiciliar”. Andrew
Sullivan advertiu na revista The New Republic que Trump “destruiu o
Partido Republicano e criou, em seu lugar, o que parece ser um
partido neofascista”. Aaron Weinberg, do HuffPost, diagnosticou o
“engatinhar vagaroso do fascismo de Hitler”. Escrevendo para o
Salon, o historiador Fedja Buric procurou criticar mudando um pouco
o tom, insistindo que “Trump não é Hitler; Trump é Mussolini”. A
âncora da MSNBC, Rachel Maddow, revelou que “eu tenho lido
muito sobre como era na época quando Hitler se tornou chanceler
[...] porque acho possível ser onde estamos agora”. O jurista Juan
Cole exclamou o resultado das eleições com a seguinte frase:
“Como os EUA se tornaram fascistas”. Ken Burns, cineasta e
produtor de documentários, denominou Trump como “fascístico” e
“hitleresco”. A reação mais exagerada veio de Sunsara Taylor,
ativista de um grupo chamado Refuse Fascism [Rejeite o Fascismo];
ela apareceu no programa de Tucker Carlson para comentar sobre
Trump, dizendo que “ele é mais perigoso do que Hitler jamais teria
sido”.9
Como segundo ponto, a acusação de fascismo e nazismo é
endossada pelos principais personagens do Partido Democrata. O
candidato à presidência Martin O’Malley, um democrata, acusou
Trump de carregar um “apelo fascista bem para dentro da Casa
Branca”. Fazendo menção a Trump, Bernie Sanders invocou
parentes que morreram no Holocausto como resultado de “um
lunático [...] despertando o ódio racial”. Invocando a memória
sombria dos “piores déspotas da História”, a senadora Elizabeth
Warren insistiu que Trump representa uma “séria ameaça”.10 Ainda
que Obama e Hillary não tenham jogado a cartada fascista ou
nazista, ambos não se afastaram dela nem a repudiaram, assim
como nenhuma outra autoridade do Partido Democrata. Afinal, como
eles poderiam rejeitá-la? Este é, agora, o lema da oposição por
parte da esquerda democrata contra Trump.
Em terceiro lugar, alguns líderes estrangeiros parecem já ter
aceitado que Trump seja fascista, talvez até nazista. Na Grã-
Bretanha, o político do Partido Trabalhista Dennis Skinner advertiu
que, se permanecesse em aliança com a América na sequência das
eleições de Trump, seu país estaria caminhando “de mãos dadas”
com um fascista. No Canadá, o líder do Novo Partido Democrata,
Tom Mulcair, usou o rótulo fascista para descrever a proibição
temporária de viagens promulgada por Trump. Dois ex-presidentes
mexicanos, Enrique Calderon e Vicente Fox, compararam Trump a
Hitler, e Fox declarou que o discurso de Trump durante a convenção
republicana fez com que ele se lembrasse de “Hitler discursando ao
Partido Nazista”. Esses comentários dão confirmação internacional
ao que a esquerda americana diz aqui; e alguns deles poderiam até
mesmo causar implicações para as relações diplomáticas dos
Estados Unidos.11
Em quarto lugar, alguns dos principais republicanos e
conservadores ecoaram a acusação da esquerda. Durante um
evento filantrópico, o ex-candidato do Partido Republicano ao cargo
de governador, Meg Whitman, comparou Trump a Hitler e a
Mussolini. A ex-governadora republicana de Nova Jersey, Christine
Todd Whitman, disse o seguinte acerca das máximas da campanha
de Trump: “Esse é o tipo de retórica que permitiu Hitler avançar”.
Escrevendo para o jornal New York Times, Ross Douthat, uma vez
colunista conservador, concluiu que Trump é um “protofascista”.
Robert Kagan, historiador neoconservador, não se deu nenhuma
reserva. “É assim que o fascismo vem para a América”. Após as
eleições, o senador John McCain, candidato à presidência do
Partido Republicano em 2008, disse, a respeito da crítica de Trump
à mídia, que foi dessa forma que os ditadores do século XX
surgiram.12 Trata-se de um padrão sem precedentes. Quando
várias pessoas do seu próprio partido dizem que você é um fascista,
isso faz com que você realmente pareça um fascista.
A esquerda mobiliza uma pilha de especialistas em apoio à
equação de que Trump e o GOP estão ao lado do fascismo e do
nazismo. A revista Slate entrevistou Robert Paxton, importante
historiador do fascismo, sobre os paralelos entre Trump, de um lado,
e Mussolini e Hitler, de outro. Bill Maher deu a deixa para o
historiador Timothy Snyder, que vinculou a ascensão de Trump à
ascensão de Hitler. “No meu mundo, de onde venho, estamos na
década de 1930”. O biógrafo de Hitler, Ian Kershaw, defendeu a
mesma posição num jornal britânico. “Os paralelos ao sombrio
período entreguerras não devem ser negligenciados”. E o historiador
Ron Rosenbaum, autor do livro Explaining Hitler [Explicando Hitler],
explicou que Trump chegou ao poder com “visões e perspectivas
extraídas de um livro escrito em alemão. Esse livro é o Mein
Kampf”.13
Por fim, a acusação de fascismo contra Trump não é um elemento
a ser jogado fora; a esquerda apresenta uma infinidade de razões
para apoiar tal acusação. O historiador John McNeill fez chegar ao
Washington Post a alcunha sobre Trump dos “11 atributos do
fascismo”. Escrevendo para o site Alternet, Kali Holloway declarou:
“É assustador como Trump se enquadra perfeitamente no famoso
guia dos 14 pontos para identificar líderes fascistas”.14 Dessa vez a
esquerda e os democratas parecem confiantes de que poderão
fazer o rótulo fascista pegar, de modo a desacreditar
permanentemente Trump e aqueles que o apoiam.
“Ele Não é o Nosso Presidente”
O que me interessa aqui não são os motivos para a esquerda
comparar Trump com os fascistas e os nazistas — lidarei com essas
motivações no próximo capítulo —, mas o que eles pretendem
alcançar com essas comparações. Evidentemente, a esquerda tem
o objetivo de tornar a presidência de Trump ilegítima. Essa noção —
de que, mesmo tendo vencido honesta e diretamente, Trump, de
alguma forma, não merece ser presidente — foi propagada pela
primeira vez, inclusive, antes das eleições. Hillary e Obama nunca
trataram Trump como um candidato legítimo.
Uma vez que Trump foi eleito, a esquerda democrata lançou uma
cruzada sem precedentes a fim de impedir que ele tomasse posse.
Ela exigiu a recontagem de votos, o que é razoável quando as
margens entre os candidatos são muito próximas, como aconteceu
na eleição de 2000 entre Bush e Gore. No caso de Trump, as
margens atingiram um patamar significativo em todos os sentidos
mais cruciais. Houve uma ou duas recontagens, e Trump acabou
ganhando mais alguns votos.
Depois a esquerda procurou desacreditar a vitória de Trump ao
destacar que Hillary ganhou por voto popular. Novamente, é algo
que soa estranho, uma vez que as eleições nos EUA não são
decididas pelo voto popular. O sistema político americano é
projetado para gerar equilíbrio entre a representação individual e a
representação estadual. O objetivo é impedir que grandes estados
monopolizem o poder. Por conseguinte, o Colégio Eleitoral dá aos
estados maiores mais eleitores, mas garante que os estados
menores também tenham influência eleitoral suficiente a ponto de
fazer a diferença.
Não é imprescindível decifrar as regras precisas do sistema. O
ponto principal é que este é um sistema democrático e estas são as
regras do jogo acordadas já de longa data. A esse respeito, as
regras do Colégio Eleitoral são como as regras de uma partida de
tênis, que é decidida não por pontos, mas por sets. Fará sentido se,
em uma partida com pontuação final de 6–4, 6–4, 0–6, 1–6, 6–4, o
perdedor, embora tenha vencido apenas dois sets de cinco, for
premiado por ter feito dois pontos a mais que o vencedor na
pontuação geral? É absurdo. Trump prevaleceu pelas regras do
jogo, e sua vitória mantém-se claramente inalterada, mesmo perante
a observação de que Hillary teria vencido sob algum outro conjunto
de regras.
Em seguida, a esquerda procurou pressionar diretamente os
eleitores a não escolherem Trump no Colégio Eleitoral. Estes
relataram opressão, assédio, e até ameaças. Embora a maior parte
da situação fosse puro desespero — e os esforços finalmente
falharam —, Peter Beinart teceu argumentos complexos para o
Atlantic Monthly sobre por que “o colegiado eleitoral deveria proibir à
presidência homens feito Trump”. Não importa o que tenham
decidido, Beinart insistiu que os eleitores deveriam votar contra
Trump, alegando ser ele um “demagogo irresponsável” e que sua
vitória criou uma “emergência nacional”.15
Finalmente, a esquerda procurou desacreditar a eleição alegando
que os russos a fraudaram. Eles a fraudaram, supostamente, ao
invadir o servidor particular de Hillary. Nunca houve provas disso. E
por que os russos prefeririam Trump a Hillary? Havendo tomado
posse, uma das primeiras decisões de Trump foi lançar um ataque
militar contra a Síria, aliada da Rússia. Então, o próprio conceito de
que os russos pesaram a balança a favor de Trump faz pouco
sentido.
Mas, mesmo que os russos tivessem invadido o servidor de
Hillary, não foram eles que escolheram Trump no lugar dela. Ao
contrário, os eleitores americanos o fizeram. Portanto, a despeito de
qual seja a evidência que os russos possam ter descoberto, no fim
das contas foi o povo americano quem determinou seu valor. Foi o
povo americano quem julgou tal evidência suficientemente
incriminatória, a ponto de dispensar Hillary.
Desde que Trump demitiu o diretor do FBI, James Comey, a
esquerda — que havia criticado o papel de Comey nas eleições —
ficou extremamente exasperada, gerando uma tempestade tão
furiosa de acusações que o ex-diretor do FBI, Robert Mueller, foi
nomeado conselheiro especial para investigar o possível conluio
entre a equipe de Trump e a Rússia. Enquanto a responsabilidade
de Mueller era descobrir objetivamente os fatos, a agenda sem
disfarces da esquerda era usar o inquérito para impedir o
desempenho de Trump, aumentar a pressão a fim de acontecer a
impugnação de mandato, e (se tudo corresse de acordo com o
plano) forçar sua renúncia.
Enquanto tudo isso acontecia, eu coçava a cabeça pensando no
esforço desesperado da esquerda para suprimir o resultado válido
de uma eleição livre. Então percebi que Mussolini e Hitler também
chegaram ao poder através de um processo legal — ou ao menos
quase legal. Nem Mussolini nem Hitler armaram um golpe. Os
camisas negras marcharam em Roma sob uma atmosfera de caos e
Mussolini foi convidado pelo rei Victor Emmanuel III a formar um
novo governo.
Embora nunca tenha obtido maioria popular de eleitores alemães,
Hitler era o cabeça do maior partido na Alemanha de 1933 quando
feito chanceler pelo presidente Paul von Hindenburg. Algumas
semanas depois, o parlamento alemão, o Reichstag, aprovou a Lei
de Concessão de Plenos Poderes, o que essencialmente transferia
seu poder a Hitler. Em outras palavras, a democracia preparou o
caminho para que esses déspotas tomassem o poder.
Consequentemente, para os esquerdistas que veem Trump no
mesmo caminho de Hitler e Mussolini, a vitória eleitoral não justifica
um fascista ou nazista americano ascendendo ao poder.
Agora, cabe dizer que, quando um grande partido político
basicamente rejeita o resultado de uma eleição livre, nos
encontramos em território inexplorado. Isso já aconteceu uma vez
nos Estados Unidos, é claro, em 1860, quando o mesmo partido, o
dos democratas, recusou-se a aceitar a eleição de Abraham Lincoln.
O desfecho se deu em uma guerra civil sangrenta.
Desde Lincoln, então, nenhum presidente americano enfrentou
maior resistência à legitimidade do que Trump. Mesmo assim,
apesar de algumas discussões vagas sobre a Califórnia deixar a
União, a América não está enfrentando um sério movimento de
secessão do tipo que se desenvolveu no Sul, em 1860–1861. O que
estamos vendo, ao contrário, é a desconfiança do próprio processo
democrático por parte daqueles que perderam as eleições de 2016.
Do ponto de vista deles, como a democracia poderia ter produzido
um resultado tão assustador, tão contrário à razão?
Quase setenta legisladores democratas recusaram-se a participar
da posse de Trump, uma violação da etiqueta democrática sem
precedentes, atitude que teria provocado grande indignação na
mídia, caso os republicanos tivessem o feito, por exemplo, com Bill
Clinton ou com Barack Obama. Presidente há apenas algumas
semanas, mesmo antes de Trump ter feito qualquer coisa que
pudesse ser considerada remotamente inconstitucional, Maxine
Waters e Tulsi Gabbard, duas representantes do Congresso
Democrata, levantaram a questão da impugnação do mandato. O
colunista Richard Cohen chegou a sugerir a necessidade de um
“golpe constitucional” — basicamente, uma assembleia de oficiais
eleitos que, segundo Cohen, têm a autoridade para retirar do cargo
um presidente que eles consideram “incapaz de cumprir os poderes
e deveres de seu cargo”.16
Ainda mais escandaloso, uma ex-funcionária do Departamento de
Defesa do período Obama, Rosa Brooks, levantou a possibilidade
de os militares dos EUA se recusarem a obedecer às ordens de
Trump e, talvez, até de o expulsarem do cargo. Se Trump ordenasse
que os militares fizessem algo que os generais julgassem insano,
disse Brooks, então eles deveriam recusar-se a obedecer. E, caso
Trump insistisse, Brooks deu a entender, eles deveriam livrar-se
dele por meio do golpe militar. Argumento semelhante havia sido
desenvolvido antes das eleições no Los Angeles Times por James
Kirchick, da Iniciativa de Política Externa [Foreign Policy Initiative].
Kirchick concluiu seu artigo dizendo: “Trump não é apenas impróprio
à presidência, mas um perigo para a América e para o mundo. Os
eleitores precisam detê-lo antes que os militares o façam”.17
Embora raramente explícitos, houve também pedidos de
assassinato. Pouco depois de Trump tomar posse do mandato
presidencial, a jornalista britânica Monisha Rajesh escreveu: “Já é
hora de um assassinato presidencial”. Lars Maischak, historiador da
Universidade Estadual de Fresno, escreveu em seu twitter: “Para a
democracia americana ser salva, Trump deve ser enforcado”.
Durante a Marcha das Mulheres em Washington, D.C., a cantora
Madonna vociferou: “Sim, estou com raiva. Sim, estou indignada. E,
sim, eu pensei muito em explodir a Casa Branca”. A comediante
Kathy Griffin publicou explicitamente uma foto sua com a imagem de
Trump ensanguentado e decapitado, resultando em uma
tempestade de protestos que a obrigou a pedir desculpas. O rapper
Snoop Dogg lançou em vídeo uma música chamada “Lavender”, na
qual ele aponta uma arma de fogo para a cabeça de um palhaço
vestido de Trump e puxa o gatilho, mostrando, na sequência, uma
bandeira vermelha e branca em que está escrito BANG. Outro
rapper, Big Sean, falou de assassinar Trump com um furador de
gelo.18 É difícil saber o quanto levar isso tudo a sério, mas é
possível imaginar a reação que viria à tona se alguém falasse dessa
maneira contra o antecessor de Trump, Obama.
Uma desconfiança do processo democrático semelhante a essa
foi fundamental na ascensão fascista ao poder na Itália dos anos
1920 e na ascensão nazista na Alemanha no início dos anos 1930.
Aliás, é importante notar que se trata do antigo fascismo e do antigo
nazismo. Hoje, quando se pensa em Mussolini ou em Hitler, se
pensa em termos da Segunda Guerra Mundial. É impossível pensar
sobre o nazismo, por exemplo, sem pensar também no Holocausto.
Contudo, é claro, não foi assim que os italianos ou os alemães
experimentaram pela primeira vez os fascistas e os nazistas.
Ninguém está dizendo que Trump hoje é o Hitler circa 1945.
Trump não iniciou uma guerra mundial nem anexou ou invadiu
outros países; ele, inclusive, certamente não exterminou seis
milhões de judeus. Esta não é a base da crítica progressista por
parte dos democratas contra Trump. Ao invés disso, eles o
comparam a Mussolini e Hitler antes da guerra, alertando que, se
fora de controle, ele pode acabar fazendo coisas horríveis
exatamente como esses dois homens acabaram por fazer.
Porém, no início dos anos 1920 e dos anos 1930, eram os
fascistas e os nazistas que desprezavam a democracia parlamentar,
cujas regras lhes eram incontornáveis e, no modo de pensar fascista
e nazista, impraticáveis. Estes foram partidos que declararam
líderes democraticamente eleitos como ilegítimos e apoiaram
abertamente estratégias que tinham o objetivo de expulsá-los do
poder. Então, quem está fazendo isso na América? Não é o Trump.
Pelo contrário, são os democratas progressistas que continuam a
questionar a validade da presidência de Trump. São os
progressistas que, hoje, recusam-se a aceitar os resultados dos
procedimentos e regras eleitorais. Eles são os que reagem, como
fizeram os fascistas e os nazistas, contra o que julgam ser um
sistema democrático defeituoso.
Depois, há a questão da violência. Como todos os estudiosos do
fascismo e do nazismo sabem, os fascistas e os nazistas gloriavam-
se dela. Mas eles não estavam sozinhos: seus rivais políticos, os
socialistas e os comunistas, também acreditavam na violência.
Naturalmente, essa era uma receita para banhos de sangue nas
ruas. Os primeiros dias do fascismo e do nazismo presenciaram
confrontos rotineiros entre os grupos políticos rivais. Na Itália, os
camisas negras de Mussolini chegaram a lutar corpo a corpo contra
os socialistas. Muitas pessoas foram mortas nessas guerras de rua.
Hitler descreve, em sua obra Mein Kampf, como seus camisas
pardas chegavam a encontros políticos, geralmente realizados em
bares e cervejarias, munidos de bastões e porretes. Os comunistas
podem nos superar em número, ele escreve, mas, para barrarem
nossas reuniões, eles terão de nos matar. No relato de Hitler, há
chuvas de golpes e combatentes caindo no chão, e lá ele
permanece, prosseguindo com seu discurso, recusando-se a ser
intimidado pelo caos que o cerca.19
Esses confrontos do início do fascismo e do nazismo me fazem
lembrar dos confrontos entre os seguidores da esquerda e os
partidários de Trump durante a campanha. Com isso, não apenas
quero dizer que estes são uma reminiscência daqueles. Quero dizer,
porém, que os manifestantes contra Trump se veem como que
batalhando uma batalha antifascista. Seus cartazes comparam
Trump a Hitler e a Mussolini. Um retrato padrão é Trump com o
bigode de Hitler; outro é uma representação de Trump paralelo a
Mussolini. Os manifestantes autodenominam-se antifascistas, ou,
abreviando, Antifas.
O período eleitoral foi dominado por confrontos acalorados, às
vezes violentos. Curiosamente, todos ocorreram durante os
comícios de Trump; não houve incidentes durante os comícios de
Hillary. Em dada ocasião, Trump teve de cancelar um comício em
Chicago, pois nem mesmo a polícia conseguiu controlar o caos. Em
San José, os esquerdistas atacaram os apoiadores de Trump com
ovos, gerando embates enérgicos, inclusive empurra-empurra e
pancadaria. Embora esse tipo de coisa tenha sido comum na Itália e
na Alemanha durante o início do século XX, não se via algo assim
na política norte-americana desde os acessos frenéticos da década
de 1960.
O próprio Trump parecia impaciente com os desordeiros. Certa
vez, ele falou de um manifestante: “Eu gostaria de dar um soco na
cara desse sujeito”. Para outro, ele disse: “Nos velhos tempos, eles
o arrancariam daqui bem depressa”. Trump já se ofereceu a pagar
os honorários de eleitores que tomassem parte contra os
manifestantes. No entanto, nenhuma vez Trump pediu que eles
perturbassem os comícios de Hillary. Em geral, sua posição era:
“Temos manifestantes que são sujos. Eles são realmente perigosos,
eles entram aqui e começam a bater em todo mundo”. Quando um
grupo de manifestantes latinos tentou interromper o comício que
Trump realizava em Miami, ele disse à multidão: “Vocês podem tirá-
los daqui, mas não os machuquem”.20
Mais tarde, um grupo chamado Project Veritas lançou evidências
gravadas em vídeo de que a campanha de Hillary e os grupos
esquerdistas haviam pagado manifestantes para provocar violência
nos comícios de Trump. Ainda assim, os principais meios de
comunicação culpam Trump pela violência. O argumento parecia ser
o de que, mesmo quando a esquerda dá início à confusão, a
violência seria uma resposta natural e justificável à retórica
incendiária de Trump. A mídia retratou os baderneiros da Antifa
como opositores heróicos tentando barrar a ascensão do nazismo
na América.
Quero, agora, concentrar-me na violência pós-eleitoral, uma vez
que é algo bastante incomum na América. Afinal, a eleição acabou e
o presidente está eleito. Houve, entretanto, protestos e perturbações
maciças nos eventos referentes à posse presidencial. Esses
protestos foram organizados por uma miscelânea, mélange, de
grupos, dos quais o mais proeminente parecia ser um chamado
Refuse Fascism. De acordo com um dos seus panfletos, “É o
caráter fascista do regime de Trump/Pence que o torna ilegítimo e
um perigo à humanidade”. O chamado do grupo à resistência foi
assinado pelo ator Ed Asner, pelo ativista Bill Ayers, pelas
comediantes Margaret Cho e Rosie O’Donnell, pela autora Alice
Walker, entre outros.21
A polícia se preparou para uma semana de tumultos por ocasião
da posse, e ela estava certa em precaver-se. O problema começou
na DeploraBall, uma reunião independente organizada por Mike
Cernovich, partidário de Trump e acusado de ser da “direita
alternativa” (alt-right). Centenas de manifestantes se reuniram do
lado de fora, gritando “escória nazista” e levantando placas nas
quais estava escrito “Alt-Reich” [“Reich Alternativo”], enquanto os
convidados entravam. Dois homens, um com uma máscara de Hitler
e outro com uma máscara de Mussolini, levantaram placas que
diziam: “Trump é da Direita Alternativa”. Quando os partidários de
Trump gritaram em resposta aos manifestantes, sobreveio o tumulto,
os manifestantes começaram a jogar garrafas nos participantes da
DeploraBall e nos policiais.22
A posse oficial de Trump, por si, provocou reações muito mais
tormentosas vindas da esquerda. Manifestantes, trajados de preto e
muitos usando máscaras, arremessaram pedras, tijolos e pedaços
de concreto, quebrando vitrines, inclusive a de um McDonald’s, de
um Bank of America e de um Starbucks no centro da cidade.
Usando latas de lixo e caixas de jornais, eles atearam fogo no meio
da rua, viraram carros e os incendiaram. Membros do movimento
Black Lives Matter acorrentaram-se a cercas em pontos de controle
de segurança, forçando o Serviço Secreto a interditá-los.
Com helicópteros sobrevoando a região, a polícia usou sprays de
contenção e granadas de atordoamento para conter os
manifestantes. No entanto, quando um SUV da polícia tentou
dispersar a multidão, os manifestantes atiraram pedras, quebrando
a janela traseira do veículo. Ativistas da esquerda se chocaram
contra os policiais, que finalmente os dispersaram com spray de
pimenta. Mais de duzentas pessoas foram presas. Curioso dizer,
onze delas eram jornalistas, que estavam lá supostamente atuando
como mídia, mas aparentemente também participando dos
tumultos.23
Simultaneamente, centenas de manifestantes mascarados
apareceram na Universidade da Califórnia, em Berkeley, para
impedir que um partidário de Trump, Milo Yiannopoulos, fizesse seu
discurso. Eles derrubaram barricadas policiais, quebraram janelas,
depredaram caixas eletrônicos e atacaram a polícia com fogos de
artifício. Eles estavam acompanhados de outras várias centenas de
manifestantes, estudantes e esquerdistas da grande Bay Area,
carregando placas com frases como “É GUERRA”. O grupo que
organizou o protesto foi chamado de By Any Means Necessary
[Faça o que for Necessário], e se posicionou como uma organização
antifascista.
Os manifestantes divulgaram uma declaração dizendo que
estavam lutando para impedir que “um grande fascista na ativa”
invadisse seu câmpus. “Vamos ser claros: Milo Yiannopoulos não
está buscando a liberdade de expressão. Ele está conscientemente
liderando a nazificação da Universidade Americana”.24 Na
realidade, convenhamos, Yiannopoulos é um provocador, é um
comediante e conservador. Ele também é gay e extravagante, que
se autodeclara uma “bicha perigosa” e chama Trump de
“papaizinho”. Ao mesmo tempo que ataca o islã por suprimir
cruelmente mulheres e homossexuais, ele não tem associação
nenhuma com o fascismo ou o nazismo. Só posso imaginar como
ele se encaixaria na Alemanha de Hitler. Mas não importa, do ponto
de vista da oposição, Milo era o nazista e eles estavam protegendo
sua comunidade do nazismo.
Os manifestantes não tinham a intenção de um proceder pacífico.
O objetivo claro era manter Milo do lado de fora. A polícia não pôde
lidar com uma manifestação de tamanha proporção, então o evento
foi cancelado. Observando os manifestantes com suas roupas
pretas, de rostos cobertos, alguns deles brandindo pedaços de pau
e bastões, não pude deixar de pensar nos camisas negras italianos
e nos camisas pardas nazistas desfilando pelas ruas com seus
capacetes, bastões, socos ingleses e correntes. A atmosfera
surrealista de Berkeley refletiu, em certo sentido, o surrealismo que
caracterizou a política americana desde o início do período eleitoral.
Eis, portanto, a ironia. Os manifestantes de Berkeley, assim como
os manifestantes contra Trump em D.C., declararam-se
antifascistas. Porém, é o lado deles que impôs censura ao impedir
que determinado palestrante discursasse num câmpus universitário.
Foram eles também que, mesmo indo contra a lei, impediram
aqueles que apoiavam Trump de participar dos eventos de posse.
Enquanto os adeptos de Trump cuidam dos próprios afazeres, os
esquerdistas só sabem confrontar, assediando-os, ameaçando-os,
quebrando e queimando coisas, e se envolvendo em conflitos contra
a polícia. Como, então, é que os supostos fascistas agem de forma
visivelmente pacífica e legal enquanto os antifascistas se parecem
mais com os fascistas a quem eles supostamente estão resistindo?
A Racionalização da Violência
A princípio, pensava estar simplesmente testemunhando
consequências chocantes de uma eleição chocante. A esquerda não
esperava que Trump vencesse. Em 20 de outubro de 2016, a revista
American Prospect publicou um artigo intitulado “Trump No Longer
Really Running for President” [“Trump já não mais Concorre à
Presidência”], cuja intenção era concluir que o “objetivo político real
de Trump é tornar impossível o governo para Hillary Clinton”. O
resultado das eleições foi, nas palavras do colunista David Brooks,
“o maior choque de nossas vidas”.25 Trump venceu contra
probabilidades praticamente insuperáveis, entre elas os grandes
meios de comunicação que fizeram campanha aberta a favor de
Hillary, além da guerra civil dentro do GOP com toda a ala
intelectual do movimento conservador recusando-se a apoiá-lo. A
princípio, interpretei a revolta impetuosa por parte da esquerda
como uma reação atordoada e calorosa, porém momentânea, à
maior vitória da história política dos Estados Unidos.
Então, duas coisas me fizeram perceber que eu estava errado.
Primeiro, a violência não desapareceu. Houve protestos violentos
como o “Not My President’s Day” [“Dia de Dizer: Não é o meu
Presidente”] por todo o país, em fevereiro; as violentas
manifestações de 4 de março nos comícios de Trump na Califórnia,
Minnesota, Tennessee e Flórida; as manifestações de abril contra os
impostos de Trump, todas supostamente destinadas a forçar Trump
a revelar suas declarações de impostos; as manifestações pró-
impeachment de julho, buscando impulsionar a retirada de Trump do
cargo; e as múltiplas, e convulsivas, manifestações em Berkeley.26
Em Portland, os esquerdistas arremessaram pedras, bolas de
chumbo, latas de refrigerante, garrafas de vidro e dispositivos
incendiários, tornando necessária a intervenção policial sob a
chamada “Alerta, alerta, temos um motim”. Mais cedo, no Capitólio
Estadual de Minnesota, alguns esquerdistas lançaram bombas de
fumaça na multidão pró-Trump enquanto outros preparavam fogos
de artifício dentro do prédio, fazendo com que pessoas fossem
tomadas pelo medo de um ataque terrorista. No rol de detidos
estava Linwood Kaine, filho do candidato à vice-presidência de
Hillary, Tim Kaine.27 Mais do mesmo, sem dúvida, está guardado
pela esquerda pelos próximos quatro anos.
O que isso mostrou é que a esquerda esteve envolvida em
violência premeditada; não uma violência ocasionada por surtos de
fervor, mas uma violência como estratégia política. Muitos da
esquerda justificaram a violência e defenderam o motivo por que a
estavam causando. Como, então, em uma sociedade democrática,
alguns cidadãos pensam ter o direito de calar outros eleitores e de
interromper os resultados de uma eleição sob os ditames da
democracia?
De acordo com Jesse Benn, ao escrever para o HuffPost, Trump
não passa de um fascista do século XXI. Além do mais, “Trump não
existe em um vácuo. Ele é a consequência natural da ala
republicana, que perdura em racismo [...] e do uso de imigrantes
como bodes expiatórios”. A ascensão do fascismo, ele diz, não é um
“típico desacordo político entre os partidários”. Historicamente
falando, os fascistas só foram contidos por uma “insurreição
impetuosa”. Acreditar de forma diferente, ele insiste, é “pôr em risco
sua oposição e expor-se à cumplicidade com uma nova era da
política fascista nos Estados Unidos”.28
Escrevendo para a Atlantic Monthly, Vann Newkirk insiste que
“uma vez que as instituições democráticas não impediram a
ascensão de Trump [...] por que as pessoas que ele pretende
ludibriar e marginalizar deveriam confiar nas instituições
democráticas para as proteger?”. A verdadeira agenda de Trump,
argumenta Newkirk, é baseada na violência: a violência da
construção do muro, a violência da deportação, a violência de
manter as pessoas fora da América por causa de sua religião, a
violência de “punir a mulher por abortar”. Por consequência, um voto
em Trump significa “um voto a favor da ampla disseminação da
violência”. Diante de uma ameaça fascista à vida e à liberdade, os
manifestantes não têm escolha senão usar de força para a própria
defesa. A única maneira de cessar a violência é fazer com que
Trump desista de sua agenda ou que seus defensores o substituam
por “alguém menos virulento”.29
Escrevendo para a Nation, Natasha Lennard inicia com a
premissa de que, porquanto Trump representa o fascismo, “é
constitutivo ao fascismo exigir um tipo diferente de oposição”.
Lennard argumenta que não faz sentido lutar contra o fascismo com
argumentos; em vez deles, o fascismo só pode ser interrompido
com o uso da força física, do mesmo tipo que foi usada pelas
brigadas que combateram Franco na Espanha ou pelos grupos
comunistas que lutaram contra os nazistas na década de 1920 e no
início dos anos 1930. Os antifascistas, ela conclui, estão
empenhados em impedir que os fascistas tenham voz: “a
característica essencial do antifascismo é que ele não tolera o
fascismo; não se trata de uma plataforma para debates”.30
Escrevendo para a Salon, ainda no período de campanha
eleitoral, o ativista Chauncey DeVega começou por admitir que
“numa democracia em funcionamento, a violência política deveria,
quase sempre, ser condenada”. No entanto, neste caso, DeVega
estaria disposto a fazer uma exceção, porque Trump é um
“incendiário político” que, além disso, está “do lado errado da
História”. Segundo DeVega, a violência da esquerda é “uma
resposta às ameaças abertas e implícitas de danos físicos e outros
prejuízos e males causados por Donald Trump e por aqueles que o
apoiam contra imigrantes hispânicos sem documentação,
americanos negros, outras pessoas de cor e muçulmanos”. Observe
com cuidado a linguagem usada por DeVega: mesmo que os
partidários de Trump não sejam de fato violentos, caso considerados
“ameaças abertas ou implícitas”, a esquerda possui justificativas
para usar de violência efetiva contra eles.31
Sentimentos como esse também ecoaram no artigo do ativista
Kelly Hayes intitulado “No Welcome Mat for Fascism: Stop Whining
About Trump’s Right to Free Speech” [Sem Tapete de Boas-Vindas
para o Fascismo: Pare de Choramingar pelo Direito de Trump à
Liberdade de Expressão].32 De fato, o argumento total de todos
esses escritores pode ser resumido em uma única frase: “Não à
liberdade de expressão para os fascistas”. Esta frase — percebe-se
— remonta à década de 1960, quando usada pela Nova Esquerda
em protestos contra a Guerra do Vietnã. A inspiração para tal lema
veio de um professor de Berkeley chamado Herbert Marcuse, boa
parte das vezes esquecido em nossos dias, mas um guru para os
radicais dos anos 1960; sua base argumentativa, porém, está agora
no centro do debate político contemporâneo.
Marcuse argumentou que a esquerda é o partido da tolerância,
mas que a tolerância não é para todos: só para pessoas tolerantes.
Na visão de Marcuse, a esquerda não deve ser tolerante com os
intolerantes. As pessoas intolerantes, segundo ele, são basicamente
fascistas. Elas se recusam a respeitar o processo democrático;
assim, por que deveriam receber o respeito que recusam aos
outros? Marcuse então argumenta que, em vez de tolerar esses
fascistas de direita, a esquerda deveria reprimi-los, calá-los, e até
mesmo espancá-los ou matá-los. Em essência, a esquerda deveria
destruir o fascismo por todos os meios necessários, do contrário os
fascistas os destruiriam.
O argumento de Marcuse ecoa o próprio Hitler, que disse que ou
os nazistas destruiriam os judeus ou os judeus destruiriam os
nazistas. “Se eles vencerem”, escreve Hitler, “Deus nos ajude!
Todavia, se nós vencermos, que Deus os ajude!”. Marcuse mesmo
era um refugiado da Alemanha nazista. Ele também fugiu da
brutalidade do nazismo. Mas, ao mesmo tempo, ele também viu a
eficácia nazista em dispersar seus inimigos e levar o próprio povo
alemão à submissão. Marcuse basicamente argumentava que, para
derrotar o nazismo na América, seria preciso que a esquerda se
valesse de táticas nazistas.
Por táticas nazistas não me refiro apenas à violência de
estudantes e ativistas irritados. Também me refiro ao que os
nazistas chamaram de Gleichschaltung. O termo em si significa
“coordenação”, “uniformização”, e refere-se ao esforço nazista de
usar a intimidação em todas as instituições culturais da sociedade
para que todos se alinhem às prioridades e à doutrina nazistas. Os
progressistas na América estão usando seu predomínio — na
verdade, seu total monopólio — na área acadêmica, no campo de
Hollywood e nos meios de comunicação para impor seu próprio
Gleichschaltung.
Eles fazem isso não somente por meio da propaganda descarada
e da completa mentira que deixaria Joseph Goebbels orgulhoso,
mas também através da batalha implacável e da exclusão forçada
das vozes dissidentes de suas instituições culturais, de modo que a
voz deles seja o único ponto de vista comunicado à grande maioria
dos estudantes e cidadãos. Novamente, do ponto de vista da
esquerda, tais intimidações e exclusões são justificadas porque é
correto e adequado que os antifascistas usem de repressão contra
aqueles que eles consideram fascistas.
Todo esse modus operandi — que Marcuse chamou de “tolerância
repressiva”, e que está encapsulado na doutrina não à liberdade de
expressão para os fascistas — está, agora, no cerne de nosso
debate político. Isso levanta duas perguntas importantes. Primeiro, é
verdade que os fascistas não merecem ser ouvidos e é justificável
negar-lhes direitos civis e constitucionais? Em segundo lugar — a
pergunta mais importante —, é verdade que as pessoas que a
esquerda chama de fascistas e nazistas são de fato fascistas e
nazistas?
Os Verdadeiros Fascistas
Essas são as perguntas que pretendo responder neste livro. A
primeira pergunta eu deixo para o capítulo final, onde a respondo
com um ressonante não. Irônico o bastante, os esquerdistas
deveriam gostar da resposta que dou, pois basicamente estou
dizendo é que não se pode privá-los de seus direitos civis e
constitucionais. Eles são os verdadeiros fascistas, mas ainda assim
merecem a plena proteção da constituição e da lei. E também
concordo com o princípio de que os fascistas não podem ser
combatidos do modo convencional. É preciso especial coragem para
derrotar um movimento tão vicioso e perverso. O que se faz
necessário para derrotar a esquerda é nada menos que a
desnazificação, e no final deste livro mostro como isso pode ser
feito.
Meio que tendo dado a resposta, respondo agora à outra
pergunta, mais abrangente e mais importante: quem são os
verdadeiros fascistas da política americana? Essa pergunta
raramente é feita de forma séria, e por isso quero dar crédito a dois
importantes predecessores notáveis que já araram este solo.
Primeiro, o economista Friedrich Hayek, cujo livro The Road to
Serfdom [O Caminho para a Sujeição], publicado pela primeira vez
em 1944, fez a afirmação surpreendente de que democracias
ocidentais sob o Estado do bem-estar social [Welfare State], tendo
derrotado o fascismo, estavam se movendo inexoravelmente na
direção fascista.
Hayek identificou o fascismo como um fenômeno de esquerda, um
primo do socialismo e do progressismo. E alertou: “O surgimento do
fascismo e do nazismo não foi uma reação contra as tendências
socialistas do período anterior, mas um resultado necessário dessas
mesmas tendências”. Embora o livro de Hayek tenha sido escrito
num tom pedante e medido, apelando aos progressistas que
aprendessem de alguém que testemunhou experiencialmente a
ascensão do fascismo na Europa, estudiosos progressistas, como,
por exemplo, Herman Finer, puseram-se de imediato a criticar
Hayek, acusando-o de exibir um “profundo desprezo hitleriano pelo
homem democrático”.33
Se percebida nessa reação a tentativa progressista, que já soa
familiar, de se apossar da cartada hitleriana e jogá-la de volta contra
Hayek, então já há um vislumbre de como a grande mentira
funciona. Aqui está Hayek argumentando como os progressistas
estão se movendo em direção a Hitler; porém, sem responder à
acusação, não propondo nenhuma evidência que lhes dê algum
suporte, a esquerda se volta e acusa Hayek de ser feito Hitler.
Jonah Goldberg recebeu praticamente o mesmo tratamento ao
seu importante livro Liberal Fascism [Fascismo Liberal]. Goldberg
argumenta: “O que chamamos de liberalismo — o edifício
remodelado do progressismo americano — é, de fato, um
descendente e uma manifestação do fascismo”. Goldberg
argumenta que o fascismo e o comunismo, longe de serem opostos,
são “concorrentes históricos intimamente relacionados para os
mesmos constituintes”. Goldberg nomeia o progressismo de
“movimento irmão do fascismo” não menos que o comunismo, o
qual exibe uma “semelhança familiar que poucos admitem
reconhecer”.34
Goldberg traça inúmeros paralelos entre o progressismo e o
fascismo, deixando clara a longa lista esquerdista nas plataformas
de Mussolini e de Hitler, para, em seguida, mostrar seu paralelo com
o progressismo americano moderno. Goldberg consegue ir fundo,
detectando até mesmo o odor do fascismo nas políticas modernas
de ambientalismo progressista, vegetarianismo, medicina holística e
políticas pedagógicas. Embora às vezes exagere nas comparações
que faz com o fascismo, seu livro vale muito a pena ser lido em
virtude da originalidade e abrangência apresentadas. Pois então,
mais uma vez, a esquerda, vingativa, colocou-se contra Goldberg,
acusando-o de ser, sem contar todas as demais coisas, fascista.
Hayek e Goldberg são o ponto de partida para o meu livro. Mas
vou muito além e cavo em áreas de pesquisa intocadas por eles.
Hayek, por exemplo, afirmou que o fascismo e o nazismo emergiram
da esquerda, mas nunca explicou como isso aconteceu. Com base
no trabalho de estudiosos como Anthony James Gregor, Renzo De
Felice e Zeev Sternhell, conto a fascinante história de como o
fascismo e o nazismo emergiram de um debate dentro do
socialismo. O problema surgiu quando as profecias centrais do
marxismo não se cumpriram. Foi em uma enorme crise que a
esquerda caiu, e o marxismo basicamente dividiu-se em dois
campos: o primeiro tornou-se o leninismo e o bolchevismo, o outro
tornou-se o fascismo e o nazismo.
Goldberg associa a esquerda americana ao fascismo, mas não se
atreve a fazer ligação equivalente com o nazismo, provavelmente
não querendo se arriscar a associar a esquerda com genocídios e
campos de concentração. É daí que realmente começo com meu
livro. Conforme Goldberg bem sabe, o fascismo e o nazismo são
duas coisas diferentes. Hitler praticamente nunca referiu a si mesmo
como fascista, e Mussolini nunca se autodenominou nazista ou
nacional-socialista. Pretendo demonstrar que há conexões
profundas não apenas entre a esquerda e o fascismo, mas também
entre a esquerda e o nazismo.
De certa forma, os democratas progressistas estão ainda mais
próximos dos nazistas alemães do que dos fascistas italianos. Os
fascistas italianos, por exemplo, eram muito menos racistas do que
o Partido Democrata nos Estados Unidos. Não existem, referindo-se
à Itália, paralelos para o terrorismo racial disfarçado do Ku Klux
Klan, que também era apoiado pelo Partido Democrata, mas estes
são encontrados na Alemanha nazista. As políticas democratas de
supremacia branca, segregação racial e discriminação fomentadas
pelo Estado eram também estranhas ao fascismo italiano, mas
comuns ao Terceiro Reich.
Aqui, por exemplo, está uma passagem do livro The Anatomy of
Fascism [A Anatomia do Fascismo], de Robert Paxton: “Pode ser
que o fenômeno mais antigo a ser eficientemente ligado ao fascismo
seja americano: a Ku Klux Klan”. Muito antes dos nazistas, Paxton
salienta, a KKK adotou seu uniforme segregado, de vestimentas e
capuzes, e engajou-se no tipo de intimidação e violência que
ofereceu “uma prévia contundente do modo como os movimentos
fascistas deveriam funcionar na Europa no período entreguerras”.35
Ainda que pareça uma concessão surpreendente quando por um
progressista, Paxton protege seu lado político não mencionando
que, durante esse período, a Ku Klux Klan era o braço terrorista da
família do Partido Democrata.
O racismo do Partido Democrata na América não só precedeu o
racismo dos nazistas, mas perdurou por muito mais tempo — mais
de um século, em comparação com os doze anos do domínio
nazista sobre a Alemanha. O racismo do Partido Democrata após a
Guerra Civil foi precedido pela defesa da escravidão e pelo apoio às
políticas de reassentamento e extermínio de índios americanos por
parte desse mesmo partido. Pensamos em conceitos como
“genocídio” e “campos de concentração” como exclusivos ao
nazismo, mas que termo exceto genocídio usar para descrever o
reassentamento em massa dos índios pelo presidente democrata
Andrew Jackson? Jackson e seus aliados não buscaram
sistematicamente despojar, deserdar e desmembrar os índios como
povo? Usando a definição oficial de genocídio dada pelas Nações
Unidas, demonstro que, sim, foi um genocídio.
Além disso, o que mais seriam as fazendas de escravos senão
um tipo particular do campo de concentração? Sim, pode parecer
uma analogia ultrajante. Como comparar um sistema de trabalho
forçado, por mais injusto que seja, aos campos nazistas, projetados
e usados para matar seres humanos? No entanto, como mais
adiante será analisado, os campos de concentração também eram
campos de trabalho. Nos campos de concentração alemães e nas
fazendas de escravos regidas pelos democratas, em ambos o
trabalho forçado era empregado com “ferramentas humanas”
unicamente no que dizia respeito à produtividade, mas com pouca
ou nenhuma consideração pela vida dos trabalhadores, que eram,
em ambos os casos, considerados inferiores e até mesmo sub-
humanos. A analogia entre dois dos piores sistemas de
confinamento compulsório e de trabalho forçado na história da
humanidade não é meramente legítima; ela já passou da hora de
ser feita.
Além do mais, toda essa questão foi levada a um patamar
completamente novo desde a publicação do livro, um marco
pioneiro, do historiador Stanley Elkins, Slavery [Escravidão]. Elkins,
tecendo paralelos bem elaborados, não só se refere às fazendas de
escravos como um “sistema fechado” consanguíneo do campo de
concentração, mas também mostra que a escravidão produziu tipos
de personalidades estranhamente semelhantes às descritas pelos
sobreviventes dos campos nazistas. Logo, a questão é que, mesmo
em algumas das instituições e práticas associadas exclusivamente
aos nazistas — do genocídio aos campos de concentração —, os
democratas, em determinado sentido, foram os primeiros a chegar
lá.
Aprendendo com Hitler
Neste livro, mostro o que a esquerda aprendeu com os nazistas e
também o que, por sua vez, a esquerda lhes ensinou. Acontece que
a esquerda forneceu aos nazistas certos esquemas políticos muito
importantes, os quais, por sua vez, foram por eles implementados
na Europa com disposição assassina. Por exemplo, Hitler disse
especificamente que pretendia deslocar e exterminar os russos, os
poloneses e os eslavos do mesmo modo como os americanos na
era jacksoniana haviam deslocado e exterminado os índios. As leis
nazistas de Nuremberg foram diretamente modeladas com base nas
leis de segregação e nas leis contrárias ao casamento inter-racial, já
implementadas décadas antes no Sul democrata.
A esterilização forçada e a eutanásia, cujos objetivos eram
eliminar os “defeitos” raciais e produzir uma raça nórdica “superior”,
foram outros dois programas que os nazistas tomaram dos
progressistas americanos. Não é minha opinião sobre o assunto,
esta era a visão dos eugenistas da Alemanha nazista. No início do
século XX, a eugenia e o darwinismo social eram muito mais
predominantes na América do que na Alemanha. Margaret Sanger e
seus companheiros eugenistas e progressistas não tomaram dos
nazistas suas ideias de matar aqueles seres indesejáveis — ou de
impedir-lhes a concepção. Mas foram os nazistas que as tomaram
de seus homólogos americanos, os quais dominavam o campo
internacional da eugenia. Há, portanto, uma via de mão dupla entre
o nazismo e a esquerda americana.
Essa é uma história que compromete profundamente os heróis do
progressismo americano: Woodrow Wilson, Franklin D. Roosevelt e
John F. Kennedy. Wilson foi um verdadeiro progenitor do fascismo
americano. Eu o chamo de protofascista. Ademais, foi ele um racista
que carrega praticamente toda a culpa pelo ressurgimento da Ku
Klux Klan, organização que, de acordo com o historiador Robert
Paxton, foi a precursora americana mais próxima de um movimento
nazista.
Mussolini era, o que ficará evidente, avidamente admirado por
Franklin D. Roosevelt (FDR), que procurou importar programas
fascistas italianos para a América. FDR também colaborou com os
piores elementos racistas do solo americano, trabalhando com eles
para impedir as leis contrárias ao linchamento, para excluir os
negros dos programas do New Deal e nomear um ex-membro da Ku
Klux Klan à Suprema Corte. Mussolini, por sua vez, elogiou o livro
de FDR, Looking Forward [Olhando Adiante], e basicamente o
considerou mais um companheiro fascista. Hitler também o tinha por
congênere de espírito, em consonância com o jornal oficial do
Partido Nazista, Volkischer Beobachter, e outros impressos da
Alemanha nazista que louvavam o New Deal por este ocupar um
tipo americano de fascismo.
JFK percorreu a Alemanha nazista na década de 1930 e voltou
efusivo, tecendo elogios a Hitler e sua teoria da superioridade
nórdica. “Cheguei à conclusão”, escreveu JFK em seu diário, “de
que o fascismo é o caminho certo para a Alemanha e para a Itália”.
Ao visitar a Renânia, JFK fez eco à propaganda nazista da época.
“As raças nórdicas parecem definitivamente superiores aos
romanos”. A hostilidade a Hitler, insistiu JFK, decorria sobretudo de
ciúmes. “Os alemães realmente são muito bons — é por isso que as
pessoas conspiram contra eles”. Apesar de ter lutado na Segunda
Guerra Mundial, JFK continuou tendo uma queda por Hitler,
inclusive até 1945, quando ele o descreveu como “a suma das
lendas [...] Hitler emergirá do ódio que agora o rodeia e será
considerado uma das figuras mais significativas que já viveu”.36
Tais fatos incriminatórios são do conhecimento de muitos
intelectuais progressistas. E foi depois da Segunda Guerra Mundial,
quando este grupo passou a dominar cada vez mais a academia —
um domínio completamente consolidado no final da década de 1960
—, que os progressistas reconheceram como seria esmagador se
os americanos conhecessem a verdadeira história do progressismo
e do Partido Democrata. E se o povo, especialmente o público
jovem, soubesse dos vínculos entre figuras progressistas
reverenciadas hoje como Wilson, FDR e JFK, de um lado, e, do
outro, aquelas repudiadas como Mussolini e Hitler? Chegar a esse
conhecimento não simplesmente derrubaria heróis progressistas de
seu pedestal, mas, basicamente, sinalizaria o fim do progressismo e
do Partido Democrata.
Desse modo, os progressistas decidiram contar uma nova história,
e esta é a história que hoje vigora. Nesta história, o fascismo e o
nazismo, que eram, desde o princípio, reconhecidos como
fenômenos de esquerda por ambos os lados do Atlântico, agora
foram transportados para os pilares da direita. De repente, Mussolini
e Hitler tornaram-se “de direita”, ao contrário daqueles que
supostamente os levaram ao poder, que transformaram-se em
“conservadores”. A esquerda, então, tornou-se a gloriosa resistência
contra o fascismo e o nazismo.
Para que a história funcionasse, o fascismo e o nazismo tiveram
de ser radicalmente redefinidos. O grande problema era que
Mussolini e Hitler identificavam o socialismo como o cerne do
fascismo e do weltanschauung nazista. Mussolini era a figura
principal do socialismo revolucionário italiano e nunca renunciou sua
fidelidade ao sistema. Já o partido de Hitler definiu-se como
defensor do “nacional-socialismo”. Assim, os progressistas tiveram
de descobrir como transportar esses esquerdistas confessos para a
direita e como arrancar o “socialismo” do “nacional-socialismo”. Não
foi uma tarefa fácil.
Como fazê-lo? Pegando uma deixa dos marxistas, a esquerda
resolveu, já na década de 1960, suprimir completamente o fato de
que o fascismo e o nazismo eram, ambos, sistemas de pensamento,
conjuntos de crenças. De acordo com Denis Mack Smith, historiador
de esquerda, “o fascismo italiano não se originou como doutrina,
mas como método, como uma técnica para ganhar poder, ainda
que, à primeira vista, seus princípios não fossem claros até para os
seus próprios membros”. O historiador Ruth Ben-Ghiat, citado
constantemente pela mídia que vincula Trump ao fascismo, insiste,
no entanto, que o fascismo é “uma daquelas palavras muito difíceis
de definir com precisão”, porque “o regime fascista dizia respeito a
tudo quanto era contradição, e esse tipo de ambiguidade
permaneceu no fascismo”.37
Na verdade, tais tolices só podem ser sustentadas quando há
recusa de levar os próprios fascistas a sério. Conforme o historiador
Anthony James Gregor escreve: “Sob a influência desagradável da
análise que o marxismo faz do fascismo, as declarações fascistas
nunca são analisadas como tais. Elas são sempre “interpretadas”.
Os fascistas nunca são compreendidos naquilo que dizem. Por
consequência, houve, até o momento, pouquíssimo esforço para
fornecer um relato sério do fascismo como ideologia”.38 Entretanto,
a esquerda reconheceu no fascismo tendências amorfas que
poderiam ser aplicadas com facilidade em outras várias doutrinas
políticas: o autoritarismo, o militarismo, o nacionalismo, etc.
Pense no seguinte: conhecemos o nome do filósofo do
capitalismo, Adam Smith. Também conhecemos o nome do filósofo
do marxismo, Karl Marx. Então, rápido, qual o nome do filósofo do
fascismo? Pois é, exatamente. Você não sabe. Praticamente
ninguém sabe. Meu ponto é: a razão disso não é que não havia
pensadores basilares para a formação e estruturação do corpo
fascista — seus nomes aparecem neste livro —, mas, sim, que a
esquerda teve de livrar-se deles para evitar o confronto com suas
inevitáveis propensões socialistas e esquerdistas. Pois então —
assim como quando o Hillary’s America surgiu —, os progressistas
concordaram entre si dizendo: “Vamos fingir que nada disso existe,
pode ser?”. Eis a grande mentira a todo vapor.
Se o estatismo e o coletivismo estão no cerne do fascismo, o
nacional-socialismo acrescenta outro ingrediente explosivo — o
antissemitismo. Trata-se de algo já bem conhecido. O que os
progressistas têm cuidadosamente disfarçado, no entanto, é o
quanto o antissemitismo nazista surgiu do ódio de Hitler pelo
capitalismo. Hitler estabelece uma distinção crucial entre o
capitalismo produtivo, que ele consegue suportar, e o capitalismo
financeiro, que ele associa aos judeus. Para Hitler, o judeu é o
avarento improdutivo no centro do capitalismo financeiro, o
empreendedor trapaceiro par excellence. Dificilmente parece ser de
“direita”; com efeito, em havendo alguma leve modificação, isso
ecoa uma retórica progressista sobre os gananciosos banqueiros da
Wall Street. Nessa condição, os progressistas perceberam a
necessidade de esconder a verdadeira base do antissemitismo de
Hitler; para tanto, o próprio antissemitismo precisou ser redefinido.
Como você pode facilmente perceber, o que está em cena é uma
grande, uma grande mentira — uma mentira que continua a crescer
e que contém várias mentiras menores —, e é daí que o meu
trabalho fica mais fácil. Mas, antes, é preciso compreender a grande
mentira em todas as suas dimensões, a fim de nos mantermos livres
dela. Uma vez livres, a esquerda estará acabada. O seu poder
sobre nós desaparecerá. Eles tinham em mãos a cartada racial e
agora têm a cartada nazista, mas não têm nenhuma outra cartada.
Se eles a perderem, perderão seu capital moral e estarão expostos
ao que realmente são — fanáticos, intolerantes, facínoras,
assassinos, vis e egoístas, ladrões da vida e da liberdade. Eles são
os verdadeiros descendentes de Mussolini e de Hitler; ao derrotá-
los, poderemos finalmente descansar dos fantasmas do fascismo e
do nazismo.
Capítulo Dois
Falsificando
a História
Introduzindo a Mentira
Munidos desta compreensão dos termos esquerda e direita, agora
cabe investigar para saber se acaso Trump e o GOP estão de
alguma forma aliados ao fascismo e ao nazismo; e, caso não
estejam, quem está. Não faz sentido começar com os vários
especialistas como Bill Maher, Chris Matthews, Michael Kinsley ou
Chris Hedges que, em sua própria forma vulgar, igualaram Trump a
Hitler. Parece óbvio que nenhum deles sabe nada sobre o fascismo
senão por tagarelices durante coquetéis. Típico disso é Matthews,
que chamou de “cheiro de fascismo” o fato de Trump ter demitido o
diretor do FBI, mesmo que o presidente tenha todo o direito de
substituir seu diretor do FBI, como Bill Clinton fez.4 Não mencionarei
os demais listados.
Mas as coisas tornam-se interessantes quando um grande
estudioso progressista do fascismo se envolve. Então, começo com
duas entrevistas do historiador Robert Paxton, autor da obra The
Anatomy of Fascism, seguidas de uma citação especialmente
reveladora desse livro. A primeira entrevista é com a âncora de um
programa de esquerda, Amy Goodman, que parecia bastante
incomodada por Trump haver retuitado uma citação de Mussolini. A
citação dizia: “É melhor viver um dia como leão do que cem anos
como ovelha”. Quando exigiram que se retratasse, Trump se
recusou. “É uma citação muito boa”, disse ele. “Que diferença faz se
foi Mussolini ou outra pessoa?”. Aqui está a marca registrada do
destemor de Trump. Ele acha a citação boa e se recusa a ser
assustado pela associação supostamente radioativa com Mussolini.
Paxton observa com ironia os comentários de Trump: “Eu o
considero tolerante demais com esse tipo de oratória política”. Em
outra parte da conversa, Paxton observa que, assim como Hitler,
“Não faz muito tempo, Trump era motivo garantido de boas
gargalhadas. Era visto como um bufão. Tudo o que você tinha de
fazer era mostrar o cabelo e chamá-lo de “Donald” e todo mundo
ria”.5 Segue-se, portanto, que a transição de bufão para poderoso
supostamente liga Trump ao fürhrer.
Em sua segunda entrevista, então com Isaac Chotiner da revista
Slate, Paxton fica mais enfático: “O uso de estereótipos étnicos e a
exploração do medo de estrangeiros vêm diretamente do livro de
receitas fascista. Fazer do país uma grande nação outra vez vez
soa exatamente como os movimentos fascistas. Preocupações com
a queda da nação, este era um dos estados emocionais mais
intensos evocados no discurso fascista, e Trump está o usando com
toda força. Uma política externa agressiva para barrar este suposto
declínio. Nada mais é que um golpe fascista”. Há muito aqui e vou
lidar com isso, mas gostaria de salientar que muitos outros
presidentes americanos já falaram sobre o declínio nacional,
prometeram restaurar o país e promoveram uma política externa
agressiva, sem serem acusados de terem lido o livro de receitas
fascista.
E então Paxton prossegue: “Li determinado relato que
absolutamente me surpreendeu, em que Trump chega a um
discurso enquanto sua audiência estava reunida em um hangar;
então ele pediu que o avião pousasse no campo, logo depois que
fosse feito o taxiamento até o hangar e só então saiu. Foi
exatamente o que fizeram em 1932 para a primeira vitória eleitoral
de Hitler. Suponho ter sido um acidente, mas, uau!, eis aí a
repetição quase perfeita de uma tática das eleições de Hitler”.
Perceba, Trump é culpado de usar das mesmas táticas eleitorais de
Hitler porque pousou dentro de um avião e por haver uma multidão
reunida no hangar o esperando? No lugar de apresentar conteúdo
ligando Trump ao fascismo, Paxton concluiu dizendo que Trump
“parece mesmo com Mussolini na forma de mexer o queixo”.6 Bom,
Paxton ao menos não comenta se Trump tem a mesma simpatia
pela comida italiana que Mussolini tinha.
Finalmente, volto-me para uma passagem do livro The Anatomy of
Fascism, em que Paxton, observando atenciosamente o colapso
dos regimes de Hitler e Mussolini na Segunda Guerra Mundial,
especula se o fascismo poderia vir para a América e, em caso
afirmativo, como seria sua aparência. “A linguagem e os símbolos
de um autêntico fascismo americano”, ele escreve, “teriam pouca
relação com os modelos europeus originais. Eles teriam de ser tão
familiares e de tal maneira encorajadores para americanos fiéis de
igual modo a linguagem e os símbolos dos fascismos originais eram
familiares e encorajadores a muitos italianos e alemães. Sem
suásticas no fascismo americano, mas com Estrelas, Listras, e
Cruzes cristãs. Nada de saudações fascistas, mas com recitações
em massa jurando lealdade”.7
Observe o que Paxton está comunicando nessa passagem e nas
duas entrevistas anteriores. Como bom progressista, ele está dando
aos canais da mídia esquerdista o que eles querem. Mesmo às
vezes rodeando sem saber muito bem o que dizer — em
determinado momento, ele percebe que o individualismo de Trump
não é inteiramente consistente com o fascismo —, ele ainda
confirma que Trump é, de modo geral, uma espécie de fascista e
protonazista. Em seguida, Paxton definitivamente liga o fascismo
com as exibições patrióticas da direita americana. Ele, no entanto,
não menciona limitações impostas sobre o governo ou sobre o
capitalismo, nem sobre nenhum dos principais aspectos que
definem o conservadorismo americano.
Em nenhum momento Paxton sugere haver algo a respeito de
Obama ou Hillary que espelhe o fascismo ou o nazismo. O fascismo
é um termo italiano que significa “agrupamento” [groupism] ou
“coletivismo”. Os fasci, na Itália, eram grupos de ativistas políticos
que pegaram seu nome dos fasces da Roma antiga — feixes de
varas carregados pelos lictores, simbolizando a força unificada dos
romanos. O significado central do termo fascismo é que as pessoas
são mais fortes como grupo do que como indivíduos.
Paxton certamente o sabe, mas acha melhor não mencionar. Na
verdade, ele não insinua nenhuma vez que o fascismo possa ser,
mesmo remotamente, um fenômeno da esquerda política. E, ao
longo dessas entrevistas, é impressionante perceber quão pouco
Paxton fala a respeito do que é de fato o fascismo. Ele não cita nem
ao menos um pensador fascista, nada que forneça a compreensão
fascista do próprio fascismo — tudo o que temos é a interpretação
progressista que parece avançar rapidamente a partir de algumas
poucas generalizações, como, por exemplo, o declínio nacional e o
patriotismo, para, depois, concluir resolutamente.
Mais uma vez, não estou dizendo que Paxton não possui um
conhecimento maior sobre o assunto. Seu livro mostra que possui.
Ele conhece os documentos relevantes; ele faz referência a eles e
está familiarizado com os intelectuais fascistas; ele os cita. É isso
que torna o seu desempenho tão intrigante. Embora tenha
conhecimento, Paxton está dialogando com pessoas ignorantes o
suficiente para confirmar os preconceitos delas ao mesmo tempo
que mantém sua erudição bona fides. No fim das contas, permita-
me dizer, Paxton está participando, conscientemente, da grande
mentira.
Desta forma, portanto, a grande mentira é disseminada:
acadêmicos astutos como Paxton estabelecem a base intelectual,
daí a mídia e Hollywood dizem: “Olhe, aqui está um sujeito que
realmente tem domínio sobre a área, confirmando que a nossa
posição política possui justificativa”. Estranho notar, a área de
Paxton não é o nazismo nem o fascismo italiano; é a França de
Vichy. Anthony James Gregor é a maior autoridade viva sobre o
fascismo, e Stanley Payne publicou não faz muito tempo seu livro
sobre a história do fascismo, obra definitiva da área. Entretanto, a
mídia progressista nunca os convida para entrevistas.
Por quê? Eis aqui uma citação direta da obra The Ideology of
Fascism [A Ideologia do Fascismo], de Gregor: “O movimento em si
não foi conservador. Foi revolucionário. Sua clara intenção era
destruir todos os artefatos sociais, econômicos e políticos do
liberalismo clássico”. E aqui está uma citação de Payne: “O núcleo
que, por fim, fundou o fascismo na Itália não decorreu dos
nacionalistas de direita, mas da transformação por parte da
esquerda revolucionária”.8 Na visão esquerdista, este é um ponto
bastante inconveniente. Logo, por que entrevistar Gregor ou Payne
quando eles provavelmente não darão base ao que a esquerda
tenta provar? É por isso que Paxton é financiado, porque ele esteve
disposto a participar desse joguinho. A esquerda lhe oferece
celebridade acadêmica, ele lhes diz o que querem ouvir. É assim
que funciona a grande mentira.
Em Palavras e em Atitudes
O fascismo não era conservador em sua inspiração, mas visava
criar uma nova sociedade com um novo tipo de ser humano.31
Walter Laqueur, Fascism: Past, Present, Future
Para chegar ao cerne de uma ideologia, é imperativo explorá-la na
teoria antes de explorá-la na prática. É por isso que comecei com
Gentile: ele explica com autoridade o estatismo e o coletivismo que
definem o fascismo e, inclusive, o nazismo. De Gentile, passamos
para as declarações doutrinárias e à agenda política do fascismo
italiano e do nacional-socialismo alemão. Estes também
representam o fascismo utópico, pode-se dizer “fascismo no
discurso”. Só então faz sentido examinar o que Mussolini e Hitler
realmente fizeram, pois o que fizeram foi, necessariamente, uma
aplicação daquilo que pretendiam originalmente realizar, mas com
adulterações e diluições já previsíveis. No discurso, o fascismo é,
necessariamente, comprometido com o fascismo da atitude.
Menciono essa distinção desde o princípio porque ela é que se
tornou a base para que os esquerdistas pudessem minimizar os
princípios fundamentais do fascismo, de modo a camuflar sua
semelhança — e, em alguns casos, seu relacionamento — com o
progressismo moderno. Mais uma vez, volto-me ao predileto
progressista, Robert Paxton, que, em suas entrevistas ao público
em geral, enfatiza que, embora o fascismo “soe bastante radical
quando no poder, ele se alia a bancos, indústrias, ao exército, às
igrejas e assim por diante”. Paxton também salienta que, “quando
você lê o programa de Hitler, seus vinte e um pontos, e quando lê o
primeiro programa de Mussolini, de 1919, percebe que ambos
tiveram pouquíssima relação com o que acabaram fazendo
afinal”.32 Paxton conclui que, apesar dos objetivos outrora
professados, o fascismo e o nacional-socialismo não podem ser
equiparados ao esquerdismo e ao progressismo, porque Mussolini e
Hitler não implementaram o escopo completo de suas ideologias.
Como contra-argumentação da minha tese, devo dizer que,
embora verdade, este é um ponto extremamente inconvincente.
Obviamente, toda teoria deve acomodar as realidades da situação;
fazê-lo não mina a teoria em sua posição de ser uma visão do modo
como as coisas deveriam ser. Lincoln posicionava-se contra a
escravidão, mas, se disposto a vencer a guerra, manter estados
fronteiriços na União era-lhe uma necessidade política.
Consequentemente, quando assinada, a Proclamação da
Emancipação foi aplicada apenas sobre áreas em rebelião contra os
Estados Unidos que ainda não haviam sido ocupadas pelo Exército
da União. Salientar isso não significa provar que Lincoln, na
verdade, não era contra a escravidão, uma vez que não a proibiu
por todo o país.
Para segundo exemplo, cito Lênin. Marxista e comunista
fervoroso, Lênin comprometeu-se a banir o capitalismo de toda a
União Soviética, e ele o fez. A economia soviética, no entanto,
entrou em colapso; assim, no início da década de 1920, ele próprio
consentindo, Lênin aceitou medidas capitalistas para resolver o
problema. Ele permitiu a propriedade privada, incluindo fazendas
privadas; ele permitiu que as empresas e os agricultores
mantivessem alguns dos seus ganhos; ele chegou mesmo a
incentivar o investimento por parte de empresas estrangeiras na
União Soviética. Lênin não entendeu sua Nova Política Econômica
como traição ao comunismo, mas a considerou uma forma de
estabilizar a economia e, também, de exercer controle político sobre
o país, para que assim pudesse verdadeiramente institucionalizar o
comunismo. Contudo, apesar de articular-se temporariamente para
longe do socialismo, alguém realmente poderia afirmar que Lênin
não foi um socialista?
Agora, voltemo-nos para Mussolini, que, na teoria, era um
estatista completo. Uma das frases favoritas de Mussolini era “Tudo
no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”.33 Aqui,
ouvem-se os ecos de Gentile e também os ecos de um
progressismo esquerdista moderno levados às últimas
consequências. Mussolini, em outras palavras, parece dizer aquilo
que vai ao encontro das fantasias secretas do progressista
moderno. Mussolini levava o estatismo tão ao extremo que, atrevo
dizer, chegava a ser mais estatista do que Barack Obama, mesmo
quando este confessou ao New York Times que invejava os líderes
comunistas chineses quanto à extensão de seus poderes.34
Mussolini era tão estatista que considerava positivo o termo
“totalitário”. Para Mussolini, a palavra não significava o que Orwell
retrata em 1984. Mussolini não tinha a intenção de esmagar o povo
italiano com um coturno. Em vez disso, o totalitarismo, para ele,
significava que o Estado cuidaria de tudo e de todos. Mussolini
buscava uma Itália em que o Estado — encarnado nele — viria a
exercer controle total sobre todos os aspectos da vida dos cidadãos.
Mussolini, contudo, nunca teve o coração para ser
verdadeiramente totalitário. Em parte porque era ele, bom, vejamos,
italiano. Seu totalitarismo sempre foi italiano, ou seja, meia-boca.
Ele meio que prendia seus oponentes, ele meio que controlava a
mídia, e meio que tinha um Parlamento em suas mãos, mas lhe
faltava o escrutínio que caracterizava seus mais sombrios
companheiros totalitários, Stalin e Hitler. Ao longo de seu reinado de
vinte anos, Mussolini matou poucos de seus próprios cidadãos e
permitiu que as pessoas, incluindo os judeus, deixassem a Itália.
Stalin e Hitler nunca sonhariam em permiti-lo. Que tipo de controle
totalitário se pode ter sobre as pessoas se elas forem livres para
arrumar suas coisas e dizer saionará?
Muito embora o totalitarismo de Mussolini fosse um tanto
anêmico, não o foi seu socialismo. A agenda original dos fascistas,
tal como delineada em Fasci di Combattimento em Milão, em 1919,
incluía sufrágio universal, redução da idade de voto para dezoito
anos, abolição do senado elitista, obrigatoriedade das oito horas por
dia trabalhadas, programa extenso de serviços públicos,
participação dos trabalhadores na gestão industrial, nacionalização
dos órgãos de defesa, direito a seguro-saúde e pensão por velhice
para todos os cidadãos, confisco estatal de terras não cultivadas,
tributação progressiva, imposto de 85% sobre os lucros da guerra e
fortes políticas anticlericais, incluindo a exclusão da instrução
religiosa nas escolas e apropriação governamental da propriedade
de instituições religiosas.
Mussolini foi capaz de decretar parte dessa agenda, em particular
um programa de serviços públicos, incomparável para a Europa da
época. Os fascistas construíram pontes, canais, estradas, estações
ferroviárias, escolas, hospitais e orfanatos. Drenaram pântanos,
recuperaram terras, plantaram florestas, legaram universidades e
institutos de pesquisa. Mussolini também expandiu os serviços
sociais num programa que, confessou ele com franqueza,
equiparava-se ao New Deal de Franklin D. Roosevelt, até mesmo
chegando a superá-lo. (Mais sobre isso será explorado em um
capítulo posterior). Mesmo assim, apesar de tudo, grande parte do
programa socialista original de Mussolini permaneceu na gaveta.
A razão para tanto é que Mussolini, ao contrário de Hitler e Stalin,
nunca teve poder absoluto. Ele foi nomeado pelo rei Vítor Emanuel
III, que também tinha o poder para depô-lo, decisão que viria por fim
a tomar. Ainda que governando, Mussolini tinha de trabalhar com as
estruturas de poder existentes, incluindo membros da classe
dominante tradicional. Embora detestasse a Igreja Católica,
Mussolini entendeu que lhe fazer oposição tornaria seu governar
mais difícil; então, em 1929, ele entrou em concordata com o
Vaticano, acordo que exigiu de Mussolini sua abdicação do controle
absoluto sobre o sistema educacional.
O poder de Mussolini alternava entre altos e baixos, dependendo
das circunstâncias. Ele não era o governante absoluto da Itália
quando chegou ao poder, mas depois que Giacomo Matteotti,
político socialista, foi assassinado por fascistas, Mussolini fez a
aposta arriscada e bem-sucedida de assumir o controle ditatorial.
Mussolini evidentemente estava no auge de seu poder durante
meados da década de 1930, de modo que, durante esse período,
assegurou que o Estado tivesse controle sobre todas as atividades
industriais e sobre praticamente todas as finanças e o crédito. No
entanto, uma vez aliado à Alemanha, Mussolini teve de, novamente,
operar dentro da estrutura estabelecida por Hitler. Conforme mais
adiante neste livro, Mussolini abraçou parcialmente um racismo e
um antissemitismo nos quais ele não acreditava de fato e que não
caracterizavam sua carreira quando ele próprio estava à frente das
tomadas de decisão.
Em 1943, as forças dos Aliados pisaram na Itália. Por meio da
ação do rei e do Grande Conselho do Fascismo, Mussolini foi
deposto do poder. Hitler, entretanto, resgatou-o do cativeiro e
restabeleceu-o, então na posição de governante em Saló, ao norte
da Itália, território este que, na época, estava sob controle alemão.
Lá, por breve período, Mussolini pôde fazer o que bem entendesse;
ele era independente.
Daí, o que Mussolini fez? Fundou, como ele mesmo disse, o único
governo genuinamente socialista do mundo, com a possível
exceção da União Soviética.35 Mussolini tentou implementar o que
ele chamou de “verdadeiro socialismo”, afirmando que “elementos
plutocráticos e partes do clero” o impediram de antes implementá-lo
na Itália.
Em Saló, Mussolini esboçou um programa socialista que ia mais
além de tudo aquilo que ele já havia tentado implementar na Itália. O
novo programa de novembro de 1943 exigiu que o Estado
controlasse todas as partes críticas da economia — energia,
matérias-primas, todos os serviços sociais mais essenciais —,
deixando apenas poupanças privadas, casas e bens próprios nas
mãos do cidadão. O setor público deveria ser administrado por
comitês de gestão em que os trabalhadores teriam papel
fundamental. Os sindicatos também faziam parte do corpo
legislativo fascista.
O passo seguinte, declarou o conselheiro de Mussolini, Ugo
Spirito, seria abolir toda a propriedade privada. Estranho dizer, o
conselheiro mais próximo de Mussolini em Saló era Nicola
Bombacci, amigo e discípulo de Lênin que, em 1921, foi cofundador
do Partido Comunista Italiano. O período de Mussolini em Saló,
embora de curta duração, prova que ele nunca abandonou seus
ideais esquerdistas originais. Ele, até o último momento, manteve-se
estadista, coletivista e socialista ferrenho.
O Programa Nacional-Socialista
Existe em Hitler, também, um socialista aplicado que, pouco
depois de assumir a liderança do Partido dos Trabalhadores
Alemães, mudou o nome deste para Partido Nacional-Socialista dos
Trabalhadores Alemães (PNSTA). Com declaração após declaração,
Hitler não poderia ter sido mais claro sobre seus compromissos
socialistas. Ele disse, por exemplo, num discurso de 1927, que
“Somos socialistas. Somos inimigos do sistema de exploração
capitalista atual [...] e estamos determinados a destruir tal sistema
sob a condição que for”.36
De início, o Partido Nazista ofereceu um programa que consistia
em vinte e cinco pontos, incluindo a nacionalização das grandes
corporações e dos fideicomissos, controle estatal sobre bancos e
crédito; a apreensão de terras sem compensação para uso público,
a divisão de grandes propriedades para formar unidades menores, o
confisco dos lucros de guerra; incluía também acusar banqueiros e
outros credores por usura, a abolição dos rendimentos mediante
serviço não declarados, a participação dos trabalhadores nos lucros
em todas as grandes empresas, um sistema de pensão mais
abrangente, prestando maiores benefícios, e um sistema de saúde e
educação gratuitos para todos.
Lendo o programa nazista inconsciente das fontes, seria
facilmente perdoável confundi-lo com o programa do Partido
Democrata de 2016 ou mesmo com alguma plataforma democrata
elaborada conjuntamente por Bernie Sanders e Elizabeth Warren. É
claro que um pouco da linguagem está desatualizada. Os
democratas não podem falar sobre “usura” nos dias de hoje; eles
teriam de substituir esse termo por “a ganância de Wall Street”. Seja
como for, está tudo lá. Tudo o que precisa fazer é riscar a palavra
“nazista” e escrever, em seu lugar, o termo “democrata”.
Progressistas como Paxton, que reconhecem o conteúdo
esquerdista do programa nazista, tentam distanciá-lo de Hitler,
associando-o a uma suposta facção de esquerda dentro do Partido
Nazista, o qual Hitler viria a eliminar mais tarde. Essa facção foi
liderada pelos irmãos Strasser, Otto e Gregor. Otto Strasser foi
expulso do Partido Nazista em 1930 e exilado na Checoslováquia.
Gregor Strasser foi morto por ordens de Hitler em 30 de junho de
1934, durante a Noite das Facas Longas.
Os Strassers, contudo, escreveram o programa nazista original
em parceria com o próprio Hitler. Os irmãos foram figuras-chave no
Partido Nazista durante a década de 1920. O partido expulsou Otto
Strasser por causa de suas ameaças de fundar seu próprio partido
dissidente, o que acabou por fazer. Gregor Strasser repudiou
publicamente seu irmão e permaneceu no Partido Nazista. Hitler
nomeou-o chefe do partido nas regiões norte e ocidental da
Alemanha; lá, tornou-se o segundo com maior autoridade,
permanecendo abaixo apenas do próprio Hitler, que em nenhum
momento repudiou os princípios que ele mesmo e os irmãos
Strasser avançaram desde o início.
Sendo assim, por que Hitler matou Gregor Strasser? Uma pista
pode ser encontrada nos escritos de Joseph Goebbels, aliado íntimo
de Strasser, que se tornou o confidente de Hitler e ministro da
propaganda. Num dos registros de seu diário, Goebbels fez uma
pergunta simples sobre o nacional-socialismo: “O que é prioridade e
o que vem em segundo lugar?”. Goebbels responde: “Em primeiro
lugar, vem o socialismo; depois, então, a libertação nacional”.37
A resposta de Hitler foi o oposto: primeiro vem a libertação alemã
e depois, então, o socialismo. Goebbels, atraído pela pessoa de
Hitler, sucumbiu às prioridades dele. Gregor Strasser não, criticando
Hitler por trair o socialismo revolucionário, mesmo tendo Hitler
assegurado que o socialismo viria depois que a Alemanha
consolidasse seu poder militar. Strasser não estava persuadido. Em
última análise, Hitler ficou cansado das críticas de Strasser e o
executou, eliminando um rival perigoso para o processo em
andamento.
Strasser acreditava que Hitler poderia ter tanto o nacionalismo
quanto o socialismo, pois, ao contrário de Mussolini, Hitler
desfrutava de poder quase absoluto para fazer o que quisesse. No
entanto, o que Hitler desejava fazer, antes das demais coisas, era
começar uma guerra. Em essência, seu objetivo era: em primeiro
lugar, subjugar a Europa, ou ao menos a maior parte dela; em
segundo lugar, expulsar ou eliminar os judeus; e, em terceiro lugar,
implementar o socialismo na Alemanha enquanto institucionalizava
a subordinação e a escravidão para todos os demais povos. A visão
de Hitler era a de que o socialismo seria bom demais para qualquer
povo que não fosse verdadeiramente ariano; consequentemente, ele
não estava prestes a institucionalizar o socialismo antes de realizar
suas duas primeiras tarefas.
Assim, Hitler também fez um acordo com o Vaticano e tentou
apaziguar-se com os cristãos. Ele precisava do apoio de católicos
bávaros e luteranos espalhados pela Alemanha. Hitler também
precisava de grandes negócios, tanto para manter a economia
alemã acelerada como para fornecer-lhe o vasto estoque de
materiais de guerra, sabendo que precisaria disso sob o objetivo de
invadir a Europa Oriental, a França e a Rússia. Hitler alcançou seu
objetivo de colocar praticamente todos os setores da economia sob
o controle do Estado. Ele lançou enormes conglomerados estatais,
como o Reichwerke Hermann Göring, mas também adiou vários
outros objetivos do programa nazista. Esse adiamento e suas
pechinchas com velhos inimigos de modo nenhum prova que ele
deixou de ser socialista ou um verdadeiro nazista. À semelhança de
Lincoln, Hitler tinha uma guerra que vencer com sucesso, para
realizar por completo suas ambições originais.
No entanto, para Hitler, ao contrário de Lincoln, a guerra não
terminou bem. Assim, o fascismo e o nazismo, então ainda em
1945, acabaram numa pilha de cinzas da História. Levou muito mais
tempo para o comunismo soviético entrar em colapso. Pode-se ver,
nesses dois exemplos, uma lição desanimadora para a esquerda
americana moderna. O coletivismo parecer ter sido testado duas
vezes e provado em ambas ser um fracasso. Mas não é bem essa
toda a verdade. O comunismo soviético foi testado e falhou por sua
própria conta. Já o fascismo e o nazismo, entretanto, foram
destruídos pelo lado de fora, pela guerra.
Consequentemente, pode-se dizer que, como planos ideológicos
para a sociedade, o fascismo e o nacional-socialismo ainda não
fracassaram, porque nunca foram completamente experimentados.
No progressismo moderno, portanto, vê-se uma tentativa de
reavivamento e ressurreição. Obviamente, este avivamento deve
estar sob um nome diferente, e a esquerda certamente precisará de
alguma camuflagem antifascista. (Vejam, não temos nenhum
fascista por aqui! Você não percebe que estamos lutando contra o
fascismo?) Mesmo assim, para pessoas que sabem como
reconhecê-los, a esquerda de hoje ainda é o partido do fascismo e
do nacional-socialismo, velhas ideologias marchando agora em um
diferente continente sob novas cores e diferentes roupagens; um
fascismo para o século XXI.
Capítulo Três
A Jornada
de Mussolini
A Crise do Marxismo
O fascismo surgiu da profunda crise enfrentada pelo marxismo no
início do século XX. Portanto, partamos dela. Lembre-se de que
Marx não pediu que os trabalhadores do mundo se levantassem e
se rebelassem contra a classe burguesa ou capitalista. Em vez
disso, ele previu que isso aconteceria. Marx se via como uma
espécie de profeta, predizendo o que viria a acontecer. Para Marx,
não importava se alguém fosse a favor do comunismo ou contra ele;
de qualquer forma, a chegada do comunismo seria inevitável.
Como sabia disso? Marx era um materialista histórico. Ele não
recebeu suas profecias de Deus; ele as recebeu por meio do estudo
daquilo que ele considerava ser os fundamentos materiais da
História. De acordo com Marx, a História é dividida em duas classes:
a classe trabalhadora, ou o proletariado, e a classe capitalista, ou a
burguesia. Em essência, a classe capitalista torna-se rica ao
explorar continuamente a classe trabalhadora. Portanto, é previsível
que, em dado momento, este conflito fique tão severo que seja
inevitável a derrubada revolucionária da classe capitalista por parte
dos trabalhadores.
Marx considerava seu trabalho “estritamente científico” e,
também, “estritamente realista”. Seu ajudante, Engels, falou das
“leis gerais do movimento”. Marx e Engels alegaram saber até as
condições precisas em que essa revolta ocorreria. Primeiro,
aconteceria nos países capitalistas mais avançados.
Especificamente, Marx esperava que o comunismo chegasse
primeiramente à Alemanha ou à Inglaterra. Em seguida, ele
esperava que se espalhasse para outros países europeus e,
finalmente, por todo o mundo. Em segundo lugar, Marx insistia que
os sinais de uma revolução iminente seriam o crescente
empobrecimento da classe trabalhadora e a crescente alienação de
seus empregadores e da sociedade.
Parece meio cômico, em retrospecto, que pessoas altamente
inteligentes aceitaram toda essa ladainha marxista — os
pressupostos infundados, o pretensioso absurdo verborrágico —
como um evangelho. Mas é certo que assim a acolheram. Contudo,
no início do século XX, tornou-se óbvio para a maioria das pessoas
— até mesmo para muitos marxistas — que nada do que Marx havia
previsto estava realmente acontecendo. Não só não havia sinais de
revolução na Alemanha ou na Inglaterra, mas também as classes
trabalhadoras nessas nações pareciam cada vez melhores e com
notória estabilidade.
Por exemplo, na Alemanha e na Inglaterra, a renda per capita,
ajustada pela inflação, praticamente dobrou no ínterim entre as
previsões de Marx e o início do século XX.7 Em suma, a barganha
capitalista parecia estar funcionando; o proletariado e a burguesia
estavam se dando muito bem. O socialismo parecia ainda menos
provável na América, escreveu Werner Sombart, economista
alemão, porque todos estavam muito confortáveis. Nas palavras de
Sombart, todas as utopias revolucionárias falham quando se trata de
ter carne assada e torta de maçã que pôr no prato.
A crise do marxismo pode ser percebida em uma única carta
escrita por Eduard Bernstein, alemão exilado na Inglaterra, pupilo e
protegido mais próximo de Engels. Já em 1898, Bernstein escreveu:
“Tentei, ao estender os ensinamentos marxistas, deixá-los de acordo
com as realidades práticas [...] Mas, em terminada minha atuação,
disse a mim mesmo — isso não pode continuar. É inútil tentar
conciliar o irreconciliável. É preciso esclarecer com exatidão onde
Marx está certo e onde ele está errado”.8
A necessidade de revisões fundamentais no marxismo tornou-se
ainda mais óbvia nas primeiras décadas do século XX. Em 1917,
houve uma revolução comunista, mas, entre todos os lugares
possíveis, ela ocorreu na Rússia, um dos países menos
desenvolvidos da Europa. Para os marxistas, aquela revolução
sobreveio de surpresa. Marx insistia que a revolução na Rússia, na
Ásia ou na África eram impossíveis sem que essas regiões
passassem por etapas do desenvolvimento capitalista. A trajetória
histórica de Marx passou do feudalismo ao capitalismo e, então, ao
comunismo. Em outras palavras, é preciso tornar-se capitalista
antes de tornar-se comunista.
Não menos do que os outros poderiam ver, os marxistas
perceberam que a revolução russa não foi uma revolta do
proletariado contra uma classe capitalista, mas uma operação militar
organizada por revolucionários profissionais contra uma ditadura
czarista. Os revolucionários não eram da classe trabalhadora, mas
principalmente provenientes da intelligentsia — advogados,
jornalistas, ativistas sociais. Não era o que Marx havia previsto.
Quanto ao tipo de revolução que Marx previu, a revolta da classe
trabalhadora, nunca houve uma revolução que fosse proletária em
qualquer sentido inteligível do termo.
Como os marxistas reagiram a esses acontecimentos
surpreendentes e, para eles, inclusive, perturbadores da História? A
maioria dos partidos marxistas oficiais na Europa reagiu feito gado,
de uma estupidez bovina. O marxismo caiu em uma espécie de
torpor intelectual. Muitos da liderança marxista basicamente
ignoraram o mundo como tal e continuaram a esperar o mundo
como ele deveria ser. Karl Kautsky e Rosa Luxemburg foram líderes
influentes do Partido Social-Democrata alemão, o principal partido
socialista do mundo, e mais tarde do Partido Social-Democrata
Independente da Alemanha. A posição deles era que a revolução
realmente chegaria à Alemanha, assim que as condições
estivessem maduras.
No entanto, como Eduard Bernstein, muitos dos marxistas e
socialistas mais inteligentes reconheceram que se tratava de um
sonho socialista. As condições em toda a Europa estavam ficando
menos maduras. A cada década, a condição de vida dos
trabalhadores melhorava consideravelmente. E como explicar a
Rússia? Marx ficaria chocado. Então um grande debate surgiu entre
os marxistas, socialistas e esquerdistas, daí surgindo duas novas
tensões do socialismo marxista, que dominariam o novo século. A
primeira era o bolchevismo, ou leninismo. A outra era o fascismo, ou
nacional-socialismo.
Comecemos por Lênin, líder revolucionário da revolução russa.
Lênin era, tal qual Mussolini, um revolucionário intelectual e também
revolucionário prático. Ele, como Mussolini, começou no socialismo
marxista ortodoxo e permaneceria, até o fim de sua vida, leal à
essência da doutrina marxista. No entanto, Lênin sabia que também
deveria explicar por que o comunismo havia chegado à Rússia, mas
não aos países capitalistas avançados como a Alemanha ou a
Inglaterra.
Sua explicação, oferecida em seu livro chamado O Imperialismo:
Fase Superior do Capitalismo, é engenhosa. Basicamente, Lênin
argumenta que o capitalismo havia “exportado” sua própria crise,
através do colonialismo e do imperialismo, para o Terceiro Mundo.
Em outras palavras, os capitalistas no Ocidente estavam
subornando sua classe trabalhadora ao explorar os pobres em
outros países. Isso, argumenta Lênin, não foi algo que Marx previu.
Por conseguinte, Lênin afirma, não deveríamos esperar uma
revolução na principal metrópole do capitalismo, na Europa
Ocidental, mas sim na periferia. A Rússia era simplesmente o
primeiro caso de revoluções socialistas ocorrendo pelo mundo
subdesenvolvido previstas por Lênin.
Além disso, ele sabia que sua revolução bolchevique não era uma
revolução da classe trabalhadora. Ele percebeu não haver registros
disso, exceto a partir de uma revisão de Marx. Em seu livro mais
famoso, Que Fazer?, Lênin insiste que Marx havia sido muito
complacente em esperar que a revolução ocorresse por si só. De
certo modo, Marx havia depositado confiança demais nos
trabalhadores. Lênin os considerava ignorantes e oprimidos demais
para dar início ao que quer que fosse.
Segundo Lênin, as revoluções futuras exigiriam uma vanguarda
profissional de combatentes militantes, lideradas por pessoas como
ele, para instigar a consciência de classe na sociedade e derrubar a
classe dominante em nome da classe trabalhadora. Esses militantes
não precisavam ser proletários; eles poderiam ser intelectuais,
artistas, até membros da burguesia. No dizer do cientista político
Joshua Muravchik, do ponto de vista de Lênin “a revolução
proletária não precisava ser realizada por proletários; ela poderia ser
realizada em favor deles”.9
No final das contas, Lênin esperava que as coisas se tornassem
bem parecidas com o que Marx havia previsto. Lênin concordava
com Marx sobre a revolução comunista ser um evento internacional.
Por fim, ela seria um fenômeno mundial. Além disso, seria dirigida
pelas diferenças de classes, vistas em todos os países. Assim, o
comunismo não pode ficar restrito a um único país; de fato, como
Marx disse certa vez, o operário não tem país.
Lênin também esperava que, quando a revolução finalmente
ocorresse, o próprio Estado desapareceria. Este foi o tema central
de seu livro O Estado e a Revolução, no qual ele previa que da
revolução do proletariado seguiria uma ditadura do proletariado, a
qual, por sua vez, seria seguida do desaparecimento completo de
qualquer tipo de Estado. Em outras palavras, na utopia comunista,
todos na sociedade possuirão conjuntamente os meios de produção
e não haverá a necessidade de um Estado.
Esse pequeno pedaço de artifício ideológico marxista fica
especialmente risível quando é posta sob consideração a União
Soviética de Lênin, com seu Estado militarizado e inchado,
confiscando a riqueza do povo e governando com um cetro de ferro
sobre sua vida. À medida que desprezava o povo russo em nome da
ideologia socialista, Lênin, em total insensatez, continuava a prever
o desaparecimento de todo o aparelho do Estado comunista.
Nota-se que as inovações de Lênin sobre o marxismo não foram
bem recebidas pela principal corrente dos marxistas europeus,
como Kautsky e Luxemburgo, que o acusaram de corromper os
ensinamentos marxistas e minar toda a lógica do próprio marxismo.
Lênin não se importou, afinal sabia que ele próprio representava o
futuro. O leninismo sobreviveria à “crise do marxismo” e mudaria o
mundo. E o que aconteceu com Kautsky e Luxemburgo? Ele
desapareceu nos arquivos mofados da história marxista e ela foi
feita nota de rodapé — executada pelo regime de Weimar, em 1919,
por ter se associado a uma insurreição armada que por fim
fracassou.
Na Itália, um homem de temperamento muito semelhante ao de
Lênin, não menos cruel e prático, ponderava sobre a mesma crise
que o déspota soviético. Ele estava acompanhado nessa busca por
todo um movimento de socialistas revolucionários, sobretudo na
Itália, mas também na França e na Alemanha. Eles chegariam a
conclusões bem diferentes da de Lênin e vislumbrariam um tipo de
futuro socialista bastante distinto. Mesmo assim, juntos, lançaram
um movimento, o fascismo, que rivalizaria com o comunismo
soviético em seu alcance global e trágica destruição.
A Síntese Fascista
De um lado, na Itália, os nacionalistas faziam lobby pela lealdade
socialista tendo por base a etnia, de outro, na Alemanha, um grupo
buscava a unidade socialista com base na raça. Bom representante
desse grupo foi o marxista Ludwig Woltmann, que procurou integrar
o materialismo científico de Marx à ciência evolucionista de
Darwin.15 Woltmann basicamente argumenta que a luta darwinista
por sobrevivência não ocorre entre criaturas individuais, mas —
dentro das comunidades humanas — entre as raças. Esse
Rassenkampf, ou conflito racial, como ele propôs, naturalmente
resultaria no triunfo das raças superiores e na eliminação das raças
inferiores.
Woltmann foi uma das inspirações para a origem do nacional-
socialismo de Hitler. Note que, desde o princípio, o nacional-
socialismo alemão, por tornar a raça primária — fazendo frente à
fidelidade pela nação —, difere do fascismo italiano. Interessante
também perceber que o progressismo americano moderno obcecou-
se pela raça. Hoje, se alguém propor a remoção de categorias
raciais do censo, a oposição mais ferrenha provavelmente virá dos
progressistas, os quais fazem eco ao que Cornel West coloca no
título de um de seus livros, Race Matters [A Raça é Fundamental].
Mussolini não teria concordado com isso, mas Woltmann sim, como
qualquer outro membro devoto do Partido Nazista.
Mussolini não acreditava em raça, nem era ele a princípio
nacionalista; na verdade, ele era um sindicalista revolucionário. O
termo sindicalismo refere-se às associações ou sindicatos a que os
trabalhadores pertenciam. Eram organizações de trabalhadores
autônomos que, embora se assemelhassem a tais, não eram
sindicatos, porque estes eram organizados regionalmente, e não por
corporação ou função e cargo. Marxistas devotos que eram, os
sindicalistas revolucionários concordavam com Marx em que a
primazia pertencia às associações de classe e que elas deveriam
ser o princípio organizador da revolução socialista.
Muito em consonância com essa ênfase na classe, conceito tão
importante para Marx, os sindicalistas, fortemente influenciados por
Sorel, procuraram reunir os sindicatos trabalhistas através de uma
greve geral que derrubaria a classe dominante e estabeleceria o
socialismo na Itália. Foi isso que fez deles “revolucionários”. Eles
pretendiam fomentar a revolução, não a esperar acontecer. Eles
foram considerados as pessoas mais inteligentes e dedicadas do
Partido Socialista Italiano e ocuparam sua ala esquerdista.
Os grandes nomes do sindicalismo revolucionário foram Giuseppe
Prezzolini, Angelo O. Olivetti, Arturo Labriola, Filippo Corridoni,
Paolo Orano, Michele Bianchi e Sergio Panunzio. A maioria deles
era de escritores ou dirigentes sindicais. Todos eram socialistas e,
em pouco tempo, todos se tornariam fascistas, apesar de Labriola
ter se oposto ao regime de Mussolini quando este chegou ao poder,
e Corridoni, morto na Primeira Guerra Mundial, não ter vivido para
presenciá-lo.
Eles reconheciam Mussolini como seu líder. Ele os conhecia bem
e conspirava com eles em reuniões e comícios. Ele lia seus livros e
artigos, além de contribuir publicando em revistas criadas e
organizadas por eles, como a Avanguardia Socialista, fundada por
Labriola, principal periódico do pensamento sindicalista. Mussolini
também analisou e publicou os principais sindicalistas em suas
próprias editorações de nicho socialista.
Concordes com todos os demais socialistas revolucionários, os
sindicalistas tinham pouca fé em procedimentos parlamentares
democráticos e, de acordo com Sorel e Lênin, buscavam por um
líder carismático, alguém que inspirasse os trabalhadores à ação, à
atitude. Mussolini, mais do que qualquer outra pessoa, encaixava-se
nos requisitos, este quem liderou os sindicalistas em uma união com
os nacionalistas a fim de formar o novo híbrido socialista, chamado
de fascismo na Itália e (com algumas modificações) de nacional-
socialismo na Alemanha.
Os sindicalistas organizaram três greves gerais na Itália, a saber,
em 1904, em 1911 e em 1913. Mussolini as apoiava. A greve de
1904 começou em Milão e se espalhou por todo o país. Cinco
milhões de trabalhadores abandonaram seus empregos. A nação
ficou paralisada: não havia transporte público, ninguém conseguia
comprar nada. Mesmo assim, a greve terminou sem causar a queda
do governo ou a instauração do socialismo.
O próprio Mussolini organizou a segunda greve geral, em 1911,
em especial por tratá-la na forma de protesto contra a guerra que a
Itália travou com a Líbia. Outro fracasso e Mussolini foi preso por
cinco meses. No ano seguinte, Filippo Corridoni, compatriota de
Mussolini, tentou outra greve geral, que, novamente, foi mais um
fracasso. Tantas tentativas seguidas de fracasso fizeram com que
Mussolini e seus companheiros sindicalistas, desistindo do princípio
de classes do socialismo e do conceito de greve geral, olhassem
para nacionalistas como Corradini, Rocco e Michels, visando daí
uma melhor abordagem.
Da colaboração dos sindicalistas e nacionalistas surgiu a nova
síntese fascista, que substituiu a categoria marxista tradicional de
classes pela então nova categoria, a de uma nação. A luta
revolucionária, doravante, não seria uma guerra de classes, mas
uma batalha que diria respeito à nação. A guerra revolucionária não
seria uma luta entre as classes — ricos e pobres —, mas uma luta
de nações ricas contra nações pobres, em que as nações
proletárias derrubariam a hegemonia dos países plutocráticos. Com
efeito, o mito da greve geral foi substituído pelo mito da guerra
revolucionária, uma guerra que os fascistas conceberam como uma
“guerra de redistribuição”.16
À primeira vista, pode parecer que o conceito de guerra colonial,
ou mesmo mundial, vá diretamente contra Marx. Mas como Angelo
O. Olivetti — sindicalista que passou ao fascismo, mas depois, por
mais curioso que pareça, ao judaísmo — salientou, o próprio Marx
havia apoiado o colonialismo como mecanismo necessário ao
desenvolvimento de países atrasados. Além disso, tanto Marx
quanto Engels não hesitaram em promover os interesses alemães
— ambos apoiaram a guerra nacionalista de Bismarck contra a
França e suas reivindicações petulantes contra a Rússia czarista.
Após a morte de Marx, Engels apoiou a anexação de Schleswig,
que fazia parte da Dinamarca, pela Alemanha. Os fascistas
enfatizaram tudo isso como forma de salientar que seu nacionalismo
era consistente com o marxismo e que eles permaneceram, no fim
de tudo, bons socialistas.
A síntese fascista não considerava a Itália uma sociedade dividida
pelo conceito de classe, mas sim um país unificado no qual todos os
setores da sociedade poderiam unir-se. Os fascistas substituíram a
antiga divisão marxista entre capitalistas improdutivos e trabalho
produtivo pela categoria única de nação produtiva. Mussolini a isso
deu o nome de Fascio Nazionale, uma união nacional. “Tornamo-
nos”, disse Mussolini, “e permaneceremos uma nação de
produtores”.17 Já se podia vislumbrar, ainda na Itália, a fusão que
mais tarde daria ao fascismo de Hitler seu nome distintivo. Quando
combinadas as duas ideias de “nação” e “socialismo”, o resultado é
o nacional-socialismo.
Mussolini nunca usou o termo “nacional-socialismo” e, indignado,
o repudiou quando este foi associado a Hitler e à Alemanha nazista.
Não obstante, Mussolini havia criado o primeiro nacional-socialismo,
e despojado das conotações raciais alemãs. Sua era a visão de uma
nação organizada aos moldes socialistas, uma nação em que todos
partilhariam dos benefícios e em que todos contribuiriam com a sua
devida parte. Essa linguagem, é claro, carrega traços de Obama;
vê-se uma congruência óbvia entre a unificação fascista e a
insistência progressista moderna de que a América é uma
comunidade única e que todos devem se unir para cada um
contribuir com sua própria “parcela justa”.
Por fim, a síntese fascista acrescentou o novo elemento do
Estado como braço executivo encarregado de definir e defender o
bem geral da nação. Esse é o ponto em que Giovanni Gentile,
discutido no capítulo anterior, emergiu como principal filósofo do
fascismo. Gentile foi o grande apóstolo do Estado centralizado. Para
ele, o Estado era a nação e a nação era o Estado. A identidade e o
bem-estar estão todos subordinados à nação, mas também sob a
vara do todo-poderoso Estado centralizado. Entendo por que
Mussolini adorava tudo isso; ele compreendeu que era aquela a
base intelectual para, bem, ele próprio.
Marx, lembremos, havia predito o desaparecimento do Estado.
Estranho notar, da mesma forma Lênin. Mas, longe de desaparecer,
o Estado expandiu-se e ampliou-se num monstro totalitário sob ele.
Não bastando, sua teoria continuava a invocar o desaparecimento
do Estado. Nesse sentido, o fascismo é a primeira ideologia de
esquerda do século XX a afirmar explicitamente a necessidade de
um poderoso Estado centralizado. Em meados da mesma época, no
entanto, e derrotados pelos fascistas por um fio, na América uma
ideologia estreitamente relacionada se desenvolvia, pedindo
também um poderoso Estado centralizado. Essa ideologia era,
naturalmente, o progressismo.
Os fascistas, assim como os progressistas, buscavam uma
transformação radical da sociedade, que é a própria antítese do
liberalismo clássico ou do conservadorismo americano moderno. A
única revolução com a qual os conservadores americanos se aliam
é a revolução americana, a revolução que estabeleceu o capitalismo
burguês, coisa que os fascistas e os progressistas procuram
transformar e derrubar. As raízes do fascismo expõem por completo
a conexão existente entre o fascismo e a esquerda política dos
Estados Unidos, e também a antítese entre o fascismo e a direita
política dos Estados Unidos.
Fascistas e progressistas, ambos enxergavam no Estado
centralizado o desenvolvimento lógica de tudo o que eles
representavam. O problema não é falar sobre a nação dos
produtores e os interesses da nação, mas quem decide quais são
seus verdadeiros interesses? Os socialistas afirmam ser a favor da
redistribuição equitativa da renda e da riqueza, mas quem determina
o que é equitativo e quem faz a verdadeira redistribuição? A essas
perguntas, os fascistas responderam: nós determinamos, por meio
do instrumento do poderoso Estado centralizado. E essa também é,
na América, a resposta que os progressistas de hoje dão.
Além disso, os fascistas adotaram uma política econômica
estritamente paralela e, em muitos demais aspectos, também
idêntica ao progressismo atual. A essa política Mussolini deu o
nome de “corporativismo”, mas um termo mais descritivo seria
capitalismo estatal. Mussolini imaginava um poderoso Estado
centralizado dirigindo as instituições do setor privado, fazendo com
que, à força, a prosperidade privada deste fosse posta em
consonância com a prosperidade nacional. Não é exatamente assim
que os progressistas consideram o controle do governo federal
sobre bancos, companhias financeiras, companhias de seguro,
plano de saúde, energia e educação? Embora a esquerda
americana de hoje não se atreva a invocar o nome de Mussolini,
aquele que no meio dela for honesto terá de admitir que Mussolini e
seus companheiros fascistas é que foram os precursores da
esquerda americana atual; foram aqueles que lhe abriram o
caminho.
Capítulo Quatro
Um Segredo do
Partido Democrata
Os Campos de Escravos
e os Campos Nazistas
Agora passemos da remoção indígena para a escravidão. À
primeira vista, parece difícil comparar uma fazenda de escravos
americana do século XIX com os campos de concentração alemães
do século XX. Estes eram criações industriais modernas, aqueles
pareciam ecos antiquados de uma era passada. No entanto, em
1959, o historiador Stanley Elkins revolucionou a história comparada
de ambas as instituições. Assim como Marc Buggeln usou o
conceito de trabalho escravo para elucidar o sistema do campo de
concentração, Elkins usou o conceito de campo de concentração
para elucidar o estudo daquele sistema escravagista.
Elkins parte de uma compreensão assustadora. Ele entendeu que,
até hoje, os retratos estereotipados da escravidão sulista não só
perduram na literatura, mas também na experiência contemporânea.
É possível enxergar, em outras palavras, as subservientes “casas de
negros” e os rebeldes “negros do campo” sobre os quais os
escravos e donos de escravos falavam. Em outras palavras, os
estereótipos não eram ficções racistas, que não seriam tão
persistentes, diz Elkins, a não ser que tivessem ao menos um
núcleo de verdade.
Elkins encontrou um estereótipo particularmente instigante: o do
cafuzo [Sambo] extravagante, desencanado, semi-idiota. Elkins
observa: “Seu comportamento era cheio de tolices infantis e sua
conversa inflada de exageros pueris”. O cafuzo, em outras palavras,
é uma criatura infantil que não amadureceu, jamais atingiu a
hombridade. O cafuzo é personagem persistente na literatura e no
teatro do início do século XX. De onde veio o cafuzo, indaga Elkis?
Aqui ele não está se referindo ao cafuzo literário ou artístico, mas ao
real, à personalidade negra real que corresponde a esse
personagem estranho e ridículo.
Ao pensar nisso, Elkins teve uma súbita epifania. Ele lembrou
que, nos campos de concentração alemães, os internos
descobriram, após o choque inicial do deslocamento, que as regras
do mundo exterior não se aplicavam ali. Olhando ao redor, eles
viram que os prisioneiros sobreviventes desistiram completamente
da dignidade e responsabilidade que, estivessem do lado de fora,
lhe caberiam. Eles se transformaram em seres infantis, quase como
crianças, em sua dependência e conformidade com as autoridades.
“O humor deles foi atingido por uma tolice e eles riam feito crianças
quando algum deles soltava um pum”.26 Em suma, aqui, num
cenário tão distante e pouco familiar, apareceu algo como o
personagem cafuzo, tão vividamente identificado como habitante da
fazenda de escravos democrata.
Ademais, Elkins observa, havia, nos campos nazistas, judeus e
outros presos que foram designados Kapos, isto é, prisioneiros
postos na função de supervisionar os esquadrões de trabalho
chamados Kommandos, sem contar que exerciam também o papel
de escreventes ou eram aqueles que registravam a rotina diária sob
a supervisão da equipe da SS alemã. Os sobreviventes dos campos
disseram em entrevistas que os Kapos basicamente assumiram o
papel dos nazistas. Eles eram tão severos quanto, ou até mesmo
mais rígidos; alguns deles chegaram a se vestir e a falar como tais.
Em suma, eles assumiram o papel daqueles que os oprimiam. Logo,
eis aqui um segundo tipo, não o cafuzo, mas não menos
desfigurado e estranho.
Como isso pôde acontecer? Elkins percebeu que as fazendas de
escravos democratas na América e os campos de concentração
nazistas tinham algo em comum. Ambos eram sistemas fechados
em que os internos viviam num mundo separado, em grande parte
selado do mundo exterior. Consequentemente, teoriza Elkins, o
ritmo ordinário dos escravos nas fazendas e dos internos dos
campos de concentração foi corrompido e transtornado a tal ponto
que acabou criando novas personalidades — personalidades
anormais e distorcidas, sem paralelo no mundo normal.
No caso do cafuzo como personagem peculiar, Elkins nota que ele
simplesmente não existia na América do Sul, cujo sistema
sustentava a escravidão, mas sem o cafuzo. E por quê? Porque,
respondeu Elkins, a escravidão sul-americana não era um sistema
fechado. Mesmo os escravos da fazenda viviam em um mundo mais
amplo, sob a proteção de seus senhores da Coroa espanhola e da
Igreja Católica. Nas fazendas democratas do Sul dos EUA, em
contraste, o escravo adulto era despojado de suas
responsabilidades masculinas usuais — homens maduros eram
tipicamente chamados de “garotos” —, resultando nessa criatura
infantilizada chamada cafuzo, a qual Elkins chama de a “perpétua
criança”.27
Toda a comunidade de estudiosos do escravagismo logo
percebeu que o livro de Elkins havia levado o debate a um novo
patamar. Quase duas décadas após ser publicado, a editora da
Universidade de Illinois lançou a obra The Debate Over Slavery:
Stanley Elkins and His Critics [O Debate Sobre a Escravidão:
Stanley Elkins e Seus Críticos], em que os principais estudiosos da
área responderam à tese de Elkins, que depois devolveu com uma
réplica. O falecido Eugene Genovese, talvez o mais conhecido
estudioso em escravidão da América, considera o livro de Elkins
“um dos ensaios históricos mais influentes da nossa geração”.28
Voltarei à tese, mas primeiro quero abordar um assunto que Elkins
evitou. Ele insistiu que não tinha a intenção de fazer uma análise
comparada das duas instituições em sua realidade, entre a fazenda
de escravos e os campos de concentração nazista. O autor não
entra em questões como itinerário, dieta, administração, de que
modo eram tratados os escravos cativos e os internos, ou as
ideologias subjacentes que sustentavam ambos os sistemas. Elkins
deixa implícito que eram regimes tão diferentes que, na maioria dos
aspectos, seriam incomparáveis.
Discordo. E suspeito que Elkins não tenha se aventurado por
desconhecer parcialmente os campos de concentração nazistas.
(Ele certamente não desconhecia as fazendas de escravos). Elkins
parece derivar boa parte do que sabe a respeito dos campos de
concentração a partir do trabalho do sociólogo Bruno Bettelheim, ele
mesmo um sobrevivente de Buchenwald e Dachau e autor de um
estudo inovador, Individual and Mass Behavior in Extreme Situations
[O Comportamento Individual e das Massas em Situações
Extremas]. No entanto, Bettelheim não tentou produzir uma
pesquisa abrangente sobre os campos, mas simplesmente destacou
a transformação do comportamento humano em condições de
sobrevivência extrema. Meu propósito de chegar aonde Elkins
temeu pisar não é miná-lo, mas avançar ainda mais a sua tese, para
mostrar que ele realmente subestimou os paralelos.
Acomodações e alimentos: a estrutura física dos campos de
concentração nazistas, e não a das fazendas, aproximava-se mais
do sistema carcerário. O típico campo de concentração tinha um
quartel, uma oficina, um escritório administrativo, uma enfermaria,
uma prisão e um crematório. (O comandante e a equipe da SS
residiam fora das instalações). Já as fazendas de escravos eram
construídas de forma um tanto diferente. Elas geralmente consistiam
na mansão do senhor de escravos — a chamada Casa-Grande —,
senzalas em ruínas, possivelmente uma oficina e campos para
plantação de arroz ou algodão.
Os campos nazistas eram segregados por sexo, enquanto as
senzalas se formavam com habitações familiares contendo homens,
mulheres e crianças. Não obstante, o conteúdo físicos tangível de
cada compartimento ou habitação era bastante semelhante em
ambos os casos: nada mais do que um leito e um cobertor, um
banheiro ou um penico e, quem sabe, uma cadeira. Para o campo
de Ravensbruck, a historiadora Sarah Helm relata que as únicas
provisões eram um prato, um copo, alguns utensílios, uma escova
de dentes, um pedaço de sabão e uma pequena toalha.29
Em termos de alimentação, os escravos estavam bem melhores,
já que recebiam porções regulares de carne e vegetais, enquanto os
presos nos campos nazistas recebiam pouco mais que uma sopa de
aveia rala, pão e água. Elie Wiesel, aprisionado em Auschwitz e
depois em Buchenwald, conta que sua ingestão diária consistia em
uma “tigela de sopa” e uma “crosta de pão velho”. Em Ravensbruck,
as mulheres pareciam estar numa situação um pouco melhor; aos
domingos, elas recebiam um “bocado de geleia, um tablete de
margarina e uma salsicha”, e também eram autorizadas a pegar
dinheiro de casa e comprar bolachas e biscoitos na loja da
instalação local.30 A desnutrição, problema episódico no regime
escravo democrata, foi crônica nos campos de concentração
nazistas.
Seja a fazenda de escravos dos democratas, seja o campo de
concentração nazista, ambos os regimes eram selados do mundo
exterior, demarcados, em alguns casos, por uma cerca alta ou
arames farpados, vigiados por guardas, nos campos, ou capatazes,
nas fazendas, às vezes auxiliados por cães treinados. Em ambos os
casos, os cativos ficariam lá por toda a vida; aqueles que entravam
nunca mais sairiam, fato para ambos os sistemas. Assim, Elkins não
poderia estar mais certo de que esses eram sistemas fechados,
mundos para si mesmos, completamente separados do mundo
exterior.
Rotina de trabalho: aqui o termo “trabalho escravo” aplica-se
igualmente ao sistema das fazendas democratas e dos campos de
concentração. O trabalho começava com o nascer do sol e acabava
ao anoitecer: era contínuo, persistente e incessante. Enquanto a
maioria dos escravos trabalhavam em plantações de algodão, a
maior parte dos cativos nos campos de concentração trabalhava em
locais de construção e pedreiras. Durante a maior parte do tempo
que passou em Auschwitz, Elie Wiesel trabalhou na construção
“onde, por doze horas diárias, arrastava pedras pesadas”.31 Em
ambos os sistemas o trabalho era principalmente braçal, não
qualificado ou pouquíssimo qualificado, embora também houvesse
tarefas que exigiam habilidade especializada como soldagem,
carpintaria, alvenaria e eletricidade, serviços atribuídos a um
pequeno subconjunto de prisioneiros um pouco mais qualificados.
Escravos e prisioneiros eram obrigados a trabalhar. O tempo
trabalhado dos escravos costumava ser de seis dias por semana,
exceto na época de plantação, e recebiam folga em virtude do
feriado de Natal, que normalmente era comemorado com música e
um banquete. Os prisioneiros nazistas trabalhavam todos os dias,
sem feriados, sem festa. Se desse uma pausa no trabalho, o
escravo provavelmente seria açoitado; agora, se um prisioneiro
nazista parasse, ele provavelmente seria espancado ou baleado.
Obviamente, em nenhum dos casos os trabalhadores eram pagos,
embora os proprietários de escravos e os capatazes por vezes
oferecessem incentivos para trabalhar, incluindo ao permitir que
escravos ficassem com parte da produção. O único pagamento que
os prisioneiros dos campos nazistas recebiam era a chance de viver
e trabalhar por mais um dia.
Os limites do poder absoluto: os democratas senhores de
escravos não possuíam, por lei, poder absoluto sobre seus
escravos. Em todos os estados sulistas, o assassinato de um
escravo era proibido. Na maioria dos estados, formas extremas de
mutilação e ferimento também eram proibidas. Mas os donos de
escravos tinham o poder de facto, porque teriam o direito de
reivindicar invariavelmente que o escravo resistira à autoridade ou
inventariam alguma outra desculpa, medidas nas quais os tribunais
acabavam acreditando.
Com açoites e outras punições, os senhores de escravos
democratas possuíam uma autoridade praticamente desenfreada.
Em 1829, no caso Estado vs Mann, o juiz Thomas Ruffin decidiu o
caso em que determinado dono foi acusado de ferir gravemente seu
escravo. Ruffin, embora democrata, era relativamente humanitário, e
disse que sua consciência se revoltava ao permitir que o abuso
ficasse impune. Apesar disso, declarou, ele precisava unir-se ao
senhor de escravos porque o “objetivo da escravidão é o lucro do
senhor” e a tarefa do escravo é “labutar duro para que outro possa
colher os frutos”.32 Tal sistema só poderia sobreviver se a vontade
do senhor fosse, praticamente falando, absoluta.
Ironicamente, o que mais protegia os escravos, se seus senhores
democratas tendessem à crueldade ou ao assassinato, era a própria
posição de posse, bem ou propriedade. Wolfgang Sofsky defende
esse ponto em seu livro The Order of Terror [A Ordem do Terror], um
estudo sobre a vida nos campos de concentração. Sofsky observa
que, ao contrário dos escravos, as vítimas dos campos de
concentração “não eram propriedade pessoal desse ou daquele
senhor, mas detentos de uma instituição. Eles não pertenciam a
ninguém”. Assim, “os prisioneiros não tinham valor nem preço”.
Em contraste, “o escravo tinha valor e preço de mercado. O dono
não adquire para si escravos a fim de matá-los, mas tem por
objetivo colocá-los para trabalhar em benefício próprio”.33 Os
escravos custavam entre 1 200 e 1 500 dólares no período entre
1830 e 1860. Isso significa que os senhores democratas tinham
grande investimento em seus escravos. Os donos não desejavam
danificá-los, cujo valor, afinal, decairia; em outras palavras, não
desejavam fazê-lo pelo mesmo motivo que você não gostaria de
danificar seu próprio carro.
Por mais marginal que fosse a proteção do escravo de seu senhor
democrata, os internos do campo nazista não tinham proteção de
seus algozes, que tinham total discrição para brutalizá-los e matá-
los. Por razão disso, não há sequer comparação quanto ao nível de
perigo que sentiam os presos do campo de concentração em
relação aos escravos. Estes temiam seus senhores e capatazes,
mas não estavam em constante risco de morte; aqueles, sim,
estavam. O perigo era maior, é claro, para os judeus, mas todos os
presos sentiam com força esse medo.
Assim como com a escravidão, a escassa proteção que os presos
dos campos nazistas conseguiram foi por ocasião da utilidade que
tinham para o regime nazista. Quando as condições do campo
melhoraram, Buggeln conta: “tinha pouco que ver com o considerar
a humanidade” e era, na verdade, “um reflexo daquilo que se exigia
da mão de obra” no regime.
É conveniente lembrar que, Buggeln comenta, no fim da guerra,
os nazistas pediram aos oficiais da SS que alimentassem melhor os
trabalhadores dos campos de concentração, que lhes dessem
roupas de inverno apropriadas e permitissem oito horas de sono,
sem interrupção. Foram regras que chegaram a se aplicar mesmo
aos judeus, dando a entender que, prevendo o fim, os nazistas
estavam tão desesperados por trabalhadores que se “dispuseram a
rescindir temporariamente de uma das principais exigências
ideológicas do nazismo — livrar o Terceiro Reich dos judeus”.34
Rebeliões e fugas: certa feita, Andrew Jackson ofereceu a
recompensa de cinquenta dólares a quem capturasse um fugitivo de
sua fazenda “e dez dólares a mais por cada cem chicotadas, até
totalizar trezentas, a quem as aplicasse ao fugitivo”.35 Fugas eram
comuns na rotina dessas fazendas. Os donos procuravam leis — A
Lei do Escravo Fugitivo — que obrigassem os estados livres a
devolver fugitivos. O senhorio passou a empregar patrulheiros a fim
de impedir que os escravos tentassem escapar e contratavam
caçadores para recuperar fugitivos. Os jornais democratas
anunciavam “cachorros negreiros” para farejar fugitivos escondidos
nas florestas ou nos pântanos. Rebeliões por parte dos escravos
eram um tanto incomuns, e é por isso que sabemos sobre as
poucas existentes, tais como as rebeliões levantadas por Nat Turner
e Denmark Vesey. No entanto, mesmo estas falharam e os autores
foram capturados e executados.
“Pouquíssimos prisioneiros escaparam dos campos”, relata Sofsky
em seu estudo The Order of Terror.36 Sofsky conta algumas
centenas de fugitivos, em si um pequeno milagre, já que os campos
eram grandes fortalezas. Sofsky salienta que as filiais menores
ofereciam melhores chances de fuga, embora até mesmo ali fosse
necessário grande planejamento. Ademais, civis da população local
poderiam entregar o fugitivo de volta aos campos.
Quanto às rebeliões, Sofsky contabiliza apenas três: uma em
Treblinka, outra em Sobibor, em 1943, e outra em 1944, em
Auschwitz. A revolta de Treblinka envolveu um ataque às cercas
perimetrais, por onde em média duzentos prisioneiros fugiram,
perseguidos por guardas da SS em caminhões e a cavalo. Sofsky
estima “ser improvável que mais de cinquenta ou sessenta dos que
escaparam tenham sobrevivido para presenciar o fim da guerra”. A
rebelião de Sobibor foi um fracasso e resultou em cerca de cem
presos executados. Da mesma forma na rebelião de Auschwitz,
todos os fugitivos, conseguindo matar três oficiais da SS e ferir
outros doze, foram caçados e mortos.37
A mensagem essencial é a seguinte: com regimes fechados
profundamente opressivos como os campos nazistas e as fazendas
dos democratas, os oprimidos, por mais motivados que estivessem
em se rebelar e derrubar o sistema, simplesmente não conseguiam
fazê-lo. Ainda que desejosos, mas sem poder. Em última análise,
tanto as fazendas de escravos quanto o regime dos campos de
concentração nazistas tiveram de ser derrubados pelo lado de fora,
pela invasão militar externa. Os Aliados e o Exército dos Estados
Unidos, cada qual tendo seu papel, foram os libertadores dos
prisioneiros e dos escravos.
Ideologias de inferioridade: o termo “escravo” [slave] deriva-se, na
verdade, do termo “eslavo” [slav]. Por certo os escravos do regime
nazista eram em grande parte eslavos e, em termos raciais,
brancos. Mesmo assim os nazistas consideravam os eslavos —
bem como consideravam os judeus e os russos — como
Untermenschen, ou sub-humanos. Dentro dos campos nazistas,
havia uma hierarquia de inferioridade que determinava o tratamento
dos presos: os prisioneiros alemães eram considerados os mais
elevados e tratados melhor, enquanto os judeus — especialmente
os judeus não alemães — eram considerados os mais inferiores e
tratados da pior forma.
Os nazistas não apenas desenharam uma simples demarcação
entre captores e cativos; havia também subcategorias que
estabeleciam uma hierarquia ou gradação entre as populações
cativas. Entre os democratas donos de escravos, em contraste,
havia uma única linha racial. Nem todos os proprietários de
escravos eram brancos — havia, inclusive, um número substancial,
embora proporcionalmente pequeno, de proprietários negros. Mas
todos os escravos eram negros. Conquanto ambos, nazistas e
democratas, tenham aplicado um código racial em seus sistemas de
escravidão, o código nazista era mais variado e multifacetado do
que o dos democratas.
É curioso perceber que os nazistas não precisaram defender sua
ideologia, pois não enfrentaram nenhum tipo de questionamento
interno. Os democratas, no entanto, enfrentaram oposição, primeiro
do Partido Whig e depois do Partido Republicano, sem contar a forte
oposição do pequeno grupo de republicanos conhecidos como
abolicionistas. Isso posto, os democratas desenvolveram uma
ideologia abrangente pró-escravidão, na qual tinham a cara de pau
de afirmar que a escravatura era boa não só para o dono, mas
também para seu escravo.
George Fitzhugh, escritor democrata, argumentou que o escravos
eram como animais, nascidos para serem dominados por seus
donos e que “a equitação lhes faz bem”. Outros democratas, como o
senador John C. Calhoun, insistiram que a escravidão foi uma
“escola civilizatória”, embora, aparentemente, não fosse uma escola
na qual alguém pretendesse se graduar.38 Convém, nesse ponto,
desfavorecer os democratas em comparação aos nazistas. Mesmo
estes não tiveram a audácia e a desonestidade intelectual de sugerir
que os Untermenschen e os judeus eram, de alguma forma,
beneficiados com o regime nazista.
Legado Duradouro
Volto-me a Elkins agora, para resumo e uma única observação
final. Resumindo, mesmo como um sistema fechado, a escravidão,
tendo sido de longa duração, produziu ao longo desse tempo uma
cultura afro-americana distinta. Eugene Genovese, em sua obra
Roll, Jordan, Roll, bem como na crítica mais compreensiva que faz a
Elkins, destaca esse ponto. Os escravos, por exemplo,
desenvolveram um repertório de canções, histórias e
relacionamentos — às vezes relacionamentos vitalícios — que, em
última análise, ajudaram a formar uma identidade negra nos
Estados Unidos.
Aqui não existe nenhum paralelo com os campos de
concentração, em parte por causa da natureza do ambiente e em
parte porque duraram apenas doze anos, de 1933 a 1945. Em geral,
os prisioneiros dos campos não estabeleceram relacionamentos
íntimos, em parte porque era algo desencorajado pelos guardas e
em parte porque os prisioneiros perceberam que a pessoa com
quem foi feita a amizade na semana anterior poderia ser
sumariamente executada na semana seguinte. Assim, as únicas
mudanças comportamentais que os campos nazistas produziram
estavam na natureza do adaptar-se depressa à vida nos campos.
Segue-se disso, portanto, o fato de o legado cultural da
escravidão ter ultrapassado a escravidão, enquanto o legado
cultural dos campos de concentração — incluindo as peculiares
desfigurações de personalidade que Elkins detectou — provou ser
um fenômeno temporário.
O fenômeno do muselmanner parecido com zumbis, substituto
nazista dos Kapos — tudo desapareceu. Não faz sentido dizer que
os judeus ou os europeus do Oriente atualmente apresentam
quaisquer das características que se desenvolveram dentro desse
sistema temporariamente fechado.
No caso do negro americano, no entanto, a situação é bastante
diferente. Embora terminada em 1865, a escravidão perdurou por
mais de duzentos anos, e teve o seu maior alcance durante a era da
supremacia democrata no Sul, desde a década de 1820 até a
década de 1860. Muitas das características da antiga fazenda de
escravos — a moradia em ruínas, a família quebrada, o alto índice
de violência usada para manter a ordem, poucas oportunidades e
escassas perspectivas de avanço, o senso generalizado de niilismo
e desespero — são evidentes em cidades urbanas governadas por
democratas como Oakland, Detroit, Baltimore e Chicago.
“Havia uma subclasse distinta de escravos”, escreve o cientista
político Orlando Patterson, “que vivia de forma fútil ou perigosa. Era
o negro incorrigível, de quem a classe de donos de escravos
sempre reclamava. Eles fugiam. Eram ociosos. Mentiam
compulsivamente. Eles pareciam imunes ao castigo”. Em seguida,
Patterson chega ao clímax: “Pode-se traçar a subclasse, como
fenômeno social persistente, neste grupo”.39 A esquerda não gosta
de Patterson por ser ele um estudioso negro oriundo do oeste da
Índia e propenso a proferir verdades politicamente incorretas.
Pessoas mentirosas não gostam disso. Mas quantas mentiras
você pode contar? Quem pode negar que os negros ainda vivem
sob os efeitos daquilo que os democratas lhes fizeram? Hoje os
negros sofrem uma taxa de ilegitimidade na família de
aproximadamente 80%. Não estou dizendo que tudo se deve à
escravidão, mas quem pode dizer que, em parte, não se deve ao
legado da escravatura? A taxa de criminalidade entre os negros é
muito maior, com altos índices de homicídio de negros contra
negros. Quem pode dizer que não é a consequência, ao menos
parcial, da desvalorização que a vida negra sofreu nas mãos do
senhorio democrata? W. E. B. Du Bois, estudioso democrata,
certamente o fez.
São perguntas, e não respostas, embora pense que Du Bois
tenha acertado nesses pontos. Se assim for, significa que o
progresso que fizemos na erradicação dos campos de concentração
e da escravidão não está nada completo. Certamente, ambas as
instituições foram derrotadas pela guerra e permanentemente
encerradas. Contudo, o legado de um deles continua. Enquanto o
legado nazista alemão mantém-se sobretudo na memória, o legado
dos democratas senhores de escravos na América ainda retém
cicatrizes feias na vidas de muitos afro-americanos.
Capítulo Cinco
Os Racistas
Originais
Aconteceu Aqui
Voltando aos Estados Unidos, vinda de Roma, onde trabalhava de
correspondente para o jornal New York Times, Anne McCormick
notou algo muito marcante. A atmosfera em Washington dois meses
após a posse do presidente Franklin D. Roosevelt (FDR), ela
escreveu para o Jornal em 7 de maio de 1933, “é uma estranha
reminiscência da Roma nas primeiras semanas após a Marcha dos
camisas negras”. McCormick achava aquilo estranho, porém
agradável. E mencionou a semelhança não para criticar o então
presidente, mas para louvá-lo. Do que ela mais gostou em FDR foi
que ele estava agindo feito Mussolini e modelando o Estado do New
Deal conforme o fascismo italiano.
Em Roma, McCormick ganhou a reputação de ser um dos muitos
correspondentes estrangeiros progressistas apaixonados pelo
regime de Mussolini. Ela costumava relatar acerca da
“solidariedade” que os italianos sentiam pelo “impulso” à ditadura de
Mussolini. “É possível perceber”, escreveu algumas semanas após a
incursão ao território etíope comandada por Mussolini, “uma
manifestação notável — uma nação movendo-se numa espécie de
transe —, encantada, convicta de ser invencível em força”. Quanto a
McCormick, o historiador John Diggins escreve no livro Mussolini
and Fascism [Mussolini e o Fascismo] que “por quase vinte anos ela
carregou um caso de amor político com uma Itália idealizada e por
seu nobre líder”.
De volta à América, McCormick sentia igual paixão por FDR, cuja
administração, escreveu ela, “prevê uma federação de indústria,
trabalho e administração pública segundo os moldes do Estado
Corporativo tal como existe na Itália”. O Congresso havia aprovado
uma legislação que “conferiria ao presidente a autoridade de
ditador”. Era “uma espécie de poder unânime de procuradores” em
que “todos os demais poderes — indústria, comércio, finanças,
trabalho, do fazendeiro ao chefe de família, estado e cidade —
praticamente abdicam em seu favor”. O estado de espírito nacional,
bem como o de McCormick, era a favor da ditadura. “A América hoje
literalmente pede ordem. Ninguém está lá muito incomodado com a
ideia de uma ditadura”.7
Ao mesmo tempo, outros na mídia comparavam FDR com o novo
líder da Alemanha, Adolf Hitler. Hitler, tal qual FDR, ascendeu ao
poder por meio do processo democrático. Claro que até então ele
havia se tornado, como Mussolini, um ditador, termo que não tinha o
mau cheiro que tem agora. McCormick e outros não hesitaram em
chamar FDR de ditador ou mesmo exortá-lo a tornar-se um. Os
ditadores eram vistos como figuras resolutas, que de fato faziam as
coisas acontecer. Eles alegavam representar a vontade genuína e o
espírito de seu povo.
A visão da esquerda na Alemanha, na Itália e nos Estados Unidos
era a de que sociedades estruturadas funcionariam melhor sob a
mão firme de um único líder. “Hitler é a Alemanha e a Alemanha é
Hitler”, gostava de dizer Rudolf Hess. Esta era a expressão clássica
do que se pode chamar de princípio da infalibilidade da liderança, ou
Führerprinzip. Da mesma forma os italianos gostavam de dizer que
“Mussolini é a Itália e a Itália é Mussolini”. FDR e os progressistas
apreciavam essa forma de pensar. O Führerprizip na Alemanha e
seu equivalente na Itália refletiam de perto a própria visão de FDR
— ecoada na mídia progressista —, de que FDR é a América e a
América é FDR.
Esse sentimento por parte de McCormick e outros não era uma
visão de outliers, de alguns poucos caprichosos. Pelo contrário, era
o sentimento progressista como um todo e, até certo ponto, a
principal linha de pensamento durante a era inicial de FDR. Até
mesmo as revistas Saturday Evening Post e Fortune falavam em
termos semelhantes. Atente-se à recepção concedida ao
extravagante ministro das Forças Aéreas de Mussolini, Italo Balbo,
na ocasião em que veio à América, em 1933, para participar da
Feira Mundial de Chicago.
Balbo havia sido um dos primeiros camisas negras da Itália.
Tendo crescido em sua região natal, Ferrara, foi um dos primeiros a
aderir ao Partido Fascista e um dos principais organizadores da
Marcha sobre Roma. Nada disso impediu que Balbo fosse
apresentado na capa da revista Time de 26 de junho de 1933, com
um artigo anexo apresentando os triunfos fascistas na tecnologia de
aviação como um exemplo ao qual a América poderia seguir.
No dia 20 de julho de 1933, o presidente Roosevelt ofereceu um
almoço na Casa Branca em honra a Balbo e condecorou-o com a
Cruz de Voo Distinto. Balbo disse ao presidente que voltaria para
casa, mas FDR o convenceu a ficar mais tempo e fazer um tour por
todo o país. De acordo com o New York Times, o “Ministro das
Forças Aéreas deixou a Casa Branca com o rosto cheio de
sorrisos”.
Os assessores de FDR organizaram para Balbo um enorme
desfile no centro de Nova Iorque, após o qual discursou sobre as
virtudes do regime fascista para 65 mil democratas no complexo
Madison Square Garden. Balbo ecoou Mussolini ao dizer: “A
existência do sentimento antifascista no exterior é um mito”, um mito
“desmascarado pela recepção entusiasta que meu esquadrão aéreo
recebeu na América”.8
Enquanto os grandes meios de comunicação progressistas
estimulavam o sentimento público em favor do regime de Mussolini,
os progressistas das universidades de elite da América cortejavam
Adolf Hitler. Sete meses após a queima de livros na Alemanha, em
1933, a Universidade Columbia convidou o embaixador alemão para
discursar no câmpus, onde foi introduzido pelo presidente da
universidade, Nicholas Murray Butler. Paul Hollander, cientista
político, relata que a Universidade Columbia “mantinha relações
amigáveis com instituições acadêmicas e representantes da
Alemanha nazista”.9
Em 1934, o presidente de Harvard, James Conant, ofereceu um
chá em sua casa para Ernst Hansfstaengl, chefe do Gabinete de
Imprensa Nazista sob o Ministério da Propaganda de Joseph
Goebbels. Hansfstaengl era amigo íntimo de Hitler e jantava em sua
casa com frequência. Hitler gostava de escutar Hansfstaengl
interpretando no piano as vibrantes marchas de futebol de Harvard.
Ele gostava em especial da parte final com o grito de guerra:
“Harvard, Harvard! Rah! Rah! Rah!”. Hitler deu a Hansfstaengl o
afetuoso apelido de “Putzi”, cujo filho, Egon, referia-se
calorosamente a Hitler como “tio Dolf”.
Durante a ascensão de Hitler ao poder, Hansfstaengl ajudou a
financiar a publicação do livro Mein Kampf e também a compra do
Völkischer Beobachter, que veio a tornar-se o jornal oficial do
Partido Nazista. Embora certo rabino de Boston estivesse incitando
um protesto de judeus, o periódico estudantil Harvard Crimson
repudiava os críticos e ainda pedia que Hansfstaengl, ex-aluno de
Harvard, recebesse um diploma honorário “apropriado para sua alta
posição” no governo de “uma grande e profunda nação”.10
Naquele mesmo ano, os mais importantes professores,
administradores e líderes estudantis de Harvard visitaram o navio de
guerra nazista Karlsruhe quando este atracou no porto de Boston,
hasteando a bandeira da suástica. O grupo de Harvard também
participou de uma recepção de gala em que o capitão do navio de
guerra tecia elogios a Hitler. Em 1936, Harvard enviou uma
delegação acadêmica para comemorar o aniversário da
Universidade de Heidelberg. O evento foi boicotado pelas
universidades britânicas por ser altamente politizado, no sentido de
apresentar o nazismo de forma positiva. Presentes, misturando-se
com a delegação de Harvard, estavam o teórico nazista Alfred
Rosenberg, o ministro da Propaganda, Joseph Goebbels e o líder da
SS, Heinrich Himmler.11
Na frente cultural, outro admirador de FDR, o compositor Cole
Porter, compôs uma melodia cativante em 1934 com a seguinte
letra: “Você é o maior! Você é o grande Houdini! Você é o maior!
Você é Mussolini”. Não é assim que a música é cantada hoje, pois
Porter mais tarde viria a mudar a letra, quando os progressistas
perceberam que lhes seria embaraçoso, assim como seria para
qualquer um na América, ter ligações com Mussolini. Daí Cole
Porter associou-se à grande mentira. Suas letras originais, junto das
obras de McCormick, do circuito percorrido por Balbo e da conexão
Harvard-Hitler, têm, como consequência dos esforços progressistas,
simplesmente desaparecido na neblina da História.
O Proto-Fascista
Embora este capítulo concentre-se em FDR — nosso führer norte-
americano não reconhecido —, a história estaria incompleta sem
começar com o presidente progressista que o precedeu quase duas
décadas, Woodrow Wilson. FDR, lembre-se disso, era o secretário
da Marinha na administração de Wilson, mas durante o mandato e
os anos subsequentes jamais discordou publicamente de qualquer
ação de Wilson descrita aqui. Na verdade, FDR e sua equipe
falaram abertamente do New Deal como continuação das políticas
de Wilson. Conforme mostro, esse foi um caso do proto-fascismo de
Wilson, caso esse maturado no fascismo mais desenvolvido da era
FDR.
Wilson, é claro, precedeu Mussolini e Hitler. É por isso que eu o
chamo de proto-fascista. Não digo que ele teria sido fã do
verdadeiro fascismo, mas que foi um precursor, visto que seu
regime revela tensões fascistas mesmo antes de haver um nome
oficial a descrevê-las. Para entender o proto-fascismo, considere o
debate acadêmico que discute se o filósofo Nietzsche era ou não
proto-fascista. Nietzsche morreu na década de 1880, então,
obviamente, não existe associação direta entre ele e o fascismo.
Estivesse vivo na época, provavelmente teria ficado horrorizado com
Hitler e Mussolini. Nietzsche detestava o nacionalismo alemão nem
era ele antissemita.
Por outro lado, Nietzsche foi um dos pensadores favoritos de
Mussolini, que, em sua época, disse “A ambição por poder na
Europa é representada unicamente pelo fascismo”. Hitler visitou os
arquivos de Nietzsche em Weimar e lá, desejoso de expôr o
entusiasmo que tinha pelo filósofo, foi fotografado por seu fotógrafo
pessoal, Heinrich Hoffman. Hitler também enviou a Mussolini uma
edição, até então recente, das obras completas de Nietzsche, com
dedicatória autografada. Esse passou a ser um dos bens mais
preciosos de Mussolini.
Se Nietzsche rejeitava explicitamente o nacionalismo e o
antissemitismo, o que é que havia nele para despertar tamanho
interesse nesses homens? Nietzsche falava em termos de criar não
apenas um übermensch, ou super-homem, mas uma raça de super-
homens, uma raça superior para governar o mundo. Nietzsche
também falava do untermenschen, os povos inferiores que deveriam
ser eliminados ou exterminados por meio da guerra ou da eugenia
numa inevitável luta por poder. Assim fica fácil entender por que tais
ideias eram apelativas a Hitler.
Livre das restrições morais do cristianismo — as quais Hitler e
Mussolini também criticavam —, Nietzsche deleitava-se ao pensar
em povos, que ele então considerava inferiores, sendo apagados da
terra. “Que venha uma tempestade”, ele escreve em Vontade de
Potência, “e derrube da árvore esta fruta podre e devorada por
vermes”. Mais uma vez, vislumbre os nazistas e os camisas negras
vibrando. E logo, cortesia de Hitler e Mussolini, a tempestade
chegou. Por isso, posso entender por que Hitler e Mussolini
apreciavam Nietzsche; e, qualificando-o adequadamente, eu o
considero proto-fascista.12
Da mesma forma era Wilson. O que ele, um discípulo de Hegel,
mais gostava no filósofo alemão era a apoteose hegeliana de um
Estado todo-poderoso. Tendo estudado sob mentores alemães, o
modelo de governo de Wilson foi extraído da experiência militarista
da Prússia de Bismarck. Wilson ridicularizava os Pais Fundadores
— primeiro presidente americano a fazê-lo —, chamando suas
ideias sobre direitos individuais, poder descentralizado e freios e
contrapesos de simplórias e obsoletas. Wilson preferia um modelo
de poder centralizado com ele próprio no leme e toda a sociedade
em obediência inerte a ditames do esquerdismo progressista. Como
Giovanni Gentile reconheceria ser este, mesmo sem ainda ser
chamado pelo nome, o significado essencial do fascismo.
É certo que dar a Wilson o título de proto-fascista soará absurdo
àqueles que, criados sob a fúria progressista, aprenderam que
Wilson é um campeão da democracia global e defensor do direito à
autodeterminação a todos. Com efeito, Wilson teve a chance de
promover ambos, mas, no fim das contas, não fomentou nenhum.
Houvesse lutado ativamente pela autodeterminação da Alemanha
logo após a Primeira Guerra Mundial, Wilson poderia ter impedido a
Segunda Guerra.
Uma das queixas mais amargas de Hitler — atingindo acorde
ressonante com seus companheiros alemães — era a de que seu
país jamais teria buscado a paz na Primeira Guerra se soubesse
que seria quase que completamente privado de seus direitos à
autonomia e à autodeterminação. A maioria dos historiadores
reconhece que termos mais sensatos do que os que foram impostos
à Alemanha em Versalhes poderiam ter impedido a ascensão de
Hitler ao poder, assim prevenindo uma Segunda Guerra Mundial.
Wilson poderia ter insistido e logrado êxito, mas não o fez. Portanto,
atenue-se o disparate retórico de Wilson diante da realidade
histórica.
Não cabe concentrar-se apenas no que Wilson disse, mas em
duas coisas que ele fez. Primeiro, não só nos moldes fascistas, mas
também nos do nacional-socialismo, Wilson pôs em prática políticas
racistas sobre todo o governo federal e ajudou a reviver a inativa
organização terrorista e racista, Ku Klux Klan. Em segundo lugar,
Wilson suprimiu as liberdades civis dos americanos de uma maneira
nunca antes vista; seria necessário ir à Itália de Mussolini e à
Alemanha nazista para encontrar comparações mais próximas.
Os progressistas estão conscientes disso e, com tanto, confessam
profunda confusão. Escrevendo no Christian Science Monitor,
Randy Dotinga enumera “5 fatos surpreendentes” acerca de Wilson,
um dos quais que ele era “atrasado e intolerante quando se tratava
de raça”. Dado o progressismo de Wilson, Dotinga acredita ser esta
“a maior contradição de todas”. Aqui, Dotinga, um jornalista, ecoa
historiadores como Arthur Link, editor dos artigos de Wilson, e John
Milton Cooper, que exercia posição semelhante sobre o então
presidente. Cooper, por exemplo, classifica o comportamento
intolerante e tirânico de Wilson de “intrigante”, um “mistério”,
perguntando-se como “uma pessoa tão arguta e cheia de ideias
como Wilson deixou isso acontecer”.13
A essa altura, espero que meus leitores estejam sorrindo,
percebendo o território da grande mentira em que estamos pisando.
A mentira está na pretensão de que existe algo estranho ou
anômalo em relação a um progressista como Wilson ser racista,
supressor das liberdades constitucionais e proto-fascista. O objetivo
deste livro está em demonstrar que esse é o curso previsível, se não
inevitável, do progressismo e da esquerda. Wilson, óbvio dizer, era
racista, como a maioria de seus antecessores democratas desde
Andrew Jackson. E, é claro, ele estava envolvido em supressões
das liberdades individuais aos moldes fascistas; é assim que os
coletivistas de todos os tipos costumam proceder uma vez que
assumem o poder.
O racismo de Wilson pode ser destacado pelo cumprimento da
segregação em todo o governo federal. Muitos não percebem que,
embora as legislaturas estaduais dominadas pelo Partido
Democrata tenham difundido a segregação por toda a região do Sul,
o governo federal de Washington, D.C. não havia se segregado
desde o fim da Guerra Civil. Wilson então reverte a situação e
institui a segregação em basicamente todas as divisões do governo
federal.
As ações de Wilson foram amargamente protestadas pelo
principal porta-voz da América negra, Booker T. Washington, que
era republicano. Quando um grupo de líderes negros, incluindo a
jornalista republicana Ida B. Wells, confrontou Wilson, ele disse que
deveriam agradecer-lhe, afinal a segregação era, em grande parte,
para o benefício dos negros. Wilson era, como Chris Myers Asch
escreve no Washington Post, um “supremacista branco
descarado”.14
Seus aliados mais próximos no Congresso eram democratas, e
ainda mais racistas do que o próprio Wilson. Quando a questão
sobre os Estados Unidos juntarem-se à Sociedade das Nações
chegou ao Congresso, James Reed, senador democrata, irrompeu:
“Imagine submeter questões envolvendo a própria vida dos Estados
Unidos a um tribunal em que se senta um negro da Libéria, um
negro de Honduras, um negro da Índia”.15 Como bom
internacionalista e progressista, Wilson era, é claro, a favor da
Sociedade das Nações, mas também impediu que posturas racistas
fossem sentenciadas no Tratado de Versalhes e nunca pronunciou
nem ao menos uma palavra condenatória sobre a violência retórica
racial contra negros e outras minorias por parte de seus
companheiros progressistas.
Wilson também ajudou a reviver a Ku Klux Klan. Curiosamente,
esse foi o resultado de uma única exibição do filme The Birth of a
Nation [O Nascimento de uma Nação], de David W. Griffith, que
retrata a Ku Klux Klan como a salvadora do Sul. Apesar da
tecnologia restrita da época, o filme agora é reconhecido como uma
obra-prima cinematográfica. Eu o considero como um dos filmes de
propaganda mais poderosos já produzidos. A esse respeito, ele
prenunciou os brilhantes filmes de propaganda de Leni Riefenstahl,
Victory of Faith [Vitória da Fé] e Triumph of the Will [Triunfo da
Vontade], ambos retratando Hitler como o salvador da Alemanha.
A pedido de Griffith, Wilson fez com que o filme The Birth of a
Nation fosse exibido na Casa Branca, com o seu gabinete e outros
amigos de influência presentes. Após a exibição, de acordo com
Griffith, Wilson descreveu o filme como “terrivelmente verdadeiro” e
“é como escrever a História com raios”. Já hoje alguns progressistas
questionam se Wilson realmente disse isso, pois não há
corroboração suficiente em seus arquivos. Contudo, também não há
motivo para duvidar da veracidade de Griffith nesse ponto.
Imediatamente após a exibição, houve um reavivamento da Klan
por todo o país, o que testemunhou tanto o poder do filme quanto do
evidente endosso de Wilson. Anteriormente, a KKK estava
sobretudo no Sul democrata; depois, então, de acordo com o
historiador David Chalmers, a KKK espalhou-se do “estado de
Maine ao da Califórnia”. De repente, havia ramificações da KKK em
Oregon, Colorado, Wisconsin, Ohio, Pensilvânia e Nova Jersey.16
Com isso não quero dizer que era esse o desejo de Wilson, mas a
maioria dos historiadores concorda que a exibição do filme na Casa
Branca conferiu à Ku Klux Klan nova legitimidade e popularidade.
Durante a Primeira Guerra Mundial, Wilson criou um Ministério da
Propaganda, servindo de precursor a ministérios similares criados
por Mussolini e Hitler. Quanto ao assédio e à intimidação da
imprensa e da oposição política que precisou enfrentar, Jonah
Goldberg escreve que a operação de Wilson foi mais efetiva — em
outras palavras, implacável — do que a de Mussolini.
Os capangas de Wilson até viraram seu veneno contra cidadãos
comuns, encorajando crianças a espionar seus pais e vizinhos, e
vizinhos a espionar outros vizinhos. Eles incentivavam vigilantes a
ameaçar e até espancar inconformistas ideológicos. Numa frase que
facilmente poderia ter sido dita por Hitler ou Mussolini, Wilson
insistia que “a conformidade será a única virtude e qualquer homem
que se recuse a conformar-se terá de pagar o preço”.
É difícil imaginar um sentimento mais intolerante. Em
consonância, a administração de Wilson reprimiu de forma geral as
liberdades civis, posturas que fariam com que o macartismo da
década de 1950 parecesse brincadeira de criança; em essência,
qualquer crítica ao governo, até mesmo proferida em particular a um
amigo, poderia levar a pessoa para a cadeia. E, de fato, dezenas de
milhares de americanos foram detidos e presos sob as famosas
Palmer Raids. Goldberg escreve: “Mais pessoas foram detidas ou
encarceradas em alguns poucos anos sob o governo de Wilson do
que sob Mussolini durante toda a década de 1920”. Goldberg
conclui que, durante a Primeira Guerra Mundial sob Woodrow
Wilson, “a América tornou-se um país fascista”.17
Ecco Un Ditatore!
Por fim, demonstro como FDR chegou assustadoramente perto de
tornar-se um ditador fascista durante seu longo mandato no
governo, de 1932 a 1945. Se não um déspota em maior escala,
FDR chegou perto mais do que qualquer outra pessoa na história
dos EUA. A essa altura do livro, já antevejo a indignação que isso
provocará na esquerda. Mas é também hora de, calmamente,
ignorá-la. A indignação em si é uma tática para proteger a grande
mentira. “Como você pode dizer isso?” e “Como você ousa?”. Ouso,
porque é verdade.
Analisados há pouco, os fascistas italianos e até mesmo os
nazistas reconheceram as tendências ditatoriais de FDR e também
a consanguinidade ideológica que havia entre as políticas dos três.
Herbert Hoover, antecessor republicano de FDR, percebeu paralelos
bastante íntimos entre o New Deal e o fascismo. O socialista
Norman Thomas, do outro extremo político, percebeu o mesmo. E,
em 1933, o colunista mais respeitado da América, Walter Lippmann,
disse a FDR que ele não tinha “nenhuma alternativa, senão assumir
poderes ditatoriais”.33 Portanto, não estou falando invencionices;
FDR foi amplamente considerado um ditador fascista, ou futuro
ditador, por muitos de seus contemporâneos.
Não digo que era o caso de um ditador aos moldes de Hitler, afinal
FDR nunca teve o aquele mesmo poder absoluto nem, é claro,
matou seus oponentes, nem enviou judeus a câmaras de gás, nem
iniciou uma guerra mundial. Então, ao retratá-lo na posição de führer
americano, quero dizer que FDR era führer da maneira americana, e
não do jeito alemão. Melhor comparação pode ser feita entre FDR e
Mussolini; ambos se julgavam uma espécie de comandante da
nação, superando as restrições da democracia enquanto ainda
funcionavam dentro das limitações políticas impostas por seus
respectivos sistemas. Os poderes legais de FDR permaneceram
abaixo dos de Mussolini; e não por ele ter “se contido”, mas, pelo
contrário, por ter sido constrangido pelo sistema constitucional dos
Estados Unidos, que impediu esse perigoso homem de trazer o
fascismo na íntegra à América.
Considere uma das principais iniciativas de FDR, peça central do
New Deal: a National Recovery Act [Lei de Recuperação da
Indústria Nacional (LRIN)]. Em essência, a lei sentenciou à morte o
livre mercado nos Estados Unidos. Acontece que essa lei dava ao
governo federal a força para criar alianças trabalhistas e de gestão
em cada indústria, a fim de estabelecer objetivos de produção, de
salário, de precificação e até mesmo de horas mínimas e máximas
trabalhadas. Eram acordos que seriam analisados por um Conselho
Consultivo da Indústria gerido pelo governo, que daria satisfação ao
próprio FDR. Além disso, a legislação da LRIN aumentou os
impostos sobre o rendimento, sobre as empresas e expandiu o
eminente poder de domínio do governo usado para confiscar terras
privadas e transferi-las ao uso público. De acordo com o conselheiro
de FDR, Rexford Tugwell, a LRIN foi projetada para “eliminar a
anarquia do sistema competitivo”.34
Jamais havia se contemplado — e muito menos decretado — uma
intervenção governamental na economia dos EUA nessa escala. Na
época, a LRIN era amplamente reconhecida em todo o espectro
político como um projeto fascista. Escrevendo para a revista North
American Review, Roger Shaw, escritor progressista, afirmou que a
LRIN era “uma nítida adaptação americana do Estado Corporativo
italiano”. Victor F. Calverton, escritor marxista, destacou esse
mesmo ponto escrevendo para o periódico Modern Monthly: “A LRIN
tem feito parte do trabalho que o fascismo europeu se propôs a
executar”. E o próprio secretário do Interior de FDR, Harold Ickes,
admitiu: “O que estamos fazendo neste país é, em certa medida, o
mesmo que está sendo feito na Rússia e até mesmo na Alemanha
de Hitler”. Mussolini mesmo, ao ouvir falar da LRIN, fez um único e
intenso comentário,“Ecco un ditatore!”, que significa “Eis um
ditador!”.35
O homem que FDR escolheu para gerir a LRIN, o General Hugh
Johnson, era ele fascista, um que tinha prazer de associar-se àquilo
que ele chamou de “o brilhante nome” de Mussolini. Johnson
carregava consigo um exemplar do pequeno livro-propaganda The
Structure of the Corporate State [A Estrutura do Estado Corporativo],
escrito em italiano por um dos acólitos do Il Duce, Raffaello Vigone,
e traduzido para o inglês pela União Britânica de Fascistas, partido
fundado por Oswald Mosley, em 1933. Johnson gostava de citar
especialmente as seções sobre como o fascismo passava por cima
do aparato confuso da democracia em direção à plena autoridade
do Estado centralizado. Sob Johnson, a LRIN publicou um panfleto,
Capitalism and Labor Under Fascism [O Capitalismo e o Labor sob o
Fascismo], que admitiu: “os princípios fascistas são muito
semelhantes aos que estavam em evolução na América”.36
Para o desgosto de FDR, sua LRIN foi derrubada pela Suprema
Corte em decisão histórica no caso Schechter Poultry Corp vs
Estados Unidos, em março de 1935. Outras iniciativas do New Deal
também foram transtornadas. A Suprema Corte estava inquieta com
a forma como FDR procurou passar por cima dos direitos da
propriedade privada e contratuais. Tais direitos — que podem ser
vistos sob a cobertura da liberdade econômica —, desde os Pais
Fundadores, são considerados tão basilares quanto outros direitos
fundamentais, como os direitos à liberdade de expressão, de religião
e de assembleia. Atuando em seu papel de protetor dos direitos das
minorias — parte do nosso sistema de freios e contrapesos —, a
Suprema Corte barrou FDR de reverter 150 anos de liberdade
econômica.
Daí o que FDR fez? Em 1937, ele apresentou a Lei de Reforma
do Processo Judiciário, um infame projeto que ficou mais conhecido
por “aparelhamento do judiciário” [Court Packing]. Basicamente,
FDR ameaçou aumentar o número de juízes da Suprema Corte, de
nove para até quinze. Isso lhe daria a chance de nomear até seis
juízes a mais, dando-lhe uma grande maioria. A mentalidade por
trás disso pode ser vista no que o principal assessor de FDR, Harry
Hopkins, disse a uma audiência de ativistas do New Deal em Nova
Iorque. “Desejo garantir”, disse ele, “que teremos advogados que
declararão legal tudo aquilo que vocês quiserem fazer”. Essa foi a
abordagem de FDR: se quer fazer algo, diga estar de acordo com a
lei; e, se a Suprema Corte discordar, expanda-a. É perceptível o
clássico desprezo do fascismo pelo papel distintivo da Suprema
Corte como fiscal dos direitos das minorias em um sistema de
equilíbrio.
Em pânico, a Suprema Corte fez uma rápida mudança e cedeu a
FDR, um movimento que os progressistas chamaram, um tanto
quanto maliciosamente, de the switch in time that saved nine, isto é,
“porque o tempo mudaram, nove se salvaram”. Esse pequeno
gracejo foi cunhado para desviar a atenção da enormidade daquilo
que FDR fez, que basicamente ameaçava destruir nosso Sistema
Constitucional, a menos que obtivesse o que queria — e assim ele
conseguiu o que queria. As ações de FDR aqui — na tênue
penumbra entre o legal e o ilegal — são diretamente comparáveis
ao que era feito na Alemanha nazista e na Itália fascista, táticas de
intimidação usadas para forçar o judiciário à conformidade.
A rendição da Suprema Corte significou, em substância, o fim da
liberdade econômica como direito constitucional. Não, FDR não
conseguiu reviver a LRIN naquele momento, e ter violado os direitos
de propriedade e contratuais, por meio dos vários programas do
New Deal, foi uma atitude relativamente modesta. Em essência,
FDR nos deu o Estado do Bem-Estar Social, e não pense que com
isso eu que o denomino um conceito fascista por si só. O Estado do
Bem-Estar Social na Alemanha, por exemplo, originou-se do
progressismo moderado e conservador de Otto von Bismarck e
antecedeu o fascismo em mais de meio século. No entanto, não
esqueça que foi a esquerda — os socialistas, os fascistas e os
progressistas — que vastamente aprofundaram o Estado do Bem-
Estar Social.
Meu objetivo aqui, entretanto, é dizer que FDR estabeleceu as
bases para que futuras administrações progressistas minassem
continuamente a liberdade econômica. O Governo Leviatã que
temos agora não se deve totalmente ao que FDR fez, mas ele quem
o iniciou. Antes dele, tínhamos liberdade econômica como direito
constitucional. Depois dele, não mais. O principal impulso da
economia fascista envolve a expansão do poder estatal centralizado
à custa dos direitos individuais e da liberdade da esfera privada.
Assim, nesse sentido, as ações de FDR, com a destruição da
liberdade econômica, são fascistas.
Ainda que intimidasse a Suprema Corte, FDR não precisava
intimidar o Poder Legislativo, já que o seu partido, o Partido
Democrata, controlava o Congresso. FDR convenceu seus aliados
democratas à passada do controle praticamente absoluto sobre uma
grande área da economia nacional. Em substância, FDR já não mais
tinha de consultar o Congresso e poderia prosseguir por iniciativa
própria em grandes áreas das tomadas de decisão. Com efeito,
invocando os gritos de “emergência econômica” durante a Grande
Depressão e depois de “emergência nacional” durante a Segunda
Guerra Mundial, FDR pôde assumir poderes quase ditatoriais.
Da mesma forma Mussolini, que subverteu o Poder Legislativo e
convenceu seu Parlamento, flexível e maleável, a entregar-lhe o
poder. O Parlamento italiano não precisava nem mesmo congregar
durante o reinado de Mussolini, pois ele, na prática, tomava quase
todas as decisões. Assim também Hitler, que na vigília do incêndio
do Reichstag, em 1933, convenceu o Parlamento alemão a aprovar
a Lei de Concessão de Plenos Poderes, que lhe confiava a
autoridade legislativa, tornando-o, portanto, de forma aparentemente
legal, o supremo governante da Alemanha nazista. Tal como FDR,
esses ditadores fascistas não apenas derrubaram o sistema, mas,
mais que isso, persuadiram-no e pressionaram-no a dar-lhes uma
autoridade essencialmente absoluta.
Como FDR lançou mão de tamanha autoridade? Mais uma vez,
aos moldes do clássico despotismo fascista, ele a usou para
intimidar empresas privadas e cidadãos comuns à submissão diante
de suas iniciativas estatais. O exemplo mais evidente foi o programa
Blue Eagle de FDR, simbolizado pela imagem de uma águia azul.
Hoje em dia, ninguém reconheceria esse símbolo, cuidadosamente
pulverizado da História pelos progressistas. Mas, na época, era o
símbolo mais reconhecido na América, amplamente comparado ao
símbolo da suástica da Alemanha nazista.
O objetivo do programa Blue Eagle consistia em forçar as
empresas à submissão “voluntária” às iniciativas de FDR. As
empresas que se submetiam penduravam o símbolo da Águia Azul
em suas lojas ou o exibiam mediante publicidade corporativa. O
governo ativamente estimulava o público a comprar apenas das
lojas Blue Eagle e a boicotar as empresas que não exibiam o
símbolo. Os capangas de FDR organizavam manifestações do estilo
de Nuremberg para chicotear o público em um frenesi contra
aqueles que se decidissem contra a submissão ao Blue Eagle.
Novamente, essa era precisamente a função do símbolo da
suástica: juntamente da saudação “Heil Hitler!”, servia para notificar
a conformidade com as políticas do regime nazista. O historiador
Aryeh Unger tem um termo direto para isso; ele o chama de
“compulsão voluntária”. Certo admirador alemão de Hitler na década
de 1930 a isso deu o nome de “trabalhar para o Führer”.37 Todos
prestavam lealdade orientando suas ações em função de Hitler,
entrando nos eixos com ele. FDR empregou precisamente a mesma
compulsão voluntária para que todo o país trabalhasse em função
do führer americano.
Como Hitler e Mussolini, FDR estabeleceu uma máquina de
propaganda maciça dentro do governo e, ao mesmo tempo,
procurou restringir a liberdade da imprensa. Na Alemanha, os
jornalistas eram praticamente obrigados a fazer união com o
Ministério da Propaganda. Do mesmo modo a Itália, que dispunha
de seu Sindicato Nacional Fascista de Jornalistas ao qual era
preciso pertencer para ser um jornalista de “boa reputação”. A
abordagem de FDR foi apenas um pouco mais sutil. Ele nomeou um
de seus escudeiros mais devotos como presidente da Comissão
Federal de Comunicações (CFC). Sob esse capanga, a CFC exigiu
que as estações de rádio enviassem transcrições de todos os
programas que lidassem com “assuntos públicos” para passar pela
autorização da Comissão.
A CFC também deixava claro que criticar o governo poderia levar
a uma revogação de licença de transmissão. Muitos âncoras de
rádios progressistas estavam bastante ansiosos para servir como
animais de estimação de FDR, da mesma maneira como a nossa
mídia convencional tornou-se voluntariamente serviçal de Obama e
Hillary. Henry Bellows, da CBS, disse a FDR que valorizava a
“cooperação” entre o governo e sua rede e “como um democrata ao
longo da vida, queria garantir seus melhores esforços para fazer
com que essa cooperação fosse bem-sucedida”. A CBS e a NBC
baniram críticas ao New Deal de suas estações durante a década
de 1930 e o início dos anos 1940. Apenas poucas estações
resistiram, mas para salvar suas licenças, elas logo foram obrigadas
a entrar na linha.38
Embusteiros à Esquerda
O primeiro embusteiro na tentativa de encobrir os laços de FDR
com o fascismo foi, ironicamente, o próprio FDR. No dia 29 de abril
de 1938, em mensagem ao Congresso, FDR disse que “eventos
infelizes no exterior” ensinaram a América uma simples verdade: “A
liberdade de uma democracia não será segura se o povo tolerar o
crescimento do poder privado a ponto de este tornar-se mais forte
do que o próprio Estado democrático. Isso, em essência, é o
fascismo — o indivíduo, um grupo ou qualquer outro poder privado
de controle tomando posse do governo”.43
Até o momento, conseguimos reconhecer a grande mentira em
pleno andamento. O fascismo não é o controle privado do governo;
é o controle governamental do setor privado. Ao aumentar o poder
do Estado centralizado em paralelo com os fascistas, FDR finge que
o faz para salvar a democracia americana do controle fascista sobre
o governo imposto por interesses do setor empresarial privado. FDR
inverte o significado do fascismo, assim fazendo com que seus
oponentes republicanos pareçam fascistas e ele, portanto, o
antifascista.
Hoje, tamanha inversão é simplesmente demais para qualquer
indivíduo acreditar. Portanto, o historiador Ira Katznelson tenta
encobrir FDR usando uma abordagem mais delicada, uma forma
superior de embuste, pode-se dizer. Num capítulo anterior,
demonstrei como Katznelson contribui para a grande mentira ao
jogar a culpa das atrocidades racistas do Partido Democrata sobre o
Sul. Junto de FDR, Katznelson emprega um modo de defesa
diferente.
Ele admite abertamente as tendências racistas e ditatoriais de
FDR. O comando de FDR, ele diz, carregava as “mais profundas
imperfeições”. Graças a FDR, “Taparam-se os olhos quando a
insensibilidade e a brutalidade seguiram adiante”. Os negócios que
ele fez com os fanáticos de seu próprio partido foram um “acordo
podre”. Entretanto, no fim, Katznelson apoia a linha do fascismo
ditatorial de FDR, porque, em suas palavras, “Com isso, o New Deal
tornou-se possível”.44
O objetivo de Katznelson é convencer os progressistas e a
esquerda de que FDR foi um nobre estadista, disposto a sujar as
mãos para conseguir algo grande. Diz Katznelson, considere os
limites sob os quais FDR operou; ao contrário da Alemanha nazista,
“não houve uma lei americana para concessão de plenos
poderes”.45 (Se Katznelson preferiria que houvesse é questionável).
Logo FDR teve de trabalhar com o Congresso; ele precisou operar
por dentro do sistema político americano para aprovar o New Deal,
por isso fazendo os acordos que fez.
Acredito que Katznelson não tenha percebido que, a fim de salvar
FDR da acusação de fascismo, ele próprio construiu um argumento
fascista clássico. Não me refiro à implicação por parte de
Katznelson de que os fins justificam os meios. Essa afirmação, por
si só, é preocupante. Realmente valeu a pena um cenário com
negros sendo linchados e sistematicamente discriminados por
décadas, isso tudo no propósito de impulsionar um punhado de
programas do New Deal? Bom, ao menos na minha concepção,
digo que não. No entanto, independentemente da resposta, o
impulso fascista do argumento de Katznelson está em outro lugar.
O tema central do fascismo — e aqui podemos nos lembrar do
filósofo do fascismo, Giovanni Gentile, endossado pelo fundador
oficial do fascismo, Benito Mussolini — é o impulso do Estado
centralizado. Na visão de mundo fascista, como Mussolini nunca se
cansava de dizer, o Estado é tudo, e tudo mais está subordinado ao
Estado. Diante disso, todas as medidas são permitidas — por mais
brutais e pesadas, por mais inconsistentes que sejam com a
liberdade privada ou com o sistema constitucional de freios e
contrapesos — quando se tem por fim expandir o controle e o poder
do Estado centralizado.
Mesmo perplexo e duvidoso quanto às táticas fascistas que FDR
usava para armar os tribunais, usurpar a autoridade do Congresso e
fomentar as formas mais repulsivas de racismo, Katznelson lhes é
favorável, pois, afinal, estas ajudaram a alcançar o objetivo fascista
de FDR, que era expandir o poder centralizado. E esse é o fascismo
à esquerda com o qual vivemos agora, tanto no impulso ideológico
perpétuo da esquerda para ampliar o poder do governo quanto na
vontade da esquerda de usar quais sejam as táticas mais
desprezíveis e fundamentais necessárias para sair de determinado
lugar e chegar a outro. FDR não só foi o führer primitivo da América;
ele também ajudou a criar exércitos de camisas pardas da esquerda
americana, que ainda hoje permanecem presentes.
Capítulo Oito
Políticas de
Intimidação
Cultura de Intimidação
Como chegamos até aqui? Afinal de contas, as coisas nem
sempre foram assim. A velha Hollywood, da década de 1930 à
década de 1950, era dominada por imigrantes judeus que
acreditavam no sonho americano e na América como força para o
bem no mundo. Conservadores como Reagan, John Wayne e
Jimmy Stewart tinham lugar naquela Hollywood. Mas nenhum deles
teria vez na atual. A mídia sempre se inclinou para a esquerda, mas
nem mesmo durante o caso Watergate foi tão agressiva e
proselitista com suas pautas esquerdistas quanto é agora. De certa
forma, a máscara de objetividade caiu por completo; o New York
Times de hoje nem sequer finge cobrir notícias de forma neutra ou
equilibrada.
Quando eu era aluno em Dartmouth, no início da década de 1980,
ainda havia liberais clássicos da antiga leva no corpo docente.
Agora eles já se foram. Naquela época, como jovem que apoiava
Reagan, eu podia debater questões políticas com professores e
estudantes de esquerda. É claro que a Ivy League era de esquerda,
mas não de maneira monolítica. Hoje, ao contrário, os pontos de
vista conservadores foram basicamente erradicados. Hoje em dia,
os jovens não rejeitam o conservadorismo; eles nem mesmo sabem
o que é isso. Se questionados acerca do “que conservadores
batalham para preservar?”, alunos até mesmo de nossos melhores
câmpus olharão boquiabertos e confusos.
Vivemos, hoje, numa das culturas mais fechadas, excludentes e
repressivas da História Moderna. De certa forma, a esquerda não
precisa promover uma caça às bruxas contra conservadores e
atormentá-los; eles simplesmente não os contratam, em primeiro
lugar. Quando palestrantes conservadores se apresentam em
universidades, eles frequentemente são impedidos de falar por
manifestantes violentos de esquerda ou calados por ativistas
portando megafones. Esquerdistas rasgaram meus cartazes na
Universidade Trinity, San Antonio, onde palestrei recentemente. Já
eu usei a ação deles a meu favor, publicando aqueles atos de
intolerância nas mídias sociais. Como resultado, mil pessoas
apareceram para a minha palestra, e a tentativa esquerdista de
frustrá-la falhou.
Mas quando Gavin McInnes, polêmico podcaster de direita, foi à
Universidade de Nova Iorque (UNI), em fevereiro de 2017, os
antifascistas de lá apareceram em massa para agredir McInnes e os
alunos que o convidaram; eles desferiram golpes contra os
conservadores e atingiram o próprio McInnes com spray de pimenta.
“Estou assustado, a UNI convidando um disseminador do ódio”,
disse a ativista Tamara Fine. “Ele é um fascista”. McInnes tentou
falar, mas foi abafado pelos manifestantes. Então ele interrompeu a
palestra e deixou o local, enquanto os manifestantes que estavam
do lado de fora gritavam e brigavam com a polícia local.4
Em abril de 2017, a especialista conservadora Heather
MacDonald foi impedida de falar na Universidade de Claremont
McKenna. Cerca de duzentos e cinquenta manifestantes barraram
sua entrada ao auditório, muitos deles berrando “fascista” enquanto
alguns outros repetiam “a vida negra importa”. As autoridades da
Universidade citaram razões de segurança para cancelar o evento
público de MacDonald. Como alternativa, foi sugerido que a palestra
fosse dada somente aos organizadores do evento e transmitida ao
vivo nas redes sociais. “Decidiram que eu daria a palestra ao vivo
para um salão praticamente vazio”, disse MacDonald.5
Lembre-se de que estas são vozes conservadoras a serem
importadas para o câmpus. Não existe nenhum conservadorismo
primitivo entre o corpo docente dessas instituições. Mesmo assim,
em ocasiões raras, quando um conservador aparece, ele ou ela é
vexado e às vezes agredido e perseguido.
Essa é a América em que vivemos agora. Nossa cultura é uma
cultura de abuso e humilhação ritualísticos, em que as vozes
dissidentes são perseguidas, envergonhadas e aterrorizadas, em
alguns casos não só para silenciá-las quanto para destruir-lhes a
carreira e a vida. A demonização é a cultura corrente da esquerda
nos dias de hoje. Por essa razão, por sinal, é que muitos
republicanos são tão tímidos no Congresso; eles estão aterrorizados
com o poder da mídia de humilhá-los de tal forma que seus próprios
apoiadores terão de sepultá-los.
Em contraste, manifestantes que usam de violência e criminosos
são celebrados na academia, na mídia e em Hollywood como ícones
do idealismo e mártires de uma grande causa. Considere o caso de
Bill Ayers e Bernardine Dohrn, chefes do serviço meteorológico
Weather Underground, ambos anteriormente citados na lista dos
mais procurados do FBI. Mesmo não se arrependendo do passado
terrorista contra a própria pátria, ambos foram reabilitados e
reintegrados na comunidade progressista. Ayers e Dohrn são agora
professores ilustres, Ayers na Universidade de Illinois, Chicago, e
Dohrn na Faculdade Northwestern de Direito.
No universo progressista, facínoras também transformam-se em
celebridades. Che Guevara, assassino comunista e diretor de um
campo de prisioneiros políticos, ele que ordenou a execução de
presos políticos e causou caos em Cuba, na África e na América do
Sul, provocando problemas na Bolívia antes de ser morto, foi feito
herói, venerado pelos progressistas, destacado em inúmeras
camisetas e cartazes de dormitórios universitários. Trayvon Martin,
arruaceiro que brigou violentamente com um homem, o mesmo que
então atirou nele em defesa própria, imediatamente foi feito mártir
da causa progressista. O presidente Obama validou a santidade do
rapaz dizendo que, no lugar de Trayvon, poderia ter sido seu próprio
filho.
De onde vem toda essa loucura? Melhor dizendo, como nossas
instituições culturais — da academia à mídia, da mídia à indústria do
cinema e da música — tornaram-se tão profundamente pervertidas?
A explicação mais corrente, oferecida por Allan Bloom no livro The
Closing of the American Mind [A Oclusão da Mente Americana],
depois continuada por Jonah Goldberg na obra Liberal Fascism, diz
que todos esses traços vêm da década de 1960. Como relata
Bloom, na primavera de 1969, esquerdistas armados e vestidos com
uniformes militares invadiram os escritórios da administração da
Universidade Cornell. Eles também tomaram o controle da união
estudantil e a da estação de rádio local. Esta foi uma tomada de
controle no estilo fascista. Walter Berns, cientista político que, na
época, ensinava na Cornell e amigo de Bloom, leu para os
manifestantes excertos de discursos de Mussolini, ao que eles
aplaudiram descontroladamente, sem saber que estavam
aplaudindo o fascismo.
Muitos conservadores aceitam o relato de Bloom de que foi a
covarde submissão da administração e do corpo docente às
demandas dos criminosos esquerdistas que simbolizaram a
subsequente renúncia ideológica da universidade americana à
esquerda política. Alguns, é claro, não se entregaram; eles
apoiaram a tomada do poder e abraçaram as demandas dos
criminosos. Um desses colaboradores foi James Perkins, presidente
da Cornell — ex-partidário do New Deal no Escritório de
Administração de Preços de FDR —, ele próprio um esquerdista.
Assim também eram muitos dos jovens professores nos
departamentos de ciências humanas e sociais.
Um grupo de professores — principalmente liberais clássicos da
velha guarda — resistiu às demandas “irredutíveis” dos estudantes.
Em sua maioria democratas, eles acreditavam, no entanto, nos
propósitos de uma educação liberal e não tinham nenhuma intenção
de permitir que os alunos universitários criminosos lhes ditassem o
que e como ensinar. Daí os bandidos fizeram uma oferta irrecusável:
submeter-se ou morrer. E eles se submeteram. Apenas alguns
docentes não esmoreceram — incluindo Bloom — e quase todos
deixaram a Universidade Cornell pouco tempo depois.
A esse respeito, em Cornell e em outros lugares, houve de fato
uma rendição. Hoje, em Cornell e em outras universidades, os
manifestantes esquerdistas não precisam assumir o establishment;
eles são o establishment. Atualmente a esquerda não precisa fazer
demandas curriculares; ela controla o comitê curricular. Não há
necessidade de a esquerda queimar ou proibir livros politicamente
contestáveis; eles simplesmente não os prescrevem. Assim, hoje, os
esforços dos progressistas visam excluir as poucas e raras vozes de
oposição que ameaçam impedir a consolidação de um completo
monopólio sobre a informação e a opinião dentro das universidades.
Portanto, o que Bloom explica a respeito da década de 1960 diz
muito, mas, por si só, é insuficiente. Então surge a seguinte
pergunta: de onde os criminosos de Cornell tiraram a ideia de tomar
o controle conforme os moldes fascistas? Quem lhes ensinou essas
táticas que persistem até hoje? Mostro, aqui, que os verdadeiros
antepassados dos ativistas de Cornell e seus sucessores são os
mestres da opressão, da intimidação e do terror — os nazistas.
Ao longo desse livro venho lidando com paralelos entre a
esquerda americana e os nazistas, mas esse é o ponto em que a
esquerda de hoje mais se parece com seu análogo nazista. Foram
os nazistas que criaram um Estado dentro do Estado e inventaram a
sistematização do controle cultural, as técnicas de propaganda, de
opressão e intimidação agressivas que agora servem de modus
operandi para a esquerda progressista.
O Gleichschaltung Progressista
O termo nazista para tanto era Gleichschaltung, o que significa
alinhar toda a sociedade às prioridades esquerdistas do nazismo.
Em seu cerne, o Gleichschaltung é uma doutrina de uniformizar a
política e controlar a sociedade; é a forma original do politicamente
correto. O Gleichschaltung opera em grande parte por meio da
pressão externa e da intimidação, mas os nazistas o consideravam
mais bem-sucedido quando redundava em Selbsgleichschaltung, ou
um tipo de “cooperação espontânea”, quando as pessoas
colocavam-se voluntariamente debaixo do domínio do regime
nazista. Aqui, argumento que a esquerda americana vem tentando
fazer algo semelhante ao aproximar a sociedade do progressismo.
Cabe ponderar dois casos paralelos em que a propaganda cultural
foi usada para transformar um marginal num ícone ideológico. Horst
Wessel, jovem de vinte e um anos, membro dos camisas pardas,
era conhecido por sua sangrenta luta contra os esquerdistas do
Partido Comunista e contra os rivais dos nazistas. Wessel também
era artista. Mudou-se para uma vizinhança boêmia de classe baixa e
compôs um poema de dezesseis linhas para o jornal nazista local.
Os comunistas assassinaram Wessel em meio a uma disputa
envolvendo a proprietária de seu apartamento tentando expulsar a
namorada do jovem rapaz, uma ex-prostituta, chamada Erna
Jaenicke.
Ordinariamente falando, este seria um episódio sórdido que
melhor teria sido se caído no esquecimento. Mas Goebbels usou a
mídia nazista para retratar Wessel como mártir. Um grupo de
nazistas colocou o poema de Horst Wessel em uma antiga melodia
alemã, e assim nasceu a canção de Horst Wessel. Seu funeral foi
uma enorme manifestação nazista, com milhares de pessoas de luto
e com o próprio Goebbels discursando. Em meio a lágrimas e
aplausos, Goebbels declarou: “Onde quer que haja uma Alemanha,
você, Horst Wessel, também estará lá”.6 Em seguida todos
entoaram em alta voz a canção de Horst Wessel, que se tornou uma
espécie de hino nazista, cantado durante a década de 1930 e
durante a guerra para gerar entusiasmo no público e nas tropas.7
Esse falso martírio é a base para os hinos progressistas entoados
a facínoras e criminosos de hoje, de Che Guevara a Bill Ayers e
Trayvon Marker. Da mesma forma para a esquerda e para os
nazistas, parece não haver nada que seu próprio lado não possa
fazer e depois sair ileso. De certa forma, quanto pior a ofensa, mais
duro a esquerda luta para legitimá-la. Os facínoras da esquerda não
só tornam-se heróis culturais, mas também aqueles que os criticam
de alguma forma transformam-se nos vilões da história. É a história
de Horst Wessel sendo repetida vez após vez. Suponho que a única
diferença seja que ainda não existe uma canção para Trayvon
Martin, e que Goebbels nunca afirmou que, no lugar de Horst
Wessel, poderia ter sido seu próprio filho.
No entanto, mesmo quando abraça a propaganda nazista e suas
táticas de opressão, a esquerda insiste, engraçado dizer, afirmando
que suas ações são em nome do antinazismo. É daí que a
respeitabilidade moral vem. É assim que os facínoras fascistas
podem ser retratados por seus aliados progressistas na mídia e em
Hollywood como sendo bonzinhos. Por contraste, os seus alvos —
as vítimas dos abusos e opressões fascistas — são retratados como
fascistas que merecem ser humilhados e abusados dessa maneira.
Se agora você começou a sentir que isso tudo não passa de uma
construção horrivelmente doentia e invertida, você está certo. Pois,
sim, realmente é.
Como as coisas chegaram a tal ponto? Essa incrível história
começa com um filósofo nazista que, por acaso, é um dos grandes
filósofos do século XX, Martin Heidegger. Ela continua com um dos
alunos judeus de Heidegger, Herbert Marcuse, que, curioso notar,
aprendeu a sua mais importante lição com os nazistas e a trouxe
para a América. Por razões que serão reveladas em breve, Marcuse
ensinou a esquerda dos anos 1960 a imitar os fascistas enquanto
posava de antifascista.
Finalmente, voltamo-nos para outro refugiado do nazismo, que, no
entanto, em sua juventude, trabalhou com os nazistas e agora
lidera, de maneira semelhante a Mussolini e Hitler no passado, sua
própria milícia privada. Note que Trump não possui uma milícia
privada, mas que esse sujeito a tem. No caso dele, bem como no de
Marcuse, a selvageria fascista deriva sua legitimidade moral e
respeitabilidade pública de uma falsa pose antifascista. Seu nome é
George Soros.
Intolerância Repressiva
Marcuse era ativo em todas as frentes. Em seu livro One
Dimensional Man [O Homem Unidimensional], ele critica o
capitalismo americano por reduzir todos os valores aos valores do
mercado e os seres humanos a consumidores manipulados pela
publicidade corporativa. A solução de Marcuse consistia em
combater a publicidade corporativa com a propaganda política,
visando motivar a consciência pública e mobilizá-la contra o
capitalismo.
Marcuse também escreveu seu An Essay on Liberation [Um
Ensaio sobre a Libertação], mostrando à esquerda na América como
ela poderia ajudar as revoluções socialistas no Vietnã, Cuba e
mundo afora: em essência, ajudaria ao tornar-se parte de uma
guerrilha de resistência nos Estados Unidos. Mais uma vez, música
aos ouvidos de ativistas de esquerda na década de 1960. Sem
dúvida eles pensaram: “Quer dizer que eu também posso me juntar
a uma guerrilha à lá Che Guevara bem aqui, em Ann Arbor,
Michigan?”.
Aqui, desejo concentrar-me na ideia de que Marcuse
provavelmente seja melhor lembrado como alguém que não poderia
ser mais pertinente nos dias de hoje, o que bem se percebe a partir
de um famoso ensaio escrito por ele, intitulado Repressive
Tolerance [Tolerância Repressiva]. Este, publicado em 1970, junto
de vários outros em um livro chamado A Critique of Pure Tolerance
[Crítica da Tolerância Pura].
Sigamos o argumento do ensaio, pois ele fornece a base para a
intolerância viciosa que a esquerda atualmente desencadeia contra
todas as formas de dissidência em nossa cultura. O assédio, a
opressão e o terrorismo contra conservadores no câmpus
universitário, a ridicularização dos republicanos na mídia, a
profanação da bandeira americana, a interrupção dos comícios de
Trump — todo esse comportamento recebe sua justificativa moral no
notório ensaio de Marcuse.
Ele começa admitindo que, se nada mudar no cenário em
questão, virtudes liberais clássicas como a tolerância e a liberdade
de expressão são desejáveis. Mas, segundo ele, dada a estrutura
de classe da sociedade, em que os grupos governantes têm a maior
parte do poder e os grupos desprotegidos têm pouco, “os limites da
tolerância estão lotados”. Estender tolerância a grupos intolerantes,
Marcuse argumenta, “na verdade protege as já consagradas
máquinas de discriminação”.
Portanto, Marcuse argumenta que um princípio geral de tolerância
liberal — tolerância em relação a todos os pontos de vista — deve
ser abandonado: “A tolerância não pode ser indiscriminada e igual
no que diz respeito ao conteúdo daquilo que é expresso, nem em
palavras nem em ações; a tolerância não pode proteger palavras de
falsidade nem atitudes erradas, estas manifestando que
contradizem e neutralizam as possibilidades de libertação”.
Na sociedade, Marcuse insiste: “Certas coisas não podem ser
ditas, certas políticas não podem ser propostas, certos
comportamentos não podem ser permitidos, sem fazer da tolerância
um instrumento para a continuação da servidão”. Marcuse não era
nada menos que contundente sobre o que defendia: “revogue-se
sistematicamente a tolerância para com opiniões regressivas e
repressivas”.
O que especificamente Marcuse procurava reprimir? Ele cita “a
retirada da liberdade de expressão e do direito de assembleia de
grupos e movimentos que promovem políticas agressivas,
armamento, chauvinismo, discriminação racial e religiosa, ou que se
opõem à ampliação dos serviços públicos, segurança social,
assistência médica, etc”. Além disso, Marcuse acrescenta que sua
“abordagem poderia exigir novas e rígidas restrições aos ensinos e
práticas nas instituições educacionais”, incluindo a supressão de
certos tipos de “pesquisa científica”.
Sem rodeios, Marcuse clama por “intolerância contra os
movimentos de direita e tolerância aos movimentos de esquerda”.
Ele confessa que seu objetivo é “mudar o equilíbrio entre a direita e
a esquerda, restringindo a liberdade da direita”, para, assim,
“fortalecer os oprimidos contra os opressores”. O argumento de
Marcuse resume-se nesta frase: sem tolerância para com o
intolerante. Na década de 1960, os acólitos de Marcuse entoaram
uma máxima semelhante: “Abaixo a liberdade de expressão para os
fascistas”.
Marcuse lembra seus leitores de que, quando os fascistas
planejavam um massacre, “os discursos dos líderes fascistas e
nazistas eram o prólogo imediato ante o massacre”. No entanto, ele
diz: “Poderia ter sido possível interrompê-lo enquanto ainda
estivesse na posição de mensagem propagada, antes que fosse
tarde demais”. Na verdade, se desde antes não houvesse tolerância
para com os nazistas, “a humanidade poderia ter evitado Auschwitz
e uma guerra mundial”. Marcuse convida companheiros
esquerdistas e progressistas a dar à direita na América o que se
pode chamar de tratamento fascista ou nazista — uma forte dose de
repressão e intolerância.26
À primeira vista, “restringir a liberdade de expressão para
fascistas” soa irrepreensível. Mas basta refletir um pouco que a ideia
torna-se problemática. Debaixo da Constituição, não são os direitos
iguais a todos os cidadãos e, assim sendo, não têm eles os mesmos
direitos à liberdade de expressão, à livre assembleia, e assim por
diante? Se assim for, os fascistas também têm tais direitos. Então,
com base em que os fascistas na América podem ter seus direitos
negados? Visto ter isso em mente, Marcuse obviamente não
acredita nos direitos iguais em pé de igualdade para todos os
cidadãos; nem seus seguidores de hoje, pelo visto.
Além disso, Marcuse não prova nem sequer por um instante que
os grupos que ele pretende reprimir são de fato fascistas. O alvo de
Marcuse não são nazistas, mas sim patriotas, republicanos e
conservadores. O significado verdadeiro de seu ensaio é o seguinte:
não à liberdade de expressão para patriotas e conservadores!
Nenhuma tolerância para capitalistas e cristãos! Já era esperado,
fascistas e nazistas, eles mesmos procuravam minar as instituições
da democracia liberal como a liberdade de expressão e a tolerância,
ato congênere aos ensinamentos de Marcuse.
Lutar contra o fascismo com intolerância é uma coisa. Mas lutar
contra o liberalismo clássico e o conservadorismo americano
moderno com intolerância é, a bem da verdade, fascismo. Stanley
Payne, historiador — que não é conservador —, sem dúvida
entendeu a mensagem. Em seu livro A History of Fascism, Payne
analisa o argumento de Marcuse sobre a tolerância repressiva e
conclui: “Em vez de apresentar uma interpretação do fascismo,
Marcuse parece simplesmente refletir o tipo de pensamento que,
desde o princípio, formou o próprio fascismo”.27 Em outras
palavras, quem quiser saber como é um fascista, que comece com
Marcuse.
Às vezes me pergunto como é que Marcuse, um refugiado da
Alemanha nazista, poderia tão sofisticamente recomendar as
mesmas táticas nazistas das quais fugiu. Lendo Marcuse — sua
admiração maquiavélica pelo uso astuto da força, sua exaltação do
poder nietzschiano —, acho que descobri. Qualquer que fosse sua
repulsa ao antissemitismo nazista, Marcuse entendeu que o uso de
táticas terroristas da Alemanha nazista era efetivo. Eles
conseguiram, os nazistas derrotaram seus adversários e os
subjugaram. Resumidamente, eles produziram o seu próprio
Gleichschaltung. Então, Marcuse imaginou, por que nós, que
também somos de esquerda, não aplicamos algumas dessas
mesmas táticas triunfantes nos Estados Unidos?
O objetivo último de Marcuse nesse ensaio é bastante claro. Ele
pretende capacitar progressistas e esquerdistas ao uso de todo tipo
de tática, desde a discriminação até a repressão e a violência direta,
a fim de erradicar sua oposição conservadora. Não se preocupe
com ser intolerante, ele diz, mas lembre-se somente de que a luta é
contra a intolerância! Percebe-se assim como grupos facínoras de
esquerda, Black Lives Matter, Antifa e todos os demais, recebem
suas táticas de guerrilha contra a moral.
Há, na tese de Marcuse, um corolário final que geralmente passa
desapercebido. Marcuse não só autoriza o que for preciso para o
uso de táticas opressoras e terroristas contra a direita. Ele também
garante aos esquerdistas que o escape é certo, eles podem fazer o
que quiser e sair ilesos, afinal são eles é que estão do lado da
humanidade e da libertação.
Vale considerar por um instante o porquê de o comportamento
predatório de Bill Clinton ser rotineiramente desculpado pela
esquerda, mesmo por supostas feministas que ficariam loucas se
um republicano ou conservador fizesse algo remotamente parecido.
É útil lembrar que Bill não foi um mero galanteador; muitas mulheres
o acusaram de assédio, tentativas de agressão e até mesmo
estupro. A explicação óbvia para tamanha imunidade é que Bill está
politicamente ao lado dos anjos, ou seja, ele está no campo
progressista e, portanto, não há limites quanto ao nível de proteção
que lhe é permitido.
A mídia de esquerda foi meticulosamente protetora ao falar do
filantropo democrata Jeffrey Epstein e de sua ilha, onde eram
organizadas orgias, muito menos mostrou interesse em cobrir as
perversidades de Anthony Podesta com suas práticas de “spirit
cooking”*. Mesmo o caso de Anthony Weiner com escândalos
envolvendo meninas menores de idade não seria problema para a
esquerda, desde que não causasse maiores alardes e tornasse
Wiener politicamente calamitoso.
Concluo esta parte sobre Marcuse voltando-me aos artigos
esquerdistas mencionados anteriormente; estes insistem que os
escritos da Escola de Frankfurt são de necessidade crítica para
entender Trump e nosso momento atual. Acredito eu que possamos
ver agora que de fato são. Deles não se entende Trump e o GOP
como fascistas perigosos. Pelo contrário. Eles mostram é que
Marcuse, Adorno e os demais eram fraudes intelectuais e políticas.
Artistas vigaristas de esquerda, uma classe que criou sua própria
versão da grande mentira e deu uma bela demonstração de como
orquestrar uma vingança nos moldes fascistas enquanto posando
de antifascistas.
A Violência de Risco de George Soros
Finalmente, voltemo-nos para o terceiro facínora da trilogia,
investidor e magnata dos negócios, George Soros. Como Heidegger
e Marcuse, ele também faz parte do Gleichschaltung progressista e
todos os três parecem fazer isso da mesma maneira. De origem
húngara, Soros passou ao patamar de bilionário por meio de astutos
investimentos globais e manipulações da moeda; seu grupo
Quantum Fund é um dos primeiros fundos de hedge, ou fundo de
cobertura, privados do mundo. Ao mesmo tempo que Heidegger e
Marcuse podem ser considerados intelectuais por trás do fascismo
progressista, Soros com certeza é seu maior financiador.
Soros é o que mais financia cerca de duzentos grupos
esquerdistas, incluindo Planned Parenthood, MoveOn.org e várias
organizações ambientalistas e de direitos humanos de esquerda.
Todos são resolutamente opostos a Trump e ao GOP. A Marcha das
Mulheres, propagada pela mídia como uma erupção espontânea
contra Trump, foi subsidiada em peso pela rede de Soros. Ele
também apoia os chamados grupos antifascistas e a organização
Black Lives Matter. Em 2015, por exemplo, a ONG Open Society de
Soros doou 650 mil dólares em apoio à manifestação do grupo
Black Lives Matter logo após o assassinato de Freddie Gray, em
Baltimore. Este ano, o Pacto pela Justiça Global [Alliance for Global
Justice], grupo apoiado por Soros, doou 50 mil dólares para os
criminosos militantes associados ao grupo Refuse Fascism.28
Como Soros vê seu papel na formação da América e do mundo?
Que ele fale por si mesmo. “Eu me imaginei como um tipo de deus”,
nas palavras de Soros. “Para falar a verdade, carrego comigo,
desde a infância, algumas fantasias messiânicas bastante potentes”.
Quando o jornal britânico Independent pediu-lhe que explicasse
essa estranha afirmação, Soros disse: “É uma espécie de doença
quando você se considera um tipo de deus, o criador de tudo, mas
agora estou confortável, desde que aceitei e comecei a agir
assim”.29 Seria necessário voltar às declarações de Hitler após
suas primeiras vitórias para ouvir palavras de tamanho calão, das
quais até os déspotas mais descarados costumam se abster.
E, neste caso, o que viria a ser a agenda desse “deus”? Em
outras palavras, o que os grupos financiados por Soros realmente
fazem? Um deles, o Revolutionary Love Project [Projeto de Amor
Revolucionário], envia ativistas a audiências públicas em
determinadas prefeituras e os mune de roteiros sobre como
humilhar deputados e senadores republicanos. A ideia toda é criar
uma impressão artificial — e, em seguida, exagerada nos meios de
comunicação — de que há uma onda de oposição pública a Trump
e ao GOP. Outra tática favorita dos grupos financiados por Soros é o
falso ataque racista. Houve dezenas desses dentro dos últimos
anos, principalmente nos câmpus universitários. Esquerdistas
pintam frases racistas nas paredes ou nos banheiros e depois, já
posto o alvoroço, eles próprios, os perpetradores, organizam
manifestações em protesto contra o que eles afirmam ser um
ressurgir do ódio, e tudo inspirado por Trump.30
Soros não apenas financia o ativismo como financia a violência
disruptiva. Seus esquadrões fantasiados e empunhando bastões
equivalem a um exército particular. Ele criou uma milícia paga de
marginais muito semelhante aos camisas negras, na Itália, e aos
camisas pardas, na Alemanha nazista. A estratégia de Soros é
lançar dezenas, até mesmo centenas de grupos, e depois ver quem
dá conta. Tomando emprestado do capital de risco, meu termo para
o que Soros faz é violência de risco, operada através de
manifestantes pagos.
O manifestante remunerado é fenômeno novo na política
americana. Na década de 1960, havia manifestantes de esquerda,
até mesmo os violentos, mas ninguém era alugado por hora. Os
grupos de Soros, pelo contrário, lançam anúncios de ‘contrata-se’
para arruaceiros, marginais e ladrões. Vi um anúncio no Craigslist
oferecendo quinze dólares por hora para manifestantes; a vaga,
causar problemas. Daí os esquerdistas podem imaginar que estão
lutando contra Hitler e recebendo por vandalismo. Infelizmente o
anúncio não menciona se Soros também oferece plano de saúde.
David Brock, administrador de vários grupos financiados por
Soros, dentre eles o Media Matters, é seu escudeiro por excelência.
Conheço Brock desde os velhos tempos, quando ele professava ser
conservador. Já naquela época, Brock era conhecido como um
homem desprezível e desonesto. Ele se gabava por não ter
escrúpulos, de estar disposto a mentir por uma causa. Tendo sido
exposto, confessou. No entanto, longe de tentar limpar o que havia
feito, ele se apresentou à esquerda como alguém disposto a
oferecer sua inescrupulosidade pela causa deles.
Brock fingiu ter sido forçado àquela “conversão” política, causada
pelos conservadores de Reagan que desaprovavam sua
homossexualidade. A bem da verdade, sua postura homossexual
era bem conhecida entre nós, jovens reaganitas, e não tínhamos
nenhum problema com isso, desde que Brock mantivesse discrição
pública, o que ele fazia. Apesar dos pesares, quando Brock perdeu
o rumo e vendeu seus serviços para a esquerda, parte da aceitação
que conseguiu estava ligada à homossexualidade.
E-mails divulgados pela Wikileaks mostram Neera Tanden, ativista
de esquerda e chefe do Centro em prol do Progresso Americano,
descrevendo Brock como alguém “obscuro” e uma “ameaça”.31
Com Brock, mas também com tantos jovens nazistas, a maldade e o
oportunismo parecem andar juntos. Seja qual for a posição política,
todos os que conhecem Brock podem ver quão bem ele se
encaixaria com os antigos camisas pardas homossexuais. De vez
em quando consigo imaginá-lo em posição de sentido e saudando
de braço erguido sempre que Soros entrar pela porta.
Posso parecer grosseiro, até mesmo insensível, no uso dessa
linguagem quando falo sobre Soros, judeu que, afinal de contas,
refugiou-se do nazismo. Além do mais, Soros afirma ser devoto do
filósofo Karl Popper; uma rede deste grande magnata, a Open
Society Institute, recebeu seu nome por causa de um dos livros mais
conhecidos do filósofo. Popper é um paladino das ideias clássicas
liberais de liberdade de expressão e debate aberto, o que faz com
que ele e Soros estejam em um relacionamento bastante estranho.
Vasculhei o trabalho de Popper para descobrir o que Soros viu nele,
mas não achei nada. Sou forçado a concluir que tamanho apreço
por Popper é completa fachada. Isso faz com que Soros possa fingir
ser amigo da liberdade enquanto maquina miná-la.
O Onzeneiro de Hitler
Soros adora jogar a cartada nazista, como, por exemplo, quando
após o 11 de setembro depreciou o procurador-geral do presidente
Bush, John Ashcroft, por questionar o patriotismo de seus críticos —
uma tática que Soros comparou aos nazistas. “Isso me fez lembrar
da Alemanha sob o comando dos nazistas”, Soros disse, “é o tipo de
conversa que Goebbels costumava usar para alinhar os alemães.
Lembro bem, eu tinha treze ou catorze anos. Foi o mesmo tipo de
propaganda”.32
Essa referência à juventude torna a transcrição de uma entrevista
com Soros, ao ar em 1998 pela rede CBS no programa Sixty
Minutes, especialmente reveladora. Aqui está o que Soros contou
ao entrevistador Steve Kroft sobre esses dias fatídicos na Alemanha
de Hitler:
Kroft: Você é um judeu húngaro.
Soros: Hum...
Kroft: . . . que escapou do Holocausto.
Soros: Hum...
Kroft: . . . se… se passando por cristão.
Soros: Isso.
Kroft: E você viu muitas pessoas sendo levadas para os
campos de extermínio.
Soros: Isso. Eu tinha catorze anos. Diria que foi quando o meu
caráter foi formado.
Kroft: De que maneira?
Soros: De um jeito que faz você pensar no futuro. É necessário
entender e antecipar os eventos quando se está sob ameaça.
Foi um tremenda ameaça do mal. Quero dizer — foi uma
experiência muito pessoal do mal.
Kroft: Meu entendimento é que você saiu com este seu
protetor, ele jurando que você era o afilhado dele por adoção.
Soros: Sim. Sim.
Kroft: Saiu e, mesmo assim, ajudou no confisco de propriedade
dos judeus.
Soros: Sim. Isso mesmo. Sim.
Kroft: Quero dizer, isso. . . essa parece uma experiência que
enviaria muitas pessoas para o divã por muitos, muitos anos.
Foi difícil?
Soros: Não, de jeito nenhum. Talvez, quando criança, você não
— você não veja a conexão. Mas foi, assim — não, não me
causou absolutamente nenhum tipo de problema.
Kroft: Sem sentimento de culpa.
Soros: Nenhum.
Kroft: Por exemplo, “eu sou judeu e aqui estou, vendo essas
pessoas partindo. Eu poderia tão facilmente estar lá. Eu
deveria estar lá”. Nada disso?
Soros: Bom, claro que eu, que eu poderia estar do outro lado
ou eu poderia ser aquele de quem o objeto está sendo tirado.
Mas não faria sentido eu não estar lá, porque — bem, na
verdade, é cômico dizer, é como no mercado — se eu não
estivesse lá, é claro que não estaria fazendo aquilo, mas outra
pessoa estaria — alguém estaria tirando de qualquer forma.
E foi assim mesmo — se eu estivesse lá ou não, eu não passava
de um espectador, a propriedade estava sendo tomada. Então, eu...
não fiz o papel de tirar essa propriedade. Assim eu não tenho
sentimento de culpa.33
O que me interessa aqui não é aquilo que o jovem Soros fez —
não pretendo impor peso demasiado à conduta de alguém com
catorze anos de idade —, mas sim como o Soros já maduro
interpreta retroativamente suas ações do passado como um
rapazote que confiscava a mando de Hitler. Evidentemente, Soros
acredita que acompanhar uma autoridade do governo fascista em
colaboração com os nazistas no propósito de cumprir mandados de
confisco aos judeus para roubar seus bens e propriedades não seja
algo de que se deva sentir-se culpado ou arrependido.
Por quê? Pois, assim como uma transação de mercado, o
resultado teria acontecido de qualquer forma. Quem já disse isso
antes? Ah, sim, claro. Lembre-se da resposta de Josef Mengele
quando confrontado por seu filho, Rolf, acerca de seus crimes.
Mengele insistiu que não era responsável pelo que aconteceu em
Auschwitz, dado que os cativos lá já estavam sentenciados à morte.
Eis então Soros montando o que pode ser chamado de Defesa
Mengele. A única diferença é que Mengele não se safou, enquanto
a explicação de Soros parece totalmente satisfatória para a
esquerda política.
Numa breve biografia de Soros para a revista New Yorker, Jane
Mayer nota que Soros uma vez descreveu 1944 — o ano em que
Hitler despachou mais de 500 mil judeus para campos de extermínio
— como “o ano mais feliz da minha vida”. Mayer acrescenta que
este foi o ano em que o pai de Soros salvou sua família fornecendo-
lhes falsos documentos de identidade. Aparentemente, o pai de
Soros fez o mesmo por outras famílias judias, embora tenha vendido
os papéis e, assim, lucrado com esse esforço.
Mayer perguntou a Soros sobre o ocorrido e este disse: “Eu tive a
sorte de ter um pai que entendeu que não estávamos no estado
normal das coisas, e se seguir as regras convencionais, você morre.
Muitos judeus não tomaram medidas evasivas. O que aprendi
durante a guerra é que, às vezes, você pode perder tudo, mesmo a
sua vida, ao não correr riscos”.34 Mais uma vez, Soros se esquiva
do problema. Justamente por não ser uma época normal, parece
não ser razoável ganhar dinheiro ajudando seus companheiros
judeus a sair da Alemanha.
Soros não enxerga assim. Ele não vê nada de errado com o que
seu pai fez. Pelo contrário, ele o vê como um herói pessoal. Ele
parece culpar os judeus não tão visionários quanto seu pai. Por que
aqueles que pensaram à frente não deveriam se beneficiar daqueles
que não o fizeram? E, mais uma vez, Soros, de maneira rude,
associa toda a questão a decisões de mercado e de investimento:
vejam o que acontece quando os tipos corretos de riscos não são
tomados!
Percebe-se em Soros o tipo de amoralismo padrão que o coloca
na mesma categoria de Heidegger e Marcuse. Estes três homens
foram profundamente íntimos do nazismo, com toda uma visão
formada em resposta a essa relação. Consequentemente, o
movimento esquerdista que eles moldaram na América também é
produto desse engajamento. Somos vítimas dessa possessão
demoníaca. Em certo sentido, o fascismo deixou esses três homens
loucos, e agora eles estão tentando deixar todos nós loucos
também.
Veja como esse trio, Heidegger, Marcuse e Soros, colocou seus
talentos e recursos por trás das causas esquerdistas truculentas.
Heidegger apoiou abertamente os nazistas. Marcuse e Soros
promovem táticas nazistas em nome de uma esquerda
supostamente antifascista. Juntos, esse trio horrendo desempenhou
um papel importante na destruição das universidades, na
propaganda esquerdista da mídia e nas táticas dos camisas pardas
usadas pelos progressistas de hoje.
Capítulo Nove
Desnazificação
O Fim da Gleichschaltung
Finalmente, agora chegou a vez de analisar o semblante mais
repulsivo do fascismo progressista; a saber, seu empenho em
estabelecer a uniformidade de pensamento e de sentimento por
todo o país. O projeto da esquerda aqui reflete aquilo que Joseph
Goebbels declarou a respeito do Gleichshaltalung nazista: “O
nacional-socialismo não só é uma doutrina política; é uma
perspectiva universal e toda abrangente sobre os tópicos do
coletivo. Esperamos que chegue o dia quando ninguém mais terá de
referir-se ao nacional-socialismo, uma vez que este haverá se
transformado no ar que respiramos. O povo precisa internalizar essa
disposição mental, as pessoas devem apossar-se dessa postura.
Tão somente quando isso for assimilado é que uma nova inclinação
terá surgido na cultura”.6
A esquerda, buscando precisamente esta mesma conformidade
de pensamento e sentimento sobre toda a sociedade americana,
tem seu próprio Gleichshaltalung não meramente “ateando fogo nas
ruas”, mas também através de uma longa guerrilha por meio das
instituições. Havendo cercado boa parte delas, a esquerda agora
pode usar a academia, a mídia e Hollywood — seu Estado dentro do
Estado — para, sem reservas em ato contínuo, disseminar a
propaganda fascista. Concorrente a isso, tamanha propaganda
expele conservadores e vozes dissidentes destas mesmas
instituições. Seus marginais fascistas — autointitulando-se
“ativistas” — não hesitam em assediar, intimidar e espancar aqueles
que vierem a representar ameaça ao Gleichshaltalung da esquerda
atual.
Esse é um tipo de fascismo que exige da direita um novo tipo de
reação. Até agora os conservadores contentaram-se em
documentar e lastimar as tendências e predisposições da academia,
da mídia e de Hollywood. Postura que não chega nem perto de ser
suficiente. É preciso romper com esse monopólio da informação. É
imperativo abrir um novo espaço para pontos de vista rivais e
dissidentes. É necessário criar instituições culturais que façam
rivalidade. E é preciso parar esses marginais que vão às ruas para
não fazer nada além de causar tumulto. Isso tudo exigirá da direita
nova criatividade, nova resolução, uma nova disposição para fazer
uso da força física prescrita na lei. Quem disser que a força física
está fora de cogitação não entende o que significa deter o fascismo.
O primeiro passo é, para nós da direita, cultivarmos uma nova
mentalidade. Devemos aprender a decifrar aquilo que lemos, vemos
e ouvimos. Quando vemos na CNN, por exemplo, sendo dito que
Trump pende a um péssimo início de mandato, devemos aprender a
reconhecer que isso significa que Trump pende a um ótimo início de
mandato — pois aquilo que é ruim no ponto de vista da CNN, na
verdade é bom no nosso ponto de vista. Devemos nos habituar a
tratar como falso tudo o que a academia progressista, a mídia
progressista e o Hollywood progressista nos apresentam.
Obviamente não no sentido concreto da coisa, mas num sentido
mais profundo, de que os fatos estão sendo manipulados a serviço
de uma metanarrativa fascista. Em suma, devemos estar sempre
alertas para a grande mentira em todas as suas formas.
Segundo passo, devemos usar todo o arsenal à nossa disposição,
da mídia conservativa às mídias sociais, para esfolar em público a
academia, Hollywood e a mídia por seu partidarismo e exclusivismo
unilaterais. Trump já vem agindo a este respeito, e é essa uma das
coisas que eu mais amo nele. Gostaria de vê-lo indo mais a fundo
nessa direção política, cortando os fundos federais para a Rádio
Pública Nacional e para o Serviço Público de Transmissão dos EUA.
Ambos são órgãos de propaganda da esquerda fascista.
Quando as universidades estatais expulsam palestrantes
conservadores, os legisladores republicanos deveriam mover-se
depressa para cortar o financiamento federal e estatal dessas
instituições. Em locais como Berkeley, onde o reitor universitário, o
prefeito e a polícia local parecem conspirar para sufocar os direitos
da Primeira Emenda da Constituição, Trump deveria enviar a
Guarda Nacional até lá, bem do jeito como Eisenhower fez em 1957,
para impedir outro grupo de democratas fanáticos de reprimir os
direitos constitucionais dos estudantes negros. É lógico que a
esquerda vai berrar. Mas deixe-os berrando. É para isso que
estamos aqui.
Note que não estamos tentando persuadir os fascistas de
esquerda. Nada seria mais inútil. Pelo contrário, o que estamos por
fazer é reduzi-los o máximo possível. Também estamos alertando o
público de que aquilo que eles recebem da esquerda não é mero
“conhecimento”, “notícias”, “entretenimento”, mas propaganda
política mascarada de conhecimento, de notícias e de
entretenimento. Este é o significado original das #FakeNews. Uma
vez que o povo americano passe a enxergar tudo isso, o poder dos
megafones da esquerda será dissolvido. E a partir daí é que então a
política americana se tornará genuinamente competitiva. Estamos,
aqui e agora, lutando contra todo o aparato da cultura geral contra
nós.
Terceiro, ao longo do tempo temos de criar nossas próprias
instituições para fazer rivalidade. É claro, eu sei que não
conseguiremos dar início a milhares de novos câmpus, mas a boa
notícia é que, com a ajuda da tecnologia, não precisamos. Em vez
disso, o que devemos fazer é criar as melhores universidades on-
line, para que batam de frente com o melhor que a academia
progressista pode oferecer. Se descobrirmos um jeito de
providenciar uma educação de alta qualidade por uma fração do que
é cobrado pelo ensino superior atual, nós podemos revolucioná-lo e
desafiar, talvez até substituir, sua estrutura de poder vigente.
Também precisamos produzir nossos próprios filmes — não
meramente documentários, mas também longas-metragens. Dentro
de poucos anos, superei Michael Moore nos gráficos de produção
de documentários, obtendo, sucessivamente, a segunda, a sexta e a
oitava maior arrecadação vinda de documentários políticos de todos
os tempos. Mas isso está longe de ser o suficiente. Hollywood
comunica a maior parte de suas mensagens ideológicas via
comédias românticas, filmes de suspense, de terror e animações
para toda a família. O chefão de Hollywood não é Michael Moore; é
Stephen Spielberg. Precisamos competir em todos os gêneros do
cinema.
Além do mais, temos de construir canais de comunicação que
consigam ir mais longe do que o alcance relativamente limitado das
rádios e do canal Fox News. Pense no seguinte. No mundo da
comédia da TV, a esquerda tem Bill Maher, Jon Stewart, Stephen
Colbert e John Oliver. Até o momento, temos pouquíssimos para
competir com eles, e muitos jovens não só adquirem desses
palhaços seu próprio estilo e senso de humor como também sua
própria instrução política.
A solução, obviamente, é que precisamos ter nossos próprios
palhaços. Isto certamente levará tempo — Maher e companhia
começaram com apresentações locais, fazendo seus eight days a
week, “oito dias por semana”, ao estilo Beatles. Nós deveríamos ao
menos já ter começado. Pense em quão valiosas seriam as doações
feitas por conservadores se fossem para alguns daqueles projetos
inovadores, e não tudo para as já tão conhecidas ONGs partidárias
ou para as ONGs sem fins lucrativos ou para as think tanks, que há
muito tempo já chegaram aos limites da eficácia. Só tomando tais
medidas, com criatividade e abrangência exaustivas, é que
conseguiremos alcançar a verdadeira desnazificação, uma vez que
isso trará fim ao Gleichschaltung da esquerda.
Devemos também lidar com as brigadas de Soros, e com isso
estou falando dos marginais de rua que usam táticas de terror e de
opressão para nos calar e nos apagar. Quando eles expulsarem
algum de nossos palestrantes de determinado câmpus universitário,
devemos enviar outros dez palestrantes e acompanhados de uma
segurança pesada. Se eles destroem nossos cartazes e nossas
placas, devemos do mesmo modo destruir os cartazes e placas
deles. Alguns “trumpsters” abraçaram medidas defensivas como
rastrear a identidade dos Antifas mascarados em protestos para
revelar seus nomes nas mídias sociais ou amarrá-los em postes e
placas de trânsito com fita adesiva. Reconheço ser este um ativismo
republicano atípico, mas com certeza isso dá o troco aos tirânicos
de esquerda.
E o mais importante, não podemos hesitar em romper a lei e a
polícia sobre esses camisas pardas da esquerda. Reagan deu bom
exemplo disso enquanto ainda governador da Califórnia, em 1960.
Toda perturbação violenta de hoje deveria ser agressivamente
julgada. O Partido Democrata, lembremo-nos, usou a Ku Klux Klan
como um de seus executores políticos. A KKK não saiu da ativa por
livre e espontânea vontade. Primeiro ela foi combatida por Ulysses
Grant, presidente republicano, durante o período de Reconstrução
dos EUA, e mais tarde pela aplicação legítima das leis com o FBI.
Quando os “protestos” da Antifa chegam ao patamar de violência,
crime, tumulto ou até mesmo terrorismo nacional, os culpados
também devem ser julgados pela força completa da lei.
Para fins de jurisprudência, cerca de duzentos esquerdistas —
dos quais muitos eram jornalistas — que perturbaram com violência
a cerimônia de posse presidencial foram acusados de perturbação
pública, crime que pode chegar a dez anos de prisão.7 A esquerda
queria nos fazer acreditar que tumultos e desordens são formas
nobres de protesto político e que, de certa forma, a lei não se aplica
ao caso deles. Como já é típico, casos assim caem nas mãos de
juízes progressistas, que liberam os manifestantes mediante uma
pena simbólica ou, afinal, nem chegam a penalizá-los. Nas
confusões causadas em Berkeley foi ainda pior: apesar do turbilhão
de violência, quase não houve prisões, uma vez que a polícia
permaneceu inerte. Mas ninguém deveria estar acima da lei. Se
juízes e júris passassem a decretar de cinco a dez anos de prisão a
esses casos, todo esse absurdo rapidamente diminuiria.
Quid Pro Quo
Por fim, chego à questão que tem me preocupado desde a posse
de Trump: como parar o uso que a esquerda faz dos poderes
governamentais contra a oposição? Sob o governo Obama, a
esquerda usou os poderes do Estado — o serviço da Receita
Federal Internal Revenue Service (IRS), o FBI, o Departamento de
Justiça e os programas de espionagem do governo — contra seus
críticos conservadores. Como quando a IRS perseguiu grupos do
movimento Tea Party com vigilância secreta e hostilização de
jornalistas dissidentes como Sharyl Attkisson e James Rosen;
inclusive eu fui seletivamente acusado de exceder as lei de
financiamento de campanha. Nenhum americano jamais foi
sentenciado e encarcerado durante as noites por oito meses pelo
que eu fiz.
Esse uso do poder governamental como armamento contra
dissidentes é um comportamento puramente fascista. Gentile o
descreve como uma etapa no desenvolvimento do fascismo, quando
este “não mais é uma revolução contra o Estado, mas um Estado
revolucionário mobilizado contra resíduos e restos internos que
obstruem sua evolução e estruturação”. O próprio Hitler chamou
esse tipo de retaliação do Estado fascista de uma forma de “terror
físico e espiritual”. Segundo Hitler, o proveito de tamanho terror está
em que os alvos desse mesmo horror “não estão preparados nem
moralmente nem mentalmente a esse tipo de ataque”. Eles então
são pegos de surpresa “até que os nervos da pessoa alvejada
entrem em colapso”. De acordo com Hitler, o objetivo de tão grande
terror é produzir submissão, alinhamento e conformidade política: “O
adversário derrotado, na maioria dos casos, desespera-se de ter
sucesso em manter resistência”.8
Como alguém que experimentou em primeira mão este uso da
intimidação fomentada pelo Estado, eu sei quão ruim tudo isso é.
Estou convencido de que alguns da equipe de Obama com quem
tive de lidar se encaixariam muito bem no célebre Tribunal do Povo
da Alemanha Nazista. Não devemos pensar que, porque estamos
na América, nós estamos imunes a esse tipo de pessoa. Também
temos a nossa escória da humanidade, e alguns dessa escória
usam crachá. Fortemente munidos de poder estatal, justamente
como as autoridades nazistas também eram, eles são muito mais
perigosos do que criminosos comuns e têm à disposição tribunais,
presídios e a força da Swat.
Assim eu me sinto severamente tentado a propor que Trump use
este mesmo aparato mortal contra a esquerda. Por que não mover o
IRS, o FBI e a Agência de Segurança Nacional contra a esquerda
da mesma forma como Obama fez com o Tea Party. Por que não
colocar a IRS para investigar Michael Moore do mesmo modo como
a administração de Obama usou o FBI para me investigar? Afinal
das contas, se não fizermos a eles o que eles fazem contra nós,
como é que conseguiremos detê-los? Eles não só pararão de nos
assediar e aterrorizar quando virem que nós também conseguimos
assediá-los e aterrorizá-los? Pessoalmente falando, eu amaria ver
Obama dormindo no beliche que usei onde fiquei confinado.
E há precedentes para esta abordagem que estou indicando. No
período da Guerra Civil, Lincoln soube que soldados do Exército
Confederado estavam matando tropas de soldados negros
capturados da União ou os vendendo como escravos em vez de
tratá-los como prisioneiros de guerra com direitos legais. Lincoln
imediatamente emitiu a Ordem de Retaliação. Ela dizia: “É, portanto,
ordenado que, para cada soldado dos Estados da União
assassinado, em violação das leis de guerra, um soldado insurgente
seja executado; e, para cada soldado escravizado pelo inimigo ou
vendido como escravo, um soldado insurgente seja submetido ao
trabalho pesado nos serviços públicos”.9
Apesar do evidente rigor daquele comando, Lincoln sabia que era
o único modo de mudar o comportamento do Exército Confederado.
E mudou. No entanto, eram tempos de guerra e, pensando bem,
estamos em situações diferentes. Não estamos em guerra civil, ao
menos ainda não estamos, e não queremos nos tornar instrumentos
da ilegalidade. Por sorte, não precisa ser assim, pois há uma melhor
solução — uma solução que funcionou. Em novembro de 2016, nós
expomos a bandidagem de Obama e de Hillary perante o povo
Americano, o povo Americano disse “chega!” e livrou-se daqueles
idiotas.
Foi um bom começo. O próximo passo é investigar e processar os
abusos de poder durante a administração Obama. Os esquerdistas
bradarão por vendeta política — a única vendeta que eles querem é
para o próprio lado deles —, mas estamos fazendo nada mais que
responsabilizar Obama, Holder, Lynch, Hillary e Lerner por suas
ações. Em suma, para esmagar o fascismo da esquerda, não
precisamos combater ilegalidade com ilegalidade; precisamos,
contudo, ser firmes e resolutos, compreendendo o tipo de pessoas
com quem estamos lidando.
Nós, conservadores e republicanos, estamos à altura do desafio?
Sim, creio que estamos. Olhe para a nossa história. Somos o partido
que batalhou uma grande guerra para pôr fim na escravidão, que
combateu linchamentos e segregação, que apagou a Ku Klux Klan,
que fez oposição à eugenia e à esterilização forçada, que resistiu ao
fascismo incipiente dos marginais e vândalos em 1960. Em suma,
somos o partido que, por um século e meio, tem lutado contra o
fascismo da esquerda política. Já vencemos antes, podemos vencer
novamente. Temos agora o poder para impedi-los de continuar.
Precisamos apenas pegar e fazer. Nas palavras de um lema vindo
dos anos 1960, “Se não agora, quando? Se não nós, quem?”.
Capítulo Um
O Retorno dos Nazistas
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Capítulo Dois
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http://www.nytimes.com/images/2017/02/22/nytfrontpage/scan.pdf.
11 JR., Cleve R. Wootson. Sen. Al Franken: Donald Trump’s New Adon the
Economy is Anti-Semitic. Washington Post, 6 nov. 2016. Disponível em:
https://www.washingtonpost.com/news/the-fix/wp/2016/11/06/sen-al-franken-
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DENBY, David. The Plot Against America: Donald Trump’s Rhetoric. New
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DREIER, Peter. Trump No Longer Really Running for President. The American
Prospect, 20 out. 2016. Disponível: http://prospect.org/article/trump-no-longer-
really-running-president.
12 SCHWARTZ, Ian. Netanyahu: No Greater Supporter of Jewish People and
Jewish State than Donald Trump. RealClear Politics, 15 fev. 2017. Disponível
em:
http://www.realclearpolitics.com/video/2017/02/15/netanyahu_no_greater_suppo
rter_of_jewish_people_and_jewish_state_than_donald_trump.html.
13 SULLIVAN, Andrew. The Madness of King Donald. New York Magazine, 10
fev. 2017. Disponível em: http://nymag.com/daily/intelligencer/2017/02/andrew-
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DAILY MAIL. Rosie O’Donnell Calls Trump ‘Mentally Unstable’ on Twitter and
Warns America That There are ‘Less Than Three Weeks to Stop Him. Daily
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DEMARCHE, Edmund. Democrats Introduce Bill to Take Nuclear Football out of
Trump’s Hands. Fox News, 25 jan. 2017. Disponível em:
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VLADIMIROV, Nikita. Dem to Unveil Bill Requiring a White House Psychiatrist.
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14 FEENEY, Matt. The Book That Predicted Trump. New Yorke. Disponível em:
http://www.newyorker.com/culture/cultural-comment/the-book-that-predicted-
trump.
15 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press,
1995. p. 203.
EVANS, Richard. The Coming of the Third Reich. New York: Penguin Books,
2005. p. 449.
16 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton
University Press, 1994. p. 4.
17 BEN-GHIAT, Ruth. An American Authoritarian. The Atlantic, 10 ago. 2016.
Disponível em: https://www.theatlantic.com/politics/archive/2016/08/american-
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to-democracy.html.
SNYDER, Timothy. Donald Trump and the New Dawn of Tyranny. Time, 3 mar.
2017. Disponível em: http://time.com/4690676/donald-trump-tyranny/.
18 HOHMANN, James. The Daily 202: Trump’s Warning to Comey Deepens
Doubts About His Respect for the Rule of Law. Washington Post, 12 maio 2017.
Disponível em: https://www.washingtonpost.com/news/powerpost/paloma/daily-
202/2017/05/12/daily-202-trump-s-warning-to-comey-deepens-doubts-about-
his-respect-for-the-rule-of-law/5915063ee9b69b209cf2b814/?
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19 MCADAMS, Dan P. The Mind of Donald Trump. The Atlantic, jun. 2016.
Disponível em: https://www.theatlantic.com/magazine/archive/2016/06/the-mind-
of-donald-trump/480771/.
20 ROSENBERG, Mark Y. Donald Trump’s Use of Fascist Language Forebodes a
Dark American Future. Quartz, 24 jan. 2017. Disponível em:
https://qz.com/892091/is-trump-a-fascist-donald-trumps-inaugural-speech-used-
fascist-language-to-prime-america-for-a-dark-future-agenda/.
21 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton
University Press, 1994. p. 215.
GREGOR, A. James. Young Mussolini and the Intellectual Origins of Fascism.
Berkeley: University of California Press, 1979. p. 98.
SMITH, Denis Mack. Mussolini. New York: Vintage Books, 1982. p. 15.
22 NIOSE, David. Our Memorial Day Collision Course with Fascism. Salon, 30
maio 2016. Disponível em:
http://www.salon.com/2016/05/30/our_memorial_day_collision_course_with_fas
cism_donald_trump_and_the_new_american_militarism/.
THAROOR, Ishaan. The Trump Presidency Ushers in a New Age of Militarism.
Washington Post, 1 mar. 2017. Disponível em:
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presidency-ushers-in-a-new-age-of-militarism/?utm_term=.843868bacc08.
23 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press,
1995. p. 11.
24 DEMOCRACY NOW. Cornel West on Donald Trump: This is What Neo-
Fascism Looks Like. Democracy Now, 1 dez. 2016. Disponível em:
https://www.democracynow.org/2016/12/1/cornel_west_on_donald_trump_this.
25 FELICE, Renzo De. Fascism. New Brunswick: Transaction Publishers, 2009. p.
63.
MOSSE, George. The Fascist Revolution. New York: Howard Fertig, 1999. p.
22.
PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press,
1995. p. 168.
26 GREGOR, A. James. Mussolini’s Intellectuals. Princeton: Princeton University
Press, 2005. p. 5.
27 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick:
Transaction Publishers, 2009. p. 25.
28 Além dos escritos de Gentile, minha narrativa fica em dívida especialmente
com o livro de A. James Gregor: Giovanni Gentile: Philosopher of Fascism. New
Brunswick: Transaction Publishers, 2008.
29 GENTILE, Giovanni. Origins and Doctrine of Fascism. New Brunswick:
Transaction Publishers, 2009. p. 28, 31, 55, 57, 67, 87.
30 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p.
207, 223.
31 LAQUEUR, Walter. Fascism: Past, Present and Future. New York: Oxford
University Press, 1996. p. 13.
32 DEMOCRACY NOW. Father of Fascism Studies: Donald Trump Shows
Alarming Willingness to Use Fascist Terms and Styles. Democracy Now, 15
mar. 2016. Disponível em:
https://www.democracynow.org/2016/3/15/father_of_fascism_studies_donald_tr
ump.
CHOTINER, Isaac. Is Donald Trump a Fascist? Slate, 10 fev. 2016. Disponível
em:
http://www.slate.com/articles/news_and_politics/interrogation/2016/02/is_donald
_trump_a_fascist_an_expert_on_fascism_weighs_in.html.
33 GREGOR, A. James. Giovanni Gentile: Philosopher of Fascism. New
Brunswick: Transaction Publishers, 2008. p. 63.
34 LANDLER, Mark; COOPER, Helene. Obama Seeks a Course of Pragmatism in
the Middle East. New York Times. 10 mar. 2011. Disponível em:
http://www.nytimes.com/2011/03/11/world/africa/11policy.html.
35 SMITH, Dennis Mack. Mussolini. New York: Vintage Books, 1982. p. 312.
36 TOLAND, John. Adolf Hitler. New York: Anchor Books, 1992. p. 224-225.
37 ULLRICH, Volker. Hitler. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 193.
Capítulo Três
A Jornada de Mussolini
1 HAYEK, F. A. The Road to Serfdom. Chicago: University of Chicago Press,
2007. p. 145.
2 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton
University Press, 1994. p. 208.
3 SHIRER, William. The Rise and Fall of the Third Reich. New York: Simon &
Schuster, 2011. p. 298.
4 ULLRICH, Volker. Hitler. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p. 125.
5 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. Intro. H. R. Trevor-Roper. New York: Enigma
Books, 2000. p. xxiv, 10.
6 GREGOR, A. James. The Faces of Janus. New York: Encounter Books, 2002. p.
105.
7 MURAVCHIK, Joshua. Heaven on Earth. New York: Encounter Books, 2002. p.
105.
8 ______. ______. p. 101.
9 ______. ______. p. 108.
10 STERNHELL, Zeev. The Birth of Fascist Ideology. Princeton: Princeton
University Press, 1994. p. 39-66.
11 GREGOR, A. James. The Ideology of Fascism. New York: Free Press, 1969. p.
159.
12 PAYNE, Stanley. A History of Fascism. Madison: University of Wisconsin Press,
1995. p. 84.
13 GREGOR, A. James. Young Mussolini and the Intellectual Origins of Fascism.
Berkeley: University of California Press, 1979. p. 20.
14 GREGOR, A. James. Mussolini’s Intellectuals. Princeton: Princeton University
Press, 2005. p. 33.
15 Para uma melhor discussão acerca de Woltmann, veja A. James Gregor em
seu livro: Marxism, Fascism and Totalitarianism. Standford: Standford University
Press, 2000. p. 183-186.
16 GREGOR, A. James. Giovanni Gentile. New Brunswick: Transaction
Publishers, 2008. p. 100.
17 GREGOR, A. James. Young Mussolini and the Intellectual Origins of Fascism.
Berkeley: University of California Press, 1979. p. 215.
Capítulo Quatro
Um Segredo do Partido Democrata
1 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. 160.
2 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 54.
3 HITLER, Adolf. Hitler’s Table Talk. New York: Enigma Books, 2000. p. 188.
4 GILBERT, Alan. The Cowboy Novels that Inspired Hitler. Daily Beast, 20 ago.
2016. Disponível em: http://www.thedailybeast.com/the-cowboy-novels-that-
inspired-hitler.
5 KATZNELSON, Ira. Fear Itself. New York: Liveright Publishing, 2003. p. 282-
283.
6 HITLER, Adolf. Mein Kampf. Boston: Houghton Mifflin, 1999. p. 139.
7 RICH, Norman. Hitler’s Foreign Policy. In: MARTEL, Gordon (Ed.). The Origins
of the Second World War Reconsidered: The A.J.P. Taylor Debate After Twenty-
Five Years. Boston: Allen & Unwin, 1986. p. 136.
WHITMAN, James. Hitler’s American Model. Princeton: Princeton University
Press, 2017. p. 9-10.
8 ULLRICH, Volker. Hitler: Ascent, 1889-1939. New York: Alfred A. Knopf, 2016. p.
665.
EVANS, Richard. The Coming of the Third Reich. New York: Penguin Books,
2005. p. 111.
9 TOLAND, John. Hitler: the Definitive Biography. New York: Anchor Books, 1992.
p. 702.
10 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. 160.
11 ALY, Gotz. Why the Germans? Why the Jews? New York: Henry Holt, 2014. p.
2.
12 BUGGELN, Marc. Slave Labor in Nazi Concentration Camps. New York: Oxford
University Press, 2014.
PLATO, Alexander Von; LEH, Almut; THONFELD, Christoph (Ed.). Hitler’s
Slaves. New York: Berghahn Books, 2010.
13 BUGGELN, Marc. Slave Labor in Nazi Concentration Camps. New York: Oxford
University Press, 2014. p. 22.
14 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 244.
15 SNYDER, Timothy. Bloodlands. New York: Basic Books, 2010. p. xiii, 256, 76,
382.
16 SOFSKY, Wolfgang. The Order of Terror. Princeton: Princeton University Press,
1993. p. 199.
17 STANNARD, David. American Holocaust. New York: Oxford University Press,
1992. p. x, 147.
18 LEWY, Guenter. Were American Indians the Victims of Genocide? History
News Network, set. 2004. Disponível em:
http://historynewsnetwork.org/article/7302.
19 UNITED NATIONS HUMAN RIGHTS OFFICE OF THE HIGH
COMMISSIONER. “Convention on the Prevention and Punishment of the Crime
of Genocide”. 9 dez. 1948. Disponível em:
http://www.ohchr.org/EN/ProfessionalInterest/Pages/CrimeOfGenocide.aspx.
20 INSKEEP, Steve. Jacksonland. New York: Penguin Books, 2015. p. 203-204.
21 ______. ______. p. 205.
22 JACKSON, Andrew. Andrew Jackson to Rachel Jackson, March 28, 1814
[carta]. In: OWSLEY, Harriet et. al. (Colab.). The Papers of Andrew Jackson.
Knoxville: University of Tennessee Press, 1980. v. 3, p. 54.
BALL, Timothy Horton; HALBERT, Henry Sale. The Creek War of 1813 and
1814. Montgomery: White, Woodruff & Fowler, 1895. p. 276-277.
23 “Andrew Jackson’s Speech to Congress on Indian Removal”. 6 dez. 1830.
Disponível em:
https://www.nps.gov/museum/tmc/MANZ/handouts/Andrew_Jackson_Annual_M
essage.pdf.
24 STANNARD, David. American Holocaust. New York: Oxford University Press,
1992. p. 123-124.
25 LAWRENCE, Jane. The Indian Health Service and the Sterilization of Native
American Women. In: MIHESUAH, Devon A (Ed.). American Indian Quarterly.
University of Nebraska Press, 2000. v. 24, n. 3, p. 400-419.
26 ELKINS, Stanley. Slavery: A Problem in American Institutional and Intellectual
Life. Chicago: University of Chicago Press, 1976. p. 111.
27 ______. ______. p. 130.
28 GENOVESE, Eugene. Rebelliousness and Docility in the Negro Slave. In:
LANE, Ann (Ed.). The Debate Over Slavery: Stanley Elkins and His
Critics.Urbana: University of Illinois Press, 1975. p. 43.
29 HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 25.
30 WIESEL, Elie. Night. New York: Hill & Wang, 2006. p. 52.
HELM, Sarah. Ravensbruck. New York: Anchor Books, 2015. p. 34.
31 ______. ______. p. 70.
32 GENOVESE, Eugene. The World the Slaveholders Made. Middletown:
Wesleyan University Press, 1988. p. 200.
33 SOFSKY, Wolfgang. The Order of Terror. Princeton: Princeton University Press,
1993. p. 171-172.
34 BUGGELN, Marc. Slave Labor in Nazi Concentration Camps. New York: Oxford
University Press, 2014. p. 37-38, 46.
35 STAMPP, Kenneth. The Peculiar Institution. New York: Vintage Books, 1984. p.
188.
36 SOFSKY, Wolfgang. The Order of Terror. Princeton: Princeton University Press,
1993. p. 58.
37 ______. ______. p. 271-274.
38 STAMPP, Kenneth. The Peculiar Institution. New York: Vintage Books, 1984. p.
11, 420.
39 PATTERSON, Orlando. Towards a Study of Black America. Dissent, Fall 1989,
480 p. Disponível em: https://www.dissentmagazine.org/article/toward-a-study-
of-black-america.
Capítulo Cinco
Os Racistas Originais