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MÉTODO DE INSPEÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DE SEVERIDADE DA

POLUIÇÃO NAS CADEIAS DE ISOLADORES EM LINHAS DE


TRANSMISSÃO DE 230 KV E 500 KV ATRAVÉS DA INTENSIDADE DO
EFEITO CORONA

Luis Felipe Guajardo Semensato (1)


Allan Sousa e Silva (2)

RESUMO

As técnicas e processos de inspeção integram os procedimentos de gestão e


manutenção dos ativos de transmissão do Sistema Elétrico de Potência e tem
função estratégica nas transmissoras, pois são as principais fontes que formarão
a base de dados e informações que determinam o planejamento, programação
de manutenções e ações destinadas a garantir a confiabilidade dos
componentes eletromecânicos das linhas de transmissão de energia elétrica. O
método preditivo de inspeção proposto neste trabalho traz a aplicação da
tecnologia de leitura e visualização da intensidade de raios ultravioleta ou efeito
corona emitidos pelos componentes das cadeias de isoladores em linhas de
transmissão de energia elétrica com tensões de 230 kV e 500 kV em ambientes
poluídos. O método permite ainda a realização da inspeção a partir do solo
mantendo as distâncias de segurança dos pontos energizados.

Palavras chaves: Linha de transmissão, inspeção, câmera ultravioleta, efeito


corona.

(1) Engenheiro Especialista na TAESA.


(2) Engenheiro de Manutenção na TAESA
1. INTRODUÇÃO

O método de inspeção preditiva deste trabalho considera, de forma prática, os


aspectos do efeito corona nas cadeias de isoladores de vidro e ferragens através
da aplicação de instrumento digital para visualização do efeito corona (câmera
UV). As experiências e repetições da aplicação em diferentes condições
ambientais, localidades e severidades traz resultados pragmáticos, baseados
nesta experimentação indutiva.
As linhas de transmissão deste estudo de caso estão localizadas na região
nordeste do Brasil e apresentam características específicas, ambientais,
meteorológicas e de poluição, que tendem a favorecer o aumento do efeito
corona nas cadeias de isoladores e respectivas ferragens.
A análise das peculiaridades e características específicas de cada linha de
transmissão e da região atravessada é de fundamental importância para a
aplicação das técnicas de inspeção das emissões de ultravioleta, assim como
seu diagnóstico. Dentre as principais características destacam-se:

▪ Períodos de seca e de chuva;


▪ Umidade relativa do ar;
▪ Horário do dia;
▪ Posicionamento do sol;
▪ Névoa, nevoeiro ou neblina;
▪ Variação de temperatura ao longo do dia e da noite;
▪ Proximidade com fontes poluidoras tais como fábricas, indústrias,
maresia, salinidade, rodovias movimentadas;
▪ Características dos poluentes.

O método proposto, além de abordar os aspectos citados acima, trará os critérios


de realização das inspeções em função da experiência acumulada e análise dos
resultados das inspeções como o ângulo de captura das imagens, limites do nível
umidade relativa do ar no momento da inspeção, distâncias entre operador do
instrumento de medição e o ponto de inspeção, padrões visuais e técnicas para
operação e maximização das funcionalidades do instrumento.

2. OBJETIVO

O objetivo deste trabalho é apresentar um método complementar de inspeção e


avaliação de cadeias de isoladores de vidro de linhas de transmissão
energizadas através da aplicação da tecnologia de leitura e visualização da
intensidade de raios ultravioleta (UV) e efeito corona emitidos pelos
componentes das cadeias de isoladores, em linhas de transmissão de energia
elétrica com tensões de 230 kV e 500 kV devido sua exposição a ambientes
poluídos.

3. EFEITO CORONA E POLUIÇÃO NAS CADEIAS DE ISOLADORES

Uma das definições do efeito corona é que se trata de uma descarga elétrica
causada devido a um elevado estresse elétrico. Esta é uma definição bastante
generalizada, mas abrange toda a gama de ocorrência deste fenômeno, uma vez
que a descarga corona pode ocorrer em meio sólido (isolante), líquido ou gasoso.
Este fenômeno pode danificar a estrutura do material e ser causa de falhas no
isolamento. [SILVA]
Nas ferragens e no meio isolante, como é o caso das cadeias de isoladores, o
efeito corona pode acelerar a degradação dos materiais.
O nível do efeito corona pode ser acentuado em decorrência de alterações na
superfície dos materiais sejam construtivos como protusões, rebarbas, falta de
acabamento, erros de instalação e falha dos anéis anti-corona ou por depósito
de partículas poluentes.
De acordo com SANTOS, devido à alta intensidade do campo elétrico,
equipamentos de alta tensão podem gerar o efeito corona. A atividade de corona
nestes equipamentos pode indicar falhas de projeto ou de funcionamento, causar
perda de potência ativa, corrosão e degradação acelerada de isoladores
poliméricos e cerâmicos. Além disso, o efeito corona gera ruído audível, rádio
interferência e TV interferência.
O desempenho dielétrico de uma cadeia de isoladores pode ser comprometido
quando estão situadas em ambientes poluídos e sob determinadas condições
climáticas como chuva e alta umidade. Se a camada de poluição depositada na
superfície do isolador se mantém seca, a variação do comportamento dielétrico
é mínima. Neste caso, quando ocorrer um processo de umidificação que venha
a dissolver o material contido no isolador, este pode se tornar condutivo,
favorecendo assim a ocorrência de efeitos elétricos que compromete a isolação
da cadeia até que, dependendo da intensidade, cause o desligamento da linha
de transmissão por arco elétrico. O comportamento deste efeito é amplamente
tratado em trabalhos publicados e seminários conforme descrito por MELLO e
DIAS.

3.1. PADRÃO VISUAL DAS CADEIAS DE ISOLADORES

A padronização visual das marcas encontradas na superfície dos isoladores e


nas ferragens das cadeias deve estar presente nas instruções e treinamentos
dos responsáveis pela investigação dos desligamentos das linhas de
transmissão de forma que seja corretamente classificada a causa devido a
poluição. Esta classificação não deve ser confundida com os desligamentos
provocados por descargas atmosféricas.
Os sinais e marcas deixadas nas cadeias de isoladores apresentadas na Figura
1 mostram que o caminho do arco elétrico passa na superfície dos isoladores
deixando rastro contínuo ao longo das unidades de vidro.
Figura 1 – Padrão visual das marcas de desligamentos por poluição.
Fonte: TAESA

4. CÂMERA ULTRAVIOLETA (UV)

A medição dos níveis de efeito corona nas cadeias de isoladores pode ser
realizada através de câmera ultravioleta. Este equipamento torna a radiação UV
visível e pode indicar a presença de atividade elétrica anormal nos componentes
das linhas de transmissão, conforme ilustrado na Figura 2.
Devem ser consideradas na análise das imagens, as possíveis fontes do efeito
corona, tais como pontos irregulares nas ferragens, poluição, depósito de
partículas ou materiais poluentes e ausência ou ineficiência de anéis anti-corona.
O diagnóstico para a definição do grau de criticidade ou severidade deve ser
realizado em conjunto com inspeção visual detalhada com imagens fotográficas
de alta resolução e qualidade.

Figura 2 – Câmera de medição UV e atividade elétrica em cadeia de isolador.


Fonte: TAESA

5. MOTIVAÇÃO PARA USO DA CÂMERA ULTRAVIOLETA

▪ Desempenho e histórico dos desligamentos de linhas de transmissão


causadas por poluição;
▪ Possibilitar a visualização do efeito corona;
▪ Tradicionalmente a inspeção para avaliação de atividade corona em
cadeias de isoladores seria realizada em período noturno com baixo nível
de precisão;
▪ Registros tradicionais (fotos ou vídeos) insuficientes ou com baixa
confiabilidade para análise de engenharia;
▪ Possibilidade de se realizar a inspeção a partir do solo, mantendo as
distâncias de segurança dos pontos energizados.

6. FATORES PARA INSPEÇÃO DA CADEIA DE ISOLADORES

Os fatores apresentados neste capítulo podem influenciar diretamente a


qualidade da inspeção e ou indicar o melhor momento para a sua execução.
Cada fator pode ser monitorado por instrumentos de medições antes e durante
a inspeção com a câmera UV.
As variações e valores devem ser registrados e, quanto maior o conhecimento
das características da região onde se encontra a linha de transmissão e
quantidade de históricos de inspeções, melhor será a assertividade nas análises
quantitativas e qualitativas.
As figuras 3 e 4 relacionam qualitativamente a temperatura, umidade relativa do
ar e o nível do efeito corona quando a cadeia de isoladores de vidro está
submetida a ambientes poluídos.

a. Temperatura

Quanto menor é a temperatura do ambiente, maior será o nível do efeito corona


na cadeia de isoladores.

Figura 3 – Relação entre temperatura ambiente e nível de efeito corona.


Fonte: O Autor

b. Umidade Relativa do Ar

Quanto maior é a umidade relativa do ar, maior será o nível do efeito corona na
cadeia de isoladores.
Figura 4 – Relação entre temperatura ambiente e nível de efeito corona.
Fonte: O Autor

7. MÉTODO DE INSPEÇÃO

Os requisitos aplicados neste item e seus valores foram considerados para se


obter os melhores resultados de inspeção com a câmera UV. As etapas e valores
de referências foram baseados em execuções experimentais de campo nas
diversas condições e variações tais como temperatura, clima e nível de poluição,
nas linhas de transmissão Xingó - Angelim em 500 kV e Angelim – Campina
Grande em 230 kV. Estes requisitos podem sofrer alterações de acordo com o
projeto e características de cada local.

I. ETAPAS BÁSICAS
A figura 5 mostra as etapas básicas aplicadas ao método que envolvem as
atividades de campo.

Figura 5 – Etapas básicas do método.


Fonte: O Autor

II. REQUISITOS PARA INSPEÇÃO


▪ Dia claro, sem neblina e sem chuva;
▪ Temperatura ambiente: inferior a 30°C;
▪ Umidade relativa do ar: superior a 60%;
▪ Período ideal: Final do período seco, antes do início no período chuvoso.

III. POSICIONAMENTO DO OPERADOR

▪ Distância entre a câmera UV e o ponto a ser inspecionado: 20 a 45


metros, conforme ilustrado na figura 5;
▪ Ângulo de inclinação do instrumento: aproximadamente 45°;
▪ Evitar se posicionar abaixo da projeção dos cabos condutores para não
haver interferências;
▪ Analisar o posicionamento para evitar apontar as lentes do instrumento
diretamente para o sol.

Figura 6 – Posicionamento do operador.


Fonte: O Autor

IV. USO DA CÂMERA

O instrumento possui um dispositivo para aumentar ou diminuir a intensidade de


efeito visual do efeito corona, que é denominado contador de fótons ou GANHO.
A intensidade deve ser ajustada da seguinte forma:

▪ Iniciar a operação com maior GANHO (default) para identificar qualquer


anormalidade na cadeia de isolador;
▪ Encontrado o possível defeito ou anormalidade, reduzir gradativamente o
GANHO até se identificar o ponto de origem;
▪ Enquadrar e centralizar o contador de fótons no objeto ou ponto de
interesse da inspeção e realizar a captura da imagem.
V. FASES DO PROCESSO DE FALHA E CLASSIFICAÇÃO DA
SEVERIDADE

A figura 7 apresenta as fases típicas do processo de evolução da intensidade da


poluição e consequentemente da intensidade do efeito corona até o momento da
falha da cadeia de isoladores.

Figura 7 – Fases típicas até a falha da cadeia de isoladores.


Fonte: https://ofilsystems.com/ com adaptações

A cada fase foi dada uma classificação de severidade com as respectivas ações
com base nas imagens obtidas com a câmera UV.

Severidade 1 (S1) – até 50% do comprimento da cadeia de isoladores


Ação: Realizar inspeções de acompanhamento a cada 12 meses.

Figura 8 – Exemplos de severidade S1.


Fonte: TAESA

Severidade 2 (S2) – de 50 a 80% do comprimento da cadeia de isoladores


Ação: Programar a execução da manutenção corretiva em até 4 meses
Figura 9 – Exemplos de severidade S2.
Fonte: TAESA

Severidade 3 (S3) – Acima de 80% do comprimento da cadeia de isoladores


Ação: Programar a execução da manutenção corretiva imediatamente

Figura 10 – Exemplos de severidade S3.


Fonte: TAESA

VI. APLICAÇÃO E RESULTADOS DO MÉTODO

O método de inspeção foi desenvolvido e implementado na linha de transmissão


em 500 kV que interliga as subestações de Xingó e Angelim, respectivamente
nos municípios de Canindé do São Francisco - SE e Angelim - PE.
A figura 11 mostra o histórico de desligamentos provocados por poluição no
período de 2015 a 2021. Devido ao aumento do número de desligamentos
provocados por poluição, iniciou-se o desenvolvimento do método no ano de
2016 e, a partir deste ano, foram realizados testes e aplicações experimentais
até o primeiro semestre de 2017. O método de inspeção com câmera UV e a
classificação da severidade tornou-se efetivo no final de 2017.
Conforme pode se observar na Figura 11, o ano de 2018 apresentou
considerável redução da quantidade do número de desligamento devido às
ações preventivas proporcionada pela análise da severidade do efeito corona.
Figura 11 – Número de desligamentos por poluição a LT 500 kV Xingó-Angelim de
2015 a 2021.
Fonte: TAESA

8. CONCLUSÕES

O método de inspeção com utilização de câmera UV para se avaliar e classificar


a severidade do efeito corona poderá ser aplicado às linhas de transmissão de
energia elétrica com tensões de 230 kV e 500 kV em locais com incidência de
poluição e poderá permitir a identificação antecipada de potenciais falhas.
Os resultados das inspeções apresentados, aliados às técnicas existentes para
inspeção em linhas de transmissão, poderão subsidiar a decisão do melhor
momento para a realização programada da manutenção corretiva com base na
intensidade do efeito corona e na classificação do nível de severidade. Este
método traz uma ferramenta tecnológica que permite dar maior confiabilidade
nos processos e técnicas de inspeção em linhas de transmissão.
Como resultado do emprego prático da técnica descrita neste trabalho, espera-
se: mobilizar as ações de correção no momento mais adequado antes que
ocorra o desligamento da linha de transmissão; aumento da qualidade
tecnológica das técnicas de inspeção; melhoria dos custos de manutenção;
aumento da confiabilidade dos ativos de transmissão; desenvolvimento e
treinamento dos profissionais nas técnicas de inspeção.
9. REFERÊNCIAS

SEMENSATO, Luis Felipe Guajardo. Panorama e diretrizes das principais


técnicas de inspeção terrestre em linhas de transmissão de energia elétrica da
rede básica. Monografia (MBA em Engenharia de Manutenção) – Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2015.

EPRI – Electric Power Research Institute. AC Transmission Line Reference Book


– 200 kV and Above. Third Edition. Palo Alto: EPRI, 2005.

GIGRE. “Critério de avaliação de isoladores em serviço”, CIGRÉ – Brasil,


GTB2.03 – Isoladores, 2008.

SEMENSATO, Luis Felipe Guajardo; AUGUSTO, Fernando Cezar do


Nascimento; ALARCON, Alfredo Ruben; OLIVEIRA, José André. Principais
técnicas, instrumentos e treinamentos para inspeção de linhas de transmissão
de energia elétrica da rede básica. Congresso brasileiro de manutenção e gestão
de ativos. 2020.

DIAS, B. A.; COSTA. E. G.; FERREIRA, T. V; GERMANO, A.D.; BRITO, K. B.;


BARBOSA, L. A.; SILVA NETO, A. I.; BEZERRA, R. C.; SILVEIRA, S; PAIVA, R.
S.; MELLO, D. R. Simulação Computacional dos Efeitos do Limo sobre
Isoladores de Vidro. XVII Encuentro Regional Iberoamericano del Cigré, Ciudad
del Este, 2017.

MELLO, D. R., COSTA Jr., R. T. D., BASTISTA, J. T., MELO, M. E. Avaliação do


Grau de Poluição em Instalações de Transmissão, Subestações e Distribuição.
Congresso de Inovação Tecnológica em Energia Elétrica, CITENEL, 2001.

SILVA, Edilson Sidney Rosa da. Sensor óptico para detecção do efeito corona
em linhas de transmissão. Dissertação (Engenharia Elétrica). Instituto Federal
da Paraíba. João Pessoa, 2021.

SANTOS, Laerte dos; FILHO, Marcelo O. Morais; SILVA, Rodolfo; BORTONI,


Edson da Costa. Tecnologias de imagem por infravermelho e ultravioleta
aplicadas a sistemas elétricos de alta tensão. Seminário Nacional de Produção
e Transmissão de Energia Elétrica. SNPTEE, 2009.

SILVA, Allan Sousa; SEMENSATO, Luis Felipe Guajardo. Técnica de inspeção


e caracterização da intensidade do efeito corona nas cadeias de isoladores
poluídas em linhas de transmissão de 230 kV e 500 kV. Congresso técnico sobre
manutenção nas empresas de energia elétrica. CETECMAN, 2021.

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