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Disciplina: Recuperação de Áreas Degradadas – 2022/2

TEXTO TBL1 – Conceitos introdutórios em Recuperação de Áreas Degradadas (RAD)

1. Introdução

Nas últimas décadas, o desafio de restaurar paisagens naturais vem se transformando. A


atividade deixa de ser uma preocupação periférica, muitas vezes visionária e romântica, restrita
a algumas instituições ambientalistas ou a cidadãos que desejam recuperar estragos para tornar
o planeta mais verde, e se torna uma potencial cadeia produtiva. Neste contexto, o tema
“recuperação de áreas degradadas” está sendo cada vez mais discutido e aplicado e, apresenta-
se como um mercado em expansão.
Os riscos inerentes à redução de matérias primas e recursos vitais, como a água, gerados pelos
atuais padrões de produção e consumo, colocaram o tema da restauração florestal no centro do
debate ambiental, com expressivos reflexos na agenda social e econômica. O tema também
passou a preocupar o setor produtivo, que – assim como os seres vivos – depende dos serviços
ecossistêmicos para sua sustentabilidade.
O cenário se mostra especialmente desafiador diante da urgência global quanto ao
enfrentamento das mudanças climáticas, em que a recuperação de florestas é chave para se
atingir níveis mais seguros de carbono na atmosfera.
Nesse cenário internacional, o Brasil está entre os principais atores: além do extenso passivo
ambiental que precisa ser restaurado por força da Lei de Proteção da Vegetação Nativa (novo
código florestal), o compromisso nacional no âmbito da 21ª Conferência das Partes da
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (United Nations Framework
Convention on Climate Change – UNFCCC), realizada em 2015 em Paris, prevê a reposição
vegetal para múltiplos usos como uma das principais estratégias para mitigar as consequências
da emissão de gases do efeito estufa. Assim, o Brasil assumiu o compromisso climático,
prevendo a restauração de pelo menos 12 milhões de hectares até 2030.

2. Degradação Ambiental

Falar de degradação ambiental e sua relação com o homem, é falar da história da humanidade.
A interferência humana no meio natural é antiga, entretanto, as consequências dessa
degradação, tem se mostrado vorazes agora na contemporaneidade e ameaçado a sua
subsistência.
Exemplos dessas consequências são o aquecimento global, a poluição, a infertilidade dos solos,
a falta de água, entre muitas outras, sendo, as principais atividades causadoras de impactos
ambientais: obras de saneamento, urbanização, extração mineral, agropecuária, comércio e
serviços, usinas de geração de energia, indústrias de transformação e instalações de terminais
(portos, aeroportos, etc.).

Um tópico fundamental no âmbito da degradação ambiental é a relevância dos ecossistemas


tropicais. Estes abrigam pelo menos dois terços da biodiversidade da Terra, beneficiando os
seres humanos em todas as escalas – local, regional e global. É por meio do uso da
biodiversidade proveniente dessas regiões do Planeta que se provê grande parte dos recursos
naturais e dos serviços ecossistêmicos de que a humanidade necessita para viver.

As florestas tropicais estão entre os ecossistemas mais degradados. Sua conversão em terras
agriculturáveis tem contribuído para a extinção de muitas espécies. No cenário atual, menos de
5% dos remanescentes florestais são efetivamente protegidos na maioria dos países.

No Brasil, a criação de novas áreas protegidas aumentou significativamente a média mundial.


No entanto, ocorre um inegável avanço das fronteiras agrícolas sobre áreas antes pouco
alteradas. Durante as últimas quatro décadas, na Amazônia, por exemplo, a vegetação original
tem sido convertida em pastagens e em lavouras de grãos, com acelerado desmatamento e
consequente degradação, que ocorre, em especial, às margens das grandes rodovias. Embora
o desmatamento seja mais acentuado em estados como Mato Grosso, Pará e Rondônia, no
chamado Arco do Desmatamento, estados antes pouco afetados pelo fenômeno, como Acre e
Amazonas, começam a alterar significativamente sua paisagem.

A ocupação da Mata Atlântica, outra floresta tropical ameaçada, vincula-se historicamente à


colonização do Brasil. Este bioma vive o impacto da intensa fragmentação de habitats, excessiva
urbanização e sobrecarga nos serviços ecossistêmicos, como a oferta de água e a qualidade
dos solos. Mesmo as áreas legalmente protegidas estão ameaçadas devido à intensa
urbanização e ao agronegócio.

No caso do Cerrado, considerado um bioma genuinamente brasileiro é a savana mais biodiversa


do mundo, a intensificação da presença humana no território ocorreu há pouco mais de quatro
décadas. As condições topográficas e climáticas permitiram aos agricultores e pecuaristas
produzirem alimentos em larga escala e com forte mecanização, causando prejuízos à fauna e
à flora originais. Hoje os remanescentes deste bioma somam apenas metade de sua área original
e menos de 8% encontram-se protegidos por meio de Unidades de Conservação.

Tipos não florestais de vegetação, como o Pampa, não foram tratados como prioridade nas ações
de conservação até um passado recente. Este bioma, marcado pela presença de espécies
herbáceas e arbustivas nativas, sempre se caracterizou pela produção pecuária de bovinos e
ovinos. Recentemente, porém, as pastagens têm cedido lugar à produção de madeira, celulose
e soja.
No caso da Caatinga, a exploração começou no Brasil colônia e se intensificou no século XVII,
quando a pecuária extensiva se consolidou como a base da economia sertaneja. A agricultura
itinerante também deixou um legado de áreas degradadas. A natureza desse bioma traz um
desafio adicional. Devido à escassez de água, a regeneração natural não ocorre de forma tão
rápida, o que, somado à intensa exploração da vegetação original, coloca esse bioma em risco
de desertificação.

Assim, a degradação ambiental em terras brasileiras vem ganhando impulso desde a chegada
dos portugueses durante a colonização.

O termo degradação ambiental, na atual literatura técnico-científica e de divulgação é quase


sempre ligado a uma mudança artificial ou perturbação de causa humana – é geralmente uma
redução percebida das condições naturais ou do estado de um ambiente. O agente causador da
degradação ambiental é sempre o ser humano: processos naturais não degradam ambientes,
apenas causam mudanças.

A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei Nº 6.938 de 1981) define degradação ambiental
como “a alteração adversa das características do meio ambiente”, sendo muitas vezes associada
à perda da qualidade ambiental.

Assim, degradação ambiental pode ser conceituada como “qualquer alteração adversa dos
processos, funções ou componentes ambientais, ou como uma alteração adversa da qualidade
ambiental. Em outras palavras, degradação ambiental corresponde a impacto ambiental
negativo. A degradação refere-se a qualquer estado de alteração de um ambiente e a qualquer
tipo de ambiente.

Importante salientar que a degradação pode ser percebida em diferentes graus. O grau de
perturbação pode ser tal que um ambiente se recupere espontaneamente; mas a partir de certo
nível de degradação, a recuperação espontânea pode ser impossível ou somente se dar a prazo
muito longo, desde que a fonte de perturbação seja retirada ou reduzida. Na maioria das vezes,
uma ação corretiva é necessária.

3. Recuperação ambiental

A recuperação de ambientes ou ecossistemas degradados envolve medidas de melhoria do meio


físico (como por exemplo da condição do solo, a fim que possa restabelecer a vegetação ou a
qualidade da água e de que as comunidades bióticas possam ser restabelecidas), e as medidas
de manejo dos elementos bióticos do ecossistema (como o plantio de espécies arbóreas ou
reintrodução de fauna).
Quando se trata de ambientes terrestres, tem-se usado o termo recuperação de áreas
degradadas (RAD).

A figura abaixo mostra diferentes entendimentos ou variações do conceito de recuperação de


áreas degradadas. No eixo vertical, representa-se de maneira qualitativa o grau de perturbação
do meio, enquanto o eixo horizontal mostra uma escala temporal.

Figura - Diferentes entendimentos sobre o conceito recuperação de áreas degradadas.

A partir de uma dada condição inicial (não necessariamente a condição original), a área analisada
passa a um estado de degradação, cuja recuperação requer, na maioria das vezes, uma
intervenção planejada – a recuperação das áreas degradadas.

Dar a um ambiente degradado condições adequadas para um novo uso, restabelecendo um


conjunto de funções ecológicas e econômicas, faz parte do conceito de recuperação ambiental.

Assim, recuperação ambiental é um termo geral que designa a aplicação de técnicas de manejo
visando tornar um ambiente degradado apto para um novo uso produtivo desde que sustentável.

Dentre as variantes da recuperação ambiental, a restauração é entendida como o retorno de uma


área degradada às condições existentes antes da degradação, com o mesmo sentido que se fala
da restauração de bens culturais, como edifícios históricos. Neste sentido, o termo, restauração
ecológica, tem sido empregado para designar ações com o objetivo de recuperar forma e funções
dos ecossistemas.
Por outro lado, em certas situações, as ações de recuperação podem levar um ambiente
degradado a uma condição ambiental melhor do que a situação inicial (mas somente, claro,
quando a condição inicial for a de um ambiente alterado). Um exemplo é um ambiente de
pastagem com erosão intensa que passa a ser usada para exploração mineral e em seguida é
repovoada com vegetação nativa para fins de conservação ambiental.
A reabilitação é a modalidade mais frequente de recuperação. No caso de obras de construção
civil e de atividades de mineração, esta é a modalidade de recuperação ambiental pretendida
pelo regulamentador (no Brasil, e em diversos outros países), ao estabelecer que o sítio
degradado deverá ter “uma forma de utilização”.
Neste contexto as ações de recuperação ambiental visam habilitar a área para que esse novo
uso possa ter lugar. A nova forma de uso deverá ser adaptada ao ambiente reabilitado, que pode
ter características bastante diferentes daquele que procedeu a ação da degradação, por
exemplo, um ambiente aquático em lugar de um ambiente terrestre, prática relativamente comum
em mineração.
A remediação é um termo utilizado para designar a recuperação ambiental de um tipo particular
de área degradada, que são as áreas contaminadas. Remediação é definida como “aplicação de
técnica ou conjunto de técnicas em uma área contaminada, visando a remoção ou contenção
dos contaminantes presentes, de modo a assegurar uma utilização para a área, com limites
aceitáveis de riscos aos bens a proteger” (Cetesb 2001).
Uma modalidade de remediação é conhecida como atenuação natural, na qual não se intervém
diretamente na área contaminada, mas deixa-se que atuem processos naturais – como a
biodegradação de moléculas orgânicas.
A inexistência de ações de recuperação ambiental configura o abandono da área. Dependendo
do grau de perturbação e da resiliência do ambiente afetado, pode ocorrer um processo de
regeneração, que é uma recuperação espontânea. O abandono de uma área contaminada,
também pode, em certos casos, por meio de processos de atenuação natural da poluição, levar
a sua recuperação.
Quando se trata de ambientes urbanos degradados, tem sido empregados termos como
requalificação e revitalização. Os ambientes urbanos podem ser degradados em razão de
processos socioeconômicos, como a redução de investimentos públicos ou privados em certas
zonas, ou em decorrência da degradação do meio físico, como a poluição dos rios ou a
contaminação dos solos.
A figura abaixo mostra um exemplo de revitalização de área urbana no centro de Seul (Coreia),
onde a prefeitura empreendeu um grande projeto de requalificação urbana e ambiental,
demolindo uma via expressa e renaturalizando um córrego até então canalizado e coberto por
lajes de concreto.
Figura – Trecho revitalizado do córrego Cheong Gye Cheon, em Seul, Coreia do Sul.

Pensando nesse processo de recuperação de ambientes antropizados e, por consequência,


degradados, numa expectativa de colocá-lo em prática, a princípio deve-se classificar a área
enquanto perturbada ou degradada, para depois decidir qual será a metodologia adotada.
Neste sentido é importante relembrar que área degradada é aquela que sofreu, em algum grau,
perturbações em sua integridade, sejam elas de natureza física, química ou biológica e que
perdeu a capacidade de retornar naturalmente ao estado original ou a um equilíbrio dinâmico, ou
seja, perdeu sua resiliência, enquanto que área perturbada é aquela que após o impacto ainda
mantém capacidade de regeneração natural e pode ser restaurada.

A capacidade de um sistema natural se recuperar de uma perturbação imposta por um agente


externo (ação humana ou processo natural) é denominada resiliência.

4. Breve histórico no Brasil

A recuperação de ecossistemas degradados é uma prática muito antiga, podendo-se encontrar


exemplos de sua existência na história de diferentes povos, épocas e regiões, porém, só
recentemente adquiriu o caráter de uma área de conhecimento, sendo denominada por alguns
autores como Ecologia da Restauração.
Incorporou conhecimentos sobre os processos envolvidos na dinâmica de formações naturais
remanescentes, fazendo com que os programas de recuperação deixassem de ser mera
aplicação de práticas agronômicas ou silviculturais de plantios de espécie perenes, visando
apenas a reintrodução de espécies arbóreas numa dada área, para assumir a difícil tarefa de
reconstrução das complexas interações da comunidade.
Quando se fala em Recuperação de Áreas Degradadas, historicamente é possível perceber que
em território nacional os esforços para tal são extremamente recentes, se pensado no processo
de degradação e, muito morosos, se comparados a países considerados mais desenvolvidos na
contemporaneidade.
Em nosso país, a primeira tentativa de recuperação de áreas ocorreu no século passado quando
o Major Manuel Gomes Archer, por ordem do Imperador, iniciou, em 1886, o reflorestamento da
floresta da Tijuca, neste plantio, foi utilizada uma mescla de plantas nativas e exóticas (incluindo
eucaliptos) (...). Nesta fase inicial de recuperação ambiental, no Brasil, além do pouco
conhecimento da dinâmica dos ecossistemas naturais, existia uma carência muito grande de
áreas de produção de mudas nativas. Estas dificuldades levaram à implantação de muitos
projetos com pequena variedade de espécies, eram utilizadas as mudas que se tinha disponível,
em plantios aleatórios e, muitas vezes, espécies exóticas àqueles ambientes que estavam sendo
recuperados.

É possível observar na legislação ambiental brasileira uma preocupação legal com os aspectos
ambientais desde antes da existência da Constituição Federal de 1988. Entretanto, é notório que
há um número crescente de áreas degradadas no país, o que expressa um leque de
problemáticas, que vão desde a ineficácia da aplicação das leis pelos órgãos ambientais
responsáveis, até a falta de sensibilização das pessoas e/ou empresas que usufruem dos
recursos ambientais.

A legislação ambiental induz obrigatoriedade para recuperação de áreas degradas, sendo que o
Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) tem como principal objetivo criação de um
plano estratégico de recuperação de alguma área degradada ambientalmente ou, até mesmo,
modificada. Sendo assim, a exigência da confecção do PRAD pode originar de Termos de
Ajustamentos de Condutas (TAC), de Autos de Infração, de decisões judiciais, de condicionantes
de Licença Ambiental ou até mesmo da vontade própria do empreendedor em recuperar.

Inicialmente o PRAD era aplicado apenas para atividades minerárias, porém a partir da década
de 1990, o PRAD passou a ser exigido como complementar ao RIMA, de outras atividades além
das minerárias. E também passou a ser solicitado em Termos de Ajustamento de Conduta (TAC),
firmados entre empresas e o Ministério Público.

A partir daí a recuperação de áreas degradadas têm se desenvolvido no Brasil, principalmente


devido às exigências impostas pelos órgãos e pela legislação ambiental, regido pela Instrução
Normativa nº 04 de 13 de abril de 2011 do IBAMA.

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