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V FESTIVAL

FOTOGRAFIA
EM TEMPO
E AFETO

meu meio, é o meio ambiente

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V FESTIVAL
FOTOGRAFIA
EM TEMPO
E AFETO

meu meio, é o meio ambiente


Organizadora
MARCELA BONFIM

2022

2 3
COMPOSIÇÕES VISUAIS / Galeria 3 - # “Fotos Contadoras de Galeria 5 - #Galeria Translúcida Lucia Martins (PA) MOSTRA A CÉU ABERTO DA VÍDEO EXPERIMENTAL:
COMPOSITORES VISUAIS: Histórias” Compositores: Natalí Araujo (RO) CULTURA DA VISUALIDADE:
Compositoras: Duo Rodrigo Masina Pinheiro (RJ) e Gal Nino Rezende (MG) Montagem e Edição:
Galeria 1 - # Bem Viver: Resistências e Aline Motta (SP) e Lia Krucken (BA) Cipreste Marinelli (RJ) e Ana Lira (PE) Samara Ramos (RO) Direção de Montagem: Michele Saraiva (SP)
Vivências Contemporâneas ​ Tulasi Resende (MG) Ismael Barreto (RO)
Compositores: Escala de Composição: Escala de Composição: Walter Netto (RO) Vídeo/Frames:
Beatriz Belo (SP) Assistência de Montagem Christyann Ritse (RO)
Pi Suruí (RO) e Ederson Lauri (RO) Aline Motta (SP) Duo Rodrigo Masina Pinheiro (RJ) e Gal
Vitória Morão (RO) Thais Passos (RO) Gabriela Barreto (SP)
Cipreste Marinelli (RJ) Isaac Lima (RO)
Escala de Composição: Convocatória: Davi de Jesus do Nascimento (MG) Fernanda Siebra (CE) Tobias Rodil (SP)
Gabriel Melo (RO)
Pi Suruí (RO) Renata Gordo (SC) Bicho Carranca (MG) Diego Queiroz (RO)
Kelven Felix (RO)
Israel Vale Jr (RO) Denis Rouvre (França) Livre Composição: Gê Viana (MA) Matheus (RO) Marcela Bonfim (RO)
Kain Juma (RO) Fernando Gonçalves (RJ) Convocatória: Camilia (RO) Geane Tavares (RO)
Christian Braga (AM) Iago Araújo (BA) EQUIPE TÉCNICA: Lais (RO)
Convocatória: Isis Medeiros (MG) Duo Ana Mendes (PA) & Nay Jinknss (PA) Músicas:
Avener Prado (SP) Laise Azevedo (RO) Aniram (RJ) Idealização, ferramentas de composição, Fotografia: Berimbau Ossauro - Dom Lauro (RO)
Guilherme Bergamini (MG) Amanda Leite (TO) Duo Paisagens Móveis: Bárbara Lissa (MG) e direção de produção e organização da Saulo de Sousa (RO) Rio Madeira Afro-Beats - Marcela Bonfim,
Geane Tavares (RO) Miguel Chikaoka (PA) Maria Vaz (MG) Mostra e do Catálogo: Geane Tavares (RO) com programação eletrônica de Rodolfo de
Marcos Madalena (RO) Diego Costa (SP) Thaís Espinosa (SP) Marcela Bonfim (RO) Bártolo (RO)
Nilson Santos (RO) Cleber Cardoso (RO) CATÁLOGO ONLINE: River Soul - Marcela Bonfim (RO)
Rafael da Luz (PA) Laura Lujan (RO) Livre Composição: Produção e Mídias Sociais:
Lautaro Actis (Argentina) Margem do Rio (RJ) Maria Thereza Soares (MA) Saulo de Sousa (RO) Projeto gráfico e diagramação: Captação e edição de voz:
Lucas de Bail (PR) Larissa Cortez (MA) Adriana Zanki Cordenonsi (RO) Thiago Maziero
Galeria 6 - Livre Compor como viver, lutar Assessoria de Produção:
Textos:
Livre Composição: Naara Fontineli (EUA) Livre Composição: e sonhar Andressa Silva (RO) Plataformas de transmissão, comunicação
Hely Chateaubriand (RO) Marcela Bonfim (RO) e execução:
Iyalorixá Marlene de Nanã (BA) Uiler Costa Santos (BA)
Galeria 2 - # Corpo-Natureza Michele Saraiva (SP) Assessoria de Texto:
Casa Ninja Amazônia, Ninja Foto, Frontfiles e
Compositores: Galeria 4 - # Galeria Escura Rita de Cássia (RO) Lia Krucken (BA) Idea comunicação visual.
Paula Sampaio (PA) e Compositores: Marcia Mura (RO)
Marcela Bonfim (RO) Rogério Assis (PA) e Manoel Pinheiro Santiago (RO) Infográfico:
Washington da Selva (BA) Manoel Batista de Almeida - In Memoriam (RO) Karla Dilascio (AC)
Escala de Composição: Mateus Sousa (RJ)
Paula Sampaio (PA) Escala de Composição: Jessica Moreira (SP)
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Paula Giordano (PA) Rogério de Assis (PA) Margot Paiva (RO)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Deia Lima (PA) Octavio Cardoso (PA) Tanison Passos (RO)
Walda Marques (PA) Ronaldo Nina (RJ)
Convocatória: Dom Lauro (RO) Meu meio, é o meio ambiente [livro eletrônico] :
Alexandre Cruz Noronha (AC) Convocatória: Danilo de S’acre (AC)
V Festival Fotografia em Tempo e Afeto / Agradecimento especial a todas e
[organização Marcela Bonfim]. -- Porto Velho, RO :
Ana Carolina Fernandes (RJ) Saulo de Sousa (RO) Luiz Brito (RO) Marcela Fernandes da Bonfim, 2022.-- (Mostra a Céu todos que direta ou indiretamente
Ngelu de Palmar (MA) Rodrigo Pedro Casteleira (RO)
Helen Salomão (BA) Márcia Gomes (PA) Livre Composição:
Aberto da Cultura da Visualidade) colaboraram com esta publicacão.
PDF
Elza Lima (PA) Janaina Wagner (SP) Andressa Silva (RO)
Joelington Rios (RJ) Hirosuke Kitamura (Japão) Cynthia Cy Barra (BA) Vários colaboradores.
Thaís Rocha (RJ) Keila Sankofa (AM) Marcelo Reis (BA) ISBN 978-65-00-43495-8 Esta edição foi contemplada no
Ulisses Lima (BA) Diego Sei (BA) Duo Lanussi Pasquali (BA) e Fábio Gatti (BA) Edital Nº 32/2021/Sejucel-Codec – 2ª
Nilmar Lage (MG) Danilo Marroco (SP) (Re)Conhecendo A Amazônia Negra (RO) 1. Amazônia - Fotografias 2. Artes visuais -
Cruupooh’re Akroá Gamella (MA) Mergulha E Voa (PE) Exposições I. Bonfim, Marcela. II. Série. Edição Pacaás Novos – Lei Federal
Raquel Bacelar (BA) Joilson Arruda (RO) Galeria 7 - # (Re)compor como a Natureza 14.017/2020 (Lei Aldir Blanc).
Mario Venere (RO) Manoel Pinheiro Santiago (RO)
Livre Composição: Elisabete Christofoletti (RO) 22-108260 CDD-779.99811
Livre Composição: Alberto César Araújo (AM) Cláudio Zarco (SP) Índices para catálogo sistemático:
Luiz Camillo Osorio (RJ) Eriel Araújo (BA)
Ianca Moreira (AP) 1. Amazônia : Fotografias 779.99811
Leandro Marques (RO)
Eliete Marques da Silva - Bibliotecária - CRB-8/9380

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S U M Á R I O

Apresentação: nós, as Rondônias________________ 09 Ulisses Lima (BA) ________________________ 48 Hirosuke Kitamura (Japão) _________________ 82 Manoel Batista de Almeida - In Memoriam (RO)___ 118
Um Festival de Composições Visuais_____________ 10 Helen Salomão (BA) ______________________ 49 Janaina Wagner (SP) _____________________ 83 Mateus Sousa (RJ) _______________________ 120
Uma Mostra a Céu Aberto da Cultura da Visualidade_ 11 Joelington Rios (RJ) ______________________ 50 Keila Sankofa (AM) _______________________ 84 Rita de Cássia (RO)_______________________ 121
Metodologia: nossa forma de compor_____________ 12 Raquel Bacelar (BA) ______________________ 51 Márcia Gomes (PA) _______________________ 85 Manoel Pinheiro Santiago (RO)______________ 122
Infográfico: compondo em linhas e camadas________ 14 Nilmar Lage (MG) ________________________ 52 Danilo Marroco (SP)_______________________ 86 Margot Paiva (RO)________________________ 123
Compor o lado não visível do ‘meio ambiente’_______ 16 Alexandre Cruz Noronha (AC) ______________ 53 Diego Sei (BA)___________________________ 87 Marcia Mura (RO)_________________________ 124
GALERIA 1: #Bem viver: resistências e GALERIA 3 - # “Fotos Contadoras de Histórias”. Mergulha E Voa (PE)______________________ 88 Tanison Passos (RO)______________________ 125
vivências contemporâneas. Compositoras: Aline Motta (SP) Saulo de Sousa (RO)______________________ 89 Uiler Costa Santos (BA)____________________ 126
Compositores: Pí Suruí e Ederson Lauri_________18 e Lia Krucken (BA)___________________________ 54 Galeria 5 - #Galeria Translúcida. Livre Composição: Duo Lanussi
Pí Suruí (RO)____________________________ 20 Aline Motta (SP) _________________________ 56 Compositores: Duo Rodrigo Masina Pinheiro (RJ) Pasquali (BA) e Fábio Gatti (BA)__________ 127
Israel Vale Jr (RO)________________________ 22 Isis Medeiros (MG)_______________________ 58 e Gal Cipreste Marinelli (RJ) e Ana Lira (PE)_____ 90 Dom Lauro (RO)__________________________ 128
Kain Juma (RO)__________________________ 23 Miguel Chikaoka (PA) _____________________ 59 Duo Rodrigo Masina Pinheiro (RJ) Livre Composição: Marcelo Reis (BA)_________ 129
Avener Prado (SP)________________________ 24 Amanda Leite (TO) _______________________ 60 e Gal Cipreste Marinelli (RJ)_____________ 92 Galeria 7 - # (Re)compor como a Natureza_______ 130
Guilherme Bergamini (MG)_________________ 25 Diego Costa (SP) ________________________ 61 Davi de Jesus do Nascimento (MG)___________94 Walter Netto (RO)_________________________ 132
Geane Tavares (RO) ______________________ 26 Laura Lujan (RO) ________________________ 62 Bicho Carranca (MG_______________________95 Lucia Martins (PA)________________________ 133
Marcos Madalena (RO) ____________________ 27 Laise Azevedo (RO) ______________________ 63 Thaís Espinosa (SP)_______________________96 Cláudio Zarco (SP)_______________________ 134
Livre Composição: Naara Fontineli (EUA)______ 28 Cleber Cardoso (RO) _____________________ 64 Iago Araújo (BA)__________________________ 97 Vitória Morão (RO)_______________________ 135
Nilson Santos (RO) _______________________ 30 Livre Composição: Aniram (RJ)_____________________________ 98 Fernanda Siebra (CE)_____________________ 136
Rafael da Luz (PA) _______________________ 31 Iyalorixá Marlene de Nanã (BA)____________ 65 Duo Paisagens Móveis: Nino Rezende (MG)_______________________ 137
Lautaro Actis (Argentina) ___________________ 32 Renata Gordo (SC) _______________________ 66 Bárbara Lissa (MG) e Maria Vaz (MG)______ 99 Natalí Araujo (RO)________________________ 138
Lucas de Bail (PR) _______________________ 33 Larissa Cortez (MA) ______________________ 67 Duo Ana Mendes (PA) & Nay Jinknss (PA)_____ 100 Samara Ramos (RO)______________________ 139
GALERIA 2 - # Corpo-Natureza. Fernando Gonçalves (RJ) __________________ 68 Livre Composição: Maria Thereza Soares (MA)____ 101 Beatriz Belo (SP)_________________________ 140
Compositores: Paula Sampaio (PA) Margem do Rio (RJ) ______________________ 69 O Meio Ambiente é o Mundo____________________ 102 Elisabete Christofoletti (RO)_________________ 141
e Marcela Bonfim (RO)________________ _______ 34 Denis Rouvre (França) ____________________ 70 Galeria 6 - # Livre Compor como viver, Manoel Pinheiro Santiago (RO)______________ 142
Paula Sampaio (PA) ______________________ 36 Christian Braga (AM) _____________________ 71 lutar e sonhar ___________________________104 Tulasi Resende (MG)______________________ 143
Paula Giordano (PA) ______________________ 38 Galeria 4 - # Galeria Escura Jessica Moreira (SP)______________________ 106 Ianca Moreira (AP)________________________ 144
Deia Lima (PA) __________________________ 39 Compositores: Rogério Assis (PA) e Michele Saraiva (SP)______________________ 108 Leandro Marques (RO)____________________ 145
Thaís Rocha (RJ)________________________ 40 Washington da Selva (BA)____________________ 72 Livre Composição: Cynthia Cy Barra (BA)______ 110 Eriel Araújo (BA)__________________________ 146
Ana Carolina Fernandes (RJ) _______________ 41 Rogério Assis (PA) _______________________ 74 Livre Composição: Andressa Silva (RO)________111 Livre composição: Gê Viana_________________147
Ângelu du Palmar (MA) ____________________ 42 Octavio Cardoso (PA) _____________________ 76 Livre Composição: (Re)Conhecendo a Agenda Visual do Meio Ambiente
Cruupooh’re Akroá Gamella (MA) ____________ 43 Walda Marques (PA) ______________________ 77 Amazônia Negra - Marcela Bonfim (RO)____ 112 para as identidades do futuro
Livre Composição: Luiz Camillo Osorio (RJ)____ 44 Livre Composição: Alberto César Araújo (AM)___ 78 Ronaldo Nina (RJ)________________________ 114 e futuro das identidades________________________148
Elza Lima (PA) ___________________________ 46 Joilson Arruda (RO) _______________________ 80 Luiz Brito (RO)___________________________ 115
Mario Venere (RO) _______________________ 47 Rodrigo Pedro Casteleira (RO) ______________ 81 Danilo de S’acre (AC)______________________ 116

6 7
a p r e s e n ta ç ã o
por Ana Aranda

Nós, as Rondônias
Este catálogo marca mais uma exposição ao ar livre instalada nas ruas da nossa cidade com
participação aberta a todos os seus habitantes. Pertence, portanto, a todos os rondonienses
filhos das muitas Rondônias que coabitam este pedaço de terra por onde se adentra para o
maravilhoso reino da floresta, suas águas, sua terra, seus bichos, suas plantas, suas gentes.

São os rondonienses filhos dos migrantes que de todos os quadrantes aqui aportaram “no porto
dos Cabrais” da música do Bado. São os rondonienses que enfrentam a guerra surda empreen-
dida contra os indígenas pela posse do seu território. São os rondonienses quilombolas, filhos
dos caçadores das ervas do sertão, são os filhos dos operários da Madeira-Mamoré. São os
nordestinos que deram molde e feição para a rica cultura dos arigós.

São também aqueles que tristemente miram esta terra por um espelho retrovisor, teimando
em ignorar uma herança de riquezas naturais em troca de uma riqueza passageira, efêmera,
destruidora e excludente, que se configura em mais um ciclo econômico sem futuro.

Mas, principalmente, somos nós, cada um com seu pedaço de amor por este lugar e suas vi-
vências. Somos parte do aconchego e a oportunidade de vida nova oferecida a tantos que aqui
vivem e outros que ainda vão chegar.

Ana Aranda,
jornalista e ativista
cultural em Porto Velho.

8 9
Um Festival de Composições Visuais Uma Mostra a Céu Aberto da
Cultura da Visualidade
O Festival Fotografia em Tempo e Afeto nasceu do desejo de expandir a sensação de A Mostra à Céu Aberto da Cultura da visualidade é uma composição visual coletiva, des-
pertencimento visual de Rondônia. Desde 2017 ocupamos as ruas da cidade de Porto Velho tinada às ruas de Porto Velho e comunidades tradicionais do entorno, constituída a partir da
e de comunidades próximas, com composições visuais provocadas de dentro para fora. A prá- instalação de galerias a céu aberto, tendo como suporte o Lambe-Lambe e os muros que os
tica da composição tem sido a aposta fundamental do Festival Fotografia em Tempo e Afeto, recebem. Esta instalação vai compondo com os espaços, as pessoas e os olhares; tornando
prezando o sentido do acesso e da inclusão. Propomos a construção de formas alternativas possível outras formas do fazer, além de ser uma grande oportunidade de desmistificar lugares
por meio de processos inclusivos, oficinas pedagógicas, rodas de conversa, e a realização da destas tantas Amazônias, misturadas à memória e aos sentidos deste Festival.
Mostra à Céu Aberto da Cultura da visualidade.
Até aqui percorremos quatro edições. Nas duas primeiras, exercitamos o livre exercício
Por que compor? da composição, concentrando nossos sentidos na ocupação dos espaços locais e na orga-
nização das imagens e nuances das tantas regiões amazônicas. Partimos de convocatórias
Acreditamos que, ao nos movimentarmos no sentido da composição, atraímos formas específicas, voltadas ao exercício interno destas regiões. A primeira edição, por exemplo, foi
mais autênticas de se expandir o PERTENCIMENTO VISUAL de nossa região, além de esti- institucionalmente representada pelo Foto Clube Rondônia, que na época acatou prontamente
mular processos nos quais percebemos a DESMISTIFICAÇÃO de nossas visualidades, como a ideia da fotógrafa Marcela Bonfim, realizando a primeira ocupação visual na Rua Euclides da
também dessas tantas Amazônias que aqui habitam. Pensar a FOTOGRAFIA é pensar o PO- Cunha, antiga Rua do Coqueiro, principal acesso à cidade de Porto Velho nascendo.
DER, a ECONOMIA, e os MEIOS que essas imagens têm de reconstruir, tanto as nossas hu-
manidades, quanto a própria compreensão de política que significa a visualidade amazônica. Na terceira edição, passamos a organizar o imaginário a partir de motes. Com o desafio
de buscar representações locais, lançamos Lugares que falam. Esta edição foi realizada na
Ou seja: ao nos empenharmos na prática do exercício de reconstruir de forma comunitária, comunidade de Nazaré, no Baixo Madeira, tendo como galeria as próprias casas dos morado-
que para nós é afetiva, nos deslocamos em direção ao lugar da efetividade das relações e res e as vias de acesso da comunidade. Acompanhando o nascer de uma narrativa “natural”,
reflexões, aqui presentes no contexto mais próximo possível. a mostra incluiu 77 imagens de moradores, registrados pela fotógrafa Marcela Bonfim, desde
o ano de 2015, período em que conheceu a comunidade, no pós-cheia de 2014. A edição
Pensemos e tomemos a imagem como uma escuta de cada um, ou seja, de cada lugar, ocorreu por ocasião do tradicional Festejo Cultural de Nazaré.
destoando das formas tradicionais na fotografia; porque temos a consciência dos males que
significam as invisibilidades, as desigualdades e as castas, por onde residem os ESTIGMAS Já na quarta edição, o exercício foi integrar o imaginário do lado de dentro da região norte,
e regimes de visibilidade. lançando o mote: Norte por Norte. Desta vez, a proposta foi abrir às mulheres que vivem na
região a possibilidade de organizarem e disponibilizarem suas vivências visuais e especifici-
Neste processo de composição, cada imagem possui um sentido ativo, que nos reconecta dades. A ideia foi estimular a singularidade de cada uma, provocando sentidos para despertar
ao todo e que gera mais pensamentos visuais (e não visuais). Esses arranjos orgânicos, que o pensamento visual interno, compondo, naturalmente, com aspectos para além do exterior.
vão se constituindo, são capazes de desconstruir o que não cabe e/ou nunca coube e de Estes percursos foram abrindo espaço para a quinta edição.
construir outras perspectivas.
Especialmente neste momento, é importante ressaltar o apoio das redes da Mídia Ninja e
Casa Ninja Amazônia, que contribuiu para expandirmos nossas composições para o lado de
fora das tantas Amazônias.

10 11
Nossa forma de Compor

Aberto da Cultura da visualidade de Porto Velho, e organizaram Manoel Batista de Almeida (in memoriam - RO) com suas ima-
as respectivas galerias. gens “Por dentro da Cheia de 2014, na comunidade de Nazaré”

​ ompositores da linha 2 também tiveram acesso ao conteúdo da
C CAMADA 4
Chave de convocatória para prosseguir compondo as galerias.
​ Compositores da Linha 5
​CAMADA 2 A quarta camada foi a própria montagem e documentação das
​ galerias, dirigida pelo artista visual Ismael Barreto, onde a ideia
Compositores da Linha 3 foi associar as camadas narrativas com o próprio meio ambiente
A segunda camada foi a realização da convocatória pública, e cotidiano da cidade, absorvida pelos fotógrafos e vídeo-makers
onde os olhares dos compositores se misturaram a outras pers- Saulo de Sousa, Geane Tavares e Christyann Ritse, artistas da
pectivas de meio ambiente, sendo gratuita e aberta a todo o pú- região que integraram seus olhares às camadas sensoriais que
blico interessado por fotografia, com a ideia de abranger o maior surgiram.
número possível de reflexões e diversidades visuais. E também ​
Para o exercício prático de construção da Edição V do Festi- Compondo em Linhas ​ desta chave abrindo a oportunidade de (Re)composição, o que CAMADA 5 E O FLUXO VISUAL
val foram convidados grandes artistas das visualidades com o ​ nos levou a uma galeria específica. ​
propósito de pensar e organizar 05 galerias, acrescidas de mais Compositores da Linha 1 Compositores da Linhas 6 e dos demais fluxos
duas livres narrações, com desdobramentos de performances, Iniciaram o processo dando o tom, como em uma música, neste ​ plataforma utilizada na realização da convocatória foi a Fron-
A Por fim, a quinta camada, com a Linha 6, como as linhas que
vivências e ativismos de artistas e pessoas convidadas, a fim de caso propondo 04 imagens à respectiva galeria, exercitando o tfiles. seguem o fluxo visual, ocupadas pelos seguintes convidados:
trabalhar todo este processo em camadas, buscando reconhecer mote conforme a visualidade que os tocam. a professora e pesquisadora Cynthia Cy Barra (BA); a Iyalorixá
os possíveis meios/ambientes que nos envolvem, muitas vezes ​ ​ AMADA 3
C Marlene de Nanã (BA); a pesquisadora em cinema Naara Fon-
desvendando aquilo que se pensava do lado de fora . Com intuito de construirmos uma ‘narrativa composta’, solicita- ​ tinele (RO); a fotógrafa e pesquisadora Maria Thereza Soares
​ mos de cada compositor da Linha 1 um texto sobre a sua pers- Compositores da Linha 4 (MA); o crítico de artes e curador Luiz Camilo Osorio (RJ); os fo-
Iniciamos a Camada 1 a partir das duplas que trabalharam na pectiva/proposta (linear ou não); A terceira camada se deu a partir das intervenções dos artis- tógrafos Marcelo Reis (BA) e Alberto César Araújo (AM); os arte
construção das 05 galerias, abrindo os trabalhos da Mostra a tas convidados, resultando em uma Galeria especial com per- educadores Lanussi Pasquali (BA), Fábio Gatti (BA) e Ge Viana
Céu Aberto da Cultura da Visualidade, onde o primeiro ou a pri- Promovendo a escala de composição: além das imagens e formances, nos diversos suportes, imprimindo sentidos como o (MA), que a partir da suas formas, fazem comentários sobre o
meira da dupla é a Linha 1, e a segunda ou o segundo, a Linha 2. texto, cada compositor da Linha 1 incluiu ao processo mais um “Berimbau Ossauro” de Dom Lauro (RO); as imagens da vivência processo visual dessas tantas camadas que percorremos; como
​ ou uma “compositora convidada”; solicitando ao mesmo ou a indígena de Márcia Mura (RO), como também da ativista pela espectadores abrangendo, sobretudo, o lado de dentro de quem
Linhas de Composição por Duplas mesma uma proposta de 02 imagens e 01 texto de até 3 linhas; leitura Rita de Cássia (RO); as “Coroas” do fotógrafo Uiler Costa- está exercitando “esse processo que é vital”.
​ sendo que este também deu sequência a escala, indicando o -Santos (BA); os varais da série “D’Água e Lama”, da fotógrafa e ​
Galeria 1: Pi Suruí e Eder Lauri segundo “compositor(a) convidado(a)”, que fez sua proposta vi- cineasta Michele Saraiva (RO); as letras visuais de “VÃO: trens, Assim, compondo em linhas, entendemos a visualidade como
​Galeria 2: Paula Sampaio e Marcela Bonfim sual com 01 imagem e 01 texto de até 3 linhas. Isto resultou na marretas e outras histórias”, livro da jornalista Jéssica Moreira uma oportunidade também de pensar a decomposição, sobretu-
​Galeria 3: Aline Motta e Lia Krucken escala 4:2:1. (SP); a “acreanidade” do artista visual Danilo de S’Acre (AC); as do imaginária, onde as linhas de sentidos não têm fim, sempre
​Galeria 4: Rogério de Assis e Washington da Selva ​​ sensações visuais da artista plástica Margot Paiva (RO); a potên- em movimento pela continuidade, convidando você a refletir co-
​Galeria 5: Duo Rodrigo Masina Pinheiro e Gal Cipreste Marinelli Compositores da Linha 2 cia ativista das imagens de Ronaldo Nina (RJ); a representativi- nosco, se o meu meio é o meio ambiente, o que existe ao meu
e Ana Lira Receberam os trabalhos da Linha 1, conforme as duplas, e mais dade do quilombola e fotógrafo Manoel Pinheiro Santiago (RO); redor faz de mim parte de uma composição?
​ os trabalhos provenientes da convocatória da 5ª Mostra à Céu e a saudade do ribeirinho barqueiro, comerciante e fotógrafo

12 13
COMPONDO EM LINHAS E CAMADAS O
M P OSITORE

C
CAM AD A 3
L I NHA 4
Para o exercício prático foram convidados grandes artistas com o propósito

S
de pensar e organizar 05 galerias visuais, mais performances convidadas. Nesta linha trabalhamos as intervenções de
A ideia foi trabalhar este processo em camadas, buscando reconhecer os artistas convidados com suas performances, em
possíveis meios/ambientes que nos envolvem, muitas vezes, desvendando diversos suportes, imprimindo sentidos e dando
aquilo que se pensava do lado de fora. origem a uma galeria específica.
IDA C AM AD A 1
SA
Iniciamos na Camada 1, a partir de duplas onde o
DE
primeiro ou a primeira da dupla foi parte da Linha 1,
IN e a segunda ou o segundo, parte da Linha 2.
L

H
A

Dando o primeiro passo, o compositor(a)


MONTAGEM E DOCUMENTAÇÃO
da linha 1 iniciou dando o tom à sua GA S Galeria.1 A ideia desta linha foi captar as camadas que
ITO
RES respectiva galeria, exercitando o mote LE R I A G.2 G.3
se formaram com o próprio meio ambiente e
1 conforme a visualidade que os tocam e cotidiano da cidade, absorvida por fotógrafos e
OS

CO A
MP um texto sobre a sua perspectiva/ G.4 G.5 vídeo-makers, que integraram seus olhares
G. às camadas sensoriais que surgiram.
H

proposta (linear ou não).


LIN O
M P OSITORE

C
AD A 4
C AM
ndo L I HA 5

S
e Assim, o primeiro compositor da Linha 1, além de fazer sua p  roposta N
ov

visual, convidou mais um compositor(a) que propôs 2 imagens


m

pro s i ç ão acerca do mote, mais um texto reflexão e, dando sequência à escala,


po mais a indicação do último compositor(a) da escala que, por sua
com

vez, enviou 1 imagem e um texto com seus reflexos; completando a FLUXO VISUAL
escala: 4;2;1; e iniciando a
 galeria a partir daí. Como as linhas que
es
da

c al a seguem o fluxo visual,


O
M P OSITORE
convidamos artistas para observarem

C
O segundo passo, foi o encaminhamento dos conteúdos da escala
RES
ITO para os compositores da Linha 2, conforme as duplas e suas res- todo o processo e exercerem uma
2 L I HA 6

S
pectivas Galerias. [...] mais os trabalhos da Chave de Convocatória epécie de “LIVRE-COMPOSIÇÃO”
N
H S

CO P A
O

da “Mostra à Céu Aberto da Cultura da visualidade de Porto Velho”. que, a partir das suas formas, farão
M ai
N
terão acesso . comentários sobre o processo visual e d em s
L I ao conteúdo da
C AM dessas tantas camadas que foram percorridas.
convocatória
AD A 5
A ideia da convocatória foi abraçar diversas

ITO
RES A convocatória foi
formas de visualidade, onde os olhares dos
compositores se misturam a outras perspecti-
C AM A D A 2
3 Como espectadores
OS

executada pela
CO P A vas de meio ambiente. Foi gratuita e aberta abrangendo, sobretudo,
M plataforma Frontfiles.
a todo o público interessado por fotografia,
H

o lado de dentro de
LIN com a ideia de abranger o maior número
possível de reflexões e diversidade visuais. quem está exercitando
Chave de convocatória: “esse processo que é vital”. Entendemos a visualidade como
Mostra a Céu Aberto da Cultura da Observando que desta chave saíram
imagens que compuseram as galerias das uma oportunidade de composicão
visualidade: cada proponente teve o limite de
duplas, e mais uma galeria de (re)composição; e decomposicão, sobretudo
uma imagem-reflexão pertinente ao mote,
enviada em jpg em boa resolução. As impressões imaginária, onde as linhas tem
tiveram tamanho máximo de 1 x 1,5m. sentido, não tem fim.
14 15
Compor o lado não visível Atualmente percebemos que dentro dos grupos de poder - visíveis e invisíveis - a imagem
tem papel crucial. Interessa a imagem e tudo o que dela é composto, até chegar no sentido de

do ‘meio ambiente’(1) uma criação. Entretanto, a questão tem sido pensar nesses sentidos não como verbo, mas sim
como formas políticas, econômicas e permanentes de um sistema, onde a imagem se constitui
dos próprios limites da racialização humana.

Sendo a raça a própria distinção de poder; é sobretudo o plano mais concreto de um


capital abstrato, por onde se pensa que “vê” a imagem da cor da riqueza, e a imagem da
cor da pobreza, automatica-mente, sem ao menos enxergar o que existe por detrás dessas
confabulações De-Cor; que se ampliam e difundem dentro de um sistema oculto, onde a inte-
ligência da visualidade se compõem na artificialidade de normas e linguagens, em camadas
específicas, convalidando o padrão.

No entanto, pensar a questão racial de um sistema tão sofisticado, como o capital, é des-
dobrar a aparência dos corpos e lugares, percebendo que toda a ilusória condição de visuali-
dade também convive na ideia de meio ambiente. É justamente aí que caminham os estigmas,
e seus corpos-alvos, todos existentes do lado de dentro das invisibilidades e de um racismo
ambiental.

Pensar ambiente é pensar a Amazônia, onde homens e mulheres têm desaparecido em


meio ao meio ambiente. Comecemos com a própria noção que cultivamos de Amazônia, na
maioria das vezes do lado de fora, nos fazendo mecanica-mente reduzir culturas, por exem-
plo, à simples ideia de reserva, ou de verde. É como se o que existe do lado de dentro só se
apresentasse de uma cor, ou de até pensar a região como um pulmão excluindo o som das
batidas de milhares de corações e raízes presentes. Ou seja, o imaginário passa longe das
origens e legados indígenas, dos fluxos negros, juntados à cultura e à ancestralidade perten-
centes às regiões. Estas últimas são pobremente pensadas. Resta-nos questionar: Quem são
os povos-identidades, em meio ao meio ambiente? Podemos pensar em um futuro digno para
este país sem reconhecê-los?

A ideia de meio ambiente vem apagando, todos os dias, milhares de histórias e realida-
des. Legados compostos de uma verdadeira relação com a floresta, completamente inversa
à noção construída do lado de fora, como a própria ideia de desenvolvimento, já apagaram.
E ainda seguem sendo apagados diariamente. Os frutos de antigas gerações se vão, em
troca de privilégios. E nós ainda reproduzimos esses apagamentos e não percebemos. Como
invertermos este movimento?

(1) Trecho da coluna publicada por Marcela Bonfim em “Compor o lado não visível do ‘meio ambiente’ é tema de festival”; “Nós Mulheres da Periferia”, em 03/02/2022.

16 17
#Bem viver:
resistências e vivências contemporâneas
CompositorEs INICIAIS:
Pí SuruÍ (RO)
Ederson lauri (RO)
LIVRE COMPOSIÇÃO:
NAARA FONTINELI (EUA)
GALERIA 1

18 19
escala de composição/TOM


SURUÍ (RO)

Imagens Pí Suruí | Fotografia Saulo de Sousa

Imagens Pí Suruí | Fotografia Saulo de Sousa

Guerreiras da Ancestralidade, 2021 Cultura, 2021 Mulher indígena, 2021 Natureza, 2021
20 21
escala de composição

ISRAEL KAIN
VALE JR (RO) JUMA (RO)

Imagens Israel Vale Jr | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Kain Juma | Fotografia Saulo de Sousa

Brasil Terra Indígena, 2021 Harmonia, 2017 Sem título, 2021


22 23
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

AVENER
PRADO (SP)

GUILHERME
BERGAMINI (MG)

Imagem Avener Prado | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Guilherme Bergamini | Fotografia Saulo de Sousa

Macaco doce, 2019 Resta uma árvore, 2009

24 25
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

MARCOS
MADALENA (RO)

GEANE
TAVARES (RO)
Imagem Marcos Madalena | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Geane Tavares | Fotografia Saulo de Sousa

Brasil abandonado Janela para o futuro, 2019


26 27
caminhar entre as imagens, entre os olhares, entre os corpos.

caminhar.

caminhar juntos. caminhar abraçadas. caminhar cantando.

LIVRE COMPOSIÇÃO caminhar nas terras e nos sonhos.


NAARA FONTINELI (EUA)
os cantos e os pés caminham juntos.
(reverberação: NUHU YÃG MU YÕG HÃM: ESSA TER-
RA É NOSSA! de Isael Maxakali, Sueli Maxakali, Carolina
Canguçu, Roberto Romero, Brasil, 2020; Conversas no por vezes o caminho já não é mais o mesmo. mas há terra.
Maranhão de Andrea Tonacci, Brasil, 1977-83).

por vezes é preciso desviar ou saltar os caminhos cerceados.

mas há terra.

há terra e a terra é nossa.

nos cantos da caminhada dos Tikmu’un e nas conversas


no maranhão.

“Essa terra é nossa”.

28 29
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

NILSON RAFAEL
SANTOS (RO) DA LUZ (PA)

Imagem Nilson Santos | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Rafael da Luz | Fotografia Saulo de Sousa

A espera do território Alenquer, Comunidade São João, 2018


30 31
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

LUCAS
DE BAIL (PR)

Imagem Lautaro Actis | Fotografia Saulo de Sousa

LAUTARO
ACTIS (ARGENTINA)
Imagem Lucas de Bail| Fotografia Saulo de Sousa

Uma bicicleta e o rio, 2018 Ribeirinha acenando, 2021


32 33
#Corpo-natureza
GALERIA 2
CompositorAs INICIAIS: LIVRE COMPOSIÇÃO:
PAULA SAMPAIO (PA) Luiz Camillo Osorio (RJ)
MARCELA BONFIM (RO)

34 35
escala de composição/tom

PAULA
SAMPAIO [PA] Imagens Paula Sampaio | Fotografia Saulo de Sousa

Imagens Paula Sampaio | Fotografia Saulo de Sousa

Série nós, 2000 Série nós, 2004 Série nós, 2003 Série nós, 2004
36 37
escala de composição

PAULA DEIA
GIORDANO (PA) LIMA (PA)

Imagens Paula Giordano | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Deia Lima | Fotografia Saulo de Sousa

Infância Quilombola, 2021 Infância Quilombola, 2021 Sem título, 2015


38 39
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

THAÍS ANA CAROLINA


ROCHA (RJ) FERNANDES (RJ)

Imagem Thaís Rocha | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Ana Carolina Fernandes | Fotografia Saulo de Sousa

40 41
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

ÂNGELU DE
PALMAR (MA)

CRUUPOOH’RE
AKROÁ
GAMELLA (MA)

Imagem Ângelu de Palmar | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Cruupooh’re Akroá Gamella | Fotografia Saulo de Sousa

42 43
LIVRE COMPOSIÇÃO
Luiz Camillo Osorio (RJ)

O ambiente é meio e é todo, Há muitos corpos que nos são caros nestas imagens - entre indígenas e

negros, tudo ali fala dos processos de “crioulização” amazônica.


nele estamos, vivemos e morremos.
Termino aqui com o Glissant (que certamente adoraria ver estas fotogra-
As imagens são muitos tempos, muitos olhares, surpresas, encantos
fias de tempo e afeto):
e terrores. As imagens nos muros são constelações no céu - brilham,

fascinam e sinalizam. O sinal é uma mistura de saber ver e ser visto pelo
“A poética da Relação (que é,
saber dos outros. Estas imagens falam de pertencimento, de ser-com (as
então, uma parte da estética do
plantas, os bichos, os mortos, a fantasia). As crianças sabem nos olhar.
caos-mundo) pressente, supõe,
inaugura, reúne, espalha, continua
As cores não têm brilho pois este é sugado pelo e transforma o pensamento desses
muro - mas elas carregam uma luz opaca que elementos, dessas formas, desse
ilumina de dentro. movimento. Desestruture esses
dados, anule-os, substitua-os,
É bonita a ideia de uma exposição nas frestas da cidade e reinvente sua música: o imaginário
do mato. As fotografias preenchem os buracos entre o que ainda não da totalidade é inesgotável e
é e o que já foi - entre tudo por fazer e o já arruinado. sempre, e em todas as formas,
completamente legítimo, ou seja,
A natureza brota junto à palavra lixo. É forte isso. livre de qualquer legitimidade”.

44 45
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

mario
venere (RO)

ELZA
LIMA (PA)

Imagem Mario Venere | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Elza Lima | Fotografia Saulo de Sousa

Cachoeira Teotônio,1999
46 47
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

ULISSES HELEN
LIMA (BA) SALOMÃO (BA)

Imagem Ulisses Lima | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Helen Salomão | Fotografia Saulo de Sousa

48 49
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

JOELINGTON RAQUEL
RIOS (RJ) BACELAR (BA)

Imagem Joelington Rios | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Raquel Bacelar | Fotografia Saulo de Sousa

50 51
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

NILMAR ALEXANDRE
LAGE (MG) CRUZ
NORONHA (AC)

Imagem Nilmar Lage | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Alexandre Cruz Noronha | Fotografia Saulo de Sousa

52 53
#Fotos contadoras CompositorAs INICIAIS:
ALINE MOTTA (SP)
LIVRE COMPOSIÇÃO:
Iyalorixá Marlene
de históriasGALERIA 3
LIA KRUCKEN (BA) de Nanã (BA)

54 55
escala de composição/tom

ALINE
MOTTA (SP)

Imagens Aline Motta | Fotografia Saulo de Sousa Imagens Aline Motta | Fotografia Saulo de Sousa

Pontes sobre Abismos #6, 2017 Pontes sobre Abismos #28, 2017 Pontes sobre Abismos #07, 2017 Pontes sobre Abismos #2, 2017
56 57
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

ISIS MIGUEL
MEDEIROS (MG) CHIKAOKA (PA)

Imagem Isis Medeiros | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Miguel Chikaoka | Fotografia Saulo de Sousa

58 59
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

DIEGO
COSTA (SP)

Imagem Amanda Leite | Fotografia Saulo de Sousa

AMANDA
LEITE (TO)
Imagem Diego Costa| Fotografia Saulo de Sousa

60 61
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

laura laISE
lujan (RO) AZEVEDO (RO)

Imagem Laise Azevedo | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Laura Lujan | Fotografia Saulo de Sousa

62 63
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

CLÉBER LIVRE COMPOSIÇÃO


CARDOSO (RO) Iyalorixá Marlene de Nanã (BA)
AS FOTOS SÃO CONTADORAS DE HISTÓRIAS
Não podemos olhar somente de maneira estética. Agé máà inön ò pá àdá
Agé máá ìnòn ò pá àdá ó
É preciso ver o que está e o que não
está ali. Ver o que não está à mostra Em português quer dizer:
e ouvir o que não foi falado. Agé não quer fogo,
Agé não quer corte.
As fotos contam histórias. As fotos são contadoras de
histórias. As crianças, de novo. O menino cuida da menina com
carinho. Estão aprendendo juntos (com o maracá). Ela
As fotos conversam entre si. Não têm a mesma origem mostra a ele o que fazer ou é ele que mostra a ela? É
de motivo, mas tem a mesma inspiração. uma troca. A preservação dos hábitos. Precisamos
guardar esta troca, antes que a construção do homem
Às vezes, o fundo é parte da imagem. A parede sem branco acabe com tudo.
reboco do muro, a imagem além da moldura.
A foto dos caminhos e dos barcos é uma das mais bo-
Vejo a foto, é só uma criança, com muitas coisas à nitas. Também faz a gente pensar: em que condições
volta. Não pode ter medo, mas merece crescer com vivem estas pessoas? A poluição do rio.
compreensão das coisas. A gente cresce para sobrevi-
ver. Mas o que cresceu de verdade? Quando a floresta queima também queima a forma
destas pessoas sobreviverem, os animais que vivem
Existe uma semelhança de impactos com a foto da na água.
Imagem Cléber Cardoso | Fotografia Saulo de Sousa queimada. Olhando esta foto, fiquei extremamente
emocionada, porque entendi que era um pôr do sol. Algumas fotos chamam a olhar para frente. Outras
Olhando mais atentamente, vi que era uma queima- pedem para a gente entender como foram feitas, a
da. Senti muita dor. Uma dor que me levou quase ao tecnologia.
desespero. E a pergunta é:
Para algumas imagens tenho que olhar várias vezes
Por que estamos fazendo isso com para ir me afeiçoando a elas porque não sei se as
pessoas estão em tocaia, vigília ou observação.
nós mesmos?
Já que a nossa ancestralidade nos ensina, com canti- Quando uma imagem mostra tudo
gas do nosso protetor das matas, Sr. Osanha, também maravilhoso, me pergunto: será que
conhecido como Agé: é isso mesmo?
64 65
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

RENATA LARISSA
GORDO (SC) CORTEZ (MA)

Imagem Renata Gordo | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Larissa Cortez | Fotografia Saulo de Sousa

66 67
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

Imagem Fernando Gonçalves | Fotografia Saulo de Sousa

FERNANDO MARGEM
GONÇALVES (RJ) DO RIO (RJ)
Imagem | Fotografia Saulo de Sousa

68 69
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

CHRISTIAN
BRAGA (AM)

DENIS
ROUVRE
(FRANÇA)

Imagem Christian Braga| Fotografia Saulo de Sousa

70 71
#GALERIA ESCURA
GALERIA 4
Compositores INICIAIS:
ROGÉRIO ASSIS (PA)
WASHINGTON DA SELVA (BA)
LIVRE COMPOSIÇÃO:
Alberto César Araújo (AM)

72 73
escala de composição/tom

ROGÉRIO
ASSIS (PA)

Imagens Rogério Assis | Fotografia Saulo de Sousa

Sem título 1, 2018 Sem título 2, 2018 Sem título 3, 2018 Sem título 4, 2018
74 75
escala de composição

OCTAVIO WALDA
CARDOSO MARQUES (PA)
(PA)

Imagens Octavio Cardoso | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Walda Marques | Fotografia Saulo de Sousa

Série Lugares Imaginários, 2009 Série Lugares Imaginários, 2009


76 77
LIVRE COMPOSIÇÃO Nós da Amazônia
Estamos entalados,

ALBERTO CÉSAR ARAÚJO (AM)


Com nó na garganta
Num gargalo em espiral
Os gritos são necessários
Nesses muros, matas e rios
Amazônia é verbo
“Amazoniar”
Também é verborragia,
Amazônia e ar!
Um grito na mais alta luz estourada.

Amazônia e água!
Um rio voador
Rios, margens, imagens
Calor, cola, colagem.
Umidade.
Amazônia líquida,
fluida, lambida.
Um grito na mais escuras das águas.

Amazônia também queima


Labaredas, rasgos e floresta
Mato ou Mato?!
A ferro, alumínio, ouro e fogo
Tem muros, cercas e atalhos
Várzeas, veredas e margens.
Do verde mais verde ao mais verde pálido um eco do lado
Do pasto ou da soja
Amazônia, uma colcha de retalhos
De náusea que enoja.
de dentro
Amazônia é imagem
dos lados de cá
É Imaginário, fábula e memória
Inventada, saqueada, estuprada.
Amazônia é preta, é branca, amarela, vermelha, cinza
Também é negra, é indígena, é alienígena
Verde, negro, azul, chumbo e carvão
Um grito de dor no mais vermelho dos sangues.

O sul do sul global é o norte


Faroeste, sem lei, sem Estado, Bang-bang.
Vende-se; aluga-se; doa-se, não importa.
Para muitos: procura-se!

Viva ou morta. Foto Rogério Assis

78 79
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

Imagem Joilson Arruda | Fotografia Saulo de Sousa

RODRIGO
JOILSON PEDRO
ARRUDA (RO) Imagem Rodrigo Pedro Casteleira| Fotografia Saulo de Sousa
CASTELEIRA (RO)

Agroecologia feminina, 2021 Sem título, 2021


80 81
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

HIROSUKE JANAINA
KITAMURA (JAPÃO) WAGNER (SP)

Imagem Hirosuke Kitamura | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Janaina Wagner | Fotografia Saulo de Sousa

Silêncio dos Sentidos, 2022 Curupira das estradas, 2022


82 83
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

KEILA MÁRCIA
SANKOFA (AM) GOMES (PA)

Imagem Keila Sankofa| Fotografia Saulo de Sousa Imagem Márcia Gomes| Fotografia Saulo de Sousa

Direito à memória - outras narrativas, 2019 Ninfa, 2016


84 85
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

DIEGO
SEI (BA)

Imagem Danilo Marroco | Fotografia Saulo de Sousa

DANILO
MARROCO (SP) Imagem Diego Sei | Fotografia Saulo de Sousa

Homem, cavalo e rio em um elo, 2020 Onde a casa começa, 2021


86 87
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

MERGULHA SAULO
E VOA (PE) DE Sousa (RO)

Imagem Mergulha e Voa | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Saulo de Sousa | Fotografia Saulo de Sousa

Sem título, 2021 Uma mãe desde sua janela, 2022


88 89
Compositores INICIAIS:
Duo RODRIGO E GAL (RJ)
(Rodrigo Masina Pinheiro
e Gal Cipreste Marinelli)
Ana Lira (PE)
#GALERIA TRANSLÚCIDA
GALERIA 5
LIVRE COMPOSIÇÃO:
MARIA THEREZA
SOARES (MA)
90 91
escala de composição/tom

DUO
RODRIGO
E GAL (RJ)

Imagens Duo
Rodrigo Masina Pinheiro
e Gal Cipreste Marinelli |
Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Duo Rodrigo Masina Pinheiro e Gal Cipreste Marinelli | Fotografia Saulo de Sousa

Cerca, 2021 Implante, 2020 GH, 2020 Carta de 2016, 2020


92 93
escala de composição

DAVI BICHO
DE JESUS DO CARRANCA (MG)
NASCIMENTO (MG)

Imagens Davi de Jesus do Nascimento | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Bicho Carranca | Fotografia Saulo de Sousa

94 95
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

THAIS
ESPINOSA (SP)

IAGO
ARAUJO (BA)

Imagem Thais Espinosa | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Iago Araujo | Fotografia Saulo de Sousa

Imensidão Rio de Desejos


96 97
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

ANIRAM (RJ) DUO PAISAGENS MÓVEIS


BÁRBARA LISSA E MARIA VAZ (MG)

Imagem Duo Paisagens Móveis: Bárbara Lissa e Maria Vaz | Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Aniram | Fotografia Saulo de Sousa

Baby Diz Três momentos de um rio


98 99
CHAVE DE CONVOCATÓRIA

ANA MENDES
& NAY JINKNSS (PA)
LIVRE COMPOSIÇÃO
MARIA THEREZA SOARES (MA)

O tempo da espera,
do agora,
do hoje,
da urgência,
o meu tempo,
o nosso tempo.
Tempo de amor e afetos,
Imagem Ana Mendes & Nei Jinknss | Fotografia Saulo de Sousa
tempo que contempla a vida.

Eu não sabia que ia ser militar


100 101
O meio ambiente é o mundo (2) A consciência das camadas políticas nos remete a estes atravessamentos do homem pela pró-
pria natureza. Traz a necessidade de se inverter a movimentação para que continuemos vivos. A
imagem tem sido uma forma de trazer para perto as nuances que envolvem a mata ou o concreto.

A partir do Festival Fotografia em Tempo e Afeto, propomos trabalhar imagens e pensamentos


visuais em Rondônia. Várias camadas visuais têm se transformado, tanto em economia quanto em
Pensar o “meio ambiente” é perceber as invisibilidades de uma pauta cheia de estigmas e política. A visualidade tem despertado olhares para narrativas comunitárias, muitas vezes pouco
distorções. A própria questão foi transportada a um plano delimitado, onde nos condicionamos o aparentes quando separadas, mas ganhando força e forma quando estão em conjunto.
tempo inteiro em pensar as imagens da problemática relacionadas a uma suposta cor - o verde - e
a um determinado lugar - a Amazônia. Além do mais, pensar “meio ambiente” dentro de Rondônia, uma das tantas Amazônias, é
desafiar os modos operacionais da lógica de um circuito de ideias. Assim, no mês de fevereiro foi
A construção social, política e histórica coloniais, colonizadas e colonizadoras, trazem como estabelecido um grande movimento de composição com o mote: “meu meio é o meio ambiente”.
princípio o conhecimento destes territórios, renomeados de “Amazônia” - assim, no singular. Uma Mais de cem pessoas, todas compondo entre si, e também com as ruas de Porto Velho, resultaram
construção exercida do lado de fora, exatamente no centro político, onde habitam e transitam os na montagem de 7 galerias a céu aberto, que foram transpostas para a plataforma do festival(3) e
fluxos e refluxos do imaginário social, estreitados à ótica econômica do capital. Sendo que, para para este catálogo.
quem reside do lado de dentro destas tantas margens, é tido e consciente, a multiplicidade, como
também o desconhecimento da amplitude do próprio território. Lia Krucken, que é uma das compositoras, junto com Aline Motta, desenvolveu uma das gale-
rias do projeto e compartilha os sentidos que nortearam as construções permeadas da coletividade
O grande desafio tem sido contribuir para a conscientização de quem vive do lado de fora expressa em cada imagem em conjunto, umas com as outras:
destas tantas margens, sobretudo, quanto a necessidade de compreensão sobre as diversas es-
pecificidades destes tantos lugares, bem como de sua diversidade. Seja em relação à diversidade Uma imagem chama outra.
do clima, ou das raízes dos imensos contextos afunilados de Amazônia, é preciso conscientizar
sobre o direito de existir como identidade, voz, tradição, política, sociedade, economia e imagem. É um tipo de chamamento pela imagem. O pensamento se ancora no visual, mas não
só. Uma imagem, perto de outras, diz mais, vai além. Várias imagens, numa galeria,
Neste sentido, percebemos que discutir o meio ambiente tem sido principalmente debater fazem uma galera: quem está retratado, quem retratou, lugares, tempos, meios-am-
ideias e planos desconhecidos, e/ou invisibilizados do próprio território, para além das paisagens, bientes. O resultado é eletrizante: vemos movimentos, olhos que nos olham, cenas
e para além do imaginário colonizador. O que nos importa são outras formas e princípios, que nos que nos convidam a ler e participar. Muitas energias estão ali, nas imagens que se
desloquem ao caráter humano da questão, onde a comunidade tem consciência que é dependen- juntaram - algumas são visíveis aos olhos e outras não.
te, como também responsável por suas formas e corpos. O que pensam e como se movimentam,
para dentro e/ou para fora, têm nos próprios limites a convalidação da sua própria existência como Marcela propõe um método que vai se abrindo, nos quais as escalas musicais vão se
natureza (meio/ambiente), como o próprio mundo. ampliando e parece desaguar no mar. A composição se faz compondo e nos faz um
‘corpo a compor’ com várias paisagens e histórias. Nesse método de arranjar ima-
Sendo assim, a questão que se coloca é: por que pensar o meio ambiente restrito à imagem gens, pensamentos e in-corpo-rações, a lógica é a do fluxo, ou melhor, dos fluxos.
de uma Amazônia, enquanto os efeitos da dita emergência climática têm afetado abruptamente Entendi que a beleza do método é justamente fluir junto, ler os sinais e pegar a onda
o mundo todo? Estados brasileiros (muitos que já perderam grande parte de suas florestas) têm que quer vir. Assim, fomos montando uma galeria, numa composição que se iniciou
dividido (ou enfrentado) o ônus do peso ambiental (com situações ambientais muito complexas). junto com Aline Motta e foi se desdobrando, incluindo várias pessoas de um longe-
E, por que, assim, só pensar na Amazônia quando se fala em meio ambiente? -perto. E agora estamos nas ruas de Porto Velho e nos espaços virtuais do festival.

Ou seja, ao transportar a discussão do meio ambiente para as humanidades de nossas neces- O convite para quem ler as 7 galerias-galeras do projeto é pensar o seu próprio
sidades como também natureza, assumimos parte substancial da responsabilidade ambiental para ambiente. Porque o jogo é esse, um jogo sem fim, no qual estamos todos juntos: ler
quem de fato é responsável: isto é, os indivíduos, e o mundo todo. Consideremos, por exemplo, o com o corpo e seu meio, e continuar a composição.
peso da guerra atual, instalada superficialmente, por meios políticos, com profundidades ambien-
tais, como uma usina nuclear. Por quais motivos ainda nos debruçamos apenas à ideia destes
pesos na Amazônia?

102 (2) Coluna publicada por Marcela Bonfim em “Nós mulheres da periferia” em 09/03/2022. (3) https://www.fotografiaemtempoeafeto.com/ 103
#LIVRE COMPOR COMO LIVRE COMPOSIÇÃO:
ANDRESSA SILVA (RO)
VIVER, LUTAR E SONHAR
GALERIA 6
CYnthia Cy Barra (BA)
MARCELO REIS (BA)
Lanussi Pasquali (BA)
Fábio Gatti (BA)
(RE)conhecendo a amazônia negra (RO)
104 105
Imagens Jessica Moreira | Fotografias Saulo de Sousa

JESSICA
MOREIRA (SP)
TRENS,
MARRETAS
E OUTRAS
HISTÓRIAS

106 107
MICHELE D’ÁGUA
SARAIVA E LAMA
(SP)

Imagens Michele Saraiva | Fotografias Saulo de Sousa

Imagens Michele Saraiva | Fotografias Saulo de Sousa

108 109
volutas
cynthia cy barra

um corpo
LIVRE COMPOSIÇÃO LIVRE COMPOSIÇÃO
que dança
é feito de ar
CYNTHIA CY BARRA (BA) ANDRESSA SILVA (RO)
e me encontra?

escuto
o que não vejo
só depois
a imagem
me diz
como
me
chama

um varal
de imagens
posto
na feira

solfeja:

olho-lama
pele-terra
boca do mar

areia
rio
mangue

corpo de águas

distâncias

um corpo que dança Fotografia Michele Saraiva | D’água e Lama


é feito de ar
e me encontra?

escuto o que não vejo


só depois a imagem me diz
como me chama
Fotografias Geane Tavares
110 111
LIVRE COMPOSIÇÃO
(RE)CONHECENDO A AMAZÔNIA NEGRA (RO)
BOCA DO MOCAMBO

Processo fotográfico (Re)conhecendo a Amazônia Negra/imagem: Marcela Bonfim. Fotografias: Saulo de Sousa / Geane Tavares

112 113
RONALDO LUIZ
NINA (RJ) BRITO (RO)

Imagens Ronaldo Nina | Fotografias Saulo de Sousa Imagem Luiz Brito| Fotografia Saulo de Sousa

Xavante, 2004 Bateção Xavante, 2004


114 115
Imagens Danilo de S’Acre| Fotografias Saulo de Sousa Imagem Danilo de S’Acre| Fotografia Saulo de Sousa

DANILO
DE S’ACRE (AC)

Poema na liquidez inerente

Alguma decisória para


construções impossíveis Batelão Fantasma
116 117
MANOEL
BATISTA
DE ALMEIDA (RO)
(in memoriam)

Imagens Manoel Batista de Almeida | Fotografias Saulo de Sousa

118 119
MATEUS RITA DE
SOUSA (RJ) CÁSSIA (RO)

Imagem Matheus Sousa| Fotografia Saulo de Sousa

Imagem Rita de Cássia| Fotografia Saulo de Sousa

120 121
MANOEL MARGOT
SANTIAGO (RO) PAIVA (RO)

Imagem Manoel Santiago | Fotografia Saulo de Sousa Imagem Margot Paiva | Fotografia Saulo de Sousa

122 123
MARCIA TANISON
MURA (RO) PASSOS (RO)
Desenhos a lápis: Tanison Passos
Fotografias Saulo de Sousa

Imagens Marcia Mura | Fotografias Saulo de Sousa

124 125
LIVRE COMPOSIÇÃO
Lanussi Pasquali
Imagens Uiler Costa Santos | Fotografias Saulo de Sousa Fábio Gatti (BA)
UILER
COSTA
SANTOS (BA)

126 127
LIVRE COMPOSIÇÃO
MARCELO REIS (BA)

Existem duas imagens


Uma que é a própria suposta
realidade: a matéria, a outra é
nossa imagem mental, quase
sempre opaca, transparente a
sua própria matéria, contudo,
reflete ao real.

Pinturas D. Lauro (sobre pallets). Fotografias Saulo de Sousa


A fotografia, essa sim, é uma
terceira imagem, que é
DOM a soma dessas duas outras
LAURO (RO) imagens, e que por sua vez
assume um corpo que
carrega em sua materialidade
uma imagem morta de um

Caricatú lobo guará, 2021


Rabetas que sobem, 2021
outro corpo qualquer.

Cristo na selva, 2021


Abertura Amazônica, 2021 A salvação, 2021 Cunianzitas, 2021
128 129
#[RE]COMPOR COMO A LIVRE COMPOSIÇÃO:
GÊ VIANA (MA)
NATUREZA
GALERIA 7
130 131
WALTER LUCIA
NETTO MARTINS
(RO) (PA)

132 133
VITÓRIA
MORÃO (RO)

CLÁUDIO
ZARCO (SP)

134 135
FERNANDA
SIEBRA (CE)

NINO
REZENDE (MG)

136 137
NATALI SAMARA
ARAÚJO (RO) RAMOS (RO)

138 139
BEATRIZ ELISABETE
BELO (SP) CHRISTOFOLETTI (RO)

140 141
TULASI
RESENDE (MG)

MANOEL
SANTIAGO (RO)

142 143
IANCA LEANDRO
MOREIRA (AP) MARQUES (RO)

144 145
LIVRE COMPOSIÇÃO
GÊ VIANA (MA)

Chão de terra batida avó Maria Viana, 2020

Infância

ERIEL
ARAÚJO (BA)

146 147
Possíveis identidades do futuro “Os povos indígenas são declarados pela ONU
como os “guardiões da floresta”, nossas vidas, nos-
/ Laços de pernas com saltos”. Ou seja, aqui na Galeria 5
(p.90), articulada por Ana Lira, falamos sobre ambientes nada

e o futuro das identidades (4) sa história e nossa cultura é a floresta. O sagrado


vem da floresta. Não existem povos indígenas sem
floresta e não existe floresta sem povos indígenas,
translúcidos vivenciados por Rodrigo Masina Pinheiro e Gal
Cipreste Marinelli, que são rearticula-dores de seus próprios
meios, em meio à potência reflexiva de seus corpos, e do desejo
somos um. Somos e sempre seremos. Minha an- traduzido em suas visualidades.
cestralidade vem das árvores, dos rios, da terra, da
mata. Minhas fotografias indicam o meu ambiente, São fotografias que contam sobre “homens e mulheres
Com a entrada de nossos corpos, no lugar de sujeitos ativos da natureza de forma mais ampla e difusa? sem face, nem nome. Seus rostos se misturam a outros se-
que é a floresta, cultura, luta, mulheres e também an-
e enunciantes no campo da produção e da circulação da fotogra- cestralidade”. (Pí Suruí) res, rios, estradas, LIVRE florestas COMPOSIÇÃO
e as coisas do mundo. Sua iden-
fia, os meios e ambientes orientados ao fluxo da visualidade têm Para aprofundar a questão, convidamos um grupo de artis- tidade se inscreve eLuiz se impõe Camillo pelaOsorio
força do (RJcorpo) e da sua
se deparado com uma enxurrada de questões e reflexões acerca tas visuais da quinta edição do Festival Fotografia em Tempo e Narrando o ambiente em que vive, a fotógrafa e jovem li- relação com o ambiente. Esses seres sem rosto, nem nome,
do processo de racialização de nossas próprias identidades. Afeto, que fizeram de suas imagens meios e ambientes propí- derança indígena, Pi Suruí, aproxima-se dos meios acadêmicos somos NÓS, todos parte de uma natureza O ambiente só”. é meioAssim e écontatodo,
cios de reflexão conjunta, a compartilhar impressões. A proposta de pensar a questão, dialogando com Eder Lauri, professor e Paula Sampaio, em meio às memórias nele daestamos,
Transamazônica, vivemos eam- morremos.
Tocar na segregação dos corpos-imagens tem nos levado a é acolher e estimular formas diversas de se pensar e se fazer, fotógrafo, também compositor da Galeria 5, “Bem viver: resis- biente onde repercutiu ainda mais a sua natureza documental,
perceber por onde trafegam os planos da seletividade no âmbito (re)conhecendo as sombras que permeiam nossos imaginários.
As imagens são muitos tempos, muitos olhares, surpresas, encantos
tências e vivências contemporâneas” (p.18), na construção como de quem faz do meio ambientee terrores. umAsescudo; uma leveza;
imagens nos muros são constelações no céu - brilham,
do privilégio. A polarização de nossos sentidos, sempre coloca- de pontes entre o ativismo e a educação. corpo-natureza. São os muros quando recebem as
fascinam e sinalizam. O sinal é uma imagens
mistura de saberdaver e ser visto pelo
dos ao avesso de um suposto lado “certo” ou “bom” da questão, Sendo as sombras uma forma de proteção para as Galeria 2 (p.34), compartilhada comigo, e diluída em meio, e saber dos outros. Estas imagens falam de pertencimento, de ser-com (as

está diretamente relacionada à cultura da visualidade branca, florestas, na preservação e manutenção da temperatura global Entre pontes sobre abismos… também coexistem LIVRE
os meios todo, pois o ambiente é meio e é todo, nele estamos,
COMPOSIÇÃO A natureza brota vivemos
junto à palavra e lixo. É forte isso.
plantas, os bichos, os mortos, a fantasia). As crianças sabem nos olhar.

estruturada no topo das vantagens. “[...] percebemos a metáfora da reprodução da vida na natu- Luiz Camillo
de Aline Motta, ao atravessar o lado oculto de um ambiente Osorio (RJComo
fa- morremos. ) observa Luiz Camillo Osorio Há (p.44):
As cores não têm brilho pois este é sugado
muitos corpos que nos são caros nestas peloindígenas e
imagens - entre

reza, representada pela mata preservada, como um grande miliar. muro - masnegros, elastudocarregam uma luz opaca que
ali fala dos processos de “crioulização” amazônica.

Sendo o imaginário o grande paradigma de uma socieda- útero materno onde a vida se desenvolve”. São as sombras O ambiente é meio e é todo, ilumina de dentro.
“Se tudo que fazemos na vida é atravessar abismos, Termino aqui com o Glissant (que certamente adoraria ver estas fotogra-

de visual, alcançar detalhes (que são bem mais que detalhes) que dão o tom à “Galeria Escura”, sacada e nomeada pelo ar- este projeto é sobre pontes. Pontes de palavras e nele estamos, vivemos e morremos. fias de tempo e afeto):
É bonita a ideia de uma exposição nas frestas da cidade e
que nos levem para além do visível, significa também perceber tista visual Washington da Selva, proposta por Rogério Assis. A imagens, pontes de busca por entendimento. Pontes As imagens são muitos tempos, muitos olhares, surpresas, encantos
do mato. As fotografias preenchem os buracos
“A poética daentre o que ainda
Relação (quenãoé,
camadas estruturais do próprio espaço e de sua cultura, que composição, assemelhada à “essência lúdica, marcada pela sobre o Atlântico… É um projeto que fala sobre a mi- e terrores. As imagens nos muros são constelações no céu - brilham, é e o que já foi - entre tudo por fazerentão,
e o já uma parte da estética do
arruinado.

caos-mundo) pressente, supõe,


existem em meio ao meio ambiente, nas quais se organizam os liberdade, espontaneidade e autonomia no brincar” - como
fascinam e sinalizam. O sinal é uma mistura de saber ver e ser visto pelo
nha família, mas poderia falar também da sua”. saber dos outros. Estas imagens falam de pertencimento, de ser-com (as inaugura, reúne, espalha, continua
A natureza brota junto à palavra lixo. É forte isso.
corpos e os movimentos visuais; inclusive dissolvidas na e pela descreve Paula Giordano -, reflete o universo de uma criança em LIVRE COMPOSIÇÃO
mecânica que segrega suas identidades. seu envolvimento com as árvores, por exemplo, dando sentidos Junto com Aline MotaLuiz LIVRE COMPOSIÇÃO
Camillo
e Lia Krucken,Osorio (RJ) contextos
localizamos
plantas, os bichos, os mortos, a fantasia). As crianças sabem nos olhar.
44
e transforma o pensamento desses
elementos, dessas formas, desse
Há muitos corpos que nos são caros nestas imagens - entre indígenas e

No caso da Amazônia, a própria forma de pensar as paisa-


à vida como uma perfeita encantaria, encontrando os próprios
meios de enxergar o mundo.
imersos às águas; como um ambienteIyalorixá
familiar; totalmenteMarlene
à de- de Nanã
“Nasci (BANa) foz do Amazonas. Cresci
na cidade.
O ambiente é meio e é todo, ilumina de dentro.
riva do futuro, mas guiada pelas fotos contadoras de história;
As cores não têm brilho pois este é sugado pelo
muro - mas elas carregam uma luz opaca que

cercado de cimento, mangueiras e água. Aprendi a


negros, tudo ali fala dos processos de “crioulização” amazônica.
movimento. Desestruture esses
dados, anule-os, substitua-os,
reinvente sua música: o imaginário
Termino aqui com o Glissant (que certamente adoraria ver estas fotogra-
da totalidade é inesgotável e
gens locais, desarticulada das imagens humanas que compõem inundando a Galeria 3 (p.54), como um nele
lagoestamos,
doce e profundo,vivemos e morremos. nadar
É bonita a ideia na nas
de uma exposição piscinafrestas daecidade
fias de tempo epulei
afeto):e no rio. Aprendi a remar sempre,ainda
e em todas as formas,
esses espaços, tem distanciado ainda mais a relação entre a Sombras também guardam a força das identidades e das surgido deAS FOTOS SÃO CONTADORAS DE HISTÓRIAS
solfejos. Ouvindo as letras da Iyalorixá Marlene de do mato. As fotografias preenchem os buracos entre o que ainda não
criança, mas um dia comprei uma moto. completamente legítimo, ou seja,
São muitas
é e o que já foi - entre tudo por fazer e o já arruinado.
As imagens são muitos tempos, muitos olhares, surpresas, encantos “A poética da Relação (que é, livre de qualquer legitimidade”.
natureza e a identidade de seus povos. Eles são invisibilizados tradições. A imagem proposta por Kain Juma, da documentação Nanã (p.65): lembranças que se misturam, uma da vida
estéticaem
do dois mun-
pelo lado de fora; exatamente onde são tomadas as principais da “mobilização dos povos indígenas em 2021; ato contra a
Não podemos olhar somente de maneira estética.
e terrores.
Agé máà inön
As imagens nos muros são constelações no céu - brilham,
ò pá àdá
fascinam e sinalizam. O sinal é uma mistura de saber ver e ser visto pelodos, talvez mais aqui
então, uma parte
do que pressente,
caos-mundo) lá. Nãosupõe,dá para saber
Agé máá ìnòn ò pá àdá ó
decisões sobre esses ambientes; invadidos por interesses parti- tese do Marco Temporal que visa acabar com a demarcação É preciso ver o que está esaberodosque não
outros. Estas imagens falam de pertencimento, de ser-com (as
44
onde vou chegar, mas inaugura, reúne, espalha, continua
nos meus sonhos me vejo do
e transforma o pensamento desses
culares de seus meios, e condenados à ideia de reserva. das terras indígenas”, traz a dimensão das mobilizações, como está ali. Ver o que não está à mostra Em português quer dizer:
plantas, os bichos, os mortos, a fantasia). As crianças sabem nos olhar.
lado de lá, na beira do rio.” (Octavio
elementos, Cardoso)
dessas formas, desse
meio ambiente propício para articulação e de luta desses povos, As cores não têm brilho Agé
e ouvir o que não foi falado. pois estenão quer
é sugado pelo fogo, movimento. Desestruture esses
Resistindo ao desenvolvimento, tanto do lado de dentro, constantemente usurpados em seus territórios. E como Israel do muro - mas elas carregamAgé
uma luznão quer
opaca Estecorte.
que é Octavio Cardoso, soltando as imagens
dados, anule-os, do tempo, em
substitua-os,
As fotos contam histórias. As fotos são contadoras
ilumina de
de dentro. reinvente sua música: o imaginário
quanto do lado de fora das tantas Amazônias, o meio ambiente Vale observa, nesses territórios os povos vivem “em harmonia histórias. As crianças,meio de novo. à memória, que davaimenina
O menino cuida do dacimento,
com até o desejo pela beira
totalidade é inesgotável e
tem suportado o peso do concreto, oscilando de um extremo a com a Natureza, defendendo e usando seus recursos de ma- carinho. do
Estão
É bonita a ideia de uma exposição nas frestas da cidade e rio, …na
aprendendo fluidez
juntos e força
(com o da
maracá).fonte
Ela
sempre, edessa
em todasda natureza. Somos
as formas,
As fotos conversam entre si. Não têm a mesma origem mostra a eleo oqueque fazer ou é ele que mostra a ela? É
outro, como o despontar de um suspiro para a vida, e não para neira responsável, para sua subsistência e fortalecendo os Além dedemotivo,
história, as fotos também contam
do mato. e
mas tem a mesma inspiração. quebram
As fotografi as preenchem os buracos entrefeito
para- de
ainda nãoágua, como nós seres,completamente
precisamos da natureza
legítimo, ou seja, para nos
uma troca. A preservação dos hábitos. Precisamos livre de qualquer legitimidade”.
uma economia depredadora. Resta-nos refletir: Porque, então, laços históricos e culturais”. digmas, como o “milagre de esquecer a sexualidade o quanto guardar estareconectar
é e o que já foi - entre tudo por fazer e o já arruinado.
troca, antes com que aoconstrução
meio emdo que vivemos. Um desejo da fotógrafa
homem
concentrar a pauta climática apenas na Amazônia? Porque as Às vezes, o fundo é parte da imagem. A parede sem
antes. / Amor de família. / A cerca de metal
reboco do muro, a imagem além da moldura.
que sobe as per-
branco acabe DeiacomLima,tudo. ao traduzir o estouro do Mar como quem vibra o pró-
pessoas não cuidam de seus meios, dos entornos perto de si, e nas. / Violência sexual. / Reparação de cabelo nas costas. prio corpo,
A foto dos caminhos e dosjorrando de uma
barcos é uma fonte.
das mais bo-
Vejo a foto, é só uma criança, com muitas coisas à
44 45
nitas. Também faz a gente pensar: em que condições
(4) Trecho da coluna publicada por Marcela Bonfim em 21 de abril de 2022 no site: volta. Não pode ter medo, mas merece crescer com vivem estas pessoas? A poluição do rio.
148 https://nosmulheresdaperiferia.com.br/festival-de-fotografia-disponibiliza-agenda-visual-do-meio-ambiente/ compreensão das coisas. A gente cresce para sobrevi- 149
ver. Mas o que cresceu de verdade? Quando a floresta queima também queima a forma
destas pessoas sobreviverem, os animais que vivem
Existe uma semelhança de impactos com a foto da
Como pássaros juninos, melodramas teatrais de Belém, lem- Ainda assim, a maioria das identidades vivem às sombras
brados por Wanda Marques (p.77), as fotos trazem das sombras do meio ambiente, que, por sua vez, se esconde nas asas da
o nosso desconhecimento sobre culturas que dizem das nossas Amazônia. E, que por sua vez, é encoberta de várias camadas
identidades. Para além dos festejos juninos, as imagens falam de estigmas; soterrando ainda mais o que existe de fato, por
dos elos que essas culturalidades registram em nosso espaço/ ideias soltas que se ouvem falar. Deixa-se de reconhecer o que
tempo. Isto não é visto e nem pensado do lado de fora - e muitas é valioso de fato, as identidades nas suas essências.
vezes nem do lado de dentro. Muros imaginários, preenchidos
de luzes, todas ofuscadas pela ideia de “conhecimento”, alheia Por fim, a ideia da composição é também um ato-desejo de
ao passo anterior, o (re)conhecimento. ver a língua do povo falar. Pois quando isso acontece são as
identidades que se manifestam. E quando se manifestarem em
Assim, as identidades criam seus próprios mundos, mes- meio-todo poderão assim dizer o verdadeiro nome da Amazônia,
mo convivendo restritas a um caos; mas diferentes dos muros do Brasil.
criados pelo mundo afora, os promotores das questões caóticas,
que tentam separar e evitar o reconhecimento que é transitar em
imagem, cultura e identidades. A racialização de nossos corpos
apoiam estruturas visuais que invisibilizam homens e mulheres
em seus próprios espaços/tempos. “As cores não têm brilho pois
este é sugado pelo muro - mas elas carregam uma luz opaca que
ilumina de dentro”, nos diz Luiz Camillo Osorio (p.44).

Ao compor com as possíveis identidades imersas ao caos


e à própria continuidade, podemos conhecer um caminho mais
seguro e promissor de como se pensar soluções e proteções
ambientais para cada lugar. Podemos contar por dentro com a
culturaAenatureza
a visualidade, como
brota junto extensão
à palavra lixo.eÉcontinuidade
forte isso. do mundo
que alcançamos em cada lugar. Luiz Camillo Osorio encerra as-
Há muitos corpos que nos são caros nestas imagens - entre indígenas e
sim sua Livre Composição (p.44):
negros, tudo ali fala dos processos de “crioulização” amazônica.

Termino aqui com o Glissant (que certamente adoraria ver estas fotogra-

mos. fias de tempo e afeto):

antos “A poética da Relação (que é,


lham, então, uma parte da estética do
visto pelo caos-mundo) pressente, supõe,
er-com (as inaugura, reúne, espalha, continua
os olhar. e transforma o pensamento desses
elementos, dessas formas, desse
o pelo movimento. Desestruture esses
que dados, anule-os, substitua-os,
reinvente sua música: o imaginário
da totalidade é inesgotável e
de e sempre, e em todas as formas,
ainda não completamente legítimo, ou seja,
livre de qualquer legitimidade”.

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