Você está na página 1de 13

O GROTESCO DA/NA FIGURAÇÃO DA MATERNIDADE NOS CONTOS DE

BRUNO SÉRVULO

Linha de pesquisa: Literatura, Cultura e Memória


Possível orientadora: Profa. Dra. Ingrid Lara de Araújo Utzig

RESUMO:

A maternidade é tema recorrente nas obras de Bruno Sérvulo, prioritariamente


nos contos, alguns deles sob o aspecto do que a teoria e a crítica literária
comumente compreendem como grotesco. Para além das conceituações, o
autor buscou figurar a maternidade a partir de um viés desromantizado, por meio
do estranhamento, com narrativas nas quais a sensibilidade da linguagem
convive com a crueldade de seus contextos. Far-se-á a leitura desse objeto de
pesquisa tendo por base as teorias e a crítica literária, que ao longo dos anos
vem dedicando especial atenção à literatura cuja pretenção é fugir do
convencional, pelo menos quanto à sua temática e abordagem, principalmente
de um autor que vive e escreve sobre/em solo amapaense.

Palavras-chaves: Maternidade; grotesco; contos; literatura

INTRODUÇÃO:

Não sei ao certo como tudo começou. Estava


em casa, olhei-me no espelho e vi o que me
tornei: um monstro (conto “O ventre” de Bruno
Sérvulo)

É perceptível que nos últimos anos tem entrado em pauta muitas


discussões a respeito da maternidade. Percebe-se, sobretudo no âmbito das
mídias sociais, uma proliferação de compartilhamentos de experiências e
vivências maternas originados dos mais diversos tipos de perfis femininos. Tais
vivências recaem como resultado de um conjunto de ideologias e valores
associados à maternidade. Para Figueiredo Souza (2019), este conjunto contribui
para o estabelecimento do lugar que as mulheres reservam à maternidade dentro
do seu planejamento pessoal, bem como a visualizam no âmbito coletivo.
Produções que tratam sobre a exaustão materna, a relação com os filhos,
com o(a) companheiro(a) após a chegada dos filhos, do poder de escolha sobre o
próprio corpo quanto à maternidade, dentre outros debates que se inserem na
chamada “maternidade real” se fazem cada vez mais presentes, inclusive na
literatura e no cinema, a exemplo do filme A Filha Perdida1, uma produção
homônima baseada no livro da escritora italiana Elena Ferrante, para este estudo,
entretanto, o enfoque será na literarura.
Partindo desta perspectiva, os relatos sobre as experiências maternas,
sejam reais ou em obras ficcionais, vão além do romantismo e, algumas vezes,
extrapolam a humanização costumeiramente criada por alguns autores; obras
marginais ou marginalizadas, por assim dizer, e que trazem à tona aspectos que
em outros contextos históricos, encontrariam lugar apenas nos subúrdios da
escrita, ou seja, relegados a uma literatura menor e/ou de baixo prestígio, mas
que hoje carregam, de certo modo, autenticidade em suas representações, sejam
por aspectos sensíveis, melancólicos ou grotescos. Este último será abordado
como um dos eixos de leitura e discussão desta pesquisa, a partir de contos
selecionados do autor Bruno Sérvulo que versam sobre a temática da
maternidade em diferentes personificações que vão de encontro à figura materna
romântica presente em inúmeras produções literárias, no imaginário sócio-
afetivo, na memória sócioafetiva e no senso comum.
Para tanto, esta pesquisa pretende se valer da conjugação dos campos
de conhecimento da teoria e crítica literária, em diálogo com outras referências,
a exemplo das autoras: Elisabeth Badinter e Simone de Beauvoir. O objetivo
deste trabalho consiste em analisar as figurações maternas presentes nos contos
do referido autor, tomando como ponto inicial o estudo da estética do grotesco e
da presença da maternidade na literatura.

JUSTIFICATIVA

Há muitos mistérios que circundam as mulheres.


Acho que eu, acho que ninguém, jamais
conseguirá desvendar. (Conto “Moms” de Bruno
Sérvulo)

O interesse em mergulhar nesta investigação surgiu da necessidade de

1 Filme dirigido por Maggie Gyllenhaal, lançado no Brasil em dezembro de 2021 e disponível
na Netflix.
contribuir para a visibilidade e divulgação de uma literatura que, apesar de ainda
ser pouco explorada, apresenta autores e obras envoltos de grande qualidade
literária e potencial valorativo: a literatura amapaense. Propor pesquisas que
gerem contribuições e novas perspectivas sobre estas produções locais é uma
maneira de abrir espaços para que estes autores sejam discutidos e divulgados,
vislumbrando um maior interesse e acesso às obras.
A ausência de referências acerca da literatura amapaense também é
outro ponto de motivação para o desenvolvimento desta pesquisa, pois abre
possibilidades de ampliar as investigações e produções científicas que
dialoguem com teorias e estudos literários já existentes e que colaborem para a
construção e fortalecimento da literatura local, em termos regioniais, e universal,
em termos de tessituras variadas sobre o ser humano em suas complexidades.
Sobre a perspectiva de uma maior discussão entre teorias literárias e
literatura amapaense, Maciel (2021), discorre que:

Essa premissa, em si mesma, é o que permite a ampliação e o


enriquecimento do terreno da crítica e dos estudos literários locais.
Retomando uma das premissas iniciais de que a literatura trata antes
da experiência humana do que propriamente suas temáticas, importa
então traçar um percurso argumentativo que permita propor – e não
impor – discussões e perspectivas que contribuam e tornem ainda mais
férteis o terreno da crítica literária amapaense.(MACIEL, 2021. p. 82)

De maneira mais ampla, trazemos à baila a inserção da literatura


amapaense dentro do cenário amazônico como um todo, mas não apenas sob
a perspectiva de um caráter puramente regional, de expressão de valores
culturais, costumes e origens históricas que geralmente são atribuídos para as
produções regionais amazônicas e que, certamente, são carregados de
importância e totalmente necessários para a construção desta vertente literária,
no entanto, nos aliamos à tentativa de falar de uma literatura que, além de
demonstrar seu lugar de origem, também se preocupa em elaborar constructos
capazes de demonstrar traços significativos e representativos da condição
humana que costuma se apresentar de maneira difusa e volátil e, por isto,
queremos também discutir uma literatura regional que sirva ao desígnios de
acionar outras emoções no leitor e que se encaixem no propósito universal da
literatura. Logo, não faria sentido desconsiderar uma produção artística/literária
de um autor que se apresenta totalmente pertinente a este fim. Vale destacar,
retomando a epígrafe, a sensibilidade do autor no que se refere às temáticas
consideradas femininas, cujas conceituais encontram-se em processo de
releituras.

Sobre o Autor

Bruno Sérvulo tem 38 anos e nasceu em Ourém-PA. Formou-se em


Letras em 2005 pela Universidade Federal do Pará - UFPA, tem mestrado em
Artes (PPGARTES-UFPA), com ênfase em Literaturas e cinema e é Doutorando
do mesmo programa, ambos pela mesma instituição de sua graduação.
Mudou-se para o Amapá no ano de 2006, após ser aprovado no
concurso público do Estado para professor de literatura, paralelamente,
ministrou aulas em escolas particulares e em inúmeras instituições, entre
públicas e privadas, de ensino superior no Estado do Amapá. Atualmente, atua
como docente do quadro efetivo no Instituto Federal do Amapá – IFAP. Desde
sua chegada a Macapá, Bruno Sérvulo tem mantido sua escolha de percorrer
sua trajetória de vida na cidade, dedicando sua docência e produção literária
para este lugar que o acolheu e que ele escolheu como seu.
Como escritor, Sérvulo tem uma jornada que, apesar de recente, tem
caminhado a passos ligeiros. Sua primeira obra, Soturnos, foi publicada em 2020
e de lá para cá, já são seis livros publicados, sendo sua última publicação o livro
O Peso Insustentável da Pluma (2022). A prosa ficcional tem sido sua escolha
de gênero até o momento, predominantemente o conto, que se evidencia ao
dedicar seu primeiro livro a Rubem Fonseca (aliás, todos os livros do autor são
dedicados a escritores e escritoras da literatura brasileira e estrangeira),
notadamente, um mestre das narrativas curtas e um dos responsáveis pela
estética do gênero no Brasil, além do mais, o próprio Fonseca flerta com o
grotesco em suas obras, tendo em vista que muitos dos seus contos são em
demasia animalescos, crus, realistas etc.
Bruno Sérvulo apresenta uma clara aptidão para contar histórias, é um
narrador nato, passeando muito tranquilamente pelas narrativas, tendo como
inspiração e objeto de criação o mundo e as pessoas, absorvendo o cotidiano
para dentro de suas linhas em tom ficcional e fantasioso. Em entrevista ao site
da editora Becalete em 2018, quando questionado sobre como sua experiência
de vida lhe influencia na escrita, o escritor explica:

Meu processo criador é todo baseado em experiências sensoriais.


Tudo o que escrevo é resultado de algo que tenha lido, visto, sentido,
presenciado. Meus olhos são argutos, mas minha memória e fugidia,
por isso sempre tenho em mão um caderno de anotações. Meu
material é sempre coisas simples e que passam despercebidas pela
maioria das pessoas, e tento elevá-las a uma potência literária e
interessante2

Ao perceber que muitos traços de suas histórias vêm de coisas reais,


seus contos chegam ao leitor de uma maneira desconfortavelmente confortante.
Apesar do paradoxo, a sensação que envolve o leitor é exatamente esta, uma
vez que suas histórias passam pelo averso, obscuro, estorvo e grotesco,
apresentando as piores facetas do ser humano, a vontade de consumi-las
sobrepõe qualquer repúdio ético ou moral e oferece o deleite que só boas
histórias de bons escritores são capazes de oferecer.
Diante das incontáveis possibilidades de estudo que suas obras
apresentam, oportunizar a investigação de uma das possíveis vertentes a serem
aprofundadas nas obras deste autor, no caso em questão a figuração da/na
maternidade na estética grotesca, garantiria, sobretudo, a valorização de um
escritor e de suas obras que enriquecem e engrandecem a produção da literatura
produzida na região. Escritos amazônidas para o universo!

OBJETIVOS

Objetivo Geral:

Analisar as figurações maternas presentes nos contos de Bruno Sérvulo,


tomando como ponto inicial o estudo da estética do grotesco e da presença da
maternidade na literatura.

Objetivos Específicos:

• Investigar de que maneira a tradição do grotesco está presente na

2Entrevista disponível no site https://www.editorabecalete.com.br/bruno-servulo, acessada em


06/06/2022.
obra literária de Bruno Sérvulo, com foco nos contos em que há sobremaneira a
temática da maternidade;
• Analisar as construções das personagens femininas nos contos
delimitados e o que isso pode representar em termos de subversão da
fragilidade, da imagem da maternidade imaculada e da acepção santificada e
virginal da mulher;
• Fazer aproximações entre o grotesco e a representação da mulher-
mãe nos textos do autor.

REFERENCIAL TEÓRICO

Foi dessa mistura química , psíquica e espiritual


que gerei o meu rebento; e ele me arrebentou
por dentro e depois por fora. (Conto “Confissões
de uma mãe” de Bruno Sérvulo)

O grotesco, quando associado ao feminino, pode aparentemente induzir


a uma leitura díspar. Isso se deve porque de modo geral o feminino, e no caso
que trazemos à discussão ou à superfície, a maternidade, reveste-se de
conceituações naturalizadas, as quais necessitam de revisão, de outras leituras
em plena época de conceituações líquidas. Ou seja, há urgência de que esses
vocábulos adjetivos, eternos perturbadores da ordem da língua, ligados a um
lirismo singelo, sejam relidos sob novos enfoques mais sensíveis, menos
determinantes. Muito se deve, inclusive, a deveras insistência de autores em
transcrever a fragilidade, a imagem da maternidade imaculada e uma acepção
santificada e virginal da mulher.

Embora a crença na concepção imaculada como evidência de


divindade tenha sido comum em civilizações antigas, o processo de
cristianização da literatura pagã, a necessidade de negação da nossa
origem na matéria, glorificação da castidade e demonização do sexo é
incompreensivelmente cruel e doutrinário e, a meu ver, ainda merece
muitas análises, pois esses dogmas escondem muito mais do que
revelam3

3O corpo da mãe na literatura: Uma usência presente. Artigo escrito e publicado por Cristina
M. T. Stevens. Portal eduCapes: O corpo da mãe na literatura : uma ausência presente acessado
em: 08/09/2022.
Por isso, durante muito tempo, o grotesco, enquanto possível
característica da literatura de ficção, fora relegado a uma literatura de baixo
prestígio e incômoda para uma sociedade pautada nos bons costumes,
esquecendo-se de que também somos constituídos de instintos e, alguns deles,
primitivos. Marquês de Sade4, perseguido e preso por conta de seus escritos,
ousou quando em sua obra trouxe o grotesco como um aspecto proveniente da
natureza humana. Bruno Sérvulo, em seu conto O Ventre, dedica a narrativa a
Sade, indiretamente avisando ao leitor que a narrativa pode ser perturbadora,
incensurável e ofensiva à delicadeza dos leitores acostumados a uma literatura
que orbita pelas aventuras e desventuras de um herói ou heroína intrépidos. O
mesmo “aviso” pode ser lido na introdução do livro, Assassinatos, mistérios e
coisas sórdidas (2020), em que o conto faz parte, quando em sua apresentação
afirma:
Safira e O Ventre eu nunca quis escrever, pois eles tocam em temas
que assustam. Sei que alguns hão de me ver com aquele olhar torto,
repreensivo e até balançar a cabeça pensando: pra que isso? O que
dizer a elas? Sinto muito, a vida é assim (SÉRVULO, 2020, p. 10)

Flannery O’Connor5 afirmou certa vez que o grotesco tende a ofender e


irritar o leitor porque faz com que ele veja o reflexo distorcido de si mesmo, logo,
desencadeia uma reação natural de indignação. A união da figuração da
maternidade com o estranho é a oposição chave para a construção do grotesco,
que decididamente busca unir o incompatível e contraditório, como feio e o belo,
o sério e o cômico,por exemplo. O grotesco, enquanto vocábulo e conceituação,
passou por inúmeros processos de compreensão e entendimentos que vão
desde o horror, o sobrenatural, até o estranho e o ridículo. Para Wolfgang Kayser
(2013) a característica mais importante do grotesco seria a “mistura do
animalesco e do humano, o monstruoso” (KAYSER, 2013, p. 24), fazendo com
que o leitor questione o mundo tal qual o concebemos ou gostaríamos que ele
fosse; um mundo estranho, onde a ordem “natural” está em suspensão. Por isso,

4
foi um nobre, político revolucionário, filósofo e escritor francês famoso por sua sexualidade
libertina. Suas obras incluem romances, contos, peças de teatro, diálogos e tratados políticos.

5
foi uma escritora norte-americana. Sendo uma importante voz na literatura americana,
escreveu dois livros e trinta e dois contos. Oriunda do sul dos Estados Unidos, enquadra-se
dentro do estilo literário gótico sulista, com situações grotescas, marcadas por violência e
personagens em decadência.
durante muito tempo, o grotesco estivera ligado à literatura fantástica, ligada ao
sobrenatural e ao inumado: Frankenstein ou o prometeu moderno de Mary
Shelley (1818) ou Macunaíma de Mário de Andrade (1928), são obras que
perfeitamente se valem do grotesco, cada uma à sua época e seu contexto de
criação e circulação. Na obra de Bruno Sérvulo, o grotesco também se
presentifica na relação incestuosa que culmina em um homicídio; nas muitas
tentativas de aborto de uma jovem; no parto “sujo” de uma menina perturbada
por demônios interiores; ou mesmo na crueldade de uma mãe que não aceita a
mudança de gênero do filho.

Evidentemente, o que hoje podemos afirmar como “o grotesco” depende


da recepção (KAYSER, 2013) e é possível que alguém receba como grotesco
algo que não foi pensado como tal na organização da obra. Repousa, portanto,
a dificuldade em analisar e teorizar sobre esta questão, quando há uma gama
de interpretações e recepções possíveis, pois, “mesmo determinando a estrutura
grotesca, ficamos na dependência da nossa recepção e não podemos dispensá-
la absolutamente” (KAYSER, 2013, p. 157). Foi partindo de uma recepção
indispensável, como afirma Kayser, que as leituras das obras se projetaram:
alguns contos do autor, podem ser lidos sob uma ótica do estranhamento, do
monstruoso, do incomum, do desprezível, do inumano...adjetivos que também
estão passíveis de refutações, mas não podem ser desprezados por completo.
O grotesco se apresenta de muitas maneiras na obra de Bruno Sérvulo,
e sua (in)definição é um dos motes de discussões principais desta pesquisa.
Ainda que a presença ou não do grotesco dependa do olhar, a maternidade
aparece como matéria cara para o autor. São muitos os contos que a figura
feminina se presentifica ou se destaca, mesmo que alguns protagonistas
masculinos tomem a narrativa para si, o papel de mãe e/ou a maternidade é
demasiadamente explorado.
A figura da mulher tem sido problematizada em diversos textos, ficionais
ou não, desde a antiguidade. A título de exemplo, podemos detacar Medéia, de
Eurípedes, que data o século V a.C. ou mesmo nos escritos bíblicos que
guardam espaços importantes para figuras femininas. Entretanto, na
atualidade, ou pelo menos nas últimas décadas, a mulher e, por extensão a
mãe, tem assumido uma postura muito mais realista sobre a maternidade na
ficção ou não: complexidade do corpo grávido, os percalços da maternidade, o
papel de mãe em relação à sociedade. Para Bruno Sérvulo, não basta ser mãe
é preciso sangrar, doer, lamentar, gritar...
O filho ainda estava coberto de placenta, sangue e ligado ao cordão
umbilical. A mulher agarrou o único objeto cortante à mão (um caco
de vidro) e entre lágrimas e soluços cortou a corda e acordou do
transe. Sentia-se desprezível, suja e com vergonha. Ensanguentada
e defecada teve nojo de si mesma. Por breves momentos tentou tocar
a criança para calar o choro. O medo era maior que a vontade e
resolveu apenas observar, rodeando a criança. O corpo da mulher
estava banhado com uma mistura homogênea de suor, lágrimas e
sangue: um veneno tão intenso que só as mulheres podem produzir.
(SERVULO, 2020, p. 25-26)

O fragmento acima retirado do contos Dores, fala do momento exato em


que uma jovem parturiente dá a luz. No entanto, o trauma de se tornar mãe,
provoca uma mudança que não é apenas física, ainda que seu corpo tenha sido
“arrebentado por seu rebento” por dentro, mas uma tortura psicológica que a
deixa tresloucada. A imagem realista dialoga com uma linguagem que ora é
dura, ora potencialmente poética, com ritmo e prosódia (cortou a corda e
acordou do transe), sob o prisma de imagens poéticas que fogem do
convencional (o corpo da mulher estava banhado de uma mistura homegênea
de suor, lágrimas e sangue: um veneno tão intenso que só as mulheres podem
produzir). Ou seja, aqui a maternidade se perfaz sem singeleza e, para alguns,
de maneira grotesca, porém, natural.
Esta, portanto, é a luz discursiva que ousamos lançar como proposta de
pesquisa: um olhar sobre a relação da maternidade nos contos do autor
aportado por um viés do que hoje pode ser estudado como grotesco,
aprofundando teorias sobre a linguagem empregada, sobre os contextos
narrativos e construções narratológicas que vão desde o perfil das personagens
até (por que nao?) o estilo empregado pelo autor.
É claro que ao classificar uma obra como grotesca ou não, estaríamos
recorrendo a arquétipos e conceituações pouco produtivas e limitadoras. Um
caminho fácil, por assim dizer. Quando na verdade, a(s) obra(s) de Bruno
Sérvulo motivam discussões mais profundas, assuntando temas variados. Aqui,
apresenta-se, é importante destacar, um olhar crível, possível, um estudo em
perspectiva que pode suscitar inúmeras descobertas, mesmo nos limitando ao
tema do grotesco e da maternidade. Este é o recorte necessário para a
dissertação de mestrado. Fica o registro de que a obra do autor carece e suscita
outros inúmeros estudos sob outros enfoques e referências.

METODOLOGIA

Segundo Ezequiel Ander-Egg (1978, p. 28) uma pesquisa consiste em um


“procedimento reflexivo sistemático, controlado e crítico, que permite descobrir
novos fatos ou dados, relações ou leis, em qualquer campo do conhecimento”.
Para tais descobertas podemos nos valer de diferentes abordagens, naturezas,
objetivos e procedimentos. Para a construção e desenvolvimento deste projeto
de pesquisa, trabalharemos com a abordagem qualitativa, tendo em vista que o
projeto traz como proposta leituras, reflexão e compreensão mais aprofundadas
da escrita de um determinado autor. Para Maria Cecília Minayo (2001)

a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados,


motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde
a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos
fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de
variáveis. (MINAYO, 2001, p. 21).

De acordo com João José Saraiva da Fonseca (2002), a pesquisa


possibilita uma aproximação e um entendimento da realidade investigada, como
um processo permanentemente inacabado. Ela se processa por aproximações
sucessivas da realidade, fornecendo subsídios para uma intervenção no real.
Logo, torna-se necessário também apresentar os procedimentos/métodos que
serão utilizados para a investigação.
Diante desse cenário em que a ciência explora muitas maneiras de se
investigar, nós optamos por fazer uma pesquisa de caráter exploratório, uma vez
que esta busca visa levantar informações sobre um determinado objeto,
delimitando assim um campo de trabalho e mapeando as condições de
manifestação do objeto em questão.
No que concerne às etapas pelas quais a pesquisa perpassará,
inicialmente faremos o levantamento e a revisão de bibliografia que servirão de
aporte para a pesquisa, tais como livros, artigos, periódicos e dissertações para
um aprofundamento do que diferentes autores têm estudado sobre o tema a ser
pesquisado, além de objetivar analisar de que maneira a crítica literária aborda
o tema em questão.

A pesquisa bibliográfica é aquela que se realiza a partir do registro


disponível, decorrente de pesquisas anteriores, em documentos
impressos, como livros, artigos, teses etc. Utiliza-se de dados ou de
categorias teóricas já trabalhados por outros pesquisadores e
devidamente registrados. Os textos tornam-se fontes dos temas a
serem pesquisados. O pesquisador trabalha a partir das contribuições
dos autores dos estudos analíticos constantes dos textos. (Severino,
2013 p.107)

Como etapa subsequente será feita uma exploração e aprofundamento


nas obras do autor objeto desta investigação, com foco nos contos que tratam a
temática escolhida, a fim de conhecer a linguagem, a escrita, a maneira como
as narrativas são construídas e seu estilo, para, por fim, fazer uma leitura de
acordo com a proposta a que este projeto se submete. Diante dos conceitos
acima expostos, entendemos que tais procedimentos são os que mais se
aproximam do que buscamos alcançar nesta investigação, no entanto, ficamos
abertos a outras possibilidades metodológicas que possam surgir a partir dos
estudos posteriores.

CRONOGRAMA

2022/2023
Atividades AGO SET OUT NOV DEZ JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL

Levantamento X X X X X X X
bibliográfico
Revisão X X X X X X
bibliográfica
Análise e X X X X X
interpretação

2023/2024
Atividades AGO SET OUT NOV DEZ JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL

Análise e X
interpretação
Escrita da X X X X X
Dissertação
Qualificação X
Revisão, X X X X
ajustes e
acréscimos
do texto final
Defesa da X
dissertação

O Cronograma está sujeito a alterações para que entre em conformidade


com o calendário do PPGLET/UNIFAP.

REFERÊNCIAS

ANDER-EGG, E. Introducción a las técnicas de investigación social: para


trabajadores sociales. 7. ed. Buenos Aires: Humanitas, 1978.

BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado. O mito do amor materno. Rio de


Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

__________________. Um é o outro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.

BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

FIGUEIREDO SOUZA, Ana Luiza de. “Me deixem decidir se quero ou não ser
mãe!”: narrativas pessoais de mulheres sobre a maternidade nas mídias
sociais. Dissertação (Mestrado em Comunicação) - Universidade Federal
Fluminense. Niterói, 2019. Disponível em https://app.uff.br/riuff/handle/1/14957.
Acesso em 26/05/2022.

KAYSER, Wolfgang. O Grotesco: Configuração na Pintura e na Literatura.


São Paulo: Perspectiva, 1986.

MACIEL, Kerllyo Barbosa. Memórias de ladrões: narrativas poéticas


amapaenses, literatura, cultura, tradição oral e religiosidade nas cantigas
de marabaixo. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do
Amapá. Macapá, 2021. Disponível em
https://www2.unifap.br/ppglet/dissertacoes/ . Acesso em 06/06/2022.

SERVULO. Bruno. Assassinatos, mistérios e coisas sórdidas. Mogi


Guaçu/SP: Ed. Becalete, 2020.

_______________ (Des)graças e (In)delicadezas: sobras de pequenas


criaturas. São Paulo/SP. Ed. WI, 2020.

Severino, Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho cientifico. São Paulo


Cortez, 2013.

STEVENS, Cristina Maria Teixeira. O corpo da mãe na literatura: uma


ausência presente. In: STEVENS, Cristina Maria Teixeira; SWAIN, Tania
Navarro (Org.). A construção dos corpos: perpectivas feministas. Florianópolis:
Editora Mulheres, 2007. v. 1, p. 85-116.

Você também pode gostar