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INSTITUTO SUPERIOR DE ENSINO SUMARÉ

ANÁLISE

O SENHOR DAS MOSCAS

JONATHAN SOARES DE DEUS RA: 1714656

CAROLINE DE OLIVEIRA SANTOS RA: 1720401

SÃO PAULO

2018
O livro O senhor das Moscas de William Golding, traz em seu cerne diversas
questões e não nos apresenta respostas. Isso não pode ser considerado ruim,
visto se tratar de particularidades do ser humano, sua relação com os pares,
meio social e sem dúvida o desvelar de si.

A princípio o autor lança mão de imagens quanto ao cenário e


especificidades de cada personagem. Essa condução de escrita facilita ao
leitor um melhor aproveitamento do enredo e proximidade com o mesmo. No
entanto, o que preocupa ou chama atenção é a ausência de adultos na
narrativa. Preocupa por que o adulto é visto como alguém que carrega consigo
bagagens de erros e acertos que podem servir de modelo ou norte aos mais
novos. Neste sentido, sua ausência na história estimula uma curiosidade de
como as personagens conseguirão lidar e por quanto tempo o farão sem a
supervisão de alguém que detivesse tais características dadas ao ser adulto.

Esse questionamento é rapidamente pontuado quando uma das crianças


entende que uma ordem seja de natureza de conhecer os nomes dos novos
habitantes da ilha , seja por nomear um líder, seria plausível para que
houvesse uma harmonia entre a convivência de todos.

Tal desejo vem senão por influência de um contato social arraigado onde as
relações se baseiam na submissão para que não haja o caos.

Cabem aqui as perguntas de como seria a escolha desse líder e a razão do


eleito ser nomeado.

A fim de responder tais questionamentos façamos uma leitura de autores de


importante relevância na historiografia.

Maquiavel, Hobbes e Bodin serão as bases para essa análise por se tratar
de uma temática política e ouso dizer antropológica, além de serem ícones na
área.

Para tentar responder aos nossos questionamentos sobre o “como” escolher


o líder, Maquiavel apresenta uma possível resposta em sua obra O Príncipe, a
qual destaca em forma digamos didática, como um líder deve se portar.

Partindo dessa premissa, o autor indica que para ser um representante dos
seus pares, implica a priori uma herança sanguínea e que por sua vez pode ser
atrelada à unção divina se esta lhe convier. O principal é que a figura do rei,
representada pelo autor como Príncipe, porte-se com sabedoria visando o bem
do Estado, nesse momento visto como um espaço territorial em ascensão.

No livro em questão, a escolha do líder se dá de maneira democrática, visto


a participação de todos numa espécie de votação entre dois candidatos
previamente escolhidos. Essa escolha se baseia primeiramente na idade dos
mesmos em comparação aos demais e em seguida por suas aptidões ou
inclinação à liderança.

Um dos candidatos é o primeiro a aparecer na narrativa, e suas ações de


liberdade são pontuadas pelo narrador de modo que possamos compreender a
grandeza do jovem. Este por sua vez, encontra uma concha a qual é o
instrumento fundamental nas convocações de assembléias, mais adiante.

Seu concorrente tem idade aproximada e também lança mão de uma


espécie de liberdade em relação ao comportamento dos demais. Contudo, sua
postura está mais para reacionária que revolucionária, sobretudo, nota-se no
decorrer da leitura que este jovem traz um passado obscuro e sua postura é
mais alinhada à sua individualidade que ao bem comum.

Conforme vimos em aula, Thomas Hobbes anuncia que a centralização do


poder torna-se viável a fim de manter a ordem e a ausência do caos. Com este
pensamento, surge então, ao menos para estes que vos escreve outro
candidato. O chamado: Porquinho. Tal, desde o principio faz menção de uma
ordem a fim de minimizar os efeitos da convivência. Pergunta o nome de todos
ali presentes para que seja feita uma espécie de registro de habitantes e assim
poder verificar possíveis faltas. Segundo ele, manter esse controle contribuirá
para o bem de todos. No entanto, o mesmo, concorda que ele não seria a
melhor escolha para ser o líder do grupo, em razão de complexos particulares
e limitações físicas.

Hobbes apresenta que essa decisão, a de ceder a liberdade ao domínio do


outro ocorre principalmente pelo fato de o ser humano em seu estado natural
ser individualista e pensar unicamente na sua sobrevivência, o qual ,se preciso
for, devoraria o outro se este ameaçasse sua vida. O homem, lobo do homem...
A partir do momento que outra pessoa decide o que deve ser feito, segundo
Hobbes, a vivência entre os pares torna-se mais harmoniosa e menos
competitiva.

Nesse momento surge então, o chamado Contrato Social, que tem a função
de estabelecer limites que beneficiem a todos. Este contrato serve como uma
garantia de que todos desfrutem da paz, mesmo que para isso seja necessária
a perca ou a abdicação de liberdades gerais. Para o autor, seria mais
producente a vida sob o domínio chamado absolutista, mas que tivessem
tranqüilidade do que desfrutar de liberdades e não ser assegurado. A
necessidade deste, ainda segundo o autor, vigora a medida que o homem em
seu estado natural pensa somente na preservação de si e que sendo assim
torna-se imprescindível a presença de um corpo político que venha gerir.

Avançando um pouco na narrativa de Golding, nos deparamos com o


surgimento de um personagem a priori inalcançável, mas que à medida que os
dias passam na ilha, torna-se mais presente. O medo. Este, por sua vez,
acelera ou desencadeia no ser humano ações pré sociais, ou como Hobbes
aborda, naturais ao homem.

O medo de se perder influência no homem o desejo e o acesso ao poder.


No entanto, ao passo que todos querem o mesmo a guerra se instaura.
O personagem pode também ser comparado ao personagem principal da
obra magna de Hobbes, O Leviatã.

(...) Então, o leviatã


sonolento respirava — as águas
subiam, as algas ondulavam e o
mar fervia sobre a superfície da
pedra-mesa com um rugido...

O trecho acima elucida claramente essa semelhança dos personagens e


uma das razões se dá pelo fato de serem da mesma natureza, ou tratar da
mesma natureza: a do homem.

Enfim, Simon desistiu e


olhou; viu os dentes brancos e os
olhos opacos, o sangue — e seu
olhar esgazeado prendeu-se
àquele reconhecimento antigo e
irrecusável.

Neste trecho, nota-se que a familiaridade de Simon ao se deparar com o


“bicho” é vista como corriqueira, isto é, o lado obscuro do ser humano, como se
visse no espelho.
(...) — Você sabe, não é? Sou parte
de você? Quase, quase, quase!
Sou a razão por que ninguém
pode ir embora? Por que as
coisas são o que são?...

Aqui fica evidente que o diálogo , ainda que utópico, relaciona as ações
desenvolvidas na narrativa ao personagem do medo. O Leviatã.

(...) — Senão — disse o Senhor das


Moscas —, vamos acabar com
você. Entendeu? Jack, Roger,
Maurice, Robert, Bill, Porquinho
e Ralph. Acabar com você.
Entendeu?...

Comprovando o que fora apresentado em aula, o Leviatã para Hobbes, é


encarado ou personificado como todos os homens. Assim, todos são iguais e
anseiam ou compartilham de desejos iguais.

Vejamos a seguir o que Budin pode contribuir para a análise narrativa.

Bodin defende que uma sociedade ideal é uma sociedade perpétua com
um rei ungido pelo divino, onde o rei é para proteger o povo, ou seja, um
sistema de poder centralizado. Defende também que em um poder dividido a
sociedade não funcionaria da forma devida.

Podemos ver que quando a soberania na ilha se divide em dois começam


uma guerra entre os meninos. Sem um poder centralizado e com as pessoas
não se identificando como servos o caos se instaura na sociedade dos
meninos, o que nos leva a lembrar também que quando os meninos se pintam
como selvagens eles têm a falsa impressão de que tem o livre arbítrio em
exercício, que os leva a acreditar que podem fazer absolutamente tudo.
Hobbes também afirma sem uma estrutura de poder centralizado e
exercendo o seu livre arbítrio entraríamos em uma guerra civil.

Num dado momento do livro O senhor das moscas, aquele segundo


candidato citado acima, revela-se como um guardião de si e se sujeita até
mesmo roubar os óculos de um dos garotos para que consiga o fogo. O que
importa ali é a sobrevivência e a garantia da vida pessoal. Nesse momento,
faz-se válida a menção de Maquiavel, o qual se dirige à figura do príncipe –
líder no caso do livro – como um ser que fará qualquer coisa a fim de promover
a sua estabilidade, ainda que para isso envolva o roubo, ou a morte de alguém.

Durante todo o livro, fica evidente que o ser humano em sua essência
está em guerra consigo mesmo e que esta atinge o outro se este atrapalhar
seus desígnios. O motor dessas ações é o medo, e este se associa à idéia de
buscar a eficácia e cumprimento dos desejos.

Cada personagem possui interesses alheios aos demais e isso mostra


uma realidade natural que atrapalha nas relações sendo necessária a
implantação soberana de um gestor, líder ou rei. O fato complicado é que
desde o começo na narrativa, a seleção desse líder é prejudicada e por
conseqüência, acarreta diversas complicações para todo o grupo, inclusive sua
cisão.

De certa maneira, O senhor das moscas pode ser comparado à obra de


Thomas Hobbes, O Leviatã, no sentido de que o homem naturalmente, não tem
condições de se valer. Isto é, o homem volta-se contra si mesmo e não
compreende que fazendo isso afasta a idéia central que motiva suas ações que
é a sua preservação, antes, aproximando-a de seu fim.

Somente a partir do momento em que se insere a razão nas relações, é


que a experiência social torna-se mais palatável e seguindo orientações de um
corpo político, mais duradoura.

Talvez a importância da narrativa fantasiosa de Golding esteja


justamente aqui. Dentro de cada ser humano. O qual se pergunta o que
seríamos ou o que faríamos ali, naquela ilha.

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