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Baseado na obra homônima, de William Golding (1963), “Senhor das Moscas”,

do diretor, Harry Fook (1990), retrata a estória de um grupo de jovens cadetes


militares estadunidenses que, após a queda de um avião em mar aberto, vêem-
se incomunicáveis em uma ilha deserta. O ambiente paradisíaco é palco de
uma complexa rede de relações sociais em via de transformação.
Em decorrência dos contatos empreendidos com o espaço, os jovens
percebem que as possibilidades de resgate não são das maiores. Diante deste
quadro, há a competição, acompanhada da disputa pelo poder; em
conseqüência, o grupo divide-se em dois. Para fim explicativo, chamaremos de
velha ordem aquela que, acredita e projeta suas ações visando o resgate ou
saída da ilha, enquanto que, a outra facção, denominaremos nova ordem,
aquela que não supõe mais o resgate e planeja suas ações com vista, se assim
podermos dizer, no estabelecimento local.
Duas personagens da trama podem representar os conjuntos por nós
mencionados acima. Ralf, lider até então, o coronel, maior patente entre os
meninos que ali estão, é expressão da velha ordem. Já Jack, o garoto de mais
idade, é a manifestação da nova ordem.
Algo que também contribui para delimitação entre os grupos é a maneira pela
qual o processo de socialização anteriormente vivenciado recai sobre cada
uma das personagens. Ralf enxerga no aprendizado adquirido com base na
organização social vivida antes (Instituição Militar), instrumentos para
compreensão da situação em que se encontra.
A personagem Ralf, ao longo da narrativa, ressalta a importância do trabalho
em equipe para a sobrevivência de todos. Ao que parece, a educação
transmitida pelo convívio na instituição militar lhe deu mais este tipo de
conhecimento.
Porém, como posto por Berger e Luckmann (2004, 177), o processo de
identificação de um indivíduo com o mundo e com o outro não se dá de forma
unilateral e mecânica e, sim dialética:

“(...) Quaisquer que sejam, a interiorização só se realiza quando há


identificação. A criança absorve os papeis e as atitudes dos outros
significativos, isto é, interioriza-os, tornando-os seus”. (BERGER, 2004, 176)
Jack não enxerga o mundo tal qual Ralf. Na maioria das vezes, busca
respostas imediatas para tentar suprir as necessidades que se apresentam.
Depois da cena em que procuram pela personagem, Capitão Benson, doente e
único adulto entre eles, nasce simbolicamente “os caçadores”. Na tentativa de
paralisar um porco, a personagem Roger, lança-se contra o animal, todavia não
consegue seu objetivo. Jack utiliza-se do sangue proveniente do ferimento de
Roger para pintar o rosto do menino e, ao mesmo tempo a si, para firmar o
vínculo entre eles.
A cisão dos jovens cadetes é marcada quando, em ocasião do aparecimento
de um helicóptero, parte do grupo desobedece à ordem de manter acessa a
uma fogueira que, corresponde a um sinal em relação aos externos.
A nova ordem surge sob o comando de Jack e, nela as relações de poder
funcionam diferentes; a partir dali está acima na pirâmide hierárquica o mais
forte fisicamente.
Em grande medida, o novo bando tem sua integridade mantida através de um
elemento em comum; o medo. Medo que reforça os laços entre estes
indivíduos e os encaminha à:

“(...) sociedade, cuja vida se realiza num fluxo incessante, significa sempre que
os indivíduos estão ligados uns aos outros pela influência mútua que exercem
entre si e pela determinação recíproca que exercem uns sobre os outros.”
(SIMMEL, 2006, 17)

Tal sentimento é difundido no instante em que, numa caçada se deparam com


algo misterioso; um dos garotos jura ter esbarrado com um monstro.
Uma personagem a se destacar no filme é Simon. Intrigado com o
desaparecimento de Capitão Benson e os rumores sobre o monstro, Simon
procura a turma dos caçadores para saber a localidade exara da tal criatura.
Lá, o menino descobre que não havera monstro algum na caverna indicada e,
corre afoito para contar a notícia a todos. No entanto, em meio a um ritual de
confraternização entre os caçadores, Simon é morto a golpes de lança pelos
garotos. Embora o acontecimento tenha impactado a todos, a maior parte deles
nega os fatos, preferem fugir da realidade em que são colocados como
assassino.
Outra figura que se sobressai na película é Piggy. O jovem, ao longo do filme, é
a pessoa que há mais tempo se mantem fiel às suas ideias. Piggy é aquele que
podemos nomear de “reencarnação da razão”; por via de suas palavras, busca
a todo custo fixar a racionalidade humana naquele ambiente.
“O Senhor das Moscas”nos mostra de modo notável, em linguagem fictícia, as
turbulência, os embates e os conflitos de uma sociedade. Mas que isso, exibe
possibilidade e limites da educação na transformação da sociedade:

“Esta aprensão não resulta de criações autônomas de significados por


indivíduos isolados, mas começa com o fato do indivíduo “assumir” o mundo no
qual os outros já vivem. Sem dúvida, este “assumir” em si mesmo constitui em
certo sentido um processo original para cada organismo humano e o mundo,
uma vez “assumido”, pode ser modificado de maneira criadora ou (menos
provavelmente) até recriado” (BERGER; LUCKMANN, 2004, 174)
Referência:

BERGER, P. L; LUCKMANN, T. A sociedade como realidade subjetiva. A


construção social realidade. São Paulo: Vozes, 2004.

SIMMEL, G. Questões fundamentais da sociologia: indivíduo e sociedade.


Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2006. (Capítulo 1 e 2)

FOOK, Harry. Direção. O Senhor das Moscas. (Lord of the flies). 1990, 90
min.

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