Você está na página 1de 14

História da assessoria

de comunicação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Contextualizar o surgimento das assessorias no mundo.


„„ Reconhecer a origem das assessorias de comunicação no Brasil.
„„ Identificar o perfil dos profissionais de assessoria do passado.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar os fundamentos históricos que nortearam
a construção e a formatação das assessorias de comunicação, dos profissio-
nais de comunicação organizacional e das Relações Públicas. Inicialmente,
será destacado o espectro histórico dos Estados Unidos, protagonistas
não apenas na construção e na idealização de departamentos de relações
com a imprensa, mas também na interpretação dos fenômenos comuni-
cacionais que marcaram uma transformação social. Posteriormente, será
a vez de situar o Brasil neste contexto, com o recorte da participação
ativa do governo e da construção particular da imprensa no Brasil, que
acabou tendo seu próprio modelo de assessoria de comunicação a partir
das assessorias de imprensa. Por fim, será situado o perfil dos profissionais
que atuaram em assessoria, mostrando como eles contaram com carac-
terísticas que permitem identificar e debater contextos históricos, sociais
e econômicos e também como determinaram algumas lógicas que se
asseguram até hoje no mercado de assessoria de comunicação.

1 Origem das assessorias de comunicação no


mundo
Até o século XIX, a imprensa se restringia basicamente a difundir ideias e
informações de governos, relatórios e algumas notícias. É somente depois
14 História da assessoria de comunicação

disso que a imprensa ganha notoriedade e força o trabalho dos jornais como
potenciais influenciadores da população.
O Times, de Londres, conhecido até hoje, iniciou sua circulação ainda
em 1785, com o nome The Daily Universal Register. Durante os anos 1800,
empresários gradualmente entenderam o potencial dos periódicos para dar
visibilidade a questões de forma massiva. É nesta época que surgiram as
publicações assemelhadas a jornais, que tiveram notoriedade até recentemente
(e gradualmente migram para plataformas digitais). Em 1821, no Reino Unido,
surgiu o The Guardian, até hoje um dos veículos de imprensa mais importantes
do mundo. É nesta época também que surgiram empresas dedicadas a coletar
informações vendendo aos jornais, as chamadas agências de notícias. A atual
France-Presse, AFP, foi criada em 22 de outubro de 1835.
O jornalismo passou a ocupar um espaço de socialização de temas, discursos
e debates, nos negócios, na política, na sociedade e na cultura. É, sobretudo,
a partir da segunda metade do século XIX, que o jornalismo toma ares de
indústria, obrigando empresas, governos e organizações a pensarem de forma
mais estratégica nas suas relações com jornais e, no século XX, emissoras de
rádio e depois de TV.
Amaral (2018) destaca que o surgimento das assessorias de imprensa nos
Estados Unidos está associado ao espaço conquistado pelos agentes de im-
prensa, ao aumento de campanhas políticas e ao uso de redatores de publicidade
pelo empresariado. Para o autor, foi esse clima que permitiu o aparecimento
de um serviço para um novo relacionamento social. Amaral (2018) lembra da
campanha do Circo Barnum, depois da Guerra Civil Americana (1861–1865),
como um possível marco inicial.

Phineas Taylor Barnum, homem arguto e empreendedor, dos mais famosos agen-
tes de imprensa do país, conseguiu com talento e muito trabalho transformar
o Circo Barnum em uma instituição nacional (que perdurou até recentemente,
sob o nome de Ringling Bros. and Barnum Bailey Circus). Ele e meia dúzia
de colaboradores promoveram centenas de artistas — palhaços, domadores,
trapezistas, ilusionistas, anões, equilibristas. Os animais eram sempre os mais
ferozes, os mais bonitos e ensinados. A campanha era tão intensa que não dava
tempo para ninguém pensar nos brutais métodos de treinamento dos animais
e nas rigorosas condições de trabalho de toda a equipe. O sucesso desse grupo
de agentes levou ao aparecimento de milhares de publicistas em muitas áreas,
inclusive nas dos negócios e da política (AMARAL, 2018, p. 21).

Pensando no estudo da chamada comunicação empresarial ou organizacio-


nal, acabamos nos remetendo ao jornalista americano Ivy Lee, que em 1906
História da assessoria de comunicação 15

foi precursor da atividade especializada que chamamos hoje de assessoria de


imprensa ou de comunicação (embora haja diferentes na atividade das duas, a
raiz é a mesma) (CHAPARRO, 2018). Lee atuou em veículos de comunicação,
como New York American, mas abandonou o jornalismo para construir o
primeiro escritório de Relações Públicas do mundo na cidade de Nova York.
Segundo Chaumely e Huisman (1964), Ivy Lee acabou se convertendo às
Relações Públicas para prestar serviços a Rockefeller, à época um empresário
acusado de práticas de monopólio e de luta contra pequenas empresas. Wey
(1986) explica que Ivy Lee foi contratado com o objetivo de ajudar o empresário
a transformar sua imagem e reputação perante a opinião pública e divulgar
informações favoráveis às empresas, por meio da imprensa informativa.
Chaparro (2018) lembra que Ivy Lee foi importante para o surgimento
das Relações Públicas e da assessoria de imprensa a partir da declaração de
princípios em uma carta a editores. No texto, ele reafirmava a intenção de gerar
informações da empresa para jornais e, consequentemente, para o público.

Com essa declaração, o sucesso de Ivy Lee foi imediato e fez escola. Como se
vê, Lee estabeleceu um pequeno conjunto de regras ético-morais, em favor do
pressuposto da confiabilidade. Comprometeu-se a fornecer notícias — apenas
notícias — e a colocar-se à disposição dos jornalistas, sempre que solicitado,
para respostas honestas, verdadeiras (CHAPARRO, 2018, p. 5).

Dessa forma, para cumprir a carta de princípios de Ivy Lee, ele começou
a criar fatos noticiáveis, formando valores sobre o qual acabou construindo a
imagem de seu cliente. Para Pinho (1990), Lee elaborava notícias e informações
em caráter jornalístico, não como matéria meramente paga. Segundo o autor,
trata-se da origem da mídia espontânea da assessoria de comunicação. Um
exemplo foi o fato ocorrido durante uma greve que estava sendo investigada
pelo congresso americano. O dono da empresa Colorado Fuel and Iron Co havia
mandado atirar sobre os grevistas. John Rockeffeler compareceu livremente
e ajudou na investigação, o que ajudou a melhorar sua imagem diante do fato
(CHAPARRO , 2018; CHAUMELY; HUISMAN, 1964).
Apesar do protagonismo, recaem críticas a Lee, que acaba sendo alvo de
debates até os dias atuais. Chaparro (2018, p. 6) adverte que Ivy Lee também
“[…] fez jogo sujo, com práticas de emprego duplo, propina, favores escusos,
almoços sedutores, viagens prazerosas e outras formas de convívio vantajoso
com o poder econômico”. Esse debate é importante porque acabou gerando
discussões éticas, relevantes na construção da área posteriormente.
16 História da assessoria de comunicação

Amaral (2018) lembra que a Primeira Guerra Mundial foi um terreno


fértil para as técnicas de promoção, propaganda e assessoria.

Os presidentes Theodore Roosevelt e Woodrow Wilson partem em busca


de soluções para seus problemas de imagem. Recorrem a entrevistas
coletivas e releases. Wilson cria o Committee on Public Information
(CPI) para ‘coordenar programas, disseminar informações e estimular
o apoio público aos objetivos da guerra’. Ivy Lee junta-se à CPI com
Carl Byoir, mais tarde proprietário de uma das maiores assessorias
do país, e com Edwards L. Bernays, tido como o mais articulado de-
fensor do conceito de Relações Públicas (Bernays, 1965, p. 290-291).
O trabalho desenvolvido durante o conflito mundial é um tremendo
sucesso e envolve numerosos jornalistas. James Keeley, do Chicago
Tribune e do Chicago Herald, representa os Estados Unidos na Inter-
-Allied Board para propaganda, e Walter Lippmann, que mais tarde
publicou o clássico Public opinion (1922), serve por algum tempo como
capitão da inteligência militar e dirige a parte editorial da propaganda
americana em Paris. A Primeira Guerra Mundial foi chamada pelo New
York Times de a ‘primeira guerra dos agentes de imprensa’. Após o
conflito, os jornalistas, geralmente orgulhosos de seu ceticismo, co-
meçaram a ver tudo como ilusão, produto de conscientes ilusionistas
(AMARAL, 2018, p. 25).

Moutinho e Sousa (2018) lembram que, além disso, os gabinetes de imprensa


alemães ligados à política se popularizaram justamente depois da Primeira
Guerra. Até 1945, no País, as relações restringiam-se à propaganda política
do regime nazista.
Em 1910, no Reino Unido, a Marconi criou, pela primeira vez, um depar-
tamento de comunicação com a imprensa. A partir de 1929, com a quebra
da Bolsa de Nova York e a crise econômica, há uma crítica ao sistema como
um todo, inclusive ao trabalho de Relações Públicas. Patrões passaram a
sofrer diante da transformação da realidade, acionistas ficaram desconfiados
e empregos foram cortados. Assim, cresceu em importância a informação,
com o uso de ferramentas de comunicação por Franklin Roosevelt, presidente
dos Estados Unidos eleito em 1932.
Depois da crise, passou a existir uma demanda da sociedade por informação,
obrigando organizações a se profissionalizarem como fontes de informações
não apenas para os veículos, mas também para o público. Deu-se origem, desse
modo, a uma ideia mais completa de assessoria de comunicação, não restrita
à imprensa. É na década de 1930 que universidades norte-americanas criaram
disciplinas e começaram a formar especialistas na área, ainda vinculada ao
campo da Administração (CHAPARRO, 2018).
História da assessoria de comunicação 17

Segundo Chaumely e Huisman (1964), a atividade de Relações Públicas


se espraiou dos Estados Unidos para o Canadá a partir dos anos 1940. Pos-
teriormente, avançou pela Europa com as empresas Esso Standard e Shell.

Em 1950, já existiam agências e departamentos de Relações Públicas em pelo


menos mais sete países do velho continente: Holanda, Inglaterra, Noruega,
Itália, Bélgica, Suécia e Finlândia. Na Alemanha, dizimada pela guerra e
convalescente do trauma nazista (regime sob o qual a propaganda teve uso
científico), a primeira agência de especialistas em Relações Públicas só surgiria
em 1958 (CHAPARRO, 2018, p. 9).

Confira no link a seguir um artigo que traz uma reflexão sobre a construção histórica
das Relações Públicas.

https://qrgo.page.link/yykrb

2 Assessoria de comunicação no Brasil


Ao nos referirmos à história da assessoria de comunicação, é comum darmos
ênfase à imprensa. Por quê? Porque a construção institucional veio primeiro
no atendimento estrito à imprensa e só depois contemplou o relacionamento
com outros públicos e estratégias de comunicação.

É comum, além disso, encontrarmos as duas ideias como sinônimas — assessoria de


comunicação e de imprensa. Vamos tratar, neste capítulo, de assessoria de imprensa,
já que a ideia mais complexa, integrada e plena de assessoria de comunicação surgiu
posteriormente, com o desenvolvimento do capitalismo, a segmentação das profissões
e a crescente especialização.

Segundo Duarte (2018), a ideia de jornalistas como intermediadores entre


fontes e jornalistas de redação surgiu de forma gradual ao longo do século
18 História da assessoria de comunicação

XX, mas tem institucionalização mais concreta na década de 1980. Inicial-


mente, surgem as assessorias de imprensa e, no desenvolvimento paralelo
com as Relações Públicas de forma geral, surgem as assessorias integradas
de comunicação, com mais atribuições e demandas.
Para o autor, no Brasil, foi a redemocratização que deu forças para a trans-
formação e o ganho de impacto por parte das assessorias de imprensa.

Nesse período, o uso da informação e o estabelecimento de relacionamentos


adequados com diferentes públicos passou a ser fundamental. Se antes bastava
articulação com as diferentes instâncias de um regime de governo fechado,
tornou-se essencial dialogar com o conjunto da sociedade e com os novos atores
sociais empoderados (ONGs, entidades representativas, lideranças políticas,
sindicatos e consumidores, por exemplo) e a opinião pública em geral. E o
caminho mais fácil foi garantir presença na imprensa. Ao longo dos anos
seguintes, em menor ou maior grau, as assessorias de imprensa ampliaram
seu papel a partir da busca de visibilidade, da necessidade de transparência
e das demandas naturais dos diferentes públicos. E tornaram-se o embrião
de uma comunicação organizacional complexa e diversificada que continua
a evoluir com a impulsão da comunicação digital (DUARTE, 2018, p. 49).

Para Chaparro (2018), no entanto, o processo de desenvolvimento da área


é anterior, mais precisamente a partir de 1964, quando já emergiam multina-
cionais e empresas de grande porte pós-governo Juscelino Kubitschek.

Com as RPs, generalizou-se, na iniciativa privada e no serviço público, a prática


da assessoria de imprensa. E as duas atividades atraíram muitos jornalistas. Em
1968, já desvinculada academicamente da área de Administração e inserida,
como carreira e área de estudo, nos cursos de Comunicação, a área de Relações
Públicas conquistou uma regulamentação de enorme abrangência no campo
profissional, iniciando, mesmo, faces de colisão com outras profissões, em
especial com o jornalismo. Foi um processo estimulado pela estratégia de
propaganda e divulgação do governo militar. Lembremos que, àquela época,
a Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República
(Aerp) ganhou espaço e força de superministério (CHAPARRO, 2018, p. 11).

Isso, conforme destacado, remete mais ao ganho de musculatura da área.


Há indicativos da atividade anteriormente no Brasil. Duarte (2018) lembra
do período em que os jornais tinham engajamento político, e o presidente
Campos Sales contou com os serviços do jornalista Tobias Monteiro, do Jor-
nal do Commercio (RJ) para divulgar uma viagem à Europa que havia feito.
Posteriormente, houve a implementação do atendimento para a imprensa e
divulgação jornalística na área pública. Isso ocorreu só em 1909, quando o
História da assessoria de comunicação 19

presidente Nilo Peçanha organizou a Seção de Publicações e Biblioteca para


Integrar Serviços de Atendimento, Publicações, Informação e Propaganda do
Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio.

O setor tinha como finalidade distribuir informações por meio de notas ou


notícias fornecidas à imprensa e aos particulares que as solicitassem e editar
o Boletim do Ministério. Nos anos seguintes, sem mudança significativa nas
responsabilidades, o setor passa a chamar-se ‘Serviço de Publicações e Bi-
blioteca’, em seguida ‘Serviço de Informações’ e, então, ‘Biblioteca e Serviço
de Informações e Divulgação’. No regulamento, a responsabilidade de que o
boletim constituísse fonte ‘a mais completa possível, de consulta e divulgação
dos conhecimentos úteis aos lavradores, industriais e comerciantes’. Todas
as repartições do Ministério ficavam obrigadas a ‘atender, sem demora, aos
pedidos de dados e esclarecimentos que lhes forem solicitados pelo diretor’.
Em 1915, retorna o nome ‘Serviço de Informações’ e são especificados novos
detalhes: ‘divulgar, pela imprensa, em notas concisas, mas completas, infor-
mações [...] que possam influir para o desenvolvimento da produção nacional’.
Entre as recomendações, o alerta que a divulgação somente poderia ocorrer
depois que o texto fosse submetido ao Ministro (DUARTE, 2018, p. 52).

Na primeira metade do século XX, a divulgação no setor público passou a


ser organizada com redatores e setores de imprensa. Não se pode ignorar, no
entanto, que em 1910, Amilcar Armando Botelho de Magalhães coordenou um
escritório para promover a comissão Rondon, divulgando o uso de Marechal
Cândido Rondon para promover o telégrafo no interior do Brasil. No setor
privado, em 1914, a empresa The Light and Power Co. Ltda, de iluminação,
desenvolveu o seu departamento de Relações Públicas. O objetivo era se
relacionar com órgãos de imprensa e poderes. Na época, a direção da empresa
demandava um setor mais especializado para cuidar da relação da empresa
com os concedentes e com a imprensa. O engenheiro Eduardo Pinheiro Lobo
ficou como responsável pela área durante mais de 15 anos.
Em 1931, foi estruturado o Departamento Oficial de Propaganda na Im-
prensa Nacional, que contou com vários nomes, mas teve seu ápice entre 1939
e 1945, com o Departamento de Imprensa e Propaganda. A partir dessa época,
houve uma grande estrutura para manipular a opinião pública, com censura,
controle ou distribuição de notícias.
No entanto, mesmo após a ditadura Vargas, a máquina do governo seguiu
sendo usada para silenciar ou cooptar jornalistas, sobretudo pela remuneração
baixa dos profissionais.
20 História da assessoria de comunicação

O amadorismo pré-regulamentação da profissão e o interesse do governo e dos


patrões em manter a situação estimularam o duplo-emprego e criaram vantagens
e distorções: repórteres ignoravam imposto de renda e tinham desconto ou não
pagavam passagens aéreas, entre outros benefícios. Era normal a troca de favores.
Havia ‘jeton’, complemento salarial pago pela instituição que o jornalista cobria,
geralmente na área pública ou de entidades de classe, assim como o ‘jabaculê’,
‘presente’ (geralmente dinheiro) oferecido por fontes (DUARTE, 2018, p. 52).

Após a regulamentação do jornalismo como profissão, criou-se uma ideia de


que o sistema estava institucionalizado, ou seja, que os jornalistas de órgãos e
entidades eram incompetentes, bloqueadores, criadores de cortinas de fumaça
e de um jornalismo conivente.

Essas críticas pouco edificantes acabaram generalizadas e marcaram profun-


damente a história das Relações Públicas e o surgimento das assessorias de
imprensa, mas não consideram a existência de profissionais em gabinetes de
divulgação cumprindo com eficiência outro tipo de papel, menos promocional
e persuasivo e mais informativo (DUARTE, 2018, p. 53).

Com a criação da Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência


da República em 1970, a área passou a ter projeção e visibilidade no setor
governamental. Chaparro (2018) acrescenta que é possível associar o desen-
volvimento das Relações Públicas ao estímulo da estratégia de propaganda e
divulgação do governo militar. Está associado também à lacuna de um atrativo
de trabalho para jornalistas, estimulando inclusive o jogo de duplo-emprego.

O uso intensivo da propaganda política pelo regime militar atuou como vitamina
de crescimento nas Relações Públicas. E, nos departamentos de Relações Públi-
cas, expandia-se a atividade de assessoria de imprensa, em um processo que se
nutria da euforia de prosperidade do ‘milagre econômico’, regado pelos dólares
da dívida externa. Aconteceu, então, o ‘dilúvio’ do press release. E, com o press
release, todo um conjunto de artifícios de persuasão (CHAPARRO, 2018, p. 15).

Segundo Wels (2004, p. 6), nesses episódios que marcaram a trajetória


inicial da história das assessorias de comunicação no âmbito governamental,
observa-se, em geral, que as atividades de Relações Públicas se agregam ao
jornalismo e à publicidade, compondo ações integradas de assessoramento
oficial na área da comunicação social.
O ingresso dos jornalistas na comunicação das organizações também se
deu pelas publicações chamadas de house organs. O Boletim Light começou a
circular em 1925, pela Light (atual AES Eletropaulo). Um ano depois, surgiu
História da assessoria de comunicação 21

a revista General Motors, um marco pela sua qualidade gráfica e editorial.


Nas décadas de 1940 e 1950, surgiram vários jornais e revistas de empresas,
mas a explosão de títulos aconteceu na década seguinte e, em 1967, foi criada
a Associação Brasileira dos Editores de Revistas e Jornais de Empresas.
Em paralelo, desenvolveram-se boas práticas com gestão de informação e
facilitação de acesso aos jornalistas e meros produtores de releases. Senado
e câmara foram trazidos como bons exemplos dessa época, bons boletins de
notícias qualificados. Além disso, em 1971, foi criada a Unipress, por Reginaldo
Finotti e Alaor José Gomes, que antes atendiam à empresa Volkswagen do
Brasil (desde 1961, ambos vieram de redações jornalísticas). A empresa tinha o
objetivo de fazer uma sucursal das redações, em especial dos jornais do Interior.
Depois desse período, cunhou-se a ideia de assessorias de imprensa. En-
tretanto, Bittar (2012, p. 9) lembra que:

[…] as assessorias de imprensa perceberam que a comunicação é algo mais


amplo. Agregaram funções, passaram a estabelecer ligações entre a entidade
e o público também. Criaram superestruturas chamadas de assessorias de
comunicação para exercício de um modelo conhecido como comunicação
integrada, prevendo a atuação conjunta de jornalistas, Relações Públicas,
publicitários. Os profissionais se encontram sobre um mesmo comando,
apoiando ações estratégicas.

Leia no link a seguir informações sobre o Departamento Nacional de Propaganda, que


marcou de forma determinante a construção histórica da comunicação, da assessoria
de imprensa e das Relações Públicas no Brasil.

https://qrgo.page.link/dDKv3

3 Assessoria: os profissionais no passado


O perfil dos profissionais que atuam com assessoria de imprensa e comunicação
se transformou a partir de evolução tecnológica e da mudança de contexto
social, econômico e cultural de cada país, mercado e lógica de trabalho. O
trabalho de assessoria de comunicação, associado ao relacionamento com a
imprensa e outros públicos, foi gradualmente constituído. Inicialmente, não
22 História da assessoria de comunicação

havia um regramento a ser respeitado, nem um código de ética a ser seguido,


nem mesmo uma expectativa mercadológica a ser vencida.
Em 1906, a Pennsylvania Railroad, fábrica do americano John D. Ro-
ckfeller, causou um grave acidente na cidade de Gap, na Pennsylvania. O
jornalista Ivy Lee foi contratado para melhorar a imagem do industrial e da
empresa, desgastadas pelo episódio. Lee começou um trabalho apostando na
transparência, diferentemente da tendência da época. Nessa abertura, Ivy Lee
inovou, levando repórteres ao local do acidente, disponibilizando engenheiros
para darem entrevistas esclarecedoras das causas da tragédia e, até mesmo,
falando sobre eventuais falhas da própria empresa. O profissional, ainda que
em fase embrionária, foi atribuído com a gestão de crises. Essa era a principal
função atribuída, mais do que a demanda por relacionamento, já que havia um
notório desprezo ao público até então. Para Chaparro (2018, p. 6):

Ivy Lee não se limitou a cuidar bem do relacionamento com a imprensa. Ho-
mem de comunicação, sabia que a imagem das pessoas, como a das instituições,
não se muda com conversa fiada e notas em jornais. Por isso, desenvolveu
habilidades e técnicas de criar fatos noticiáveis, de preferência retumbantes.
Com eles alterou os valores de referência associados à imagem pública de John
Rockefeller. E fundou a escola das Relações Públicas. Entretanto, por mais
desfavoráveis que sejam ou possam ser os julgamentos que hoje fazemos do
fundador das Relações Públicas e da assessoria de imprensa, não há como lhe
recusar um mérito de enorme valia para o jornalismo: o de ter criado o conceito
e a prática do informante profissional competente. Ivy Lee organizou-se para
atuar nos processos jornalísticos como fonte de informações e elucidações.

Depois da crise de 1929, havia a necessidade de se entender como funcio-


navam o governo e a economia. Com isso, a busca por informação cresceu.
Empresas se organizaram e contrataram profissionais específicos para gerir
suas fontes de informação e disponibilizá-las para a imprensa, especialmente
para os jornais de grande circulação:

[…] a demanda social de informação foi devidamente aproveitada pelas Re-


lações Públicas, que cresceram e sofisticaram-se desde então. O próprio Ivy
Lee partilhou dessa fase, antes de morrer, por volta de 1935, quando dirigia o
Departamento de Relações Públicas da Chrysler. O crescimento (físico, teórico
e estratégico) da atividade de Relações Públicas alcançou os meios acadêmicos.
Em meados da década de 30, as Universidades Yale, Harvard e Columbia
criaram cadeiras da matéria e começaram a formar especialistas na carreira,
que nas estruturas do ensino ficou vinculada ao campo da Administração.
Consolidava-se, assim, uma escola americana de RP (CHAPARRO , 2018, p. 8).
História da assessoria de comunicação 23

A construção da ideia de relacionamento, de reputação e gerência de imagem


são muito importantes até hoje no trabalho de quem atua com assessoria de
comunicação e de imprensa e para a profissão de Relações Públicas.
Phineas Taylor Barnum transformou o Circo Barnum em uma instituição
nacional e, junto a Ivy Lee, marcou o início de uma era. Entretanto, isso
demorou para ser assimilado de forma natural:

Stanley Walker, editor de Cidade do New York Herald Tribune, traduz o des-
conforto dos editores e repórteres com a atividade dos pioneiros das RPs em um
ensaio bem-humorado. Walker observou que os cinco mil agentes de Relações
Públicas em New York, no início do século, superavam o número de jornalistas,
que as escolas de jornalismo produziam mais agentes de Relações Públicas do
que jornalistas e que metade ou mais das matérias publicadas nos jornais diários
tinha origem nas assessorias de Relações Públicas (AMARAL, 2018, p. 21).

No caso dos Estados Unidos, o início do século XX marcou também a


difusão de veículos de comunicação e de reportagens investigativas e sensa-
cionalistas. Diversas empresas de grande porte foram alvo de apurações ou
especulações:

Os meios empresariais sentem-se ameaçados por tais ousadias e partem para


o combate. Os muckrakers foram uma bênção para as assessorias de Relações
Públicas e imprensa. Em 1906, James D. Ellsworth abre um escritório em Boston.
Três anos mais tarde, é a vez de Pendleton Dudley, outro pioneiro, em New York.
Henry Ford publica o house organ, The Ford Times, em 1908. Desse mesmo
ano, datam os programas de RP da Cruz Vermelha Americana e da Associação
Nacional de Tuberculose. Em 1918, o Conselho Luterano Nacional e os Knights
of Columbus inauguram seus serviços de imprensa (AMARAL, 2018, p. 24).

No Brasil
Como destaca Duarte (2018, p. 52), a seção de publicidade do Ministério da Agri-
cultura, Indústria e Comércio em 1909 informava a imprensa por notas e editava
o boletim da organização. A descrição, segundo o autor, era de que havia “[…] a
responsabilidade de que o boletim constituísse fonte a mais completa possível,
de consulta e divulgação dos conhecimentos úteis aos lavradores, industriais
e comerciantes”. Essa atribuição mudou, posteriormente, para “[…] divulgar,
pela imprensa, em notas concisas, mas completas, informações que possam
influir para o desenvolvimento da produção nacional” (DUARTE, 2018, p. 52).
Com a forte interferência e a falta de regulação profissional, houve algum
grau de obscuridade na relação do jornalismo com empresas, mais especifi-
24 História da assessoria de comunicação

camente com o setor público. Havia duplo-emprego, vantagens e distorções.


Embora as assessorias de imprensa e os departamentos de Relações Públicas
tenham prosperado na década de 1960 no Brasil, reinava, diante de governos
autoritários e relações escusas, uma influência de departamentos públicos de
comunicação em veículos. Duarte (2018, p. 58) exemplifica:

[…] no Setor de Imprensa do Serviço de Informação Agrícola (SIA) do Mi-


nistério da Agricultura existia uma estrutura de divulgação que, apenas em
1960, distribuiu “1.619 notas e notícias, 102 entrevistas e declarações e 479
reportagens, num total de 2.200 matérias”. Um exame dos então chamados
comunicados (hoje releases) indica que os textos tratavam, sobretudo, de
orientações e informações sobre agricultura, pesca, eventos, estatísticas.

No setor privado, desde 1950, cresceu a divulgação para grandes empresas.


Uma ação, famosa até hoje, foi a criação do prêmio Esso de Reportagem. A
Esso pode ter tido a primeira assessoria de imprensa propriamente dita no
País. Posteriormente, em 1961, a Volkswagen criou um departamento de
assessoria de imprensa, outro marco da profissionalização da área. De acordo
com o jornalista Reginaldo Finotti, os primeiros produtos eram chamados
calhaus, pequenas notas para ocupar espaços que ficassem vazios quando
da diagramação das páginas (DUARTE, 2018). Depois, Reginaldo Finotti e
Alaor Gomes fundaram a Unipress, usando justamente essa experiência na
montadora. Após 1960, os profissionais de comunicação passaram a divulgar
fatos para geração de notícias (DUARTE, 2018).
Há ainda outro aspecto particular do perfil brasileiro. Com a criação de
vertentes sindicais e de jornalistas empresários, a partir dos anos 1980, houve
gradualmente um afastamento entre assessoria de imprensa e área de Relações
Públicas. Dessa maneira, fortaleceu-se a ideia de assessoria de imprensa
jornalística, um processo bastante distinto do restante do mundo. Por aqui,
reafirmou-se o uso de habilidades e técnicas de jornalismo.

Acesse no link a seguir o texto do Museu de Comunicação de Portugal, com a história


do primeiro comunicado de imprensa, em 1906, após o acidente com a Pensylvania
Railroad.

https://qrgo.page.link/deKZi
História da assessoria de comunicação 25

AMARAL, L. Assessoria de imprensa nos Estados Unidos. In: DUARTE, J. (org.). Assessoria
de imprensa e relacionamento com a mídia. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2018. p. 21-35.
BITTAR, D. T. O poder da assessoria de comunicação nos momentos de crise. [S. l.]:
BOCC, 2012. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/bittar-danielle-o-poder-da-
-assessoria-de-comunicacao.pdf. Acesso em: 13 fev. 2020.
CHAPARRO, M. C. Cem anos de assessoria de imprensa. In: DUARTE, J. (org.). Assessoria
de imprensa e relacionamento com a mídia. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2018. p. 3-20.
CHAUMELY, J.; HUISMAN, D. As relações públicas. São Paulo: Difel, 1964.
DUARTE, J. (org.). Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia. 5. ed. São Paulo:
Atlas, 2018.
MOUTINHO, A. V.; SOUSA, J. P. Assessoria de imprensa na Europa. In: DUARTE, J. (org.).
Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2018. p. 37-46.
PINHO, J. B. Propaganda institucional: usos e funções da propaganda em relações
públicas. 2. ed. São Paulo: Summus, 1990.
WELS, A. M. C. Assessorias de comunicação social: panorama conceitual. In: CONGRESSO
BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 27., 2004, Porto Alegre. Anais [...]. Porto
Alegre: INTERCOM, 2004. Disponível em: http://www.portcom.intercom.org.br/pdfs/
38042588209704322823739818691564597573.pdf. Acesso em: 31 jan. 2020.
WEY, H. O processo de relações públicas. 3. ed. São Paulo: Summus, 1986.

Leituras recomendadas
ABREU, A. A. A modernização da imprensa (1970-2000). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.
FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS. Manual de assessoria de comunicação:
imprensa - 2007. 4. ed. Brasília, DF: FENAJ, 2007.
26 História da assessoria de comunicação

Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun-
cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a
rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de
local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade
sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.

Você também pode gostar