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Introdução
Se existe um tipo de exposição que é quase impossível evitar é a poluição do
ar. Não passamos mais do que poucos minutos sem respirar durante toda a
vida e, por isso, todas as substâncias que estão presentes no ar terão contato
com nosso aparelho respiratório e causarão danos, não somente locais, mas
também sistêmicos. Há um enorme apanhado de evidências mostrando a
problemática que envolve saúde ambiental no contexto da poluição atmos-
férica. É importante conhecer as questões toxicológicas e epidemiológicas
que identificam e evidenciam as consequências terríveis para a saúde pública
dessa questão ambiental.
Neste capítulo, você vai estudar os principais contaminantes da atmosfera
e como eles contribuem para elevar as taxas de mortalidade. Também vai ver
as diferenças entre os efeitos de exposições agudas e crônicas aos poluentes.
Por fim, você vai ler sobre exposições a poluentes do ar em ambientes internos.
2 Toxicologia ambiental: poluição do ar
elevar a taxa de óbitos por esses eventos (LIU et al., 2019). O mesmo aumento
de 10µg/m3 na média diária, mas dessa vez de NO2, incrementa em até 0,88% a
mortalidade por problemas cardiovasculares (MILLS et al., 2015). A associação
entre aumento nas concentrações de MP e gases poluentes atmosféricos e
o incremento em hospitalizações e mortes por acidente vascular encefálico
(AVE) também já foi revisada e referendada por Shah et al. (2015).
No Brasil, diversos estudos são conduzidos em diferentes estados para
avaliar a epidemiologia das consequências da exposição à poluição atmosfé-
rica ambiental. Rodrigues et al. (2017) verificaram, em Cuiabá e Várzea Grande,
no estado do Mato Grosso, que a exposição ao MP2,5 aumenta a mortalidade,
e que esse efeito é potencializado pelo calor e pela baixa umidade do período
de estação seca. Ferreira et al. (2016) observaram, em São José dos Campos,
estado de São Paulo, que tanto o MP10 quanto o MP2,5 estão associados com
o aumento de admissões hospitalares por problemas respiratórios ou car-
diovasculares. Costa et al. (2017) concluíram que, na cidade de São Paulo,
a exposição ao MP10 e NO2 está associada a mortes por patologias do sistema
circulatório em idosos.
Embora os efeitos agudos tóxicos para o sistema cardiovascular sejam os
que se evidenciam com maior importância, as manifestações respiratórias
podem também levar ao aumento na procura por atendimento em unidades
de saúde. Já foi demonstrado que existe relação entre aumento de internações
hospitalares de crianças com pneumonia com elevações nas concentrações
de MP10, MP2,5, NO2, SO2 e O3 (NHUNG et al., 2017). Outro estudo apontou que
um aumento de 10µg/m3 na média diária de MP10 pode causar redução na
capacidade funcional dos pulmões em pacientes com DPOC (BLOEMSMA;
HOEK; SMIT, 2016).
Recentemente, Gao et al. (2020) demonstraram, em um estudo prospectivo
realizado entre os anos de 2015 e 2017 em Pequim, na China, que há correlação
entre elevações diárias em concentrações de MP2,5, NO2, SO2 na atmosfera e
redução de função nos pulmões e aumento de inflamação sistêmica em indiví-
duos com DPOC (GAO et al., 2020). Aqui no nosso continente, os resultados de
uma revisão com metanálise, avaliando trabalhos realizados em cidades do
Brasil, Chile e México, mostraram associações significativas entre a exposição
de curto prazo ao PM2,5 e o aumento do risco de mortalidade respiratória e
cardiovascular em todas as faixas etárias (FAJERSZTAJN et al., 2017).
No que se refere a exposições crônicas aos poluentes do ar, as pesquisas
apontam para uma maior mortalidade por doenças cardíacas e do sistema
circulatório do que por problemas pulmonares, exceto câncer de pulmão.
Em uma metanálise avaliando grandes estudos de coorte, os quais objetiva-
Toxicologia ambiental: poluição do ar 7
ram traçar uma correlação entre exposições de longo período aos poluen-
tes atmosféricos e mortalidade, os autores concluem que há aumento em
número de mortes, principalmente por doença cardíaca isquêmica, quando
são observadas elevações de 10µg/m3 nas concentrações de MP2,5 ou NO2
(HOEK, 2013). Um artigo de revisão sistemática com metanálise analisou a
influência da exposição à poluição atmosférica, de curto ou longo período,
nos índices de hipertensão arterial na população. Os resultados apontam
para uma correlação entre exposição crônica ao MP2,5 e hipertensão. Além
disso, há ênfase da relação entre exposição de curto período a MP10, MP2,5,
SO2 e NO2 (YANG et al., 2018).
A literatura mais recente vem apresentando evidências sobre os processos
de carcinogênese envolvidos com os poluentes atmosféricos, mais especifi-
camente o MP. Li e colaboradores (2018) apontam para o envolvimento direto
do estresse oxidativo e do processo inflamatório na patogênese do câncer
de pulmão associado à exposição crônica ao MP2,5. Santibáñez-Andrade et al.
(2019) foram além — revisaram os mecanismos de toxicidade do MP e traçaram
um paralelo com as assinaturas para o câncer (os hallmarks of cancer, descritos
por Hanahan e Weinberg em 2000 e 2011). A conclusão é de que a exposição
crônica ao MP contribui ativamente com o processo de tumorigênese no câncer
de pulmão. A associação de exposição crônica ao MP2,5 e câncer de pulmão
já foi verificada, também, em estudo de revisão sistemática com metanálise,
o qual apontou que há correlação entre a variável e o desfecho, corroborando a
inclusão desse poluente na classificação da IARC em 2013 (HAMRA et al., 2014).
De acordo com um estudo desenvolvido em São Paulo, o MP10 pode au-
mentar a incidência de alguns tipos de câncer (pele, pulmão, tireoide, laringe
e bexiga) e, também, pode contribuir para o aumento da mortalidade por
câncer. Segundo os autores, os resultados evidenciam que é preciso adotar
medidas para reduzir os níveis atmosféricos de MP e que é muito importante
realizar seu monitoramento contínuo (YANAGI; ASSUNÇÃO; BARROZO, 2012).
sangramento nasal;
pele seca;
náusea.
Referências
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Leituras recomendadas
LI, R.; ZHOU, R.; ZHANG, J. Function of PM2.5 in the pathogenesis of lung cancer and
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MANAHAN, S. E. Química ambiental. 9. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013.
WHO. Household air pollution and health. Geneva: WHO, 2018. Disponível em: https://
www.who.int/en/news-room/fact-sheets/detail/household-air-pollution-and-health.
Acesso em: 24 out. 2020.