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HISTÓRIA DA PARÓQUIA DE MULUNGU

“Peregrinos às centenas e milhares, palmilhando


muitas léguas, para lá se dirigem:" a história da
construção da igreja do Catolé.

Em agosto[1] 1941 o padre português José Antonio Pequito, jesuíta, professor da


Escola Apostólica de Baturité, assumiu a freguesia de Mulungu. Apesar de não
ter deixado nenhum registro escrito no Livro do Tombo, seu trabalho foi de
grande importância para a paróquia pois entre suas realizações estão a
aquisição de uma casa paroquial e, especialmente, a idealização e início da
construção da Igreja de Nossa Senhora de Fátima no arraial Catolé, distante
11km do centro de Mulungu.

Ao que tudo indica, a ideia original do padre Pequito era criar na serra um
centro religioso de peregrinação inspirado no santuário português de Fátima.
Este santuário teve sua pedra fundamental abençoada e lançada no dia 13 de
junho de 1943. A bênção da primeira pedra foi proferida pelo padre José
Aparício sj, que durante 12 anos havia sido confessor de Lúcia, uma das videntes
de Fátima. Em um panfleto divulgado em maio daquele ano, o padre José
Antonio Pequito detalhou seu projeto:

No alto da serra de Baturité, num arraial chamado Catolé, da paróquia de


Mulungu, quase a igual distância da de Santo Dumont (Coité), numa pequena
plataforma circundada de montanhas, escoando pelos seus pés veios de agua
perene, aí, aprove Deus Nosso Senhor e a generosidade de corações fervorosos
que a habitavam e possuíam, estabelecer um dos pedestais da fé, amor e
gratidão dos filhos cearenses e brasileiros para com a excelsa Mãe de Deus e
nossa querida Mãe do Céu. Aí se levantará uma capela, com proporções de
matriz, à Nossa Senhora do Rosário de Fátima. (sic)[2]

Em agosto de 1945 é publicado um outro panfleto de propaganda e pedido de


ajuda que traz no verso uma foto (fig. 1) da fachada do santuário ainda em
construção bem como as medidas do projeto: “O santuário tem a forma de uma
cruz latina. Mede 42 metros de comprimento total; os braços e pé da cruz tem
24 m. x 10 m. e a torre 30 metros de altura.”[3] Não há registros do andamento
da obra na gestão do padre Pequito. Em 21 de setembro de 1950 o padre
Demétrio Eliseu Lima publicou um panfleto pedindo donativos para a
construção e dando conta do grande número de fiéis que frequentavam àquela
igreja ainda inacabada. “Peregrinos às centenas e milhares, palmilhando muitas
léguas, para lá se dirigem cada mês, a pedir graças e cumprir promessas por
tantos favores obtidos”[4] Por essa época do santuário se achava coberto pela
metade. A construção ganhará novo impulso com o padre José Mário Pontes
que tomou posse em outubro de 1952. No Livro do Tombo, escreveu:

“Empenhei-me de corpo e alma para o grandioso templo dedicado à Nossa


Senhora de Fátima. Reiniciei logo após a festa de novembro, os trabalhos da
construção. Fiz a placa de 70 metros quadrados. Subi as paredes. Fiz os arcos.
Acabei a cobertura. Fiz dois altares e mosaiquei os lados da Cruz. Grande
benfeitor é o Snr. Alfredo Farias.”

A construção arrastava-se há quase dez anos. Em outubro de 1953 o trabalho


prosseguiu, mas não há registro do que foi feito nesta etapa. Em novembro
1954, com a celebração da festa de Nossa Senhora de Fátima, os trabalhos
avançaram e o padre José Mário Pontes assim registrou no Livro do Tombo:
“Terminei o apartamento para os padres. Gastei muito, perto de duzentos mil
cruzeiros só neste ano. Mui me ajuda o Snr. Alfredo Farias que me dá o dízimo
da apanha do café.”[5] Foi neste ano de 1954 que se deu um triste
acontecimento que marcou com sangue a ainda curta trajetória do imponente
santuário. Na última noite da festa, um conflito entre duas famílias rivais deixou
três feridos e dois mortos. Segundo o padre José Mário “o móvel desta intriga
era questão de terra”.[6]

Depois da gestão do padre José Mário não se tem registros de outras


intervenções naquela igreja. Os padres que vieram depois registraram apenas as
festas sempre muito concorridas e as visitas pastorais dos bispos.

Estes poucos registros históricos foram encontrados na Sala de História


Eclesiástica do Ceará e no Livro do Tombo (1904-1997) da paróquia de
Mulungu. Ao que tudo indica construção do Santuário nunca foi devidamente
concluída. Atualmente a estrutura imponente do templo não é de fácil
manutenção e a participação dos fiéis já não é tão intensa como outrora. Apesar
disso, continuam as missas no dia 13 de cada mês e a festa celebrada de 03 a 13
de novembro com intensa participação de fiéis, inclusive, vindo de outros
municípios em caravana.

___________________________________________
[1] A data (dia e mês) não é precisa pois não consta no Livro do Tombo a ata da posse ou
qualquer outro dado oficial sobre o período em que o Padre José Antonio Pequito administrou a
paróquia de Mulungu.

[2] Panfleto - Sala de História Eclesiástica do Ceará. Fortaleza – Ceará.

[3] SANTUÁRIO DE N. SENHORA, Panfleto. Sala de História Eclesiástica do Ceará. Fortaleza –


Ceará.
[4] J.M.J – Panfleto. Sala de História Eclesiástica do Ceará. Fortaleza – Ceará.

[5] Livro do Tombo (1904-1997), p. 43

[6] Idem, p. 44
______________________________________________________

Leia também:
FREGUESIA DE MULUNGU: O começo da nossa história

Padre João Dantas – Camareiro Secreto do Papa Leão XIII e capelão do


povoado de Mulungu

"Debaixo dos cajueiros, sozinha a meditar": A história da catequista


mulunguense cofundadora da Congregação das Irmãs Carmelitas da Divina
Providência

Padre João Dantas – Camareiro


Secreto do Papa Leão XIII e
capelão do povoado de Mulungu

Revirando o baú da história da Igreja Católica em Mulungu


encontramos alguns personagens e acontecimentos dignos de serem
lembrados. É o caso do padre João Dantas Ferreira Lima. As pesquisas
que realizei até agora nos permitem pensar que o supracitado
sacerdote foi o primeiro a assumir oficialmente por oito anos o
pastoreio no então povoado de Mulungu nos idos de 1875.

O padre João Dantas nasceu em janeiro de 1851, em Baturité, na


localidade denominada Riachão da Lagoa Nova, atual cidade de
Capistrano. Foi ordenado em 1873 e cantou a primeira missa na Matriz
de Baturité.

Em Junho de 1875 a convite dos habitantes do Povoado do Mulungu


aceitou essa Capelania, onde permaneceu oito anos como Capelão
provisionado. Em Maio de 1884 foi nomeado Vigário da nova freguesia
de Ipueiras. Em Dezembro de 1886 foi removido para S. João de
Uruburetama, outra nova freguesia que inaugurou e da qual tomou
posse a 16 de Janeiro de 1887.

Em 1889 o Ministério da Guerra o nomeou Capelão-Tenente do Corpo


Eclesiástico do Exercito. Em 1890 foi nomeado Capelão do Hospital
Militar no Morro do Castelo no Rio de Janeiro e, no mesmo ano, voltou
ao Ceará onde assumiu a Capelania da Guarnição do Estado.

Em Fortaleza o padre João Dantas foi grande propagador da devoção a


Nossa Senhora do Carmo conseguindo dos Frades Carmelitas
Descalços em Roma a faculdade de erigir canonicamente a confraria de
Nossa Senhora do Carmo na Matriz do Patrocínio em 1891. Em seguida
o padre João preocupou-se em dotar Fortaleza de um templo
consagrado à Virgem do Carmelo e conseguiu transformar a Capela de
Nossa Senhora do Livramento, que estava inacabada e prestes a
desabar, na atual Igreja do Carmo.

Conta-se que o padre João Dantas encomendou a imagem de Nossa


Senhora do Carmo em Portugal. A imagem chegou à Fortaleza e era
preciso pagar as taxas da alfândega para retirá-la, mas o piedoso
sacerdote esqueceu de fazer os pagamentos e a imagem foi leiloada e
arrematada pelo Sr. José Rossas que, procurado pelo padre João
Dantas, negou-se a cedê-la por qualquer preço. Dias depois José
Rossas se viu doente com paratifo, doença gravíssima na época, e,
assustado mandou sua esposa procurar o padre João Dantas e
devolver-lhe a imagem.

Outro fato interessante se deu por ocasião da conclusão da Igreja do


Carmo. O padre João Dantas assumiu pessoalmente a dívida de mais
de vinte contos empregados na construção. Muito dinheiro na época.
Três meses depois ganhou um prêmio da loteria de cinquenta contos,
pagando com esse dinheiro, todas as dívidas da Igreja.

A 30 de julho de 1900 foi distinguido com o titulo de Monsenhor e


Camareiro Secreto Supranumerário de Sua Santidade o Papa Leão
XIII.

Monsenhor João Dantas foi um sacerdote conhecido pelo


desprendimento quase completo dos bens terrenos. Não era bom
orador, mas excelente conselheiro e confessor, sendo um sacerdote
piedosos e simples, popular e trabalhador. Morreu pobre dos bens
terrenos em 26 de outubro de 1946 aos 95 anos.

Em Mulungu parece que o trabalho do padre João Dantas foi tão


intenso que ele escreveu ao bispo pedindo dispensa da reza do
breviário: “Aqui o nosso trabalho já é extraordinário e agora havendo
este jubileu torna-se onerosíssimo (...) vejo que não poderei resistir a
tanto e tão pezado trabalho sem a dispensa de alguns preceitos”.
(Arquivo da Sala de História Eclesiástica do Ceará. Fortaleza - Ce). Em
1878, ainda em Mulungu, batizou e foi padrinho de uma criança
chamada Maria do Carmo que mais tarde se tornaria a freira carmelita
cofundadora da Congregação das Irmãs Carmelitas da Divina
Providência.

Por Pe. Evando Alves de Andrade

"Debaixo dos cajueiros, sozinha a


meditar": A história da catequista
mulunguense cofundadora da
Congregação das Irmãs Carmelitas da
Divina Providência
Pe. Evando Alves de Andrade

No dia 24 de Janeiro de 2018 chegou às minhas mãos um livro intitulado "Irmã


Maria Tereza de Jesus. Resumo da vida de uma alma amante de Jesus".

A obra me foi entregue juntamente com um bilhete que dizia: "É com grande
alegria que conheci a cidade de Mulungu com uma missão de entregar para o
pároco desta paróquia este livro que conta a história de uma filha deste lugar".
Logo folheei o livro e descobri a surpreendente história de Maria do Carmo
Chaves, mulunguense que assumiu o nome de Irmã Maria Tereza de Jesus e foi
a quarta cofundadora da Congregação das Irmãs Carmelitas da Divina
Providência. No livro vários trechos do diário escrito pela própria religiosa,
informam sobre sua vida, pensamento e sofrimentos. No trecho a seguir, irmã
Tereza fala sobre sua origem:

"Nasci no dia 09 de agosto de 1878 na Vila Lameirão, distrito de Mulungu,


Serra de Baturité, Ceará. Fui batizada a 17 de agosto de 1878. Minha família
era profundamente cristã. Meu pai, Alexandre Ferreira Chaves, minha mãe,
Joaquina Francisca de Jesus. Recebi, no santo batismo o nome de Maria do
Carmo" (p. 27).

Consta ainda no diário que, por ocasião de uma visita pastoral em Mulungu,
recebeu, na Matriz de São Sebastião, o sacramento da crisma das mãos de Dom
Joaquim José Vieira, Bispo de Fortaleza. Irmã Maria Tereza conta da
dificuldade para ir à missa dominical:

"Meu pai morava longe da Igreja. Só aos domingos eu podia comungar com
grande sacrifício, porque tinha que ir, a pé, uma légua distante de nossa casa"
(p. 32).

Desde cedo interessou-se pelo serviço à Igreja. Contava que desde pequena sua
vocação era ser catequista. Em conversas com suas irmãs de congregação
dizia: "Lá no Ceará...então, eu dava catecismo pra todo lado que me
chamavam..., eu ia preparar as meninas para a Primeira Comunhão..." (p.
323)

Aos quatorze anos teve que abandonar os estudos para ajudar a mãe no serviço
de casa e, ao mesmo tempo o pai, ajudando os trabalhadores na medição do
café. Sempre devota, ia com as irmãs até a capela próxima (capela de Santa
Luzia no distrito de Lameirão) para fazer suas pequenas orações.

Por volta dos 18 anos, com a chegada dos missionários franciscanos em


Mulungu, a jovem Maria do Carmo, passa a ouvir a voz do Senhor que lhe
chama. Diz ela em seu diário: "Eu era bem jovem - a natureza em flor - e Jesus
a me chamar" (p. 37).

Em 23 de setembro de 1901, aos 23 anos, ingressa na Ordem Terceira


Franciscana, na Matriz de Mulungu. Em 1902 deixa sua terra natal e vai em
busca da realização da vocação. Esse momento também ficou registrado em seu
diário:

"Saí em companhia de meu querido pai. Fomos a cavalo e andamos 28 léguas


para chegarmos à Capital, porque ainda não havia estrada de rodagem. Ao
chegar a Fortaleza, hospedei-me na casa de meu padrinho, Monsenhor João
Dantas, o padre que me havia batizado aí demorei-me três dias..., esperando o
vapor que ia ao Rio. Chegando o dia da partida, tomei o vapor, em companhia
de quatro moças, sendo três candidatas à vida religiosa" (p. 41-42).

Em 1904 ingressa no Carmelo. Em 1906 toma o hábito e no ano


seguinte professa os votos. Por mais de 50 anos Irmã Maria Tereza de
Jesus Menino serviu a Deus no Carmelo e no serviço aos doentes e
pobres. Faleceu no dia 15 de outubro de 1954 em Juiz de Fora, Minas
Gerais.

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