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QUAL É O SENTIDO DA VIDA?

FILOSOFIAS PARA PENSAR


NOSSO PROPÓSITO NO MUNDO
com Renato Noguera

1. AMAR
Não saber
O que será que foi que eu
Sonhei quando amanheceu,

E quis cantar
Era o mar
Ou eram ondas de canções
Canções só feitas de canções
Outros azuis
Tantos sóis
Tão desgarrada luz no ar
E eu sem saber o que é o mar
O mar

Mas me diz o que é o amor


Me explica por favor
O que me faz querer
Ser
Saudade de você
Saudade da saudade de você e eu
Você
E aquilo tudo de nós dois
Que vai se transformar depois
Não sei em que

Sim eu sei
O mundo será sempre assim
Um recomeço sem ter fim
Sem ter razão
Ouve então
Preciso te dizer que não
Preciso repetir que sigo só
Mas me diz o que é o amor
Me explica por favor
O que me faz querer
Ser
Saudade de você
Saudade da saudade de você e eu

‘Saudade da Saudade’
José Miguel Wisnik
ÍNDICE:
4 APRESENTAÇÃO
5 CONHEÇA SEU PROFESSOR
7 QUEM PRODUZIU O MATERIAL
9 O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESSA AULA
9 RESUMO EXPANDIDO
9 UMA POSSÍVEL INTERPRETAÇÃO
10 O PENSAMENTO DE WILHELM REICH E ERICH
FROMM SOBRE O AMOR E O AMAR
11 GEOPSICOLOGIA E BIOMAS AFETIVOS:
A FILOSOFIA IORUBÁ DE ORUNMILÁ
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR NO TEMA DA AULA:
15 LIVROS
17 FILMES
18 SÉRIES
19 VÍDEOS DA CASA DO SABER NO YOUTUBE
Casa do Saber

21 CURSOS NA PLATAFORMA DE STREAMING


CASA DO SABER +

3
APRESENTAÇÃO
Neste curso, unimos diferentes mitologias e filosofias como forma de ampliar
e diversificar o seu olhar sobre o sentido da vida, uma das questões mais
importantes da filosofia.

Por meio de histórias mitológicas e do diálogo com notáveis pensadores de


diferentes épocas e continentes do mundo, você ganhará novos recursos para
refletir sobre suas escolhas e buscar o seu propósito na vida.

Os encontros foram idealizados com o intuito de percorrer o intenso e


emocionante caminho da vida, através de eixos fundamentais deste processo:
amar, aprender, escolher, saber e envelhecer.

Nesta primeira aula o professor Renato Noguera propõe uma reflexão sobre a
importância do amor, um afeto fundamental e que dá sentido às nossas vidas.
Tendo como ponto de partida uma história de Ausar e Auset da mitologia do
antigo Egito (Kemet), a geopsicologia da filosofia africana de Orunmilá e o
diálogo com os pensadores alemães Erich Fromm (1897-1957) e Wilhelm Reich
(1900-1980), serão abordadas as questões sobre o amor e o amar. E também,
como nos relacionamos com os outros e conosco.

Esperamos que este material potencialize a sua experiência ao longo do curso,


servindo como um guia prático e referencial ao longo desta jornada de cinco
aulas, e trazendo, fundamentalmente, um resumo do conteúdo abordado em
cada uma das aulas, além de muitas referências bibliográficas e audiovisuais
que te instigarão a explorar mais intensamente cada um dos temas.

Ricardo Nicolay
(Curador)
Casa do Saber

4
CONHEÇA SEU PROFESSOR: RENATO NOGUERA
É professor do departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


e conquistou o título de mestre em Filosofia pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCAR) e o doutor pela UFRJ.

É pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro),


sediado na UFRRJ, e coordenador do Grupo de Pesquisa Afroperspectivas,
Saberes e Infâncias (Afrosin). Renato Noguera está envolvido em diversos
projetos de pesquisa, entre eles destacam-se: “O que as crianças pensam
sobre a escola: imagens, palavras e infâncias na Educação Infantil e no Ensino
Casa do Saber

Fundamental”, e, “‘Modernidade’ na perspectiva da Crítica da Razão Negra”.


Coordena também o projeto de extensão “Brinquedoteca Pedagoginga”,
também na UFRRJ.

5
Escreveu, entre outros livros: Por que amamos: O que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor (2020), Mulheres e deusas: Como as divindades e
os mitos femininos formaram a mulher atual (2018), O Ensino de Filosofia e a
Lei 10639 (2015) e Nana e Nilo: que jogo é esse? (2012).

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Casa do Saber

E ASSISTA AO VÍDEO:
CONHEÇA SEU PROFESSOR

6
QUEM PRODUZIU O MATERIAL

CONTEÚDO

Ricardo Nicolay
Curador

Danilo Kovacs
Curador assistente

Ronaldo Vitor
Curador assistente

REVISÃO E APROVAÇÃO

Ricardo Nicolay
Curador

DESIGN

Ana Luiza dos Santos


Designer

FALE COM A GENTE


suporte@casadosaber.com.br
Casa do Saber

7
AMAR
Casa do Saber

Casal (data não encontrada), Djanira da Motta e Silva

8
O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA

- Amar é uma possibilidade de dar sentido à vida


- Geopsicologia de Orunmilá
- Biomas afetivos: ambientes nos quais um ori cresce e se manifesta
- Zona de conforto afetiva

RESUMO EXPANDIDO

Uma possível interpretação


A narrativa mítica de Ausar e Auset nos apresenta inúmeras pistas de como
podemos entender o sentido do amor. Primeiro, poderíamos tomar cada
divindade como um aspecto da condição humana. Set, irmão de Ausar, se
encaixaria perfeitamente na personagem que anseia ter poder a qualquer
preço, a ponto do amor e o do ódio serem lidos como forças antagônicas.

Seguindo este pensamento, inclusive, o desejo e a busca por controle e


domínio impossibilitariam que nutrientes afetivos sejam capazes de alimentar
o amor. Set figuraria como o representante do desejo por controle e domínio,
mesmo que o preço a ser pago para alcançá-los seja seu próprio mal-estar.
No outro lado, porém, Ausar representaria a nossa natureza (intimidade), e
Auset o amor e a arte de amar, simultaneamente.

Compreender o poder e o controle como as únicas formas de satisfação,


portanto, seria uma forma de nos fragmentarmos. Se alguém busca somente
a restrição, a força, e o sucesso independentemente de conhecer a si
mesmo, essa pessoa estaria dilacerada, divorciada de seu coração. Set
simboliza cada um de nós, já que na busca pelo poder desencontramos do
amor e despedaçamos a nossa própria intimidade.

Auset, por sua vez, representaria a capacidade que temos de amar. Vemos
que após trazer Ausar novamente à vida, ele fica esverdeado – fazendo
referência à cor da natureza – porque, investido de amor, alcança a si mesmo
Casa do Saber

– a sua própria natureza. O sentido do amor nesta etapa da narrativa é o de


restaurar a vida e de nos conectar com o que existe de mais profundo em
cada um de nós.

9
Temos aqui, então, a possibilidade de materialização do jogo de posições
antagônicas em que se encontram o poder e o amor. Se de um lado o
poder nos afastar de nós mesmos, o amor nos faz chegar ao nosso ponto
mais íntimo, fazendo com que sejamos capazes de viver num lugar onde as
conexões com nossos sentimentos mais verdadeiros seja mais urgente do
que a riqueza ou o sucesso.

O pensamento de Wilhelm Reich e Erich


Fromm sobre o amor e o amar
Para o psiquiatra e psicanalista Wilhelm Reich (1900-1980), o amor seria o
que há de mais essencial e profundo na vida, sendo o condicionante e o
condicionado. Para Reich, a vida se “faz pelo amor e para o amor”. 1

É importante salientar que o amor assume este papel, pois a cultura


passa por um processo intitulado “peste emocional”, caracterizada por
Reich como uma biopatia crônica do organismo, isto é, a existência de
um comprometimento emocional muitas vezes acompanhado de um
comprometimento físico que acaba afastando o homem de uma concepção
fundada em uma lei cósmica natural. Somente o restabelecimento de uma
vida amorosa natural para crianças, adolescentes e adultos poderia livrar o
mundo das neuroses de caráter e da “peste emocional”.

Em sua obra, o psicanalista e filósofo Erich Fromm (1897-1957) tenta


compreender quais os mecanismos e os princípios constituintes da Arte de
Amar e do amor. O amor não seria um produto do acaso, como um evento
aleatório que acomete as pessoas de forma involuntária, mas sim proveniente
de um esforço que requer certa primazia, empenho e conhecimento. Estas
categorias funcionariam pela ótica do cuidado, da responsabilidade, do
respeito e do conhecimento.

Para Fromm, amar é um exercício a ser executado.


Casa do Saber

1 REICH, Wilhelm. O Assassinato de Cristo. São Paulo: Martins Fontes, 1999, p.38.

10
Portanto, podemos compreender o caráter de uma necessidade ou de uma
atividade que precisa ser implementada e refinada. Amar significa incorporar
o outro em nossa existência, logo, seria impossível amar somente ao outro,
pois quem não ama a si mesmo, não pode se dedicar a ninguém.

Geopsicologia e biomas afetivos:


a filosofia iorubá de Orunmilá
O ori, nome iorubá para cabeça, é uma expressão filosófica que também
está no campo religioso. De acordo com o sistema de Orunmilá (5-6 a.C.),
“as pessoas são formadas pelos quatro elementos: água, fogo, terra e ar.
Esses elementos são organizados no ori [...] por meio de 100 búzios que
preenchem quatro posições: a frontal, a esquerda, a direita e a adjunta” 2
como ilustra a imagem a seguir:
Casa do Saber

2 NOGUERA, Renato. Por que amamos: o que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor.
Rio de Janeiro: HarperCollins, 2020, p. 69.

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O sistema é bastante complexo e pode apresentar as mais variadas combinações
nos indivíduos, desde aquele que tenha um mesmo elemento em todo seu
ori até aquele que tenha dois ou três. Por mais que os elementos possam se
repetir, há neles gradações de intensidade, como ilustra a imagem abaixo:

O mais importante neste sistema é compreender que através do


autoconhecimento busca-se o equilíbrio para os elementos naturais.
Nas sociedades iorubás, “o ori é de extrema importância porque dá aos
indivíduos sua direção no mundo.” 3

Por sua vez, temos os biomas afetivos, que vão se constituindo e se


transformando em ambientes nos quais um ori cresce e se manifesta, isto é,
ecossistemas formados por vegetação, solo e clima em que determinados
sentimentos, emoções, ideias, pensamento, comportamento e
linguagem habitam. Eles podem surgir a partir de interações sociais, políticas,
históricas e culturais.
Casa do Saber

3 NOGUERA, Renato. Por que amamos: o que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor.
Rio de Janeiro: HarperCollins, 2020, p. 73.

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Podemos habitar os seguintes biomas afetivos: 

- Água: Mar, rio ou lago;


- Ar: Brisa, ciclone, furacão, tufão, tornado e vendaval;
- Terra: Arenosa, argilosa, humosa ou calcária
- Fogo: Solar, vulcânico ou fogueira

A partir da filosofia iorubá, cada ser humano é composto por um ou mais


desses elementos que, por sua vez, também são afetos e configuram-se
numa espécie de equação afetiva, que almeja desvendar como a pessoa (ou
as pessoas) se movem nos biomas afetivos, configurando um conjunto de
interações entre elas. Num mundo composto por inúmeras possibilidades de
afetos, estas combinações podem ser entendidas como uma forma de bem-
estar a partir das interações e contatos.

O afeto, aliás, pode ser compreendido como conceito guarda-chuva que


representa tudo que nos mobiliza enquanto indivíduos, grupos e sociedades:
as ideias, os pensamentos, as emoções, os sentimentos. Todos eles estão
sob um registro pois é de extrema importância poder articulá-los. A raiva, por
exemplo, é um afeto que nos ajuda a compreender e estimular a noção de
limites.

Já o amor é um afeto catalisador que visa encontrar o bem-estar, mobilizando


os outros afetos em busca de um estado de equilíbrio. O amor trabalha,
então, para impedir que uma inflamação afetiva crie as condições ideais para
grandes explosões e implosões. À medida que somos capazes de amar, nos
mantemos mais equilibrados, ainda que de forma provisória, já que é uma
característica do ser humano cair em desequilíbrio e entrar em constante
dinâmica de desgaste, seja de uma forma explosiva (demonstrando afetos
agressivos) ou através de uma explosão afetiva que aja contra nosso próprio
corpo.

A geopsicologia de Orunmilá propõe, portanto, um exercício de


reconhecimento da nossa composição afetiva, pois compreende que
os afetos estão intimamente relacionados com os modos de habitar a
existência, interferindo na maneira como nos manifestamos no mundo e nos
Casa do Saber

relacionamos com as pessoas de diversos ambientes afetivos. O itinerário


proveniente da leitura dos diversos ambientes vai contribuir para um percurso
afetivo mais equilibrado, o estado de axé.

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A expressão axé, que também é um conceito filosófico, traduz um estado
de bem-estar consigo diante do mundo em qualquer circunstância, puxando
para si uma noção de consciência afetiva. Sob esse prisma, para encontrar o
sentido da vida é necessário ter confiança e uma condição de vislumbre para
não se relacionar com o mundo num modelo de guerra. Numa sociedade que é
predominantemente cosmofóbica, desconfiar de si é uma grande armadilha.

É necessário então experimentar o amor na sua maior radicalidade, pois ele


está relacionado a não se esconder dos seus afetos, do que sentimos e dos
caminhos que percorremos. Na potência do amor reside algum sentido para a
vida. 

“Nunca desconfie dos seus sentimentos”


Tomani Kouyaté, djéli griô (Mestre das Palavras e das Artes)
Casa do Saber

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PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: LIVROS

1.
2.
Por que amamos:
o que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor?
Ricardo Noguera

3. Socrates and Orunmila.


Two patron saint of
classical philosophy
Sophie Oluwole
Casa do Saber

A Arte de Amar
Erich Fromm

15
4.

5. O Banquete
Platão

O assassinato de Cristo
Wilhelm Reich 6.

Tudo sobre o amor:


Casa do Saber

novas perspectivas
bell hooks

16
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: FILMES

1.

Romeu + Julieta
2.
( 1977 )

3. La La Land
( 2016 )
Casa do Saber

Um Casal Inseparável
( 2021 )

17
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: SÉRIES

1.
Modern Love -
Primeira Temporada
( 2019 )

2.
Modern Love -
Segunda Temporada
Casa do Saber

( 2021 )

18
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
VÍDEOS DA CASA DO SABER
NO YOUTUBE

1.
AMOR, CONHECIMENTO
E BELEZA
Mauricio Marsola

clique na imagem para assistir

2.
FIM DO AMOR ROMÂNTICO
Maria Homem

clique na imagem para assistir


Casa do Saber

19
3.
A EXISTÊNCIA DO AMOR
ULTRAPASSA O ENTENDI-
MENTO DO DESEJO
Tatiana Paranaguá

clique na imagem para assistir

4.
QUEM É CONTRA O AMOR?
Clóvis de Barros Filho

clique na imagem para assistir


Casa do Saber

20
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
CURSOS NA PLATAFORMA DE
STREAMING CASA DO SABER +

1.
AMOR E FELICIDADE
Clóvis de Barros Filho

clique na imagem para assistir

2.
AS RELAÇÕES HUMANAS HOJE
Contardo Calligaris

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Casa do Saber

21
QUAL É O SENTIDO DA VIDA?
FILOSOFIAS PARA PENSAR
NOSSO PROPÓSITO NO MUNDO
com Renato Noguera

2. APRENDER
Maá munhã ira apigá upé rikué Como estratégia de sobrevivência,
Waá perewa, waá yuká Em silêncio decidimos ficar.
Waá munhã maá putari. Hoje nos vem a força,
De nosso direito reclamar.
Tradução: Assegurando aos tanu tyura,
O que fazer com o homem na vida, A herança do conhecimento
Que fere, que mata, milenar
Que faz o que quer.
Mesmo vivendo na cidade,
Do encontro entre o “índio” e o Nos unimos por um único ideal,
“branco”, Na busca pelo direito,
Uma coisa não se pode esquecer, De ter o nosso território ancestral.
Das lutas e grandes batalhas,
Para terra o direito defender. O que fazer com homem na vida
Que fere, que mata,
A arma de fogo superou minha flecha, Que faz o que quer?
Minha nudez se tornou
escandalização, Território ancestral
Minha língua foi mantida no anonimato, Márcia Wayna Kambeba
Mudaram minha vida, destruíram o
meu chão.

Antes todos viviam unidos,


Hoje, se vive separado.
Antes se fazia o Ajuri,
Hoje, é cada um para o seu lado.

Antes a terra era nossa casa,


Hoje, se vive oprimido.
Antes era só chegar e morar,
Hoje, nosso território está dividido.

Antes para celebrar uma graça,


Fazia um grande ritual.
Hoje, expulso da minha aldeia,
Não consigo entender tanto mal.
ÍNDICE:
4 APRESENTAÇÃO
5 CONHEÇA SEU PROFESSOR
7 QUEM PRODUZIU O MATERIAL
9 O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESSA AULA
9 RESUMO EXPANDIDO
9 O APRENDER COMO UM RESISTIR AO
ESQUECIMENTO DA INFÂNCIA

11 INFANCIALIZAÇÃO E ADULTUDADE:
OS ANTAGONISMOS DA NOSSA VIDA
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR NO TEMA DA AULA:
13 LIVROS
15 FILMES
16 VÍDEOS DA CASA DO SABER NO YOUTUBE
17 CURSOS NA PLATAFORMA DE STREAMING
CASA DO SABER +
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3
APRESENTAÇÃO
Neste curso, unimos diferentes mitologias e filosofias como forma de ampliar
e diversificar o seu olhar sobre o sentido da vida, uma das questões mais
importantes da filosofia.

Por meio de histórias mitológicas e do diálogo com notáveis pensadores de


diferentes épocas e continentes do mundo, você ganhará novos recursos para
refletir sobre suas escolhas e buscar o seu propósito na vida.

Os encontros foram idealizados com o intuito de percorrer o intenso e


emocionante caminho da vida, através de eixos fundamentais deste processo:
amar, aprender, escolher, saber e envelhecer.

Nesta aula, o professor Renato Noguera discutirá o papel do aprender para


encontrar o sentido da vida. Partindo das histórias de “Kiriku e a feiticeira”
e de “Pinóquio: histórias de uma marionete”, do pensamento dos filósofos
franceses Gilles Deleuze (1925-1995) e Félix Guattari (1930-1992) e do filósofo
argentino Walter Kohan (1961-), Noguera nos convida a pensar sobre o sentido
da vida a partir do aprendizado, tendo como ponto de partida os processos de
infantilização e de adultidade.

Esperamos que este material potencialize a sua experiência ao longo do curso,


servindo como um guia prático e referencial ao longo desta jornada de cinco
aulas, e trazendo, fundamentalmente, um resumo do conteúdo abordado em
cada uma das aulas, além de muitas referências bibliográficas e audiovisuais
que te instigarão a explorar mais intensamente cada um dos temas.

Ricardo Nicolay
(Curador)
Casa do Saber

4
CONHEÇA SEU PROFESSOR: RENATO NOGUERA
É professor do departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


e conquistou o título de mestre em Filosofia pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCAR) e o doutor pela UFRJ.

É pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro),


sediado na UFRRJ, e coordenador do Grupo de Pesquisa Afroperspectivas,
Saberes e Infâncias (Afrosin). Renato Noguera está envolvido em diversos
projetos de pesquisa, entre eles destacam-se: “O que as crianças pensam
sobre a escola: imagens, palavras e infâncias na Educação Infantil e no Ensino
Fundamental”, e, “‘Modernidade’ na perspectiva da Crítica da Razão Negra”.
Coordena também o projeto de extensão “Brinquedoteca Pedagoginga”,
Casa do Saber

também na UFRRJ.

5
Escreveu, entre outros livros: Por que amamos: O que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor (2020), Mulheres e deusas: Como as divindades e
os mitos femininos formaram a mulher atual (2018), O Ensino de Filosofia e a
Lei 10639 (2015) e Nana e Nilo: que jogo é esse? (2012).

CLIQUE NO CÍRCULO
Casa do Saber

E ASSISTA AO VÍDEO:
CONHEÇA SEU PROFESSOR

6
QUEM PRODUZIU O MATERIAL

CONTEÚDO

Ricardo Nicolay
Curador

Danilo Kovacs
Curador assistente

Ronaldo Vitor
Curador assistente

REVISÃO E APROVAÇÃO

Ricardo Nicolay
Curador

DESIGN

Ana Luiza dos Santos


Designer

FALE COM A GENTE


suporte@casadosaber.com.br
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APRENDER
Casa do Saber

Empinando Pipa (1950), Djanira da Motta e Silva

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O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA
- O aprender como superação da infância
- O aprender como resistência ao esquecimento da infância
- Infância como fase, categoria e conceito
- Infancialização e adultidade: duas ideias antagônicas
- O sentido da vida pode ser acessado através do ato
de habitar a infância

RESUMO EXPANDIDO
Por que perdemos a capacidade de nos espantar e nos surpreender com
os elementos abstratos e inexplicáveis? Por que se aventurar? Porque se
aventurar é aprender, e aprender é um ato revolucionário.

O aprender como um resistir ao


esquecimento da infância
A infância tem um papel fundamental na vida de todos os humanos. Trata-se
de um momento marcado pela descoberta e pelo espanto com o incerto, o
misterioso, o indomável, o abstrato e o concreto.

É neste período que temos nossas primeiras experiências, quando


construímos os traços iniciais de nossa identidade, e quando formulamos
e postulamos as formas como vamos nos manifestar e interagir com as
pessoas ao nosso redor. Diante desses esclarecimentos constantes,
começamos a formar nosso juízo, nossa curiosidade e a desbravar o mundo,
cada qual a sua maneira. Nas fábulas apresentadas por Renato Nogueira –
Kiriku e Pinóquio –, podemos compreender como diferentes mundos tratam
do universo infantil e de qual forma estas sociedades vivenciam e se equipam
de diferentes tipos de aprendizados ao decorrer da vida.

Com a noção de que existe uma diversidade de infâncias, de possibilidades,


Casa do Saber

de acessos e de estruturas de base e suporte para o envelhecer, é possível


perceber que a importância do aprendizado para os povos produz tanto
sociedades estáveis quanto instáveis, o que implica diretamente na ideia

9
de qual seria o papel que o aprendizado deveria ocupar na sociedade e na
cultura e no que, de fato, se trata o ato de aprender. Seria uma questão de
resistência à condição social instável imposta ou uma forma de superação
pessoal?

Este aprendizado tem funções diferentes a depender do território, linguagem


e simbologia de cada cultura. Em As aventuras de Pinóquio - A história de
um boneco, as analogias propostas pelo autor Carlo Collodi (1826 - 1890)
sugerem uma emancipação e superação da infância, como se os atos de
Pinóquio o levassem a uma certa imposição contra esta condição da infância,
uma vez que o personagem deveria abdicar do seu “corpo de madeira” e da
mentira para conseguir vislumbrar a condição de “ser um humano de carne e
osso”.

Ao longo da obra podemos perceber um apelo para a manifestação purificada


de uma infância como fase de transição. Esta visão traz consigo a ideia
de que a infância se trata de uma menoridade da razão, de um intelecto
não aperfeiçoado onde o aprender tem relação direta com o abandonar da
infância.

CARÁTER TRIDIMENCIONAL DA INFÂNCIA

1) Infância como noção biopsicossocial e jurídica;


2) Infância como categoria geracional;
3) Infância como conceito

Já na história mítica de Kiriku e a Feiticeira, a “maldade” se converte em um


Casa do Saber

sinal de reflexo do sofrimento da personagem, que estabelece uma relação


direta com seu mal-estar.

10
Na narrativa, a concepção do aprender passa por uma ressignificação, pois
é vista como um ato de resistência ao esquecimento da infância. A metáfora
aqui diz respeito a potencialidade deste lugar infantil, uma vez que pouco
importa se tratamos do protagonismo de um adulto ou de uma criança, mas
sim de um “estado de infância” que Kiriku é capaz de instaurar no mundo. A
infancialização seria, então, uma instância necessária para o aprender, pois
este estado foi o que permitiu ao personagem percorrer caminhos que não
eram possíveis para seus pares.

É somente mantendo o “estado de infância” como um ato de resistência


que podemos enfrentar e configurar o novo, traçar os passos com
responsabilidade, mas com encantamento característico.

Infancialização e adultidade:
os antagonismos da nossa vida

Através do mito de Kiriku, vimos que a infancialização não é apenas um


estado temporal, mas sim uma posição subjetiva, um modo de ser que
apresenta o desejo, a paixão e a vontade pelo aprendizado. Ou seja, mais do
que uma etapa da vida, a infancialização é a forma como buscamos trabalhar
as múltiplas ocorrências do cotidiano, cativando-se por cada traço de
novidade.

O que se destaca, portanto, é a abertura que o sentido da infância oferece


para nosso aprendizado, cuja compreensão não está restrita a ideia de ensino
formal, mas sim de acúmulo de repertórios plurais. Desse modo, aprender,
assim como infancializar-se, é assumir uma postura de mútua fragilidade
e conhecimento frente a vida, já que por não conhecermos o futuro que
se impõem, abrimos os braços em direção ao novo e ao desconhecido,
apaixonando-se ou frustrando-se por cada experiência.

No entanto, se a infância pode ser entendida como forma de potência, como


podemos analisar as mudanças e durezas surgidas na vida adulta?

Para tal reflexão, é necessário que tomemos o conceito de adultidade


Casa do Saber

como base. Forma antagônica de qualquer traço infantil, a adultidade é


caracterizada pelo desgaste de nossas potências naturais, constituindo
uma perda ou alteração cosmo-física da vontade de aprendizado, em

11
detrimento de uma rigidez que busca negar a vitalidade da infância. Assim
como uma moldura, a adultidade restringe a criatividade natural, o amor pelo
descobrimento e a paixão pelo novo; sustentando uma densa apatia pelo
viver.

Essa transformação psíquica é também corporal, na medida que se organiza


por uma lógica hierárquica que entende o corpo/repertório adulto como
superior ao da criança. Nesse sentido, a adultidade sustenta uma lógica
binária de ser ou estar no mundo, polarizando lados naturalmente unificados:
em uma ponta estariam os adultos (fortes, trabalhadores, potentes),
enquanto na outra os jovens (frágeis, singelos e impotentes).

Se por um lado um dos problemas da adultidade está na separação


rígida e desigual das formas de compreensão dos sujeitos, a ponto de
criar hierarquias socialmente desiguais; por outro há a impossibilidade
do reconhecimento da infância enquanto um sentido de mundo, ou
seja, a possibilidade de encanto pelas experiências efêmeras, lúdicas
e compartilhadas. Não à toa, se pensarmos um exemplo que ilustre tal
polarização é fácil encontrarmos em nossa comunicação rotineira expressões
de demérito para o universo infantil: “isso é coisa de criança”, “vamos parar
de brincadeira”, “deixe de graça, você já é adulto”.

Por meio de sua fria racionalidade e valorização de corpos ou hábitos


restritos, a adultidade bloqueia a pujança individual e a ampliação dos
horizontes de conhecimento, desmerecendo tudo o que é anterior ao sujeito
adulto. Com esse apagamento que traduz uma espécie de desprezo pelo
passado glorificam-se heróis sem reconhecer suas jornadas, valoriza-se o
presente em detrimento do passado.

Tal como Kiriku, cuja disposição e sede de conhecimento infantis o levaram


a descobrir a origem do mal, hoje a infancialização pode nos direcionar para
o encontro de outro sentido da vida, algo mais amplo, eterno e necessário: o
poder da escuta e o desejo de aprender.
Casa do Saber

12
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: LIVROS

1.
2.
Lugares da Infância:
Filosofia
Walter O. Kohan (org.)

Infância. Entre Educação

3.
e Filosofia
Walter O. Kohan

O Maravilhoso
Casa do Saber

Mágico de Oz
L. Frank Baum

13
4.

5. O brincar e a realidade
Donald W. Winnicott

6.
Diferença e repetição
Gilles Deleuze

O juízo moral
na criança
Jean Piaget
Casa do Saber

14
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: FILMES

1. 2.

Kiriku e a feiticeira Pinóquio


Michel Ocelot (1998) (1940)

3. 4.
Casa do Saber

O mágico de Oz Pinóquio (2021)


Victor Fleming (1939) Guillermo del Toro
15
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
VÍDEOS DA CASA DO SABER
NO YOUTUBE

1.
O CARÁTER SOCIAL E
HISTÓRICO DA INFÂNCIA
Renato Noguera

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2.
EDUCAÇÃO E EQUILÍBRIO
EMOCIONAL SEGUNDO A
NEUROCIÊNCIA

Cláudia Feitosa-Santana

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Casa do Saber

16
3.
APRENDER É SE EMOCIONAR
Guilherme Brockington

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PARA VOCÊ SE APROFUNDAR


NO TEMA DA AULA:
CURSOS NA PLATAFORMA DE
STREAMING CASA DO SABER +

1.
O CÉREBRO, DA CRIANÇA
AO ADOLESCENTE
Adriana Fóz

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Casa do Saber

17
2.
FILOSOFIA DA CORAGEM
Oswaldo Giacóia Junior

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Casa do Saber

18
QUAL É O SENTIDO DA VIDA?
FILOSOFIAS PARA PENSAR
NOSSO PROPÓSITO NO MUNDO
com Renato Noguera

2. APRENDER
3. ESCOLHER
No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra
Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra.

‘No meio do caminho’


Carlos Drummond de Andrade
ÍNDICE:
4 APRESENTAÇÃO
5 CONHEÇA SEU PROFESSOR
7 QUEM PRODUZIU O MATERIAL
9 O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESSA AULA
9 RESUMO EXPANDIDO
10 A ESCOLHA COMO UM DADO DA EXISTÊNCIA
11 RAZÃO E EMOÇÃO: A CONVERGÊNCIA AFETIVA
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR NO TEMA DA AULA:

13 LIVROS

15 FILMES

16 VÍDEOS DA CASA DO SABER NO YOUTUBE

18 CURSOS NA PLATAFORMA DE STREAMING


CASA DO SABER +
Casa do Saber

3
APRESENTAÇÃO

Neste curso, unimos diferentes mitologias e filosofias como forma de ampliar


e diversificar o seu olhar sobre o sentido da vida, uma das questões mais
importantes da filosofia.

Por meio de histórias mitológicas e do diálogo com notáveis pensadores de


diferentes épocas e continentes do mundo, você ganhará novos recursos para
refletir sobre suas escolhas e buscar o seu propósito na vida.

Os encontros foram idealizados com o intuito de percorrer o intenso e


emocionante caminho da vida, através de eixos fundamentais deste processo:
amar, aprender, escolher, saber e envelhecer.

Nesta aula, analisaremos o lugar e a importância do verbo escolher na


busca por nosso sentido da vida. O professor Renato Noguera apresenta
um panorama a partir da antagônica afirmação clássida: “razão versus
emoção”. Para cumpril tal objetivo, Noguera navega pela literatura do escritor
brasileiro laureado com os prêmios Jabuti e Camões Raduan Nassar (1935-) e
interpretação do mito de Sísifo proposta pelo filósofo e escritor franco-argelino
Albert Camus (1913-1960), incluindo em tão diverso debate a neurociência, a
filosofia e mitologia iorubá, as leituras filosóficas da Instrução de Amenemope,
obra literária do Egito antigo, e do filósofo Arthur Schopenhauer (1788-1860).

Esperamos que este material potencialize a sua experiência ao longo do curso,


servindo como um guia prático e referencial ao longo desta jornada de cinco
aulas, e trazendo, fundamentalmente, um resumo do conteúdo abordado em
cada uma das aulas, além de muitas referências bibliográficas e audiovisuais
que te instigarão a explorar mais intensamente cada um dos temas.

Ricardo Nicolay
(Curador)
Casa do Saber

4
CONHEÇA SEU PROFESSOR: RENATO NOGUERA
É professor do departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


e conquistou o título de mestre em Filosofia pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCAR) e o doutor pela UFRJ.

É pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro),


sediado na UFRRJ, e coordenador do Grupo de Pesquisa Afroperspectivas,
Saberes e Infâncias (Afrosin). Renato Noguera está envolvido em diversos
projetos de pesquisa, entre eles destacam-se: “O que as crianças pensam
sobre a escola: imagens, palavras e infâncias na Educação Infantil e no Ensino
Casa do Saber

Fundamental”, e, “‘Modernidade’ na perspectiva da Crítica da Razão Negra”.


Coordena também o projeto de extensão “Brinquedoteca Pedagoginga”,
também na UFRRJ.

5
Escreveu, entre outros livros: Por que amamos: O que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor (2020), Mulheres e deusas: Como as divindades e
os mitos femininos formaram a mulher atual (2018), O Ensino de Filosofia e a
Lei 10639 (2015) e Nana e Nilo: que jogo é esse? (2012).

CLIQUE NO CÍRCULO
Casa do Saber

E ASSISTA AO VÍDEO:
CONHEÇA SEU PROFESSOR

6
QUEM PRODUZIU O MATERIAL

CONTEÚDO

Ricardo Nicolay
Curador

Danilo Kovacs
Curador assistente

Ronaldo Vitor
Curador assistente

REVISÃO E APROVAÇÃO

Ricardo Nicolay
Curador

DESIGN

Ana Luiza dos Santos


Designer

FALE COM A GENTE


suporte@casadosaber.com.br

7
ESCOLHER
Casa do Saber

Festa de São João (1941), Heitor dos Prazeres

8
O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA

- As escolhas não são desprovidas de emoções


- As escolhas estão ancoradas na compreensão
do que podemos fazer
- A diferença entre emoções e sentimentos
- Convergência afetiva

RESUMO EXPANDIDO
Há um verbo comum que une situações esparsas de nossas vidas, como ter
ou não ter filhos, manter uma relação infeliz ou abandoná-la, seguir numa
carreira desgastante ou apostar num novo destino: escolher.

Entendido como ação de selecionar, definir ou indicar preferência por algo


ou alguém, a escolha é um movimento do sujeito em direção a busca da
felicidade plena. Quem escolhe acaba realizando, na mesma proporção, o
abandono daquilo que não foi selecionado por lhe ser negativo: se entramos
numa nova carreira é porque a anterior foi posta de lado, caso optemos por
ter filhos, perdemos o desejo de não os ter. Nesse sentido, é possível que
haja arrependimento em todas nossas ações, mas suas motivações iniciais
são sempre baseadas num princípio positivo de crescimento e aprendizado.

A questão que nos atravessa, portanto, não é como lidaremos com o futuro,
mas se conseguiremos tomar as decisões necessárias para realizar nossos
sonhos. Poderemos ser ou ter tudo o que desejamos? Sob a incerteza da
vida e a demanda pela realização das ambições, é a nossa capacidade de
manusear o incipiente verbo escolher que pode indicar um sentido da vida.

Sob esse prisma, que critérios utilizar para tomar decisões? Como agir em
consonância com nossas vontades e princípios éticos? Como fazer para
si sem prejudicar ao outro? É possível mover-se para uma vida melhor com
Casa do Saber

posicionamentos que sejam racionalmente calculados e isentos de emoção?


Aliás, a emoção interfere na nossa tomada de decisões e, logo, nossa
capacidade de escolher?

9
Com respostas muitas vezes imprecisas, vale retomar parte de todo pensamento
filosófico que se debruçou sobre as possíveis tensões que envolvem nossas
escolhas. Ainda assim, quando a filosofia não nos oferece um caminho, a
literatura pode abrir uma luz, pois como escreveu Raduan Nassar: “a razão jamais
é fria e sem paixão”.

A escolha como um dado da existência


Uma das ideias principais do existencialismo é a de que a existência precede a
essência. Afinal, qual seria a “essência” do homem se não a própria concepção
de sua existência? Dessa forma, o existencialismo ilustra que seria impossível
replicar um sentido único (uma única essência) que explique o que é ser humano.
Quem nunca se deparou com perguntas tão básicas e ao mesmo tempo tão
importantes, como: Quem somos nós? Para onde vamos? O que é a vida? E a
morte?

Algumas dessas dúvidas se transformam em questões fundamentais pois não


conseguimos respondê-las, uma vez que suas soluções mudam e se moldam
conforme as encaramos e nos manifestamos no mundo, isto é, como buscamos
seu sentido e de que forma este sentido dá condições para exercer uma vida
digna. Albert Camus (1913-1960), notável filósofo franco-argelino, foi um dos
principais expoentes desta área do conhecimento filosófico, trabalhando na
tentativa de encontrar algum sentido para a vida.

Na narrativa mítica de Sísifo, como resultado por ter desafiado tantos deuses,
como Zeus e Tanatos, foi condenado por toda a eternidade a empurrar a pedra
mais pesada por uma montanha muito alta até o seu topo. Ao completar o
desafio, a pedra então rolaria para baixo e, numa espécie de ciclo vicioso, Sísifo
recomeçar todo o processo.

Esta metáfora pode ser interpretada como a passagem dos ciclos da natureza.
Para Camus, o mito representa um ser que vive a sua vida ao máximo, que
odeia a morte, e está condenado a realizar uma tarefa que não deseja:
mesmo sem reconhecer algum sentido, o personagem continua a executá-la
sistematicamente.
Casa do Saber

10
O sentido da vida nesta interpretação de Camus só seria compreendido
através das categorias paixão e revolta. Por paixão, podemos entender uma
emoção que coloca o ser em conexão com os sentimentos, as emoções e
os dados da existência que agenciam o “ser no mundo”. Já a revolta se daria
com a iminência dos absurdos do mundo, do espanto com o incerto e com o
abstrato.

"Todos viemos ao mundo cheios de pretensões de felicidade


e prazer [...] até ao momento em que o destino nos aferra
bruscamente e nos mostra que nada é nosso [...]"

Arthur Schopenhauer, in 'A Arte de Ser Feliz'.

Diante disso, do caráter absurdo da vida, da impossibilidade de um projeto


de luz, só nos restaria o ser, condenado a ser livre, que se conecta com os
dados da existência através da liberdade, constituindo um projeto de vida
autêntico através da escolha. Como a noção de escolha está intimamente
ligada a uma autenticidade, à noção de responsabilidade, aos sentimentos e
à forma como os seres se manifestam no mundo, ela traz consigo, também, a
condição de aprimoramento do ser através do autoconhecimento.

Só podemos escolher na medida em que temos uma convergência com o


ser, com os sentimentos, com as emoções, com as paixões e revoltas. Isso
pode significar, de diferentes maneiras, graus de convergência e divergência
do sujeito com o mundo. Sem escolher a si mesmo não é possível configurar
um sentido para vida. Aliás, não há um só sentido, mas os sentidos que
somos capazes de criar. Escolher, portanto, é inevitável, e a escolha é a
possibilidade de configurar uma compreensão de tudo o que podemos ser
ou fazer no mundo.

Razão e emoção: a convergência afetiva


Na medida em que compreendemos como se dão as tomadas de decisões – a
feitura das escolhas –, nos deparamos com uma margem sutil e angustiante
Casa do Saber

que, embora conhecida, aflige: a ambivalência entre o querer e o poder. Isto é,


o descompasso entre o que almejamos e sua transformação em realidade, já
que não há uma correlação imediata de nossos desejos e a sua realização no

11
mundo. Por mais que nos habilitemos para algo, o destino é sempre incerto,
improvável e surpreendente.

Sob as impossibilidades de mensurar o por vir, nossa capacidade de


escolha se vê refém da conexão com aspectos pessoais e subjetivos que
respondam à incerteza do futuro. Qualquer tomada de decisão, portanto,
faz uso de argumentos racionais, assim como de expectativas depositadas
nas emoções (alegria, surpresa, medo, raiva etc.). Contudo, ainda que uma
escolha pressuponha o uso da emoção, caso os movimentos da vida se
dessem sem a baliza da racionalidade, assumiríamos que a convivência em
coletividade seria impossível. Logo, uma oposição entre razão e emoção é
fictícia, pois ambas não atuam como pratos diferentes de uma balança, mas
sim como convergência afetiva, pares de uma única moeda.

Se a tomada de decisões razoáveis pressupõe a unicidade entre emoção


e razão, também poderíamos ilustrar essa conexão por uma espécie de
cartografia do pensamento que tem o coração dos sujeitos como sede dos
pensamentos e emoções. Pulsante em seu repetitivo trabalho de nutrir o
corpo com sangue e oxigênio, o coração seria a morada onde o indivíduo
encontraria a harmonia dos barulhos do mundo com seus ruídos internos,
entre aquilo que lhe é mais frio e plausível e o que é mais explosivo e
incontrolável.

De acordo com a Instrução de Amenemope, obra literária do Egito antigo,


o coração é abrigo da escolha e por sê-lo, pode orientar a vida feliz,
assentando em sua musculatura uma zona de conforto que faz se tocarem
o racional e o sensível, o cômodo e o incômodo. Mais do que órgão vital,
a filosofia de Amenemope aloca no coração humano a capital de todo
nosso pensamento e emoção, vendo nessa conjunção de afetos um valor
positivo oposto a primazia da razão defendida pelo filósofo alemão Arthur
Schopenhauer (1788 - 1860), por exemplo.

O desafio humano, neste caso, não estaria na dualidade da escolha, nas


fissuras entre o querer e o poder, pelo contrário, ele nos habitaria desde
que nascemos, mobilizando todos os repertórios de experiências sociais,
emocionais e pessoais que nos tornam seres cautelosos e sensíveis,
igualmente. De tal modo, as dores do mundo não estariam entre escolher
bem ou mal, mas sim em como podemos nos apropriar de nós mesmos para,
Casa do Saber

enfim, conhecer o que somos, o nosso coração.

12
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: LIVROS

1.
2.
O mito de Sísifo
Albert Camus

3.
Um copo de cólera
Raduan Nassar
Casa do Saber

O ser e o Nada
Jean-Paul Sartre

13
4.

5. Um psicólogo no
campo de concentração
Viktor Frankl

6.

O erro de Descartes
António R. Damásio
A Arte de Ser Feliz
Arthur Schopenhauer
Casa do Saber

14
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: FILMES

1.

Um copo de cólera
(1999)

4.
Casa do Saber

Thelma and Louise


(1992)
15
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
VÍDEOS DA CASA DO SABER
NO YOUTUBE

1.
INDECISÕES, DÚVIDAS:
COMO ESCOLHER?
Luiz Hanns

clique na imagem para assistir

2.
A ILUSÃO DO LIVRE
ARBÍTRIO
Cláudia Feitosa-Santana

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Casa do Saber

16
3.
QUANDO NOSSAS DECISÕES
NÃO SÃO AS MELHORES
Fabiano Moulin

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4.
SOMOS LIVRES PARA
ESCOLHER?
Akira Guimarães

clique na imagem para assistir


Casa do Saber

17
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
CURSOS NA PLATAFORMA DE
STREAMING CASA DO SABER +

1.
VOCÊ É O QUE VOCÊ DESEJA
Daniel Omar Perez

clique na imagem para assistir

2.
FILOSOFIA E PENSAMENTO
Franklin Leopoldo e Silva

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Casa do Saber

18
QUAL É O SENTIDO DA VIDA?
FILOSOFIAS PARA PENSAR
NOSSO PROPÓSITO NO MUNDO
com Renato Noguera

2. APRENDER
4. SABER
Tem que correr, correr
Tem que se adaptar
Tem tanta conta e não tem grana pra pagar
Tem tanta gente sem saber como é que vai
Priorizar
Se comportar
Ter que manter a vida mesmo sem ter um lugar
Daqui pra frente o tempo vai poder dizer
Se é na cidade que você tem que viver
Para inventar família, inventar um lar
Ter ou não ter
Ter ou não ter
Ter ou não ter
O tempo todo livre pra você
O banco, o asfalto, a moto, a britadeira
Fumaça de carro invade a casa inteira
Algum jeito leve você vai ter que dar
Sair pra algum canto, leva na brincadeira
Se enfia no mato, na cama, na geladeira
Ter algum motivo para se convencer
Que o tempo vai levar
Que o tempo pode te trazer
Que as coisas vão mudar
Que as coisas podem se mexer
Vai ter que se virar para ficar bem mais normal
Vai ter que se virar para fazer o que já é
Bem melhor, menos mal, menos mal
Mais normal

‘Dois cafés’,
Tulipa Ruiz e Gustavo Ruiz
ÍNDICE:
4 APRESENTAÇÃO
5 CONHEÇA SEU PROFESSOR
7 QUEM PRODUZIU O MATERIAL
9 O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESSA AULA
9 RESUMO EXPANDIDO
9 LÍNGUA DE TOURO COM INHAME:
OS IORUBÁS E A PERCEPÇÃO DO MUNDO
11 FELICIDADE E SABEDORIA
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR NO TEMA DA AULA:
13 LIVROS
15 VÍDEOS DA CASA DO SABER NO YOUTUBE
17 CURSOS NA PLATAFORMA DE STREAMING
CASA DO SABER +
Casa do Saber

3
APRESENTAÇÃO

Neste curso, unimos diferentes mitologias e filosofias como forma de ampliar


e diversificar o seu olhar sobre o sentido da vida, uma das questões mais
importantes da filosofia.

Por meio de histórias mitológicas e do diálogo com notáveis pensadores de


diferentes épocas e continentes do mundo, você ganhará novos recursos para
refletir sobre suas escolhas e buscar o seu propósito na vida.

Os encontros foram idealizados com o intuito de percorrer o intenso e


emocionante caminho da vida, através de eixos fundamentais deste processo:
amar, aprender, escolher, saber e envelhecer.

Nesta aula, o saber é nosso objeto de análise e reflexão a partir,


fundamentalmente, da filosofia africana de Orunmilá tendo como fio condutor
a história mitológica iorubá do orixá Exu, do pensamento do filósofo grego
Epicuro de Samos (341–270 a. C.), e da socióloga nigeriana Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí
(1957-). O professor Renato Noguera irá abordar a ideia de sabedoria e
como ela dialoga com a filosofia na busca pelo sentido da vida, tendo como
perspectiva ampliada a felicidade.

Esperamos que este material potencialize a sua experiência ao longo do curso,


servindo como um guia prático e referencial ao longo desta jornada de cinco
aulas, e trazendo, fundamentalmente, um resumo do conteúdo abordado em
cada uma das aulas, além de muitas referências bibliográficas e audiovisuais
que te instigarão a explorar mais intensamente cada um dos temas.

Ricardo Nicolay
(Curador)
Casa do Saber

4
CONHEÇA SEU PROFESSOR: RENATO NOGUERA
É professor do departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


e conquistou o título de mestre em Filosofia pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCAR) e o doutor pela UFRJ.

É pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro),


sediado na UFRRJ, e coordenador do Grupo de Pesquisa Afroperspectivas,
Saberes e Infâncias (Afrosin). Renato Noguera está envolvido em diversos
projetos de pesquisa, entre eles destacam-se: “O que as crianças pensam
sobre a escola: imagens, palavras e infâncias na Educação Infantil e no Ensino
Casa do Saber

Fundamental”, e, “‘Modernidade’ na perspectiva da Crítica da Razão Negra”.


Coordena também o projeto de extensão “Brinquedoteca Pedagoginga”,
também na UFRRJ.

5
Escreveu, entre outros livros: Por que amamos: O que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor (2020), Mulheres e deusas: Como as divindades e
os mitos femininos formaram a mulher atual (2018), O Ensino de Filosofia e a
Lei 10639 (2015) e Nana e Nilo: que jogo é esse? (2012).

CLIQUE NO CÍRCULO
Casa do Saber

E ASSISTA AO VÍDEO:
CONHEÇA SEU PROFESSOR

6
QUEM PRODUZIU O MATERIAL

CONTEÚDO

Ricardo Nicolay
Curador

Danilo Kovacs
Curador assistente

Ronaldo Vitor
Curador assistente

REVISÃO E APROVAÇÃO

Ricardo Nicolay
Curador

DESIGN

Ana Luiza dos Santos


Designer

FALE COM A GENTE


suporte@casadosaber.com.br

7
SABER
Casa do Saber

Candomblé (1957), Djanira da Motta e Silva

8
O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA

- Sentido da vida: saber encontrar o caminho da felicidade


- Termo “visão de mundo” expressa adequadamente a prerrogativa
ocidental da dimensão visual
- Cosmopaladar: o gosto de viver e o desgosto
- Tetrapharmakon da filosofia epicurista

RESUMO EXPANDIDO

Língua de touro com inhame:


os iorubás e a percepção do mundo
Conta a cosmovisão iorubá que em um tempo muito antigo havia um reino
governado por Obatalá. Curioso para descobrir quem era a pessoa mais
sábia de seus domínios, Obatalá iniciou uma grande busca entre homens,
mulheres, crianças, escolas e casas de sua comunidade, mas nunca obtinha
sucesso. Certo dia, contudo, um senhor chamado Orunmilá apareceu e
lhe disse ser o maior sábio de todos os vivos. Desconfiado de tamanha
segurança, Obatalá colocou uma prova nas mãos do suposto sábio: ele
deveria cozinhar o prato mais saboroso já conhecido. Orunmilá retornou para
sua casa com pensamentos pujantes, “o que cozinhar para o rei?”, “que
temperos selecionar?”, “quais as melhores combinações para chegar numa
textura, cheiro e sabor ideal?”. Ainda que em dúvida, o sábio preparou uma
iguaria de sua especialidade: língua de touro com inhame.

Após alguns dias, Orunmilá retornou com seu prato para o rei, que crente do
fracasso do súdito, se espantou com tamanho prazer ao degustar a comida.
Nunca na vida ele havia provado algo tão gostoso. Porém, como bom rei
que era, Obatalá exigiu uma contraprova e ordenou que Orunmilá cozinhasse
o pior prato do mundo, pois todo sábio deveria ser completo e ponderado,
logo, capaz de compreender o bem e o mal. Orunmilá recebeu o pedido
com susto, já que cozinhar é a arte da melhora dos alimentos, da superação
Casa do Saber

de nossas experiências terrenas. Descrente de quais seriam os ingredientes


mais desagradáveis, os cheiros mais horripilantes e as aparências mais
nefastas, o sábio não hesitou em preparar o mesmo prato: língua de touro
com inhame.
9
Ao provar a criação de Orunmilá, o rei enojou-se, contorceu-se de desgosto e
pôde compreender que nunca havia comido nada tão terrível. Nesse instante,
seus olhos esbugalharam, sua boca ficou cheia de saliva e a língua amarga.
Obatalá, então, disse em voz alta para todos os presentes: “Descobrimos o mais
sábio dos homens!”.

Esta narrativa mitológica é fundamental para expressar algumas questões


nucleares da cosmovisão iorubá. Como um sábio pode ser definido por sua
habilidade culinária? O que sabedoria e conhecimento têm de próximo do
paladar? Ainda que incompreensível num primeiro momento, essa narrativa ilustra
como diferentes sociedades elaboram operações variadas de compreensão
do espaço e dos sujeitos. No caso do mito aqui descrito, o paladar é a fonte
ideal para que os sujeitos encontrem o gosto de viver e possam saborear as
experiências do cotidiano, alcançando a sabedoria.

Nesse ponto, vale destacar como a ideia ocidental de uma visão de mundo
compartilhada é limitada para encontrarmos um sentido em nossas vidas, já
que pelo elogio aos aspectos visuais/materiais ela exclui a riqueza do paladar,
da audição, do tato e de toda sorte de inteligências que outras sociedades se
apropriam para inscrever-se na realidade. No caso iorubá, por exemplo, o paladar
e a língua articulam um mapa capaz de traduzir sentimentos e idealizações em
saberes, como se a realidade não fosse palpável por sua concretude, mas
sim pelo amargor, pela doçura, pela salinidade e pela profusão de sabores em
comunhão.

Ainda nessa questão, segundo Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí (1957-), o termo “visão de


mundo” que se usa no ocidente para sintetizar a lógica cultural de uma sociedade
expressa adequadamente a prerrogativa ocidental da dimensão visual. Mas,
teríamos um resultado eurocêntrico se utilizássemos essa expressão para nos
referirmos a culturas que provavelmente dão prioridade para outros sentidos.
A qualificação “sentido de mundo” é uma alternativa de maior abertura para
descobrir a concepção do mundo de diferentes grupos culturais. Nesse sentido,
“visão de mundo” se aplica exclusivamente à descrição do sentido cultural
ocidental, e tenhamos como referência “sentido de mundo” para falar da
sociedade iorubá e de outras culturas que podem privilegiar outros sentidos ou
inclusive uma combinação deles. 1
Casa do Saber

1 OYĚWÙMÍ, Oyèrónkẹ́. La invención de las mujeres. Una perspectiva africana sobre


los discursos occidentales del género. Bogotá: Editora en la frontera, 2017.

10
Se na filosofia iorubá o saber é relacionado à alimentação, Orunmilá é sábio
por mover-se entre diferentes nuances capazes de mimetizar na língua do rei
a linguagem da vida. Ali, em cada tempero selecionado havia um repertório
não visível, porém rico em história e transcendência, em prudência e ação,
e prazer e horror. Não à toa, o prato cozido é língua de touro com inhame.
O primeiro ingrediente é um símbolo da comunicação e do alimentar-se,
mas sob o corpo do mais forte dos animais. Já o segundo, uma raiz capaz
de restaurar uma alegoria do que cresce e nasce da terra, ou melhor, das
tradições submersas que somente os sábios podem nos mostrar.

Felicidade e sabedoria

Quando falamos de “felicidade”, automaticamente somos lançados em um


campo de extrema nebulosidade. Este sentimento se desdobra em uma
das dúvidas fundamentais da vida humana: o que é a felicidade? De modo
geral, da Antiguidade até a contemporaneidade, o significado de felicidade
sempre se modificou, adquirindo contornos relativos até os dias de hoje. Os
primeiros pensadores que se debruçaram sobre os significados de ser feliz
estavam mais preocupados em decifrar os arcabouços da natureza humana e
da bondade do ser do que propriamente imersos em uma apreensão do que
faria parte de uma felicidade plena.

Epicuro de Samos (341–270 a. C.), filósofo grego do período helenista, ao


partir de um ponto de vista hedonista traçava relações com as principais
questões do prazer, da sabedoria e da diversão, a fim de colocar a felicidade
como uma categoria que agencia o homem em direção aos seus principais
desejos e que confere um sentido para a sua vida. A felicidade, para ele,
só poderia ser alcançada por meio de prazeres moderados que levam a um
estado de tranquilidade (ataraxia), a ponto da busca do prazer configurar
a própria definição de felicidade. Estas são categorias diretamente
proporcionais, portanto, o encontro com a felicidade seria uma das formas de
manutenção saudável do corpo e da serenidade de espírito.

“Tal como se escolhe como alimento, não o que é mais


abundante, mas o mais doce, também não é o tempo mais
Casa do Saber

longo, mas o mais agradável, que dá mais prazer.”

Epicuro em ‘Carta a Meneceu’

11
Por Epicuro podemos entender a felicidade como um caminho que deve ser
vivenciado no dia a dia, algo que nos conduz para a concretização do prazer
e para os bons relacionamentos individuais e coletivos, como a amizade.
Aliás, a amizade evidencia que ter amigos ao nosso redor e compartilhar as
lembranças com eles é uma forma de criar o equilíbrio entre os prazeres da
vida e o exercício da sabedoria.

Ocupar-se do que pensam os deuses seria tão inútil quanto temer a morte,
porque nos afastaria da vida e dos momentos que importam. Para Epicuro,
não era necessário temer as divindades porque ocupam o etéreo, então, não
estariam preocupados com a terrena vida humana. Portanto, cabe a este ser,
por meio da sabedoria, construir seu próprio caminho, fundado na prudência
e na felicidade. Durante a vida, enquanto houver o bem, seja ele pautado
pela prática das virtudes, pela convivência amistosa ou pelo exercício da
felicidade, não existirá dor ou sofrimento.

A filosofia de Epicuro estabelece a tetrapharmakon,


quatro remédios para alcançar a felicidade:

- Não se deve temer os deuses;


- Não se deve temer a morte;
- O bem não é difícil de se alcançar;
- Os males não são difíceis de suportar.

O sentido da vida, assim, passa pela sabedoria, compreendida como um


modo de nutrição existencial, ou ainda, entendido a partir do termo “nutrição
afetiva”. Assim como postulou Orunmilá, o gosto de viver é chave para
encontrar o sentido da vida.
Casa do Saber

12
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: LIVROS

1.
2.
A invenção das
mulheres
Oyèrónkẹ́ Oyěwùmí

3.
Carta sobre a Felicidade
Epicuro
Casa do Saber

Colonização, quilombos:
modos e significações
Antônio Bispo dos Santos
13
4.

5. Sabedorias para partilhar: 70


ensinamentos selecionados
pelo próprio autor
Mário Sérgio Cortella

6.
A arte de viver: o manual
clássico da virtude,
felicidade e sabedoria
Epicteto

Ensinando
Casa do Saber

pensamento crítico:
sabedoria prática
bell hooks
14
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
VÍDEOS DA CASA DO SABER
NO YOUTUBE

1.
SEI QUE NADA SEI: A
INVESTIGAÇÃO DE SÓCRATES
Maurício Marsola

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2.
O PRAZER DO CONHECIMENTO
Luis Mauro Sá Martino

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Casa do Saber

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3.
OBSTÁCULOS À FELICIDADE
Luiz Hanns

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Casa do Saber

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PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
CURSOS NA PLATAFORMA DE
STREAMING CASA DO SABER +

1.
APRENDER A VIVER
Maurício Marsola

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2.
NEUROCIÊNCIA
RAZÃO E EMOÇÃO

Cláudia Feitosa-Santana

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Casa do Saber

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QUAL É O SENTIDO DA VIDA?
FILOSOFIAS PARA PENSAR
NOSSO PROPÓSITO NO MUNDO
com Renato Noguera

5.
2. ENVELHECER
APRENDER
[...] A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer
A barba vai descendo e os cabelos vão caindo pra cabeça aparecer
Os filhos vão crescendo e o tempo vai dizendo que agora é pra valer
Os outros vão morrendo e a gente aprendendo a esquecer
Não quero morrer pois quero ver como será que deve ser envelhecer
Eu quero é viver pra ver qual é, e dizer venha pra o que vai acontecer
Eu quero que o tapete voe
No meio da sala de estar
Eu quero que a panela de pressão pressione
E que a pia comece a pingar
Eu quero que a sirene soe
E me faça levantar do sofá
Eu quero pôr Rita Pavone
No ringtone do meu celular
Eu quero estar no meio do ciclone
Pra poder aproveitar
E quando eu esquecer meu próprio nome
Que me chamem de velho gagá

‘Envelhecer’
Arnaldo Antunes, Marcelo Jeneci e Warthon Gonçalves
ÍNDICE:
4 APRESENTAÇÃO

5 CONHEÇA SEU PROFESSOR

7 QUEM PRODUZIU O MATERIAL

9 O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA

9 RESUMO EXPANDIDO

11 A VIRTUDE DO ENVELHECIMENTO

12 A MODERNIDADE E O DESCARTE DA VELHICE

13 COSMOFOBIA E COSMOFILIA

PARA VOCÊ SE APROFUNDAR NO TEMA DA AULA

15 LIVROS

17 FILMES

19 SÉRIES

20 VÍDEOS DA CASA DO SABER NO YOUTUBE


Casa do Saber

21 CURSOS DA PLATAFORMA DE STREAMING

3
APRESENTAÇÃO

Neste curso, unimos diferentes mitologias e filosofias como forma de ampliar


e diversificar o seu olhar sobre o sentido da vida, uma das questões mais
importantes da filosofia.

Por meio de histórias mitológicas e do diálogo com notáveis pensadores de


diferentes épocas e continentes do mundo, você ganhará novos recursos
para refletir sobre suas escolhas e buscar o seu propósito na vida.

Os encontros foram idealizados com o intuito de percorrer o intenso


e emocionante caminho da vida, através de eixos fundamentais deste
processo: amar, aprender, escolher, saber e envelhecer.

Nesta aula, o professor Renato Noguera apresenra o envelhecer como ideia


central para pensar o sentido da vida, mas não como estamos acostumados
a compreendê-lo. Será traçado um percurso a partir do mito grego de Ge-
ras (a personificação da velhice), da narrativa mítica iorubá de Nanã (a orixá
mãe que viu a origem do universo), e da história de Sidarta Gautama, ou Buda
(o homem que alcançou a iluminação), que serão refletidos a partir do livro
Saber envelhecer, do romano Cícero, e do pensamento filosófico do mes-
tre Antônio Bispo dos Santos (1959-), o Nêgo Bispo, sobre as categorias de
cosmofilia e cosmofobia.

Esperamos que este material potencialize a sua experiência ao longo do cur-


so, servindo como um guia prático e referencial ao longo desta jornada de
cinco aulas, e trazendo, fundamentalmente, um resumo do conteúdo aborda-
do em cada uma das aulas, além de muitas referências bibliográficas e audio-
visuais que te instigarão a explorar mais intensamente cada um dos temas.

Ricardo Nicolay
(Curador)
Casa do Saber

4
CONHEÇA SEU PROFESSOR: RENATO NOGUERA
É professor do departamento de Educação e Sociedade (DES), do Programa de
Pós-Graduação em Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Educação,
Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade
Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

Graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)


e conquistou o título de mestre em Filosofia pela Universidade Federal de São
Carlos (UFSCAR) e o doutor pela UFRJ.

É pesquisador do Laboratório de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Leafro),


sediado na UFRRJ, e coordenador do Grupo de Pesquisa Afroperspectivas,
Saberes e Infâncias (Afrosin). Renato Noguera está envolvido em diversos
projetos de pesquisa, entre eles destacam-se: “O que as crianças pensam
sobre a escola: imagens, palavras e infâncias na Educação Infantil e no Ensino
Casa do Saber

Fundamental”, e, “‘Modernidade’ na perspectiva da Crítica da Razão Negra”.


Coordena também o projeto de extensão “Brinquedoteca Pedagoginga”,
também na UFRRJ.

5
Escreveu, entre outros livros: Por que amamos: O que os mitos e a filosofia
têm a dizer sobre o amor (2020), Mulheres e deusas: Como as divindades e
os mitos femininos formaram a mulher atual (2018), O Ensino de Filosofia e a
Lei 10639 (2015) e Nana e Nilo: que jogo é esse? (2012).

CLIQUE NO CÍRCULO
Casa do Saber

E ASSISTA AO VÍDEO:
CONHEÇA SEU PROFESSOR

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QUEM PRODUZIU O MATERIAL

CONTEÚDO

Ricardo Nicolay
Curador

Danilo Kovacs
Curador assistente

Ronaldo Vitor
Curador assistente

REVISÃO E APROVAÇÃO

Ricardo Nicolay
Curador

DESIGN

Ana Luiza dos Santos


Designer

FALE COM A GENTE


suporte@casadosaber.com.br

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ENVELHECER
Casa do Saber

Mulher de cabelos verdes (1916), Anita Malfati

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O QUE VOCÊ IRÁ APRENDER NESTA AULA

- O envelhecimento é um processo que aumenta


as nossas capacidades
- É preciso assumir o tempo
- Modelos culturais paradigmáticos: cosmofílicos e cosmofóbicos
- Descolonização do pensamento
- Sociedades estáveis versus sociedades de crise

RESUMO EXPANDIDO
“Tataravô, bisavô, avô
Pai Xangô, Aganju
Viva Egum, babá Alapalá”
ALAPALÁ - Gilberto Gil

Poucos são os dramas humanos maiores do que a passagem do tempo e a


consciência de nossa finitude. Constatar a aproximação da morte e, logo, da
velhice, serviu de base para longas reflexões de nosso pensamento, cultura e
artes. No expressionismo, por exemplo, o envelhecimento foi tema de obras
de Van Gogh (Figura 1), ali entendido como as angústias da velhice; por outro
lado, a passagem do tempo também surge na pintura de Djanira da Motta e
Silva (Figura 2), que retrata um ritual indígena de puberdade.

Fato é que a consciência da morte e a linha cronológica que se estabelece


desde que nascemos inspira, afaga e angustia.

Ao mesmo tempo, é comum associarmos a maturidade com o acúmulo de


experiências. Seria então a aproximação da morte um jeito de descobrir o
propósito da vida? A vivência do tempo e de tudo que dele se desdobra nos
torna mais sábios e, logo, felizes?
Casa do Saber

9
FIGURA 1
Casa do Saber

At Eternity’s Gate (1820),


Vincent Van Gogh
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FIGURA 2
Ritual da Puberdade, Tribo da Canelas (1962)
Djanira da Motta e Silva

A virtude do envelhecimento

A filosofia ocidental tem por fim refletir as principais questões que


desestabilizam o ser humano ou, no limite, apresentam restrições amplas
para nosso desenvolvimento espiritual, pessoal e coletivo. Nessa lógica, uma
missão que se desmembra ao pensamento filosófico é “desbanalizar” aquilo
que é banal, questionando e aprofundando marcas de diminuição de nossas
potências intelectuais, sobretudo.

De acordo com Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.), uma ojeriza que permeia a
vida humana é o medo de seu fim, isto é, a indignação pelo envelhecimento
Casa do Saber

e o não aceitar a morte. Na medida em que haveria um conflito interno contra


algo incontornável (a passagem do tempo), desenvolveríamos um sentimento
banal de fragilidade, incerteza e preocupação; tornando a morte e o

11
envelhecimento objetos primeiros da filosofia. Segundo Cícero este caráter
de incipiente que veste o envelhecimento de banalidade deve ser enfrentado
pelo bom pensamento, permitindo ao sujeito um bem-estar consigo e com
sua comunidade.

O envelhecimento, portanto, não poderia ser compreendido como perda


de vida ou resistência ao futuro, mas sim como experiência temporal de
plenitude e apreciação das conquistas adquiridas ao longo do dia a dia. Sua
carga negativa não residiria nas marcas do corpo daquele que envelhece,
mas sim nos princípios coletivos que rebaixam tal etapa da vida. Tirando o
peso negativo da velhice daqueles que a experienciam, o autor trabalha com
reflexões que tomam a boa vida enquanto repositório de prática de virtudes,
de modo que sua filosofia parcimoniosa estabelecesse quatro pressupostos
naturais que definiriam a velhice:

- as limitações corporais na vida ativa


- o enfraquecimento do corpo
- a privação dos prazeres
- a proximidade da morte

Envelhecer, portanto, teria dimensões naturais a todos nós, o que não


implicaria o sofrimento ou mal-estar dos sujeitos. Pelo contrário, as restrições
do corpo poderiam ser compensadas pelo equilíbrio e reprodução de
virtudes (bons hábitos), especialmente a prudência, a temperança, a
coragem (a consciência do medo) e o senso de justiça.

Nesse argumento que ameniza a perda da força corporal em detrimento


de uma vida eticamente proveitosa, Cícero compreende que o medo da
passagem do tempo – e da morte – não pertence a natureza humana,
mas sim a cultura, aos valores plurais que agem na contramão de práticas
virtuosas e saudáveis. Só teme a velhice aqueles que não são gratos à
vida, e, por sua vez, só não são gratos os injustos, os imprudentes, os
destemperados e os covardes.

A modernidade e o descarte da velhice


Casa do Saber

Ao assumirmos com plenitude o fato de que o tempo modifica as coisas e


que a velhice é um fluxo incontrolável, por que ainda hoje ela é vista com
desdém e, em certa medida, marginalidade?

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Para além de qualquer reflexão sobre a virtude ou crise ética dos sujeitos, há
um pano de fundo que sustenta nossas interações sociais e que aloca nos
mais velhos a decadência das energias que movem o mundo: a modernidade.
Categoria sociológica e filosófica com amplo debate, a modernidade emerge
do colonialismo como uma espécie de culto ao produto e a produção, num
pensamento extrativista que elenca as singularidades e virtudes por padrões
quantitativos em que quem mais produz é quem vale mais. De tal modo,
ainda que indiretamente, a ideia do produzir está alinhada com a plenitude do
corpo e, assim, da juventude. A permanência do mundo moderno pressupõe
o louvor a juventude e o horror a infância e velhice, já que é o tempo de
nenhuma ou pouca habilidade produtiva.

Oposta às afirmações modernas, a ação de envelhecer nos coloca frente a


outro paradigma, o de que a vida não pode ser explorada ou usurpada pelo
trabalho. Ela mostra que o limite do corpo deve ser o tempo do prazer e
do aproveitar, algo como uma resistência à normatização e um desvio das
ordens de controle social. É por isso que o envelhecimento abre uma chaga
na ideologia moderna, expondo o esgotamento do culto à produtividade
e defendendo a valorização do cotidiano sob outras narrativas que negam
práticas colonialistas e extrativistas do corpo, dos grupos humanos e do
planeta.

Cosmofobia e cosmofilia

O mestre quilombola e lavrador Antônio Bispo dos Santos (1959-) é assertivo


ao apontar a existência de dois modelos culturais que tratam da ideia de
envelhecimento: as culturas cosmofílicas e as culturas cosmofóbicas.
A primeira dessas estruturas de organização coletiva abarcaria variados
povos africanos e indígenas, compondo uma tessitura que trabalha com
o envelhecimento enquanto um direito e dignidade merecidas ao sujeito
e ao grupo, a ponto dos mais velhos serem vistos como detentores das
experiências e dos conselhos que podem direcionar a vida comunitária.
Nessa lógica em que o passado e o ancestral podem ofertar para o presente,
haveria uma paz no mal-estar que contorna o envelhecer e até mesmo a
necessidade de expansão e conquista por parte desses grupos culturais.
Casa do Saber

Em outra face estariam as culturas cosmofóbicas, cuja definição passa pela


organização de seu poderio militar e interesses expansionistas, a ponto de
ter os produtos e a produção como símbolo de seus hábitos comuns. Nessas

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culturas em que a mercadoria toma a centralidade do sujeito, a juventude
é vista como fase ideal da vida, pois ali se desempenham os momentos de
maior performatividade e trabalho. O ponto central que articula o culto à
produção e a ânsia pela juventude nas comunidades cosmofóbicas, porém,
se dá na hierarquização etária entre as etapas da vida, já que ao se elevar o
jovem ao posto – tratado como máquina –, rebaixam-se os idosos, crianças,
mulheres, pessoas com deficiência e qualquer outro tipo que naturalmente
seja menos vigoroso para o universo dos ofícios. De modo geral, as culturas
cosmofóbicas são expansivas e pressupõem um traço de violência contra
o outro, a fim de manter rígidos padrões de hegemonia que passam,
necessariamente, pela invenção de tradições e de um passado glorioso.

Por ser fruto de uma ação cosmofóbica, o mundo contemporâneo amarra


a ideia de envelhecimento com o entendimento de perda da vitalidade,
impondo aos que envelhecem um estereótipo diminuto. Nessa hierarquização
que opõe saudáveis e problemáticos, desenvolve-se uma negação da
passagem do tempo, suprimindo uma fase natural da vida à condição
de problema para as gerações futuras. Negar os mais velhos é, de tal
modo, ocultar parte do que somos em detrimento de nossos produtos,
desconsiderando que a velhice é mais uma etapa natural que a vida tem a nos
apresentar.

Tal como apontou Cícero e as plurais visões cosmofílicas suprimidas com a


modernidade, compreender o envelhecimento enquanto processo capaz de
expor nossas virtudes ético-históricas é fundamental para amenizar nossa
angústia mais profunda: a morte. O pensamento moderno – e colonial – com
sua sede de controle nega que o tempo é incontornável, belo e agregador;
aceitá-lo não é assumir que falhamos, mas agir em direção ao pensamento
isento das imposições cosmofóbicas e a favor do contato simultâneo de
gerações. É assumir que a vida só se manifesta com o auxílio do antigo e que
sem ele seu sentido é, cada vez mais, incerto.
Casa do Saber

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PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: LIVROS

1.
2.
A invenção de uma
bela velhice
Mirian Goldenberg

3.
Velhos são os outros
Andréa Pachá
Casa do Saber

Saber envelhecer
Cícero

15
4.

5. Pra vida toda valer a pena


viver: pequeno manual para
envelhecer com alegria
Ana Cláudia Quintana Arantes

6.
A velhice
Simone de Beauvoir

O legado dos genes


Casa do Saber

Mayana Zatz e Martha


San Juan França

16
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: FILMES

1.
2.
Amour
(2013)

3.
Meu pai
(2020)
Casa do Saber

Cocoon
(1985)

17
4.

O exótico hotel Marigold


(2011)

5.
Casa do Saber

La vita davanti a sé
(2020)

18
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA: SÉRIES

1.

Os Experientes
2.
(2015)

3.
Método Kominsky
(2018)
Casa do Saber

Grace e Frankie
(2015)

19
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
VÍDEOS DA CASA DO SABER
NO YOUTUBE

1.
ENVELHECER, MEMÓRIA E A
IMPORTÂNCIA DO SONO
Fabiano Moulin

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2.
O TEMPO E O QUE
FAZER COM ELE
Clóvis de Barros Filho

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Casa do Saber

20
PARA VOCÊ SE APROFUNDAR
NO TEMA DA AULA:
CURSOS NA PLATAFORMA DE
STREAMING CASA DO SABER +

1.
TRANSIÇÕES DE VIDA
Luiz Hanns

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2.
O TEMPO E A MENTE HUMANA
Luís Mauro Sá Martino

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Casa do Saber

21

Você também pode gostar