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Santa Dulce e o

sacerdócio da
Vontade
perfil • 25.08.2022 • quinta de júpiter • balsâmica em leão • lunação leão-virgem

Agosto das Encruzilhadas


A soteropolitana Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes nasceu no dia 26 de maio de 1916 e
cresceu no coração da capital baiana. A freira brasileira, que se tornou a primeira santa
católica nascida nesse solo, “O Anjo bom da Bahia”, tem seu dia santo em agosto, no dia 13.

Para a Tradição de Bruxaria Mariposa agosto é mês de sagrações e celebrações, onde


honramos o sacerdócio da primeira garota perdida, nossa querida Grã-Mestra, Amanda Maia,
que nesse ano de 2022 completou 3 anos de iniciação, ou seja, de trabalho contínuo para a
Senhora das Encruzilhadas. O mês de agosto é todo delas. E das santas, das doces que
também comungam com a morte, o movimento, com a justiça e com a cura das mulheres.
Ishtar. Inana. Ísis. Atargatis. As Graças. Hécate. Deméter. Sélquis. Bastet. E Santa Dulce dos
Pobres, uma mulher que teve seu sacerdócio costurado pela Vontade de transformar a
realidade através de uma existência entregue a sua causa, ao compromisso com o ativismo
político e que ainda permanece viva enquanto egrégora de devoção, impulsionadora de ação.

O Anjo da Insubordinação
Quando menina, aos treze anos de idade, sua casa de infância, no Campo da Pólvora, no
centro pulsante da cidade-encruzilhada que é Salvador, ficou conhecida como o “portal de
São Francisco”, pois ela já reunia em seu lar pessoas em situação de rua para ali partilhar
alimento e acolhida, trabalho que exercia com sua irmã e tia, havia perdido a mãe aos sete
anos de idade por complicações em um parto e desde esse advento voltou-se para sua fé.
Nesse momento, reconhece o chamado para o sacerdócio e já demonstra desejo de dedicar-se
a esse caminho, mas ainda é muito jovem e só retoma essa vontade após se formar professora
em 1932. No ano seguinte se junta a congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada
Conceição da Mãe de Deus e após seis meses de noviciado professou seus votos, aos 19 anos
de idade, no dia 13 de agosto de 1933.

Aos 18 anos, no ano que ingressou na


congregação e iniciou seu noviciado

Seu trabalho nas ruas de Salvador foi contínuo ao longo de sua vida como sacerdotisa, na
linha de frente e em contato direto com as pessoas que estavam a margem, esquecidas e
doentes, assim como aquela que habita as encruzilhadas também se fez insubordinação e
desobediência para revolucionar sua realidade. Suas ações na rua não eram bem aceitas
dentro de sua congregação, mesmo assim ela não compreendia como poderia estar em outro
lugar que não ali: junto àqueles que mais precisavam de amor e acolhimento. Levou os
doentes e famintos que encontrava pelas ruas da cidade Soteria para onde pudesse, invadiu
um antigo mercado, da onde foi expulsa gentilmente, protegida sob o manto da cristandade.
Em seguida habitou os porões da Igreja do Senhor do Bonfim, até pedirem que retirasse seus
enfermos dali, por ser um local turístico, cartão-postal daquela sociedade.
O Hospital Santo Antônio começou a partir de um galinheiro, ao lado da congregação a qual
servia, se transformou em albergue até se firmar, após anos de luta, como a maior unidade de
saúde do Norte e Nordeste do país.

Foi cercada das pessoas que ajudava que em 1947 ela se colocou na frente da comitiva do
Presidente da República Gaspar Dutra, num ato revolucionário de desobediência civil que
visava abrir um diálogo político para que se conseguisse o espaço para cuidar dos enfermos
em situação de rua. Através desta ação Santa Dulce conseguiu visibilidade e apoio para sua
causa que gerou diversos frutos. Em 1948 improvisou em um galinheiro um abrigo para 70
doentes e após o encontro com o Presidente conseguiu fazer seu intento crescer, em 1960 o
espaço se tornou um albergue e, finalmente em 1983, um hospital que atualmente faz parte da
instituição Obras Sociais Irmã Dulce. E não parou por aí, seu diálogo com líderes políticos e
religiosos era parte constante do seu sacerdócio, sempre buscando dar luz à sua causa, usou
de toda a coragem, ímpeto e articulação que sua marte em Leão e mercúrio em Gêmeos
podiam lhe proporcionar.

Se engajou ativamente em movimentar seu propósito e afetar a realidade vigente, aos 22 anos
fundou a União Operária São Francisco onde se dedicou ao serviço social voltado para
incentivar cultural e socialmente a classe trabalhadora, impulsionando sua luta por direitos.
Para a sustentabilidade dessa iniciativa conseguiu apoio para a abertura de dois cinemas que
além de exibir filmes também habitavam concertos de música. Utilizava inclusive dessa
expressão artística para acolher a quem necessitava de seus dons, na década de 1930 fez uma
série de visitas a instituições de encarceramento baianas, onde tocava sanfona para os
detentos, trabalho que exerceu por mais de 20 anos até que suas visitas foram proibidas pelas
instituições.
A Revolução é Santa
Santa Dulce ilumina uma face, muitas vezes esquecida, de um sacerdócio: o ativismo
político; ações que alimentam o propósito através das relações em comunidade, a alteridade,
a capacidade de trocar e negociar na encruzilhada, de fazer acontecer pelo movimento em
uma realidade que necessita desesperadamente do Amor que brota da Noite. Enxergou por
cada rua onde trabalhou o divino naqueles que necessitavam de seu sacerdócio, suas ações
dedicadas a esse movimento, impulsionadas por sua Vontade empenhada, são inerentes de sua
existência e mais do que qualquer milagre a sagraram Santa.

Seu sacerdócio se fez na sua comunidade, e foi para o povo da rua a quem ela dedicou sua
Magia, trabalhou até o fim dos seus dias, vindo a falecer em 13 de março de 1992 e em 13 de
outubro de 2019 foi santificada após ter dois milagres reconhecidos.

Enquanto deus me der sopro de Vida, trabalharei

Irmã Dulce

Ao longo de sua existência suas ações ensinam a enxergar o divino em todos os lugares,
especialmente onde a moral cristã vigente fecha os olhos e se recusa a aceitar novas visões. A
causa de Santa Dulce estava além da cristandade, ela foi a insubordinação, o inconformismo,
a Vontade materializada de agir para mudar o mundo, e o fez. Seu legado está vivo, ainda
inspira e impulsiona, a instituição que fundou acolhe e ampara milhares de pessoas
mensalmente, além de ter criado parâmetros para o trabalho de serviço social em todo o país,
como a difusão de restaurantes populares e o trabalho em penitenciárias.

Santa Dulce habitou e ainda habita as ruas, em cada ato divino que brota do dom daqueles
dedicados a criação de novas realidades e honrá-la em agosto é enaltecer ações
comprometidas em serem chamas na escuridão, capazes de abrir caminho para novas formas
de pensar e assim como aquela que me guia e que criou a Tradição da Mariposa, Santa Dulce
trabalhou para a Encruzilhada, para a Revolução de realidades, sua existência foi a expressão
do seu dom pulsando em tempos de adversidade e evidencia a necessidade do empenho em
tempos de Guerra.

As suas ações não estão descoladas de quem você é, porque quem você é dá
exemplo daquilo que você acredita

Amanda Maia, Grã-mestra da Tradição de Bruxaria Mariposa

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