Você está na página 1de 20

Espetáculo musical livremente inspirado na vida de

Cícero Guedes, liderança do MST assassinado em


Campos do Goytacazes em 2013. Utilizando fatos
da biografia de Cícero, textos jornalísticos, poesia e
músicas compostas originalmente para a montagem,
“Meu nome é Cícero” reflete sobre as desigualdades
sociais, a injusta distribuição de terra, e sobre a luta
dos seres humanos por melhores condições de vida
numa sociedade que privilegia o lucro para os que
detêm mais dinheiro e poder. Três atores músicos-
cantores e uma atriz se revezam em diversos papeis
e discursos, materializando a saga não apenas de
uma personagem, mas de uma coletividade.
FICHA TÉCNICA
ELENCO
Adriana Medeiros
Arnaldo Zeus
Gualter Torres
Tim Carvalho

ROTEIRO E DIREÇÃO CÊNICA


Adriano Moura

ASSISTÊNCIA DE DIREÇÃO
Adriana Medeiros

LETRAS E MÚSICAS
Matheus Nicolau

PREPARAÇÃO VOCAL
Orlando Pacheco

DIREÇÃO MUSICAL
Matheus Nicolau
Orlando Pacheco

CENOGRAFIA
Gualter Torres

ADEREÇOS
Gualter Torres e Fabrício Simões
BANDA
André Rangel
Denisson Caminha
Matheus Nicolau

TÉCNICO DE SOM
Victor Mineiro

ILUMINAÇÃO
Fabrício Simões

COREOGRAFIA E PREPARAÇÃO CORPORAL


Edeilson Fernandes

FIGURINO
Ingrid Ribeiro

MAQUIAGEM
Fabrício Simões

ILUSTRAÇÃO
Magacho Couto

FOTOGRAFIA
Patrícia Bueno

DESIGN
Matheus Nicolau
MÚSICAS
01 - A Lágrima do Povo

A lágrima do povo
É o que chove no sertão
Tudo em volta é estorvo
Todo esforço é em vão

Lá o gado é só osso
Mandacaru vira pão
Me arribei inda moço
labutar grão por grão

Quem sua terra já deixou


Sabe o quanto pesa ver
O lugar que me criou
Na distância se perder

Mas não perco nas lembranças


O meu jeito assim de ser
De quem vive de esperança
Na espera por viver

Eu vim comendo a poeira pela estrada


Vinha faminto de rumo e chegada
Em cada lama ou calçada onde andei
Não encontrei um quinhão sem um patrão ou um rei
Não encontrei um quinhão sem um patrão ou um rei

Ah… eu não quero ser rei


Mas me cansei de penar
Ah… eu não quero ser rei
Quero o destino mudar
02 - De Boleia em Boleia

Eu vim de longe, de boleia em boleia


Me embrenhei na estrada velha
Pra abraçar a vida em mim

Eu vim de longe do sertão de alagoas


No meu céu tantas pessoas
No meu mar sonhos sem fim

Quem vem assim como eu


Sabe da vida o pior
Sentiu a fome dar nó
Sem sobrenome a danar

Quem vem assim como eu


Conhece a lida de cór
Fez sua vida em suor
Tanto penou pra chegar

Mas cheguei
Vim fazer história aqui
Mas cheguei
Respeite o lugar de onde eu vim
Mas cheguei
Vim bestado com meu matulão
Mas cheguei
Vim marcar meu lugar nesse chão
3 - Brava Gente

Como é lindo ver


Do verde a vida brotar
Ver o céu nascer
Do chão do nosso lugar

Pra quem planta sonho


A safra sempre há de ser
Muito além de um ganho,
Um jeito de agradecer

Como é lindo ver


O mundo do nosso quintal
Nele deve ter
A cura pra todo mal

Toda essa campina


É pouco parte de mim
Tudo aqui germina
Num sopro de um querubim

Aqui nessa terra o verde e eu somos um


Sorrimos ao sol, brilhamos por causa em comum
A água me alenta e a luz me esquenta também
Assim como o verde, eu vivo o que a terra provém

Sou brava gente semente e agente de um tempo de paz


No brava gente tem vida entre os dentes e fome jamais
4 - Verde

No princípio era o verde


E o verde era Deus
Dele tudo se obteve
Fez-se luz em todo breu

Mas do verde se fez verba,


Habitando entre nós,
Novo deus de toda guerra
Para a Terra um novo algoz

E onde antes mata verde havia


Abriram um clarão pra verba entrar
E um deus que quem quisesse verde via
É terra onde eu não devo mais pisar

Verde que sofri


Verde tanto rei
Verde sem tamanho
Verde tudo eu vi
Verde longe eu sei
Verde meu que sonho

No princípio era o verde


E o verde era Deus
5 - Quanto vale o sonho?

Quanto vale o sonho


De ter seu quinhão de terra
Perto de onde o galo berra
Pra plantar o que comer

Quando vale o sonho


De ter minha própria horta
Uns porquinhos na engorda
Jeito simples de viver

Deve valer menos


Que o sonho de magnata
Que bebe água importada
Que não sabe desse chão

Ele vem de longe


Pra tirar nosso sustento
Diz que seu empreendimento
É o futuro da nação

Quanto vale o sonho?


Depende de quem sonha
Quanto vale o sonho?
Depende o quanto ganha

Quando vale o sonho


De ter tudo num segundo
Ser mais rico desse mundo
Sem penar pra conseguir

Quanto vale o sonho


De ter grandes edifícios
Sem deixar nenhum indício
Do que fez pra construir

Deve valer menos


Que esse sonho caipira
De quem muito se admira
Com a riqueza desse chão

Eles não entendem


Como é sonhar pequeno
Porque o pouco só faz pleno
Quem tem grande coração
6 - Tá pra nascer Cabral

Vou te contar uma história


Você deve conhecer
Tem mais de 500 anos
E até hoje faz doer
Mas o povo é sem memória
Tem costume de esquecer

Acho que inté imagino


A história que cê vai contar
É de quando os homens branco
Invadiram esse lugar
O portuga que se achava
Dono do maior cocar

Isso mesmo meu amigo


Foi um tal de seu Cabral
A mando de um rei das Europa
Invadiu o litoral
E foi logo avisando
“Agora é tudo Portugal”

Quem aqui já habitava


Até tentou fazer motim
Logo foram dominados
Foi matança sem ter fim
Mas os índios arredio
Até hoje cantam assim

Ninguém arreda não


Ninguém arreda não
A gente aqui nasceu
É nosso esse chão

Ninguém arreda não
Ninguém arreda não
Tá pra nascer Cabral
Que engane a nação

Veja só que coincidência


Há pouco tempo aconteceu
Veio aqui outro Cabral
Esse o povo que elegeu
Foi eleito pelo povo
E do povo se esqueceu

Ele veio pra essas bandas


A mando do capitalista
Se encantou com nosso mar,
Terra a perder de vista
E foi logo avisando
“Agora é de Eike Batista”

Quem aqui tivesse terra


Era pra arredar o pé
Tudo desapropriado
No valor que bem quiser
Cadeado do diabo
Na porteira do seu Zé

Mas a gente vai à luta


Nossa guerra é pelo bem
Pra acabar com nosso sonho
Não vai ser qualquer vintém
Nos juntamos com os índios
Pra cantar assim também
7 - 5 pães e 2 peixes

Com 5 pães e 2 peixes


A multidão saciou
Nós te pedimos que aceite
Nossas migalhas, senhor

Com 5 pães e 2 peixes


Que um pobre menino lhe deu
Receba o pouco que temos
Foi tudo que a safra rendeu

Aceite nossa labuta


Do grão faça a fruta
Não deixe faltar
Que brote fartura do nosso lugar
Nas mãos calejadas de quem mais batalha
Destrói o açoite, a fome e a mortalha
As nossas misérias transforma, Senhor

Se de Oxalá tudo provém


Não há de faltar para ninguém
Nosso ganha-pão Deus que mantém
Toda vez que o dia vem

É um imenso dom multiplicar


Pra quem distribui não vai faltar
E dois peixes enchem todo mar
De quem sabe partilhar
8 - Feira

Nem toda feira vende o que brota do chão


Nem tudo aquilo que cultiva é pra comer
Nem tudo que é semente tá pra plantação
Nem tudo que existe o olho pode ver

Na nossa feira tem banana, tem mamão


Tem mandioca, milho, azeite de dendê
Queijo da roça, tem farinha, tem feijão
E um novo jeito de fazer acontecer

Vem fazer a feira, vem pra festejar


Comemorando a fartura e a partilha
Chama toda a família
Quem quiser pode chegar
Vem fazer a feira, vem pra festejar
A nossa feira é só pra fazer renda
É pra que a cidade entenda
Nosso sonho de mudar

Na nossa feira tem comida de verdade


Não tem veneno, tudo aqui é natural
O fruto orgânico é a grande novidade
Também faz parte da mudança social

Todo produto aqui é fruto da vontade


Que um dia o bem vire manchete no jornal
A gente vende uma nova humanidade
A nossa feira é pelo mundo mais igual
9 - Na Curva do S

É mais um corpo pelo chão


É mais um morto do sertão
E essa batalha pela terra
Mata mais gente que outra guerra

Na Curva do S
O sonho ainda sangra,
O sol ainda é sombra
E sempre será

Na Curva do S
O som é um socorro
que mesmo em silêncio
Insiste em soar

Na Curva do S
Seguimos em prece
Ainda adoece pensar
Que a qualquer curva
O S será sepultura
Seremos ceifados só por sonhar
10 - Aviso

Tem uma voz mandando te avisar


Que é bom tomar cuidado
Que tem um cerco armado
Pra te apagar

Perigo em toda esquina


Cê já conhece a sina
De quem se rebelar

O medo é um aliado
Que anda ao nosso lado
Derrotas do passado
vivem a assombrar

Tem uma voz mandando te avisar


Que numa rua escura
O mal que te procura
Pode te alcançar

É bom ficar esperto


Que pode ser de perto
O autor do seu azar

Num dia inesperado


O fim é decretado
O povo feito gado
Ou é morto ou se deixa marcar

Eu vim te avisar
Que há perigo em toda parte
Eu vim te avisar
Que o inimigo é mais covarde
Eu vim te avisar
Que é sempre um risco andar sozinho
Eu vim te avisar
Das armadilhas do caminho
11 - Ocupa ou não?

Chegou nossa hora


É tudo pra agora
E a gente não pode errar

Nós vamos bem cedo


E vamos sem medo
Marcar o nosso lugar

É sem alvoroço
Os homi é maldoso
E a gente não tá pra brincar

É bom ter cuidado


O mal vive ao lado
Ninguém sabe de onde virá

Depois desse tanto


De fome e pranto
Que só quem viveu pra dizer
É só teimosia
Aquilo que guia
Quem ainda sonha vencer

Ocupa ou não?
Ocupa sim!
Ocupa ou não?
Ocupa Sim!
Nós vamos fazer o forró
E é pra fazer até o fim
12 - Vamos à Luta

Quem sonha junto não morre


Tá vivo em quem segue sonhando
No breu sua sombra socorre
Nos seus passos vou me guiando

Na luta que juntos travamos


Não houve batalha perdida
Vivemos a lembrar os dados
Pra história não ser repetida

E assim quem a morte levou


O nosso destino é levar
Não há o que pare essa dor
E nem dor que vá nos parar

Vamos à luta
Encarar o medo de frente
Quando se junta
Não existe quem possa com a gente
Nossa missão pelo chão, pelo pão, pela vida
Seguimos de cabeça erguida
A luta jamais se encerra
Enquanto houver gente sem terra

Você também pode gostar