O Trabalhismo e a Quarta Revolução Industrial: trabalho, educação e
economia política.
Por: Daniel Albuquerque Abramo
O futuro se avizinha para nós e já começou para alguns países da Ásia,
da Europa e da América do Norte. A Quarta Revolução Industrial não é mais uma miragem do futuro, mas uma realidade construída neste exato momento. O período histórico clama por profundas alterações institucionais na maior parte dos países do globo. Novas cadeias produtivas já começam a gerar novas formas de organizar a produção e com isso causam profundas alterações no mundo do trabalho. Nós, os trabalhistas, devemos olhar para este momento com um duplo ponto de vista: se por um lado as alterações nos meios de produção e na acumulação capitalista causam um evidente aprofundamento da luta de classes e maior exploração de nossos trabalhadores, é exatamente nos períodos de Revolução Industrial e alterações na divisão internacional do trabalho que uma nação subdesenvolvida e dependente como a nossa pode se reinserir no sistema internacional e dar um salto econômico pulando etapas, em termos de qualidade, de seu processo de desenvolvimento. Porém, cabe entender, essa é uma luta política tanto nacionalmente quanto ao nível internacional. Essa não se trata de uma luta individual, mas da luta da coletividade brasileira. Nesse sentido, é possível notar que, se por um lado as grandes empresas como UBER e IFOOD exploram nossos trabalhadores em grande escala e participam de um processo de redução de direitos e proteções trabalhistas, sua atuação, pela forma absurda como se dá, gera a possibilidade de um debate direto e de nossa organização com os trabalhadores sobre pautas históricas do Trabalhismo Brasileiro, como a questão anti-imperialista e a crítica sobre a posição predatória de tais empresas no processo de acumulação capitalista. Mais do que isso, gera a possibilidade de engendrar uma resposta adequada, ou seja, que proteja e beneficie os trabalhadores e todo nosso povo para reorganização do mundo do trabalho no presente período histórico de desenvolvimento do capitalismo. Os acontecimentos e as transformações no cenário internacional criam espaço para transformação e para o acirramento consequente da luta de classes em nosso país e vanguardismo institucional. Engana-se quem pensa que o imperialismo é um fenômeno do passado. Atualmente, o sistema econômico global ruma de forma acelerada para um nível nunca observado de exploração da maioria da população mundial e para a acumulação de capital na mão da classe dominante dos países centrais, em competição econômica com a China. Os países desenvolvidos manipulam nações emergentes e o sistema internacional a seu bel-prazer e lucram com a escravidão dos tempos modernos, com a desinformação e também com a guerra. Isto se dá por um processo fruto da pós-dissolução da URSS, da aceleração da globalização sem maiores oposições e das consequências de suas assimetrias entre países centrais e países periféricos, bem como do próprio aprofundamento da divisão política e econômica do globo na divisão internacional do trabalho. Tal processo é centrado em uma padronização universalizada, na forma de uma imposição muitas vezes acrítica do modo de governo e organização de Estados, sociedades, sistema político e economias. À imagem e semelhança, ainda que economicamente inversa (polo financeiro e tecnológico para países centrais; polo fabril montador, polo exportador de matéria-prima para periféricos), de seus tutores associados aos países centrais do sistema capitalista, para facilitar o fluir do capital “livremente” pelo mundo em sua versão virtual, informações e dados, e principalmente de seu átomo real e material: as mercadorias. Porém, ao contrário da vitória eterna e absoluta para o ocidente geopolítico e sua visão de mundo e forma de governar e organizar Estados e Nações, que foram proclamadas ao colapso da antiga URSS — no ato que pareceu marcar uma suposta impossibilidade de alternativa contrária ao capitalismo ocidental — os tempos que vivemos parecem demarcar uma nova e forte luta ideológica, com futuro ainda incerto e a possibilidade de novas formas de organização e importantes inovações institucionais. É imperativo que o Trabalhismo Brasileiro tenha as respostas para tais questões históricas e que estas soluções sejam autênticas e sigam os valores históricos de nossa teoria e cultura política. Exatamente por isso, não devemos olhar o presente momento com covardia. O avanço tecnológico não é ruim ou explora os trabalhadores por si. Pelo contrário, devemos entender essa questão, também, como uma questão de classe. Sob poder da classe dominante, todo avanço científico-tecnológico, sobretudo os que mais impactam no avanço das forças produtivas, e, portanto, na organização do modo de produção, não demonstra carácter emancipatório de rompimento ou mínima reforma racional do modo de produção capitalista, mas sim de aumento da exploração. Não devemos nos esquecer nunca de que o avanço tecnológico pode tanto servir para explorar, se a modernização é passada da perspectiva da classe dominante, quanto pode servir para libertar e redimir, se a modernização é executada sob a hegemonia da classe trabalhadora. Por isso, temos um dever urgente com o povo brasileiro, pois essa é uma luta fundamentalmente política. Os trabalhistas devem encarar tal momento histórico com confiança, pois existem soluções para nossos problemas e elas são observáveis na história do Brasil, do trabalhismo e na experiência internacional. Portanto, devemos agarrar essa oportunidade histórica em nossas mãos, mais do que qualquer outro grupo político. A própria Revolução de 30, cujo trabalhismo é fruto, e a industrialização brasileira no século XX nos indicam um caminho. Nós, que somos do partido de Brizola e Darcy Ribeiro, o partido dos CIEPs, temos muito o que pensar sobre este tema, de forma ampla e estratégica. Experiências internacionais, sobretudo na Ásia, como as da China, Coreia e Japão, nos dão pistas sobre políticas públicas coerentes e equívocos que podem ser cometidos em tal processo. Para tal, é necessário que reflitamos profundamente sobre a educação necessária para adequar nossos jovens a essa realidade disruptiva das novas tecnologias, bem como formas e mecanismos de organizar o mundo do trabalho para gerar o máximo de empregos formais relacionados a essas novas cadeias. Um bom exemplo para refletir, seria a criação de alternativas nacionais viáveis e competitivas para alguns dos serviços ofertados por plataformas e aplicativos internacionais, um retorno a ênfase nas fontes renováveis e sustentáveis de energia, bem como um foco no setor cultural relacionado às novas cadeias produtivas e uma visão especialmente voltada para a indústria de jogos, setor em que o Brasil é grande consumidor e ainda produz pouco e tem capacidade para se inserir bem. Também é necessário que o Brasil aproveite para se inserir em novas áreas produtivas que atualmente ainda começa desenvolver, como o setor de chips e de todo o maquinário necessário para produzir os produtos eletrônicos e tecnológicos que utilizamos diariamente. Evidentemente, não devemos nos restringir a apenas tais setores, embora estas sejam áreas onde o Brasil pode se inserir com maior facilidade e mais rapidamente. Devemos observar bem de perto também o setor da robótica, do maquinário agrícola relativo às novas tecnologias, o setor naval, o setor nuclear, o setor aeroespacial, e todas as cadeias produtivas de tecnologia fina relacionados a estes. No caso do sistema educacional japonês, por exemplo, um fetiche sobre o ensino tecnológico, parte da visão de mundo neoliberal que defende o fim da “filosofia” gerou grande deficiência de formação em ciências humanas e atrapalhou o próprio processo de planejamento político e econômico do país. Algo similar foi promovido em território brasileiro com o “Novo Ensino Médio” proposto pelo golpista Temer, com o agravo de que retira horas das ciências humanas na formação de nossos alunos, e nem sequer coloca em prática um plano coerente de ensino técnico voltado para as demandas contemporâneas. No caso coreano, houve uma mistura entre esse modelo de ensino, sem desprezar a questão cultural, dominando amplos setores culturais e de mídia que antes eram ocupados por produto culturais japoneses. O Brasil deve evitar os equívocos do modelo japonês e aprender com os acertos do modelo coreano e do modelo chinês. Alguns exemplos positivos podem ser observados na cidade de Niterói, com a iniciativa de municipalização, reforma e modernização de CIEPs e a construção de Plataformas Urbanas Digitais — centros tecnológicos de última geração que atuam na formação profissional e técnica dos alunos, tendo como porta de entrada as atividades lúdicas. Se certos aprendizados do modelo coreano ou do modelo chinês, por exemplo, onde se utilizam imensos centros tecnológicos públicos para a mesma finalidade, forem incorporados na estratégia de Plataformas Digitais Urbanas, esta pode se tornar ainda mais eficiente e atrair e formar ainda mais jovens para essa nova realidade. Nesse sentido, uma experiência se torna inescapável para esse debate, pela sua proximidade histórica e geográfica. Evidentemente falamos do caso da educação pública no Ceará, em especial, na experiência de Sobral, que incorpora aprendizados de todas as experiências citadas acima, e se tornou o maior exemplo de inovação institucional e tentativa brasileira bem sucedida de adequação ao que a nova realidade da quarta revolução industrial nos impõe. Entrar nessa reflexão sem pensar na experiência de Sobral seria um imenso absurdo e uma grande injustiça. O Brasil é o segundo país do mundo, perdendo apenas para a África do Sul, com o maior número de “jovens nem-nem”, ou seja, jovens que nem estudam e nem trabalham. A formação educacional e profissional, a criação de vagas de emprego e a inserção de tal força de trabalho no mercado a médio prazo se trata de uma boa medida para o crescimento econômico como um todo pela quantidade de jovens nessa situação. Esse é um dos maiores e mais sérios gargalos que impedem o Brasil de aproveitar o presente momento histórico e superar sua condição de dependência econômica para com o estrangeiro. Se nosso país quiser prosperar na Quarta Revolução Industrial, se reindustrializando em novos marcos, competindo de fato na disputa técnico-científica global, pulando etapas, em termos de qualidade, no processo de desenvolvimento de suas forças produtivas, deve então elaborar um sério e meticuloso programa de educação em tempo integral ao nível nacional, com um generoso enfoque em profissionalização voltada para as novas tecnologias que não seja exclusivamente para formar trabalhadores para o setor privado, mas cidadãos completos. Para tal, terá de superar outro grande obstáculo comum a todos os países emergentes com grandes projetos educacionais públicos: o problema do financiamento. Isso implica em uma grande luta política e mobilização de massas contra a classe dominante, em benefício da educação pública, na batalha pelo orçamento público. Além disso, é indispensável uma articulação entre governo, estatais e setor privado para absorver essa gama de jovens e trabalhadores qualificados em um processo de reindustrialização sustentável. Tudo racionalmente planejado conforme a cultura local e as aptidões de cada região de nossa nação. Mais do que nunca o futuro pensado por Darcy Ribeiro e Leonel Brizola precisa ser perseguido. Um futuro em que nossos jovens recebam a melhor educação possível e todos os mecanismos e ferramentas que pudermos lhes oferecer para redimirem o destino de nossa pátria e nossa sociedade. Isso será nossa vitória total, social e política. Mas, sobretudo, também será nossa vitória econômica e a vitória do futuro de nossa classe trabalhadora, do povo brasileiro e de nossa nação.
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