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PROJETO GIRASSOL: PSICOMOTRICIDADE AQUATICA COM CRIANÇAS

AUTISTAS

Déborah Crystina Souza e Silva


Esp. Educação Especial – SEED-SE, NUPIEPED-UFS.
Cândida Luísa Pinto Cruz
Mestranda em Educação pelo PPGED- UFS

Rita de Cácia Santos Souza


Dra. em Educação, Docente da UFS e NUPIEPED.

Eixo temático 11 – Educação Física e Esportes


Relato de experiência

RESUMO

Apresentamos neste artigo o Projeto Girassol realizado na cidade de Paulo Afonso –


Bahia, o mesmo contempla atividades corporais no meio líquido tendo como foco a
psicomotricidade e a natação. Atende crianças, adolescentes, jovens e adultos com
autismo como fator de desenvolvimento corporal e social dos mesmos. O projeto é
desenvolvido por docentes e discentes dos cursos de Pedagogia e Educação Física de
duas instituições de ensino superior da cidade. São promovidos atendimentos
específicos às pessoas que por estarem afastados de cidades centrais tem dificuldade de
acesso a atendimentos terapêuticos diversos. A metodologia utilizada consta da ação-
reflexão-ação, por meio sistemático e contínuo. É efetuada uma avaliação inicial e
observação constante e relatório trimestral. O objetivo deste método foi avaliar a
resposta motora e a socialização entre as pessoas autistas, foi elaborado instrumento
avaliativo pelos investigadores, contendo dez questões a serem avaliados de acordo com
uma escala. As primeiras conclusões apontam para a efetivação participação das pessoas
com autismo nas atividades desenvolvidas e dos seus familiares, tem propiciado o
desenvolvimento das pessoas em diferentes áreas como a corporal, social, linguístico e
cognitivo. A importância do projeto encontra-se nas ações pedagógicas, natação e de
psicomotricidade aquática para pessoas com autismo, promovendo mudanças na vida de
cada pessoa assistida nas diferentes atividades, diminuindo as estereotipais e
aumentando a interação social.
PALAVRAS-CHAVE: Autismo. Atividades aquáticas. Atividades pedagógicas.
Psicomotricidade.

INTRODUÇÃO
O trabalho em pauta apresenta o projeto Girassol – Apoio Educacional
Multidisciplinar a Pessoas com Transtornos Espectro Autistico – TEA, que é
desenvolvido através de ações colaborativas entre instituições como: Faculdades,
Universidade, Vila Militar e tem financiamento através do Programa de Extensão
(PROEX) da Universidade do Estado da Bahia, com discentes e estagiários dos cursos
de Pedagogia e Educação Física, além de docentes das respectivas áreas. É importante
destacar a existência no projeto das atividades de Natação e da Psicomotricidade
aquática como atividades complementares e como recursos educacionais na atenção a
pessoa com autismo. Para o detalhamento da pesquisa utilizamos como objetivo geral:
Desenvolver a psicomotricidade no meio aquático para pessoas com TEA, favorecendo
o desenvolvimento da coordenação motora e da socialização; E os seguintes objetivos
específicos: Aplicar a psicomotricidade aquática no desenvolvimento da coordenação
motora e sociabilização; Desenvolver o processo de interação entre os autistas, o meio
aquático e a socialização.

A relevância do projeto encontra-se na prestação da promoção de atividades


planejadas e fundamentadas para o desenvolvimento das potencialidades das pessoas
com TEA e atenção aos seus familiares. São criados espaços coletivos de estudos,
reflexão, discussão e apoio pedagógico aos autistas e seus familiares envolvendo
atividades pedagógicas e de psicomotricidade aquática, diversas áreas utilizam a
psicomotricidade em diferentes contextos e em diferentes faixas etárias (escolas,
clínicas de reabilitação, hospitais, etc.). Nessa perspectiva, buscamos a psicomotricidade
de modo a estabelecer conexões necessárias para o desenvolvimento de uma prática
pedagógica que respeite as especificidades de todos os alunos e pessoas, independente
de sua condição física, sensorial, cognitivo, étnica e social.

DESENVOLVIMENTO

O Autismo foi descrito cientificamente pela primeira vez por Leo Kanner,
medico psiquiatra infantil em 1943, através da observação de 11 crianças com as
características particulares de comportar-se com pessoas e objetos, distúrbios de
linguagem e falta de imaginação.
A Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID 10-1,
considera o Autismo infantil como, “Autismo Infantil é um transtorno invasivo do
desenvolvimento definido pela presença de desenvolvimento anormal e\ou
comprometido que se manifesta antes da idade de 3 (três ) anos o transtorno ocorre em
garotos três ou quatro vezes mais frequentes que em meninas.” Há em geral
incapacidade na utilização social, tanto da linguagem verbal quanto corpórea. O
comportamento é geralmente realístico e agregado a rotinas de vida anormais,
resistência a mudanças, ligação a objetos estranhos e padrão de brincar estereotipado. A
capacidade para pensamentos abstratos e simbólicos fica diminuída, a inteligência tem
variações de subnormal a normal, ou acima.
Em 1907 Dupré, criou o termo psicomotricidade destacando o paralelismo do
desenvolvimento motor e da evolução intelectual junto aos débeis mentais. O
pensamento, o conhecimento, o raciocínio, são adquiridos a partir de certo número de
conceitos de base, que não podem ser transmitidos unicamente pelo ensino verbal, mais
necessitam de uma vivência motora, uma vivência corporal da relação com o mundo e
com as pessoas. Experiência que se adquire pela manipulação do seu corpo, dos objetos,
na realidade do espaço–tempo.

A Psicomotricidade é definida por COSTE, 1992 como: a ciência encruzilhada


com diversas áreas de estudo como a biologia, a psicologia, a psicanálise, a sociologia e
a linguística. Estuda o homem e suas relações com o corpo ao tempo que desenvolve as
faculdades expressivas do individuo. É fundamentada por conhecimentos básicos como:
o movimento, o intelecto e o afeto. Esses conceitos são importantes quando analisamos
as dificuldades e características das pessoas com autismo, desenvolvimento atividades
direcionadas a necessidade de cada pessoa. A psicomotricidade no meio aquático é
baseada em atividades que estimulam o individuo a se conhecer, a aprender, a aceitar,
ajustando o comportamento e ao longo das atividades.
A psicomotricidade aquática com as crianças com Transtorno do Espectro
Autista TEA nos desafia a trabalhar aspectos do desenvolvimento integral de cada
criança. Sobre esses desafios ORRÚ (2012), define que “o autismo é um distúrbio do
desenvolvimento neurológico que se manifesta através de dificuldades marcantes e
persistentes na interação social, na comunicação e no repertório de interesses e de
atividades”. Essas dificuldades podem se agravar caso não ocorra atividades
educacionais e terapêuticas para reduzir esses comportamentos. Para FERREIRA, 2002,
p. 114 “os comportamentos motores que caracterizam a patologia são os balanços, a
contração de grupos musculares, a marcha na ponta dos pés, as flexões bruscas do corpo
para frente e as automutilações que se manifestam por meio de mordidas, batidas de
cabeça, etc.” é necessário colocar que os autistas tem dificuldades na coordenação
dinâmica geral e necessitam de estímulos psicomotores como através das atividades da
natação. Por ser uma atividade física que ocorre no meio líquido propicia na criança a
organizar seu corpo no tempo e no espaço utilizando todos os elementos psicomotores,
auxiliando na construção do seu esquema corporal e o desenvolvimento de conceitos
básicos da aprendizagem.
A psicomotricidade foi frequentemente descaracterizada, por uma metodologia
de exercícios denominados psicomotores, que encerraria novamente o corpo dentro dos
limites estreitos do pedagogismo intelectual, sem levar em conta a pessoa e seu corpo.
Corroborando DAMASCENO, 1997, destaca que a aquisição de qualquer habilidade
está por sua vez fortemente relacionada com o propósito do ato, logo o ato motor não é
um processo isolado, pois sua significação emerge da totalidade da personalidade.
Assim, o esquema corporal, ao refletir o equilíbrio entre as funções psicomotoras e sua
maturidade, de um conjunto funcional organizado, através da relação mútua organismo-
meio. Para DAMASCENO (1992, p.6), “a natação e a psicomotricidade estão inter-
relacionadas e confundidas como aspectos indissociáveis de uma mesma realidade”.
Ambas contribuem para a qualidade de vida, interação, sensibilidade exteroceptiva,
interoceptiva e proprioceptiva na pessoa com autismo.

O PROJETO GIRASSOL

O Projeto Girassol –Apoio Educacional Multidisciplinar a Pessoas com TEA, A


Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus de Paulo Afonso, situado no
semiárido do Nordeste. As atividades de extensão é um dos princípios das instituições
de ensino superior, a Universidade do Estado da Bahia, através da Pró-reitoria de
Extensão, articula ações sócio pedagógicas através do Núcleo de Pesquisa e Extensão
em Educação Especial e Inclusiva. O Projeto está ligado ao Colegiado do curso de
Pedagogia do Departamento de Educação e do curso de Educação Física - Campus VIII
- Paulo Afonso, iniciou suas atividades em julho de 2012, inicialmente com um grupo
de 10 crianças com TEA-Transtorno do Espectro do Autismo, em 2013 este número foi
triplicado passando a atender 30 pessoas com TEA, entre crianças, adolescentes e
jovens, com diversas ações voltadas para as pessoas com autismo e suas famílias, em
atendimento a uma demanda reprimida trazida por profissionais da educação básica e
familiares de pessoas com autismo.
Atualmente o projeto atende 60 pessoas com TEA, com idade que varia de 02 a
36 anos, o seu funcionamento ocorre semanalmente nos turnos vespertino e matutino,
no contexto socioeconômico do semiárido, no raio de 300 km, somos a única
experiência desta natureza, tanto em nível público ou privado que realiza trabalho
socioeducativo, cognitivo e motor, atendendo toda região circunvizinha pela sua
localização central entre Alagoas, Sergipe e Pernambuco. O Projeto tem como base a
inclusão, a emancipação das pessoas como protagonistas da sua história e atende os
dispositivos legais, que coloca a UNEB como instituição responsável pela formação de
profissionais da educação e saúde tendo como foco a pessoa com autismo. O Projeto
Girassol é uma referência que precisa ser fortalecida e ampliada nas ações da UNEB, da
pesquisa, do ensino e da extensão socialmente referenciados.
Por meio das práticas psicomotoras no meio líquido as crianças são levadas a
explorar seu próprio corpo e suas possibilidades de movimentação e deslocamento no
meio líquido é um eficaz instrumento para trabalhar com crianças com TEA na
aprendizagem organizada não se detendo apenas o fato da aprendizagem da natação,
mas como uma importante contribuição no processo da sua evolução e o
desenvolvimento de sua psicomotricidade. O desenvolvimento psicomotor caracteriza-
se pela maturação que integra o movimento, o ritmo, a construção espacial, o
reconhecimento dos objetos, das posições, a imagem do nosso corpo e a palavra. Assim,
torna-se importante estimular o desenvolvimento psicomotor para que a criança
conscientize-se de seus movimentos corporais que expressam suas emoções e suas
descobertas (BUENO, 1998). Por ser uma atividade física que ocorre no meio aquático
já proporciona a criança a organizar seu corpo no tempo e no espaço utilizando todos os
elementos psicomotores, construindo dessa forma seu esquema corporal desenvolvendo
uma boa evolução da motricidade, das percepções espaciais, lateralidade, temporais, e
da afetividade.
Contamos com a colaboração de 08 (oito) estagiários voluntários, sendo que 06
(seis) são estagiários do curso de Educação Física em parceria com a Faculdade Sete de
Setembro - FASETE e 02 (dois) estagiários do curso de Pedagogia UNEB. As
atividades tornaram possíveis devido à parceria estabelecida com o Exército Brasileiro,
através da 1ª Cia. De infantaria-Paulo Afonso, que nos cedeu à piscina do Clube da Vila
Militar para que o projeto existisse. Por meio dessas parcerias conseguimos realizar o
projeto.
Foi elaborada uma rotina de acordo com as características individualidades, uma
vez, que pessoas com TEA seguem uma rotina em suas vidas diárias, mas as rotinas
precisam ser quebradas quando ocasionam atitudes prejudiciais. Ao mesmo tempo em
que é importante mantê-las, é também mudá-las, pois as mudanças fazem parte da vida
cotidiana. As aulas de natação\psicomotora são executadas com a duração de 50
minutos, em grupos que variam de 02 a 04 crianças, acontecem uma vez por semana no
período matutino e vespertino com ambos os sexos com faixa etária de 02 a 12 anos. A
dinâmica inicial das aulas é caracterizada pelo acolhimento com cada criança, depois é
ensinado as adaptações ao meio líquido, molhando os pés, entrar e sair da piscina,
aplicando regras e atividades da parte respiratória com ênfase na concentração e calma.
Aos poucos as crianças passam a aceitar melhor os estímulos, por meio da
propriocepção mostrando-se capaz de explorar diferentes etapas no desenvolvimento da
educação psicomotora. São usados jogos dinâmicos com diversos materiais didáticos
como pranchas, bolas coloridas de vários tamanhos, tapetes, disquinhos coloridos,
letrinhas e numerais flutuantes, macarrão, pullboy, arcos, baldes, arcos. Ambientação ao
meio líquido: exercícios com letras alfabéticas, numeral – parada e com movimentos,
Deslocamento- Exercícios de procurar e guardar vários objetos como bolas. Recolher
objetos flutuantes como argolas materiais que afundam e estimulando a respiração,
Exercícios de deslocamento entre um estagiário para outro (deslize, braçada/pernada) de
acordo com a capacidade de cada pessoa. Exercícios de equilíbrio com o apoio do tapete
e macarrão – estimulando as pernas. Atravessar o arco sobre a superfície da água e
submergindo e estimulado a respiração. Exercícios de entrada na água. Exercícios de
jogar e buscar com bolas grandes, pequenas, mirar objetos, acertar o alvo.

METODOLOGIA

A metodologia utilizada baseia-se na abordagem qualitativa e na constante ação-


reflexão-ação, por meio sistemático e contínuo de acompanhamento das atividades
desenvolvidas. É efetuado uma avaliação observacional e um relatório trimestral de
cada participante além de registro nos dias de atendimento. Como forma de avaliação ao
longo do tempo no projeto foram elaborados instrumento avaliativo pelos
investigadores, contendo dez questões a serem avaliados de acordo com uma escala
(Não executa, Executa ajuda física, Executa com dificuldade, Executa bem e Executa
muito bem). Este instrumento é executado por meio das práxis das atividades aquáticas,
essa avaliação é realizada pelos docentes e estagiários envolvidos nas atividades de
psicomotricidade.
Os docentes e estagiários planejam as atividades a serem desenvolvidas e
discutem a execução das atividades para contribuir na aprendizagem e desenvolvimento
dos assistidos pelo projeto. É respeitado o principio da especificidade e individualidade
biológica de cada pessoa participante, pois um exercício pode dar certo para alguns e
para outros não. Utilizando alternativas diversas para que eles possam evoluir em sua
aprendizagem e na busca constante da qualidade de vida das pessoas com TEA.

RESULTADOS:

Os benefícios das atividades desenvolvidas como psicomotricidade e da natação


são notados já nas primeiras semanas de participação no projeto, pois, as atividades no
meio aquático, estimulam o apetite, acalma e melhora a resistência das crianças. Os
resultados são percebidos em diferentes aspectos relevantes da vida das pessoas com
autismo e seus familiares, a saber:
a) Mudança de concepção do fomento das necessidades especiais de uma visão divina,
feiticista para uma discussão humana, socioeconômica e política;
b) Aceitação, compreensão das famílias sobre a condição psicossocial do seu familiar
com autismo;
c) Melhorar a qualidade de vida das pessoas com autismo, envolvidas nas atividades de
Psicomotricidade aquática e a socialização partindo do principio das possibilidades
individuais;
d) Avanço nas relações sócio educativas no aprendizado e desenvolvimento psicomotor
das pessoas com TEA, e uma relação humana e de respeito às diferenças entre os
sujeitos da educação: educadores, dirigentes e familiares.
Esses dados foram colhidos pelas fichas individuais de cada participante do
projeto, com a evolução nas áreas social, corporal, cognitiva, linguística e interação
familiar.
CONCLUSÕES

A prática de atividades psicomotoras no meio aquático é uma alternativa de


abordagem para pessoas com autismo cujo objetivo é superar dificuldades, propiciando
o desenvolvimento de outras áreas pouco estimuladas, permitindo o seu
desenvolvimento em diferentes áreas. É através de experiências sensoriais e corporais
que são propostas pela psicomotricidade que são desenvolvidas as noções de tempo e
espaço, relação com objetos e pessoas, na pessoa com autismo não é claro as fronteiras
do corpo. O projeto Girassol tem contribuído no atendimento as pessoas com autismo
um ambiente educacional, estimulador e terapêutico no interior da Bahia em uma região
com poucos recursos e atendimentos especializados. Compreendemos que existe a
necessidade de novos estudos e profissionais voltados para atender a demanda de
pessoas com autismo em diferentes atividades escolares, pedagógicas de atendimentos
em diferentes terapias como a de Educação Física e Psicomotricidade.

REFERÊNCIAS

BUENO, Jocian Machado. Psicomotricidade teoria e prática – estimulação,


educação e reeducação psicomotora com atividades aquáticas. 1 ed. Lovise, 1998.

COSTE, J.C A Psicomotricidade. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1992.

DAMASCENO, Leonardo Graffius. Natação, psicomotricidade, desenvolvimento.


Brasília: Secretário dos Desportos da Presidência da República, 1992.

ESCOBAR, Michele Ortega; BURKHARDT, Roberto. Natação para portadores de


deficiência. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985.

FERREIRA, Carlos A. M. & THOMPSON, Rita. Imagem e Esquema corporal. São


Paulo-SP: Lovise, 2002.

GREGUOL, Márcia, Natação Adaptada: em busca de movimentos com autonomia.


Barueri, SP: Manole, 2010.
ORRÚ, Silvia Ester. Autismo Linguagem e educação: interação social no cotidiano
escolar. 3ª ed.- Rio de Janeiro: Wak Ed, 2012.

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