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Cultura EDIÇÃO: Audaci Junior

EDITORAÇÃO: Luciano Honorato A UNIÃO – João Pessoa, Paraíba - QUARTA-FEIRA, 19 de julho de 2023 9

Cinema na PB sob a
ótica da mulher
Em virtude da programação da Com ‘Aponta pra Fé –
Ou Todas as Músicas
Mostra Aruanda SP, realizadoras da Minha Vida’,
a cineasta Kalyne
do estado avaliam o panorama da Almeida (foto maior)
é a segunda mulher a
direção e produção feminina nos dirigir um longa de
ficção na Paraíba
filmes paraibanos

Foto: Reprodução
Guilherme Cabral da casa e da associação das mu- Entre os curtas no evento es- do no audiovisual) um aumento mes. “A razão é a mesma para as
guilhermecabral@epc.pb.gov.br
lheres. Casada um ex-pescador tará a ficção Não existe pôr do sol, de participação de mulheres nos outras áreas: uma sociedade pa-

A
que agora trabalha na construção de Janaína Lacerda, que também sets. “Começou pelas funções de triarcal que afastou, e ainda afas-
manhã começará a civil, juntos, cuidam da peque- expôs seu ponto de vista a res- produção executiva, arte, figuri- ta, mulheres do mercado de tra-
Mostra Aruanda SP, na Ester. A vida do casal e da co- peito da presença feminina na no, direção, roteiro, fotografia e balho e da educação formal e
no CineSesc de São munidade tomam novos rumos Sétima Arte paraibana. “As mu- som. Eu mesma fiz parte do pri- quando permite e contrata é em
Paulo, que se esten- diante do impasse entre os mora- lheres estão fazendo cinema pa- meiro coletivo de produção au- funções subalternas e pagando
derá até o próximo domingo (dia dores do Porto do Capim e a Pre- raibano há tempos, seja nas áreas diovisual totalmente formado menos. isso é um projeto de so-
26). O evento realizado na capital feitura da cidade, que busca reti- técnica, de atuação ou de dire- por mulheres, Las Luzineides, ciedade fundamentado em mi-
paulista representa “uma vitri- rar a comunidade daquele local. ção. Somos de igual criativida- mas, proporcionalmente, na to- soginia e racismo. A saída para
ne” para a divulgação de filmes “Entendo que a gente precisa ocu- de, competência e importância talidade dos sets, a gente ainda mudar essa situação é, a prio-
da Paraíba, como também dar par os espaços e precisava de nar- para a construção destes filmes não representa nem 50%, salvo ri, investir em ações afirmati-
a visibilidade às obras produzi- rativa construída a partir da dire- que incorporam o dito cinema raras exceções que, em sua maio- vas sem dúvida nenhuma, pois
das por mulheres. O evento vai ção e do roteiro. Encarei a direção paraibano, apesar dessa presen- ria, são em projetos tocados por é o começo, e políticas públicas
oferecer um panorama do novo desse longa e fazê-lo como docu- ça ainda ser de maioria mascu- mulheres nas funções de direção com recortes de gênero e raça.
cinema paraibano, cuja progra- mentário ficaria ‘endurecido’. En- lina, estamos conquistando es- e produção executiva. Se for fei- Sem isso, a igualdade de oportu-
mação é composta por 14 filmes, tão, trato da questão da moradia, paço e aguardo, alegremente, o to o recorte de gênero e raça esse nidades e ocupação nos espaços
sendo sete curtas e sete longas- que é uma questão social, de for- dia em que o debate será sobre número, infelizmente, diminui”, fica mais difícil porque a cons-
metragens. Desses, cinco são di- ma subjetiva e poética, através de os filmes que fazemos, e não só lamentou ela. trução social não dá o reconhe-
rigidos por mulheres: dois lon- um casal protagonista”, explicou sobre o fato de sermos mulheres A realizadora ainda lembrou cimento e oportunidade para
gas e três curtas, o que dá mais Kalyne Almeida. fazendo cinema. Não acho que haver motivo para maior partici- promover a equidade”, comen-
de 35% de autoria feminina. “Na minha visão, o panora- seja pouca em quantidade, por- pação masculina na direção de fil- tou Ana Dinniz.
A iniciativa resulta de par- ma é de que temos poucas ci- que vejo, trabalho e convivo com
ceria do Sesc-SP com a Bolan- neastas mulheres de longa na muitas mulheres que trabalham
deira Arte e Films, produtora Paraíba, mas não temos parida- com cinema, inclusive já estive
Foto: Kio Lima/Divulgação

responsável pelo Fest Aruanda, de nem no curta e nem no lon- em sets de maioria feminina. Tal-
que acontece sempre no final do ga no estado. Isso é sintomático vez, a questão seja os lugares que
ano, em João Pessoa, e completa e acontece em várias profissões, ocupamos, ou o respeito que re-
18 anos de existência, em 2023. no Brasil, onde a mulher é mi- cebemos nos sets, de ter as opi-
Para mais informações sobre a noria, mas, sobretudo, na Paraí- niões respeitadas e o trabalho re-
mostra e sua programação, bas- ba e no Nordeste. É uma questão conhecido”, declarou ela.
ta acessar o site oficial do Ses- de política pública. Para estar Janaína Lacerda ainda co-
c-SP (www.sescsp.org.br/proje- à frente de um filme a mulher mentou sobre como propiciar
tos/mostra-aruanda-sp/). precisa abandonar muitas coi- mais visibilidade ao trabalho
Kalyne Almeida informou sas, pois às vezes são donas de das cineastas paraibanas. “A dis-
que participará da Mostra casa, são mães e trabalham em tribuição do cinema nacional,
Aruanda SP com o premiado outros lugares. É importante ter como um todo, já é uma ques-
filme Aponta pra Fé – Ou Todas as mais políticas públicas inserin- tão, se a gente for afunilando ao
Músicas da Minha Vida, o seu pri- do as mulheres no cinema de cinema paraibano e mais ainda
meiro longa de ficção. “Eu vou longa na Paraíba e no Brasil”, ao cinema paraibano feito por
viajar para participar do evento acrescentou a cineasta. mulheres a gente tem que levar
acompanhada por um grupo de Já a cineasta Caroline Olivei- em consideração o contexto em
pessoas, que inclui a atriz prota- ra também reconheceu ser pou- que este está inserido, acredito
gonista desse filme, Rayssa Ho- ca a presença das mulheres no que com um trabalho de base
landa, e sua irmã, Rossana. Tra- cinema paraibano. “Isso é, ob- bem feito, mulheres podendo
balho com cinema de lugar e viamente, pela questão estrutu- fazer seus filmes, escrever seus
poder levar duas pessoas, que ral da sociedade. Não é pela ques- roteiros, executar suas ideias, o
Foto: Acervo Pessoal

vivem e moram na comunidade tão biológica, de que somos mães, filme por si só falará e encontra-
do Porto do Capim, onde o longa mas, historicamente, de como se rá seus caminhos, em festivais,
foi rodado, é poder dar mais vi- organiza o patriarcado e temos em mostras, em plataformas de
sibilidade a temas como o que é muito menos oportunidade e re- streaming, acreditando que estes
focado nesse filme. Sou a segun- presentatividade, desde sempre. também tecem uma reflexão e
da mulher a dirigir um longa de Então, existe todo um percurso se propõem a fazer uma repa-
ficção na Paraíba. A primeira foi para se conseguir se fortalecer, ração para igualar essa partici-
Vânia Perazzo, com Por 30 Di- ter foco e ganhar espaço para es- pação da presença feminina em
nheiros (2005)”, disse ela. tar em lugares de liderança, prin- suas programações”.
Em Aponta pra Fé, Martha é cipalmente dentro de uma arte Veterana nas produções da
uma jovem estudante universi- muito machista e, às vezes, mili- Paraíba, Ana Dinniz – diretora
tária que mora no Porto do Ca- tarista, que é o audiovisual”, de- do curta O que os machos querem
pim, comunidade situada no Va- clarou ela, cujo longa documental – lembrou ter percebido, ao lon- Dos 14 filmes da Mostra Aruanda SP, cinco são dirigidos por mulheres, a
radouro, ao pé do Rio Sanhauá, Miami–Cuba será exibido na Mos- go dos últimos 25 anos (perío- exemplo de Caroline Oliveira (acima), com o longa documental ‘Miami-
no Centro de João Pessoa. Cuida tra Aruanda SP. do esse em que vem trabalhan- Cuba’, e Janaína Lacerda (abaixo), com o curta ‘Não existe pôr do sol’

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