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Martha MarandinoI
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 41, n. 3, p. 695-712, jul./set. 2015.. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-9702201507133421 695
Sociologial analysis of museum didactics: educational
subjects and the dynamics of constitution of exhibition discourse
Martha MarandinoI
Abstract
Keywords
698 Martha MARANDINO. Análise sociológica da didática museal: os sujeitos pedagógicos e a dinâmica...
outros discursos, com a finalidade específica de pré-escolar/primário, secundário e terciário,
atender ao processo de transmissão e aquisição agências, posições e práticas. O terceiro
de conhecimentos. Bernstein (1996) entende contexto é o recontextualizador. Nele, as
que o discurso pedagógico pode ser definido posições, os agentes e as práticas estão
como as regras para embutir e relacionar dois preocupados com os movimentos de textos e
discursos e, nesse processo de relação, o discurso as práticas do contexto primário de produção
da competência, instrucional – dos conteúdos discursiva que passam para o secundário, de
e conhecimentos científicos, por exemplo – é reprodução discursiva. A função daqueles que
embutido no discurso regulativo, de ordem se encontram nesse terceiro contexto é a de
social – referente aos campos pedagógicos. Na regular a circulação dos textos entre os dois
produção do discurso pedagógico, os discursos outros contextos:
que se encontram em relação, são deslocados
de sua prática e contexto, transformando-se. [...] podemos dizer que o discurso
O princípio recontextualizador do discurso pedagógico é gerado por um discurso
pedagógico age de forma seletiva, apropriando, recontextualizador [...]. O princípio
refocalizando e relacionando outros discursos recontextualizador cria campos
a partir de sua própria ordem, tornando-o um recontextualizadores, cria agentes com
outro discurso e produzindo um novo. funções recontextualizadoras (BERNSTEIN,
Na produção do discurso expositivo 1998, p. 63).
nos museus, profissionais de várias áreas de
conhecimento, com seus próprios discursos, O campo recontextualizador onde os
participam da definição do que será agentes atuam realizando a recontextualização
selecionado como conhecimento final a ser pode ser subdividido em dois: o campo
apresentado para o público. Nesse processo, recontextualizador oficial (CRO) e o campo
os agentes envolvidos também definem como recontextualizador pedagógico (CRP) (LEITE,
o conhecimento será exposto e, desse modo, 2007; BERNSTEIN, 1996, 1998). O CRO é criado
os discursos das diferentes áreas estabelecem e dominado pelo Estado e seus agentes, pelos
relações entre si com a finalidade de tornar departamentos especializados e autoridades
esse conhecimento compreensível pelo público. educacionais locais, com suas pesquisas e
Os agentes e as áreas de conhecimento que sistema de inspeção. Já o CRP é composto pelos
participam da produção do discurso expositivo pedagogos e outros formadores de professores e
serão analisados neste texto. pesquisadores das escolas, pelas universidades
e seus departamentos/faculdades de educação,
Os campos recontextualizadores com suas pesquisas, mas também pelas
oficiais e pedagógicos fundações privadas, os “meios especializados
de educação, jornais semanais, revistas, etc. e
As regras do discurso pedagógico as editoras, juntamente com seus avaliadores e
atuam em três contextos fundamentais dos consultores”. Pode ainda se estender “para campos
sistemas educacionais. O contexto primário não especializados do discurso educacional”,
seria o da produção do discurso e refere- mas que exercem influência sobre o Estado
se ao processo de criação e modificação (BERNSTEIN, 1996, p. 270).
seletiva de novas ideias, formando o A dinâmica de funcionamento do
“campo intelectual” do sistema educacional campo recontextualizador é reveladora
(BERNSTEIN, 1996). O contexto secundário dos processos e agentes que realizam a
seria o da reprodução seletiva do discurso recontextualização e a criação do discurso
educacional e é formado por vários níveis: pedagógico. Existe, assim, uma dinâmica
700 Martha MARANDINO. Análise sociológica da didática museal: os sujeitos pedagógicos e a dinâmica...
Então, eu acho interessante ver a exposição No caso do Mu2, um museu universitário
pública tal como ela é hoje, como um público dedicado à temática da anatomia
retrato de qual era a concepção tanto da veterinária, foi possível perceber também
museologia quanto da zoologia há cem a importância de outros conhecimentos e
anos. Eu acho interessante porque, na especialistas, para além do campo científico,
verdade, é um registro histórico. (Mu1-2) envolvidos na preparação da exposição.
Os técnicos que fazem parte do quadro de
O discurso expositivo do Mu1 enfatiza funcionários do museu são fundamentais
aspectos do campo científico referentes a uma para que os objetos anatômicos possam ser
determinada concepção de História Natural preparados e mantidos expostos no museu.
hegemônica ao longo do século XIX e início do A importância da especialidade desses
XX. Em alguns momentos, contudo, a presença profissionais foi ressaltada pela direção:
de outros discursos, referentes a outras áreas
do conhecimento, para além da científica/ E nós temos dois técnicos [...] Você já viu
biológica, foi notada. Em alguns depoimentos, montar um esqueleto? Depois que você
fica evidenciado o processo de negociação que macera tudo, aquilo vira um quebra-cabeça,
vigorou na realização dessas experiências: não é? E principalmente quando você está
montando um esqueleto de rato, um esqueleto
Então, teve a ajuda de um museu logo de pássaro, um esqueleto de cavalo-marinho,
que trabalhou num museu de arte [(...]) como a gente tem aí. Então, aquilo realmente
e ele me ajudou, tinha muito mais é um quebra-cabeça, uma coisa delicadíssima,
ideias. Inclusive os últimos temas das e o técnico tem um jeito, uma paciência, uma
exposições temporárias foi ele que bolou, coisa. É perfeito. (Mu2-1).
porque eu sou uma pesquisadora com
uma cabeça muito acadêmica. como são A interação entre as áreas científicas e da
todos os outros colegas aqui. (...) Numa museologia é também um elemento considerado
exposição, você tem que fazer a coisa positivo e rico pela direção de Mu2, com reflexos
toda da montagem visual, da mensagem. importantes para a própria exposição e o museu
É uma coisa da comunicação no museu. em geral. No entanto, como se vê a seguir, nem
Não adianta fazer texto comprido, sempre as diferentes perspectivas, resultantes
porque as pessoas não leem, não têm de outras áreas de formação, são negociadas
tempo. Mas o texto não pode atrapalhar de forma tranquila no processo de produção. A
o objeto, o exemplar museológico. fala de uma das especialistas revela os embates
(Mu1-4). presentes no jogo de poder entre os diferentes
campos de conhecimento ao longo do processo
O depoimento acima mostra que o de produção:
conhecimento do museólogo foi requisitado
para a elaboração de uma exposição que No começo, o pessoal teve assim uma
se preocupava com a compreensão do reação, porque é engraçado, não é,
público sobre o conteúdo que estava sendo não sei, isso é uma coisa bem atávica
apresentado. Processos de seleção e de na gente, até como esse museu foi
simplificação foram indicados na fala como nascendo, espontaneamente, e tudo.
parte do caminho de elaboração da exposição, Então, aquilo é muito assim da
sendo os critérios de escolha orientados pelo anatomia, dos professores da anatomia.
papel dado à mensagem e ao público e, logo, De repente, você entregar tudo isso para
ao processo de comunicação. a gestão de uma outra pessoa, que você
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equipamentos de manutenção, bombas, áreas da física, da biologia, da matemática, da
filtros, a parte de alimentação, tudo isso astronomia, entre outros, ou seja, o diálogo
foi comprado porque aqui dentro não tinha entre os diferentes discursos utilizados na
nada. (Mu3-3). construção do discurso expositivo se dava nos
seguintes termos:
Em cada exposição de museu,
diferentes fatores acabam por influenciar Havia reuniões gerais com todos eles, mais
o processo de constituição das exposições. de vinte pesquisadores, de todas as áreas.
Sem dúvida, o público visitante, o acervo Desses vinte, alguns sempre tinham uma
e a gestão de recursos foram elementos participação, desenvolvimento e contato
fundamentais na concepção da exposição do maior, e, a partir dessas reuniões gerais,
Mu3 e se comportaram como moduladores ou a Ana fazia o exercício da unidade. [...]
efetivamente como outros discursos no jogo E eram vários contatos, várias reuniões,
da produção do discurso expositivo. por telefone, era entender o que ele estava
O Mu4 é um centro de ciências falando e como a gente poderia musealizá-
pertencente a uma universidade pública, formado la, transformar aquela ideia em uma
por aparatos interativos das áreas de física, exposição. (Mu4-3).
matemática, química, biologia, astronomia,
história, entre outras. Contudo, foi concebido O depoimento acima, de uma das
para funcionar como um museu e essa decisão museólogas envolvidas na concepção
esteve relacionada inclusive com a equipe e execução dessa exposição, oferece a
responsável pela elaboração de sua proposta, dimensão do trabalho de mediação entre o
basicamente composta por museólogas. Esses discurso científico e aquele da museologia,
profissionais tomaram a decisão de que um com o qual as profissionais dessa área
centro de ciências é um museu e, nesse sentido, tiveram que lidar. Apresenta também um
procuraram incorporar, no processo de produção bom exemplo das etapas de elaboração do
das exposições desse espaço, a dinâmica de discurso expositivo, em experiências em
trabalho característica da cultura museológica. que o discurso central é o museológico e
Outra tarefa dessa equipe responsável não o científico. Nessas etapas, o papel
foi a de transpor o discurso científico dos do museólogo é compreender o discurso
consultores especialistas nas áreas disciplinares científico, seus conteúdos e sua estrutura,
(pesquisadores pertencentes às universidades para transpô-lo em uma exposição, criando
envolvidas no projeto inicial) para o discurso assim um “novo discurso”. Exemplo disso
apresentado na exposição: foi a tentativa de organização da exposição
ao redor de grandes temas e não por áreas
Nós tínhamos que nos apropriar e transpor disciplinares do conhecimento científico.
aquilo para o espaço físico. [...] Então, Entretanto, apesar de, na maioria das vezes,
tudo o que eram os “objetos museológicos” as museólogas terem o controle sobre o
foram criados, planejados e executados sob discurso expositivo, determinadas áreas e
nossa supervisão. A estrutura do discurso sujeitos acabaram definindo o que e o como
expositivo foi toda criada por nós [...]. expor a partir da estrutura de conhecimento
Mas existiu todo um trabalho com os de seu campo disciplinar:
pesquisadores. (Mu4-3).
Os assessores eram os pesquisadores
A relação estabelecida entre a equipe [...]. Então, teve uma dinâmica
de museólogas e os cientistas das diferentes bastante grande. Eles falavam, a gente
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positiva ou negativamente, intelectual assim”. Chegava lá, eu dizia “Você tirou a
ou emocionalmente, que conceitos imagem daqui que casava com a imagem
preestabelecidos ele já tem com relação dali”. Ele dizia “Mas é porque ficou mais
àquele tema, que preconceitos e informações bonito aqui”. Eu dizia “Mas não casa no
ele tem com relação àquele tema. (Mu4-3). conceito”. [...] Ele pode ter uma ideia de
criação, o que ele vai colocar rebaixado
Na medida em que o público é um e tudo mais. Você tem que acompanhar
elemento-chave do trabalho do museu, o passo a passo, no mínimo. (Mu5-5).
discurso expositivo impõe seus próprios
princípios seletivos com vistas a torná-lo Nessa exposição, é possível perceber,
inteligível e tem o papel de mediar os demais através da fala anterior, exemplos das negociações
discursos a partir de seus princípios e objetivos. que foram se configurando na medida em que
Esse seria o grande desafio das exposições os recursos expositivos iam sendo elaborados.
atualmente, na opinião da museóloga: mudar Técnicos de diferentes áreas da comunicação
de uma lógica de emissão ou transmissão para foram contratados para concretizar a proposta
a lógica da recepção. conceitual da exposição e, aos poucos, os
Em Mu4, pode-se evidenciar o diálogo e conflitos de perspectivas, os diferentes enfoques
os conflitos presentes no processo de construção particulares de cada área foram se revelando no
do discurso expositivo. Nesse caso específico, embate da produção do discurso final.
na história de elaboração desse espaço, O processo de tradução da concepção
estiveram presentes não apenas os discursos inicial, elaborada geralmente numa forma textual,
da ciência, mas também os da divulgação e do durante o qual são arrolados os conteúdos,
ensino formal e não formal de ciências, através os possíveis objetos, os diferentes recursos,
dos assessores que se envolveram na concepção as desejáveis estratégias que pretendem ser
desse museu. Além disso, o discurso do público apresentadas e explicadas verbalmente para
e o da comunicação foram levados em conta na o técnico, enfrenta desafio particular ao ser
elaboração do discurso expositivo. concretizado, especialmente no caso de uma mídia
O Mu5 é um museu pertencente a uma espacial como a exposição. Em Mu5, a responsável
renomada instituição pública de pesquisa brasileira por acompanhar o trabalho do programador visual
e, desde sua origem, teve a intenção de articular, negociou o tempo todo seus objetivos conceituais
em sua proposta conceitual, não apenas as com o trabalho técnico e mesmo artístico desse
dimensões científicas e históricas do conhecimento profissional. O projeto inicial sofreu assim
biológico, mas também as perspectivas educativas restrições em função do espaço expositivo, do
e comunicativas dos museus de ciências. público-alvo, das demandas estéticas, educacionais
Dessa forma, a relação entre diferentes campos e comunicacionais e se modificou na produção do
do conhecimento foi prevista na sua própria discurso expositivo final.
constituição. Esse fato pode ser evidenciado na Na transposição das ideias e conteúdos
negociação entre os conceptores que dominavam propostos inicialmente, seleções se processam,
as ideias científicas e os artistas e designers que as quais se relacionam também com o suporte
produziram os elementos expositivos: pelo qual essa informação será apresentada,
sendo necessário um trabalho conjunto entre
A parte de programação visual eu os profissionais que conceberam a proposta e
acompanhei direto, passei quase dois anos, aqueles que a realizam. Nesse sentido, a relação
fiz um curso intensivo de programação entre conteúdo e forma de apresentação deve
visual. Eu ia praticamente todo dia lá olhar chegar a um denominador comum, apesar deste
o painel, e aí eu dizia “Agora você modifica não ser um campo tranquilo de negociações:
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estabeleceram relação com o discurso da ciência, do discurso expositivo e, mais especificamente,
que, nesse caso, não era o principal e foi submetido sobre a dinâmica de funcionamento do campo
aos princípios dos primeiros: recontextualizador pedagógico dos museus,
caracterizando os atores e instituições que estão
Essa relação [com cientistas] tem algumas envolvidos e as relações entre eles.
coisas engraçadas. Por um lado, ela é tensa
às vezes, e isso é eterno. Os cientistas querem A recontextualização e o
que todos gostem de sua descoberta e da funcionamento do campo
contribuição específica dela e que isso fosse recontextualizador pedagógico
compreensível a todos. O problema é que, na constituição do discurso
às vezes, não é. Temos que fazer uma bela expositivo
tradução do trabalho dele e do que ele está
querendo mostrar. É uma relação tensa, mas Para a análise do funcionamento do campo
funciona. Outra questão para nós complicada recontextualizador pedagógico, tomou-se por base
é a eficiência do rigor. É claro que o rigor é o conceito de discurso pedagógico e de princípio
necessário, mas às vezes ele limita muito. [...] recontextualizador que caracteriza esse discurso
E aí vai passar um tempo e você vai ver que (BERNSTEIN, 1996). Destaca-se, em primeiro
o rigor primeiro dificulta a questão estética. lugar, que os dados obtidos revelam a existência
Então, tem diversas dificuldades para serem de diferentes discursos que fazem parte do e que
resolvidas em relação a isso. (Mu5-2). são recontextualizados na constituição do discurso
expositivo. Alguns desses discursos por nós
Outro aspecto importante que marcou identificados foram:
a negociação de discursos na elaboração da
exposição deste museu refere-se às imposições • o discurso da ciência – representado
feitas ao seu projeto arquitetônico, com relação pelos conteúdos da biologia, da área de saúde e
à proteção do patrimônio histórico do local. As da história da ciência;
restrições a mudanças na arquitetura do prédio, • o discurso museológico – que considera
a obrigatoriedade da manutenção de aspectos a cadeia museológica que vai da aquisição até
históricos na construção do espaço, entre outros, a conservação, documentação, salvaguarda e
determinaram um perfil da exposição. Negociações extroversão do acervo e inclui as questões referentes
foram realizadas para se chegar a um consenso aos objetos históricos e interativos expostos;
sobre o que poderia ser ou não modificado e a • o discurso educacional – relacionado
construção da exposição teve que levar em conta à intencionalidade de levar o público a
a estrutura física do local. A solução, muitas vezes, compreender as informações científicas
foi incorporar esses elementos arquitetônicos à oferecidas nas exposições, apercebendo-se dos
narrativa da exposição, dando destaque a eles aspectos de ensino-aprendizagem que ocorrem
ou utilizando-os como parte da própria estrutura nesses espaços;
expositiva. Desse modo, os limites impostos pelo • o discurso da comunicação – centrado
espaço físico foram cruciais para a elaboração do no processo de transmissão das informações por
discurso final exposto. meio de estratégias das áreas da programação
Os exemplos anteriormente apresentados visual, das artes plásticas e do design.
buscaram evidenciar as negociações, os atores,
os discursos e os campos envolvidos na produção No processo de recontextualização, esses
do discurso de cinco exposições de museus discursos entram em relação e produzem um
de ciências. Esses dados nos levam a tecer novo, o discurso expositivo. Este age do mesmo
considerações sobre o processo de produção modo que o discurso pedagógico, a partir da
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propiciou a cada um deles para a realização do institucional. A decisão de dar voz ou não aos
trabalho. Vimos nos dados que, em Mu1, Mu2 e demais discursos para além do científico é
Mu4, por exemplo, as profissionais no campo da uma decisão política e de gestão da própria
museologia tiveram uma participação fundamental instituição e recebe influência dos órgãos
na seleção e formatação dos conteúdos e formas financiadores, das políticas governamentais
como a ciência foi apresentada nas suas exposições. de cultura e educação e dos grupos de
Nesses casos, em meio a negociações e tensões, controle – ou seja, do CROmuseus. Essas
a museologia também se revelou um discurso decisões implicam a escolha das equipes e
mediador importante e seus profissionais, atores dos profissionais das diferentes áreas – com
que determinaram o que efetivamente apareceu na seus diferentes discursos (CRPmuseus) – que
proposta final. participarão da elaboração e atuarão no
Contudo, mesmo que possuam menor processo de recontextualização durante a
autonomia e poder, outros profissionais produção do discurso expositivo.
estão contidos no campo recontextualizador Contudo, mesmo que seja dada voz a
pedagógico dos museus – CRPmuseus –, como diferentes atores, esse espaço por si só não
os designers e artistas plásticos, na medida garante que efetivamente esses participem com
em que, a partir de negociações, colocam em o mesmo peso nas decisões, escolhas e seleções
jogo suas ideias, concepções e visões sobre que serão realizadas durante o processo de
os conhecimentos apresentados. Esse aspecto recontextualização. Entram, nesse universo de
pode ser percebido especialmente na exposição negociação, fatores sociais, culturais, políticos e
de Mu5, já que se evidenciou a negociação ideológicos que poderão regular a relação entre
entre a coordenação (Mu5-5) e o artista os diferentes discursos, dando voz a uns e calando
plástico responsável pela produção dos painéis outros. São os grupos que se encontram no poder
existentes na exposição. no processo de produção do discurso expositivo
Nos demais museus, os técnicos a que poderão controlar essa distribuição do poder
cargo da preparação e montagem de animais e na elaboração das exposições.
da taxidermia, os técnicos de carpintaria, de Dessa forma, a determinação de quais
eletrônica, por exemplo, estão envolvidos na são os contextos de produção e reprodução
elaboração das exposições e também podem ser do discurso pedagógico nos museus
identificados como sujeitos ligados ao CRPmuseus. dependerá da autonomia relativa concedida
Suas especialidades acabam muitas vezes infl às agências, nos diferentes níveis do sistema
uenciando as decisões e promovendo intervenções de produção e reprodução do conhecimento
em certos aspectos da proposta expositiva, na sociedade, sendo que o discurso expositivo
adaptando-a, e sugerindo possibilidades para pode incluir, como parte de sua prática
as restrições na produção e mesmo para o recontextualizadora, discursos da escola e
funcionamento e segurança dos objetos expostos. de saberes técnicos, entre outros, a fim de
Pôde-se evidenciar este aspecto, por exemplo, tornar mais eficaz seu próprio discurso. Como
em Mu2, quando os técnicos responsáveis pela indica Bernstein (1996), a forma de regulação
preparação e montagem dos esqueletos dos e a composição social dos diferentes agentes
animais expostos definem a postura dessas podem variar de uma situação histórica
montagens e acabam influenciando a maneira para outra, podendo, no campo pedagógico,
como esses objetos aparecem na exposição. aqueles que produzem o novo conhecimento
É importante frisar que os diferentes ser seus próprios recontextualizadores.
atores que formam o CRPmuseus possuem No caso dos museus, como foi visto,
autonomia relativa na produção do discurso dependendo do contexto histórico, da política
expositivo e que esta varia conforme o contexto institucional e da proposta conceitual da
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exposição, outros atores também podem elementos chaves para a compreensão das
fazer parte desse campo recontextualizador dinâmicas de seleção e de distribuição do
do discurso expositivo, como os funcionários poder na elaboração do discurso expositivo.
administrativos, científicos e técnicos do museu, Ao considerarmos que é especialmente por
além dos professores e o público em geral que meio da exposição que o público se envolve
o visita. Assim, postula-se neste trabalho que o nos processos de ensino e aprendizagem
discurso expositivo é um discurso próprio que, nos museus, pesquisas que exploram a
por possuir objetivos específicos e recolocar perspectiva sociológica da didática museal
outros discursos a partir de suas próprias podem colaborar, revelando a dinâmica de
características, acaba por se comportar como o produção desses elementos, contribuindo
discurso pedagógico na perspectiva de Bernstein. para a formação dos profissionais que atuam
Estudos sobre a educação em museus nesses locais e, por conseguinte, qualificando
em sua dimensão sociológica fornecem as atividades educativas por eles elaboradas.
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Martha Marandino é professora associada da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Doutora em educação
pela Universidade de São Paulo e livre docente pela Universidade de São Paulo. Coordena o Grupo de Estudo de Pesquisa em
Educação Não Formal e Divulgação da Ciência (GEENF).
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