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Eu Sou o Mestre - Lendas de Um Senhor Do Tempo Renegado
Eu Sou o Mestre - Lendas de Um Senhor Do Tempo Renegado
***
***
Ele estava de volta na cela cinza. As gavetas ainda estavam vazias, o fogo
continuava apagado, a inacessível janela mostrava nuvens novamente.
As vozes abafadas além da porta não ficaram mais claras nas semanas que se
passaram. Uma tigela de mingau, com sua colher de estanho, permaneceu ao
lado da cama, por quase um mês. Não havia porque tentar comer – ele nunca
morreria de fome.
Um Senhor do Tempo passava pela experiencia da Prisão Lenta assim como
qualquer um. Esse Senhor do Tempo podia passar o tempo planejando sua
eventual libertação. Não havia nada mais a aprender dessa experiencia. Não
reabilitação. Apenas a antecipação de localizar quem tinha prendido,
sentenciada e emprisionado ele. Muito tempo para pensar sobre a vingança:
planejar e literalmente executar – e ele nem precisaria voltar no tempo para ver
as coisas como são.
A dor de cabeça voltou no começo do segundo mês, até...
***
“Então...” Loge inclinou a cabeça para o lado em um gesto inesperadamente
humano de curiosidade. “Você está pronto para cooperar?”
***
Narvi saiu correndo do campo em direção aos vestiários. As tachinhas em suas
botas ecoaram na superfície de concreto do túnel dos jogadores.
Seus companheiros de equipe marchavam em sua frente, seu hálito quente se
misturando ao ar frio da noite. Ele facilmente os ultrapassou, com a mesma
facilidade com que ele havia ultrapassado a defesa adversária para chegar ao
empate antes do intervalo. A torcida da casa gritou seu protesto, apelando em
vão por uma decisão de impedimento. Tendo isso negado eles recorreram ao
abuso – particularmente vocais sobre Narvi.
Talvez o arbitro tivesse chamado para o intervalo cedo demais, Narvi não se
importava. Ele ainda conseguia escultar a torcida da casa entoando cânticos
nojentos enquanto ele seguia para o camarim do time visitante. Ele se sentou no
banco, respirou fundo e olhou ao redor da sala.
Os zagueiros Olson e Brown, estavam se servindo de água e frutas, incapazes
de olhá-lo nos olhos como de costume quando a multidão se voltou contra ele.
Alguns cortes de cabelos ruins mais abaixo no banco, o fisioterapeuta estava
falando com Bartollu, o goleiro. O mascote do time, um guaxinim absurdamente
alto com uma cabeça enorme, estava imóvel na parede oposta, como se fosse
um enorme ursinho de pelúcia.
Narvi estava esperando o discurso usual de combate do técnico para todo o time
desde o momento que ele entrou. Juan Martino esteve ausente da linha de
ataque nos últimos cinco minutos do primeiro tempo; os jogadores presumiram
que ele havia saído para se preparar para o tradicional momento das
reprovações e censura que seu treinador achava ser motivacional.
Mas Juan Martino parecia estranhamente calmo. O chefe gordo estava fumando
um cigarro enquanto falava para o arbitro, que acompanhou a equipe até a sala.
Por cima do burburinho, Narvi conseguia ouvir o que eles estavam falando.
“Se houver mais violência ou gritarias racistas no campo”, o juiz estava dizendo:
“Estou decidido a abandonar a partida.”
Martino soltou uma nuvem de fumaça. “Em uma semifinal? É pouco provável que
isso aconteça, não é?” ele olhou ao redor como se solicitasse uma resposta
similarmente incrédula de todos os outros. Seu olhar se fixou no guaxinim
gigante, que permanecia impassível como sempre.
Sem medo, o arbitro se inclinou para frente para chamar atenção de Martino e
enfatizar seu ponto. “Com todo respeito, sou eu quem decidi o que vai
acontecer.”
Martino também se inclinou. “Cancelar o jogo? Isso não vai acontecer.”
Parecia que o árbitro não estava disposto a se dobrar mesmo com o olhar intenso
de Martino. Ou não conseguia.
“Isso. Não. Vai. Acontecer.” O tom de Martino era calmo, mas enfático. “Você
entendeu?”
O arbitro franziu a testa. Piscou. “Isso...não...vai acontecer.” Martino assentiu,
aparentemente satisfeito. “Muito bom. Isso é tudo.”
O arbitro afastou-se de Martino, sem expressão, e deixou a sala sem dizer mais
nenhuma palavra.
“As pessoas mais inteligentes podem ser as mais fáceis de serem influenciadas,”
disse Martino a si mesmo enquanto olhava para o mascote. Narvi desamarrou
suas botas enlameadas e tirou sua roupa suada. Ele poderia tomar um banho
rápido. Lavar um pouco da sujeira do primeiro tempo, e com isso suas
frustrações.
O chuveiro assobiou ensurdecedoramente quando ele mergulhou sua cabeça.
Ele mudou a água de quente para terrivelmente fria nos últimos trinta segundos.
O lugar estava inesperadamente silencioso quando ele saiu do chuveiro. Ele se
enxugou antes de voltar para um vestiário vazio.
Olson, Brown, Bartolli, Walton...sumiram. Não tinha mais fisioterapeuta, nem
comissão técnica. Havia apenas Martino do outro lado da sala, com seu casaco
e seu distinto chapéu de feltro. Ao lado dele estava o absurdamente grande e
imóvel guaxinim.
Narvi olhou desesperadamente ao redor, momentaneamente em pânico, será
que de alguma forma, ele impossivelmente havia perdido a noção do tempo
enquanto tomava banho e o técnico estava prestes a dar-lhe uma bronca? Ou
pior, substitui-lo no segundo tempo?
“Desculpe, chefe, ei...”
O técnico parou seu protesto com um gesto da sua mãe enluvada. “Eu gosto de
chefe,” ele disse. “Embora eu prefira Mestre.”
Narvi riu insolentemente. “Boa, chefe.” Ele então foi pegar suas roupas, mas
Martino se colocou entre ele e o cabideiro.
O técnico tirou o chapéu e aproximou seu rosto ao de Narvi, de uma forma
desconfortavelmente intima. Narvi revirou os olhos. Ele estava familiarizado com
a técnica “secador de cabelo” quando o técnico soltava um fluxo humilhante de
insultos e abusos diretamente no rosto de um jogador. Ele costumava deixar
entrar por um ouvido e sair por outro.
Mas dessa vez Martino falou baixinho, sedutoramente. “Escute-me. Eu sou o
Mestre”. Seus olhos eram bem mais escuros do que Narvi se lembrava. “Eu sou
o Mestre e você vai me obedecer. Você vai fazer exatamente o que eu disser.”
O desconforto nervoso que Narvi sentia pareceu desaparecer, como a sujeira
desapareceu no chuveiro.
“Está na hora de você sair do esconderijo Narvi.” Os olhos escuros queimaram.
“É hora do Hyrrokin em você se revelar. Você entende?”
A sala girou em torno de Narvi, até que houvesse apenas o som dessa voz
aveludada em seus ouvidos, nas profundezas dos olhos de seu Mestre.
Pela primeira vez em trinta anos, Narvi entendeu.
O Mestre acenou para o mascote. “Se apresse. Ele está vindo à tona e
precisamos sair daqui imediatamente.”
Narvi estava olhando ao seu redor, como se estivesse vendo tudo pela primeira
vez. Ele esticou seus membros enquanto sua personalidade Hyrrokin se
reafirmava depois de tantos anos ocultos. Foi, o Mestre pensou, como ver uma
borboleta esticar suas asas. Narvi estava finalmente se libertando da sua
crisalida invisível. Ele parecia o mesmo, mas seu verdadeiro eu estava
emergindo.
O Mestre tirou o casaco pesado e o terno grosso, então começou a tirar a
máscara que usava para se disfarçar de Juan Martino. No devido tempo os
funcionários do clube encontrariam o cadáver encolhido do verdadeiro Juan
Martino enfiado no fundo de uma mochila.
“Se apresse!” ele gritou para o guaxinim.
O mascote retirou a cabeça peluda e revelou as características do reptiliano
pálido que era Loge. O biomecanoide se afastou da parede do outro lado do
vestiário e andou até onde o Mestre estava examinando o atordoado Narvi. Ele
colocou a mão pelo abdômen de seu traje e tirou um dispositivo de digitalização
Hyrrokin.
“O poder psíquico é insuficiente,” Loge declarou.
“O que?” o Mestre puxou o dispositivo do biomecanoide e olhou para as leituras
até conseguir admitir que não entendia o que significavam. Ele o empurrou de
volta para as mãos deformadas de Loge. “Aquela multidão deve estar no seu
auge – certamente o suficiente para alimentar nossa fuga.
“Esse não é o problema,” disse Loge. “A energia psíquica é insuficiente para
projetar Narvi na orbita de coleta. Não tem energia o suficiente para conduzir ele
além dos limites dessa construção”.
“Esta construção?” Ah, o estádio de futebol.” O mestre balançou a cabeça e
olhou para Narvi. Ele considerou tudo o que ele havia feito para chegar até aqui:
ele identificou os líderes dos vândalos entre os torcedores da casa, hipnotizando-
os para alimentar sua paranoia sobre os jogadores do time visitante, forneceu a
equipe armamento rudimentar, permitindo-os passar pela segurança e entrar no
estádio.
A atmosfera febril da semifinal deveria ter levado a multidão a um tumulto em
grande escala. Com dezenas de milhares de fãs de futebol em um estado de
emoção intensificada nesse espaço confinado, o dispositivo do biomecanoide
canalizaria o turbilhão de energia psíquica para levar Narvi para um local seguro,
bem longe.
Em vez disso, na ausência dos jogadores durante o intervalo a multidão parecia
estar se acalmando.
A distância o Mestre conseguia escultar a multidão começando a aplaudir
novamente enquanto as duas equipes começavam a correr pelo campo para
continuar a partida. Agora, isso parece uma ideia.
“Muito bem.” O mestre recolocou a máscara, o sobretudo e as luvas. Ele acenou
com a cabeça decisivamente para o biomecanoide. “Loge, coloque aquele
disfarce ridículo novamente.”
Ele tirou a camisa de futebol de Narvi do gancho e refletiu, não pela primeira vez,
como os aros o lembravam de seu uniforme da prisão. Ele jogou em seu
atacante.
Narvi a vestiu, gradualmente reconhecendo quem ele era e onde ele estava.
“Agora, meu jovem...” o Mestre tentou estalar seus dedos, mas era complicado
nessas luvas. Ele se contentou em estreitar os olhos escuros para Narvi.
“Amarre as botas. Você está indo para o segundo tempo.”
***
***
A turnê de despedida do Jovens Alienados não estava indo bem. Apenas três
shows, pensou Tania Siarnaq e a hostilidade mutua a muito nutrida do trio já era
insuportável.
Se não fosse Chanelle reclamando das comodidades do local, era Bronwen
exigindo complementos para os pilotos da sala verde. Mais cedo, Chanelle
repreendeu seu empresário, Sam Quill, sobre a ausência de mercadoria
especificas da turnê. “Onde está a minha estatueta?” ele exigiu. “Você prometeu
que poderíamos ter versões de cinco centímetros antes da turnê começar. Onde
elas estão Sam?”
“Verei o que posso conseguir,” respondeu Sam, cansado, antes de pedir licença
para fazer uma ligação. Poucos minutos depois, Bronwen estava discutindo
sobre a possibilidade de assumir o vocal principal em seu maior sucesso. “Só
uma vez querida... só uma vez, cê sabe...isso é pedir muito? Ein? Querida?”
“Bem, já que você perguntou, querida, é pedir muito,” Tania disse a ela em uma
rara falta de consideração, fatos simples: (a) Bronwen não cantava os vocais
principais nem mesmo quando o Jovens Alienados ainda era jovens, porque (b)
Bronwen não sabe cantar direito.
Talvez Bronwen parasse de chorar e saísse do banheiro a tempo para o número
de abertura. Ela poderia cantar baixinho no fundo como de costume, se
necessário.
Esse último bate-boca na sala verde não poderia ter ocorrido em um momento
pior. Chanelle chegou atrasada no seu voo de volta do fim de semana no exterior
com Waldo – ou erra Warren? – então eles entrariam atrasados no palco essa
noite. Uma multidão de fãs, com sua lealdade gravadas em formato de tatuagens
da banda, gritavam impacientes para que o show começasse. E porque Sam (o
pão-duro) se recusou a agendar mais um horário, não era como se elas
pudessem atrasar por mais tempo.
O problema com uma turnê com ingressos esgotados, pensou Tania, é que você
não podia trair o público.
Sam se esgueirou de volta para a sala verde e parou na porta que levava ao
palco. Ele disse a Tania que estava ligando para sua esposa, inventando outra
desculpa do porque não voltaria para casa essa noite. Ele tinha parado de tentar
fazer isso do quarto de hotel de Tania desde a vez em que ela saiu do chuveiro
seminua e foi incapaz de para de rir dele mandando ela parar de falar e do olhar
assustado em seus lindos olhos azuis.
Na porta agora, Sam parecia bem mais calmo e controlado do que Tania
esperava. Sua aparência tradicional era pobre casual misturado com energia
nervosa, mas essa noite não houve nenhuma contração característica nas
expressões em seu rosto. Seu senso de vestimenta era...qual era a
palavra...sombrio? Talvez as coisas fossem mais sérias do que ela pensava.
Tania ergueu a sobrancelha de maneira encorajadora para ele e piscou
extravagantemente. Mas Sam estava aparentemente perdido em uma nova
discussão que irrompeu na sala verde.
Bronwen saiu do banheiro cambaleando, com ainda mais olheiras do que era
normal em sua maquiagem de palco. Chanelle estava se queixando com
Bronwen e fingindo mostrar interesse em uma bandeja de vol-au-vents (veganos
e sem glúten, claro). Ela estava mais uma vez falando sobre sua estupida
estatueta, em um tom declamatório, o que indicava que ela estava fazendo um
anuncio público e com uma nota ascendente que sugeria que ela estava
convocando os cães de caça.
Tania tampou os ouvidos com as mãos e olhou para Sam, seus olhos apelando
para que ele fizesse alguma coisa, qualquer coisa.
Sam caminhou até o centro da sala verde, seu rosto impassível. Ele estudou as
mulheres brigando no outro canto da sala. “Calem as bocas, vocês duas.” Ele
gritou.
Então ele tirou uma arma do bolso da jaqueta e disparou contra elas. As
mulheres chocadas mal tiveram tempo de gritar ante de simplesmente
desaparecerem.
Tania piscou em descrença. Piscou novamente. Ela gritou.
Sam se virou. Seus dedos estavam em seus lábios enquanto caminhava em sua
direção.
“Não” balbuciou Tania. “Por favor.” Ela se afastou dele até que se bateu contra
a parede. “Sam, não...por favor... eu achei que te conhecia.”
Ele parou na frente dela e sorriu. “Você me conhecia naquele quarto de hotel.”
Quando ela olhou nos olhos dele, não estavam mais azuis. Eles eram escuros,
frios e perigosos.
Ele se aproximou. Como que esse poderia ser o mesmo homem que a tocou
com tanta ternura naquele dia? Ele não estava a segurando, mas ainda parecia
que ela estava sufocando.
Ela conseguiu resmungar: “Quem é você?”
“Você pode me chamar de Mestre.”
***
“...isso de novo,” disse Loge.
O Mestre tentou se estabilizou com a sobrecarga sensorial da sala que o
envolvia. Ele olhou para o biomecanoide. Sua estrutura, alta, magra ainda
estavam posicionados de forma incongruente na cadeira ao lado da estante,
exatamente como ele lembrava.
Loge pressionou o rosto na imagem da mesa iluminada. “Narvi é um jogador de
futebol.” Vamos começar com ele?”
***
“Ok, última pergunta,“ disse O’Mahoney. Ele coloca seu casaco de camelo com
firmeza no ombro, pronto para sair.
Phoebe Karta olhou para seu gerente de campanha. “Tenho certeza que
podemos responder mais algumas perguntas.“ Ela examinou as pessoas
reunidas com um desprezo fulminante.
Os jornalistas começaram a disparar perguntas. O partido dela realmente apoiou
a politica de repatriação? Como ela poderia repudiar o financiamento da
campanha da oposição quando ela mesma não quis revelar os próprios arranjos
fiscais? Era verdade que ela não tinha lido sua própria circular? Porque ela
estava cobrando uma taxa de entrada para quem fosse comparecer a seus
comícios?
Ela escolheu uma mulher da segunda fila. Phoebe poderia ridicularizar seu
penteado, seu jeito de vestir – isso sempre ia bem com sua base, e ninguém
poderia acusar Phoebe de sexismo porque ela era uma mulher, não era? Que
se fez sozinha. Não ela não achou que estava se vangloriando, claro.
O’Mahoney parecia estar prestes a interrompê-la quando recebeu uma ligação.
Phoebe não pareceu perceber quando ele falava silenciosamente e saia da sala,
mas tempo para passar sua mensagem aos súditos da imprensa. Não importa
qual seja a pergunta, ela faria seu discurso de sempre: Deus nos deu mãos para
oferecer as pessoas um aceno amigável, não dinheiro em espécie. Todo gasto
social é comunismo. Existe apenas uma religião verdadeira, todos os outros são
ateístas. Para ter uma defesa forte você deve banir todos os alienígenas
indesejáveis.
Phoebe fez seu mantra “riqueza significa saúde” e em seguida reprisou sua
famosa e cruel representação de um ativista cego. Isso tinha caído bem na
semana passada, causando indignação por todo país: “Ele literalmente não
consegue ver qual é a verdade!” No meio da impersonificação seus olhos
desfocados avistaram alguém entrando no salão.
Não era O’Mahoney mas ela o reconheceu de qualquer maneira. A imprensa
também. Câmeras e rostos se reorientaram para ele.
“Padre Wallingford! Você está apoiando Phoebe Karta...? Você pode confirmar
que sua igreja está financiando...? Qual sua resposta as acusações dos pais
sobre...?”
Wallingford ativou seu familiar charme do sul. Seu sorriso ameaçou dividir seu
rosto gordo e corado na metade. Ele mascava um chiclete enquanto falava.
“Haverá tempo o suficiente para isso mais tarde amigos! Agora minha candidata
tem que estar pronta para seu comício.” Ele dispersou qualquer outra pergunta.
“Sejam abençoados, todos vocês! Vocês podem terminar a entrevista depois do
discurso. Podem ir agora, a sala da imprensa está pronta para vocês.”
Phoebe o fulminou com o olhar, a velha fraude. Toda a energia da sala tinha
mudado dela para ele em um instante. O momento foi perdido. Ela
relutantemente permitiu que o falso padre a conduzisse para longe da sala de
impressa.
A área de estar tinha assentos confortáveis, uma variedade de lanches e bebidas
e um espelho de maquiagem.
Phoebe puxou o cotovelo das mãos do Padre Wallingford. “Porque você me
arrastou pra cá? Eu estava arrasando lá.”
“Sim.” Wallingford puxou uma cadeira para ela. “Eu sei como isso pode ser
satisfatório.”
Phoebe se sentou, tirou seus óculos e olhou para o espelho. Ela começou a
pentear o cabelo. Wallingford estava atras dela alisando sua batina, para que ela
pudesse ver seu reflexo com um olhar raivoso. “E... você disse minha
candidata?”
Seu sorriso estupido não desapareceu. “É o que eles querem ouvir, você sabe.”
“Eu não pedi o seu endosso.”
“Você também não rejeitou. Você está contente o suficiente por eu angariar
apoio.”
Phoebe bufou. “Está mais para agitar.”
Ele ofereceu uma reverencia simulada. “Eu sou seu humilde servo.”
“Humilde!” Phoebe abaixou a escova e procurou por seu batom. “Você veio em
seu jato particular, padre?”
Ele se afastou dela. “Bom, era muito longe para viajar de burro.”
Phoebe não conseguia encontrar seu batom na cômoda de madeira. Ela olhou
em volta e também não conseguia encontrar seu manequim. A sala estava tão
vazia e quieta que ela conseguia ouvir as vozes distantes e aplausos da multidão
à espera da convenção.
“Onde está todo mundo?”
Wallingford parecia preocupado com algo no fundo da sala. Um tipo de
manequim sentado apoiado na cadeira contra a parede. “Eu mandei todos irem
embora.”
“Eu preciso da maquiadora.” Phoebe mexeu nos acessórios espalhados em sua
penteadeira.
“E preciso do meu gerente de campanha. Onde está O’Mahoney?”
“Ele não está aqui,” respondeu Wallingford. Ele colocou um boné da campanha
Vote Karta na cabeça do manequim.
Phoebe girou na cadeira e olhou fixamente para Wallingford. “Eu preciso dele.
Agora.”
“Você não precisa.” Wellingford caminhou até ela e girou sua cadeira para que
ela encarasse o espelho.
“Ele terá um papel bem menor nos eventos de hoje.”
Phoebe começou a protestar, mas parou quando percebeu que o manequim de
algum jeito estava lutando para ficar de pé.
Phoebe procurou seus óculos e tentou se virar, mas o padre Wellingford estava
segurando a cadeira.
“Termine sua maquiagem.”
“Quem é você para me dizer o que fazer?” Ela empurrou seus óculos de grife no
nariz. “Quem você pensa que é?”
“Eu sou muitas coisas,” disse o Padre Wellingford. Ele não estava mais sorrindo.
“Você pode me chamar de Mestre.”
Phoebe sufocou uma risada. “Qual é. Quem vai te chamar desse jeito?”
“Praticamente todo mundo, minha querida.”
Ela percebeu que o manequim havia atravessado a sala e agora estava do lado
de Wellingford. Abaixo do boné Vote Karta, olhos reptilianos piscaram pra ele.
Phoebe encarou desesperadamente Wellingford. O reflexo de seus olhos
escuros travou seu olhar, e ela se viu impossibilitada de desviar.
Phoebe Karta recuperou suas memorias Hyrrokin mais rápido que suas
contrapartes, o Mestre notou. Ela estava falando com Loge perto da mesa de
maquiagem enquanto o Mestre verificava o corredor para ver se não tinha
ninguém. Talvez essa extração fosse mais fácil que as outras. Ainda assim, ela
ficaria chocada quando Loge revelasse a verdadeira razão para transporta-la.
Loge vai ter sua própria surpresa, pensou ele.
Quando ele estava de volta a sala, Karta o ajudou a vestir o biomecanoide no
casaco de camelo de O’Mahoney – ele se certificou de tirar do gerente de
campanha antes de matá-lo. Os dedos enrolados de Loge ficavam pendurados
no final das magas. O Mestre ajudou com o boné da campanha na tentativa de
esconder os olhos reptilianos.
Karta não estava convencida. “Parece ridículo.”
“Quando se trata de disfarces ele é meio que um conhecedor,” afirmou Loge de
forma tranquilizadora. “Você deveria ver o Hughie Green dele.”
“Seu público aguarda.” O Mestre acenou com a cabeça em direção a saída do
auditório, onde a música da campanha tinha incitado a antecipação das pessoas.
“É hora de levá-los ao frenesi com sua retórica.”
“Não tenho certeza se eu consigo lembrar qual era as mensagens de campanha
dela.”
“Ah, veja.” O Mestre já estava com as mãos na maçaneta. “A mudança climática
é uma farsa, deportar todos os estrangeiros, os pobres não importam – não deve
ser tão difícil? Basta ler os cartazes dos idiotas.”
Ele foi atingido por um novo pensamento repentino. “Ou ainda melhor...” O
Mestre saltou para frente e colocou seu polegar na boca de Karta, manchando
seu batom na bochecha. Ele bagunçou seu cabelo. “Agora me siga.”
A fanfarra que deu as boas-vindas a Karta enquanto ela subia no pódio alertou
a enorme multidão de sua chegada. O centro de conferência lotado reverberou
de alegria. Um repetido canto de “riqueza é saúde! Riqueza é saúde!” ecoou
pelas vigas.
Outra grande ovação ecoou por todo o local enquanto uma câmera filmava a
festa da plataforma. A multidão assistia a enorme exibição e reconheceu
claramente Wallingford quando ele pegou o microfone.
Ao invés de acalma-los para que ele pudesse ouvir melhor, o Mestre criou mais
energia de seus gritos e cânticos. “Eu vim aqui apresentar Phoebe Karta a
vocês,” ele berrou no microfone com o sotaque sulista afetado do Padre
Wellingford. “Mas ela não precisa de apresentação. Vocês a conhecem melhor
que ninguém. Certamente melhor que a imprensa. Eles a atacam por qualquer
coisa que ela diga...”
Gritos de concordância e raiva ressonaram da multidão pelo lugar.
O Mestre acenou para que Karta se juntasse a ele no centro das atenções.
“Mas em sua coletiva de imprensa há apenas alguns momentos, foi assim que
eles a atacaram!”
A câmera deu um zoom no rosto de Karta para revelar seu cabelo bagunçado e
maquiagem borrada. Houve um tumulto de espanto em todo o local.
“Bem, esses criadores de notícias falsas estão aqui essa noite, meus amigos!”
O Mestre apontou para a área da imprensa na parte de trás do centro de
conferência. “E eles não são nossos amigos. Vocês sabem o que fazer.”
A plateia recuou como uma mare vazante. A massa de enlouquecidos
apoiadores transbordou para a área da imprensa. Luzes de arco caíram e
brilharam, a câmera parou de gravar.
“Agora!” ele pediu a Loge. “Faça agora!”
O Mestre se recostou, rindo do caos que havia criado. Ele arrancou a máscara
de Wellingford e jogou a de lado. Era hora de escapar com Loge, e uma vez que
a transferência de Karta estiver completa, recuperar sua TARDIS.
Ele olhou em volta para ver onde Loge estava. Não seria bom perdê-lo nesse
pandemônio. Mas algo estava diferente dessa vez. O biomecanoide não estava
se afastando de Karta; ele tinha se aproximado e estava segurando sua mão
esquerda enquanto o efeito similar do redemoinho de transferência psíquica os
envolvia.
No mesmo segundo o Mestre sabia que Loge iria abandoná-lo. Deixando-o aqui,
sem sua TARDIS, sem sua vingança.
O rugido de fúria do Mestre se perdeu no caos ao redor dele. Loge estava se
afastando, puxando Karta. O Mestre levantou a batina e deu dois grandes passos
em direção aos dois. Ele pegou a mão de Karta. Uma onda de energia o agarrou,
pressionando em um diluvio de poder como em uma tempestade tropical. E
então ele não conseguia mais ver o auditório.
O diluvio se dissolveu ao redor dele quase tão rápido como tinha começado. A
cegueira esporádica do brilho das luzes do estádio foi substituída por um outro
brilho. O Mestre soltou a mão de Karta e tropeçou para trás até uma parede.
Essa só poderia ser a plataforma solar Hyrrokin; a decoração austera e quase
nenhuma móvel, estranhamente lembrava o Mestre de sua cela.
Karta mal reconheceu sua transferência abrupta e instantânea através de
150.000 quilômetros de espaço quando se virou para Loge. “Onde estão os
outros?” Havia um novo tom de comando em sua voz. Não o de aspirante a
político, mas calma e confiança de alguém familiarizado com o comando e
autoridade.
Loge estava ocupado tentando se livrar do disfarce com certa dificuldade. Ele
indicou um caminho através de um arco de saída. “Eles estão esperando por
você na sala de preparação.” Em seguido ele viu o Master do outro lado de Karta
e teve uma reação absurdamente reptiliana de descrença.
Ele se atrapalhou para escapar do pesado casaco de camelo. Tentando
encontrar o dispositivo de condenação, talvez.
O Mestre deu um tapinha no bolso de sua batina para localizar o compressor de
eliminação de tecido. Ele estava pronto para a vingança imediata contra o
biomecanoide; e seria satisfatória depois de tudo o que ele havia passado.
Isso o estabeleceria como o salvador dos senhores de guerra quando ele
revelasse as verdadeiras intenções de Loge.
Mas Loge foi mais rápido. Seus braços dispararam e seus dedos longos se
fecharam no pulso do Mestre, como aço. O Mestre gritou quando foi forçado a
ficar de joelhos.
“Não se preocupe com ele,” disse Karta a Loge. “Traga-o para os outros e talvez
ele posse ser útil antes de partirmos.”
Antes que o Mestre pudesse intervir, ela saiu da câmara. Loge colocou o Mestre
de pé, e então seguiu atrás de Karta.
“Você está deixando seus próprios prisioneiros tratá-lo dessa maneira?” disse o
Mestre.
Loge não respondeu.
O Mestre andou atrás deles. Já ensaiando em sua mente as palavras doces e
lisonjeiras que ele iria usar para tentar persuadir os senhores de guerra a
trabalhar com ele.
A próxima câmara da nave era um espaço curvo alinhado com equipamentos.
Janelas quebradas entre as maquinas foram firmemente vedadas, para evitar o
efeito devastador do calor e da luz da estrela de sobrecarregar os ocupantes.
Metade da parede oposta exibia uma imagem de uma terra distante.
Pelo corte de cabelo absurdo o Mestre reconheceu duas figuras agachadas
sobre o painel de instrumento.
Narvi não estava mais com seu uniforme de futebol, embora seu rosto ainda
estivesse manchado de lama do campo. Siarnaq também havia trocada suas
ridículas roupas de palco e agora assim como Narvi usava macacões práticos
que devem ter retirada das entranhas de um traje espacial. Do outro lado da sala,
Karta estava vestindo roupas semelhantes.
O Mestre apontou um dedo acusador para Loge. “Esse ciborgue me enganou. E
vai enganar vocês também.”
Três senhores da guerra agora olhavam para ele.
“Loge não está libertando vocês. É um biomecanóide de julgamento e vai mandá-
los de volta para enfrentar a justiça na dimensão Hyrrokin. Se vocês valorizam
sua liberdade, force-o a revelar onde está minha nave para que eu possa ajudá-
los. Vocês podem ficar nessa dimensão sem consequências.” Ele apontou uma
mão enfaticamente para a tela de exibição. “Comigo ao seu serviço posso dar a
terra a vocês.”
Narvi se aproximou dele, com aquele sorriso insolente familiar estampado na
cara dele novamente. “Nós não precisamos dos seus serviços. É por isso que
temos Loge.”
“Quem você acha que nos trouxe ao seu planeta primitivos em primeiro lugar,
todos esses anos atras?” Siarnaq sorriu. “E quem estava pronto para nos ajudar
a voltar quando o momento era mais propicio?”
O Mestre olhou incrédulo para o biomecanoide.
“Estava na hora.” Disse Loge.
“Então vocês têm o que queriam,” vociferou o Mestre. Ele engoliu a raiva
crescendo dentro dele, tentando manter o desespero longe de sua voz. “Deixe-
me volta para a minha TARDIS e posso ir embora.”
“As pessoas mais inteligentes podem ser as mais fáceis de influenciar,” disse
Loge, “Se você tivesse prestado atenção, teria percebido que eu escondi sua
nave da sua própria percepção.”
Loge inclinou a cabeça para o lado em um movimento brusco, e foi como se uma
janela se abrisse na mente do Mestre. “A estante!” ele disse. “De volta aos
quartos da faculdade. De volta a TARDIS.”
Não temos uso para a terra”, disse Siarnaq. “Você pode ir pra lá.”
“Ou para o que vai sobra dela,” disse Narvi.
O calor foi drenado do Mestre agora e ele sentiu um pavor. “O que você quer
dizer?”
Karta se juntou aos outros dois nos controles do painel. “Chegar nessa estação
da Terra exigiu muito energia psíquica. Milhares de pessoas zangadas,
animadas, ansiosas foram o suficiente para cada uma de nós.”
“Mas para nós levar de volta a Hyrrokin,” disse Narvi “vai exigir muito mais.
Bilhões de pessoas, eu diria.”
O Mestre tentou entender. “Todo o planeta?”
Usaremos essa nave para transformar o seu Sol em uma supernova. Isso não é
o tipo de coisa que as pessoas na terra irão ignorar.” Disse Narvi ainda sorrindo.
“Loge deixará claro para eles com uma transmissão planetária assim que a
reação começar a crescer. O terror subsequente, o desespero de bilhões irá
alimentar nossa fuga e nós estaremos em casa antes que o sol se devore.”
“E tirar os humanos de sua miséria”. Adicionou Karta.
O Mestre olhou freneticamente ao seu redor. Uma tentativa inútil de observar
todos os equipamentos o cercando e identificar algo, qualquer coisa, que
pudesse ajudar.
O aperto de Loge havia relaxado seu braço. O Mestre sentiu novamente o
Compressor de eliminação de tecido. Será que ele poderia matar todos eles
antes que desencadeassem essa reação em cadeia?
Ele se afastou de Loge e se virou para enfrentar os senhores de guerra.
Desespero e raiva o tomaram. “O que vocês esperam que eu faça?”
“Você vai morrer aqui,” Loge disse a ele.
“Você não pode fazer isso!” berrou o Mestre, e sua mão agarrou a alça do
compresso de eliminação de tecido no bolso.
Loge entrou na frente, bloqueando sua visão dos senhores de guerra. “Qual é.
Você sabe que eu posso te aprisionar ou libertar com a mesma facilidade...”
***
Cinza, cinza, cinza. A cela o encarava de volta, sem lhe dar nada. A estante
vazia ao lado do fogo morto. A cama fria. A tigela de mingau.
Ele manteve sua raiva para si mesmo, maior do que qualquer coisa na sala. E
no bolso de seu uniforme de prisão ele segurou a colher de estanho. Ele sabia
que não poderia ficar sem isso, mesmo que ele quisesse. E ele não queria. Ele
poderia ficar assim para sempre se necessário.
Ele esperava que não fosse para sempre. O Mestre ficou lá, imóvel, segurando
a colher em um aperto implacável por cinco dias até ele sentir a dor de cabeça
começando a voltar.
***
3 de agosto.
E assim minha provação continuou.
Passei meus dias trancado em meu quarto na pensão, me escondendo da luz,
entrando e saindo no esquecimento. Não importava; o pesadelo permanecia
quer eu acordasse ou dormisse.
A luz que vazava pelas cortinas dava lugar à escuridão, e com ela viria a
convocação. Todos os dias eu esperava mais que tudo que a compulsão não
voltasse, mas todas as noites depois que a casa caía em silêncio, eu me via
caminhando pelas ruas estreitas e vazias de Whitby.
Procurando, caçando mais presas para levar ao meu Mestre.
5 de agosto.
Dormi 24 horas inteiras após minha fuga aterrorizada do cemitério. Não parei
para respirar até chegar ao Royal Crescent e até estar em segurança na pensão
da Sra. Veazey. Em cada canto, eu temia o apertar de garras daqueles dedos
atrofiados agarrando-me nas sombras para me trazer de volta à compulsão do
Mestre.
No entanto, não havia perseguição; eu fui em segurança pelas ruas e estava no
meu quarto quando o sol nasceu.
Acordei e, para minha grande surpresa, me senti mais revigorado do que estive
em todos os outros dias. Um olhar calmo me encarou de volta no espelho e uma
certa cor voltou ao meu rosto.
Eu estava realmente livre de minha servidão abominável? Havia tudo aquilo sido
apenas um grande pesadelo, uma invenção de uma imaginação inquieta?
Tomei banho e me vesti, desci cautelosamente para o café da manhã, temendo
ser recebido por meus colegas convidados após o constrangimento do episódio
do jantar. Não havia necessidade para tal preocupação. Todos as três pareciam
animadas com a minha presença, dizendo o quanto eu parecia mais em forma.
Até a Sra. Veazey me pareceu bem-disposta, especialmente depois que indiquei
que estaria ausente do meu quarto se ela quisesse limpar.
"Ficou sabendo, Sr. Stoker, sobre o falatório na cidade?" Perguntou a Srta.
Smith.
Admiti que não, devido à minha doença prolongada. Foi como eu resolvi lidar
com tudo isso na minha cabeça.
"A coisa certa a se fazer." disse a Sra. Veazey, trazendo um bule de chá fresco.
"Pobre Sr. Swale."
O medo tomou conta de meu coração quando as Senhores começaram a contar
sobre a morte de um mendigo chamado, Sr. Swale, que fora encontrado sem
vida em um banco nas proximidades do cemitério. Swale era conhecido na
cidade por ser inofensivo, e todos concordaram que era uma tragédia que ele
tivesse perdido a vida de tal forma.
Tomei um gole do meu chá, para que pudesse organizar meus pensamentos
confusos e para lavar a secura de minha garganta. “Disseram como ele morreu?”
Perguntei.
“Exposição ao tempo devido a estar passando a noite na rua,” disse a Sra.
Veazey com a naturalidade que apenas alguém nascido em Yorkshire poderia
expressar.
Eu respirei um alívio repentino. Se esse fosse um ato perpetrado por aquele
demônio, o corpo teria se desfeito em pó, como os animais que eu levei para que
ele se alimentasse. Talvez, enquanto escrevo, o Mestre esteja morrendo no chão
do santuário, faminto da força vital que precisava para sobreviver.
“Isso é muito triste,” eu disse, tomando outro gole de chá, sentindo o líquido
aquecer meu corpo.
5 de agosto. Mais tarde.
Passei a maior parte daquele dia na cidade. A brisa do mar estava mais doce do
que imaginei que poderia ser, e meu ânimo se recuperou ainda mais. Eu
caminhei ao longo da parede do porto, saboreando o sol que aquecia a cidade,
decididoo a aproveitar ao máximo o tempo que me restava aqui. Eu tinha alguns
dias até que Florrie e Noel chegassem e ainda havia muito o que ver. Nos
próximos dias, pretendia visitar a biblioteca pública do Coffe House no cais, com
meus pensamentos claros o suficiente sem toda aquela obra de ficção que fez
raiz na minha mente.
Voltei ao número 6 da Royal Crescent no final do dia, um homem em paz.
Essa paz duraria pouco.
Escolhi jantar longe de meu alojamento e desfrutei uma boa refeição em um dos
albergues locais. Achei a companhia dos pecadores locais restauradora e
bastante esclarecedora com sua hospitalidade a um recém-chegado sendo
incomparável. Ouvi todas suas histórias e já estava escuro quando voltei a
pousada.
Ao voltar para a pousada com a intenção de logo ir me deitar, encontrei a Sra.
Smith e a Sra. Stokes esperando ansiosamente pelo meu retorno na sala de
jantar. Eu perguntei o que as afligia.
“Oh, Sr. Stoker, é minha filha,” disse a Sra. Smith visivelmente abalada.
A Senhora Stokes tentou acalmar a mulher mais velha, dirigindo-a até o sofá
para que pudesse se sentar. “Marjorie não voltou para o jantar,” disse a Sra.
Stokes, com o rosto pálido. “Ela saiu no final da tarde para tomar um pouco de
ar.”
“Tenho certeza de que não existe motivos para preocupação.” Eu disse,
colocando o máximo de convicção que consegui em minhas palavras. “Ela disse
onde pretendia ir?”
“Para a abadia e então para o cemitério,” disse a Sra. Smith.
A sala girou naquele momento, um pavor obscuro caiu sob minha cabeça
embrulhando meu estômago. Eu me segurei na mesa.
“Senhor Stoker?” Disse a Sra. Stoker, com uma das mãos segurando meu braço.
Abri meus olhos e olhei para seu rosto preocupado.
Eu corri para fora do quarto, abri a porta da frente e fui em direção à noite.
5 de agosto. 11:00.
Eu esperava com toda a esperança, encontrar a Senhorita Smith vagando pelas
ruas, tendo de alguma forma se perdido durante sua caminhada.
Entretanto, eu sabia que não encontraria.
Cheguei ao fim da escadaria da Abadia. Esperei por várias horas, olhando pra
cima enquanto se curvavam para longe de mim. Eu sabia que precisava escalar,
como fizera tantas vezes nos últimos quatros dias.
Toda a liberdade que senti, durou pouco. Uma determinação raivosa me tomou.
Como um grunhido de raiva, coloquei meu pé no primeiro degrau, indo em frente.
A cada passo dado, minha raiva crescia.
Respirando com dificuldade, eu entrei no cemitério da igreja. Nuvens escondiam
a lua, mas eu sabia o caminho certo a seguir, andando com passos firmes entre
as lápides na escuridão. Com um pavor terrível, vi meu destino, a lápide cheia
de buracos, naquele ângulo doentio. Eu agarrei a ponta da pedra, como se
quisesse ganhar as forças vindas daquele núcleo. Respirei fundo, me arrastei
para frente e permiti que a lápide me consumisse.
Tremendo e desorientado por ter passado por aquele portal escuro, avancei até
o santuário. Estava como eu havia deixado, tão quebrado e podre quanto o
habitante que ocupava as sombras.
Eu vi o Mestre do outro lado da câmara, de costas para mim com a cabeça
encapuzada abaixada olhando em direção à alcova esquerda. Ele acomodou
uma figura inconsciente naquela luz amarela gordurosa. Senhorita Smith! Eu
quase me desesperei com o horror.
Meu pé raspou na pedra quebrada. O Mestre se virou para me encarar, os olhos
brilhando na escuridão. “Stoker,” ele respirou. “Você não deveria ter voltado
aqui!”
“Demônio!” Gritei, mergulhando de cabeça no santuário. Ele foi até o painel de
controle com velocidade inesperada, aparentado alegria em seu rosto enquanto
alcançava a segunda alcova e o controle de ativação. Sua mão agarrou a
maçaneta de madeira. Senhorita Smith gemeu, alheia a toda a situação.
Rugindo, me joguei contra ele, arrancando-o fisicamente daquele aparelho
infernal, jogando-o no chão. Senhorita Smith gemeu, sua cabeça pendia para
trás. Corri até ela, tentei puxa-la para fora da alcova. Mas então, mãos como
garras se fecharam em volta do meu rosto, me puxando para trás com uma força
brutal. Eu gritei, o Mestre sibilou em meus ouvidos, suas garras sondando meus
olhos. “Humano inútil.” Ele murmurou.
Eu o mordi com força, encontrando carne magra e podre. O Mestre gritou em
agonia, puxando sua mão de volta e então se afastando de mim. Eu me virei,
mirando um soco no seu rosto exposto. Ele se esquivou com a habilidade de um
lutador premiado, voltando com um golpe certeiro na cabeça que me fez
cambalear. Eu agarrei a borda da plataforma de controle para me equilibrar,
virando-me para enfrentar seu próximo ataque. Ele puxou o capuz para revelar
toda a extensão de suas feições horríveis, saltando em minha direção com uma
intenção cruel. Tamanha foi a ferocidade de seu ataque que acabei recuando.
Ele estava imediatamente em cima de mim, dedos na minha garganta.
Seus olhos brilharam, me encarando com uma intensidade aterrorizante. Eu
tinha experimentado aquele olhar imortal antes, mas agora aqueles olhos
apagaram toda a realidade, cavando em minha alma. Eu vi raiva e depravação,
uma fome de domínio sobre toda a vida.
“O que você é?” Eu gritei.
“Eu sou o Mestre!” Ele rosnou, como um animal abafando todos os outros sons.
“E você vai me obedecer!”
Puro poder fluiu em mim, me consumindo. Eu estava preparado para me
entregar à sua promessa sedutora.
“Você vai me obedecer! “O Mestre falou mais uma vez.
Imagens dançaram em meus olhos, uma lanterna mágica de momentos
arrebatados de minha vida. O rosto de Florrie e Noel. Tão queridos para mim, e
quase perdidos. Eu estiquei minha cabeça, vendo a Srta. Smith sentada dentro
da alcova, tão pacífica, uma inocente em tudo isso.
“Eu não vou obedecer!” Gritei, levantando minhas mãos, colocando-as contra a
carne esfolada de seu rosto, forçando-o a recuar. Imediatamente senti seu poder
diminuir, o corpo fraco e magro sob sua capa, como se a energia estivesse
sugando sua alma. Com um urro desafiador de raiva, eu o empurrei para trás. O
Mestre se chocou contra um pilar com um grito de dor, fragmentos de pedra
caíram sobre ele. Imediatamente ele avançou, a capa ondulando, vindo em
minha direção novamente.
Eu lutei, e todo essa luta fez com que as forças do Mestre se esgotassem. Eu o
lancei como um pano contra o painel de controle. Ele gritou quando faíscas
irromperam do estrado, formando um halo em torno como brilho do fogo de Santo
Antônio. A câmara inteira estremeceu, o chão tremendo sob meus pés. Um grito
estridente ecoava.
“Seu imbecil!” Sibilou o Mestre, as mãos mexendo nos botões e interruptores.
“Você ativou os circuitos de desmaterialização!”
Eu não sabia o que essas palavras significavam. A atenção do Mestre foi atraída
pelo aparelho que faiscava e crepitava, corri para a Srta. Smith. Eu a peguei
enquanto ela desmaiava na alcova, a luz amarela desaparecendo no nada. Eu
levantei sua forma esguia com ambos os braços, o chão se movendo sob meus
pés quando me virei. O ar estava denso com som e luz, o lamento aumentando
em tom como um grito angustiado das profundezas do inferno.
O Mestre correu ao redor do estrado, golpeando os interruptores, aquele rosto
horrível parecia uma máscara de desespero. “Ainda não é hora! Stoker, me
ajude!” Ele implorou, mas seu domínio sobre meu espírito havia terminado. Eu
ergui a Srta. Smith e corri.
Poeira choveu de cima, pedaços de pedra quebrando das paredes e se
espatifando no chão esburacado. Me forcei a manter o equilíbrio. Então virei e
olhei para trás.
“Não!” Lamentou o Mestre enquanto uma luz brilhante filtrava-se pela superfície
suja e queimada da válvula de vidro no centro da plataforma. Ele se firmou em
um movimento, sacudindo-se para cima.
Do outro lado da plataforma, as feições encapuzadas do Mestre saltaram, olhos
fixos nos meus.
Foi a última vez que olhei para aquela máscara de terror. Eu me virei e avancei
para o retângulo de escuridão.
O ar frio correu pelo meu rosto, meus pés tocaram a grama brilhante sob a luz
do amanhecer. Coloquei a Srta. Smith suavemente no chão. De repente, pesado
e cansado, caí de joelhos ao lado dela, puxando uma lufada de ar doce.
Diante de mim, a lápide pulsou com a luz. Eu temia que a qualquer segundo o
habitante que espreitava lá dentro se levantasse para obter uma amostra da
vingança que eu sabia que ficaria para sempre em sua alma. Mas momentos
depois, a pedra começou a desbotar, o ar se encheu com o mesmo grito
lamentoso. Pode ter sido um truque do amanhecer, mas em algum lugar dentro
daquela cacofonia eu jurei que podia discernir um grito de raiva selvagem. Um
segundo depois, a lápide desapareceu no nada.
Um gemido suave me puxou de volta para o aqui e agora. Abaixei-me para
examinar a Srta. Smith, que parecia dormir pacificamente. Com sorte, ela não se
lembraria de sua provação, ou a descartaria como um sonho febril.
Eu, é claro, não tive tanta sorte.
7 de agosto.
Minha alma estava inquieta. No dia seguinte, levantei-me muito antes do
amanhecer, incapaz de encontrar qualquer sensação de esquecimento durante
o sono. Eu caminhei com os eventos da semana passada ainda passando em
minha mente.
Eu havia voltado para a pensão com a Srta. Smith, que não parecia que havia
passado por qualquer provação, embora felizmente com pouca memória do que
tinha acontecido. Inventei uma história de como ela desmaiou durante a
caminhada e foi abrigada pelo proprietário de uma hospedaria local enquanto se
recuperava. Isso pareceu satisfazer seus preocupados companheiros, e não
senti necessidade de incomodá-los ainda mais com qualquer indício da terrível
verdade.
Quem acreditaria em mim, de qualquer forma? Histórias como essa eram
destinadas às fantasias da ficção, entretendo as massas.
Enquanto caminhava, ponderei sobre que compulsão havia me levado a cumprir
as ordens daquele monstro: simplesmente um desejo de ajudar uma criatura em
extrema necessidade, ou algo mais traiçoeiro?
Eu caminhei ao longo do West Cliff. Uma brisa suave fluiu do mar, seu toque frio
me refrescando a cada passo. Fiquei surpreso ao chegar até Sandsend, onde
me virei e refiz meus passos de volta em direção a Whitby. Eu me sentia leve e
livre e agora podia esperar a chegada de minha querida Florrie e Noel mais tarde
naquele dia.
Quando me aproximei de Whitby e do Royal Crescent, o sol estava começando
a nascer, a luz do amanhecer trazendo calor para a cidade baixa. Fiz uma pausa
no West Cliff, olhando para o mar, que hoje brilhava calmo e parado.
Meus olhos foram atraídos para o penhasco ao leste e as ruínas da abadia,
orgulhosos e altos. Abaixo dela, fica a igreja de Santa Maria e seu cemitério,
onde os mortos viajam rapidamente.
Uma sombra passou por mim enquanto eu olhava para este quadro, onde minha
provação acontecera poucos dias atrás. Um rosto se ergueu diante de mim, com
cicatrizes e decadência, olhos fixos em mim.
Pisquei, dissipando a visão
Eu sabia com toda certeza que quando olhei nos olhos dessa criatura chamada
Mestre - olhos preenchidos com ódio e depravação - eu havia encarado o
verdadeiro coração das trevas. A quintessência de tudo o que é mau. Ainda nas
noites escuras, ouço o rugido mortal de seu estranho motor e vislumbro a sombra
de sua capa em meio às nuvens que assombram a lua. E eu me pergunto se ele
voltaria por mim de novo.
A MISSÃO MÁGICA E MISTERIOSA DE MISSY
Jaqueline Reyner
Daphne Nollis via o lado bom de todos. Ela mesma já ouviu com frequência que
tinha um coração de ouro, ela acredita com carinho que todas as pessoas tinham
corações igualmente metálicos, apenas precisando de polimento às vezes. E
fazer isso era seu trabalho, literal e figurativamente. Ela trabalhava como
limpadora para Tivone de Enfis, quem a maioria da população acreditava ter
coração nenhum - mas Daphne sabia que estava lá, mesmo que atualmente
estivesse quase completamente manchado. Ela não acreditava em abandonar
pessoas só porque faziam coisas que ela não aprovava, como assassinato
judicial implacável. Abandono apenas lhes empurraria mais para dentro do
escuro, ela pensou, enquanto uma palavra gentil e um bolinho tinha potencial de
lhes trazer de volta do limite.
Então Daphne (‘Senhora N’ para seus clientes, mesmo que não fosse casada),
esfregava o banheiro de Tivone de Enfis, vaporizava a sua masmorra e tirava as
migalhas de sua torradeira, esperando que enquanto isso sua conversa
animada, biscoitos de aveia e passas caseiros e menções ocasionais de como
todas as pessoas eram merecedoras de direitos e respeito fizessem seu coração
brilhar, só um pouquinho. Em troca, Tivone de Enfis deu para Senhora N um
bônus em ocasião do Festival da Nevasca e um cartão holográfico
personalizado, lhe incluiu em suas viagens do Time Tivone, e se controlou para
não mandar matar nenhum de seus parentes (ela teria que admitir que não tinha
muitos deles e se mostrassem algum sinal de comportamento sedicioso teria
sido para corte, no entanto sua irmã / tia / prima de terceiro grau poliu seus
ornamentos).
Motivo pelo qual Daphne não achou nada muito peculiar quando caminhou para
dentro de uma nuvem de brilhos na ante sala do escritório de Tivone de Enfis,
logo entre a Mesa da Ruína do ajudante e o bebedouro, e encontrou a si mesma
recebendo uma mensagem mental no nome de alguém chamado Iarbus, lhe
convidando para um evento misterioso em um planeta não especificado.
Iarbus, Daphne pensou, soava um tanto familiar. O marido da sua prima de
terceiro grau, talvez? Ou era o gerente do departamento de Marketing e Caos, o
que tem a barba pontuda? Não, era aquele homenzinho dos Recursos
Enfisianos; ela tinha quase certeza. Então, não era uma festa de aniversário
(infelizmente) ou uma consulta. Seria um daqueles dias de treinamento. Mas, ela
não ia reclamar, era sempre bom conhecer gente nova e explorar um pouquinho
de um planeta diferente.
O convite telepático vinha com uma confirmação de presença automática, então
Daphne cuidadosamente transmitiu sua aceitação.
Cinco segundos depois, ela era um redemoinho de átomos.
Dez segundos depois disso, ela estava no topo de um penhasco.
Centenas de metros abaixo, ondas roxas se quebravam contra pedras negras
como o ébano, cada uma mais pontuda que os dentes de uma víbora com dentes
de agulha. Mesmo assim, não era bom criticar nada que estava remotamente
sob a supervisão de Tivone de Enfis, então ela se contentou com um minúsculo
dar de ombros mental que teria sido legal se tivessem lhe deixado tirar seu
avental primeiro, ou talvez especificado que vestimentas apropriadas ao ar livre
seriam desejáveis. Até o holograma parado para recepcionar os que chegavam
tinha uma sombrinha holográfica. Talvez fosse a falta de uma capa de chuva e
galochas que fazia o holograma recepcionista lhe encarar com olhos tão
arregalados; olhos que tinham maquiagem demais na opinião de Daphne. Não
eram apenas esfumaçados, eram infernos completos.
Daphne e o holograma não estavam sozinhos no penhasco. Quatro homens
também estavam lá.
O primeiro pensamento de Daphne foi que eles, como ela, não tinham recebido
informação adequada na vestimenta apropriada. Três deles vestiam capas
(muito como Tivone de Enfis frequentemente fazia) e, enquanto o material
parecia maravilhosamente dramático voando no vento uivante, não eram
práticas - muito ocupadas voando para aquecerem. Pior, o quarto homem estava
usando (ou tentava usar) um diadema alto e fino; não apenas era inútil como
proteção contra os elementos, ele havia precisado recolocar o objeto em sua
cabeça três vezes, apenas nos poucos momentos desde que Daphne havia se
materializado.
O holograma feminino com todo aquele rímel (honestamente - um pouquinho de
hidratante labial era o suficiente a não ser que estivesse indo para uma festa ou
algo do tipo) parecia relutante em tirar seus olhos de Daphne, mas
eventualmente balançou a cabeça como se para limpá-la e incluiu a todos em
um sorriso quase predatório. ‘Boas-vindas a todos vocês, convidados de honra.
Talvez pudessem se apresentar?’
Um dos homens com capas riu. ‘Dificilmente eu precisaria de alguma
apresentação.'
‘Oh, querido,’ disse o holograma. 'Você tem que brincar junto. Faça o que a moça
legal diz.’ Ela se inclinou para frente e sussurrou em confidência. 'Quero dizer
eu. Eu sou a moça legal. A moça adorável e holográfica que é apenas um
holograma.’
‘Sim.’ Daphne concordou com a cabeça. 'Não fique nervoso. Alguém tem uma
almofada?’
Os quatro homens levemente sinistros tinham a aparência de que uma pequena
lesma tinha tentado falar com eles. Ah, eles são aquele tipo de pessoa, pensou
Daphne. Provavelmente era esse o motivo pelo qual tinham sido mandados para
um dia longe, uma tentativa de lhes fazer trabalhar melhor uns com os outros.
Que pena que ela não teve uma chance de trazer uma caixa de barrinhas de
aveia consigo, isso sempre quebrava o gelo. Na verdade, olhando para esse
grupo, ela talvez tivesse precisado trazer armamento pesado: brownies de
chocolate.
‘Almofada,’ Daphne repetiu. ‘Qual é, vocês sabem do que eu estou falando.
Conhecendo você! Você joga a almofada e quem pegar tem que contar um fato
sobre si mesmo.’
‘Oh, eu gostei disso!’ O holograma franziu o nariz, e uma almofadinha verde
apareceu no ar e caiu aos pés de Daphne.
Ela pegou do chão. Os quatro homens ainda lhe encaravam. Ela suspirou.
Parecia que ela teria que tomar a iniciativa por si mesma, lhes mostrar como era
feito. ‘Meu nome é Daphne Nollis e eu não sou casada, apesar de que meus
cavalheiros me chamam de Senhora N como cortesia. Eu tenho um turtpup de
estimação e faço um cookie de aveia e passas bom pra caramba, modéstia à
parte.’ Ela jogou a almofada para o homem que tinha dado risada.
Ele pegou, parecendo surpreso com o reflexo. Seus olhos encararam a almofada
por um momento, então levemente incerto falou, ‘Eu, eu, sou o Incorporamento
Rouge. Eu destruí muitos impérios. Homens feitos tremem ao som do meu
nome.’ Ele hesitou, então jogou o objeto para o próximo homem, um ser baixinho
com pele azul pálida e orelhas demais.
‘Eu sou Xnardo, filho de Wnardo, filho de Vnardo.’ A voz de Xnardo aumentou
em volume. ‘O sangue dos reis corre em minhas veias!’
O vento atingiu a almofada enquanto era jogada de novo e ela ficou presa em
uma ponta cheia de joias do diadema fino usado pelo quarto homem (que
também era alto e fino). ‘Eu sou, é claro, Dib o Magnífico. Não preciso dizer mais
nada,’ ele disse enquanto desprendia a almofada
‘Oh, continue, diga um pouco mais.’ disse o holograma. ‘Por favorzinho.’
Dib o Magnífico negou geralmente com a cabeça.
‘Por favorzinho com cerejas no topo? Adoráveis, adoráveis cerejas?’
Dib de repente ficou preocupado. ‘Isso é parte do teste?’
'Você acha que é parte do teste?’ disse o holograma. ‘Ooooh! Talvez seja um
teste para ver o que você vai dizer. Talvez seja um teste para ver se você vai
ficar firme! Ou…’ Ela se inclinou para a frente e sibilou, de maneira que Daphne
mal a escutou sobre o vento. ‘Talvez isso não seja um teste de forma nenhuma.’
A face de Dib se contorceu momentaneamente antes de ficar suave novamente.
‘Eu escolho ficar firme. Não vou dizer mais nada.’
O holograma balançou a cabeça com tristeza. ‘Bem, se você tem certeza,
querido…’
'Não!' Dib gritou repentinamente. ‘Eu direi outra coisa. Ah! Eu sei.’ Ele sorriu. ‘Eu
tenho setenta e nove concubinas.
Daphne bufou em desaprovação.
‘Sim, uma desgraça,' o holograma concordou. ‘Por que não arredondar para
oitenta?’ Ela virou para o último homem, que havia acabado de pegar a
almofadinha da jogada deplorável feita por Dib. ‘Vamos lá, então. Sua vez,
gracinha.’
Esse homem era, aos olhos de Daphne, ‘normal’, tirando um nariz bastante
comprido que parecia a tromba de um elefante - e, como ela descobriria, uma
boca redonda e pequena que se abria como algum tipo de planta carnívora ou
anêmona marinha quando ele falava, soltando sílabas pequenas em stacatto.
‘Eu. Sou. Ⅎ.’
O holograma cutucou Daphne nas costelas (no entanto Daphne obviamente não
sentiu nada). ‘Eu estava imaginando como pronunciar isso,’ ela disse. Ⅎ jogou a
almofadinha para longe, seu longo nariz se enrugando como se o objeto fosse
algo fedido, como o colete que pertencia a Tvone de Enfis após um dia pesado
na conquista de mundos. Passou através do holograma - que segurou seu
estômago e cambaleou por alguns segundos, antes de fingir que descobria, em
seu espanto, que não havia um buraco em seu torso - e caiu no chão de pedras.
Daphne, arqueadora automática, pegou a almofadinha e colocou no bolso de
seu avental.
‘É isso, então,’ Daphne disse, vendo que nenhum dos homens ia falar mais
alguma coisa. ‘Eu assumo que você seja a assistente desse tal de Iarbus?’ ela
adicionou, virando para o holograma. 'Você mandou os convites, não?'
O holograma sorriu largo e balançou a cabeça de um lado para o outro. ‘Eu sou
MISSY!’
‘MISSY?’
‘Misterioso Simulacro.’
Daphne piscou.
'Você acha que eu não sou misteriosa?’ disse o holograma, aparentando ofensa.
‘Eu não disse uma palavra,’ Daphne apontou a verdade.
‘Oh, então tudo bem,’ o holograma respondeu. ‘Isso nem funcionava mesmo.
Que tal isso? Você é a Senhora N - eu sou a senhorita E, Miss E!’
‘O que o E quer dizer?’ Daphne perguntou.
‘Tudo! Energética, excelente, excitante - eficiente, especial, e extremamente
encantadora!’
Enquanto os outros ficaram por perto com expressões perplexas e não
impressionadas, Daphne acenou educadamente com a cabeça.
‘Parece que Iarbus é um homem de sorte por ter você, então,' ela disse. Ela não
estava acostumada com hologramas tão cheios de… personalidade.
Geralmente eles simplesmente exerciam uma função, uma simulação de
computador com uma face por cima para facilitar a relação. E eles raramente
eram programados para piscar assim para você, como se vocês duas estivessem
compartilhando um segredo emocionante. Era até legal, na verdade. Daphne
não tinha mais tantos amigos quanto costumava ter; eles simplesmente não
entendiam porque ela continuava trabalhando para Tivone de Enfis. Por que não
podiam entender? Não era como se ela também não quisesse um mundo cheio
de paz e compreensão, de sorrisos e alegria, de pudim de caramelo e festas de
aniversário, um mundo onde você pudesse dizer ‘Aquele Tivone é um pouco
idiota’ sem condenar você e sua família a serem estrangulados pela Guarda
Enfisiana. É claro que ela queria! Ela estava apenas trabalhando para derrubar
ele de dentro. Bem, de certa forma pelo menos.
E ir bem nesse dia de excursão patrocinado por Tivone de Enfis seria outro
minucioso passo em direção a esse alvo. Ele ficaria satisfeito com ela, o que
significaria que ela talvez ousasse em mencionar de passagem algo do tipo ‘Ooh,
eu sempre achei que o direito a um julgamento justo fosse uma coisa bem legal,
você não concorda, Senhor Tivone?’ Então ela teria que dar o seu absoluto
melhor em quaisquer eventos que tivessem sido planejados.
Daphne sorriu para o holograma. ‘Eu aposto que você tem umas atividades boas
preparadas para nós, não?'
‘Ah, simplesmente super,’ disse o holograma. ‘Cem por cento super duper. Por
que você não adivinha o que vamos fazer primeiro?’
Daphne deu de ombros. ‘Alguma coisa para construir um espírito de equipe, não
é? Exercícios de confiança? Você sabe, onde você tem que cair pra trás e confiar
em alguém para te pegar. Eu já fiz isso antes.’ Ela olhou para os quatro homens
com certa hesitação. Ela provavelmente esmagaria o magricelo Dib o Magnífico
em uma panqueca se caísse em cima dele. E enquanto ela sempre se orgulhou
de si mesma por não ter preconceito contra ninguém, não importando sua cor,
forma ou tamanho, ela não estava exatamente animada com a ideia de aterrissar
na tromba preênsil de Ⅎ; quem seria capaz de dizer onde poderia encostar? ‘Ou,
talvez você estivesse pensando em uma caça ao tesouro? Não que tenha gente
o suficiente para dividir em times iguais. E tinha algo para coletar aqui além de
pedras?’
Xnardo grunhiu. ‘Pare com essa tolice! Eu fui convocado para este lugar pelo
próprio Iarbus! Ele considerou a mim, e apenas a mim, digno de herdar seu
grande poder!’
‘Ooh, agora você talvez possa me ajudar,’ Disse Daphne. ‘Esse tal de Iarbus -
ele não é o marido da minha prima Euphemia, é? Careca, risada suja, comeu
biscoitos demais ao longo do caminho, se você entende o que eu quero dizer…’
Os olhos de Xnardo se arregalaram até que houvessem grandes círculos de
prata ao redor de suas írises. Iarbus é o maior feiticeiro que esse universo já
conheceu! Portador de poder infinito! Destruidor da oitava galáxia! Mago mental
extraordinário!'
‘Oh, não é o marido da Euphemia, então,' Disse Daphne. ‘Ele é um caixa verde.
Mas isso também não soa muito como o homem dos Recursos Enfisianos.’
O Incorporamento Rouge levantou uma sobrancelha. ‘Enfisianos? Você por
acaso conhece Tivone de Enfis, sua reles fêmea?'
Daphne cruzou os braços e contou até dez, para que ela não acabasse dizendo
nada rude. De canto de olho ela viu que Miss E também tinha cruzado os braços
e estava encarando o Incorporamento Rouge com força. Mas Miss E não parecia
irritada com o comentário sexista, ela parecia - o que era mesmo? Triunfante.
Era isso. Que estranho. Mesmo assim, ela era apenas um holograma. Talvez ela
não entendesse insultos baseados em gênero.
Tendo controlado sua irritação, Daphne disse, ‘Bem, é claro que eu conheço
Tivone de Enfis. Eu assumi que todos aqui conhecem, foi ele que arrumou esse
dia de treinamento, não? Quer dizer, não conheço ele pessoalmente, ele é muito
importante, mas é por causa dele.’
'Já chega disso.’ Esse era Xnardo, soando bravo de novo. ‘Comece com os
testes! Estou faminto pelo poder que me foi prometido!’
Miss E afundou em uma profunda reverência a ele. ‘Como quiser.’ Então ela se
endireitou e balançou um dedo para todos os homens. ‘Pequeno lembrete - só
pode haver um vencedor. Mas vai haver um vencedor. Uma pessoa vai levar o
prêmio.'
Xnardo bateu em seu próprio peito. ‘E será eu!’
‘Se você diz que sim, querido,’ disse o holograma. ‘Agora, apenas bem, bem
rapidamente, vamos passar pelos termos e condições.' Ela de repente gritou um
fio de frases, rápido demais para que Daphne pudesse entender completamente,
mas soava como algo do tipo ‘Eu me referi `aqui conforme o participante
reconhece que o participante entra na Provação de Iarbus referida aqui como o
processo através de sua própria vontade e uma vez iniciados no processo não
podem sair do processo e devem continuar até a morte ou vitória qualquer que
vier antes e o participante concorda em aceitar todos os riscos inerentes deste
processo e reconhece que Iarbus não é responsabilizável pela quase certa morte
do participante e dito participante concede dito a Iarbus permissão para usar
fotovidios e/ou holo gravações de seu inevitável corpo para propósitos
promocionais assinatura de voz aqui -’ Miss E balançou uma mão na direção dos
quatro homens, que em rápida sucessão anunciaram seus nomes, estão na
direção de Daphne, que seguiu o exemplo deles, estando bem acostumada a
assinar coisas que não tinha entendido completamente, pois quem tinha tempo
para internalizar todas essas coisas e você só tinha que confiar que as pessoas
no comando tinham os seus melhores interesses em mente, assim como ela
tinha bastante certeza que Tivone de Enfis tinha, de verdade, ele apenas
expressava isso de maneiras um tanto controversas.
'Atenção!' clamou o holograma. ‘Primeiro, caros valentes aventureiros, vocês
devem cruzar em direção ao campo de combate, onde enfrentaram o primeiro
teste!’ Ela fez uma careta. 'Não deveria ter usado ‘primeiro’ duas vezes. Teste
inicial? Teste de abertura? Teste que vem antes do segundo teste?’
‘Anda logo com isso!’ Xnardo exclamou. ‘Devemos mesmo escutar a tagarelice
inútil de uma mulher?
'Fútil? Você não quer dizer, muito lo-o-o-o-uca?’ Miss E revirou seus olhos de
uma maneira que Daphne considerou um tanto ofensiva, mas ela já estava
acostumada a não chamar a atenção das pessoas por comportamento esquisito
(ninguém nunca levava a sério e era frequentemente seguido por uma execução)
então ela apenas desaprovou internamente enquanto isso. De qualquer forma,
enquanto ela não aprovava os insultos de Xnardo, ela até concordava com ele
quanto as coisas estarem demorando tempo demais para começar. Se eles não
começaram logo, ela não conseguia ver nenhuma maneira onde acabariam a
tempo para que ela estivesse de volta para repor os slimepods noturnos usados
por Tivone de Enfis.
O holograma talvez tivesse sido programado para entender deixas sociais, pois
ela parou de revirar seus olhos e ordenou com força, ‘Oh, muito bem. Cruzem a
ponte para o campo de combate. Andem logo.’
E de repente havia uma ponte. Não, sempre havia existido uma ponte. Não
tinha? Uma coisa sólida, robusta levando para longe da beira do penhasco para
dentro do nevoeiro girando no ar.
'Você espera que andemos naquilo?’ disse Xnardo.
‘Sim.’ Disse Miss E. Ela grunhiu, apontando um dedo para ele como se fosse um
phaser, e adotou um sotaque engraçado. 'Cê tem um problema com isso,
cowboy?’
‘Claro que não.' Não foi Xnardo mas Dib o Magnífico, que praticamente desfilou
para frente na ponte e logo se perdeu de vista. O Incorporamento Rouge e Ⅎ
rapidamente seguiram. Apenas Xnardo, Daphne e o holograma ficaram - e aí o
holograma piscou, dando um tchauzinho enquanto desaparecia.
O vento estava uivando e eles estavam muito alto, mas mesmo que Tivone de
Enfis fosse um mestre de tarefas rígido, ele dificilmente teria arranjado um dia
de treinamento em algum lugar inseguro. Daphne sentia ser sua obrigação
reconfortar esse homem, mesmo que ele tivesse sido um tanto rude.
‘Seria a altura?’ ela perguntou para Xnardo. ‘Eu tive um amigo uma vez, há
muitos anos atrás, que ficava todo tonto se subíamos em onibalão. Mas você
não precisa se preocupar. A ponte parece muito forte, e se aquele Dib magricelo
pode passar por ela sem ser soprado para longe um cavalheiro mais …
encorpado como você não terá problema nenhum. Vamos, você pode segurar
minha mão se quiser.’
Xnardo se afastou da mão oferecida com um rosnado. ‘Xnardo, filho de Wnardo,
filho de Vnardo tem medo de nada!’ Ele deu um passo - um passo ridiculamente
tímido, considerando quão estável a ponte parecia - e então mais um. E - Depois
de uma longa pausa - outro. Ele estava quase na ponta dos pés, balançando,
um pé na frente do outro como se estivesse em uma corda bamba ao invés de
um caminho largo e sólido. E então … Daphne pensou que seus olhos lhe
pregavam peças, mas não, estava realmente acontecendo - ele balançou de
novo, e de alguma forma caiu através da ponte. Ela correu até ele, sem ter
esperança de chegar lá a tempo, e certamente não conseguiu. Ela tentou ver
onde ele tinha ido parar, mas não havia nenhum traço de Xnardo a não ser um
leve traço de grito no ar, e a ponte permaneceu substancial debaixo de seus pés.
Tudo que ela podia fazer era se apressar até o outro lado, e esperar que um dos
outros pudesse ajudar.
‘Foi o Xnardo!’ Ela gritou, quando finalmente alcançou o fim da ponte. ‘Ele caiu!
O que tem lá embaixo?'
Miss E piscou de volta a existência e franziu o nariz. ‘Oh, apenas a escuridão
sem fim,’ ela disse. ‘Bem, tanto faz.’
‘Mas não podemos fazer alguma coisa?’ Daphne perguntou. ‘Quer dizer, isso
não é justo de verdade. Não tínhamos nem chego ao primeiro teste!’
‘Ah,’ disse Miss E. ‘Pequeno micro mini detalhe. Aquele era o primeiro teste. A
ponte se manifestou como uma representação da sua confiança. Qualquer um
que na verdade duvidasse de sua capacidade de completar as tarefas à frente
iria encontrar ela tão frágil quanto a sua crença. Whoops!’ ela adicionou, com a
aparência de que achava a ideia toda muito engraçada.
Daphne particularmente achava que as coisas não eram exatamente assim. O
holograma podia pelo menos ter avisado eles. Mas ela também invejava Xnardo
um pouquinho. Presumivelmente todos que falassem um teste seriam
teleportados direto de volta pra casa, e estava terrivelmente frio e ela poderia
definitivamente beber uma xícara de chá. Xnardo sortudo poderia estar tomando
um banho quente e comendo um pão em pouco tempo. Ela estava quase tentada
a falhar no próximo teste de propósito, nem que apenas para sair daqui. Mas
Tivone de Enfis com certeza não aprovaria esse tipo de comportamento, e ela
tinha a sensação de que ele saberia, de alguma forma. Ele sempre sabia. Ela
teria que ver isso até o final.
Ⅎ, O Incorporamento Rouge e Dib o Magnífico foram logo juntados no campo de
combate. Miss E gesticulou para que Daphne se juntasse a eles. O nome -
campo de combate - preocupava Daphne um pouco. Ela podia empunhar um
espanador como ninguém, mas qualquer coisa com mais cara de arma do que
isso lhe assusta um pouquinho. Dificilmente uma semana passava no domínio
de Tivone de Enfis sem que alguém acidentalmente desse um tiro de phaser ou
atravessasse seu próprio coração com uma sharpblade, ou até mesmo cortasse
a própria cabeça fora com uma laseraxe. Armas eram perigosas.
Miss E fez uma dancinha. ‘Tchau, tchau, Xnardo!’ ela cantou. ‘Um já era, faltam
quatro!'
O Incorporamento Rouge riu. ‘Eu acho que você vai encontrar apenas três
concorrentes sérios aqui,’ ele disse.
Ⅎ empinou seu longo nariz. ‘Três? Apenas. Um. Eu!’
‘Agora, agora, crianças,' disse Miss E. ‘Se vocês não forem legais uns com os
outros, eu simplesmente terei que cortar fora todas as suas cabeças e tentar de
novo, e isso seria tão entediante. Por favor, sejam bons menininhos e tentem
realizar o próximo teste, andem amores.’
Daphne esperava que o próximo teste fosse um pouco mais interessante. O
lance com a ponte pode ter sido esperto, mas não era o que ela chamaria de
divertido. Talvez eles pudessem fazer aquela coisa onde você tinha uma vulper,
um pintinho e uma sacola de brotos de grama e tivesse que descobrir como levar
todos em segurança para o outro lado de um rio. Ou onde você coloca uma
venda e sente algo com as mãos e outra pessoa tinha que desenhar o que você
estava descrevendo, e os resultados eram sempre hilários. Mas claro, esse tipo
de coisa tendia a ser realizado do lado de dentro, e não havia nenhum sinal de
um lado de dentro aqui - nem mesmo um pequeno casebre, muito menos um
centro de conferência. O que era particularmente decepcionante, já que
começava a chover.
Deus do céu, esses homens estavam fazendo um alarde por causa de umas
gotinhas. Ⅎ estava enroscado no chão, gritando enquanto tentava puxar a capa
para cobrir a cabeça. Dib o Magnífico estava correndo em círculos, balançando
os braços no ar. 'Está queimando! Está queimando!’ - esse era o Incorporamento
Rouge.
‘Ah é. Eu deveria ter mencionado,’ Disse Miss E, abrindo sua sombrinha com um
floreio. 'Está chovendo as lágrimas dos seus inimigos.’
‘Nossos o que?’ Exigiu Daphne. Inimigos? Desde quando ela tinha inimigos?
Esta, okay, Mirabelle Quarante tinha ficado um pouco irritada quando Daphne
não quis compartilhar a receita para sua torta de bipnoz, mas o segredo tinha
sido passado por gerações de Nollises e ela não sentia que fosse seu para
revelar. Mas inimigos? Pessoas que lhe odiavam? Pessoas que ela havia
machucado? Pessoas que lhe culpavam por algo desagradável? Certamente ela
não tinha nenhum desses?
De repente o chão sumiu debaixo dos pés de Daphne - debaixo dos pés de todos
eles. Quatro guinchos soaram conforme eles tropeçaram para dentro de quatro
buracos separados. ‘Oh, minha cabeça,' disse o holograma de Miss E, olhando
dentro de um de cada vez. ‘Parece que vocês vão se afogar nas lágrimas de
seus inimigos - se o ácido nelas não lhes dissolver antes, yum um. Mas não se
preocupem, não é um ácido muito forte - não queremos que vocês morram rápido
demais, queremos? Onde estaria a diversão nisso? Só vai dar uma leve dor
aguda conforme vocês derretem beeeeeeeeem devagaaaaaaaaaar.’
Uma gota caiu na mão de Daphne, mas por sorte ela ainda vestia suas confiáveis
luvas de borracha. A borracha borbulhou onde a chuva tinha caído, no entanto.
Isso era irritante. Ela imaginou se Tivone de Enfis aceitaria seu pedido de um par
novo.
Uma nova face apareceu acima dela. Uma face bastante surpreendente.
‘Mirabelle!’ Daphne exclamou. ‘Eu estava justamente pensando em você! O que
você está fazendo aqui?’ Mas Mirabelle não respondeu. Ela olhou para Daphne
de sua posição superior com uma expressão quase um pouco de saco cheio em
sua face.
Então Miss E apareceu de novo. ‘Uma pequena pista, porque eu sou a gatinha
mais adorável, fofinha e prestativa de toda a gatolândia,' ela disse, usando uma
voz falsamente fofa de uma criança pequena. ‘O único jeito de sair do buraco
antes de se afogar ou dissolver no nosso desagradável amigo ácido é persuadir
seu inimigo mais mortal a te tirar dele, o que é ridiculamente embaraçoso se eles
forem, por exemplo, algum tipo de babaca religioso com um tufo de cabelo
branco e uma face nem velha nem jovem - nem anotem não, vale para mais de
uma pessoa - mas você vai ter que morder a língua e fazer isso.’
Bem, isso não parecia tão difícil, mesmo que fosse vergonhoso - sim, o
holograma estava certo nisso, pronto! - descobrir quanta animosidade aquela
torta tinha causado. 'Você se importaria de me dar uma mãozinha?' Daphne falou
para Mirabelle. A mulher deu de ombros e estendeu uma mão para dentro do
buraco. Segundos depois, Daphne estava de volta em terra firme. ‘Obrigada,’ ela
disse. ‘Eu sinto muito por não compartilhar a receita de torta da minha mãe. Eu
acho que estava sendo um pouco egoísta. No final das contas, qual é o problema
com mais pessoas sendo capazes de fazer coisas legais? Quanto mais torta,
melhor. Eu vou te dar a receita assim que eu voltar para casa.’
‘Ela não é real,’ disse Miss E, revirando os olhos (ela fazia isso muito).
'Não importa,’ disse Daphne. ‘A lição ainda vale. Compartilhar é bom.'
Justamente naquela hora, um barulho do buraco de Ⅎ lhe fez girar no lugar, mas
de canto de olho ela acho que tinha visto Miss E enfiar um dedo na garganta e
fingir ânsia de vomito.
Ⅎ estava tendo dificuldades, e o ser em pé no topo do fosso onde ele estava
preso - parecia muito com uma árvore do Festival da Neve, mas com olhos
vermelhos incandescentes - não estava fazendo nada para ajudar. Ela precisava
reconhecer que ele não tinha braços, mas certamente poderia ter feito algo.
Daphne tentou cruzar o campo na direção do buraco para tentar puxar Ⅎ para
fora, mas havia uma barreira invisível naquela direção - assim como havia entre
ela e todos os outros buracos também. Não havia nada que pudesse fazer além
de assistir. Eventualmente, com a maior parte de suas roupas queimadas
(Daphne tentou não olhar) e uma quantidade considerável de perfurações na
pele também, o Incorporamento Rouge e Dib o Magnífico ganharam a segurança
da terra firme novamente, a chuva acima deles parou e seus ‘inimigos’
desapareceram. Mas não Ⅎ.
'Não queremos perder o show, não é mesmo?’ disse Miss E, e Daphne descobriu
que podia (de alguma forma) ver bem dentro do buraco, mesmo que não
parecesse ter se aproximado. Ela desejou não poder. A chuva estava caindo
sobre o pobre homem. sua boca em formato de anêmona pulsava para dentro e
para fora, emitindo pequenos gemidos de dor. 'Cincão que o nariz dele cai antes
dos joelhos se dissolverem,’ Miss E disse, balançando um pequeno retângulo
azul-esverdeado de papel na cara de Daphne.
Daphne não aceitou a aposta, mas teria perdido em todo caso.
A chuva ácida - uma torrente acima da prisão de Ⅎ - não dava uma trégua, e o
nível da água estava subindo. A pior coisa era como tudo acontecia devagar. O
terror de Ⅎ cresceu, sem esperança de uma liberação rápida. Obviamente ele
não se afogaria de verdade, e sua pele, depois carne, então os ossos não
estavam realmente derretendo, mas seria a dor de verdade? Parecia que sim.
Infelizmente ela não era capaz de ignorar a capacidade do Tivone de Enfis de
pensar que um pouco de dor constrói caráter. Foi um alivio quando os últimos
ossos de Ⅎ foram liquefeitos, seu inimigo-árvore desapareceu e não havia mais
gritos.
'Não é engraçado como o lado de dentro das pessoas é tão mais bonito que o
lado de fora?’ Mais uma vez Miss E tinha sumido por alguns minutos, mas agora
ela estava de volta. ‘Teria sido totalmente incrível decorar aquela árvore de natal
com guirlandas de intestinos e dançar ao redor dela. E globos oculares como
bolinhas deveriam total ser uma coisa. Não deveriam?’
Daphne se apressou em mudar o assunto. ‘Pelo menos não houveram brigas,’
ela disse. ‘Quando você disse que esse era o campo de combate…’
‘Ah sim,’ disse Miss E. ‘Tem isso. Ooh, olhem! Aqui estão todos os seus
ancestrais mortos para atacar vocês.'
E de repente havia milhares de pessoas ao seu redor. Pessoas? Seria essa a
palavra certa? Era ir um pouco longe demais, na opinião de Daphne. Pior que as
fantasias que crianças usavam para Pedir-Piada na Véspera do Nascidomaga.
Quem quer que tivesse pensado nisso precisava de uma boa bronca; ela sentia
um certo desconforto no estômago olhando para as hordas em decomposição.
Havia carne podre pendurada em ossos podres. Algumas das figuras eram
apenas ossos, antigos e alvejados. Uns poucos estavam inteiros, mas com pele
cinza e olhos embaçados. A maior parte usava capas. E as armas! Miss E estava
andando entre eles, comentando com alegria - ‘Canhão laser de Raio-X, mmm!
Oh meu Deus, não me diga que isso é uma espada de lâmina larga mais-três?
Okay, tipo, eliminador de compressão de tecido, isso é, tipo, super legal, mas
você sabe que vai ser processado, né?'
O Incorporamento Rouge e Dib o Magnífico ambos sacaram armas próprias.
Daphne estava um pouco preocupada. O convite não dizia nada sobre trazer sua
própria arma - porque enquanto ela odiava armas, ela talvez odiasse ser atacada
por hordas com fantasias demoníacas um pouco mais, e a única coisa que ela
tinha para se defender era a almofadinha que ainda estava no bolso do seu
avental. Isso não adiantaria de muito contra um canhão laser de Raio-X. Ela não
podia correr - não havia uma abertura nas fileiras que os cercavam. Santo Deus,
Tivone de Enfis deve ter gasto uma fortuna com esse evento - contratar esse
tanto de mortos-vivos teria custado um braço e uma perna (sem piada nenhuma,
ela adicionou internamente). Agora mesmo, ela desejou ter sido um pouco
menos perfeccionista.
Mas estranhamente, mesmo que o exército estivesse atacando os dois homens,
estava deixando Daphne sozinha. Uma ou duas vezes uma criatura se
aproximou dela quando a mesma acenou um paninho de limpeza em sua
direção, mas atacando de verdade? Não. ‘Muito bem,’ disse Miss E, segurando
a parte de trás da mão verticalmente para esconder a boca como se fosse dizer
um segredo. 'Você descobriu. Quanto mais você luta, mais eles vão atacar. O
único jeito de ganhar é parar de lutar.’
Dib o Magnífico, em combate corpo a corpo com um zumbi particularmente
grande, congelou. ‘Mulher tola! Eu escutei isso!’
‘Ah, merda,’ disse Misse E, mas ela não parecia abalada por isso.
Em contraste, o Incorporamento Rouge parecia abalado. Tinha uma flecha
enfiada em seu ombro e uma queimadura de laser atravessando seu rosto que
tinha tirado um olho de comissão. ‘Parem de brigar!’ Daphne gritou pra ele.
'Então eles vão parar!’
'Ridículo!'
'Não, é verdade!' ela exclamou.
‘Somente um fraco, covarde, iria parar de lutar!’ gritou Dib o Magnífico.
‘O que você está fazendo?’ disse Daphne. ‘Isso vai fazê-lo continuar!’
E fez mesmo. Confrontado com tamanho ataque violento, o Incorporamento
Rouge não teve chance. Um último raio de próton lhe acertou no peito. O exército
de zumbis desapareceu antes que seu corpo sequer tivesse atingido o chão.
Então seu corpo sumiu também.
Por um momento, os sobreviventes apenas encararam. Então o que tinha
sobrado uivou em triunfo. ‘Aha! Ahaha! Ahahaha! Eu sou vitorioso! Não mais
serei Dib o Magnífico. De agora em diante serei conhecido como Dib o Incrível!'
'Incrível,' Miss E murmurou por baixo de sua respiração, apenas alto o suficiente
para Daphne escutar.
Daphne não era uma que acreditava em se colocar em evidência - ‘Eu não sou
uma para me colocar no holofote,’ ela tinha dito muitas, muitas vezes - mas o
comportamento de Dib era, ela pensou, um tanto desrespeitoso, sem contar que
é impreciso.
Ela deu uma leve tossida. Dib lhe ignorou. Ela tossiu de novo. Dib apenas
continuou ‘Ahahahahaha!’
‘Eu não sou uma pra me colocar em evidência,' Daphne disse, ‘mas eu acho que
você está esquecendo algo. Eu ainda estou aqui.’
Dib fez uma careta, e finalmente parou de fazer ‘Ahahaha!’ ‘Como se você
pudesse possivelmente ser uma candidata para o poder de Iarbus! Sua presença
aqui é um erro - uma piada!’
‘Eu recebi um convite exatamente como você,' Daphne disse para ele. ‘Senhor
Tivone é muito bom para me incluir em coisas.’
‘Sua mulher ridícula! Olhe ao seu redor! Xnardo. O Incorporamento Rouge. Até
mesmo Ⅎ. Nenhum deles se compara a mim, Dib o Mag- o Incrível - é a verdade.
Mas você? Você está tão abaixo de nós! Nós seguramos mundos inteiros em
nossas mãos! O poder que Iarbus controla - como seria crível que ele te
considerasse uma herdeira digna?’
Daphne estava prestes a responder, prestes a dizer para Dib exatamente o que
pensava dele e de sua grosseria, quando ela parou de repente, um pensamento
se enfiando em sua cabeça. Estaria ele … certo? Ela rebobinou o cenário na
própria cabeça. Ela estava lá, cuidando das próprias coisas, tirando um pouco
de pó, e então o convite apareceu em sua mente … Tivone de Enfis tinha enviado
mensagens mentais para ela antes, ela não tinha razão para duvidar que era
para ela, mas …
Poderia ter sido? Poderia um bobinho ter enviado uma mensagem mental sem
segurança nenhuma, uma mensagem mental que ela acidentalmente
interceptou? Será que era para Tivone de Enfis estar aqui? Deveria ser Tivone
a competir pelo poder de Iarbus? Poderia tudo isso ser … real?
Daphne sentou no chão com pesar, sem se importar que eram desconfortáveis
e frias, ou que ela estava enchendo sua saia de lama. ‘Ah, senhor.’ ela respirou.
‘Eu não deveria estar aqui.’
Miss E revirou os olhos. ‘Desculpa, mana. Você está bem certa, claro. Mas não
foi muito divertido?’
‘E na verdade, a sua presença é bem-vinda,’ adicionou Dib o Magnifico/Incrível.
‘Eu vou adorar ter uma testemunha para o meu triunfo final.’ Ele deu um
poderoso passo para a frente e clamou em voz alta: ‘Eu tomo posse do poder!’
As pedras tremeram. Daphne se levantou com pressa e caiu novamente. O chão
se partiu. Subindo da terra fervorosa surgiu um homem. Em suas mãos estava
uma forma - uma esfera, um cubo, um icosaedro? Era todas e nenhuma delas,
brilhando com escuridão. Daphne encarou. Era sua imaginação ou seriam essas
coisas olhos encarando da louca geometria da forma? Milhares de olhos em
milhares de faces … milhares de bocas gritando incessantemente,
silenciosamente, desesperadamente…
‘Bem vindo,’ ressoou a voz do homem como se fosse uma música horrível. ‘Eu…
sou… Iarbus!’ Havia tamanha força em suas palavras que Daphne começou a
aplaudir, sem nem perceber o que fazia.
Iarbus lhe ignorou. ‘Por muitos anos eu esperei,’ ele disse. ‘Eu fiquei fatigado,
me curvando debaixo do peso desse poder que eu seguro, poder tão grande que
um mero soprar dele poderia comprimir um planeta inteiro em um minúsculo
diamante. Mas eu não podia deixá-lo ir. Eu tinha que passá-lo para um homem
como eu, um homem capaz, um homem digno, um homem pronto para
empunhar tamanha força. Então eu criei testes, testes que apenas tal homem
seria capaz de completar. Eu esperei por anos. Décadas. Séculos! Tantos
tentaram. Tantos falharam. Ao falhar, adicionaram sua essência ao poder, lhe
tornando ainda maior, e também lhe deixando mais pesado sobre meus ombros.
E finalmente - finalmente! - um homem triunfou! O primeiro! Eu encontrei meu
herdeiro. Posso passar meu poder adiante.’
Totalmente arrebatado, Dib o antigo Magnificente andou para frente, seus dedos
esqueléticos se fechando ao redor de forma brilhante. Forças giravam a partir
dela, lhe envolvendo, ele e Iarbus envoltos em uma galáxia de energias.
‘Ahem,’ disse Miss E, com uma pequena tossida.
Os dois homens se viraram para ela.
'História legal,’ disse Miss E. Mas você esqueceu de um pedacinho, não foi? Um
detalhe minúsculo. O detalhe de que Dib-Dab aqui não é o primeiro a passar nos
seus testezinhos nesses séculos todos, é? A primeira pessoa foi na verdade
essa mina aqui!’
'Você!' arqueou Iarbus.
‘Foi o que eu disse. Eu!’
'Não, eu quis dizer - você!'
Miss E suspirou. ‘Sim, eu quis dizer - sou eu! A vadia está de volta, vadias.’
‘Mas você foi… ‘
'Destruída? Que bobagem. Você não faz ideia de quantas vezes já fui destruída.
Na verdade, eu considero um pouco de desperdício se eu chegar no fim de um
plano maquiavélico sem ser destruída. Ser destruída nunca destruiu a mim! Eu
sempre volto! Ter a minha essência vital sugada para uma fonte de poder antiga
foi apenas um tropeço.' Miss E deu uma balançada para enfatizar seu ponto.
‘Calma aí,’ Daphne interrompeu, ‘Eu achei que você era assistente dele?’
'Não,' o holograma respondeu. ‘Eu sou a vítima de uma grande injustiça. Eu não
sou assistente de ninguém. Eu sou Missy!’
‘Sim, você disse isso antes,’ Daphne replicou.
‘Não, não, é soletrado diferente,’ Missy falou. 'Será que vocês podem calar a
boca por um segundo e me deixar contar sobre o lance da grande injustiça? Eu,
Missy, fui a primeira pessoa na história a completar os extenuantes testes do
Iarbus. Provei a mim mesma digna de empunhar o poder! Mas ele me rejeitou!’
‘Bem, você é apenas uma mulher,’ Iarbus interrompeu. 'Você obviamente apenas
conseguiu por um erro.’
Dib balançou a cabeça em concordância. ‘Nenhuma mulher poderia passar por
tais testes. E mesmo que conseguisse - de alguma forma - ela claramente não
seria digna de tal poder.’
Missy levantou os braços em exaspero. 'Será que vocês se escutam? Você foi o
erro, Dibzinho. Eu te convidei para vir aqui. Não Iarbus. Eu. Sim, minha força
vital foi sugada na fonte de poder quando Iarbus me rejeitou, mas eu era mais
forte que qualquer um que tinha vindo antes - porque eu tinha vencido. Eu fui
capaz de manter minha identidade. Eu encontrei maneiras de manipular o poder
de dentro. Eu escolhi cinco dos homens mais crédulos, mas mesmo assim
poderosos e malvados na galáxia, usei o poder no qual eu estava presa para
lhes enviar mensagens -’
‘Que você nem mente-segurou,’ adicionou Daphne.
- Pelos deuses, você está louco? Tala sussurrou enquanto corria pela fileira de
plantas. — Não é seguro. Ela verificou a máscara firmemente tecida sobre o
rosto, rezando para que fosse o suficiente. Aqui no campo, nas profundezas das
plantações altas e espinhosas, não havia mais nada para protegê-la.
O pulso de Tala disparou enquanto ela se aproximava de seu alvo. Sair
sorrateiramente após o toque de recolher e observar o céu todas as noites
finalmente foi recompensado. Ela tinha visto luzes atrás dos campos antes, mas
ela nunca foi capaz de vê-las de perto antes que elas desaparecessem. Ela sabia
que devia haver outras terras lá fora, outras criaturas, não importa o que os
Anciões dissessem. E agora, pela primeira vez em toda a vida de Tala, um
estranho apareceu.
- Eu sabia que você viria - sussurrou ela. - Não sei de onde você veio, mas
finalmente você está aqui!
Um estranho. Alguém novo. Alguém que parecia não ter ideia do perigo que
ambos corriam. Vestida com um casaco escuro com capuz, a figura avançou em
direção a uma grande planta, que olhou para baixo, sua flor roxa suave dançando
ao vento noturno.
A figura sacou uma faca brilhante e cortou a cabeça de flor.
— Ah, não.... Tala parou. Ela colocou as mãos na máscara. Ela sabia o que
estava por vir.
A planta decapitada se debateu violentamente enquanto ao redor do estranho
as plantas começaram a ondular como uma só. Fazendo barulho com raiva, elas
lançaram sua arma silenciosa. O ar brilhou quando o luar atingiu as minúsculas
partículas. O estranho riu. A risada de um homem.
Tala sabia que ele cairia em um sono para sempre se ela não o ajudasse, mas
sua consciência a alertou furiosamente. Ele havia prejudicado as plantas - todos
sabiam que elas só deveriam ser cortadas durante a Colheita Noturna. estranho
merecia ser punido!
Mas e se o estranho não soubesse o que tinha feito? E se ele fosse um
estrangeiro? E se os deuses finalmente tivessem respondido suas orações? Tala
abaixou a cabeça, em conflito.
Um farfalhar a fez erguer os olhos. O estranho havia partido. Espiando nas
sombras, Tala o viu afastando-se por entre as plantas que se debatiam. —
Espere! ela clamou. Ela correu atrás dele. 'Por favor, você pode esperar?' ela
clamou novamente.
As plantas cresceram sobre ela e Tala rezou novamente para que os vapores
não passassem por sua máscara. As plantas a reconheciam, ela sentia.
Raramente se voltavam contra seus cuidadores, os moradores aprenderam a
lidar com elas ao longo dos anos, mas eram mortais para qualquer um que as
cruzasse. Ela tinha visto por si mesma. Quando crianças pequenas, ela e seus
primos haviam se esgueirado para o campo. O pequeno Kalat estava ansioso
para provar a si mesmo e então, desafiado por seu irmão, ele escalou um caule
espinhoso e colheu uma flor para tia Syla. Porém, ele escorregou e bateu no
chão, arrancando a máscara de seu rosto. As crianças assistiram, impotentes,
enquanto as plantas liberavam seu veneno e Kalat adormecia para sempre. Ele
ainda estava segurando a flor em sua mão quando os Anciões o levaram para o
Santuário. Tala nunca tinha ido para o campo sem sua máscara
O estranho estava se aproximando da clareira no fundo do campo, onde uma
floresta marrom emaranhada de arbustos e espinhos bloqueava sua saída.
'Agora você vai ter que falar comigo!' pensou Tala.
Ela correu atrás dele, mas então, bem diante de seus olhos, ele bateu em uma
árvore e desapareceu. — Isso é impossível! Tala engasgou. Ela olhou ao redor
do tronco, bateu nele e olhou para os
galhos secos, mas ele não estava mais lá. 'Uma pessoa não pode simplesmente
cair em uma árvore!' disse ela. A menos que ... ele não fosse uma pessoa? Ele
andou ileso entre as plantas, não foi? E se ele não fosse um estrangeiro?
E se fosse uma visitação dos deuses?
Tala caiu de joelhos e começou a cantar uma canção de oração, com os olhos
fechados. — Olá? OLÁ? Tem como você parar? Estou com a cabeça estourando
de dor.
Os olhos de Tala se abriram e ela viu a cabeça de um homem saindo do tronco
da árvore. Seu cabelo loiro curto e desgrenhado parecia a luz da lua e seu rosto
redondo estava enrugado de irritação.
— Sim, você. Chega de cantoria. O fedor dessas plantas já é o bastante para
dar uma baita enxaqueca. Tala ficou boquiaberta. - Sinto muito - ela disse. 'Oh
Bal'kalu, você é-'
'Bal'kalu? "Quem é ele?" O homem levantou uma sobrancelha.
'Bal'kalu, Deus dos Campos, Portador da Colheita e Nossa Espécie e Mestre
Benevolente. Não acredito que você escolheu aparecer para mim! '
- Gentil e benevolente? O homem sorriu maliciosamente. - Você errou por um
bocado. Tchau! Sua cabeça desapareceu novamente. Tala deu um pulo. —
Espere! Você andou ileso pelas plantas, eu te vi! Só os deuses podem fazer isso!
' A cabeça do homem reapareceu, desta vez com o que parecia uma máscara
sobre ela, mas feita de um estranho,
material espesso. - A primeira coisa que você deve saber: sou melhor do que
qualquer deus. Então ele desapareceu novamente.
'Como você está dentro da árvore?' Tala pegou uma grande pedra e bateu no
tronco. Seria magia? Você é um demônio? '
Tala de repente caiu direto na madeira e em uma sala espaçosa e bem
iluminada. O homem estava diante dela, carrancudo. Entendeu? E antes de
começar a ter um chilique, não tenha." - rebateu ele. - Eu mencionei que minha
cabeça está estourando, não foi? Ele voltou sua atenção para uma mesa branca,
onde estava cutucando a flor cortada com algum tipo de ferramenta.
- Pelos deuses ... - disse Tala, seus olhos vagando pelas estranhas paisagens
ao seu redor. - Todas as árvores são assim por dentro?
Há. Todas as pessoas aqui são tão ignorantes quanto você? Espero que sim. O
homem espirrou e assoou o nariz em um pano. “Essas plantas realmente são
incrivelmente fedidas. Como você aguenta? Você não odeia feder o cheiro de
plantas fedorentas o dia todo?
Essa arvore é a sua casa? Ela caiu do espaço? ' Tala persistiu. 'Ouça, fedida ...'
'Tala.'
'… Qualquer que seja o seu nome. Quer que te conte um segredo?
"Sim."
O homem se abaixou perto de seu ouvido e sussurrou. 'Não é uma árvore.'
'Eu sabia!' Tala respirou fundo. 'É mágica, não é? Você realmente é melhor do
que os deuses! '
'Muito melhor. Muito, muito melhor. Quer saber outro segredo? ' Ele não esperou
por uma resposta. - Quaisquer deuses seus deveriam ter muito medo de mim!
Tala correu pelos campos quando o sino tocou. Ela não sabia como se sentaria
para orar com toda a excitação borbulhando sob sua pele. Ela prometeu ao
homem - ou, como ele disse a ela para chamá-lo, Xanos - que não contaria a
ninguém que ele estava lá, não que ele precisasse pedir. Se os anciãos
descobrissem que ele tinha prejudicado as plantas, eles iriam matá-lo, e ela não
estava disposta a deixar sua passagem para o espaço desaparecer quando ela
esperou sua vida inteira por isso.
Ela tocou o pequeno dispositivo enfiado dentro de seu capuz. Como ele chamou?
Um 'transmissor', era isso. Ele disse que podia ver através dela, que a janela em
movimento em sua nave mostraria tudo o que ela visse. Tantas coisas novas
para aprender! O coração de Tala bateu forte, a emoção de seu encontro
pulsando por ela.
Uma adolescente com cabelos da cor do pôr do sol correu até Tala. 'Olhe para
você,' Ela sorriu. 'Alguém está feliz esta manhã! É por causa do Cabu? '
— O quê? Tala disse, surpresa. 'Oh! Não. Eu não o vi.' Ai deuses, Cabu! Ele
tinha caído fora de sua mente no segundo que ela conheceu o estranho. '- Só
estou de bom humor.'
"Aposto que Cabu se voluntaria quando o fizermos", disse Asha. 'Todos nós
podemos viver juntos no novo assentamento. Talvez isso o faça sorrir pela
primeira vez! Eu estou muito ansiosa, e você? '
Tala forçou um sorriso, mas seu coração afundou. Ela odiava mentir para sua
melhor amiga sobre Xanos, mas sabia que Asha não entenderia. Ela ficaria
horrorizada por ele ter ferido as plantas e iria direto contar para os Anciões.
Enquanto Tala passava as noites observando as estrelas, Asha estudava textos
sagrados, absorvendo o conhecimento que ela esperava que um dia a tornasse
uma Anciã. Ela nunca conseguia entender por que Tala iria querer mais do que
este lugar, onde todos os dias eram iguais.
A dupla fez seu caminho para o Santuário dos Anciãos, onde o resto dos aldeões
estavam reunidos do lado de fora no círculo de oração. Cabu ficou na beirada,
observando-as se aproximar. Asha deu uma cotovelada em Tala enquanto o
jovem alto e sério olhava fixamente para ela. Tala sorriu educadamente em
saudação e sentou-se em seu lugar de costume, tentando acalmar o coração
batendo. Como ela desejou que sua tia e seu tio não o tivessem escolhido como
seu futuro companheiro! A ideia de passar as noites lavando suas túnicas e
ouvindo-o falar sobre seu sonho de ser feitor - honestamente, ele era muito mais
adequado para Asha do que para ela. Esses dois seriam uma combinação
perfeita. Se eles se casassem, certamente não sentiriam falta dela se ela fugisse
para o espaço com Xanos ...
'- E onde você estava no café da manhã?' uma voz aguda a advertiu quando
uma mulher se sentou ao lado dela, grunhindo com o esforço. Os círculos
escuros sob seus olhos evidenciavam muitos anos de árduo trabalho físico.
'- Acordei cedo, tia, e fui fazer uma prece perto do campo' - mentiu Tala. '- Sabe,
já está quase na hora da colheita.'
'- Bem' - disse sua tia. - E lá estava eu pensando que você estava com a cabeça
nas nuvens de novo. Seu tio ficará feliz com você.
Naquele momento, o tio de Tala saiu do santuário. As tatuagens de folhas roxas
em seu rosto o marcavam como o Alto Ancião, um homem sagrado escolhido
pelos deuses. Atrás dele estavam os outros Anciões, cada um usando uma
túnica roxa.
O Alto Ancião Masa não morava com Tala e sua família. Os Anciões viviam na
Cabana, um edifício sagrado atrás do santuário, onde contemplavam e recebiam
instruções dos deuses. Quando menina, Tala puxou as vestes do tio e implorou
que ele a deixasse espiar dentro dos edifícios sagrados, mas a tia Syla deu um
tapa na mão dela. "Mostre algum respeito", ela avisou. 'Os lugares sagrados são
apenas para os escolhidos e os mortos!'
O sino anunciou o início das orações. Tala tentou não pensar em Xanos, mas
sua mente divagou. Ela sorriu secretamente, pensando no que ele chamava de
'TARDIS' - sua espaçonave que parecia uma árvore. Ele disse a ela que poderia
assumir qualquer forma. 'Até a sua casa!' ele sorriu. Ele tinha um grande sorriso,
Tala notou, mas torto, como se estivesse quebrado.
O Alto Ancião bateu três vezes com seu cajado de madeira entalhada no chão.
'Bom dia, meu povo dedicado e zeloso. Hoje, trago notícias - boas notícias! Os
deuses falaram. Recebemos uma mensagem muito aguardada sobre o acordo.
'
As orelhas de Tala se ergueram. Esta era uma notícia que todos estavam
esperando.
O Alto Ancião sorriu com benevolência para seu povo. “Os deuses estão
satisfeitos com nosso progresso. As plantas nos novos campos são saudáveis e
fortes. Eu sei que vocês sentem falta de seus entes queridos, mas devemos
confiar nas decisões dos deuses. Os novos campos beneficiam a todos nós. '
Ele estava certo, Tala sabia. Cada geração de aldeões era maior que a anterior
e os campos não eram mais suficientes. Eles dependiam das plantas, nenhuma
parte era desperdiçada - eram alimentos, roupas, tudo. Às vezes, as árvores
davam frutos azuis e laranjas, mas isso não enchia barrigas famintas. No
entanto, as pessoas temiam sair da aldeia. Dizia-se que alguns haviam ido em
busca do que havia além, mas nunca mais voltaram.
Mas, alguns ciclos atrás, os deuses se ofereceram para ajudar o povo mais uma
vez. Em uma visão compartilhada, os Anciões viram um lugar abundante com
solo rico, onde novas safras poderiam prosperar. Os deuses prometeram
proteger os voluntários altruístas que foram para o norte para fazer este
importante trabalho, mas ainda não havia notícias deles até agora.
'O Ancião Dasu acabou de voltar e nos garante que tudo está bem por lá. Seus
entes queridos estão dedicados à tarefa; não tema por eles, mas alegre-se por
eles prosperarem. Alguns talvez queiram se juntar a eles, pois prosperar exige
muito trabalho e precisamos de mais mãos. Quem entre vocês vai se voluntariar?
' O Alto Ancião ergueu os olhos com expectativa, observando a multidão.
Tala sentiu o dedo de Asha cutucá-la nas costas, mas ela o ignorou. Ela não
podia ir para os novos campos, não agora que conhecera Xanos.
Tala virou a cabeça e viu Asha de pé orgulhosamente, junto com outras pessoas,
incluindo Cabu. - Levante-se, Tala! Asha murmurou.
O Alto Ancião Masa chamou os voluntários para a frente. “Agora, se vierem
comigo, começaremos os preparativos”, disse ele. - Vocês estão fazendo um
nobre sacrifício hoje.
- Achei que íamos ser voluntárias juntos. Asha disse no ouvido de Tala.
Tala não conseguia olhar nos olhos dela. - Vou com o próximo grupo - mentiu
ela. 'Tia Syla precisa de mim agora, é muita coisa para ela cuidar sozinha.'
- Nós concordamos - começou Asha, mas então o olhar do Alto Ancião pousou
nela. Com o rosto carregado de decepção, ela murmurou algo baixinho e foi
embora sem se despedir.
Tala lutou para se concentrar o dia todo. Sua cabeça estava muito cheia de
novas ideias e possibilidades para pensar em coisas enfadonhas como varrer a
terra ou mexer a sopa. Ela havia sido repreendida pelo Supervisor Jakul várias
vezes e o Ancião Yaba fixou seus olhos redondos nela durante as orações do
pôr do sol, quando ela esquecia as palavras.
O humor dos Anciões piorou naquela tarde. Eles andaram de um lado para o
outro nos campos repetidamente, verificando se todos estavam trabalhando
duro. Tala tentou manter a cabeça baixa.
'Este é um trabalho importante!' ela sussurrou no transmissor enquanto cortava
as trepadeiras que cresciam ao redor dos caules das plantas. “Temos que fazer
isso, Xanos, ou elas estrangulam as plantas. Os Anciões dizem que as vinhas
são um mal imortal, nós as matamos, mas elas sempre voltam a crescer. '
Naquela noite, Tala guardou seu jantar e correu para o quarto, alegando
cansaço. Ela fez suas orações e, como sempre, pediu aos deuses que
abençoassem a mãe que ela nunca conheceu. - Ela morreu lhe dando vida - tia
Syla lembrava Tala sempre que reclamava que sua existência era entediante.
Tala se perguntou o que sua mãe pensaria se pudesse vê-la agora, preparando-
se para visitar as estrelas.
Quando teve certeza de que a família estava dormindo, Tala escapuliu para a
escuridão. Ao passar furtivamente pelo círculo de orações, sua pele formigou.
Puxando a máscara firmemente sobre o rosto e olhando ao redor, ela não viu
nada desagradável, mas o sentimento persistiu enquanto ela cruzava o campo
e caminhava por entre as plantas.
O instinto disse a ela que alguém a estava seguindo, mas sempre que ela olhava
ao redor, ela não via nada, exceto as plantas brilhando suavemente.
Ela estava quase alcançando a árvore de Xanos quando uma mão se fechou
sobre sua boca e a ponta de uma lâmina cravou-se em suas costas. Uma voz
baixa sibilou: 'Não se mexa!'
Tala conhecia aquela voz. Supervisor Jakul! Ela o odiava; ele trabalhava com
todos até a exaustão e tinha grande prazer em correr para os Anciões sempre
que alguém fazia algo que não gostava.
- Por que você está se esgueirando por aqui? o Supervisor perguntou em tom de
exigência.
Tala lutou contra ele, então o chutou com tanta força na perna que ele gritou,
jogando-a no chão. Enfurecido, ele deu um tapa na cabeça dela. O transmissor
caiu de seu capuz.
—O que é isso? ele grunhiu, agarrando-o. Ele examinou o dispositivo à luz da
lua e o sacudiu, disparando um zumbido. Herege! ele sibilou, os olhos
arregalados de medo. Bruxa! Seu tio ficará sabendo disso! ' Ele agarrou seu
pulso e começou a arrastá-la pelo campo.
Me larga! Tala gritou, tentando se desvencilhar. 'Xanos! Me ajude, Xanos! '
Houve um flash de luz, um som estranho e o Supervisor caiu no chão. Xanos
estava atrás dele, franzindo a testa através da máscara. Em uma das mãos, ele
segurava uma ferramenta estranha que apontou para Tala. Disse para você ter
cuidado!
'Eu não sabia que ele estava me seguindo!' Disse Tala. - Ele simplesmente saltou
da escuridão. Você o matou? ' “Bom, duh! O homem fez uma careta. - Estou
desapontado com você, Tala. Meu trabalho aqui é muito importante. Eu não
posso permitir
que ninguém me sabote. ' Ele chutou o corpo sem vida do Supervisor. 'Eu não
deveria ter confiado em você. "Você está demitida!" 'Por favor, Xanos! "Me
desculpe, por favor." Farei qualquer coisa por você. Qualquer coisa. Tala
implorou. Ela não poderia suportar
ver seu sonho escapando de seu alcance. - Vou conseguir informações, vou
descobrir o que você quiser com meu tio. Ele é o Alto Ancião, lembra?
Xanos apontou o dispositivo para a cabeça de Tala. - Ele sabe que você está
aqui?
É claro que não! Eu te disse, se ele descobrir que você machuca as plantas, ele
vai te matar. Nunca machucamos as plantas. ' - Mas você não se importa em
machucar as vinhas, não é? Cortando seus pobres caules e queimando-os até
a
morte.
e ofereceu a Tala. - Algo para lembrar dele. Tala recuou assustada. "Eles estão
mortos?"
- Bem, o casamento foi cancelado!
'Como você fez isso?' Tala olhou para Xanos com nova admiração, novo medo.
- Você disse que não era deus! 'Eu disse que sou melhor do que um deus. Preste
atenção.'
Tala, ainda cambaleando, mal o ouviu. Primeiro Asha, depois o tio Masa e agora
Cabu tinha partido para sempre. Ela se sentia entorpecida, mais sozinha do que
nunca. As lágrimas surgiram novamente.
"Isso não é necessário" Xanos ergueu o queixo. - Tá bom, tá bom, você venceu.
Nenhum mal vai acontecer com você de novo, não importa se é seu namorado,
seu tio ou seu deus.
Tala deu um pequeno aceno de cabeça.
— Agora. Enquanto você estava distraindo os Smurfs ... - Os quem?
'Eles são meus amigos. Viva em uma casa ao pé de uma árvore. Eles são bem
pequenininhos. Enfim! Enquanto você estava ocupado distraindo-os, percebi
algo muito interessante. Xanos a conduziu pelo santuário e apontou para uma
escotilha discreta no chão. - Vamos ver o que os pequeninos estavam
guardando, certo?
'Sabat - eu preciso te contar a verdade sobre as plantas ... É a Hana, ela não
está no assentamento, ela está morrendo! Não há assentamento ... Ouça-me -
os Anciões estão vendendo nossa colheita para um visitante das estrelas e
mantendo o lucro enquanto passamos fome! '
Desconfortáveis, os aldeões recuaram enquanto Tala ia de pessoa em pessoa.
Ela implorou que ouvissem, mas eles a desprezaram, a ridicularizaram. "Ela está
doente", murmuraram. 'Ela sempre foi estranha. Ela não tem mãe, você sabe.'
'Por que ninguém me escuta?' Tala implorou. 'Eu estou tentando salva-los!'
Uma mão agarrou seu pulso. 'Tala!' sibilou sua tia. — O que está fazendo? Você
está doente?
Tala quase chorou de alívio. - Tia Syla, por favor, você precisa me ouvir. O tio é
um mentiroso. Ele é um assassino.'
Tia Syla deu um tapa no rosto de Tala. 'Como você ousa falar comigo dessa
maneira! Ele é o Alto Ancião! Faça suas orações imediatamente antes que os
deuses o derrubem.' Ela gesticulou se desculpando para as pessoas ao redor
deles.
Tala desabou no chão quando o sino de oração tocou. O zumbido da conversa
desapareceu, mas então um coro de sussurros surgiu. Tala estava triste demais
para olhar para cima.
Ao lado dela, tia Syla gritou alto e uma voz familiar ecoou. 'Meus seguidores
leais. Meu povo dedicado. Eu finalmente vim. Eu sou Bal'kalu, o Deus dos
Campos, e peço seu perdão. '
Tala ergueu os olhos. Xanos estava fora do santuário, sorrindo
benevolentemente para os aldeões. Ele usava uma túnica preta simples com
mangas compridas e largas. Uma tatuagem de folha roxa profunda se arrastava
de sua bochecha até o pescoço.
Ao lado dele, flanqueado por dois outros Anciões, estava o Alto Ancião Masa,
com as mãos amarradas e o nariz sangrando, com um rasgo irregular no rosto.
Xanos falou novamente. 'Vocês devem ouvir a verdade: eu falhei com vocês.
Este homem não é um escolhido, ele é um charlatão que enganou a todos nós.
Em meu nome, ele tem criado um cordial profano com as plantas sagradas. Um
cordial profano que ele vende para lucrar, para que possa viver no luxo enquanto
vocês trabalham até a morte. Meu devoto povo, escolhi mal este homem e por
isso caminho entre vocês da minha forma mais simples para lhes mostrar que
sinto muito. '
Tala olhou em volta. Os aldeões ficaram de boca aberta, nenhum deles corajoso
o suficiente para falar. Sua tia quebrou o silêncio. 'Ele é meu companheiro!' ela
baliu.
Xanos sorriu gentilmente e puxou sua arma preta e atarracada. 'E agora você
vai ver o que acontece com aqueles que abusam do sagrado privilégio que eu
lhes dei.'
Ele apontou para o Alto Ancião Masa, que pareceu desaparecer. Os aldeões
caíram de joelhos em reverência diante de seu minúsculo cadáver. Tia Syla
agarrou a mulher ao lado dela, chorando.
'Deixe este momento anunciar um novo caminho. Uma forma honesta. Vou
começar identificando o novo Alto Ancião. Alguém que se mostrou digno neste
dia. Sem saber minha verdadeira identidade, ela veio em meu auxílio quando o
charlatão tentou me matar.' Ele jogou a cabeça para trás e riu. 'Não tenham
medo, meus devotos. Eu sou imortal. ' Ele estendeu a mão para Tala. - Venha,
minha filha. Eu escolhi você para ser minha nova Alta Anciã. Entre no santuário
e receba sua bênção. '
Hipnotizada, Tala pegou sua mão e o seguiu para dentro.
'Obaaaaaa! Foi divertido.' exclamou Xanos, dançando no local. Ele piscou. 'Você
gosta das minhas tatuagens? Suco de fruta!'
A névoa estava se dissipando da mente de Tala. Em um minuto ela estava do
lado de fora, assistindo Xanos fazer seu discurso, e no minuto seguinte ela
estava dentro do laboratório no santuário. Ela não tinha certeza de como ela
havia chegado lá.
“Seu tio estava tão ocupado enchendo a barriga que nem pensou nas limitações
dessa operação”, disse Xanos. - Mas agora estou no comando. É hora de
aumentar a rotatividade. ' Ele mudou a configuração de um dos tanques e a
enorme planta dentro dele se debateu violentamente.
Tala observou enquanto os Anciões sobreviventes se moviam ao redor das
camas, ajustando tubos e verificando os hospedeiros. Ela cruzou os braços. -
Então você ainda não vai ajudar essas pessoas?
'Estou ajudando-os a serem mais eficientes', disse Xanos. - Eles estão
cumprindo um propósito muito melhor agora. E o resto da aldeia também.'
'Eles têm vidas, famílias ...!'
Xanos riu. 'Mas sem futuro! Você mal podia esperar para sair daqui quando eu
te conheci. Não finja que mudou de ideia. Eu te conheço Tala, você é como eu.
Você quer mais.'
Tala olhou para ele. 'O que você ganha com isso?'
'A. Droga.' Ele falou devagar, como se ela fosse uma criança pequena. 'Vou fazer
um novo negócio com esta Criadora, ou talvez abrir um pouco o mercado para o
lance mais alto. Mas antes disso, um pouco de solução de problemas. ' Ele sorriu.
'Há um bando de Malviids realmente irritantes no Kereval-5 e eu preciso de uma
grande quantidade de suco roxo para colocá-los naquele sono eterno.'
'Por que faria isso?' disse Tala.
'Bem, porque eles não responderam gentilmente à minha carta sobre me darem
algumas armas muito brilhantes e mortais que eles estavam guardando.' disse
Xanos. Ele ergueu o dedo indicador e sorriu: 'Oh - e porque eu posso!'
Assobiando, ele começou a empilhar as garrafas em uma caixa. - Você foi leal a
mim, Tala - disse ele. - Então, vou lhe dar uma escolha. 'Seja grata por isso, é
mais do que ofereci à maioria.'
Ela esperou.
- Prometi que levaria você comigo, não prometi? O que acontece é que preciso
de alguém em quem possa confiar. Portanto, você pode trabalhar como minha
enviada e comandar esta operação ou pode ser o jantar da Sra. Plantinha Cara-
De-Planta e suas amigas.'
Ele selou a caixa e se virou. 'Só mais uma coisa. Seja qual for sua escolha, é
hora de usar meu nome verdadeiro. Eu sou seu Mestre.'