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Capítulo Zero - Prólogo: A Sensação de uma Nova Vida

No começo, a escuridão sem fim era tudo o que existia. Nenhuma sensação, nem mesmo um
pensamento ou emoção. Mas, de repente, havia uma luz. Então surgiu também uma leve sensação
vacilante, uma breve tranquilidade que vinha do fundo do ser, junto a uma confusão e inquietude. Havia
um calor e uma inquietação vaga, criando um desejo de se perder. Se perder? Sim, esqueci de algo.
Mas o que será? O que eu poderia ter esquecido?

Antes que surgisse uma chance de encarar essas questões, tudo começou a tremer. Um momento
depois, sua mente conheceu o frio. Um calafrio acabou assolando sua pele, junto a uma sensação
pegajosa e quente. Entretanto, não havia tempo para compreender qualquer coisa.

Junto a aquela mistura diversa de sensações — de alguma forma, familiares — surgiu o pânico. Ao
mesmo tempo, começou a se contorcer devido ao perigo, surgiu uma luta desesperada para conseguir
respirar. A dor era quase insuportável, enquanto os pulmões — e também todo o corpo, célula por célula

gritavam por oxigênio. Incapaz de permanecer calmo o suficiente para pensar de maneira racional, seu
corpo começou a se contorcer e soluçar por puro instinto.

Seus sentidos confusos e irresponsivos foram pouco a pouco sendo devastados pela agonia... Não
sobrando nenhuma opção a não ser o sofrimento. Estrangulado por isso, perdeu a consciência com
facilidade.

A consciência se desvaneceu e o conceito de si próprio ficou confuso. Quando finalmente despertou, viu
um céu cinzento. O mundo estava embaçado... Ou era por causa da visão embaçada? Tudo parecia
distorcido, como se a imagem estivesse do outro lado de um óculos cuja as lentes necessitavam de um
grau correto.

Apesar de ter estado fora do contato com as emoções humanas, ficou perturbado por causa dessa visão
turva. Era impossível discernir até mesmo as formas mais grosseiras e rudes.

Pouco a pouco sua mente voltou a se estabilizar, recuperando o senso próprio e, ao final, foi atingido por
uma completa confusão.

O que é isso? O que aconteceu comigo? Não dava para manter a consciência por muito tempo, e a
lembrança de ter sido colocado nesse recipiente ainda não havia aparecido.

A próxima vez que uma sensação confusa brotou em sua consciência, foi quando tomou compreensão.
Ficou completamente desnorteado, como era de se esperar. Se sua memória estivesse correta, deveria
estar morto por uma bala perdida em meio a uma luta de gangues. No entanto, após voltar a si, de
algum modo foi parar dentro de o que parecia ser uma... Cela? Não fazia sentido, seria correto supor
que estava em algum tipo de hospital ou semelhante, devido ao que imaginava ser um suporte de soro.
Se isso fosse um hospital, então seria correto supor que houve algum tipo de acidente. A visão
embaçada poderia ser explicada dessa forma também.

No entanto, agora que seus olhos podiam ver a luz fraca com mais clareza, conseguia distinguir melhor
tudo a sua volta. A iluminação era um pouco inadequada... aparentemente proveniente de uma lâmpada
falha, a menos que as coisas fossem diferentes do que pareciam. As paredes eram cinzentas e ásperas,
mas à umidade do ambiente deixava elas frias e com a sensação de estarem molhadas.

Sua mente tentou compreender aquela situação, mas quanto mais trabalhava para entender, menos
sentido a situação fazia. Todavia, uma coisa era lógica, ele estava preso em uma cela. Não importava
como olhasse, a maioria das coisas o remetia a uma cela de prisão.
A cama era uma simples colchão acima de uma base retangular cimentada, nem mesmo um lençol
possuía. O “quarto” possuía apenas duas entradas. A primeira era uma porta de aço fortemente lacrada,
nela não havia nenhuma fechadura, apenas um pequena janela que parecia ter sido soldada para que
não abrissem, e uma espécie de depósitorio adaptado.

A segunda entrada não era nada demais, um janela com barras de ferro. O que o incomodou foi a altura
da janela. Ela estava num ponto muito alto, que mesmo subindo encima da cama, apenas conseguia ver
o céu noturno.

Seu pequeno espaço também fora equipado de uma pia e um vaso sanitário, ambos funcionais diga de
passagem. Por algum motivo estava feliz com aquilo, mas não conseguia indentificar do porque.

A última coisa importante de se notar na cela era um suporte de soro que estava ligado a ele. Em
primeiro momento, quando notou, quase foi levado pela emoção e puxou o acesso venoso instalado na
parte superior de sua mão, mas a razão falou mais alta e impediu. Depois de algum tempo, parou e
percebeu o quão estranho foi o que quase havia feito, ele nunca foi algum levado pela emoção daquela
forma e em nenhuma hipótese teria puxado o acesso venoso daquela forma, nem mesmo pensaria em
fazer aqu...

*Clang-Clang* Devido a um estrondoso ruído feito por algo batendo na porta, ele perdeu seu raciocínio e
se voltou a porta para verificar o que havia puxado sua atenção.

— Bora Miller não tenho o dia todo! — reclamou o guarda do outro lado.

Inconscientemente, ele se aproximou da porta e, através do depositário, ele retirou uma bandeja selada
com comida.

Notou que o guarda parecia ter ficado parado em frente a porta, não sabia o porque, mas sentia que
aquilo era comum. No próximo momento, ouviu os passos do guarda se afastando lentamente. Curioso,
pós o ouvido naquela porta fria, um cheiro de ferro subiu pelo seu nariz, mas não era isso que
importava, o que realmente importou foi o comentário do guarda se afastando cada vez mais.

— ...estou dizendo Ben, ele está esquisito depois...

Ao mesmo tempo, notou algo bizarro: Miller? Quem era Miller? A situação era difícil de se compreender
e a confusão só aumentava.

Não entendo. Esse era o problema exato. Mas, claro, mesmo que tivesse entendido, nunca, mesmo em
um milhão de anos, pensaria que aquilo era real. Sem dúvidas era algo que podia ser explicado
logicamente.

Mas, enquanto todos seus pensamentos giravam num loop sem saída, uma luz... não... um homem,
chegou para solucionar aquele problema.

— Ei! — chamou o homem do lado de fora da cela. — Essa é a foto que você tinha pedido...

De pouco em pouco, passo por passo, sua mente foi compreendendo a situação cada vez mais,
empurrando cada vez mais uma verdade — completamente maluca — até então encoberta para dentro
de seus pensamentos. Sua mão inconscientemente moveu-se e agarrou a imagem de uma família. O
mundo parecia ter ficado mudo e a voz do guarda, tornou cada vez mais dispersa.

Algo então em sua mente clareou, e junto a foto que deveria não possuir nenhum significado, tomaram
espaço no seus pensamentos. Memórias, confusas, rancorosas, tomaram sua mente, e como uma
pancada severa, mas ao mesmo tempo doce e amarga, não deixou aberturas para nenhuma discussão.

Aquela não era sua vida... não, o correto seria, aquela era sua nova vida, pois, em outras palavras,
aquela pessoa da foto — eu — havia reencarnado num possível criminoso.

Tomado então pela emoção e confusão, um grito brotou das profundezas de sua alma: Mas que porra...

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