Você está na página 1de 7

Narrativa “Acampamento de Verão”

Capítulo 1: Dia sangrento


Capítulo 2: O culpado
Capítulo 3: Por trás de tudo

Capítulo 1: Dia sangrento

Os pássaros cantavam em meio aos ventos suaves, trazendo o perfume adocicado dos ipês em
tons de rosa e branco. Era uma manhã contrastante, em que as notícias sombrias se
espalhavam pelo acampamento como um eco perturbador: cinco vidas haviam sido
brutalmente ceifadas na noite anterior. Meu nome é Letícia Campos e, enquanto descrevo
esses eventos, sinto que esta pode ser a última vez que revivo tais circunstâncias.

O dia 15 de dezembro de 1987 ficaria gravado para sempre em nossa memória. A descoberta
dos corpos de Antônio, Isabel, Joaquim, Verônica e Emily em diferentes partes do
Acampamento IpêGarden lançou uma sombra de medo e desconfiança sobre todos nós. As
luzes das ambulâncias e o ar de urgência que pairava sugeriam algo terrível.

Minhas passadas apressadas ecoaram pelos corredores enquanto seguia o chamado das
circunstâncias. No pátio, deparei-me com a congregação dos jovens acampantes, todos
visivelmente abalados. Lá estava o diretor, a coordenadora e o treinador, todos em conversa
com um homem alto de semblante inabalavelmente concentrado, em meio a uma atmosfera
de desespero compartilhado. Soube mais tarde que o homem de terno e óculos era o
investigador da polícia chamado César, encarregado de desvendar o mistério que nos assolava.

Os eventos subsequentes levaram Maurício, um jovem de aparência bem cuidada, cabelos


escuros, a ser chamado para se juntar aos adultos. Logo depois, fui convocada a participar de
uma reunião na sala da Direção, onde todos os nomes até então mencionados se reuniam. Eu e
Maurício compartilhávamos o mesmo grupo de atividades das vítimas, tornando nossas
perspectivas valiosas para a investigação.

César, o investigador, nos observava com seriedade, ciente da seriedade do momento. Ele
começou a conversa com explicações calmas e meticulosas. Era crucial compreender as
vítimas, seus relacionamentos e dinâmicas para desvendar o que havia acontecido naquela
noite terrível. Sentados diante dele, Maurício e eu éramos peças desse quebra-cabeça
intrincado.

Com bloco de anotações e caneta em mãos, César traçava um perfil de cada vítima, começando
por Antônio, o mais velho do grupo. Minhas palavras fluíam, descrevendo-o como alguém
sereno, sempre com um sorriso no rosto, um líder compassivo que contribuía para a
organização das atividades do acampamento.

Isabel ganhava vida em minhas palavras como uma mulher forte e independente, amante da
natureza e de atividades ao ar livre. Joaquim emergia como o palhaço do grupo, capaz de
trazer risos e alegria a qualquer situação. Verônica era retratada como uma mente aguçada,
sempre atenta e mergulhada em reflexões profundas. Por fim, Emily, a mais jovem, surgia
como uma alma doce e curiosa, encantadora e cheia de imaginação. Maurício completava
minhas observações, fornecendo detalhes adicionais sobre cada um, construindo uma imagem
mais completa e rica. César, com sua perícia e experiência, registrava cada detalhe em suas
anotações, seus olhos perspicazes capturando nuances que poderiam revelar segredos ocultos.

Perguntas detalhadas se sucederam, com César sondando nossas memórias em busca de


conflitos não ditos, tensões veladas ou comportamentos estranhos. Nossa colaboração
continuou por horas, até que ele agradeceu pela nossa disposição em compartilhar e nos
liberou para retornar aos nossos alojamentos.

Enquanto caminhávamos juntos, Maurício lançou uma pergunta carregada de inquietação:


"Você acha que alguém do acampamento poderia ter feito isso?" Suas palavras pairavam no ar,
ecoando a dúvida que todos enfrentávamos.

Pensativa, deixei que as palavras de Maurício permeassem meus pensamentos, confrontando a


realidade sombria diante de nós. Olhei diretamente em seus olhos, minha voz firme, mas
tremendo levemente devido à emoção, quando compartilhei minha reflexão: "Quem quer que
tenha feito isso não tem senso de humanidade." A tristeza em minhas palavras refletia a dor e
a desconexão que as mortes haviam causado.

À medida que os dias passavam, minha inquietude crescia. Sentia-me como se estivesse à beira
de uma revelação sombria prestes a emergir. A cena do crime estava gravada em minha mente
como um enigma a ser decifrado, e eu estava determinada a encontrar respostas, não
importasse o quão profundas ou perturbadoras elas pudessem ser.

Finalmente, a chance de explorar a cena do crime se apresentou, e minha ansiedade se


misturou com a determinação enquanto me aproximava dos detetives envolvidos na
investigação. A atmosfera estava tensa e carregada com um mistério assombroso, e meu
coração batia rápido enquanto observava cada movimento dos detetives.

Os corpos, cada um em sua posição macabra, contavam histórias de um horror indescritível.


Antônio sob uma árvore, Isabel em uma clareira, Joaquim próximo à fogueira extinta, Verônica
à beira do lago e Emily perto da cabana. Cada postura parecia transmitir uma mensagem
silenciosa que eu não conseguia decifrar.

Enquanto eu observava, César agachou-se junto aos corpos, sua expressão séria e concentrada.
Ele notou minha presença e ergueu os olhos, encontrando os meus. "Letícia, você tem alguma
intuição sobre o que aconteceu aqui?" Sua voz carregava uma curiosidade respeitosa. Engoli
em seco, sentindo o peso daquela cena e do que ela representava. "Não tenho certeza",
admiti, minha voz um sussurro carregado de mistério. "Mas algo não está certo. Os corpos, as
posições... Parece haver um padrão, uma mensagem oculta que não estamos vendo."

César observou-me com uma expressão que refletia sua avaliação cuidadosa. Então, ele se
levantou, circulando a área com passos calculados, absorvendo cada detalhe da cena. Eu o
segui com os olhos, sentindo uma conexão silenciosa entre nós, uma aliança para desvendar os
segredos ocultos.

"Você pode estar certa, Letícia," ele declarou com firmeza, lançando-me um olhar cheio de
significado. "Às vezes, é preciso deixar de lado o óbvio e mergulhar nas entrelinhas para
encontrar a verdade. Se sua intuição está nos guiando, devemos segui-la. Este lugar tem
segredos que precisamos desvendar."

Concordei com um aceno, um nó de expectativa formando-se em meu estômago. A


responsabilidade pesava sobre mim, uma determinação crescente de desenterrar a verdade,
não importando o quão profunda ou perturbadora pudesse ser. Firme e decidida, as palavras
saíram dos meus lábios: "Estou com você, César. Juntos, vamos desvendar cada enigma, não
importa o quão desconcertante possa ser. Vamos encontrar quem é o responsável por essas
mortes... Eu sei disso." César assentiu, um brilho de confiança mútua passando entre nós. "Eu
confio em você," ele disse, sua voz mesclando certeza e gravidade.

No entanto, o clima mudou abruptamente, a seriedade tomando conta de sua expressão. Com
um olhar que parecia penetrar em minha alma, ele soltou as palavras que ecoaram como um
golpe final: "Amanhã, Letícia, chegaremos ao desfecho. Vou revelar o que descobri. Vou expor
o rosto por trás das mortes desses jovens."

Capítulo 2: O culpado

O sol mergulhava no horizonte, tingindo o céu com tons ardentes de laranja e roxo, como se o
próprio universo estivesse refletindo a agitação que tomava conta do acampamento. As
sombras se alongavam como dedos sombrios, rastejando pelo terreno, intensificando a
sensação de que algo sinistro estava à espreita. As conversas murmurantes entre os
acampantes, outrora cheias de vivacidade, agora tinham um tom inquietante, como se todos
compartilhassem um segredo obscuro que se espalhava como uma mancha de tinta na água.

O anúncio de César ressoou pelos alto-falantes, convocando a todos para se reunirem na área
central do acampamento. As vozes murmurantes cessaram quase instantaneamente,
substituídas por um silêncio pesado e palpável, como se a própria atmosfera segurasse a
respiração, aguardando o desdobramento iminente.

A reunião em círculo reuniu olhares nervosos, entrelaçando-se em busca de respostas,


perguntas sem solução enchendo o ar de incerteza e apreensão. César, imponente no centro
do grupo, irradiava uma autoridade inabalável enquanto seus olhos percorriam
meticulosamente cada rosto, buscando reações, procurando pistas escondidas sob as máscaras
de inocência e culpa.

"Senhoras e senhores," ele começou, sua voz ressoando com uma intensidade que fez o ar
vibrar, "estamos aqui por um motivo que vai além das aparências superficiais. As provas
coletadas, os depoimentos meticulosamente reunidos e as complexas circunstâncias nos
levaram a uma possibilidade dolorosa. Estamos no epicentro de um momento crucial, em que
revelaremos a máscara do culpado por trás dos terríveis eventos que assolaram este
acampamento."

A tensão no ar era quase tangível, cada palavra de César ecoando como um tambor batendo,
aumentando a pressão que pairava sobre todos os presentes. Meus dedos involuntariamente
se fecharam em punhos, minhas palmas começaram a suar, apesar da brisa fresca que soprava.
O olhar de César percorreu o círculo, seus olhos penetrantes cravando-se em cada um de nós,
como se tentasse ler nossos pensamentos mais profundos. Então, seu olhar finalmente
repousou sobre mim, uma troca silenciosa que parecia desafiar minha resiliência e
determinação.
"Letícia," ele chamou, sua voz ecoando como um veredicto solene, "você trouxe à tona
questões intrigantes. Fez uma conexão entre as vítimas, suas famílias e a influência do pai de
Maurício na antiga rede da empresa. No entanto, há uma camada sombria ainda por revelar."

A atenção de todos estava focada em mim, os olhares convergindo para formar um ponto de
interrogação silencioso sobre minha cabeça. Mantive minha postura, embora sentisse o peso
dos olhares escrutinadores que me avaliavam. "Sim, é verdade," respondi, minha voz trêmula,
mas impulsionada por uma determinação implacável. "As famílias das vítimas e a família de
Maurício sempre estiveram envolvidas em rivalidades profundas. Não posso ignorar o fato de
que ele e o pai dele teriam motivos para eliminar os rivais de uma vez por todas."

Um sussurro inquieto percorreu a multidão, o ar impregnado com a tensão elétrica da


revelação. Todos os olhares agora se voltavam para Maurício, que permanecia ao meu lado.
Seu rosto era uma máscara de emoções contidas, uma mistura de fúria reprimida e
incredulidade que flutuava na superfície de sua expressão. A energia escura que emanava dele
parecia palpável, como se a raiva e o medo se entrelaçassem para formar um escudo
intransponível.

César, então, fez um gesto imperativo aos detetives que se ocultavam nas sombras, e eles
avançaram em direção a Maurício, suas figuras imponentes projetando-se como guardiões
sombrios. "Maurício," César dirigiu-se a ele, sua voz ressoando com uma gravidade pesada,
"neste momento, você é o principal suspeito. As evidências, as circunstâncias e a ligação que
Letícia apontou nos conduziram até você."

Maurício pareceu prestes a falar, mas um olhar cortante de César o deteve, encurtando suas
palavras. "A justiça será feita, mas esta história não é tão simples quanto parece. A influência
de seu pai pode livrá-lo temporariamente das consequências imediatas, mas lembre-se,
Maurício, a verdade tem o poder de romper barreiras aparentemente intransponíveis."

César então se voltou para todos nós, seus olhos penetrando como uma lança afiada. "A
empresa Tech, antiga propriedade do pai de Maurício, foi devastada por um incêndio trágico
anos atrás. Um acidente que ceifou vidas e que foi encoberto, apagado dos registros e da
memória pública. Apenas um pequeno círculo de pessoas sabia a verdade por trás da
tragédia."

O murmúrio inquieto aumentou na multidão, a conexão começando a se formar nas mentes


perplexas. César continuou, sua voz ecoando com uma mistura de indignação e determinação.
"Os pais das vítimas deste assassinato estavam entre aqueles que ajudaram o pai de Maurício a
manter a verdade escondida. Eles foram cúmplices em um encobrimento que custou vidas.
Maurício, em sua busca por vingança, pode ter visto nos filhos desses cúmplices uma
oportunidade de justiça, uma maneira de expor a verdade ao mundo."

As palavras de César caíram como um martelo, uma onda de choque percorrendo a multidão.
Maurício, agora escoltado pelos detetives, mantinha o rosto marcado por uma mistura de raiva
e impotência. A atmosfera estava carregada com a gravidade do que havia sido revelado, as
teias do passado e do presente entrelaçadas de maneira perturbadora. César deu um passo à
frente, sua figura imponente irradiando autoridade. "Maurício, você enfrentará as
consequências de suas ações, mas lembre-se de que a verdade é implacável. Seu pai pode
tentar protegê-lo temporariamente, mas a justiça sempre encontra um caminho."
Os detetives levaram Maurício embora, e a tensão que pairava no ar não se dissipou. César
permaneceu no centro das atenções, observando enquanto as pessoas se afastavam
lentamente, cada passo ecoando como um eco de respostas não dadas. A raiva fervia dentro
de mim, um fogo que queimava com intensidade. Eu tinha olhado nos olhos de Maurício, vi a
fúria e o desespero contidos ali. Mas havia algo mais, algo que eu não conseguia ignorar: um
desejo vingativo, uma necessidade pulsante de fazer justiça à sua própria maneira.

As palavras de César ecoaram em minha mente, sua voz carregada de um sombrio


pressentimento. "Maurício pode ser temporariamente protegido pela influência de seu pai. A
justiça pode ser obscurecida pelo poder do dinheiro." Cada palavra dele ressoava como um
sino, trazendo à tona a lembrança de uma injustiça passada, uma tragédia encoberta que
nunca viu a luz do dia. E eu sabia, com uma certeza fria e implacável, que não podia permitir
que isso acontecesse novamente.

O vento sussurrou nas folhas das árvores, como um segredo compartilhado entre a natureza e
eu. Eu estava determinada a fazer o que fosse necessário para revelar a verdade, para
desenterrar os segredos e enfrentar a escuridão que havia se enraizado naquele lugar. A
incerteza pairava no ar, a dúvida se infiltrando como uma sombra na minha mente. O que
realmente estava acontecendo por trás da fachada? Quais eram os verdadeiros motivos por
trás das mortes?

Enquanto o crepúsculo caía sobre o acampamento, uma sensação inquietante se espalhou por
mim. Uma sensação de que as respostas estavam ao alcance, mas também a percepção de que
a verdade poderia ser mais sombria do que eu poderia imaginar. Um nó de tensão se formou
no meu peito, uma mistura de resolução e inquietação. "Eu vou fazer o que era pra ter feito
muito antes," sussurrei para mim mesma, o compromisso firmemente enraizado em minha
determinação. Quaisquer segredos sombrios que ele pudesse revelar seriam apenas peças do
quebra-cabeça que eu estava determinada a resolver, custasse o que custasse.

Capítulo 3: Por trás de tudo

A chuva caía implacável, suas gotas geladas misturando-se com as minhas emoções turvas.
Meus passos ecoavam no solo encharcado, cada um marcando o ritmo da minha decisão. A
área para onde Maurício havia sido levado estava envolta em sombras, um cenário que refletia
a escuridão que fervilhava dentro de mim. Meus dedos acariciavam a arma com uma
familiaridade arrepiante, como se a morte fosse uma companheira íntima da minha mente
tortuosa.

"Maurício", minha voz era melódica, mas carregava o peso de um segredo obscuro. Ele recuou,
olhos arregalados, a impotência dançando em suas íris. "Hoje, tudo chega ao fim. Não há
escapatória, não há salvação."

Ele gaguejou, suas palavras uma oração desesperada em meio à minha fúria. "Letícia, por favor,
você não precisa fazer isso. Há outro caminho."

Um sorriso distorcido dançou nos meus lábios, um lampejo de minha verdadeira natureza que
eu havia mantido escondido. "Outro caminho? Ah, Maurício, você não entende. Esta é a única
opção que realmente importa agora. A vingança é apenas uma parte disso. É sobre fazer com
que cada um de vocês enfrente o que fizeram."

Ele balançou a cabeça, seus olhos implorando por compreensão, mas era tarde demais.
"Letícia, por favor, eu sei que você está sofrendo, mas isso não é a resposta."

Meus olhos se fixaram nos dele, um olhar intenso que revelava um caos que ele mal podia
compreender. "Sofrendo? Oh, Maurício, você não faz ideia. Eu amo isso. Amo o poder de
decidir quem vive e quem morre."

Ele deu um passo para trás, horror estampado em seu rosto. "Você está doente, Letícia. Isso
não é você."

Um riso sombrio escapou dos meus lábios, a máscara de normalidade caindo para revelar
minha verdadeira face. "Oh, Maurício, você só viu uma parte de mim. Fui uma mestra em
esconder o que arde dentro de mim. A dor, a raiva, o desejo de ver o sangue jorrar. É assim que
eu sobrevivo, como uma predadora entre as ovelhas."

Ele engoliu em seco, os olhos cheios de terror e incredulidade. "Você é louca."

Eu dei uma risada, um som que ecoou com uma melodia dissonante naquela noite chuvosa.
"Louca? Talvez. Mas eu também sou justiça. Justiça por aqueles que vocês traíram, por aqueles
que vocês condenaram. Cada gota de sangue é uma lembrança de tudo o que vocês
roubaram."

Maurício estava encurralado, seus olhos procurando por uma saída que não existia. Eu me
aproximei, cada passo ecoando como um tambor sinistro. "Maurício, você será o último a
pagar. A última peça desse quebra-cabeça distorcido.”

Ele soluçou, uma mistura de medo e desespero que alimentou minha satisfação mórbida. "Por
favor, não faça isso."

Eu estava prestes a apertar o gatilho, a linha tênue entre vida e morte, quando uma voz cortou
o ar como um trovão, interrompendo a dança macabra que havíamos começado.

"Letícia, pare!"

Minha mão vacilou, a arma tremendo em meus dedos enquanto meu olhar se voltava para a
figura que emergia das sombras. César. Ele estava ali, como se fosse um intruso em minha festa
sombria, uma presença indesejada em minha sinfonia de terror.

Ele se aproximou, sua voz suave, mas firme. "Você não precisa fazer isso, Letícia. Ainda há uma
chance de escolher um caminho diferente."

Eu o encarei, um misto de ódio e perplexidade fervendo em meu peito. "Escolher um caminho


diferente? Você realmente acredita nisso? Meu caminho foi traçado há muito tempo, César. E
ele é pavimentado com vingança."

Sua mão se estendeu, um gesto gentil que parecia querer me puxar das sombras em que eu
estava mergulhando. "Letícia, a verdade é que você pode escolher como isso acaba. Não é
tarde demais para redenção."

Eu recuei, a gargalhada amarga escapando dos meus lábios. "Redenção? Você realmente acha
que é tão simples assim? Eu já atravessei essa linha há muito tempo. Não há como voltar
atrás."
A chuva continuava a cair, o ritmo das gotas ecoando como uma batida macabra que conduzia
nossa conversa mórbida. César permaneceu inabalável, como uma rocha firme em meio à
minha tormenta. "A verdade é que há muito mais em jogo aqui, Letícia. Você acha que essa
vingança irá apagar tudo o que aconteceu? Isso não trará seus pais de volta."

Minhas mãos tremiam, a arma ainda em minha posse. Um turbilhão de emoções e memórias
inundou minha mente, uma tempestade que eu não conseguia controlar. As palavras de César
ecoaram como uma verdade indesejada, uma ferida que eu havia tentado ignorar por tanto
tempo.

Eu estava à beira de um abismo emocional, o peso das minhas ações me puxando para um
abismo sem fundo. César estava certo; minha busca por vingança não traria de volta aqueles
que eu havia perdido. E, no final das contas, eu estava me perdendo também.

A arma caiu das minhas mãos, o som metálico ecoando como um último suspiro de resistência.
Meus olhos encontraram os de César, uma mistura de desespero e resignação refletida neles.
"Você venceu, César. Mas não pense que isso é redenção. Eu sou o que sou, e nada mudará
isso."

Ele se aproximou, sua expressão suave, mas cheia de compreensão. "Não é sobre ganhar ou
perder, Letícia. É sobre escolher um caminho que possa levar a um mínimo de paz. A redenção
não acontece da noite para o dia, mas cada passo na direção certa é um começo."

Os reforços que César havia convocado finalmente chegaram, uma equipe que me cercou,
pronta para conter qualquer resistência. Eu estava derrotada, não apenas fisicamente, mas
emocionalmente. Minha busca por vingança havia se transformado em uma espiral de
escuridão que me engolia.

Enquanto eu era escoltada para longe da cena, minha mente girava em torno das palavras de
César. Ele estava certo de que a redenção não era uma jornada fácil, mas talvez, apenas talvez,
houvesse um fio de esperança que eu poderia agarrar.

E assim, enquanto a chuva continuava a cair, eu finalizava este diário que testemunhou minha
jornada de vingança e descoberta. Não me arrependo do que fiz, pois acredito que a justiça foi
alcançada de alguma forma. Mas agora, enquanto enfrento as consequências do meu passado
sombrio, devo encontrar um caminho que me permita confrontar a dualidade dentro de mim.

Pergunto a mim mesma, em meio a esta encruzilhada de moral e escuridão, o que podemos
realmente julgar como certo ou errado nessas ocasiões? A linha entre heróis e vilões é mais
tênue do que gostamos de admitir, e a justiça que buscamos muitas vezes é apenas a face
refletida de nossos próprios demônios. Talvez a verdadeira redenção resida não na absolvição,
mas em aceitar a complexidade da nossa natureza e buscar uma paz que possa iluminar até
mesmo as partes mais sombrias de nossa alma.

Você também pode gostar