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SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICANÁLISE HOLÍSTICA

CURSO LIVRE DE PSICANÁLISE

BRUNO PRÍNCIPE NASTÁCIO ADIPIETRO

POSSÍVEIS PARALELOS ENTRE A PSICANÁLISE E A BIOLOGIA INSTINTUAL

São Paulo
2017
BRUNO PRÍNCIPE NASTÁCIO ADIPIETRO

POSSÍVEIS PARALELOS ENTRE A PSICANÁLISE E A BIOLOGIA INSTINTUAL

Trabalho de conclusão de curso de formação


apresentado à Sociedade Brasileira de
Psicanálise Holística, como requisito parcial
para a obtenção do título de Psicanalista.

Orientador: Prof. Ms. Marcos de Oliveira Silva

São Paulo
2017
No Princípio era o Instinto,
e este, mais o Verbo, se fez Pulsão
E ela reinou sobre a Terra

Bruno Príncipe Nastácio Adipietro


RESUMO

Em um primeiro momento, no primeiro capítulo desta monografia, iremos


refinar e aprimorar nossos conhecimentos sobre a evolução, e sobre os instintos
mais básicos dos animais, voltados, é claro, aos nossos objetivos didáticos. Ainda
neste capítulo, nos aprofundaremos nos instintos que possuem paralelos possíveis e
pertinentes a vários dos comportamentos humanos, tanto individuais, como sociais,
e, inclusive, possivelmente presentes nas mais diversas neuroses.
Em seguida, ainda nos focando principalmente nos estudos instito-biológicos,
mas já introduzindo seus possíveis desdobramentos na psique humana, iremos nos
aprofundar no estudo das origens das pulsões, e nestas propriamente ditas. Sempre
nos lembrando das descobertas e análises freudianas, principalmente, e também em
aspectos sociológicos.
Já no terceiro capítulo, agora focando totalmente nossa atenção às teorias
psicanalíticas, vamos estudar como as pulsões se desdobram em neuroses
propriamente ditas, ou em sintomas neuróticos. Além dos já citados ensinamentos e
compreensões próprios das teorias freudianas, também abordaremos as ideias de
um filósofo chamado David Hume, que nos deixou ideias bastante pertinentes à
prática psicanalítica.
Ainda nos baseando nestas teorias, iremos, agora no quarto capítulo, refletir
sobre uma ideia bastante pertinente a qualquer terapia, e a Psicanálise não deveria
se abster de comentar sobre, por mais que ainda existam muitas discordâncias, que
é a ideia de cura psicanalítica. Não procurando, é claro, definir uma ideia desta, mas
abordando-a com a cautela e a atenção necessárias, apresentando assim um novo
ponto de vista, como acontece no primeiro capítulo acerca dos instintos.
E por fim, apresentaremos nossas conclusões, que, em hipótese alguma,
devem ser tomadas como novos ensimentos morais, ou tão pouco, como crítica aos
já presentes na nossa sociedade.
SUMÁRIO

Objetivo 6
Introdução 7
Capítulo 1 – As Bases Instintuais e seus Desdobramentos na Psique
Humana 9
1.1 A Sexualidade como base para o Complexo de Édipo 10
1.2 O Egoísmo Ontológico como fonte do Ciúme 11
1.2.1 O ciúme aos filhos anteriores 11
1.2.2 O ciúme entre irmãos 13
1.3 As Funções Reprodutivas como Diferenciadores Sociais 14
1.4 Um Instinto Acumulativo como Compulsão 15
1.5 Instintos de Grupo e sua Influência na Psique 17
1.6 A Agressividade como Fonte do Sadismo e do Masoquismo 18
1.7 O Medo Instintual como base para a Ansiedade 20
1.8 Preguiça, Paralisias, e Desmaios: Movimentos Instintuais para
a Fuga da Realidade 21
Capítulo 2 – Dos Instintos às Pulsões 23
2.1 Os Instintos que se fazem Pulsões 24
2.2 Como os Instintos formam Pulsões 25
Capítulo 3 – Das Pulsões às Neuroses 29
3.1 Fontes e Abafamentos sociais das Neuroses 30
3.2 Uma Neurose como o resultado de uma Disputa entre Espécies
que dividem uma mesma Psique 32
3.3 Uma Neurose como o resultado de uma Disputa Instinto-pulsional 33
3.4 Uma Neurose como um Encaixe Pulsional 34
3.5 Os Aspectos neurotisantes da Pós-modernidade 36
3.5.1 A individualização excessiva 36
3.5.2 Uma corrida contra o Tempo 37
3.5.3 A falta de privacidade 38
Capítulo 4 – Das Neuroses à Cura 39
4.1 O Conflito com as Outras Ciências 39
4.2 O Amansamento das Paixões 41
4.3 A Cura Permanente e Impermanente 42
CONCLUSÕES 44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 46
REFERÊNCIAS DIGITAIS 47
6

OBJETIVO

Esta monografia tem como objetivo principal mostrar os possíveis paralelos


entre as descobertas psicanalíticas e as descobertas da biologia instintiva, sem o
intuito de substituir uma à outra. Baseada nas obras de autores como Charles
Darwin, Richard Dawkins, Allan e Barbara Pease, e, claro, do pai fundador da
Psicanálise, Sigmund Freud, serão mostrados os mais surpreendentes cruzamentos
entre os instintos animais também presentes nos homens, com os aspectos mais
variados da vida nas sociedades pós-modernas, ditas civilizadas e racionais.
Importante se torna evidenciar que quaisquer conclusões provindas desses
cruzamentos não tem como objetivo defender este ou aquele comportamento moral,
nem tão pouco julgá-los certos ou errados, e muito menos incentivá-los.
7

INTRODUÇÃO

Quando o ponto de vista da biologia evolutiva surgiu, nos revelou de uma


forma mais clara e direta, oriunda de observações e de estudos mais completos e
complexos, que temos muito em comum com os demais animais. Seus
comportamentos até nos surpreendem com tamanha similaridade. É tão diferente
assim de um jovem leão alfa que mata os bebês do antigo macho, um homem que
mata o filho de sua parceira com um antigo parceiro? E o que dizer quando
comparamos uma briga de irmãos, ainda pequenos, com filhotes de algumas
espécies de pássaros que expulsam seus irmãos do ninho, condenando-os à morte
certa? Com tantas semelhanças assim, mesmo que ainda possa parecer exagerado
sob a óptica atual, se faz imprescindível uma análise mais aprofundada sobre o
assunto.
Após iniciados os seus estudos, uma das conclusões à qual Freud chegou foi
a seguinte: os sonhos são guiados, de uma maneira geral, tanto nos indivíduos
neuróticos quanto nos ditos normais, pela realização de desejos não satisfeitos em
vigília, no dia ou em dias anteriores ao sonho. Em outras palavras: os sonhos são
realizações de desejos (FREUD, 1969, p. 162). Para os sonhos mais simples, como
no caso de um desejo por comer algum alimento específico que foi negado em
vigília, a ideia foi bem aceita. Mas quando um sonho era interpretado como a
realização de um ato imoral, de cunho sexual por exemplo, os contemporâneos de
Freud não aceitaram muito bem a ideia. À época, não se acreditava que as crianças,
por exemplo, poderiam ter alguma sexualidade ativa, e ainda mais que essa
sexualidade pudesse gerar desejos.
Hoje, contando mais de cem anos dos primeiros escritos de Freud, muita
coisa mudou; muito conhecimento foi produzido; muitas outras escolas, sobre os
mais variados temas, foram surgindo e se estabelecendo, trazendo à tona situações
interessantíssimas, como é o caso de carcaças de baleias, que quando depositadas
nos fundos dos mares, servem de ambiente para o surgimento de espécies únicas
de microorganismos. Além disso, é importantíssimo frisar que muito conhecimento
foi produzido pelo “simples” fato de informações de escolas distintas terem sido
cruzadas, como nos mostra os chocantes insights aos quais Einstein chegou,
quando se imaginou viajando, lado a lado, com um fóton de luz. Com a Psicanálise
não deveria ser diferente. Nenhum psicanalista deve ter medo de cruzar conceitos
8

de sua prática com os conceitos de outras. Este trabalho é um exemplo deste


esforço.
Contando também mais de cem anos, temos grandes alunos de Freud, como
Carl Gustav Jung e Alfred Adler, deixando para trás, mas não em absoluto, o
movimento psicanalítico mais clássico. E não poderia ser diferente: tantas mentes
aguçadas e preparadas trabalhando juntas não poderiam concordar em todos os
pontos. Algumas discordâncias estavam fadadas a acontecer. E assim, como foi
exposto algumas linhas acima, conhecimentos foram criados a partir de outros
pontos de vista.
Os psicanalistas não podem, e não devem, fechar seus olhos ao avanço e às
descobertas de outras ciências. Temos sempre que ter em mente que a Psicanálise,
antes de tudo, é um punhado de reflexões e teorias sobre o ser humano e o seu
comportamento, somando-se a uma pitada assertiva de filosofia e prática. Enquanto
observa o Homem, ela tem que levar em conta tudo o mais que pode ou não
influenciar seu objeto de estudo. É por isso que o ponto de vista biológico evolutivo,
e também o instintual e observado, deve sim ser levado em consideração, afinal,
temos muito mais milênios de instintos atrás de nós, do que livros nas nossas
estantes.
9

CAPÍTULO 1 – AS BASES INSTINTUAIS E SEUS DESDOBRAMENTOS NA


PSIQUE HUMANA

No seu livro intitulado de O Gene Egoísta, o biólogo Richard Dawkins parte


das primeiras moléculas da científica sopa primordial, até nossa atual e complexa
civilização. Seu objetivo não é explicar a vida em si, mesmo porque ainda nos faltam
muitos dados para tal, mas sim examinar a biologia do egoísmo e do altruísmo,
Dawkins (2007), para esclarecer um ponto de vista diferente sobre o que aconteceu
para que exista, hoje, tanta diversidade de espécies nos reinos animal e vegetal.
Para tanto, seu trabalho é repleto com modelos e dados relacionados a
comportamentos que muitas das espécies compartilham, como os citados na
introdução anterior.
Mas como emparelhar comportamentos humanos aos dos animais? Não é
uma tarefa das mais fáceis, mas com um pouco de atenção e dedicação os
paralelos vão surgindo. A óptica biológica aborda o ser humano, a espécie homo
sapiens sapiens, como mais uma espécie surgida das modificações acumuladas de
espécies anteriores, que foram passadas aos descendentes, ou seja, selecionadas
mediante mecanismos de seleção natural, como a teoria darwiniana expressa
quando entendida corretamente.
Antes de nos aprofundarmos no assunto de fato, importante é explicar que
nenhuma espécie busca se perpetuar como espécie, ou seja, os indivíduos de uma
espécie não buscam o melhor para a espécie, mas sim para si mesmos, mesmo que
em detrimento de membros da sua própria espécie (DAWKINS, 2007, p. 38). Não
podemos admitir que quando um jovem passarinho expulsa seus irmãos do ninho,
ele esteja agindo em prol da espécie. Cada indivíduo, agindo em benefício próprio, é
fundamental para que entendamos os paralelos comportamentais que virão a seguir.
Além destes últimos conceitos, não devemos seguir, também, sem antes
fixarmos os seguintes conceitos sobre os instintos: eles são respostas automáticas a
dadas situações enfrentadas pelo organismo do indivíduo; cada instinto tem sua
resposta particular, e cada espécie os seus instintos particulares, além dos
compartilhados; e eles são herdados, não aprendidos (FERREIRA, 1983, p. 309).
10

1.1 A SEXUALIDADE COMO BASE PARA O COMPLEXO DE ÉDIPO

Quando falamos em Freud, falamos em sexo. Quando falamos em sexo


estamos, na verdade, falando em prazer. Biologicamente analisando, os indivíduos
que, de alguma forma, passaram a encarar o sexo como prazeroso, geraram mais
descendentes, fazendo assim esse comportamento seguir adiante. Com a nossa
espécie não poderia ter sido diferente.
Os instintos sexuais, quando focados pelo olhar psicanalítico, nos revelam
comportamentos peculiares. O que é o Complexo de Édipo, sob a óptica biológica,
se não a principal conseqüência de uma primeira sexualidade desperta? No
pequeno garoto, que nem mesmo fala, e que, também tão pouco conseguiria
fecundar uma mulher, já surgem impulsos sexuais pelo primeiro exemplar do sexo
oposto que ele encontra em sua tão breve existência: sua mãe. Logo depois surge o
seu primeiro rival: seu pai, que sem demorar se torna vítima dos primeiros impulsos
agressivos. Da mesma forma que o pequeno pássaro expulsa seus irmãos para ter
em si os recursos concentrados de seus pais, o pequeno homo sapiens sapiens
quer o controle dessa fêmea sem mais demoras, mesmo que ainda demore muitos e
muitos anos para que alguma possível fecundação ocorra.
Enquanto que no reino animal esses embates terminam em mortes em um
bom número de vezes, como é o caso dos leões, por exemplo, no nosso caso eles
terminam de forma bem mais desejável. Quando o pequeno se depara com as
visíveis superioridades de seu oponente, e também com a contribuição de um
entorno favorável, passa por um processo necessário e fundamental que é o da
identificação. Ele desiste desta primeira fêmea e passa a olhar para as demais. Isso,
claro, é o que acontece nos casos bem sucedidos. Nos mal sucedidos, pelos
motivos contrários aos anteriores, surgem as neuroses, acarretando em um sem
número de sintomas possíveis, dos quais a literatura psicanalítica nos fornece ricos
exemplos.
Mas e quanto a uma jovem garota? Como se dão esses processos? Quando
a jovem percebe-se igual à mãe, passa a desejar o pai, e também a desejar ser a
mãe. Os primeiros impulsos sexuais, desta vez, são destinados ao pai, e os
agressivos, à mãe. Pelas mesmas razões anteriores, nos casos bem sucedidos, a
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menina deixa o interesse pelo pai, e passa a querer ser similar à mãe, ou seja, ter
um filho, comportamento este que é enormemente incentivado pelos brinquedos
infantis femininos até os dias atuais. E claro que as neuroses também surgem em
meninas pelos mesmos motivos contrários anteriores.
Não é difícil de notar que vivemos influenciados por instintos e impulsos dos
quais os animais também compartilham. Só as espécies que se reproduziram estão
vivas hoje em dia, e só se reproduziram as espécies que, por razões biológicas
diversas, inclusive genéticas, desenvolveram mecanismos a favor do prazer e contra
o desprazer (FREUD, 1969, p. 17). E, tendo essas características logo cedo
despertadas, conseguiram passar esse comportamento adiante com mais eficiência,
até a nossa espécie.
Além da sexualidade sendo as bases do Complexo de Édipo freudiano,
veremos também como a Biologia joga luz sobre o ciúme e outras características
humanas.

1.2 O EGOÍSMO ONTOLÓGICO COMO FONTE DO CIÚME

O ciúme é um sentimento bastante peculiar, sem dúvida. Ele pode acontecer


em todos os núcleos de convívio humano: família, escola, trabalho, etc. Mesmo após
o término de uma relação amorosa, por exemplo, podemos sentir ciúme pelo
parceiro que se foi. Mas como os instintos explicam tal comportamento?

1.2.1 O ciúme aos filhos anteriores

Vamos retomar o exemplo do jovem leão que assassina os filhotes do macho


derrotado. Sabemos todos, ou podemos ao menos imaginar, que a vida natural e
selvagem seja bastante complicada. Recursos são escassos, predadores estão
sempre à espreita, ávidos pela próxima refeição, e a competitividade para se
reproduzir é enorme. Adotando-se uma lógica egoísta, por que um jovem leão,
vitorioso na luta para se reproduzir, gastaria recursos tão valiosos com os
descendentes de um derrotado? Logicamente o leão não pensa assim, são seus
instintos que o fazem agir de maneira tão cruel, aos nossos olhos, obviamente. Se o
grupo de leões vai fornecer todos os seus recursos a filhotes, que estes sejam do
melhor macho, já que um macho perdedor deva gerar descendentes perdedores, e
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perdedores não tem vez na natureza. Vale à pena mencionar que os indivíduos
perdedores não são necessariamente os mais fracos, como se constuma pensar no
senso comum. Eles podem ter as mais diversas características possíveis, como
menos chances de se reproduzir, ou menos chances de obter alimentos. Em suma:
toda e qualquer característica que dificulte que este indivíduo atinja a reprodução vai
caracterizá-lo como perdedor. Vamos, agora, explorar estes instintos funcionando
nos seres humanos.
Ao contrário do que acontece com os leões, as disputas amorosas entre os
casais humanos terminam de formas bem mais brandas, apesar de algumas
exceções ocorrerem, obviamente, mas os paralelos entre as duas espécies são
difíceis de negar quando expostos lado a lado. Claro está que nos seres humanos o
prazer do sexo fala mais alto que o instinto de reprodução, mesmo porque estamos
socializados, mas seria ingênuo de nossa parte achar que este instinto tenha
perdido sua força. Na verdade, devemos encarar este instinto como base formadora
de pulsões que vão guiar os sujeitos nas suas escolhas futuras, e por toda a vida.
Entre essas pulsões, que por hora podemos considerar como instintos socializados,
incluiremos o ciúme. Em outras palavras: o ciúme é uma espécie de egoísmo
socializado.
Nas sociedades pós-modernas podemos encontrar um cem número de
explicações, que podemos considerar, por um ponto de vista psicanalítico, como
racionalizações, do porquê da ocorrência do ciúme. Se nos debruçarmos
atentamente sobre estas, podemos perceber com espantosa dose de paralelismo,
que suas raízes não são diferentes das dos animais. Seria de se espantar, por
exemplo, que surgissem no novo companheiro pensamentos do tipo “tenho que
gastar dinheiro com os filhos de outro”? Ou então “se não fosse esse moleque eu
poderia matricular meu filho em uma escola melhor, mas tenho que dividir entre os
dois”? À luz do que foi dito anteriormente fica claro que não. Muito comum também,
por sinal uma questão muito recorrente em consultórios, é o fato de pais ou mães
diferenciarem, principalmente de forma velada, os filhos de relações anteriores dos
filhos da nova relação. Mais adiante veremos que cenários com essa qualidade são
terrenos férteis para o surgimento e continuação de neuroses.
13

1.2.2 O ciúme entre irmãos

Muito comuns entre irmãos pequenos são as pequenas disputas. É muito


curioso observar tais cenas: um dos pequenos está quietinho em algum lugar,
destraído com alguma coisa, quando o outro resolve brincar com algum brinquedo
que estava jogado no chão. Sem aviso algum, aquele pára o que quer que esteja
fazendo para disputar o recém interessante brinquedo com o outro. A disputa que se
segue quase sempre termina em agressões por um lado, lágrimas por outro, e uma
boa bronca aos dois.
Na Natureza não existem muitas chances do irmão desafortunado apenas
derramar lágrimas; o resultado da disputa é muito mais drástico e permanente.
Como já foi exposto parágrafos antes, os recursos naturais são difíceis de serem
conquistados. Quando filhotes de águia real, por exemplo, nascem antes dos demais
irmãos, não exitam em se livrar deles. Mais uma vez, sob a óptica dos genes
egoístas, a morte de filhos não é mal vista. Menos filhos significa maior
concentração de recursos, e, novamente, maiores chances da perpetuação dos
genes dos pais.
Quando olhamos de volta aos pequenos do exemplo que abre este item,
notamos que, aparentemente, não existe um motivo para a disputa, afinal, o
brinquedo não causava interesse ao irmão agressor. Mas quando olhamos pela
mesma óptica das jovens águias, percebemos o real motivo, que é a disputa de
recursos. Além de brinquedos, é facilmente notável, e com número maior de
exemplos, a disputa entre a atenção dos pais.
O quanto não é comum, principalmente nos indivíduos ditos normais, as
lembranças das dispuitas com os irmãos nos tempos de infância? E quantas destas
disputas ainda não são presentes na vida adulta? É muito comum encontrar histórias
de mágoas baseadas neste tipo de ciúme, sentimento este que muito é
negligenciado pelos pais. Muito comum também é a preferência que alguns pais dão
a este ou àquele filho, por esta ou àquela razão. Este comportamento, que,
socialmente é dito como inexistente, e muitas vezes negado veementemente por
eles, não serve senão para acentuar uma característica que já nos é ontológica.
Também como anteriormente, esta mistura permite o surgimento e continuação, e
possível agravamento, de quadros neuróticos.
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1.3 AS FUNÇÕES REPRODUTIVAS COMO DIFERENCIADORES SOCIAIS

Nas sociedades pós-modernas, ainda é muito comum observarmos que


certos comportamentos são mais incentivados aos meninos do que às meninas. Os
meninos, desde a mais tenra infância, são incentivados a serem garanhões. Os pais,
e as mães, dos jovens garotinhos não perdem uma única oportunidade sequer, seja
no lugar que for, de ensiná-los que eles tem que se aproximar e gostar das meninas;
e não há, ao menos nestas primeiras apresentações ao sexo oposto, menções em
respeito à fidelidade. Já para as meninas, existem um cem número de brinquedos
que as incentivam, também desde a mais tenra infância, aos chamados “cuidados
parentais”, que nada mais são do que os cuidados que a mãe, ou os pais, tem em
relação aos filhos pequenos. E, ao contrário dos meninos, elas são estimuladas a
não serem promíscuas.
Como a Biologia encara essas diferenças? Essa resposta reside em uma
incrível diferença entre os sexos: a quantidade de gametas. Antes de mais nada,
gametas são as células responsáveis pela reprodução das espécies que se
reproduzem sexuadamente (FERREIRA, 1983, p. 268). Na nossa espécie, os
gametas presentes nos indivíduos masculinos são chamados de espermatozóides, e
nos femininos, óvulos. O organismo masculino produz milhões de espermatozóides
diariamente, enquanto que o feminino libera, mensalmente, um óvulo apenas, e que
este já existe desde o ventre materno. Vale à pena lembrar que existe sim a
possibilidade de uma mulher, em uma mesma ovulação, disponibilizar mais de um
óvulo, mas mesmo assim a concorrência permanece incrivelmente “desleal”. Com
tais apresentações podemos entender o porquê dos comportamentos anteriormente
expostos serem influenciados.
Biologicamente falando, os indivíduos machos estão preparados para
espalhar seu material genético o mais amplamente possível, com diversas e
diversas fêmeas, obtendo assim boas probabilidades de gerarem filhos capazes de
atingir a idade reprodutiva. Enquanto isso, as fêmeas ficaram incumbidas de serem
seletivas o mais que puderem, em busca do mesmo fim que seus parceiros (PAESE,
2000, p. 125). Para as fêmeas existe ainda um outro agravante: os cuidados
parentais. Nos grandes animais, grupo ao qual estamos incluídos, são as fêmeas
que cuidam dos filhotes, em grupo ou individualmente. É por essa razão que,
retomando o exemplo anterior dos leões, as fêmeas que tiveram seus filhotes mortos
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pelo novo macho alfa, não se oporão à tal situação; para elas, será melhor mesmo
que seus genes sejam misturados com genes vencedores.
Essas influências instintivas se fazem notar nos seus mais diversos grupos
sociais. Já exploramos os grupos infantis em itens anteriores, e não há razões para
deixarmos os grupos adolescentes e adultos de fora. Neste ponto não precisamos
nos apoiar em grandes autores, ou em grandes obras. Todos sabemos que os bares
e casas de show, por exemplo, cobram mais caro para os clientes homens; em
muitos casos, inclusive, a entrada de mulheres é totalmente gratuita. Em regiões
mais carentes, encontramos sugestões ainda mais diretas: além da entrada franca, é
oferecido às mulheres que estiverem sem calcinha cervejas e outros drinks. Às que
aceitam tal sugestão, acabam se expondo à doenças e gravidez indesejada, além, é
claro, dos julgamentos sociais. Clara também se torna, neste exemplo, a exploração
mercadológica que pode ser feita através desse importantíssimo instinto.

1.4 UM INSTINTO ACUMULATIVO COMO COMPULSÃO

No livro intitulado O Valor do Amanhã, o economista Eduardo Giannetti busca


justificar, biologicamente, a existência dos juros (GIANNETTI, 2008, p. 19). Não se
farão necessários grandes exemplos para se ilustrar a ideia de que guardar e poupar
são extremente úteis para que os organismos se mantenham vivos e reprodutores.
Mas como vemos nesse mesmo livro, existem espécies de animais que apresentam
evidentes desvios na conduta econômica. É o caso de hamsters que, pesando não
mais que 100 gramas, acumulam mais de 25 quilos de sementes em suas tocas
(GIANNETTI, 2008, p. 65). Além desta espécie, podemos perceber que a nossa
própria é capaz de guardar muito mais que isso.
Uma situação bem característica de tal comportamento é a seguinte: ao nos
depararmos com um expositor, oferecendo brindes quaisquer, tendemos a pedir
mais, mesmo sabendo que, muitas vezes, não vamos usar nem mesmo uma
unidade do tal brinde. Com a ideia de que “talvez isto seja últi algum dia”, vamos
acumulando quinquilharias das mais diversas. E sempre haverá espaço para as
próximas.
Seguindo o viés biológico, é sempre bom estocar, pois nunca se sabe o que
acontecerá amanhã. O próximo inverno pode ser rigoroso demais e os frutos
demorarão a voltar; a semente disponível agora pode não mais estar na próxima
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hora, pois um concorrente não hesitou em apanhá-ja; uma fêmea pode se interessar
mais pelo indivíduo mais abastado, pois assim garantirá que seus filhotes não
passem necessidades, e atinjam a idade reprodutiva. Enfim, muitas razões existem
para que as espécies estoquem. Mas e no caso do animal humano?
Nas grandes metrópoles, ao menos, existem muitos estabecimentos que já
fazem esse serviço para os moradores ao redor; basta ir a um supermercado,
voltando pra casa do trabalho, por exemplo, e comprar os ingredientes para a
próxima refeição. Não há necessidade real de grandes geladeiras; basta um pouco
de paciência que o jantar será o mais fresquinho possível. Mas estamos muito
cientes que nosso acúmulo além da conta não se dá apenas com frutas, verduras ou
legumes. Nossas contas bancárias e nossos estilos de vida são frutos de uma
exarcebada acumulação de recursos. E a resposta psicanalítica aqui proposta é uma
junção deste instinto de acumulação com outros desdobramentos psíquicos,
favorecidos ou não pelas sociedades atuais.
Sempre tendo em mente que uma neurose só se estabelece quando uma
porção de aspectos são satisfeitos, podendo ser incluídos dentre eles esse ou
aquele instinto, mais ou menos presente na constituição do indivíduo, um aspecto
importante da acumulação é a capacidade de garantir poder ao sujeito que acumula,
gerando uma característica sensação de controle. Para um neurótico que sofre do
conhecido Transtorno Obssessivo Compulsivo, o TOC, acumular ações garante
certo controle sobre certas pulsões, mesmo que de forma exagerada, e mesmo
ainda que em detrimento de outros aspectos da vida do sujeito. A prática
psicanalítica também nos mostra que ganhos secundários tremendos, que
claramente irão seguir uma lógica própria de cada sujeito afetado, reforçam o
comportamento neurótico. Para o neurótico desse tipo, acumular e controlar é como
a junção cotidiana da fome com a vontade de comer.
17

1.5 INSTINTO DE GRUPO E SUA INFLUÊNCIA NA PSIQUE

Aristóteles, há cerca de dois milênios e meio atrás, nos deixou uma ideia
difícil de ser ignorada, e mais difícil ainda de ser contestada: “o homem é um animal
político, destinado a viver em sociedade” (ARISTÓTELES, 2010, p. 60). O fato de
estarmos fadados a viver em sociedade não passa desapercebido pela psique
humana, mas o faz em um nível muito mais sutil, que é o campo dos estudos da
Psicanálise. O sentimento de pertencimento que buscamos nas nossas relações
mais extensas é visivelmente necessário, porém, como veremos a seguir, nem
sempre benéfico. Buscamos sempre pertencer a algum grupo, seja este uma família,
religião, torcida de futebol, ou até mesmo uma gangue de mal feitores. Viver em
grupos parece uma característica instintual.
Cerca de uma década após os terríveis acontecimentos nos campos de
concentração e extermínio nazistas, psicólogos e outros pesquisadores correlatos
elaboraram e puseram em prática diversos experimentos para buscarem responder
à uma inquietante pergunta: será que todos os nazistas eram pessoas cruéis,
realmente? Um dos experimentos que ficaram mais conhecidos foi o do pesquisador
Solomon Asch: o participante era colocado ao lado de vários outros participantes, e
deveria comparar um traço a três outros traços, e dizer, em voz alta, qual dos traços
era igual ao traço indicado (Asch, Conformity Experiment). Na verdade somente um
dos participantes era realmente testado, os demais eram atores instruídos a
escolher sempre o traço mais curto, que era, importante frisar, visível e
drasticamente mais curto.
Os testados eram sempre os últimos a responder, o que fazia com que eles
acompanhassem, em alto e bom som, todos os colegas escolherem a resposta
errada. Nos vídeos que acompanham muitos destes testes, pois este foi repetido
inúmeras vezes, por muitos pesquisadores ao redor do mundo (Asch, Conformity
Experiment), é notável o desconforto que o testado demonstra em suas expressões
facio-corporais e tom de voz, quando se vê forçado a responder de forma errada.
Após as tomadas de resultados, os testados eram questionados acerca dos
porquês que os levavam a seguir a resposta do grupo, mesmo sabendo que
estavam abrindo mão de uma evidencia objetiva e concreta. Duas respostas foram
as mais ouvidas: vontade de pertencer ao grupo, e por acreditar que a maioria
deveria saber mais do que apenas um.
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Outro aspecto importante desse experimento é mostrado quando um dos


atores é instruído a responder corretamente. Ao constatar que não seria o único a ir
de encontro a maioria, o testado respondia corretamente, inclusive, com certa
veemência. Nas filmagens é fácil notar que o próprio testado buscava trocar olhares
de aprovação e satisfação com seu colega de opinião. Sozinho, porém, o testado
não se pronunciava.
Muitos outros animais vivem em sociedade, enfrentando situações bastante
complicadas, mas evidente é o fato de que estes, ao contrário dos seres humanos,
são geneticamente forjados a tal situação. As abelhas operárias, por exemplo, não
aprendem suas funções após terem nascido; elas já nascem sabendo ser operárias.
Não há reivindicações de qualquer tipo, pois não há outra forma de ser. Mas é claro
que não acontece dessa forma com os seres humanos. Nascemos como um bloco
de mármore pronto a dar vida a uma bela estátua, mas é o próprio bloco que se
esculpe, e belo ou não vai depender das sociedades, e não somente do indivíduo.
Experimentos desse tipo tem muito a nos incomodar, porque se as pessoas
chegam ao extremo de abrirem mão da clara evidência física, por mais incomodadas
que fiquem, para seguir a opinião da maioria, o que dizer quando vamos às urnas,
onde as evidências não são nem de perto mais simples e objetivas?
Claro está que esse comportamento é completamente não racional, e que,
com alguns outros agravantes, como sempre acontece, um quadro neurótico pode
ser facilmente estabelecido. O quão difícil não deve ser para o indivíduo que tem a
ousadia de não seguir a maioria? Quantos livros não foram escritos, e
brilhantemente escritos, inclusive, para que seus autores não fossem imersos em
psicose? E quantos destes não trouxeram um pouco de conforto, por mais incrível
que pareça, a indivíduos como eles próprios? Poucos se aventuram a serem os
lobos solitários. Mas as ciências humanas estão repletas deles.

1.6 A AGRESSIVIDADE COMO FONTE DO SADISMO E DO MASOQUISMO

A ideia tão incrustada no senso comum de que o mais forte sobrevive não é
mentirosa; apenas não está completa. Ser o macho mais forte é sim uma grande
vantagem, mas somente dentro de um determinado contexto, assim como “falar em
línguas”, em algumas religiões, é um sinal de alto grau de espiritualidade, e não uma
evidência cabal de alguma falha cerebral, mesmo que momentanea. Vários são os
19

atributos que auxiliam os animais, tais como ter o maior chifre, no caso dos
rinocerontes, ou conseguir fazer o melhor ninho, como no caso de alguns pássaros.
Mas é evidente que a agressividade não é uma característica desprezível. Avaliemos
este aspecto e seus desdobramentos na psique humana.
Nas sociedades humanas a agressividade tem perdido espaço
acentuadamente, porém não tem sido descartada totalmente. Com o passar dos
séculos ela tem sido claramente posta em outros trilhos, e as “vias de fato” ainda
acontecem, mas tendem a desaparecer. Grosso modo, o diálogo tem sido praticado
e tem atingido resultados perceptivos e indiscutíveis. Mas e quando o diálogo não
atinge suas finalidades?
Em termos puramente instintuais, podemos considerar um sujeito agressivo
como um sujeito que tem este instinto mais intensamente apresentado do que outros
sujeitos, dentro, é claro, de certos limites. Em termos psicanalíticos, um sujeito
agressivo é um sujeito cujas pulsões agressivas não foram devidamente sublimadas,
ou seja, não tiveram seus alvos apontados a objetos socialmente aceitos. Quando
isso acontece, podemos ter dois sujeitos típicos possíveis: o sujeito sádico, ou o
sujeito masoquista, apesar que estas características andam juntas.
O prazer em causar dor, sadismo, e o prazer em sentir dor, masoquismo, tem
como fonte biológica a agressividade, e como fonte psíquica, a direção da libido. A
libido do sádico está orientada para fora, para algum objeto externo, com o objetivo
de destruí-lo. Já a libido do masoquista está orientada para o próprio corpo, também
com o objetivo de destruí-lo. Importante se torna apontar que a destruição objetivada
por ambas essas orientações libidinais é majoritariamente simbólica. É uma parte da
psíque do sujeito que deseja-se destruir, e como essa destruição não é real, surge
um comportamento de fixação e compulsividade impossível de ser saciado. E temos
aí o surgimento de uma neurose.
Ainda se faz necessário mencionar que apesar dessas duas práticas estarem
intimamente ligadas a comportamentos e práticas sexuais, elas não tem como
objetivo o orgasmo, visto que em muitos homens que praticam tais comportamentos,
em sessões organizadas por casas e profissionais específicos, não há a ereção. Um
excelente exemplo da célebre frase de Oscar Wilde: “tudo tem a ver com sexo,
menos sexo.”
20

1.7 O MEDO INSTINTUAL COMO BASE PARA A ANSIEDADE

Quando nossos antepassados mais longíncuos começaram a se aventurar


por apenas duas pernas, eles eram presas fáceis como quaisquer outras. Mas eles
eram dotados de um comportamento altamente eficaz e útil: reconhecer padrões.
Sendo presas fáceis, com pouquíssimos recursos de defesa disponíveis, alguns
indivíduos acabavam virando presa de alguma outra espécie predadora. Com o
passar do tempo, com o grupo cada vez maior e acumulando mais e mais
experiências desse tipo, começaram a notar, por exemplo, que antes de um colega
ser atacado, ruídos provindos dos arbustos mais próximos eram ouvidos. Aqueles
que passaram a ficar mais alertas a esse tipo de ruído, passaram a evitar os
ataques, ou diminuir suas consequências.
Com o avanço cada vez mais crescente dos primeiros grupos humanos, outro
aspecto característico de nossa espécie entrou em cena: a abstração. Aonde se
localiza o amanhã, por exemplo, que não em nossas mentes? Quando dizemos que
alguém nos deve dinheiro, existe alguma base natural para essa ideia? Não há tal
situação na Natureza: ou se tem algo, ou não. Não há a necessidade de grandes
investigações filosóficas para chegarmos a uma resposta como essa. Mas nas
sociedades humanas o peso das abstrações é muito maior que o peso real das
coisas. Guiamos 99% de nossas vidas com base em abstrações. E é nesse cenário
que o medo entra em cena.
Como há pouco foi dito, o futuro só existe em nossas mentes. Quando um
caçador se depara com um tigre, por exemplo, ele não tem medo do tigre em si,
afinal ele apenas o avistou; o caçador tem sim medo do que o tigre poderá fazer
com ele, caso o alcance. O medo é causado pelas possíveis consequências da
situação. No caso de uma neurótica fóbica, ao se encontrar com um cachorro, ao
dobrar uma esquina, por exemplo, ela não vai se apavorar por causa do cachorro,
mas sim vai se apavorar pelo significado inconsciente que ele tem, que de algum
modo formou-se em sua psique, e que pôde muito bem ter sido aprendido em seus
núcleos sociais. O cachorro pode muito bem nem ter notado a presença da
neurótica, o que impossíbilita qualquer ataque, mas a neurótica ficou congelada na
situação.
Aqui, importante se torna diferenciar o medo da ansiedade, e a diferença é
muito simples: o medo nos faz agir, enquanto a ansiedade, que também pode ser
21

interpretada como o medo de ter medo, nos congela e impede qualquer ação.
Quando o nosso caçador se encontrou com o tigre, ele logo procurou matá-lo ou
fugir dele; duas ações com possíveis bons resultados. Mas nossa fóbica ficou
congelada; simplesmente parada em seu lugar, sem esboçar reação até que alguém
a auxilie.
Vivendo de forma tão abstrata como, inclusive, é altamente influenciado pelas
sociedades, a ansiedade nos castra de maneira fenomenal. Só o imaginar de
alguma possibilidade ruim acontecer, evitamos agir. Não há nenhum problema em
não se arriscar na bolsa de valores, por exemplo, cujo funcionamento é bem pouco
racional quando o estudamos mais de perto, mas é no perder o emprego por agir em
função do medo de perder o emprego que mora o verdadeiro problema. Podemos
notar, então, uma outra característica dos quadros neuróticos: o exagero.
É proposto, de maneira geral, que os nossos instintos, podendo muito bem
ser notados presentes em várias outras espécies, e que por nós são compartilhados
pelos caminhos tortuosos pelos quais se apresenta a “evolução” das espécies, não
se calam, e, nem tão pouco, são deixados de lado pela vida em sociedade, ou pelas
tantas e tão complexas abstrações humanas. Os instintos, na verdade, acabam por
serem soterrados e negligenciados por tantos e tão variados aspectos externos, mas
que nunca se calam, e nunca o farão.
Como todos os indivíduos são diferentes entre si, geneticamente e
socialmente, esse ou aquele instinto pode ser mais ou menos fraco em determinado
indivíduo. Quando essa dose instintual se encontra com outros aspectos da sua
vida, como o país em que nasceu, ou o grupo social a que pertence, tem-se ou não
a caracterização de uma neurose.

1.8 PREGUIÇA, PARALISIA, E OS DESMAIOS: MOVIMENTOS INSTINTUAIS PARA


A FUGA DA REALIDADE

Uma espécie de lei, bastante últi, presente, e importante na Natureza, é a


ideia do menor esforço. O Universo, por um ponto de vista termodinâmico, é um
grande sistema caminhando para o caos, para a desordem. As estrelas estão
morrendo a cada instante; o núcleo da Terra perderá calor até que todo o ferro e o
níquel nele presentes se solidifquem, cessando assim os campos magnéticos que
nos protegem dos raios nocivos vindos do Sol; tudo, enfim, por um prisma
22

termodinâmico, tende a ter a sua entropia incrementada a cada instante. Com a


psique humana, não haveria de ser diferente.
Desmaios, situações estas que abateram o próprio pai da Psicanálise, são um
exemplo dramático, e também drástico, da fuga da realidade. Em muitos dos
programas que mostram a vida selvagem, podemos acompanhar estratégias muito
parecidas com esta. Quantos animais, pertencentes às classificações humanas, não
se fingem de mortos, ou simplesmente, ficam paralisados, mediante a uma grande
ameaça? Respostas automáticas como esta, foram utilizadas por inúmeras outras
espécies antes da nossa; mas não foram por nós esquecidas.
Depois de milênios soterrando nossos instintos com tantas e das mais
variadas pulsões, como discutiremos mais à frente, as ansiedades da vida
contemporânea fazem com que novos desdobramentos instintivos sejam
desenvolvidos para que sejamos protegidos. Somando-se a estas, a condição
natural de equilíbrio, a qual os mais variados sistemas buscam atingir, presenciamos
quadros neuróticos caracterizados pela crescente falta de atividade perante a
realidade. Os quadros depressivos são perfeitos exemplos dessa busca pelo
caminho mais fácil, tanto é que muitos conselhos superficiais, isto é, que não se
orientam por buscar revelar conteúdos inconscientes, se pautam nas mais variadas
atividades físicas. Andar disso ou daquilo, correr aqui ou ali, e dessa ou daquela
forma, são dicas que abarrotam os livros de auto ajuda.
Quando estes instintos estão mais ativos no indivíduo, por razões aqui
consideradas naturais, frutos dos mecanismos da seleção natural, este terá maior
propensão a escolher suas defesas com base nessas características. Infelizmente,
por razões óbvias de serem extraídas de tudo o que já foi exposto até aqui, estes
quadros neuróticos tendem a ser os mais complicados para a Psicanálise, afinal de
contas, nosso método só funciona quando existe, no indivíduo analisado, o mínimo
de atividade progressiva, e a falta desta se torna incrivelmente prejudicial ao
trabalho analítico.
23

CAPÍTULO 2 – DOS INSTINTOS ÀS PULSÕES

Nas primeiras semanas de vida, um bebê se encontra em uma situação muito


parecida com a de um pequeno animal indefeso, totalmente dependente dos
cuidados parentais. Instintivamente falando, o bebê dispõe de pouquíssimos
recursos, e que, mesmo existentes, não lhe garantem uma sobrevida muito longa se
deixado à própria sorte. Com o cérebro ainda em formação, o instinto que mais
podemos perceber agindo nos bebês é a fome. Os gritos que precedem muitas das
mamadas não nos deixam enganar quanto a isso. E esse é terreno fértil para o
surgimento das pulsões.
O cérebro é o órgão das associações. Desde os primeiros instantes, e há
quem diga que estes primeiros instantes se passam ainda durante a gestação, o
cérebro vai construindo ligações; ligações essas que não estavam previstas
geneticamente. Algumas delas “vêm de fábrica” realmente, como se diz
popularmente, e dentre essas podemos citar as instintivas. Quando a fome surge,
por exemplo, surge também o choro, que não é aprendido, ele simplesmente é
realizado, fazendo despertar na mãe o dever de alimentá-lo. Com a mãe, surge o
seio; surgem os primeiros toques no corpo do bebê; surgem também a voz e o
cheiro da mãe; e também é claro, a satisfação. É neste cenário complexo de tantas
sensações sendo percebidas simultaneamente à satisfação, que vão surgindo as
primeiras pulsões (CASTROVELLOSO NETTO, 1999, p. 08).
Enquanto que a fome, um instinto, nos “avisa” que precisamos comer, são as
pulsões que nos “dizem” o que comer. Dessa forma podemos, claramente,
diferenciar as pulsões dos instintos: as pulsões surgem depois dos instintos, não
sendo assim os próprios instintos, e vem antes dos objetos, também não fazendo
parte destes. Para um exemplo claro e bastante direto, temos o crítico gastronômico
do longa de animação Ratatouille, que escolhe o prato vencedor como sendo aquele
que o faz reviver momentos felizes de sua infância. Percebemos aí, sem sombra de
dúvidas, que não foi apenas um instinto sendo satisfeito, mas sim toda uma
configuração psíquica participando da situação e sendo satisfeita.
Ainda nos utilizando do instinto da fome, podemos iluminar um pouco mais
esse conceito tão importante à Psicanálise. Qual de nós que nunca acordou com
fome, mas não conseguiu escolher o que comer de imediato? Qual de nós que
24

nunca se sentiu insatisfeito, mesmo após ter se empanturrado em uma farta


refeição? É claro que razões biológicas podem ser responsáveis parcial ou
totalmente, mas é importante dizer que as pulsões estão sempre ativas e
influenciando a psique. Uma de suas mais importantes características é que elas
não são acessíveis conscientemente. Sua formação e as associações que lhe
fornecem base nos são acessíveis apenas pela investigação psicanalítica. No caso
dos neuróticos, somente acessando esses conteúdos, e, posteriormente, os
resignificando durante o tratamento, é que melhoras podem ser percebidas. Com
essas informações em mente, podemos avançar um pouco mais nesse terreno tão
complexo e desafiador.

2.1 OS INSTINTOS QUE SE FAZEM PULSÕES

Propomos aqui que todos os instintos podem ser base para pulsões, de forma
independente ou coletiva. Podemos considerar, também, que as pulsões são
associações mentais com bases instintivas, ou, de uma forma mais didática, que as
pulsões são associações mentais que se utilizam de moldes instintuais, que são os
próprios instintos, e, importante enunciar, que se distanciam destes quando
formadas.
Uma das grandes descobertas de Darwin foi que, para que novas espécies
fossem capazes de surgir, todo novo indivíduo deveria ser ligeiramente diferente dos
demais (DARWIN, 2010, p. 103). Essas diferenças poderiam ser de diversas ordens,
e mais à frente (DARWIN, 2010, p. 177) é explicado que uma dessas ordens é a
instintual. Ora, para que um pássaro recém nascido expulse seus irmãos do seu
ninho, muitos outros nada fizeram; nem todas as leoas permitem que seus filhotes
sejam assassinados, e nem todos os leões vencedores saem à caça dos filhores do
perdedor. Com o ser humano não seria diferente: filhos criados pelos mesmos pais,
com diferenças mínimas de tempo, inclusive, se apresentam adultos totalmente
diferentes, encarando experiências comuns de formas bem diversificadas.
O que se busca expor com essas explicações biológicas é que cada um dos
nossos instintos se apresenta diferentemente em cada um de nós, acarretando
assim que o alívio da ansiedade ou quaisquer outras tensões se dará por meio de
pulsões dessa ou daquela espécie. Se assim não fosse, só existiria um tipo único de
neurose, e o trabalho dos psicanalistas seria muito mais simples.
25

Se um indivíduo tiver seu instinto sexual já naturalmente acima da média, por


exemplo, este poderá não resolver seu Édipo de forma satisfatória, e ter, na vida
adulta, desenvolvido uma neurose. Este instinto pode ter sido tão intenso que as
pulsões dele formadas se mantenham igualmente fortes e presentes na vida adulta.
Terá se formado, então, uma espécie de nó difícil de ser desatado que, por exemplo,
impeça sua libido de ser direcionada a outro objeto que não a sua mãe. Ilusório, e
errôneo, seria acreditar que esse instinto terá sido o único responsável por este
quadro neurótico. Para que uma neurose tenha se estabelecido, não basta ter este
ou aquele instinto, nessa ou naquela intensidade, mas também é necessário um
ambiente propício para que as pulsões moldadas nesse instinto sejam de caráter
mais favorável ao bem estar do indivíduo.
Vejamos agora um indivíduo que apresente uma agressividade exarcebada.
Frente à situações de grande ansiedade, nas quais, por exemplo, conteúdos que
devam ser impedidos de se tornarem conscientes, por essa ou aquela razão moral,
devam permanecer reprimidos, o sujeito pode ser agressivo com o próprio corpo. O
sujeito pode se ferir, dessa ou daquela maneira, de forma que a dor física abafe a
dor psíquica.
Para um indivíduo cujas pulsões predominates tenham se formado moldadas
à fome, a ansiedade será temporariamente suprimida pelo ato de comer; ao
indivíduo cujo um número suficientemente grande de pulsões tenham como molde o
instinto acumulativo discutido anteriormente, seu ego se protegerá com o acúmulo
de objetos ou de ações; aos de medo exacerbado, racionalizações das mais
diversas terão protegido o indivíduo de todos os males, prováveis ou improváveis.

2.2 COMO OS INSTINTOS FORMAM PULSÕES?

Nas primeiras linhas da citação presente no início desta monografia, “No


Princípio era o Instinto, e este, mais o Verbo, se fez Pulsão”, foi baseada em um
importante aspecto presente na ontologia dos seres humanos, com um dos mais
importantes conceitos do cristianismo, que busca explicar o início de tudo que se
tem conhecimento, inclusive do próprio Deus. A citação cristã é a seguinte: “No
princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era Deus” (João
1:1), e pode ser encontrada em qualquer bíblia atual, com uma ou outra alteração
em palavras, mas não em seu sentido.
26

A resposta à pergunta proposta no título deste item, ainda se encontra antes


um pouco do “Verbo”, ou seja, antes um pouco da línguagem. Como já foi dito
anteriormente, o cérebro é o órgão das associações, e estas tem início muito antes
do bebê aprender qualquer forma de linguagem, que não a puramente instintual.
Para que a resposta seja a mais clara e organizada possível, ela será baseada nas
fases de desenvolvimento da organização sexual, presentes nos estudos freudianos
da obra Três Ensaios sobre a Sexualidade (FREUD, 1969, p. 186).
Aprendemos com Freud que a maturação sexual humana se dá em três
momentos distintos, para se manter em um quarto momento, até a morte do
indivíduo. No primeiro momento, a fase oral, o bebê conhece o mundo através da
sua boca. Assim que consegue controlar melhor seus bracinhos, seus pais tem que
tomar o maior cuidado possível para que ele não entre em sérios apuros, pois todo o
objeto acessível pode se tornar motivo para grandes problemas. Com o passar dos
“nãos” e dos tapinhas nas mãos, o pequeno cérebro começa a associar, entre outras
sensações, o incômodo nas mãos e os “nãos” nos ouvidos. Podemos dizer que aí se
fixam as primeiras pulsões: os Instintos encontram o Verbo.
Já na segunda fase, a anal, o pequeno já tem maior controle do seu corpo, e
começa a ensaiar aventuras pelos cômodos da casa. Sem controle da produção e
expulsão de seus dejetos fisiológicos, o pequeno aventureiro se vê interrompido
diversas vezes com gritos estridentes e severas broncas, ao notar que algo não
deveria estar tão molhado assim, e nem com um cheiro tão forte e repugnante.
Conforme as indicações dos pais, o bebê começa a aprender que fazer suas
necessidades nos devidos lugares é bom, e que o controle dessas funções, desses
esfincteres, passa a ser grandemente recompensado. Com esses novos hábitos,
reter coisas, que mais tarde passarão a ser palavras e pensamentos, o pequeno
aprende que controlar é bom, e pulsões desse tipo vão se formando, ganhando mais
peso ainda, principalmente, com as gratificações vocativas dos pais.
Na terceira fase, a fálica, outras sensações passam a estar presentes na
psique em formação da criança. Estas sensações começam a se organizar nas
zonas erógenas mais comuns aos adultos. O garotinho percebe ser mais parecido
com o pai do que com a mãe, e o inverso acontece com a garotinha. Nesta fase, a
latência dos instintos sexuais começa a se fazer permanente, e, se tudo correu
como o esperado, o Complexo de Édipo encontra seu fim. Ainda nesta fase, a
linguagem começa a ganhar enorme peso na vida psíquica da criança, peso este
27

que durará pelo resto da vida do adulto. Os instintos como a fome, o medo, e o nojo,
começam a ser justificados de maneira mais clara, além de terem suas
características bem identificadas.
Por fim, do final da adolescência à vida adulta, entramos na fase de latência.
Aqui, a escolha do parceiro mais agradável já está bem encaminhada, se não
consolidada. É nesta fase que os paradigmas morais atuais, que cercam o indivíduo,
se tornarão importantíssimos para uma vida adulta saudável. Por mais que as
sociedades pós-modernas aparentam ser bem mais liberais que as sociedades
anteriores, as ideias de bom e ruim, certo e errado, e “isso pode e aquilo não”, ainda
tendem a seguir o padrão mais clássico, vivenciado por Freud. Além dos aspectos
sexuais desta fase, importantes também são os aspectos sociais da vida adulta. Se
o indivíduo teve uma boa solução no Complexo de Castração, por exemplo,
entendendo que o pai é a figura de maior autoridade, ele terá menores resistências a
aceitar as leis e normas vindas do mundo exterior além do seio familiar, e será mais
difícil mergulhar na delinquência. Ele será um indivíduo mais funcional e mais
benéfico à sociedade como um todo.
Importante se faz mencionar que, ao contrário do que se pensa, cada fase
superada deixa remanescências. Como o próprio Freud o fez, a comparação da
psique humana a uma cidade é incrivelmente clara e didática. Ao nos deslocarmos
pelas cidades, nos deparamos com prédios recém construídos, tendo ao lado casas
com décadas de idade; podemos nos utilizar de estações de metrô recentes para
apreciarmos um espetáculo em um teatro centenário; e podemos, ainda, perceber
que existem bairros inteiros mais modernos e com suas ruas e avenidas distribuídas
de forma diferente de outros bairros mais antigos. Acontece o mesmo com a psique
humana: comportamentos infantis recheiam, e até dão mais vida, às relações
amorosas adultas; comportamentos que há muito não se expunham, o são em
situações de crise, e mais incontáveis exemplos que se fazem desnecessários neste
momento.
Buscando responder à pergunta título deste item, e nos utilizando dos últimos
parágrafos e exemplos, podemos perceber que os instintos vão ganhando, ao longo
do maturamento sexual do indvíduo, representantes na linguagem, como acontece
com as palavras “fome” e “medo”, e quaisquer outras que nos remetem a ideia de
um instinto. Mas o que acontece com as pulsões é um pouco mais complicado
porque, como já foi mencionado, um ou mais instintos podem estar presentes em
28

uma única pulsão. Por isso, podemos chegar a uma conclusão, em resposta à nossa
pergunta inicial: os instintos formam pulsões quando conseguem um representante
linguístico, ou seja, uma pulsão é um representante dos instintos.
29

CAPÍTULO 3 – DAS PULSÕES ÀS NEUROSES

Depois de termos entendido de uma forma suficientemente aceitável como


somos influenciados por instintos milenares ainda presentes em nossas psiques, e
também como estes instintos são intermediados pelas nossas mais diversas e
complexas pulsões, podemos então nos debruçar sobre as causas que levam as
pessoas a se tornarem consulentes de psicanalistas ao redor do mundo.
Todos nascemos puramente id, selvagens, egoístas, buscando sempre o
prazer próprio, e procurando evitar a todo o custo o desprazer. Mas a vida em
sociedade requer que esses instintos sejam neutralizados, amansados, ou até
mesmo estirpados dos indivíduos. Ao longo de nossas vidas, aprendemos que isso
não acontece facilmente, e que, ao contrário do que desejamos, requer que muitos
aspectos sejam satisfeitos para podermos considerar que um amansamento
instintual seja considerado suficiente e funcional.
Para prosseguirmos nos nossos estudos, precisamos, primeiramente, definir o
que representa o termo “neurose”. O já mencionado dicionário define o termo da
seguinte maneira: perturbação mental que não compromete as funções essenciais
da personalidade, mantendo o paciente [em] penosa consciência de seu estado
(FERREIRA, 1983, p. 309). Esta definição não está longe da verdade, mas ainda lhe
falta a origem desta perturbação mental, e é sobre esta que Freud baseou todo seu
método. Reunindo a origem freudiana com esta definição comum, podemos dizer
que uma neurose é uma perturbação mental que não compromete as funções
essenciais da personalidade, mantendo o paciente em penosa consciência de seu
estado, sendo causada por conteúdos recalcados da vida psicossexual (FREUD,
1969, p. 19).
Ainda nos apoiando nos sintomas da jovem Dora, analisada há quase um
século atrás, ainda que brevemente, não podemos nos esquecer dos sintomas
físicos pelos quais uma neurose pode também se apresentar. É muito comum que
os médicos de hoje não se acanhem em adicionar o sufixo “de fundo emocional” à
quadros já diagnosticados, mas que não tem a causa orgânica relacionada.
Gastroenterites, dores de cabeça, fraquesas nos membros, sem falar da não
capacidade de ingerir certos alimentos, e tão pouco dos famosos desmaios. Quando
não se descobre a causa orgânica desses sintomas, dizem ao paciente “de fundo
30

emocional”. Infelizmente, para o paciente, eles apenas indicam remédios e sugerem


novos hábitos para acabar com os sintomas desagradáveis, e dão o caso por
encerrado. Mas quando ou o paciente, ou o médico, possuem uma sensibilidade um
pouco acima da média, logo procuram a ajuda de um profissional especialista nas
características psíquicas do ser humano: um psicanalista ou um psicólogo. Sendo
assim, podemos adicionar mais uma característica à nossa definição anterior de
neurose: perturbação mental ou física, sem causa orgânica diagnosticada, que não
compromete as funções essenciais da personalidade, mantendo o paciente em
penosa consciência de seu estado, sendo causada por conteúdos recalcados da
vida psicossexual. Neste momento, esta definição nos será mais que suficiente.
Assim como quando interpretamos os sonhos de um paciente, dividindo-os
em partes menores, obtendo assim mais informações sobre a constituição psíquica
do indivíduo e de seus núcleos neuróticos, podemos segmentar a supracitada
definição em duas partes: “perturbação mental ou física, sem causa orgânica
diagnosticada, que não compromete as funções essenciais da personalidade,
mantendo o paciente em penosa consciência de seu estado”, e “causada por
conteúdos recalcados da vida psicossexual”. Em relação à essa definição aqui
segmentada, e a quaisquer outras possíveis de serem enunciadas, maiores
reflexões acerca da sociedade à qual o indivíduo em questão está inserido se fazem
necessárias, o que faremos a seguir.

3.1 FONTES E ABAFAMENTOS MORAIS DAS NEUROSES

É neste momento que uma divisão entre os conhecimentos biológicos e


psicanalíticos se faz, não apenas necessária, mais crucial às nossas necessidades
reflexivas. O ser humano há muito deixou de ser apenas o homo sapiens sapiens, e
este primeiro sobrepujou este segundo de uma forma gritante e permanente, ao
menos, é claro, quando uma neurose não “resolve” surgir. O homo sapiens sapiens
surgiu sim, sem sombras de dúvida, como fruto de modificações sussessivas que
aconteceram a espécies a ela anteriores, mas ainda muito se faz perceber.
A história do Homem como tal, com suas mais disversificadas línguagens,
suas mais variadas descobertas científicas, e com suas mais persistentes falhas,
data de muitos milênios atrás. Desde as primeiras tábuas contendo algum tipo de
símbolos comunicativos, aos primeiros sofistas de Atenas, é evidente, mesmo ao
31

mais desinteressado dos indivíduos, que as sociedades humanas veem mudando, e


o fazem com espantosa rapidez. O que era abominável há poucas décadas atrás,
como o divórcio, por exemplo, hoje é prática comum e até incentivada em alguns
casos. As antigas “perverções orais” freudianas, Freud (1969), hoje se fazem
presentes nas relações mais superficiais possíveis de se dar, principalmente entre
os mais jovens, e a sua falta gera mais problemas do que a sua prática. Em suma:
culpar as pulsões, instintos, ou quaisquer outras características individuais, como a
origem das neuroses somente, é um erro grosseiro, que não deve mais ser
cometido. Fatores sociais, por tanto, se fazem incrivelmente presentes na formação
das neuroses.
Digamos que, nos aproveitando do exemplo anteriormente exposto, uma
mulher resolva não mais tolerar as escapadelas do marido, e decida pôr um fim na
relação. Nosso cenário se monta há décadas atrás, no início do século, digamos.
Encontrar meios para tal investida já lhe seria muito difícil, mas, para fins didáticos, a
mulher consegue pôr um fim oficial ao seu casamento. É aí que se inicia o seu
calvário moral. Quando a notícia se espalha pelas redondezas, o dono da mercearia,
seus mais próximos conhecidos, seus familiares, e até mesmo o padre da paróquia,
começam a olhá-la com outros olhos. Não poucas vezes, ela percebe cochicos em
sua direção; nota que pessoas mudam de lado da calçada ao estarem seguindo em
sua direção; e ao longo dos meses, sua condição psíquica vai se modificando para
pior, e de forma acentuada. Passa a comer pouco, mal sai da cama, e seus cuidados
de higiene, outrora dignos de uma mulher da realeza mais anterior, passam a ser
nulos. Quadro atual: uma neurose depressiva.
Enquanto isso, o recém divorciado continua sua vida, sem encarar grandes
mudanças. Em seus pensamentos, sua antiga esposa é que falhou em não
satisfazê-lo sexualmente. Ela quem deveria estar sempre disponível para satisfazer
seu caprichos sexuais, os quais, ao longo dos anos, foram ficando cada vez mais
estranhos e custosos à esposa. Mas como à sua época uma esposa deve ser quase
completamente subimissa aos desejos do marido, ele não fazia nada além dos seus
direitos como homem.
Com o exemplo anterior, que pode muito bem ser identificado nessa ou
naquela novela de época, sintomas pervertidos do homem são abafados pela moral
atuante. Enquanto isso, uma mulher psiquicamente normal, apenas cansada de
suas obrigações matrimoniais, decide acabar com o seu sofrimento e é golpeada
32

duramente pelos representantes da moral atuante, e desaba em um quadro


neurótico. No primeiro caso, sintomas neuróticos são abafados pela moral; no outro,
são produzidos.

3.2 UMA NEUROSE COMO O RESULTADO DE UMA DISPUTA ENTRE ESPÉCIES


QUE DIVIDEM UMA MESMA PSIQUE

Como já foi dito no início deste capítulo, o Homem deixou de ser o que era há
muitos milênios, mas é claro que não totalmente; não se anula milhares de milênios
de instintos sem nenhum vestígio. Obivamente, os instintos primordiais, estes no
sentido mais fiel do termo, não foram esquecidos; foram apenas soterrados pela
cultura, pela linguagem, e pela socialização. Mas, em alguns momentos, clamam por
serem ouvidos e reclamam o espaço perdido.
Quando sonhamos, retornamos, mesmo que por alguns minutos, imersos em
uma narrativa caótica, mas não aleatória, àquele estado primordial, no qual tudo nos
pertencia por direito. Naquela encenação onírica, onde todos os atores e objetos são
preenchidos por nossos próprios aspectos, buscamos satisfazer nossos desejos
mais primevos, apenas para não acordarmos imersos em grande ansiedade. O
desejo de vingança aos colegas de classe; o medo de fazermos mal aos nossos
mais próximos; a vontade de atingirmos a liberdade moral de não cuidarmos deste
ou daquele parente; enfim, todos os desejos podem ser, e possivelmente serão,
satisfeitos nesse período tão valioso de desacordo à realidade.
Quando bem interpretado, um sonho pode se tornar uma incrível ferramenta
de revelação pessoal. O sonhador pode passar a encarar um lado de sua psique
que nunca havia olhado antes, ou, pode passa a encarar certos conteúdos com
outros olhos, por outro ponto de vista. Dessa forma, aquele animal irracional,
completamente desrespeitoso à “moral e aos bons costumes”, começa a deixar de
ser um monstro assustador e passa a ser um aspecto próprio, um aspecto seu, que,
claro, precisa ser ouvido com mais atenção, e que também precisa ser observado
mais cautelosamente. A sua influência negativa passa a ser resignificada, e uma
maior ego-sintonia pode ser promovida.
Esse cenário positivo não é facilmente alcançado. Por mais incrível que
pareça, o principal obstáculo a esse avanço é o próprio ego a ser salvo. As defesas
deste último não cederão facilmente à irracionalidade do homo sapiens sapiens.
33

Muitos são os fatores que podem favorecer este desequilíbrio, mesmo que um certo
equilíbrio já tenha sido alcançado. Qualquer golpe do mundo real pode pôr a perder
todo o avanço conquistado, ou pode instaurar um novo estado de crise, como se
nenhum avanço jamais tivera sido conseguido. Quando isso acontece, a batalha
dessas duas espécies se inicia novamente, e o trabalho do psicanalista volta a ser
requisitado.

3.3 UMA NEUROSE COMO O RESULTADO DE UMA DISPUTA INSTINTO-


PULSIONAL

O filósofo escocês David Hume, que viveu e escreveu durante a primeira


metade do século XVIII, quase dois séculos antes de Freud, escreve, em seu
completo Tratado da Natureza Humana, que a razão não passa de uma escrava das
paixões, e que não pode, tão pouco, aspirar ser outra coisa (HUME, 2000, p. 448).
Para este autor, ao longo de todo este seu tratado, paixões e emoções estão muito
próximas aos nossos instintos e pulsões. Podemos, sem medo de errar, interpretá-
las como tal. Se Hume tivesse conhecido a teoria das pulsões, teria lhe aderido sem
hesitar.
Hume argumenta, em prol de sua tese, que a razão, ou seja: a capacidade de
ponderar, escolher, deliberar, não tem poder de ação por si mesma. Esta definição
do termo “razão” é praticamente identica à nossa, que pode ser encontrada no mais
básico dos dicionários (FERREIRA, 1983, p. 309). O autor continua suas reflexões e
nos mostra um ponto de vista bastante fecundo à teoria e prática psicanalíticas, que
pode ser exposto da seguinte forma: uma escolha não pode, em hipótese alguma,
ter sido racional, pois sendo a razão uma escrava dos instintos e das pulsões, quem
tomou a decisão foi uma dessas últimas, vencedora por sua vez, de uma disputa
anterior. Coube à razão apenas justificar a escolha do vencedor, pois escolher de
fato esteve, e sempre estará, fora do seu alcance.
O que torna essa reflexão tão importante à prática psicanalista é o fato dela
demonstrar, mesmo de forma um tanto quanto indireta, o absurdo de certos
comportamentos humanos. Não é absurdo um indivíduo pensar que, por exemplo,
um frasco de condicionador comum irá iniciar um incêndio, se esquecido no
banheiro de um clube? E o que dizer de um outro que, mesmo arriscando seu
emprego e liberdade, não consegue resistir a impulsos sexuais indevidos? Evidente
34

que nem todas as neuroses se apresentam com tal grau de complexidade e


intensidade. Boa parte delas é percebida, ao longo de anos, como aquele incômodo,
semelhante à suspeita de um dos oficiais do príncipe Hamlet, quando pronuncia a
famosa frase “Há alguma coisa podre no reino da Dinamarca” (SHAKESPEAR,
2010, p. 37). Nada mais contrário ao homem racional.

3.4 UMA NEUROSE COMO UM ENCAIXE PULSIONAL

No item anterior, trouxemos à baila um ponto de vista bastante pertinente à


prática psicanalítica, mas o fizemos num cenário mais negativo. Apesar de
continuarmos a falar das neuroses, este novo ponto de vista é mais brando, sem
deixar de lado a pertinência. Uma vez mais, as diferenças entre as pulsões e os
instintos ficarão evidentes, e, somando-se um contexto neurótico, sua influência na
psique humana será comprovada.
Precisamos nos lembrar que o ser humano nasce id, e após ter o seu
superego formado, se torna social e civilizado. Quando nossa idade atinge os dois
dígitos numéricos, todo o nosso caráter está formado, e quaisquer deficiências
estruturais já não mais terão chances de correção, mas sua influência pode, com
paciência e esforço da dupla analista e analisando, ser aplacada em concordância
com a vida do analisando. É com esses dois dígitos que os instintos já foram mais
do que soterrados pelas pulsões, e estas sim são dinâmicas e podem ser mais
“facilmente” modificadas. Se assim não fosse os psicanalistas não o seriam, e
seriam quaisquer outros tipos de terapeutas.
Nossas pulsões vão guiando nossas vidas, por assim dizer, se manifestando
nas mais diversas, e até, surpreendentes escolhas. Muitas pessoas tem a peculiar
característica de pesquisar e pesquisar itens, tomando um tempo bastante
significativo de seus passeios, sejam estes itens vestimentas ou utensilhos, e por fim
nada comprarem. Mas em algum outro momento, geralmente com o seu foco em
outro assunto, sentem aquele par de sapatos, por exemplo, clamarem por sua
atenção, e, sem perder nem a milésima parte do tempo perdido no momento
anterior, acabam comprando. O que aconteceu neste momento? Quais as
diferenças? E o que as pulsões tem a ver com isso?
Essas perguntas podem ser respondidas da seguinte forma: o item comprado
se encaixou às pulsões do indivíduo, e essa escolha lhe foi irresistível. É que claro
35

que nem todas as compras são realizadas desta forma, mas àqueles mais
pacientes, que aprenderam a respeitar essa peculiar característica de sua própria
psique, mesmo que não se dirijam a esta nesses termos, são reservadas menos
dores de cabeça com um item que, ou não será usado, ou o será de má vontade,
como diz o didato, ou será alvo de trocas e estresse. E o que isso tem a ver com as
neuroses? Nossas escolhas podem ser divididas em dois grandes grupos: o grupo
das escolhas pulsionais, e o grupo das escolhas racionais. Começaremos nossa
análise com este último grupo.
Uma escolha racional pode ser considerada aquela que reuniu uma porção de
opções, com suas respectivas características positivas e negativas, e que, após um
estudo racional, fez surgir a opção mais adequada às necessidades e objetivos
contingentes. Este é o tipo de escolha que a maioria das pessoas pensa ter, sem se
dar conta de que todas essas características, por exemplo, vem corroborar a opção
já escolhida, como já nos mostrou David Hume.
Uma escolha pulsional, por sua vez, não passa por esse processo. O fulano
apenas avistou o par de sapatos do nosso exemplo, por pouquíssimo tempo, mas as
justificativas racionais não tiveram tempo de atuar. Neste caso, por tanto, quem
escolheu o par de sapatos foi o conjunto de pulsões atuantes naquele indivíduo, e
estas, como já foi dito, dependem unicamente da história e da idiossincrasia deste
indivíduo em particular.
Finalmente temos condições de somar conceitos e responder àquela nossa
última pergunta. Uma neurose pode ser identificada como uma escolha pulsional
irresistível ao indivíduo, e esta escolha só cessa sua atuação quando as pulsões por
ela responsáveis são, de alguma forma, modificadas. Claro que em sujeitos normais,
como diria Freud no seu artigo Análise Terminável e Interminável (FREUD, 1969, p.
238), essas pulsões sofrem as modificações necessárias de forma natural e sem
maiores dificuldades; mas já em um indivíduo neurótico, a ajuda de um psicanalista
se faz fundamental.
A jovem que sempre escolhe o mesmo tipo de namorado; o homem que não
consegue se manter em um mesmo emprego por muito tempo; aquela pessoa que
sempre tem o mesmo olhar sobre as coisas; são exemplos deste último tipo de
indivíduo. Outro exemplo que não poderia deixar de ser citado, e este exclusivo das
sociedades pós-modernas e de suas tecnologias digitais de comunicação, é o uso
desregrado e difundido dos chamados emoticons, muito comuns nas redes sociais e
36

meios de comunicação pessoais. Cada pequena carinha daquelas, e vamos nos


basear aqui somente nos emoticons que buscam representar emoções humanas,
deixando de lado os que representam objetos reais, se torna muito útil à
comunicação dos usuários, pois informa certas emoções em um nível inconsciente,
portanto pulsional, que escapa à racionalidade do discurso convencional. Quando
“faltam as palavras” para expressar um sentimento qualquer, sobram as pulsões,
traduzidas para a pós-modernidade por pequenas carinhas amarelas.

3.5 OS ASPECTOS NEUROTISANTES DA PÓS-MODERNIDADE

Infelizmente, quando jogamos nossas lentes reflexivas às sociedades da


então chamada pós-modernidade, passamos a enxergar não só os pontos positivos,
mas o negativos também. Até aí, nada que já não tenhamos feito com outras épocas
e sociedades, mas alguns aspectos contemporâneos são bastante preocupantes.
Vamos nos focar em três: a individualização excessiva, a corrida contra o tempo, e a
falta de privacidade. Toda elas, é claro, favorecem o surgimento de quadros
neuróticos.

3.5.1 A individualização excessiva

O primeiro desses aspectos, nos é importante pois facilita o


sobrecarregamento dos indivíduos, e os fazem acreditar que eles, e somente eles,
detém toda a responsabilidade do que acontece nas suas vidas, e também os fazem
acreditar que eles são o problema, e não também as contingências circundantes.
Não devemos pensar, em hipótese alguma, que a Psicanálise retira do indivíduo
uma parcela de responsabilidade sobre as mazelas que lhe acometem, mas deixa
bem claro que esta não é a única.
É muito comum acompanharmos o surgimento de novos distúrbios mentais ao
longo dos anos, mas o que tem acontecido neste cenário atual chega a ser
assombroso. “Síndrome de Cotard”, nome que se dá às pessoas que acreditam já
terem morrido; “Síndrome de Capgras”, que define os que acreditam que uma
pessoa próxima foi substituída por um impostor idêntico; e “mutismo seletivo”, que
faz com que o indivíduo só converse quando, e com quem, desejar (Soares, 9
transtornos mentais que você provavelmente não conhecia), são alguns dos
37

exemplos desses novos distúrbios. Os mais sensíveis e atentos, para os quais


algumas dessas descrições se tornariam até cômicas, logo perceberão que o real
perigo é a disseminação de uma falácia que se esquece da história do indivíduo, seu
cenário social atual, e dos possíveis problemas que sua sociedade fomenta. As
discussões sobre as premissas éticas e sociais daquela época são abafadas, e a
culpa recai, total e esclusivamente, sobre os indivíduos.

3.5.2 Uma corrida contra o Tempo

O Tempo sempre gerou, e vai continuar gerando, discussões


interessantíssimas. Desde Aristóteles, vinte e cinco séculos atrás, até John
McTaggart, pouco menos de um, os homens não concordam muito na natureza do
tempo, ou, se quer, se ele existe de fato. Mas parece que nunca tivemos tanta
certeza do que é o Tempo, pois todos estamos muito preocupados em não
desperdiçá-lo.
Claro que todos sabemos que nossas vidas, por mais que durem, tem uma
duração finita, e que, em algum momento futuro, terão um fim, mas o grau de
preocupação com esse futuro próximo, e cada vez menor, é assustador. Uma pressa
excessiva, de querer tudo “pra ontem”, como se diz nas grandes empresas, e em
algumas famílias, está gerando um sentimento de perda muito prejudicial. A
individualização excessiva, já mencionada, pode ser interpretada como um
desdobramente deste aspecto. Sem tempo para ser desperdiçado, vamos nos
impondo cada vez mais metas, e com prazos cada vez menores. Em frente a esse
cenário, escolhas vão surgindo, sem maiores reflexões, e os indivíduos vão se
esquecendo de que não vivem sozinhos no mundo, e vão optando por uma vida
mais individual, e, pretensamente, melhor realizada. Com isso, o número de solteiros
aumenta, e o número de núcleos familiares propriamente ditos tende a diminuir
(Nanô, Percentual de solteiros supera o de casados, mas há mais pessoas em união
conjugal, aponta IBGE).
Somando-se a esse quadro a ideia de vida bem suscedida, estamos criando
um cenário perfeito para isolamento social, falta de interesse real nas pessoas, e um
aumento na incidência de suicídios, principalmente nos paízes mais desenvolvidos.
38

3.5.3 A Falta de Privacidade

Pode parecer estranha a ideia de que o aumento da individualização das


sociedades possa garantir cada vez menos privacidade, mas é o que parece. Com
cada vez menos tempo a perder, somos influenciados a acreditar que precisamos
saber sobre tudo, e a todo o momento, como se um acidente de trânsito na Índia
pudesse influenciar, significativamente, o rumo de nossas vidas. Com os nossos
smartphones, conectados 24 horas por dia na internet, recebemos mensagens de
todos os nossos conhecidos, e estamos conseguindo, cada vez menos, nos
conectar com nós mesmos, o que ajuda, e muito, o surgimento, ou agravamento, de
quadros neuróticos.
A este fato, podemos somar a “morte de Deus”, já anunciada por Nietzsche
(2011), já há mais de um século atrás, para entendermos melhor o que está nos
acontecendo. Nossas referências morais estão perdendo espaço, e cada vez mais
rápido, para os nossos códigos de leis. Já que não há mais deuses, e que ninguém
nos observa de fora, voltamos nossos olhos para o outro, que vai se tornando cada
vez mais ameaçador. Nossa moral está sendo substituída pelas nossas éticas.
Um outro fato curioso, que pode ser percebido por qualquer pessoa que saia
o mínimo de casa, é a proliferação de igrejas. Em qualquer salão que comporte
umas vinte cadeiras, já se instala um púlpito, e um pastor, lendo a Bíblia
fervorosamente, prega a palavra de Deus. Mas não acabamos de citar a morte dos
deuses, e a substituição da moral pela ética dos mais variados códigos? Sim, mas
quando cada quarteirão tem a sua própria idéia da palavra divina, temos esta
palavra cada vez mais relativisada, e, por tanto, cada vez mais eticalizada. Não é à
toa que está se tornando um diferencial, entre as escolas particulares de todo o
mundo, a presença de câmeras de segurança, não só nos corredores, mas dentro
das salas de aula. Infelizmente, como a moral está cada vez mais falha, é melhor
saber o que eles estão fazendo.
Percebemos de imediato que o assunto merece mais espaço, para ser melhor
debatido e observado, mas podemos adiantar, sem medo de grandes erros, o
seguinte: com essas câmeras, lá se vai a nossa privacidade; com a falta de
privacidade, cada vez mais longe estará o hábito de ficarmos um pouco mais
sozinhos; com a perda deste hábito, as neuroses estarão com as portas abertas, e
com o convite em mãos, para muito nos prejudicar.
39

CAPÍTULO 4 – DAS NEUROSES À CURA

A idéia de cura na Psicanálise é, e continuará sendo, uma idéia bastante


polêmica e controversa, tanto que muitos psicanalistas se esquivam, inclusive, da
utilização do próprio termo em questão. Diferente não poderia ser com uma ciência,
ou método científico, que lida com o ineditismo e complexidade das relações
humanas. Mas abandonarmos uma ideia de cura seria muito, no mínimo, precoce de
nossa parte, haja vista que as pessoas que buscam a Psicanálise, por menos que
saibam sobre a técnica inicialmente, a buscam com o objetivo franco de melhorar
sua qualidade de vida, se livrando de algum incômodo. Se a Psicanálise não tivesse
como alvo uma ideia de cura, por mais peculiar que possa soar, como veremos a
seguir, de nada serviria. O século que nos separa dos primeiros casos analisados
por Freud e seus dissípulos provam esse objetivo.
O próprio Freud, no já mencionado artigo Análise Terminável e Interminável, é
honesto em admitir, sem deixar de lado a ironia, que uma análise termina quando o
analista e o analisando não mais se encontram (FREUD, 1969, p. 232). Claro que o
mestre de Viena não nos dá tão pouco acerca do presente assunto. Ele vai além e,
com sua clareza característica e digna de nota, na mesma página menciona acima,
inclusive, nos dá estas valiosas informações: os encontros podem ser interrompidos
quando os sintomas que trouxeram o indivíduo ao divã já não mais o prejudicam, ou,
quando tanto material inconsciente foi trazido à tona, e tanto já foi conversado,
analisado, e explicado, que o analista julga que nada além poderá ser revelado.
Frente a estes pontos de vista, podemos seguir em frente com as nossas
reflexões sobre um assunto que, o que tem de complexo e controverso, tem de
importante, fundamental, e prático.

4.1 O CONFLITO COM AS OUTRAS CIÊNCIAS

Desde que a prática psicanálitica surgiu, ela tem sofrido agressões filosóficas
de todos os lados, e estas já se iniciavam nas reuniões com os ainda não
dissidentes de Freud, como Adler e Jung. Não mais brandas são as de hoje, com o
crescente número de especializações, e nem menos relevantes. O problema já
40

começa com o fato da Psicanálise tratar de conteúdos inconscientes, pois o próprio


inconsciente é tema de infindáveis debates.
Via de regra, ao receber em seu consultório um novo futuro paciente, o
psicanalista deve ter em mente que terá que tornar consciente conteúdos então
inconscientes. Tudo o que é dito no decorrer de uma sessão pode ser um sintoma
do algo que perturba o paciente. Uma das grandes contribuições da Psicanálise,
como uma filosofia prática, aos estudos do ser humano, é que todo comportamento
humano tem um lastro inconsciente. Quando nos debruçamos numa obra literária,
por exemplo, depois de termos um pouco mais de contato com a vida do autor,
quando possível, e com a época e sociedade na qual ele esteve inserido,
começamos a perceber melhor as razões da sua obra ser como é. O próprio Freud,
por ter nascido em família de origem judia, aprendeu que os sonhos não eram meros
conjuntos de imagens, um tanto quanto caóticas, que preenchiam nossas noites de
sono. Como estão presentes em vários locais das escrituras sagradas judaico
cristãs, que ainda hoje influenciam enormente o imaginário ocidental, podemos
afirmar que se Freud tivesse nascido em um outro contexto social, ele não teria
aprimorado seus estudos sobre a psíque humana. É aqui que as diferenças com as
outras ciências começam a ficar mais evidentes.
Seguindo com o mesmo exemplo anterior, podemos imaginar que qualquer
outro nascido judeu, mesmo inserido em um cenário social exatamente igual ao
“freudiano”, não teria produzido tanto quanto ele produziu. E por quê? Porque
nenhum ser humano é exatamente igual ao outro, e que, entre nossas orelhas, está
uma forma de ver o mundo, independentemente de todo o resto, totalmente única.
As ciências convencionais não podem tolerar tal comportamento de seus objetos de
estudo, por isso soterram a Psicanálise com suas críticas. Uma pergunta, então, não
pode deixar de surgir, e tão pouco de ser respondida: como um psicanalista pode
saber, então, que está orientando suas sessões para um caminho favorável ao
paciente? A resposta nos foi dada há mais de cem anos atrás, quando o marco zero
da Psicanálise surge: pela correta interpretação dos sonhos.
Os sonhos são caóticos, a grande maioria não volta a se repetir, e expõem
suas mensagens em uma linguagem única, peculiar a cada sonhador. Cada um de
nós, oniricamente, já nasce um grande artista, com estilo e linguagem próprios. Para
muitos ramos das ciências, e também das filosofias, os sonhos não passam de
construções mentais aleatórias e sem sentido algum, mas Freud demonstra, no seu
41

belo trabalho A Intepretação dos Sonhos, que os sonhos, após sua correta
interpretação, revelam sobre o sonhodar muito mais do que este julgava existir, e,
não poucas vezes, do que gostaria de admitir. Uma outra pergunta surge, e esta
com resposta mais complexa que a anterior: como saber, então, se cada um de nós
é um sonhador único, possuindo seu próprio dicionário onírico, que a interpretação
está correta?
Quando um psicanalista chega a uma interpretação, que pode ter-lhe tomado
um tempo enorme de reflexões, ele deve, respeitando sempre o tempo do sonhador,
informar para qual direção sua psique está se direcionando; e aqui começamos a
responder nossa pergunta. Assim que o paciente começa a refletir sobre o que lhe
foi dito, e as novas sessões vão acontecendo, seus comportamentos vão se
modificando. Quando certas situações voltam a acontecer, o próprio sonhador pode
perceber que houveram mudanças, e que ele não mais encara essas situações da
mesma forma que antes. Como não existe qualquer espécie de “gabarito onírico do
sonhador”, o analista terá como sua referência, em primeiro lugar, o método que foi
utilizado pela interpretação, que se baseia massivamente nas associações feitas
pelo sonhador, durante as sessões; em segundo lugar, poderá avaliar os futuros
comportamentos do sonhador, após a interpretação; e, o que abala os paradigmas
de qualquer ciência exata, outros sonhos, que poderão revelar as novas tendências
pulsionais. A ideia de sonhos servirem como referência a outros sonhos não soa
bem às ciências clássicas.

4.2 O AMENSAMENTO DAS PAIXÕES

Mais uma vez traremos à baila o pensamento de David Hume, pela já


mencionada similaridade do seu conceito das “paixões humanas”, com as pulsões
psicanalíticas. Além disso, o título deste item se utiliza de um termo freudiano
bastante presente no Análise Terminável e Interminável, que é o “amansamento”
(FREUD, 1969, p. 233), cuja significação nos será bastante útil nas próximas linhas.
Como já expusemos, uma neurose se dá por razões pulsionais, quando
algumas delas acabam por atrapalhar o bom e desejável funcionamento do ego do
indivíduo. Se compararmos os pensamentos dos dois pensadores, Freud e Hume,
podemos traduzir a ideia anterior da seguinte forma: uma neurose se dá quando
42

certas paixões atrapalham a razão do indivíduo. Falta-nos introduzir a ideia de cura


psicanalítica a este enunciado.
Apoiando-nos no exposto no item anterior, quando uma correta interpretação
de um sonho provoca mudanças perceptíveis no ego do sonhador, bem como todo o
trajeto do processo analítico, podemos dizer que aqueles sintomas causados por
aquele conteúdo recém tornado consciente, deixaram de ser tão passionais, tão
inconscientes, e tão irresistíveis. Quando o sonhador em questão percebe que suas
escolhas eram influenciadas por algo estranho à razão, ele começa a perceber que
existe a possibilidade de escolher diferentemente. Isso quer dizer que aquelas
pulsões desapareceram do inconsciente do paciente? A resposta é um grande “não”.
Aquela influência negativa não foi estirpada como se faria a um tumor malígnico.
Aqueles conteúdos vão permanecer na psique do paciente, mas este estará mais
atento à sua influência. Da mesma forma que acontece a algumas doenças
incuráveis, como àquelas cujo tratamente tem como função a diminuição do avanço
da doença, ou a diminuição dos sintomas, também acontece a algumas neuroses:
as pulsões continuam lá, clamando para serem atendidas, mas elas foram
amansadas pelo tratamento analítico, e tem a sua influência diminuída. De certa
forma não houve uma cura? A qualidade desta cura, se assim poçamos a ela nos
referenciar, será discutida mais à frente.

4.3 A CURA PERMANETE E IMPERMANENTE

Muito comum aos analistas é ter aquele paciente que “vai e volta”. Agenda
suas sessões, comparece por alguns meses, mas depois pára. Passado algum
tempo, lá está ele, de volta à sua poltrona, contando seus sonhos e suas aflições. O
que acontece a pacientes assim? Além das possíveis resistências a certos
conteúdos, existe também a possibilidade de que certos conteúdos só os
incomodam em situações específicas.
Como já refletimos sobre, um quadro neurótico pode se iniciar por fatores
sociais. Uma pessoa em particular pode afetar outra pessoa de forma bastante
peculiar, mas quando o contato entre as duas cessa, os afetos também cessam.
Claro está que o objetivo principal de uma análise não é estancar episódios
esporádicos de algum tipo de “vazamento pulsional”, mas sim de preparar o
indivíduo de tal forma a não mais sofrer por certos conteúdos. Mas, infelizmente, a
43

análise é um processo lento. De outra forma não poderia ser: a desconstrução de


terrenos psíquicos propícios às neuroses, que foram, muitas vezes, construídos e
mantidos ao longo de décadas, não poderia ser de rápida duração.
No nosso exemplo, o sujeito chega ao consultório muito afetado, e, em pouco
tempo, desabafando e chorando, percebe que o incômodo não mais o incomoda, e
se julga curado. Resolve suspender o processo, para algum tempo depois perceber
que os incômodos retornaram. Infelizmente, por várias razões, inclusive as que são
de fundo sintomático-neurótico, algumas pessoas só funcionam assim: à base de
incêndios sendo apagados com determinada frequência. O tratamente analítico,
para o analista, é, muitas vezes, um exercício de paciência, sendo esta do tipo
interminável.
Além dessa característica, que pode muito bem ser um traço do indivíduo,
inclusive instintual, temos também a influência de outros fatores, que nos foram
indicados por Freud no seu Mal-estar na Civilização: o corpo, o mundo, e os outros
(FREUD, 1969, p. 85). Quando o indivíduo volta aos seus núcleos sociais, todo o
trabalho analítico é posto à prova, e pode ser muito pouco, ou nada, frutífero. Assim
como uma brasa, que mesmo já fria, longe da churrasqueira, volta a se incandecer
ao retornar a ela, sintomas neuróticos podem muito bem serem reativados e
reforçados nesses núcleos, tornando uma ideia de cura permanente e
impermanente.
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CONCLUSÕES

Partimos dos instintos, sob uma ótica puramente biológica; passamos pelas
pulsões, esta já uma ideia puramente psicanalítica, explicando que sem os instintos,
e sem o Verbo, elas não seriam. Das pulsões, partimos para as neuroses, motivos
que levam pessoas a se tornarem pacientes de psicanalistas, e refletimos sobre
quais as influências instinto-pulsionais estão presentes em quadros deste tipo.
Depois das neuroses, não poderíamos deixar de mencionar, por mais controverso e
polêmico que o assunto seja, a ideia, ou ideias, de cura psicanalítica. E por fim, o
que pudemos concluir?
Nosso objetivo, ao longo desses capítulos, era demonstrar a pertinência das
possíveis influências instintuais na psique humana, e em alguns de seus aspectos.
Obtivemos êxito e alcançamos este objetivo. Com este novo ponto de vista, reunindo
dois campos de estudos tão distintos à primeira vista, pudemos enxergar o Homem,
que não abandonou o homo sapiens sapiens por completo, com outros olhos, estes
mais abertos e, ao mesmo tempo, mais focados.
Não deveríamos negligenciar estas nossas características tão evidentes,
mesmo aos olhos dos mais desinteressados. Temos quatro membros, grande parte
dos grandes animais também, de um jeito ou de outro, com garras ou unhas; nossa
infância é nutrida pelo leite materno, e a de muitos animais também; conhecemos o
mundo externo através de cinco sentidos básicos, e a grande maioria dos animais
também; por que haveríamos, então, de estarmos tão distante assim deles?
O Homem vem se afastando de sua parte selvagem há muito tempo, e pelas
mãos e ideias de muitos autores. As tentativas de Aristipo de Cirene, sofista dito pré-
socrático, com suas aparições perfumado na ágora, Onfray (2008), não são mais do
que mensagens com este alerta. Com seus mais variados cheiros, o sofista nos faz
lembrar de um sentido tão negligenciado pela história do pensamento humano: o
olfato. E por que tamanha negligência e esquecimento? O homem racional pós-
platônico, se concentra em conhecer o mundo, majoritariamente, pela visão e pela
audição. Poquíssimos são os espetáculos que estimulam nossos narizes, e sobram
os de imagens e sons.
Muito temos a aprender quando observamos nossos companheiros de
planeta. Muitos desses companheiros estão por aí há muitos milhões de anos antes
45

do nosso surgimento, e muitos outros vão reinar quando já não mais aqui
estivermos. Não deveríamos ter medo de nos explicar através deles, pois isso não
mudaria o que já somos; não ao menos de imediato. Assim como uma parede não
se desfaz à nossa frente quando aprendemos que ela é constituída de tijolos,
cimentos e ferragens, nossos aspectos não deixariam de nos influenciar se levarmos
as ideias aqui presentes em consideração, ou seja, que compartilhamos tantas
características em comum com outros animais, e que algumas delas podem sim
influenciar, por exemplo, uma relação pai-filho.
Este novo ponto de vista vai curar todas as neuroses dos futuros pacientes?
Muito provavelmente não, mas é possível sim que alguns deles passem a olhar por
um novo prisma, ou, pelo menos, a modificar o já presente. Mas uma coisa é certa, e
esta o é deste os tempos pre-históricos, e nunca o deixará de ser: homo homini
lupus, ou seja, o homem é o lobo do homem.
46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARISTÓTELES. A Política. São Paulo, 2010.

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DARWIN, Charles. A Origem das Espécies. São Paulo, 2010.

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FREUD, Sigmund. Além do Princípio de Prazer. Rio de Janeiro, 1969.

FREUD, Sigmund. Cinco Lições de Psicanálise. Rio de Janeiro, 1969.

FREUD, Sigmund. Moisés e o Monoteísmo, Esboço de Psicanálise e outros


trabalhos. Rio de Janeiro, 1969.

FREUD, Sigmund. O Futuro de uma Ilusão, O Mal-Estar na Civilização e outros


trabalhos. Rio de Janeiro, 1969.

FREUD, Sigmund. Um Caso de Histeria, Três Ensaios sobre a Sexualidade e outros


trabalhos. Rio de Janeiro, 1969.

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NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo, 2011.

ONFRAY, Michel. Contra-história de Filosofia. São Paulo, 2008.

PAESE, Allan e Barbara. Por que os Homens fazem Sexo e as Mulheres fazem
Amor?. Rio de Janeiro, 2000.

SHAKESPEAR, William. Hamlet. São Paulo, 2010.


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REFERÊNCIAS DIGITAIS

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<http://www.simplypsychology.org/asch-conformity.html>. Acessado em 4 de Outubro
de 2016.

NANÔ, Fabiana. Percentual de solteiros supera o de casados, mas há mais pessoas


em união conjugal, aponta IBGE. Disponível em:
<https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/09/21/numero-de-
solteiros-cresce-e-ultrapassa-o-de-casados-no-pais-aponta-ibge.htm>.
Acessado em 16 de Março de 2017.

SOARES, Jéssica. 9 transtornos mentais que você provavelmente não conhecia.


Disponível em:
<http://super.abril.com.br/blog/superlistas/9-transtornos-mentais-que-voce-
provavelmente-nao-conhecia>. Acessado em 16 de Março de 2017.

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