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“Um país não muda pela sua economia, sua política e nem

mesmo sua ciência; muda sim pela sua cultura .” Herbert José de
Sousa (Betinho), sociólogo e ativista dos direitos humanos

À:
Ilma. Senhora Úrsula Vidal,
MD. Secretária de Cultura do Pará

Prezada Senhora,
Por meio deste, os abaixo assinados, realizadores audiovisuais dos mais diversos
municípios e localidades do estado do Pará, vêm à sua presença para apresentar
sugestão de planilha para aplicação dos mais de 67 milhões de reais que estão
destinados ao governo do Pará, pela Lei Paulo Gustavo (Lei 195 complementar –
08/07/2022), para aplicação em projetos de socorro emergencial ao setor audiovisual.
A iniciativa da construção dessa proposta faz-se como manifestação do
compromisso dos signatários de contribuir no esforço para que a Lei Paulo Gustavo
atinja seus objetivos culturais, econômicos e sociais por todo o Pará, estendendo seu
alcance para além dos grandes centros urbanos e econômicos do estado.
Nossa proposição assenta-se também no que dita o Artigo, 4º. §2, que
estabelece a obrigatoriedade da oitiva da sociedade civil para definição dos planos de
ação para aplicação dos recursos oriundos da LPG, que pode ser realizada pelo ente
público de várias formas, mas “...desde que adotadas medidas de transparência e
impessoalidade, cujos resultados deverão ser observados na elaboração dos
instrumentos de seleção de que trata este parágrafo” e, é para ampliar tal consulta que
encaminhamos para consideração de V.S.ª a presente proposta uma vez que não
testemunhamos que tenha havido chamada pública e ampla, por parte da SECULT, para
oitiva do segmento audiovisual, procedimento constado para os demais segmentos
culturais, cujos cards e convocatórias são facilmente encontrados nas redes sociais da
SECULT.
Outrossim, permita-nos compartilhar uma reflexão: “Que acontece quando se
solta uma mola comprimida, quando se liberta um pássaro, quando se abrem as
comportas de uma represa? Veremos...” Esta fala do então ministro da cultura Gilberto
Gil (Berlim, Alemanha, 02/09/2004), é interrogação que se impõe sobre nós neste
momento em que se inicia a etapa de execução da Lei Paulo Gustavo e que sabemos
destinar 70% dos recursos ao segmento audiovisual. O que acontecerá se tais recursos
forem distribuídos democrática e equitativamente para viabilizar produções
audiovisuais nas beiragens de rios, nos campos, nas florestas; obras de homens e
mulheres, realizadores caboclos, quilombolas e indígenas? Povo, povoado de histórias a
serem cinematograficamente contadas em todas as regiões do estado. O que
acontecerá se em vez de concentrar os recursos do Art. 6º- I (Apoio a Produções
Audiovisuais - R$ 44.322.174,06), em poucas empresas produtoras e diretores da capital
e em uns dez projetos com altas somas, traçarmos um plano para que sejam realizados
dezenas de filmes de ficção ou documentários, de longa, média e curta e curtíssima
duração por todo o estado, assegurando no mínimo um longa-metragem por região? E
se em vez de direcionar os recursos do Art 6º - II (Apoio a salas de cinema - R$
10.134.988,70), para salas de exibição já estabelecidas, investirmos na adequação e
equipagem de dezenas de espaços comunitários nos municípios mais carentes de
equipamentos culturais do interior do estado? O que acontecerá se em vez de
investimos os recursos do Art. 6º - III (Capacitação, formação e qualificação no
audiovisual; apoio a cineclubes e a festivais e mostras - R$ 5.089.009,97) apenas em dois
ou três festivais já consolidados, ainda que apoiando tais festivais, consigamos garantir
que sejam criados pelo menos um novo festival de cinema em cada região de
integração? E, por fim, o que acontecerá se a distribuição dos recursos da Lei Paulo
Gustavo, na soma que compete a SECULT, for pautada por uma visão mais holística do
fazer cinematográfico paraense, cuja a pujança se projeta para muito além do desejo de
realização de obras para a Netflix, Globoplay e outros canais internacionais?

Não temos respostas exatas para as perguntas que nos fazemos, mas
acreditamos no rumo que se enseja: mais histórias contatas, mais gente na cena,
memórias sendo preservadas, cineastas brotando em todo canto, gente que já faz,
tendo acesso a recursos para fazer melhor; telas se abrindo para que o povo ver filmes
nas localidades mais distantes... Não sabemos para onde pula a mola comprimida ou
para onde voa o pássaro recém liberto, mas sabemos que com a efetiva
descentralização na aplicação dos recursos, além de atender o disposto no Art. 8º, III - §
12. “ Os Estados, na implementação das ações emergenciais previstas neste artigo,
deverão estimular a desconcentração territorial de ações apoiadas, nos termos
estabelecidos em regulamentação estadual...”, Se inaugurará um tempo novo para o
audiovisual paraense, oportunidade de exercício do protagonismo amazônico no
audiovisual, palco onde mais que a disputa econômica, persiste a disputa cultural no
esforço constante das nações ricas de manterem controle ideológico sobre as demais
nações. Nesse jogo das ideias, das identidades e dos protagonismos nós, amazônidas,
temos que nos insurgir. Precisamos apresentar para nós mesmo e para o mundo nossa
cultura, história, arte, talentos e compreensão do universo em que vivemos. Produzir e
difundir cinema amazônico é nosso direito cultural e também nosso dever para com as
gerações futuras.
Nós acreditamos na cultura, no talento, criatividade e no potencial técnico e
artístico da nossa gente. Lei Paulo Gustavo para todos, também no audiovisual!
Belém, 13 de maio de 2023
(Viva Luiz Gama, José do Patrocínio e André Rebouças,
três grandes abolicionistas negros brasileiros)

Assinam:

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