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Prof. Dr. Antônio Carlos do Nascimento Osório
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Profª. Drª. Soraia Freitas
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Profª. Drª. Inara Barbosa Leão
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Profª. Drª. Marilda Moraes Garcia Bruno
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Profª Drª Jacira Helena do Valle Pereira
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Profª Drª Alda Maria do Nascimento Osório
AGRADECIMENTOS
In memorian
A quem, com seu carinho, dedicação e amor, me criou e ensinou-me valores e princípios para o exercício de
uma vida digna, Umbelina Correa da Costa, minha querida vó Bila (1982)
Ao meu pai, Silvio Lobo, exemplo de luta e conquistas em seu campo de trabalho, a Noroeste do Brasil.
(1990)
À minha querida irmã Zacil Correa Lobo, minha secretária no escritório de advocacia, onde prestou sempre
seus serviços com entusiasmo e atenção (2000)
À minha querida irmã Silza Lobo Dias, pedagoga e orientadora educacional, com uma vida prestada à
educação. (2002)
À minha querida irmã Elcy Correa Lobo, minha colega de turma da Escola Normal nos idos de 1965/66/67,
professora sempre dedicada à escola primária que, de forma prematura, foi levada desta vida. (2009)
À minha sogra Lucrecia Gonçalves Dias. Sua voz foi emudecida, seu sorriso apagou-se na abrupta surpresa do
seu passamento. Ficou o inconformismo e o espírito irresignável com o sistema de saúde do País, deficiente e mal
administrado. Até quando? (2009)
Ao meu tio Joca e minha prima Graça, lá da ilha de Florianópolis, com quem passamos tantos verões nas belas
praias catarinenses. (2008, 2009)
Ao meu sobrinho Robson Oliveira, sempre amigo e prestativo, mais uma vítima das estradas do Brasil (2009)
À minha mãezinha querida, professora Elza Corrêa da Costa Lobo, normalista, pedagoga, diretora de Escola
que, no leito do Hospital, soube da minha qualificação, mas o destino não permitiu estar presente para assistir à defesa
desta tese (9/março/2010)
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À minha amada esposa Marlene Conceição Gonçalves Dias Lobo, meus queridos filhos Silvio Lobo Neto e Ygor Fillip
Dias Lobo, pelo sacrifício a que vos impingi nos longos meses e anos de doutorado, período em que não me foi possível dar-vos a
atenção devida, o carinho e o amor na convivência dos nossos dias. Obrigado pela compreensão, amor e pelo estímulo nos momentos
em que o cansaço afrontou minh’alma e emudeceu meu espírito.
Às minhas queridas filhas Sylvia Raíssa de Vasconcelos Lobo Melo, Keila Priscila de Vasconcelos Lobo Catan, Leíse
Mirelle de Vasconcelos Lobo, aos meus genros José Carlos Catan, Augusmar Vieira Melo e aos meus netos Rayanne, Kalline, Gabriel
e Murilo, pelo sempre presente amor, carinho e incentivo.
Ao meu compadre e amigo João Baptista de Mesquita, colega de longos anos de Universidade, que sempre confiou em
meu trabalho e me apoiou em minhas iniciativas de estudo e carreira profissional.
Aos meus pares do Conselho Regional de Educação Física, CREF 11- MS/MT, especialmente Marcelo Ferreira Miranda e
Domingos Sávio, meus ex-alunos e hoje respeitáveis colegas profissionais, autoridades do mundo da Educação Física; o primeiro,
Conselheiro do Conselho Federal de Educação Física; o segundo, Presidente do CREF 11, pelas constantes palavras de amizade e pela
torcida nesta minha caminhada.
Aos meus ex-alunos João Batista da Rocha e sua esposa Rose, companheiros e amigos sempre presentes. Ele, vereador,
que em sua primeira viagem ao mundo político, soube capitanear a nau pelo “cabo das tormentas” da política, conseguindo contorná-lo
e colher novas especiarias com o jeito honesto de fazer política.
Aos meus colegas do Grupo de Estudos e Investigação Acadêmica nos “Referenciais Foucaultianos”, GEIARF, pelos
semanais debates, concordâncias e discordâncias, leituras e aproximações, apoio e impulso estimulante no Mestrado e Doutorado.
Aos colegas professores do Departamento de Educação Física, local da minha lotação por 30 anos de ensino universitário.
Aos meus colegas professores da Faculdade de Direito, local da minha lotação há cinco anos, e ao Curso de Direito, pelos
seus alunos, aos quais ministro disciplinas desde sua criação.
Aos meus professores do Doutorado pelos ensinamentos, mediação, auxilio, e, sobretudo, por abrir-me novos portais do
conhecimento.
À secretária do Programa de Pós-Graduação em Educação, Jaqueline Mesquita e seus auxiliares, que jamais me negou um
só pedido administrativo, atendendo-me com carinho e atenção.
Combati o bom combate, terminei a carreira, guardei a fé... (II Timóteo 4:7)
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O
grande Mestre Rui Barbosa nos ensinou que um povo cuja fé se petrificou é um
povo cuja liberdade se perdeu. Daí a grande lição sobre o inconformismo com a
situação do Brasil, ao afirmar:
Sinto vergonha de mim, por ter sido educador de parte deste povo, por ter batalhado
sempre pela justiça, por compactuar com a honestidade, por primar pela verdade, e por ver
este povo já chamado varonil, enveredar pelo caminho da desonra.
Sinto vergonha de mim, por ter feito parte de uma era que lutou pela democracia, pela
liberdade de ser e ter que entregar aos meus filhos, simples e abominavelmente a derrota
das virtudes pelos vícios, a ausência da sensatez no julgamento da verdade, a negligência
com a família, célula-mater da sociedade, a demasiada preocupação com o ‘eu’ feliz a
qualquer custo, buscando a tal ‘felicidade’ em caminhos eivados de desrespeito para com o
seu próximo.
Tenho vergonha de mim pela passividade em ouvir, sem despejar meu verbo a tantas
desculpas ditadas pelo orgulho e vaidade, a tanta falta de humildade para reconhecer um
erro cometido, a tantos ‘floreios’ para justificar atos criminosos, a tanta relutância em
esquecer a antiga posição de sempre ‘contestar’, voltar atrás e mudar o futuro.
Tenho vergonha de mim, pois faço parte de um povo que não reconheço, enveredando por
caminhos que não quero percorrer…
Tenho vergonha da minha impotência, da minha falta de garra, das minhas desilusões e do
meu cansaço.
Não tenho para onde ir, pois amo este meu chão, vibro ao ouvir o meu hino e jamais usei a
minha bandeira para enxugar o meu suor, ou enrolar o meu corpo na pecaminosa
manifestação de nacionalidade.
Ao lado da vergonha de mim, tenho tanta pena de ti, povo deste mundo!
‘De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a
injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a
desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto’.
RESUMO
This study has, as its epistemological basis, the archeogenealogy by Michel Foucault, in his
theoretical methodology, having as its point of support issues pertaining to the subjectivity of
relations of knowledge/power and as legalization theme issues about education in its
application as an instrument of realization of the educational rights. The analysis of the
discourse attempts to understand the relationships, interrelationships, linkages and
correlations of utterance under determined rules by discursive and non-discursive framed, this
discursive formation of the educational legalization, validating it with an emergent
possibilities. To deny the complicity between power/knowledge based upon reason and its
validity and relevance, articulating creative thinking with a practical analysis and revealing
the true rationalist, reviewing the ways and the subject action possibilities against the
repressive and dehumanizing systemic character of knowledge and the social stuffs involved.
To promote the insertion of the desecration law in the control of the society as a paradigm to
guide the standardization and control, revealing and rejecting the axes of coercion from their
theoretical coordinates. To reveal and deconstruct the ambitious, authoritarian, paternalistic
citizenship suppress plan from the inapt, which is being redistributed by the construction of
citizenship by institutional Judiciary and Public Prosecution, which is embedded in the
suppression of freedom, dignity, justice and citizenship of the subject by the way of
legalization. To explain the dominance of rationality that has dominated the modern era,
linked to economic and political development and its political impositions by reaffirming the
imaginary and emotional, for the upgrading of natural concrete against the domination of
universal abstract, normative and legislator. The law is one of the newest speeches of
appeasement between the social contradictions and it appears now as an improved strategy
and healing of the possible dimensions of knowledge and power.
RÉSUMÉ
ANEXO A - Recurso Extraordinário 436.996, Supremo Tribunal Federal – STF - São Paulo.
Relator Ministro Celso de Mello, Recorrente: Ministério Público de São Paulo. Recorrido:
Município de Santo André.
ANEXO K - Lei de Diretrizes e Bases ea Educação Nacional (Lei Federal Nº 9.394, de 20 de Dezembro de
1996).
ANEXO L - Lei da Ação Civil Pública (Lei Federal Nº 7.347, de 24 de Julho de 1985) .
ANEXO N - Leis de Responsabilidade (Lei Federal Nº 1.079, de 10 de Abril de 1950, Decreto-Lei Nº 201, de 27
de Fevereiro de 1967).
ANEXO P - Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), Declaração da Quarta
Conferência Internacional sobre os Adultos (UNESCO, 1985), Convenção sobre os Direitos da Criança (1989).
ANEXO R - Declaração Mundial sobre a Educação para Todos (Jomtien, Tailândia, 1990), Declaração e
Programa de Ação da Conferência Mundial sobre os Direitos do Homem (Viena, Áustria, 1993).
ANEXO S - Quadro de Ação de Dacar – Educação para Todos (Dacar, Senegal, 2000) .
ANEXO T - Plano de Ação para a Década das Nações Unidas para a Educação no Domínio dos Direitos do
Homem (1995-2004) .
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................................13
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................199
ANEXOS ...........................................................................................................................Vol II
APRESENTAÇÃO
A INVESTIGAÇÃO
referenciais em construção a partir das relações entre direito e moral, com objetivos de
provocar uma renovação ética política, ainda não totalmente consolidada.
As situações contemporâneas têm demonstrado que a educação não está e não ficará
indiferente à significativa influência que o direito tem exercido em seu meio ao promover
modificações, de forma coercitiva, sob o imperativo da ordem judicial, no âmbito das
decisões político-administrativas, que interferem diretamente no cotidiano escolar, nas
práticas educativas, nas questões curriculares, nas relações entre os atores educacionais,
enfim, alterando e transformando toda a dinâmica do funcionamento da educação.
Tais fatos devem ser considerados à luz das peculiaridades da educação para sopesar
as conseqüências decorrentes do emprego das modernas teorias da argumentação jurídica
cultivadas na esteira da incorporação de uma série de princípios, valores e direitos
fundamentais presentes na Carta Constitucional de 1988, edificada sob a matriz
principiológica, trazendo em seu contexto, diretrizes, valores e princípios como: dignidade da
pessoa humana, solidariedade social, liberdade e igualdade, juridicamente válidos e aplicáveis
pelo poder judicante, sob a argumentação de adequar o raciocínio jurídico ao raciocínio
moral.
É preciso ressaltar que certos setores da sociedade guardam expectativas e defendem
a garantia da imediata concessão dos princípios, valores, diretrizes e compromissos políticos,
assegurados pela Constituição Federal de 1988, por intermédio da atuação do Poder
Judiciário, na medida em que essa nova ordem constitucional tem representado ou pode
representar um caminho para viabilização do Direito à Educação, independente dos grupos e
suas diversidades sociais, dando mostras de ser o último espaço possível de mobilização
social.
Ocorre que esse viés interpretativo, apresentado como favorável às minorias
desprovidas de maiores influências no campo político, tem levantado controvérsias que
podem ser assinaladas como consequências de uma colisão de valores resultante da posição de
supremacia assumida pelo Poder Judiciário perante os demais Poderes do Estado.
De um lado é possível constatar a aplicação judicial do Direito à Educação com
apoio na doutrina brasileira da efetividade, baseada nas teorias dos princípios constitucionais
e dos direitos fundamentais, que adquiriram o caráter de normatividade jurídica, na qualidade
de direitos protegidos pela luz constitucional, dotados de efetividade plena, revestidos pela
característica de direitos públicos subjetivos, ou seja, autoaplicáveis na ordem jurídica.
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De outro lado, destaca-se, em contrapartida, uma outra linha de análise que adota a
abordagem sobre a questão da violação à teoria da separação dos poderes, aos princípios
orçamentários, à reserva do possível e ao primado da soberania popular, base central para o
exercício da democracia.
Mencionadas contradições, manifestadas no plano dos valores, sinalizam a existência
de conflitos não resolvidos e interrogações ainda não respondidas, embora a politização das
cortes brasileiras seja uma realidade a partir da Constituição Federal de 1988, que veio
consolidando-se nos inúmeros processos que tratam de diversas questões como a saúde, as
relações familiares, a política e as questões educacionais, estas aqui representadas nesta
pesquisa, por um recorte empírico composto por dados processuais trazidos à análise.
Ante esse jogo de linguagem e aparência, teorias e práticas, que retratam um novo
tipo social e uma nova ordem político-econômica concebidos pela lógica cultural do
capitalismo avançado, estes estudos, pela via do discurso, promove um (re) imaginar e (re)
criar caminhos de investigação voltados para a problemática da Judicialização da Educação,
em seus tecidos de fabricação enunciativo-discursiva, levando em consideração, ao crivo das
relações enunciativas, os questionamentos sobre a validade e pertinência epistemológica desse
saber, (Judicialização da Educação) fundado sob os alicerces da razão e hegemonizado como
verdade.
Frente ao problema apresentado, grave e relevante, a tese que esta pesquisa procura
defender, dentro de um desenvolvimento lógico de argumentação, fundamenta-se no
pressuposto de que os conceitos de controle e de saber/poder, cunhados por Michel Foucault,
possibilitam compreender que o denominado paradigma do Direito à Educação, mesmo
apresentando conjecturas baseadas na posição defendida pela ciência jurisprudencial de que
tais direitos estão revestidos por garantias ofertadas pela judicialização, não demonstrou, no
decurso de mais de vinte anos de vigência da Constituição Federal de 1988, condições de
efetividade, que pudessem apontar quaisquer ou alguma evidência de se desvendar o paradoxo
da transformação da sociedade pela educação.
Como meios de comprovação, analisa-se a Judicialização da Educação entendendo-a
como dispositivo de saber/poder aplicado em várias esferas sociais, na condição de promotora
da normalização de comportamentos e da exposição a exames, objetivados a produzir
verdades que são reproduzidas nos modos de viver, pensar e agir dos indivíduos. Toda essa
estratégia de controle, constituída por múltiplos mecanismos influenciadores e edificadores,
sedimentou, no leito da justiça, o comprometimento com a verdade formal fundada no e para
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o País legal, contribuindo, ainda mais, para que as questões reais e cotidianas vividas pelos
cidadãos fossem e sejam relegadas a processos judiciais fragmentados, ampliando os conflitos
e contradições de uma racionalidade duvidosa.
O modus operandi utilizado pela processualística do Direito neste novo momento
constitucional, fortalecido pela teoria do ativismo judicial, fator determinante de uma posição
inovadora do sistema jurídico contemporâneo, tem sido defendido como engenho propiciador
da pavimentação das vias de solução dos problemas existentes nas complexas sociedades
atuais; no entanto, tal assertiva, nesse sentido, não se apresenta convalidada por quaisquer
indícios de resultados na realidade das práticas educativas e sociais contemporâneas.
Como dados referenciais de uma empiria, demonstrativos da aplicação do discurso
da Judicialização da Educação em Mato Grosso do Sul e no Brasil, este trabalho de
investigação procedeu a levantamentos e análises, abaixo relacionados:
a) Processos judiciais que tramitaram nos Fóruns e Tribunais do Poder Judiciário de
MS, no período de 2005 a 2008, disponibilizados pelo Conselho Estadual de
Educação de Mato Grosso do Sul, instituição que os integrou como parte ré, no
pólo passivo da ação, e,
b) Dados enunciativos constantes de diferentes decisões referenciadas na
jurisprudência brasileira apontados em estudos analíticos da judicialização.
Com essas informações compostas de enunciados colhidos em um recorte da
realidade processual judicial, promoveu-se a análise dos discursos produzidos a partir dos
recursos de interpretação jurídico-processual no campo da Educação - Judicialização da
Educação - que, em se tratando das relações sociais e intermediações, é explicitada nas
dinâmicas dos diferentes campos e domínios das interações postuladas como políticas, tendo
como foco as estratégias de interpretações do aparato legal segundo os princípios e diretrizes
da Constituição Federal de 1988 – instrumento regulamentador, enquanto direitos e deveres,
das normalizações sociais.
Por se tratar de uma aplicação processual recente, a Judicialização da Educação tem
sido marcada em sua consolidação por meio da atuação desenvolvida por diversas instituições
que compõem os aparelhos da Justiça (Poder Judiciário, Poder Executivo. Ministério Público
e Polícia Judiciária, em seus organismos – Fóruns, Tribunais, Juízos, Promotorias e
Procuradorias, Defensorias Públicas, Conselhos Tutelares, Conselhos dos Direitos da Criança
e Órgãos da Segurança Pública).
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[...] a partir da atual Constituição e das leis que se seguiram, a educação passou a ser
efetivamente regulamentada, com instrumental jurídico necessário para dar ação
concreta ao que foi estabelecido, pois de nada adiantaria prever regras jurídicas com
relação à educação (com boas intenções) se não fossem previstos meios para a sua
efetividade.
[...] supõe-se, por outro lado, que uma única e mesma forma de historicidade
compreenda as estruturas econômicas, as estabilidades sociais, a inércia das
mentalidades, os hábitos técnicos, os comportamentos políticos, e os submeta ao
mesmo tipo de transformação; supõe-se enfim, que a própria história possa ser
articulada em grandes unidades – estágios ou fases – que detêm em si mesmas seu
princípio de coesão. São estes postulados que a história nova põe em questão quando
problematiza as séries, os recortes, os limites, os desníveis, as defasagens, as
especificidades cronológicas, as formas singulares de permanência, os tipos
possíveis de relação.
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“O Legado de Foucault”, organizado por Scavone, Lucila; Alvarez, Marcos Cesar e Miskalci,
Richard (2006).
Sérgio Adorno (2006) enfoca a crítica feita por Michel Foucault ao modelo jurídico-
político clássico, que já não daria conta das formas de poder como as disciplinas, as quais ele
analisou exaustivamente em “Vigiar e Punir”. O autor busca detalhar a visão dicotômica que
opõe de modo mais radical soberania e disciplina como dois modelos de poder – um
correspondente ao século XVIII e o outro correspondente ao século XIX – ao defender a idéia
de que tal dicotomia seria mais uma questão de ordem metodológica do que, propriamente,
um princípio teórico. Seguindo esse imperativo metodológico, Michel Foucault conseguiu
pensar diferentemente as relações de poder, ao romper com as visões tradicionalmente
evolutivas do Direito, ao questionar a hegemonia do modelo jurídico-político como único
modelo capaz de explicar as relações de poder na modernidade e ao descortinar as práticas
disciplinares de poder em toda sua amplitude.
Andrei Koerner (2006), tratando do poder, da lei e do Direito, aborda a questão das
transformações contemporâneas do Direito, afirmando que tal trajetória vem sendo construída
em função das articulações entre Direito, esquemas de saber-poder e formas de subjetivação
que são novas formas de investimento dos sujeitos.
Por último, Luís Antônio Francisco de Souza (2006) discute sobre o poder disciplinar
e a bio-política, explicando que, na modernidade tardia, as técnicas de vigilância eletrônica e
as novas estratégias de segurança privada conformam um novo modelo de controle social, em
que a dimensão tecnológica da vigilância não substitui os mecanismos disciplinares clássicos
baseados na gestão dos corpos e comportamentos representados pelo panoptismo.
A compreensão do Direito, expressada por Foucault, nos dá a indicação de que a lei é
uma verdade construída, de acordo com a necessidade do sistema econômico vigente, para
justificá-lo como uma verdade a priori, universal, portanto, naturalizando-a no plano macro
social, pela criação das regras de direito, que são projetadas, produzidas, transmitidas e
oficializadas como regras de verdades.
A pesquisa histórica foucaultiana não analisa o discurso/verdade para propor novas
regras jurídicas, outras verdades, pois, procura colher cada momento do discurso, em sua fase
pré-discursiva até a sua emergência, indagando sobre a lei de sua existência e verificando os
fenômenos específicos que o fizeram(fazem) aparecer no campo dos acontecimentos.
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no contexto discursivo são observadas sob a lente da sua produção como produção de saberes
dinamizados pelas relações de poder.
O PESQUISADOR
disciplinas do curso de educação física e de outros cursos, como é o caso do Curso de Direito
onde ministra aulas desde sua criação e implantação, tendo sido professor das disciplinas
Direito Civil I, Direito Civil II, Filosofia Jurídica, Ética, Práticas Jurídicas e Atividades
Complementares, portanto, transitando entre o campo jurídico e o campo da educação física,
até ser transferido definitivamente para o Curso de Direito (Departamento de Economia e
Administração), para atender as necessidades de ampliação do quadro docente efetivo e
atender melhor os projetos da área.
Sua experiência no campo do direito e da educação física foi alicerçada nos fóruns,
delegacias, repartições públicas, nas escolas e universidades, focos de permanente e efetiva
atuação. Os cargos de assessoria e direção departamental, exercidos na Secretaria Municipal
de Educação e Secretaria de Estado de Educação propiciaram grande experiência do ensino e
da administração do ensino na ótica política e administrativa, vivenciando os graves
problemas existentes nos sistemas de ensino, na administração das escolas, na aplicação e
avaliação das políticas educacionais e nas lutas e movimentos sociais.
Toda essa carga de atividades, ações e funções marcaram este investigador como
educador e advogado, sem maximizar este ou aquele campo profissional, mas, procurando
sempre aperfeiçoar ambos.
No Movimento Constituinte de 1987/8, exercendo o cargo de Pró-Reitor de Extensão
e Serviços Comunitários/UFMS, foram inúmeras as reuniões em que participou, realizadas
em Universidades, Entidades de Classe, Ministérios, debatendo, especificamente, os
anteprojetos de inserção da educação no texto constitucional.
Dessa forma, a temática do Direito à Educação há muitos anos tem sido seu campo
de estudo, análise e debates, ficando sempre, enquanto cidadão brasileiro, inconformado com
o não cumprimento dos direitos garantidos pela Carta Constitucional de 1988, o que
proporcionou, muitas vezes, revolta pelas variadas promessas e insinuações de políticas
públicas educacionais, porém, desprovidas dos meios próprios de sustento e aplicação.
As constantes renovações de planos, diretrizes e projetos políticos têm sido
configuradas como meras figuras retóricas, dignas dos oradores sofistas em suas estratégias
discursivas, às quais se misturam táticas políticas de Maquiavel, no mundo atual, com
estratégias preparadas para apaziguar os movimentos sociais (professores, pais, comunidade,
sociedade).
Já tendo ocupado funções, lugares e espaços nas pequeninas salas de aula das escolas
periféricas como nos salões governamentais que administram a educação; já tendo transitado
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por entre as favelas que servem de moradias ao cidadão em sua miserabilidade provocada
pelas circunstâncias históricas, pobre e excluído, na busca da tutela do direito em súplicas às
Cortes Judiciais; já tendo exercido a advocacia proferindo defesas processuais perante cortes e
ministros nos palácios dos Tribunais Superiores; já tendo vivido e vivenciado os fatos da vida
por mais de seis décadas; por tudo isso e muito mais, a experiência dos fatos passados tem
aconselhado manter sempre o olhar crítico e interrogativo socratiano, embora, como Sócrates,
a crítica à lei jamais o impediu de a ela obedecer.
Infelizmente, as lutas pela educação e pela justiça estão prenhes de teses acadêmicas,
políticas e sociais que subjazem nas prateleiras e nas gavetas, sem haver qualquer interesse
das cúpulas administrativas políticas em programa-las ou levá-las pelo menos a situações
experimentais.
Essas e outras razões o fizeram aproximar do aporte teórico foucaultiano, inovador
ou contestador, mas que despertou reflexões acadêmicas voltadas para compreender as
estratégias do poder, indicando uma nova forma de pensar as relações de saber e poder,
escavando por entre os ditos e escritos, nos arquivos do tempo. Fugindo às metodologias
tradicionais, procurou identificar os discursos em suas estratégias, leis, regras, articulações e
relações, fenômenos que dão condições de conhecer sua existência e surgimento no mundo
social, abrindo novas possibilidades no campo da pesquisa ao desconstruir as verdades
racionalistas e seus regimes, expondo a nu todas as mazelas dessa ordem.
Assim, no exercício das funções do magistério superior, o que se deve esperar das
atividades profissionais ligadas ao ensino, extensão e principalmente a pesquisa é no dizer
foucaultiano “[...] ocupar uma posição específica, mas cuja especificidade está ligada às
funções gerais do dispositivo de verdade em nossas sociedades” trabalhar no sentido de
desenvolver uma “[...] luta ao nível geral deste regime de verdade [...]”, combatendo “[...] em
torno do estatuto da verdade e do papel econômico-político que ela desempenha que é tão
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A judicialização tem sido mais que um tema, pois configura-se como uma questão de
interesse de vários setores da sociedade alcançados pelas decisões das cortes de justiça, como
protagonistas de julgamentos que afetam o campo das políticas públicas, ou estabelecem
posições jurídico-morais em casos complexos. Os estudos que vem sendo desenvolvidos estão
disseminados em vários fechos, que vão desde a política, a educação, a economia, as ciências,
alcançando inclusive a violência urbana e a segurança pública, isto é, permeia todas as
instituições e segmentos da sociedade.
O fenômeno da judicialização opera mudanças que não residem apenas na
transferência de poder para o Judiciário, na medida em que envolve várias partilhas entre
diferentes áreas de domínio, de regularização e controle, despertando diferentes compreensões
32
______________
1
Decisões que não modificam para melhor a situação estrutural educacional, política, econômica e social.
Decisões que mantém a incógnita no plano da solução do problema “A pior decisão é a indecisão.” (Benjamin
Franklin).
33
Novo Código Civil, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo Código de Defesa do
Consumidor que, em geral, não são alvos de estudos dos educadores.
Deram exemplos quanto aos problemas da relação escolar levados à Justiça e à
ordem da jurisprudência. Por fim, propuseram um novo pacto entre os atores educacionais
(professores, gestores e comunidade) a fim de preparar os educadores para que possam dar
direção e tomar decisões sobre o universo escolar, fazendo-se efetivos protagonistas das
relações escolares.
O Estado do conhecimento da judicialização da educação, mesmo em reduzido
volume de pesquisas existentes, abrangeu aspectos diversos como a escola e as relações entre
os atores da educação, a atuação do Ministério Público por suas Promotorias especializadas,
as atividades dos Conselhos Tutelares, a omissão dos poderes da República, a violência no
espaço escolar, a judicialização como a voz institucional dos pobres e o direito à alimentação
e à vida, temas que se supõe os mais incidentes no meio educacional.
Mencionadas pesquisas, embora em seus objetos, tangenciem a temática deste
trabalho de tese, a ela não guardam maiores ou diretas relações e identificações, quer em suas
temáticas e delimitações, estruturas de composição, delimitações, métodos, procedimentos ou
paradigma de aporte.
No universo dos trabalhos aqui levantados, pertinentes à judicialização no campo
educacional, maiores destaques foram dados às investigações relacionadas à atuação do
Ministério Público, como instituição mais próxima do cidadão no sentido de atender aos seus
ensejos para requerer a solução dos seus conflitos, ou de buscar o reconhecimento aos seus
direitos.
O Ministério Público, por seus membros, trocou o traje simbólico da acusação, tão
conhecida no Tribunal Popular do Juri, pela beca representativa da defesa do cidadão e da
coletividade ao receber novas atribuições conferidas pela Constituição Federal de 88,
especialmnte o constante do Art. 127 – “O Ministério Público é instituição permanente,
essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. (grifo meu).
O estabelecimento das novas funções, determinadas pela Constituição de 1988,
trouxe/traz novos atores para o campo social; dentre eles, os representantes do Ministério
Público que na conformidade com o paradigma do neoconstitucionalismo, dos direitos
humanos e dos chamados novos direitos, vêm encontrando na jurisdição constitucional o
instrumento que compreende necessário para garantia da ordem vigente.
36
O despertar do sujeito para os novos direitos garantidos pela Carta Soberana encontra
na Instituição do Ministério Público seu primeiro espaço de reivindicação, caracterizado, de
forma subliminar, pela invasão do direito (linguagem dos direitos) no campo da política e das
relações sociais, como mestre auxiliar do juiz do destino das instituições e do povo.
O direito, que tem se portado de forma incisiva como uma engenharia social,
encarregou-se da domesticação da política e das relações sociais mediante a solução dos
______________
2
O controle difuso, também denominado concreto, incidental ou descentralizado, ocorre no âmbito de um caso
concreto posto à análise do Poder Judiciário e se efetiva de forma incidental em qualquer processo posto à
apreciação dos magistrados de primeira instância ou dos Tribunais, inclusive superiores, e não integram o objeto
da lide. Seus efeitos, via de regra, operam-se ex nunc (a partir de então) e somente entre as partes
3
Pela via concentrada, o controle dá-se perante o Supremo Tribunal Federal, através da instauração de um
processo objetivo em que se busca a declaração de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei ou
ato normativo de forma abstratamente considerada, contrastando-a com a Carta Magna. Tal controle é efetivado
no âmbito de Ação Declaratória de Constitucionalidade, Ação Direta de Inconstitucionalidade ou, ainda, através
de Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental, e seus efeitos atingem a todos, são erga omnes, e, em
regra, opera-se ex tunc (retroativamente).
37
comme résultat éventuel des stratégies politiques”. Autor(es): Taylor, Matthew M.; Da Ros,
Luciano. Fonte: Dados 51(4): 825-864, GRA, TAB. 2008 .
“Em busca da judicialização da política no Brasil: apontamentos para uma nova
abordagem”/“In search of judicialization of politics: notes for a new approach”/“À la
recherche de la judicialisation de la politique: notes pour une nouvelle approche”. Autor(es):
Carvalho, Ernani Rodrigues de. Fonte: Rev. Sociol. Polit. (23): 127-139, ILUS, GRA, TAB.
2004 Nov.
“Judiciário e privatizações no Brasil: existe uma judicialização da política?”/“The
judiciary and privatizations in Brazil: is there the judicialization of politics?”/“Pouvoir
judiciaire et privatisations au Brésil: existe-t-il une judiciarisation de la politique?”.
Autor(es): Oliveira, Vanessa Elias de. Fonte: Dados 48(3): 559-686, GRA, TAB. 2005 Sep.
“Revisão judicial e judicialização da política no direito ocidental: aspectos relavantes
de sua gênese e desenvolvimento”/“Judicial review and the judicialization of politics in
western law: relevant aspects of gênesis and development”/“Revision judiciaire et
«judicialisation» de la politique dans le droit occidental: aspects importants de sa genèse et
développement”. Autor(es): Carvalho, Ernani. Fonte: Rev. Sociol. Polit. (28): 161-179, TAB.
2007 Jun.
“Uma experiência de supervisão na área psicossocial: desafios teórico-práticos”/“An
experience of supervision in the psycho-social field: theoretical and practical challenges”.
Autor(es): Faleiros, Vicente de Paula Fonte: Rev. katálysis 12(2): 258-267, ILUS. 2009 Dec.
“Poder de decreto e accountability horizontal: dinâmica institucional dos três poderes
e medidas provisórias no Brasil pós-1988”/“The power to decree laws and horizontal
accountability: the institutional dynamics of the three powers and temporary acts in Brazil in
the post-1988 period”/“Pouvoir de décret et accountability horizontal: diynamisme
institutionnel des trois pouvoirs et mesures provisóires au Brésil après 1988”. Autor(es): Da
Ros, Luciano. Fonte: Rev. Sociol. Polit. 16(31): 143-160, GRA, TAB. 2008 Nov. SciELO
Brasil Idioma(s): Português.
“Direito e política: o Ministério Público e a defesa dos direitos coletivos”/“Law and
politics: the Ministério Público and the defense of collective rights”/“Droit et politique: le
Ministério Público et la défense des droits collectifs”. Autor(es): Arantes, Rogério Bastos
Fonte: Rev. bras. Ci. Soc. 14(39): 83-102, FIG GRA TAB. 1999 Feb.
40
Toda atuação renovatória de fundo constitucional ainda está sendo absorvida pelos
diversos domínios do Poder Judiciário em seus espaços de atuação, mas, as análises
acadêmicas já realizadas dão mostras da grande influência provocada no cenário brasileiro, na
vida do cidadão brasileiro, que contempla agora a figura emblemática do Leviatã Hobbesiano,
travestido na Toga da Magistratura, efetuando retificações no Acordo Rousseauniano, quanto
às ações de controle do sujeito Estado.
O projeto político da modernidade foi alicerçado na crise radical da sociedade, no estremecimento da ordem do
direito e do estado, na crítica radical das relações políticas e na experiência da exploração e da opressão.
preocupação com a tutela aos direitos fundamentais sua principal peculiaridade, fato que
conduziu a Justiça à realização de uma leitura principiológica4 e valorativa da Constituição.
O marco filosófico do novo Direito Constitucional é a convergência das duas
correntes de pensamento que oferecem paradigmas opostos para o Direito, como modelos
puros: o Jusnaturalismo e o Positivismo. (BARROSO, 2006).
Para uma melhor compreensão da figura jurídica da Judicialização é importante
revisitar os modelos paradigmáticos dos Estados Constitucionais desenvolvidos e aplicados ao
longo dos períodos moderno e contemporâneo.
Os pensamentos de Montesquieu (1996) “O espírito das leis” e de Locke (1998)
“Dois tratados sobre o governo civil” foram os maiores contributos teóricos para a formação
do Estado Liberal que teve por fundamentos a separação dos poderes, a teoria do império das
leis e dos princípios norteadores dos direitos fundamentais.
Esse modelo paradigmático estabelecia, ao Estado não interventor, o devido controle
das relações sociais pela força coercitiva da lei, expressando entendimento do Direito como
norma legal, compreendida em um sistema normativo. Rompeu com o modelo feudal no
sentido de considerar o homem como sujeito de direitos, dotado de liberdade, igualdade
perante a lei, criando a tutela jurisdicional, os direitos políticos etc.
A base essencial desse paradigma foi estabelecer uma ordem política, isto é, manter o
controle político da sociedade mediante a aprovação de um estatuto jurídico- político, a Carta
Constitucional. Assim, tendo na lei o fundamento da ação do Estado, coube ao Poder
Legislativo a supremacia entre os poderes, por ser detentor da produção normativa. Ao Poder
Judiciário, a incumbência da tarefa específica da aplicação da lei, atendendo ao sentido literal
da norma, restringindo qualquer tipo de interpretação. Ao Poder Executivo, a implementação
do direito legislado.
A realidade demonstrou que todo aparato constitucional garantidor de direitos não foi
suficiente para alcançar a massa populacional que se viu massacrada pela exploração do
trabalho e desprovida dos meios de sustento e dignidade de vida, fatos geradores de diversos e
seguidos movimentos sociais.
A crise do liberalismo impôs uma reavaliação paradigmática do modelo do Estado
Constitucional, frente a situações econômicas graves e que permeavam os segmentos sociais
provocando extraordinários prejuízos. Nesse vale de incertezas, geradas pelo capitalismo em
______________
4
Leitura Principiológica – utilizado no direito como a forma de se proceder a leitura da norma jurídica pelos
princípios adotados pela constituição.
42
sua prática gestada pela política liberal é que surgiu o Estado Social de Direito, demandando a
criação dos direitos denominados de 2º geração, (Direitos Coletivos e Sociais).
Habermas (1997) analisa esse momento como a busca da materialização dos direitos
de 1ª geração (Direitos Fundamentais) e a implementação dos novos direitos refletidos na luta
por igualdade.
Nas figuras do Bem-Estar Social, ou Social de Direito, o Estado passou a exercer
novas atribuições de intervenção na economia e na sociedade. No campo do Direito
desenvolveu-se uma reinterpretação ao configurar regras e princípios, associando o valor à
norma. Ao juiz foi estendida a possibilidade interpretativa da lei (análise teleológica,
sistêmica e histórica), deixando de ser mero aplicador mecânico da lei, para tornar-se seu
intérprete.
Novas rupturas ocorreram provocando uma nova crise do sistema capitalista, que
culminou por levar à exaustão o paradigma do Estado do Bem-Estar Social. No redesenho
desenvolvido foi exigida uma nova configuração do Estado Constitucional. Os movimentos
sociais travaram lutas em busca de uma posição alternativa ao Estado Social, frente aos
problemas gerados pela alteração nos processos do modo de produção capitalista.
Surgiram nesse momento de crise os direitos de 3ª geração (Direitos Difusos) e
evoluiu a acentuação interpretativa dos direitos de primeira e segunda gerações, culminando
com a pactuação impositiva de um novo modelo de Estado Constitucional denominado Estado
Democrático de Direito.
Se no Estado do Bem-Estar Social a prevalência entre os poderes esteve com o Poder
Executivo, no Estado Democrático de Direito a participação do Poder Judiciário foi ampliada
como forma de legitimação da nova figura paradigmática de Estado.
Finalmente, o Direito consegue um reencontro com a moral a partir da ruptura da
estrutura jurídica com o positivismo normativista Kelsenniano e a conseqüente transformação
processada no ordenamento jurídico, elevando-se regras e princípios à posição normativa
hegemônica.
Habermas (1997, p. 246) recomenda que: “Os julgamentos dos juízes que decidem
um caso atual devem levar em conta o horizonte de um futuro presente, fincados na validade à
luz de regras e princípios legítimos, uma vez que as decisões judiciais, do mesmo modo que
as leis são criaturas da história e da moral.”
O que se tem mostrado é a aplicação de princípios adequados à situação fática
apresentada, segundo a realidade que envolve o caso em julgamento, como forma de ajustar
43
aos casos difíceis uma nova dogmática de interpretação constitucional necessária à melhor
aplicação do Direito para obtenção da Justiça.
Dentro de novos parâmetros estabelecidos pelo Estado Democrático de Direito abriu-
se uma nova dogmática de interpretação constitucional, pois, as normas constitucionais
passaram a ser dotadas de imperatividade, que é atributo de todas as normas jurídicas e, frente
a sua inobservância, o deflagrar dos mecanismos próprios da coação, o cumprimento pela
força. (BARROSO, 2006).
Essa transição paradigmática se deu a partir do pós-guerra, criando uma conceituação
pós-positivista do Direito, na qual, a ética foi estabelecida como eixo estrutural alicerçado em
valores e princípios historicamente produzidos.
O pós-positivismo abriu caminhos para o debate sobre a Justiça agora conduzida sob
os alicerces da esteira do ativismo judicial, que se desenvolveu sob três vertentes: o
substâncialismo, o procedimentalismo e o pragmatismo.
Esses movimentos, considerados como modelos de interpretação constitucional,
provocaram uma alteração substancial no sistema operacional da Justiça que transitou do
formalismo, no qual se encontrava encapsulada, para o pragmatismo que a aproxima da
realidade na qual se encrava o caso concreto levado a julgamento.
Para adequação do sistema judicial à esse novo momento foi necessária a construção
de novas formas de interpretação que se identificam como uma espécie de criação normativa,
demonstrando com isso que o positivismo jurídico não consegue mais responder às
necessidades reais pautadas no cenário social, fato a impor o surgimento de novos aparatos de
julgamento para atender ao Estado Constitucional de Direito.
Pode-se afirmar que a judicialização dos conflitos políticos provocou uma
reestruturação do processo judicial brasileiro, pois o juiz deixou de ser servo da lei em sua
aplicação processual, para ser o seu intérprete, mediante o uso das lentes dos princípios,
diretrizes e valores estabelecidos pela Constituição Federal de 1988, agora sob a forma de
norma jurídica, razão inequívoca da concessão de maior liberdade, arbítrio e
discricionariedade5 à atividade jurisdicional construtiva.
Alguns estudos desenvolvidos no Brasil têm considerado o Judiciário Ativista como
um caminho para as minorias. Nesse sentido, pontuam a dissertação de mestrado de Olsen,
______________
55
Discricionariedade - É a qualidade do poder discricionário. Traduz-se em apresentar o poder que é conferido à
Administração Pública para agir livremente, ou seja, sem estar vinculada à determinada conduta, desde que aja
dentro dos limites legais e em defesa da ordem pública. Tal poder assegura a posição de supremacia da
Administração Pública sobre o particular.
44
de que tais leis e direitos freqüentemente são muito vagos, fluidos e programáticos, mostra-se
inevitável alto grau de ativismo e criatividade do juiz chamado a interpretá-los”.
Ao discutir o grau de criatividade dos juízes, afirma:
Trata-se [...] de problema que não pode se resolver com um claro sim ou não à
criatividade dos juízes. Tal criatividade, ou, para ser mais preciso, alto grau de
criatividade, pois bem vimos como se trata essencialmente de problema apenas de
natureza quantitativa, pode ser benéfica ou maléfica, segundo as muitas
circunstâncias contingentes, de tempo e lugar, de cultura, de necessidades reais de
determinada sociedade, circunstâncias, de mais a mais, de organização e estrutura
das instituições e, não por último, dos tipos de magistratura que exercem tal
criatividade (CAPELLETTI, 1993, p. 92).
Garapon (1999) desenvolve suas considerações sobre o ativismo judicial em sua obra
“Juiz e a Democracia”, compreendendo-o como um processo de mudança social provocado
pelo enfraquecimento do Estado frente às imposições do mercado e pelo desmoronamento
simbólico do homem e da sociedade democrática. Afirma que a expansão jurídica ocorrida de
forma acelerada não é conjuntural, mas ligada às sociedades democráticas.
Lieberman (1981) declara que a explosão do número de processos não é um
fenômeno jurídico, mas social, sendo originado pela depressão social que se tem reforçado
pela expansão do Direito.
Garapon (1999) considera que os laços sociais anteriores foram rompidos, como a
Família, a Igreja, o Estado provedor, surgindo, em substituição, um processo de
contratualização das relações sociais regulando a vida humana. Compreende o autor que
outros fatos deram causa à ampliação do poder judicial como a derrocada do mundo
socialista, extinguindo a bipolarização geopolítica do mundo, o que significou uma
desvalorização simbólica do mundo político, permitindo que o poder fosse expandido além
fronteiras de forma transnacional a exigir regulamentações por organismos internacionais.
Igualmente, o autor assegura que a judicialização tem como uma de suas causas a
jurisdicização das relações sociais efetuada pelo mundo político. Reduziu-se a mobilização
social dando lugar ao debate judiciário para o desenvolvimento da luta social.
nos fatos sendo que nesse caso ocorre a dissolução do normativo na multiplicidade de
decisões.
Hermes – representa o foco na Hermenêutica, com a multiplicidade de atores
jurídicos e políticos em um entrelaçamento sistemático de funções institucionais, ações
jurídicas complexas, visando à realização de programas diversos. Fica definido o direito
líquido que se põe nas diversas situações ocupando os espaços disponíveis e suportando fortes
compressões, portanto, uma racionalidade discursiva e argumentativa a reporesentar uma
imbricação entre Ética e Direito como suportes da nova legitimação.
Vianna (2002) destaca que a cidadania social se fortalece com o processo de
judicialização frente às perspectivas de liberdade e igualdade, na qual, no plano político,
atende aos objetivos da cidadania e no plano jurídico-social ao sujeito de direitos.
Compreende o autor a necessidade de vencer três desafios: Fazer do Direito uma
filosofia da práxis fundada em valores sócio-históricos; Fazer o Direito expressar a vida do
povo, tanto na legislação como nas sentenças; Fazer o Direito ser capaz de manter a unidade
republicana e, ao mesmo tempo, responder às questões sociais emergentes.
A hegemonia do Poder Judicial nas principais questões da sociedade tem gerado um
sensível aumento dos conflitos jurídicos, implicando em substanciais alterações que
impuseram novas necessidades ao Poder Judiciário. Pode ser assinalado o aumento das
demandas, maior congestionamento processual e a ampliação das necessidades do próprio
poder.
O argumento justificatório da ampliação do campo da judicialização no Brasil é o da
adequação à globalização como causadora de novos conflitos em decorrência de novos
direitos, diferentemente de alguns países que vêm trabalhando em direção inversa.
Defendendo uma posição contrária à excessiva judicialização, Melo (2001, p. 06) vê
com pessimismo a inserção do judiciário nas múltiplas questões políticas e sociais, afirmando:
“[...] saímos da ditadura da farda e entramos na ditadura da toga, onde o cidadão é
transformado em vassalo do arcaísmo jurídico.”
Chrispino, A.; Chrispino, R., (2008, p. 23), em seu artigo “Judicialização das
Relações Escolares”, apontam que os indivíduos e as instituições comunitárias estão ligados
por força das circunstâncias de lutas realizadas e em realização e das informações alcançadas
no travar dessas lutas, o que têm proporcionado, na vivência do cotidiano, o conhecimento
dos seus direitos e a forma de buscar na justiça os seus reconhecimentos:
52
Com o surgimento dos novos direitos sociais e coletivos, ocorreu uma redução do
chamado Poder Discricionário6 do Executivo, transferindo-o para o espaço das decisões do
Judiciário, na medida em que a forma de apreciação dos novos direitos pela Constituição da
República de 1988 outorgou ao juiz a possibilidade de analisar a realidade jurídica dando
interpretação criativa à lei.
Retornando um pouco no tempo pode-se afirmar que o surgimento da modernidade
proporcionou a primazia do político, acentuada com a inculcação da igualdade apontada no
contrato social russeauniano no sentido de considerar o homem como bom por natureza,
retratado como altruísta, piedoso, virtuoso, aquele que se despe do seu individualismo em prol
do todo que é a instituição estatal, rotulada como importante e necessária para a evolução da
sociedade.
De fato, o capitalismo, em suas necessidades relacionais, buscou o sujeito ideado
pelo modernismo russeauniano, especialmente pela ocorrência/imposição da naturalização da
obediência como condição para tornar-se um sujeito social, sentimento que caracterizou e
transformou o homem em um sujeito domesticado, obediente, resignado e conformado,
portanto, útil à produção.
Nas relações sociais a regra jurídica determinou condutas e comportamentos
subjugando os sujeitos dessas relações, fato determinante para ser instalado o processo de
alienação processada em um primeiro plano no campo do exercício da atividade laborativa
nas condições a si impostas e determinadas frente à necessidade de sobrevivência e, em um
segundo plano, pela aceitação da figura da democracia representativa nos processos de
decisão das questões políticas, que se caracteriza pela transferência dos direitos do cidadão.
A representação política é a marca do pensamento liberal cunhado no pensamento
igualitarista, uma espécie de projeto moderno elaborado por Hegel em sua obra Lições sobre a
Filosofia da História Universal (1837), na qual, a liberdade consiste somente em saber e
querer objetos universais, substanciais, como o Direito e a Lei, produzindo uma realidade que
lhes é conforme o Estado, limitando a liberdade nos limites do ente estatal.
______________
6
Poder discricionário é o que o direito concede ao administrador público de modo explícito ou implícito, para a
prática de certos atos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade ou conteúdo. À luz desse
conceito, convém desde logo esclarecer que poder discricionário não se confunde com poder arbitrário.
Discricionariedade e arbítrio são atitudes inteiramente distintas: discricionariedade é liberdade de ação
administrativa, dentro dos limites permitidos em lei; arbitrariedade é ação contrária ou excedente da lei. Ato
discricionário - quando autorizado pelo direito - é legítimo e válido; ato arbitrário é sempre e sempre ilegítimo e
inválido. Daí a advertência de Jèze: «Il ne faut pas confondre pouvoir discrétionnaire e pouvoir arbitraire»
(«Droit Administratif», 1914, 1/371). (MEIRELLES, 1972, p. 287).
54
O Estado Liberal, edificado sob o pilar mestre dos direitos individuais, ancorado no
desenvolvimento da economia industrial e alicerçado na lição iluminista da lei, teve como
base para a estruturação da sociedade moderna o ordenamento jurídico e seu regramento
(códigos e constituições), formando nesse bojo de regras jurídicas, representações de oferta de
paz social, na verdade, atendendo diretamente aos interesses da burguesia em contraposição
ao absolutismo.
O nascimento do Estado Liberal Constitucional, de marca positivista, se deu sob o
signo do consentimento das pessoas com a adoção do pensamento das liberdades, garantias,
direitos e igualdades, dentro de um extenso formalismo, contrapondo ao ancien régime, que
se caracterizava por seus privilégios. Na verdade, a contraposição anunciada representou
novas estratégias com as mesmas pretensões – domínio do saber investido por relações de
poder.
O Estado Moderno garantidor da livre atuação do mercado acabou por afogar o
sujeito de direitos num imenso lago de contradições, notadamente, quanto aos princípios
inseridos nas declarações de direitos frente à uma realidade capitalista adversa. Nesse sentido
reforça-se o discurso do direito.
Os pensamentos de liberdades, garantias, direitos e igualdades, nasceram com o
Estado Moderno e promoveram a alteração da relação entre Estado e cidadão, a partir das
mediações do capital, como afirma Bobbio (1992, p. 3):
O movimento de lutas por direitos pode ser representado pela Revolução Mexicana
(1910), pela Constituição de Weimar na Alemanha (1919) e pela criação da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), no entanto, é na pós II Guerra Mundial que o tema dos
direitos humanos passou a ser efetivamente incluído na agenda de discussões e ações
positivas, concretizados na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), aprovada na
terceira sessão ordinária da Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Embora de revelada importância em seus conceitos, padeceu de uma eficácia maior pelo seu
caráter restritivo de recomendação, sem cunho obrigacional aos países.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos proclamou em seu texto o direito à
educação no artigo XXVI ao afirmar: “[...] toda pessoa tem direito à instrução”. É essa a
definição de uma posição política universalizante adotada e expandida pela atuação da
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), criada
em 16 de novembro de 1945.
No entanto, cedo ficou demostrada a ineficácia do teor da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, o que gerou insatisfações, questionamentos e proposições no sentido de se
instituir movimentos internacionais que pudessem ser validados por proposituras claras pelos
direitos humanos, mas, a bem da verdade, traduziu-se em um jogo de forças mediado pelo
sistema capitalista com seu poder de influência e determinação.
Uma das primeiras medidas nesse sentido foi a elaboração e aprovação do “Pacto
Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais”, em 16 de dezembro de 1966, que
consagrou a segunda geração dos direitos humanos, porém, com aplicação gradativa, tanto
que somente 10 (dez) anos mais tarde é que se pode dizer que tenha entrado em vigor.
O Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais destacou os
seguintes direitos:
A. Ao trabalho;
B. À remuneração eqüitativa e que proporcione ao trabalhador e sua família
“condições dignas de existência”;
C. À previdência social;
56
Dessa forma, o Estado Democrático de Direito, desde seu nascimento convive com o
neoliberalismo de regulação, compreendido por Souza (2008), “Questões polêmicas de
Direito Econômico”, como uma graduação no modo de conduzir a política econômica:
Nesse sentido, Barroso (2003, p. 291) assegura: “Pelo contrário, apenas deslocou-se
a atuação estatal do campo empresarial para o domínio da disciplina jurídica, com a
ampliação do seu papel na regulação e fiscalização dos serviços políticos e atividades
econômica”.
O que diferencia a reforma de Estado no Brasil frente ao que representava o Estado
Mínimo, é a interposição do sistema de “regulação” denominado “neoliberalismo de
regulação” e não mais de “regulamentação”, mecanismo que favoreceu o uso de poderes de
interveniência no campo político pelo Poder Judiciário.
Nasce assim o século da judicialização com novas mudanças na dinâmica funcional
do sistema de controle da sociedade, agora representada pelo ativismo jurídico, pela
jurisprudência sociológica e pelo realismo legal.
Esse agir do ente estatal (Poder Judiciário) exige reflexões que permitam
compreender as condições de surgimento e manutenção desse fenômeno jurídico-político,
além de poder antever ou prever as conseqüências do agir da maquinaria estatal e detectar
seus variados aspectos.
O movimento discursivo notado nos segmentos sociais e nos apontamentos
acadêmicos indica a existência de grupos de concordância de um lado e grupos de contestação
de outro, pois tal acontecimento (judicialização), que tem seu comando maior na “[...]
interpretação de acordo com a constituição [...]”7, provocou e continua despertando
questionamentos da sociedade por seus segmentos atingidos diretamente por seus efeitos.
Junqueira (1996) analisa a exclusão da população dos bens sociais e a reorganização
da sociedade a partir da criação de instituições e movimentos sociais para garantia de direitos
e explicita:
______________
7
Interpretação de acordo com a constituição - Interpretação da lei segundo princípios, regras ou dispositivos da
Constituição Federal.
58
[...] ainda que durante os anos 80 o Brasil, tanto em termos de produção acadêmica
como em termo de mudanças jurídicas também participei da discussão sobre os
direitos coletivos e sobre a informalização das agencias de resolução de conflitos,
aqui estas discussões são provocadas não pela crise do Estado do bem-estar social,
como acontecia nos países centrais, mas sim pela exclusão da grande maioria da
população de direitos sociais básicos, entre os quais o direito à moradia e à saúde.
[...] tratava-se fundamentalmente de analisar como os movimentos sociais e suas
demandas por direitos coletivos e difusos, que ganham impulsos com as primeiras
greves do final dos anos 70 e com o início da reorganização da sociedade civil que
acompanha o processo de abertura política, lidam com um Poder Judiciário
tradicionalmente estruturado para o processamento de direitos individuais.
(JUNQUEIRA, 1996, P. 390-391)
A crise que se abate sobre o arcabouço jurídico tradicional está perfeitamente em sintonia com o esgotamento e
as mudanças que atravessam os modelos vigentes nas ciências humanas. Adverte-se que as verdades metafísicas
e racionais que sustentaram durante séculos as formas de saber e de racionalidade dominantes, não mais
mediatizam as inquietações e as necessidades do presente estágio da modernidade liberal-burguês-capitalista. Os
modelos culturais, normativos e instrumentais que justificam o mundo da vida, a organização social e os critérios
de cientificidade tornaram-se insatisfeitos e limitados, abrindo espaço para se repensar padrões alternativos de
referência e legitimação. Isso, transposto para o jurídico, nos permite consignar que a estrutura normativista do
moderno direito positivo estatal é ineficaz e não atende mais ao universo complexo e dinâmico das atuais
sociedades de massa que passam por novas formas de produção do capital, por profundas contradições sociais e
por instabilidades que refletem crises de legitimidade e crises na produção e aplicação da justiça.
VOLKMER (2005)
comportamentos e invadir o cotidiano social, provocar uma ruptura dos valores e dissimular,
pela escolta da moral, uma democracia sem liberdade.
São fatos que fazem surgir interrogações quanto ao uso que se tem feito da ciência;
são situações que exigem um rastreamento analítico que se desenvolva por um processo
operacional de crítica aos movimentos desencadeados sob o predomínio do paradigma
científico que impõe valores e comportamentos e comandam o domínio sobre a natureza, as
coisas e os homens, em um acasalamento do capital e ciência, geradores de novos dogmas e
autoritarismos.
Santos (2000, p. 292), ao assegurar que a modernidade considerou a ciência e
tecnologia como guias para o conhecimento desprovido de limites éticos, questiona a relação
entre a racionalidade econômica e a racionalidade técnico-científica:
iluminista instituidor do ideal científico como crença na autonomia da razão no mundo, capaz
de exercer força criativa com seus poderes emancipadores.
O Iluminismo de inspiração de Immanuel Kant (1724-1824) e Jean-Jacques
Rousseau (1712-1778) abarcou três aspectos diversos, mas relacionados entre si:
1. Crítica sem restrição ao conhecimento e crença;
2. Tudo deve passar pelo filtro da razão; e,
3. Auto-correção do conhecimento (correção por si só). O conhecimento como via
do progresso e superação das desigualdades sociais.
Essa visão de conhecimento plantada na modernidade permitiu que o saber técnico
fosse adotado como domínio no qual o homem, as coisas e o mundo são tidos como meros
instrumentos para se atingir os fins propostos: o controle sobre a natureza e sobre a sociedade.
Adorno e Horkheimer (1985) confirmam o caráter repressivo do conhecimento
científico, que, na procura de livrar o homem do medo das potências míticas, terminou por
moldar o desenho de um projeto civilizatório em que a racionalidade do capitalismo o tornou
peça descartável, lançado na bandeja da balança do produtivo ou não produtivo.
Todo esse aparato teórico-prático possibilitou a arquitetura de novos mecanismos de
controle e dominação acelerando, na contemporaneidade, a exasperação da competitividade
nas relações entre os homens, o que culminou por colocar o outro como permanente ameaça,
fulminando princípios e valores.
Afirmam Horkheimer e Adorno (1985, p. 34-35):
mediante o exercício de uma reflexão crítica sobre a realidade empírica. Pensar o mundo
contemporâneo frente à naturalização da conjunção do saber, poder e sujeito, como invenção
da modernidade paginada por opressões, coerções, jogos e regras invisíveis e anônimas que
normalizam a própria vida.
Ementa:
______________
8
Entendimento doutrinário - compreensão técnica-teórica do direito
9
Para melhor entendimento da expressão jurídica “julgados”, colhe-se publicação do Código de Processo Civil
Comentado: Em sede doutrinária, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery lecionam que “o devedor
deve ser intimado para que, no prazo de quinze dias a contar da efetiva intimação, cumpra o julgado e efetue o
pagamento da quantia devida. A intimação do devedor deve ser feita na pessoa de seu advogado, que é o modo
determinado pela Reforma da L 11232/05 para a comunicação do devedor na liquidação de sentença e na
execução para cumprimento da sentença.” (in Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante,
Editora Revista dos Tribunais, 9ª edição, p. 641 (grifo meu).
67
______________
10
Ordenamento Jurídico - conjunto hierarquizado de normas jurídicas que disciplinam coercitivamente as
condutas humanas, com a finalidade de buscar harmonia e a paz social.
11
Efetividade do direito - aplicação concreta da norma jurídica no mundo real.
68
O que a doutrina tem entendido é que para o direito ser aplicado é necessário o
provimento de recursos materiais, técnicos e pessoais, o acesso físico e econômico e a
aceitação nos planos ético, cultural e individual. Tais condições se resumem em três critérios:
disponibilidade, acessibilidade e qualidade, sem os quais se torna impossível alcançar a
efetividade do direito à educação.
Não basta a mera inserção do direito nos documentos legais e constitucionais para se
concretizar a existência fática desse direito no mundo real.
Quanto aos critérios acima relacionados: Disponibilidade - capacidade de prover
recursos materiais, físicos e humanos necessários ao cumprimento de um direito;
Acessibilidade - possibilidade de acesso físico e econômico e não discriminação, e Qualidade
- aceitabilidade ética, cultural e individual, o legislador constituinte demonstrou preocupação,
tanto que, limitado às competências a si impostas, exauriu a tarefa legiferante12 ao deixar
expresso o caráter de auto-aplicabilidade do direito à educação estabelecido no §1º do Art.
208, da Constituição Federal (1988) que afirma: “[...] o acesso ao ensino obrigatório e gratuito
é direito público subjetivo”.
Em que pese todos os percalços existentes no caminho para a efetividade do direito à
educação, não se pode negar a relevância desse dispositivo legal, como destaca Horta (1998,
p. 7-8),
______________
12
Tarefa legiferante - processo de criação de leis.
69
Pode-se hoje, com uma certa dose de tolerância, reconhecer que o direito universal
de entrada no sistema escolar está tendencialmente concretizado no Brasil.
Inversamente, o maior déficit em matéria de direito à educação consiste na falta de
garantias concretas quanto à saída do sistema escolar. [...] o baixo nível dos
70
Entende o mencionado autor que ainda faltam garantias concretas à saída do sistema
escolar, fato determinante para a persistência da ocorrência dos fenômenos como o fracasso
escolar, o retardo escolar, a evasão escolar e o iletrismo.
O processo de saída, analisado como a possibilidade de todos os alunos concluir o
curso, permite ainda pontuar outros fenômenos que impedem a continuidade, o seguimento
dos estudos e a sua conclusão. É importante abordar no que se reporta a ausência de garantia à
saída do sistema escolar a ocorrência do fenômeno da produção do delinqüente socio-
pedagógico, assim entendido os alunos que ostentam a violência no meio social e escolar, em
decorrência da própria vivência intra-instituição.
O delinqüente, assim “tatuado” por grupos sociais, pode ser alguém de personalidade
voltada à delinqüência de gênese estrutural e/ou conjuntural. Se portador de uma doença
crônica (gênese estrutural) frente à ausência de conhecimento familiar da patologia pode ser
levado a práticas de violência ante a ausência de ações devidamente planejadas e incorporadas
ao cotidiano institucional escolar para solucionar o problema. Em outra situação, a evolução
patológica com piores conseqüências pode ser provocada quando ao sujeito for oportunizado
associar-se a movimentos de grupos (gangues), (gênese conjuntural).
Todo esse processo está sendo vivenciado pelos estabelecimentos de ensino, no
Brasil e no mundo, fenômeno, portanto de característica conjuntural e que não pode ser
menosprezado quanto a análise do processo de saída.
Arregi Goenaga (1998, p. 58-59, grifo do autor), registra a produção pedagógica do
delinqüente, afirmando:
É preciso buscar as raízes nos perseguidores e não nas vítimas, assassinadas sob os
pretextos mais mesquinhos. Torna-se necessário o que a esse respeito uma vez
denominei inflexão em direção ao sujeito. É preciso reconhecer os mecanismos que
tornam as pessoas capazes de cometer tais atos, é preciso revelar tais mecanismos a
72
eles próprios, procurando impedir que se tornem novamente capazes de tais atos, na
medida em que se desperta uma consciência geral acerca destes mecanismos. Os
culpados são unicamente os que, desprovidos de consciência, voltaram contra
aqueles o seu ódio e sua fúria agressiva. É necessário contrapor-se a uma tal
ausência de consciência, é preciso evitar que as pessoas golpeiem pra os lados sem
refletir a respeito de si próprias. A educação tem sentido unicamente como educação
dirigida a uma auto-reflexão crítica. Contudo, na medida em que, conforme os
ensinamentos da psicologia profunda, todo caráter, inclusive daqueles que mais
tarde praticam crimes, forma-se na primeira infância, a educação que tem por
objetivo evitar a repetição precisa se concentrar na primeira infancia. (ADORNO,
1995, p. 121-122).
[...] deve ter por escopo o oferecimento de condições para o desenvolvimento pleno
de inúmeras capacidades individuais, jamais se limitando às exigências do mercado,
pois o ser humano é fonte inesgotável de crescimento e expansão no plano
intelectual, físico, espiritual, moral, criativo e social.
Em que pese toda a importância dos direitos sociais, auferidos pelo movimento
constituinte a partir de 1987 na história brasileira e que se traduziu na construção de uma
Carta Constitucional Social, emblemática e representativa, e a existência formal do direito
social educacional de importância teórica doutrinária indiscutível, a realidade brasileira
somente obterá diferenças positivas para consolidar esses ganhos se o Estado estabelecer
prioridades criando políticas públicas efetivas.
Eis aí o grande enigma do direito à educação, pois, não obstante seja componente de
uma norma constitucional revestida de condições de garantia de exigibilidade, conforme
expressa o texto normativo, é inegável que a fruição desse direito tem sido retardada ou
impossibilitada em sua plenitude por fatores que precisam ser identificados e dimensionados.
Até aqui buscamos fazer uma pré-análise do direito à educação em sua importância
como direito público subjetivo apontando a hipótese de sua não concretização no mundo real,
a partir de interrogações pontuais quanto a inocorrência da efetividade plena.
A Judicialização da educação tem sido conceituada e defendida como a aplicação das
normas jurídicas que integram o ordenamento jurídico brasileiro, e que estão dispostas nos
estatutos jurídicos visando o cumprimento do direito à educação, portanto, para dar
efetividade real à norma constitucional.
Essa compreensão enfatiza a importância de, nesta investigação, tecer e responder
indagações quanto à figura da norma em sua formulação e efeitos, procurando auscultar as
influências e determinações da sua edificação e compreender o movimento percorrido na
história dos povos até sua adoção como regra aceita e aplicada em todos os campos da
sociedade moderna.
Considerando a norma como a fixação de um “dever ser”, por ela, pode-se delinear
um dos caminhos da averiguação da entrada do indivíduo no campo do saber da
judicialização, explicitando a dinâmica sócio-política dos acontecimentos. As ciências
humanas em seus princípios, preceitos, regulamentos, prescrições e regras, compõem um
esquadrinhamento dos processos de escrita e de registro, que se organizaram como
75
Assim sendo, a escola, uma criação da sociedade moderna, difundida como uma
instituição objetivada à formação para a cidadania e liberdade, a bem da verdade, foi ideada,
planejada e organizada como uma instituição de seqüestro, escapando da promessa de uma
razão iluminista para tornar-se um fenômeno de inclusão por exclusão, pois o fim pretendido
se vê marcado pela normalização como instrumento de controle.
76
Vejamos o que nos diz Foucault (2005, p. 115) a respeito dos aparelhos, das redes de
seqüestro:
Para que servem essa rede e essas instituições? Podemos caracterizar a função
destas instituições da seguinte maneira. Primeiramente, estas instituições-
pedagógicas, médicas, penais ou industriais – têm a propriedade muito curiosa de
implicarem o controle, a responsabilidade sobre a totalidade, ou a quase totalidade
do tempo dos indivíduos; são, portanto, instituições que, de certa forma, se
encarregam de toda a dimensão temporal da vida dos indivíduos. (FOUCAULT,
2005a, p. 115).
possibilidade de conseguir alcançar a inclusão aos bens sociais. Certificação nesse sentido tem
sido demonstrada por Cury (2002, p. 253):
[...] o direito à educação como direito declarado em lei, é recente e remonta ao final
do século XIX e início do século XX. Mas seria pouco realista considerá-lo
independente do jogo das forças sociais em conflito. Tanto a ampliação dos direitos
civis e políticos como a inserção de direito sociais não são apenas uma estratégia das
classes dirigentes que aí teriam descoberto, na solução coletiva, diversas vantagens
que o anterior sistema de autoproteção não continha. [...] Esses direitos são também,
produtos dos processos sociais comandados pelos segmentos da classe trabalhadora,
que viram neles um meio de participação na vida econômica, social e política.
(CURY, 2002, p. 253).
A proteção dos direitos sociais se faz por intervenção ativa do Estado, que é
condenada ao se falar de proteção dos direitos de liberdade. Enquanto os direitos de
liberdade nascem contra o superpoder do Estado - e, portanto, com o objetivo de
limitar o poder -, os direitos sociais exigem, para sua realização prática, ou seja, para
a passagem da declaração puramente verbal à sua proteção efetiva, precisamente o
contrário, isto é, a ampliação dos poderes do Estado. Também, ‘poder’, como de
resto, qualquer outro termo de linguagem política, a começar pela “liberdade”, tem
conforme o contexto, uma conotação positiva e outra negativa. O exercício do poder
pode ser considerado benéfico ou maléfico, segundo os contextos históricos, e
segundo os diversos pontos de vista a partir dos quais esses contextos são
considerados. Não é verdade que o aumento da liberdade seja sempre um bem, ou o
aumento do poder seja sempre um mal. (BOBBIO, 1992, p. 72).
82
O saber do direito à educação não se mostra como algo dado em definitivo, mas uma
construção decorrente das imposições e condições políticas, econômicas, sociais e
institucionais, em permanentes lutas nesses domínios de saber, sempre em conflitos, como
algo em constante produção. São ordens de verdades momentâneas decorrentes de interesses
lançados no jogo daquilo que é atendido ou contrariado.
O Poder Judiciário pela Suprema Corte conforme julgamento realizado no ano de
2005 registrou entendimento em seu julgamento quanto à exigibilidade judicial do direito à
educação, firmando posição favorável à força decorrente de decisão do Juízo. Em sede de
Recurso Extraordinário14 determinou que crianças até seis anos de idade, terão atendimento
em creche e em pré-escola, como direito assegurado pelo próprio texto constitucional
(Constituição Federal Artigo 208, IV), sendo o direito à educação dever jurídico cuja
execução se impõe ao poder público, notadamente do município (Constituição Federal, art.
211, § 2º).
A Excelsa Corte asseverou ser inquestionável que a prerrogativa de formular e
executar políticas públicas cabe ao Poder Legislativo e Executivo, no entanto, declara ser
possível ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, a implementação
de políticas públicas definidas pela própria Constituição, nos casos de descumprimento pelos
órgãos públicos dos encargos político-jurídicos e quando a omissão comprometer a eficácia e
a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional.
O Ministro Relator, por seu relatório e voto, em rigorosos argumentos deixou
explicita a posição da Excelsa Corte quanto ao sentido da legitimidade constitucional do
controle e da intervenção do Poder Judiciário em tema de implementação de políticas públicas
consequentes e responsáveis, o que pavimenta a via executiva dos direitos à educação, mas
não completa a construção do caminho necessário para a sua plena efetivação.
Eis manifesto no plano jurídico o entendimento da necessidade e importância da
educação como fator de mudança social, tanto que as maiores críticas à Constituição Federal
de 1967 e Emenda Constitucional, nº 01, de 17 de outubro de 1969, foram versadas no sentido
______________
14
Recurso Extraordinário 436.996, São Paulo. Relator Ministro Celso de Mello, recorrente: Ministério Público
de São Paulo, recorrido: Município de Santo André.
84
São os casos da conduta tipificada como ilícito penal (delito de abandono intelectual,
crimes de responsabilidade, crimes de improbidade), como infração administrativa (ausência
de comunicação ao Conselho Tutelar sobre maus tratos) e como infração disciplinar ou de
natureza funcional.
Além disso, a implantação de espaços institucionais surgiu como estratégias e
mecanismos de sustentação para a defesa da criança e do adolescente abarcando o Poder
Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho de Direitos da Criança e do
Adolescente e o Conselho Tutelar.
Cury e Ferreira (2009, p. 33) descrevendo o direito à educação, propiciado pela
Constituição Federal de 1988, em sua condição de efetividade, apontam a importância dos
instrumentos jurídicos disponibilizados:
Esta versão legal do direito à educação, dentro desse conjunto, não se mostrava
presente nas constituições passadas, e por conseqüência, no ordenamento jurídico
vigente. Até então, tínhamos boas intenções e proteção limitada com relação à
educação, mas não uma proteção legal, ampliada e com instrumentos jurídicos
adequados à sua efetivação. (KOZEN, 1999, p. 659 ‘Até a vigência da atual
Constituição Federal, a educação, no Brasil, era havida, genericamente, como uma
necessidade e um importante fator de mudança social, subordinada, entretanto, e em
muito, às injunções e aos acontecimentos políticos, econômicos, históricos e
culturais. A normatividade de então limitava-se, como fazia expressamente na
Constituição Federal de 1967, com a redação que lhe deu a Emenda Constitucional
n. 01, de 17 de outubro de 1969, ao afirmar a educação como um direito de todos e
dever do Estado, com a conseqüente obrigatoriedade do ensino dos 7 aos 14 anos e a
gratuidade nos estabelecimentos oficiais, restringindo-se, quanto ao restante,
inclusive na legislação ordinária, a dispor sobre a organização dos sistemas de
ensino. Em outras palavras, a educação, ainda que afirmada como um direito de
todos, não possuía, sob o enfoque jurídico e em qualquer de seus aspectos,
excetuada a obrigatoriedade da matrícula, qualquer instrumento de exigibilidade,
fenômeno de afirmação de determinado valor como direito suscetível de gerar
efeitos práticos e concretos no contexto pessoal dos destinatários da norma’.
E é somente nessas relações de luta e de poder - na maneira como as coisas entre si,
os homens entre si se odeiam, lutam, procuram dominar uns aos outros, querem
exercer, uns sobre os outros, relações de poder – que compreendemos em que
consiste o conhecimento.
A discussão da efetividade do direito está no plano das lutas, das relações de poder,
dos processos de constituição dos saberes, o que sinaliza a existência de dispositivos de
controle tais a impossibilitar a transposição do plano normativo teórico para o plano das
práticas educativas e sociais.
Não se pode desconsiderar que a racionalidade iluminista cooptada pelo capital tem
sido também espaço para constituição de subjetividades e socialização, a serviço de um
sistema que não beneficia ao todo social. O direito à educação tem sido subordinado à lógica
do mercado, como de sorte toda prática política, econômica, social e cultural, na medida em
que os valores econômicos mostram-se como fundamentos da sociedade moderna e
contemporânea.
Assim, haverá sempre uma dependência do jogo do capital, e nele o direito à
educação, compreendido como um dos mais importantes processos para consolidação de um
Estado Democrático de Direito, ainda não se mostra palpável nas práticas sociais e educativas,
mesmo considerando os inúmeros recursos e instrumentos criados. Toda essa produção
normativa se dá no dizer foucaultiano, como “[...] uma história política do conhecimento, dos
fatos de conhecimento e do sujeito do conhecimento”. (FOUCAULT, 2005b, p. 23).
As políticas públicas estabelecidas pelo Governo da União, em cumprimento ao
ditame constitucional do direito à educação, desenvolvidas por artifícios do que chamamos de
política de verdades ainda não permitiram alcançar os objetivos encarnados no próprio
mandamento constitucional, por seus princípios e diretrizes.
Continua a busca ainda incompreendida da pedagogia da transformação, conforme
argumenta Benevides (1996, p. 01) esclarecendo que:
É preciso estar pronto para acolher cada momento do discurso em sua irrupção de
acontecimentos, nessa pontualidade em que aparece e nessa dispersão temporal que
lhe permite ser repetido, sabido, esquecido, transformado, apagado até nos menores
traços, escondido bem longe de todos os olhares, na poeira dos livros.
à luz das relações históricas possíveis entre si, mergulhados em relações de poder, são,
essencialmente, os materiais de análise utilizados.
Este exame analítico do discurso parte da constatação prévia de que os enunciados
devem ser considerados em seus quatro elementos básicos, como descreve Foucault (2000, p.
133): “Um referencial [...] (um princípio de diferenciação), um sujeito [...] (uma posição a ser
ocupada), um campo associado [...] (um domínio de coexistência para outros enunciados) e
uma materialidade, [...] (regras de transcrição, possibilidades de uso e reutilização)”.
Para poder captar o domínio dos enunciados e seu agrupamento, adotou-se como
relevante trabalhar na descrição das formações discursivas, sendo essencial proceder a
identificação dos enunciados, considerando-os em sua dispersão15 e descontinuidade, em seus
regimes de institucionalização, utilização, reutilização e de combinação, como caminhos que
permitam compreender a regularidade (modos e capacidade de correlação e coexistência).
Essa operacionalização analítica será realizada entre enunciados que dão corpo às
formações discursivas e é dinamizada de forma conjunta, pois um pertence ao outro,
coexistem entre si, sendo que a coexistência e pertencimento provêm das práticas discursivas
que são conceituadas como:
O campo empírico desta pesquisa é composto por dados enunciativos contidos: nas
sentenças de ações ajuizadas contra o Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul;
nas decisões do Poder Judiciário Brasileiro, coletados mediante levantamento de decisões
jurisprudenciais sobre a judicialização da educação; e nos documentos relativos à legislação
pertinente a judicialização e ao direito à educação.
Os enunciados da Judicialização da Educação e do Direito à Educação são figurados
como partes um do outro, construídos em decorrência das relações desenvolvidas entre si e
outros enunciados de discursos pré-existentes, formando séries e conjuntos, em outros
domínios, outros espaços, contextos e momentos históricos.
______________
15
Dispersão dos enunciados é a interdiscursividadade, a pluridiscursividade, a heterogeneidade discursiva, o
interdiscurso, isto é, a existência de enunciados que se correlacionam em vários discursos, compondo a história
discursiva.
97
Declaração Mundial sobre a Educação para Todos (Jomtien, Tailândia, 1990); Declaração e
Programa de Ação da Conferência Mundial sobre os Direitos do Homem (Viena, Áustria,
1993); Declaração da Quarta Conferência Internacional sobre os Adultos (UNESCO, 1985);
Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966), e a Declaração
Universal dos Direitos do Homem (1948).
As modalidades enunciativas desses discursos no Brasil contribuíram para as
formações discursivas da Constituição Federal de 1988, que expressou o direito a educação de
forma clara, inserindo-o como direito fundamental e social, razão de se buscar os enunciados
do direito à educação dispostos nas Constituições Federais do Brasil desde o Império, que
tiveram em parte, suas inspirações, no curso do aparecimento dos direitos humanos que
trouxeram acoplado o direito à educação.
A inventariação documental acima é indicativa de uma gama de documentos
possíveis de análises; no entanto, é possível suprimir um ou outro documento, dentre os
relacionados, na conformidade com o desenvolvimento da pesquisa, segundo a verificação das
interposições dos conceitos, dos sujeitos, dos objetos, da enunciação e das estratégias.
Em um primeiro plano é preciso reconhecer e indagar do funcionamento das práticas
jurídicas, educativas e sociais, que se manifestam como práticas discursivas em uma espécie
de regime desses objetos. Observando que a judicialização é um fenômeno da modernidade
que decorre de um sistema de controle tendo o direito, a norma e a justiça como principais
meios de coerção, mostra-se como via necessária conhecer as práticas concretas dos
discursos em seu contexto histórico de formação, como produto das relações de poder.
Nesse sentido nos diz Foucault (2000, p. 56):
Isso indica que a linguagem enquanto componente do discurso é engendrada por uma
trama discursiva que ultrapassa o próprio elemento lingüístico, como diz Laclau (1991, p.
137): “Porque cada ato social tem um significado e é constituído na forma de seqüências
discursivas que articulam elementos lingüísticos e extralingüísticos”.
Com efeito, o que interessa para esta investigação não são os conteúdos e conceitos
do discurso em suas proposições, conteúdos, conceitos e teorias, apresentadas como verdades
fincadas em posições hegemonizadas. Este empreendimento investigativo realiza uma
exploração analítica que se materializa na verificação e constatação das condições
propiciadoras do surgimento do saber da judicialização da educação, submetido em seu
processo de formação enunciativa às regras compostas pelas práticas judiciárias, políticas,
econômincas, educativas e sociais, cunhadas pelas ferramentas das relações de poder.
Exatamente, por isso, para compreender essas condições é necessário analisar
documentos, acontecimentos e fatos dos discuros políticos, econômicos, educacionais e
sociais compreendendo-os como um conjunto de enunciados apoiados em um sistema de
formação que atende a uma determinada tecnologia da verdade e que se submete a regras de
controle e seleção, como filtro possibilitador da formação discursiva que, segundo Foucault,
(2000, p. 82) trata de:
[...] um feixe complexo de relações que funcionam como regra: ele prescreve o que
deve ser correlacionado em uma prática discursiva, para que esta se refira a tal e
qual objeto, para que empregue tal ou qual enunciação, para que utilize tal conceito,
103
para que organize tal ou qual estratégia. Definir sua individualidade singular, um
sistema de formação é, assim, caracterizar um discurso ou um grupo de enunciados
pela regularidade de uma prática.
[...] que para a genealogia que ele (Foucault) tem realizado é a dos mecanismos e
técnicas infinitesimais de poder que estão intimamente relacionados com a produção
de determinados saberes - sobre o criminoso, a sexualidade, a doença, a loucura etc.
- e analisar como esses micro-poderes, que possuem tecnologia e história
específicas, se relacionam com o nível mais geral do poder constituído pelo aparelho
do Estado.
______________
16
Tutela Jurisdicional – poder que o Estado possui para aplicar o direito ao caso concreto. Poder de conceder a
tutela por força da lei, na tarefa de manter a ordem jurídica, solucionando conflitos de interesses. Jurisdição (do
latim juris, “direito”, e dicere, “izer”).
17
Transitado em Julgado – processo judicial com sentença julgada e não mais passível de recursos a outras
instancias do Poder Judiciário.
108
______________
18
A arqueologia pode assim – e eis um de seus temas principais – constituir a arvore de derivação de um
discurso. [...] Ela colocará, junto à raiz, como enunciados reitores os que se referem à definição das estruturas
observáveis e do campo dos objetos possíveis, os que prescrevem as formas de descrição e os códigos
perceptivos de que ele pode servir-se, os que fazem aparecerem as possibilidades mais gerais de caracterização e
abrem, assim, todo um domínio de conceitos a serem construídos. (FOUCAULT, 2000, p. 168, grifo nosso).
109
Por episteme entende-se, na verdade, o conjunto das relações que podem unir, em
uma dada época, as práticas discursivas que dão lugar a figuras epistemológicas, a
ciências, eventualmente a sistemas formalizados. [...] é o conjunto das relações que
podem ser descobertas, para uma época dada, entre as ciências, quando estas são
analisadas no nível das regularidades discursivas. (FOUCAULT, 2000, p. 217).
______________
20
VELÁSQUEZ, Diego. As meninas. Espanha, 1656-1957.
115
É de se repetir mais uma vez que o saber compreendido pela judicialização, em seu
método, conteúdo e validade não é objeto direto deste estudo, pois, o foco de análise do
arqueogenealogista está nas práticas discursivas, em suas regularidades, na medida em que,
esse saber pode ou não assumir a epistemologização e atingir a cientificidade.
Consequentemente, o que se é analisado são as práticas que dão lugar a esse saber, ou seja, o
momento do pré-discurso, verificando quais as teorias e idéias, conhecimentos e reflexões que
______________
21
Hipossuficiente – pessoa economicamente desassistida, não possuindo condições financeiras de custear o
processo.
117
foram possibilitados nesse espaço da ordem (solo epistemológico) para dar lugar ao saber, isto
é, analisa-se o território arqueológico, que se denomina como épistème.
A judicialização, como forma de julgar, exercida nas práticas judiciárias, mobiliza
enunciados que representam esse discurso, em diversos contextos, resultando em
interpretações que culminam com a formação de regras judiciárias concebidas com base na
Constituição Federal de 1988 e todo aparato legistativo, em temas como: a inclusão e ou
exclusão, a qualidade do ensino, o acesso, dentre outras muitas questões, todas reconhecidas
como práticas discursivas produtoras de políticas de verdades retratadas agora na aplicação de
códigos judiciários com repercussão no campo político.
Como o direito é invenção do homem, e, historicamente foi criado como vontade da
sociedade de se auto-regulamentar, acabou por assumir os contornos teóricos de uma
importante peça do sistema de controle social. Obviamente, a sua utilização pode e é
enquadrada como instrumento de dominação da sociedade, pois a inculcação das formas de
submissão possibilitaram a disseminação das regras de controle instituídas como meio e
caminho para proporcionar a convivência entre as pessoas na sociedade.
Como a política é o campo de decisão sobre a organização da sociedade, aqueles que
detêm esse poder exercitam a imposição de vontades de grupos dominantes, como bem
observa Monreal (1988, p. 49),
[...] outro aspecto que se deve levar em conta é que a lei, a que se torna como uma
concreção da vontade geral de um povo que, fazendo uso de seu poder soberano
impõe, por meio de seus representantes as regras de vida social que devem imperar
em uma sociedade, geralmente que se limita a expressar os interesses e aspirações
do grupo social que, de fato, exerce o domínio sobre ela.
diretrizes e bases da educação nacional e dispõe sobre a duração de 9 (nove) anos para o
ensino fundamental com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.
A mencionada Deliberação 8.144/2006, tece normas sobre o ensino fundamental com
duração de 9 (nove) anos e matrícula obrigatória a partir dos seis anos de idade no Sistema
Estadual de Ensino de Mato Grosso do Sul expressando em seu art. 9º:
Art. 9º - A criança que tiver 6 (seis) anos de idade, completos no início do ano
letivo, deverá ser matriculada no primeiro ano do Ensino Fundamental, com duração
de 9 (nove) anos.
§ 1º Á criança que vier a completar 6 (seis) anos de idade no decorrer do mês de
início do ano letivo, facultar-se-á a matricula no primeiro ano do Ensino
Fundamental com duração de 9 (nove) anos.
§ 2º - As crianças que completarem 6 (seis) anos de idade, após o primeiro mês de
início do ano letivo, em curso, deverão ser matriculadas na Educação Infantil.
Foram analisados 33 (trinta e três) processos judiciais, por cópia integral dos autos
em todas as suas fases, tendo como fonte de pesquisa o Conselho Estadual de Educação de
Mato Grosso do Sul (CEE/MS), sendo que dos processos analisados:
− 16 (dezesseis) ações foram ajuizadas contra o CEE/MS discutindo o teor da
Deliberação 8.144, de 19.10.2006, já mencionada e contendo pedido para
matricula na primeira serie do ensino fundamental, de crianças com idade
inferior a 6 (seis) anos.
− 13 (treze) processos postularam a anulação dos Pareceres 062/07 e 014/05, e
requereram a validação dos certificados de conclusão do ensino médio.
− 1 (um) processo referente a competência do Conselho Estadual de Educação de
Mato Grosso do Sul para editar normas relativas a autorização de funcionamento
das instituições de ensino no Estado.
− 1 (um) processo no qual se impugnava obrigações impostas pelo Conselho
Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul ao desamparo de lei, em sede de
processo administrativo no qual se requeria autorização para funcionamento de
unidade escolar.
− 1 (um) processo referente a direito de aluno cursar a 3ª série sem ter cursado a 2ª
serie – apresentando justificativas de capacidade intelectual precoce.
− 1 (um) processo contendo pedido de autorização judicial para expedição de
certificado de conclusão de ensino médio por ter sido o requerente aprovado em
exame vestibular de Curso Superior, sem ter concluído o terceiro ano do ensino
médio.
Para análise da empiria proposta, inicialmente foram identificados os
questionamentos temáticos contidos nas ações judiciais investigadas, sendo:
− 1º- O teor dos parágrafos 1º e 2º do art. 9º da Deliberação 8.144/2006, que
impede a matrícula de crianças no primeiro ano do ensino fundamental com 6
(seis) anos incompletos;
− 2º- A invalidação de certificados de conclusão de ensino médio por força dos
Pareceres nº 14/05 e nº 062/2007 (CEE/MS);
− 3º- O indeferimento ao pedido de Autorização para funcionamento de Instituição
de Ensino; e,
122
Foi ressaltado pelo Juiz da 2ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos nos
autos 001.07.005354-6 (p. sentença) – Mandado de Segurança, o grande quantitativo de ações
dessa natureza acentuando:
Inicialmente, observo que, nos primeiros meses de cada ano, tornou-se comum, nas
Varas de Fazenda Pública da Capital, assim como nas Varas Residuais do interior, o
elevado número de ações de mandado de segurança que aportam perante o Poder
Judiciário do Estado, tratando da questão da idade mínima imposta pelo Estado de
Mato Grosso do Sul, através do seu Conselho Estadual de Educação, para ingresso
no primeiro ano do ensino fundamental.
Este ano não tem sido diferente. Contudo, algumas considerações novas merecem
ser tecidas em face do advento da Lei Federal n. 11.114, de 16-5-2005, e da Lei
Federal n. 11.274 de 6-2-2006, as quais ensejaram a edição da Deliberação n. 8.144
de 9-1-2006, pelo Conselho Estadual de Educação.
123
A - Enunciado coletado: (art. 208, inciso II, da C.F. 1988) – Ensino fundamental
obrigatório e gratuito, inclusive aos que não tiveram acesso na idade escolar.
A, propósito, impõe-se consignar que a mens legis contida na Lei Federal n. 11. 114,
de 16-5-2005, de sorte alguma foi tolher o acesso à educação da criança que esteja
em condições psicológicas, emocionais e intelectuais para ingressar no primeiro ano
do Ensino Fundamental, até porque qualquer entendimento deste jaez viria de
encontro ao preceito constitucional que assegura ser a educação direito de todos
e dever do Estado e da família. (negrito meu).
Nesse sentido, o contexto da Lei n. 11.114/2005 urge que se promova o método de
interpretação conforme a constituição. (grifo meu)
Decisão nesse mesmo sentido foi prolatada nos processos adiante relacionados:
(Mandado de Segurança 001.07.005354-6), (Mandado de Segurança 001.07.001189-
4), (Mandado de Segurança, Nº 001.07. 105039-7), (Mandado de Segurança Nº
001.07.010043-9), (Mandado de Segurança 001.07.103068-0), (Mandado de
Segurança 001.07.001801-5), (Mandado de Segurança 001.07.100931 – 1),
(Mandado de Segurança, 001.07.003247-6), (Mandado de Segurança,
001.07.004716-3), (Medida Cautelar Preparatória nº 2007.000241-4), (Mandado de
Segurança n. 2008.004626-8/0000-00) e (Mandado de Segurança n. 001.07.000675-
0).
B - Enunciado coletado: (art. 208, inciso V da C.F. 1988). Acesso aos níveis mais
elevados, segundo a capacidade de cada um.
A Constituição Federal em seu artigo 208, inciso V, assegura a todos ‘[...] acesso
aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a
capacidade de cada um’ (grifo do autor).
Logo, se a Constituição Federal não veda ingresso de menor de 7 anos no 1º Grau,
não pode o Estado deliberar pela adoção de critério de idade mínima, especialmente
num país com déficit escolar e de alfabetização e quando o infante apresenta
desenvolvimento intelectual compatível com o curso pretendido. (BRASIL, 1988).
Aliás, de acordo com o art. 206, inciso I, da CF, o ensino será ministrado com base
na igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. Isso significa
dizer que o acesso à educação deve ser garantido independentemente de qualquer
condição social ou financeira.
Decisão:
Decisão:
Decisão:
Não cabe ao CEE criar obrigações que não estão previstas em lei e, com fundamento
nelas, negar autorização de funcionamento a unidade escolar.
falta de professores,
condições para o desenvolvimento do aluno com deficiência,
adequação do prédio escolar,
vaga em pré-escola,
transferência compulsória de alunos,
problemas disciplinares,
criação de cursos,
fechamento de salas de aulas,
cancelamento de matrículas,
licença gestante,
progressão continuada,
ato infracional da criança e adolescente relacionados ao ambiente escolar
FONTE: LOBO FILHO, (2010) - UFMS/PROP/Programa de Pós-Graduação em Educação
São estas algumas das situações que indicam os objetos do discurso da judicialização
no campo da jurisprudência, embora seja possível colher outros objetos e enunciados no
universo das práticas judiciárias dos Tribunais Estaduais e Superiores que tenham como
fundamentação o direito à educação e os dispositivos estatutários jurídicos aplicados como
complementação interpretativa.
Executivo na proposição e fixação de regras, normas, leis, políticas públicas, bem como as
das figuras do Juíz, do Representante do Ministério Público, do Defensor Público, dos
Conselheiros dos Conselhos Tutelares e Direitos da Criança e do próprio indivíduo que busca
a tutela estatal na aplicação de determinado dispositivo do direito à educação.
A empiria trazida à pesquisa aponta a atuação em especial do Conselho Estadual de
Educação de Mato Grosso do Sul, por sua Presidente e Conselheiros, na produção de normas,
o Secretário de Estado da Educação, como executor de políticas públicas, os Diretores das
Unidades de Ensino, como aplicadores das normas instituídas, integrantes dos discursos como
sujeitos ativos ou passivos.
Tais sujeitos participam na interpretação e aplicação, como também na formação e
intervenção dos discursos; entretanto, a descentração do sujeito se mostra patente porque
inexiste um sujeito titular do discurso da judicialização da educação, mas posições, funções,
status, espaços ocupados por sujeitos que intervem nesse discurso. Eles (os sujeitos) não
detêm o poder soberano do dito do discurso por serem também, objetos do mesmo discurso,
vez que, submetem-se, independentemente dos seus desejos, vontades ou anuências, às regras
existentes nas múltiplas facetas institucionais e discursivas interventoras, desde a produção
dos enunciados.
Elas, (as regras), subjugam as características enunciativas em seu processo de
formação dando-lhes vida, forma e conteúdo seguindo as imposições da regulação política,
econômica e social, determinando, na qualidade de forças anônimas revestidas de poder, as
condições para a composição dos enunciados do discurso dando-lhe condições para receber a
moldura temática como espécie de fórmula de efetivação das políticas públicas de educação,
no mundo social.
A subjugação mencionada não ocorre por incidência de forças coercitivas desta ou
daquela natureza sobre as proposições dos discursos finalizados. A inferência subjugadora
que sobrevêm e interessa à arqueogenealogia é a que ocorre ainda na fase da gestação do
discurso caracterizando-se como um processo de nutrição enunciativa que se operacionaliza
nos entrecruzamentos de intervenções formando elementos possibilitadores da emergência do
discurso no plano das verdades assentadas na sociedade pelos jogos das relações de saber e
poder.
O discurso da judicialização da educação aqui representado por ações ajuizadas
perante o Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul e por decisões jurisprudenciais das mais
diversas cortes do País, longe de significar um princípio influenciador da educação, em suas
131
Não se trata de uma análise comparativa entre os discursos, e sim da análise das
condições de realidade dos enunciados presentes nas normas políticas atuais pela verificação
da coexistência e identificação de princípios, leis e regras a que esses enunciados foram
submetidos.
As análises não abrangem a significação do conteúdo da Judicialização, seu sustento
teórico, técnico ou científico, exatamente porque o plano de verificação está situado em um
nível aquém do estado final do discurso, nas relações que antecedem a esse referente
(Judicialização) no sentido de identificar todo composto de relações ocorridas.
A pertinência das correlações não se dá apenas pela identificação de conteúdos, mas
também pela integração ao mesmo quadro discursivo, não importando se não houve
continuidade, se existem falhas, rupturas, pois são esses elementos que se procurou descrever
em sua dispersão temporal.
O a priori histórico da judicialização da educação está contemplado nos “arquivos”
(as condições de aparecimento e seu campo de domínio) e “coisas” (o campo de utilização). O
que se perquiriu foi a lei do que pôde ser dito, significando abranger as restrições impostas ao
discurso pelas redes de poder, movendo-se nos procedimentos feitores dos
enunciados/acontecimentos, procurando por eles definir o sistema de sua enunciabilidade.
Os enunciados não são passivos, inertes, fixos; bem ao contrário, sofrem constantes
mobilizações, reforços, alterações e transformações em sua historicidade. Por isso a
delimitação do discurso do presente se dá pelas práticas discursivas do passado, sendo
necessário definir os discursos enquanto práticas que obedecem a regras em um jogo de
relações que se desenvolve historicamente.
Foucault (2000, p. 151) afirma que a arqueologia: “[...] designa o tema geral de uma
descrição que interroga o já-dito no nível de sua existência, da função enunciativa que nele se
exerce, da formação discursiva a que pertence do sistema geral do arquivo de que faz parte”.
A arqueogenealogia, na qual a arqueologia e a genealogia são operacionalizadas em
conjunto, trabalha com as regularidades enunciativas que não se determinam apenas
verificando enunciados da mesma espécie, do mesmo conteúdo, de uma identidade lógica,
mas, de enunciados que sofrem relações entre si, e possuem certa interdependência.
É certo que a compreensão de regularidade como uma das condições da formação
discursiva não se sintetiza na procura de enunciados idênticos, mas de enunciados
pertencentes a uma mesma formação discursiva. Eis a razão e o porquê de ouvir o dito dos
vencidos, os enunciados conflitantes, os esquecidos, os excluídos, sendo possível nessa linha
135
Ensino fundamental
obrigatório e gratuito,
inclusive aos que não
tiveram acesso na idade
escolar
Situação fática
Acesso aos níveis mais
Igualdade de acesso e consolidada em razão de
elevados de ensino,
permanência na escola decurso de tempo –
segundo a capacidade de
Teoria do fato consumado
cada um
instituições, técnicas, grupos sociais, organizações e as relações entre discursos diversos, que
se movimentaram como práticas discursivas e não-discursivas, manifestadas pelas regras
dessas relações, intervenções, existências e co-existências enunciativas.
É a partir do recorte constituído pelos processos ajuizados contra o CEE/MS e pelas
decisões jurisprudenciais, por seus enunciados em suas relações com os enunciados dos
discursos antecedentes que se buscou compreender a formação discursiva da judicialização.
O modo de análise adotado na dimensão arqueológica desenvolveu-se em feixes
conceituais e opções teóricas abrangendo os objetos, as modalidades de enunciações,
conforme já definido nos capítulos anteriores. Mas, deve ser observado que a análise vai se
aperfeiçoando no sentido em que se vem descrevendo os sistemas de dispersão, pois, as
relações ocorrem de forma conjunta entre os quatro elementos, podendo em algum momento
pontuar cada um até para demonstrar a ocorrência da regularidade.
Dentro dessa dinâmica analítica o inventário seguiu o que Foucault (2000) descreveu
como “Sistema Vertical de Dependência” que significa todas as posições do sujeito, todos os
tipos de coexistência entre enunciados e todas as possibilidades de estratégias discursivas.
Salienta-se que a relação de dependência entre os componentes do sistema se dá por uma
espécie de hierarquia relacional, pois as opções teóricas, inicialmente, são as condutoras das
relações possíveis de ocorrerem no plano e momento seguinte, pois dependendo do tipo das
opções teóricas utilizadas, podem ser aceitas ou excluídas determinadas regras de formação, o
que gerará determinados conceitos ou outros.
Com base nessa consideração (tipo de opções teóricas- formação de estratégias) uma
primeira observação foi verificar como ocorreu a organização dos conceitos, os agrupamentos
de objetos e a determinação dos tipos de enunciação que vão indicar a teoria ou tema em que
se funda o discurso.
As teorias (estratégias), também denominadas de pontos de escolhas teóricas, são
distribuídas no tempo mediante determinadas condições, que podem ocorrer por idéias que
vão se encadeando, sendo da mesma ou de origem diversa, ou por modelos teóricos em
organização ou já devidamente organizados.
As opções teóricas da judicialização da educação estão compreendidas nas
considerações filosóficas de Capelletti (1993), Garapon (1999), Habermas (1997), Dworkin
(1999) e Posner (1995) que oferecem os contornos das abordagens conceituais sobre a
judicialização e estabelecem posições teóricas que se distribuem nas linhas procedimentalista,
substâncialista e pragmatista.
139
Embora as bases teóricas defendidas pelos menciondos pensadores ainda não possam
ser consideradas como alicerçadas em fundamentamentos metodológicos científicos e
filosóficos consistentes e indiscutíveis ante ainda a ausência de dados mais concretos
referente à aplicação prática da judicialização, é certo que a linha substancialista representa a
posição majoritária do Poder Judiciário Brasileiro, com a manifesta aplicação do ativismo
judicial (a interpretação normativa tendo a Constituição Federal como horizonte normativo da
ordem social e política democrática), linha teórica que tem sido adotada nas sentenças
judiciais e jurisprudências, como se pode observar dos dados constantes da empiria trazida
aos autos, bem como no que se denomina de movimento externo do ativismo que são as
declarações verbais e entrevistas à imprensa concedidas pelos Senhores Ministros da Suprema
Corte.
O discurso da Judicialização da Educação não se perfila como uma unidade
interpretativa conceitual isolada, única, soberana, havendo sim posições opostas, conflitantes,
díspares, chamadas de pontos de difração do discurso.
No campo do constitucionalismo são observadas ponderações e críticas sobre o
positivismo formalista que sustentou as teses do direito e justiça na modernidade, por se
constatar o seu esgotamento na solução dos conflitos sociais contemporâneos e o espaço que
possibilitou o surgimento do neo-positivismo que sustenta o neo-constitucionalismo.
As opções teóricas da judicialiação da educação apresentam controvérsias no
universo conceitual e normativo por representar posições que dão novos feitios à sociedade de
controle.
O sustento argumentativo da judicialização encontrado no trabalho de Arantes (2002)
representa perigosas considerações quanto a: politização do Ministério Público; expansão das
práticas judicializadoras; politização do Judiciário Brasileiro; ampliação dos instrumentos
judiciais; novas relações entre direito e política; novo estatuto dos direitos fundamentais;
superação do modelo da separação dos poderes do Estado. Esses e outros aspectos abordados
pelo autor colocam em dúvida a manutenção da liberdade, democracia e cidadania.
Entende o mencionado autor, segundo pesquisa por si realizada com membros da
classe do Ministério Público, que a sociedade civil é incapaz de defender autonomamente seus
interesses e direitos e as instituições políticas mostram-se insatisfatórias no cumprimento do
seu papel representativo. Por tal fato a sociedade brasileira é hipossuficiente e o Ministério
Público ante aos poderes concedidos pela Constituição Federal de 1988, nomina-se como
140
ATIVISMO
JUDICIAL
a) a aplicação direta da
Constituição a situações
não expressamente
contempladas em seu
texto e
independentemente de
manifestação do
b) a declaração de legislador ordinário;
inconstitucionalidade de c) a imposição de
atos normativos condutas ou de
emanados do legislador, abstenções ao Poder
com base em critérios Público, notadamente em
menos rígidos que os de matéria de políticas
patente e ostensiva públicas.
violação da Constituição;
As posições adotadas pelo Supremo Tribunal Federal e por todos os espaços de juízo
do Poder Judiciário Brasileiro estão alinhadas ao substancialismo. A teoria que dá
fundamentação à Judicialização da educação firma-se no neo-constitucionalismo, dentro do
princípio do ativismo judicial, na linha substancialista. A identificação das opções teóricas do
142
discurso indica os caminhos da formação dos objetos do discurso, das formas de compor os
enunciados, de manipular conceitos, ou seja, maneiras de uso das possibilidades do discurso.
Mas, as opções teóricas do discurso da judicialização também sofrem(ram) relações
com outras linhas ou abordagens que se mostram presentes no jogo da formação discursiva,
não com a mesma força de influência que a linha substancialista possui na determinação das
regras do jogo das intervenções, mas, com consideráveis ingerências.
Trata-se das linhas procedimentalista e pragmatista, que se posicionam mais
especialmente no espaço das interpretações e comentários do discurso.
A história doxológica classifica a judicialização em três opções teóricas já
mencionadas: a primeira, a teoria procedimentalista, a segunda, a teoria substancialista e, a
terceira, a teoria pragmatista. Para a arqueologia no contexto desta investigação não importa
tais correntes em seus conteúdos significantes e significados, em sua estrutura interna de
teoria, senão para servir de apoio à análise do pré-discurso (fase pré-discursiva), (formação de
enunciados), (formação discursiva), isto é, como base necessária para verificação das
condições a partir das quais foi possível pensar tais saberes em seus componentes teóricos
(opções teóricas).
Isto explica a identificação da judicialização da educação como um componente
conceitual que se agrega diretamente aos fundamentos do direito constitucional em suas
concepções de lei, justiça, Estado e poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário).
Percorrendo a linha do tempo da criação do Estado Liberal seguindo a imposição da
condição de intervenção mínima no mercado e nas relações negociais da sociedade, resultou
no desenvolvimento de dois fenômenos jurídicos:
1º - O Constitucionalismo, preconizando a indispensabilidade da feitura da Carta
Maior na qual foi contemplada a limitação do Estado e do poder político;
2º - A Codificação como forma necessária para assegurar a própria autonomia do
indivíduo no campo econômico.
Ambos forneceram a estrutura conceptiva ao Estado Moderno. Notadamente, a
codificação liberal lastreou-se com dispositivos de proteção voltados detidamente ao cidadão
detentor de patrimônio, livre do controle público (Estado Mínimo), fato considerado
historicamente como uma verdadeira inversão de prioridades, pois, a grande massa
populacional, desprovida de patrimônio, capital e bens, foi colocada à margem do próprio
ordenamento jurídico. Isso fortaleceu ainda mais o capitalismo, consumando uma posição
hegemônica da mais forte repercussão social, negando abertamente a justiça social.
143
Mato Grosso do Sul dão indicações que os componentes do campo enunciativo das decisões
jurisprudenciais das Cortes de Justiça do Brasil são partes integrantes dos processos
investigados, pois foram e têm sido utilizados como fundamentos de julgamento por
representar a linha de atuação jurisprudencial brasileira.
Tal constatação demonstra que o Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul, ao decidir
em matéria de natureza educacional nos processos indicados nesta pesquisa, atendeu ao
entendimento jurisprudencial nacional, sendo possível afirmar que os enunciados reitores já
expostos decorreram de relações e interveniências segundo regras determinadas pelos planos:
social; econômico; político e também jurisprudencial, segundo as estratégias teóricas da
judicialização da política.
A judicialização da educação abrange um corpo enunciativo que se mostra presente
em alguns documentos legais que dão corpo ao direito à educação e oferecem suportes para a
postulação e declaração de direitos voltados à área da educação e das relações escolares.
Mencionados documentos são em princípio: a Constituição Federal de 1988, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Federal 9.394 de 20 de setembro de 1996), o
Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei Federal 8.429 de 13 de julho de 1990) com a
utilização dos recursos processuais da “Ação Civil Pública” (Lei Federal nº 7.347, de 24 de
julho de 1985), da Lei da “Probidade Administrativa” (Lei Federal nº 8.429, de 02 de junho
de 1992), da Lei da Responsabilidade (Lei Federal nº 1.079, de 10 de abril de 1950 e do
Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967).
Referidos dispositivos legais, notadamente a Constituição Federal de 1988,
consagraram princípios, valores, direitos e deveres, a partir de diretrizes que sedimentaram os
direitos fundamentais, sociais, individuais e coletivos, como marcas de um novo tempo na
história da sociedade brasileira, comandando uma nova visão do Direito e da Justiça. O direito
à educação, integrante do rol desses direitos, está pontuado nas sentenças constantes dos
processos analisados como suporte e fundamento para concessão das tutelas requeridas,
confirmando o discurso da judicialização no contexto das relações escolares e das principais
questões da educação.
Os enunciados coletados nesta pesquisa, distribuídos nos processos ajuizados contra
o Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso do Sul e nas Jurisprudências colacionadas
em diversos julgados dos Tribunais Judiciais Brasileiros, como um recorte visualizativo da
Judicialização da Educação, contidos na relação já exposta, estão identificados como
146
GRUPO 1
ENUNCIADOS
GRUPO 2
ENUNCIADOS
exclusão operados nos espaços sociais, nas instituições, no aparelho judiciário e no Estado,
segundo saberes engendrados pelas relações de poder.
Não se pode olvidar que os dispositivos racionais existentes no quadro social
espelham uma contradição fundamental aninhada de um lado no contexto democrático das
instituições (participação nas decisões) e de outro, na dinâmica dos processos políticos
(sistema de representação) que só apresentam essas características (democracia e
representatividade) na medida em que o papel desenvolvido pelo sujeito, no âmbito da sua
cidadania, seja de passividade.
A judicialização da educação não modifica essa racionalidade indutiva da
passividade do sujeito, mesmo porque a amplia na medida em que fere princípios básicos da
democracia ao estender ao Poder Judiciário atribuições e decisões de caráter político furtando
à própria finalidade da conjuntura do sistema político que é a atuação popular. É o cidadão
quem deve exercitar a indispensável soberania, sem tutelas de instituições judiciais, pois essa
é a base do pensamento fundante do Estado Democrático, somente possível pelo sistema de
representação o que, no âmbito das instituições judiciais, não é possível.
Por ser contraditória em sua essência, a Judicialização pode consolidar uma nova
face e modus operacional do autoritarismo em razão de que a toga da magistratura não está
revestida sob qualquer forma ou espécie com o selo de validade representacional política,
possível apenas pelo voto popular. Isso demonstra, ab initius, que a judicialização pode vir a
ferir o principal ditame constitucional que é o Estado Democrático de Direito.
Se o panorama que se desenha no visor da janela da democracia deixa patente que a
judicialização da educação pode abrir fissuras na estrutura e alicerces nos quais foi edificada a
Carta Constitucional de 1988 a teoria do ativismo judicial sintetizada no julgamento
processual segundo os princípios constitucionais se mostra incongruente, por conseguinte,
merecedora de reavaliação.
Nota-se, destarte, pelo olhar reflexivo da genealogia do poder, que o dispositivo
“instituição escola” produz a ocorrência sistemática de submissão do sujeito a táticas cada vez
mais sutis de intervenção na sua constituição, por intermédio da aplicação de mecanismos de
objetivação explicitados de um lado no interesse do capitalismo pelo sujeito produtivo,
portanto, útil ao modo de produção, de outro, no empenho pela naturalização do processo
político representacional vigente, e agora pela anulação da cidadania do sujeito em projetos de
ações paternalistas, que esconde no fundo falso institucional o autoritarismo.
153
Silva Junior; Ferretti (2004, p. 108) dizem que: “[...] a instituição escolar emerge na
história como necessidade da formação do ser social construtor do pacto social burguês”, pois
os artefatos escolares foram criados pelas religiões cristãs em competição, mas foram
apropriados pelo Estado Educador, especialmente a partir do século XIX.
Uma incursão no percurso histórico da educação permite mostrar que a escola como
instituição de seqüestro22 e dispositivo disciplinador tem servido, na perspectiva da economia,
à constituição do sujeito útil ao processo de produção e, na perspectiva da política, à
constituição do sujeito dócil, dotado de uma atuação resignada, passiva e disciplinada.
Essa constatação é confirmada por Linhares (1997, p. 67-68), ao tecer considerações
a respeito da escola que tem aumentado as possibilidades de acesso ao mesmo tempo em que
vem se afirmando como instrumento de exclusão social:
(...) fazer do saber escolar algo vivo, para ser refeito, que lhes ajude a entender mais
de si mesmos, entendendo mais os movimentos que o Brasil vem produzindo; um
saber escolar que contribua na ampliação de escolhas, um saber aberto a virar
ferramenta em suas mãos. (...) Uma escola que construa a cidadania e não aquela
que através da (...) força da hegemonia vai confirmando medrosos, fracassados e
revoltados: uns e outros marcados por um espelho que os reflete no que eles têm de
possibilidades, as mais negativas, devolvendo-lhes assim uma imagem
autodesprezível. (LINHARES,1997, p. 67-68).
______________
22
A fábrica, a escola, a prisão ou os hospitais têm por objetivo ligar o indivíduo a um processo da produção, de
formação ou de correção dos produtores. Trata-se de garantir a produção ou os produtores em função de uma
determinada norma. [...] Para que servem essa rede e essas instituições? Podemos caracterizar a função destas
instituições da seguinte maneira. Primeiramente, estas instituições pedagógicas, médicas, penais ou industriais –
têm a propriedade muito curiosa de implicarem o controle, a responsabilidade sobre a totalidade, ou a quase
totalidade do tempo dos indivíduos; são, portanto, instituições que, de certa forma, se encarregam de toda a
dimensão temporal da vida dos indivíduos. (FOUCAULT, 2005B, p. 115-116).
23
A segunda função das instituições de seqüestro é não mais a de controlar o tempo dos indivíduos, mas a de
controlar simplesmente seus corpos. [...], mas, se analisarmos de perto as razões pelas quais toda a existência dos
indivíduos se encontra controlada por estas instituições, vemos que se trata, no fundo, não somente de
apropriação, de extração da quantidade máxima de tempo, mas, também, de controlar, de formar, de valorizar,
segundo um determinado sistema, o corpo do indivíduo. (FOUCAULT, 2005, p. 118-119).
154
[...] a escola é, depois da família, (mas, muitas vezes, antes dessa), a instituição de
seqüestro pelo qual todos passam (ou deveriam passar) o maior tempo de suas vidas,
no período da infância e da juventude. Na medida em que a permanência da escola é
diária e se estende ao longo de vários anos, os efeitos desse processo disciplinar de
subjetivação são notáveis. (VEIGA NETO, 2003, p. 85).
Bruni (1989) em seu artigo, “Foucault: o silêncio dos sujeitos”, detalha o exercício
dos poderes disciplinares como comando do lançamento do sujeito ao fundo do espaço da
exclusão produzindo o silenciamento do sujeito, questionando:
[...] podemos ver como se vão constituindo pouco a pouco, dos pequenos detalhes
até as grandes formas institucionais, os poderes disciplinares a que estamos presos
de mil maneiras. Dos olhares às normas, da repreensão à punição, da discriminação
à exclusão, da ordenação à instituição, o social se dispõe como imensa malha
cerrada que o discurso de Foucault possibilita ver por dentro na sua construção
minuciosa, exata, eficiente, científica — e detestável, em que o ‘sentido’ é apenas
obra da racionalização. ‘Poder’ é força social múltipla que assimila ou exclui, ou
melhor, é confronto belicoso das forças: é esta ‘hipótese de Nietzsche.
Dos dados coletados nesta investigação é interessante verificar que o elevado numero
de pedidos de matrícula para crianças menores de 6 (seis) anos no ensino fundamental,
objetos dos requerimentos contidos nos processos analisados, expressam uma situação real de
necessidade de acesso, fato que preocupa a família levando-a a buscar a tutela jurisdicional
para assegurar o direito à educação para seus filhos.
Ocorre que o sistema político-econômico vigente provocou a situação de
necessidades sociais criando empecilhos para solução (institui dificuldades), e, agora,
apresenta a judicialização da educação como solução (distribui facilidades). Não há lógica em
tal situação pois as questões que impediram a solução dos problemas sociais, dentre elas, a
educação, continuam existindo e não será a simples determinação judicial que modificará o
status quo.
O Ministério da Educação (MEC) em trabalho por si realizado e publicado,
denominado “Ensino Fundamental de nove anos, orientações para inclusão de crianças de 6
anos de idade (2007)” em referência inicial ao projeto, informa que 81,7% das crianças de seis
155
anos estão na escola, sendo que 38,9 % freqüentam a educação infantil, 13,6 % das crianças
pertencem às classes de alfabetização e 29,6 % estão no ensino fundamental (dados IBGE,
Censo Demográfico 2000), demonstrando com esses dados o quadro de interesse da
população pelo aumento da escolarização obrigatória.
No mesmo sentido, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB,
2003), em pesquisa realizada com crianças em idade escolar demonstrou que quando as
crianças ingressam na instituição escolar antes dos sete anos de idade, apresentam, em sua
maioria, resultados superiores em relação àquelas que ingressam somente aos sete anos.
Como dedução primeira, a partir da verificação de tais dados, é que as postulações
para ingresso com 6 (seis) anos incompletos ajuizadas contra o Conselho Estadual de
Educação de Mato Grosso do Sul possuem suportes nas próprias conclusões contidas nas
investigações realizadas pelos órgãos governamentais e expressam a realidade da luta por
direitos.
Uma apressada análise da aplicação da judicialização nos casos mencionados pode
levar a uma conclusão simplista de que a efetividade do direito à educação está garantida pela
atuação do Poder Judiciário, mesmo nas grandes questões educacionais não solucionadas há
decênios.
Na verdade, o que ocorre no universo da aplicação do discurso da judicialização da
educação é que ele se restringe a esses pequenos fatos relatados, pois, embora guardem
importância social para os postulantes, no contexto do discurso judicializante não representam
o complexo campo educacional em suas amplas relações, o que faz por exigir uma análise
mais apurada dos resultados apresentados no plano real, quanto as determinações judiciais.
As pesquisadoras Araujo; Peres (2005, p. 2) trazem dados estatísticos que em seus
enunciados desarticulam todo discurso da universalização da educação:
[…] No início dos anos 90, recupera-se a força desta expressão. Ou, mais
exatamente, surge a ‘cidade educadora’. Substitui-se o termo ‘educativa’, que sugere
159
que a cidade é um mero fator de educação, por ‘educadora’, que indica seu caráter
de agente, ou seja, a mudança é feita para ressaltar o caráter formador que as cidades
devem assumir. Essa recuperação se produz, sobretudo, a partir do Congresso
Internacional de Cidades Educadoras, que aconteceu em Barcelona, em 1990, no
qual foi aprovada a ‘Carta das Cidades Educadoras’.
A - As Constituições Brasileiras
pelas inovações tecnológicas alcançadas, o que acentua ainda mais o desequilíbrio econômico
e social, ante ao poder de exploração do sistema que domina as modernas tecnologias, fatores
cada vez mais críticos pois as inovações apresentadas criam e recriam mecanismos de
subjugação.
Os direitos sociais caracterizados como políticas estatais de apoio para melhoria das
condições de vida aos hipossuficientes são meios destinados a reduzir o extraordinário
desnivelamento provocado pelo sistema capitalista que fortalece a máquina de apropriação e
expropriação, concedendo altos benefícios aos donos do capital, vilipendiando o trabalhador;
justamente, aquele que gera o lucro e a mais valia pela sua força de trabalho e que é levado a
alienar-se pela estratégia do próprio trabalho que o subjuga à lógica capitalista.
Cesarino Junior e Cardone (1993) analisando o direito social brasileiro estabelecem
uma periodização:
162
DIREITO SOCIAL
BRASILEIRO
De 1500 a 1888
(pré-histórico)
Inexistência de uma
legislação social
, 2010)
fundamentais e sociais, ressaltando que as edições das normas constitucionais após 1964
foram marcadas pelos princípios incorporados ao Estado Social de Direito em decorrência das
novas exigências da sociedade.
Nas últimas décadas a sociedade civil no Brasil vem se organizando em diversos
segmentos e promovendo movimentos sociais na luta por novos direitos, na defesa dos
cuidados com as diferenças, na batalha pela superação das desigualdades, dentre outras
frentes formadas com a intenção de alcançar conquistas necessárias ao enfrentamento das
graves conseqüências provocadas pelos grandes avanços tecnológicos e econômicos.
A C. F. de 1988 é um dos resultados dos grandes esforços da sociedade brasileira que
conseguiu a consagração do princípio da dignidade da pessoa humana como norma imperativa
inserida na Carta Soberana, um dos fundamentos da República Federativa do Brasil,
consolidado com a edificação do Estado Democrático de Direito.
O Estatuto Constitucional aprovado concedeu à nação brasileira a figura do mínimo
existencial ou o piso mínimo normativo, no qual a educação é encravada como fonte de
concessão de uma vida digna, o que a coloca como questão central no processo de resolução
dos conflitos desta sociedade complexa, pluralista, multicultural e mecanicista. Presencia-se a
formação de novos dispositivos jurídico-normativos entrelaçados em jogos de relações entre a
estrutura política de governo, as determinações econômicas e as forças operativas dos
segmentos sociais, tendo como um dos resultados a composição do conjunto normativo
denominado “direito à educação”.
As práticas discursivas compreendem jogos de relações desenvolvidos segundo
regras variadas e anônimas, determinadas nas lutas entre vários segmentos públicos e privados
que não estão presentes somente nos domínios da educação, pois é possível encontrá-las nos
meios políticos, nas decisões legislativas, nas maquinarias de pressão social, como elementos
que impulsionam a criação de mecanismos favoráveis ou não favoráveis à educação e à sua
efetividade.
O recuo no tempo permite visualizar os vários deslocamentos temáticos dos direitos
humanos, direitos fundamentais, direitos sociais e direito à educação, impelidos pelas
diligências expendidas por organismos internacionais e movimentos sociais enquanto
elementos questionadores de direitos.
A educação obteve significativa importância ao ser incluída no rol constitucional
como direito social conforme descreve o art. 6º da C. F. 1988: “[...] são direitos sociais a
educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a
164
[...] a política inscrita na Carta Soberana foi abortada por imposição do Banco
Mundial que, para atender as exigências do capital em crise, infundiu ditames de
uma educação voltada aos interesses do mercado, à estabilização econômica e ao
princípio de governabilidade, indispensáveis ao processo de ampliação do
capitalismo financeiro. (LEHER, 1998, p. 120).
[...] a inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros, que tem
por base a liberdade, a segurança individual e a propriedade, é garantida na
Constituição do Império, pela maneira seguinte: [...]. A instrução primária é
garantida a todos os cidadãos.
de 1946 que foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 4.024 de 20
de dezembro de 1961.
A Carta de 1946 estabeleceu princípios do ensino obrigatório e gratuito, da liberdade
de cátedra, instituiu concursos para o seu provimento e definiu a vinculação de recursos para a
manutenção e desenvolvimento da educação prevendo a criação de institutos de pesquisa.
Por decretos-leis várias áreas foram regulamentadas: Lei Orgânica do Ensino
Industrial (Decreto-Lei nº 4.073/42); Lei Orgânica do Ensino Secundário (Decreto-Lei
4.2144/42); criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) (Decreto-Lei
nº 4.048/42); Lei Orgânica do Ensino Primário (Decreto-Lei nº 8.529/46); Lei Orgânica do
Ensino Normal (Decreto-Lei nº 8.530/46); Lei Orgânica do Ensino Agrícola (Decreto-Lei nº
9.613/46); a instituição do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) (Decreto-
Lei nº 8.621/46 e 8.622/46).
Esses decretos-leis são instrumentos normativos reguladores que em suas
construções tiveram seus enunciados submetidos a múltiplas regras formadoras de objetos do
discurso como o ensino industrial, as especificações do ensino primário e ensino secundário, o
ensino comercial, o ensino agrícola. São objetos tecidos nas malhas dos jogos de conceitos,
representando um momento histórico expresso em discursos voiltados para o mundo do
trabalho.
A Constituição de 1967 nos capítulos 167 a 172 possuiu um capítulo denominado
“Da família, da educação e da cultura”, sendo que, em uma ponta fortaleceu o ensino
particular mediante a criação de bolsas de estudo e em outra limitou a liberdade acadêmica e
diminuiu o percentual de receitas vinculadas para manutenção e desenvolvimento do ensino.
A Emenda Constitucional nº 1/69 manteve o conteúdo da C.F. de 1967 incluindo a
possibilidade de intervenção dos Estados nos Municípios nos casos da não aplicação anual, no
ensino primário, de 20% da receita tributária municipal.
O regime de exceção criado pela Revolução de 1964 impôs ao Brasil restrições aos
direitos políticos, fechamento do congresso nacional, controle do Poder Judiciário, enfim,
todas as principais características dos sistemas autoritários. Em que pese o determinismo
coercitivo governamental, muitos grupos ocuparam espaços para constituição de trincheiras
de defesa nos campos das lutas, às vezes ofuscadas pela repressão, mas, enaltecidas pelo
brilho dos que arrostaram contra o cerceamento de direitos e dedicaram suas vidas por uma
pátria livre e plena de justiça.
168
deveres para com a educação como: ensino fundamental obrigatório e gratuito; ensino médio
gratuito; atendimento educacional especializado aos educandos com necessidades especiais,
preferencialmente na rede regular de ensino; atendimento gratuito em creche e pré-escola às
crianças de zero a seis anos; programas suplementares de material didático escolar, transporte,
alimentação e assistência saúde; acesso a escola pública e gratuita próxima de sua residência.
Nessa derivação enunciativa supra referida cada um dos documentos legais
apontados foi edificado sob contendas, contestações, debates, altercações, diferenças,
disputas, representativos dos embates da política e dos determinismos regulamentadores da
economia nacional e mundial.
A educação no Brasil tem sido matéria de uma enorme produção legislativa
caracterizada por batalhas de longa duração no campo do legislativo, com resultados nem
sempre coerentes com as perspectivas da classe educacional.
deficiência. O Censo Escolar 2006 aponta que apenas 28,6% das escolas públicas e 18,5% das
escolas privadas incluíam alunos com deficiência.
Quanto a infra-estrutura dos estabelecimentos escolares do ensino fundamental os
dados representam grande frustração pois em 2006, mais da metade dos alunos (53,9%)
estudaram em escolas que não possuem biblioteca e cerca de 45% deles não contavam com
quadra de esportes em suas escolas.
TABELA 3 – Número e porcentagem de matrículas nas redes pública e privada de ensino (2008)
PUBLICA PRIVADA
Creches 1.143.430 (65,3%) 608.306 (34,7%)
Pré-escola 3.849.829 (77,7%) 1.117.696 (22,5%)
Ensino Fundamental 28.468.696 (88,7%) 3.618.004 (11,3%)
Ensino Médio 7.395.577 (88,4%) 970.523 (11,6%)
Educação de jovens e adultos 4.796.036 (97 %) 149.388 (3%)
FONTE: Censo Escolar 2008 (BRASIL/MEC/INEP, 2008).
Os Conselhos Tutelares vêm sendo criados com uma intensa participação popular na
discussão dos projetos de leis, ladeados pelas Instituições que representam segmentos da
sociedade organizada, tais como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Pastoral do
Menor, Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua e do próprio Ministério Público
Estadual. Essa experiência tem sido marcada como a definição de uma política popular de
atendimento ao menor e ao adolescente e de criação e funcionamento dos órgãos colegiados.
As instalações dos Conselhos têm obedecido aos princípios da autonomia na
aplicação das medidas contidas nas normas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)
referentes à independência funcional e a inexistência de subordinação. O funcionamento tem
primado pela ação parceira com o Ministério Público, com a Justiça da Infância e da
Adolescência, com a Defensoria Pública e com as unidades de reeducação e ressocialização
do menor e do adolescente.
A Constituição Federal de 1988 em seu art. 277, § 7º estabeleceu diretrizes para as
ações governamentais para a área da criança e do adolescente determinando uma
descentralização político-administrativa e a participação popular na fixação das políticas e no
controle das ações. O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 88, incisos I e II prevê
expressamente a municipalização do atendimento da criança e do adolescente e a criação de
Conselhos Municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente como
órgãos deliberativos e controladores das ações de governo.
175
______________
25
Ação Civil Pública – prevista no artigo 129, III da C.F. (1988) “São funções institucionais do Ministério
Público: [...] III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e
social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.
26 Mandado de Injunção – é um instituto processual civil, outorgado ao legítimo interessado como remédio
constitucional para a obtenção, mediante decisão judicial de equidade, a imediata e concreta aplicação do direito,
liberdade ou prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania popular ou à cidadania, quando a falta de norma
reguladora torne inviável o seu regular exercício (SILVA, 1989, p. 51-52).
27
Mandado de segurança – Pelo mandado de segurança, podem ser defendidos os chamados direitos líquidos e
certos, distintos da liberdade de locomoção, contra atos e omissões abusivas do Poder Público. São considerados
176
− a ação popular28.
Referidos instrumentos processuais abrem possibilidades de atendimento às
pretensões individuais e coletivas, conferidas pela proteção constitucional, mediante a
exigibilidade de criação de políticas públicas.
O Brasil pelo Decreto n 99.710, de 21 de novembro de 1990, promulgou a
Convenção sobre os Direitos da Criança, que afirma em seu preâmbulo:
líquidos e certos os direitos cujo reconhecimento independe de uma instrução probatória no processo
(COMPARATO, 1989b, p. 96).
28
Ação Popular – é o meio processual a quem tem direito qualquer cidadão que deseje questionar judicialmente
a validade de atos que considera lesivo ao patrimônio público, a moralidade administrativa, ao meio ambiente e
ao patrimônio histórico e cultural.
177
Convenção sobre os
Direitos da Criança
adotada pela
Assembléia Geral
da ONU
Convenção
Interamericana à
Restituição de
menores celebrada
em Montevideu
Convenção
Interamericana
sobre Tráfico
Internacional de
Menores
Convenção sobre
os Aspectos Civis
do Sequestro
Inteernacional de
Crianças
Ato Internacional Convenção 138,
sobre Direitos sobre Abolição do
Humanos, abolindo a Trabalho Infantil –
pena de morte para
assinada em
menores de 18 anos
02/02/2000
Passa-se a reduzir direitos sociais (por direitos sociais entendemos o conjunto das
garantias ou obrigações do Estado para com a satisfação das necessidades básicas do
cidadão no contexto em que vive, traduzidas no direito fundamental à vida em
sociedade), em nome dessa redução, justificando-se com o discurso da falência do
Estado e isto implica um passo na direção de reformas orientadas para o mercado e
coordenadas pelo Estado e pelo mercado (BRESSER PEREIRA, 1996, p. 49). O
mercado é que passa a ser um eixo central do processo de sobrevivência, em vez do
Estado de Direito, levando à privatização de fundos públicos, como os da
Previdência Social, e de serviços, como os de saúde e de educação, desde as creches
até a universidade, e mudando o foco das políticas assistenciais para os mais pobres
e excluídos, reduzindo-se o acesso universal ou até substituindo-o por formas
transitórias e precárias de políticas focalizadas. (SILVA E MOTTI, 2001, p. 29).
______________
29
Reserva do Possível – Previsão orçamentária reservando o possível segundo a disponibilidade existente.
181
A educação, como a maioria das áreas sociais, sofre as consequências desse novo
momento histórico institucional do País, sendo por certo esse jogo de regras o mais decisivo
na produção do discurso da judicialização da educação.
Reforça a aplicação da judicilização na área da educação justamente a existência dos
direitos educacionais de natureza principiológica alcançados na promulgação da Constituição
Federal de 1988 e que se tornaram os fundamentos para decisões, inclusive em assuntos de
políticas públicas educacionais.
Embora já se tenha passado mais de 20 anos do início da vigência da C.F. 1988, sua
repercussão no campo da ciência política é hoje causa de profundas reflexões, embora
inúmeras áreas já estejam alcançadas pela conseqüências da judicilização.
Neste novo século renovam-se as lutas pela efetivação dos direitos humanos e
sociais, individuais e coletivos, mesmo após tantas décadas de movimentos, de mudanças, de
rupturas, de crises, sem que pelo menos feixes tênus de luz pudessem ser festejados como
pequenas vitórias do século passado.
É tempo de incertezas, indignações e frustrações, eis que paulatinamente, sub-
repticiamente, armadilhas foram armadas objetivando extinguir as trincheiras das batalhas
sociais; emudecer as frentes dos movimentos trabalhistas; reduzir os agrupamentos de
intelectuais que acreditavam nas mudanças, nas transformações, na utopia; fazer cessar os
gritos frenéticos dos estudantes nas praças, nas ruas, nas universidades; fazer calar as vozes;
corromper as representações políticas, cooptar as lideranças e rasgar a carta ética escrita na
história da humanidade.
Se a luta pelo direito à educação pugna por mudanças, será preciso rever as novas
astúcias promovidas nas instâncias do poder disfarçadas pelos discursos da judicilização da
educação impregnados de promessas de cumprimento dos direitos constitucionais, como
redenção aos excluídos.
A população, historicamente expropriada dos bens que deveriam lhe pertencer por
justiça na partilha natural da riqueza da nataureza e pela promessa da igualdade social,
vivendo a margens dos bens sociais, excluída das oportunidades de acesso a educação e
cultura, é agora chamada aos tribunais judiciais na condição de hipossuficientes, para receber
decisões judiciais como vitória concedida por arautos da justiça.
O direito à educação é questão mundial e foi conquistado como direito escrito nas
Cartas Constitucionais da maioria dos Países do Mundo, deixando marcado nas estradas dos
tempos o sacrifício da própria vida dos que lutaram por essa causa, razão de ser imcompatível
184
com a própria origem das lutas o uso de tais direitos como engodo para o fortalecimento de
poderes institucionais, como tem ocorrido com o Ministério Público e o Poder Judiciário.
A organização EDUCAREDE (2003), em texto intitulado “O direito de ter direitos”,
relata a sequência das conquistas dos direitos, conclamando à luta pela concretização desses
direitos.
A primeira geração de direitos civis e políticos, apresentava a promessa do
fortalecimento da sociedade civil e dos indivíduos na relação com os poderes do Estado,
retratada na “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” proclamada na França em
1789, garantindo a liberdade e a igualdade dos direitos de todos os indivíduos.
A revolução industrial do século XIX fez por surgir novos problemas e novas lutas
sociais. Os direitos garantidos na Declaração de 1789 não refletiam a difícil realidade em
que vivia a população (exploração do trabalho, baixos salários, falta de moradia, saúde e
educação).
Os direitos da primeira geração pugnavam pela liberdade enquanto o movimento
trabalhista exigia a efetividade desse direito e a conquista dos direitos de igualdade.
Surgem os direitos de segunda geração - direitos sociais, econômicos e culturais,
representados pelo direito à organização sindical, à segurança e estabilidade no trabalho, à
greve, à previdência social, à saúde, à educação gratuita, à cultura e à moradia, cabendo ao
Estado o dever de garantir os direitos conquistados.
As grandes guerras mundiais e suas conseqüências demonstraram a violação total aos
direitos do homem e é nesse momento que os governos e as entidades se unem aos
movimentos populares na luta por direitos, finalmente inseridos na “Declaração Universal
de Direitos Humanos” aprovada em 10 de dezembro de 1948.
Sem efetividade os direitos de primeira e segunda gerações, a Declaração de 1948
passou a incorporar os direitos civis e políticos formulados nas lutas contra o Absolutismo,
nos séculos XVII e XVIII, e os direitos sociais, econômicos e culturais, propostos pelos
movimentos sindicais e populares durante os séculos XIX e XX.
Na metade do século XX novos movimentos gritam pelas desigualdades sociais, pela
destruição do meio ambiente, pela desigualdade nas relações de gênero, dentre outros,
conseguindo a criação de uma terceira geração de direitos: os direitos de solidariedade, à
paz, ao desenvolvimento e à autodeterminação dos povos, a um meio ambiente saudável e
ecologicamente equilibrado e à utilização do patrimônio comum da humanidade. Nesse
mesmo tempo são gerados documentos internacionais em favor da mulher, da criança, do
185
Não se pode aceitar que os direitos fiquem restritos aos textos em que são expressos,
pois formam um patrimônio coletivo da humanidade que deve ser garantido a todos
os cidadãos do mundo. A sua violação deve nos encorajar a transformar as
condições que impedem a sua efetivação.
Novos desafios, conflitos e necessidades certamente colocam em pauta os direitos: a
garantia dos direitos já expressos; a conquista de novos direitos. Os direitos são
efetivados e conquistados se estivermos atentos às transformações sociais e
dispostos a enfrentar as situações que podem impedir ou limitar a sua existência.
(ERNICA; ISAAC; MACHADO, 2003, p. 1).
Educação para
Todos.
Registro na
Declaração de
Jomtiem (1990): -
Plano de Ação – Item
26 – Item 33
Registro na Emenda
Registro na LDB Constitucional nº 19,
(1996) de 1998 –
Constituição Federal
Art. 1º e 2º (1988)
Universalização
do Ensino
Registro na
Declaração de
Jomtiem (1990)
Art. 3º
Registro na Registro na
Emenda Declaração de
Constitucional n º Salamanca (1994)
14, 12/09/1986: Art. 2º
LDB 1996
Art. 3º
Educação como
dever do
Estado.
Registro na
Declaração dos
Direitos da
Criança (1959)
Princípio7º
Registro na Registro no
Declaração de Estatuto da
Jomtiem (1990): Criança e do
art. 3º Adolescente
(1990)- Art. 54
Obrigatoriedade
e Gratuidade do
ensino básico
Registro na
Declaração de
Jontiem (1990):
Aert. 3º
Registro na Lei de
Diretrizes e Bases Registro na
da Educação Declaração de
Nacional (1996): Salamanca (1994):
Art. 4º 3
nas relações de poder, dos quais pode-se destacar os conflitos econômicos e políticos que
dinamizam em suas hegemonias contrapostas pelos movimentos sociais, a própria formação
de conceitos.
A periodização utilizada pela história tradicional tenta agrupar e dar um sentido de
continuidade, razão porque definem períodos na história da educação brasileira como espaços
de acontecimentos político-econômicos. Como exemplo podemos citar: No Brasil Colônia, o
Período Jesuítico (1500-1759), ainda no Brasil Colônia o Período Pombalino (1759-1822), no
Brasil Império (1822-1889), Na Primeira República (1889-1930), Na Era Vargas (1930-
1945), No Nacional Desenvolvimentismo (1945-1964), no período militar (1964-1984), na
transição democrática (1984 em diante).
Esses momentos históricos apontam para uma serie de embates que se refletem em
variadas legislações, muitas em decorrência de ações reformistas presenciando a inserção de
novos enunciados no plano educacional a demonstrar um percurso político institucional
governamental no qual a educação tem seu tratamento inicial como “instrução”, não sendo
questão prioritária nos programas de governo.
Evoluindo a cada período e retrocedendo em outros, a educação foi submetida a
alternâncias entre momentos de exercício democráticos e outros de cunho autoritário, até
alcançar sua inscrição como direito social na Carta de 1988.
A Declaração Mundial sobre Educação Para Todos, Jomtiem (1990), em seu
preâmbulo, trás uma análise da realidade de quarenta anos de luta internacional pela educação
destacando a persistência de problemas de grande gravidade como a falta de acesso ao ensino
primário para mais de 100 milhões de criança:
______________
30
Dados da Declaração de Dakar (2000).
195
esparsas, que são a Lei 4024/61, a Lei 5540/68, a Lei 5692/71 e a Lei 7044/82, desprovidas de
uma centralidade e sistemacidade.
Como já afirmado, o projeto de lei destinado a estabelecer as diretrizes e bases da
educação nacional como competência privativa da União, obteve já em dezembro de 1988 o
início da sua tramitação, sendo vivenciado um rico momento de discussão que alcançou os
principais segmentos da educação em todo o Brasil sob a liderança do Fórum Nacional em
Defesa da Escola Pública.
Entre as discussões que antecederam a aprovação da LDB/96 resultando em um
projeto bastante abrangente e o texto aprovado de autoria do Senador Darci Ribeiro, podem
ser identificados alguns enunciados não validados e a inserção de outros enunciados não
contemplados na redação fruto do debate nacional.
Dentre os enunciados não validados é possível citar a ausência de uma clara
normatização a respeito do funcionamento das instituições privadas de ensino que pudesse
contemplar a participação direta do corpo docente na estrutura de definição pedagógica na
qual fosse incluída a questão da qualidade e de forma expressa a liberdade de manifestação e
associação dos professores.
Outro ponto enunciativo que no projeto participativo que antecedeu ao substitutivo
Darci Ribeiro foi inserido como consenso e não foi convalidado no processo de aprovação da
LDB/96 foi a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais através da proibição
de cobrança de taxas dos alunos.
A luta desenvolvida pelo Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública tinha
também por objetivo a participação da comunidade brasileira representada pelo Fórum
juntamente com o Conselho Nacional de Educação e Ministério da Educação, nas ações
voltadas a proposições e avaliações da educação nacional, criando-se um processo de maior
democratização.
A não validação desse conjunto enunciativo revela-se como uma estratégia de
interdição do discurso democrático da gestão nacional da educação na medida em que, ao
excluir o Fórum como uma das vertentes representativas da nação brasileira na fixação de
políticas e controle da educação nacional, optou-se por persistir no retrocesso político
educacional mantendo-se a visão parcial da burocracia estatal.
Na trama da formação do discurso das diretrizes e bases da educação nacional
identificam-se também condições de possibilidades históricas do discurso estabelecidas por
196
básica e ensino superior, pauta-se pela restrição de recursos financeiros, fazendo desaparecer
sem perceber a questão dos suportes financeiros na entoação do discurso da necessidade de
novos contornos teóricos funcionais da gestão da educação.
A produção do direito à educação, enquanto subsídio da judicialização da educação,
foi permeada pelas relações de poder geradas por regras, imposições, determinações, jogos de
composição e antagonismos, na fase de edificação dos discursos, revelando-se como jogos de
forças na gestão das sociedades, capitaneadas pelo sistema capitalista, no qual as insurgências
de oposição por maiores que sejam suas capacidades de insurreição, ainda se curvam à
dominação que tem um ritual próprio com procedimentos que naturalizam o domínio, o
controle, a sujeição, estimulado pelos processos de produção.
Há um combate permanente travado pelos múltiplos setores da sociedade no espaço
público e privado frente a composição de enunciados formadores de discursos, emergidos nas
superfícies do conhecimento como verdades postas (emergência), razão da afirmação de que
os discursos sofrem influencias dos sujeitos históricos, os mais variados que se notabilizam
nas práticas sociais.
A genealogia nada mais é que a pesquisa da proveniência e da emergência (Herkunft
e Entstehung) objetivada a mostrar as relações de força e o confronto que se processa na
produção dos saberes ao longo da construção enunciativa dos discursos.
A emergência inicial do discurso do direito à educação foi o seu aparecimento
acoplado ao discurso dos direitos humanos, formado descontinuadamente em um longo
período, mas que não se materializa como verdade universal ante a inexistência de um saber
absoluto, pois, o saber emerge em meio à violência que caracteriza a regra discursiva que
impõem condições de domínio.
Já o discurso da judicialização da política e da judicilização da educação polarizam
atenções pela grande abrangência aplicativa, somada a interferência ideológica de
Instituições, o estabelecimento de um novo paradigma na ação de Estado comandada pelo
neo-constitucionalismo, as novas competências do Judiciário e do Ministério Público, das
Polícias e dos Conselhos Tutelares, tornando o espaço do discurso um amplo campo que estão
sendo delimitados pela subjetividade dos sujeitos (Julgadores) na visão discricionária dos
princípios e valores constitucionais.
As técnicas de reescrita dos enunciados do direito à educação, forjados nos
movimentos sociais mundiais e entidades internacionais, em documentos e leis culminaram
198
CONSIDERAÇÕES FINAIS
econômicos, acompanhados por reformas dos Estados, decorrentes da readequação dos modos
de produção, conduzindo por essa trilha todos os setores da sociedade sob as influências das
relações determinadas pelo atual modelo imposto pelo sistema capitalista.
Isso nos posssibilitou localizar onde se alojam e fundam-se os discursos da
Judicialização na Educação. Enquanto pilares podemos afirmar que seu lastro se alinha ao
neo-constitucionalismo, responsável pela conformação dada a um novo ordenamento jurídico,
melhor expressado com a aprovação da Constituição Federal de 1988, no caso do Brasil.
Isso impôs o surgimento de novas tipologias no campo dos direitos (individuais,
fundamentais, coletivos, humanos, sociais, difusos, ambientais) e as relações deles
decorrentes provocou outras espécies de demandas às quais o positivismo normativista não
mais conseguiu responder, embora ainda seja as bases das relações jurídicas hoje.
Nessa composição dos direitos de terceira e quarta gerações, somados aos de
primeira e segunda, o direito à educação ocupou lugar de importância ante seu histórico de
mais de dois séculos de conquistas sedimentadas por embates e lutas alimentadas pelos
movimentos sociais e entidades internacionais, além do interesse maior despertado pelas
profundas transformações no modelo econômico mundial, exigindo a produção de mão-de-
obra com novas capacidades ante os requisitos de competências, criatividades e
competitividades.
Sob mencionado panorama mundial, novas configurações jurídicas foram dadas aos
Poderes da República, ocorrendo a cedência de certa supremacia ao Poder Judiciário em
relação ao Executivo e Legislativo, sustentada pela implantação da teoria do ativismo judicial,
tendo no primado do império da constituição por seus princípios, valores e diretrizes o
alicerce das ações de intervenção nos mais diversos domínios da vida.
A teoria da judicialização na concepção do ativismo judicial constitui o centro neural
teórico conceitual do discurso em análise por ser o nexo causal da reconstituição das relações
de poder na sociedade contemporânea, via de conseqüência, numa total reestruturação da
agenda estatal determinada a pautar todos os domínios do conhecimento. A judicialização da
educação seguiu esse modelo teórico marcado por pontos de ligação de uma sistematização,
sendo determinante no processo de formação de objetos, enunciações e modalidades
enunciativas, exercendo uma reprodução estratégica em outros espaços, mas tendo as mesmas
conseqüências.
Como artefato para rápida apreensão e aceitação pública da judicilização da
educação pela sociedade, o discurso emergiu nas mais diversas superfícies de sua inscrição,
201
O discurso do direito à educação acoplado aos direitos humanos teve seus primeiros
marcos enunciativos na passagem da modernidade para a contemporaneidade, servindo como
pano de fundo para a ruptura com o absolutismo e a ascenção da burguesia ao poder.
Sob fortes embates e decisões, sua principal e primeira escritura documental a
Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948), tornou-se referência temática mundial
proporcionando à educação espaço institucional e grande mobilização das sociedades e
entidades internacionais razão da sua inscrição posterior nos mais diversos tratados, pactos e
declarações internacionais e nas mais diversas Constituições dos países do mundo.
A educação consolidou-se como questão política e dever governamental difundida
como área de vital importância ao desenvolvimento do ser humano e dos Países, demandando
constantes produções de estudos, levantamentos, análises e pesquisas, objetivando-se
conhecer o quadro situacional mundial.
Os dados quantitativos e qualitativos obtidos, retratados em documentos produzidos
por organizações congregadoras dos mais importantes países foram difundidos e seqüenciados
por recomendações que se seguiram à intensa mobilidade institucional em ações de caráter
planejativo e de financiamento mundial.
Essa e outras exigências do setor econômico tornaram os embates políticos mais
acirrados ante a determinante posição de adoção de novas configurações do papel do Estado,
construídas sob o paradigma do capitalismo mundializado firmado pelos nós das correntes
que guarnecem os interesses do capital resumidos ao consumo e lucro.
O despontar de diferentes exigências do mercado proporcionou a destruição das
políticas de investimentos sociais e alimentou composições entre os setores privados de
produção e o público estatal objetivadas ao estabelecimento de políticas de preparo da mão de
obra competente e de qualidade indispensável à economia.
A educação, preleccionada como direito de todos, e, já inserida na grande maioria
das constituições dos países do mundo torna-se objeto da produção discursiva mundial
capeada pelas necessidades de desenvolvimento do homem. O Brasil, vindo de mais de vinte
anos de regime autoritário recepcionou no processo constituinte de 1987/88 os principais
documentos internacionais, tratados, declarações, acordos e pactos vindo a inserir o direito à
educação como um dos pontos mais importantes da Constituição Federal de 1988, festejados
com uma espécie de agradecimento popular à classe política ao atendimento das necessidades
sociais e à concretização dos ideais da cidadania.
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