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Curso de

Tupi Antigo
A língua da costa do Brasil em 1500

por Ariel L. de O.
2021 por: Ariel L. de O. 2021
Curso de Tupi Antigo
O Brasil é um país multicultural e poliglota; com várias
famílias de línguas, sendo que uma delas é o macro-tupi,
dentro da qual está o tupi. Esta apostila é um curso
amador da língua, que busca ensinar o tupi de 1500
com adaptações para usar nos dias atuais.

Para informações sobre o autor, me encontre em


Blog: tupiperiodico.tumblr.com
e-mail: arielnintendo@gmail.com
WhatsApp: +55 (12) 9 9108-7991
Telegram: @soranotamashii
SUGESTÕES DE ESTUDO

Livros:
• NAVARRO, Eduardo de Almeida. Método Moderno
de Tupi Antigo.
• BARBOSA, Lemos. Curso de Tupi Antigo.

Fontes:
• Vocabulário na Língua Brasílica.
• VIÉGAS, A. P. Vocabulário Português–Tupi.
• de CARVALHO, Moacyr Ribeiro. Dicionário Tupi
(antigo)–Português.
• BARBOSA, Lemos. Pequeno Vocabulário Tupi–
Português.
• Biblioteca Digital Nimuendaju
• Cursos de Tupi e Nheengatu na FFLCH–USP
Blogs:
• Abánhe'enga rupi/resé xe remikûatîara
• Língua Brasílica
• Xe mba'e
• Tupi Periódico
• Aprender a Língua Tupi
• Ame o Brasil
O QUE É O TUPI E O QUE NÃO É

Na escola, quando aprendemos do Brasil pré-cabralino,


nos contam muito sobre os povos “tupi-guarani.” Nas aulas de
geografia, aprendemos que “Caraguatatuba” e “Jericoacoara”
são nomes “tupi-guarani.” Isso é parte de uma simplificação
feita para crianças que não têm contato com a história e com os
povos nativos brasileiros. “Tupi-guarani” é um ramo de uma
grande família linguística tupi, e dentro deste ramo se encontra
o tupi antigo de que falo neste livro; o tupi falado na costa do
Brasil durante os primeiros anos da colonização. Língua da
qual se desenvolveram línguas gerais no Norte e no Sul, das
quais também vêm muitos topônimos. Além do tupi, não
podemos nos esquecer a diversidade cultural e linguística do
Brasil. A língua tupi e a língua krenak, por exemplo, são tão
ininteligíveis quando o português e o tupi. Já o tupi antigo e o
guarani antigo podem ter sido tão inteligíveis mutualmente
quanto o português e o castelhano.
LINGUAGEM NEUTRA

Perceba que esta apostila usa linguagem neutra


(também chamada de “neolinguagem”), isto é, linguagem
neutra de gênero. Essa linguagem inclui usar o termo “pessoa”
ou “criança” no lugar de “homem” ou “filho,” por exemplo.
Também vai se refletir em algumas profissões, como
“médique,” e eu vou embaralhar os gêneros nas frases – não
são todas masculinas, nem femininas, nem neutras.
Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

LIÇÃO 0

TUPI NHE'ENGA – A LÍNGUA TUPI

Antes de qualquer coisa, é importante entender os sons


e a escrita da língua. Aqui, vou começar explicando as
qualidades das vogais em tupi, suas consoantes e mudanças
fonéticas que vão afetar as palavras em diversos casos.

A língua tupi tem 12 vogais: 6 sonoras e suas


variações nasais. Todas são abertas, ou seja, o “e” tem som de
“é” (/ɛ/), o “o” tem som de “ó” (/ɔ/), e o “a” tem som aberto
mesmo quando é nasal (/ã/, e não /ɐ/ɐ , como em português).
O tupi tem a vogal /ɨ/, representada pela letra “y”.
Algumas pessoas dizem que esse som é entre o /i/ e o /u/, ou o
contrário do “u” francês e do “ü” alemão. Para produzir esse
som, pronuncie /iuiuiu/ e perceba o movimento da língua de
frente pra trás no céu da boca. A língua deve ficar bem no
meio. Perceba também que os lábios ficam arredondados para
pronunciar /u/, mas abertos para pronunciar /i/. Mantenha-os
abertos como em /i/. Assim se faz o som /ɨ/.

A língua tupi tem 19 consoantes:

• O m tem o mesmo som do português, como na palavra:


tetama. Não esqueça de fechar os lábios para
pronunciar o “m” no final de palavras, como em sem.
• O n também tem o mesmo som do português, como na
palavra: kunumĩ. Não se esqueça de mover a língua
para pronunciar o “n” no final de palavras também,
como em nhan.
• O ng tem seu som como no inglês: porang. Se o ng for
seguido de uma vogal, é possível que tenha som de
“ng” como em portugês: nhe'enga.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

• O mb é um som de /b/ pré-nasalizado. Então, comece a


pronunciar b com um som nasal anterior a ele. Como na
palavra: mba'e.
• O nd também é um som pré-nasalizado. Comece a
pronunciar o d com um som nasal anterior a ele. Como
na palavra: endé.
• O p tem o mesmo som como em portugês: paranã.
• O t tem o mesmo som como em português e é possível
que tenha o som de /tʃ/ antes de i, isto é, algo como
“txi.” Exemplo: tining.
• O k tem o som como em inglês. Por exemplo: oka.
• O b tem o som como no castelhano entre vogais. Para
fazer esse som, tente pronunciar /b/ sem tocar os lábios.
Por exemplo: karaíba.
• O s sempre tem o som surdo, isto é, nunca tem som
de /z/. Por exemplo: ka'aasapaba (daí Caçapava).
• O x é um alofone de s. Todo “s” depois de “i” torna-se
“x.” Por exemplo: i xy.
• O r é sempre um flap simples, como no português
“arara”. Nunca é velar (“rr”) e tampouco vibrado.
Exemplo: karagûatá.
• O ' é uma pausa glotal. É o som que fazemos em uh-
oh. Por exemplo: 'y.
• O h é o mesmo som do inglês. É um som bastante raro
no tupi, como no cumprimento he.
• O g é uma aproximante. Acontece no mesmo lugar da
boca do g do português, mas a passagem de ar não é
obstruída: ygara.
• A semivogal û tem som de /w/. Nos casos de gû e no
começo de palavra, o som varia livremente entre /w/
e /ɰʷ/: gûyrá.
• A semivogal î tem som de /j/, e em contextos nasais
pode se transformar em /j~ɐ ɲ/: îandé/nhandé.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

A acentuação em tupi segue as regras do português. Isto


é, oxítonas terminadas em “a(s)”, “e(s)” e “o(s)” recebem
acento. Ditongos terminados em “i” ou “u” recebem acento.
Para fins didáticos, é comum usar do hífen (-) ou
manter os acentos próprios dos morfemas ao juntar palavras.
Por exemplo, vamos ver como o monólogo de Gûaîxará seria
em diferentes caligrafias:

COM HÍFEN SEM HÍFEN, COM ACENTOS


Mba'e-eté ka'u-gûasu, Mba'eeté ka'ugûasu,
kaûĩ mo-îeby'-îebyra. kaûĩ moîebýîebýra.
Aîpó s-aûsu'-katu-pyr-a, Aîpó saûsúkatúpýra,
aîpó anhẽ. Îa-mombe'u aîpó anhẽ. Îamombe'u
aîpó i mo-morang-y-mbyr-a. aîpó i momorangymbýra.

S-erapûan kó mosakara, Serapûan kó mosakara,


i kaûĩ-gûasú-ba'e. i kaûĩgûasúba'e.
Kaûĩ mboapŷ-areté, Kaûĩ mboapŷareté,
a'e marã'-monhangara, a'e marãmonhangara,
marana potá memẽ. marana potá memẽ.
NESTA APOSTILA COM MENOS ACENTOS
Mba'eeté ka'ugûasu, Mba'eeté ka'uuasu,
kaûĩ moîebyîebyra. kauĩ moiebyiebyra.
Aîpó saûsukatupyra, Aipó sausukatupyra,
aîpó anhẽ. Îamombe'u aipó anhẽ. Iamombe'u
aîpó i momorangymbyra. aipó i momorangymbyra.

Serapûan kó mosakara, Serapuan kó mosakara,


i kaûĩgûasúba'e. i kauĩuasúba'e.
Kaûĩ mboapŷareté, Kauĩ mboapyareté,
a'e maramonhangara, a'e maramonhangara,
marana potá memẽ. marana potá memẽ.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

LIÇÃO 1

GÛATÁ YPY – PRIMEIROS PASSOS

Imagine que você está chegando no litoral do Brasil em


1500 e uma comunidade litorânea vai te receber na praia.
Como esse diálogo começaria?

Bem, a forma educada de cumprimentar é:

– Ereîupe/Ereîúrype? (lit. você está vindo?)


Em resposta, você deve dizer: – Aîur (lit. estou vindo).
– Eîkobé! (lit. viva!)

Existem, claro, os cumprimentos ao longo de diferentes


partes do dia.

De manhã: tîa nde ko'ema

Ao meio dia: tîa nde asaîé

De tarde: tîa nde karuka

De noite: tîa nde pytuna

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

No entanto, sendo uma pessoa estranha, provavelmente


te diriam:

– Abape endé? (quem é você?)


ou – Marãpe nde rera? (como é o seu nome?)

Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro em 1500


por Oscar Pereira da Silva (1922)

Você pode se apresentar dizendo: – Xe rera... (meu


nome é...).

Depois disso, a pessoa que te recebeu vai querer saber


de onde você veio. Essa pessoa dirá: – Mamõ suípe ereîur? (de
onde você vem?)
Responda dizendo: – Aîur ... suí (eu vim de ...).

Para seguir seu caminho, você vai se despedir. Existem


várias fórmulas para isso.
– Ne'ĩ, asó (ikó/ko'yré)
Então vão te desejar uma boa viagem te dizendo: –
tereîkokatu/teresokatu (lit. que você fique bem/que você vá
bem).

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

Se for a hora de comer ou de dormir, você tem a opção


de dizer algo como terekarukatu ou terekekatu (que você coma
bem ou que você durma bem).
Se houver a intenção de se encontrarem de novo, então
diga: – tîaîoepîákyne (que nos vejamos) ou tîanhomongetane
(que conversemos).

Então agora podemos fazer nosso primeiro diálogo.


Escolha alguém para completar os espaços com seus nomes e
as suas cidades ou bairros.

Exercício:
Estudante A – Eîkobé!
Estudante B – Tîa nde ko'ema! Abape endé?
Estudante A – Xe rera ______. Marãpe nde rera?
Estudante B – Xe rera ______. Mamõ suípe ereîur?
Estudante A – Aîur ________ suí. Mamõ suípe ereîur?
Estudante B – Aîur ________ suí. Ne'ĩ, asó ikó.
Estudante A – Teresokatu. Tîanhomongetane!
Estudante B – Tîaîoepîákyne!

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LIÇÃO 2

MARÃPE EREÎKÓ? – COMO ESTÁ VOCÊ?

Para começar a fazer frases de verdade na língua,


precisamos conhecer os pronomes. Os mais importantes são os
que estão abaixo:

Tupi Português
Ixé Eu
Endé Você, tu
A'e Ela, ele, elas, eles
Oré Nós (exclusivo)
Îandé Nós (inclusivo)
Peẽ Vocês, vós

Você deve ter percebido que os pronomes são bem


diferentes do português. Vamos ver isso por partes.

• Por que endé significa “você” e “tu”? Por que “peẽ”


significa “você” e “vós”?
No Brasil, temos uma diversidade de jeitos de falar o
português. Enquanto a maioria dos lugares usa “você”
pra falar com alguém, alguns lugares ainda têm o “tu.”
O uso do “vós” é bastante raro no Brasil, mas ainda
sobrevivo em Portugal e Angola, por exemplo. Os dois
têm o mesmo significado de falar com quem está à sua

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

frente. Nesta apostila, eu vou traduzir sempre como


“você” e “vocês.” Coloquei os dois na tabela para
deixar isso claro.
• Por que a'e significa ela/elas/eles/ele?
O pronome a'e serve pra qualquer pessoa ou até grupo
de pessoas, porque o tupi não diferencia gênero nem
número, isto é, não tem diferença dizer professora,
professor, professores e professoras. Por isso, a'e serve
para todas essas opções.
• Por que tem dois pronomes para dizer “nós”?
O tupi, assim como muitas línguas do Oceano Pacífico,
tem dois pronomes para nós: um inclusivo e um
exclusive. Oré é o “nós” quando você fala com alguém
de um grupo que não envolve a pessoa – por exemplo,
um grupo de mulheres falando a um homem sobre
mulheres. Já o îandé é inclusivo, isto é, inclui a pessoa
com quem você está falando – por exemplo, quando
dois pescadores estão falando sobre pescadores.

Agora que conhecemos os pronomes, você também


pode se apresentar de outro jeito: Ixé... (eu sou...) ou ... ixé
(...sou eu). Você pode preencher dizendo seu nome, sua
profissão ou alguma outra identidade sua. Isso funciona porque
o tupi não tem cópula, isto é, não precisa de um verbo para
“ser/estar.” Veja os seguintes exemplos:

a) Oré poroposanongara
Nós (excl.) somos médicas
b) A'e morombo'esara
Ele é professor
c) Kunhã endé
Você é mulher/a mulher é você
d) Kunumĩ a'e
Ele é menin/o menino é ele

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Exercício:
Usando esse vocabulário, traduza para o tupi as frases:

kunumĩ – menino kunhã – mulher


apŷaba – homem morombo'esara – professore
pitanga – criança kunhãtaĩ – menina
temimbo'e – alune poroposanongara – médique

a) Você é a criança
R:
b) Ela é a menina
R:
c) O homem é ele
R:
d) O estudante sou eu
R:
e) Nós (incl.) somos estudantes
R:
f) Vocês são as professoras
R:
g) A mulher é a professora
R:

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Com os pronomes, vamos aprender a conjugar nosso


primeiro verbo: o verbo ekó/ikó, que significa estar, viver ou
morar.

Pronome Verbo
Ixé a-îkó
Endé ere-îkó
A'e o-îkó
Oré oro-îkó
Îandé îa-îkó
Peẽ pe-îkó

Perceba mais uma diferença do tupi para o português.


Em português, nós conjugamos um verbo mudando o final –
comer→como, comes, come... Já no tupi, mudamos o começo
do verbo com um prefixo único de cada pronome:

ixé→a
endé→ere
a'e→o
oré→oro
îandé→îa
peẽ→pe

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Isso vai acontecer de novo com todos os verbos. Por


isso é importante fixar bem na memória.

Exercício:
a) Ixé __ itákûape
Eu estou na enseada das pedras (Itakûá/Itaguá)
b) Endé __ pindó 'ype
Você está no rio das palmeiras
c) Oré __ Nhoesembepe
Nós (excl.) estamos em Nhoesembé/Porto Seguro
d) Peẽ __ ka'ape
Vocês estão na mata
e) Îandé __ kotype
Nós (incl.) estamos no quarto
f) A'e __ ytupe
Ela* está na cachoeira
*Poderia ser qualquer pessoa ou grupo de pessoas

No exercício, você deve ter percebido que todas as


frases terminam em -pe. Isso será explicado melhor na próxima
aula.

Esse verbo ekó/ikó é bastante versátil. Mais um uso que


aprenderemos dele nesta aula é dizer como você está.

– Marãpe ereîkó? (como você está?)


– Aîkokatu. (estou bem.)

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LIÇÃO 3

MAMÕ SUÍPE EREÎUR? – DE ONDE VOCÊ VEM?

Na aula 2, nós aprendemos o verbo ekó/ikó, mas


ficamos com um mistério: por que todas aquelas frases
terminam com -pe?
Esse -pe é o que nós chamamos de posposição. O
português é uma língua que tem preposições – por exemplo:
no quarto, na casa, em cima da mesa, debaixo da cadeira, etc.
Já o tupi tem posposições, que fazem o mesmo trabalho, mas
vêm depois da palavra. Vamos aprender as posposições mais
básicas do tupi:

• -pe: em, para


• pupé: dentro de
• supé: para (pessoa)
• suí: a partir de, fora de

Para usar essas preposições básicas, vamos aprender


alguns verbos novos. Você se lembra como conjugar?

gûatá sem ker nhe'eng


pronomes
(andar) (sair) (dormir) (falar)
ixé agûatá asem aker anhe'eng
endé eregûatá eresem ereker erenhe'eng
a'e ogûatá osem oker onhe'eng
oré orogûatá orosem oroker oronhe'eng
îandé îagûatá îasem îaker îanhe'eng
peẽ pegûatá pesem peker penhe'eng

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Vamos ver algumas frases de exemplo:

a) Aker inĩ pupé


Durmo na rede
b) Eresem oka suí
Você sai da casa
c) A'e ogûatá itakûape
Ele caminha para a enseada das pedras
d) Îanhe'eng kunhã supé
Nós falamos para a mulher

No entanto, não é tão simples como colocar a


posposição depois da palavra. Antes disso, preste atenção a
dois fatores: a sílaba tônica e a nasalidade. Para posposições
que vêm separadas da palavra e que tem o acento próprio,
como supé e suí, nada muda, mas para -pe, que não tem acento
próprio e vem colada no final da palavra, isso importa. Se uma
palavra termina em um som nasal, como paranã, kunumĩ ou
kunhã, o -pe vira -me. Se a palavra terminar em -ma sem
acento, como 'ypanema, o -pe vira -me e o ma some. Se a
palavra terminar em -ba ou -pa sem acento, como
Karagûatatyba, a última sílaba some e fica com -pe. Por fim,
se for uma palavra que termina em -a sem acento, esse a vira
um y sem acento. Assim:

e) Ogûatá paranãme
Foi para o mar
f) Oroîkó ygárype
Ficamos na canoa
g) Asó 'ypaneme
Fui para Ipanema
h) Aîkó Karagûatatype
Moro em Caraguatatuba

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Veja que decidi traduzir para o passado algumas frases.


Isso aconteceu porque o tupi não diferencia o presente do
passado. Se quiser deixar claro quando aconteceu,
posteriormente vamos ver mais advérbios de tempo.

Exercício:
Usando esse vocabulário, traduza para o tupi as frases:

kunumĩ – menino kunhã – mulher


apŷaba – homem morombo'esara – professore
pirá – peixe ytu – cachoeira
'y, ty, îy – rio ybytyra – morro, Serra

h) A mulher caminhou para a cachoeira


R:
i) O homem falou à professora
R:
j) O menino está na Serra
R:
k) O peixe saiu do rio
R:

Agora você entende porque você se apresenta dizendo


aîur ... suí para dizer “eu vim de...” Então vamos conferir
alguns lugares com nomes tupi no Brasil:

Ilha Grande – 'ypa'ũgûasu


(o nome em tupi também significa Ilha Grande)
Niterói – Nheterõîa
Porto Seguro – Nhoesembé
São Paulo – Piratininga
(seu nome antigo era São Vicente; Piratininga significa “peixe
seco”)

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LIÇÃO 4

TYÎUKA – TIJUCA, RIO PODRE

Se o tupi não tem verbo para “ser/estar,” então para usar


um adjetivo para descrever alguma coisa é só por o adjetivo
direto?

Mais ou menos. Para usar os adjetivos, nós precisamos


conhecer os pronomes de 2ª classe:

1ª classe 2ª classe
Ixé xe
Endé nde
A'e i
Oré oré
Îandé îandé
Peẽ pe

Esses pronomes de 2ª classe têm várias utilidades. Aqui,


vamos aprender a usá-los com adjetivos. Vejamos o exemplo
angaturam (gentil):

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a) Xe angaturam
b) Nde angaturam
c) I angaturam
d) Oré angaturam
e) Îandé angaturam
f) Pe angaturam

Para usar um adjetivo dizendo que alguém é alguma


coisa (ele é gentil, ela é alta, nós somos velhos, etc.), você
sempre deve usar esse pronome de 2ª classe.
Em alguns casos, estamos falando de alguém por nome.
Então colocamos o nome e também o pronome i.

g) Gûãîbĩ i kyrá
A velha é gorda
h) 'ybotyra i porang
'ybotyra (nome feminino) é bonita
i) Ybyrá i puku
A árvore é comprida/alta
j) 'ybá i îuk
A fruta está podre

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Exercício:
Usando esse vocabulário, traduza para o tupi as frases:

nharõ – bravo ate'ym – preguiçoso


abá – pessoa kyre'ym – valente
angaturam – gentil kyrá – gordo
porang – bonito popyatã – forte
îagûara – onça gûãîbĩ – velha

a) Eu sou forte
R:
b) Você é gordo
R:
c) O menino é preguiçoso
R:
d) A pessoa é gentil
R:
e) A onça está brava
R:
f) O professor é bonito
R:
g) A velha é valente
R:

No entanto, algumas vezes não estamos dizendo que tal


pessoa é assim, mas dizemos algo como “a pessoa gorda falou
à pessoa magra.” Então como fazemos? Nesses casos, entra a
aglutinação do tupi, isto é, juntar palavras em uma nova
palavra maior.
Para fazer isso, precisamos dominar alguns aspectos da
fonologia do tupi fazendo duas perguntas: Cadê a sílaba tônica?
A palavra é nasal?
A sílaba tônica é aquela que leva o acento da palavra.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

Se você tiver dificuldade com isso, veja as sílabas sublinhadas


nas palavras: casa, menina, mulher, tupi, estudar, árvore.
E o que é uma palavra nasal? Bom, em tupi, uma
palavra é nasal quando a sílaba tônica é nasal, porque essa
nasalidade se espalha por toda a palavra. A sílaba tônica é nasal
se tiver ~, se tiver m ou n antes ou depois da vogal.

Vamos treinar isso vendo as próximas palavras em tupi:

não-nasais nasais
kunumĩ
apŷaba kunhã
îagûara nharõ
abá ate'ym
kyrá kyre'ym
popyatã

Então vamos começar do mais fácil:


abá + popyatã → abá-popyatã
Simplesmente juntamos as palavras.
îagûara + nharõ → îagûá'-nharõ
o ra átono sumiu.
apŷaba + ate'ym → apŷab'-ate'ym-a
Como ate'ym começa com vogal, podemos tirar só o a
átono do apŷaba. Veja também que nenhum substantivo pode
terminar em consoante em tupi. Por isso colocamos um a no
final.
kunhã + kyrá → kunhã-ngyrá
Kunhã é uma palavra nasal, mas kyrá não. Então kunhã
nasaliza o adjetivo kyrá transformando k em ng.
kunumĩ + kyre'ym → kunumĩ-kyre'ym-a
Kyre'ym já é uma palavra nasal, então não
transformamos k em ng. Veja que colocamos novamente o a no
final.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

As regras para nasalizar são as seguintes:

k → ng t, s → nd
b, p → mb, m r→n

Exercício:
1. Combine as palavras seguintes:
a) taîasu + poxy →
(o porco-do-mato/cateto feio)
b) kunhã + puku →
(a mulher alta/jovem)
c) 'ybá + kating →
(a fruta fedida, abacaxi)
d) ty + îuk →
(o rio podre, Tijuca)
e) 'y + panem →
(o rio imprestável, Ipanema)
f) îagûara + porang →
(a onça bonita)

2. Traduza para o tupi:


a) Ele está no rio podre.
R:
b) Você é a mulher alta.
R:
c) A onça bonita está na Serra.
R:
d) O cateto feio está no rio imprestável.
R:

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

LIÇÃO 5

NDE ANAMA – SUA FAMÍLIA

Quando falamos de membros da família é que o tupi


mostra sua cara. Começamos com a versatilidade dos
pronomes de 2ª classe que vimos anteriormente. Basta colocar
esse pronome antes de uma coisa pra indicar a quem ela
pertence. Na verdade, basta por qualquer nome antes. Por
exemplo: inĩ → xe inĩ; nde inĩ; i inĩ, etc. Vamos usar aryia e sy:

DIÁLOGO
– Eîkobé! (Oi!)
– Tîa nde karuka. Abape a'e? (Boa tarde. Quem são elas?)
– A'e xe aryîa, a'e xe sy. (Ela é minha vó, e ela minha mãe.)

– Abape gûãîbĩ? (Quem é a velha?)


– A'e Iperugûasu aryîa. (Ela é a vó de Iperugûasu)
– Abape kunhã? (Quem é a mulher?)
– A'e i xy. (Ela é a mãe dele.)

Agora que você conhece como mostrar posse em tupi,


você sabe a diferença entre:

îagûanharõ ≠ îagûara nharõ


(a onça brava) ≠ (a bravura da onça)

Você viu que dizemos xe sy, mas i xy. Isso é porque todo
s depois de i vira x.

Para aprender a falar da família em tupi, precisamos


entender primeiro o que são os substantivos pluriformes (seu
equivalente em guarani, língua irmã, é oscilante).

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

O tupi tem muitas palavras pluriformes – substantivos,


adjetivos, verbos. Os substantivos pluriformes são palavras que
mudam o começo dependendo de quem as possui. Vamos usar
a palavra para “nome”: tera.
Veja que há diferentes formas de mostrar um
substantivo pluriforme: era (t-, r-, s-), era (t) ou o que eu
prefiro usar: (trs) era pela praticidade.

nome t-era
meu... xe r-era
seu... nde r-era
… dele/dela/deles/delas s-era
nosso (excl.)... oré r-era
nosso (incl.)... îandé r-era
… de vocês pe r-era

Isso vai ser muito importante, pois muitas palavras para


parentes são pluriformes. Vamos ver algumas com um
exemplo:

Vamos começar focando em um casal: Potyra e


Paragûasu. Esse casal tem uma filha Îasy, e um filho,
Tatamirĩ.
Paragûasu tem um irmão, Pindobusu, e uma irmã,
'arasy. Pindobusu tem um filho mais velho que Tatamirĩ e
Îasy, chamado Aîmbiré, e 'arasy tem uma filha mais nova
chamada Îurukugûá. Paragûasu, Pindobusu e 'arasy são
filhes de Îagûanharõ e Mani.
Já Potyra tem uma irmã, chamada Ytu, e um irmão,
chamado Ka'ioby. Ka'ioby é pai de Paka, mais velha do que
Îasy e Tatamirĩ. Ytu é casada com Inaîegûasu e tem o filho
mais novo da família, chamado de Akangusu.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

ÎASY TATAMIRĨ ÎAGÛANHARÕ MANI


ANAMA

INAÎEGÛASU YTU KA'IOBY POTYRA PARAGÛASU PINDOBUSU 'ARASY

AÎMBIRÉ
PAKA
ÎASY TATAMIRĨ
AKANGUSU ÎURUKUGÛÁ

Se você for a Îasy, como você descreveria essa família?


Talvez você diria algo assim:
Em tupi Em português
Xe rera Îasy. Xe sy rera Potyra, xe Meu nome é Îasy. O nome da minha
ruba rera Paragûasu. Xe kybyra mãe é Potyra, e o nome do meu pai
rera Tatamirĩ. Xe ruba ryke'yra é Paragûasu. O nome do meu irmão
Pindobusu, tendyra 'arasy. 'arasy é Tatamirĩ. O irmão do meu pai é
xe aîxé. Pindobusu ra'yra Aîmbiré. Pindosubu, e sua irmã é 'arasy.
A'e xe kybyra. 'arasy membyra 'arasy é minha tia paterna. O filho
Îurukugûá. A'e xe pyky'yra. Xe de Pindobusu é Aîmbiré. Ele é meu
aryîa rera Mani, xe ramũîa rera primo. A filha de 'arasy é
Îagûanharõ. Îurukugûá. Ela é minha prima. O
Xe sy'yra rera Ytu. I mena nome da minha vó é Mani, e o
Inaîegûasu. Ytu membyra nome do meu pai é Îagûanharõ.
Akangusu. A'e xe kybyra. Xe tutyra O nome da minha tia materna é Ytu.
Ka'ioby. Ka'ioby raîyra rera Paka. Seu marido é Inaîegûasu. O filho de
A'e xe rykera. Ytu é Akangusu. Ele é meu primo.
Meu tio materno é Ka'ioby. O nome
da filha de Ka'ioby é Paka. Ela é
minha prima.
Veja que o tupi se importa com a geração, isto é, primo
e irmão são a mesma palavra. Por isso o tio paterno usa a
mesma palavra para pai.

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

mãe – sy avó – aryîa


pai – (trt) uba avô – (trt) amũîa
tio paterno – (trt) uba esposa – (trs) emirekó
tia paterna – aîxé esposo – mena
tia materna – sy'yra
tio materno – tutyra

TERMOS QUE DEPENDEM DO GÊNERO


Para mulheres: Para homens:
filhe (sem gênero) – membyra filho – (trt) a'yra
irmão – kybyra filha – (trt) aîyra
irmã +nova – (m) pyky'yra irmã – (trt) endyra
irmã +velha – (trt) ykera irmão +novo – (trt)ybyra
sogro – menduba irmão +velho – (trt)yke'yra
sogra – mendy sogro – (trt)atu'uba
sogra – (trt)aîxó

LIÇÃO 6

PINDAMONHANGABA – LUGAR DE FAZER ANZOIS

verbos transitivos: monhang, kuab, 'ok, sok, epîak (s), eî (s),


potar
combinação

LIÇÃO 7

YTUPE – NA CACHOEIRA

plantas e animais, îepotar≠syk, verbos irregulares: 'u e ur (tt),


negação
adjetivos pluriformes: oryb (rs), esãî (rs), akub (rs)
demonstrativos

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Curso de Tupi Antigo Ariel L. De O.

LIÇÃO 8

PARANÃGÛASU – O OCEANO

-usu/-gûasu
perguntas: -pe e serã
clima: ybaka, ybatinga, amana, amandusu, ybytu, kûarasy, ro'y,
sakub, tupã

LIÇÃO 9

KARAGÛATATYBA – CARAGUATATUBA, O
AJUNTAMENTO DE CARAGUATÁS

verbos de 2ª classe: ma'endûar, esaraî (rs), apysyk, tyb


i≠o
partes do dia

LIÇÃO 10

ÎASYK PIRATINÍNGYPE – CHEGAMOS EM


PIRATININGA/SÃO PAULO

futuro
advérbios de tempo

LIÇÃO 1

TÍTULO

lição

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