Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
São Gonçalo – RJ
2019
Thamiris da Silva Frazão
São Gonçalo - RJ
2019
Thamiris da Silva Frazão
_____________________________________________
Profª. Doutora Érica Cristina Bispo (Orientadora)
Instituto Federal do Rio de Janeiro
_____________________________________________
Profª. Doutora Angela Maria da Costa e Silva Coutinho
Instituto Federal do Rio de Janeiro
_____________________________________________
Prof. Doutor Osmar Soares da Silva Filho
Colégio Pedro II
São Gonçalo - RJ
2019
AGRADECIMENTOS
RESUMO
O presente trabalho traz um estudo sobre os poemas dos Cadernos Negros. Ao utilizar
perspectivas geográficas e literárias evidenciamos distintas representações da cidade,
destacando, em alguns momentos, as paisagens urbanas e como os lugares são
experimentados pelos sujeitos poéticos, o que permitiu a observação acerca da
configuração da cidade como produto de distintos momentos históricos, o espaço
urbano marcado por contrastes e lutas, os efeitos de medidas políticas nos processos de
marginalização e o acesso à cidadania, conduzindo a entendimentos e reflexões sobre as
relações sociais, por meio da linguagem poética.
RESUMEN
El presente trabajo trae un estudio sobre los poemas de los Cadernos Negros. Mediante
el uso de perspectivas geográficas y literarias, destacamos diferentes representaciones
de la ciudad, destacando, en algunos momentos, los paisajes urbanos y cómo los lugares
son experimentados por los sujetos poéticos, lo que permitió la observación de la
configuración de la ciudad como producto de diferentes momentos históricos, el espacio
urbano marcado por contrastes y luchass, los efectos de las medidas políticas en el
proceso de marginación y acceso a la ciudad, que conducen a la comprensión y
reflexión sobre las relaciones sociales a través del lenguaje poético.
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 1
2 ABORDAGENS SOBRE AS CONCEPÇÕES DE ESPAÇO, PAISAGENS, PAISAGEM
LITERÁRIA E CIDADE ............................................................................................................. 4
3 AS CIDADES ENTRE OS HIBRIDISMOS DOS TEMPOS ................................................. 11
4 A CIDADE E SEUS ANTAGONISMOS, LUTAS E RESISTÊNCIAS ................................ 20
5 EXPERIÊNCIAS DO ESPAÇO URBANO E O ACESSO À CIDADANIA ........................ 30
6 CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 41
7 REFERÊNCIAS ....................................................................................................................... 43
ANEXOS..................................................................................................................................... 46
1 INTRODUÇÃO
1
enunciação ou o desaparecimento das identidades, e conforme Cuti ao ressaltar que “a
produção literária de negros e brancos, abordando as questões atinentes às relações
inter-raciais, tem vieses diferentes por conta da subjetividade que a sustenta, em outras
palavras, pelo lugar socioideológico de onde esses produzem” (CUTI, 2010, p. 33).
Portanto, os poemas selecionados como corpus dessa pesquisa permitem evidenciar as
perspectivas contra hegemônicas.
Voltar à pesquisa para a análise de poemas que trazem a cidade e suas paisagens
possibilita a observação de como os lugares são experimentados. Os principais recortes
teóricos que buscamos contemplar com nossa análise nesta pesquisa operaram no
sentido de: evidenciar a cidade, as paisagens, as formas que são apreendidas pelos
sujeitos poéticos e como as percepções subjetivas dos cenários ajudam a revelar as
relações do acesso à cidadania destes sujeitos.
Com base nos nossos objetivos, o presente estudo teve como procedimento
metodológico essencial a pesquisa de fontes bibliográficas que nos permitiram analisar
as obras visando evidenciar os recortes teóricos anteriormente mencionados.
No capítulo “Abordagens sobre as concepções de espaço, paisagens, paisagem
literária e cidade”, discorremos sobre alguns conceitos teóricos e perspectivas acerca do
tema que julgamos pertinentes para nossa pesquisa. Entre eles, Milton Santos (2012 e
2014) e Roberto Corrêa (1989), pois ambos auxiliam no entendimento acerca dos
elementos geográficos e como se dão as dinâmicas sociais, econômicas e políticas nas
cidades capitalistas. Utilizamos Michel Collot (2013), a fim de recorrer a uma das
múltiplas possibilidades textuais como a de revelar as paisagens literárias, que são mais
que uma referência espacial, sendo constituídas pela atuação do imaginário e pela
apreensão objetiva e subjetiva de determinado lugar, o que permite entendê-las como
apelos de sentidos.
No capítulo “As cidades entre os hibridismos dos tempos”, partimos da visão de
Jacques Le Goff (2003) acerca da importância do ato de rememorar, apresentando dados
importantes de como as memórias são recuperadas nas diversas sociedades.
Apresentamos o conceito de memória coletiva, segundo Maurice Halbwachs (2015),
para entender como esse tipo de memória contribui na percepção da configuração da
cidade como constituição de mesclas temporais. Recorremos à perspectiva de
Maldonado Torres (2007), ao tratar do colonialismo (estrutura de poder em que uma
nação detém o controle sobre a outra) e da colonialidade (os restos do colonialismo na
2
sociedade capitalista), para discorrermos sobre alguns continuísmos históricos na
atualidade tais como os que concernem às questões como as relações de poder, os
genocídios e as segregações das populações negras.
No capítulo “A cidade e seus antagonismos, lutas e resistências”, evidenciamos
as diferentes oposições que existem no cenário urbano, alicerçados em concepções de
Aníbal Quijano (apud BALLESTRIN, 2000) que defende que na sociedade capitalista o
racismo desempenha papel fundamental no exercício do poder. Outra perspectiva
adotada foi a de Renato Emerson dos Santos (2014), que retoma o pensamento
decolonial aproximando-o do contexto brasileiro.
No capítulo, que trata das “Experiências do espaço urbano e o acesso à
cidadania”, pudemos analisar como os percursos feitos pelo sujeito poético denotam sua
inserção na sociedade brasileira. Para isso, utilizamos as constatações de Maria
Manzini-Covre (1995) sobre a cidadania como uma constante relação dialética entre os
direitos civis, sociais e políticos. Outra contribuição importante foi a Milton Santos
(1996-1997) ao defender a existência das cidadanias mutiladas.
Consciente de que este trabalho é uma singela contribuição para um leque de
possibilidades de leituras do corpus selecionado, buscamos destacar as paisagens dos
poemas apresentando os cenários urbanos tendo como vieses as desigualdades sociais e
raciais. Além disso, devido aos Cadernos Negros estarem preocupados com a
valorização da cultura e de escritores afro-brasileiros, tivemos oportunidade de nos
debruçar sobre textos que trazem perspectivas diferentes das predominantes no mercado
editorial, o que possibilitou evidenciarmos distintas experimentações na literatura que
tem como temáticas a cidade e as paisagens.
3
2 ABORDAGENS SOBRE AS CONCEPÇÕES DE ESPAÇO, PAISAGENS,
PAISAGEM LITERÁRIA E CIDADE
Para pensar sobre A cidade e suas paisagens nos Cadernos Negros, julgamos
pertinente recorrer a alguns aportes teóricos e críticos que podem nos auxiliar na
compreensão de perspectivas geográficas e literárias acerca do espaço, da paisagem, da
paisagem literária e da cidade. As concepções estão alicerçadas nos livros
Metamorfoses do espaço habitado (2014) e Pensando o espaço do homem (2012), de
Milton Santos, em O urbanismo como modo de vida (1987), de Louis Wirth, em O
espaço urbano (1989), de Roberto Lobato Corrêa, em O ser e o tempo na poesia (2015),
de Alfredo Bosi, em O arco e a lira (2012) de Octavio Paz, e nas obras Poética e
filosofia da paisagem (2013) e Do horizonte da paisagem ao horizonte dos poetas
(2013), de Michel Collot.
Os livros Metamorfoses do espaço habitado (2014) e Pensando o espaço do homem
(2012), de Milton Santos, apresentam informações complementares, por isso, decidimos
utilizar as duas obras de maneira dialógica. Santos (2014) nos apresenta o espaço e a
paisagem como categorias que possuem semelhanças e diferenças capazes de revelar as
dinâmicas sociais. Dos muitos termos que servem para abordar o conhecimento
geográfico, tais como lugar, área, região, território, habitat, paisagem, é o espaço que
adquire um sentido mais amplo. O espaço pode ser compreendido como uma totalidade
e a paisagem como uma subcategoria dele. Para o autor (2014), o espaço é um
agrupamento de objetos e das relações que ocorrem sobre esses itens e “é o resultado da
soma e da síntese, sempre refeita, da paisagem com a sociedade por meio da
espacialidade” (SANTOS, 2014, p.80), ou seja, o espaço é a união da paisagem, da
sociedade e da espacialidade ˗ é o instante da inclusão territorial dos processos sociais.
De acordo com Santos (2012), o espaço social é determinado pela forma, estrutura e
função. A segmentação desses elementos pode gerar análises equivocadas. Ao
privilegiar uma visão holística, o geógrafo compreende que a seleção de determinado
espaço não pode ser estudada através da paisagem ou localizada numa parte específica
do lugar, já que “a produção do espaço é o resultado de múltiplas determinações, cuja
origem se situa em níveis diferentes e em escalas variáveis, indo do simples lugar à
dimensão internacional” (2012, p. 58). Acrescenta que os objetos surgem repletos de
simbologias, representatividades e intencionalidades, contendo significados para além
4
da aparência, advertindo-nos que, por apresentar diversas influências, a simples
aparência do espaço tende a nos enganar.
O geógrafo também destaca que a disposição da população nos diversos
territórios não é igualitária e à medida que os espaços são ocupados, há alterações nos
locais, permitindo constatar que a heterogeneidade é um atributo do espaço, seja ele no
quantitativo populacional ou nas transformações do próprio espaço. No Brasil, a
urbanização foi grande influenciadora da distribuição de cidadãos e, portanto, das
mudanças da configuração espacial. Os avanços tecnológicos e sociais reverberam tanto
no campo quanto na cidade. Nesse sentido, Santos (2014) afirma que o capital constante
também está presente no campo nas figuras dos fertilizantes, das máquinas, das
sementes, por exemplo.
Convém salientar que alguns fenômenos contribuíram para as transformações
mundiais, sobretudo na segunda metade do século XX, tais como: a internacionalização
do capital; a interdependência econômica entre diversos países; a divisão internacional
do trabalho. Esses acontecimentos tiveram como resultado um processo de
uniformização das produções que atravessaram fronteiras, levaram as regiões e as
cidades a se especializarem, aumentando as trocas comerciais que passaram a ocorrer
por meio das transações entre diferentes partes do globo, estabelecendo uma conexão
entre elas e assumindo “diversos papéis, não só econômicos, mas também políticos,
culturais etc.” (SANTOS, 2014, p. 52). Então, houve aumento das influências externas
nos diversos países do mundo o que por um lado acentuou as características específicas
de alguns lugares e por outro uniformizou a produção.
Ao elucidar o conceito de paisagem, Santos (2014) defende que ela é o que a
nossa visão pode alcançar. Apreendida pelos sentidos humanos, a paisagem “é formada
não apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons etc.” (2014,
p.68). Para se constituir, ela depende de um posicionamento em algum lugar, alterando-
se conforme a disposição do corpo no local, em vista disso, a medida da paisagem é a
mesma da percepção. Cabe ressaltar que a percepção é seletiva e muda de acordo com
as experiências de cada indivíduo, já que cada espectador pode apreender algo diferente.
Ciente de que essa percepção é limitada, Santos ressaltou que ela não é um
conhecimento, pois depende da interpretação.
A paisagem é composta de elementos materiais e imateriais, está sempre voltada
para o passado, no entanto, regula-se de acordo com as exigências sociais e suas
transformações que são sempre parciais. Partindo das sugestões de Carl Sauer para
5
entendermos a paisagem como artificial ou natural, Santos (2014) afirma que paisagem
natural é aquela que não sofreu alteração pela ação humana, e a artificial é a alterada
pela ação do homem. O geógrafo entende que os processos produtivos industriais
tornam difícil encontrar paisagens naturais e, quando conseguimos obtê-las, elas são
objeto de especulação econômica. Por conseguinte, as alterações dos modos de
produção transformam os lugares, permitindo compreendermos que assim como o
espaço, “a paisagem é sempre heterogênea” (2014, p.71), resultado de mesclas entre
elementos naturais e artificiais.
A constatação de que a paisagem é heterogênea amplia-se para outras questões
como a existência de construções de diversos momentos históricos, resultado de
processos substitutivos e aditivos, tendo em vista que “uma paisagem é uma escrita
sobre a outra” (SANTOS, 2014, p.72). Isso se justifica pelo fato de que cada período
privilegia um método de produção, alterando a paisagem e atribuindo a ela um caráter
inovador, o que possibilita a coexistência de elementos do presente e do passado. Em
vista disso, temos uma paisagem que se organiza de acordo com as exigências do capital
e da tecnologia, sendo que a paisagem urbana, por contemplar diferentes níveis de
produção, apresenta-se mais multifacetada. Outro aspecto importante mencionado pelo
geografo é que a paisagem deve ser pensada junto com as questões políticas,
econômicas e culturais, mas que nem sempre é possível visualizar todas essas
influências nela.
Em ambos os livros de Santos pudemos entender que os avanços tecnológicos
permitiram o progresso e o aumento do bem-estar social, ainda que não tenham sidos
distribuídos de maneira igualitária, acarretando em múltiplas alterações desiguais nos
diversos espaços e paisagens.
Partindo das diferenciações entre espaço e paisagem, podemos refletir sobre a
cidade. Segundo Louis Wirth (1987), o surgimento da cidade moderna está relacionado
com os avanços da tecnologia e ela é “um núcleo relativamente grande, denso e
permanente, de indivíduos socialmente heterogêneos” (1987, p.96), contudo, antes era
possível encontrar as cidades pré-industriais e pré-capitalistas.
Sabendo que o centro da cidade é lugar onde os espetáculos mundiais e regionais
são protagonizados, as observações elaboradas por Roberto Corrêa esclarecem as
relações das dinâmicas sociais e estruturais. Corrêa (1989) entende o espaço urbano
como sinônimo de cidade, ele o conceitua como “conjunto de diferentes usos da terra
justapostos entre si” (1989, p.7). As utilidades da terra são fragmentárias e articuladas.
6
Enquanto a fragmentação reflete a segregação imposta por questões econômicas e
políticas endógenas a cidade capitalista, a articulação entre diferentes partes da cidade
utiliza como instrumentos as tomadas de decisões, as ideologias, as relações de poder, o
fluxo de capital, de pessoas e de produtos.
Percebendo o espaço urbano como simultaneamente articulado e fragmentado,
Roberto Corrêa sublinha que essa inter-relação é “a expressão espacial de processos
sociais” (1989, p.8), deste modo, por ser reflexo social, a cidade apresenta como
atributos a desigualdade e a mutabilidade. Unida à ideia do espaço como manifestação
das relações sociais, há a categorização dos agentes produtores do espaço urbano: os
proprietários dos meios de produção, proprietários fundiários, os promotores
imobiliários, o Estado e os grupos sociais dos excluídos. As ações dessas categorias são
reguladas juridicamente priorizando os interesses dominantes.
Os proprietários industriais e empresariais são grandes consumidores do espaço
devido à natureza da sua atividade. Os proprietários fundiários, através da
transformação das áreas rurais em urbanas, por causa do crescimento da população e da
demanda por terra, também utilizam como critério a incorporação de valor, a
localização geográfica e geológica. Os proprietários imobiliários, entre outras
atividades, fazem a incorporação de valores, financiamentos, investimentos,
levantamento de dados, construção do imóvel, acarretando no surgimento de outros
agentes como o proprietário-construtor. É importante salientar que o capital imobiliário
pode recorrer à ajuda estatal para a construção de habitações populares, isso se reflete
na criação do BNH (Banco Nacional de Habitação), por exemplo. O auxílio do Estado é
relevante, tendo em vista que serve para amenizar as crises econômicas por meio da
geração de empregos.
O Estado como agente produtor do espaço, por sua soberania, apresenta múltiplas
funções, atuando como consumidor, criador de espaço, promotor fundiário, imobiliário,
fazendo a regulamentação do uso da terra e a taxação tributária, o que contribui com a
valorização ou desvalorização das zonas urbanas, sendo também alvo dos movimentos
sociais. Os grupos sociais excluídos são formados por pessoas que não tem condições
de comprar ou alugar residências nas áreas mais valorizadas da cidade, tendo que
ocupar os locais mais desvalorizados e sem infraestrutura, apropriando-se de espaços
esquecidos pelos demais agentes. Ao produzirem a favela, os grupos dos excluídos
tornam-se agentes transformadores do espaço urbano, alterando-o como meio de
resistência e de sobrevivência. Ademais, o deslocamento para as áreas afastadas,
7
perigosas e/ou sem infraestrutura é apenas um dos diversos sinais da desigualdade da
cidade capitalista, os outros podem aparecer com as doenças e o nível da escolaridade.
Corrêa (1989) também afirma que com o surgimento da favela há a reivindicação por
intervenção estatal nas áreas periféricas, levando a melhorias pontuais, e em decorrência
disso temos um reordenamento populacional, já que em alguns casos os antigos
residentes não conseguem permanecer naquele espaço em que houve incorporação de
valor, tendo que ocupar outras áreas periféricas.
Os entendimentos acerca das paisagens e dos espaços urbanos são essenciais para
auxiliarem nossas analises dos poemas dos Cadernos Negros, já que estes nos
oferecerem uma literatura engajada na promoção de escritores afro-brasileiros e de suas
experiências, levando-nos a ter contato com uma poesia que “resiste aferrando-se à
memória viva do passado; e resiste imaginando uma nova ordem que se recorta no
horizonte da utopia... quer desfazendo o sentido do presente em nome de uma libertação
futura, o ser da poesia contradiz o ser dos discursos correntes” (BOSI, 2015, p.169).
Refletindo sobre o poder de insubordinação ao status quo, entendemos conforme
Octavio Paz (2012) que a poesia moderna serve de alimento aos dissidentes e
desterrados do mundo burguês e que o “poema se alimenta da linguagem viva de uma
comunidade, de seus mitos, seus sonhos e suas paixões” (PAZ, 2012, p. 48).
Para a análise das paisagens literárias recorremos a Michel Collot (2013) que,
seguindo os pressupostos fenomenológicos, sobretudo os de Merleau-Ponty, ajuda-nos a
entender como os poemas podem revelar as paisagens urbanas. No livro Poética e
filosofia da paisagem (2013), suas elucidações conduzem ao entendimento da paisagem
construída por todos os sentidos humanos e como “um fenômeno, que não é nem uma
pura representação, nem uma simples presença, mas o produto do encontro entre o
mundo e um ponto de vista” (2013, p.18), o que ressalta a subjetividade, as experiências
plurais dos lugares e a dependência de um sujeito ou ponto de vista para a sua
constituição.
Segundo o crítico literário, “a paisagem nos fornece um modelo para pensar a
complexidade de uma realidade que convida a articular os aportes das diferentes
ciências do homem e da sociedade” (COLLOT, 2013, p. 15). Ao destacar que o
pensamento se desdobra em paisagem e a percepção como pensamento, também
sublinha uma dialética da paisagem, argumentando que esta possui partes visíveis e
invisíveis permitindo vermos além da parcialidade da paisagem, mas ela como elo do
interior e do exterior decorrente de um ser presente no mundo.
8
Diferente das abordagens extraliterárias que propõem resgates geográficos ou
turismos literários, Collot (2013) utiliza a noção da paisagem literária tratando os textos
como imagens das regiões, destarte, entende que a paisagem não é simplesmente a
representação da região, sendo mais importante compreender o modo pelo qual ela é
apreendida. A partir disso, temos uma paisagem que “convida a preencher as lacunas
do olhar pelo trabalho da imaginação ou pelo impulso do movimento” (2013, p.51-52).
Nesse sentido, reflete afetos e convida o leitor a entrar em um estado poético que o
permite imaginar.
Partindo de Bakhtin que destacou que a enunciação poética possibilita enxergamos
um mundo por uma perspectiva interior, diferente do romance que permite a exterior,
Collot (2013) também afirma que alguns textos poéticos tornam-se lugares privilegiados
para a apreensão da paisagem, porque a voz lírica em primeira pessoa coincide com o
ponto de vista do observador. Além disso:
9
capturado pelo observador que apreende a paisagem, pode ser visto por outro,
atribuindo uma terceira dimensão destinada ao ponto de vista de outra pessoa. Por fim,
outra característica mencionada no ensaio é o conjunto tido como “uma unidade que
pode ser percebida como um golpe de vista, por que joga para a periferia toda uma
massa de informações que o olhar poderia assimilar”. (COLLOT, 2013, p. 2013)
Em suma, entendemos que as visões dos diversos teóricos e críticos destacados
neste capítulo servem de suporte para a leitura de como ocorrem os processos de
representação da cidade e das paisagens nos Cadernos Negros. Entre as concepções,
destacamos as reflexões de Milton Santos acerca da distinção entre espaço e paisagem e
os processos econômicos, políticos e industriais intrínsecos as dinâmicas sociais.
Roberto Corrêa ao abordar que as diferentes categorias sociais auxiliam na produção e
na experiência do espaço urbano. Além disso, para analisar os poemas ao longo dos
capítulos, utilizamos a perspectiva de Michel Collot e o seu entendimento de que existe
uma paisagem literária que é dotada de elementos objetivos e subjetivos, e as
percepções de Alfredo Bosi e Octavio Paz sobre os poemas e o caráter subversivo que
adquirem, tornando-se capazes de contradizerem os discursos do status quo.
10
3 AS CIDADES ENTRE OS HIBRIDISMOS DOS TEMPOS
11
característica a fluidez, na medida em que, ao ser rememorada, ela se altera conforme as
disposições e interações dos indivíduos nos diversos lugares. Conforme afirma
Halbwachs:
Desta massa de lembranças comuns, umas apoiadas nas outras, não são as
mesmas que aparecerão com maior intensidade a cada um deles. De bom
grado, diríamos que cada memória individual é um ponto de vista sobre a
memória coletiva, que esse ponto de vista muda segundo o lugar que ali
ocupo e que esse mesmo lugar muda segundo as relações que mantenho com
outros ambientes. (HALBWACHS, 2003, p. 69)
Ítalo Calvino
12
As duas primeiras estrofes do poema apresentam sétimas marcadas pela anáfora
“Chega-se a Saubara”, no início. E uma décima que começa com “Chega-se, finalmente,
a Saubara”. É importante mencionar que o verbo “chega-se” marca o fim do percurso de
três momentos distintos da história do processo de apropriação do território saubarense.
Na primeira estrofe, o sujeito poético descreve o trajeto utilizado pelos traficantes de
escravos: chega-se por meio do mar e das barcas que transportam pessoas como
mercadoria – “Viagem de gentes, trapos, mercadorias”. Na segunda estrofe, o percurso é
feito pelos rios até o encontro do mar, caminhos utilizados com o intuito de explorar as
riquezas locais e realizar as trocas comercias. Na última estrofe, o advérbio de tempo
“finalmente” associado ao vocábulo “Chega-se” marca de maneira mais concreta o
inicio do processo de colonização em Saubara, justificado na fé.
É importante destacar que existe um munícipio brasileiro com o nome Saubara,
localizado próximo à Bahia de todos os Santos, no estado da Bahia, marcado pela
biodiversidade, pela colonização espanhola e pelos efeitos da escravidão. Esse local
possui manifestações culturais como a Marujada, em que grupos declamam textos sobre
as navegações portuguesas e brasileiras; e as Caretas do Mingau, que no período da
colonização era um grupo formado por mulheres que se vestiam como fantasma visando
a assustar os invasores e a levar mantimentos para seus maridos durante à noite. Hoje,
as Caretas do Mingau são formadas pelas descendentes daquelas mulheres e realizam
desfiles para que as ações de suas ascendentes não caiam no esquecimento, mantendo
vivas as heranças do passado.
As Saubaras do poema traduzem os diferentes lugares marcados por parecidos
processos históricos e culturais, já que, na verdade, trata de saubaras que são,
paradoxalmente, invisíveis e acessíveis.
Ao indicar que o caminho para Saubara pode ser feito pelo mar e os “odores
repelentes que recendem tumbeiros”, o sujeito poético demostra ter conhecimentos
pertencentes a um determinado grupo social, mas também sublinha o seu ponto de vista
sobre o que é dito, permitindo-nos pensar sobre o caráter singular que a memória
individual imprime sobre a memória coletiva, conforme Maurice Halbwachs (2015). A
enunciação apresenta uma paisagem delimitada por um horizonte que nos remete às
grandes navegações e à escravidão, recorrendo ao mar para realizar o trajeto da história.
Apresenta um percurso que nos faz recordar o passado de exploração territorial
colonialista.
13
Sabendo que a paisagem é “o produto do encontro entre o mundo e um ponto de
vista” (COLLOT, 2013, p.18) e que a memória individual é apenas um ponto de vista
sobre a memória coletiva, compreendemos que as conexões entre passado e presente
estão marcadas por efeitos históricos e subjetivos que esse sujeito poético nos mostra.
Inclusive, no último caminho percorrido, através da fé, em que as velas não são mais as
da embarcação e, sim, as do rito religioso, vemos os marujos e as rezadeiras aguardando
a salvação, cabendo à nova geração à tarefa de re-inventar outra cidade. Enfim, as
Saubaras invisíveis são um misto de passado, presente, crenças e desejos de mudanças
que constituem a cidade e que podem ser acessíveis pelo ato de rememorar.
Em “Cidade senzala”, de Bruno Gabiru, temos dinâmicas sociais apresentadas com
um tom de denúncia e revolta:
14
contrastes radicais que se refletem no tecido urbano, nos materiais do
prédios, nos estilos arquitetônicos: ao lado de arranha-céus de aço e vidro
“fumê”, encontram-se favelas, cortiços, “barriadas” que ocupam as áreas
vazias entre os prédios e bairros, e as zonas periféricas. Os barracos de
papelão e lata, madeira e bambu vão se multiplicando a beira dos rios e das
autoestradas, embaixo de pontes de concreto e aço e em estacas sobre
lagunas, como em tempos pré-históricos. (FREITAG, 2002, p. 110)
15
correm pelas escadarias, ruas e avenidas
negros fortalecidos, vestidos e com livros nas mãos
correm gritando, anunciando o que querem:
escolas, dentistas, seguro de vida
assistência médica, casa e comida
e é pra ontem
e já não é mais sonho
o corte do machado
o grito da cachoeira
o terror negro encarnado
palmarino que engoliu saliva
agora cospe e diz que tá com raiva
do espera um minutinho, do tudo passa
se não passa é assim mesmo, só um cadinho
cuidado: palmarino zangado passa por cima
e arregaça palavras do caminho
(CN, 2006, p.227)
16
No primeiro verso, o sujeito poético faz referência a “capão”, permitindo-nos
inferir que se refere a Capão Redondo um distrito situado na zona sul de São Paulo,
região periférica que se constitui pelo complexo tecido social com uma população que
mescla indivíduos de várias regiões do Brasil, entre os quais, nordestinos, negros e
indígenas. O cotidiano de Capão Redondo sintetiza de maneira clara os sentidos de
correria ao longo do poema, para os moradores da periferia a vida é correria diária na
luta pelo ganha-pão, na busca de alternativas para sobrevivência, na tentativa de
recupera o tempo perdido, pois para o povo pobre e negro a dinâmica da vida é outra e
nada vem de graça.
O poema “Preta periferia”, de Fernando Gonzaga, traz as semelhanças históricas
e atualizadas dos lugares periféricos.
Um grande mastro
Enterrado no barco... Velas
Me levam para além-mar.
O vento sopra, o chicote estala.
Corpo preso, alma livre, pensamentos azeviche.
A nebulosidade invade a minha mente.
Gente amontoada no porão.
Confuso, ouço a bizarra sinfonia das correntes.
De repente, que sonho dantesco...
A respiração ao meu lado sumiu.
Mais um corpo jogado no mar.
O silêncio surgiu.
Engasgo, enxugo as lágrimas, engulo ar.
Mais um corpo sucumbiu.
O bom filho à casa torna.
Odoyá!
A grande calunga assusta.
Mais um corpo de ébano afunda.
Comida pra tubarão.
Mão de obra negra,
Branca escravidão.
Trrimmmmm
Desperto da dor...
Tô vivo.
Mas, a cada dia,
O genocídio da juventude é notícia.
Pesadelo... na travessia.
(CN, 2018, p.22)
O poema tem inicio com o sonho do sujeito poético, em que ele está em uma
embarcação realizando uma viagem. Ao revelar que está preso e sua alma é livre ele
revela que pertence ao grupo dos escravizados. Os acontecimentos mencionados no
poema ocorrem dentro de um tumbeiro, embarcação responsável por levar os
escravizados de África às demais colônias. No entanto, o sujeito poético revela que no
trajeto muitas pessoas morriam. O que ocorria era que, além do longo percurso e das
condições da viagem com uma alimentação e higiene precária acrescia-se o fato de que
“os comerciantes tinham interesse em alojar o maior número possível de escravos nos
navios, e essa prática tornava a viagem insuportável. Muitas vezes aumentar o número
18
de cativos implicava em diminuir a quantidade de víveres disponível para cada um”
(ALBUQUERQUE E FILHO, 2006, p. 48). O grande quantitativo de pessoas
escravizadas mortas na travessia do oceano Atlântico não é novidade, outra referência a
esse fato pode ser encontrada na letra “Quilombo no mar”, da Cia Banto, em que “quem
sabe meu Deus permitiu e/ fizeram quilombo no fundo do mar”.
No poema, a onomatopeia retira o sujeito poético do pesadelo e o despertar do
sonho é marcado pelo fato de que “o genocídio da juventude é notícia./ pesadelo na
travessia”. As passagens no mar e no cenário urbano possuem como elo o extermínio
que evidencia a vida como pesadelo na travessia, permitindo compreender as
possibilidades de rememoração através do que havia no passado e que permanece no
presente por meio das dinâmicas sociais e dos lugares.
Para concluir, os poemas mencionados neste capítulo permitem o estabelecimento
de elo entre pretérito e presente, nesse sentido os textos não só nos possibilitam
rememorar, mas apresentam cenários que refletem os resquícios do passado,
constituindo-se como paisagens urbanas híbridas.
19
4 A CIDADE E SEUS ANTAGONISMOS, LUTAS E RESISTÊNCIAS
Paulicéia globalizada
brancuras controlam tudo
o ser escuro
queira ou não queira
periferia
rabeira
e tudo às claras
artiganda das propamanhas
percebe quem sabe ler
artimanhas da propaganda
20
Hipocrisia é o nó do país desigual
sobram becos
e sonhos sem saída
hip-reali-hop pode ser show
igual futebol, samba, novela
as carências, num palco não cabem
universidade também para afros
só se a gente for quilombola
na democracia deles
realiwood não é hollydade.
(CN, 2006, p. 142)
21
Apesar de a mídia ofertar de maneira massiva entretenimentos que mesclam
realidade e espetáculo, levando muitos a desejarem viver numa fantasia, o sujeito
poético enfatiza que “Realiwood não é hollydade”, fazendo uma crítica direta aos
mecanismos de manipulação utilizados pelo cinema. Isso também estabelece outra
crítica à cultura de massa como destaca Walter Benjamin (1996, p. 194) ao afirmar que
“a recepção através da distração, que se observa crescentemente em todos os domínios
da arte e constitui o sintoma de transformações profundas nas estruturas perceptivas,
tem no cinema o seu cenário privilegiado”, em que a sétima arte pode ser utilizada como
instrumento de mudanças de perspectivas inclusive nos momentos de entretenimento.
Podemos perceber que a paisagem delineada neste poema é a da periferia do terceiro
mundo, onde, inclusive, a cidade pequena é influenciada pelo sistema capitalista global
e revela os contrastes sociais e as necessidades de ser persistente “na democracia deles”.
Lançando um olhar sobre a conjuntura brasileira, “Não saia do Brasil”, de Tico
de Souza, apresenta de maneira contundente as situações problemáticas do país.
22
Ao colocar em evidência a fome, as diferentes formas de mortalidade que
ocorrem nas regiões periféricas e a segregação racial, o sujeito poético chama a atenção
para as mazelas existentes no Brasil, ressaltando que não há necessidade de sair ou
voltar os olhares com pavor para o que acontece no exterior ˗ a exemplo da África que a
mídia muitas vezes pinta como continente de extrema pobreza-, no entanto, os males
que afligem o outro lado do Atlântico também nos atormentam, já que “Para ver a fome
matando gente como na África/ Vá às periferias das grandes cidades”. Além disso, o
terrorismo e a ditadura, dois dilemas vividos em outros países, também podem ser
identificados no Brasil, por meio da conduta de personalidades como Edir Macedo,
ACM e Paulo Maluff, que utilizam seus cargos e/ou status para transgressão da lei com
intuito de adquirirem benefícios pecuniários ou para guiar a população, pautados pela
relação de respeito e obediência existente entre os pastores e os servos da igreja
evangélica.
Na segunda estrofe, o sujeito poético traz duas temáticas recorrentes nas mídias:
os guerrilheiros colombianos e o frio europeu. Ao afirmar “Pra que visitar a Colômbia e
seus guerrilheiros/ Se temos os esquadrões da morte, PCC/ e Comando Vermelho.”,
volta o enfocar os problemas do nosso país. Na terceira estrofe, o Pateta da Disney,
desengonçado e conhecido por suas trapalhadas, é comparado com os vereadores/
Prefeitos e deputados.
O poema de Tico Souza ressalta as semelhanças entre os problemas do Brasil
com outros lugares do mundo que estão na periferia do capitalismo. Em vista disso, ao
citar outros países que vivem a margem e advertir ao leitor para não sair do Brasil, o
sujeito poético convida-nos a lançarmos os olhos sobre as áreas urbanas brasileiras com
o intuito de observarmos paisagens que se configuram como locais onde os dilemas
sociais tais como segregações e diferentes tipos de violências se reduplicam.
No poema “É ela, favela”, de Raquel Garcia, temos a personificação da periferia,
em que ela é protagonista do enredo que nos é apresentado.
Favela
Que não apaga as velas
Por todo o sangue
Derramado nas vielas
Coração que congela
Diante da opressão
Flagelo
Da polícia sem razão
Ela grita
Contra a desigualdade
23
Que impera
Resultado da miséria
Questiona as injustiças
Que o fuzil apagou
Na calada da noite
Sob ordem do opositor
É ela,
Que dorme acordada
Possui nome e sobrenome
Identidade ocultada
Já não teme os homens
(CN, 2014, p.187)
Os primeiros versos descrevem a favela, “que não apaga as velas/ Por todo o
sangue/ Derramado nas vielas”, apresentando uma comunidade que não se esquece
daqueles que viveram nela e que sofreram alguma forma de violência. Com o “coração
que congela/ Diante da opressão”, há a perda da sensibilidade e a frieza diante das
operações policiais. O eufemismo nos versos “Questiona as injustiças / Que o fuzil
apagou” , marcam um cenário em que o derramamento de sangue e o uso da força
podem ser atrelados às constatações de Achille Mbembe quando aborda o conceito de
biopoder de Foucault, o estado de exceção e o de sítio enxergando as “trajetórias pelas
quais o estado de exceção e a relação de inimizade tornaram-se a base normativa do
direito de matar (2018, p.17)”. Essa política de inimizade também é utilizada
recorrentemente, dando suporte ao convencimento da necessidade de atuações que
levam a morte e que deixam a favela sem apagar as suas velas num estado contínuo de
luto.
Na segunda e terceira estrofe, ao gritar e questionar as desigualdades sociais, a
favela tem um posicionamento de não passividade às atrocidades que sofre, inclusive,
atenta a tudo a que ocorre, ela não descansa, pois “é ela,/ que dorme acordada”. Por fim,
apesar de possuir nome e sobrenome, a favela tem sua identidade ocultada, ou seja, é
retirado dela aquilo que lhe dá reconhecimento enquanto cidadã na sociedade,
permitindo refletir acerca da contradição entre texto poético e um dos elementos que
alicerça a Carta Magna brasileira que é a cidadania.
“Negra existência!”, de Joana D’arc, aborda as demandas e os desejos do sujeito
poético sobre a cidade.
24
E, benditas, faladas ou escritas
Se façam presentes.
Fui à marcha
Para Zumbi!
Na Paulista
Carioca
Pernambucana
Alagoana
Baiana.
Negros Pretos
Brancos quase brancos
Brancos pretos
Negros todos, tantos.
Panteras Negras
De luz
Linhas de batuques
25
Insurreições.
Até a Consolação
Redenção caminhos
Sem escravidão.
Policiais, Cantem!
Abracem
Façam a segurança
Desta negra gente
Protejam o protesto
Justo
Sem confronto de práxis.
Carros alegóricos
De Ifá
Passos de axé
Deuses poetas
Quase humanos
Cabelos pro céu.
Ori de gestos
Odu nas cabeças
Gente banto bonita
Sem medo
Sem obsessão de
Credo.
Fui à marcha
Para Dandara
Quilombo sempre
20 de dezembro,
20 de janeiro
20 de fevereiro
20 de março
20 de abril!
20 sempre!
(CN, 2018, p.150-151)
26
indivíduos a refletirem acerca processo de miscigenação no Brasil na tentativa de levá-
los ao entendimento de que estamos todos no mesmo barco.
Em outro trecho há uma citação aos Panteras Negras ou Black Panther Party for
Self-Defense, organização revolucionária que visava combater a opressão e a
segregação racial. Desse modo, a marcha descrita no poema configura-se paisagem
urbana plural onde é possível encontrar as diferentes faces da atuação do Movimento
Negro como o caso do Partido dos Panteras Negras, as diversas Marchas para Zumbi,
tal como a 13ª Marcha da Consciência Negra (2016) na Av. Paulista e Consolação que
pedia o fim do racismo e do genocídio da juventude negra. Aliás, de acordo com Renato
Santos, apesar da diversidade do movimento negro “este conjunto amplo e diverso
constitui uma esfera dialógica em torno de uma mesma luta, com arenas próprias e
outras compartilhadas para troca, difusão, embates, que constituem uma dinâmica não
centralizada e, acima de tudo, complexa.” (2014, p.71). Enfim, com a palavra
“quilombo” trazendo uma ideia de resistência, o texto poético se encerra com a
repetição da data 20 , dando-nos a ideia de que sempre é dia de marchar, celebrar e
reivindicar, resistir.
O poema “A Maré, na Maré, Amar é”, de Paulo Dutra, propõe a leitura do
vocábulo “Maré”, mesclando os diferentes sentidos na composição da paisagem.
Na Maré,
Amar é ver
A morte
Todo santo dia.
Na Maré,
Amar é ver
A morte
Todo santo dia.
Na Maré,
Amar é morrer
à bala
Todo Santo dia.
Na Maré,
Amar é remar
Contra a maré
Todo Santo dia.
Na Maré,
27
Amar é viver
A vida
Todo Santo dia.
Na Maré,
Amar é viver
A vida
Todo santo dia.
Na Maré,
Amar é ser Maré
apesar dos pesares
Apesar das marés.
Mariella é Maré.
Até no nome
Ella é Maré;
Tem Maré no nome.
Na Maré,
Para ela, Mariella,
Amar é lutar
Com ou sem colete.
Na Maré,
Até quando não estão na Maré
Morre à bala
Quem é da Maré.
aMar é viver
A Maré vive
Viva a Mar (i) é (lla)
Vive a Mariella.
(CN, 2018, p.202-203)
Nos primeiros versos o sujeito poético revela que o texto é uma homenagem à
Marielle Franco. Fundindo as palavras maré e amar é, por meio das aliterações e
assonâncias, a musicalidade e ritmo do poema são partes essenciais e constitutivas da
atribuição de sentidos do texto. Quando o sujeito poético menciona que “na Maré,/Amar
é morrer/à bala/Todo Santo dia”, descortina um ponto de vista não romantizado do
amor, por outro lado, na Maré o amor pode ser entendido como um ato de resistência,
pois apesar dos pesares, as pessoas continuam a lutar e pela sobrevivência, permitindo-
nos inferir que sentem amor pela vida.
Não há amor que chegue facilmente, para alcançá-lo é necessário ter força para
remar contra os obstáculos, já que “Na Maré/ Amar é remar/ Contra a maré/ Todo Santo
28
dia”, aliás, em “Na Maré” lemos as periferias num processo metonímico, visto que as
desigualdades, dificuldades e violências comumente vivenciadas pelos moradores do
Complexo da Maré, em certo sentido, também fazem parte do cotidiano de pessoas que
vivem em outras comunidades. Nas segunda, terceira, sexta e sétima estrofes, o uso das
repetições enfáticas demostram que viver com a morte é uma experiência diária. Além
disso, “Na Maré,/ Amar é ser Maré/ apesar dos pesares/ Apesar das marés”, revelando
que na comunidade é preciso se adaptar as inconstâncias da vida.
Quando o sujeito poético afirma que “Mariella é Maré./Até no nome/Ella é
Maré;/ Tem Maré no nome.”, admite pensarmos na atuação política e a vida pessoal de
Marielle Franco que foi de constante superação e mudança, assim como as marés com
suas alterações periódicas. Também evidencia o posicionamento político da vereadora,
pois “Amar é lutar/ Com ou sem colete”. Além disso, “Até quando não estão na Maré/
Morre à bala/ Quem é da Maré.”, possibilitando entendermos como uma referência ao
assassinato da vereadora, uma vez que na ocasião de sua morte ela já não residia no
Complexo da Maré. Histórias como a dela revelam o quando as populações periféricas
são estigmatizadas, pois mesmo quando não estão nas suas comunidades, elas
continuam sendo alvo das ações policiais, revelando a prática da necropolítica. Por
último, “Mariella vive na Maré./ Porque a maré somos nós”, unindo o Complexo da
Maré, a vereadora e a população.
Entender as imagens urbanas que foram delimitadas pelos sujeitos poéticos
como reflexos de processos históricos, econômicos, políticos e culturais torna-se
fundamental para o entendimento das ideais defendidas por Aníbal Quijano (2005) de
que a ideologia da democracia racial oculta à discriminação e o domínio colonial em
países sul-americanos como Brasil, Colômbia e Venezuela. Segundo o sociólogo, nesses
países, as populações de origem africana não possuem facilidade no acesso à cidadania,
embora os conflitos não sejam tão explícitos como na África do Sul e nos Estados
Unidos. Alguns poemas retrataram como a segregação aparece num discurso velado
através das artimanhas das propagandas, outros mostraram que nas periferias e nas
cidades há de maneira explícita políticas que levam ao extermínio, a desvalorização e a
segregação daqueles que estão à margem do sistema, mas também destacamos poemas
que apresentaram a cidade idealizada e a cidade como disputa de direitos por vias
democráticas.
29
5 EXPERIÊNCIAS DO ESPAÇO URBANO E O ACESSO À CIDADANIA
30
É a batida ambivalente
Do funk que invade o ambiente,
Cartola ao morro vai tingindo...
Surgido das ondas de uma velha vitrola
Mais ao fundo um som de arrasta-pé
Trazido na bagagem nordestina
Ah, que a saudade da terrinha desatina
A vida no morro é também pela poesia colorida,
Chega-se a esquecer que a cidade é partida
E que o morro é uma parte temida
E, pelo Estado, esquecida.
(CN, 2018, p.125)
O sujeito poético inicia o poema com “Ao longe o olhar alcança os morros da
cidade” e vai percorrendo até chegar ao “seio do morro”. Conforme ocorre esse
deslocamento, temos uma aproximação com a comunidade, apresentam-nos um lugar
repleto de poesia e experimentado pelos múltiplos sentidos. Na comunidade, surge o
sentimento de coletividade, onde não é “Nem um pouco solitário”. A brasilidade emana
dos odores das panelas, nas batidas dos diferentes sons e ritmos que perpassam os
diferentes ambientes. Essa mescla revela a característica daquela população marcada
pela pluralidade. Inclusive, numa alusão a Cartola, os diferentes sons do morro mostram
que “o sol colorindo é tão lindo/É tão lindo/E a natureza sorrindo/Tingindo, tingindo/A
alvorada” nos morros da cidade.
Apesar das belezas, dos momentos de celebração e de convivência, o desfecho
mostra um olhar distinto do que estava sendo mostrado até então, pois no cotidiano dos
morros, “Chega-se a esquecer que a cidade é partida/ E que o morro é uma parte
temida/E, pelo Estado, esquecida.”. Essa segregação e esquecimento revelam uma
privação do acesso aos direitos sociais e políticos, sobretudo pela ausência do Estado, e
por outro lado, evidencia-se a não atuação das pessoas daquele local na reinvindicação
dos seus direitos. Então, aquela parte da cidade caracteriza-se pela ausência de políticas
públicas .
Em “Corpo negro”, de Benício dos Santos, o percurso pela cidade é influenciado
pelo tom da pele, o que faz o negro ter uma experiência da cidade marcada por flagelos.
31
resistência é o desenho
do caminho que traço.
(CN, 2014, p.34)
O corpo negro, ao transitar pela cidade, enfrenta o racismo que vai chicoteando
seus passos, entretanto, o sujeito poético mantém sua autoestima e seus “pés seguem
driblando” o racismo. A cor da pele pode ser associada com os males enfrentados pelo
sujeito poético ao caminhar pela cidade, evidenciando a existência de um “estigma - a
situação do indivíduo que está inabilitado para a aceitação social plena”. (GOFFAMAN,
2004, p.4), que mostra como o modo como o ir e vir são afetados nos lugares urbanos,
possibilitando uma reflexão sobre a livre locomoção que não é plenamente realizada por
todos os indivíduos nem por todos os lugares da cidade, ensejando o entendimento de
uma cidade que apresenta obstáculos para o transitar em oposição ao que explícita o
Art. 5 inciso XV da Constituição da República Federativa do Brasil de que “é livre a
locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos
termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens” (BRASIL;
Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988). Apesar
disso, a “resistência é o desenho” destacando uma atuação ativa e de não subordinação
aos obstáculos que lhe são impostos.
Na “Rua A, Barraco Nº 9”, de Luís Carlos de Oliveira, o poema menciona o
livro Quarto de Despejo, de Carolina Maria de Jesus (2004), que nos permite refletir
sobre as periferias urbanas, as dinâmicas sociais e as experiências das pessoas descritas
pelo sujeito poético em virtude das consequências do crescimento da cidade e da
marginalização de parcela populacional nesse processo.
32
Batizar com sobrenome:
Secretária de Segurança Pública
Nossa carteira de identidade.
no Harlem latino
o tom nordestino
dá a cor do Black
33
à noite ronda a cidade
e invade a cidadela
dos santos homens de bem
de oito e de dezoito
de doze e de trinta e oito
vão tomando as praças
cheirando poeira
e soltando fumaça
os meninos vão
os meninos vêm
deixando no espelho
seus olhos vermelhos
os meninos vão
os meninos vêm
trazendo entre os dedos
carinho e brinquedos
do Harlem latino
a voz do menino
dá o som do breque
de sete e de dezessete
de soco e de cassetete
vão descendo a pua
varrendo a sujeira
e limpando as ruas
lá na cela rola o nu
no tom do Carandiru
no Harlem latino
o mesmo destino
une os moleques
o pé de um menino
às vezes toca na bola
e consome a ansiedade
do escolhido de Deus
de bico e canela
de joelho e de trivela
34
juntando o milheiro
e encantando as ruas
os meninos vão
os meninos vêm
trazendo sem jeito
medalhas no peito
Mas
Na favela escorre o pus
do bico dos urubus
no Harlem latino
só o sonho de um hino
ri para o moleque
(CN, 2006, p.46)
A partir de tais constatações, pode-se inferir que o “na favela rola o blues”
significa que aquele é o local da manifestação da poesia, da tristeza e da diáspora
africana, tendo em vista que “o blues é o lamento dos oprimidos, o grito de
independência, a paixão dos lascivos, a raiva dos frustrados e a gargalhada do fatalista”
(OLIVER, 1995, apud ALVES, 2011, p.51).
Além disso, o blues “ao som dos maracatus” remete ao não esquecimento de que
o Maracatu é um cortejo com personagens notórios da História do Brasil, o que revela o
misto de influências indígenas, africanas e europeias, mostrando que no Harlem Latino
35
desfilam pessoas importantes para aquela sociedade que é fruto de distintas heranças
culturais. Também cabe evidenciar que a formação da favela, sobretudo nas grandes
cidades é feita por populações de diferentes regiões do país como a nordestina. Isso dá a
periferia “o tom nordestino” estabelecendo uma íntima relação entre os lugares menos
industrializados e os espaços urbanos.
Para além dos aspectos culturais, o poema permite pensarmos diferentes
problemáticas sociais desde a formação da favela até temáticas contemporâneas como
as relacionadas ao planejamento urbano, à violência e a pobreza.
Os personagens que estão em situação de vulnerabilidade são os meninos que
“de oito e de dezoito/ de doze e de trinta e oito”, que pode ser as idades dessas crianças
e adolescentes ou os calibres das armas que eles portam apresentando-os num lugar
distinto da infância idealizada que não sofre com as diferentes mazelas sociais.
Entretanto, outra estrofe traz uma imagem oposta dessas crianças que ao “trazerem entre
os dedos/ carinho e brinquedos”, vivenciam outras experiências, revelando que há
momentos de ser criança e há momentos de negação da infância.
36
O poema “ABRACADABRA ou rap de um Menino Negro fugindo da morte”,
de Élio Ferreira, traz as experiências da cidade dos meninos negros.
37
Nos primeiros versos o sujeito poético ao afirmar que “você quer me ver morto,
morto, morto”, denuncia às ações que levam parcela da população a morte sendo ele e
os demais meninos alvos de tais práticas. No decorrer do poema, observa-se a existência
da relação entre sujeito e paisagem, registrado nos versos “meu corpo apodrecendo a
atmosfera numa favela” ou “meu corpo apodrecendo uma desova”, onde é difícil
vislumbrar um cenário positivo, pois a categorização do lugar mostra o valor que é dado
tanto para o corpo quanto para o espaço.
As onomatopeias aparecem por todo o texto enfatizando as ações como em
“METRALHADORA pra rapratá tátátá tátátátá raprá-tá-tá/ policial grupo de extermínio
contra o/Menino Negro fugindo da morte esquadrão da morte”. Cabe destacar que,
Segundo Francis Meneghetti (2011, p.3) “o esquadrão da morte do estado de São Paulo
se forma do meio da polícia civil, durante a Ditadura Militar nos anos 1960, tornando-se
uma organização não formal dentro de uma organização formal do Estado”. Zuenir
Ventura (1994, p. 48) assevera que no Rio de Janeiro, o esquadrão teve como precursor
o general Amauri Kruel que ao mesmo tempo em que exterminava os bandidos estava
envolvido com corrupção, práticas que ao serem descobertas foram consideradas um
dos maiores escândalos do estado. Isso permite compreender o porquê do sujeito
poético na estrofe anterior mencionar que o desejo de vê-lo morto é “em nome da tua
ordem CALHORDA”, ou seja, em nome de um discurso moral que não se aplica as
práticas dos integrantes do esquadrão.
Devido ao esquadrão da morte ter tido uma conexão com as forças militares,
também podemos refletir sobre o relatório do Human Rights Watch (2019) em que os
38
o menino está ou não está inserido, o sujeito poético sublinha pautas relacionadas às
desigualdades sociais.
39
Enfim, na tentativa de notar as diferentes experiências das paisagens urbanas nos
poemas pudemos ver que os trajetos descritos evidenciaram diferentes problemas para
os sujeitos no acesso a serviços e a cidadania, sobretudo, pela negação ao direito à vida,
pela locomoção sem empecilhos objetivos ou subjetivos, pela falta de condições dignas
para a subsistência e pela da falta de planejamento urbano. Tais percursos dos sujeitos
poéticos levam-nos, portanto, a entender conforme Milton Santos (1996-1997) que no
Brasil não temos cidadãos, o que temos na verdade são cidadanias mutiladas, já que a
classe média não está preocupada com os direitos, mas sim com a obtenção de
privilégios e os demais participantes da sociedade não tem a possibilidade de serem
cidadãos como os negros no país, que têm sua cidadania mutilada no trabalho, no
salário, na circulação pelos espaços, na educação e na saúde.
40
6 CONCLUSÃO
41
Nas “Experiências do espaço urbano e o acesso à cidadania” pudemos ver que
todos os poemas mostraram algum empecilho para o exercício pleno da cidadania, seja a
partir da negação do direito a vida, que é essencial, tendo em vista que instrumentaliza a
concretização dos outros direitos, seja através da impossibilidade de ir e vir, do direito
de ter uma habitação digna ou de outros serviços básicos, levando-nos a compreender
conforme Milton Santos, que no Brasil não há a existência da cidadania plena,
principalmente, para os negros.
As representações da cidade encontradas nos Cadernos Negros nos volumes 29,
37, 41 e Os melhores poemas revelaram o espaço urbano como lugar desigual, repleto
de barreiras sociais. Inclusive, todas as paisagens dos poemas apresentam dimensões
simbólicas e subjetivas, representando o espaço urbano como lugar de contrastes. O
único poema utilizado neste trabalho que traz um olhar diferente dos já mencionados é
“Negra existência!”, de Joana D’Arc, que tem uma dimensão do não concreto,
sobretudo pelo tempo verbal predominante no texto que nos leva a uma dimensão
hipotética ou do desejo, permitindo-nos entender que o espaço urbano está longe de ser
o ideal ou idealizado pelos sujeitos dos poéticos.
Nossa pesquisa pode ser considerada como um passo inicial às reflexões sobre
as cidades, as políticas públicas urbanas, os processos de exclusão e marginalização,
que por serem ensejados pela poesia permite um debate sensível e ao mesmo tempo
crítico sobre as questões que envolvem as relações sociais.
A leitura da cidade e das paisagens que apresentamos constitui-se como uma
pequena contribuição para o enriquecimento do debate sobre o tema nos Cadernos
Negros, uma vez que seu corpus literário é extenso. Nesse sentido, esperamos que nossa
escrita instigue outros pesquisadores com o intuído de ampliar as discussões aqui
travadas.
42
7 REFERÊNCIAS
COLLOT, Michel. Poética e filosofia da paisagem. Trad: Ida Alves. Rio de Janeiro:
Editora Oficina Raquel, 2013.
COLLOT, Michel. Poética e filosofia da paisagem. Trad: Ida Alves. Rio de Janeiro:
Editora Oficina Raquel, 2013.
______. Do horizonte da paisagem ao horizonte dos poetas. In: ALVES, Ida Ferreira;
FEITOSA, Marcia Manir Miguel (Orgs.) Literatura e paisagem: perspectivas e diálogos.
2ª ed. Niterói: EdUFF, 2013b.
CUTI, Luiz Silva. Literatura Negro-Brasileira. São Paulo. Selo Negro, 2010.
EVARISTO, Conceição. Literatura Negra. Rio de Janeiro: Cadernos CEAP, 2007.
43
FREITAG, Barbara. Cidade dos homens. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 2002.
GARCIA, L. H.A. Raízes da Alma Negra: o blues e a fundação de uma cultura
americana. Varia História. Belo Horizonte, nº17, mar/97, p.258-278.
JESUS, Carolina Maria. Quarto de Despejo: diário de uma favelada. 8ª Edição. São
Paulo: Ática, 2004.
LE GOFF, Jacques. Historia e memória. 5.ª ed. Trad: Irene Ferreira; Bernardo Leitão;
Suzana Ferreira Borges. Campinas: Editora da UNICAMP, 2003.
PAZ, Octávio. O arco e a lira. Trad: Ari Roitman; Paulina Wacht. São Paulo: Cosac
Naify, 2012.
RIBEIRO, Esmeralda, et al. Cadernos Negros: volume 29. São Paulo: Quilombhoje,
2006.
44
RIBEIRO, Esmeralda, et al. Cadernos Negros: volume 41. São Paulo: Quilombhoje,
2018.
WIRTH, Louis. O urbanismo como modo de vida. In: VELHO, Otávio G. (Org.). O
fenômeno urbano. Rio de Janeiro: Guanabara, 4a. ed., 1987.
45
ANEXOS
46
ANEXO B - Benício dos Santos
47
ANEXO C - Bruno Gabiru
48
ANEXO D - Carlos Gabriel
49
ANEXO E - Elio Ferreira
50
ANEXO F - Fernando Gonzaga
51
ANEXO G - Jamu Minka e Jônatas Conceição
52
ANEXO H – Joana D’Arc
53
ANEXO I - Jovina Teodoro
54
ANEXO J - Kasabuvu
55
ANEXO L - Luís Carlos Oliveira
56
ANEXO M - Oubi Inaê Kibuko
57
ANEXO N - Paulo Dutra
58
ANEXO O - Raquel Garcia
59
ANEXO P - Sergio Balbouk
60
ANEXO Q - Tico de Souza
61