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em 1864

www.dn.pt / Quinta-feira 19.10.2023 / Diário / Ano 159.º / N.º 56 429 / € 1,50 / Diretor interino Leonídio Paulo Ferreira / Subdiretor Bruno Contreiras Mateus

REPOSIÇÃO DO IVA LEVARIA DEBATE

QUINZENAL
A UM AUMENTO DE 2% Ensaio
NO PREÇO DO CABAZ geral para
a discussão
CONSUMO Dos 41 produtos do cabaz do IVA Zero da Deco Proteste, 20 estão mais caros,
em especial a fruta, o azeite e os legumes. Laranja e brócolos estão quase 60% acima de abril.
do Orçamento
PÁG. 13
do Estado
MÉDICOS Fnam acusa ministro de “promover PÁGS. 4-5

desigualdade em vez de equidade” PÁG. 9

PRESIDÊNCIA
Santana afasta-se
da corrida a Belém:
“Nunca disse
que era candidato”
PÁG. 6

GUERRA BIDEN “ILIBA” ISRAEL

DE EXPLOSÃO NO HOSPITAL
E DESBLOQUEIA AJUDA A GAZA AMÉLIA
NA TERRA SANTA – O ATAQUE SURPRESA
P. HUTCHINSON
MEDIEVALISTA
MIRIAM ALSTER / POOL / AFP

OPINIÃO DE MARIA JOÃO TOMÁS

OS FUTUROS ISRAELITAS NÃO COMBATEM
CRÓNICA DE DORA PIRES ENVIADA ESPECIAL “Quem ler esta
DN/TSF A ISRAEL
PÁGS. 16-17 tradução em inglês
vai descobrir
que Fernão Lopes
FESTA Quando um ilhéu, CHINA Xi recebe Putin
um aldeão e um clube da com tapete vermelho. é um dos maiores
distrital enfrentam um grande... Conflitos “reforçam cronistas da Europa”
isso é Taça de Portugal PÁGS. 22-23 cooperação” PÁG. 19 PÁGS. 26-27
2 EDITORIAL Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias

FOTO DE 1976
EDITORIAL
Leonídio
Paulo Ferreira
Diretor interino do Diário de Notícias

O amigo americano

D
a ordem imediata para um porta-aviões americano se deslocar para
o Mediterrâneo Oriental (e depois um segundo) ao discurso de soli-
dariedade com Israel depois do ataque terrorista do Hamas a 7 de
outubro, Joe Biden deixou, desde o primeiro momento desta nova
crise no Médio Oriente, que os Estados Unidos estão ao lado do tradicional Julgamento de Vera Lagoa no Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa, que começou a 14 de maio
aliado, sem hesitações. E a visita de ontem do presidente americano a Israel, de 1976. A jornalista era processada por ser “presumível autora de um artigo publicado no
apenas 11 dias depois de o grupo palestiniano ter morto mais 1400 israelitas e semanário O Diabo, de que era diretora, e que foi considerado injurioso para o Presidente
sequestrado cerca de 200, confirmou totalmente esse apoio, seja com as refe- da República”, lia-se no DN do dia seguinte. Foi ilibada de todas as acusações.
rências emocionais ao Holocausto e ao 11 de Setembro, seja com o respaldo
da afirmação israelita de que a destruição de um hospital na véspera, em
Gaza, foi obra de um disparo falhado dos próprios grupos palestinianos.
Esta solidariedade americana com Israel é antiga. Os Estados Unidos esti-
veram logo na primeira linha do reconhecimento do Estado Judaico, cuja in-
dependência foi declarada em 1948. Mas houve um período em que até foi a
OPINIÃO HOJE
França quem forneceu aos israelitas o armamento necessário para dissuadir
ataques dos países árabes. O estreitamento das relações israelo-americanas Pedro Marques Inês Drumond
deu-se a partir dos Anos 1960 e tanto na Guerra dos Seis Dias como na do Yom Não é apenas mais um orçamento Capital de Risco: tendências recentes
Kippur o apoio dos Estados Unidos foi total. Uma lógica que se mantém. PÁG. 07 e revisão do quadro legal aplicável
Não se trata, como simplisticamente por vezes se afirma, de um mero resul- PÁG. 14
tado da ação do lobby judaico esta aliança entre os Estados Unidos e Israel. Há Rute Agulhas
um entusiasmo por Israel na sociedade americana que vai dos evangélicos, Explicar a guerra às crianças… outra Maria João Tomás
inspirados pela Bíblia, aos meios conservadores – que veem Israel como um vez… Guerra na Terra Santa
aliado militar –, passando pelos setores mais liberais da sociedade, que admi- PÁG. 10 – O ataque surpresa
ram o caráter democrático do Estado Judaico, exceção no Médio Oriente. PÁG. 17
Biden, consciente destes laços com Israel, fez a esperada exibição de sim-
patia com um povo atacado como nunca antes (o pior massacre de judeus Jorge Conde
depois do Holocausto, “o 11 de Setembro israelita”, como já se diz), mas não O SNS, os médicos e todos os outros João Almeida Moreira
profissionais de Saúde A guerra do chocolate
deixou de usar a sua influência para tentar minimizar o sofrimento dos pales-
PÁG. 10 PÁG. 20
tinianos através da abertura da fronteira entre Egito e Gaza para apoio huma-
nitário, obtendo o acordo dos israelitas. Se pensarmos que a normalização de
relações entre Israel e o Egito, no final dos Anos 1970, foi mediada por Jimmy Joaquim Ruivo
Carter e que os Acordos de Oslo de 1993 entre israelitas e palestinianos con- The Chronicles of Fernão Lopes
tou com o patrocínio de Bill Clinton, então é evidente que um presidente dos PÁG. 27
Estados Unidos pode sempre dar um contributo para minimizar a guerra,
mesmo que não consiga impor a paz. Neste momento em que tudo está tão
extremado, é importante a vontade americana de se envolver no problema.

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Diretor interino Leonídio Paulo Ferreira Subdiretor Bruno Contreiras Mateus Diretor de arte Rui Leitão Diretor adjunto de arte Vítor Higgs Editores executivos Carlos Ferro,
Helena Tecedeiro, Pedro Sequeira Grandes repórteres Ana Mafalda Inácio e Fernanda Câncio Editores Sofia Fonseca, Carlos Nogueira, Ricardo Simões Ferreira, Rui Frias, Filipe Gil
e Nuno Fernandes Redatores Ana Meireles, César Avó, David Pereira, Isaura Almeida, João Pedro Henriques, Mariana de Melo Gonçalves, Rui Miguel Godinho, Sara Azevedo Santos,
Susete Henriques, Susana Salvador e Valentina Marcelino Arte Eva Almeida (coordenadora), Fernando Almeida, Rafael Costa e João Coelho Digitalização Nuno Espada Dinheiro
Vivo Bruno Contreiras Mateus (diretor) Evasões Inês Cardoso (diretora ) Notícias Magazine Inês Cardoso (diretora ) Conselho de Redação Ana Mafalda Inácio, Fernanda Câncio,
Susana Salvador e Rui Frias Secretaria de redação Carla Lopes (coordenadora) e Susana Rocha Alves E-mail geral da redação dnot@dn.pt E-

19.10.2023
-mail geral da publicidade dnpub@dn.pt Contactos RuaTomás da Fonseca, Torre E, 5.º – 1600-209 Lisboa. Tel.: 213 187 500. Fax: 213 187 515;
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378; Publicidade: 969 105 615. Estatuto editorial disponível em www.dn.pt. Tiragem média de Julho 2023: 6.432 exps.
NotíciasFlix

Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 3

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 Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
4 EM FOCO

“A Oposição à Direita
está perplexa e até
diz que este é um OE
pipi, betinho e bem
DEBATE QUINZENAL
apresentadinho. E já
me chamaram luso-
-comunista e a IL
Ensaio geral
até disse que eu
tinha três mãos.”
António Costa
para a discussão
do Orçamento
Primeiro-ministro

“[O Governo] baixa

o IRS em 1,3 mil
do Estado
PARLAMENTO António Costa aproveitou regresso dos debates
milhões de euros –
copiou o PSD, mas quinzenais para ensaiar argumentos quanto à “falência das linhas
copiou mal –, mas de demarcação” que a Direita tentou estabelecer desde 2015 com
esta redução tem a governação socialista. SNS e impostos foram os temas dominantes.
do outro lado
um aumento
de 2,7 mil milhões.” TEXTO JOÃO PEDRO HENRIQUES
Joaquim Miranda Sarmento

F
Líder parlamentar PSD
oi o primeiro debate parla-
mentar quinzenal com o
primeiro-ministro depois
de uma interrupção de três
anos e três meses; mas podia ter
sido também – e substantivamente
“[O primeiro- foi – o primeiro dia do debate na ge-
neralidade sobre o Orçamento do
-ministro tem] três Estado para o próximo ano
mãos: há as duas (OE2024).
mãos, as que A Oposição levou para o confron-
to os seus principais argumentos
governam, e há para criticar a proposta governa-
a mão que está mental; e o chefe do Governo en-
saiou os argumentos com que res-
sempre a gamar ponde a essas críticas. O jogo de am-
os portugueses.” bas as partes ficou à vista uns dos
outros e agora, se alguém ainda qui-
André Ventura ser surpreender alguém, novos ar-
Presidente do Chega gumentos terão de ser pensados
para quando efetivamente tiver lu-
gar o debate na generalidade do
OE2024, no final deste mês.
Face à Direita, António Costa
usou as armas esperadas, gabando-
-se das bandeiras que conquistou,
“Querem penalizar nomeadamente ao PSD, no campo
as pessoas que não fiscal, com a diminuição do IRS em
cerca de 1,4 mil milhões de euros
têm recursos para em 2024.
trocar de carro. Fez, aliás, questão de explicar
Estamos num como, no seu entender, a Direita fi-
cou “perplexa” e “sem saber o que
momento em que dizer” (“já disseram um bocadinho
as famílias nem de tudo: que o Orçamento era pipi,
bem apresentadinho e betinho; já
sabem se podem disseram que eu sou luso-comunis-
renovar o frigorífico.” ta; e a Iniciativa Liberal até disse que
eu tinha três mãos”).
Rui Rocha
Presidente da Iniciativa Liberal
E a seguir explicou em detalhe a
sua tese sobre a “falência sucessi-
va” das três “linhas de demarca-
ção” que a Direita ensaiou desde
2015 face à governação socialista.
Argumentou-se, por exemplo, que
“o PS não sabia ser bom gestor das
contas públicas”, mas, “tragédia
das tragédias para a Direita, a ver-
dade é que as contas públicas es-
tão cada vez mais equilibradas”;
também foi dito que estaria em
causa a atração de investimento
estrangeiro e que os mercados não
tinham confiança nos Governos
do PS, mas “a verdade é que o rácio
da dívida é inferior não só ao da
Grécia e Itália, mas também face a
Espanha, França e Bélgica” e, além
disso, “todos os anos Portugal ba-
teu recordes de investimento em-
presarial e de atração de investi-
mento direto estrangeiro”; e por
último acenou-se com a “narrati-
O primeiro-ministro
reconheceu ter-se
enganado quando
disse que
a privatização da TAP
teria sido condição
imposta pela UE
para aprovar o plano
de reestruturação
da empresa.
va” de que os socialistas seriam os
amigos “do Estado grande” e que
iriam “esmifrar” os contribuintes,
mas, “efetivamente, reforçámos o
investimento no SNS e na Educa-
ção, mas isso não foi feito à custa
do aumento dos impostos sobre
os portugueses. Foi feito apesar da
redução dos impostos sobre os
portugueses, em particular do
IRS.” Em síntese: “Um casal com
dois filhos, cada qual com um ren-
dimento de 1500 brutos mensais,
irá pagar em 2024 menos 874 eu-
ros de IRS do que hoje. Mas ainda
dói mais ao PSD é que, se a este ca-
sal fosse aplicada a regra que vigo-
rava no último dia do seu Gover-
no, em 2015, pagaria a mais 2404
euros.”
No final do debate,
António Costa
anunciou que
hoje o Conselho
de Ministros aprovará
a criação
de um subsídio
de desemprego
para vítimas
de violência doméstica.
De resto, Costa foi atacado onde
se esperava: nas aflições que se vi-
vem no SNS; na forma como o Go-
verno foi apanhado desprevenido
no surto hiperinflacionista da habi-
tação; no aumento da carga fiscal
(“dá poucochinho com uma mão e
retira muito mais com a outra. Bai-
xa o IRS em 1,3 mil milhões de eu-
ros, ainda bem – copiou a proposta
do PSD, mas copiou mal –, mas esta
redução tem do outro lado um au-
mento de 2,7 mil milhões de euros
de impostos indiretos”, disse Miran-
da Sarmento, líder parlamentar do
PSD); e nas contradições internas
no Governo acerca da privatização
da TAP.
Aqui, quanto à TAP, o chefe do Go-
verno confessou que se tinha ex-
pressado “mal” quando disse que a
privatização tinha sido prometida à
UE para esta aprovar o plano gover-
namental de ajudas à empresa de
3,2 mil milhões de euros, dizendo
ainda que o Estado poderá, na pri-
vatização, até manter o “controlo es-
tratégico” da empresa, mesmo que
só com uma quota de 10%, tudo de-
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 5

“25 milhões de euros

é quanto
os principais grupos
económicos lucram
por dia. Situação que
não é obra do acaso,
resulta das opções
do Governo,
acompanhado por
António Costa PSD, CDS, Chega e IL.”
volta ao Paula Santos
Parlamento Líder parlamentar do PCP
dia 30, primeiro
dia do debate
na generalidade
do OE2024.
“O Governo falhou
as promessas que fez
e deve ser
responsabilizado
por isso, porque
a crise da construção
não aconteceu
igualmente
em todos os setores.”
Mariana Mortágua
Porta-voz do Bloco
de Esquerda

“Essas reformas
[prometidas pela

ANTÓNIO COTRIM / LUSA

pendendo de quem comprar e do
pacto social que for estabelecido.
Já sobre a Saúde, explanou núme-
ros que dão contas de aumentos
substanciais (desde 2015, último
ano da governação de Passos Coe-
lho) nos atendimentos e nas cirur-
gias, aproveitando, de caminho,
para assegurar que está em curso a
“maior reforma” alguma vez feita no
SNS e aconselhando todos os uten-
tes a usarem mais a linha Saúde24
em vez de irem de madrugada para
os centros de saúde para marcarem
consultas, negando ainda ter algu-
ma vez dito que o problema das Ur-
gências era “culpa dos portugueses”.
E no final, respondendo a Rui Ta-
vares, do Livre – o único deputado
no debate todo que não centrou a
sua intervenção no OE2024 – anun-
ciou que no Conselho de Ministro
de hoje o Governo aprovará um de-
creto-lei prevendo a aplicação do
subsídio de desemprego às vitimas
de violência doméstica.
Assim terminou o primeiro round
do debate parlamentar do OE2024.
Dia 30 há mais.
IUC aumenta mesmo para carros pré-2007
IMPOSTOS Oposição deixou críticas, mas a medida vai mesmo avançar. Afinal, disse
o PM, é necessário fazer escolhas em política e prefere baixar os impostos sobre o trabalho.
TEXTO RUI MIGUEL GODINHO
A pesar das críticas da Oposi-
ção, o primeiro-ministro rei-
terou: o Imposto Único de Circu-
lação (IUC) para carros anteriores
a 2007 vai mesmo aumentar no
próximo ano. Isto depois de ter
sido desafiado a recuar na aplica-
ção da medida.
Ontem, durante o debate quin-
zenal, António Costa defendeu
que é preciso “fazer escolhas” ao
fazer política. E, disse o primeiro-
-ministro, “entre mais 25 euros
[anuais] de IUC ou menos 874 eu-
ros de IRS”, a sua escolha pessoal
recai sobre “baixar os impostos so-
bre os rendimentos do trabalho e
dos pensionistas”, porque quer
“maior justiça social” no país. “É
muito simples”, disse o chefe de
Governo.
Intervindo em resposta a Rui
Rocha, o primeiro-ministro expli-
cou que este imposto vai contem-
plar duas vertentes (a cilindrada
do automóvel e uma componente
ambiental). Por isso, atirou, “a
Oposição tem de decidir se a
emergência climática é todos os
dias ou se é só à segunda, quarta e
sexta-feira”.
Também o presidente do Chega,
André Ventura, criticou esta medi-
da ao falar do Orçamento, que clas-
sificou como uma “vigarice”. “Os
portugueses vão entregar mais di-
maioria absoluta]
nem vê-las
e apenas se veem
oportunidades para
apertarmos o cinto.
(...) E agora, que
oportunidades é que
o país vai ter?”
Inês Sousa Real
Deputada única
e porta-voz do PAN
“Não vamos para
nheiro ao Estado”, disse, referindo
que o aumento do IUC é uma ver-
gonha que deixaria corado qual-
o Orçamento
quer democrata”, acusando ainda de 2024 sem resolver
o Executivo de encobrir o fim das um problema que
portagens nas antigas SCUT com o
aumento deste imposto.
vem de 2022 e 2023
Segundo o relatório que acom- [o subsídio
panha o Orçamento do Estado de desemprego para
para 2024, serão abrangidos cerca
de três milhões veículos de catego- vítimas de violência
ria A (carros, com matrícula até
2007) e 500 mil da categoria E (mo-
doméstica].”
tociclos), que serão tributados Rui Tavares
com base apenas na cilindrada, Deputado único
sem considerar a componente e porta-voz do Livre
ambiental. O impacto orçamental
previsto é de 84 milhões de euros.

6 POLÍTICA
Pedro Santana Lopes considerou “ordinário” o comentário de Luís Marques Mendes na SIC.
Santana afasta-se da corrida a Belém:
“Nunca disse que era candidato”
CONTENDA Depois de Marques Mendes mencionar Coimbra como referência à localização da
Figueira da Foz, Santana Lopes critica “dito ordinário” e rejeita ser candidato a suceder a Marcelo.
TEXTO VÍTOR MOITA CORDEIRO
O
presidente da Câmara
da Figueira da Foz e an-
tigo primeiro-ministro,
Pedro Santana Lopes,
admitiu ontem não querer partici-
par na corrida à Presidência da Re-
pública e exigiu “respeito total pela
Figueira da Foz” ao comentador
político e membro do Conselho de
Estado Luís Marques Mendes (um
dos nomes mais falados no campo
do PSD para concorrer ao Palácio
de Belém). “Não vou responder
com a mesma moeda e cometer a
ordinarice de falar da terra dele”, es-
creveu o autarca na sua página do
Facebook.
Na origem da contenda está o
comentário que Marques Mendes
fez na SIC, no passado domingo,
depois das suas notas habituais, re-
ferindo-se à Figueira da Foz como
ficando “ali ao lado de Coimbra”.
Como reação, Santana Lopes pu-
blicou um texto que intitulou
como “ordinarice” e que surgiu
como crítica. “O nome é Luís Mar-
ques Mendes. Que incomodado e
nervoso está! Não devia. Até deu
um salto grande nas sondagens
manipuladas… Mas ele sabe que é
falso, por isso a agitação que o leva
a um dito ordinário como este. Está
com raiva, meta-se com quem o in-
comoda”, escreveu o autarca na sua
página da rede social, acrescentan-
do ainda “que as supostas sonda-
gens [sobre a corrida a Belém], que
não o são, nada significam sobre o
que se irá passar logo que deixem
de ser considerados António Gu-
terres, Passos Coelho, António Cos-
ta (se for confirmado que não que-
rem concorrer)”,
“Eu não fui incorreto com nin-
guém nem provoquei ninguém.
Foi o dito comentador que se refe-
riu à Figueira da Foz em termos que
não aceitamos. Exige-se um pedi-
do de desculpas. A Figueira da Foz
é tão perto de Coimbra quanto
Coimbra é perto da Figueira da Foz.
Repito: não ponham no ‘mesmo
prato da balança’. Foi uma descon-
Figueira da Foz.
“Ao lado de Coimbra”
O comentador
político Luís
Marques Mendes
saudou no
passado domingo
os Bombeiros
Voluntários da Figueira
da Foz. “Uma saudação, já agora,
também, aos Bombeiros
Voluntários da Figueira da Foz –
fica ali ao lado de Coimbra – por
causa da campanha de prevenção
do cancro da mama e da próstata,
que lançaram na semana passada”,
disse Marques Mendes no seu
espaço de comentário habitual na
SIC. A referência a Coimbra, como
forma de localizar a Figueira da
Foz, incomodou o autarca da
cidade, que reagiu a isso no
Facebook.
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
“Exijo- lhe respeito
total pela Figueira
da Foz. Não vou
responder com
a mesma moeda
e cometer a ordinarice
de falar da terra dele
[Marques Mendes].
Tenha tino. Não
repita.”
“Teve a gentileza
de me ligar, há
minutos, e de dizer as
palavras que esperava
REINALDO RODRIGUES / GLOBAL IMAGENS
de uma pessoa com
a educação que, para
lá de muitas diferenças
e divergências, sempre
lhe conheci.”
Pedro Santana Lopes
Pres. Câmara da Figueira da Foz
ca, disse, depois, o antigo primeiro-
-ministro ao DN, quando questio-
nado sobre se as suas reações na
rede social, ao afastar uma corrida
a Belém, estavam relacionadas
com o comentário de Marques
Mendes. “Disse que tenho o me-
lhor currículo – no plano interno”,
para assumir o cargo, confirmou o
autarca. Admitindo também que
“nunca se diz nunca”, Santana Lo-
pes realçou que o seu compromis-
so é para com a Figueira da Foz.
“É pouco provável”, anteviu o po-
litólogo António Costa Pinto ao
DN, sobre uma possível candidatu-
sideração a uma terra que todos sa- ra de Pedro Santana Lopes a Belém,
bem qual é”, concluiu o autarca. ainda antes de estalar a tinta entre
o antigo primeiro-ministro e Mar-
Corrida a Belém ques Mendes. “O problema de San-
Algumas horas depois do primeiro tana Lopes é que será difícil ter o
comentário, Santana Lopes refor- apoio do PSD perante outros can-
çaria a crítica com outro texto no didatos”, considerou o também in-
Facebook, desta vez centrado nos vestigador de ciência política no
potenciais sucessores de Marcelo ISCTE.
Rebelo de Sousa na Presidência da
República. Garantindo que a sua Um pedido de desculpa
publicação anterior “nada teve que Como desfecho da contenda, algu-
ver com qualquer disputa pré-elei- mas horas depois de ter publicado
toral”, Santana Lopes retirou-se da o segundo texto, Santana Lopes
lista de possíveis candidatos. “Cada confirmou no Facebook que Mar-
vez mais sei e sinto, no estado em ques Mendes lhe endereçou um
que está o Mundo, que não quero pedido de desculpa. “Teve a genti-
participar nessa corrida. E estou leza de me ligar, há minutos, e de
também convencido de que o co- dizer as palavras que esperava de
mentador da SIC em questão não uma pessoa com a educação que,
chegará a ser candidato. Para evitar para lá de muitas diferenças e di-
especulações, é pela evolução po- vergências, sempre lhe conheci.
lítica que prevejo que tenho esse Não vou falar do mais que poderá
entendimento”, considerou Santa- fazer, ele saberá. Por mim, recebi as
na Lopes. suas palavras com satisfação”, as-
“Mas eu nunca assumi que era” sumiu Santana Lopes.
candidato a Presidente da Repúbli- vitor.cordeiro@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 7

PUB

Bruxelas
aponta
falhas na
Opinião contratação
Pedro Marques
pública
Não é apenas
mais um orçamento
A Comissão Europeia
abriu ontem um pro-

É
habitual dizer-se que não
há bons orçamentos, ape-
nas orçamentos possíveis.
Lendo as análises dos co-
mentadores mais insuspeitos de
serem favoráveis ao Governo, sou
levado a pensar que essa máxima
talvez não se aplique ao orçamento
agora apresentado pelo Governo.
Devo confessar que, ao fim de
tantos anos a ler posições sistema-
ticamente desfavoráveis ao Partido
Socialista da parte desses autores,
foi com verdadeira surpresa que os
vi defenderem as virtudes da pro-
posta de Orçamento do Estado
(OE). Surpresa e satisfação. Não
apenas por o orçamento recolher
elogios das pessoas mais imprová-
veis, mas por constatar que nestes
tempos de crescente crispação po-
lítica e mediática, em que só ouvi-
mos dizer mal e mal, há ainda es-
paço para o elogio, aqui e acolá.
Da parte da Oposição, como lhe
compete, vieram críticas. Mas é
preciso reconhecer que, desta vez,
houve uma verdadeira dificuldade
em articular os motivos pelos quais
o orçamento merece reprovação.
As anedóticas declarações de
Montenegro, além da sua conheci-
da falta de jeito, são disso revelado-
ras.
Sintomático também que, à vista
de alguns comentadores, Fernan-
do Medina se tenha voltado a posi-
cionar como possível sucessor de
António Costa. Que o PS tenha ex-
celentes escolhas na mesa para
quando tal cenário se colocar, é po-
sitivo. Que seja a sucessão no PS a
ocupar, há vários anos, páginas de
jornais, mas terem sido todos os
outros partidos (exceto o Chega,
que é um partido unipessoal) a
mudar as lideranças, é divertido.
O que gerou tais reações? Procu-
rarei sintetizar em cinco pontos.
Primeiro, o OE propõe uma si-
gnificativa redução do IRS. Era um
caminho que já vinha sendo segui-
do, sobretudo para os escalões
mais baixos, mas agora será senti-
do por todos e muito particular-
mente pelos mais jovens. Há sema-
nas mencionei nestas páginas que
era positivo o PSD ter apresentado
uma proposta concreta no mesmo
sentido; de forma surpreendente
para muitos, o Governo conseguiu
superá-la. De forma mais sur-
preendente, o PSD votará contra.
Segundo, além de baixar o IRS,
os rendimentos das famílias irão
melhorar também com o aumento
das pensões (6,2%), dos funcioná-
rios públicos (3% nos salários e
2,4% noutras valorizações), do sa-
lário mínimo (7,9%) e dos salários
no setor privado (referencial de 5%
acordado com os parceiros so-
ciais).
Terceiro, apesar da crise interna-
cional, Portugal continuará a cres-
cer acima dos nossos parceiros eu-
ropeus.
Quarto, a dívida pública desce
abaixo dos 100% do PIB, o que re-
presenta uma redução de 25 pon-
tos percentuais em apenas três
anos. É obra!
Finalmente, acautela o futuro no
médio e longo prazo. Será criado
um fundo (Portugal passa para o
pequeno grupo de países no mun-
do com excedentes) destinado a fi-
nanciar os investimentos públicos
quando os fundos europeus forem
reduzidos. Acresce que, ao reforçar
cesso de infração a Portu-
gal pela falta de conformi-
dade com a legislação da
União Europeia (UE) em
matéria de contratos pú-
blicos. Em causa estão, se-
gundo um comunicado de
imprensa do Executivo co-
munitário, casos de não-
-conformidade com aspe-
tos de três diretivas (leis
europeias) relativas a con-
tratação pública, argu-
mentando Bruxelas, no-
meadamente, haver casos
em que a legislação nacio-
nal permite a utilização de
procedimentos por nego-
ciação sem publicação
prévia.
Outras questões identifi-
cadas dizem respeito a re-
gras nacionais que permi-
tem a modificação de con-
tratos relacionados com
tarefas e serviços públicos,
impõem limites à subcon-
tratação ou introduzem
uma discriminação direta a
favor de certos produtos
originários da região onde
a entidade adjudicante
está estabelecida.
As diretivas em causa so-
bre contratação pública
(2014/24/UE; 2014/25/EU
e 2014/23/EU) garantem a
igualdade de tratamento
dos operadores económi-
cos interessados em parti-
cipar nos procedimentos
de adjudicação de contra-
tos e o respeito da obriga-
ção de transparência.
Portugal tem dois meses

16
VALORES
Eleições na Polónia
Graças a uma exemplar
mobilização eleitoral (perto dos
75%!), a maioria parlamentar na
Polónia passa a ser composta por
moderados, europeístas e
progressistas. É a derrota do
Governo ultraconservador que
entrou em rota de colisão com a
União Europeia, mas também
com o Estado de Direito.
os fundos da Segurança Social, as-
segura a sustentabilidade do siste-
ma até 2070. Bem sei que estamos
habituados a uma narrativa dife-
rente, mas a Segurança Social só
deixará de ser viável por decisão
política de quem a queira privati-
zar.
Não devemos embandeirar em
arco. O orçamento é um exercício
muito difícil em que nunca se con-
segue resolver todas as questões.
Mas é com verdadeira satisfação
que vejo que, finalmente, há no
meu país um Orçamento conside-
rado “bom”. O que estará a mudar
em Portugal?
Eurodeputado
para responder às questões
de Bruxelas, recebendo um
parecer fundamentado (a
segunda etapa de um pro-
cesso de infração) se não o
fizer.
A UE define por contra-
tação pública a aquisição,
mediante contrato público,
de obras, fornecimentos ou
serviços por uma ou mais
autoridades adjudicantes a
operadores económicos
selecionados pelas mes-
mas, independentemente
de as obras, os fornecimen-
tos ou os serviços se desti-
narem ou não a uma finali-
dade de interesse público.
DN/LUSA

8 SOCIEDADE
Leilão coloca arte
ao serviço da saúde mental
de crianças e jovens
SOLIDÁRIO 30 artistas doaram as suas obras para angariar dinheiro para
a Associação CAPITI. Evento decorre no Museu da Eletricidade, em Lisboa.
TEXTO SARA AZEVEDO SANTOS
A
CAPITI – Associação Por-
tuguesa para o Desenvol-
vimento Infantil organiza
hoje a 7.ª edição do leilão
artístico solidário Art Mind, para
angariar fundos para apoiar crian-
ças e jovens de famílias carenciadas
com problemas de desenvolvi-
mento. Esta é uma das principais
fontes de receita anuais da associa-
ção. O evento acontece hoje na
Central Tejo do Museu da Eletrici-
dade, em Lisboa, e é possível ver as
obras que serão leiloadas em expo-
sição neste local.
A CAPITI é uma Instituição Par-
ticular de Solidariedade Social
(IPSS) que disponibiliza serviços
médicos e terapêuticos a crianças
e jovens com problemas de neuro-
desenvolvimento pertencentes a
famílias carenciadas. “É feita uma
avaliação criteriosa da situação so-
cioeconómica das famílias candi-
datas a apoio e é atribuído um es-
calão. A CAPITI suporta 90%, 70%,
50% ou 30% do custo anual do tra-
tamento”, explica Mariana Saraiva,
presidente da associação, em en-
trevista ao DN. A família é depois
encaminhada para uma das clíni-
cas parceiras, consoante a zona de
residência. Já têm clínicas parcei-
1 2
ras em 12 cidades do país. Quase
70% dos casos em acompanha-
mento por esta associação perten-
cem aos escalões 0 e 1, e a CAPITI
apoia 90 ou 70% das suas consul-
tas.
No final de 2022, a CAPITI conse-
guiu que 165 crianças e jovens fos-
sem acompanhadas de forma re-
gular, sendo que mais de metade
destas crianças vive fora do Distri-
to de Lisboa.
Colocando a arte ao serviço da
saúde mental, este leilão conta
com a participação de 30 artistas
contemporâneos como Alexandre
Farto (Vhils), Ana Perez Quiroga,
Diogo Pimentão, Duarte Amaral
Neto, Fátima Mendonça, Fernão
Cruz, Jorge Molder, Martim Brion,
Noé Sendas, Pedro Valdez Cardoso,
Sandra Rocha e Teresa Segurado
Pavão. O evento vai acontecer na
Central Tejo do Museu da Eletrici-
dade, entre o meio-dia e as 20.00
horas. Os visitantes podem ver as
obras expostas e participar no lei-
lão online, que encerra esta noite,
às 21.30.
“Todos os artistas que aceitam
este desafio e generosamente
doam uma obra para ser leiloada
valorizam muito o trabalho da as-
Mariana Saraiva
Presidente da Associação CAPITI
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
sociação e querem contribuir atra-
vés da sua arte para que mais crian-
ças e jovens tenham acesso a trata-
mentos na área da saúde mental.
Sem a sua generosidade esta inicia-
tiva não existiria”, diz Mariana Sa-
raiva.
Outras fontes
de financiamento
A CAPITI vive exclusivamente de
doações e este leilão é uma das
principais fontes de receita anuais
desta associação. Para manter o
apoio a todas as crianças em acom-
panhamento e de novas famílias
que procurem ajuda para os seus
filhos, a CAPITI recorre a outras for-
mas de angariação de fundos
como reuniões regulares com em-
presas, associações, particulares e
outras entidades para apresentar o
seu trabalho, ações de sensibiliza-
ção junto de escolas e empresas
para consciencialização sobre a
saúde mental infantil, organização
de outras iniciativas solidárias pon-
tuais e candidatura a prémios em
que a sua atividade se enquadre.
“Iniciativas como este leilão per-
mitem sensibilizar e informar a so-
ciedade para estas perturbações
invisíveis, levando a voz da CAPITI
3 1 Pedido,
escultura feita
por Fernão
Cruz em
papier-maché.
2 Passage,
serigrafia
feita por Vhils.
3 Fotografia
sem título de
Sandra Rocha
do Parque
Mayer. A foto
foi tirada em
2005.
4 Extended
(monochrome),
desenho
de Diogo
Pimentão.
mais longe. Com a desmistificação
da temática da saúde mental há
um reforço da importância da
identificação precoce das proble-
máticas, do acesso ao diagnóstico.
A intervenção é fundamental para
melhorar a qualidade de vida des-
tas crianças e jovens”, destaca Ma-
riana Saraiva.
Esta associação, fundada em
2017, apoia crianças com pertur-
bações como autismo, hiperativi-
dade e défice de atenção, dificulda-
des de aprendizagem, problemas
de comportamento, ansiedade, en-
tre outras, e cujas famílias vivem
numa situação económica mais
desfavorável. Mariana Saraiva ex-
plica que as terapias para estas per-
turbações são longas e dispendio-
sas, exigindo cerca de 175 euros por
mês.
“Não havendo respostas públi-
cas, estas famílias com dificuldades
financeiras não têm possibilidade
de suportar os tratamentos em clí-
nicas privadas, ficando as crianças
“em abandono”, sem quaisquer
perspetivas de futuro, seja em ter-
mos sociais, escolares ou profissio-
nais, e agravando a situação de ex-
clusão da própria família”.
sara.a.santos@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 9

MP não quer Cabrita julgado

pelo atropelamento na A6
JUSTIÇA Ministério Público considerou que não
há indícios para sustentar a pronúncia tanto do
ex-ministro como do ex-chefe de segurança, Nuno Dias.

Manuel Pizarro
tem dito estar
O Ministério Público (MP)
defendeu que o ex-minis-
tro Eduardo Cabrita e o seu an-
a que seguia o veículo no inte-
rior do qual era transportado e
disse que Eduardo Cabrita não
disponível para tigo chefe de segurança, Nuno deu indicações da velocidade
a negociação. Dias, não devem ir a julgamen- do carro ao motorista. Quanto

AMIN CHAAR / GLOBAL IMAGENS

to no processo do atropela-
mento mortal na Autoestrada
6 (A6), na zona de Évora.
No debate instrutório do
processo, que decorreu ontem
nas instalações do Tribunal da
Relação de Évora (TRE), o ma-
gistrado do MP considerou
que não há indícios suficientes
ao então chefe de segurança,
além de circular num outro au-
tomóvel, diferente daquele
onde seguia Eduardo Cabrita,
não tinha a perceção da veloci-
dade a que seguia o carro do
ex-ministro, entre outros argu-
mentos, segundo o MP.
Em reação, a defesa do ex-

Fnam acusa ministro que sustentem a pronúncia

destes dois arguidos.
No caso de ex-ministro da
Administração Interna (MAI),
-ministro considerou que a
decisão do MP foi correta e dis-
se esperar que Cabrita não seja
pronunciado. Opinião contrá-

de “promover desigualdade o procurador referiu que, tal

como foi dito na instrução, Ca-
brita ia a trabalhar e a respon-
ria teve o advogado de defesa
da família. “Quem tem o do-
mínio do facto ali é o senhor

em vez de equidade”
der a e-mails e telefonemas du-
rante a viagem e não se aperce-
beu da presença do peão na
via.
PROTESTOS Médicos voltam a reunir com tutela para nova ronda Também considerou que
não ficou provado que o ex-mi-
de negociações. Sindicato diz que a adesão à greve nos últimos dois nistro soubesse da velocidade
ministro. O resto são cantigas.
O que está provado é que a co-
mitiva era determinada e con-
dicionada em obediência ao
ministro”, disse José Joaquim
Barros.
DN/LUSA

dias é prova de união da classe.

Recuperação de

U
m dia depois de duas
greves nacionais e com
greves parciais às horas
extraordinárias nos cui-
dados primários os dois sindica-
tos médicos voltam a sentar-se à
mesa das negociações com o mi-
nistro da Saúde Manuel Pizarro.
Na semana passada, tanto a Fede-
ração Nacional dos Médicos
(Fnam) como o Sindicato Inde-
pendente dos Médicos (SIM) con-
cordaram ter havido uma certa
abertura para discutir algumas
questões, nomeadamente a dos
horários de 35 horas, mas, ontem,
a Fnam referiu em comunicado
que a proposta do ministro vem
promover a desigualdade em vez
da equidade, sublinhando que só
aceitará “um acordo que respon-
da às necessidades do SNS e que
seja capaz de atrair e fixar os médi-
cos”.
Este sindicato reforça a posição
de que “os médicos estiveram e es-
tarão sempre dispostos a sacrifí-
cios pelos utentes para salvar o
SNS, mas não podem fazer o im-
possível e ultrapassar a exaustão
sem que haja um vislumbre de
melhores condições de trabalho”,
relembrando que os 85% de ade-
são à greve do dia 17 e os 90% no
dia de ontem são sinal “significati-
vo do descontentamento e da
grande unidade dos médicos”. De-
pois desta greve, e de “uma mani-
festação que, não obstante a in-
tempérie, levou meio milhar de
médicos à porta do Ministério da
Saúde, o Conselho Nacional da
Fnam vê reforçada a sua capaci-
dade para, de uma vez por todas,
levar o Governo a legislar em fun-
ção das necessidades dos médicos
e do SNS, em detrimento da sua
insistência na divisão da carreira
médica em médicos de primeira e
de segunda, desregulando uma
mão-cheia de direitos que salva-
guardam os médicos, os doentes e
a melhor prática clínica”.
Na mesma nota, esta estrutura
sindical, que reúne os sindicatos
do Norte, Centro e Sul dos Médi-
cos, diz que, afinal, “a abertura em
negociar de Manuel Pizarro refle-
te-se na reposição da jornada das
35 horas, mas apenas para os mé-
dicos especialistas hospitalares
que fazem Serviço de Urgência
(SU). Além disso, na dedicação
plena, mantém o aumento do tra-
balho suplementar para além dos
limites legais de 150 horas, o au-
mento medieval da jornada diária
de 8 para 9 horas, o fim do descan-
so compensatório após o trabalho
noturno, e a inclusão do sábado
aprendizagens prolongada
como um dia de trabalho regular EDUCAÇÃO Ministro João Costa explicou ainda
para os médicos que não fazem
SU”. no Parlamento que apenas 60% das escolas
A Fnam afirma ainda que o mi- recorreram ao reforço de professores.
nistro “insiste num salário-base
sem equidade entre os médicos,
sem a justa atualização, e sem ga-
rantir, transversalmente, a recupe-
ração do poder de compra para to-
dos, culminando numa fragmen-
tação que em nada contribuirá
O ministro da Educação
anunciou que as medidas
do plano de recuperação das
da pela Iniciativa Liberal so-
bre o Plano 23|24 Escola+, que
prolonga para este ano letivo
para atrair e fixar médicos no SNS”, aprendizagens foram prorro- algumas das medidas do pla-
assinalando que, “ao fim de 18 me- gadas conforme as necessida- no que vigorou desde 2021,
ses de negociação, o Ministério da des das escolas, justificando o para recuperar os défices de
Saúde continua sem enviar as atas fim do reforço de professores aprendizagem resultantes da
de reuniões passadas, os articula- por apenas 60% das escolas te- pandemia de covid-19.
dos dos diplomas da dedicação rem recorrido. “Tivemos uma O novo plano mantém, por
plena e das Unidades de Saúde Fa- quase unanimidade na rele- exemplo, o reforço dos horá-
miliar aprovadas unilateralmente, vância do papel dos técnicos, rioa até quatro horas letivas
sem a concordância da Fnam, em um grande consenso em torno semanais destinado exclusi-
Conselho de Ministros.” das tutorias e da necessidade vamente à equipa multidisci-
O sindicato avisa que vai man- de reforço das equipas multi- plinar de apoio à educação
ter as mesmas formas de lutas disciplinares e a monitorização inclusiva, bem como a possi-
programadas, dois dias de greve da dimensão financeira mos- bilidade de as escolas contra-
em novembro, 14 e 15, “possíveis trou que o crédito horário adi- tarem técnicos no âmbito
de reverter quando o Governo es- cional só foi mobilizado em dos planos de desenvolvi-
tiver à altura de legislar de acordo cerca de 60% das escolas”, afir- mento pessoal, social e co-
com as necessidades dos utentes mou João Costa. munitário, mas extingue o re-
e do país, através da incorporação O ministro da Educação foi forço extraordinário de do-
das soluções que médicos apre- ontem ouvido pela Comissão centes através do crédito
sentam para salvar a carreira mé- Parlamentar de Educação e horário das escolas.
dica e o SNS”. A.M.I. Ciência, em audição requeri- DN/LUSA
10 SOCIEDADE
Opinião
Jorge Conde
O SNS, os médicos
e todos os outros
profissionais de Saúde
H E
á pouco mais de um ano afir-
mámos aqui que faltavam mé-
dicos em Portugal. Um con-
junto de amigos, todos médi-
cos, criticaram muito a nossa análise,
porque Portugal tem mais médicos que
a média dos países da União Europeia e
do que as recomendações internacio-
nais mencionam.
Dados de então levaram-nos a afirmar
que, no SNS, apenas cerca de 11 mil mé-
dicos estavam obrigados em pleno a rea-
lizar serviço de Urgência.
Com a agitação que o setor está a pas-
sar, parece que é legítimo afirmar que o
SNS tem médicos a menos e “quase” não
tem médicos que não trabalhem em mais
do que uma Unidade de Saúde, sejam
elas públicas ou em acumulação entre o
setor público e privado. Sabemos todos
que, se os médicos entenderem trabalhar
só num sítio e não fizerem trabalho ex-
traordinário, o sistema colapsa. Há muito
mais procura que oferta, seja porque as
novas gerações olham para o trabalho de
forma diferente, seja porque a ideia de
trabalhar obrigatoriamente no setor pú-
blico (leia-se SNS) já não tem a adesão
que tinha no final do século passado.
Numa altura em que o Governo prepa-
ra grandes mudanças no setor, importa
que seja capaz de trazer os profissionais
para o seu lado. É preciso serenar os mé-
dicos, mas vai ser preciso fazê-lo a todos
Segurar os melhores
pode implicar grandes
transformações
na forma como se paga,
tendo esta de estar
obrigatoriamente
indexada
à produção.”
os outros profissionais de Ssaúde.
Por um lado, é preciso melhorar as
condições de trabalho, quer no que diz
respeito aos espaços, quer aos equipa-
mentos. A antiguidade de muitos equi-
pamentos e a incerteza com que respon-
dem às solicitações, cria ansiedade e fal-
ta de previsibilidade no trabalho. Muitos
dos edifícios precisam de mais conforto
para os doentes, mas também para os
profissionais.
Por outro lado, e é aqui que se centra
grande parte do conflito latente, é preci-
so pagar melhor. Os profissionais de
Saúde, com os médicos à cabeça, são
dos que mais demoram a formar-se,
desde logo porque os cursos são mais
longos, mas também porque a especiali-
zação consome outro tanto tempo. São
poucos aqueles que encontram no em-
prego público horários das 9 às 5, com a
maioria a trabalhar por turnos, vendo
noites e fins de semana ocupados com
trabalho. Acresce ainda que são poucos
os que trabalham apenas o seu horário
normal de 35 horas, vendo-se obrigados
a trabalhar muito mais horas involunta-
riamente.
Por tudo isto, é óbvio que são dos tra-
balhadores mais mal pagos da Adminis-
tração Pública, com a agravante de se-
rem dos mais bem pagos do setor priva-
do. É por isso necessário que o SNS se
torne competitivo do ponto de vista la-
boral, se pretendemos mantê-lo como
serviço de referência ao qual todos re-
correm. Segurar os melhores pode im-
plicar grandes transformações na forma
como se paga, tendo esta de estar obri-
gatoriamente indexada à produção.
O SNS é um dos bens mais importan-
tes da democracia portuguesa e por isso
importa que se saiba preservá-lo, garan-
tindo que continua a ser a primeira esco-
lha dos doentes. Para isso é necessário
que seja a primeira escolha dos profis-
sionais e que estes possam sentir-se feli-
zes com o trabalho.
Ouvi ontem que os médicos pedem
30% de aumento. É com certeza um au-
mento irreal e impossível..., mas não me
parece mal, já que um assistente em iní-
cio de carreira, depois de 6 anos de curso
e 5 de especialidade, ganha 16,52€ à hora
(ilíquidos).
Presidente do Instituto Politécnico de Coimbra
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
Opinião
Rute Agulhas
Explicar a guerra
às crianças… outra vez…
screvi sobre este mesmo tema
em fevereiro de 2022, a propósi-
to do conflito armado entre a
Rússia e a Ucrânia. Cerca de ano
e meio depois, o mesmo título e o mes-
mo texto mantêm-se totalmente ade-
quados à realidade atual, mudando ape-
nas os países em causa.
Novamente, as crianças são bombar-
deadas a toda a hora com notícias sobre
o que sucede no Médio Oriente, questio-
nando-se se, afinal, as escolas e os hospi-
tais serão locais seguros. Ouvem falar em
crimes de guerra e perguntam: “Mas não
é a guerra, em si mesma, um crime?”
Percebem comentários que salientam
que até a guerra tem regras e, perante
isto, perguntam-se: “Mas como é possí-
vel que existam regras para regular algo
que nem deveria existir?”
São perguntas legítimas por parte de
quem não compreende o que se passa.
Por parte de quem ouve os adultos dize-
rem que devem portar-se bem e resolver
os problemas a bem e, ao mesmo tempo,
são esses mesmos adultos que se envol-
vem em conflitos armados e tentam re-
solver as divergências recorrendo à vio-
lência.
Penso que transmitimos às nossas
crianças mensagens paradoxais e con-
traditórias e corremos sérios riscos com
os modelos aos quais as estamos a expor.
É fundamental que
as crianças continuem
a acreditar que
o mundo pode ser,
de facto, um local
seguro e que, para tal,
é necessária e urgente
uma ação conjunta
de todos nós. Sem
exceção.”
No artigo do ano passado escrevi, es-
perançosa: “Aproveitemos a guerra para
educar para a não-violência, ajudando
as crianças a interiorizar a ideia de que
os conflitos podem ser resolvidos pacifi-
camente e que, apenas dessa forma, po-
deremos todos transformar uma crise
numa oportunidade de aprendizagem e
crescimento.”
Mas será que o estamos a conseguir
fazer?
Uma investigação recente da Univer-
sidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
(UTAD), em Vila Real, concluiu que 68%
dos adolescentes portugueses, entre os
12 e os 18 anos de idade, foram vítimas
de comportamentos agressivos em con-
texto escolar. Predominam comporta-
mentos de violência psicológica e física,
bem como comportamentos associados
ao cyberbullying. 35% dos adolescentes
sofreram ainda comportamentos mais
graves, como ameaças com objetos ou
armas e lesões corporais graves. Este es-
tudo permitiu ainda concluir que 64%
dos jovens assumiram ter praticado al-
gum ato violento para com um colega da
escola.
Falamos, assim, das guerras e das
mensagens positivas que, sem sucesso,
tentamos transmitir às crianças e jovens.
E falamos também desta violência, per-
petrada e sofrida por eles, num contexto
que, em abstrato, deveria ser seguro.
Estão as nossas crianças e jovens a
conseguir interiorizar a ideia de que é
possível resolver divergências e proble-
mas de forma não-agressiva, sabendo
transformar as crises em oportunidades
de mudança e crescimento? O estudo
atrás referido parece indiciar que não é
bem assim.
Por isso, novamente sublinhamos a
importância de filtrar estas notícias so-
bre as guerras com os mais novos, limi-
tando a sua exposição à informação e
ajudando-os a clarificar alguns aspetos,
sem alarmismos e evitando generaliza-
ções abusivas. É fundamental que as
crianças continuem a acreditar que o
mundo pode ser, de facto, um local segu-
ro e que para tal é necessária e urgente
uma ação conjunta de todos nós. Sem
exceção.
Psicóloga clínica e forense,
terapeuta familiar e de casal
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 11

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Rumo à cimeira de novembro, todos os meses sentamos à mesma mesa vozes

qualificadas sobre temas decisivos para o ecossistema de mobilidade. Especialistas,
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Mobi Summit 2023.
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da EDP Comercial, Roderick van der Berg, CEO da Eco-Movement, e Luís Tiago Ferreira,
Diretor de Smart Cities da e-Redes, vão debater o valor dos dados como um ativo
para acelerar a mobilidade elétrica.

Na Session 6, em novembro, falamos da importância de criar espaço para a

mobilidade sustentável, de forma a pacificar o tráfego urbano. Um painel de
discussão que conta com a participação de Miguel Gaspar, Business Development
& Innovation da SIBS, Carlos Silva, Presidente da EMEL, Frederico Venâncio, Country
Manager da Bolt, e Vera Diogo, Presidente da MUBI - Associação pela Mobilidade Urbana
em Bicicleta.
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 Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
12 LOCAL

Rio Maior. Ação popular tenta travar abate

de árvores por alegadas razões de segurança
AMBIENTE Centenas de árvores têm vindo a ser abatidas na zona de Rio Maior, pela Infraestruturas de Portugal (IP).
Depois da estrada que liga a vila a Santarém, é agora a vez da EN 114, que a liga às Caldas da Rainha. Um grupo de cidadãos
está disposto a “ir até às últimas consequências” para as preservar.

TEXTO PAULA SOFIA LUZ

E
m Rio Maior, as árvores não controlo destas espécies reveste-se,
morrem de pé. Ou não é atualmente, da maior importância,
essa a vontade da IP (In- por constituírem um grave e cres-
fraestruturas de Portugal) cente problema”, nomeadamente
que desde há vários meses já terá pela obstrução de equipamentos
abatido mais de 400 árvores e se pre- de sinalização e segurança “e inva-
para para continuar essa “operação dindo bermas e sistemas de drena-
limpeza” nas bermas da EN 114, in- gem”, bem como pela invasão dos
vocando “razões de de segurança terrenos agrícolas confinantes com
rodoviária”. a via e por serem “fatores de perda
“Tenho 50 anos, vivi a maior par- de biodiversidade”.
te da minha vida na minha terra
(Rio Maior) e nunca pensei assistir “Não se plantam
a uma coisa destas, embora, con- árvores com 100 anos”
fesse, que há uns anos já tinha tido João Correia estima que, no espa-
esta espécie de iluminação: muito ço de 15 quilómetros, tenham sido
do belo natural que existe é por cortadas cerca de 470 árvores –
mero acaso, porque alguém não carvalhos, sobreiros, cedros, aci-
cultivou ou construiu, e a natureza prestes, freixos e choupos. Entre-
seguiu um pouco do seu curso. Por- tanto, recentemente verificou que

FOTOS: MÁRIO VASA / GLOBAL IMAGENS

tanto, expectativas baixinhas, por à beira da EN 114 começavam a
assim dizer.” O desabafo de João aparecer “árvores marcadas”, com
Correia, professor de Ciências, cru- o (mesmo) destino traçado.
za-se com o de mais três dezenas de O grupo de trabalho constituído
amigos, conhecidos e defensores no seio deste movimento em defe-
da natureza. Esta semana, alguns sa do arvoredo não se conforma
deles concentraram-se junto ao lo- com esta “estratégia do quero, pos-
cal para falar ao DN da “incon- so e mando” que identificam na IP.
gruência desta ação, a coberto do “Eu não tenho confiança numa en-
DL n.º 124/2006, de 28 de Junho, tidade que resolve abater árvores
sendo que as principais vítimas têm porque sim, sem uma análise fitos-
sido carvalho-cerquinho, freixo, ci- Grupo que promoveu ação sanitária, sem qualquer considera-
preste, cedro, choupo, entre outras popular contra o abate ção pela ligação afetiva da popula-
árvores”. de árvores critica “estratégia ção às árvores, sem qualquer respei-
“Foram cortadas centenas de ár- do quero, posso e mando” que to pela população”, acrescenta João
vores e, agora, pelo menos mais identificam na Infraestruturas Correia. “Há aqui árvores com mais
170 árvores encontram-se marca- de Portugal (IP). de 100 anos, algumas delas carva-
das no espaço de pouco mais do lhos com um perímetro de três me-
que 1km, entre as Bocas de Rio tros. E esse é um dos critérios para
Maior e Senhora, num troço de es- vidência Cautelar para impedir o que possam ser candidatas à classi-
trada particularmente belo pelo abate das árvores”, afirma ao DN ficação de Interesse Municipal”.
efeito de túnel arbóreo criado pelos Júlio Ricardo. Da parte da autarquia, presidida
carvalhos e sobreiros de grande O abate das centenas de espécies por Luís Filipe Santana Dias (eleito
porte”, explica João Correia, que insere-se numa ação iniciada pela pela Coligação Juntos pelo Futuro –
desde o verão se dedica com afinco Infraestruturas de Portugal (IP) em PPD/PSD – CDS/PP), não é conhe-
a denunciar, junto de várias entida- fevereiro deste ano, que abrange cida qualquer intervenção pela ma-
des, o que mais lhe parece um várias vias do Distrito de Santarém, nutenção do conjunto arbóreo. O
atentado ambiental: “São árvores entre outros. A IP invoca a “melho- assunto já foi abordado pelo verea-
belíssimas, que não só embelezam ria da circulação”, numa nota de es- dor da Oposição, Miguel Paulo (PS),
o trajeto como dão sombra. O ato clarecimento enviada à Agência que de resto também se juntou ao
de as cortar só vai deixar o terreno Lusa, no início desta semana. movimento. Além do ICNF, o grupo
livre para espécies invasoras, faci- Acrescenta ainda que “as ativida- denunciou também a situação ao
litando incêndios”, considera. des de poda e abate de árvores na SEPNA (Serviço de Proteção da Na-
Também Júlio Ricardo corrobo- EN114 foram precedidas do respe- tureza e do Ambiente) e denunciou
ra esta opinião. Depois de alertadas tivo parecer técnico da especialida- numa carta aberta o que considera
as diversas entidades (incluindo o de para avaliação das necessidades ser “um crime ambiental”.
Instituto de Conservação da Natu- de intervenção” e que “55% das ár- A IP garante ainda que, como
reza e Floresta – ICNF – e a Câmara vores alvo de intervenção respeita medida compensatória, está pre-
de Rio Maior, entre outras), e pe- a espécies invasoras, nomeada- vista a plantação de árvores em vá-
rante o silêncio, que soa a consen- mente acácias e aliantos”. Os cida- rios concelhos do Distrito de San-
timento, o grupo avança agora para dãos locais discordam, justifican- tarém. “Até pode plantar, mas nun-
os tribunais, através de uma ação do que “nunca identificaram qual- ca plantará árvores com 100 anos”,
popular. “Esperamos que o Minis- quer espécie dessas por ali”. contesta o movimento.
tério Público avance com uma Pro- Mas a IP insiste que “o abate e dnot@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
DINHEIRO 13

Reposição do IVA
levaria a um
aumento de 2%
no preço do cabaz
CONSUMO Dos 41 produtos do cabaz do IVA
Zero da Deco Proteste, 20 estão mais caros, em
especial a fruta, o azeite e os legumes. Laranja e
brócolos estão quase 60% acima de abril.

LEONEL DE CASTRO / GLOBAL IMAGENS

TEXTO ILÍDIA PINTO

S
e o Governo pusesse fim ao pacto mais direto”, refere Rita Rodri-
IVA Zero neste momento, o gues, que não hesita em frisar que,
cabaz de 41 produtos mo- “globalmente, os preços estão mais
nitorizado pela Deco Pro- caros do que antes da entrada em vi-
teste que está a ser beneficiado pela gor do IVA Zero”. A que se devem as
medida passaria a custar não os subidas, “só a ASAE consegue solici- O IVA Zero para 46 categorias de produtos entrou em vigor no dia 18 de abril e termina no final deste ano.
138,77 euros que o consumidor pa- tar evidências das questões que ge-
gava por eles a 17 de abril, dia ante-
rior à entrada em vigor da retirada do
raram os aumentos”.
A associação lamenta ainda que a
Apoios esses, sublinha Gonçalo
Lobo Xavier, que “não se destina- IMPACTO DO FIM DO IVA ZERO NUM CABAZ DE 41 BENS
imposto sobre estes produtos, mas celeridade de adaptação de preços vam a impedir aumentos de pre- PRODUTO PREÇO 17/04 PREÇO 18/10 VARIAÇÃO ENTRE
141,35 euros. São mais 2,58 euros, não seja a mesma nas subidas e nas ços, porque o mercado continua a C/ IVA C/ IVA 17/04-18/10 C/ IVA%
correspondentes a um aumento de descidas. “Há sempre muita rapidez funcionar, mas sim ajudar a que os Óleo alimentar 3,04 € 2,33 € -23,28%
1,86%, em cima dos 6% da reposição quando é para subir preços, mas preços não aumentassem tanto”. Carapau 5,15 € 4,35 € -15,46%
do impostos (ver infografia). Os da- para os descer a velocidade não é a E, garante, “o mercado está cada Tomate chucha 3,04 € 2,67 € -12,05%
dos são da Deco Proteste, que alerta mesma”, sublinha. vez mais pressionado e, em produ- Cenoura 1,32 € 1,18 € -10,08%
para a subida do custo de vida para O DN/Dinheiro Vivo tentou, sem tos como o azeite, os ovos, a carne Curgete 2,00 € 1,82 € -9,23%
as famílias. “Há uma tendência ge- sucesso, ouvir a Confederação dos de frango, e a carne em geral, os Dourada 7,01 € 6,52 € -7,01%
neralizada de aumento dos preços Agricultores de Portugal sobre esta preços têm aumentado e vão, infe- Febras de porco 5,50 € 5,18 € -5,79%
que está, claramente, a absorver o matéria. Já a Associação Portuguesa lizmente, continuar a aumentar”. Costeletas de porco 5,82 € 5,52 € -5,20%
impacto da medida do IVA Zero que, das Empresas de Distribuição O que não significa, sustenta, que Alface frisada 2,31 € 2,19 € -5,20%
já por si e isoladamente, é diminuto”, (APED) garante que não é o retalho a medida [do IVA Zero] não tenha Carcaça tradicional 0,20 € 0,19 € -4,50%
diz a diretora de Comunicação e Re- que está a aumentar preços, é a pro- funcionado. “Associar o IVA Zero ao Cebola 1,92 € 1,84 € -4,33%
lações Institucionais da organização dução, mas que tal se deve à seca, crescimento de preços é profunda- Bacalhau graúdo 13,57 € 12,99 € -4,30%
de consumidores. com efeito na escassez de produção mente injusto e redutor”, diz Lobo Manteiga com sal 2,28 € 2,20 € -3,41%
Rita Rodrigues assume que a si- de azeitona ou laranjas, bem como à Xavier, que recusa comentar os da- Queijo curado fatiado embalado 2,53 € 2,47 € -2,69%
tuação gera uma “grande preocupa- dificuldade em arranjar cereais, ain- dos da Deco, por não os conhecer. Banana importada 1,29 € 1,26 € -2,55%
da por efeito da guerra na Ucrânia. Perna de peru 4,70 € 4,59 € -2,52%
ção”, na medida em que o Governo Mas assegura que, até setembro, os
Arroz carolino 2,18 € 2,13 € -2,40%
já assumiu que o IVA Zero termina- O diretor-geral da APED lembra, dados da comissão de acompanha-
Leite UHT meio gordo 0,96 € 0,95 € -2,01%
rá no final do ano e não será prolon- por outro lado, que, apesar da medi- mento do IVA Zero “mostram que o
Massa espirais 1,37 € 1,35 € -1,31%
gado em 2024. “Se os cálculos, à data da do IVA Zero ter sido negociada cabaz teve descidas de preços, em
Iogurte aroma 1,95 € 1,93 € -1,27%
de hoje, são estes, e sabendo-se que com os parceiros, produção e co- média, de 10%”. Um valor “muito Ovos 1,62 € 1,61 € -1,03%
os primeiros dias de janeiro trazem mércio, em abril, os apoios à produ- importante”, diz. Na próxima se- Queijo flamengo fatiado embalado 2,74 € 2,76 € 0,79%
os aumentos típicos do arranque do ção “chegaram tardiamente e só em gunda-feira à tarde há nova reunião Atum (posta em óleo vegetal) 1,44 € 1,47 € 1,56%
ano, a acrescer a isto, vemos a situa- setembro começaram a ter efeitos da referida comissão de acompa- Frango inteiro 2,84 € 2,89 € 1,82%
ção com muita preocupação face na produção nacional”. nhamento. Pescada fresca 9,14 € 9,37 € 2,50%
àquilo que são já as dificuldades Gonçalo Lobo Xavier admite que Carne de novilho para cozer 8,22 € 8,43 € 2,52%
atuais dos consumidores”, diz. os apoios à produção “são impor- Arroz agulha 1,58 € 1,63 € 3,29%
A 17 de abril, e com o IVA em vi- tantes” e garante que, perante o pro- Bife de peru 7,85 € 8,11 € 3,33%
gor, o cabaz de 41 produtos custava, longamento do IVA Zero, de outu- Atum (posta em azeite) 1,79 € 1,85 € 3,46%
em média, 138,77 euros. Seis meses APED está a negociar bro para dezembro, a associação Lombo de porco sem osso 5,95 € 6,19 € 4,02%
depois – completados ontem –, o defendeu “ser necessário continuar
mesmo cabaz, agora sem IVA, custa
o fim formal do IVA a pagar aos agricultores, mas nos
Massa esparguete 1,15 € 1,20 € 4,55%
Iogurte líquido 2,01 € 2,14 € 6,53%
133,01 euros, ou seja, menos 5,76 Zero no cabaz mesmos moldes que os outros Esta- Pão de forma sem côdea 2,02 € 2,18 € 7,76%
euros. Em causa está uma descida alimentar para 10 dos-membros”. Batata vermelha 1,38 € 1,50 € 8,67%
de 4,15%, “o que fica muito aquém Quanto ao fim do IVA Zero, pre- Ervilhas ultracongeladas 3,59 € 3,95 € 9,87%
do que seria desejável”, lamenta a de janeiro, para visto para o final do ano, a APED Maçã Gala 1,98 € 2,21 € 11,91%
associação de defesa do consumi-
dor. Mais do que ao prolongamen-
permitir a adaptação está a negociar com o Governo
uma moratória de dez dias. “Não
Maçã Golden 1,79 € 2,05 € 14,70%
Couve-flor 2,22 € 2,59 € 16,33%
to do IVA Zero em 2024, a Deco dos supermercados vamos [nos supermercados] mu- Azeite virgem extra 7,52 € 9,57 € 27,28%
“apela à implementação de todas as à mudança de preços dar o sistema em 24 horas, nem as Laranja 1,37 € 2,18 € 58,64%
medidas complementares, desi- etiquetas todas na Passagem de Brócolos 2,41 € 3,83 € 59,19%
gnadamente os apoios à produção, nas prateleiras. Ano”, sublinha. TOTAL 138,77 € 141,35 € 1,86%
e que podem, essas sim, ter um im- ilidia.pinto@dinheirovivo.pt FONTE: DECO PROTESTE
14 DINHEIRO
Aeródromo de Cascais, em Tires, processa 12 mil movimentos por ano.
Governo quer acelerar
deslocação de voos executivos
da Portela para Cascais
AEROPORTO Ministro das Infraestruturas cria grupo
de trabalho que terá seis meses para apresentar um plano.
TEXTO CARLA ALVES RIBEIRO
O
desvio do tráfego de avia-
ção executiva do Aero-
porto Humberto Delga-
do (AHD), em Lisboa,
para o Aeródromo Municipal de
Cascais (AMC) é um objetivo assu-
mido pelo Governo que, ontem,
num despacho assinado pelo minis-
tro das Infraestruturas, João Galam-
ba, criou um grupo de trabalho que
será coordenado pelo seu gabinete,
com a tarefa de apresentar um pla-
no de operacionalização dessa mu-
dança em seis meses, ou seja, até
abril do próximo ano.
“Considera-se fundamental im-
pulsionar e formalizar a estreita coo-
peração entre as várias entidades en-
volvidas neste processo de desloca-
ção da operação dos voos executivos
do AHD para o AMC, para se conse-
guir concretizar, de forma célere, a
plena operacionalidade da medida
e assegurar que, do ponto de vista
técnico e da segurança operacional,
a mesma cumpre as plenas condi-
ções de funcionamento”, lê-se no do-
cumento.
O Governo diz que o Aeródromo
de Cascais, que processa cerca de 12
mil movimentos por ano, é uma das
“infraestruturas aeroportuárias
com maior volume de tráfego de ae-
ronaves” do país e “dispõe de um
terminal de passageiros com os ser-
viços e equipamentos necessários
para garantir a segurança e o con-
forto aos passageiros, podendo
constituir uma alternativa ao AHD
no que respeita ao tráfego de avia-
ção executiva”.
O despacho destaca o investimen-
to já efetuado naquela infraestrutu-
ra pela Câmara Municipal de Cas-
cais, na aerogare, no quartel de bom-
beiros e na torre de controlo, mas
admite “a necessidade de virem a ser
realizados investimentos ao nível da
placa de estacionamento e do ta-
xiway, da extensão da pista e ao nível
CARLOS MANUEL MARTINS / GLOBAL IMAGENS
INÊS DRUMOND
VICE-PRESIDENTE DA CMVM
Capital de Risco: tendências recentes
e revisão do quadro legal aplicável
O
desenvolvimento do
mercado de capitais,
ao permitir uma es-
trutura de financia-
mento das empresas mais equi-
librada, ao facilitar o financia-
mento de investimentos de
longo prazo e ao promover o
crescimento e a transparência
das empresas, apoiando a inova-
ção e o empreendedorismo,
deve ser parte integrante de um
processo de crescimento econó-
das acessibilidades ao aeródromo”.
Do grupo de trabalho farão parte,
mico sustentado. Os projetos de
transição digital e energética
além de dois técnicos especialistas atualmente em curso, tenden-
do Ministério das Infraestruturas,
representantes do Município de
cialmente de longo prazo e en-
volvendo necessidades de inves-
Cascais, da Autoridade Nacional da
Aviação Civil e da NAV. Terão de “ava-
timento avultadas e adequadas
ao nível de risco, tornam o papel
liar o volume e perfil do tráfego a
deslocar, os respetivos impactos
do mercado de capitais no finan-
ciamento da economia ainda
operacionais numa e noutra infraes- mais relevante.
trutura e as condições do AMC para
acolher a desejada deslocação da
De acordo com o relatório da
OCDE sobre o mercado de capi-
aviação civil, incluindo identificação
dos investimentos considerados ne-
tais em Portugal, publicado em
2020, ao longo das últimas déca-
cessários para o efeito”.
O despacho de João Galamba sur-
das, os “investidores institucio-
nais alternativos”, incluindo os
ge depois de a Comissão Técnica In- Fundos de Capital de Risco
dependente, que está a estudar a lo- (FCR), tornaram-se importantes
calização daquele que será o novo fornecedores de capital a nível
aeroporto de Lisboa, ter entregue ao internacional; porém, em Portu-
Governo um relatório com medidas gal, de acordo com a mesma fon-
para aumentar a capacidade da Por- te, a dimensão dos “mercados de
tela. Entre as recomendações está o capitais privados” é bastante in-
desvio de tráfego executivo e tam- ferior às “médias europeias”.
bém militar (da Base de Figo Madu- A última edição do Relatório
ro) para outros aeroportos do país. sobre a Atividade de Capital de
Na proposta de Orçamento do Esta- Risco da CMVM evidencia um
do para 2024, o Executivo assume crescimento significativo da ati-
essa deslocalização. vidade deste setor em Portugal
Quanto à retirada dos voos milita- nos últimos três anos, medido
res, João Galamba disse ontem que pelos montantes sob gestão,
exigirá a renegociação do contrato pelo número de entidades parti-
de concessão do AHD. “A saída de cipadas e pelo número de parti-
Figo Maduro do atual perímetro do cipantes dos FCR. No final de
Aeroporto Humberto Delgado im- 2022, cerca de 62% do valor total
plicará uma comissão de negocia- dos ativos sob gestão correspon-
ção com a ANA, para alterar o con- dia a FCR de “private equity” e
trato de concessão por incorpora- 35% a FCR de “venture capital”.
ção de novos ativos”, disse o ministro Verificava-se, ainda, a concen-
à margem do GreenPort Congress & tração dos fundos em estratégias
Cruise, em Lisboa. Galamba adian- de investimento de
tou, no entanto, que o Governo está “growth/mezzanine” e uma di-
a trabalhar já há alguns meses para minuição da importância relati-
que a saída de Figo Maduro se con- va dos ativos sob gestão em es-
cretize “no curto prazo”, indepen- tratégias de investimento de
dentemente do tempo que levar a “turnaround/special situations”.
comissão de negociação a consagrar Como em qualquer segmento
as alterações no contrato de conces- do mercado, a regulação aplicá-
são. Com LUSA vel à gestão de ativos, onde se in-
carla.ribeiro@dinheirovivo.pt clui o capital de risco, tem um
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
2023
“OS PROJETOS
DE TRANSIÇÃO DIGITAL
E ENERGÉTICA ATUALMENTE
EM CURSO (...) TORNAM
O PAPEL DO MERCADO
DE CAPITAIS
NO FINANCIAMENTO
DA ECONOMIA AINDA
MAIS RELEVANTE.”
impacto significativo não apenas
na sua atividade, como na sua
própria robustez.
Importa, assim, destacar a revi-
são, em 2023, do quadro legal
aplicável à gestão de ativos em
Portugal, essencialmente moti-
vada pela complexidade gerada
pelas sucessivas alterações que o
regime legal sofreu nas últimas
duas décadas (em parte associa-
das à necessidade de transposi-
ção de diretivas europeias) e pela
existência de requisitos adicio-
nais (face aos europeus) impos-
tos pela lei nacional, impactando
negativamente a competitivida-
de do nosso mercado. A revisão
efetuada, que deu origem ao Re-
gime da Gestão de Ativos (Decre-
to-Lei n.º 27/2023, de 28 de abril),
teve assim por base princípios de
simplificação, consistência e pro-
porcionalidade, promovendo a
competitividade e atratividade
do mercado nacional sem colo-
car em causa a proteção do inves-
tidor.
A redução dos tipos de entida-
des gestoras de ativos, junta-
mente com o alargamento da
atividade permitida a cada tipo,
em particular no que diz respeito
às Sociedades de Capital de Ris-
co (SCR), permite (i) maior flexi-
bilidade na gestão dos ativos, (ii)
otimização de recursos e (iii) re-
dução de custos.
A distinção das entidades ges-
toras com base na sua dimensão
faz com que os requisitos legais
aplicáveis sejam diferenciados e
proporcionais, podendo as ges-
toras de menor dimensão ficar
sujeitas a requisitos menos res-
tritivos, sem colocar em causa,
claro está, o cumprimento da le-
gislação da União Europeia.
Igual destaque deve ser dado à
simplificação de processos ad-
ministrativos: o novo regime pre-
vê a redução significativa de pra-
zos legais, incluindo no que toca
a processos de autorização de
entidades gestoras, por parte da
CMVM, e sujeita a mera comuni-
cação o registo de uma parte si-
gnificativa de organismos de in-
vestimento coletivo anterior-
mente sujeitos a processos de
autorização.
Os requisitos de acesso ao in-
vestimento em FCR tornam-se
menos exigentes, em termos de
montante mínimo de investi-
mento inicial. Porém, este “ali-
viar” de requisitos ocorre num
enquadramento em que todas as
entidades gestoras, incluindo as
SCR, são obrigadas a avaliar a
adequação dos conhecimentos e
experiência dos investidores não
profissionais aquando da co-
mercialização de unidades de
participação.
Em linha com o recomendado
pela OCDE, com estas (e outras)
alterações previstas no Regime
da Gestão de Ativos procurou-se
um equilíbrio mais adequado
entre a robustez das entidades
supervisionadas, a proteção dos
investidores e a competitividade
do mercado nacional. A par de
outras ações que a CMVM tem
vindo a desenvolver, espera-se
que este novo regime legal con-
tribua para o desenvolvimento
sustentável do mercado de capi-
tais e, consequentemente, para o
crescimento da nossa economia.
 Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
ESPECIAL 15
DIREITOS RESERVADOS

O papel dos médicos junto das populações foi um dos temas em debate. A importância da literacia em saúde esteve em destaque na conferência.

“Sustentabilidade Ambiental “Inaladores menos verdes

devem ser mais taxados”
Sobre a utilização dos inaladores,
bombas, como muitos chamam

no Setor da Saúde”. O Papel dos aos dispositivos, Paula Rosa, espe-

cialista em pneumologia e coorde-
nadora da Comissão de Trabalho

Profissionais e das Instituições

de Doenças Ocupacionais e do
Ambiente da Sociedade Portugue-
sa de Pneumologia realçou as no-
vas fórmulas menos agressivas
CONFERÊNCIA Como podem os médicos contribuir para a sustentabilidade ambiental? para o ambiente, mas nem sempre
do conhecimento dos médicos.
Que políticas incentivam profissionais e utentes a reivindicarem menos pegada carbónica? “Há novos inaladores com me-
nos efeito de estufa. A informação
Está a tutela a contribuir e a dar orientações para reduzir os gases com efeito de estufa? Foram é essencial e se a literacia em saú-
questões como estas que fizeram o debate lançado pelo Conselho Português para a Saúde e de é importante para o cidadão co-
mum, também nós, profissionais
Ambiente (CPSA) e Embaixada do Reino Unido, em Lisboa com o apoio da farmacêutica GSK. de saúde, temos de estar atentos e
acompanhar a inovação.”
A coordenadora do Programa
Nacional para as Doenças Respira-
tórias da Direção Geral da Saúde
(DGS) discordou de parte da afir-
mação. “Não cabe a cada médico,
que mal tem tempo para observar
o doente, estar a fazer esta ou aque-
la opção por terapêuticas mais sus-

“
tentáveis. É aqui que entra a DGS

N
ão é apenas o futuro que
está em causa, é o nosso
presente”, começou por
alertar Luís Campos,
presidente do CPSA, justificando a
visão macro que os países deviam
adotar implementando práticas
mais sustentáveis em todos os se-
tores. No caso da saúde, o médico
ressalvou o papel fundamental que
os profissionais desempenham
junto das populações e que, por
essa razão, podem e devem ter na
alteração de comportamentos em
toda a sociedade.
Saúde e Ambiente
são faces da mesma moeda
À luz das estatísticas citadas pela
organização da iniciativa, que teve
o DN e a TSF como parceiros de
média, a produção global de saúde
no mundo está a intensificar os ní-
veis de doença no planeta devido à
emissão de gases com efeito de es-
tufa.
Nas intervenções ao longo da ini-
ciativa ficou a certeza demonstra-
da por vários médicos especialistas
que os doentes respiratórios já sen-
tem diariamente as consequências
do agravamento das condições cli-
máticas. “Precisamos de momen-
tos como este, que promovam o
diálogo interdisciplinar e abran-
gente”, explicou Chris Sainty, o em-
baixador britânico, referindo-se
aos oradores e à plateia (presencial
e remota) profissionalmente mui-
to diversificada.
Aliança para a “Ação
Transformadora
sobre Clima e Saúde”
Com participação remota e ainda
que rápida, Maria Neira, diretora do
Departamento de Ambiente, Altera-
ções Climáticas e Saúde da Organi-
zação Mundial da Saúde (OMS), pe-
diu contributos de todos para o tra-
balho em desenvolvimento no
ATACH (The Alliance for Transfor-
mative Action on Climate and
Health), um instrumento que utiliza
o poder coletivo dos Estados-mem-
bros da OMS para implementar sis-
temas de saúde sustentáveis e resi-
lientes às alterações climáticas inte-
grando essas práticas nos planos
nacionais, regionais e globais.
“Precisamos de aprender uns
com os outros e os bons exemplos
de um lado devem ser seguidos por
todos”, disse a antiga vice-ministra
da Saúde de Espanha, nomeada
uma das 100 maiores influenciado-
ras políticas em saúde e alterações
climáticas. Dando exemplos de
como é possível diminuir o impac-
to dos serviços de saúde, Maria Nei-
ra apontou de imediato a necessi-
dade de existir eficiência energéti-
ca nos hospitais e centros de saúde.
Médicos e parceiros da cadeia de
produção da saúde disseram nesta
iniciativa, em que TSF e o DN foram
parceiros de média, que são neces-
sárias novas orientações políticas e
novas práticas organizacionais para
conseguir ir mais além, em nome
de um setor mais verde.
Em Portugal, a saúde comparati-
vamente à média global das emis-
sões de gases com efeito de estufa
está quatro décimas acima dos
atuais 4,4%. Nesse valor surge o
transporte de medicamentos, a
produção de energia e os pequenos
inaladores pressurizados usados
por doentes com problemas respi-
ratórios como os principais agentes
poluidores.
na interlocução com o Infarmed e
com outras estruturas como já
aconteceu, por exemplo, com a
prescrição sem papel, que foi uma
boa-prática em nome da sustenta-
bilidade ambiental. As escolhas de-
vem ser ponderadas com informa-
ção sobre os malefícios e haver
orientação especifica para os mé-
dicos”, afirmou Cristina Barbara,
acreditando que “à semelhança do
que acontece com o tabaco tam-
bém certos inaladores menos ver-
des podem e devem ser taxados
pelo nível de poluição que geram”.
Neste contexto, a médica mos-
trou-se ainda preocupada com o
desperdício que vê abundante-
mente na indústria farmacêutica
com os dispositivos plásticos for-
necidos em cada embalagem,
mesmo tratando-se de terapêuti-
cas de recarga.

16 INTERNACIONAL
Biden “iliba”
Israel
de explosão
no hospital
e desbloqueia
ajuda a Gaza
GUERRA EUA dizem que dados preliminares
confirmam versão israelita, de falha num rocket
da Jihad Islâmica. Governo de Netanyahu disse
que não irá bloquear a entrada de alimentos e
água a partir do Egito para os civis palestinianos.
TEXTO SUSANA SALVADOR
O
presidente dos EUA, Joe
Biden, ilibou ontem Is-
rael da explosão ocorri-
da na véspera no hospi-
tal Al-Ahli Arab de Gaza, apontan-
do o dedo “à outra equipa” durante
um encontro em Telavive com o
primeiro-ministro israelita, Benja-
min Netanyahu. As Forças de Defe-
sa de Israel (IDF, na sigla em inglês)
dizem que a culpa foi de um rocket
defeituoso lançado pela Jihad Islâ-
mica Palestiniana, aliada do Ha-
mas. E os primeiros dados dos ser-
viços de informação norte-ameri-
canos vão no mesmo sentido. Mas
isso não fez calar os protestos no
mundo árabe. Biden saiu de Israel
não com um cessar-fogo, mas com
a promessa de que a ajuda humani-
tária poderá entrar em Gaza.
A visita do presidente norte-
-americano (a segunda a uma zona
de guerra este ano, depois da ida à
Ucrânia) tinha como foco reiterar o
apoio dos EUA a Israel após o ata-
que do Hamas a 7 de outubro e ga-
rantir uma resposta humanitária
em Gaza, alvo dos bombardea-
mentos israelitas desde então. Mas
a explosão da véspera – que segun-
do os palestinianos fez pelo menos
471 mortos – pôs tudo em risco,
com os israelitas a serem de ime-
diato acusados pelos palestinianos
de serem os responsáveis.
Ainda antes de partir de Wa-
shington, Biden já sabia que a sua
viagem seria apenas a Telavive e já
não à Jordânia, onde inicialmente
BRENDAN SMIALOWSKI / AFP
estava prevista uma reunião com o
presidente da Autoridade Palesti-
niana, Mahmud Abbas, e com o lí-
der egípcio, Abdel Fattah al-Sisi. Os
palestinianos culparam Israel do
ataque ao hospital, com milhares
de pessoas a manifestarem-se em
várias cidades, desde Beirute à Cis-
jordânia, Sanaa ou Argel.
Ao chegar a Israel, Biden disse ter
ficado “profundamente entristeci-
do e indignado” com a explosão e
apontou o dedo aos palestinianos,
A Casa Branca explicou depois que
IBRAHIM AMRO / AFP
continuava a recolher informação,
mas que as primeiras indicações
dos serviços de informação norte-
-americanos afastam a responsa-
bilidade de Israel.
Ainda antes de Biden chegar, as
IDF tinham apresentado as suas
provas de que a explosão no hospi-
tal tinha sido causada por uma fa-
lha num rocket lançado pela Jihad
Islâmica Palestiniana. Esta organi-
zação, segundo um porta-voz das
IDF, disparou dez rockets na altura
do ataque (pelas 19.00 locais), ten-
do um deles caído de forma pre-
matura e atingido o parque de es-
tacionamento do hospital. A Jihad
Islâmica negou a responsabilidade,
insistindo em culpar Israel.
Os militares israelitas alegam
contudo que não efetuaram qual-
quer disparo que pudesse ter cau-
sado a explosão. Além do mais, ex-
plicam que um míssil teria deixado
uma cratera grande no local e mais
danos estruturais nos edifícios em
volta, mas as imagens do rescaldo
do ataque revelam apenas uma
zona queimada. O porta-voz das
IDF, contra-almirante Daniel Ha-
gari, disse que os danos são resul-
tado do combustível do rocket que
se incendiou após atingir o solo.
Os israelitas divulgaram também
imagens do que dizem ser o rocket
a ter problemas após o lançamen-
to e a cair, atingido o parque do
hospital. E um diálogo entre dois
alegados membros do Hamas,
com um deles a dizer que os des-
troços são de um rocket da Jihad Is-
lâmica e que este terá sido lançado
do cemitério ao lado do hospital.
As explicações não convence-
ram todos, havendo quem lem-
brasse que Israel tinha dado ordens
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
para a evacuação de 20 hospitais de
Gaza – um deles o Al-Ahli Arab – e
que este tinha sido alvo de ataques
israelitas ainda no fim de semana.
Ajuda humanitária
Apesar de Biden ter apoiado a ver-
são israelita, deixou também o avi-
so em relação à resposta ao ataque
terrorista do Hamas de 7 de outu-
bro, que causou mais de 1400 mor-
tos em Israel. “Desde que este ata-
que terrorista ocorreu, temos visto
ser descrito como o 11 de Setembro
de Israel. Mas para uma nação do
tamanho de Israel, foi como se fos-
sem 15 11 de Setembro”, disse Bi-
den, reiterando o apoio dos EUA
aos israelitas.
O presidente norte-americano
Netanyahu recebeu Biden
com um abraço (em cima).
Protestos (e violência como
no caso de Beirute, ao lado)
multiplicam-se.
falou do “choque”, da “dor” e da
“raiva” que os israelitas sentem por
aquilo que aconteceu. “Mas cuida-
do. Quando sentirem essa raiva,
não se deixem consumir por ela.
Depois do 11 de Setembro ficámos
furiosos nos EUA. E embora procu-
rássemos justiça e obtivéssemos
justiça, também cometemos er-
ros”, acrescentou Biden.
A resposta de Israel foi bombar-
dear a Faixa de Gaza, dar ordens
para que os palestinianos retiras-
sem do norte do território – em an-
tecipação de uma eventual incur-
são terrestre – e declarar um cerco
total, cortando a água e a luz. Pelo
menos 3200 palestinianos já terão
morrido nos ataques.
Biden conseguiu garantia de Is-
rael de que não iria travar a entrada
de ajuda humanitária na Faixa de
Gaza via Egito. “Tendo em conta o
pedido do presidente Biden, Israel
não irá impedir o fornecimento de
bens humanitários do Egito desde
que seja apenas comida, água e
medicamentos para a população
civil no sul da Faixa de Gaza”, indi-
cou o governo em comunicado,
sem indicar contudo a data em que
esta ajuda poderá começar a entrar
via a fronteira de Rafah.
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
EUA vetam resolução
Com Biden no terreno, os EUA ve-
taram uma resolução no Conselho
de Segurança das Nações Unidas
sobre o conflito. A moção, propos-
ta pelo Brasil (que atualmente pre-
side a este órgão), pedia uma pau-
sa nos bombardeamentos e corre-
dores humanitários para permitir
a entrada de ajuda, ao mesmo tem-
po que condenava “os crimes terro-
ristas hediondos do Hamas”.
A embaixadora dos EUA na
ONU, Linda Thomas-Greenfield,
justificou o veto dizendo que a re-
solução não reconhecia o direito de
Israel a defender-se, explicando
ainda que queria dar tempo a Bi-
den no terreno. A resolução teve o
apoio de 12 dos 15 membros do
Conselho de Segurança – Reino
Unido e Rússia (que tinha tentado,
sem sucesso, incluir um cessar-
-fogo duradouro e o fim dos ata-
ques indiscriminados por Israel)
abstiveram-se.
“O Conselho de Segurança da
ONU, que se tornou completa-
mente ineficaz, mais uma vez fa-
lhou no cumprimento da sua res-
ponsabilidade”, escreveu no Twit-
ter (rebatizado X) o presidente
turco, Recep Tayyip Erdogan. “Os
países ocidentais, que não deixam
pedra sobre pedra quando se trata
de direitos humanos e liberdades,
não tomaram nenhuma medida
além de colocar lenha na fogueira”,
concluiu.
susana.f.salvador@dn.pt
Crónica de Israel
DORA PIRES
Os futuros
israelitas
não combatem
Os alertas por objetos
suspeitos são muito
frequentes. Nos últimos dias
fiquei “refém” da segurança
israelita numa pastelaria,
num café e numa paragem
de metro ligeiro.
É coisa de meia dúzia de
minutos. Vem uma carrinha
com especialistas e rebenta
a mala ou nem precisa, usa
um robozinho e
rapidamente percebe que o
único crime ali cometido foi
o esquecimento.
Mesmo assim é sempre
levado a sério, todos se
lembram do tempo em que
os caixotes do lixo
rebentavam com bombas
de pregos e matavam
muitas pessoas.
Só os judeus ultraortodoxos
insistem em violar a regra
de distanciamento imposta
pela autoridade. Há sempre
alguns que avançavam,
provocadores mais do que
destemidos, a empurrar
carrinhos de bebé, com
bebés lá dentro. Como
quem diz “gente de pouca
fé, os que têm medo de
morrer”.
São pagos pelo Governo
para estudar a Torá e para
ter filhos – e cumprem
ambos os requisitos
escrupulosamente.
Rezam em todo o lado. Nos
transportes, encostados a
uma parede ou enquanto
caminham, de livro na mão.
Exibem a religião, a roupa
ancestral e o grande
número de filhos como
atributos superiores.
Mas não combatem. Um
acordo de décadas permite
aos ultraortodoxos não
fazerem o serviço militar,
obrigatório por lei para
todos os outros judeus a
partir dos 18 anos.
Muitos não acreditam no
Estado Israel e garantem
que o Messias ainda há de
vir.
Basta vê-los com seis, sete
filhos, em escadinha, para
perceber que, se nada
mudar, é deles o futuro de
Israel.
Alguém consegue imaginar
esse país?
Enviada especial do DN
e da TSF a Israel
À MARGEM
Israel ataca posições
do Hezbollah no Líbano
O Exército israelita atacou
ontem posições da milícia xiita
libanesa Hezbollah no sul do
Líbano, em resposta ao
lançamento de mísseis
antitanque, após 11 dias de
trocas de tiros na fronteira, que
vive o maior pico de tensão
desde 2006. Um dos mísseis
teleguiados do Hezbollah foi
lançado contra três posições
militares israelitas ao largo da
cidade libanesa de Naquora e o
outro contra a colina de al-
-Tahyat. Nesta última zona, os
alvos foram um “centro de
congregação para os soldados
da ocupação” e um sistema de
vigilância, disse a formação
xiita, alegando ter feito várias
vítimas nestes locais, incluindo
pelo menos uma morte.
Ameaças de bomba em
França, Bélgica e Argentina
O Palácio de Versalhes, oito
aeroportos franceses e um
belga foram ontem evacuados,
depois de receberem ameaças
de bomba. No caso de
Versalhes, foi a terceira vez
desde sábado. França está em
alerta máximo depois de um
professor ter morrido
esfaqueado, num ataque
terrorista. Além do palácio, as
ameaças de bomba obrigaram
a evacuar oito aeroportos
franceses e um belga. A Bélgica
também está em alerta, após o
ataque terrorista de segunda-
-feira. Na Argentina, também
houve ameaças de bomba, mas
contra as embaixadas de Israel
e dos EUA em Buenos Aires.
Mais luso-israelitas
mortos pelo Hamas
O primeiro-ministro, António
Costa, disse ontem na
Assembleia da República que
quatro cidadãos
lusodescendentes morreram
em Israel e que quatro estão
desaparecidos. Mas a
Comunidade Israelita do Porto
contabiliza, até ao momento,
nove luso-israelitas que
perderam a vida na sequência
do ataque de 7 de outubro
levado a cabo pelo Hamas,
identificando uma décima
vítima que estava em processo
de obter a nacionalidade. Há
ainda outros dois luso-israelitas
desaparecidos, sendo que um
terceiro está também no
processo de obter a
nacionalidade. Na nota, a
Comunidade Israelita do Porto
faz saber que “solicitou” ao
Presidente Marcelo Rebelo de
Sousa “para o Estado tudo fazer
no sentido de resgatar os
cidadãos portugueses
desaparecidos e, com certeza,
raptados pelo Hamas”.
Guerra na Terra Santa
– O ataque surpresa
I
srael sofreu um ataque inédi-
to na sua História, no passa-
do dia 7 de outubro. O grupo
terrorista Hamas entrou por
terra, ar e mar no seu território.
Não só conseguiu passar a fron-
teira, como matou vilas inteiras,
fez centenas de reféns, e os seus
militantes percorreram livremen-
te as ruas das cidades fronteiriças,
muito bem armados. A famosa
Cúpula de Ferro não conseguiu
impedir a chuva de rockets vindos
de Gaza. Considerado como o 11
de Setembro para Israel, a grande
pergunta é como tudo isto foi
possível acontecer num país que
tem à frente um primeiro-minis-
tro experiente, um general como
ministro da Defesa com larga ex-
periência de guerra com o Hamas
e o Hezbollah, um ministro da Se-
gurança Interna anteriormente
condenado por terrorismo contra
muçulmanos e um partido ul-
traortodoxo, o Shas, cujo líder
apelou à morte dos muçulmanos.
Terá sido distração? Menospre-
zaram o que a Mossad e as secre-
tas egípcias avisaram, convenci-
dos que iriam resolver facilmente
o assunto? Apesar de ser Sabbath,
dia de descanso semanal para os
judeus, e de se estar a celebrar a
Festa dos Tabernáculos, não esta-
riam a rezar com certeza! Esta co-
ligação ultraortodoxa, ultra nacio-
nalista de Extrema-Direita mos-
trou que não reza em serviço,
quando fizeram o ataque à mes-
quita de Al-Aqsa na semana da
Páscoa judaica, que este ano tam-
bém coincidiu com o Ramadão! A
Netanyahu dava-lhe jeito uma
pequena guerra com o Hamas
para sair vitorioso e calar a Oposi-
ção interna, e a internacional,
cansada da reforma judicial que
dá ao Governo plenos poderes no
parlamento, e para distrair as
atenções dos colonatos erguidos
incansavelmente na Cisjordânia.
Saiu-lhe o tiro pela culatra, e arris-
ca-se a ser julgado quando tudo
isto acabar, e os israelitas não lhe
vão perdoar tamanha incúria e
prepotência.
Para o Hamas a Operação Al-
-Aqsa está a ter resultados muito
para além do esperado. Não só
conseguiu afirmar-se perante to-
das as outras brigadas terroristas
17
Opinião
Maria João
Tomás
de Gaza e da Cisjordânia, como é
o líder da causa palestiniana. Es-
tranhou-se que durante nove me-
ses não se tenha insurgido, ou fei-
to pequenos ataques em Israel,
como retaliação do avanço dos
colonatos ou da alteração do Es-
tatuto dos Lugares Sagrados que
este Governo israelita tentou im-
plementar, ao reclamar que os ju-
deus também teriam direito a re-
zar na esplanada das mesquitas,
que circunda a mesquita de Al-
-Aqsa, a terceira mais sagrada
para o Islão. Imagine-se o contrá-
rio, e os muçulmanos quererem
rezar junto ao muro das lamenta-
ções?
Finalmente, os civis, as grandes
vítimas desta guerra.
Do lado de Israel, as centenas
que foram barbaramente mortas
às mãos dos militantes do Hamas
nas vilas fronteiriças com Gaza, e
os que estavam no festival de mú-
sica e foram levados como reféns
do grupo terrorista. Foram dupla-
mente vítimas, não só do Hamas,
mas também do seu Governo,
que não soube defender as fron-
teiras do seu país, nem proteger
os seus cidadãos. Aliás, os israeli-
tas desde janeiro que saem à rua
contestando as políticas desta co-
ligação de Netanyahu.
Do lado de Gaza, os palestinia-
nos prisioneiros do Hamas na
sua própria terra. A organização
da Irmandade Muçulmana, ins-
pirada na ideologia violenta de
Sayed Qutub, para além de man-
ter um regime opressivo, usa os
palestinianos como escudos hu-
manos, obrigando-os a guarda-
rem as armas nas garagens das
suas casas. Com a iminente en-
trada das forças de Israel em terri-
tório de Gaza, estão a impedir
que os palestinianos saiam de
suas casas, porque são importan-
tes peões na guerrilha urbana
que se avizinha. Os palestinianos
também vítimas de Netanyahu
que os mantém encurralados,
lhes cortou o acesso a bens bási-
cos de sobrevivência e os bom-
bardeia incansavelmente.
Esperam-se tempos muito difí-
ceis.
Professora do ISCTE-IUL
18 INTERNACIONAL
Majid Tafreshi
“Não vejo reação
alguma dos
Nobel da Paz
à questão
da Palestina”
IRÃO Novo embaixador da república islâmica
em Lisboa minimiza o facto de uma ativista
a cumprir pena de prisão ter sido distinguida
pelo Comité Norueguês. Sobre a guerra
declarada por Israel, diz que “o Hamas é Gaza”.
ENTREVISTA CÉSAR AVÓ
D
esignado embaixador em
Portugal em abril, Seyed
Majid Tafreshi chegou ao
país em julho e, por fim,
apresentou em setembro as cre-
denciais ao “Presidente Sousa”,
como se refere a Marcelo Rebelo de
Sousa. Tafreshi tem em comum
com o chefe de Estado português a
formação académica – ambos dou-
torados em Direito, o iraniano em
Direito Internacional. Vindo da
Nova Zelândia, no seu novo posto o
diplomata diz ter como objetivo
principal o desenvolvimento das
relações económicas entre os dois
países e, em nome da cooperação
económica, assegura que as buro-
cracias são tratadas com a maior
brevidade possível. Realça também
o facto de a maior parte dos 2 mil
iranianos a viver em Portugal serem
estudantes, muitos ao nível do dou-
toramento. A ambição em fazer a
diferença está à vista: “Desejo que
Portugal seja a base da nossa rela-
ção com a União Europeia.”
Há dias, a ativista Narges Mo-
hammadi, a cumprir pena de dez
anos de prisão, foi laureada com o
Nobel da Paz. Há 20 anos outra
mulher, Shirin Ebadi, recebeu o
mesmo prémio. Como é que o re-
gime pode acomodar as preten-
sões da juventude sem ser pela via
repressiva? Qual o papel da mu-
lher no futuro do Irão?
Antes de mais, regime não é uma
palavra bonita, diga antes governo.
Veja, respeito todos os cidadãos ira-
nianos. Primeiro, não se vê qualquer
reação dos laureados com o Nobel
da Paz, de Obama, e outros, ao pro-
blema da Palestina. Como é que
uma senhora pode estar na prisão e
todos os dias corresponder-se com
a comunidade internacional? Ela
[Mohammadi] tem acesso à inter-
net, tem acesso ao mundo livre. De-
pois, mostre-me um Prémio da Paz
de alguém que tenha tentado criar
alguma coisa na UE. Parece que
tudo na UE é ótimo. Sobre as senho-
ras, o que fizeram vai contra a lei. Se
vamos falar de senhoras iranianas,
veja quantas medalhas venceram
na semana passada nos Jogos Asiá-
ticos. A literacia para as mulheres
antes da revolução de 1979 era de
30/35%, agora é de 90/95%. E 60%
dos estudantes universitários são
mulheres. Como é que pode acusar
um país de impedir o desenvolvi-
mento das mulheres e investir tan-
to na sua educação? Claro que algu-
mas das questões relevam das tradi-
ções. Algumas mulheres querem ser
donas de casa, não podemos dizer
que elas têm de ir trabalhar. Aqueles
que apoiam aquelas mulheres [ati-
vistas] estão a introduzir sanções ile-
gais contra o país. Essas sanções pu-
nem toda a população sem discri-
minação. É claro que as pessoas têm
o direito a falar. Todos os dias há ma-
nifestações. Se for ao Irão não vai
encontrar uma única instituição
onde as mulheres estão impedidas
de entrar. Claro que há alguma limi-
tação quando vão nadar, devido aos
valores islâmicos. Sobre os direitos
humanos, não temos 25, temos 25
mil ONG.
O Irão combateu o Estado Islâmi-
co no Iraque e na Síria. No entanto,
o Irão é o grande patrocinador de
grupos considerados terroristas
pela UE, EUA e outros países,
como o Hezbollah e o Hamas. Ao
fazer um ataque, como o do dia 7, a
civis israelitas, inclusive muitos
deles a celebrar a paz num festival,
em que difere o Hamas do Estado
Islâmico?
O problema começou há 75 anos e
esta crise de identidade prossegue.
Precisamos de falar com base na lei
internacional. O Hezbollah tem de-
putados eleitos no parlamento liba-
nês. Como é que o podemos censu-
rar? Seria uma bofetada na cara de
centenas de milhares de eleitores
que o reconhecem e lhe dão o voto.
Sobre o Hamas, é isto que o nosso lí-
der diz: que toda a gente que foi for-
çada a sair da sua terra que regresse
e vote. Não é boa política censurar
uma pessoa ou um grupo de terro-
rista porque está a defender... per-
“O problema começou
há 75 anos e esta crise
de identidade
prossegue. Reconhecer
um grupo como
terrorista e focar
apenas nesse tema é
uma política falhada.”
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
trada na paz e na estabilidade. O
Irão tem sempre uma política de-
fensiva. A questão deve ser feita a
outros: vão aumentar a tensão? Vão
desencadear novas guerras no Mé-
dio Oriente? Deu-se um desenvolvi-
mento positivo na região, o Irão e a
Arábia Saudita restabeleceram as
relações bilaterais. O que procura-
mos para o Médio Oriente é a paz e
a segurança sob qualquer fórmula.
Os israelitas têm de compreender
que não têm outra opção que não
reconhecer a Palestina, reconhecer
a nação, e que não pode continuar o
abuso de poder.
Disse que é a favor de qualquer fór-
mula de paz. Admite o reconheci-
mento de Israel por parte do Irão em
troca de a Palestina se tornar num
país?
Para reconhecer Israel temos uma
grande linha à nossa frente. É muito
claro para nós que o reconhecimen-
to da comunidade internacional de-
pende do reconhecimento dos pa-
lestinianos. Se os palestinianos qui-
serem doar as suas terras, é com
eles. Mas nós não podemos falar em
nome dos palestinianos. A melhor
fórmula de paz é aquela em que os
refugiados regressam e participam
numa votação, numa votação que
REINALDO RODRIGUES / GLOBAL IMAGENS
não é exclusiva. É a melhor política
para se reconhecerem mutuamen-
te. Ao contrário das ações bárbaras
a que assistimos, nas quais se força
as pessoas a abandonarem o seu
país.
Como referiu, o Irão e Arábia Sau-
dita estão a retomar relações. Crê
que esta crise pode de alguma for-
ma afetar esse progresso?
A nossa relação com a Arábia Saudi-
ta é muito importante. É como duas
gunto: posso ocupar terras e basea- asas do mesmo pássaro no Médio
do na autodefesa não deixo fazer Oriente, dois dos países mais pode-
nada a quem está a lutar pelas terras rosos na região. Acreditamos que
que são consideradas ocupadas podemos ter um futuro melhor para
pela UE e estes são terroristas? Pre- a nossa próxima geração e para a
cisamos de ver que países são os for- economia da região. Queremos li-
necedores da defesa [de Israel]. Pre- vrar-nos de atores externos.
cisam de tensão. O terrorismo não Vários países, Ucrânia incluída,
tem fronteiras. Reconhecer um gru- acusam o Irão de ter fornecido
po como terrorista e focar apenas drones à Rússia, os quais estão a
nesse tema é uma política falhada. ser usados em ataques contra in-
Não conseguimos ver nenhuma fraestruturas e civis ucranianos.
manifestação em Gaza contra o Ha- Em que medida a imagem interna-
mas. Israel diz que vai erradicar o cional do Irão é afetada?
Hamas. Não existe tal direito, segun- O Irão e a Rússia têm laços de ami-
do a convenção de Genebra e nos zade e cooperação militar baseada
protocolos adicionais, porque se na lei internacional. Estão a exage-
trata de um grupo e de um Estado. rar, alguns drones foram enviados
Ao dizer que vai erradicar o Hamas, muito antes pelo nosso ministério.
Israel vai erradicar a população de Por que uma superpotência como a
Gaza. Hamas é Gaza, Hamas é Pa- Rússia precisa de uns quantos dro-
lestina. A proporcionalidade é mui- nes? Os europeus devem lembrar-
to importante. Como vamos ser -se do que foi o Iraque. Porque é que
bons vizinhos? Qual a necessidade precisam de uma aliança militar
de ter uma bomba atómica? Porque cada vez maior? Putin disse há mui-
não se junta aos países que assina- tos anos que a Rússia estará com a
ram um pacto a favor do Médio UE, não dentro da UE. Isto é claro. O
Oriente sem armas nucleares, como assunto é irrelevante. Nós não reco-
fez o Irão? nhecemos terras ocupadas. Como
Teerão deixou no ar a hipótese de
o conflito na região se expandir
podem acusar-nos e depois termos
as votações que tivemos na Assem-
caso a ofensiva terrestre de Israel bleia Geral da ONU?Volte-se ao erro
a Gaza se concretizar. O Irão pode- de cálculo da NATO e que a afetou.
rá entrar diretamente na guerra, Que país está fora da NATO e que
apesar das advertências dos EUA? mais lucrou com estas histórias?
A política do Irão está sempre cen- cesar.avo@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 19

BREVES

MDM pede Deputados falham

recontagem
dos votos
O presidente do Movimento
Democrático de Moçambique
(MDM), terceira força parla-
mentar, exigiu ontem que se
faça uma recontagem dos re-
sultados das sextas eleições
autárquicas em Moçambique,
afastamento de
presidente pró-UE
Os deputados do partido no
poder na Geórgia não conse-
guiram os votos suficientes
para afastar a presidente pró-
-Europa Salome Zurabishvili ,
depois de esta ter acusado o
Governo de prejudicar o pedi-

PEDRO PARDO / AFP

criticando a gestão feita pela
Comissão Nacional de Elei-
ções. Em causa estão as deci-
sões de anulação do escrutínio
de 11 de outubro por vários tri-
Presidente chinês lembrou já se ter encontrado com homólogo russo 42 vezes na última década. bunais distritais, que alegam
que o processo foi marcado
do de adesão da Geórgia à
União Europeia. Os deputados
do Sonho Georgiano obtive-
ram 86 dos 100 votos necessá-
rios para afastar Zurabishvili no
primeiro processo de impeach-
ment no país, que a Oposição

Xi recebe Putin com

por irregularidades, com des- boicotou. Na segunda-feira, o
taque para a falsificação de Tribunal Constitucional decre-
editais, no caso de Maputo. O tou que Zurabishvili violara a

tapete vermelho. Conflitos

escrutínio foi anulado em, pelo Constituição ao fazer viagens
menos, três pontos, havendo ao estrangeiro para fazer lóbi
outros recursos submetidos pela entrada da Geórgia na UE
por partidos de Oposição. sem autorização do Governo.

“reforçam cooperação” PUB

CHINA Numa das primeiras visitas desde invasão da Ucrânia, presidente

russo foi convidado de honra do 3.º Fórum da Nova Rota da Seda.

Empreitada para a Construção do Aumento

A
última visita de Vladimir
Putin a Pequim, no início
de fevereiro de 2022, an-
tecedeu, em três sema-
nas, uma invasão da Ucrânia que
parece ter apanhado a liderança
chinesa de surpresa. Mas tal não
impediu o presidente Xi Jinping de
ontem ter desenrolado o tapete
vermelho para receber o homólo-
go russo, convidado de honra da 3.ª
edição do Fórum da Nova Rota da
Seda.
Numa conferência de imprensa
pouco depois de um encontro bila-
teral de três horas no Palácio do
Povo, Putin garantiu que os confli-
tos que assolam o mundo “são
ameaças comuns que reforçam a
cooperação entre Rússia e China”.
Numa das suas primeiras deslo-
cações ao estrangeiros desde o iní-
cio da guerra na Ucrânia – e do man-
dado de captura emitido contra ele
pelo Tribunal Penal Internacional –,
Putin disse “olhar com otimismo” as
“perspetivas” de cooperação com o
aliado chinês, indispensável para
Moscovo num momento em que as
sanções ocidentais pesam sobre a
economia russa.
A China é o parceiro comercial
número um da Rússia, com um co-
mércio recorde de 190 mil milhões
de dólares no ano passado. Xi lem-
brou a meta de 200 mil milhões de
dólares estabelecida por ambos os
países este ano. Também defendeu
a Nova Rota da Seda, – oficialmen-
te Uma Faixa, Uma Rota – grande
projeto de infraestrutura promovi-
do por Pequim numa centena de
países, afirmando que “dará novo
impulso à economia mundial”.
“A confiança política mútua en-
tre os dois países está em constan-
te crescimento”, disse Xi ao seu alia-
do, segundo a agência oficial Xi-
nhua, no momento em que ambos
procuram apresentar uma frente
unida contra o Ocidente, liderado
pelos Estados Unidos.
Segundo a mesma agência noti-
ciosa, o presidente chinês pediu
aos dois países para “salvaguarda-
rem a equidade internacional” e a
Putin disse “olhar
com otimismo”
as “perspetivas”
de cooperação com
o aliado chinês,
indispensável
para Moscovo num
momento em que
as sanções ocidentais
pesam sobre
a economia russa.
“Justiça”, destacando a sua “coorde-
nação estratégica estreita e eficaz”.
Xi lembrou que se encontrou com
Putin 42 vezes na última década e
garantiu “ter desenvolvido uma
boa relação de trabalho e uma ami-
zade profunda” com o homólogo.
Mísseis americanos
“não mudarão nada”
Um dia depois de os EUA terem
confirmado a entrega à Ucrânia,
em segredo, de mísseis ATACMS
(Army Tactical Missile System), Pu-
tin veio garantir que estas armas
não afetarão o curso da guerra. “O
principal é que [estes mísseis] não
vão mudar radicalmente as coisas
na linha de contacto, é impossível”,
disse o presidente russo aos jorna-
listas no final da visita à China. “A
agonia da Ucrânia será prolonga-
da”, acrescentou, e considerou que
os EUA cometeram “um erro”.
Entretanto, no terreno, as autori-
dades ucranianas confirmaram
cinco mortos em ataques que tam-
bém causaram danos à rede elétri-
ca de Kharkiv.
Meses após o início da contrao-
fensiva ucraniana, Kiev garante
que as suas tropas estão a avançar,
mas o progresso é lento porque o
Ocidente não fornece armas sufi-
cientes. Para o Kremlin, o facto de a
Ucrânia não ter retomado mais do
que umas dezenas de quilómetros
quadrados desde que iniciou os
avanços, no passado mês de junho,
mostra que a operação falhou.
DN/LUSA/AFP
do Número de Vias do IC20 – Via Rápida da Caparica,
entre o Nó A2/IC20 e o Nó de Casas Velhas
A partir de 23 de outubro de 2023, por um período de 20 meses
A AEBT - Autoestradas do Baixo Tejo, S.A. informa que, a partir do próximo dia 23 de
outubro de 2023, e por um período de 20 meses, vai ter início a intervenção para a
Construção do Aumento do Número de Vias do Lanço IC20 – Via Rápida da Caparica,
entre o Nó A2/IC20 e o Nó de Casas Velhas.
Estes trabalhos, que advêm de uma obrigação contratual da AEBT, visam garantir as
condições de circulação e os níveis de serviço no lanço em causa, com reconhecidos
benefícios ao nível da segurança rodoviária.
Para execução da empreitada serão condicionadas as larguras das vias existentes e/ou
o número de vias disponíveis para circulação.
A AEBT tem consciência dos incómodos resultantes da obra numa via que está aberta à
circulação, mas está certa de que os possíveis incómodos serão largamente compensados
pelo nível de segurança que resulta de uma infraestrutura continuamente adaptada às
necessidades de quem a utiliza.
O Número de Assistência e Informação 210 730 300 está à disposição dos automobilistas,
para prestar as informações e os esclarecimentos que considerem necessários.
CENTRO HOSPITALAR DO OESTE, E.P.E.
AVISO
O Centro Hospitalar do Oeste, E.P.E., torna público, con-
forme Aviso publicado na sua página eletrónica no dia
19-10-2023, que se encontra aberto, pelo prazo de 10 dias
úteis, procedimento concursal para constituição de bolsa
de reserva de recrutamento de Técnicos Superiores do
Regime Geral, na área de Serviço Social, para celebração
de contrato nos termos do Código do Trabalho.
A Presidente do Conselho de Administração
EIsa Baião
20 INTERNACIONAL
A guerra do chocolate
D
irigidos pelos seus che-
fes digitais, os bolsona-
ristas de internet têm
opiniões simples e fortes
sobre qualquer tema. À primeira
complexidade, entretanto, caem
na mais completa exaustão men-
tal.
Exemplo recente: depois de de-
fenderem um dos lados com aque-
la certeza só ao alcance dos pobres
de espírito no conflito em Gaza,
cansaram-se de tanto mapa, de
tanto número, de tanto contexto,
de tanta história, de tanto anexo,
de tanta camada, de tanta chatice.
Na verdade, os bolsonaristas
gostam mesmo é de envolver-se,
com paixão infantil, num conflito
QUAL É A CONTRIBUIÇÃO DOS MUNICÍPIOS
PARA A SUSTENTABILIDADE DO PLANETA?
As respostas em mais uma edição
da revista Poder Local
Opinião
João Almeida Moreira
que tenha bons e maus muito bem
definidos na cabeça deles.
Encontraram um: “A guerra do
chocolate”.
O “mau” da “guerra do chocolate”
é Felipe Neto, influenciador digital
com 45 milhões de seguidores. Por
volta de 2015, Neto endeusava a
Lava Jato e demonizava Lula e to-
dos os demais “políticos tradicio-
nais” até, em 2018, ver um deputa-
do medíocre chegar ao Planalto de
mãos dadas com o juiz daquela
operação e perceber que enfiara um
barrete.
Após os quatro anos de retroces-
so económico, social, sanitário, in-
telectual e moral que se seguiram,
pediu desculpas pelas imaturida-
QUE DESAFIOS GLOBAIS
SE RESOLVEM
A NÍVEL LOCAL?
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
des do passado e passou a mirar em
Bolsonaro e no gado bolsonarista.
Como Neto se tornou, por estes
dias, o rosto de uma campanha do
chocolate Bis, os líderes de opinião
bolsonaristas no mundo digital de-
cidiram promover um boicote à
marca.
A hashtag #bisnuncamais passou
pelas redes sociais dos deputados
Nikolas Ferreira, conhecido por dis-
cursar de peruca para atacar a po-
pulação trans, André Fernandes,
condenado por acusar uma jorna-
lista de escrever notícias incómodas
para Bolsonaro em troca de sexo, ou
Carla Zambelli, famosa por andar a
correr pelas ruas de São Paulo de
arma em punho atrás de um eleitor
de Lula.
Bovinamente fiéis aos seus líderes
digitais, os bolsonaristas filmaram-
-se então nas redes sociais, o solo
fértil da imbecilidade, como ecoou
Tensos, cansados, o Umberto, a deitar centenas, mi-
lhares de embalagens de Bis no lixo
confusos, com aquela tal certeza só ao alcance
os bolsonaristas dos pobres de espírito. Estavam tão
certos, tão certos que talvez nem se
de internet jamais tenham apercebido de que com-
imaginariam que a prar mais Bis do que nunca para
deitar no lixo a seguir talvez não fi-
“guerra do chocolate” zesse sentido.
se tornaria tão difícil Foi nessa altura que os “maus”
contra-atacaram sob a forma de um
de entender vídeo debochado de Randolfe Ro-
como a de Gaza.” drigues, senador do PT. “Vindo da-
LEIA TUDO
em
poderlocal.dn.pt
queles que consumiam cloroquina
[remédio inútil contra a covid], o
boicote a um chocolate tão gostoso é
elogio! Assim como Felipe Neto, em
2022 o Brasil pediu Bis de tudo o que
nosso país já teve de bom: vacina no
braço, economia aquecida e comida
no prato. Agora falta só o Bolsa Bis
para o povo ficar feliz de novo!”
A contrarresposta coube a Carlos
Jordy, deputado bolsonarista cuja
principal credencial é ter tentado
associar Felipe Neto a um massacre
escolar com 10 mortos, em 2019:
sugeriu comprar KitKat, concor-
rente do Bis.
Mas quando tudo no cérebro sin-
gelo dos bolsonaristas de internet
voltava a fazer sentido – “vamos pa-
rar de comprar Bis para deitar fora a
seguir e comprar o concorrente“ –,
alguém se lembrou de reproduzir
nas redes sociais uma campanha re-
cente da KitKat, marca assumida-
mente progressista, a favor dos
LGBTQIA+, com direito a beijo gay
no meio do anúncio e tudo.
Tensos, cansados, confusos, os
bolsonaristas de internet jamais
imaginariam que a “guerra do cho-
colate” se tornaria tão difícil de en-
tender como a de Gaza. Mas estão
prontos para a próxima.
Jornalista,
correspondente em São Paulo
PUB
ACEDA AO SITE OFICIAL
PODER LOCAL
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
CARTOON E PASSATEMPOS 21

CARTOON POR MIGUEL AGUIAR

PALAVRAS CRUZADAS SUDOKU

Alalia. Alar.
Horizontais: 1. Grupo circular de ilhas de coral. Reprovação em exame (académico). 2. Peça Tanto. 9. Ovar. Portar. 10. Saciar. Pipa. 11.
metálica, espiralada, helicoidal, dotada de elasticidade. Que tem a forma de ovo invertido. 3. 6. Ror. Sol. Cor. 7. Ab. Casaca. 8. Pomar.
Desbastar saliências. Espécie de padiola para transporte de doentes. 4. Campesino. Olaria. Lata. 4. Lagar. Pilim. 5. Alisar. Da.
Especiaria indiana. 5. Dar as cores do arco-íris a. Suspiro. 6. Camareira. Sigla de «Save Our 1. Amar. Ampola. 2. Tofu. Imoral. 3.
Souls». Redução de para. 7. Milímetro (abreviatura). Céu da boca. 8. Dar lustre a. Peixe de água Verticais:
doce. 9. Verbal. Pequena vasilha para transporte de líquidos em viagem. 10. O ladrar dos cães. 11. Alamar. Orar.
Um dos conceituados símbolos da gastronomia espanhola. 11. Cordão de metal ou de requife Carpa. 9. Oral. Cantil. 10. Latido. Tapa.
que guarnece ou abotoa a frente do vestuário. Discursar. 6. Aia. SOS. Pra. 7. Mm. Palato. 8. Polir.
Afagar. Maca. 4. Rural. Caril. 5. Irisar. Ai.
Verticais: 1. Adorar. Reservatório pequeno de vidro. 2. Queijo de soja. Indecente. 3. Fábrica de 1. Atol. Raposa. 2. Mola. Oboval. 3.
louça de barro. Descaramento (familiar). 4. Tanque onde se espremem ou pisam certos frutos. Horizontais:
Dinheiro (gíria). 5. Aplanar. «De» + «a». 6. Grande porção (popular). Estrela. Opinião política Palavras Cruzadas
(figurado). 7. Prefixo (afastamento). Peça de vestuário de cerimónia para homem. 8. Arvoredo
frutífero. Tão numeroso. 9. Aclamar. Levar. 10. Fartar. Vasilha bojuda de madeira, menor do que SOLUÇÕES
o tonel, para líquidos. 11. Paralisia dos órgãos da fala. Levantar.

O que tem de novo o “novo” Diário de Notícias

O ESSENCIAL DA INFORMAÇÃO, TODOS OS DIAS EM BANCA
 Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
22 DESPORTO

Quando um ilhéu,
um aldeão e um
clube da distrital
enfrentam um
grande... isso é
Taça de Portugal
FESTA Desde 2015-16 que os 18 representantes da I Liga VILAR DE PERDIZES NO CLUBE DA ALDEIA CABEM
9 NACIONALIDADES E MUITA TRADIÇÃO FAMILIAR
estão obrigados a entrar em ação na 3.ª eliminatória
da prova na condição de visitantes. O sorteio ditou que
o FC Porto, vencedor das últimas duas edições, iniciasse FC PORTO Presidido por Márcio Rodrigues, um filho da terra que
a defesa do troféu diante do Vilar de Perdizes, emblema assumiu o clube em 2010 e com a ajuda da família o manteve de pé e
da aldeia mais mística do País, 6.º classificado da Série A o levou dos distritais até aos nacionais, o emblema transmontano quer
desfrutar da receção aos dragões em Chaves e da receita de bilheteira.
do Campeonato de Portugal, onde o azar também
é rentabilizado e a multiculturalidade é bem-vinda. O jogo
é amanhã, no Estádio Municipal de Chaves, dia em que

P
o Benfica, recordista de taças (26) joga no Estádio João Paulo II, ediram o FC Porto, o sorteio fez-lhes
casa dos açorianos do Lusitânia, também do 4.º escalão a vontade e eles festejaram. Enfren-
tar um grande do futebol português
do futebol português e que lideram a Série C. O Sporting era tudo o que o Vilar de Perdizes
podia pedir desportiva e financeiramente.
jogará no conforto da região, visitando o vizinho Olivais e Amanhã, como disse o treinadorVítor Gami-
Moscavide, dos distritais de Lisboa, no Estádio José Gomes to, “é preciso perder o respeito pelo adversá-
rio e dignificar as poucas possibilidades de
(Amadora), ainda com a memória da eliminação precoce vencer” o detentor da Taça de Portugal.
diante do Varzim, do 3.º escalão, em 2022. Será a primeira vez que o emblema do
Concelho de Montalegre, no Distrito de Vila
Real, irá defrontar uma equipa da I Liga.
Com um orçamento a rondar os 150 mil eu-
TEXTO ISAURA ALMEIDA ros, a maior parte da verba assumida pelo
município, o pequeno clube da aldeia com
cerca de 400 habitantes festeja um recorde
um grupo de amigos, o Vilar de Perdizes
nasceu com o nome da terra, onde orgu-
lhosamente se mantém apesar das dificul-
dades inerentes ao futebol amador e a uma
interioridade atroz e isoladora.
Atualmente, o Grupo Desportivo de Vilar
de Perdizes é presidido por Márcio Rodri-
gues (36 anos), um filho da terra que assu-
miu o clube em 2010 e com a ajuda da famí-
lia – a mulher é diretora na formação, o pai
faz parte da direção, o irmão é team mana-
ger e a mãe trata da lavandaria – o manteve
de pé e alavancou dos distritais até aos na-
cionais, onde milita no Campeonato de
Portugal pela primeira vez esta época. Em
2015-16 qualificou-se pela primeira vez

TAÇA DE PORTUGAL
CALENDÁRIO 3.ª ELIMINATÓRIA
DIA 19
Rebordosa-Sp. Braga
DIA 20
Lusitânia-Benfica
Sp. Covilhã-Portimonense
Vilar de Perdizes-FC Porto
DIA 21
Santa Clara-Vianense
Paredes-Moreirense
Nacional-Mirandela
Atlético-Vizela
Rabo de Peixe-Casa Pia
Atlético da Malveira-Marco 09
Leixões-Vit. Setúbal
Vila Meã-Estrela da Amadora
Felgueiras-Arouca 19.00 de bilheteira por antecipação – os bilhetes para a Taça de Portugal, prova que agora lhe
Ac. Viseu- U. Leiria 20.00 (Canal11) custam 10 euros! permite enfrentar os dragões.
Olivais e Moscavide-Sporting 20.45 (RTP1) O jogo é no Estádio Municipal Eng.º Ma- O clube tem apenas sete equipas – quatro
nuel Branco Teixeira, em Chaves, uma espé- delas de formação em futsal, além das se-
DIA 22 cie de segunda casa. É lá que jogam na con- niores masculina e feminina e futebol de
Sintrense-Estoril Praia 11.00 (Canal11) dição de visitados no Campeonato de Portu- onze. O futsal tem 170 atletas e dado mais
20.00 (SportTV1) Torreense-Rio Ave 14.00 (Canal11) gal e é na cidade, que dista 28 km da aldeia, alegrias do que o futebol. E até foi criado o
Canelas 2010-Desp.Chaves 15.00 que vivem quase todos os jogadores da equi- Troféu Padre Fontes, o sacerdote que colo-
Mafra-Feirense 15.00 pa, onde cabem nove nacionalidades (por- cou a aldeia no mapa com a Noite das Bru-
16.30 (SportTV1) Moncarapachense-Vit. Guimarães 15.00 tuguesa, colombiana, guineense, brasileira, xas (31 de outubro) e é uma das figuras mais
19:00 (Canal11) Länk Vilaverdense-Farense 15.00 norte-americana, tobaguenha, senegalesa, emblemáticas de Vilar de Perdizes. Foi ele
20.45 (RTP1) Dumiense-AVS 15.00 francesa e costamarfinense). O tobaguenho que tornou a aldeia conhecida a nível nacio-
Penafiel-Santa Maria 15:00 André Raymond chegou ao futebol portu- nal evocando bruxas, azares e jantares de
Marítimo-Mortágua 15.00 guês em 2019 para jogar no LänkVilaverden- sexta-feira 13.
12.00 Tondela-1.º de Dezembro 15.00 se, mas acabou por terras de Trás-os-Mon- Sexta classificada da Série A do Campeo-
14.00 (Canal11) Pêro Pinheiro-Serpa 15.00 tes à procura de mais minutos em campo. nato de Portugal, a equipa orientada por Ví-
15.00 Montalegre-Pevidém 15.00 Há também um ex-dragão no plantel. tor Gamito enfrenta agora o FC Porto de
15.00 Elvas-Tirsense 15.00 Marcelo Tadeu tem 22 anos e nasceu em Sérgio Conceição. Para o capitão Moreno,
15.00 (hora local) Amarante-Académica 15.00 Santos, no Brasil, onde começou a jogar fu- será um “sonho” tornado realidade para
16.30 Camacha-Famalicão 15.30 tebol. Chegou ao FC Porto com 14, mas nun- todo o grupo e por isso há que “desfrutar”
17.00 (Canal11) Belenenses-Gil Vicente 17.00 (Canal11) ca se chegou a afirmar. Passou ainda por Es- do momento, que para muitos será único
18.00 Oliveirense-Boavista 20.00 (SportTV1) panha e França, até chegar a Montalegre. na carreira.
Fundado após o 25 de Abril (1976) por isaura.almeida@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 23

OLIVAIS E MOSCAVIDE 111 ANOS A SER VIZINHO
DOS GRANDES DE LISBOA... E A SOBREVIVER
SPORTING Centenário emblema lisboeta tem histórico de ligação aos
leões, que já defrontaram na Taça de Portugal de 1995-96. Treinado por
Ricardo Barão, filho do ex-leão Barão, a equipa dos Distritais de Lisboa
vai receber os verdes e brancos em casa emprestada, na Reboleira.
LUSITÂNIA O SATÉLITE DO SPORTING QUE DEVE
O NOME A UM AVIÃO E QUE FORMOU MÁRIO LINO
BENFICA Clube açoriano fundado em 1922 recebe amanhã o campeão
no esgotado Estádio João Paulo II. Para manter a segurança foi preciso
contratar stewards fora da ilha. Capitão Rui Santos admite ansiedade,
mas quer surpreender o Benfica, que não ergue o troféu desde 2017.

A R
Freguesia dos Olivais pertence a
Lisboa, a de Moscavide a Loures.
Juntas dão nome ao emblema
centenário fundado em 1912. Há
111 anos que o Clube Desportivo dos Oli-
vais e Moscavide sobrevive à vizinhança de
dois grandes, o Benfica e o Sporting, o ad-
versário de sábado. A proximidade geográ-
fica com o emblema de Alvalade (7km) foi
benéfica para o clube dos Distritais de Lis-
boa, que ao longo dos anos recebeu vários
jogadores por empréstimo, casos de Miguel
Veloso, Pereirinha, Fábio Paim, Márcio San-
tos, Mauro Caramona, Duarte Machado,
Hugo Évora, Carlos e André Marques ou
Celestino.
As ligações aos verdes e brancos não se fi-
cam por aqui. O atual treinador, Ricardo
Barão, é filho de Francisco Barão, um histó-
rico dos leões, que venceu cinco títulos pelo
Sporting entre 1978 e 1982. O técnico ga-
rante que no sábado o pai é mais um adep-
to dos lingueirões e Francisco Barão confir-
ma, dizendo que vai ao estádio ver o jogo
com os dois netos e espera que a equipa do
filho dificulte a vida ao amigo Rúben Amo-
rim... com quem Ricardo tirou o curso de
treinador de II nível.
E pode dar-se o caso dos irmãos Marquês
se defrontarem. Pedro joga no Olivais e Ro-
drigo no Sporting B, tendo sido chamado
aos treinos de preparação do jogo da Taça
de Portugal durante esta semana.
O clube da distrital da Associação de Fu-
tebol de Lisboa já defrontou o Sporting na
Taça de Portugal em março de 1995 e aca-
bou goleado (6-1). Ficou a experiência de
quem enfrentou os leões com a camisola
dos lingueirões, casos de Hélder Guia, Me-
lo e Sequeira (autor do golo de honra), que
foram a um treino esta semana contar
como foi jogar com o Sporting da altura,
onde atuavam jogadores como Luís Figo,
Oceano, Carlos Xavier e Sá Pinto, e dar con-
selhos a quem agora volta a ter essa oportu-
nidade.
Devido à condicionante do sorteio que
estipula que os clubes da I Liga jogam fora
na 3. ª eliminatória, o Olivais e Moscavide
fez a festa mesmo sabendo que não pode-
ria receber os leões em casa. O jogo será na
Reboleira e os bilhetes custam entre 10 e 20
euros.
O presidente Gonçalo Candeias e os as-
sociados do clube queriam receber o vizi-
nho no Estádio Alfredo Marques Augusto,
em homenagem a “Alfredo Caganita”, que,
sendo funcionário da Câmara Municipal de
Lisboa, arranjou maneira de o clube grená
ter um campo com dignidade e que hoje
tem bancadas com 2730 lugares. Mas, as-
sim podem ver a receita quadruplicar à bo-
leia dos adeptos rivais, uma vez que o Está-
dio José Gomes tem capacidade para cerca
de 10 mil pessoas.
Afastados dos campeonatos profissio-
nais desde 2006-07, são uma das três equi-
pas dos Campeonatos Distritais ainda em
prova – as outras são o Atlético Clube da
Malveira e o Santa Maria.
Para além do futebol, a instituição de uti-
lidade pública da Zona Oriental de Lisboa
distingue-se na prática desportiva em di-
versos escalões do basquetebol e atividades
recreativas e socioculturais inerentes à vi-
vência citadina de um clube que se aguen-
ta de pé à 11 anos.
isaura.almeida@dn.pt
eceber o Campeão Nacional no
Estádio João Paulo II, a casa do Lu-
sitânia, na Ilha Terceira, nos Aço-
res, obrigou a horas e medidas ex-
traordinárias, segundo o presidente Luís
Carneiro, que teve de contratar assistentes
de recinto do continente para garantir a se-
gurança do jogo da 3.ª eliminatória da Taça
de Portugal. Apesar disso, espera honrar os
101 anos da história do clube satélite do
Sporting – é a delegação nº 14 . A receita de
cerca de 175 mil euros está garantida com
lotação esgotada. Serão sete mil nas banca-
das e cada um pagou 25 euros.
Fundado por um grupo de amigos que se
reuniam habitualmente na Sociedade Fi-
larmónica de Instrução e Recreio dos Artis-
tas e lhe deram o nome do avião “Lusitânia”,
em homenagem à travessia transatlântica
de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, tor-
nou-se um dos mais emblemáticos clubes
açorianos, sediado no palacete onde nas-
ceu e viveu a aristocrata Violante Canto, que
foi comprado em 1962 com a ajuda dos só-
cios e de alguns mecenas.
Foi o primeiro clube dos Açores a dispu-
tar um Campeonato Nacional em 1978-79.
Tal como o clube-mãe, o Sport Club Lusitâ-
nia sempre foi um emblema eclético, mas
as dificuldades financeiras levaram os res-
ponsáveis a abdicar do atletismo, ciclismo,
andebol e hóquei em patins, mantendo
apenas o futebol e reativando recentemen-
te o basquetebol – estão na I Divisão e já ga-
nharam uma Taça da Liga – e o futsal.
Foi no Lusitânia que Mário Lino jogou até
1958, quando se mudou para o Sporting,
onde venceu dois campeonatos, uma Taça
das Taças e uma Taça de Portugal. O primei-
ro açoriano a chegar à seleção (1961) foi ho-
menageado no ano passado, no centenário
do emblema açoriano, que orgulhosamen-
te se autointitula como “o Clube mais Cam-
peão dos Campeões Açorianos”, mostran-
do os mais de 500 troféus que tem no mu-
seu como prova disso.
Quando passou à 3.ª eliminatória da Taça
de Portugal, o técnico Ricardo Pessoa pediu
um grande e viu o desejo realizado no sor-
teio. A receção ao Sporting seria mais dese-
jada pela relação umbilical ao emblema de
Alvalade, mas defrontar o Benfica não é
menos importante. A equipa lidera a Série
C do Campeonato de Portugal e conta com
um ex-benfiquista no plantel – António Le-
gatheaux, médio que fez a formação nas
águias entre 2009 e 2013 – e a experiência de
Diogo Careca, que em 2016 defrontou o
Sporting na prova ao serviço do Praiense.
Apesar de já ter defrontado duas vezes o FC
Porto na Taça de Portugal, em 1973-74 (8-0) e
1979-80 (2-0) na condição de visitante, há
na ilha uma natural ansiedade com a pri-
meira receção a um grande do futebol por-
tuguês. O capitão tem esperança de poder
surpreender o campeão em título. “É claro
que há alguma ansiedade. Não é todos os
dias que se joga com o Benfica, mas esta-
mos a encarar com tranquilidade”, disse Rui
Santos, guarda-redes e único açoriano en-
tre os habituais titulares, sem medo de ver
pela frente Di María, Rafa ou Musa.
Será o segundo encontro do Benfica
para a Taça de Portugal nos Açores, onde
em setembro de 1957 venceu (2-0) o An-
grense, antes de golear os açorianos em
Lisboa (10-0).
isaura.almeida@dn.pt

24 CULTURA
Lily Gladstone,
a serenidade
vencedora.
Assassinos da Lua das Flores
A história viva segundo Scorsese
AMÉRICA Não se pedia mais do que Scorsese a ser Scorsese: Assassinos da Lua das Flores
responde a esse apelo enquanto põe os olhos na culpa americana, com robustez e
maturidade clássica.
TEXTO INÊS N. LOURENÇO
F
ace à presença assídua de
produções americanas nas
nossas salas, será que ain-
da usamos o termo “Holly-
wood” considerando a complexi-
dade do seu H maiúsculo? A pala-
vra vulgarizou-se, mirrou, perdeu
o seu toque de glória cruel, para se
transformar numa abstração
mais ou menos elástica, que serve
sobretudo para enquadrar os de-
mónios ou discursos salvíficos da
indústria cinematográfica. Vem
este pensamento solto a propósi-
to do novo filme de Martin Scor-
sese, que, na sua grandeza e coe-
rência autoral, parece trazer para
cima da mesa ferramentas que
permitem refletir sobre a Holly-
wood de hoje, sem ceder à ansie-
dade da cura de todos os males
com um só filme, e, acima de
tudo, sem deixar de usar o seu
próprio idioma (de cinema), ain-
da que integrando outro idioma
(no caso, literalmente, o dos ín-
dios Osage).
Assassinos da Lua das Flores,
que tem agora honras de sala es-
cura antes da estreia na platafor-
ma Apple TV+, vem com uma
aura de filme “corretivo” das prá-
ticas hollywoodescas, mas há
uma certa simplificação no tom
mediático. Já lá vamos. Scorsese,
ao adaptar o livro homónimo do
jornalista David Grann (editado
entre nós pela Quetzal), sobre os
assassinatos ocorridos no seio da
Nação Osage, no Oklahoma, em
plena década de 1920, deu cores e
rostos a um capítulo que concen-
tra algo da violência sobre a qual
se fundou a nação americana.
Uma violência que a filmografia
do realizador sempre perseguiu
como obsessão artística. Vejamos,
o que é que sintetiza a primeira
frase em off de Ray Liotta no filme
Tudo Bons Rapazes – “Desde que
me lembro, sempre quis ser um
gangster” – senão uma violência
de berço, inscrita no tecido cultu-
ral e levada ao extremo no corpo
dos atores?
Em Assassinos da Lua das Flores
essa violência anuncia-se com a
chegada de Ernest Burkhart (Leo-
nardo DiCaprio), um tipo meio
ingénuo, meio oportunista que
está a regressar aos Estados Uni-
dos, depois da Primeira Guerra
Mundial, na esperança de conse-
guir uma “orientação” do seu tio
plutocrata, William Hale (Robert
De Niro). Não sabemos bem quais
seriam as suas expectativas na-
quele Oklahoma onde os Osage
são os verdadeiros detentores da
riqueza (fruto da descoberta de
uma jazida de petróleo), mas o
que interessa é que o tio tem o es-
quema pronto antes de aconte-
cer: Ernest dará uma boleia a
Mollie (Lily Gladstone), nativa
que detém os direitos sobre os de-
pósitos petrolíferos nas suas ter-
ras, casar-se-á com ela e, assim, o
pobre diabo terá acesso à proprie-
dade. Isto ao mesmo tempo que a
família de Mollie e outros Osage
começam estranhamente a reve-
lar uma curta esperança média de
vida, ora por doença, ora por sui-
cídio.
Com o ressentimento escondi-
do nas costuras dos fatos impecá-
veis e numa aculturação artificial,
a personagem de De Niro é um
modelo de maleficência traqueja-
da. Alguém que exibe uma atitu-
de protetora do povo Osage ape-
nas para poder usar métodos de
aniquilação mais sofisticados,
como seja uma falsa insulina inje-
tada no corpo de Mollie, primeiro
por médicos e depois pelo pró-
prio marido... Este, por sua vez,
torna-se a mais envolvente con-
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
vertigem até ao último momento,
perante a nobreza infinita de
Mollie/Lily Gladstone.
Sem se comprometer com um
género em particular – o western,
o drama histórico ou o true crime
–, apesar de esta ser também uma
história do nascimento do FBI,
Scorsese percorre-os todos na
medida do seu próprio ecletismo,
enquanto cineasta de múltiplas
influências, capaz de remexer as
entranhas da América com um
abrangente toque clássico. A ro-
bustez de Assassinos da Lua das
Flores deve-se muito a esse classi-
cismo que reafirma o seu lugar
como “realizador de Hollywood”,
moldado pela cinefilia e pelo co-
nhecimento da própria história
do cinema americano.
O ponto é este: as visões sobre o
filme dividem-se entre um supos-
to politicamente correto, em rela-
ção à narrativa dos índios, e o fac-
to de o espectador conhecer este
universo pela perspetiva dos cri-
minosos. O que prova como As-
sassinos da Lua das Flores existe,
sobretudo, na qualidade de um
filme de Martin Scorsese, com um
sentido de profundo respeito pe-
los Osage (envolvidos na roda-
gem), mas nunca abdicando do
ponto de vista do homem branco
– lá está, o ponto de vista da vio-
lência. E é aí que cai o argumento
do politicamente correto. O reali-
zador não sacrificou a linguagem
visceral do homem americano
por uma perspetiva “justa”. Diga-
mos que o cinema não está na
tentativa de compensar falhas an-
tigas, mas na arte de observar a
história viva. Em entrevista ao The
Guardian, Scorsese sublinhou
mesmo que não se trata de um fil-
me “histórico”, porque “os efeitos
tradição dramática de Assassinos da tragédia ainda se sentem na
da Lua das Flores: somos levados comunidade”. No fundo, Assassi-
a acreditar nos seus genuínos sen- nos da Lua das Flores é Hollywood
timentos por Mollie, enquanto e a América a conviverem com as
testemunhamos a sua subjuga- suas feridas. O filme de um ci-
ção ao gangsterismo e uma inca- neasta maduro que faz o que bem
pacidade de interpretar rapida- entende, magnificamente, em
mente a realidade. DiCaprio dá- 206 minutos.
-lhe essa lentidão, ambiguidade e dnot@dn.pt
O mapa
das estrelas
JOÃO RUI PEDRO INÊS N.
LOPES TENDINHA LOURENÇO
ASSASSINOS DA LUA
DAS FLORES
NYAD
THE BURIAL
PÁTRIA
TRANSGRESSOR
NO RASTO DO ASSASSINO
OS TRÊS MOSQUETEIROS:
D’ARTAGNAN
NO VERÃO PASSADO
ESTRANHA FORMA DE VIDA
A SIBILA
Mau Medíocre Com interesse Bom Muito bom Excecional
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
A regra dramática
e a nova exceção
PLATAFORMAS The Burial é um filme pouco comum
na atual produção dos EUA: revisitando a história verídica
dos negócios perversos em torno de uma agência funerária,
a realizadora Maggie Betts redescobre a tradição
do cinema liberal de Hollywood.
TEXTO JOÃO LOPES
E N
is um pormenor: realizado por
Maggie Betts, The Burial é mais um
filme que surge diretamente numa
plataforma de streaming (Prime Vi-
deo) sem que os respetivos responsáveis
lhe atribuam um título português. O por-
menor é secundário, mas sintomático. Para
lá da banalidade das informações presta-
das na plataforma, tudo se passa como se o
marketing, com todos os seus meios técni-
cos e a sua inteligência social, não distin-
guisse um determinado filme de qualquer
outro… Aliás, a indiferença é tal que até
mesmo o facto de os intérpretes principais
– Jamie Foxx e Tommy Lee Jones – serem
personalidades previamente “oscarizadas”,
apesar de essa ser uma informação que
consta nas notas do Prime Video america-
no, não surge na respetiva “tradução” por-
tuguesa.
A ironia tem algo de amargo, já que esta-
mos perante um filme bem interessante.
Provavelmente, há três ou quatro décadas,
antes de terem nascido muitos dos profissio-
nais que, agora, concebem e colocam em
prática os valores dominantes do marketing,
contaminando todo o funcionamento do
mercado, The Burial (à letra: “O Enterro”),
ainda que não merecendo menosprezo, se-
ria encarado como um objeto mais ou me-
nos rotineiro. Agora, surge como uma curio-
sa, subtil e inteligente exceção.
Porquê? Porque já poucos arriscam fazer
um clássico drama de tribunal, não apenas
“copiando” uma matriz académica, mas sa-
bendo colocar em cena as muitas ramifica-
ções sociais e políticas que os seus elemen-
tos podem envolver – lembremos, justa-
Tommy Lee Jones e
Jamie Foxx: um drama
do Sul dos EUA.
mente, essa outra exceção que é Os 7 de
Chicago (2020), de Aaron Sorkin (Netflix).
Esta é a dramatização da história verídica
de Jeremiah O’Keefe (Tommy Lee Jones),
proprietário de uma agência funerária em
dificuldades financeiras. Quando o grupo
Loewen, uma poderosa rede de agências fu-
nerárias dos EUA, tenta comprar a sua em-
presa, O’Keefe e o advogado Willie E. Gary
(Jamie Foxx) irão expor a perversidade fi-
nanceira do potencial comprador e, sobre-
tudo, a prática, ao longo dos anos, de negó-
cios muito suspeitos…
Digamos, para simplificar, que tudo isto se
passa em meados da década de 1990, no Sul
dos EUA (Mississippi) e que as tensões so-
ciais, latentes ou explícitas, se refletem tam-
bém através do facto de O’Keefe, um bran-
co, ter como advogado um afro-america-
no… O que é tanto mais importante na
dinâmica narrativa de The Burial quanto o
filme está longe de se submeter às normas
do politicamente correto que condicionam
tantas produções atuais (muitas delas tam-
bém “perdidas” no streaming) – eis um ge-
nuíno drama legal com laços criativos com
a tradição liberal de Hollywood.
Vale a pena acrescentar que esta é a segun-
da longa-metragem de ficção de Maggie
Betts. A primeira, Noviciate, perturbante re-
trato da vida no interior de um convento de
freiras em meados da década de 1960, mar-
cada pelos ecos do Concílio Vaticano II, va-
leu-lhe um prémio de revelação no Festival
de Sundance de 2017 – consultamos as in-
formações que acompanham The Burial, fa-
zemos click no seu nome e descobrimos que
a sua ficha biográfica não existe…
Mergulhar com a
senhora Annette Bening
DRAMA A fórmula de superação num filme que é uma
prova de esforço: Nyad, de Elizabeth Chan Vasarhelyi e
Jimmy Chen, desperdício do talento de Annette Bening,
atriz que encarna a verdadeira e muito viva Nyad,
celebrada nadadora que nadou o impossível.
TEXTO RUI PEDRO TENDINHA
yad é o nome que a mitologia
grega dá às ninfas do mar. Nyad
é o nome da famosa maratonista
americana que aos 64 anos con-
seguiu nadar sozinha de Cuba até Florida
Keys e tornar-se na única pessoa no mun-
do a conseguir tal feito. Nyad é também o
nome deste filme “desportivo” previsível
como as regras de um feito humano raro. A
questão aqui é se esta mulher e o seu feito
e feitio (terrível, por sinal) davam um fil-
me? A resposta é que poderiam dar um
bom filme, coisa que a dupla Elizabeth
Chan Vasarhelyi e Jimmy Chen desbarata
quase por completo. Ficamos apenas com
uma fórmula de caso da vida, variante
“histórias verídicas que inspiram”, neste
caso em molde de homenagem a uma se-
nhora que desafiou a lógica e elevou a ex-
pressão “velhos são os trapos”. Aliás, mais
do que uma homenagem, uma espécie de
“promo” à atleta, entre o anónimo e o es-
pecial televisivo, ou não fosse o argumen-
to baseado na autobiografia da maratonis-
ta, Find a Way.
A nadadora recordista conseguiu a faça-
nha num período de quatro anos após vá-
rias tentativas e já depois de uma tentativa
falhada décadas antes. A história segue
essa odisseia, mas anda para trás para es-
miuçar a sua formação como campeã de
natação na infância, os traumas da separa-
ção dos pais e do abuso sexual do seu trei-
nador pedófilo. No centro dramático está
a forma como manteve a amizade com a
sua ex-namorada, Bonnie Stoll, que nesta
travessia impossível acabou por ser a sua
treinadora.
25
Impossível
não amarmos
aqui, de novo,
Annette Bening!
Apesar da dupla de realizadores, famosa
pelo documentário de proeza Free Solo, que-
rer convocar uma estética realista e uma lin-
guagem crua – na qual Annette Bening e o
seu corpo são um chavão operativo dessa
mesma declaração de valores –, há sempre
qualquer coisa de fórmula a não funcionar,
já para não mencionar os efeitos oníricos
que o estado de esgotamento da nadadora
sugerem, como o Taj Mahal no oceano ou as
miragens com restos de trauma. Enfim, efei-
tos psicológicos que ofendem e traem o tal
realismo pretendido. A forma como a falta de
subtileza no tratamento da mágoa sexual de
Nyad surge é de um mau gosto aflitivo.
No meio disto, sempre se poderá dizer que
sobra o talento de Annette Bening, imensa,
poderosa, como habitualmente. Correto,
mas não é ela quem salva o filme, apenas o
dignifica mais. A sua presença física e o
modo como expõe os sinais da idade, é uma
lição poderosa que Hollywood deveria
aprender. Uma interpretação que a coloca na
linha da frente na temporada dos prémios,
mesmo que nesta altura esteja difícil apostar
nela para os Óscares: Lily Gladstone, Emma
Stone, Carey Mulligan, Sandra Huller e Mar-
got Robbie estão com muito mais gás. Por in-
crível que pareça até Jodie Foster, na pele da
treinadora amiga, está mais perto de mais
uma nomeação como secundária, categoria
onde não há tanta concorrência...
O que de melhor se encontra nesta obra
que em breve já estará na Netflix é uma von-
tade de filmar a derrota e a vitória num mes-
mo plano. Isso é decente, mas a declinação
da soma dos clichés é que fica na cabeça do
espectador derrotado.
26 CULTURA
Amélia P. Hutchinson
“Quem ler esta tradução em inglês
vai descobrir que Fernão Lopes é
um dos maiores cronistas da Europa”
CRÓNICAS Investigadora integrada da Universidade Nova de Lisboa depois de uma carreira
académica em Inglaterra e nos Estados Unidos, a medievalista Amélia P. Hutchinson coordenou
com Teresa Amado o ambicioso projeto de edição que hoje é apresentado no Mosteiro da Batalha.
ENTREVISTA LEONÍDIO PAULO FERREIRA
Vai ser agora lançada em Portugal
aquela que é a primeira tradução
integral para inglês das Crónicas
de Fernão Lopes. Pergunto-lhe, é
a primeira tradução integral para
inglês ou é mesmo a primeira para
qualquer língua?
É a primeira tradução integral para
qualquer língua. A única que hou-
ve, de certa forma, anteriormente,
era para francês, mas só foi tradu-
zida a Crónica de Dom Pedro.
E as traduções que havia até agora
para inglês eram excertos?
Sim, eram excertos. Apareceram
alguns já há bastante tempo, de
certa forma ligados à expansão
portuguesa. Não totalmente, mas
nos Anos 80 houve uma seleção de
textos que foi publicada com o tí-
tulo The English in Portugal 1367-
-87. Foi traduzida por alguns cole-
gas nossos, ingleses, mas selecio-
naram os excertos que falavam
acerca da presença dos ingleses
em Portugal, como diz o título.
O que é que um estudioso, um
académico agora mundo fora –
porque o inglês é a língua franca
dos nossos dias –, pode tirar
destas Crónicas de Fernão Lopes?
É perceber a História de Portugal,
a História da Península Ibérica,
a própria História da Europa?
É tudo. Obviamente, dedica-se es-
sencialmente à História de Portu-
gal, mas Fernão Lopes também
transcreveu muitos eventos ou
acontecimentos que se desenvol-
veram em Castela, também em
Aragão, e que eram importantes
porque ele notava como a nossa
própria vida dependia dos acon-
tecimentos em Castela, precisa-
mente pelo jogo de dinastias e de
posse do poder. E também porque
durante a década de 1380 e tam-
bém na de 1370, portanto logo em
1373, há tropas britânicas que
vêm ajudar Portugal nas suas lutas
contra Castela e é interessante
porque Castela muitas das vezes
era auxiliada pelos franceses, o
que significa que nessa época em
que se estava a desenrolar a Guer-
ra dos 100 Anos, ela continuava a
desenvolver-se, agora em casa de
outros, que era o território ibérico
naquela altura.
Da sua experiência como
professora, tanto em universida-
des inglesas como americanas,
há interesse dos medievalistas e
de outros académicos por Fernão
Lopes?
Sim, notei isso, mas não no meu
campo de ensino, porque no es-
trangeiro o meu campo de ensino
era mais língua e cultura. Mas, por
exemplo, quando participava em
congressos internacionais, os
meus colegas ingleses e america-
nos tinham grande interesse, por-
que davam-se conta do que exis-
tia nas crónicas de Fernão Lopes,
mas não podiam citar diretamen-
te porque não tinham acesso ime-
diato à totalidade das crónicas.
Eles gostam de estar bem funda-
mentados, então havia um pedido
constante sempre que nos encon-
trávamos para se fazer uma tradu-
ção. E esta tradução integral vai
corresponder ao seu interesse.
Estas crónicas que chegaram
até aos nossos dias falam dos dois
últimos reis da primeira dinastia e
também de D. João I, fundador da
Dinastia de Avis. Além do valor
de testemunho histórico, há um
valor literário também em Fernão
Lopes?
Absolutamente. Fernão Lopes é
um escritor excelente, com uma
grande fineza de análise de perso-
nalidades, de situações que ele é
Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
capaz de transmitir, as suas descri-
ções são muito interessantes. Há
alguns académicos que acham
que ele tem uma qualidade cine-
matográfica, da forma como ele
muda de uma cena para a outra,
quando está a descrever aconteci-
mentos que são simultâneos, na
descrição das personalidades, da
forma como define as persona-
gens e, já nessa definição das per-
sonagens, dá uma ideia da forma
como as coisas vão decorrer, qual
é o seu papel, se o papel é positivo,
se é negativo. Portanto, tem um
manuseamento também da lín-
gua de uma forma muito fina.
Esse é um dos desafios da
tradução. É possível passar essa
qualidade literária, em português,
para uma tradução?
Nós tentámos. Difícil é, foi por isso
que, ao fazer, a tradução passou
por muitas revisões, há secções
que foram revistas umas sete ou
oito vezes.
Estamos a falar de um compromis-
so entre respeitar o estilo, mas
também tornar percetível para
o leitor da atualidade.
Absolutamente. E também quan-
do está a ser traduzido para inglês,
que é uma língua muito mais su-
cinta e mais direta, essa foi tam-
bém uma das preocupações: fazer
com que o texto não perdesse o
seu toque medieval, digamos as-
sim, mas ao mesmo tempo que
não fosse arcaico, que fosse lido
com grande facilidade, com gran-
de fluência, e que fosse aceite na-
turalmente dentro da língua in-
glesa.
Este é um projeto que já vem de há
mais de dez anos?
Foi completado em 12 anos.
Quem são os principais
financiadores?
Dos financiadores, o maior de to-
dos foi o National Endowment for
the Humanities, a maior institui-
ção de financiamento para a pes-
quisa académica nos Estados
Unidos. A seguir foi a nossa Dire-
ção-Geral do Livro, dos Arquivos
e das Bibliotecas, em Portugal. Ti-
vemos financiamento também da
FLAD e do instituto Camões. Nos
Estados Unidos tivemos igual-
mente um pequeno financia-
mento da Universidade da
Geórgia, do Wilson Center, e tam-
bém da Anglo-Portuguese So-
ciety, em Londres.
Falámos já da qualidade literária
de Fernão Lopes. Neste momento,
a escrita deste português do
“Dos financiadores século XV está disponível para
pessoas que sabem inglês,
desta tradução, portanto, muitas centenas de
o maior de todos foi milhões. O que é que vão
o National Endowment descobrir, além da História? Vão
descobrir um grande cronista?
for the Humanities, Vão descobrir que Fernão Lopes é
a maior instituição um dos maiores cronistas da Euro-
pa Ocidental, a par com os mais co-
de financiamento para nhecidos da época que escreveram
a pesquisa académica sobre este período, que são Pedro
López de Ayala, em Castela, e Jean
nos Estados Unidos.” Froissart, em língua francesa.
dnot@dn.pt
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 27

Do Super-Homem ao Garfield:
Amadora BD arranca hoje
Opinião LISBOA O evento vai decorrer até dia 29 de outubro com
Joaquim Ruivo a temática Clássicos Intemporais.

TEXTO MARIANA DE MELO GONÇALVES

The Chronicles
of Fernão Lopes
O
mundo da banda de-
senhada está de re-
gresso à Amadora

1
Basta uma passagem pelos
títulos das grandes e popu-
lares coleções editoriais,
como a célebre Que sais-je?
(Presses Universitaires de Fran-
ce), com mais de 4000 títulos,
ou a Very Short Introductions
(Oxford University Press), ou da
Cronista quase desconheci-
do fora de Portugal, no estudo e
conhecimento dos séc. XIV e
XV europeus, quando compa-
rado com Pedro López de Ayala
ou Jean Froissart, amplamente
traduzidos e citados, Fernão
Lopes ficou prisioneiro, até ao
para a 34ª edição do
festival Amadora BD. O evento
arranca amanhã e irá decorrer
até 29 de outubro.
Dedicado à temática Clássicos
Intemporais, o evento vai cele-
brar os aniversários de persona-
gens como Super-Homem, Tex,

TIAGO PETINGA / LUSA

mesma editora a coleção The
Oxford Companions, ou ainda a
coleção The New Cambridge
Companion (Cambridge Uni-
versity Press), para darmos
conta de como os temas relati-
vos à cultura portuguesa, ou à
História de Portugal, aparecem
tímidos e marginais. Chega a
ser confrangedor.
Em boa verdade não pode-
mos medir a importância da
presente, desse constrangi-
mento: o de só poder ser lido
em português. E as suas quali-
dades, tanto literárias, como
narrativas e até as que dizem
respeito à sua objetividade, na
preocupação que teve em veri-
ficar certos acontecimentos, fi-
caram sempre ofuscadas pelo
halo dos outros cronistas euro-
peus.
Mônica, Garfield, e vai albergar
um total de 14 exposições.
Esta edição do Amadora BD
encontra-se espalhada por vá-
rios espaços: do Ski Skate Ama-
dora Parque à galeria municipal
Artur Bual e ainda a Bedeteca da O festival vai passar pelo Ski Skate Parque, pela galeria Artur Bual
Amadora. Para além das exposi- e pela Bedeteca da Amadora.
ções, haverá uma zona de ga-
ming, sessões de autógrafos e a presença dos seus ilustradores cada aos 75 anos da personagem
uma área comercial. internacionais como Jon Bogda- Tex. Esta estará patente na Bede-
O Ski Skate Amadora Parque nove, Bob McLeod e Mick Gray. teca da Amadora e traz o dese-

nossa cultura e história a partir
dessa análise. Até porque, hoje
em dia, essas coleções de “livros
de bolso”, condensando temas e
pesquisas, também estão a ficar
ultrapassadas pelo acesso dire-
to e livre que a internet possibi-
lita. A investigação historiográ-
fica e os trabalhos dela resultan-
tes, a História de Portugal, a
literatura, a cultura portuguesa
em geral, já não são tão margi-
nais como se podia supor.
Ainda assim, podemos la-
mentar que dos clássicos, para
além de Camões, só Gil Vicente
tenha traduções em francês
graças ao trabalho de Paul Teys-
sier, a quem a nossa cultura
muito deve. Em inglês, só es-
parsas e avulsas traduções, sem
significado.
A nossa perplexidade pode
continuar quando, por exem-
plo, damos conta de que uma
das figuras maiores da ciência
europeia do seu tempo, o mate-
mático Pedro Nunes, só teve a
tradução das suas obras com-
pletas do latim para português
após 2002, nesse trabalho
exemplar coordenado pelo
professor Henrique Leitão.
3
O lançamento público
das suas crónicas tradu-
zidas para inglês em Por-
tugal, no Mosteiro da Batalha,
encontra a oportunidade e o lu-
gar ideais. Porque é Panteão
Régio de muitas das persona-
gens que viveram e marcaram
os tempos descritos pelo cro-
nista e porque é um monu-
mento que, para além de esta-
leiro de inovação artística e ar-
quitetónica, desde cedo se
tornou espaço de memória
dessa “nova geração de gentes”,
tão singularmente perceciona-
da nas crónicas de Fernão Lo-
pes.
Para além do mais, o lança-
mento das Chronicles of Fernão
Lopes, no contexto da realiza-
ção no Mosteiro, entre os dias
19 e 21, da importante IV Confe-
rência Internacional Arquitetu-
ras da Alma – Religious Heritage
(organização DINÂMIA’CET-
-Iscte – ISCTE-IUL | IEM –
NOVA FCSH | CHAIA – UÉVO-
RA | UCP – CEHR), é uma exce-
lente ocasião para proporcio-
nar a dezenas de investigadores
estrangeiros que participam na
conferência o encontro com
um dos maiores cronistas dos
acolhe a zona central desta 34ª
edição e conta com a presença
de 13 editoras. Terá ainda even-
tos de cosplay, realidade virtual,
e zona de gaming com videojo-
gos e consolas.
“Neste momento o Amado-
raBD é um festival com o que se
faz de melhor na banda dese-
nhada contemporânea, não só
em Portugal, como também no
estrangeiro. Temos vindo a con-
quistar um público mais vasto,
mais intergeracional, e é esse o
nosso objetivo também”, disse a
responsável pelo festival Catari-
na Valente, à Lusa.
Um dos destaques será a cele-
bração dos 85 anos do Super-Ho-
mem com uma exposição e com
Quando, de Manuel Alegre,
editado esta semana em Itália
POESIA A edição italiana do livro foi apresentada esta semana em Nápoles.
Q uando, livro de Manuel Ale-
Vão estar também presentes La-
wrence Klein, diretor do Museu
de Cartoon de Nova Iorque, e em
representação da chancela por-
tuguesa, Miguel Mendonça.
Maurício Sousa, o criador da
banda desenhada da Turma da
Mônica, está confirmado no fes-
tival para a celebração dos 60
anos da personagem criada em
1963 e que se tornou num ícone
de várias gerações.
Outra das exposições será de-
dicada à personagem Garfield,
onde serão exibidos os originais
de Jim Davis, o que irá permitir
aos visitantes acompanharem a
evolução da personagem.
Para juntar às celebrações , ha-
verá ainda uma exposição dedi-
cimentos como a Guerra Colo-
nhador italiano Marco Ghion a
Portugal.
O escritor galego Miguelanxo
Prado também marca presença
no festival e irá mostrar os seus
trabalhos originais como O Pac-
to da Letargia e Amani.
Haverá também espaço para a
primeira exposição individual
de Bernardo Majer, vencedor do
prémio da Melhor Obra de BD
de Autor Português nos Prémios
de Banda Desenhada da Ama-
dora em 2022.
Segundo Catarina Valente,
este festival é “dedicado a toda
as gerações de leitores”. A edição
anterior contou com certa de
15 000 a 20 000 visitantes.
Com AGÊNCIAS
cedora da obra do escritor portu-

2
E, por tudo isto, não pos-
so deixar de destacar,
noutro âmbito, um novo
e importante projeto editorial
que marca a nossa historiogra-
fia e a nossa cultura em geral: a
tradução para inglês das obras
de Fernão Lopes, com coorde-
nação da professora Amélia
Hutchinson e cuja ideia inicial
remonta a 2005.
seu tempo.
A edição das obras completas
de Fernão Lopes em inglês, e
para a qual a professora Amélia
Hutchinson se muniu de uma
equipa internacional de cola-
boradores, é, podemos dizê-lo,
um marco na nossa cultura.
Diretor do Mosteiro da Batalha
gre escrito e publicado em
2020 em plena pandemia, foi ago-
ra publicado em Itália pela edito-
ra Homo Scrivens e apresentado
esta terça-feira em Nápoles.
De acordo com a editora D.Qui-
xote, “Quando é um poema longo
com referências a Homero, Virgí-
lio, Dante, Camões e Shakespeare
e também Boby Dylan e Nelson
Mandela. E onde versam aconte-
nial, Estaline, o Maio de 1968 e a
América que vive das redes sociais
e dos tweets”. Em Portugal, a obra
venceu o Prémio Nacional de
Poesia António Ramos Rosa.
A apresentação da edição italia-
na de Quando – numa tradução
de Maria Luisa Cusati – decorreu
esta terça-feira em Nápoles, na li-
vraria Mondadori e contou com a
presença da tradutora – e conhe-
guês –, da jornalista italiana Armi-
da Parisi e do editor Aldo Putigna-
no. O lançameto do livro teve re-
percussões na imprensa napoli-
tana que adjetivaram o autor por-
tuguês de ”voz revolucionária da
poesia.”
Manuel Alegre é um autor a
quem a Universidade de Pádua,
também em Itália, criou uma cá-
tedra com o seu nome em 2009.
 Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
28 ESPECIAL

Do oriente para o ocidente:

A Jornada Marítima da Porcelana Chinesa
Ao mencionar a China, muitos naturalmente associam-na à porcelana. A palavra
“China”, em português, partilha a mesma grafia do termo em inglês. Algumas
pessoas acreditam que o vocábulo “China” teria origem na primeira dinastia
feudal unificada do país, a Qin, enquanto outros pensam que teria a ver com
a porcelana, e que o termo provém da cidade de Jingdezhen, na Província
de Jiangxi, mundialmente conhecida como a “Capital da Porcelana” que
era conhecida antigamente como Changnan, cuja pronúncia é muito
semelhante à palavra “china”. Talvez seja por isso que em inglês a porcelana
é designada por china ou chinaware.

Um prato da porcelana kraak

depositado no Museu de Macau.

A
o mencionar a China,
muitos naturalmente
associam-na à porcela-
na. A palavra “China”,
em português, partilha a mesma
grafia do termo em inglês. Algu-
mas pessoas acreditam que o vo-
cábulo “China” teria origem na
primeira dinastia feudal unifica-
da do país, a Qin, enquanto ou-
tros pensam que teria a ver com a
porcelana, e que o termo provém
da cidade de Jingdezhen, na Pro-
víncia de Jiangxi, mundialmente
conhecida como a “Capital da
Porcelana” que era conhecida
antigamente como Changnan,
cuja pronúncia é muito seme-
lhante à palavra “china”. Talvez
seja por isso que em inglês a por-
celana é designada por china ou
chinaware.
A China é a terra natal da porcela-
na. Há cerca de 4200 anos, surgiu a
cerâmica de céladon, cuja primei-
ra produção ocorreu durante a Di-
nastia Han Oriental (25-220 d.C.).
A Dinastia Tang (618-907 d.C.) re-
presentou o auge das dinastias chi-
nesas, com uma prosperidade cul-
tural e económica sem preceden-
tes. Foi neste período que surgiu a
“porcelana esmaltada policroma-
da em três cores “, uma cerâmica
famosa pela sua vivacidade de
tons. As cores do esmalte incluíam
o amarelo, verde, branco, casta-
nho, azul, preto, entre outras, mas
com predominância do amarelo,
verde e branco, razão pela qual é
nomeada por a “Porcelana de Três
Cores da Tang ”.
Durante as dinastias de Han e
Tang, o comércio terrestre pros-
perou com a Rota da Seda. Figu-
ras de comerciantes da Ásia Oci-
dental e camelos foram meticulo-
samente moldadas nas cerâmicas
de argila com a técnica de “ Três
Cores”, sendo testemunhas do es-
plendor da Rota da Seda Terrestre
naquela época. Mais tarde, na Di-
nastia Yuan (1271-1368 d.C.), as
histórias da China contadas por
Marco Polo reacenderam a curio-
sidade e o entusiasmo dos oci-
dentais pela China e pela sua por-
celana. Esta última, por sua vez,
apreciada como “ouro branco” na
Europa.
Devido à inexistência de uma rota
comercial direta com a distante
China, a porcelana chinesa era
uma raridade na Europa antes do
século XV, no entanto, a situação
foi alterada pelo navegador por-
tuguês Vasco da Gama. No ano de
1497, que corresponde ao oitavo
O Palácio de Santos, onde está
instalada a Embaixada
de França em Portugal tem um
teto piramidal com 267 pratos
da porcelana kraak da Dinastia
Ming.
ano do Reinado Xuan De da Di-
nastia Ming, Vasco da Gama em-
barcou numa viagem rumo à Ín-
dia e trouxe especiarias e peças de
porcelana de volta, atendendo ao
pedido do rei D. x Manuel I. Esta
iniciativa permitiu que a porcela-
na chinesa começasse a ser distri-
buída de forma contínua para ou-
tros países europeus via Portugal.
Em 1602, a Companhia das Índias
Orientais Holandesas apreendeu
no mar uma carraca mercante
portuguesa. O navio estava carre-
gado com uma grande quantida-
de de porcelana azul cobalto e
branca. Devido à falta do conhe-
cimento da proveniência das pe-
ças, os europeus designaram-nas
como “Porcelana kraak”.
A cerâmica azul cobalto e branca
é uma porcelana representativa
do pós-dinastias Yuan e Ming, ao
passo que as duas cores princi-
pais não são predominantes da
cultura tradicional chinesa, mas
sim originárias das regiões oci-
dentais da época: por exemplo, o
branco é a cor principal da civili-
zação islâmica, enquanto o azul
cobalto se trata duma cor venera-
da na cultura da Mesopotâmica.
Além disso, muitas das estruturas
e formas das cerâmicas derivam
do nomadismo árabe. A fim de
tornar as cores das peças artesa-
nais mais intensas, durante as
viagens marítimas de Zheng He,
foram realizadas visitas específi-
cas à Pérsia (atuais áreas costeiras
do Iraque e Irão) para adquirir os
pigmentos necessários à produ-
ção de cerâmica azul cobalto e
branca.
A porcelana chinesa não só serve
para decoração,
como também
é uma peça de
arte que simbo-
liza o cúmulo da
cultura tradicional
chinesa e personifica
a quintessência artísti-
ca do país. Graças às ro-
tas terrestre e marítima da
seda, e ao espí-
rito explorató-
rio dos portu-
gueses na Era
dos Descobri-
mentos, a por-
celana chinesa
espalhou-se
pelo mundo e
tornou-se um símbolo de sofisti- Uma peça da “Porcelana de Três
cação e elegância. A jornada da Cores da Tang ” depositada no
porcelana chinesa do oriente para Museu de Xi’an, na Província de
o ocidente contribuiu não apenas Shaanxi, China.
para as trocas comerciais entre a
China e o resto do mundo, mas conjunta da “Faixa Económica
também para os intercâmbios e a das Rotas da Seda” e a” Rota Ma-
aprendizagem mútua entre civili- rítima da Seda do Século XXI” (a
zações. Mesmo atualmente, a in- iniciativa “Faixa e Rota”), que se
fluência da porcelana chinesa tem tornado cada vez mais co-
pode ser vista em diversos aspetos nhecida globalmente como a
da cultura portuguesa. Tanto nos continuação e exaltação das anti-
painéis de azulejos, quanto nas gas Rotas da Seda e tem como ob-
porcelanas Vista Alegre, é possível jetivo promover a cooperação
identificar semelhanças evidentes amigável e mutuamente benéfi-
com a porcelana chinesa. ca entre a China e o resto do
mundo, bem como o desenvolvi-
A porcelana chinesa é um símbo- mento e prosperidade comum da
lo da prosperidade das antigas humanidade.
Rotas da Seda, que tiveram um
papel fundamental no desenvol-
vimento e progresso da socieda-
de humana através das trocas co-
merciais e intercâmbios culturais.
Hoje em dia, a China, baseada no
espírito das antigas Rotas da
Seda, tem promovido a iniciativa INICIATIVA DO MACAO DAILY NEWS
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023
O chocolate invade o Mundo
do Vinho por quatro dias
GAIA Entre hoje e domingo, há dezenas de marcas para degustar e comprar,
15 showcookings e 11 workshops para acompanhar. Tudo com e sobre chocolate.
É a 2.ª edição europeia do Festival Internacional do Chocolate e do Cacau, que
acontece no WOW.
TEXTO SOFIA FONSECA
H
á degustações, showcookings,
esculturas, palestras, concer-
tos e workshops. Tudo com ou
à volta do chocolate. Nos pró-
ximos quatro dias, o WOW – The World of
Wine, em Vila Nova de Gaia, é invadido
por esta iguaria na 2.ª edição europeia do
Festival Internacional do Chocolate e do
Cacau, por onde, no ano passado, passa-
ram cerca de 50 mil pessoas.
A entrada é gratuita e a chuva pode ser
a desculpa ideal – se é que precisava de
alguma – para ir até ao quarteirão cultu-
ral das renovadas caves do Vinho do Por-
to de Gaia até domingo para se deliciar e
apreciar algumas novidades, várias de-
las com sabores bem inusitados, provar
alguns dos melhores chocolates do
mundo e aprender um pouco mais so-
bre este alimento.
O chocolate 65% de cacau com caipi-
rinha da Baianí é um dos destaques do
evento. Os fãs de chocolate com álcool
terão ainda as barras com 72% de cacau
com cachaça envelhecida em tonéis de
amburana e com hidromel, produzidos
pela Mestiço. Para os apreciadores de
cerveja, a Natucoa traz duas versões com
base de cacau: Mel de Cacau e Nibs de
Rapadura. Para quem gosta de chocola-
te com frutas, o festival apresenta mistu-
ras com jaca, framboesa e raspas de li-
mão, entre outras.
“O Chocolat Portugal é uma celebra-
ção que transcende fronteiras e culturas,
e vai unir os amantes do chocolate de
todo o mundo em torno de uma paixão
compartilhada”, garante Marco Lessa,
criador do festival, que, em termos inter-
nacionais, vai já na sua 33.ª edição. Na
Europa, nomeadamente em Gaia, vai na
segunda e o objetivo é claro: criar a co-
nexão direta entre todos os elos da ca-
deia produtiva do chocolate, da origem
ao consumidor final. “O festi-
val fortalece a cultura e o
trabalho por trás do ‘fru-
to de ouro’ ou ‘alimento
dos deuses’, como o ca-
cau também é conhe-
cido, expandindo o co-
nhecimento sobre as
delícias derivadas do
cacau e promovendo
Caves do Vinho do Porto de Gaia vão
receber festival durante quatro dias.
as marcas de origem, as pequenas in-
dústrias, o agronegócio, o turismo, os
benefícios para a saúde e a gastrono-
mia”, defende o organizador.
Nos showcokings vão marcar presen-
ça nomes incontornáveis do mundo dos
chocolates, nomeadamente o espanhol
Iván Pascual, chef pasteleiro Campeão
do Mundo nos World Chocolate Masters
2018; Francisco Siopa, chef-executivo de
pastelaria do Penha Longa Resort; e ain-
da Ricardo Costa, chef-executivo dos res-
taurantes do Yeatman Hotel.
O evento conta ainda com
chefs a fazer esculturas
de chocolate ao vivo, e uma Chocola-
tland para os mais novos que inclui um
bilhete para explorar o mundo do Cho-
colate Story, acesso à Cozinha Kids e en-
trada na zona de diversões (20).
O Terroir, essa palavra que costuma-
mos associar ao vinho, mas que também
se aplica ao chocolate (além do café), é
destaque desta edição. “A definição de
terroir e o sentimento de pertença” é o
tema que dá o mote a várias palestras
com especialistas no assunto.
VIVER 29
Novidades que tem
de experimentar
GLAD. Nova marca de chocolates vegan
Abriu recentemente no Porto, na zona
da Boavista, a loja Glad, marca de
chocolates vegan de Katrin e
Marcella Cavalcanti. Com uma
gama composta por tabletes,
nibs e até infusões, as irmãs que-
rem mostrar o verdadeiro sabor
do cacau, recorrendo a métodos
sustentáveis e através de criações ge-
nuínas.
A Gama Single Origin inclui três tabletes feitas com 70%
de cacau, todas homónimas dos três países produtores
de cacau trabalhados pela marca. O chocolate Equa-
dor tem um toque de frutos secos; o chocolate Mada-
gáscar permite um final de boca marcado por frutos ver-
melhos e cítricos; já o chocolate Nicarágua incorpora
um perfil mais complexo, feito a partir de notas florais e
de iogurte. A Gama Inclusions é composta por quatro
tabletes que harmonizam diferentes sabores, aromas,
texturas e crocâncias, graças à combinação de ingre-
dientes como a flor de sal do Algarve, as amêndoas alen-
tejanas torradas, as framboesas, o café ou a aveia.
No primeiro sábado de cada mês, clientes e curiosos
podem ainda confecionar, personalizar e embalar os
seus próprios chocolates num workshop orientado pe-
las responsáveis da marca por 25€ por pessoa.
Arts da The Chocolate by Penha Longa
A marca de chocolates artesanais do
Penha Longa Resort, em Sintra,
lançou recentemente a nova co-
leção de chocolates para a esta-
ção de Outono/Inverno 2023.
Criada por Francisco Siopa,
chef-executivo de pastelaria do
Penha Longa Resort, e a sua sub-
-chef Inês Freitas, a coleção Arts é uma
homenagem às artes. Há seis novos bombons (2€ a uni-
dade; 12€ a caixa de seis), cada um deles aludindo a uma
forma de expressão artística. A Viagem de Chihiro re-
mete para o cinema; o Milky Way, em honra de Alberto
Caeiro, para a poesia; Penha Longa Forest para a Arqui-
tetura; o New York para a Música, mais precisamente
para Frank Sinatra; o Pollock para a Pintura; e o Gold para
a Escultura.
A dupla concebeu ainda três sobremesas (10€
cada): o Strawberry Saturn, o Crois-
sant au Chocolat e a Margarida.
 Quinta-feira 19/10/2023 Diário de Notícias
30 ACONTECEU EM

O DN
DE HÁ CEM
ANOS

AS NOTÍCIAS
DE 19 DE OUTUBRO

DE 1923
PARA LER HOJE
ARQUIVO DN CRISTINA CAVACO, LUÍS MATIAS E SARA GUERRA
EDIÇÃO DE IMAGEM RAFAEL COSTA
Diário de Notícias Quinta-feira 19/10/2023 31

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ÚLTIMA
BREVES
Três detidos Um GNR demitido e sete
em Lisboa numa PSP suspensos em 2022
manifestação
Um militar da GNR foi demitido e sete
pela Palestina elementos da PSP foram suspensos de serviço
Três pessoas foram ontem em 2022, num total de 14 penas aplicadas aos
detidas na praça do Martim polícias pelo ministro da Administração
Moniz, em Lisboa, na Interna, segundo dados da Inspeção-Geral da
sequência de uma Administração Interna (IGAI). Este organismo
manifestação que juntou precisa que foi aplicada a pena de “separação
centenas de pessoas com de serviço” a um militar da GNR, que segundo
bandeiras da Palestina e o regulamento de disciplina desta
cartazes a pedir o fim da corporação, significa “afastamento definitivo
escalada de violência na da Guarda, com extinção do vínculo funcional
Faixa de Gaza. Os à mesma e a perda da qualidade de militar,
manifestantes gritaram ficando interdito o uso de uniforme,
palavras de ordem contra distintivos e insígnias militares, sem prejuízo
Israel e os seus do direito à pensão de reforma”. A IGAI
bombardeamentos, que especifica ainda que sete polícias da PSP

RODRIGO ANTUNES/LUSA
começaram depois de o foram suspensos e seis elementos do SEF
país ter sido atacado, no dia foram alvo de penas no ano passado, três dos
7, por membros do Hamas, quais suspensos, dois com multa e um com
que mataram mais de 1400 uma repreensão escrita. O ministro da
pessoas, num ataque Administração Interna decidiu arquivar 34
terrorista que fez centenas processos disciplinares em 2022, sendo sete
de reféns. referentes militares da GNR, 23 a polícias da
PSP e quatro a elementos do SEF. Os dados
agora publicados mostram ainda que a IGAI
instaurou no ano passado 53 processos
disciplinares para apuramento de

Tráfico humano. “Denunciar circunstâncias de atos praticados por

elementos das forças e serviços de
segurança, a que se juntaram os 73
transitados de anos anteriores.

é contributo de cidadania” Fernando Daniel, Calum

COLABORAÇÃO Sindicato de Jogadores e PJ unidos no combate ao “roubo de Scott e Jão no Rock in Rio
sonhos” no futebol. Luís Neves diz que efetivos do SEF serão reforço importante.
Fernando Daniel, Calum Scott e Jão vão juntar-
-se a Ed Sheeran no segundo dia do Rock in Rio
2024, no palco mundo, a 16 de junho. O
TEXTO ISAURA ALMEIDA britânico Calum Scott, que se tornou
conhecido pela música Dancing On My Own no
programa de televisão Britain’s Got Talent e pela

O
Sindicato de Jogadores Pro-
fissionais de Futebol (SJPF) e
a Polícia Judiciária (PJ) uni-
ram-se no combate ao tráfi-
co humano no futebol. Ontem, na con-
ferência intitulada Tráfico Humano é
Crime, para assinalar o dia europeu do
combate ao tráfico humano, Joaquim
Evangelista e Luís Neves quiseram pas-
sar uma mensagem de tolerância zero
ao “roubo de sonhos”.
O diretor da Policia Judiciária come-
çou por lembrar que a PJ “nunca apos-
tou definitivamente na investigação”
deste tipo de crime porque “nem se-
quer tinha acesso às bases de dados” do
Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
(SEF). E que a partir de dia 1 de novem-
bro, com a integração na polícia crimi-
nal de 750 pessoas do SEF a luta será
mais eficaz. “As vítimas de tráfico não
falam porque vivem petrificadas pelo
medo. Não podem denunciar. Isto é vá-
lido aqui, como é válido no match-fi-
xing, na manipulação desportiva, no
assédio... Porque não há propriamen-
te uma vítima. A polícia não é nenhum
papão, a polícia precisa de ser informa-
da. Toda a gente pode falar connosco.
Quem fala e denuncia não pode ser
considerado um bufo, mas visto como
um contributo de cidadania. Com os
reforços do SEF teremos uma institui-
ção forte e robusta. Temos obrigação
de dar resposta às vítimas, temos de as
libertar de quem lhes rouba o sonho de
ser jogador de futebol”, disse ontem
Luís Neves.
Segundo dados enviados pelo SEF ao
DN em junho, nos últimos cinco anos
(2018-2022), o tráfico de seres huma- sua canção original You Are The Reason, está
nos, exploração e apoio a imigração ile- assim de regresso a Portugal. A ele junta-se
gal fez cerca de 260 vítimas. também o cantor brasileiro Jão, que vai
Ciente de que o “crime anda sempre apresentar os seus êxitos Imaturo e Coringa.
à frente de quem o combate”, Joaquim Fernando Daniel foi entretanto a primeira
Evangelista lamentou “a má vontade confirmação portuguesa da edição de 2024 do
das associações distritais e dos municí- Rock in Rio, onde volta após cinco anos com os
pios” esse combate e mostrou-se revol- seus sucessos Nada Mais e Tal Como Sou.
tando por ver jogadores, ex-jogadores Agora que já são conhecidas as estrelas que
e treinadores envolvidos no que consi- vão atuar no segundo dia do festival – com o
derou ser um “flagelo” de dimensão na- britânico Ed Sheeran como cabeça de cartaz –,
cional. E apelou a um Estado mais in- serão colocados à venda a partir de amanhã os
tervencionista e a jogar por antecipa- passes de fim de semana, que custam 147
ção e em defesa da vítima. Por isso o euros e têm um stock limitado, mas também os
líder do Sindicato propõe a elaboração ingressos VIP diários, de 340 euros, que ficam
de “um manual de entrada e acolhi- disponíveis nas lojas Worten e no site oficial do
mento dos jogadores estrangeiros em Rock in Rio. O festival, que decorrerá nos dias
Portugal” e a criação de uma platafor- 15, 16, 22 e 23 de junho, vai celebrar 20 anos,
ma online para denunciar e sinalizar que vão ser marcados pela nova localização, no
estes casos.” Parque Tejo Lisboa.

Conselho de Administração Marco Belo Galinha (Presidente),José Paulo Tição de Freitas Fernandes Fafe, Paulo César Martins Lima de Carvalho, Filipe Miguel da Cruz
e Queirós Nascimento, Diogo Miguel Risueño da Cruz Agostinho, António Manuel Mendes Ferreira, Victor Manuel Almeida Santos de Menezes, Kevin King Lun Ho
Secretário-geral Afonso Camões Diretor interino Leonídio Paulo Ferreira Subdiretor Bruno Contreiras Mateus Data Protection Officer António Santos
Propriedade Global Notícias Media Group, SA; Matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada. Capital social: 9 309 016,95 euros. NIPC: 502535369. Proprietário
e editor: Rua Gonçalo Cristóvão,195-219 – 4049-011 Porto. Tel.: 222 096 100. Fax: 222 096 200 Redação: Rua Tomás da Fonseca, Torre E, 3.º – 1600-209 Lisboa.
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da empresa: Páginas Civilizadas, Lda. – 41,51%, KNJ Global Holdings Limited – 29,35%, José Pedro Carvalho Reis Soeiro – 20,40%, Grandes Notícias, Lda. – 8,74% Impressão
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