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CURITIBA
2020
FERNANDA PEREIRA CORRÊA DA SILVA
CURITIBA
2020
Em memória de meu querido pai, Joaquim, que
mesmo após a partida desta vida se faz presente
através da minha busca pelo conhecimento.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho de conclusão de curso possui como objetivo analisar como as marcas
Natura e Boticário articulam cor, tipografia, forma e textura para realizar distinção de
gênero. Produtos de higiene, de beleza e perfumes são artefatos presentes no dia a
dia dos indivíduos, e suas visualidades acompanham a construção de significados
sobre a expressão de cada um. Analisando frascos de perfumes das marcas Natura
e Boticário, o trabalho expõe a importância da cultura visual na formação de
artefatos inclusivos. As marcas foram escolhidas por serem amplamente divulgadas
e acessíveis. Sob a luz das teorias feministas e das teorias de gênero, o trabalho
articula que o conceito de gênero difere do sexo biológico, como as percepções
tradicionalistas postulam. Construção social, o gênero não é um fator associado à
materialidade. Ele se refere à percepção individual do ser e de suas expressões. A
partir dessa perspectiva, utiliza-se da leitura visual e da Gestalt para avaliar a
estrutura formal das embalagens. Com a análise de conteúdo, é possível desvelar o
discurso por trás das mensagens semânticas que ditam feminilidades e
masculinidades. Foram realizadas entrevistas qualitativas com o intuito de verificar o
repertório, as associações de significados às visualidades e o entendimento dos
usuários sobre gênero. A partir da perspectiva da cultura visual, é possível articular
as teorias e contextos, compreendendo o papel do designer na quebra do discurso
hegemônico. As análises formais revelam a articulação de matiz, saturação e valor
das cores, os aspectos de sensação visual de toque, as formas empregadas e a
anatomia das fontes presentes nas embalagens. As duas marcas utilizam esses
aspectos de maneira tradicionalista, reforçando em seus textos descritivos dos
portais a associação com adjetivos e comportamentos esperados. A percepção dos
entrevistados revela que essas significâncias estão engendradas no repertório da
sociedade, e que a aplicação de estereótipos como resumo de um público diverso
culmina na exclusão daqueles que não se identificam com a visão conservadora de
feminino e masculino. Além disso, a disseminação desses produtos e suas imagens
nos meios digitais repercute alterando a percepção do indivíduo sobre si e de seus
comportamentos, trabalhando como próteses de gênero. A atuação do designer no
sentido de mudar essa realidade em grandes empresas é irrisória, pois suas
estruturas burocráticas impõem que a alteração deve ser feita nos níveis
estratégicos superiores. As marcas, portanto, possuem o poder de quebrar com
discursos hegemônicos, e o usuário assume papel importante sobre suas escolhas
de consumo.
This conclusion work aims to analyze how the cosmetic brands Natura and Boticário
articulate color, typography, form and texture to distinguish gender. Hygiene and
beauty products are vastly used in the routine of most individuals. Their visualities
work along in the construction of meanings about one's expression. Analyzing
perfume bottles of the brands, the work exposes the importance of the visual culture
in developing inclusive artifacts. The brands were chosen for being publicized and
accessible to a large public. Under the light of feminist and gender theories, the work
articulates that the concept of gender differs from biological sex, such as postulated
by traditionalist perceptions. As a social construction, gender is not associated with
the material world by nature. It refers to the individual perception of oneself and its
expressions. From that perspective, the visual lexicon and Gestalt theory are used as
a tool to evaluate the formal structure of the packagings. Employing content analysis,
it is possible to unveil the speech behind semantic messages that dictate femininities
and masculinities. The qualitative interviews check the users' backgrounds and
meaning associations to the visualities, as well as their knowledge about gender.
Theories and contexts are articulated to understanding the role of the designer in
breaking hegemonic speeches. The formal analysis reveals hue, saturation and
value of the colors, the visual aspect to touch, the forms applied and the type
anatomy in the perfume bottles. Both brands use these aspects conservatively, an
aspect reinforced in the product descriptions through adjectives and behaviour
indications. Understanding the interviews, it is possible to assert that those meanings
are deeply infiltrated in society's repertoire. The use of stereotypes to epitomize a
diverse public culminates in the exclusion of those who don't relate to the
conservative concepts of feminine and masculine. The dissemination of those
products and images in the media alters the individual perception of oneself and
one's behaviours, working as gender prosthetics. The designer role to change that
reality in corporations is whimsy, for their bureaucratic structures impose a higher
level strategy. Therefore, brands have the power to break hegemonic speeches, and
the user takes an important role on their own consuming options
INTRODUÇÃO 11
LEVANTAMENTO DE DADOS 12
A PERSPECTIVA DE GÊNERO 12
Feminismos 13
Estudos de Gênero 16
LEITURA DE IMAGENS E CULTURA VISUAL 20
MARCAS ESCOLHIDAS 24
Natura 24
Linhas de Produtos 25
Boticário 27
Linhas de Produtos 28
FORMA 30
Gestalt 30
COR E TEXTURA 34
Cor e Gestalt 34
Percepção fisiológica da cor e da textura 35
Teorias da Cor 36
Escalas Cromáticas 37
Matiz, Sombreado e Tonalidade 38
Harmonia e Contraste 38
Contraste de Tom 38
Psicologia das cores 39
TIPOGRAFIA 42
DIRETRIZES METODOLÓGICAS 43
PALETAS DE CORES DOS PRODUTOS 44
Natura 44
Boticário 46
DESENVOLVIMENTO 48
PROCESSO DE SELEÇÃO DAS AMOSTRAS 48
PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DAS AMOSTRAS 52
ANÁLISE SINTÁTICA 57
Natura Ilía 57
Natura Kriska 62
Natura Sr. N 66
Boticário Portinari 71
Boticário Uomini 76
Boticário Glamour 81
DIAGNÓSTICO DE DADOS 85
METODOLOGIA DAS ANÁLISES 85
ANÁLISE DE CONTEÚDO 86
ANÁLISE DOS TEXTOS DESCRITIVOS DOS PORTAIS 89
Natura Ilía 90
Natura Kriska 94
Natura Sr. N 98
Boticário Portinari 101
Boticário Uomini 103
Boticário Glamour 104
ENTREVISTAS 107
Entrevista 01 112
Entrevista 02 114
Entrevista 03 116
REFERÊNCIAS 122
11
1. INTRODUÇÃO
Natura e Boticário são marcas brasileiras de cosméticos que utilizam
produção nacional e possuem público acessível e abrangente. Essas marcas
comunicam seu posicionamento oficial em reportes anuais, onde deixam claras as
progressões com relação a sustentabilidade e inclusão (NATURA, 2018),
(BOTICÁRIO, 2018).
Parte do processo de comunicação, as informações visuais também
produzem e transmitem significados, afetando a percepção do consumidor de
maneira inconsciente (DONDIS, 2003, p.20).
O léxico visual possui um papel importante na alfabetização, na interpretação
das informações visuais como forma, textura, cor e tipografia. Ao trabalhar com os
elementos de maneira isolada, os estudos da Gestalt auxiliam a análise das
mensagens que cada elemento pretende passar e perceber finalmente o todo
(DONDIS, 2003, p.22).
Produtos de higiene são amplamente utilizados na sociedade brasileira. As
marcas que veiculam esses produtos, também veiculam mensagens e bombardeiam
o consumidor com informações e significados. Parte de uma construção social,
essas empresas montam estratégias baseadas em seu público, e conferem a ele
características que acreditam fazer parte do indivíduo em sua natureza.
De acordo com Judith Butler, essas características são, na verdade,
construídas socialmente. O conceito da performatividade de gênero de Judith Butler
afirma que gênero é um conjunto das formas de expressão no qual o indivíduo se
apropria inconscientemente de significantes (BUTLER, 2004, p.1). O processo de
reflexão desses significantes é tão intenso nesses corpos falantes, que passam a
assumir as características como próteses.
O designer visual, no processo de formulação da informação sintática, a partir
de elementos como forma, cor, textura e tipografia, deve ter o cuidado de entender o
que cada um desses elementos transmite, e utilizá-los de maneira responsável.
O presente trabalho pretende analisar o posicionamento das marcas Natura e
Boticário para verificar como utilizam forma, cor, textura e tipografia, permitindo ao
consumidor entender se a mensagem que comunicam de maneira visual está de
acordo com a mensagem expressa, e com as evoluções da sociedade.
12
2. LEVANTAMENTO DE DADOS
2.1. A PERSPECTIVA DE GÊNERO
Os produtos comercializados pelas marcas apresentam características físicas
perceptíveis por seu público, consciente ou inconscientemente. A cada uma dessas
características são atribuídos socialmente significados e mensagens. Tomando
como base a dicotomia entre feminilidades e masculinidades (conceitos opostos pelo
contraste) deve-se compreender os efeitos que a exposição constante de seus
significados exercem sobre a sociedade. É necessário também entender como são
constituídas as relações entre gênero, objeto e suas características formais, além de
a maneira como o gênero é percebido dentro do campo das Ciências Sociais.
Os estudos de gênero no contexto atual passaram por um histórico de
transformações em diversas sociedades, não necessariamente na mesma ordem
cronológica. Inicialmente eles eram restritos aos estudos sobre a mulher
(feminismos), e posteriormente incluíram os estudos queer e os estudos sobre
masculinidades. A análise realizada utiliza um apanhado de tipos diversos de
feminismos e centraliza seu ponto de vista nos conceitos de gênero, sua
performatividade e suas próteses.
Existem ainda muitas tensões, pois algumas teóricas feministas reclamam
que a sobreposição do objeto de estudo (mulher e corpo feminino) pelos teóricos de
gênero (conceito como construção social) deixam de lado as compensações
históricas devidas às mulheres pelas relações de submissão, e minimizam as
reivindicações representativas nas esferas públicas.
O trabalho de conclusão de curso não possui a intenção de posicionar-se com
relação a essas tensões, mas de compreender as vertentes teóricas disponíveis em
sua riqueza para apropriar-se das ferramentas disponíveis para analisar criticamente
as relações de produção e consumo, tanto de imagens quanto de produtos, e suas
consequências na esfera pessoal e profissional. Além disso, é necessário
compreender o interesse do designer nos estudos de gênero, e as aplicabilidades
dos conceitos na área de atuação.
13
2.1.1. Feminismos
A definição de feminismo é uma tarefa complexa, pois não está limitada
geográfica ou temporalmente. Refere-se a um termo flexível e em constante
transformação, que possui diferentes pautas de acordo com cada cultura, sociedade,
período histórico, e percepção dos desafios que encontram em cada cenário
(CORREA, 2001 p. 15).
Existem diversas vertentes, cada qual com suas bases teóricas que podem
ou não aproveitar-se umas das outras para expressar uma análise crítica, adaptar-se
ao contexto sociohistórico e compreender sua adequabilidade, bem como suas
pautas centrais.
O feminismo conservadorista preocupa-se com as tensões relacionadas ao
sexo e com as relações hierárquicas de poder presentes entre homens e mulheres.
Ele é frequentemente referido como "feminismo burguês" porque não se preocupa
em questionar as origens políticas e culturais dessas desigualdades (CORREA,
2001 p. 16).
O chamado feminismo liberal tem suas bases nos ideais de liberdade,
igualdade e fraternidade da Revolução Francesa, e dá prioridade às ferramentas
legislativas e dispositivos legais para implantar a igualdade de direitos entre homens
e mulheres (CORREA, 2001 p. 16).
A vertente dogmático-marxista acredita que todos os fenômenos sociais estão
inseridos na lógica da luta de classes, e que a dinâmica de minimização da mulher
na sociedade está diretamente atrelada como parte dos problemas sociais gerais,
com base nas ideias de Marx e Engels (CORREA, 2001 p. 16).
O patriarcado é explorado pelo feminismo radical como um sistema de
dominação dos homens sobre as mulheres em todas as esferas da sociedade,
utilizando-se de diferenças biológicas para naturalizar as desigualdades. O cerne
dessas diferenças estaria no conceito tradicional de família e seus contratos
hierárquicos, que usam da psicologia do poder para legitimar suas bases (CORREA,
2001 p. 16).
Estudos feministas socialistas trabalham a formulação de novos conceitos
adequados para analisar diferentes realidades e a reformulação de categorias
conceituais consideradas inadequadas para analisar as classes sociais, o sexo e os
14
excludentes de gênero, classe social e etnia e deve estar atenta aos marcadores
culturalmente definidos na constituição de subjetividades (ZACAR, 2018, p.23).
De acordo com Ana Paula Silva, os produtos de higiene pessoal são artefatos
amplamente utilizados pela população brasileira e estão incluídos no processo de
diferenciação de feminilidades e masculinidades. Essa escolha é realizada pelo
mercado, tomando como base o pensamento de que a necessidade desses
produtos é regida pelos fatores biológicos, utilizando-se de visualidades para
promover conceitos socialmente construídos. Por esse motivo, a maneira como os
produtos são apresentados reflete o posicionamento das marcas perante a
sociedade (SILVA, 2010)
A análise dos produtos das marcas Natura e Boticário auxilia na identificação
do discurso das duas marcas com relação às diferenciações citadas e permite
verificar se a sua produção de design gráfico atualmente disponibilizada caminha em
conjunto com os valores que as marcas comunicam de maneira verbal expressa.
Com o aumento do consumo de imagens no início do século XXI, os
processos de construção de feminilidades e masculinidades nas imagens e artefatos
consumidos diariamente torna-se problemática. Essas imagens realizam influência
significativa na compreensão das normas socioculturais, investigando também a
maneira como são concebidas, quem as produz e reproduz, levando em
consideração que podem ser articuladas como táticas de poder, empregadas na luta
por legitimação de valores e crenças (DE ABREU, 2015, P.3936).
20
FONTE
https://www.gratispng.com/png-fna9i2/download.html
Acesso em 28 de abr. de 2020.
FONTE:
https://www.natura.com.br/
Acesso em 29 de abr. de 2020
2.3.2. Boticário
O Boticário é uma marca de produtos cosméticos fundada em 1977 por
Miguel Krigsner que começou como uma farmácia de manipulação em Curitiba. À
época de sua abertura, estavam em processo na política brasileira, medidas de
restrições às importações, que valorizavam e favoreciam a venda de produtos
nacionais e dificultavam a utilização de insumos provenientes de fora do país
(MELO; RIBEIRO, 2007, p.303).
Em 1979, Miguel Krigsner comprou de Sílvio Santos as embalagens em
formato de ânfora que viraram a assinatura da marca, e no ano seguinte, o Boticário
iniciou a estratégia de abertura de franquias, crescendo significativamente até
construir sua própria fábrica em 1982 (BOTICÁRIO, 2020).
Em 1984, a divulgação por campanhas publicitárias direcionadas a revistas
femininas em rede nacional aumentou sua exposição ao público e estabeleceu uma
comunicação padronizada (MELO; RIBEIRO, 2007, p.304).
Para acompanhar os conceitos de sustentabilidade de mercado que tomaram
a pauta do cenário nos anos 1990 e buscar maior conexão com as questões
ambientais, o Boticário abriu uma organização sem fins lucrativos chamada
Fundação Boticário, voltada a ações para a conservação da natureza (BOTICÁRIO,
2020).
A marca acompanhou o cenário crescente do mercado brasileiro de
cosméticos nos anos 2000 e teve um aumento de quase 10% no faturamento líquido
entre os anos de 2000 a 2004, possibilitando sua expansão para outros países.
(ABIHPEC, 2005 apud MELO; RIBEIRO, 2007, p.304).
A empresa, que passou por reformulações na presidência em 2010, passou a
chamar-se ˜Grupo Boticário˜ e reuniu marcas como ˜O Boticário˜, ˜Eudora˜, ˜Quem
disse, Berenice?˜ e ˜The Beauty Box˜, agregando em 2020 a ˜Vult˜, a ˜Blz˜ e a ˜Multi
B.˜ (BOTICÁRIO, 2020).
O presente estudo pretende focar na análise das linhas de produto da marca
o Boticário.
28
FONTE:
https://logodownload.org/o-boticario-logo/
Acesso em 29 de abr. de 2020
Até 2003, o Boticário possuía em mix de produtos cerca de 580 itens divididos
em deocolônias, desodorantes, shampoos, sabonetes, cremes, loções,
bronzeadores, protetores solares, condicionadores e maquiagem. Para se
determinar o nome dos produtos, existe um processo de desenvolvimento com
pesquisas de marketing e comunicação, que são os responsáveis por sua
denominação comercial, levando-se em conta caracterısticas como fragrância,
público-alvo, mensagem social, entre outras (ALMEIDA; SILVA, 2003, p.7).
Através da pesquisa telematizada no site oficial da marca, foram identificadas
as seguintes linhas de produtos: Intense, Malbec, Make B., Egeo, Floratta, Nativa,
Nativa Spa, Glamour, Quasar, Linda, Capricho, Cuide-se Bem, Boti Baby, Men, Lily,
Accordes, Connexion, Coffee, Arbo, Portinari, Styletto, Zaad, Uomini, Sophie,
Elysée, Insensatez, Match., Boticollection, The Blend, Dr. Botica, Dream, Botica 214
(BOTICÁRIO, 2020).
A seleção das linhas para análise de cor, forma, textura e tipografia deve
realizada a partir dos seguintes critérios estabelecidos:
● Volume de vendas (o site disponibiliza a seleção de produtos por preferência
do consumidor) - o volume de vendas não indica somente a popularidade do
produto, mas a sua acessibilidade;
● Produtos categorizados no site da marca como masculinos ou femininos pelo
mecanismo de busca. A seleção recebeu novo filtro para selecionar produtos
com nomes de mulher ou de homens, e em seguida, aplicada à descrição da
linha;
● Promessa de atribuir adjetivos qualitativos ao uso dos produtos que estejam
atreladas às feminilidades e masculinidades, no sentido de definir o que é ser
mulher ou homem;
29
FONTE:
https://www.boticario.com.br/
Acesso em 20 de abr. de 2020
30
2.4. FORMA
2.4.1. Gestalt
A Gestalt é uma escola alemã do ramo da psicologia experimental que atua
nos estudos da forma, e auxilia outras áreas, como da "percepção, linguagem,
inteligência, memória e aprendizagem, motivação e conduta dos grupos sociais". Ela
postula que o sistema nervoso central possui um mecanismo de busca pela
estabilidade, adaptando-se naturalmente aos diferentes estímulos produzidos pelo
meio externo. Os efeitos desse mecanismo de visualização do observador permitem
a análise de como essas informações visuais são percebidas, e como interpretam as
mensagens presentes (FILHO, 2008, p.15).
A fonte compositiva de toda mensagem visual está nos elementos básicos
catalogados pelo psicólogo Rudolf Arnheim (1904-2007) em seu trabalho "Art and
visual perception": o ponto, a linha, a forma, a direção, o tom, a cor, a textura e a
proporção (SARDELICH, 2006, p.454). Esses padrões visuais com qualidades
expressivas auxiliam a interpretação da imagem e, na criação, são manipulados de
acordo com o objetivo da mensagem. (DONDIS, 2003, p.23).
A forma pode ser definida em termos filosóficos e metafísicos, a partir do
conceito daquilo que determina matéria para ser algo. Ela se refere aos limites
exteriores da matéria, dos quais se constitui um corpo. É a configuração de seus
limites que podem ser vistos de fora. A forma pode ser constituída em ponto, linha,
plano ou volume (FILHO, 2008, p.34).
A visualização da forma depende da interação do olho humano com o objeto,
intermediado pela luz. Ela é manifestada pelos diferentes estímulos ao campo visual,
em função dos contrastes dos elementos que configuram um objeto.
Unidade básica da forma, o ponto é a sua menor redução, com geometria
circular e sem extensões. Dentro de uma composição, o ponto refere-se a qualquer
unidade que funcione como centro de atenção do visualizador, pois uma de suas
características é compelir o olho a visualizá-lo (FILHO, 2008, p.35).
Formada por sequências de pontos minimamente distantes entre si, a linha
pode também ser descrita como o movimento de um ponto em alta velocidade. A
velocidade é dada pela percepção em atraso do olho do movimento em sequência
como um rastro deixado por sua forma. A linha refere-se ao contorno da matéria e
31
equilíbrio significa que a soma das forças opostas exercidas ao objeto resulta em
zero (FILHO, 2008, p.45).
Uma forma pode ser equilibrada pelo movimento em direção a um centro de
atração. A direção pode ter sentido denotativo ou conotativo como índice, pois pode
ressaltar, apontar para aspectos menos evidentes e conferir diferentes significados à
composição (FILHO, 2008, p.51).
Quando simétrico, o equilíbrio define a semelhança ou igualdade de ambos
os lados da forma ou composição em relação a um ou mais eixos axiais (horizontal,
vertical ou diagonal), com a distribuição das forças e pesos homogêneos.
O contraste existe quando há jogos de oposição entre polaridades. Ele pode
ser definido em termos de linhas, direções, cores, tonalidades, contornos,
movimentos, proporção e escala. É manipulado para evidenciar um aspecto
específico da forma, intensifica o significado pela dramatização e simplifica a
comunicação (FILHO, 2008, p.56).
Sua função é quebrar o equilíbrio para atrair a atenção. Um exemplo seria o
posicionamento de duas esferas de tamanhos opostos, que faz com que elas
pareçam comparativamente muito grande e muito pequena (FILHO, 2008, p.56).
O contraste é trabalhado com jogos de presença e ausência de luz que geram
a noção de tom e volume. Entre a presença ou ausência total da luz, existe uma
gama de matizes. Em composições monocromáticas, essas tonalidades são obtidas
pela sobreposição da luz e da sombra (branco e preto) em escala com retículas,
ajustando sua intensidade (FILHO, 2008, p.57).
O destaque de cores, por sua vez, ressalta formas e partes específicas do
objeto que se deseja intensificar. Ele torna essas partes visíveis e legíveis, e desvela
os códigos sociais embutidos às cores por sistemas institucionais. Além disso, pode
causar as sensações de equilíbrio ou desequilíbrio, aproximação ou distanciamento,
suavidade ou agressividade (FILHO, 2008, p.58).
O contraste por direção pode culminar no equilíbrio ou desequilíbrio de uma
forma. Esses efeitos ocorrem na composição quando elementos são posicionados
acima ou abaixo de um eixo central. Aqueles acima do eixo tornam-se mais pesados
e aqueles abaixo, mais leves. Pela mesma lógica, formas horizontais transmitem
maior estabilidade e verticais, instabilidade e leveza (FILHO, 2008, p.59).
33
2.6. TIPOGRAFIA
A tipografia pode ser utilizada como critério de análise da comunicação de
feminilidades e masculinidades pelas marcas, pois é através de sua criação que os
significados de um texto ou material podem ser ˜clarificados, honrados e
compartilhados, ou conscientemente disfarçados˜. De acordo com Robert Bringhurst,
a escolha das palavras tem uma relação de merecimento com a escolha da
tipografia. (BRINGHURST, 2018, p.28).
Ellen Lupton define as palavras como um mecanismo de expressão originado
do corpo. Da mesma maneira, os tipos iniciaram sua formação a partir da caligrafia e
evoluíram através da história, convergindo em imagens designadas a serem
infinitamente repetidas. Além do caráter constante da tipografia na comunicação
humana, ela pode ser utilizada como ferramenta para pensar em como emoldurar
conteúdos, dar voz e corpo à palavra, e capacitar o fluxo de mensagens (LUPTON,
2004, p.8).
Bringhurst compara a produção tipográfica com uma composição musical: as
vastas possibilidades de construção de arranjos tornam-na passível de
interpretações. Ela pode ser utilizada tanto para nutrir emoções quanto para
manipular comportamentos, e portanto deve ser utilizada com cautela
(BRINGHURST, 2018, p.29).
Além disso, os tipos possuem tom, timbre e caráter tanto quanto as palavras
possuem uma significação e devem combinar com o contexto em que estão
inseridas ou com a mensagem que se deseja passar (BRINGHURST, 2018, p.29).
Bringhurst comenta que existem diversos sistemas de classificação de
tipografia baseados na ciência, mas considera que, pelo fato de fazer parte do
âmbito da arte, a tipografia pode ser melhor analisada com sua abordagem histórica,
e relação com o momento e escolas artísticas de cada período (BRINGHURST,
2018, p.139).
O presente trabalho dedica-se a utilizar as diversas teorias dispostas sobre
tipografia como guia para verificação de significados pela presença de elementos
tipográficos distintos, podendo compreender seu momento histórico, mas mantendo
seu uso como ferramenta para análise comparativa.
43
3. DIRETRIZES METODOLÓGICAS
Para analisar as amostras selecionadas de cada uma das marcas em sua
linha de produtos, tanto de maneira individual, elencando os elementos, quanto em
forma de tabela paramétrica, são estabelecidas as diretrizes referentes à forma, cor,
textura e tipografia que se deseja analisar.
Essas diretrizes são conceituadas nas teorias da Gestalt, da Cor e nas teorias
de tipografia presentes no levantamento de dados. Através das teorias supracitadas,
é possível elencar os critérios:
Forma: a análise de forma das amostras pretende analisar as
conceitualizações propostas pela Gestalt com relação a: harmonia, equilíbrio e
contraste, em termos de regularidade/irregularidade, organicidade/geometria,
leveza/peso, verticalidade/horizontalidade, simetria/assimetria, dinamismo/ritmo,
proporção/desproporção, agudeza /suavidade.
Cor: as cores presentes nas amostras foram selecionadas e organizadas em
paletas RGB extraídas das fotografias dos produtos disponíveis online. Devido à
restrição do coronavírus e da dificuldade de encontrar fotografias das embalagens
externas que contém os perfumes, o termo "embalagens" refere-se aos frascos em
si. A decisão também foi tomada em função de que os frascos são a parte do
perfume que mais entram em contato com o consumidor, visto que a embalagem
externa por vezes é descartada.
As cores nas paletas apresentam variações tonais captadas em software
(Photoshop, illustrator), entretanto, pela simplicidade da análise, não foram
catalogadas todas as variações, e a tentativa realizada foi de captar a cor na maior
saturação apresentada.
As diretrizes metodológicas relacionadas à cor envolvem escala de
luminosidade, saturação, valor, matiz e tom, brilho, pureza, contraste e calor,
além das relações de cada cor ou combinação com o significado que podem
expressar.
As diretrizes de textura envolvem a aparência da textura na imagem digital e
as sensações produzidas ao olho, evidenciando qualidades como superfície
lisa/rugosa/ondulada, macia/rígida, mole/dura, brilhante/opaca.
44
FONTE: A AUTORA
45
FONTE: A AUTORA
FONTE: A AUTORA
46
3.1.2. Boticário
FONTE: A AUTORA
FONTE: A AUTORA
47
FONTE: A AUTORA
48
4. DESENVOLVIMENTO
4.1. PROCESSO DE SELEÇÃO DAS AMOSTRAS
Dados os aportes teóricos, critérios estabelecidos e as diretrizes
metodológicas explicitadas, as amostras foram selecionadas dentre
aproximadamente 26 linhas da Natura e 31 linhas do Boticário. Elas estão
disponíveis no portal oficial das marcas entre janeiro e o presente momento.
Para realizar o mecanismo de busca nos portais, a seleção levou em
consideração: nome das linhas, faixa etária do público, direcionamento embasado
por gênero e descrição do produto.
Nos portais da Natura e do Boticário, existem diversos filtros para a busca de
seus produtos (figuras 11 e 12), nos quais são dispostas as opções de "perfumaria
feminina" e "perfumaria masculina".
FONTE:
https://www.natura.com.br/
ACESSO EM 14 AGO. 2020
49
FONTE:
https://www.boticario.com.br/
ACESSO EM 14 AGO. 2020
FONTE:
https://www.natura.com.br/nossas-marcas
ACESSO EM 14 AGO. 2020
50
FONTE:
https://www.boticario.com.br/institucional/marcas/
ACESSO EM 14 AGO. 2020
FONTE:
https://www.natura.com.br/ilia
ACESSO EM 14 AGO. 2020
FONTE:
https://www.boticario.com.br/glamour
ACESSO EM 14 AGO. 2020
Como é possível observar na figura 17, o matiz é dado pela sigla H (do
Inglês, hue), medido em graus de acordo com o seu ângulo dentro do círculo
cromático (figura 18). A saturação (indicada pela sigla S) é medida em uma escala
percentual do 0 ao 100. Seus efeitos na cor estão diretamente relacionados com o
brilho. Quando ela for equivalente a zero, e o brilho for mínimo, produzirá preto. A
100%, e brilho máximo, produzirá a cor pura em sua pigmentação mais intensa. Isso
ocorre porque o brilho funciona em uma escala de cinza, e a saturação adiciona ou
reduz o pigmento. O valor, tom ou brilho é indicado pela sigla B, medido em escala
percentual, do 0 ao 100, onde 0 equivale à ausência completa de luminosidade
(preto), e 100% equivale à presença total de luz e mostra a cor em sua tonalidade
mais clara
54
FONTE:
https://modelab.gitbooks.io/grasshopper-primer/content/1-foundations/1-3/4_domains-color.html
ACESSO EM: 18 AGO. 2020
Além do aporte teórico, foi utilizada a ferramenta online chamada "What the
Font" do site My Fonts1, de acordo com a imagem 20.
1
https://www.myfonts.com/WhatTheFont
56
FONTE:
https://www.myfonts.com/WhatTheFont
ACESSO EM 25 AGO. 2020
vistas em perspectiva dos produtos, uma análise tipográfica mais completa não é
possível.
Em função da pandemia do COVID-19 que tomou conta do cenário desde
março de 2020 até o presente momento, as leituras visuais foram feitas somente a
partir das reproduções fotográficas. Com elas foi possível traduzir as sensações
aparentes. O método utilizado não é, portanto, preciso, mas encaixa-se nas medidas
de segurança cabíveis à situação, de maneira a não apresentar riscos de saúde à
redatora.
FONTE:
https://www.instagram.com/naturabroficial/
ACESSO EM 28 AGO. 2020
58
FONTE:
https://www.instagram.com/naturabroficial/
ACESSO EM 28 AGO. 2020
FONTE:
A AUTORA
A paleta estabelecida apresenta cinco cores, que são aqui nomeadas pela
ordem em que aparecem na imagem 23. A COR 01 refere-se ao líquido interno e
constitui-se no que chamamos de "rosa claro". Quando definida nos termos técnicos
dos critérios estipulados, podemos informar que seu matiz a 2o compõe um vermelho
levemente amarelado, com ondas compridas, definindo a cor quente. Saturado a
15%, possui pouca pigmentação da cor pura. O seu tom é medido em termos de
brilho, e neste caso, a tonalidade clara é indicada a 99% de brilho.
A COR 02 e a COR 03 são variações da mesma cor presente na embalagem,
selecionadas de partes menos e mais iluminadas da fotografia para dar maior
precisão à análise. A primeira assemelha-se a um "marfim", e tem matiz amarelo
avermelhado, posicionada a 31 graus, pouco saturada, (apenas 16% de
pigmentação), a 98% de brilho - o que torna uma tonalidade clara. A cor 03, da
mesma maneira, compõe um matiz amarelo avermelhado, a 35 graus na escala
cromática, com baixa saturação (12%), e 99% de brilho. A COR 04 refere-se à
segunda cor da embalagem externa: um amarelo avermelhado a 28 graus, podendo
ser referido como um laranja, acinzentado pela sua baixa saturação a 17%
(lembrando que a saturação parte de uma escala de cinza). Composto por 78% de
brilho, ainda constitui uma tonalidade clara.
60
FONTE:
https://www.instagram.com/naturabroficial/
ACESSO EM 28 AGO. 2020
FONTE:
A AUTORA
63
FONTE
https://www.natura.com.br/
ACESSO EM 28. AGO 2020
FONTE
https://www.myfonts.com/WhatTheFont/result
ACESSO EM 28. AGO 2020
FONTE:
A AUTORA
67
FONTE:
<https://sites.natura.com.br/revista/espaco-natura-c16-v1>
ACESSO EM 28 AGO. 2020
69
FONTE:
<https://sites.natura.com.br/revista/espaco-natura-c202012-v1>
ACESSO EM: 28 AGO. 2020
FONTE:
<https://catalogo.boticario.com.br/BR/#1>
ACESSO: 29 AGO. 2020
maior que sua largura, compondo sua verticalidade. A base do borrifador possui o
formato de um prisma octogonal, e sua tampa compõe um cilindro, ocupando
aproximadamente ¼ do perfume.
Sua embalagem externa traz uma pintura de Portinari, com cores que variam
entre quentes e frias, pinceladas sujas e em diversas direções. Ao centro, um
retângulo ocupa a parte inferior, alinhado à base da caixa de mesmo formato. Ele
ocupa função de caixa de texto, fazendo contraste com a tipografia clara. Contém as
informações de nome do perfume, marca do Boticário e especificações.
FONTE: ARQUIVO
73
FONTE:
A AUTORA
A COR 05 foi selecionada a partir da área mais fosca da tampa. Seu código é
R: 140, G:57 e B:51. O matiz a 4 graus indica o vermelho quase puro. Com
saturação e brilho intermediários, a primeira a 64% e a segunda a 55%, demonstra a
interferência dos cinzas da escala.
O frasco translúcido deixa transparecer a coloração do líquido interior. Os
jogos de luzes e sombras não são granulados, indicando que o material é vítrico e
brilhante. Tais jogos permitem compreender a tridimensionalidade das formas em
relevo, e as linhas que constituem as sombras. Essas linhas são inclinadas, e
apesar de não serem contínuas, pelo princípio da continuidade da Gestalt, é
possível vislumbrar por onde passam e até onde chegam, entendendo que
caminham em pares e se cruzam. A inclinação confere ao frasco movimento e
dinamismo.
A parte prismática octavada que suporta o borrifador, em contrapartida, reflete
a iluminação em ângulos diferentes, com grânulos de tamanhos diminutos. Assim,
seu material é opaco. Pela coloração, é possível deduzir que se trata de metal
escovado, ou de plástico coberto em tinta fosca. A tampa também compartilha da
mesma qualidade fosca, agregada de transparência, pois pode-se verificar o
borrifador em seu interior. Como a função de abrir e fechar precisa ser performada
com segurança, entende-se que a matéria prima é leve e flexível. Por este motivo,
apesar de translúcida, ela não é vítrica, mas de plástico ou acetato.
A tipografia escolhida para o perfume Portinari é categorizada como Display.
É ideal para títulos e destaques por ser uma fonte pesada, não apresentando boa
legibilidade e leiturabilidade quando inserida em textos. A largura de suas hastes é
regular e simétrica em todas as letras, portanto, ela também se encaixa na categoria
Monospace. Apesar da regularidade apontada, seus traços são realizados em
diferentes angulações, e as aberturas variam entre grandes e pequenas no eixo
oblíquo.
As letras possuem tamanhos variados e estão desalinhadas, o que traz efeito
de movimento e desordem. Elas foram desenhadas manualmente com pincel
poroso, deixando pequenas falhas em seu traçado. Por ser uma tipografia
apresentada somente em caixa alta, e pela irregularidade de tamanhos, não é
75
FONTE:
<https://www.myfonts.com/WhatTheFont/result>
ACESSO EM 07 SET 2020
76
FONTE:
<https://produto.mercadolivre.com.br/MLB-1073847173-2-perfumes-uomini-e-uomini-black-o-boticario-frete-gratis
-_JM>
ACESSO EM 22 SET 2020
altura ser maior que a largura em aproximadamente uma vez e meia. Seu aspecto
blocado, associado às suas cores, torna a embalagem pesada.
FONTE:
A AUTORA
apenas 41% de pigmento da cor pura, e brilho intermediário a 48%. Ela foi retirada
das partes menos iluminadas do frasco.
A cor 04, marrom, também traz um matiz vermelho amarelado, desta vez a
29o no círculo cromático. Com apenas 36% de saturação, a cor tem baixa
pigmentação, que unida ao baixo brilho resulta em uma tonalidade mais escura. Ela
foi retirada das partes menos iluminadas do frasco, e tem código R:109, G: 89 e B:
70.
As cores do perfume Uomini foram escolhidas dentro de matizes muito
próximos, variando pouco em seu brilho e saturação e criando transições sutis e
uniformes. Não há contrastes significativos, o que a torna uma embalagem neutra
em termos cromáticos.
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/uomini>
ACESSO EM 22 SET 2020
FONTE:
<https://www.myfonts.com/WhatTheFont/result>
ACESSO EM 25 SET 2020
FONTE:
<https://catalogo.boticario.com.br/BR/#59>
ACESSO EM 22 SET 2020
81
FONTE:
< https://catalogo.boticario.com.br/BR/#16>
ACESSO EM 30 SET 2020
FONTE:
A AUTORA
A paleta do perfume foi dividida em apenas três cores: rosa, cinza (ou prata),
e preto. O frasco, em si, é transparente. A cor 01 refere-se ao líquido interno. Ela
será chamada de rosa bebê, e possui código R: 236, G: 192 e B: 183. Seu matiz a
10 graus compõe um vermelho levemente amarelado, pouco saturado (apenas 22%)
e de tonalidade muito clara, com valor de 93%.
A cor 02 foi retirada do cilindro intermediário do perfume, logo antes da
tampa. Ela tem código R: 125, G: 122 e B: 113. Com matiz a 45 graus, revela a
mistura entre o amarelo e o vermelho, com maior pigmentação do primeiro. Sua
saturação é baixíssima, a 10%, e brilho intermediário a 49%.
83
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/glamour-desodorante-colonia-75ml/>
ACESSO EM 30 SET 2020
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/glamour-desodorante-colonia-75ml/>
ACESSO EM 30 SET 2020
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/glamour-desodorante-colonia-75ml/>
ACESSO EM 30 SET 2020
85
5. DIAGNÓSTICO DE DADOS
5.1. METODOLOGIA DAS ANÁLISES
O presente trabalho pretende analisar como as marcas articulam a forma, cor,
textura e tipografia em suas embalagens para realizar distinção de gênero. Durante
as análises formais, levaram-se em consideração os aspectos sintáticos presentes
nos frascos dos perfumes para avaliar o viés do discurso visual.
Trazendo à tona o contexto dessas embalagens, foram selecionados os
textos descritivos presentes nos sites, relacionando-os com as análises prévias.
Desta forma, é possível correlacionar a mensagem textual e visual e compreender
se estão em sintonia.
Com intenção de analisar uma terceira percepção, externa ao design e ao
discurso das marcas, foram realizadas entrevistas qualitativas com três convidados
de perfis diferentes. O critério de seleção de pessoas foi, primeiramente, o fator
etário. Esta separação permite encontrar uma conexão de experiências históricas
vividas similares àquela da redatora do trabalho.
Como segundo e terceiro critérios, foram selecionados a diversidade de
gênero e a orientação sexual. Como o trabalho entrelaça as questões de gênero
com aspectos formais das embalagens, verificar a percepção e recepção da
comunidade diversa é de suma importância. Ademais, trabalhar conceitos de gênero
e excluir o público mais afetado pelos discursos hegemônicos significaria deixar de
86
FONTE:
BARDIN, 1977, p. 61
FONTE:
<https://www.natura.com.br/ilia>
ACESSO EM: 11 OUT 2020
X = LINHA
Y = FRAGRÂNCIAS
FONTE:
<https://www.natura.com.br/ilia>
ACESSO EM: 11 OUT 2020
X = DEO PARFUM
Y = ILÍA
Z = MULHER
α = FORMA e VOLUME
β = FRAGRÂNCIA
FONTE:
<https://www.natura.com.br/kriska>
ACESSO EM: 15 OUT 2020
Neste primeiro texto, a última frase ainda pode ser reescrita de uma nova
maneira:
FONTE:
<https://www.natura.com.br/kriska>
ACESSO EM: 15 OUT 2020
1. FEMINILIDADE / é / forte.
FONTE:
<https://www.natura.com.br/sr-n>
ACESSO EM: 15 OUT 2020
A linha Sr. N da Natura apresenta também uma descrição mais curta, e outra
mais longa. Dentro do primeiro texto, é possível identificar os seguintes objetos de
ação:
1. SR. N;
e estabelecidas as conexões:
FONTE:
<https://www.natura.com.br/sr-n>
ACESSO EM: 15 OUT 2020
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/portinari>
ACESSO EM: 17 OUT 2020
1. PORTINARI;
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/uomini>
ACESSO EM: 18 OUT 2020
1. UOMINI
2. TRADUÇÃO
3. FRAGRÂNCIA
FONTE:
<https://www.boticario.com.br/glamour>
ACESSO EM: 18 OUT 2020
Qualificadores Marcas
NATURA BOTICÁRIO
Feminino Masculino Feminino Masculino
adaptação X
atenção X
charme X
classe X
delicadeza X
discrição X
doçura X
dualidade X
elegância X X
encanto X
expressividade X
firmeza X
força X X
inspiração X
intensidade X X
leveza X
magnetismo X
paixão X
racionalidade X
segurança X X
sensibilidade
senso artístico X
sensualidade X
transparência X
versatilidade X
voluptuosidade X
FONTE:
A AUTORA
107
5.3. ENTREVISTAS
Na etapa final do trabalho de conclusão, foram formuladas seis perguntas
para compor o questionário das entrevistas qualitativas. Com fim de avaliar a
percepção de um público diverso sobre as visualidades das embalagens
selecionadas dentre cada uma das marcas, as questões também deveriam
denunciar a construção de conceito dos entrevistados sobre "feminilidade",
"masculinidade" e "gênero".
As perguntas desenvolvidas buscam verificar as associações entre o
repertório dos entrevistados e os frascos de perfume, a compreensão das
construções de significado sobre forma, cor, textura e tipografia, e sua relação com o
gênero. Além disso, tentou-se avaliar as diferenças de vocabulário das descrições
léxicas dos entrevistados quando comparadas às da designer, no sentido de
entender como o Design Gráfico contribui na visualização formal dos artefatos e na
articulação das teorias e do senso crítico.
De início, os participantes foram alertados de que seu conhecimento sobre o
tema da entrevista seria mínimo, resumindo-se a "embalagens da Natura e do
Boticário". Foram solicitadadas breves apresentações pessoais, incluindo os dados
de nome, idade, sexo biológico, gênero, orientação sexual, estado civil, grau de
escolaridade e ocupação.
108
FONTE: A AUTORA
FONTE: A AUTORA
110
FONTE: A AUTORA
FONTE: A AUTORA
111
FONTE: A AUTORA
FONTE: A AUTORA
112
5.3.1. Entrevista 01
A primeira entrevista, realizada com o Perfil 01, apresenta as telas dos perfumes
Natura Kriska e Sr. N.
A percepção da entrevistada sobre o Natura Kriska é de um frasco rosa pink
metálico. Ela associa o formato da tampa a uma rosa (flor), e comenta sobre o seu
aspecto transparente. Sobre suas formas, aborda que lembram curvas femininas,
especialmente de pessoas cisgênero, mas que apesar disso, são mais retas do que
de costume. Em relação à fonte, aponta que agrada seu gosto pessoal, e que é
legível, delicada e sofisticada. Para a entrevistada, a sensação do frasco ao toque é
fosca, ainda que brilhante.
Suas considerações indicam que o perfume aborda o público do gênero
feminino, independente do sexo. A entrevistada corrige sua fala anterior, e aponta
113
que o fato de o perfume não ser tão curvilíneo abre margem para incluir mulheres
transsexuais, por não estar associado ao que a sociedade espera de uma mulher.
Ela comenta que se identifica com o frasco, e que dependendo somente da
embalagem poderia adquirir o perfume.
Quando apresentada às imagens do perfume Sr. N, a entrevistada aponta que
o frasco traz uma leitura mais masculina de acordo com o que a sociedade
dissemina. Comenta que a embalagem tem uma estrutura reta, quadrada e dura.
Sobre suas cores, ela comenta que o frasco é verde, aproximando-se de um "musgo
brilhante", e que sua tampa é preta. De acordo com Dani, o aspecto ao toque parece
duro, firme e fosco, e sua fonte é reta, característica do que a sociedade
compreende como masculino. Apesar disso, disse gostar das letras.
Em resposta à pergunta sobre as definições de feminino e masculino, Dani
se posiciona citando que a feminilidade nada tem a ver com a ideia tradicional de
delicadeza, e sim à força das mulheres. A partir disso, ela define seu conceito de
mulheres como pessoas que mudam a estrutura da sociedade, enquanto os
homens tentam deixá-la como está. Ser feminina, para ela, é saber que existem
erros que precisam ser mudados e quebrar com as estruturas de delicadeza e
fragilidade.
Ao ser questionada sobre a masculinidade, a primeira palavra que lhe vem à
cabeça é "tóxica". Esclarece que as pessoas vêem o masculino como algo que nada
tem a ver com o conceito da palavra, e que a masculinidade não é definida pelas
cores usadas nas vestimentas, pois essas significâncias são socialmente
construídas. Ela também comenta que o conceito está ligado com o poder de ação,
mas que este precisa ser mais fluido, e não tão separatista. Segundo Dani, o homem
nunca será completamente masculino, pois carrega em si também uma parte
feminina.
Acerca da distinção de gênero entre embalagens, ela acredita que as marcas
poderiam articular figuras e símbolos tradicionalmente associados pela sociedade
como feminino ou masculino, posicionando-os nas embalagens do gênero oposto.
"Isso não existe naturalmente, fomos nós que colocamos ali", cita Dani sobre
a associação de significantes de gênero às formas, cores, texturas e tipografias.
114
5.3.2. Entrevista 02
Para a segunda entrevista, com o Perfil 02, apresentaram-se as telas dos
perfumes Boticário Portinari e Natura Ilía.
Com relação ao perfume Portinari, Roberto articula que o frasco abstrato
constitui uma deformação do que seria um simples cilindro, agregado de formas e
protuberâncias. Ele comenta que por sua aparência, acredita ser um perfume doce e
feminino, com menos "notas fortes", como as amadeiradas tradicionalmente
carregadas pelos perfumes masculinos.
Comenta que as cores da caixa externa são alegres, e por esse motivo o
perfume se destaca entre outros. Para ele, Portinari possui um "ar de presente".
Como um paralelo, cita a loja Kopenhagen, onde o que é vendido não se resume ao
produto, mas ao ato de presentear chocolates. Ele adiciona que poderia facilmente
se tratar de uma linha especial, e cita que a tampa vermelha remete a uma touca de
natal.
Com relação às cores, Roberto cita que o frasco parece dourado. Ele também
traz sua perspectiva sobre a fonte utilizada, e dá o palpite de que possivelmente
seria a assinatura do pintor. Questionado sobre a sensação de toque, entende que
as formas do vidro são um tanto brutas, passando a sensação de robustez. "Não é
delicado", diz. Acredita que o vidro seja espesso, e que não há necessidade de
cuidado ao manejá-lo.
Roberto agrega que, de acordo com seu repertório, as obras de Portinari são
frequentemente exibidas em pares. Ele cita "Colheita de Arroz" e "Colheita de
Feijão" (pertencentes ao acervo do MASP), além de "Jangadas do Nordeste" e
"Cena Gaúcha" (expostos na sede do Itamaraty), e também o quadro "Guerra e Paz"
(posicionado na sede da ONU em Nova Iorque).
Apontando essa dualidade, o entrevistado afirma que o perfume poderia ser
unissex. Ainda que reconheça a possibilidade de compartilhamento do perfume, ele
acredita que o perfil de pessoas que o utilizaria seria de mulheres em torno de 30
anos de idade, que trabalham fora de casa e se importam com o perfume que usam.
Caso sua escolha dependesse somente da embalagem, o entrevistado afirma
que faria uso do perfume.
115
cotidiano do homem ou da mulher. Ele cita um pincel como feminino por ser um
artefato que considera delicado, e um carrinho como masculino. Comenta também
que não possui conhecimento sobre estudos de psicologia das cores, mas que
acredita que deveriam tomar lugar nessa distinção.
Sua percepção sobre feminino e masculino carrega um histórico de
associações cognitivas automáticas com base em postulações do mercado. Ele cita
algumas marcas internacionais, como Jean Paul Gaultier, com corpos suntuosos
esculpidos nas embalagens, e o frasco do perfume "Nina", por Nina Ricci, para
exemplificar formas arredondadas de outros perfumes. Além dessa característica,
cita ver formas alongadas como uma possibilidade de diferenciação do feminino.
Roberto confessa não compreender com propriedade o conceito de gênero.
Para responder à última pergunta, define-o como a opção de ser homem ou mulher,
ou os dois, ou nenhum.
5.3.3. Entrevista 03
Durante a terceira entrevista, Aline descreve os perfumes Glamour e Uomini,
ambos do Boticário.
Ao visualizar o frasco do primeiro perfume, diretamente o associa com o
feminino por suas cores e formas, além de seu nome. Ela conecta o formato do
perfume com o corpo de uma mulher e comenta que esse aspecto, combinado com
sua base achatada, torna o perfume anatômico e de fácil armazenamento.
Aline descreve as cores como rosa "bebê", rosa claro ou rosa antigo. Quando
questionada sobre tipografia, faz menção à sua configuração clássica e considera
estar alinhada ao conceito do nome: "É glamurosa", diz.
Sobre o público do perfume, a entrevistada alerta para a existência de
padrões de feminino que costumam atrelar imagens, cores, vestimentas e perfumes
a estereótipos. Ela supõe que a marca tenha um volume de vendas alto com estes
produtos, porque há um vasto número de pessoas buscando tais diferenciações.
Não obstante, ressalta que este não é o seu caso.
Em referência ao frasco de Uomini, Aline expõe que a combinação de cores
entre o marrom e o dourado busca satisfazer o estereótipo do masculino e remete
ao material "madeira". A embalagem não possui tampa. Por esse motivo, conta com
117
Critérios Marcas
NATURA BOTICÁRIO
Ilía Kriska Sr. N Portinari Uomini Glamour
COR
vermelho, vermelho, vermelho, vermelho, vermelho,
ciano, verde
matiz amarelo magenta amarelo amarelo amarelo
saturação baixa média média-alta alta média baixa
brilho alto alto médio-baixo médio médio alto
TIPO
classificação hot metal didot display display display script
peso leve leve pesada pesada pesada leve
serifa ausente presente ausente ausente ausente ausente
alinhamento alinhada desalinhada alinhada desalinhada alinhada alinhada
FORMA orgânica orgânica geométrica geométrica geométrica orgânica
lisa / fosca / fosca/
TEXTURA glitter glitter fosca lisa rugosa lisa
FONTE:
A AUTORA
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pelas análises realizadas, pode-se compreender que as visualidades
possuem algumas funções semânticas percebidas de forma fisiológica, e outras
socialmente construídas. As últimas variam de acordo com o contexto histórico e
cultura do visualizador, principalmente com a cultura visual e material. Essas noções
podem ser invertidas, mantidas ou quebradas de acordo com a intenção do produtor
das informações. A publicidade utiliza do discurso para aumentar as vendas dos
produtos e por vezes utiliza-se de conceitos do marketing que reduzem o indivíduo a
estereótipos. Apesar de sua linguagem codificada, que pode ser explicitada através
de ferramentas como a análise do discurso, ela é mais acessível ao consciente do
que a linguagem visual. Através da educação visual, é possível entender como os
aspectos formais são lidos, percebidos e articulados. Assim também funciona com
os conceitos de gênero. Uma vez compreendido que se trata de um conceito
socialmente construído, é possível liberar amarras e aceitar que a expressão
individual é a reflexão do ser, que as pessoas são diversas e não redutíveis. Com o
uso dos elementos visuais e do discurso, as marcas são capazes de promover
mudanças de inclusão ou exclusão de gênero. O designer consciente sobre o uso
das visualidades pode trabalhar como uma ferramenta de alerta e sugestão de
mudança, entretanto sua atuação fica limitada às escolhas estratégicas das marcas.
Cabe a elas a escolha de alinhamento com a mudança que desejam promover.
Para compreender como as marcas Natura e Boticário utilizam cor, tipografia,
forma e textura ao distinguir gênero, o trabalho de conclusão foi realizado em três
etapas: a primeira apresentou as análises formais das embalagens com base na
teoria explicitada; a segunda ocupou-se em contextualizar a apresentação dos
produtos no portal e verificar a semântica trazida pelos textos descritivos, e a
terceira, trouxe à tona a percepção de um público diverso sobre as visualidades.
A todas elas foi dedicada grande atenção, entretanto, o maior rigor e enfoque
é reservado às descrições formais, pois estas ocupam um papel chave: ressaltam a
importância dos critérios citados e o seu impacto na expressão de gênero individual
através das visualidades e materialidades. Eles comunicam valores e prioridades
das marcas e afetam profundamente a percepção de seu público e as construções
sociais de gênero. A Análise de Conteúdo e as entrevistas de validação
122
7. REFERÊNCIAS
DONDIS, Donis A. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
LUPTON, Ellen. Pensar com tipos. Nova Iorque: Princeton Architectural Press,
2004.