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in my life.

— So how could I dance with another…? — A sua voz era baixa, mas perceptível, cantava
num tom até animado, se lembrando da própria música. — Oh, when I saw her standing
there..

— É uma ótima música.

Se assustou quando ouviu a voz próxima ao seu corpo, se ergueu da cadeira e olhou para
trás, procurando por aquele que havia iniciado a conversa. Michelle Addams, uma
empresária de pouco sucesso que tinha nenhum projeto em mãos, mas estava a cargo para
ter o projeto da banda nelas, era uma ótima mulher e estava destinada a ser uma ótima
empresária também - se não fode-se com tudo, claro.

— Te ouvi lá de dentro. — Insinuou apontando com a mão, o que a fez olhar para o vidro
que separava a sala de reuniões e a varanda.

— Mesmo? Achei que estava cantando baixo.

— Estava mesmo, só que eu não podia ignorar. — Deu um sorriso enquanto se levantava e
andava com a mesma para dentro.

A banda estava numa corda bamba, sem o seu baterista, não tinham muito o que fazer
tendo apenas cantores e tocadores de instrumentos de corda, eram praticamente inúteis
sem ter alguém que os conduzia naquele meio, o produtor chegou a pedir para que
mostrassem alguns garotos que tocavam, mas nenhum deles chegou a se encaixar nas
músicas, ou até mesmo com a banda, era tudo tão diferente que chegava a ser tenso, não
podiam tocar daquele jeito e o prazo estava cada vez mais próximo do fim.

— A gente podia ir beber em algum clube aqui por perto, para tirar um pouco dessa carga
que estão carregando.

Os meninos da banda estavam brincando do outro lado, dentro da sala da gravadora,


gritavam no microfone, mexiam em seus instrumentos, não paravam quietos, pareciam
crianças do jardim de infância, mas aquilo deixava tudo melhor, era a alma do que
realmente eram, de alguma forma, alguém tinha que estar contente com o que faziam,
mesmo que tivessem um buraco no meio do trabalho deles. No caso, a falta de alguém.

— Vou chamar eles. — Apertou o braço da empresária e andou a passos calmos até a sala
do outro lado do corredor, abriu a porta e deu de cara com eles, pulando e cantando com
todo o ar que tinham em seus pulmões.

Era estranho, a ausência dele era perceptível, mas a falta não.


— Laura? — Olhou em direção a George e balançou a cabeça, retomando ao que havia ido
fazer ali.

— Vamos em um clube com a “nossa” empresária. — Os três se apressaram a pegar os


seus casacos e seguirem para o elevador.

O clube era um dos mais visitados de Liverpool, mas naquele horário estava com o
público abaixo da média, talvez pelo frio que fazia do lado de fora, mesmo que dentro
estivesse quente como a companhia de uma fogueira, não era um dia típico.

Em um dos palcos que havia no lugar, um dos garçons se dirigia até uma bateria, chegava
a ser cômico a forma como nem sequer tirou o avental que usava, apenas se sentou na
pequena cadeira posta em frente ao instrumento e se preparou para tocar, as baquetas
sujas de tinta vermelha e laranja, davam um ar de juventude a pequena bolha que se
envolveu naquele espaço em particular, o rapaz se preparou, respirando fundo enquanto
olhava em algo no seu colo, bateu em um dos tambores com uma das baquetas, repetindo
o mesmo gesto só que em toda a bateria, formando um ritmo e assim uma música. Sabia
que era Twist and Shout.

Se apressou para se sentar com os outros, ainda prestando bastante atenção naquele
rapaz, ele parecia tão focado e ao mesmo tempo tão solto na sua própria bolha, ninguém
além dela prestava atenção, nem mesmo aqueles que pareciam trabalhar consigo.

— Ele é bom. — Frank comentou.

— Realmente. — Suspirou o McCartney, ouvir alguém tocando bateria ainda causava


certos arrepios nele. — Laura, vai lá descobrir quem ele é.

— Que? — Olhou incrédula para eles, os três pareciam de acordo com o que ele tinha dito,
balançou a cabeça tentando pensar se realmente faria o que havia sido pedido.

Sentiu uma mão em seu ombro, olhou do canto do seu olho e viu que era o mais novo
entre eles. — Vai lá, por nós.

— Vocês me devem algo.

O seu sapato batia contra o chão de forma calma, mas o som era alto e chamava a
atenção por onde andava, tentou não chamar toda essa atenção, mesmo que estivesse
indo diretamente para o palco onde o garçom tocava, ele ouviu, até porque parou de olhar
para os seus próprios movimentos para olhar para ela.

— Oi. — Em um sorriso desengonçado, ele olhava diretamente em seus olhos, chegando a


nem piscar direito.
— Oi! — De forma animada, se aproximou um pouco mais do palco, ele permanecia com a
mesma expressão de antes, totalmente imóvel, estava nervoso? Ou apenas tentando ser
educado? De forma assustadora, se pudesse ser sincera. — Me diga o seu nome.

— Richard William Bach-Stark, e a senhorita? — O viu puxando a cadeira para trás, saindo
de onde estava.

Soltou uma risada, era mesmo educado.

— Laura Denona. — Estendeu a sua mão na direção dele.

O aperto da mão dele era aconchegante, só que os calos dela eram preocupantes, ele
não parecia se preocupar com aquele fato em momento algum, era como se fosse tão
natural que já nem se lembrava que tinha.

— Laura, nome de origem latim, folha de loureiro, símbolo de vitória, glória e fama.

O mesmo passou pela garota e pegou a bandeja que tinha deixado antes de subir ao
palco, se direcionando para trás do balcão, os ombros encolhidos como se já tivesse
chamado atenção demais, de longe, conseguia o ver tentando se convencer de voltar para
onde ela estava, em meio às cadeiras altas do balcão, olhando para onde ia, e assim o fez,
deu meia volta e se direcionou para onde ela estava, as orelhas vermelhas e provavelmente
quentes, e aquele mesmo sorriso desengonçado nos lábios.

— Por que está tão interessada em mim?

— Você tocando me deixou interessada. — O mesmo soltou um riso, agora mais de perto
conseguia ver bem cada detalhe do seu rosto, era um rosto limpo, sem marcas, cicatrizes
ou até mesmo espinhas, os seus lábios eram cheios e o seu nariz era grande, maior do que
o de seus amigos e daqueles que conhecia.

Chegava a ser um charme, se pudesse dizer isso.

— Os homens daquela mesa tem a ver com isso?

Olhou para trás, todos da mesa que antes ocupava estavam olhando para os dois, nem
sequer conseguiam esconder, miseráveis.

— Tem.. — Puxou uma das cadeiras que estava ao seu lado para se sentar, se
aproximando mais do Stark. — Eu faço parte de uma banda, e estamos à procura de um
baterista.

— E se interessaram por mim? Com tanta gente boa por aí? — O desprezo próprio era
evidente, mas não conseguia tirar aquilo que ele tocou da sua cabeça nem se quisesse.

— Eu quero você, você só tem que me dizer se iria gostar.


— De você eu iria, da banda eu preciso ver ainda. — As bochechas do moreno tomaram
outra cor, tinha medo que as suas também tivessem da mesma forma, só que teve pouco
dessa visão dele porque se virou para pegar algumas garrafas de cerveja, e se dirigiu para
fora do balcão. — Vão querer marcar algum dia para me ver?

— Quando você conseguir, está ótimo.

— Se estiver com tanta pressa, eu posso aparecer hoje mais tarde.

O relógio já marcava as nove horas, se o mais tarde dele realmente fosse mais tarde,
talvez tivessem que esperar até a madrugada para ter algo do garçom-baterista, mas
poderia valer a pena toda a espera, nunca saberiam se não o fizessem.

— Pode ser, aqui o cartão do prédio. — Retirou do bolso e deixou exatamente em sua mão,
se distanciando com um sorriso, que era compartilhado por ele. — Obrigada, Rick.

— Foi nada! — Riu enquanto voltava a conversar com os seus amigos.

Os seus olhos se fechavam quando ouviu o elevador do fim do corredor se abrir,


lentamente os abriu e pode ver a figura do baterista do outro lado, o produtor fez o trabalho
de ir abrir a porta pro rapaz, que se apresentou assim que o viu, não conhecia ninguém
além da garota, só ela sabia quem ele era.

Com certa pressa, todos os membros da banda se uniram dentro da cabine de gravação,
esperando para que o rapaz também entrasse.

— Vocês podem escolher a faixa, só apresentem a bateria pra ele.

O vocalista pegou o ar da graça e segurou no braço do homem, o encorajando a ficar


próximo da bateria, os outros já sabiam exatamente o que ele iria fazer e seguravam os
risos.

— Richard, essa é a bateria, bateria, esse é o Richard. — Todos soltaram as risadas que
estavam fazendo esforço para prender, sendo repreendidos pelo empresário, iriam colocar a
banda em ação. — Inclusive, sou o Frank.

— Eu sou o Ben, e ele é o George, o nosso caçula.

— Oi, eu sou o Richard.

— Já sabemos quem você é, Richard, agora por favor se organizem. — O Eastman estava
esperando por aquilo há horas, mas sabia que ele estava com esperança que aquele fosse
o garoto certo para estar no Anomia, as suas esperanças eram carregadas desde que o
Mansell se foi, e talvez aquele fosse um ótimo momento para soltar elas.
Com as guitarras e baixos seguros nos braços e em seus pescoços, os microfones
diretamente direcionados para eles, o que mais poderiam tocar além de Twist and Shout? A
música que tinha escutado o baterista tocar mais cedo naquela noite.

Com o movimento das cabeças, que dançavam com a música, e os pés que batiam em
sincronia com o ritmo, o Stark sabia exatamente o que fazia com as suas baquetas, sabia
que estava tocando certo, se conectando com os outros membros da banda da sua
maneira, e sem que percebesse, os conduzia a partir dos seus toques. Aquele era o
momento que podiam respirar calmamente, porque agora não precisavam mais correr atrás
de alguém, não precisavam preencher uma vaga que os assombrava, porque ela estava
sendo ocupada naturalmente por aquele cara, era só ver a forma como todos estavam
sintonizados, dançavam, cantavam e se olhavam, como se tocassem há anos.

— Achamos, Michelle.

— Achamos.. — Um sorriso apareceu no lábio do produtor e da empresária, em especial


na mulher que ordenava a banda, porque agora sabia que iria os fazer decolar para a fama.

— Nove. — Os papéis jogados na mesa mostravam que estavam ocupados e até sem
saber o que fazer. — Temos nove faixas até agora.

— E você acha pouco?

— Para um álbum de lançamento? Sim. — Deu uma olhada séria em direção ao


McCartney, só que ele continuou sério, sabia que ele era metódico em relação ao que fazia,
mas não daquele jeito, era a sua forma de trabalhar.

— Olha, eu acho nove um ótimo número, temos composições de basicamente todos os


membros da banda. — A Addams tentava convencer o rapaz, mesmo que ele não
comprasse tanto o que dizia, sabia que até poderiam adicionar mais músicas, mas será que
ficariam tão boas quantas as que já estava? Com aquelas já poderiam provar que podiam
ter espaço no cenário musical. — Por que não nomeiam de novo todas as faixas?

— Deixa comigo! — O mais novo se levantou da mesa em que estava sentado e tirou o
papel das mãos do baixista, se dirigindo pro centro da sala, onde era visível para todos os
que residiam nela. — A faixa de entrada do álbum “THE Mania”, é I Saw Her Standing
There, em diante, All I’ve Got To Do, Hold Me Tight, Roll Over Beethoven, I Wanna Be Your
Man, Not A Second Time, I’m Happy Just To Dance With You, Tell Me Why, Do You Want To
Know A Secret e Twist and Shout.

— Está ótimo, é o nosso primeiro álbum, a gente coloca mais na próxima, seu cabeçudo.
— A Denona mexeu no cabelo do mais velho, vendo um bico se formando nos seus lábios,
havia sido vencido e estava tudo bem, porque iria ter mais tempo para compor.
Agora apenas tinham que gravar as músicas que faltavam, e completar a lista de nove
faixas, o que era a parte mais divertida, a mais fácil iria ser a parte em que o empresário iria
ter que fazer, tornar a banda famosa pela sua lábia.

Enquanto viajava nos próprios pensamentos, pensando sobre como tudo poderia ser
daquele momento adiante, o Lillard se aproximou dela, com uma cadeira em mãos se pôs
ao lado dela, a observando em silêncio enquanto ela fritava a própria cabeça, era uma
ótima inspiração a ter do seu lado, era como se tivesse sua própria musa e não tinha que
quebrar o seu coração para se deleitar da sua mente, para poder se sentir criativo, se ela
sorrisse, conseguia escrever um verso inteiro sobre, quem não sabe uma composição
inteira, apenas deleitando do seu sorriso.

— Sabia que pode falar além de admirar? — A garota se virou em direção ao rapaz, que se
aproximou ainda mais dela, tentando ver o que tinha no caderno que segurava.

— Quero que ouça as composições que fiz te admirando. — Balançou a cabeça como se
concordasse com ele, mas parou ao realizar o que havia sido dito, ele realmente tinha algo
para ela? — Eu estou falando sério, se é isso que está pensando.

— Alguma música no álbum é pra mim?

O Lillard olhou em volta, observando se todos estavam ocupados demais com o seu
próprio mundo, se ninguém estava de olho na conversa dos dois, ou da aproximação deles,
no fundo sabia que todos pensavam que era comum, todos eram assim uns com os outros,
retornou a sua visão para ela, e em um movimento inesperado, deixou um selar nos lábios
dela, algo que ficasse apenas entre os dois - porque só eles teriam prestado atenção. Ou só
ele prestou atenção, ela ainda o olhava com aqueles olhos castanhos ligeiramente
arregalados, ainda atônitos sobre o que havia acontecido.

— Não, mas eu tenho algumas composições pro próximo álbum.

— Ganancioso, não? Pensar que podemos fazer um segundo álbum.

— Você sabe que vamos, Laura, e eu vou poder cantar elas pra você. — Piscou em sua
direção e se levantou, percebendo a movimentação de George em direção a ela, a Denona
se afundou na cadeira tentando se enganar sobre o que havia acontecido, escondendo o
sorriso bobo que havia permanecido.

Poderia se questionar sobre aquilo o dia inteiro, ficar se olhando no espelho e entender o
por que, olhar para dentro da sua alma através dos seus olhos e pensar, como? Se bem
que nem sequer sabia a pergunta direito, imagina a resposta, estava perdida na sua própria
cabeça e nem o seu melhor amigo iria conseguir a tirar daquela bolha interminável.

— Terra chamando Laura?

— Laura não está disponível, quer conversar com outro profissional? — Em meio a risos
contidos, ambos voltaram a um silêncio aconchegante, ele não tinha visto nada, ela viu
demais, ela sentiu demais, e iria continuar no próprio silêncio.

— E agora com vocês, THE ANOMIA!

O som do microfone sendo deixado de lado pelo “apresentador” daquela noite foi
escutado até por eles que estavam fazendo o seu caminho até o palco, os finos corredores
que não conseguiam passar um do lado do outro, mas que ainda assim trazia aquele frio na
barriga de ser um show, aquela sensação do estômago queimando porque sabiam o que
estava por vir, as mãos suando, porque sabiam que estariam em frente a um público, e se
tivessem sorte, não seria poucas pessoas - seria de fato uma plateia.

Era um bar, mas não deixava de ser um palco onde iriam se apresentar, ainda havia
pessoas esperando para que os novatos tocassem e mostrassem o seu valor, visto que não
fazia nem vinte e quatro horas que o álbum tinha sido lançado, não sabiam se estava indo
bem, se havia vendido algo, ou se estava tendo total rejeição dos críticos, estavam prontos
unicamente para aquele momento, onde não era a primeira vez, mas era o lugar que tinham
se apresentado pela primeira vez, o peso era maior. Agora eram adultos.

— One, two, three, four! — O forte sotaque do garoto de Liverpool se fez presente, as
principais vozes da música eram o McCartney e a Denona, principalmente ela, mas os dois
se levavam juntos.

Eram os únicos com culhões o suficiente para gritar até os pulmões caírem quando
estavam no palco, era parte da música, o que podiam fazer? Liberdade de expressão, se
podiam chamar assim.

As pessoas se embalavam no que acontecia no palco enquanto a música ia se


distanciando do seu início, os gritos da plateia eram ouvidos quanto mais ficavam soltos
com ela, aos poucos dançavam sem se importar com quem estivesse ao seu lado, a
vontade de fazer e o momento pareciam mais importantes do que qualquer outra coisa,
aquela música era o que não tinham a tanto tempo.

— Acho que estão gostando. — Bernard dizia com um sorriso, enquanto recuava para que
a sua voz não pegasse no microfone.

— Gostando? Se manca, estão aos nossos pés. — Podia parecer arrogante o que Frank
tinha dito, mas era a realidade, estavam quase caindo por um pedaço deles, por eles e pela
sua música, queriam tudo.

— Então vamos dar a eles o que querem.

Os quatro tocaram o dó maior ao mesmo tempo, começando mais uma música.

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