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Escola Superior Pedagógica do Bengo

Departamento de Ensino e Investigação Científica de Letras Modernas

U.C: Literatura Africana em Expressão Portuguesa

Análises textuais – Periodização da Literatura de Cabo Verde

3º Ano
Diurno
Autores:
Adelina Somassenje
Aurora Bilhete
Celma Numa
Elisandra Miranda
Emanuel Sambumba
José Morais
Manuel Miguel
Marinela Camões
Valdemiro Bernardo

A Docente
_________________________
Yolanda Viamonte

Caxito, 2023
ÍNDICE

1º período - Iniciação.......................................................................................................................1

2º Período - Hesperitano..................................................................................................................2

Análise do poema Panorama de Jorge Barosa.............................................................................3

3º Período – Claridoso.....................................................................................................................5

4º Período.........................................................................................................................................7

5º Período - Universalismo..............................................................................................................8

6ª Período - Consolidação................................................................................................................9
1º período - Iniciação

(Vavá)

O Romance "O escravo" de José de Almeida é o marco da literatura caboverdiana. A


obra foi publicada no período da iniciação, este que foi um período marcado pelo abaixo
romantismo(realismo) e pelo parnasianismo. Neste período, as produções literárias eram
marcadas pelo regionalismo, culto a natureza e valorização do homem indígena das Ilhas de
Cabo Verde, características que são observadas ao longo do romance.

Para sustentar a nossa análise trouxemos o excerto da primeira parte do romance


intitulada “João- O escrava”, onde é claro ver logo no começo da narrativa o regionalismo,
pois, o autor descreve a região das Ilhas de Cabo Verde e lá mais para frente faz um leve
comparação de Cabo Verde à Europa.

Ainda neste excerto, fica vísivel a descrição da natureza caboverdiana nas expressões "
Em 1835, ali não havia, nem as azedinhas, nem as ameixoeiras".

O Narrador não só olha para a natureza e para região cabo-verdiana, mas olha também
para o habitante da terra, o homem cabo-verdiano, faz uma caracterização do mesmo e chama-
lhe de indígena para dizer que este homem é nativo da região.

O texto também foi muito influenciado pelo parnasianismo, quanto a sua estrutura e a
linguagem muito objectiva que o narrador traz e também pela maneira detalhada como a
narrativa e feita. Ele, o narrador, preocupa-se em situar o tempo e a região da narrativa de forma
minuciosa e detalhada.

1
2º Período - Hesperitano

(Marinela)

Oh mar eterno sem fundo sem fim

Oh mar das túrbidas vagas oh! Mar

De ti e das bocas do mundo a mim

Só me vem dores e pragas, oh mar

Que mal te fiz oh mar, oh mar

Que ao ver-me pões-te a arfar, a arfar

Quebrando as ondas tuas

De encontro às rochas nuas

Suspende a zanga um momento e escuta

A voz do meu sofrimento na luta

Que o amor ascende em meu peito desfeito

De tanto amar e penar, oh mar

Que até parece oh mar, oh mar

Um coração a arfar, a arfar


Em ondas pelas fráguas

Quebrando as suas mágoas

Dá-me notícias do meu amor

Que um dia os ventos do céu, oh dor

Os seus abraços furiosos, levaram

Os seus sorrisos invejosos roubaram

Não mais voltou ao lar, ao lar

Não mais o vi, oh mar

Mar fria sepultura

Desta minha alma escura

Roubaste-me a luz querida do amor

E me deixaste sem vida no horror

Oh alma da tempestade amansa

Não me leves a saudade e a esperança

Que esta saudade é quem, é quem

Me ampara tão fiel, fiel

E como a doce mãe

Suavíssima e cruel

Nas mágoas desta aflição que agita

Meu infeliz coração, bendita!

Bendita seja a esperança que ainda

Lá me promete a bonança tão linda

Fugénin Tavares

O poema a ser analisado, pertence ao segundo período da literatura de Cabo Verde,


intitulado Mar Eterno.

Este poema refere-se ao clamor de uma pessoa que perdeu a sua pessoa amada.
Neste poema o eu lírico vê o mar como responsável pela separação da pessoa amada, o eu
lírico está triste com apátrida do seu amado e faz súplicas ao mar que se acalme e ouve o seu
clamor e que o traga de volta. O eu lírico ainda pede notícia dos seu amor.

Neste poema, podemos notar a influência da literatura europeia, visto que neste período
os autores buscavam algumas influências do colono para escrevem os seus textos. Este poema
remete-nos a época medieval, mas, primeiramente as cantigas de amigos, onde uma donzela se
dirigia à natureza para saber notícias do seu amigo.

O poema está dividido por 9 estrofe cada uma possui 4 versos, o poema não possuí
métricas, possui rimas.

Análise do poema Panorama de Jorge Barosa


(Zezinho)

Panorama

Destroços de que continente,

de que cataclismo,

de que sismos,

de que mistérios?…

Ilhas perdidas

no meio do mar,

esquecidas

num canto do mundo

- que as ondas embalam,

maltratam,

abraçam…

montes alérta

implorando ao céu!

Montes alérta

nos seus contorcionismos estáticos

de séculos

rindo para o oceano gargalhadas


que ficaram apenas começadas,

sorrindo para o céu esgares enigmáticos

como que evocarem o drama milenária…"

O texto a ser analisado tem como título “Panorama”, que é um dos poemas pertencentes
da obra Arquipélago, de Jorge Barbosa, publicado em 1935, no final do período Hesperitano.

Jorge Barbosa, com a publicação da sua obra Arquipélago em 1935, marcou uma nova
era na literatura cabo-verdiana, podemos falar a partir daí de uma literatura cujo tema principal
diz respeito ao homem cabo-verdiano e às ilhas. Jorge Barbosa, no seu poema “Panorama”,
demonstra preocupação com as origens, possivelmente recorrendo ao mito da Atlântida ao
questionar a origem das ilhas como podemos constatar no seguinte excerto: “Destroços de que
continente/ de que cataclismo, / de que sismos, e de que mistérios?...”. Para preencher o vazio
que as origens das ilhas deixam, a sua interrogação traz-nos a sugestão da lenda da Atlântida,
que se reporta a um continente que teria sido submerso no meio do oceano Atlântico Através
dessas interrogações Jorge Barbosa busca os fundamentos míticos que alicerçaram a matriz
cabo-verdiana.

O texto também pode nos remeter para as origens, não só das ilhas, como também, à
busca das raízes do homem cabo-verdiano. Neste poema o sujeito poético procura desvendar,
através de uma série de perguntas o mistério que é a origem das ilhas de Cabo-Verde e as suas
raízes. Podemos pressupor que o sujeito poético ao indagar sobre a origem e a identidade destas
ilhas estará a indagar sobre a sua própria origem e identidade como homem cabo-verdiano.
Acreditamos também que este poema faz alusão ao mito milenário da Atlântida. Ainda no texto,
podemos encontrar outras marcas predominante do período Hesperitano como o regionalismo,
como pode ser confirmado no seguinte excerto: Ilhas perdidas no meio do mar, esquecidas num
canto do mundo que as ondas embalam, maltratam, abraçam...”.

Nesse excerto, podemos perceber que o sujeito poético valoriza e aprecia aquilo que é o
arquipélago ou as ilhas de cabo-verde. Apesar da relação que o mar estabelece com a ilha seja
familiar, ela é carregada de contradição, é o mar que determina o isolamento, agravando assim as
condições de vida, mas por outro lado faz-se presente, tanto para embalar com o som das suas
ondas batendo nos rochedos, como para ligar as ilhas ao mundo retirando-as assim do
isolamento. Percebe-se que o mar é o elemento provocador desta realidade, tanto cria o
sentimento de prisão como também é visto como o caminho para a saída do isolamento.
3º Período – Claridoso

(Adé)

Partir,
deixar a ilha tão pequena
que o vento nómada
bafeja
e as ondas do mar rodeiam.
Fugir,
buscar terras mais ao longe
onde a alma errante caminhe.
Partir,
deixar na terra o canto duma morna
que o emigrante recorde.
Fugir,
deixar no mar o sulco branco
da hélice do vapor,
que as vagas mansas
apaguem (...)
(In Certeza, n°1. 1994 apud. Ferreira, 1975: 138)

Neste poema, o sujeito poético manifesta do desejo de sair e ir a procura da realização


dos sonhos. Nota-se o escapismo(2ª estrofe) atitude comum na época, onde os escritores
buscavam na imaginação as situações consideradas por eles ideiais para fugir dos problemas
instalados no Arquipélago. O Mar aparece como liberdade ou a porta para salvação dos
problemas do sujeito poético (última estrofe) Atitude comum na época, onde os Autores olhavam
o Mar por um lado como prisão impedindo seus sonhos, e por outro lado, o convite à saída.

(Lola)

Mares

Em que navios esguios

Chamam para as aventuras sempre moças

Dos destinos inatingíveis

Palácios adormecidos em aristocráticos silêncios....


Eu sou o cavaleiro moço

Que todos os dias parte em cruzadas

Para as miragens dos poentes do mar

Meu cavalo de vagas altas

Tem nas pernas a insatisfação da distância!...

Análise

A evasão foi a forma encontrada pelos poetas da geração da claridade para denunciar a situação
de abandono a que o arquipélago se encontrava, através do sonho , eles mostravam que era
possível viver em outras condições bem diferentes.

A análise deste poema, é uma das partes da o obra de Baltasar Lopes , um dos fundadores da
revista Claridade.

No poema, o primeiro verso rima com o quarto verso e são versos brancos.

4º Período – Cabo-vernitude

(Celma)

QUEIXUME

Tu minha terra
dá-me dedos novos
para dedilhar a lira quebrada
e dá-me um espírito novo
para apreciar a estrela que se apagou

Roubaram meu brinquedo


meu brinquedo mais rico
aquele que sempre trouxera
no mais fundo de mim
Depois disseram-me
que era para meu bem
mas eu sei que não é verdade

Dondê a esperança
que animava meu espírito
nos momentos de crise

Dondê a esperança
que me dava forças
nos anos de seca
Roubaram meu brinquedo
(deixaram-me sem nada)

Dá-me minha terra


dá-me dedos novos
para dedilhar a lira quebrada
e dá-me um espírito novo
para apreciar a estrela que se apagou

Roubaram meu brinquedo


meu brinquedo mais rico
aquele que sempre trouxera
no mais fundo de mim
Depois disseram-me
que era para meu bem
mas eu sei que não é verdade
Roubaram meu brinquedo
(deixaram-me sem nada)
O poema em análise é intitulado “Queixume”. Foi extraído na obra Caminhada de
Ovídio Martins. Esta obra faz parte do 4º período da literatura Cabo-verdiana denominado Cabo-
vernitude.

Queixume é um poema branco ou poema de versos soltos, pois, os versos não rimam.

Ao olharmos para o próprio título (Queixume) percebemos que o eu lírico transmite


algumas lamúrias que infelizmente não eram ouvidos naquela época em que o colonizador tinha
poder sobre o arquipélago. O poema teve influência de um dos temas do suplemento cultural de
Cabo Verde que são problemas endêmicos que assolam o arquipélago. O eu lírico transmite o
desejo de voltar as origens, pois, com a presença dos colonizadores, perdeu-se parte de suas
culturas, podemos afirmar com os dois últimos versos “E dá-me um espírito novo/ para apreciar
a estrela que se apagou?”

5º Período - Universalismo

Nelito

ANTI-EVASÃO

Pedirei
Suplicarei

Chorarei

Não vou para Pasárgada

Atirar-me-ei ao chão

e prenderei nas mãos convulsas

ervas e pedras de sangue

Não vou para Pasárgada

Gritarei

Berrarei

Matarei

Não vou para Pasárgada

A poesia de Ovídio Martins - Gritarei, Berrarei, Matarei, Não vou para Pasárgada (1973)
- é uma poesia que homenageia o camarada poeta João Vário.

Esta poesia é um canto de amor e luta que representa uma constante obsessão pela
libertação, rejeitando o conformismo, reacionária dos problemas que alastram a personalidade do
africano insular de Cabo Verde.

Associando o poema ao período correspondente (5.º período) uma das marcas que
podemos encontrar é a "liberdade de escrita", ou seja a liberdade do poeta escrever do modo que
lhe prouver, sem comprometimento ideo-político no texto.

Basta observar nos versos seguidos do poema, principalmente nas expressões repetidas:
Não vou para Pasárgada, o pensamento e a resistência do autor sobre a sua decisão, com que
significar que aconteça o que acontecer, não há nada que mude a sua posição.

Uma outra marca é o regionalismo e a Cabo-verdianidade presente nos poemas do 5.º


período. Embora não mencionado directamente neste poema, Ovídeo Martins deixa claramente a
valorização de Cabo Verde quando afirma sobre a sua permanência e não deslocação para
Pasárgada fazendo citações de coisas que podia fazer ao invés de sair da sua região.
Ainda sobre a liberdade do poeta escrever "livremente" aquilo que pensar, podemos dar
este período como o da liberdade do autor, pois os textos destes períodos apresentavam
pensamentos singulares dos autores e é aqui onde surge a primeira escritora: Orlanda Amaríls.

6ª Período - Consolidação

(Sambumbinha)

“Passaporte para Pasárgada” é o poema introdutório do capítulo intitulado Itinerário de


Pasárgada que constitui a obra Cântico da manhã futura (1986), obra que marca abertura do
sexto período da Literatura de Cabo-verde. Diferente do poema analisado no período anterior
(Anti-evasão, de Ovídio Martins), e do mesmo modo que “Vou-me embora pra Pasárgada”, este
poema tem como mote o desejo de fuga para o lugar distante como forma de sair do lugar
indesejado e das frustrações de um “aqui” opressor.

Pasárgada não é lugar comum.

Lá quem manda é o Rei,

que é amigo dos horizontes

e ouve as cantigas que os meninos cantam

na Rua Direita e na Rua do Sol.

Quem tem ouvidos e oiça, que vá.

Os surdos não entram em Pasárgada.

Os surdos, entrego-os na misericórdia de Cristo,

que os há-de aperfeiçoar para a próxima reincarnação.

Nesta não entram em Pasárgada.

Já propus ao Rei que não concedesse o visto

a quem não foi à pedreira

arrancar uma pedra para Pasárgada.

Os surdos não entram em Pasárgada.

Oh! Rei! Pela tua magnificência,

concede mãos aos homens


para poderem ser cidadãos de Pasárgada.

Dá-lhes o martelo e a marreta das catedrais,

Para que a Poesia nasça das suas mãos!

O poema retoma os topos Pasárgada de Manuel Bandeira, mantendo principalmente o


tema da evasão. O desejo de fuga para outro lugar nesse poema de Osvaldo de Alcântara também
é decorrente da recusa do “aqui” e do “agora”.

[...] pasargadismo (criticado nos anos 60) 2 . neologismo retirado


da Pasárgada do poema homónimo de Manuel Bandeira, que não
era para Osvaldo Alcântara senão o lugar da utopia, da felicidade
(outra forma simbólica de Éden. Eldorado ou Terra da
Promissão), não representando um sentimento de renúncia ou
fuga à realidade, antes a recusa da situação sócio-histórica.
aspirando a uma «manhã futura» diferente (cf. «Itinerário de
Pasárgada») 3 : «Pasárgada não é lugar comum»: «Em Pasárgada
tem tudo/lá é outra civilização». (Laranjeira, 1995, p. 203)

Na primeira estrofe do poema, o eu poético apresenta Pasárgada, deixando claro que o


território “não é lugar comum”. Trata-se de uma cidade específica e governada por um rei que se
revela amigo da liberdade, e também daqueles que ecoam suas vozes em prol de novos ideais.

O interessante é que, nesse contexto, o “passaporte” se inscreve como objeto de ironia.


Pensar o passaporte enquanto documento oficial emitido por um órgão público formal, que
permite um visto para a movimentação de pessoas em territórios internacionais, como condição
para a entrada em Pasárgada se torna uma situação um tanto cômica, porque se estabelece a
obrigatoriedade de ter em mãos esse documento, como exigência para entrada numa cidade que
não existe.

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