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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA

EMPREGO DE PRÓTESE EM FRATURA DE CARAPAÇA DE Chelonoidis


carbonarius (TESTUDINES: TESTUDINIDAE): Relato de caso

Dara Evely Vieira da Costa


Orientadora: Profa. Dra. Líria Queiroz Luz Hirano

BRASÍLIA - DF
NOVEMBRO/2020
ii

DARA EVELY VIEIRA DA COSTA

EMPREGO DE PRÓTESE EM FRATURA DE CARAPAÇA DE Chelonoidis


carbonarius (TESTUDINES: TESTUDINIDAE): Relato de caso

Trabalho de conclusão de curso de


graduação em Medicina Veterinária
apresentado junto à Faculdade de
Agronomia e Medicina Veterinária da
Universidade de Brasília.

Orientadora: Profa. Dra. Líria Queiroz


Luz Hirano

BRASÍLIA - DF
NOVEMBRO/2020
iii

Ficha Catalográfica

Cessão de Direitos

Nome do Autor: Dara Evely Vieira da Costa

Título do Trabalho de Conclusão de Curso: Emprego de prótese em fratura de


carapaça de Chelonoidis carbonarius (Testudines: Testudinidae): Relato de caso

Ano: 2020

É concedida à Universidade de Brasília permissão para reproduzir cópias desta


monografia e para emprestar ou vender tais cópias somente para propósitos
acadêmicos e científicos. O autor reserva-se a outros direitos de publicação e
nenhuma parte desta monografia pode ser reproduzida sem a autorização por
escrito do autor.

__________________________
Dara Evely Vieira da Costa
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v
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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus, durante toda a minha trajetória de vida Ele


foi quem sempre me ouviu durante minhas crises, me consolou nos choros durante
as noites, me acalmou, me deu forças e me ajudou durante toda a minha graduação
quando eu achava que não conseguiria, sem Ele eu não conseguiria ter chegado
aonde cheguei.
Quero agradecer minha mãe Heverlly por TODO o amor, apoio e
compreensão, sem você eu nada seria, ao meu irmão João pelo companheirismo,
aluguéis de ouvido, por acompanhar minhas esquisitices durante esta trajetória, ao
meu primo Marconi por ser esse ser iluminado que sempre buscou me ajudar
durante a faculdade, ao meu tio Nem por existir e sempre alegrar meus dias em
casa, me tirando um pouco do estresse da rotina universitária. Quero agradecer ao
meu namorado, parceiro e melhor amigo, Henrique, por todo carinho, amor e
paciência que teve comigo durante minhas crises da faculdade, aos conselhos, aos
abraços, em praticamente tudo que fez e faz por mim, mal você sabe, mas é uma
peça fundamental da minha vida e nesta graduação.
Aos meus filhos e filhas de quatro patas que me ensinaram e continuam
ensinando cada vez mais a amar, respeitar e compreender os animais, vocês foram
minha motivação maior para escolher esse curso maravilhoso, meu eterno obrigada
Kyara (in memoriam), Dante (in memoriam), Pepita (in memoriam), Benji, Lord,
Luna, Lola, Bella, Mia, Lucy e Mel. Tuiny e Mimi, agradeço vocês também, por terem
sido minhas primeiras filhas e aberto esse caminho para mim, desejo o melhor
aonde estiverem.
Aos meus amigos que a UnB me deu e que o tempo cruelmente nos separou,
mas que isso não nos impediu de continuar cultivando uma amizade maravilhosa e
acolhedora, muito obrigada por todos os momentos de carinho, estudos, trabalho e
surto coletivo, Ananda, Weslley, Nathália, Fernanda, Michelly e Moira, minhas boas
memórias pela UnB são graças a vocês. Ari, Carol, Vivi, Lívia, Tarcísio muito
obrigada pelos aluguéis e apoio durante as provas, se eu cheguei aqui é por que
vocês me ajudaram!
Aos meus amigos do Setor de Silvestres por dividirem a rotina, as
reclamações, as vivências, congressos, palestras, pelas palavras de apoio, todo o
vii

ambiente agradável que se formou no setor foi graças a vocês, Raíssa, Bruna,
Arthur, Paulo, Fernanda, Letícia, Elane, Evelyn, Victor, Glabis e Thais.
Aos residentes por terem compartilhado todo o tipo de experiência comigo,
pelas conversas e brincadeiras, sou grata por todos que passaram por mim durante
o PIBEX, muito obrigada pelo apoio Ariam, Lenon, Carol, Júlia, Cecília, Guilherme,
Hed, Nicolas e Paula, vocês são demais.
Quero agradecer especialmente ao César Leão, por toda ajuda,
disponibilidade e boa vontade desde o primeiro semestre até a realização do meu
TCC. César você possui um dom magnífico, habilidades maravilhosas, você é uma
pessoa super talentosa e que merece todo o reconhecimento do mundo pelo
trabalho que você faz, que de longe dá para ver que é feito com todo amor e carinho.
Sem você esse TCC nem sequer seria pensado, muito obrigada!
Quero agradecer muito a todos do Plantão Veterinário pela paciência,
compreensão, pelas conversas, distrações, por me fazerem pegar na massa e
praticar, por compartilharem suas experiências comigo, muito obrigada Mayara,
Beto, Jefferson, Antônio, Reinaldo, Eudes, Marcílio, Kalinin, Nelson, Anne, Angelina,
Manuela por todo aprendizado, com certeza levarei para o resto da vida.
Quero fazer um agradecimento especial à minha orientadora, Líria Hirano,
que me possibilitou adentrar no universo dos animais silvestres, que desde o início
da minha graduação eu tinha vontade de conhecer. Muito obrigada por ter me
aceitado como sua orientanda, por ter a divina paciência com a minha pessoa e com
meus pequenos surtos sobre as coisas, muito obrigada por todo o aprendizado, por
ser essa pessoa maravilhosa que é e que admiro tanto e sempre admirarei,
basicamente tenho que te agradecer por toda a luz que me deu neste final de
graduação, serei eternamente grata!
viii

SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS ............................................................................................ix

LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS ................................................................xi

CAPÍTULO 1 - REVISÃO DE LITERATURA ....................................................... 1

RESUMO ............................................................................................................. 1

ABSTRACT ......................................................................................................... 2

1 Anatomia do casco ......................................................................................... 3

2 Abordagem terapêutica inicial de fraturas de casco ................................... 6

3 Métodos e materiais de reparo....................................................................... 8

3.1 Fio de aço ..................................................................................................... 8

3.2 Resina epóxi ................................................................................................. 9

3.3 Métodos de pontes..................................................................................... 10

3.4 Prótese ........................................................................................................ 12

3.5 Métodos Auxiliares .................................................................................... 13

Referências Bibliográficas .............................................................................. 15

CAPÍTULO 2 - ARTIGO ..................................................................................... 18

Emprego de prótese em fratura de carapaça de Chelonoidis carbonarius


(Testudines: Testudinidae): Relato de caso .................................................. 18

RESUMO ........................................................................................................... 18

ABSTRACT ....................................................................................................... 19

1 Introdução ...................................................................................................... 20

2 Relato de Caso .............................................................................................. 21

3 Discussão ...................................................................................................... 24

4 Conclusão ...................................................................................................... 26

Referências Bibliográficas .............................................................................. 26

CAPÍTULO 3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................... 28


ix

LISTA DE FIGURAS

Capítulo 1

Figura 1 - Ilustração de uma tartaruga-de-caixa-oriental (Terrapene carolina


carolina) com presença de uma articulação (seta) entre as fileiras de escudos
peitorais e abdominais do plastrão (HOLBROOK, 1841). ........................................4
Figura 2 – Nomenclatura dos escudos do casco de jabuti-piranga (Chelonoidis
carbonarius). Legenda: A: Carapaça; vista dorsal; B: Carapaça; vista caudal; C:
Carapaça; vista lateral. Azul: escudos vertebrais; Verde: escudos costais; Laranja:
escudos marginais; Vermelho: escudos nucais; Rosa: escudos supracaudais
(fusionados). D: Plastrão; vista ventral. Vermelho: escudos gulares; Verde: escudos
umerais; Azul: escudos peitorais; Roxo: escudos abdominais; Amarelo: escudos
femorais; Azul-claro: escudos anais; Rosa: escudos axilares; Preto: escudos
inguinais (Arquivo pessoal). .....................................................................................5
Figura 3 - Esquema em corte transversal da anatomia lateral de um exemplar fêmea
de testudine. Legenda: 1: Traqueia; 2: Bifurcação da traqueia para os brônquios
primários é cranial, a fim de facilitar a respiração contínua quando o pescoço está
flexionado; 3: Curva sigmoide dos brônquios, quando o pescoço é flexionado; 4:
Pulmões; 5: Timo, incorporando glândulas paratireoides cranianas; 6: Tireoide; 7:
Coração; 8: Aorta e glândulas paratireoides adjacentes; 9: Fígado disposto
centralmente na cavidade celômica; 10: Bexiga; 11: Urodeu; 12: Rim; 13: Ureter; 14:
Coprodeu; 15: Proctodeu; 16: Oviduto sendo visto por trás dos folículos imaturos do
ovário esquerdo; 17: Folículos maduros do ovário esquerdo; 18: Cólon descendendo
ao coprodeu (MCARTHUR et al., 2004). ..................................................................6
Figura 4 - Formas de utilização de fios de aço para fixação de fraturas de casco em
testudines. A e B: fraturas de carapaça fixadas com fios em hemicerclagem em
testudine (A) e Emydoidea blandingii (B) (ROFFEY & MILES, 2018; BARTEN, 2006).
.................................................................................................................................8
Figura 5 - Exemplos do uso de resina em Chelonoidis sp. A: fechamento de
plastrotomia cirúrgica (CUBAS, 2014); B: fixação de fratura não deslocada de
plastrão (Arquivo pessoal). .......................................................................................9
Figura 6 - Utilização do método de pontes para fixação de fratura em casco em
testudines. A: utilização de ganchos em testudine (ROFFEY & MILES, 2018); B: uso
de lacres e resina para fixação de fratura em carapaça em Phrynops geoffroanus
(Arquivo pessoal); C: associação de parafusos de aço inoxidável com fios de
cerclagem trançados em “8” e recoberto com fita adesiva para proteção do tecido
mole contra atrito em testudine (ROFFEY & MILES, 2018); D: uso de braquetes para
x

ancoragem de fios de aço de fratura de casco em crescimento em Chelonia mydas


(MARINELIFE, 2010)..............................................................................................11
Figura 7 - Próteses de carapaça confeccionadas em impressora 3D para
exemplares de Chelonoidis carbonarius. A: Esboço gráfico das projeções 3D de uma
prótese montada em quatro partes (BIDO, 2018); B e C: Animais com a prótese 3D
finalizada (MILÉSKI, 2016; COSTA & CASTRO, 2019). ........................................13

Capítulo 2

Figura 1 - Passo-a-passo da confecção da prótese de carapaça para Chelonoidis


carbonarius. A: Fratura consolidada em escudos vertebrais da carapaça. B:
Posicionamento do exemplar para a impressão da fratura em massa ortodôntica; C:
Primeiro molde em alginato. D e E: Molde de resina acrílica mimetizando a fratura.
F: Segundo molde para confecção da prótese de resina acrílica. G: Prótese de
resina acrílica. H: Prova da prótese no jabuti para moldagem. I: Prótese finalizada e
fixada na carapaça com massa epóxi. J: aspecto final da prótese após pintura com
tinta guache (Fotos de Hedermy Christiem Cerqueira de Paula Tessari)...............23
xi

LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS

3D Tridimensional
BID Duas vezes ao dia (do latim: bis in die)
CETAS-DF Centro de Triagem de Animais Silvestres do Distrito Federal
HVet-UnB Hospital Veterinário da Universidade de Brasília
IM Via intramuscular
kg Quilogramas
mg Miligramas
ml Mililitros
PDT Terapia Fotodinâmica (do inglês: Photodynamic Therapy)
SID Uma vez ao dia (do latim: semel in die)
UnB Universidade de Brasília
VO Via oral
CAPÍTULO 1 - REVISÃO DE LITERATURA

Dara Evely Vieira da Costa; Líria Queiroz Luz Hirano

RESUMO

A carapaça é composta de ossos recobertos por escudos queratinosos ou por tecido


adiposo. A estrutura óssea é inervada e vascularizada, de forma que quando
danificada, ocorre sangramento e pode ter comprometimento da movimentação do
animal. As fraturas podem ocorrer devido a atropelamentos, ataques de predadores,
quedas, pisadas, acidentes com cortadores de grama, hélices de barco, granizo,
problemas nutricionais, metabólicos e genéticos. O reparo do casco é importante
para prevenir o desenvolvimento de infecções e pode ser feito com diversos
materiais como fios de aço, braçadeiras plásticas, braquetes odontológicos, resinas
e próteses. A escolha da técnica varia de acordo com o tipo e extensão da fratura,
além das particularidades do paciente como origem, idade, espécie e condição
física. Juntamente com o reparo da fratura, é possível associar terapias
complementares, tais como terapia fotodinâmica, cicatrizantes tópicos e
ozonioterapia para um melhor resultado. O presente capítulo teve como objetivo
revisar a utilização de técnicas para restauração de casco em testudines, com
ênfase no emprego de próteses.

Palavras-chave: casco, ortopedia, restauração, répteis.


2

CHAPTER 1 - LITERATURE REVIEW

Dara Evely Vieira da Costa; Líria Queiroz Luz Hirano

ABSTRACT

The carapace is structured by bones covered with keratinous scutes or fat tissue.
The bone structure is innervated and vascularized, so when damaged, bleeding
occurs and may compromise the movement of the animal. Fractures can occur due
to various situations such as roadkill, predators, falls, treads, accidents with
lawnmowers, boat propellers, hail, and nutritional, metabolic or genetic problems.
Shell repair is important to prevent the development of infections and can be made
with different materials like steel wires, plastic clamps, seals, dental brackets, resins
and prosthesis. The choice of technique varies according to the type and extension
of the fracture, as well as the patient's particularities such as origin, age, species and
physical condition. Along with fracture repair, it is possible to associate some
complementary therapies such as photodynamic technique, topical healing and
ozone therapy for a better result. This chapter aimed to review the use of techniques
for shell restoration in testudines, with emphasis on the use of prosthesis.

Keywords: shell, orthopedic, restoration, reptiles.


3

1 Anatomia do casco

Répteis da ordem Testudines são amplamente conhecidos pela presença


de um casco que envolve a maior parte de seus corpos. Essa estrutura pode ser
dividida em duas partes, a carapaça na região dorsal, e o plastrão, ventralmente,
conectadas nas laterais por pontes ósseas. A carapaça possui cerca de 50 ossos
derivados das costelas, vértebras e elementos dérmicos, enquanto o plastrão
evoluiu das clavículas, interclavículas e gastrália, sendo a última considerada uma
espécie de costela abdominal (BOYER & BOYER, 2006).
A carapaça é composta de ossos recobertos por escudos queratinizados
ou por gordura (BAPTISTOTTE, 2014). As tartarugas de casco mole possuem pele
coriácea no lugar das escamas queratinizadas, o que torna essa estrutura mais
flexível, enquanto que as espécies marinhas possuem placas ósseas mais
delgadas, o que forma uma casca mista, com estrutura dura e coriácea (O'MALLEY,
2005).
O casco da maior parte dos testudines é recoberto por escudos
queratinizados, que possuem componentes epidérmicos e dérmicos. Os primeiros
estão relacionados com a produção de pigmentos, em que há a mistura de queratina
α e β. Os componentes dérmicos ficam sobrepostos aos ossos dérmicos e, na
junção entre os escudos, há camadas de células epidérmicas com presença de
células produtoras de queratina e as que irão repor novos tecidos córneos. O tecido
queratinizado geralmente é retido e colabora com a formação dos anéis típicos nos
escudos, de forma que a proliferação celular e a queratinização ocorrem de forma
contínua (JEPSON, 2016).
Os escudos se formam a partir da epiderme e são equivalentes às
escamas dos outros répteis. Os do tipo queratinizado não são perfeitamente
sobrepostos aos ósseos, mas se escalonam de forma que as suturas queratinizadas
não fiquem diretamente sobre as junções ósseas, o que reforça e fortalece o casco
(BOYER & BOYER, 2006; ROFFEY & MILES, 2018). Toda a estrutura óssea do
casco dos testudines é inervada e vascularizada, por isso, quando danificada,
ocorre sangramento e pode comprometer a movimentação do animal (BARTEN,
2006; JEPSON, 2016).
4

Algumas espécies de testudines, como as tartarugas-de-caixa


(Terrapene carolina) (Figura 1) possuem os escudos articulados, com dobradiças
de tecido cartilaginoso entre as suturas das placas ósseas, ao invés da junção
ossificada, as quais devem ser consideradas em procedimentos de reparação de
fraturas. Essas variações permitem o fechamento do casco (O'MALLEY, 2005)
como mecanismo de defesa do animal. Algumas espécies também utilizam essas
articulações para expandir o plastrão e possibilitar a passagem de ovos (BOYER &
BOYER, 2006).

Figura 1 - Ilustração de uma tartaruga-de-caixa-oriental (Terrapene carolina


carolina) com presença de uma articulação (seta) entre as fileiras de escudos
peitorais e abdominais do plastrão (HOLBROOK, 1841).

A nomenclatura dos escudos da carapaça é dada de acordo com a região


corporal do animal (BOYER & BOYER, 2006), que são distribuídos em três séries
de escudos córneos. A primeira série é a correspondente à linha sagital mediana,
composta pelos escudos vertebrais, dispostos craniocaudalmente entre o escudo
nucal, menor e mais cranial de todos, e o supracaudal, localizado na extremidade
oposta (Figura 2A e 2B). A segunda série é a costal, formada por grandes escudos
córneos distribuídos em duas fileiras laterais aos escudos vertebrais. A terceira é a
marginal composta por pequenos escudos que circundam a carapaça (Figura 2C)
(SOUZA et al., 2000).
O plastrão é recoberto por escudos córneos pareados e nomeados de
acordo com a região na qual se encontram. Em ordem craniocaudal são
denominados de guIares, umerais, peitorais, abdominais, femorais e anais.
5

Exemplares da subordem Pleurodira e os Cryptodira marinhos possuem ainda o


escudo intergular, localizado na extremidade cranial da linha sagital mediana do
plastrão. Na região lateral do casco, em sentido craniocaudal, há os escudos
axilares e inguinais, que formam pontes para a união da carapaça com o plastrão
(Figura 2D) (SOUZA et al., 2000).

Figura 2 – Nomenclatura dos escudos do casco de jabuti-piranga (Chelonoidis


carbonarius). Legenda: A: Carapaça; vista dorsal; B: Carapaça; vista caudal; C:
Carapaça; vista lateral. Azul: escudos vertebrais; Verde: escudos costais; Laranja:
escudos marginais; Vermelho: escudos nucais; Rosa: escudos supracaudais
(fusionados). D: Plastrão; vista ventral. Vermelho: escudos gulares; Verde: escudos
umerais; Azul: escudos peitorais; Roxo: escudos abdominais; Amarelo: escudos
femorais; Azul-claro: escudos anais; Rosa: escudos axilares; Preto: escudos
inguinais (Arquivo pessoal).

Os testudines possuem uma única cavidade chamada de celomática ou


pleuroperitoneal. Esta camada é dividida de forma horizontal por uma membrana
6

pleuroperitoneal, o septo horizontal, que separa os pulmões que estão dispostos


dorsalmente às vísceras (Figura 3) (MCARTHUR et al., 2004).

Figura 3 - Esquema em corte transversal da anatomia lateral de um exemplar fêmea


de testudine. Legenda: 1: Traqueia; 2: Bifurcação da traqueia para os brônquios
primários (cranial para facilitar a respiração quando o pescoço está flexionado); 3:
Curva sigmoide dos brônquios, quando o pescoço é flexionado; 4: Pulmões; 5: Timo;
6: Tireoide; 7: Coração; 8: Aorta e glândulas paratireoides adjacentes; 9: Fígado;
10: Vesícula urinária; 11: Urodeu; 12: Rim; 13: Ureter; 14: Coprodeu; 15: Proctodeu;
16: Oviduto; 17: Folículos maduros do ovário esquerdo; 18: Cólon (MCARTHUR et
al., 2004).

2 Abordagem terapêutica inicial de fraturas de casco

Fraturas de cascos podem ocorrer devido a uma série de situações, tais


como atropelamentos, predadores, quedas, pisadas, danos causados por
cortadores de grama, hélices de barco e granizo, além de problemas nutricionais,
metabólicos e genéticos (BARTEN, 2006; ROFFEY & MILES, 2018). Uma de suas
principais consequências é a ocorrência de infecções com formação de abscessos,
7

lesões pulmonares, ocasionando pneumonia necrótica e, em casos mais graves,


celomite fibrinogênica, sepse e morte do animal (SELLERA et al., 2013).
Antes de realizar a reparação do casco é necessário estabilizar o
paciente para controlar hemorragias e fornecer tratamento suporte como
fluidoterapia e analgesia. Em casos de fratura com hemorragia interna, a
hemostasia pode ser realizada por pressão digital, ligadura de vasos, uso de
esponjas de gelatina absorvível e eletrocauterização (NORTON, 2005; BARTEN,
2006).
Embora a anestesia ou sedação sejam necessárias em algumas
situações, devem ser usadas com cautela em pacientes desidratados ou debilitados,
principalmente nos casos em que há comprometimento de tecidos moles (NORTON,
2005). Em um caso descrito por Bernardi et al. (2011) foi relatado um procedimento
cirúrgico em fratura de casco de um testudine atropelado, que ocasionou lesão
cavitária e comprometimento pulmonar. Inicialmente o exemplar foi sedado com
tiletamina e zolazepam para sutura da pleura, de forma a reduzir o desconforto
respiratório.
Após a estabilização inicial do paciente, recomenda-se a administração
de antibióticos sistêmicos, por ao menos uma semana, ou até a cicatrização da
ferida (KAPLAN, 2002). Posteriormente, deve-se cuidar das lesões por meio da
limpeza, desbridamento e secagem da ferida (KAPLAN, 2002; BARTEN, 2006).
A associação de antibiótico tópico à limpeza da ferida e uso de bandagem
oclusiva antes da técnica de reparação do casco em si, pode colaborar para a evitar
infecção bacteriana (SELLERA et al., 2013). É necessário lembrar que esses
animais são ectotérmicos e que a temperatura vai agir diretamente no metabolismo,
colaborando assim para a melhora do quadro clínico do animal e,
consequentemente, na cicatrização de fraturas. A radiografia é indicada para auxiliar
na determinação da extensão da fratura, do prognóstico e decidir sobre o método
de reparo (NORTON, 2005).
8

3 Métodos e materiais de reparo

O reparo do casco é importante para prevenir o desenvolvimento de


infecções e abscessos. Dependendo do estado da fratura, sua consolidação pode
ser um processo prolongado, no qual a taxa metabólica, que é dependente da
temperatura ambiente, influenciará na cicatrização da lesão (LONG, 2016; ROFFEY
& MILES, 2018). Os materiais utilizados para o reparo vão variar de acordo com o
tipo de fratura e da extensão, além das particularidades do paciente como idade,
espécie e condição física (SOUZA, 2006; SANTOS, 2009).

3.1 Fio de aço

Uma das maneiras mais simples de aproximação da fratura é por meio


de fios de aço para realização de cerclagem (ROFFEY & MILES, 2018), em que há
o envolvimento total de um osso, com o objetivo de promover a fixação da fratura.
No caso do reparo de cascos de testudines, a técnica mais empregada é a
hemicerclagem, cuja fixação do foco da fratura ocorre por meio de orifícios feitos no
osso, sem envolvimento total desse (Figura 4) (JOHNSON, 2014). Os fios podem
auxiliar na fixação da resina epóxi no casco do animal, o que diminui o tempo de
cicatrização (VALENTE et al., 2012).

Figura 4 - Formas de utilização de fios de aço para fixação de fraturas de casco em


testudines. A e B: fraturas de carapaça fixadas com fios em hemicerclagem em
testudine (A) e Emydoidea blandingii (B) (ROFFEY & MILES, 2018; BARTEN, 2006).
9

3.2 Resina epóxi

A resina epóxi é produto da combinação de epicloridrina e éter diglicidílico


de bisfenol A ou F. Esse composto pode ser usado como adesivo, cola,
revestimento, encapsulamento, material de fundição, selante e ligante. Sua
variedade de aplicações ocorre em virtude de sua resistência satisfatória a
processos de corrosão e deformações mecânicas, além de apresentar boa adesão
(ALTIDIS, 2013; BASTOS et al., 2019).
Resinas e outros materiais adesivos como colas, cimentos e acrílicos,
são muito utilizados na oclusão de plastrotomias cirúrgicas (Figura 5A) e na
reparação de fissuras ou fraturas não deslocadas (Figura 5B) (ROFFEY & MILES,
2018). A associação de camadas de fibra de vidro com resina epóxi colabora para
a impermeabilização, reduz o desgaste e a abrasão do casco e promove
estabilidade (KAPLAN, 2002; SOUZA, 2006).

Figura 5 - Exemplos do uso de resina em Chelonoidis sp. A: fechamento de


plastrotomia cirúrgica (CUBAS, 2014); B: fixação de fratura não deslocada de
plastrão (Arquivo pessoal).

Entretanto, o emprego de resina epóxi e fibra de vidro no reparo de


fraturas de casco têm sido revistos. Alguns autores contraindicam o uso desses
materiais, pois alegam que a vedação total das feridas pode ser prejudicial em casos
10

de infecção na cavidade celomática e por dificultar o manejo da lesão ao encobrir


fragmentos celulares e sujidades, o que pode interferir na cicatrização (OLIVEIRA
et al., 2015; ROFFEY & MILES, 2018).
Quando utilizada, a resina deve ser aplicada na periferia da fratura, nunca
diretamente nas bordas ou entre os fragmentos ósseos, pois impede a cicatrização
e, no caso dos materiais auto polimerizáveis, o aquecimento pode lesionar tecidos.
Para não interferir no crescimento do casco e potencializar a recuperação e a
calcificação, a resina deve ser removida periodicamente em animais jovens, no qual
a consolidação de uma fratura ocorre por volta de quatro a 18 meses.
Adicionalmente, indica-se a retirada da resina em um período de um ou dois anos
em exemplares em crescimento, enquanto em adultos, essa pode ficar permanente
(KAPLAN, 2002; SOUZA, 2006; OLIVEIRA et al., 2015).

3.3 Métodos de pontes

As pontes são feitas a partir da fixação de dispositivos no casco, como


braçadeiras, ganchos (Figura 6A), placas de metal, lacres (Figura 6B), parafusos
(Figura 6C) e braquetes (Figura 6D), a fim de conectar os fragmentos e reduzir a
tensão no local de fratura. Quando não são ancorados diretamente no osso,
materiais mais empregados para fixação desses dispositivos são colas epóxis,
polimetilmetacrilatos (acrílico), acrílicos dentários, super colas ou adesivos de
cianoacrilatos de lojas de ferragens (ROFFEY & MILES, 2018).
A redução da fratura com a fixação de parafusos como base no método
de ponte promove uma boa estabilização. Entretanto, deve-se ter cuidado, uma vez
que o aquecimento da furadeira ortopédica, o aprofundamento excessivo dos
parafusos e a alta pressão exercida nos fios de conexão podem provocar danos em
tecidos moles e necrose tecidual (MONTORO, 2018).
O método de ponte pode ser utilizado na promoção de distração
osteogênica, técnica interessante para animais em crescimento. Ela se baseia no
princípio da pressão e tensão para manipular o aumento de dimensão e
movimentação ósseas. Esse método foi aplicado em uma tartaruga marinha na
11

Flórida e o procedimento foi baseado em uma técnica usada em crânio humano


(MARINELIFE, 2010; BBC BRASIL, 2011).
Uma vantagem do método de ponte é que o local fraturado pode
permanecer descoberto, o que permite acesso à ferida e monitoramento da
cicatrização. Além disso, é possível empregar materiais variados, de baixo custo,
pouco invasivos e de fácil colocação. Uma desvantagem é a possibilidade de os
dispositivos descolarem do casco, no caso dos materiais adesivos (ROFFEY &
MILES, 2018).

Figura 6 - Utilização do método de pontes para fixação de fratura em casco em


testudines. A: utilização de ganchos em testudine (ROFFEY & MILES, 2018); B: uso
de lacres e resina para fixação de fratura em carapaça em Phrynops geoffroanus
(Arquivo pessoal); C: associação de parafusos de aço inoxidável com fios de
cerclagem trançados em “8” e recoberto com fita adesiva para proteção do tecido
mole contra atrito em testudine (ROFFEY & MILES, 2018); D: uso de braquetes para
ancoragem de fios de aço de fratura de casco em crescimento em Chelonia mydas
(MARINELIFE, 2010).
12

3.4 Prótese

As próteses são equipamentos e/ou aparelhos que substituem membros,


órgãos, tecidos ou funções do corpo que podem ser permanentes ou transitórias,
externas ou internas (AZEVEDO et al., 2018). Em casos em que o dano ao casco é
muito extenso e impossibilita o uso das técnicas convencionais, o desenvolvimento
de próteses é uma alternativa para garantir a qualidade de vida ao animal.
As próteses são classificadas de acordo com a origem do enxerto. Elas
podem ser autógenas, quando provêm do mesmo indivíduo, homólogas ou
alógenas, se provenientes de outro animal da mesma espécie, heteróloga ou
xenógena, se originada de um indivíduo de outra espécie, sintética, quando feita
com material inorgânico, e mista, se há a associação de dois ou mais tipos de
próteses (JÚNIOR, 2008).
A impressão tridimensional (3D), criada na década de 80, com o objetivo
inicial de produzir peças automobilísticas (SANTOS, 2014), tem sido muito
empregada na medicina veterinária para confecção de peças anatômicas e de
próteses (BIDO, 2018). Em dois casos que envolveram exemplares de Chelonoidis
carbonarius com perda de 90% da carapaça devido a incêndios, os animais
receberam próteses feitas em impressão 3D (Figura 7) (MORAES, 2015; GIRARDI
& ALMEIDA, 2015; COSTA & CASTRO, 2019).
13

Figura 7 - Próteses de carapaça confeccionadas em impressora 3D para


exemplares de Chelonoidis carbonarius. A: Esboço gráfico das projeções 3D de uma
prótese montada em quatro partes (BIDO, 2018); B e C: Animais com a prótese 3D
finalizada (MILÉSKI, 2016; COSTA & CASTRO, 2019).

3.5 Métodos Auxiliares

Os métodos auxiliares são aqueles que podem ser utilizados de forma


conjunta com os métodos convencionais, colaborando assim para a cicatrização das
fraturas.

A Terapia Fotodinâmica (PDT) é utilizada para tratar diversas lesões


como neoplasias e infecções locais. Essa técnica consiste na aplicação de feixes
de luz que atuam como agente bioestimulador e aceleram o processo de reparação
tecidual. As fraturas devem ser limpas e debridadas durante o tratamento, o que
permite que a PDT aja de maneira eficaz, promova a descontaminação da ferida e
a recuperação da fratura durante o tratamento (SELLERA et al., 2013).
14

Mendes (2011) cita que a radiação do laser acelera em dobro o reparo


ósseo, e tem efeitos diretos e indiretos, que estimulam a microcirculação e trofismo
celular. Também possui efeitos analgésicos, anti-inflamatórios, antiedematosos e
estimulante de trofismo tecidual, indicado para consolidação de fraturas devido à
aceleração da velocidade mitótica, além de aumentar a velocidade de consolidação
óssea e diminuir a dor.

Outro método alternativo é o uso de cicatrizantes tópicos, de acordo com


Souza (2006), o uso de pomadas impermeabilizantes à base de subgalato de
bismuto, sem a adição de ácido bórico, é adequado para tratamento que necessitem
de rápida cicatrização de lesões abrasivas em cascos. Em tratamentos prolongados,
o autor recomenda o uso de polivinilpirrolidona iodada, que induz maior regeneração
óssea, porém com maior tempo de cicatrização.

A terapia com ozônio também é um método auxiliar e deve ser utilizada


de forma coadjuvante, mas nunca como terapêutica principal. O ozônio estimula a
produção de citocinas, a síntese de anticorpos, a ativação de linfócitos T, melhora a
oxigenação e o metabolismo celular por meio de vasodilatação e do aumento da
resposta enzimática antioxidativa. Também atua como antialérgico, anti-inflamatório
e imunomodulador, melhora quadros anêmicos, circulação sanguínea e gera rápida
analgesia e redução de inflamações agudas e crônicas (PENIDO, 2010).

A ozonioterapia geralmente é utilizada em casos de doenças infecciosas


crônicas, vasculopatias, procedimentos ortopédicos e odontológicos. Na clínica
pode ser usada de maneira tópica em casos de traumatismo e para diminuição da
dor, como auxílio em casos de lesões teciduais e feridas. Apesar de complementar
várias terapias, a ozonioterapia deve ser utilizada com cautela, pois é um gás
irritante, que pode provocar intoxicações. Essa técnica é contraindicada em casos
de gestação, miastenia severa e hemorragia ativa (PENIDO, 2010).
15

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18

CAPÍTULO 2 – ARTIGO

Emprego de prótese em fratura de carapaça de Chelonoidis carbonarius


(Testudines: Testudinidae): Relato de caso

Dara Evely Vieira da Costa; Líria Queiroz Luz Hirano

RESUMO

Os testudines pertencem à classe Reptilia, são ectotérmicos e se diferem dos


demais répteis pela presença do casco, que envolve a maior parte de seus corpos.
Fraturas nesse arcabouço ósseo são comuns e podem ocorrer devido a diversos
fatores, principalmente traumas. O presente trabalho tem como objetivo relatar um
caso de colocação de prótese em casco de jabuti-piranga (Chelonoidis carbonarius).
Um exemplar adulto, fêmea, de 2,45 kg, foi encaminhado ao Setor de Animais
Silvestres do Hospital Veterinário da Universidade de Brasília. O espécime
apresentava fratura de carapaça provocada por prensas compactadoras de um
caminhão de coleta de lixo domiciliar. Mesmo após a cicatrização da lesão, houve
persistência de uma comunicação da cavidade celomática com o meio externo, o
que ocasionou quadros de pneumonia recorrentes. Após estabilização do paciente
e tratamento das infecções, foi colocada uma cobertura com esparadrapo para isolar
a cavidade celomática, que era trocada periodicamente. Posteriormente, decidiu-se
pela confecção de uma prótese feita de resina acrílica, visto que não era viável
realizar o reparo por técnicas convencionais. O método se mostrou satisfatório na
vedação da carapaça e o animal foi acompanhado durante um mês sem demonstrar
indícios de pneumonia ou qualquer complicação.

Palavras-chave: jabuti-piranga, casco, reconstrução, répteis.


19

CHAPTER 2 - ARTICLE

Use of prosthesis in a carapace fracture of Chelonoidis carbonarius


(Testudines: Testudinidae): Case report

Dara Evely Vieira da Costa; Líria Queiroz Luz Hirano

ABSTRACT

The testudines are members of the class Reptilia, they are ectothermic and differ
from other reptiles by the presence of the shell, which covers most of their bodies.
Shell fractures are common in these animals and can occur due to several factors,
mainly trauma. This paper aims to report a placement of a prosthesis in a red-footed
tortoise (Chelonoidis carbonarius). An adult female weighing 2.45 kg was sent to the
Wild Animals Sector of Veterinary Hospital of Universidade de Brasília. The
specimen presented a carapace fracture caused by compress of garbage truck.
Even after the healing of the lesion, there was persistence communication between
the celomatic cavity and the environment, which caused recurrent pneumonia. After
stabilization of the patient and treatment of infections, an adhesive cover was placed
to isolate the cellomic cavity, which was changed periodically. Moreover, it was
decided to make a prosthesis with acrylic resin, since it was not feasible to perform
the repair by conventional methods. The method was satisfactory in the sealing of
the carapace and the animal was monitored for a month without showing signs of
pneumonia or any other complications.

Keywords: red-footed tortoise, reconstruction, reptiles, shell.


20

1 Introdução

A classe Reptilia é dividida em duas subclasses, a Anapsida, composta


pela ordem Testudines e a Diapsida, formada pelas ordens Squamata, Crocodylia e
Rhynchocephalia. Assim como os demais répteis, os testudines são ectotérmicos e,
apresentam como uma de suas particularidades, a presença do casco que envolve
grande parte do corpo. A ordem Testudines é dividida em duas subordens, a
Cryptodira, em que há retração vertical do pescoço, com representantes de hábitos
aquáticos, semiaquáticos e terrestres e a Pleurodira, cujo os representantes são
aquáticos lacustres, retraem o pescoço horizontalmente, possuem o escudo
intergular, com exceção das tartarugas marinhas, e a pelve fundida ao plastrão
(DUTRA, 2014).
O manejo da maior parte das espécies de testudines é considerado de
baixo risco, uma vez que a contenção física é simples e pode ser feita pelas laterais
do corpo, ou região caudal de exemplares pequenos e médios (JEPSON, 2016).
Durante a avaliação física desses animais, deve-se realizar a inspeção do casco,
uma vez que essa estrutura tem a mesma função protetora da pele e, quando
danificada, pode ser porta de entrada para bactérias, fungos e parasitas. Fraturas
de casco não são incomuns e podem ocorrer principalmente devido a traumas
provocados por ataques de animais, veículos motorizados, quedas e cortadores de
grama, com acometimento maior de exemplares de vida livre (BARTEN, 2006).
Antes de realizar o reparo do casco é necessário examinar o animal como
um todo e estabilizá-lo, fazer a limpeza, desbridamento e secagem da ferida
(KAPLAN, 2002). Os princípios da fixação de fraturas devem ser aplicados nessas
situações, para isso, deve-se minimizar as forças de tração presentes, o que
resultará em uma boa cicatrização (DUTRA, 2014). Muitos materiais podem ser
utilizados para a fixação de fratura, tais como fibra de vidro, resina epóxi e de
poliéster, plásticos acrílicos odontológicos, arame, malha transparente (KAPLAN,
2002), parafusos, placas ortopédicas, ganchos e fios de aço (MONTORO, 2018).
Em alguns casos, pode haver tecido insuficiente para a total
consolidação da fratura, o que dificulta o emprego das técnicas convencionais.
Nessas situações, as próteses sintéticas podem ser utilizadas para recompor o
formato original e isolar a cavidade celomática do meio externo. O presente trabalho
21

teve como objetivo relatar um caso de colocação de prótese de carapaça em um


exemplar de jabuti-piranga (Chelonoidis carbonarius).

2 Relato de Caso

No dia 11 de agosto de 2015, um exemplar adulto da espécie Chelonoidis


carbonarius, fêmea, com 2,45 kg, foi encaminhado ao Setor de Animais Silvestres
do Hospital Veterinário da Universidade de Brasília (HVet-UnB) pelo Centro de
Triagem de Animais Silvestres do Distrito Federal (CETAS-DF). O animal tinha como
histórico ter sido resgatado de um caminhão de coleta de lixo domiciliar, no qual a
prensa compactadora teria prensado seu casco.
No exame clínico, observou-se uma fratura incompleta na região dos
escudos vertebrais da carapaça e o animal apresentava apatia, com dificuldade de
locomoção. Para analgesia, foi prescrito morfina 1 na dose de 4 mg/kg, por via
intramuscular (IM), uma vez ao dia (SID).
No dia 14 de agosto, foi iniciado o tratamento com ampicilina2 na dose de
6 mg/kg, IM, SID, e cefazolina3 na dose de 22 mg/kg, IM, SID. Também se constatou
que o animal apresentava derrame cavitário e uma amostra foi puncionada para
análise. Observou-se que o líquido possuía coloração castanho claro, com aspecto
turvo (+++), presença de bactérias (cocos e bacilos), hifas de fungos,
leucofagocitose e predominância de heterófilos degenerados com diagnóstico
sugestivo para peritonite séptica.
No dia 31 de agosto, verificou-se a presença de miíase na região
fraturada. Foi feita a retirada manual das larvas, com limpeza diária e aplicação de
clorpirifós4 ao redor da região. No dia seguinte, foi feita a aplicação em dose única
de 5 mg/kg, IM, de levamisol5. Após esse episódio, observou-se uma evolução na
consolidação da fratura, ausência de secreção e início de formação de tecido de
granulação.

1
Sulfato de Morfina 10 mg/ml, Hipolabor, Belo Horizonte, MG, Brasil.
2
Ampicilina Veterinária Injetável 2g, Vetnil, Louveira, SP, Brasil.
3
Cefazolina Sódica 1g, BioChimico, Itatiaia, RJ, Brasil.
4
Lepecid® Spray 5g, Ourofino, Cravinhos, SP, Brasil.
5
Ripercol®L Injetável 7,5%, Zoetis®, São Paulo, SP, Brasil.
22

No dia 29 de outubro de 2015, o animal apresentou secreção ocular


sendo feito o exame radiográfico, em que foi possível observar radiopacidade
pulmonar intensa, com diagnóstico de pneumonia. Foi realizado tratamento com
enrofloxacina 6 na dose de 5 mg/kg, IM, SID. Após esse episódio, o animal
apresentou mais dois episódios de pneumonia em um período de quatro meses.
Aproximadamente seis meses após o recebimento do jabuti, a ferida
cicatrizou e foi reduzida a frequência das limpezas. Com um ano, houve a perda de
mobilidade sem alinhamento do fragmento ósseo. Além disso, suspeitou-se de
persistência da comunicação da cavidade celomática com o meio externo devido
aos quadros de pneumonia recorrentes. Para evitar novas infecções, foi utilizada
uma vedação provisória da carapaça com esparadrapo, que era trocada a cada 15
dias.
Posteriormente, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida do
exemplar, decidiu-se pela confecção de uma prótese sintética. Inicialmente, foi feito
um molde da deformação da carapaça com alginato7. Em seguida, utilizou-se a
resina acrílica 8 para a produção de um segundo molde, semelhante à falha do
casco, para que a prótese fosse esculpida sem comprometer o animal. A área da
lesão mimetizada no molde de resina acrílica foi isolada com verniz e preenchida
com resina acrílica, de forma que se formasse uma cobertura a ser encaixada na
deformação do animal. Posteriormente, a prótese foi finalizada com o auxílio de uma
micro retífica, fixada com massa epóxi de bicomponente 9 e pintada com tinta
guache10 (Figura 1).

6
Chemitril® Injetável 2,5%, Chemitec, São Paulo, SP, Brasil.
7
Alginato Dencrigel Dencril® 410g, Dental Cremer, Blumenau, SC, Brasil.
8
Resina Acrílica Termo Polimerizante, Clássico, Campo Limpo Paulista, SP, Brasil.
9
Durepoxi Sólido, Loctite®, São Paulo, SP, Brasil.
10
Tempera Guache, Acrilex®, São Bernardo do Campo, SP, Brasil.
23

Figura 1 - Passo-a-passo da confecção da prótese de carapaça para Chelonoidis


carbonarius. A: Fratura consolidada em escudos vertebrais da carapaça. B:
Posicionamento do exemplar para a impressão da fratura em massa ortodôntica; C:
Primeiro molde em alginato. D e E: Molde de resina acrílica mimetizando a fratura.
F: Segundo molde para confecção da prótese de resina acrílica. G: Prótese de
resina acrílica. H: Prova da prótese no jabuti para moldagem. I: Prótese finalizada e
fixada na carapaça com massa epóxi. J: aspecto final da prótese após pintura com
tinta guache (Fotos de Hedermy Christiem Cerqueira de Paula Tessari).
24

3 Discussão

Fraturas no casco de testudines podem promover a comunicação do


meio externo com a cavidade celomática e predispor a quadros de infecção, sepse
e morte (SELLERA et al., 2013; LONG, 2016). No presente relato, essa situação foi
constatada no exemplar de C. carbonarius e causou complicações relacionadas a
quadros recorrentes de pneumonia.
Bernardi et al. (2011) e Gomes et al. (2015) relataram exposição da
cavidade celomática em testudines, devido a atropelamento e mordida de cão,
respectivamente. No primeiro caso, houve rompimento da pleura e
comprometimento do pulmão em muçuã (Kinosternon scorpioides). No relato de
Gomes et al. (2015), ocorreu exposição de cavidade celomática, com lesão de
fígado e de pulmão em jabuti-piranga (C. carbonarius). Em ambos casos, os
tratamentos tiveram um resultado satisfatório, sem ocorrência de óbitos, assim
como o relatado neste estudo. Não foi possível determinar se houve
comprometimento de órgãos internos no testudine em questão, mas não se
observou sinais de sangramento ativo ou alterações radiográficas sugestivas.
O tratamento realizado por Gomes et al. (2015), em fraturas laterais da
carapaça de jabuti-piranga envolveu a limpeza da ferida com solução fisiológica e
clorexidine degermante diluído, colocação de curativo, antibioticoterapia,
analgésicos, anti-inflamatórios, fluidoterapia e suplementação vitamínica e mineral.
Os autores relataram a cicatrização e fechamento da membrana celomática em dois
meses, entretanto, tal observação no animal do presente estudo não foi possível
devido à conformação da fratura.
A consolidação de fraturas em carapaça é um processo lento que
demanda energia do testudine, cujo metabolismo é dependente da temperatura
ambiente (LONG, 2016; ROFFEY & MILES, 2018). Em condições térmicas
consideradas ótimas, associadas ao acompanhamento de outros fatores como o
nível de cálcio, colaboram para uma cicatrização mais eficaz. Devido ao fragmento
ósseo já se encontrar consolidado no momento da decisão da implementação da
prótese, não houve a necessidade de suplementação de cálcio na dieta do animal
ou controle da temperatura ambiental.
25

Valente et al. (2012) relataram que a colocação de hemicerclagem e


resina epóxi promoveu a consolidação de fratura de casco em tigre-d'água brasileiro
(Trachemys dorbigni) em 60 dias. Sellera et al. (2013) afirmam que o uso de terapia
fotodinâmica seguida por irradiação de laser vermelho fez com que houvesse
reepitelização e queratinização competente após quatro sessões em 28 dias em
fratura de carapaça de tartaruga-verde (Chelonia mydas). No presente relato, a
perda da mobilidade do fragmento ósseo fraturado ocorreu aproximadamente após
um ano de tratamento, provavelmente devido às condições de extensão e
profundidade nas quais a fratura se encontrava.
No trabalho de Bernardi et al. (2011), a coaptação da fratura foi realizada
através da técnica de cerclagem, associada ao uso de acrílico dentário para a
vedação e mobilização da fratura. No presente relato, notou-se que os métodos
convencionais de reparação por coaptação não seriam possíveis para alinhar o
fragmento deslocado, uma vez que esse se encontrava consolidado, o que
demandaria a realização de uma fratura cirúrgica no casco.
A escolha da técnica e dos materiais para a confecção de próteses
depende do estado geral da fratura e de sua complexidade, além da espécie, idade
e condição física do animal (SOUZA, 2006; SANTOS, 2009). Nos casos reportados
por Costa e Castro (2019) e Girardi e Almeida (2015) foram utilizadas próteses de
impressoras 3D. Neste relato, a técnica foi eleita devido à disponibilidade de
materiais mais acessíveis e de baixo custo, além de não ter sido necessário realizar
a perfuração do casco para acoplar a prótese. Ressalta-se o cuidado para que não
houvesse o contato direto da resina acrílica com o corpo do animal antes de seu
endurecimento, a fim de evitar queimaduras na cavidade devido ao aumento da
temperatura que a resina promove ao se polimerizar.
O uso da prótese mostrou-se efetivo durante o período de observação e
apresentou um encaixe satisfatório na fratura com boa vedação. Não foram
observados quadros de pneumonia após sua colocação, o que melhorou a
qualidade de vida do exemplar, sem a necessidade de troca frequente de
bandagem. Essa técnica pode ser reproduzida para outros casos relacionados à
fratura com acometimento de uma parte do casco, em que não seja possível realizar
distração osteogênica ou fechamento da fratura pelos métodos convencionais.
26

4 Conclusão

Apesar da colocação de próteses ser uma técnica eficiente em casos de


grande dano tecidual e/ou comprometimento da função, há poucos estudos que
relatam o seu uso e de diferentes materiais para o desenvolvimento de próteses
para testudines. No presente trabalho, a prótese confeccionada com resina acrílica
em molde inicial de alginato mostrou-se uma opção viável, barata e eficaz, o que
viabiliza seu emprego quando há perda parcial da estrutura, mostrando-se de
resultado satisfatório na recuperação do animal.

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CAPÍTULO 3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

As fraturas de casco ocorrem devido a vários fatores tais como


atropelamentos, predadores, quedas, pisadas, danos causados por cortadores de
grama, hélices de barco, granizo, problemas nutricionais, metabólicos e genéticos.
Dentre os agravamentos relacionados à perda dessa estrutura de proteção estão os
casos de infecção, principalmente pneumonia, celomite, e de forma mais agravada,
sepse.
O reparo do casco é importante para prevenir o desenvolvimento de
infecções e abscessos e, consequentemente, diminuir o risco de óbito do animal. O
tempo de cicatrização da fratura dependerá da extensão, localidade e tipo, bem
como do estado geral do animal, juntamente com a taxa metabólica e temperatura
ambiente.
Nos casos em que o dano ao casco é muito extenso e impossibilite a
reparação convencional, o desenvolvimento de próteses serve como alternativa
para substituição da parte perdida, de forma a garantir a qualidade de vida do
paciente. Tal método já foi utilizado por profissionais da medicina de répteis, mas
somente com próteses produzidas por impressão 3D. Além desse método, é
possível confeccionar próteses com outros materiais de baixo custo e mesma
eficácia utilizando resina acrílica, por exemplo.

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