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Textos alternativos

Texto narrativo Manual, p. 82

PNL
O rapaz não podia conformar-se com a ideia de ter sido transformado em gnomo.
“Isto ou é sonho ou imaginação minha”, pensava ele. “Se esperar algum tempo, hei
de voltar a ser criatura humana.”
Colocou-se bem em frente do espelho e fechou os olhos. Só os abriu passados
5 alguns instantes, na esperança de ver cessar o encantamento. Mas tal não aconteceu,
continuava assim pequenino. Era tal como dantes, menos na estatura. As estrigas do
cabelo, as sardas do nariz, os remendos nos calções de couro e até as meias
ponteadas, era tudo exatamente a mesma coisa, só que em ponto pequenino.
De nada servia ter esperança. Era preciso deitar mãos à obra. O melhor que tinha
10 a fazer era ir procurar o gnomo e tentar fazer as pazes com ele.
Saltou para o chão e pôs-se a procurar. Olhou por trás das cadeiras e armários,
foi ver debaixo da cama e no forno. Até se meteu pelos buracos dos ratos, mas tudo
em vão.
Enquanto ia procurando, chorava, suplicava, fazia toda a espécie de promessas:
15 nunca mais faltaria à sua palavra, nunca mais seria mau, nunca mais adormeceria
durante a leitura do Evangelho. Se voltasse a ser um humano, seria a criança mais
obediente, mais amável, mais delicada! Mas, apesar de muito prometer, de nada lhe
servia.
De repente, lembrou-se que a mãe dissera um dia que os gnomos têm o costume
20 de se esconder nos estábulos e resolveu-se a ir lá. Por sorte, a porta da casa ficara
aberta; se não fosse isso, nunca conseguiria levantar o ferrolho. Assim, saiu, sem
dificuldade.
[…]
E dirigiu-se ao estábulo, à procura do gnomo.
Só havia três vacas. Mas quando o rapaz entrou, foi tal o ruído e os mugidos
25 eram tantos que parecia haver no estábulo pelo menos trinta vacas.
– Nãh…! nãh…! nãh…! – mugia a Rosa de Maio –, que felicidade ainda haver
justiça neste mundo!
– Nãh…! nãh…! nãh…! – entoavam todas juntas. E não podia distinguir o que
elas diziam, porque o mugido de uma era mais forte que o da outra.
30 O rapaz queria falar do gnomo, mas não conseguia fazer-se ouvir porque as vacas
estavam todas revoltadas, todas inquietas como quando ele deixava entrar no
estábulo um cão estranho. Atiravam coices, esticavam as correntes, voltavam a
cabeça para trás e ameaçavam com os chifres.
– Chega-te aqui – gritava Rosa de Maio –, que levas um coice de que nunca mais
35 te esqueces!
– Vem cá – dizia o Lírio de Ouro –, que eu faço-te dançar nos meus chifres!
– Aproxima-te de mim, quero que tu sintas o que eu sentia no verão passado
quando me atiravas com o teu tamanco! – rugia a Estrela.

Selma Lagerlöf, 2004. A Maravilhosa Viagem de Nils Holgersson através da Suécia.


Trad. Maria de Castro Henriques Osswald. Lisboa: Relógio D’Água (pp. 22-25)

EUG5 © Porto Editora

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