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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS

EFEITOS DO ENSINO COLETIVO NA INICIAÇÃO


INSTRUMENTAL DE CORDAS: A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO
MEIO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

FLAVIA MARIA CRUVINEL

GOIÂNIA
2003
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
(GPT/BC/UFG)

Cruvinel, Flavia Maria


C 955e Efeitos do ensino coletivo na iniciação instru-
mental de cordas: a educação musical como meio
de transformação social / Flavia Maria Cruvinel.
- Goiânia, 2003.
321 f. : il.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal


de Goiás, Escola de Música, 2003.

Bibliografia : f. 210
Inclui anexos

1. Música instrumental (Cordas) - Estudo em


grupo 2. Música - Instrução e ensino 3. Educação
musical instrumental (Cordas) - Ensino 4. Música
- Educação e ensino – Aspectos sociais I. Univer-
sidade Federal de Goiás. Escola de Música II. Títu-
lo.

CDU : 787
FLAVIA MARIA CRUVINEL

EFEITOS DO ENSINO COLETIVO NA INICIAÇÃO


INSTRUMENTAL DE CORDAS: A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO
MEIO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

Dissertação apresentada como requisito parcial


para a obtenção do título de Mestre em Música,
Programa de Pós-graduação stricto-sensu,
Mestrado em Música na Contemporaneidade,
Escola de Música e Artes Cênicas, Universidade
Federal de Goiás.

Orientadora: Profª Drª Eliane Leão

GOIÂNIA
2003
iii

TERMO DE APROVAÇÃO

FLAVIA MARIA CRUVINEL

EFEITOS DO ENSINO COLETIVO NA INICIAÇÃO INSTRUMENTAL DE


CORDAS: A EDUCAÇÃO MUSICAL COMO MEIO DE TRANSFORMAÇÃO
SOCIAL

Dissertação defendida e aprovada em 28 de abril de 2003, pela Banca Examinadora


constituída pelos professores.

______________________________________
Profª Drª Eliane Leão
Presidente da Banca

______________________________________
Profº Drº Antônio Ibañez Ruiz

_______________________________________
Profª Drª Maria Helena Jayme Borges
iv

À minha família, meus pais Neil (in memoriam) e Maura; aos


irmãos Fabiana, Flávio e Nara e aos meus queridos sobrinhos
Gabriel e Isabela.

A todos os alunos que participaram dessa experiência.

A todos os alunos que já tive e que terei.


v

AGRADECIMENTOS

À querida Profª Dr. Eliane Leão, pela amizade e confiança depositada; por me permitir
desenvolver todas as idéias, pelo “sonhar” junto;

Ao João Maurício Galindo, educador musical, por ser meu primeiro incentivador nesse
projeto e por toda a atenção dispensada;

Ao Prof. Dr. Paulo César Rabelo, Coordenador das “Oficinas de Música e Teatro”, por
todo apoio, confiança e amizade;

À Profª Drª Sônia Ray, Coordenadora do Mestrado, pelos constantes incentivos e


confiança depositada;

À Profª Drª Glacy Antunes de Oliveira, Diretora da EMAC/UFG, por incentivar e apoiar o
Projeto “Oficinas de Música e Teatro”, através do Programa de Extensão da EMAC/UFG,
por ser sabedora da importância do mesmo para a comunidade local;

Aos Educadores Musicais entrevistados, Abel, Carmen, Luciano, Marcelo, Cristina, Joel,
Alípio, Marcos, Thelma e Enaldo por permitir a coleta desse material precioso;

A todos da Sociedade Cidadão 2000, em especial Sr. Joseleno Vieira dos Santos
(Presidente), Sra. Rosa Helena de Paula Parreiro (Coordenadora Geral) e Sra. Edivânia
Lúcio (Coordenadora do CEACA). Aos educadores Vanderley, José Carlos e Marlene; e a
todos os funcionários da Sociedade Cidadão 2000/CEACA, que de alguma forma
contribuíram para a presente pesquisa.

A todos os professores que trabalham e trabalharam no projeto: Aneir de Freitas, Vandair


Lima, Guilherme Klava, Cindy Folly, José Sarto da Silva, e em especial Esther Ormond,
Leandro Valério Silva e Jailton de Oliveira Teixeira - pela participação no experimento
que resultou na presente pesquisa - pelo aprendizado mútuo, pelo companheirismo e por
acreditarem nesse ideal;

À Claúdia Zanini e Marisa Damas Vieira, pela ajuda, pelos conselhos e incentivos;

À Ivete F. C. Roriz por fazer o contato com CEACA, Sociedade Cidadão 2000;

Aos diretores, coordenadores e educadores do Projeto Guri de São Paulo, em especial


Nurimar Vasick e Silvana Cardoso;

A todos os professores do Programa de Pós Graduação – Mestrado em Música da


Contemporaneidade;

À Elaine Maria Guimarães Monteiro, secretária do mestrado e ao Maurício Ramos,


secretário das “Oficinas de Música e Teatro”, pelo apoio precioso durante essa jornada;

A todos os colegas, pela amizade e pela a oportunidade do aprendizado em grupo.


vi

“A existência, porque humana, não pode ser muda, silenciosa, nem


tampouco pode nutrir-se de falsas palavras, mas palavras
verdadeiras, com que os homens transformam o mundo. Existir
humanamente, é pronunciar o mundo, é modificá-lo”. (Paulo
Freire)
vii

SUMÁRIO

LISTA DE FIGURAS..........................................................................................................x
RESUMO...........................................................................................................................xiii
ABSTRACT........................................................................................................................xiv
1. INTRODUÇÃO..............................................................................................................01
2. O ENSINO MUSICAL COMO MEIO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL.........09
2.1. EDUCAÇÃO E SOCIEDADE......................................................................................09
2.2. CULTURA E SOCIEDADE.........................................................................................19
2.3. MÚSICA E A SOCIEDADE........................................................................................26
2.3.1. As funções sociais da música.....................................................................................26
2.3.2. A educação musical na sociedade contemporânea.....................................................32
2.3.2.1. Pressupostos teóricos...............................................................................................32
2.3.2.2. O papel da universidade frente aos novos fenômenos musicais............................39
3. O ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS...................................42
3.1. ASPECTOS HISTÓRICOS..........................................................................................42
3.2. ASPECTOS PEDAGÓGICOS DO ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS
MUSICAIS...........................................................................................................................47
3.2.1. Metodologia do Ensino Coletivo de Cordas...............................................................47
3.2.2. Vantagens pedagógicas do Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais....................50
3.3. ASPECTOS PSICOLÓGICOS DO ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS
MUSICAIS...........................................................................................................................52
3.3.1. Desenvolvimento da personalidade............................................................................52
3.3.2. Ambiente receptivo, Clima social e Psicologia do professor....................................53
3.4. A CONTRIBUIÇÃO DE GALINDO ..........................................................................55
4. O ENSINO COLETIVO NA VISÃO DOS EDUCADORES MUSICAIS................58
4.1. ENTREVISTAS COM EDUCADORES MUSICAIS QUE ATUAM NA ÁREA......58
4.2.ROTEIRO DA ENTREVISTAS....................................................................................59
4.3. ANÁLISE DOS EXCERTOS.......................................................................................60
5. METODOLOGIA..........................................................................................................83
5.1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS.....................................................................................83
5.1.1. A PESQUISA EM EDUCAÇÃO NA ATUALIDADE.............................................83
viii

5.1.2. A PESQUISA-AÇÃO...............................................................................................84
5.2. DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO............................................................................87
5.3. PERFIL DOS GRUPOS E DOS SUJEITOS................................................................89
5.3.1. Grupo COMUNIDADE.............................................................................................90
5.3.2. Grupo CEACA...........................................................................................................91
5.3.3. Análise do perfil dos grupos e dos sujeitos................................................................93
5.4. INTERVENÇÕES/AULAS..........................................................................................95
5.4.1. Intervenções/Aulas do grupo COMUNIDADE.........................................................97
5.4.2. Observações e/ou análises das Intervenções/Aulas do grupo COMUNIDADE......114
5.4.3. Intervenções/Aulas do grupo CEACA.....................................................................115
5.4.4. Observações e/ou análises das Intervenções/Aulas do grupo CEACA....................143
5.5. PROTOCOLOS: DEPOIMENTOS E RECITAIS......................................................145
5.5.1. Depoimentos.............................................................................................................145
5.5.1.1. Roteiro para a coleta dos depoimentos..................................................................145
5.5.1.2. Depoimentos dos sujeitos do grupo COMUNIDADE..........................................146
5.5.1.3. Depoimentos dos sujeitos do grupo CEACA........................................................163
5.5.1.4. Observações e/ou análises dos depoimentos dos sujeitos.....................................175
5.5.2. Recitais.....................................................................................................................179
5.5.2.1. Descrição dos recitais ...........................................................................................179
5.5.2.2. Observações e/ou análises dos Recitais ................................................................180
5.6. OBSERVAÇÕES DO JÚRI........................................................................................182
5.7. ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES DO JÚRI.............................................................186
5.8. RESULTADOS...........................................................................................................190
5.9. ANÁLISE FINAL ......................................................................................................191
6.CONCLUSÃO...............................................................................................................195
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................207
FONTES E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................................210
REFERÊNCIAS AUDIOVISUAIS.................................................................................216
ANEXO 1 – ENTREVISTAS COM OS EDUCADORES MUSICAIS............................218
ANEXO 2 - EXCERTOS DAS ENTREVISTAS DOS EDUCADORES MUSICAIS.....277
ANEXO 3 - AUTORIZAÇÃO DOS EDUCADORES MUSICAIS................................314
ANEXO 4 – AUTORIZAÇÃO DOS SUJEITOS..............................................................316
ANEXO 5 - QUESTIONÁRIO (SUJEITOS)....................................................................319
ix

ANEXO 6 - CARTAZ/FOLDER DE DIVULGAÇÃO DAS OFICINAS DE MÚSICA E


TEATRO............................................................................................................................321
ANEXO 7 - PARTITURAS DAS PEÇAS (GRADE).......................................................326
ANEXO 8 - PROGRAMA DE RECITAIS........................................................................347
ANEXO 9 - CARTAZ DE DIVULGAÇÃO DO RECITAL NO CENTRO CULTURAL
“MARTIM CERERÊ”........................................................................................................354
ANEXO 10 - CONVITE DE DIVULGAÇÃO INTERNA (CEACA)..............................356
ANEXO 11 - DIVULGAÇÃO INTERNA CEACA..........................................................358
ANEXO 12 - DIVULGAÇÃO NA IMPRENSA ESCRITA............................................360
ANEXO 13 – DESENHOS DOS SUJEITOS DO CEACA...............................................376
x

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 – Roteiro das entrevistas....................................................................................59


FIGURA 2 – Quadro de alunos do grupo COMUNIDADE................................................90
FIGURA 3 – Quadro de influências musicas I.....................................................................90
FIGURA 4 – Quadro sobre a Oficina de Ensino Coletivo de Cordas I................................91
FIGURA 5 – Quadro de alunos do grupo CEACA.............................................................91
FIGURA 6 – Quadro de influências musicais II..................................................................92
FIGURA 7 – Quadro sobre a Oficina de Ensino Coletivo de Cordas II.............................92
FIGURA 8 - 1ª Intervenção/Aula: 21.08.02.........................................................................97
FIGURA 9 - 2ª Intervenção/Aula: 23.08.02.........................................................................98
FIGURA 10 - 3ª Intervenção/Aula: 28.08.02.......................................................................98
FIGURA 11 - 4ª Intervenção/Aula: 30.08.02.....................................................................100
FIGURA 12 - 5ª Intervenção/Aula: 04.09.02.....................................................................100
FIGURA 13 - 6ª Intervenção/Aula: 06.09.02.....................................................................101
FIGURA 14 - 7ª Intervenção/Aula: 11.09.02.....................................................................102
FIGURA 15 - 8ª Intervenção/Aula: 13.09.02.....................................................................102
FIGURA 16 - 9ª Intervenção/Aula: 18.09.02.....................................................................103
FIGURA 17 - 10ª Intervenção/Aula: 20.09.02...................................................................104
FIGURA 18 - 11ª Intervenção/Aula: 25.09.02...................................................................105
FIGURA 19 - 12ª Intervenção/Aula: 27.09.02...................................................................105
FIGURA 20 - 13ª Intervenção/Aula: 02.10.02...................................................................106
FIGURA 21 - 14ª Intervenção/Aula: 04.10.02...................................................................106
FIGURA 22 - 15ª Intervenção/Aula : 09.10.02.................................................................107
FIGURA 23 - 16ª Intervenção/Aula: 11.10.02...................................................................107
FIGURA 24 - 17ª Intervenção/Aula : 16.10.02..................................................................108
FIGURA 25 - 18ª Intervenção/Aula: 18.10.02...................................................................108
FIGURA 26 - 19ª Intervenção/Aula: 23.10.02...................................................................108
FIGURA 27 - 20ª Intervenção/Aula: 30.10.02...................................................................109
FIGURA 28 - 21ª Intervenção/Aula: 01.11.02...................................................................109
FIGURA 29 - 22ª Intervenção/Aula: 06.11.02...................................................................110
FIGURA 30 - 23ª Intervenção/Aula: 08.11.02...................................................................110
xi

FIGURA 31 - 24ª Intervenção/Aula: 13.11.02...................................................................111


FIGURA 32 - 25ª Intervenção/Aula : 20.11.02..................................................................111
FIGURA 33 - 26ª Intervenção/Aula: 22.11.02...................................................................111
FIGURA 34 - 27ª Intervenção/Aula : 27.11.02..................................................................112
FIGURA 35 - 28ª Intervenção/Aula: 29.11.02...................................................................112
FIGURA 36 - Semana Ensaio (29ª e 30ª Intervenção/Aula): 03 e 04.12.02 (Apresentações
e ensaios)............................................................................................................................112
FIGURA 37 - Ensaio (31ª Intervenção/Aula): 06.12.02 ..................................................113
FIGURA 38 - Ensaios Finais: 07 e 08.12.02......................................................................113
FIGURA 39 - 1ª Intervenção/aula: 28.08.02......................................................................115
FIGURA 40 - 2ª Intervenção/aula: 30.08.02......................................................................115
FIGURA 41 - 3ª Intervenção/aula: 04.09.02......................................................................116
FIGURA 42 - 4ª Intervenção/aula: 06.09.02......................................................................118
FIGURA 43 - 5ª Intervenção/Aula: 11.09.02.....................................................................119
FIGURA 44 - 6ª Intervenção/aula: 13.09.02......................................................................121
FIGURA 45 - 7ª Intervenção/aula: 18.09.02.....................................................................123
FIGURA 46 - 8ª Intervenção/aula: 20.09.02......................................................................124
FIGURA 47 - 9ª Intervenção/aula: 25.09.02......................................................................126
FIGURA 48 - 10ª Intervenção/aula: 27.09.02....................................................................128
FIGURA 49 - 11ª Intervenção/aula: 02.10.02....................................................................130
FIGURA 50 - 12ª Intervenção/aula: 04.10.02....................................................................132
FIGURA 51 - 13ª Intervenção/aula: 09.10.02...................................................................132
FIGURA 52 - 14ª Intervenção/aula: 16.10.02....................................................................133
FIGURA 53 - 15ª Intervenção/aula: 30.10.02....................................................................134
FIGURA 54 - 16ª Intervenção/aula: 01.11.02 ...................................................................136
FIGURA 55 - 17ª Intervenção/aula: 06.11.02....................................................................136
FIGURA 56 - 18ª Intervenção/aula: 08.11.02....................................................................137
FIGURA 57 - 19ª Intervenção/aula: 18.11.02...................................................................138
FIGURA 58 - 20ª Intervenção/aula: 20.11.02....................................................................138
FIGURA 59 - 21ª Intervenção/aula: 22.11.02....................................................................138
FIGURA 60 - 22ª Intervenção/aula: 25.11.02....................................................................139
FIGURA 61 - 23ª Intervenção/aula : 27.11.02...................................................................140
xii

FIGURA 62 - 24ª Intervenção/aula : 29.11.02...................................................................141


FIGURA 63 - 25ª Intervenção/aula: 04.12.02....................................................................142
FIGURA 64 - 26ª Intervenção/aula: 06.12.02....................................................................143
FIGURA 65 – Roteiro dos depoimentos dos sujeitos........................................................146
FIGURA 66 – Depoimento 1.............................................................................................146
FIGURA 67 – Depoimento 2 ............................................................................................148
FIGURA 68 – Depoimento 3.............................................................................................150
FIGURA 69 – Depoimento 4.............................................................................................152
FIGURA 70 – Depoimento 5.............................................................................................154
FIGURA 71 – Depoimento 6.............................................................................................156
FIGURA 72 – Depoimento 7.............................................................................................157
FIGURA 73 – Depoimento 8.............................................................................................158
FIGURA 74 – Depoimento 9.............................................................................................160
FIGURA 75 – Depoimento 10...........................................................................................163
FIGURA 76 – Depoimento 11...........................................................................................164
FIGURA 77 – Depoimento 12 ..........................................................................................166
FIGURA 78 – Depoimento 13...........................................................................................168
FIGURA 79 – Depoimento 14...........................................................................................169
FIGURA 80 – Depoimento 15...........................................................................................171
FIGURA 81 – Depoimento 16...........................................................................................172
FIGURA 82 – Depoimento 17...........................................................................................173
FIGURA 83 – Observação 1..............................................................................................182
FIGURA 84 – Observação 2..............................................................................................183
FIGURA 85 –Observação 3...............................................................................................184
xiii

RESUMO

A presente pesquisa, resultado da dissertação de mestrado em Educação Musical, Mestrado


em “Música na Contemporaneidade” da EMAC/UFG, visou comprovar a eficiência da
metodologia de Ensino Coletivo de Cordas (violino, viola, violoncelo e contrabaixo) na
iniciação instrumental. A democratização do ensino musical através da metodologia, que
promove a transformação do indivíduo e conseqüentemente, a transformação da sociedade,
foi analisada e discutida, chegando-se às conclusões finais. A importância da educação, na
sociedade como instrumento de transformação social, é abordada por FREIRE (1975,
1996, 1997), LUCKESI (1994), LIBÂNEO (1996), GOHN (1999), GIROUX (1999),
MCLAREN (1999), VILANOVA (2000), MACEDO (2000), SAVIANI (2001). As
relações existentes entre música e sociedade, bem como o papel da Educação Musical no
contexto social contemporâneo, FREIRE (1992), SOUZA (2000), foram alguns dos
referenciais específicos que embasaram as discussões. Necessário se faz ressaltar a
importância da pesquisa em Educação Musical, visando um maior entendimento dos
processos pedagógicos em andamento, das suas relações com a sociedade, auxiliando a
criação de metodologias inovadoras, que auxiliam a transformação social. A presente
pesquisa-ação existencial (BARBIER, 1997), com abordagem qualitativa, delimitou como
objeto de estudo – o ensino coletivo de instrumentos de cordas, como uma metodologia de
ensino eficiente para a iniciação instrumental, sendo um dos meios de democratização do
ensino musical. Realizou-se levantamento da literatura na área específica e áreas afins,
bem como, entrevistas com 11 pedagogos que trabalham com o ensino coletivo, para
fundamentar as discussões. Participaram do experimento 29 sujeitos, com faixa etária entre
12 a 46 anos. Delimitou-se um semestre letivo, agosto a dezembro de 2002, para a
realização da pesquisa de campo do experimento. O experimento de estudo foi desenhado
para dois grupos de perfis diferentes. O primeiro, trabalhando pré-adolescentes e
adolescentes em situação de rua. O segundo, trabalhando com pessoas da comunidade com
perfis diversos. Após a descrição e análise dos dados, chegou-se aos seguintes resultados e
conclusão: 1) Comprovou-se que: o aprendizado em grupo privilegia um melhor
desenvolvimento da percepção e dos elementos técnico-musicais elementares para a
iniciação do instrumento; a teoria musical aplicada é associada à prática instrumental
facilitando o entendimento dos alunos; o resultado musical acontece em menos tempo que
nas aulas individuais motivando os alunos a darem continuidade ao estudo do instrumento;
2) Constatou-se: o desenvolvimento musical em 100% dos sujeitos; o ensino coletivo de
cordas desenvolve uma maior concentração, disciplina, auto-confiança, autonomia e a
independência nos alunos; o ensino coletivo de cordas promove um processo de interação
entre os alunos, sociabilizando-os e desenvolvendo o senso-crítico causados pelos
estímulos e condução democrática por parte da professora/pesquisadora; a metodologia e
estratégias de ensino devem se adequar às condições sócio-econômicas e culturais de cada
grupo; as relações interpessoais entre os sujeitos do grupo contribuem de maneira
significativa no processo de desenvolvimento de aprendizagem de cada sujeito; 3) Sugeriu-
se que: o educador musical deve estar atento às manifestações musicais da
contemporaneidade para um melhor diálogo com os alunos; o educador musical deve
compreender o contexto sócio-econômico, político e cultural em que está inserido, para
que sua atuação seja crítica e eficaz, para promover a transformação social.
xiv

ABSTRACT

The present research, the master's degree dissertation in Musical Education results,
Mestrado em Música na Contemporaneidade da EMAC/UFG, sought to prove the Group
Strings Teaching (violin, viola, cello and bass) methodology efficiency in the instrumental
initiation. The musical teaching democratization through the methodology, that promotes
the individual's transformation and consequently, the society transformation, was analyzed
and discussed, being reached the final conclusions. The education importance in society as
social transformation instrument is approached by FREIRE (1975, 1996, 1997), LUCKESI
(1994), LIBÂNEO (1996), GOHN (1999), GIROUX (1999), MCLAREN (1999),
VILANOVA (2000), MACEDO (2000), SAVIANI (2001). The existent relationships
between music and society, as well as the Musical Education role in the contemporary
social context have been discussed by FREIRE (1992) and SOUZA (2000). They were
some of the specific references used in the discussions. It is necessary to emphasize the
research in Musical Education importance, seeking a larger understanding of the pedagogic
processes in practice, their relationships with the society, aiding the innovative
methodologies creation, which helps the social transformation. The present existential
research-action (BARBIER, 1997), with qualitative approach, delimited a study object –
the group strings teaching instruments, as an efficient teaching methodology for the
instrumental initiation, being one of the musical teaching democratization way. A large
search about the literature in the specific area and similar areas was developed, as well as,
interviews with 11 educators that work with the group teaching was provide to support the
discussions. Twenty-nine (29) individuals had participated in the experiment, with age
group from 12 to 46 years old. A school semester, August to December of 2002, was
delimited for the accomplishment of the experiment field research. It was chosen in
delimiting as experiment of study two groups of different profiles. The first one worked
with preadolescents and adolescents in street (misery) situation. The second one worked
with people (in general / all sort of people) of the community with several profiles. After
the description and analysis of the data, it was reached the following results and
conclusion: 1) it was proven that: the learning in group privileges a better perception and
elementary technician-musical development for the instrument initiation; the applied
musical theory is associated to the instrumental practice facilitating the students'
understanding; the musical result happens in less time than in the individual classes
motivating the students to give continuity to the instrument study; 2) it was verified that:
the musical development in 100% of the subjects; the group strings teaching develops in
the students a larger concentration, it disciplines; develops self confidence, autonomy and
the independence; the group teaching of strings promotes an interaction process among the
students, socializing them and developing the sense-critical caused by the
teacher/researcher incentives and democratic conduction; the methodology and teaching
strategies should adapt to the socioeconomic and cultural conditions of each group; the
group individuals interpersonal relationships contributes in a significant way in the
development learning process of each subject; 3) It was suggested that: the musical
educator should be attentive to the contemporary musical manifestations for a better
dialogue with the students; the musical educator should understand the context
socioeconomic, political and cultural in that it is inserted, so that its performance can be
critical and effective to promote social transformation.
1

1. INTRODUÇÃO

A música na sociedade atual deve ser entendida como um poderoso


instrumento de transformação, não só do indivíduo, mas do ser humano social, pois este
vive em sociedade, pertence a um grupo.
FREIRE (1992) entende que a música é “dotada de uma dimensão política,
como instrumento potencial de transformação do homem e da sociedade, na medida em
que, como as demais formas de arte, ela contribui para a elaboração de um saber crítico,
conscientizador, propulsor da ação social, assim como para um aperfeiçoamento ético
individual” (p.14).
Nesse sentido, através de uma Educação Musical transformadora, os alunos
poderão vivenciar novas experiências tanto no âmbito individual quanto no coletivo,
procurando conhecer seus mundos interiores e exteriores, uma vez que o processo de
socialização musical é uma importante ferramenta para que os alunos entendam, de
maneira mais sensível e crítica, a realidade na qual estão inseridos.
Por isso, o educador musical deve ter em mente questões como: qual é o papel
do educador musical na sociedade? Quais são os espaços de atuação? Qual ser humano
pretende-se formar através da música? De que maneira? A partir de quais metodologias?
Dentro deste contexto, discute-se qual é o papel do educador musical na sociedade
contemporânea.
KOELLREUTTER (1997), apud CRUVINEL (2001), em seu artigo “O
ensino da música num mundo modificado” entende que o ensino musical na sociedade
moderna deve ter um caráter funcional, sendo que o mesmo deve aceitar a tarefa de
transformar critérios e idéias artísticas em uma nova realidade, para resultar em mudanças
sociais:

Surgirá um tipo de ensino musical para o treinamento de


musicistas que, futuramente, deverão estar capacitados a encarar
sua arte como arte aplicada, isto é, como complemento estético aos
vários setores da vida e da atividade do homem moderno. Acima
de tudo, musicistas que deverão estar preparados para colocar
suas atividades a serviço da sociedade (KOELLREUTTER apud
CRUVINEL, p.94).
2

A partir dessa concepção, a Educação Musical pode ser entendida como um


meio de transformação social, levando ao ser humano não só novos conhecimentos na área
musical, mas também, nas áreas interdisciplinares, proporcionando uma formação musical
mais crítica. Do estudo e criação de metodologias eficientes do ensino coletivo
instrumental, a sociedade teria maior acesso ao aprendizado musical, uma vez fortalecida a
construção da cidadania e reconhecido a disciplina como agente de transformação social.
O acesso à educação formal no Brasil, ainda hoje, é um privilégio quase que
exclusivo das classes média e alta. A democratização do ensino no país, constitui-se em
uma difícil tarefa para a sociedade. A situação do ensino musical não é diferente. O ensino
da música no país, ainda não consegue alcançar um grande número de pessoas. As escolas
particulares que atuam no ensino específico de música são elitistas, sendo inacessíveis,
economicamente, para a grande parte da população brasileira. Por outro lado, a realidade
das escolas públicas é preocupante - os recursos são insuficientes para se obter as
condições ideais para o desenvolvimento do processo pedagógico. A área musical, entre
outras, ainda é vista como integrante das atividades complementares na formação do aluno,
e não como parte das disciplinas prioritárias. Estes aspectos agravam a situação do ensino
musical e o acesso a ele. Outro problema se refere à demanda dos alunos que é sempre
maior do que o quadro docente disponível.
O Ensino Coletivo é uma importante ferramenta para o processo de
democratização do ensino musical, contribuindo de forma bastante significativa neste
processo. A musicalização através do ensino coletivo, pode dar acesso a um maior número
de pessoas à Educação Musical, aumentando a razão professor/aluno por esforço hora/aula
ministrada. Alguns projetos ligados a essa filosofia de ensino vêm surgindo no país,
alcançando êxito, tanto na área pedagógica quanto na social. Pode-se afirmar que o estudo
da música, através do ensino coletivo, veio democratizar o acesso do cidadão à formação
musical.
OLIVEIRA (2002) acredita que o século XIX trouxe uma mudança no
paradigma do ensino da música. Para ele, “o acesso à educação, advindo com a cultura de
massa, forçou esta mudança, estabelecendo um padrão alternativo, agora não mais baseado
numa relação bastante estreita e individual entre professor e discípulo, e sim,
experimentando o uso do ensino da música em situações coletivas” (p.1).
3

A presente pesquisa teve suas raízes na experiência com o ensino coletivo de


instrumentos musicais realizada no Mvsika – Centro de Estvdos, onde se ensina violão,
desde o ano de 1994. Nesta experiência, especificamente, o trabalho com ensino coletivo
de violão, voltado para crianças de 05 a 08 anos, foi desenvolvido através dos anos,
utilizando, como ferramenta, a exploração da criatividade para dar suporte ao
desenvolvimento técnico-musical. Essa experiência resultou na monografia “O Ensino do
Violão – Estudo de uma Metodologia Criativa para a Infância”, que discutiu estratégias
para a iniciação ao violão, com base no uso da criatividade, através do ensino coletivo.
Em meio aos estudos e experimentos, no final de 1999, a influência de João
Maurício Galindo se fez notar. Na época, ele estava terminando seu trabalho de dissertação
de mestrado sobre uma metodologia de Ensino Coletivo de Cordas (utilizada no presente
estudo), em um curso de formação de professores que estivessem interessados em trabalhar
com o ensino coletivo. Após esse contato, a certeza de estar trilhando o caminho certo no
trabalho com o violão e a de poder vislumbrar a oportunidade de alcançar um número
maior de pessoas, a partir da sistematização de Galindo, se concretizou.
O próximo passo foi dado: introduzir o método em Goiânia, a partir de um
Projeto de Extensão da EMAC/UFG1, intitulado “Oficinas de Música e Teatro”2. Desde o
ano 2000, coordena-se a Oficina de Cordas, a partir das condições e clientela locais, de
onde surgiu a oportunidade de se observar a metodologia para que, desenhado o
experimento, fosse possível coletar dados para o presente estudo.
Sobre a implantação da metodologia e o projeto de ensino coletivo proposto
pela Oficina de Cordas, o Profº Drº Paulo César Rabelo, em entrevista à VIEIRA (2003),
relatou:

Ele foi baseado no projeto Guri de São Paulo, um projeto que


ensina cordas em massa em várias cidades do interior de São Paulo
e na Capital. Tem toda uma estrutura já, tem um método pronto. A
gente trouxe uma pessoa de São Paulo, o João Maurício Galindo,
que formou os professores aqui e a metodologia desse curso
específico de cordas é que você ensina todos os quatro tipos, quer
dizer, violino, violoncelo, viola e contrabaixo, conjuntamente. Por
que eles têm semelhanças, esses quatro instrumentos, então a gente
usa essas semelhanças pra ensinar (VIEIRA, p.24).

1
Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás.
2
O projeto é coordenado pelo professor Dr. Paulo César Rabelo.
4

A utilização da metodologia inovadora constitui-se em uma primeira


iniciativa no Estado de Goiás, na iniciação instrumental coletiva, em instrumentos de
cordas heterogêneos, voltada para uma população de leigos e possibilitou este estudo, que
se propõe acrescentar à literatura da área, com novas possibilidades de ensino musical.
A presente pesquisa tem como objetivo geral, investigar as fundamentações
teóricas e metodologias de ensino coletivo de instrumentos musicais, a partir de uma
experiência com a iniciação instrumental de cordas (violino, viola, violoncelo e
contrabaixo), sob duas vertentes:

1) Investigar e discutir como se desenvolveu e qual foi o processo de aprendizagem


de cada grupo envolvido no projeto. Investigar a metodologia de iniciação
instrumental, na modalidade de Ensino Coletivo de Cordas. A partir das condições
estabelecidas pelas Oficinas de Música e pelo Projeto de Extensão, investigar as
novas sugestões de estratégias e perspectivas pedagógicas, levando em conta a
realidade local, bem como, identificar a clientela (o perfil dos alunos que procuram
a Oficina de Cordas, do Projeto de Extensão da EMAC/UFG).

2) Investigar e discutir o Ensino Coletivo em música como um meio de


transformação social.

Partiu-se das seguintes hipóteses: 1) O Ensino Coletivo de Cordas, oferecido


pela Oficina de Cordas da EMAC/UFG à comunidade goianiense, promove a iniciação
instrumental do aluno; 2) O Ensino Coletivo de Cordas democratiza o ensino em música e
promove a transformação do ser humano e conseqüentemente, a da sociedade.
A relevância desta pesquisa consiste na investigação sistemática do processo
de aprendizado em instrumento de corda via ensino coletivo. Discutem-se e analisam-se as
questões relativas à pedagogia do ensino coletivo, bem como as relações interpessoais no
grupo. Ainda, no presente estudo, aborda-se a função da música na sociedade como um
meio de transformação do indivíduo. Sendo o sujeito deste processo de aprendizagem um
ser social, discute-se em conseqüência, o que esta atividade possibilita na transformação da
sociedade.
5

Desde o início das atividades da Oficina de Ensino Coletivo de Cordas


(abril/2000) fez-se leituras da literatura específica existente, bem como, leituras de
pesquisas na literatura interdisciplinar.
A revisão bibliográfica procurou corresponder à necessidade da formação de
um referencial teórico que auxiliasse o presente estudo. Foi necessário recorrer às áreas de
conhecimento afins à Educação Musical, tais como Pedagogia, Psicologia, Filosofia,
Sociologia, Antropologia, entre outros.
As relações existentes entre a Educação e a Sociedade foram abordadas por
vários educadores; FREIRE (1975,1996a,1996b,1997) aborda a educação como
instrumento de transformação social; LIBÂNEO (1996) discorre sobre a democratização
da Escola Pública; GIROUX (1999) defende a Educação Radical. Ainda pode-se citar as
contribuições de LUCKESI (1994), GOHN (1999), MCLAREN (1999), MACEDO (2000),
VILANOVA (2000), SAVIANI (2001), entre outros. A Educação Musical dentro do
contexto social é abordada por FREIRE (1992) e SOUZA (2000). A iniciação instrumental
através do ensino coletivo é uma metodologia que está sendo estudada e aplicada em
diversos instrumentos e níveis, tendo-se como referencial específico, os estudos de
TOURINHO (1995), MORAES (1995,1996,1997), GALINDO (1998,2000), OLIVEIRA
(1998,2002), que são alguns dos educadores brasileiros que estudam e aplicam o ensino
coletivo nas aulas de instrumentos.
Ainda, para que fosse possível conhecer o panorama do ensino coletivo em
instrumentos musicais, realizou-se onze (11) entrevistas com professores que atuam com a
metodologia do Ensino Coletivo em Música, nas cidades de São Paulo, Salvador, Belo
Horizonte, visando o levantamento de problemas na área, bem como, o conhecimento de
como cada um destes profissionais atuam na área estudada. As entrevistas resultaram em
dados.

Analisou-se as entrevistas, tirando delas os excertos para que fossem


conhecidas quais as características da área. Da mesma forma, utilizou-se os relatos desses
educadores musicais como referencial teórico no capítulo referente ao desenvolvimento
histórico do ensino coletivo, para enriquecer as análises e considerações finais.
No panorama contemporâneo, necessário se faz discutir metodologias e
materiais didáticos adequados para o ensino instrumental em grupo, justificando e
propiciando o acesso da comunidade à Iniciação Instrumental de Cordas. A literatura
6

específica da área carece de discussões mais aprofundadas acerca da qualidade do ensino


de cordas, inclusive do ensino coletivo. Pensa-se que a finalidade do processo pedagógico
é formar instrumentistas e professores mais capacitados, futuros apreciadores (público
mais consciente e crítico) de uma música mais elaborada, além da formação do ser
humano, do cidadão. A importância deste tema, proposto para investigação, tem que se
efetivar concretamente via estudo, pesquisas e material bibliográfico, se o objetivo for
propor uma nova prática de ensino musical.
Com base no que foi exposto, pôde-se propor, através da sistematização de
metodologias eficientes do ensino coletivo, o suprimento da carência de boa formação
musical do cidadão brasileiro, que não pertence à elite. Este cidadão sempre teve negado o
seu acesso à uma educação musical de qualidade, e por vezes, foi excluído das salas de
concerto, ora por razões econômicas, ora pelo total desconhecimento de que exista música
fora da mídia.

A abordagem metodológica foi fundamentada na Pesquisa-Ação, que indica


que o pesquisador não é neutro no processo de pesquisa, mas está mergulhado no mesmo.
Através da ação e reflexão, o pesquisador atua como um interventor objetivando a
mudança social:

Se por muito tempo o papel da ciência foi descrever, explicar e


prever os fenômenos, impondo ao pesquisador ser um observador
neutro e objetivo, a pesquisa-ação adota um encaminhamento
oposto pela sua finalidade: servir de instrumento de mudança
social. Ela está interessada mais no conhecimento prático do que
no conhecimento teórico. Os membros de um grupo estão em
melhores condições de conhecer sua realidade do que as pessoas
que não pertencem ao grupo (BARBIER, 1997, p. 29 e 30).

Por isso, a pesquisa-ação é a ciência da práxis e o seu objeto de pesquisa está


relacionado à elaboração da dialética da ação em um processo pessoal e único. BARBIER
(1997) acredita o processo de pesquisa é “relativamente libertador quanto às imposições
dos hábitos, dos costumes e da sistematização burocrática” (p.34).

A coleta de dados ocorreu desde maio/2001. Realizou-se o levantamento da


literatura na área específica e áreas afins, bem como, entrevistas com onze (11) pedagogos
que trabalham com o ensino coletivo com o objetivo de fundamentar as discussões do
7

observado. Participaram do experimento vinte e nove (29) sujeitos, com faixa etária
mínima de doze (12) anos. Delimitou-se um semestre letivo (agosto a dezembro de 2002)
para a realização da pesquisa de campo do experimento, com carga horária de duas
Intervenções/Aulas semanais. O experimento estudado foi desenhado para dois grupos de
perfis diferentes. O primeiro, trabalhando com pessoas da comunidade com perfis diversos.
O segundo, trabalhando pré-adolescentes e adolescentes que atuam no mercado informal
de rua (a princípio excluídos de uma educação formal mais séria e eficaz, bem como, de
algum tipo de educação musical). A coleta de dados teve como instrumentos de pesquisa:
1) Planejamento das aulas; 2) Diário de Classe; 3) Fichas de questionário dos sujeitos; 4)
Filmagens através de câmera de vídeo 8mm de cada intervenção/aula; 5) Filmagens em
8mm de depoimentos/entrevistas dos sujeitos no final do semestre letivo; 6) Filmagens e
Programas dos Recitais Finais (verificação do ensino-aprendizagem); 7) Fitas de vídeos
com a divulgação do projeto que foi veiculada na imprensa televisiva; e 8) Recortes de
jornais com a divulgação do projeto na imprensa escrita.
O produto final da pesquisa, e/ou observações a serem encaminhadas, foram
baseados na experiência prática e nas observações sistematizadas do processo
desenvolvido. Portanto, na pesquisa proposta, foram feitas descrições e análises de como
se desenvolveu cada grupo e qual foi o processo de aprendizagem. A análise foi feita via
metodologia dedutiva, onde foram estudados os fenômenos, suas relações, seus elementos,
resultando num trabalho qualitativo.

Através da pesquisa proposta, esperou-se investigar sistematicamente o


processo desenvolvimento do aprendizado em instrumentos de cordas pelo ensino coletivo.
Investigou-se, portanto, o ensino coletivo de cordas como uma metodologia eficiente para
a iniciação instrumental; e ainda, como meio de democratização da educação musical e
conseqüentemente, de transformação social.
Esperou-se discutir metodologias e estratégias de ensino, adequados ao ensino
instrumental em grupo, uma vez que estas metodologias parecem propiciar o acesso da
comunidade em geral à Iniciação Instrumental de Cordas. Pensa-se que o conseqüente
desenvolvimento da qualidade deste ensino é a finalidade do processo pedagógico – formar
instrumentistas e professores mais capacitados para o ensino, bem como, formar futuros
apreciadores (público) de uma música mais elaborada. Ainda, com o presente estudo,
8

provavelmente, uma contribuição será dada à literatura da área (inexistente no Estado de


Goiás e em número reduzido no país).
No capítulo 2, tratou-se o ensino musical como meio de transformação social.
Abordou-se as relações existentes entre Educação e Sociedade, Cultura e Sociedade, e
Música e Sociedade. Ainda, a educação musical na contemporaneidade e o papel da
universidade frente aos novos fenômenos musicais.
No capítulo 3, ressaltou-se os espaços já empreendidos na área do ensino
coletivo em instrumentos musicais no Brasil. E ainda, os aspectos pedagógicos e
psicológicos do ensino instrumental em grupo e observações sobre a metodologia
sistematizada por Galindo.
O capítulo 4, resultou dos aspectos ressaltados das entrevistas feitas com
educadores musicais que atuam nas cidades de São Paulo, Belo Horizonte e Salvador,
buscando conhecer como era a prática pedagógica dos mesmos e como se encontrava o
panorama do ensino coletivo de instrumentos musicais no país. E ainda, através das
entrevistas, vários aspectos e questões da área puderam ser expostos e discutidos,
enriquecendo as análises do experimento.
No capítulo 5, apresentou-se a metodologia utilizada na condução da
investigação proposta. Tratou-se de fundamentar inicialmente o tipo de análise a ser
realizada para a valorização e entendimento dos dados. Esta análise se baseou na
observação da pesquisa em ação, com base no que foi proposto por BARBIER (1997),
desde o processo de aprendizagem, possibilitando ao professor/pesquisador observar como
agente e colaborador, à transformação pretendida dos sujeitos participantes, ou seja,
intervindo nesse processo. É parte também deste capítulo, a descrição e análise do
experimento: o perfil dos sujeitos e dos grupos, as intervenções/aulas, os recitais, os
depoimentos dos sujeitos, a análise do júri. Neste capítulo, apresentaram-se os resultados e
a análise final.
Depois de feitas as análises dos fenômenos observados, o capítulo 6 contém a
conclusão, que foi direcionada para a seguinte questão: como o ensino coletivo de
instrumentos musicais pode contribuir para a democratização do ensino musical,
propiciando uma educação musical como parte da formação do indivíduo, transformando o
ser humano e, conseqüentemente, a sociedade. Após a conclusão, chegou-se ao capítulo 7,
onde foram apresentadas as considerações finais.
9

2. O ENSINO MUSICAL COMO MEIO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

2.1. EDUCAÇÃO E SOCIEDADE

O ser humano ao longo de sua existência experimenta, vivencia, observa,


conhece. Da necessidade de desenvolver-se material e espiritualmente, o indivíduo procura
conhecer a si mesmo e o mundo que o cerca. Desta forma, o conhecimento é o resultado do
pensamento sobre a relação que se estabelece entre o sujeito e o objeto a ser conhecido.
A busca do conhecimento é permanente na trajetória humana. Desde o
princípio da humanidade, o indivíduo percebeu que através da união com seus
semelhantes, ou seja, a partir da formação de grupos, poderia obter mais sucesso,
trabalhando conjuntamente a fim de garantir sua sobrevivência. Através do grupo poderiam
trocar idéias, sentimentos, valores, enfim, o saber.
Não há sociedade sem educação e não há educação sem sociedade. Cada
sociedade em cada época cuidou da formação do indivíduo através dos modelos e padrões
culturais vigentes. Assim como a sociedade se transforma, a educação também se
transforma. E o quê entende-se por Educação?
Segundo LIBÂNEO (1991) “a educação – ou seja, a prática educativa – é um
fenômeno social e universal, sendo uma atividade humana necessária à existência e
funcionamento de todas as sociedades” (p.16 e 17). Complementando esse pensamento
com o fator político, SAVIANI (2001) acredita que “a importância política da educação
reside na sua função de socialização do conhecimento” (p.88).
Entende-se que a educação não é neutra. A educação está relacionada a uma
intrincada teia de áreas de conhecimento. Nesse sentido, para analisar a educação na
sociedade, deve-se levar em conta a sua conexão com diversas áreas, tais como: Filosofia,
Sociologia, Economia, Antropologia, Psicologia, dentre outras. Não há como analisar a
educação como um meio de transformação social sem manter um diálogo com os demais
campos disciplinares. Não há como fixar fronteiras rígidas ou isoladas, já que todos esses
campos têm como objetivo desvendar o homem e suas relações e práticas sociais.
10

Quando o tema é educação, deve-se considerar, analisar e discutir a função


social dos diversos processos educativos na produção, reprodução ou transformação das
relações sociais.
LIBÂNEO (1991) acredita que a prática educativa não se constitui apenas
como uma exigência social, mas também o “processo de prover os indivíduos dos
conhecimentos e experiências culturais que os tornam aptos atuar no meio social e a
transformá-lo em função de necessidades econômicas, sociais e políticas da coletividade”
(p.17). A prática educativa é parte da dinâmica das relações sociais e das formas de
organização da sociedade. E por isso, a educação não é neutra, muito menos igualitária. É
usada de acordo com os interesses dos que estão no poder.
LUCKESI (1994), identifica a existência de três correntes filosófico-políticas
que atuam no âmbito da educação. E explica que as considera filosóficas, porque
compreendem o sentido da educação; e políticas, porque constituem um direcionamento
para a ação educativa. A seguir, apresenta-se às referidas correntes: 1) Educação como
redenção da sociedade: entende a educação como redentora da sociedade, ou seja, a
educação é responsável pela direção da sociedade, salvando-a da situação em que se
encontra; 2) Educação como reprodução da sociedade: acredita que a educação reproduz a
sociedade, como ela é e está, ou seja, a educação reproduz a realidade que se vive; 3)
Educação como transformação da sociedade: a educação funciona como instância
mediadora de uma forma de entender e viver a sociedade.
O autor destaca que essa última corrente, compreende a educação como
mediação de um projeto social. Não redime nem reproduz a sociedade, mas serve de
instrumento, ao lado dos outros, para realizar um projeto para a sociedade (projeto este que
pode ser conservador ou transformador). Esta corrente pretende “(...) demonstrar que é
possível compreender a educação dentro da sociedade, com seus determinantes e
condicionantes, mas com a possibilidade de trabalhar pela sua democratização”
(LUCKESI,1994,p.48).
No trajeto histórico, a educação vem sendo utilizada de várias maneiras, de
acordo com as estruturas políticas e sócio-econômicas de cada época. Infelizmente, em
grande parte, a educação vem sendo utilizada de forma controladora, manipuladora, ou até
mesmo “adestradora”, de acordo com os interesses dos mais poderosos:
11

Na perspectiva das classes dominantes, historicamente, a educação


dos diferentes grupos sociais de trabalhadores deve dar-se a fim de
habilitá-los técnica, social e ideologicamente para o trabalho.
Trata-se de subordinar a função social da educação de forma
controladora para responder às demandas do capital (FRIGOTTO,
2000, p.26).

Por outro lado, FRIGOTTO (2000), com base no pensamento de


GRYZYBOWSKI (1986), acredita que na perspectiva de grupos sociais, principalmente a
classe trabalhadora, a educação seja voltada para o desenvolvimento das potencialidades e
do saber social, que permitirá a esse homem (trabalhador) possuir uma melhor
compreensão da sua realidade e desenvolvendo a capacidade de fazer valer seus próprios
interesses econômicos, políticos e culturais.
Através do referencial econômico, vê-se que a ideologia da educação,
modifica-se na medida em que mudam os interesses sociais. A perspectiva pedagógica
modifica-se de acordo com cada faixa social, ou seja, a partir das divisões de classes.
“Podemos perceber que a explicitação do papel social da educação, ou especificamente da
relação entre o processo social da educação, ou especificamente da relação entre o
processo de produção e os processos educativos ou de formação humana, vem marcada por
concepções conflitantes, sobretudo, antagônicas” (FRIGOTTO, p.29).
MACEDO (2000) em seu texto “O Cenário de Exclusão Social – uma
tentativa de desconstrução”, afirma que educação desempenha um papel crucial no
processo de desigualdade social. Apesar de se saber que este é um processo de extrema
complexidade e, que não se poderá resolver apenas com a mudança de currículos, ou na
prática diária da sala de aula, mas através da educação, pode-se aprofundá-lo ou não. No
trecho a seguir a autora expõe claramente o seu ponto de vista:

Essa é uma questão que precisa ficar clara ao se trabalhar com


educação. Seu papel no jogo de forças que determina quem vai
ficar no poder; quais são os grupos beneficiários e quais não os são
na sociedade. Quem tem e quem não tem direito de sonhar e ver
seus sonhos realizados. Quem pode crescer e ultrapassar limites. E
quem vai ter as asas cortadas, quem sempre voará baixo e não
conhecerá as próprias potencialidades e nem sequer alcançará seus
limites. No entanto, isso não é imutável. A história da humanidade
é a história de seu próprio movimento que a mantém em
permanente transformação. É nesse continuum que brotam e se
alimentam as inquietações, os sonhos e as utopias individuais e
12

coletivas e que se dão as pequenas, cotidianas ou grandes e


históricas mudanças na sociedade (MACEDO, p.47 e 48).

A autora expõe que o tema - desigualdade social e ensino/educação - tem sido


alvo de vários estudos no campo sociológico. Fundamentada no pensamento de Boudon
(1981)3, afirma que “apesar das desigualdades culturais serem observáveis desde idades
muito tenras e de ser impossível sua supressão, é a origem social a variável que mais pesa
no processo da desigualdade diante do ensino. Mesmo porque essa variável reduz
progressivamente as desigualdades culturais” (MACEDO, p.48). Diante do quadro de
desigualdade educacional, tendo como pano de fundo a social e a cultural, já mencionadas.
MACEDO (2000) nos demonstra o vínculo econômico quando afirma que a acumulação
do conhecimento segue pari passu com a acumulação de riquezas por parte dos poderosos,
e que “nesse processo, aumenta o fosso entre o conhecimento apropriado pela classe
dominante, ao menos aquele transmitido pelos especialistas, no caso, o professor, e o
assimilado pelo povo” (p.50). As diferenças sociais são referendadas pelas diferenças na
educação, sendo que a desigualdade social alimenta e é alimentado pelo sistema de ensino.
Diante dessa realidade, é oportuno afirmar que a educação no decorrer da
história desenvolve-se como um poderoso instrumento de poder. O acesso à escola é um
reflexo desse quadro, bem como a qualidade do ensino oferecido. E o que significa
democratizar o ensino?
Em sentido amplo é dar acesso a todos o cidadãos a uma escola pública,
gratuita e de qualidade, seguindo ainda os preceitos iluministas da era revolucionária
francesa. Sob este aspecto, há uma tentativa de que as palavras de liberdade, igualdade e
fraternidade não sejam apenas belas palavras a serem guardadas nos livros de história, sem
significado real.
Em sentido estrito, LIBÂNEO (1996) afirma que democratização do ensino
está na maneira pela qual o professor desenvolve o ensino-aprendizagem:

Democratizar o ensino é ajudar os alunos a se expressarem bem, a


se comunicarem de diversas formas, a desenvolverem o gosto pelo
estudo, a dominarem o saber escolar; é ajudá-los na formação de
sua personalidade social, na sua organização enquanto
coletividade. Trata-se, enfim, de proporciona-lhes o saber e o
saber-fazer críticos como pré-condição para sua participação em
3
Ver em Boudon, Raymond. A desigualdade das oportunidades: a mobilidade social nas sociedades
industriais. Tradução de Carlos Alberto Lamback. Brasília: Unb, 1981.
13

outras instâncias da vida social, inclusive para melhoria de suas


condições de vida (LIBÂNEO, p.12).

O autor entende que a democratização da escola pública deve ser entendida


como uma maneira de ampliar as oportunidades educacionais, onde os conhecimentos
seriam difundidos através de uma reelaboração crítica. Com isso, seria necessário o
aprimoramento da prática educativa na escola objetivando a elevação cultural e científica
das camadas populares, contribuindo tanto na resposta às suas necessidades e aspirações
imediatistas, como a melhoria de vida, quanto na sua inserção em um projeto de mudança
social mais amplo.
Porém, LIBÂNEO compreende que a transformação social não se dará
exclusivamente pela ação pedagógica, apesar da luta pedagógica ser parte das lutas
políticas. Mas o papel da escola, como instrumento do despertar do conhecimento e da
consciência crítica do cidadão, parece ser evidente. Já que:

A escola mantém uma relação dinâmica com a realidade social,


possibilita a luta por melhores condições de vida, a formação de
dirigentes políticos que representem as camadas populares,
desmistifica os conteúdos das matérias, substitui modelos sociais e
éticos por outros, adequados a um novo projeto de sociedade, ou
seja, ela é uma ameaça à ordem estabelecida (LIBÂNEO, p. 49).

Para que a educação contribua na transformação da sociedade, é preciso que


se busque, pedagogias e didáticas apropriadas, que contemplem tal pressuposto. LIBANÊO
(1996) defende uma pedagogia que considere os determinantes sociais e que propicie a
crítica aos mecanismos e imposições resultantes da organização da sociedade
contemporânea, marcada pela divisão de classes sociais antagônicas. Porém, ao mesmo
tempo, deve ser entendida como “uma pedagogia que vai buscar no interior da escola,
respostas pedagógico-didáticas que permitam o exercício dessa crítica, a partir das próprias
determinações sociais das situações pedagógicas concretas” (p.12).
GOHN (1999) visualiza que a prática cotidiana de vários movimentos sociais
tem demonstrado que a relação entre os processos de aprendizagem e de exercício da
cidadania está cada vez mais clara. Segundo a autora, na última década do século XX, a
educação adquiriu, no discurso e na retórica, “uma visibilidade política nunca dantes
recebida. Isto não tem significado, até o momento, ações efetivas correspondentes. Mas
tem criado, a nível do senso comum, uma grande base de legitimidade” (p.7).
14

Se por um lado o discurso ainda não transpôs o plano teórico para o plano
prático, ações mais eficazes e por que não, revolucionárias, podem estar na eminência de
acontecer em um plano mais amplo, com o respaldo da sociedade a partir de estudos e
discussões. Para autora, “os anos 90 delineiam um novo cenário. A sociedade como um
todo aprendeu a organizar e a reivindicar seus direitos de cidadania, a partir da constatação
da qualidade de não-cidadãos na prática” (GOHN, 1999, p.8).
Nesse sentido, a sociedade através dos movimentos sociais, ou seja, dessa
organização, ainda que restritos, nutre esperanças de transformação e estas são construídas
através de experiências de vivenciamento de práticas coletivas, solidárias e contraditórias :

Ainda que restritas a pequenos grupos, essas experiências têm tido


grande efeito de ressonância no conjunto da sociedade e na
própria máquina estatal/governamental. São experiências
educativas, questionando o status quo vigente, preocupadas não
apenas com a aquisição de bens materiais mas também com a
qualidade de vida que estamos construindo, com o projeto para o
futuro que estamos gestando no presente (GOHN, p.9).

VILANOVA (2000) recorre ao ponto básico da pedagogia freiriana 4 que se


constitui no seguinte questionamento: que tipo de homem (ser humano) quero ajudar a
formar? E ainda: para que tipo de sociedade? A autora acrescenta a essas questões uma
outra: com que conhecimento? Para a autora, incorporar o pensamento de Paulo Freire na
prática pedagógica “é adotar uma concepção de construção do conhecimento a partir da
realidade cultural, política e sócio-econômica dos educandos e educandas, buscando
simultaneamente, desenvolver a sua capacidade crítica de interpretação do mundo, a
consciência dos direitos, dos deveres e de transformação social” (p.128).
A autora parte do princípio da não neutralidade e declara-se comprometida
com a mudança social, a partir de uma visão transformadora da realidade, com o
compromisso fundamental de formação do cidadão. Acredita que o processo de construção
da cidadania, tem como ponto de partida, pequenos cuidados, da formação de hábitos

4
Entende-se por pedagogia freiriana, aquela que é influenciada pelo pensamento do Professor Paulo Freire.
Usa-se, da mesma forma, o termo “freiriano” que se refere ao mesmo educador. David Trend (1999) explica
que os escritos de Paulo Freire tem destaque no meio acadêmico internacional, sendo que o cerne da
filosofia freiriana está na crença de que a Educação é o centro que determina as relações políticas e sociais.
Expõe que nas décadas de 70 e 80, os preceitos e a filosofia da Pedagogia Crítica (que surgiu da necessidade
de agir da sociedade contemporânea, considerando suas contradições de maneira dialética) foram adaptados
ao mundo industrializado como um meio de relacionar-se com os desequilíbrios de poder existentes. In:
“Cruzando as fronteiras do Discurso Educacional: Novas Políticas de Educação”, 1999, p.175.
15

cotidianos de convivência, de um clima positivo, de atenções especiais com o aluno ou


com o grupo.
Porém, a sociedade contemporânea é marcada pelas desigualdades sociais.
Como deve ser a atuação dos educadores no sentido de proporcionar uma educação que
desenvolva o sentido de cidadania àqueles que vivem em um cenário de exclusão? A
pedagoga descreve a filosofia do projeto pedagógico do “Axé”, desenvolvido em Salvador-
BA, voltado para menores em situação de rua, como sendo:

um investimento na estruturação interior e exterior da pessoa do


educando, construindo e desconstruindo normas, vínculos,
conceitos, e que se faz a partir de pequenas coisas, próprias da
relação familiar, mas negadas àqueles muitos pobres, que estão
fora da família, ou àqueles cuja miséria afetou crucialmente a
estruturação familiar e, por isso, perderam o sentido de proteção
de pertencimento, de aconchego, de lugar. Formar esse cidadão
passa pelo processo de formar o ser humano, reconhecido por si
mesmo e pela sociedade. Ajudar o educando a elaborar um projeto
de vida pessoal, como já referido, e social, é premissa básica do
processo pedagógico (VILANOVA, 2000, p.152).

Com isso, “toda ação educativa é precedida de uma reflexão sobre o ser
humano e da análise do meio concreto de quem queremos educar (ou melhor: a quem
queremos ajudar a educar-se)” (VILANOVA, p.152). Ainda, a autora acena que os
educadores comprometidos com seu trabalho, devem refletir sobre a teoria a partir dos
questionamentos surgidos na prática, no cenário cultural, tornando suas ações mais
consistentes, influenciando os conteúdos trabalhados, relacionando-os com a ordem das
relações humanas.
Destaca ainda que, a dimensão política, ou seja, o âmago do processo
pedagógico é manifestado na própria forma com que esses saberes são construídos e que
tipo de relação é gerada e qual é a implicação dos sujeitos envolvidos, utilizando-se
sobretudo, os saberes éticos e estéticos. Sinaliza, portanto, para a utilização dos conteúdos
artísticos, como forma de fortalecer “o sentido de pertencimento e de cidadania,
procurando-se criar uma cultura democrática e transformadora que sirva de base para todas
as relações” (VILANOVA, p.152). Prega a criação de aprendizagens significativas a partir
do contexto, propiciando o desenvolvimento da ludicidade, do imaginário, da criatividade,
da expressão simbólica, dos desejos, dos medos, das alegrias, das fantasias. Esse
desenvolvimento seria acompanhado de perto, com o objetivo de ampliar as experiências
16

das crianças e adolescentes, promovendo o acesso dos mesmos, às artes, à cultura


universal, à ética e à estética.
Por isso, assumir o pensamento freiriano, segundo VILANOVA, é fazer-se
uma ode à liberdade, à convivência com o diferente, à paixão pelo exercício do criar. A
pedagogia proposta por Paulo Freire, reconhece a dignidade do educando, quando afirma
que quem aprende é o sujeito em interação com o mundo.
Seguindo essa linha de pensamento, a educação constitui-se em “uma
atividade onde professores e alunos, mediatizados pela realidade que apreendem e da qual
extraem o conteúdo de aprendizagem, atingem um nível de consciência dessa mesma
realidade, a fim de nela atuarem, num sentido de transformação social” (LIBÂNEO, 1996,
p.33). A educação libertadora questiona a realidade de maneira concreta, das relações do
homem com a natureza e com os outros homens, visando essa transformação, sendo
portanto, uma educação crítica.
A contribuição do educador Paulo Freire nas correntes de educação, pós-
década de 60, que pregam uma visão mais crítica e contextualizada da sua função na
sociedade, parece ser evidente.
Para MCLAREN (1999), FREIRE modificou não só a maneira de entender a
educação no contexto social contemporâneo, mas sobretudo:

Ele deu à palavra ‘educador’ um novo significado, flexionando o


termo de modo a abraçar múltiplas perspectivas: intelectual
fronteiriço, ativista social, pesquisador crítico, agente moral,
filósofo radical, revolucionário político. Mais do que qualquer
outro educador deste século, Freire conseguiu desenvolver uma
pedagogia de resistência à opressão (MCLAREN, p.21).

FREIRE (1975) acreditava que a educação não é neutra, sendo que o


processo educativo é um ato político. De um lado, está a burguesia, do outro, os operários.
Através da ação pedagógica libertadora poderia haver a mudança social. Porém, a
pedagogia libertadora prescinde do diálogo entre as partes, professor e alunos. Nesse
sentido, o educador seria um provocador de situações, um animador cultural.
Ainda, o educador propôs a radicalização em oposição ao sectarismo, que é
fechado e irracional, como uma forma de modificar a realidade. Para ele, a sectarização é
castradora, não admite o diálogo pelo fanatismo da qual se nutre, porém:
17

A radicalização, pelo contrário, é sempre criadora, pela criticidade


que a alimenta. Enquanto a sectarização é mítica, por isso
alienante, a radicalização é crítica, por isso libertadora.
Libertadora porque implicando no enraizamento que os homens
fazem opção que fizeram, os engaja cada vez mais no esforço de
transformação da realidade concreta, objetiva (FREIRE, p.22).

Porém, FREIRE afirma que o radical, em um processo de libertação, não deve


ter atitude passiva diante da violência do opressor. Desta forma, o radical tem na práxis o
seu campo de atuação, sendo que a práxis é produto da “reflexão e ação dos homens sobre
o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-
oprimidos” (FREIRE, 1975, p.40).
GIROUX (1999), a partir da influência de FREIRE, vai além e propõe a
Educação Radical, que une a teoria e a práxis e tem suas premissas básicas originadas na
crise da teoria social: “Mais especificamente, podemos distinguir três peculiaridades: a
educação radical tem uma natureza interdisciplinar, questiona as categorias fundamentais
de todas as disciplinas e tem uma missão pública de tornar a sociedade mais democrática”
(p.20).
Segundo o educador, radical seria sinônimo de crítico, já que não se poderia
pensar em Educação Radical sem o pensamento crítico. Esclarece que a Educação Crítica
opera sobre dois pressupostos básicos: o primeiro afirma que há uma necessidade de uma
linguagem crítica e de questionar-se as pressuposições; o segundo seria a linguagem das
possibilidades.
A relação Poder e Educação tem importante destaque na construção do
pensamento do estudioso. Com base nesse aspecto, utiliza a palavra “empoderamento”,
que define da seguinte maneira:

É a capacidade de pensar e agir criticamente. Essa noção tem uma


referência dupla: para o indivíduo e para a sociedade. A liberdade
e as capacidades humanas dos indivíduos devem ser desenvolvidas
ao máximo, mas os potenciais individuais devem estar vinculados
à democracia, no sentido de que a melhoria social deve ser a
conseqüência necessária do florescimento individual. Os
educadores radicais encaram as escolas como estruturas sociais.
Essas estruturas devem educar as potencialidades que as pessoas
têm de pensar, para agir, para ser indivíduos e para ser capazes de
compreender os limites de seus compromissos ideológicos. É um
paradigma radical (GIROUX, p.21).
18

Nesse sentido, GIROUX entende que os educadores devem dar atenção as


atividades coletivas e a contexto social do aluno. Para ele, as escolas deveriam tratar os
“modos de vida”, sendo que as mesmas não são simplesmente “locais de instrução”. O
autor afirma que as escolas funcionam como culturas que legitimam algumas formas de
conhecimento e desaprovam outras. Percebe-se aí, que a escola pode manipular (e o faz!) o
conhecimento na medida que estabelece como e o que deve ser conhecido. Para isso, a
escola deve levar em conta a bagagem cultural do aluno, sua vida e seu contexto, tanto nas
práticas pedagógicas quanto na elaboração de um currículo. Esse pensamento é expresso
por GIROUX (1999), no relato de sua própria experiência:

Quando eu era criança, a aprendizagem era uma atividade coletiva.


Mas quando fui para a escola e tentei compartilhar a aprendizagem
com os outros alunos, isso foi chamado de ‘cola’. O currículo me
enviava a clara mensagem de que a aprendizagem era um esforço
extremamente individualista, quase secreto. Minha experiência na
classe trabalhadora não contava. Não apenas, mas foi depreciada.
Eu estava sendo reproduzido segundo uma lógica diferente
(GIROUX, p.24).

Nota-se no relato que esta escola, segue a linha que privilegia o


individualismo (da tradição liberal), que cerceia o envolvimento do indivíduo com o grupo,
em uma tentativa de limitar o intercâmbio de idéias e a troca de experiências.
A partir desse pensamento, GIROUX, em seus estudos, interessa-se pela
investigação de novos espaços discursivos para a aprendizagem. E daí, vem o seu interesse
pela cultura e pelos artistas. Em sua visão, os trabalhadores culturais têm uma função
pedagógica, quer exercendo suas atividades na sala de aula, quer exercendo nos palcos, nas
galerias ou nas ruas.
GIROUX (1999) defende que precisa ser estruturada uma nova linguagem
crítica educacional e cultural que dê embasamento para a compreensão de como as
diferentes formações sociais são estruturadas no controle das práticas pedagógicas e
culturas específicas. Acredita que os trabalhadores culturais precisam romper o
relacionamento entre a “diferença” e a “exploração”, com uma visão e movimento social,
que proporcione a transformação das condições materiais e ideológicas, onde a diferença
estará estruturada nos princípios de justiça, da igualdade e da liberdade. Com isso,
contribuiriam para que a cidadania (na concepção pós-moderna) e a democracia radical
fossem instaladas.
19

Para ele, os estudos culturais precisam ser reconstruídos como parte do


discurso mais amplo de “diferença” e “transformação pedagógica”. Esse discurso seria
embasado na dialética da crítica e da possibilidade: “Na verdade, quero dizer que os
estudos culturais oferecem um discurso teórico para uma nova política cultural da
diferença, da pedagogia e da vida pública” (p.191). Para que a reconstrução dos estudos
culturais, GIROUX sinaliza que seria fundamental a necessidade de ser desenvolvido um
discurso que acentue as conexões orgânicas entre os trabalhadores culturais e a vida
cotidiana, de um lado; e a educação e a reconstrução da cultura pública democrática de um
outro:

Na verdade, desenvolvo a proposição de que os estudos culturais


proporcionam a oportunidade de educadores e outros trabalhadores
culturais repensarem e transformarem o modo como as escolas, os
professores e os alunos se definem como sujeitos políticos capazes
de exibir sensibilidades críticas, coragem cívica e formas de
solidariedade enraizadas em um forte compromisso com a
liberdade e com a democracia (GIROUX, p.191)

Com base nesse pensamento, o educador deve aprofundar seu pensamento,


não só nas questões que envolvem Educação e Sociedade, mas também deve perceber o
papel da cultura na sua atividade pedagógica. Propõe-se discutir brevemente sobre Cultura
e Sociedade, quais são os conceitos de cultura e como eles influenciam na educação e na
música.

2.2. CULTURA E SOCIEDADE

O conceito de cultura não é consensual em relação aos estudiosos na área.


Tendo como base o estudo de THOMPSON (1995), passar-se-á a conhecer e discutir o
conceito de cultura dentro de uma visão histórica.
Segundo o autor, o conceito de cultura possui uma longa história própria,
tendo passado por vários tipos de conceito, sendo que o atual é produto desta história.
Primeiramente, o termo “cultura” significava cultivo, cuidado com alguma coisa (grãos,
animais etc). Partindo da relação entre o homem e a natureza, pode-se afirmar que o
primeiro conceito de cultura seria a maneira com que o homem interage com a natureza,
modificando o seu meio-ambiente e sua vida. A cultura seria a ação do homem sobre a
20

natureza e seu meio, visando à transformação da sua realidade. Este conceito é amplo, mas
serve de ponto de partida para a discussão de outras definições e enfoques.
No século XVI, o conceito saiu da esfera agrícola passando a ser utilizado no
processo do desenvolvimento humano: do cultivo de grãos passou a ser entendido como o
cultivo da mente. No século XVIII, o substantivo cultura (cultur) apareceu na França,
referindo-se ao processo geral do desenvolvimento humano ou ao produto deste processo,
logo sendo incorporado pelos alemães (kultur).
O conceito de cultura emergiu no final do século XVIII, como o processo de
desenvolvimento e enobrecimento das faculdades humanas, um processo facilitado pela
assimilação de trabalhos acadêmicos e artísticos e ligado ao caráter progressista da era
moderna. No início do século XIX, aparece o que foi chamado de concepção clássica do
conceito. O termo “cultura” era usado como sinônimo, ou em alguns casos, contraste do
termo “civilização”. Cultura era o processo progressivo de desenvolvimento humano, um
movimento em direção ao refinamento e à ordem, por oposição à barbárie e à selvageria”
(THOMPSON, 1995, p.167-168).
Essa concepção era fruto do espírito iluminista confiante no progresso da era
moderna. Acreditava-se que uma pessoa “culta” era uma pessoa “civilizada”. Na
Alemanha, com o passar do tempo, o termo “cultura” ganhou conotação positiva e
“civilização”, negativa. O civilizado estava ligado ao refinamento, a polidez enquanto que
o culto está ligado a produtos intelectuais, artísticos e espirituais.
O conceito clássico de cultura possui referencial no cultivo de uma “alta”
cultura, privilegiando alguns trabalhos e valores em relação aos outros: indivíduos mais
cultos (segundo a tradição clássica) são enobrecidos de mente e espírito. A concepção
clássica de cultura foi utilizada pelos filósofos e escritores nos séculos XVIII e XIX,
sobretudo os alemães. O termo “cultura” era utilizado para referir-se a um processo de
desenvolvimento intelectual ou espiritual como base na herança clássica se diferindo do
conceito de civilização.
Os pensadores da Escola de Frankfurt utilizavam como fundamento teórico à
distinção entre “civilização” e “cultura”, difundida na Alemanha. Cultura, seria o mundo
de idéias e dos sentimentos; o mundo espiritual das idéias, da arte, dos sentimentos etc. Já
civilização significa o mundo da reprodução material da vida. Portanto, a partir dos
modelos clássicos, a cultura ocidental é colocada como superior.
21

A concepção antropológica é a terceira apresentada por THOMPSON. Com o


surgimento da Antropologia, influenciado pelo pensamento evolucionista de DARWIN, o
conceito de cultura ganha novo enfoque. A Antropologia Cultural (ramo da antropologia
que estuda a relação do homem e a cultura, consolidada, a partir da metade do século XIX)
faz estudos referentes à cultura de grupos étnicos, que possui em comum um território,
uma língua, um modo de vestir, comer, enterrar os mortos, enfim, um modo de viver e se
relacionar dos homens, independente de todo o seu aparelho físico. Tudo aquilo que
constrói a história.
THOMPSON acredita que quando HERDER utilizou o termo “culturas”, ele
pretendia chamar a atenção para as características particulares de diferentes grupos. Esse
fundamento foi utilizado pela Antropologia, no século XIX, que através dele, pretendia que
o estudo da cultura pudesse elucidar os costumes, as práticas e as crenças de outras
sociedades, não européias. Existem duas concepções de cultura no sentido antropológico:
a descritiva e a simbólica.

A concepção descritiva de cultura refere-se a um variado conjunto


de valores, crenças, costumes, convenções, hábitos e práticas
características de uma sociedade específica ou de um período
histórico. A concepção simbólica muda o foco para um interesse
com simbolismo: os fenômenos culturais, de acordo com esta
concepção, são fenômenos simbólicos e o estudo da cultura está
essencialmente interessado na interpretação dos símbolos e da
ação simbólica (THOMPSON, 1995, p.166).

Nota-se que a concepção descritiva está relacionada aos estudiosos


interessados na descrição etnográfica de sociedades não européias. A cultura é vista como
um “conjunto inter-relacionado de crenças, costumes, formas de conhecimento, arte etc.,
que são adquiridos pelos indivíduos enquanto membros de uma sociedade particular e que
podem ser estudados cientificamente” (THOMPSON, 1995, p.171-172). Neste pensamento
impera a influência do evolucionismo de Darwin. Um conceito de cultura, baseado na
concepção descritiva, segundo THOMPSON seria: “A Cultura de um povo ou sociedade é
o conjunto de crenças, costumes, idéias e valores, bem como os artefatos, objetos,
instrumentos materiais, que são adquiridos pelos indivíduos enquanto membros de um
grupo ou sociedade” (p.173). O método de estudo, a partir dessa concepção, se dará pela
comparação, pela classificação e/ou pela análise científica.
22

Já a concepção simbólica, está relacionada ao estudo do simbólico e suas


vertentes. O conceito de cultura sob o prisma simbólico, é entendido por THOMPSON
(1995), da seguinte forma: “Cultura é o padrão de significados incorporados nas formas
simbólicas, que inclui ações, manifestações verbais e objetos significativos de vários tipos,
em virtudes dos quais os indivíduos comunicam-se entre si e partilham suas experiências,
concepções e crenças” (p.176). O método de estudo, se dá pela análise dos fenômenos
culturais e/ou pela análise cultural (para elucidar padrões de significados incorporados às
formas simbólicas). Essa concepção é apropriada para discussão construtivista no estudo
dos fenômenos culturais, inclusive com os contextos e estruturas sociais, tais como Cultura
de Massa e Indústria Cultural.
A partir da concepção simbólica, THOMPSON propõe uma nova concepção
do conceito de cultura denominado “Concepção Estrutural de Cultura”. O autor pretende
dar ênfase tanto ao caráter simbólico dos fenômenos culturais como na inserção dos
mesmos nos contextos sociais estruturados. Define análise cultural como “o estudo das
formas simbólicas – isto é, ações, objetos e expressões significativas de vários tipos – em
relação a contextos e processos historicamente específicos e socialmente estruturados
dentro dos quais, e por meio dos quais, essas formas simbólicas são produzidas,
transmitidas e recebidas” (THOMPSON, 1995, p.181).
Essa visão é referendada por ARAÚJO (2001), que acredita que o conceito de
cultura trata da produção do simbólico: “Tudo que diz respeito à produção do simbólico
diz respeito à cultura (...) De qualquer forma, é a criação de um imaginário a partir de suas
práticas cotidianas, a partir de suas crenças, a partir de seus valores etc.” (p.212).
Da mesma forma, MARCUSE (1998), um dos pensadores da Escola de
Frankfurt, propõe através de seus estudos, uma redefinição do conceito de cultura, mas
partindo de um ponto de vista sociológico. O autor tem no conceito de WEBSTER, o ponto
de partida, para a sua definição: “cultura é entendida como o complexo específico de
crenças religiosas, aquisições, tradições etc. que configuram o ‘pano de fundo’ de uma
sociedade” (p.154). MARCUSE visualiza que o conceito de cultura deve ser elaborado a
partir dos valores que estão explícitos na sociedade, como ponto de convergência, mas
também no que está implícito, ou seja, o que está no “pano de fundo” da sociedade,
devendo refletir os valores culturais e sua relação com a estrutura social. MARCUSE
define o seguinte conceito:
23

Cultura como processo de humanização caracterizado pelo esforço


coletivo para conservar a vida humana, para pacificar a luta pela
existência ou mantê-la dentro de limites controláveis, para
consolidar uma organização produtiva da sociedade, para
desenvolver as capacidades intelectuais dos homens e para
diminuir e sublimar a agressão, a violência e a miséria
(MARCUSE, 1998, p.154).

MARCUSE acredita que a sociedade contemporânea necessita de novas


abordagens sobre cultura e valores culturais. Afirma que houve uma mudança na relação
civilização-cultura imposta pela nova sociedade tecnológica, conseqüentemente, os valores
e referenciais culturais modificaram-se. O autor destaca como sendo valores culturais na
atualidade: o aumento da liberdade pessoal e pública, a diminuição das desigualdades (que
impedem o desenvolvimento dos “indivíduos” ou da “personalidade”), assim como uma
administração capaz e racional. Ainda, alerta que a discussão e a redefinição do conceito
de cultura, “(...) contraria as tendências mais potentes. Significaria a libertação do pensar ,
do investigar, do ensinar e do aprender do sistema existente de valores e de modos de
comportamento, assim como a elaboração de métodos e de conceitos capazes de
ultrapassar racionalmente os valores estabelecidos” (MARCUSE, 1998, p.165).
Observa-se que no século XX, o conceito de cultura passa a ser discutido com
mais freqüência e de forma mais crítica, sob a luz de vários enfoques e concepções. Com
isso, vários novos conceitos de cultura surgiram e surgem, coexistindo na sociedade
contemporânea (com todas as suas contradições).
Nos dias atuais, ao se tratar da cultura na sociedade contemporânea, um novo
fenômeno deve ser analisado: a globalização cultural. ORTIZ (1994), parte do seguinte
questionamento: como pensar na realidade mundial a partir da questão cultural?
O autor desperta para o surgimento de outro conceito de cultura, a partir do
ponto de vista da globalização econômica. Por outro lado, ORTIZ entende que a questão
não é tão simples, pois a herança intelectual tende a ressaltar os aspectos específicos de
cada cultura. Assinala que HERDER inaugurou uma maneira de pensar a cultura como a
“totalidade de um modo de vida”, como o “espírito de um povo”. E completa que
HERDER se recusava a considerar o “universal”, a “humanidade”, se voltando para
analisar a identidades particulares. Com isso:
24

As sociedades escapariam assim das malhas da história global,


elas seriam análogas aos organismos vivos, centrados sobre si
mesmos. Cultura existiria apenas no plural, enfoque antagônico à
visão abrangente do iluminismo. Apesar das polêmicas sobre
como defini-la conceitualmente, esta dimensão pluralista
permanece e permeia a tradição antropológica (ORTIZ, 1994,
p.20).

ORTIZ complementa que cada “povo” é uma entidade, um “mundo” diverso


dos outros. Esta afirmação é respaldada pelo pensamento dos antropólogos, que se vêm
como decifradores de uma linguagem oculta e estudiosos das diferenças. A categoria
cultura lhes permite dar conta desta pluralidade dos modos de vida e de pensamento. A
análise da mundialização da cultura, na visão de ORTIZ, entra em conflito com boa parte
da tradição intelectual existente, que possui fundamentação antropológica. O que é
proposto pelos antropólogos é exatamente estudar o conjunto de valores, estilos, formas de
pensar, que se estende a uma diversidade de grupos sociais. Para ele, são poucos os
antropólogos interessados no estudo do processo de mundialização cultural. Com isso, essa
questão requer uma mudança no enfoque a ser estudado.
Assim como MARCUSE, propõe trocar o referencial antropológico pelo
sociológico, para que se entenda melhor as profundas transformações por que passa o
mundo moderno, a globalização cultural, proposta por ORTIZ, deve ser estudada. Já que
“uma cultura mundializada corresponde a mudanças de ‘ordem estrutural’ e essas
transformações constituem a ‘base material’ que sustenta a contemporaneidade” (ORTIZ,
p.22). Portanto, não se pode negar que o universo cultural possui uma interação com a
dimensão econômica evidente. Com isso, para analisar a cultura no universo da
contemporaneidade, o enfoque econômico, que é a base principal do sistema capitalista e
bandeira do movimento de globalização, deve ser considerado, assim como, o social. O
enfoque sociológico é imprescindível, para se entender a ação do homem no espaço, no seu
tempo. O homem faz a história, e sem o elemento sociológico não há como entender as
estruturas sociais e suas indeterminações, fruto do pensamento humano e sua ação.
A partir do que foi exposto, pode-se afirmar que existem vários conceitos de
cultura, a partir de diversos enfoques. Nota-se que por trás de cada conceito há um
referencial teórico que determina a ideologia de cultura de cada autor, de cada sistema, e
por que não, de cada governo. Sabe-se que a cultura está ligada aos valores comuns de um
grupo social, porém questiona-se: até que ponto os valores culturais vigentes refletem o
25

espírito de um povo ou seriam impostos/manipulados por grupos dominantes? Como


discutir a cultura no mundo contemporâneo (cultura de massa, mídia e novas tecnologias)?
Existe cultura oficial ? A quem ela interessa? Seria possível uma globalização cultural ?
O conceito de cultura brasileira também é polêmico e possui várias vertentes,
defendidas por vários autores. Sabe-se que a cultura brasileira é fruto da união de três
raças: a amarela, a branca e a negra, já que o povo brasileiro é formado a partir do
elemento nativo-indígena, do europeu e do africano. RIBEIRO (2000) entende que a
“sociedade e a cultura brasileiras são conformadas como variantes da versão lusitana da
tradição civilizatória européia ocidental, diferenciadas por coloridos herdados dos índios
americanos e dos negros africanos” (p.20).
A questão cultural brasileira, segundo SODRÉ (1970), passa por três
períodos distintos. O primeiro foi denominado de Período Colonial, onde o que existia era
uma cultura transplantada da Europa para o Brasil, anterior ao aparecimento da camada
social intermediária a pequena burguesia (século XVI até a 1ª metade do século XVIII).
Neste primeiro momento, a cultura seria de exploração. O segundo foi denominado de
Período Colonial de Transição, onde a cultura ainda era transplantada. Este período é
posterior ao aparecimento da camada intermediária, a pequena burguesia (2ª metade do
século XVIII até 1930), em que se deu o surgimento de uma nova sociedade. E por fim, o
terceiro período (a partir de 1930), é marcado pelo surgimento e processo de
desenvolvimento da cultura nacional, devido o alastramento das relações capitalistas.
Somente neste último período, é que se pode afirmar que a cultura nacional ganhou uma
identidade original, ocasionando a “afirmação” e a “independência” da Cultura Brasileira.
SODRÉ acredita que somente neste último período é que se inicia o desenvolvimento
cultural no país. Nota-se aí, que SODRÉ possui uma visão desenvolvimentista a partir do
ponto de vista econômico.
Por outro lado, BOSI (1992) defende que não se pode falar em Cultura
Brasileira, ou seja, uma cultura que aglutine todas as manifestações materiais e espirituais
do povo brasileiro. Para o autor, essa unidade ou uniformidade parece não existir em
nenhuma sociedade moderna, menos ainda, em uma sociedade onde existem classes sociais
distintas. BOSI acredita que cultura seria a “herança de valores e objetos compartilhada por
um grupo humano relativamente coeso” (p.309). Para ele, existem várias culturas
brasileiras, e vários tipos de classificação. Primeiramente, classifica a Cultura Brasileira
em duas vertentes: a Cultura Erudita Brasileira, baseada no sistema educacional,
26

principalmente nas universidades, e a Cultura Popular, basicamente iletrada, representando


a simbologia do homem rústico, sertanejo ou interiorano, do homem pobre suburbano.
Nesta primeira classificação, BOSI discute o limite entre a academia e o folclore.
A partir do ponto de vista do desenvolvimento urbano-capitalista, BOSI
define dois novos conceitos: a Cultura Criadora e a Cultura de Massas. A Cultura
Criadora, que seria as culturas individualizadas de escritores, de compositores, de artistas
plásticos, de dramaturgos, de cineastas, enfim, de intelectuais que não estão na
universidade, mas que possui um conhecimento considerado alto, participando de um
sistema cultural elevado. A Cultura de Massas, segundo o autor, estaria ligada ao sistema
de produção e ao mercado de bens de consumo.
Portanto, para que o educador tenha uma percepção crítica e contextualizada
de seu papel na sociedade em que vive, deve estar atento a que tipo de educação pratica e a
partir de qual conceito (ideologia) de cultura age. E o educador musical deve visualizar e
intervir nesse contexto a partir de sua ferramenta de trabalho: a música.

2.3. MÚSICA E A SOCIEDADE

2.3.1. As funções sociais da música

A música é uma das manifestações culturais que sempre esteve presente na


vida do homem. Para que se possa compreender a importância da música e o papel do
educador musical na sociedade contemporânea, deve-se abordar, primeiramente, a relação
entre a música e o homem, bem como, a música na sociedade.
Segundo SCHAFER (2001), a origem da música seria explicada por dois
mitos gregos. O primeiro, remete-se a Píndaro, que nas Doze odes píticas, descreveu como
surgiu a arte de tocar aulos5. A partir dos escritos de Píndaro, a arte de tocar aulos teria
sido inventada por Palas-Atena que após a decapitação de medusa, ficou comovida com o
choro das irmãs e criou o nomos6 (designados por Deus e somente o grande artista poderia

5
Aulos é um “instrumento grego de palheta, consistindo de um tubo cilíndrico ou levemente cônico, em geral
com cerca de 50 cm de comprimento” (Dicionário Grove de Música, 1994, p.49).
6
“Na Grécia antiga, certas melodias-tipo, inalteráveis, a que se atribuía influência mágica, moral ou
simplesmente ritual. Sempre cantados, os nomos tinham a participação de instrumentos acompanhantes,
como a cítara, o aulo etc” (Dicionário Grove de Música, 1994, p.653).
27

recebê-los). O outro, seria trazido pela lenda de Hermes, que teria inventado a lira7, a partir
da percepção de que a carapaça da tartaruga poderia ser utilizada como caixa de
ressonância na produção do som. O autor observa que, no primeiro mito, a música surge
como emoção subjetiva e no segundo mito, a música é resultante das descobertas das
propriedades materiais do universo. E complementa que tais fundamentos são utilizados
em todas as teorias da música subseqüentes.
SCHAFER comenta que a lira é o instrumento de Homero, da epopéia, da
serena contemplação do universo. Já o aulos, é o instrumento de exaltação, da tragédia, do
ditirambo8 e do drama. A lira é o instrumento de Apolo e o aulos de Dionísio. O autor faz
um interessante comentário sobre o pensamento apolíneo e dionisíaco, influenciando o
pensamento musical através dos séculos:

Na visão apolínea, a música é exata, serena, matemática, associada


às visões transcendentais da Utopia e da Harmonia das Esferas. É
também a anáhata dos teóricos hindus. É a base de especulação de
Pitágoras e dos teóricos medievais (época em que a música era
ensinada como uma disciplina do quadrivium, ao lado da
aritmética, da geometria e da astronomia), bem como da técnica de
composição sobre doze notas de Schoenberg. Seus métodos de
exposição são as teorias dos números. Ela busca harmonizar o
mundo pelo projeto acústico. Na visão dionisíaca a música é
irracional e subjetiva. Ela emprega recursos expressivos:
flutuações temporais, obscurescimento da dinâmica, coloração
tonal. É a música de palco operístico, do bel canto, e sua voz
aguda e penetrante pode ser também ouvida nas Paixões de Bach.
É sobretudo a expressão musical do artista romântico, tendo
prevalecido durante todo o século XIX e no expressionismo do
século XX. Ainda hoje é ela que preside à formação dos músicos
(SCHAFER, 2001, p.21 e 22).

PALÁCIOS (2001) afirma não ser exagero “dizer que a compreensão de um


dos aspectos centrais da música é simultânea com a compreensão da própria essência do
universo e da natureza humana” (p.24). O autor cita o pensamento do filósofo e
matemático grego Pitágoras, que acreditava que a harmonia musical refletia a harmonia do

7
Lira é “Instrumento de cordas, presas a uma barra com dois braços (...) A lira e a cítara foram os mais
importantes instrumentos de cordas na Grécia e Roma antigas. A lira tem caixa de ressonância feita a partir
do casco da tartaruga (conforme consta do mito que narra sua invenção por Hermes)” (Dicionário Grove de
Música, 1994, p. 540).
8
Ditirambo, “Designação para uma canção em honra ao deus Dionísio. Os ditirambos gregos forma escritos
entre 700 aC e 200 d.C. O termo foi retomado no séc. XIX para peças que visavam evocar a qualidades
desregradas e veementes de Dionísio (Baco)” (Dicionário Grove de Música, 1994, p. 270).
28

universo. O pensador identificou a relação entre a música e a alma, sendo que a música tem
uma influência decisiva no caráter da pessoa, e por isso, acreditava que todos deveriam tê-
la na educação, como parte da sua formação. Pitágoras enxergou o interesse social na
música. Da mesma forma, o autor cita Platão, que descreveu na obra “A República”, a
relação existente entre a música e o comportamento humano. Como a música é composta
de melodia, harmonia e ritmo, Platão acreditava que suas possíveis combinações afetavam
o comportamento humano. Para o grande filósofo, a educação pela música deveria começar
antes mesmo das crianças começarem a raciocinar. Platão percebeu a função social da
música.
NUNES (1997) afirma que Pitágoras não deixou escritos ou fragmentos.
Porém, deixou um legado a seus seguidores, através de referências sobre números e suas
funções na música e na cosmologia. Essas referências, segundo o autor, não foram
fundamentadas na matemática propriamente dita ou na física experimental, mas permitiram
a seus discípulos considerar as relações numéricas como essência de todas as coisas. Para
os pitagóricos, o mundo observável consiste num arranjo harmônico baseado em
proporções numéricas.
Ainda, o mesmo autor destaca que o modelo platônico da harmonia das
esferas, descrita em nos diálogos de “A República”, constituiu-se na mais elaborada forma
de modelo musical da Antigüidade Clássica, sendo que sua influência foi marcante até o
século XVI. A analogia da concepção platônica do universo com a música atinge o seu
limite, englobando-se o cosmos em seus mais variados aspectos: do ético ao estético, do
físico ao metafísico. NUNES (1997) afirma que as raízes dessa “fenomenal alegoria”
platônica estão na analogia pitagórica entre as relações numéricas e os intervalos musicais:

A série harmônica correspondente à ordem dos intervalos passa a


fazer parte de um jogo de similariedades envolvendo os mais
variados termos, no qual as relações numéricas entre as sete notas
da escala são transferidas para a ordenação planetária, segundo a
astrologia antiga: Lua, Sol, Vênus, Mercúrio, Marte, Júpiter e
Saturno (NUNES, p.30).

Vê-se que Platão utilizou os intervalos musicais e suas relações numéricas em


uma tentativa de explicar a estrutura do universo: “Trata-se agora não apenas de uma
cosmogonia, enquanto mito ou doutrina referente à origem do mundo, mas de uma
cosmogonia, que tenta explicar a estrutura do universo” (NUNES, 1997, p.30).
29

A influência da arte e da música na sociedade parece evidente. A função da


arte na sociedade é discutida por FISCHER (1987), que faz considerações sobre a
necessidade da arte para o homem e para a sociedade: “a arte tem sido, é e será sempre
necessária” (p.12). Para o autor, a arte “é o meio indispensável para essa união do
indivíduo como o todo; reflete a infinita capacidade humana para a associação, para a
circulação de experiências e idéias” (p.13).
FISCHER discute a função da arte a partir da visão bretchiniana, que acredita
que a arte possui uma qualidade libertadora, como um instrumento de igualdade social:
“Brecht observa que, numa sociedade dividida pela luta de classes, o efeito ‘imediato’ da
obra de arte requerida pela estética da classe dominante é o efeito de suprimir as diferenças
sociais existentes na platéia, criando, assim, enquanto a peça vai sendo encenada, uma
coletividade ‘universalmente humana’ e não dividida em classes” (FISCHER, 1987, p.15).
O autor alerta que a razão de ser da arte nunca permanece inteiramente a mesma, e a
função da arte, numa sociedade em que a luta de classes se aguça, difere, em muitos
aspectos, da função original da arte. Cita que Marx enxergou o poder da arte de se sobrepor
ao momento histórico e exercer um fascínio permanente, já que toda arte seria
condicionada pelo seu tempo e representaria a humanidade em consonância com as idéias e
aspirações, as necessidades e as esperanças de uma situação histórica particular: “ao
mesmo tempo, a arte supera essa limitação e, de dentro do momento histórico, cria também
um momento de humanidade que promete constância no desenvolvimento”
(FISCHER,1987, p.17).
Transpondo para o campo musical, FREIRE (1992)9 discute em seu estudo
“Música e Sociedade”, as funções sociais da música através da história. No estudo
mencionado, visualiza e confirma a trajetória histórica das funções sociais da música nos
distintos períodos da civilização ocidental. Parte do conceito de MERRIAM (1964), que
considera que as funções sociais da música vão sendo construídas a partir de seus diversos
usos. Ao mesmo tempo, investiga a ocorrência de tais funções ao longo de quatro períodos
propostos por WIORA (1961)10.

9
Trata-se da pesquisa de doutorado da educadora musical Vanda B. Freire.
10
“1ª Idade – a pré-história e seus prolongamentos entre os povos primitivos, e na música popular arcaica de
civilizações posteriores; 2) 2ª Idade – desenvolvimento da música entre as altas culturas antigas
(Mesopotâmia, Egito, Oriente, antigüidade greco-romana; 3) 3ª idade – surgimento da música ocidental, ou
seja, a arte musical ocidental a partir da Alta Idade média; 4) 4ª idade – a idade da técnica e da indústria,
localizada pelo autor no século XX” (Freire, op. cit, 1992, p.19).
30

As funções sociais da música foram categorizadas por MERRIAM da


seguinte maneira: 1) Função de expressão emocional; 2) Função de prazer estético; 3)
Função de divertimento; 4) Função de comunicação; 5) Função de representação
simbólica; 6) Função de reação física; 7) Função de impor conformidades a normas
sociais; 8) Função de validação das instituições sociais e dos rituais religiosos; 9) Função
de contribuição para a continuidade e estabilidade da cultura; 10) Função de contribuição
para a integração da sociedade.
A função de expressão emocional tem como referência o papel da música
como meio de expressar idéias e emoções não reveladas no discurso comum. Através da
música, os sentimentos seriam expressos, havendo a libertação de idéias, expressões,
emoções, pensamentos. A função da música teria lugar no desabafo de conflitos sociais; na
liberação individual e coletiva; na exploração da criatividade em si mesma; na evocação de
sentimentos religiosos, de solidariedade partidária e patriotismo; na elaboração de estados
de tranqüilidade e nostalgia; nas relações grupais; na excitação sexual; na exaltação do
ego; na diminuição de frustrações através do desabafo como forma de ajuste ou à mudança
social, reduzindo os desequilíbrios, integrando a sociedade.
A função de prazer estético enfoca tanto o criador quanto do contemplativo.
Segundo FREIRE, MERRIAM crê que a música e a estética estão associadas à cultura
ocidental de maneira clara, bem como, em diversas culturas orientais. Porém, assinala ser
discutível essa função nas sociedades primitivas (já que as mesmas têm uma relação mais
funcional com a música). A partir dessa função, “os sons que constituem o universo
musical de cada comunidade têm influências ambientais e é resultante do gosto e do prazer
estético dos seus participantes” (MAFFIOLLETTI, 1993, p.23).
A função de divertimento, como o próprio nome sugere, refere-se à conotação
que a música possui, de divertimento, em todas as sociedades. Porém, FREIRE esclarece
que MERRIAM distingue a diversão “pura”, que seria uma característica da música de
tradição ocidental, da diversão combinada com outros elementos, que seria uma
característica da música das sociedades primitivas. “Nos jogos e narrativas praticados nas
sociedades primitivas, a atividade não é exclusivamente musical, mas um ingrediente do
modo de comunicação” (FREIRE, 1992, p.23).
A função de comunicação, tem como pressuposto que a música comunica
alguma coisa, mesmo que não se tenha consciência do quê, como e para quem. A autora
31

cita que MERRIAM entende que o som musical só pode ser produzido de pessoas para
outras pessoas.
A função de representação simbólica, advém do princípio de que a música,
em todas as sociedades, funciona como representação simbólica de outras coisas, idéias e
comportamentos. Das formas e conteúdos de uma determinada música, emergem
elementos culturais que a identifica com uma de época ou conotações afetivas que
expressem determinados sentimentos.
A função de reação física, segundo o próprio MERRIAM, é discutível devido
a sua ligação com questões sócio-culturais. Porém, FREIRE esclarece que o autor entende
que a música provoca determinadas reações no campo físico, e exemplifica: a possessão
provocada por rituais religiosos, à excitação e canalização do comportamento de uma
multidão; o encorajamento das reações físicas do guerreiro e do caçador; o estímulo à
dança, entre outros.
A função de impor conformidade a normas sociais, que seria a função das
canções que chamam a atenção, em suas letras, para comportamentos convenientes ou
não, tais como: as canções de protesto, causando rebeldia; canções usadas em cerimônias
de iniciação, causando sentimento de conformidade; canções que transmitem mitos, lendas
e história. Segundo FREIRE, MERRIAM considera que a música e a linguagem possuem
influência mútua e os textos sustentam uma linguagem permissiva.
A função de validação das instituições sociais e dos rituais religiosos, deve ser
mais estudada e aprofundada, porém, pode ser constatado o uso da música na preservação
da ordem e coordenação de símbolos cerimoniais, na sua transmissão de forma mágica, na
validação de sistemas e preceitos religiosos.
A função de contribuição para a continuidade e estabilidade da cultura seria o
resultado da combinação das funções anteriores. Nesse sentido seria parte dessa função: a
música como veículo de história, mitos e lendas; a música utilizada na educação; a música
na enculturação de indivíduos, transmitindo os ensinamentos sobre o ambiente natural e
seu uso e os valores do grupo, no sentido de dar uma continuidade à cultura (ou o conceito
de vigente).
Por fim, a função de contribuição para a integração da sociedade, que prega
que a música realiza a função de integrar a sociedade reduzindo seus desequilíbrios,
promovendo um ponto de união em torno do qual as pessoas se congregam, sendo exigida
cooperação grupal. Essa função é notada na satisfação dos alunos em participar de grupos
32

musicais que possuem os mesmos valores, os mesmos modos de vida e as mesmas formas
de arte; no desabafo das canções de protesto, onde se permite que o indivíduo ajuste-se às
condições ou ainda, promove-se à mudança a partir da mobilização do sentimento grupal;
pelas danças com canções de acompanhamento, que contribuem para a cooperação
harmoniosa entre os indivíduos, que agem com unidade, compartilhando um sentimento de
prazer.
Constata-se, a partir das funções descritas, que a música está inserida na
sociedade como um importante elemento cultural, que transforma individualmente, o ser
humano e coletivamente, a sociedade.

2.3.2. A educação musical na sociedade contemporânea

2.3.2.1. Pressupostos teóricos

O contexto contemporâneo é marcado por uma diversidade de tendências


musicais, que convivem com um emaranhado de idéias, conceitos, concepções estéticas e
criativas. Pergunta-se: qual é a função da Educação Musical na sociedade contemporânea?
Qual é o papel do educador musical nesse contexto? Que tipo de aluno (ser
humano/cidadão) pretende-se formar?
SCHAFER (1991) afirma que “a aula de música é sempre uma sociedade em
microcosmo, e cada tipo de organização social deve equilibrar as outras” (p.279). O
educador musical compara uma aula de coral a um sistema político: “O canto coral é o
mais perfeito exemplo de comunismo, jamais conquistado pelo homem” (p.279). Em um
outro momento, cita o pensamento de Emile Jaques Dalcroze, que acreditava que “num
sistema social ideal, todos têm a obrigação de partilhar a sua arte e aprendê-la livremente;
todo músico verdadeiro, artista e compositor, dedicará uma hora diária ao ensino da
música, em benefício da comunidade, só então o problema estará solucionado”
(SCHAFER, 1991, p.304).
VEIGA (1997) entende que não se pode separar o ensino de música da
ideologia da cultura. E que também é papel do educador musical, despertar a consciência
dos músicos sobre a faceta política da música. Ainda, o autor entende que “a cultura
33

brasileira, aliás, de um modo geral desenvolveu requintes para ocultar a verdade e a


miséria que nos cerca” (p.62).
TOURINHO (1993) defende a idéia do método de ensino como uma invenção

social:

Quero defender a idéia de que o método de ensino é uma invenção


social, historicamente referenciada, que reflete concepções
ideológicas específicas e organiza, apenas parcialmente, algumas
possibilidades de tratar um conhecimento durante a relação de
ensino e aprendizagem. Um método de ensino não pode, então, ser
visto simplesmente com um arranjo lógico, eficiente e objetivo de
um campo do conhecimento para uso no ensino (TOURINHO,
p.13).

Diante desses questionamentos, quais seriam os fundamentos para uma


Educação Musical mais crítica e contextualizada com o mundo contemporâneo?
FREIRE (1992) apresentou ao final do estudo citado, diretrizes para um
redirecionamento do ensino de graduação em música, partindo da análise de seu conteúdo
e de uma concepção dialética de educação. Utilizou como fundamentação de GADOTTI
(1990) sobre os princípios gerais ou características da dialética 11.
As diretrizes ou princípios estabelecidos por FREIRE são: 1) historicidade; 2)
criação de conhecimento; 3) preservação de conhecimento; 4) reflexão crítica e elaboração
teórica; 5) prática atual; 6) implicação política; 7) expressão estética. A autora esclarece
que não há nenhuma relação de seqüência ou hierarquia dessas diretrizes ou princípios.
Passa-se a apresentar, resumidamente, a descrição dos mesmos.
O princípio da historicidade possui uma implicação histórica, revelada pela
dinâmica existente entre o passado, presente e futuro, e visa entender as relações sociais
existentes no presente e no passado que impregnam a música das influências do futuro.
Segundo FREIRE (1992), essas influências já estão contidas no presente, em uma
abordagem que envolva as múltiplas relações inerentes a todo o fato ou fenômeno social de
maneira dinâmica. A autora esclarece que “o compromisso com a historicidade impede o
exercício de uma arte aparentemente destituída de marcos temporais e espaciais, ou seja,
alienada” (p.143). Desta forma, o compromisso da historicidade é com o passado, o
presente e com o futuro, não necessariamente, o presente refletindo o passado, mas o
presente contido no passado e no futuro. A sociedade apresentar-se-ia permanentemente

11
Vide in FREIRE, Vanda. “Música e Sociedade” . Rio de Janeiro: ABEM, 1992, pp. 140-142.
34

inacabada, em contínua transformação, tendo em seu bojo as contradições que gerarão


novos processos e novas contradições.
O segundo princípio remete-se à criação do conhecimento. Esse princípio é
concebido em estado de transformação permanente, sendo processado de maneira
contínua: “criar conhecimento permanente não significa excluir ou desprezar os
conhecimentos e conteúdos do passado, mas significa não parar neles” (FREIRE, 1992,
p.144).
O terceiro princípio relaciona-se à preservação do conhecimento. A autora
esclarece que essa preservação não possui a conotação de imobilismo e cristalização:
“preservar conhecimento significa assegurar o acesso ao acervo cultural da humanidade,
revisitando a partir das reflexões críticas sempre renovadas, dando conta da dinâmica desse
conhecimento num processo de recriação permanente” (FREIRE, 1992, p.145). Porém, a
autora adverte que a preservação do conhecimento não significaria preservar algum tipo
privilegiado de conhecimento, mas ao contrário, garantiria espaços para todos os tipos de
conhecimentos musicais, do popular ao erudito, do folclórico a cultura de massa, pois eles
estão presentes no contexto social do século XX (que é contraditório e conflitante).
O princípio da reflexão crítica e elaboração teórica aparece como
procedimentos inseparáveis da prática. Para a autora, da prática parte o conhecimento e a
ela retorna, em uma movimentação dialética. Esclarece que não se trata de investir nas
disciplinas teóricas, tirando o tempo da prática instrumental, mas contextualização das
matérias teóricas, que apenas descrevem partes do fenômeno musical, a partir da música
dita “séria” , derivada da tradição européia. O quê deve-se fazer, é partir de uma
elaboração ou reelaboração das disciplinas teóricas de maneira contextualizada, ou seja, a
elaboração teórica levando à reflexão crítica.
O quinto princípio remete-se à prática atual, entendida como ação. FREIRE
(1992) esclarece que no princípio anterior foi constatada a relação inseparável, prática-
teoria, no sentido de elaboração teórica e reflexão crítica. A prática musical do século XX
foi desenvolvida segundo diversas concepções e tendências que contempla da música
folclórica à música de massas, passando pela música “séria” dos séculos passados até a
atualidade. Com isso, “o compromisso com a prática atual é o compromisso com todas as
modalidades musicais que se mesclam na contemporaneidade, realizando os conflitos e
contradições sociais que essas músicas representam” (p.147). A partir dessa concepção, os
35

conteúdos, repertórios, técnicas, estariam comprometidos com a prática atual, abrigando a


multiplicidade de manifestações musicais e a reflexão crítica sobre elas.
Por outro lado, a prática musical atual deve da mesma forma privilegiar a
ação individual, artística do músico, que não é esgotada na reprodução, mas atinge sua
plenitude no ato de criação: “a realização plena do fazer artístico está na criação, na
expressão dos sentimentos, ou dos significados, ou de sentidos” (FREIRE, 1992, p.148).
Desta forma, FREIRE acredita que o compromisso com a prática atual está em abranger a
totalidade das práticas musicais da contemporaneidade, incluindo o antigo e o novo, bem
como, abranger a totalidade do ato artístico, que não é consumado somente através da
reprodução, mas sobretudo da criação.
O princípio da implicação política, segundo a autora, envolve a possibilidade
de construção da própria história (até onde seria possível), em uma perspectiva de
transformação social. Como toda prática educativa contém a dimensão política, o
compromisso político seria “inserir os conteúdos nos contextos humanos e sociais que lhes
dão sentido, ao invés de tentar isolá-los para compreendê-los” (FREIRE, 1992, p.148).
Para FREIRE, o compromisso político aparece associado à ação transformadora, a partir do
comprometimento de uma educação dialética.
O sétimo princípio relaciona-se à expressão estética. A autora acredita que a
dimensão sensível não poderia estar ausente de nenhum curso, sobretudo aqueles ligados à
arte de maneira direta. Entende que o espaço da experiência estética deve ser privilegiado,
porém, sem atrelá-lo a uma única concepção estética, ou reduzi-lo a uma instância
recriadora, de reprodução:

De certa forma, o compromisso com a dimensão estética será o


ápice do processo, segundo a concepção dialética, dos cursos
superiores de música. Ao abranger as esferas racional e estética do
homem, privilegiar-se-ia o homem total, que é, sobretudo o
homem artista. Não o artista alienado, mas o artista conscientizado
de todas as relações sociais, históricas, políticas, que envolvem sua
ação artística e sua arte (FREIRE, 1992, p.151).

Apesar de FREIRE ter apresentado esses princípios ou diretrizes voltadas


para os cursos superiores de música, acredita-se que os mesmos podem ser utilizados como
parâmetros para uma educação musical crítica, em uma concepção dialética.
36

Uma nova corrente na área da Educação Musical, vem ganhando espaço no


cenário nacional, e tem como fundamento, o Ensino Musical baseado nas experiências
musicais dos alunos, tendo como ponto de partida, o cotidiano.
SOUZA (2000) afirma que os educadores musicais têm buscado associar as
experiências musicais dos alunos às experiências sociais do mundo. Sem a compreensão
das realidades sócio-culturais por parte dos alunos não há como propor uma pedagogia
musical adequada:

Com as recentes tecnologias de comunicação, surgem novas


práticas musicais que colocam em cheque os modelos pedagógicos
até bem pouco estabelecidos no campo da Educação Musical.
Nessa perspectiva, temas como o imaginário infantil, o consumo
de música e a formação de identidades através dos meios de
comunicação de massa tornam-se relevantes para a aula de música
(SOUZA, p.7).

Por isso, cada vez mais, se torna necessário que os professores de música
compreendam as realidades sócio-culturais dos alunos, nas suas diversidades, para que os
mesmos proponham metodologias de ensino adequadas, possibilitando a compreensão de
como a educação musical pode ter uma atuação mais contundente no campo social.
O tema “cotidiano” tem aparecido freqüentemente nas pesquisas sobre
educação e conseqüentemente, nas pesquisas da área de educação musical. SOUZA (2000)
aborda a educação a partir do cotidiano, como uma forma de conhecer a realidade social
dos alunos. A pesquisa do cotidiano surge como perspectiva na aula de música, com o
objetivo de oferecer fundamentos para que ocorra uma atualização da teoria e da
metodologia da Educação Musical, melhorando a relação entre a teoria e a prática na sala
de aula.
Segundo SOUZA, as teorias do cotidiano estão ligadas à Filosofia e à
Sociologia, porém de forma extremamente diversificada, sendo que as mesmas estão
ligadas tanto a tradição interacionista (inspiradas nos trabalhos de GARFINKEL/s.d)
quanto na renovação da sociologia compreensiva (BERGER e LUCKMANN/1994) ou nas
novas correntes da fenomenologia (WALDENFELS/1985):

Com as teorias do cotidiano, as pesquisas educacionais entram na


escola, se dispondo a ouvir os seus agentes a fim de verificar com
que bases operar no âmbito da sala de aula. Dessa forma, elas
37

permitem analisar que os processos intervêm na formação do


conhecimento dos alunos e suas relações com o currículo explícito
e/ou oculto, de onde procede o conhecimento que se ensina na
escola (SOUZA, 2000, p.19)

E qual seria o conceito de cotidiano? SOUZA descreve que cotidiano pode ser
entendido como um “mundo social” de uma determinada camada da população. Explica,
neste contexto, que é comum falar-se do “cotidiano dos meninos e meninas de rua”,
referindo-se, neste caso, “a contextos de socialização e experiências, à formação de
orientações normativas, regras, maneiras de comportamento e modos de ver do meio social
impregnados de fatores socioculturais” (SOUZA, 2000, p.27).
Para autora, esse conceito serviria como uma ferramenta metodológica que
organizaria o comportamento dos alunos, sendo com isso, considerado de maneira didática.
Por outro lado, enfatiza que o conceito de cotidiano pode ser usado como categoria de
descrição e planejamento da aula: “Cotidianidade serve como categoria de orientação
didática para os professores, com ajuda da qual eles podem transformar a sua aula,
tornando-a mais próxima da realidade, orientadas nas necessidades e nos interesses
específicos dos alunos” (SOUZA, 2000, p.27-28).
Por fim, o conceito de cotidiano, do ponto de vista das Ciências Sociais, seria
tratado como “um lugar social de processos, de crenças, de achar sentido comunicativo e
interativo, nos quais os participantes da sociedade constroem suas identidades sociais e em
cujas molduras se estabelece um entendimento sobre as normas sociais, realizam as
interações sociais e se reconhecem processos intersubjetivos como sua parte essencial”
(SOUZA, 2000, p.28).
SOUZA (2000) pontua que essas teorias se tornam relevantes na construção
de uma teoria da educação musical e de um entendimento para a metodologia do ensino-
aprendizagem musical. A vida cotidiana se compromete com a dimensão subjetiva. Em
uma perspectiva sociológica, se compromete com a análise histórica individual, do sujeito
imerso no complexo das relações presentes (e essa realidade histórica estaria repleta de
significações culturais). Por isso, várias pesquisas são concentradas na pequena
comunidade, podendo ser um único sujeito:

(…) uma única criança na aula particular ou um pequeno grupo na


escola. Nessa, há uma localização que permite uma observação
direta e participante. O estudo da situação e da interação, o método
38

da história de vida, dentre outros, são importantes para a análise do


indivíduo no espaço local. Pode ser o espaço mais próximo – a
casa, o quarto; mais distante, como a rua; outros mais internos,
como a escola e a sala de aula. Todos esses processos manifestam
a dificuldade analítica e metodológica de identificar o cotidiano,
ao mesmo tempo em que revela a complexidade da sociologia do
cotidiano (SOUZA, p.28 e 29).

Nas experiências musicais do cotidiano dos alunos estaria a chance para o


trabalho sócio-pedagógico, embasado em uma experiência estética real e musical do aluno,
e não como propostas de atividades musicais que transmitem conhecimentos isolados sobre
métodos pedagógicos e repertório desvinculado da prática. SOUZA (2000) acredita que ao
ter como temática, o cotidiano, “a educação estará incluindo a formação da consciência
crítica, os valores em seus objetivos” (p.39), já que na cotidianidade é que está escondida a
estrutura do comportamento social.
Segundo a autora, a tarefa básica da Educação Musical seria “fazer o contato,
promover experiências com possibilidades de expressão musical e introduzir os conteúdos
e as diversas funções da música na sociedade sob condições atuais e históricas” (SOUZA,
2000, p.176). Para tanto, o educador musical deve considerar que o ensino-aprendizagem
em música não se dá somente em sala de aula, mas em contextos sociais mais amplos. O
essencial da condução metodológica estaria em ouvir os seus agentes com a finalidade de
verificar quais as bases que deveriam ser utilizadas em sala de aula.
O professor de música deve estar atento ao meio em que vive, ao cotidiano,
para que a experiência musical dos alunos seja transformadora:

Uma alternativa seria o que poderíamos chamar de um modelo


emancipatório da aula de música, cujo objetivo é revelar os
sentidos e a importância social da música de maneira crítica. Nessa
perspectiva, a aula deve possibilitar ao aluno sair da posição de
simples consumidor passivo e se tornar um produtor e um
transmissor. Só assim o aluno pode sair de um consumo alienante,
podendo ter opinião própria sobre a música (SOUZA, 2000,
p.178).

Portanto, o educador musical deve estar atento ao contexto social em que está
inserido, tanto na atividade pedagógica dentro de sala de aula com na repercussão do
resultado da mesma na sociedade. Deve observar como a sua atividade pedagógica está
39

influenciando os alunos e conseqüentemente, a comunidade que os cerca. Ao adotar esta


postura, o educador musical deve estar sempre atento a questões como: Qual é a música
que se deve ensinar no nosso tempo? Para quê (objetivo)? Por quê (justificativa)? Para
quem (público alvo)? Como despertar um maior interesse dos alunos pela música? Qual
(is) metodologia (s) utilizar?12. Desta forma, o educador musical conseguirá atuar de forma
crítica e verdadeiramente transformadora.

2.3.2.2. O papel da universidade frente aos novos fenômenos musicais

Qual é a Ideologia de Cultura Universitária? Qual é a música que se pretende


difundir? Para quê (objetivo)? Por quê (justificativa)? Para quem (público alvo)? Estes
questionamentos estão por trás do modelo educacional oferecido pelas universidades.
Então, qual é o tipo de Educação Musical defendida atualmente pelas escolas de música e
conservatórios brasileiros em nível universitário?
GONÇALVES (1997) detecta que a música privilegiada nas universidades é
aquela advinda da cultura tradicional, monopolizada pelas elites. Assim, a música ensinada
nas universidades não está satisfazendo as aspirações formuladas pela sociedade
contemporânea. Por outro lado, detecta também que apesar da música acadêmica fazer-se
incompatível com a vida do homem na atualidade, o mesmo é sufocado pela cultura
“mercenária”, cujos anseios e aspirações estão voltados para o utilitarismo e a
aplicabilidade imediata do campo produtivo. Aponta de maneira pessimista que o ensino
de música pode desaparecer das instituições educacionais devido a estas ameaças.
Para autora, os conteúdos musicais, transmitidos tradicionalmente pelas
universidades, não são suficientes para satisfazer e cobrir todo o aparato desenvolvido no
contexto musical do século XX. Acredita que a cultura popular, que tem na música uma
manifestação que nasce do povo e que é vivenciada pela maioria da sociedade, não
encontrou ressonância no meio acadêmico. Por outro lado, reconhece que a universidade
ainda “não se encontra preparada tanto técnica quanto filosoficamente para absorver os
novos encaminhamentos dados ao emergente contexto musical erudito, advindos dos
entendimentos decorrentes de uma nova visão do homem sobre si mesmo e seu meio”

12
“A tarefa básica da música na educação é fazer contato, promover experiências com possibilidades de
expressão musical e introduzir os conteúdos e as diversas funções da música na sociedade sob condições
atuais e históricas. Isso significa que para ensinar música deveremos interpor as questões: qual conhecimento
musical, pra que e para quem ensinar” (SOUZA, p.176).
40

(GONÇALVES,1997,p.211). Afirma, ainda, que é profundamente importante que a


universidade reavalie o ensino musical que vem sendo produzido.
SEKEFF (1997) prega que se deve ter um novo olhar sobre o processo de
globalização cultural. Detecta que na era pós-moderna, as novas tecnologias, novos
conceitos, a integração entre culturas e um novo sentido perceptivo vem influenciando o
ensino musical. A autora esclarece que há riscos em se ter uma educação musical
globalizadora, devendo sempre ser estimulados as culturas locais e adaptações tecnológicas
a partir de soluções particulares. Cita MORIN, que acredita que a diversidade genética,
psicológica e cultural, é o tesouro da humanidade.
E é dentro deste contexto diversificado que a universidade está inserida,
possuindo, com isso, “a necessidade de abrigar a globalização e de, ao mesmo tempo
superar a tendência moderna de uma cultura única e dominante” (SEKEFF, 1997, p.198).
Afirma que para se formar um profissional preparado para o atual mercado de
trabalho, tão veloz e dinâmico quanto o fenômeno tecnológico, é necessário traçar um
novo perfil que se lê no trecho a seguir: “(...) o novo perfil de profissional deve envolver
uma especificidade que transcenda a mera habilidade técnica, exigindo sim, um
desenvolvimento amplo e contínuo que responda às exigências do novo cenário cultural e
mercadológico, garantindo autonomia a esse futuro profissional e a viabilização das novas
expectativas” (SEKEFF, 1997, p.199).
SEKEFF acredita, portanto, que o papel da universidade é investir em um
ensino de música que tenha qualidade, mas ao mesmo tempo globalização e flexibilização
no seu currículo. E esta mudança passa por repensar do que se entende por ensino de
música tanto no plano conceitual, pedagógico, profissional quanto no de gestão13. Para a
autora, não basta ao músico competente ser capaz de fazer, mas também tem que ser capaz
de pesquisar, conhecer, experimentar e aprender, ou seja, possuir uma formação mais
crítica, para que o mesmo se adeque ao mercado de trabalho, com competência,
flexibilidade e autonomia. Exigências estas, que advém da competitividade que os novos
tempos proporcionam.

13
Entende-se aí, que a autora refere-se a que tipo de ideologia de ensino musical a universidade brasileira
pretende ter, ou seja, qual é o fundamento cultural, qual é a ideologia de cultura que pretende difundir.
41

Após discutir-se o Ensino de Música (na graduação e na pós-graduação), os


planos de extensão14 são abordados. VELLOSO (1997) acredita que a extensão
universitária é uma atividade articuladora entre ensino, pesquisa e sociedade. Classifica em
dois pólos esta atividade:

1) extensão universitária enquanto veículo de comunicação entre a


academia e a sociedade; 2) extensão universitária enquanto
instrumento de transformação da realidade. Ambas são primordiais
pois, se de um lado agem como instrumento de prestação de contas
a sociedade, de outro tornam efetiva a vocação da academia
enquanto espaço de reflexão, produção e ação sobre a realidade
social que nos engloba (VELLOSO, p.104).

Nesse sentido, a extensão universitária15 deve ser entendida como uma ponte,
uma forma de comunicação entre o meio acadêmico e a sociedade, e por isso mesmo, um
agente transformador. E essa experiência transformadora deve ser entendida nas duas
vertentes: o conhecimento é passado pela universidade à comunidade e ao mesmo tempo, a
universidade se integra, se abre a partir destas experiências, conhecendo melhor o seu
meio, a sociedade em que está inserida, e, por quê não, aprendendo da mesma forma,
através das necessidades da mesma. Além disso, a extensão pode ser um grande
“laboratório” proporcionando ao professor-pesquisador novas experiências:

A pesquisa permite que o professor adquira uma sensibilidade


social, ao ter uma preocupação constante em ‘ouvir o mundo’
(Berger), para poder articular suas propostas pedagógicas com a
realidade numa permanente atualização. Além de ser um elemento
fundamental para uma reflexão teórico-prática e para o
desenvolvimento da observação de situações pedagógicas, ela
estará contribuindo para a preparação e estruturação da coerência
da fala e para o hábito de registrar práticas (SOUZA, 2000, p.182).
14
O experimento descrito e analisado nessa pesquisa foi realizado nas Oficinas de Música, do Projeto de
Extensão da EMAC/UFG.

15
Segundo a PROEC (Pró-Reitoria de Extensão e Cultura ) – UFG, a “extensão universitária é o momento
em que a sociedade sistematiza, apóia e acompanha as ações que visam sua integração/interação com os
serviços prestados à população (...) A integração universidade/comunidade é viabilizada através da
articulação da Extensão Universitária com ensino e pesquisa. A Universidade deve participar da elaboração
de políticas públicas que visem à proteção de acervos e ao incentivo da criação artística considerados
relevantes para a preservação da memória e da dinâmica cultural. É função também da Universidade resgatar
a escola no seu papel socializador, na perspectiva da ampliação dos valores da democracia, da cidadania e
dos traços culturais locais e da compreensão, respeito e convivência pacífica em relação às diferenças étnicas
e de gênero” (Disponível em http://www.proec.ufg.br/coordenadoria_extensão.html).
42

3. O ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS

3.1. ASPECTOS HISTÓRICOS

O Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais vem sendo difundido há


algumas décadas no Brasil. Acredita-se que a sistematização do ensino coletivo de
instrumentos musicais iniciou-se na Europa, sendo levado posteriormente para os Estados
Unidos. Enaldo Oliveira em seu estudo “O ensino coletivo dos Instrumentos de Corda:
Reflexão e Prática” destaca que desde as primeiras décadas do século XIX já se tem
notícia de aulas coletivas em diversos instrumentos nos EUA. O autor descreve que a
maior parte das academias de música que trabalhava com ensino coletivo era constituída de
instituições familiares. As academias possuíam três fontes de renda conjuntas ou não: as
taxas, a venda de instrumentos musicais e acessórios e ainda, a venda dos métodos de uso
exclusivo. OLIVEIRA (1998) entende que a lucratividade foi um grande incentivo para a
utilização de aulas coletivas. Além deste fator, foi destacado que “a metodologia coletiva
possibilitava atender a um grande número de alunos por turma (estima-se que a média era
de 20 pessoas) e, além disso, propiciava um convívio social que foi de fundamental
importância para o sucesso das escolas” (p.3).
Em 1843, Felix Mendelssohn, inaugurou o Conservatório de Leipzig, na
Alemanha. Esta instituição propagou a nova metodologia de ensino de instrumentos em
grupo. Nos Estados Unidos, após a Guerra Civil, houve uma efervescência cultural, sendo
fundados neste período dois importantes conservatórios: The Boston Conservatory e o The
New England Conservatory, como é destacado no trecho a seguir:

Nos Estados Unidos, durante o século XIX e especialmente depois


da Guerra Civil (1861-1865), a vida musical se tornou
efervescente: a cultura européia se expandiu através de turnês e de
músicos menos sofisticados começaram a formar bandas e
orquestras que supriam a demanda de música popular e de dança.
Todas as partes do país experimentaram um verdadeiro despertar
musical e muitos conservatórios foram, então, fundados, tais como
The Boston Conservatory (1867) e The New England School
(criado apenas uma semana depois), implementando a mesma
metodologia utilizada nos conservatórios europeus (OLIVEIRA,
p.5).
43

O final do século XIX marcou o declínio das pedagogias de ensino coletivo


nos Estados Unidos. Para OLIVEIRA (1998), dois fatores que contribuíram para tal
situação seriam: a objeção de muitos professores e administradores em relação ao ensino
coletivo e o aparecimento de cursos de música em nível superior, que objetivava a extrema
especialização do intérprete através do ensino individual. O autor acredita que existem três
fases principais na história do ensino coletivo em instrumentos de cordas nos Estados
Unidos:

(...) a das academias, em que o ensino coletivo era praticado com


um grande número de alunos por classe, e onde todos tocavam ao
mesmo tempo; a fase dos conservatórios, com classes de quatro
alunos que se revezavam na execução prática; e finalmente, a fase
das escolas públicas, com um grande número de alunos, por classe,
se exercitando em conjunto (OLIVEIRA, p. 9).

OLIVEIRA afirma que esse declínio coincidiu com o aparecimento do que a


história registra como The Maidstone Movement, ocorrido entre a última década do século
XIX e o início da Primeira Guerra Mundial. Relata que nesse período, a Murdock and
Company of London, empresa especializada na venda de instrumentos musicais, instituiu o
ensino coletivo do violino nas escolas de ensino formal (All Saints National Schools). O
objetivo da empresa ao difundir a metodologia do ensino do violino em grupo, era
desenvolver o amor pela música orquestral através do aprendizado do instrumento. Para
que esse programa funcionasse, os alunos compravam da empresa, os instrumentos
musicais e os materiais didáticos e em contrapartida, a companhia fornecia os professores
que lecionavam nas classes coletivas.
Ainda segundo o mesmo autor, esse projeto é referido por muitos estudiosos
como sendo o que originou a idéia do ensino instrumental coletivo. O alcance do projeto
pode ser conferido a partir do dado de que no ano de 1908, 400.000 alunos de 5.000
escolas britânicas estavam efetivamente estudando violino. Essa idéia foi levada para os
Estados Unidos que, em 1911, incentivou o inglês Albert Mitchell a implantar o ensino
coletivo de instrumentos musicais nas escolas públicas americanas.
Finalizando, OLIVEIRA afirma que desde então, a prática do ensino coletivo
de instrumentos musicais vem tendo uma trajetória de altos e baixos: ora um grande
desenvolvimento, ora enfrentando dificuldades. Porém, acredita que a metodologia coletiva
tem sido de fundamental importância em muitos aspectos, tais como, a criação e o
44

desenvolvimento de orquestras em escolas públicas, aumentando, com isso, o número de


alunos interessados no aprendizado instrumental. Após essa iniciação, o aluno procurava
pelo ensino individual como meio de aperfeiçoamento.
MORAES (1997), relata que há algumas décadas, o ensino instrumental em
grupo tem sido praticado e avaliado em países como a Inglaterra e os Estados Unidos, onde
os objetivos dos professores não são mais a comprovação da eficiência do mesmo, mas a
sua sistematização através de metodologias e materiais didáticos específicos. MORAES
acredita que a motivação e a interação social são elementos como os grandes responsáveis
pelo incremento do aprendizado musical. E complementa que o papel do professor como
provedor ou fonte única do conhecimento, a partir do modelo de aula individual, passa para
o papel de consultor, facilitador e líder democrático, nos moldes da aula coletiva. Já o
aluno passa da postura passiva da aula individual (que poderá trazer dependência e
ausência de reflexão, envolvimento e motivação) para o aprendizado através da descoberta,
do desenvolvimento da reflexão, da contextualização pessoal, da criatividade, da iniciativa
e da independência através da aula coletiva.
No Brasil, pode-se considerar que o ensino coletivo em instrumentos musicais
teve início a partir das primeiras bandas de escravos, no período colonial. Das bandas de
escravos, vieram posteriormente às bandas oficiais, as fanfarras, os grupos de choro e
samba. Porém, aprendia-se (e ainda aprende-se) com a prática, sem uma preocupação de
sistematização pedagógica.
A primeira grande iniciativa de sistematização de um método de ensino
coletivo em música no Brasil veio através do Canto Orfeônico, na era Vargas. O projeto
pedagógico foi idealizado pelo grande compositor Heitor Villa-Lobos, a convite do
interventor federal do Rio de Janeiro, João Alberto. Em seguida, a convite de Anísio
Teixeira, então Secretário de Educação do Distrito Federal, Villa-Lobos assumiu no ano de
1932 a direção do SEMA (Superintendência de Educação Musical e Artística), no cargo de
supervisor e diretor da Educação Musical do Brasil, “onde organizou o ensino de canto
orfeônico, pondo em prática seu princípio de que a salvação da música brasileira dependia
da formação básica da juventude e de que o canto coletivo era o melhor meio de educação
social” (Enciclopédia da Música Brasileira, p.819). A frente do SEMA realizou
concentrações orfeônicas, onde os alunos cantavam duas, três e quatro vozes. Em 1940,
reuniu no Estádio São Januário, Rio de Janeiro, a maior concentração orfeônica desse
projeto: 40 mil estudantes. Dessa atividade pedagógica, originou o “Guia Prático” (12
45

volumes com canções para canto e piano, coro e conjunto instrumental), “Canto
Orfeônico” (2 volumes) e “Solfejos” (2 volumes). Em 1942, foi criado o Conservatório
Nacional de Canto Orfeônico.
Porém, a partir da década de 50, algumas iniciativas surgiram no campo do
ensino coletivo instrumental, atingindo seu auge na atualidade. OLIVEIRA (1998), no
estudo citado, afirma que no final da década de 50, o professor José Coelho de Almeida
realizava seus experimentos através da formação de bandas de música nas fábricas no
interior paulista. Posteriormente, Coelho de Almeida como diretor do Conservatório
Estadual Dr. Carlos de Campos, Tatuí, implantou um projeto de iniciação e aprendizado
musical coletivo através de instrumentos de corda, tendo como professores Pedro Cameron
e José Antônio Pereira.
Nos anos 70, Alberto Jaffé e Daisy de Luca iniciaram os primeiros
experimentos de ensino coletivo em cordas. Em 1975, o casal, a convite do SESI – Serviço
Social da Indústria, implantou o projeto de ensino coletivo de cordas, em Fortaleza-CE.
Em 78, foram convidados pelo MEC – Ministério da Educação e Cultura, através da
FUNARTE – Fundação Nacional de Arte para implantarem o projeto de ensino coletivo de
cordas por todo Brasil. O programa foi chamado de Projeto Espiral, sendo que o primeiro
centro foi implantado em Brasília. No ano seguinte, 1979, JAFFÉ mudou-se para São
Paulo a convite do SESC – Serviço Social do Comércio, para trabalhar neste projeto por
quatro anos.
Segundo OLIVEIRA (1998), “o trabalho de Alberto e Daisy Jaffé foi, sem
dúvida, o mais importante para a história dos métodos coletivos em cordas no Brasil, pois
além de eles serem os pioneiros, contribuíram, ainda, para a formação da maioria de
profissionais de cordas existentes no país” (p.13) . Desde 1992, Jaffé e sua esposa Daisy se
transferiram para os EUA, a convite do Pensacola Christian College, na Califórnia, com o
intuito de editar seu método de ensino. A edição denominada “The Jaffé String Program”,
faz parte do projeto Beka Book, e tem como objetivo a produção de vídeo-aulas, no
modelo Home School16.
No levantamento bibliográfico para a presente pesquisa, detectou-se os
trabalhos de alguns educadores musicais brasileiros, ligados ao tema - ensino coletivo de
instrumentos musicais – como se destaca a seguir: Linda Krüger e Anamaria Peixoto

16
A vídeo-aula a partir do conceito Home School, significa o ensino sistematizado, passo a passo, através de
fitas de vídeo, com o objetivo de ensino à distância. O estudante aprende em casa, a partir desse material.
46

(1991/UFPA/Cordas); José Leonel Gonçalves Dias (1994/Dissertação de


Mestrado/USP/Cordas), Ana Cristina Tourinho (1995/Dissertação de
Mestrado/UFBA/Violão), Abel Moraes (1995/Monografia/UFMG/Violoncelo), Abel
Moraes (1996/Dissertação de Mestrado/London College of Music/Violoncelo), Enaldo
Antônio James de Oliveira (1998/Dissertação de Mestrado/USP/Cordas), João Maurício
Galindo (2000/Dissertação de Mestrado/USP/Cordas), Joel Luís Barbosa (Tese de
Doutorado/EUA/Sopros) e Flavia Maria Cruvinel (2001/Monografia de
Especialização/UFG/Violão).
Do levantamento dos trabalhos acadêmicos na área, de conversas com
educadores musicais e de algumas visitas para coleta de mais dados através de entrevistas17
relata-se a seguir, como se encontra o panorama do ensino coletivo de instrumentos
musicais no país.
Atualmente, a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo trabalha em um
projeto vultuoso, o Projeto Guri18. Tendo como objetivo “desenvolver as habilidades e
potencialidades de crianças e adolescentes de áreas culturalmente carentes através da
música”, funcionando como um agente de transformação, onde “a música leva estes jovens
a recuperação da auto-estima e ao fortalecimento da cidadania; criando uma nova
perspectiva de vida”19. O Projeto Guri, criado em 1995, é considerado como um dos mais
bem sucedidos projetos da área social, ligado ao ensino musical, em todo país. O projeto
trabalha crianças e adolescentes, na faixa etária de 8 a 18 anos, possuindo 77 pólos,
atendendo 18.000 alunos. Ainda, através da mesma secretaria, ocorrem as classes coletivas,
na ULM (atual Conservatório Tom Jobim).
Outro projeto, no estado paulista, acontece no Conservatório Dramático e
Musical Carlos de Campos Tatuí, que após ter iniciado vários projetos em sopros e em
cordas, desenvolve, atualmente, o Método Suzuki. Ainda, desde a era Jaffé, o ensino
coletivo de cordas é trabalhado nas escolas da rede SESC, em São Paulo. Na Bahia
trabalha-se o ensino coletivo através da Sociedade “1º de Maio”, nos Alagados
(Sopros/Joel Barbosa); Escola Batista (Maestro Alípio e Marcus Rocha); Projeto de Cordas
(Oscar Dourado). Ainda, através da Escola de Música da UFBA, existiram e existem os
seguintes trabalhos na área com os seguintes educadores musicais: Maria Lurdes de

17
Vide Anexo 1 e capítulo 4.
18
A metodologia aplicada na Oficina de Cordas, Projeto de Extensão/EMAC/UFG e no experimento da
presente pesquisa, é utilizada pelo Projeto Guri (sistematizada por GALINDO).
19
Folder do Projeto Guri.
47

Junqueira Gonçalves, Alda de Oliveira e Diana Santiago (Piano), Cristina Tourinho


(Violão), Joel Barbosa (Sopros). Em Belo Horizonte, o professor Abel Moraes
desenvolveu trabalho monográfico e dissertação de mestrado sobre o tema, com o
Violoncelo. Atualmente, o professor ministra aulas, através e sobre o ensino coletivo, na
UEMG. Em Porto Alegre, ficou registrada a experiência de Marcello Guerchfeld utilizando
a orquestra de câmara como experiência didática. Em Santa Maria-RS, Marcos Kröning
Corrêa desenvolve pesquisa sobre a dinâmica da aprendizagem musical em grupo através
do estudo dos processos e procedimentos nas práticas instrumentais a partir do violão. Em
Brasília, Maria Isabel Montandon e Maria Inês Diniz trabalham com piano em grupo. Em
Goiânia20, os trabalhos mais expressivos são do Mvsika – Centro de Estvdos, iniciado no
ano de 1994, e das Oficinas de Cordas, EMAC/UFG, iniciado no ano de 2000 (local onde o
experimento da presente pesquisa foi desenvolvido). Ainda, GALINDO em entrevista para
a presente pesquisa, afirmou conhecer, o trabalho do violonista Pedro Cameron, que criou
um método de ensino coletivo, na cidade de Rio Claro. Da mesma forma, TOURINHO
através de depoimento citou o trabalho de Mário Ulloa, na UFBA, com violão em
grupo/master-class e o trabalho na década de 80 de Cláudio Jaffé, a partir do ensino
coletivo de cordas (SESC/São Paulo).

3.2. ASPECTOS PEDAGÓGICOS DO ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS


MUSICAIS

3.2.1. Metodologia do Ensino Coletivo de Cordas

Primeiramente, discute-se: como é possível trabalhar a iniciação de


instrumentos diferentes, na mesma aula, ao mesmo tempo? A sistematização de
metodologia eficiente para o ensino coletivo heterogêneo 21 de instrumentos de corda de
arco, somente foi possível devido à existência de elementos comuns na construção e na
execução desses instrumentos.

20
A autora da presente pesquisa possui uma outra pesquisa (Monografia/Violão em Grupo/Especialização-
EMAC/UFG) e artigos sobre o tema (Anais da ABEM/2001, do I Seminário de Pesquisa em Música,
EMAC/UFG/2001e do II Seminário Nacional de Pesquisa em Performance Musical/2002).
21
Ensino Coletivo Homogêneo ocorre quando o mesmo instrumento é lecionado em grupo. Já Ensino
Coletivo Heterogêneo acontece quando vários instrumentos diferentes são trabalhados no mesmo grupo.
48

GALINDO (2000) afirma que “(...) o essencial é entender que os quatro


instrumentos de arco são, até certo ponto, o mesmo instrumento, de modo que
compreendido um, com algum estudo e treinamento compreende-se facilmente os demais.
Isso é suficiente para que se efetive a iniciação instrumental” (p.46). O autor destaca que
existem vários elementos comuns entre o violino, a viola, o violoncelo e o contrabaixo, que
possibilitam a criação de estudos e técnicas de ensino que podem ser trabalhadas de
maneira simultânea. Outro aspecto, para o sucesso da metodologia, seria a adoção do
Estudo Dirigido22 como técnica de trabalho em oposição ao ensino explanatório e
dissertativo.
No formato de Estudo Dirigido, a aula é dividida em três partes – a revisão, a
informante e a aplicação. Cada aula possui, desta forma, a seguinte estrutura didática:

Revisão: nesta parte da aula, o professor deve realizar uma


recapitulação dos assuntos abordados anteriormente; Informante:
nesta etapa, o aluno é exposto a um novo problema técnico ou
novos materiais a serem desenvolvidos; Aplicação: esta é a fase de
treinamento em que o aluno aplica e estuda as informações
adquiridas na fase anterior. Esta é a grande diferença entre o
design pedagógico das aulas em grupo e as aulas individuais, pois
aqui se realiza o estudo dirigido (OLIVEIRA, p.16).

GALINDO (2000) acredita que o Estudo Dirigido é uma eficiente estrutura


didática, já que o professor praticamente estuda com o aluno, ou seja, conduz a aula de
uma forma detalhada, passo a passo, como se destaca no trecho a seguir:

(...) o aluno efetivamente pratica na frente do professor que


observa e corrige. Mais que isso, o professor guiará seu estudo
minuto a minuto, definindo quantas vezes um exercício deverá ser
repetido, em que velocidade será executado, se haverá ou não um
aumento de velocidade, e em gradação; corrigirá sua postura,
aplicará exercícios pra relaxamento, ginásticas para alongamento e
desenvolvimento de determinados feixes musculares; corrigirá sua
afinação, seu som e sua articulação; e finalmente, por se tratar de
um grupo, trabalhará desde cedo um repertório a três ou mais
vozes. Para cada um desses itens, o professor dispõe de técnicas de
trabalho definidas e testadas, e poderá, além disso, criar as suas
próprias (GALINDO, p.57).

22
Conceito utilizado por Alberto Jaffé para denominar a filosofia e a estrutura didática das aulas coletivas.
49

A partir do método coletivo, a postura do professor deve ser como a de um


regente. Desde o primeiro dia de aula, os alunos devem sentir que fazem parte de uma
Orquestra de Cordas. Além do professor-regente, no mínimo um outro professor deverá
estar em aula para auxiliá-lo. O professor-assistente ajuda no que JAFFÉ denominou de
assistência manual23, ou seja, enquanto o professor-regente conduz a aula, o professor-
assistente anda em sala corrigindo os alunos através do toque ou da demonstração do
exemplo correto.
A linguagem utilizada pelo professor deve ser a mais direta possível, sem
espaço para aprofundamentos teóricos, já que a metodologia de ensino foi desenvolvida
para leigos em música. Para que o aprendizado seja expressivo, é preciso dar ênfase à
prática:

Na aprendizagem humana, o indivíduo primeiro aprende a falar


para depois saber ler. O músico pode aprender, primeiro, a
produzir sons e, posteriormente, entender o sinal gráfico que os
símbolos partem de uma prática musical. No processo inverso, o
símbolo, para o aluno, não possui significado concreto, nem
utilização imediata (OLIVEIRA, 1998, p.62).

Com isso, deve haver a repetição de exercícios de maneira constante, sendo


que os mesmos quando assimilados e acomodados pelos alunos, devem ser aos poucos
abandonados, e novos exercícios devem ser introduzidos. Porém, GALINDO adverte que
a cada aula, deve-se introduzir apenas um elemento novo, para que os alunos não se
confundam com o excesso de informações novas. Para OLIVEIRA, o ritmo de ensino
deve estar de acordo com o nível mais alto, ou seja, quem deve ditar o mesmo são os
melhores alunos. Neste ponto, há que se ressaltar que cabe ao professor a escolha de como
conduzir a aula, que deve sempre estar observando os limites do grupo, mas também os
limites de cada um. Se algum aluno possui uma maior dificuldade ou deficiência,
recomenda-se que o professor tente atendê-lo individualmente, ou mesmo, um aluno mais
adiantado fazendo o papel de “monitor”.
Os aspectos teóricos necessários para a iniciação instrumental, ou seja, os
princípios elementares da teoria musical, são passados de acordo com a necessidade
prática. O elemento teórico somente surge pela necessidade da prática, sendo que após a

23
Outro conceito utilizado por Jaffé.
50

explicação é imediatamente tocado. Portanto, pode-se afirmar que a teoria musical


utilizada é a Teoria Aplicada.
O tempo aproximado da iniciação instrumental é de três a quatro semestres,
sendo que depois deste período, o aluno prossegue com as aulas individuais. Para
OLIVEIRA (1998), a carga horária ideal é a de três (3) aulas por semana de duas horas
cada aula. Por sua vez, GALINDO (2000) afirma que a carga horária deva ser no mínimo
duas (2) vezes por semana, uma hora e meia cada aula.
O perfil do professor que trabalha com o ensino coletivo é diferente do que
trabalha a partir da aula individual. Alberto Jaffé 24 acredita que o modelo de aula coletiva
exige do professor algumas qualidades especiais, tais como “timing”25, carisma e
habilidade verbal. Nesse sentido, OLIVEIRA acredita ser indispensável ao professor
possuir a habilidade de perceber os erros do aluno em sua execução, bem como, auxiliá-lo
na solução de seus problemas. Outra habilidade, seria desenvolver uma correta didática
visando introduzir novas habilidades técnicas aos alunos, em três níveis de explanação: 1)
explicação verbal desta habilidade; 2) demonstração desta habilidade executando-a no
instrumento; 3) assistência manual, que seria o uso do toque auxiliando o aluno na
execução: “este toque ajuda a transmitir ao aluno as sensações cinestésicas relativa ao ato
de tocar” (OLIVEIRA,1998,p.17).

3.2.2. Vantagens Pedagógicas do Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais

Segundo OLIVEIRA (1998), o ensino coletivo é mais estimulante para o


aluno iniciante devido ao seu maior desenvolvimento, em menos tempo de aula, em
decorrência das técnicas pedagógicas usadas no ensino coletivo. Destaca que a sonoridade
do grupo é mais agradável, no início, do que a sonoridade individual do aluno:

(...) a minha prática desenvolvida ao longo destes últimos anos,


mostrou que o aprendizado em grupo tem como conseqüência um
estímulo adicional ao desenvolvimento do aluno, diminuindo
consideravelmente o tempo gasto no aprendizado dos princípios

24
JAFFÉ apud OLIVEIRA (1998). Necessário se faz ressaltar que, o professor Alberto Jaffé ainda não
publicou trabalhos sobre o tema no Brasil. Porém, vários de seus alunos (que foram formados através do
ensino coletivo e atuam como professores, regentes ou instrumentistas) transmitem seu legado, a partir de
depoimentos, pesquisas e artigos.
25
OLIVEIRA (1998) explica que a palavra “timing” é usada com a habilidade do professor em dominar a
dinâmica da aula através de ritmo interno próprio.
51

básicos da técnica instrumental. Para a maioria dos iniciantes, as


primeiras tentativas de produção do som nos instrumentos de
corda são extremamente desagradáveis se ouvidas
individualmente. Entretanto, se executados em um grande
conjunto, estes sons tornam-se bastante aceitáveis devido à fusão
das sonoridades. O êxito inicial gera, no aluno, uma dose de
satisfação pessoal bastante elevada, estimulando-o a continuar o
aprendizado (OLIVEIRA,p.20).

Ainda, segundo OLIVEIRA (2002), o aprendizado musical em grupo é


agradável pelas seguintes razões: o aluno percebe que suas dificuldades são compartilhadas
pelos colegas, evitando desestímulos; o aluno se sente, logo no início dos estudos, em uma
orquestra ou num coral e ao conseguir executar uma peça a sua motivação aumenta; o
aspecto lúdico do ensino coletivo (sendo bem direcionado pelo professor) se torna uma
poderosa força, auxiliando um aprendizado seguro e estimulante; e por fim, a qualidade
musical no estudo em grupo é muitas vezes superior se comparado ao individual,
contribuindo para que o processo de aprendizagem seja acelerado.
Para GALINDO (2000), são duas as principais vantagens do ensino coletivo
de instrumento de corda: o maior estímulo por parte dos alunos e um maior rendimento do
desenvolvimento dos mesmos. Para ele, o estímulo está na interação do grupo, onde o
indivíduo observa, compara e aprende com o grupo: “o aluno observa que seus colegas têm
as mesmas dificuldades e percebe que os problemas não são exclusivamente seus; muitas
vezes, ao observar um colega, o aluno acha a solução para um problema seu” (p.58). Um
outro fator seria o resultado sonoro do grupo ser mais estimulante do que o resultado
sonoro individual e ainda, o desenvolvimento do repertório na aula em grupo ser mais
rápido do que na aula individual: “em poucas semanas, o grupo executa sua primeira
música, já com melodia e harmonia; esta deve ser uma estratégia clara do ensino em grupo:
fazer música o quanto antes” (p.58). O outro aspecto está ligado ao rendimento, que no
ensino coletivo é maior do que no individual devido à disciplina que o professor impõe:

(...) utilizando os processos de estímulo e relaxamento, raramente


é conseguida no estudo individual realizado em casa. Portanto, o
rendimento do aluno tende a ser maior no trabalho de estudo
dirigido. Também o resultado musical concreto acontece em
menor tempo para um grupo que para um estudante solitário. Após
aprender uma simples escala, o grupo estará apto a executar
arranjos harmonizados a três ou quatro vozes, o que é bastante
estimulante (GALINDO, 2000, p.58 e 59).
52

O autor também destaca que além desses aspectos positivos da aula coletiva, a
compreensão musical dos alunos é maior devido ao trabalho de repertório em grupo, onde
o professor aborda estilo, harmonia, polifonia, noções de conjunto.
MORAES (1995) acredita que “de todas as vantagens que o ensino em grupo
pode trazer, a motivação é, provavelmente, a mais importante. Também a competição, em
sua expressão mais natural e saudável, pode trazer estímulo extra para um aprendizado
mais rápido e de melhor qualidade” (p.35). Outro aspecto seria que o ensino coletivo tem
como característica a “economia de esforço do ponto de vista despendido pelo professor,
apesar de ser a energia requerida em uma aula em grupo relativamente maior do que em
uma aula individual” (p.35).

3.3. ASPECTOS PSICOLÓGICOS DO ENSINO COLETIVO DE INSTRUMENTOS


MUSICAIS

3.3.1. Desenvolvimento da personalidade

O Ensino Coletivo desenvolve algumas características na personalidade


musical do indivíduo. Na medida que as experiências e dinâmicas de grupo vão
amadurecendo, vão tornando-se extremamente ricas para o indivíduo, devido às relações
interpessoais desenvolvidas pelos sujeitos desse grupo.
Dessa forma, o ensino em grupo, possibilita uma maior interação do indivíduo
com o meio e com o outro, estimula e desenvolve a independência, a liberdade, a
responsabilidade, a auto-compreensão, o senso crítico, a desinibição, a sociabilidade, a
cooperação, a segurança e no caso específico do ensino da música, um maior
desenvolvimento musical como um todo.
GALINDO (1998) entende que o aprendizado musical em grupo e a
conseqüente atividade de uma orquestra de estudantes favorece os sentidos de socialização,
responsabilidade e solidariedade.
MORAES (1995) em seu estudo acerca do ensino em grupo para violoncelo,
afirma que o ensino em grupo configura-se como um agente de socialização, sendo que é
no grupo que se processam as experiências. O autor cita o estudo de David Jaques (1991),
onde o mesmo afirma que:
53

A experiência no grupo pode ser extremamente importante para


estimular iniciativa e liberdade, forçando-o a abandonar hábitos de
dependência. Isto se processa quando aprende a desempenhar uma
variedade de papéis dentro do grupo e começa a desenvolver um
senso de responsabilidade pelo sucesso ou fracasso do grupo. No
processo deste aprendizado de papéis, os alunos precisarão
desenvolver uma maior auto-compreensão, tornando-se
conscientes de suas próprias inibições, defesas e argumentações.
Devem também ser capaz de reconhecer as dificuldades dos outros
alunos e ajudá-los a superá-las (JAQUES apud MORAES p.24 e
25).

O ensino em grupo desenvolve a auto-estima no aluno, na medida em que


assimila os conhecimentos de forma eficaz e prazerosa. A partir da interação com o grupo,
o sujeito passa a conhecer mais a si próprio e o outro, trocando experiências. Na medida
em que essa interação grupal ocorre, o sujeito se sente realizado por fazer parte daquele
grupo, com isso, a sua auto-estima aumenta, da mesma forma, a sua produção e
rendimento.
MORAES (1995) entende que a auto-estima constitui-se no fator mais
decisivo que o homem possui para o seu desenvolvimento psicológico e sua motivação. A
auto-estima seria o resultado da auto-confiança e do auto-respeito, formando a base da
auto-imagem. O autor complementa citando o ponto de vista de COLEMAN que afirma
que quanto mais a auto-estima o sujeito possui, mais amado, respeitado, reconhecido e
apreciado ele se sente; sendo que “a auto-estima tem como condição determinante na sua
formação, e a auto-avaliação e as comparações sociais como suas fontes de origem” (p.29).
Para o pesquisador, a relação do ensino com o prazer deve ser constante. Observa ainda
que, a maioria dos alunos que iniciam o estudo instrumental não se profissionaliza, com
isso, a relação do aluno de prazer com a música deve ser o objetivo principal em primeira
instância, antes de se cobrar notas afinadas, ritmos precisos.

3.3.2. Ambiente receptivo, Clima social e Psicologia do professor

Outro ponto a ser destacado refere-se ao ambiente e ao clima em sala de aula.


O meio ambiente não deve ser entendido somente a partir das questões referentes ao
espaço físico, mas também o ambiente criado pelo professor durante a aula:

o meio ambiente não deve ser entendido apenas como a referência


espacial, o lugar, propriamente dito; mas o ambiente lúdico e
54

encorajador criado pelo professor para que o aluno se expresse de


maneira livre e natural. A partir dessa confiança mútua, o canal da
percepção e do conhecimento estará aberto para receber vários e
diferentes estímulos, fazendo com que os mesmos se consolidem
em matéria expressiva (CRUVINEL, 2001, p.12).

Nesse sentido, MORAES (1995) descreve que o clima da aula pode ser:
amigável, informal, próximo, relaxado, caloroso, livre, permissivo, frio, hostil, formal,
tenso etc, a partir do estudo de JAQUES (1984)26. O professor (“tutor” do grupo) tem
papel importante no estabelecimento do clima social na sala de aula, exercendo também,
influência na forma como os alunos se expressam artisticamente. O autor afirma que a
proposta do ensino em grupo “visa propiciar aos alunos um ambiente receptivo à expressão
pessoal, e adequado ao desenvolvimento de hábitos saudáveis de manifestação artística
sem censuras ou julgamentos severos. Portanto, a freqüência de experiências positivas no
grupo deve ser maior do que aquelas conflituosas ou constrangedoras” (p.28) . Com isso,
deve-se buscar um “ambiente positivo”. E esse ambiente seria aquele que é adequado à
auto-expressão e ao aprendizado, pode ser viabilizado pelo professor através de atitudes
como: encorajamento, mediação, abertura e alívio de tensões.
MORAES (1995) acredita que o professor, na busca de uma postura positiva
em sala de aula, deve evitar comentários não construtivos, e ainda, sempre evitar
comparações declaradas entre os alunos, pois os mesmos já observam por si só, já que as
diferenças existentes entre ele e os colegas normalmente falam por si mesmos. Para ele,
“ao estabelecer comparações, o professor enfatiza as fragilidades naturais desta fase do
crescimento e corre o risco de ‘rotular’ seus alunos como o ‘desafinado’, ‘o sem ritmo’, ‘o
distraído’, e outros predicados danosos que podem passar a integrar definitivamente a auto-
imagem do aluno” (p.30) . Complementa ainda que “no contexto do grupo, mesmo
pequenas diferenças de nível musical ou técnico entre os alunos já fornecem elementos
suficientes para eles próprios se compararem mutuamente e um reforço dessas
comparações por parte do professor, neste sentido, pode contribuir negativamente para a
auto-estima do aluno” (p.30 e 31) .

26
MORAES (1996) também utiliza JAQUES (1984) como referência em sua dissertação de mestrado, que
definiu o clima social, da seguinte maneira : “as ‘atmosphere’ of enviroment wich is determined by the sort
of relationship among the components of the group. It can be ‘warm, friendly, relaxed, informal, permissive,
free, in contrast to cold hostile, tense, formal, restrained” (MORAES, sem página).
55

Em suma, para MORAES (1995) “o ensino em grupo oferece a oportunidade


de se obter informações sobre o comportamento social de cada aluno. O professor pode
analisar diferenças e similariedades, reconhecer, incentivar ou corrigir padrões de
comportamento que possam atrapalhar o aprendizado ou a performance em apresentações”
(p.36). O autor acredita que o ensino em grupo desenvolve: um pensamento imaginativo e
criativo; uma mente crítica e informada; consciência em relação aos interesses e
necessidades dos outros; senso de rigor acadêmico; uma convivência social; habilidade de
satisfação pelo aprendizado durante toda a vida.

3.4. A CONTRIBUIÇÃO DE GALINDO

Tratar-se-á de maneira breve sobre alguns princípios e técnicas de ensino da


metodologia sistematizada por GALINDO (2000), implantada pela Oficina de Cordas,
EMAC/UFG, sendo portanto, adotada para o ensino dos grupos experimentais da presente
pesquisa.
GALINDO (1998) explica que o ensino coletivo de instrumentos de arco é
possível devido a dois aspectos principais: 1) A existência de vários elementos comuns aos
quatro instrumentos (violino, viola, violoncelo e contrabaixo), possibilitando com isso, a
criação de estudos e técnicas de ensino possíveis para serem aplicadas simultaneamente
nos instrumentos mencionados; 2) A adoção do Estudo Dirigido como técnica
metodológica.
O autor destaca que a atitude do professor deve contemplar os seguintes
tópicos: 1) Conseguir a atenção constante dos alunos; 2) Portar-se desde o início como um
misto entre regente e professor; 3) Dirigir-se igualmente a todos os naipes e alunos, 1ªs e
últimas estantes; 4) Falar sempre objetiva e claramente; 5) Falar o essencial, já que o
tempo de trabalho é precioso; 6) Exigir disciplina com elegância e cordialidade.
Da mesma forma, estabeleceu as diretrizes pedagógicas para o sucesso da
metodologia de ensino coletivo de instrumentos de arco:

1) Manter os alunos estimulados; 2) Manter o aspecto lúdico


presente na maior parte do tempo possível (...); 3) Tentar nivelar a
turma sempre por um nível acima da média, de modo a não
desestimular os mais talentosos; 4) Estar atento ao ponto de
saturação da turma (...); 5) Estimular de forma igualitária nos
56

alunos os processos racionais, intuitivos e emocionais; 6) Procurar


transmitir aos alunos conceitos musicais o mais cedo possível,
como por exemplo final de frase, tensão e relaxamento, dinâmica,
eco etc. Jamais esperar o aluno tornar-se um bom técnico para
então despertar sua intuição. Deve-se fazer música mesmo nos
exercícios mais simples (GALINDO, 2000, p.3).

GALINDO dividiu o método em 5 fases. Porém, abordar-se-á neste capítulo


apenas a 1ª Fase, já que somente esta foi utilizada no experimento 27.
Na 1ª Fase - Primeiros Contatos – trabalha-se com os alunos as noções
iniciais dos instrumentos, tais como a nomenclatura das partes dos instrumentos,
posicionamento e primeiros exercícios. Nessa fase os alunos que optam pelo violino ou
pela viola, tocam na posição de “cavaquinho”, ou seja, como se estivesse segurando um
cavaquinho. No momento adequado, o posicionamento tradicional é introduzido. Nas
primeiras semanas de aula, o arco não é utilizado, sendo todos exercícios tocados em
“pizzicato”28. A leitura é feita através do que GALINDO (2000) chamou de “escritas
esquemáticas”, que é o nome da nota acompanhado de um número que significa a duração
sonora (Ex: LA 4 – a nota lá com duração de quatro pulsações). Esta leitura é introduzida
na série “Contando”, que possui o seguinte conteúdo: 1) Contando, 1ª Parte - Trabalha-se
apenas as cordas comuns (lá, ré e sol) ; sons e pausas de 2,3,4 pulsações; Compasso; sinais
gráficos (pentagrama, barra de compasso e barra dupla finalizadora); 2) Contando, 2ª Parte
– sons e pausa de uma pulsação; barra dupla de repetição; barra de compasso simples no
final da linha; e 3) Contando, 3ª Parte – cordas mi e dó.
Após essa fase, passa-se a série “Na Pauta” (1ª, 2ª e 3 ª Parte). Nessa série
introduz-se a leitura musical tradicional, sendo que os exercícios ainda executados em
pizzicato. Nessa série, trabalha-se o mesmo conteúdo da anterior, porém, introduzindo as
figuras musicais e pausas (semibreve, mínima, semínima, mínima pontuada); e ainda as
claves (sol, fá e dó).
Na seqüência do trabalho, é introduzida a mão esquerda, a partir da série
“Dedos”. Primeiramente, introduz-se, nos quatro instrumentos, o tetracorde maior, a partir

27
A Descrição do Experimento é demonstrada no capítulo 5 da presente pesquisa. Necessário se faz ressaltar
que em outros grupos, anteriores aos grupos experimentais, já se chegou ao fim de todas as fases, seguindo a
programação de 4 semestres (ou dois anos) prevista para a iniciação instrumental. Porém, para a presente
pesquisa, optou-se em delimitar como objeto de estudo grupos iniciantes (um semestre), com perfis
diferentes.
28
Segundo o Dicionário Grove de Música, “Pizzicato (It. ‘beliscado’) instrução para fazer soar a corda ou as
cordas de um instrumento (geralmente de arco) beliscando-se com as pontas dos dedos” (p.729).
57

da corda ré. Depois, transpõe-se o mesmo dedilhado para a corda lá. Neste ponto, já são
iniciados exercícios com a escala de Ré Maior e a execução de pequenas peças na mesma
tonalidade. Após fixar-se a leitura e ter-se uma afinação razoável, o arco é introduzido.
GALINDO (2000) observa que nesta fase, a prioridade é o relaxamento
corporal dos alunos, sendo que “na maioria dos casos o professor deve contentar-se
inicialmente com uma postura apenas aproximada da ideal para assegurar o devido
relaxamento. A maneira de segurar o instrumento será pouco a pouco refinada, a cada
aula” (p.64).
O autor indica três soluções para o problema de desafinação: manter uma boa
postura; audição interior e exigência constante e bem dosada. Da mesma forma, o autor
sugere a melhor maneira de introduzir um novo exercício e/ou melodia:

1) O professor faz o solfejo cantando a melodia; 2) Os alunos


repetem; 3) Os alunos tocam a melodia; 4) O professor corrige as
posições da mão esquerda; 5) O professor pede a um aluno que
toque a melodia sozinho, enquanto pede-se a outros que
identifiquem as desafinações, utilizando as palavras “alto” ou
“baixo”; 6) Todos os alunos tocam a melodia novamente
(GALINDO,2000,p.87).

Uma forma de motivar, ainda mais, o grupo, é ampliar o repertório com novas
melodias. No decorrer do processo pedagógico, pode-se executar não só peças em
uníssono, mas a três ou quatro vozes, “transformando-se pouco a pouco em uma orquestra
de cordas” (GALINDO,2000,p.96). O autor destaca que o ideal é trabalhar-se com dois
professores em sala de aula, um ocupando a posição central (regência/condução da aula) e
o outro percorrendo a sala, corrigindo as posturas e auxiliando os alunos de maneira mais
aproximada (fisicamente). Porém, em turmas com até 15 (quinze) alunos, um professor
bem treinado poderá trabalhar sozinho.
Nota-se que o segredo do método está na fixação do conteúdo através da
estrutura de aula Estudo Dirigido. A construção do conhecimento é feita de maneira eficaz,
sempre revisando os conteúdos já conhecidos e introduzindo-se apenas um novo conteúdo
de cada vez. Dessa forma, o ensino-aprendizado acontece de forma prazerosa e segura.
58

4. O ENSINO COLETIVO NA VISÃO DOS EDUCADORES MUSICAIS

4.1. ENTREVISTAS COM EDUCADORES MUSICAIS QUE ATUAM NA ÁREA

Para que se conhecesse melhor a realidade e o panorama do ensino coletivo


em instrumentos musicais no país, além da realização da revisão bibliográfica específica,
foram realizadas entrevistas com educadores musicais que atuam na área, no período de 30
de abril a 14 de agosto de 2002.
As entrevistas foram conduzidas com o intuito de conhecer o pensamento
desses educadores musicais que atuam na área, as várias metodologias utilizadas e os
aspectos históricos, pedagógicos, psicológicos e sociais, visando o enriquecimento das
discussões sobre o tema. Outro ponto seria justificar a importância da presente pesquisa,
respaldada pelos referidos depoimentos, no sentido de se tratar de um estudo pioneiro no
país, sob o aspecto de discutir o ensino coletivo como um dos meios de transformação
social.
As entrevistas foram feitas com gravador de áudio simples, sendo utilizadas 6
(seis) fitas cassetes. O total de tempo das entrevistas é de aproximadamente 5 (cinco)
horas. Foram entrevistados os seguintes pedagogos: Abel Moraes (Belo Horizonte-MG);
José Alípio de Oliveira Martins, Marcos Antônio de Oliveira Rocha, Joel Luís Barbosa e
Ana Cristina Tourinho (Salvador-BA); Luciano Lopes, Marcelo Brazil, Carmen Borba,
João Maurício Galindo, Enaldo Oliveira e Thelma Chan (São Paulo-SP).
O método de escolha dos entrevistados, primeiramente, se deu ou a partir da
expressiva atuação profissional na área, com trabalhos de pesquisa e artigos publicados
sobre o tema, ou por trabalharem em projetos renomados, que atuam a partir do método de
ensino coletivo. Outro fator foi o acesso e a disponibilidade dos mesmos.
A primeira visita ocorreu em abril de 2002 e foi feita ao violoncelista Abel
Moraes, de Belo Horizonte, com o intuito de entrevistá-lo para conhecimento de seu
trabalho. O professor, até o presente momento, é responsável por uma disciplina sobre o
ensino coletivo em instrumentos musicais, do curso de pós-graduação da Escola de Música
da UEMG. Visitou-se em maio de 2002, a Escola de Música, da UFBA, em Salvador, onde
foram contatados a Profª Drª Ana Cristina Tourinho e o Profª Joel Luís Barbosa. Ainda,
assistiu-se às aulas coletivas em sopros, ministradas pelo professor José Alípio de Oliveira
Martins, na Escola Batista de Salvador. Nessa ocasião, colheu-se o depoimento do
59

professor Marcos Antônio de Oliveira Rocha. O Projeto Guri, de São Paulo, foi visitado
em duas ocasiões, maio e agosto de 2002, onde se pôde acompanhar várias aulas coletivas:
de cordas, de violão, de percussão. Nessas ocasiões foram entrevistados os professores que
trabalhavam no projeto: Luciano Lopes, Marcelo Brazil, Carmen Borba, João Maurício
Galindo, Enaldo Oliveira. Por fim, entrevistou-se a educadora musical e regente de coros,
Thelma Chan.
Após essa fase, todas as entrevistas foram transcritas na íntegra (vide Anexo
1), sendo retirados das mesmas os excertos (vide Anexo 2), que se constituem dos trechos
mais interessantes da entrevistas. Após a exposição dos excertos das entrevistas, os
mesmos serão analisados, a fim de serem levantados e discutidos os elementos e os
aspectos relevantes da área, não encontrados na escassa bibliografia específica.

4.2. ROTEIRO DAS ENTREVISTAS

FIGURA 1 – Roteiro das entrevistas

1) Como foi o seu primeiro contato com a música?


2) Qual é a sua formação musical? Quando e como você iniciou seus estudos musicais?
3) Como surgiu o seu interesse pelo ensino coletivo em X (instrumento musical)? Fale um
pouco da sua experiência?
4) Em sua opinião, quais são as vantagens e desvantagens de ensinar através do ensino
coletivo?
5) Qual é a faixa etária que você trabalha?
6) Locais em que atua ou atuou?
7) Qual a carga horária trabalhada?
8) Como se dá a sua atividade pedagógica? Qual é a metodologia aplicada e qual é o seu
referencial teórico?
9) Em sua opinião, como está a pesquisa na área da Educação Musical e em específico, o
ensino coletivo de instrumentos musicais?
10) Para finalizar, você tem alguma sugestão ou consideração final a fazer?
60

4.3. ANÁLISE DOS EXCERTOS

Dos resultados obtidos das entrevistas individuais com educadores musicais


que atuam na área do ensino coletivo, foram retirados os excertos, que são os recortes
feitos das entrevistas que contêm aspectos de interesse para a presente análise. Dos
excertos destacaram-se as seguintes temáticas de interesse: Primeiro contato com a
música, Formação musical, Interesse pelo ensino coletivo, Vantagens e desvantagens
do ensino coletivo, Faixa etária, Carga horária, Referencial teórico, Pesquisa em
educação musical e em ensino coletivo, Sugestões e Considerações Finais.
Primeiramente, buscou-se conhecer qual seria à primeira motivação que levou
os educadores musicais a seguir esta carreira. A partir dos depoimentos, quatro (4)
pedagogos afirmaram ter tido o primeiro contato com a música no ambiente familiar:
“Bom, eu sou filho de uma professora de piano, e eu cresci ouvindo aulas de piano em
casa” (MORAES), “Eu tive contato com violão, principalmente, com meus irmãos mais
velhos” (BRAZIL), “Eu nasci numa família em que desde pequenininho todos cantam na
minha casa, a gente ia igreja cedo e cantava na classe das crianças, às vezes cantava na
frente da Igreja” (ROCHA), “(...) desde os meus cinco anos, eu estudo música. Então,
meus pais sempre gostaram muito, meu avô era um tocador de bandolim” (CHAN). Dois
(2) outros começaram aprender na escola: “Na verdade eu comecei a tocar, criar interesse
em escola mesmo (...) Então, na 6ª série, mais ou menos, eu conheci um conjunto musical
que tinha na escola, que fazia baile né, e tinha uma banda marcial. Então, as
possibilidades eram o quê? Começar aonde desse oportunidade. Eu comecei tocando
percussão na Banda Marcial” (MARTINS), “(...) com dez anos de idade e na escola tinha
uma professora que organizou um coro, aí eu comecei a cantar nesse coro.” (GALINDO).
Outros dois (2) relataram, como experiência marcante, assistir a um concerto. Ao vivo:
“Bom, primeiramente, foi através de um concerto que assisti no Teatro Municipal, há
muito tempo atrás (...) Eu era muito pequena e minha mãe nem queria saber daquela
história e eu acabei estudando violão porque tinha violão em casa e daí, acabei fazendo
violão erudito e mais tarde quando eu tinha condições, eu acabei estudando violoncelo”
(BORBA); e pela televisão: “eu tinha nove anos de idade. E eu estava assistindo TV
quando vi uma orquestra tocando na TV, eu fiquei apaixonado. E no outro dia, acordei de
manhã, e fui falar com o meu pai” (LOPES). Uma educadora aprendeu a tocar seu
61

instrumento “de ouvido” e depois procurou uma escola especializada: “Eu comecei a tocar
violão, eu tinha 11 anos de idade. Comecei a tocar de ouvido com o filho de uma amiga do
meu pai. E eu toquei mais ou menos durante uns dois anos de ouvido. Depois meu pai
decidiu que era melhor eu fosse aprender música. E depois de alguma relutância, porque
eu, eu não sabia bem o quê queria né, eu fui com ele numa escola” (TOURINHO). Outro
pedagogo começou em uma instituição de menores carentes: “Eu comecei a aprender
música na Guarda Mirim Municipal de Piracicaba, São Paulo. Uma entidade para
menores carentes. E lá tinha uma banda e um coral e um conjunto de flautas doce”
(BARBOSA). E por fim, um pedagogo relata que iniciou os estudos em música através de
escola especializada, sem relatar o que causou a influência: “Eu comecei a estudar música
quando eu tinha sete anos, em Belém do Pará. Primeiro eu fiz um curso de musicalização
(...) Aos nove anos eu comecei a estudar violino” (OLIVEIRA).
Constatou-se nos depoimentos que nesse tópico, o primeiro contato com a
música, a família foi a grande incentivadora e responsável pela formação musical desses
educadores. Por outro lado, em um relato interessante, um educador destacou a influência
da mãe e a inação por parte da mesma, que resultou em um atraso na sua formação
musical: “Primeiro foi com minha mãe falando que achava a música linda. Não tinha
nenhuma tradição de música na família. Não sou filho de músicos como acontece com
freqüência aí (...) engraçado que eu pedia para estudar música e minha mãe não, nada”
(GALINDO). Também foi constatada a importância das escolas regulares que oportunizam
dar uma formação mais ampla a seus alunos, a partir da experiência musical, contribuindo
para a descoberta das aptidões musicais dos educandos e suas futuras profissionalizações,
como nos casos descritos, constituindo muitas vezes, a única oportunidade: “Então, as
possibilidades eram o quê? Começar aonde desse oportunidade” (MARTINS). Outro
ponto a ser destacado refere-se ao fato de que um dos entrevistados (que possui o título de
doutor em música) iniciou seus estudos musicais em uma instituição para menores
carentes, onde foi promovida sua socialização e sua inserção na sociedade, o que
transformou a sua vida (que é um dos temas de discussão na presente pesquisa).
Para que se soubesse qual é o perfil do professor que trabalha com o ensino
coletivo em instrumentos musicais, buscou-se nos depoimentos, conhecer qual seria a
trajetória percorrida visando o conhecimento musical. Buscou-se saber sobre a formação
musical de cada entrevistado. Dos onze (11) entrevistados, dois (2) são doutores em
62

música, três (3) são mestres, um (1) é mestrando, quatro (4) são graduados em música e um
(1) está terminando o curso de bacharelado em instrumento.
Um ponto bastante interessante é que alguns entrevistados tiveram uma
formação diferenciada, tanto por iniciar o instrumento tardiamente ou por ter tido a
oportunidade de tocar outros instrumentos: “De forma que, eu precisei chegar aos dezoito
anos para realmente tomar uma iniciativa por vontade própria de estudar música (...)
Minha formação foi um pouco irregular (...) eu comecei a estudar na Orquestra Ribeiro
Bastos (...) Nesse sentido, eu tive a experiência musical de tocar, de sentir no ambiente
social, participar de uma atividade musical em grupo,” (MORAES); “(...) com quinze
anos resolvi a estudar música, comprei um violão, fui ter aula de violão. Fui ter aula de
Jazz. E aos dezessete comecei a estudar viola. Aí fui pra viola, fui estudar, cai num
trabalho de ensino em grupo e em um ano eu já tava tocando na Orquestra Jovem, aqui
em São Paulo, aí foi indo. Fiz vestibular, entrei na Faculdade de Música, sabendo pouca
coisa, e fui indo. Foi assim que começou (...)” (GALINDO); “aos quinze anos comecei a
estudar violão (...). E aos vinte e cinco anos eu entrei na Licenciatura em Música, na
Universidade Federal, na época eu desencanei de Engenharia (...) Aí entrei na UNESP,
comecei a fazer Composição e Regência” (BRAZIL); “Eu comecei tocando percussão na
Banda Marcial. Depois comecei a me interessar por violão, aí fui tocar guitarra nesse
conjunto posteriormente (...) comecei a participar de Bandas, participando de bandas, não
perdi também o contato com o violão. E fiquei tocando trompa, percussão, bombardino,
trombone e retornei a Salvador, fiz um curso de violão, chamado de violão clássico (...) E
aí fui fazer universidade de Regência”(MARTINS); “Eu fiz faculdade, fiz bacharelado em
violão, na realidade (...) então eu estudei o violoncelo ali, na Escola Municipal de Música.
E na Faculdade eu fiz o trabalho com percussão, com o núcleo de percussão, cantei em
coral muito tempo, fiz o estágio com uma professora que dava o Método Orff de
musicalização para criança (...)” (BORBA).
Através do relato dos educadores musicais, pode-se notar que a formação
musical destes professores não ficou restrita apenas a um instrumento ou uma área de
conhecimento musical. A maioria teve experiência tocando um outro instrumento. Esse é
um fator extremamente benéfico para o professor que atua no ensino coletivo,
principalmente quando se trata do heterogêneo (instrumentos diferentes). Em relação ao
fato de que a iniciação instrumental da maioria dos educadores musicais pode ser
considerada tardia (tendo como parâmetro à educação musical tradicional voltada para a
63

formação de concertistas), não ficou configurado como sendo este, um ponto negativo. Ao
contrário, essa vivência ampla e versátil, relatada pelos entrevistados, pode ter contribuído
na escolha e na atuação pedagógica pelo ensino coletivo. Outro ponto importante é o fato
que a maioria dos educadores musicais atuou em bandas, orquestras, coros e grupos
musicais; ou seja, a música em grupo foi significativa na formação destes profissionais
(vide em anexo as entrevistas de MORAES, GALINDO, BARBOSA, MARTINS,
BORBA, BRAZIL, CHAN). Com base nesses depoimentos, pode-se afirmar que o perfil
do educador musical que atua com o ensino coletivo de instrumentos musicais é o de um
profissional estudioso, versátil, com uma formação mais ampla (principalmente com
alguma experiência com regência). Dos onze (11) entrevistados, todos, na sua formação
como estudante de música, tiveram experiências significativas com música em conjunto.
Para que se conhecesse, quais eram as influências e as motivações dos
educadores musicais em atuarem na área pesquisa, perguntou-se como surgiu o interesse
em lecionar através do ensino coletivo. A experiência de ter participado como regente de
grupos e coros foi o que motivou três (3) educadores musicais: “E eu dava aula de
violoncelo, pouco tempo depois, eu me interessei em trabalhar com orquestra e acabei
regendo orquestra infantil. Em São João Del Rei eu tive uma experiência com regência
coral também. Então eu tive uma experiência ainda como estudante de violoncelo, de
trabalhar com orquestra, de trabalhar com grupos” (MORAES); “Eu dava aula no
Instituto Adventista de Ensino, em São Paulo. E lá tinha uma banda, quer dizer, eu fui
responsável pra formar a banda que existia e tinha acabado. Quando eu tava dando aula
lá e montando essa banda, eu trombei na Biblioteca muito material americano que tinha
lá, e no meio tinha três, tinha uma coleção completa do Hal Leonard pra banda . Os três
volumes e cada volume são pra cada instrumento. Então, um monte de métodos de banda.
Aí eu comecei” (BARBOSA); “Eu dava aula já no Projeto Guri em 98. Mas eu dava aula
de Canto Coral. Fiz formação, estudei, cantei em coral, fiz um monte de coisa e dava aula
no coral infantil. E o pessoal da coordenação sabia que eu tocava violão e estavam
precisando de professor de violão no pólo aqui. E aí eu fui” (BRAZIL). Outros três (3)
educadores musicais foram motivados após da constatação dos benefícios pedagógicos:
“por intermédio de um amigo meu chamado Mário Vergio que foi aluno do professor
Alberto Jaffé. E ele me mostrou um CD que o professor Alberto Jaffé gravou com os
alunos do SESC pra demonstração do trabalho dele. Esse CD foi, esse CD não, esse LP,
na verdade, foi gravado com oito meses de trabalho dos alunos e o resultado musical
64

desse, desse disco, despertou toda a minha curiosidade pra como se realiza essa questão
do aprendizado musical coletivo. O aprendizado instrumental coletivo” (OLIVEIRA); “o
professor Enaldo Oliveira fazia parte deste quarteto e quando ele foi abrir os pólos lá, ele
me convidou para fazer parte. Então, ele me ensinou a maneira com ele faz o ensino
coletivo e eu fiquei encantada por ver o resultado” (BORBA); “Bom, acho que, eu fui
estudar através do ensino coletivo por acaso. Eu fiquei sabendo desse trabalho, li no
jornal, um amigo me falou. Fui lá e comecei a ter aula. Inclusive no começo eu tava muito
cético, eu achava que aquilo lá não ia dar certo. Depois de uns meses eu vi que dava
certo que eu tava conseguindo tocar mesmo o instrumento. Eu não sei se é uma coisa meio
inata, assim, esse interesse meu especulativo, eu começava a perguntar pro Jaffé, como é
que era pra dar aula” (GALINDO). A necessidade de se ter um emprego foi o motivo
para que 2 (dois) professores começassem a ensinar instrumentos musicais de maneira
coletiva, sem conhecimento prévio de alguma metodologia de ensino específica: “eu
precisava de trabalhar (...) Eu precisava arrumar algum emprego, alguma coisa, eu só
tocava em orquestra. E na orquestra, éramos bolsistas ainda, não tínhamos formado.
Então, apareceu o Pedro, que é o coordenador técnico do projeto. Ele ligou para mim e
falou diretamente comigo sobre dar aula em grupo e tal. Eu nunca tinha, nunca tinha
imaginado que esse tipo de coisa existia” (LOPES); “Não sabia que era aula em grupo,
não sabia como era e cheguei lá e me deparei com uma turma, e disse: ‘não, vou ter que
fazer alguma coisa né?’. E diante daquela situação eu comecei a criar, eu comecei a
experimentar um monte de coisas e algumas coisas deram certo, algumas coisas não
deram certo, a gente vai experimentando” (BRAZIL). Uma professora respondeu que,
primeiramente, o motivo de se adotar o ensino coletivo se devia à grande demanda e um
número pequeno de professores atuando na escola: “(...) nós éramos na época dois, três
professores de violão, e a demanda era muito grande, a procura pelo curso de violão era
muito grande” (TOURINHO). E o gosto pelo estar em grupo foi destacado por 2 (dois)
pedagogos: “Eu acho que na verdade ensinar música é até mais agradável quando a gente
tem uma turma mista, eclética, com vários instrumentos, é mais gostoso para o professor”
(MARTINS); “Bem, eu sempre gostei de coisas pessoas juntas. Eu sempre achei que a
coisa quando você junta as pessoas, ela acaba bonita, ela fica mais bacana. Sei lá, cria
uma força. Então, eu sempre fui de trabalhar com o coletivo mesmo. É, e surgiu como?
Surgiu porque eu sempre gostei de cantar com mais gente. Sempre gostei de participar de
coral, de conjuntos (...)” (CHAN).
65

Outro aspecto levantado foi quais seriam as vantagens do ensino coletivo se


comparado ao individual. A interação entre os alunos, despertando a socialização, a
cooperação, a motivação, o rendimento, entre outros; e o ambiente lúdico, provocado por
esta interação, são aspectos que foram destacados pelos educadores musicais, nos trechos a
seguir: “O que me chamava muita atenção, era a facilidade com que as crianças se
interagiam, e aprendiam e estavam muito ligadas ali nas atividades. E por conseqüência
eu percebia que a atenção e a produtividade era muito maior do que nas atividades
individuais (...) a abordagem que eu uso é uma abordagem de interação social, de
aprendizado colaborativo, ou seja, de constate troca de informação dentro do grupo (...) O
professor é o que eles chamam de facilitador. O professor, claro que ele dá informação,
ele corrige postura, mas o que o professor puder fazer através de outro aluno, é muito
melhor. Porque ele vai estar envolvendo a percepção do outro em relação ao colega, em
relação às limitações e as facilidades do colega” (MORAES); “Eu acho que o ensino
coletivo, primeiro, é muito mais lúdico. Uma turma inteira, existe uma troca de energia de
idéias que é muito maior do que numa aula individual. Você está conduzindo pra uma
música o estudo, também é muito mais interessante (...)” (BORBA); “O ensino coletivo
entusiasma mais os alunos e até os professores (...) a aula se torna mais gostosa, pra eles,
o aprendizado é isso, pela comparação do aluno que faz, sempre tem alguém que faz com
mais facilidade, o outro já ouve, repete, tem aquela ajuda mútua” (MARTINS); “existe a
questão da socialização desse aluno porque ele está justamente começando dentro de uma
prática coletiva, ele aprende a respeitar e a manter as relações com seus colegas”
(OLIVEIRA); “E além disso, desde o primeiro contato, ele já percebe que faz parte do
grupo, divide o grupo em pequenos grupos menores, depois junta um grande número, a
banda mesmo. Aí, desde o começo, ele percebe assim: ‘Eu faço parte de uma banda!’”
(BARBOSA);“(...) quando a gente dá aula individual, só tá você e o aluno numa sala. O
aluno, ele tem um único incentivo que é o do professor. Agora, agora quando é aula
coletiva, quando não tem só o incentivo de uma única pessoa, têm o incentivo de todos os
alunos” (LOPES); “(...) as vantagens pedagógicas, que eu considero são inúmeras. Como
você poder, por exemplo, oferecer pra um iniciante parâmetros muito mais facilmente. A
pessoa que começa, ela tem do lado um, espelhos como chamam. Então, tem pessoas que
estão com as mesmas dificuldades que ela, ou com um pouco mais, ou com um pouco
menos, mas naquele mesmo nível de aprendizagem, diferente da aula individual, onde você
tem um professor que é mais um modelo que você segue. Eu aprendi muito com os meus
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alunos quando eles chegavam pra mim e eu, eles faziam alguma coisa, e eles : ‘Olha, veja
isso aqui! Isso aqui é fácil. Não isso aqui não é fácil. É fácil só pra quem sabe’, não é?”
(TOURINHO); “(...) própria convivência mesmo social, a coisa do grupo mesmo”
(CHAN).
Outra vantagem colocada foi em relação ao desenvolvimento do repertório
de maneira mais rápida, ou seja, o aluno já começa a tocar seu instrumento a partir do
ensino coletivo, sem espaços para divagações técnicas ou teóricas: “E é muito rápido, eu
acho. Essa é a coisa mais fantástica que logo, logo, eles conseguem tocar alguma coisa,
isso é muito legal, viu. No olho da criança, quando ela consegue acertar todas as notas, e
brilha o olho, ele não precisa nem dizer, porque eu sei que ele conseguiu” (BORBA);
“Desde o começo a gente trabalhava com o instrumento na boca e trabalhando música. A
gente trabalha desde o começo com melodias mesmo sabe, coisas bem simples, duas notas,
três notas. Então ele já vai desde o começo assim, tendo essa experiência musical e essa
afinidade com o instrumento (...)” (BARBOSA); “(...) outra coisa você tem que cuidar
como estratégia de ensino pra que eles toquem uma melodiazinha o mais rápido possível.
No ensino individual, muito comum você vê o professor fazer o aluno ficar fazendo nota
longa durante três meses até a posição do arco estar totalmente perfeita, pra depois
ensinar mão esquerda. Isso é desestimulante” (GALINDO).
Uma outra questão musical apontada foi em relação à afinação do grupo.
Segundo alguns educadores musicais, a vivência de se tocar em grupo é extremamente
interessante para a melhora da afinação individual de cada aluno. Quando o aluno estuda
sozinho, se ele não possui uma sonoridade agradável (bonita) e uma afinação razoável, ele
pode se sentir desestimulado por não possuir ainda condições para um desempenho
musical que esteja dentro do seu padrão desejado (cada pessoa possui um modelo pessoal
desejado de acordo com seus padrões estéticos). Por isso, a sonoridade no ensino em
grupo é mais afinada e agradável, estimulando os alunos: “Você não fica só em cima
daquela coisa técnica no começo, e o grupo acaba eliminando aquele som feio do
começo” (BORBA); “Vantagem. Motivação. Você motiva o aluno. Pega um aluno,
alguém, é muito fácil encontrar gente foi estudar violino através do ensino individual, teve
uma aula, foi pra casa com o violino, tentou tocar saiu aquele som horroroso. Porque tirar
som do violino é complicado ou do viola, do violoncelo, do contrabaixo, é complicado.
Aquilo raspa, aquilo apita e a pessoa se desestimula rapidinho, principalmente se for
jovem ou crianças né. É, no ensino em grupo você pega aquele som, que sai, e você se
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diverte com ele, você até brinca” (GALINDO); “A somatória dessas sonoridades dentro
de um grupo, ela fica quase aceitável. Não fica tão ruim quanto individualmente. Bom isso
gera pro aluno, um estímulo realmente adicional, porque ele não percebe tanto as coisas
ruins que tem no seu próprio som e o resultado musical acaba entusiasmando ele porque
ele ta percebendo uma coisa melhor do que realmente a realidade individual dele”
(OLIVEIRA); “(...) eu acho que crianças fazendo música juntas, uma ajuda a outra, sabe?
Então, no caso do coral por exemplo, você tem um superafinados, os médios, os normais e
os desafinadinhos. Então, quando você tem o desafinado, por quê que ele é desafinado?
Por quê ele não cantava nunca na casa dele? Por quê a mãe dele era desafinada? Por quê
ele ouviu ninguém cantando? Porque... Por quê? Então, sempre tinha uma razão. Daí,
você colocava o desafinado aqui e um afinado a sua direita, e outro afinado a sua
esquerda, e um outro afinado atrás. Então, essa coisa dessa vibração, né, que vinha, atrás
da orelha do desafinado, ele afinava, entendeu? Então, essa é uma vantagem, eu acho que
assim, um ajuda o outro, e esse cara sozinho, esse desafinado fazendo mal, já pensou que
sacrifício?” (CHAN). Nota-se que a educadora tenta ajudar os alunos a partir da suas
próprias condições, procurando compreender a sua realidade e o contexto em que vivem.
Outra vantagem destacada referiu-se ao desenvolvimento do ouvido
harmônico do aluno, já desde o início do estudo de instrumento: “O quê vai ficar faltando
é assim, que o ensino coletivo tem, aí sim, que o ensino individual você não tem, é você
tocar uma música a três ou quatro vozes logo de cara. Isso é muito estimulante. Quando a
criançada, a garotada ouve, a harmonia a quatro vozes acontecendo, eles ficam
encantados. Isso eu já cansei de ver. Eu quando tive aula coletiva, e toquei a minha
primeira música a quatro vozes, eu fiquei encantado. E aí, você fazer apresentações com
uma orquestra, sentir que você ta dentro de uma orquestra, dignificar um trabalho de uma
orquestra, valorizar isso. Isso também estimula os alunos” (GALINDO); “O aluno se
sente motivado, ainda mais quando coloca peças com vozes diferentes, né. Eles ficam
assim : ‘Nossa que bonito!’. Eles acostumam a tocar só uníssono, que é uma voz só e de
repente eles se deparam com outras vozes, eles realmente sentem, eles se sentem, eles
sentem que estão numa Orquestra” (LOPES);“E aí a musiquinha sai diferente, os
instrumentos também participam já na sua independência depois de certo período,né, na
sua função exatamente. A tuba já faz papel de tuba, o trompete é o solista, isso e aquilo, aí
começa esse trabalho é muito gostoso” (MARTINS).
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A economia de tempo foi outro fator indicado por dois (2) entrevistados:
“(...) primeira coisa que eu acho, olhando a parte, digamos assim, de economia de tempo.
Você gasta menos tempo pra poder fazer o mesmo trabalho” (TOURINHO); “(...) as
vantagens que o método tem é principalmente a otimização de recursos instrumentais, ou
seja, tem um número de instrumentos que você pode utilizar para vários alunos ao mesmo
tempo (...). E também, a otimização do tempo do professor (...) um bom professor que pode
atender um grande número de alunos. Eu acredito que realmente essa seja a melhor das
vantagens” (OLIVEIRA).
Foi constatado, através dos depoimentos dos educadores musicais, que o
ensino coletivo promove: baixa desistência dos alunos: “(...) a desistência foi muito
pequena, a evasão, né foi muito pequena, quer dizer não teve pra primeiro caso”
(BARBOSA); “Bom, o ensino coletivo é o ensino que não deixa o aluno desanimar”
(ROCHA); melhora a auto-estima dos alunos: “E no começo eu vejo, que a gente
trabalha com criança, baixa renda, baixa auto-estima, né, eu vejo que no começo eles
dizem que não conseguem, não sei, ‘Ah, é muito difícil!’ e isso no decorrer do ensino vai
se transformando, né. Eles acabam pedindo pra você passar mais uma vez, que ele ainda
não conseguiu. Ele tem a absoluta certeza que se passar de novo ele vai conseguir. Isso é
muito legal. Isso aí eu acho que é o mais importante pra mim” (BORBA); “Dentro do
Projeto Guri, eu pude perceber também um aspecto muito interessante relacionado a auto-
estima do aluno, principalmente em relação a Febem. Por exemplo, como é que se, como é
que se pode perceber essa melhora da auto-estima. Os alunos vão pra Febem ou todos os
nossos alunos que tem um perfil culto, social desfavorável, eles recebem a seguinte
mensagem da sociedade: ‘Você não serve para viver em sociedade ou você não serve para
ter um bom atendimento médico ou você não serve para ter uma boa casa’. Então, isso
deixa a auto-estima do aluno, a realidade social dele, deixa uma auto-estima muito baixa.
A mensagem básica que ele tem dentro dele é ‘você não serve pra nada’. Com o
desenvolver do processo de aprendizagem instrumental, ele começa a perceber que ele
serve pelo menos para aprender a tocar um instrumento. E se ele é capaz de aprender a
tocar um instrumento e produzir algo tão bonito quanto à música, ele capaz de fazer
outras coisas tão bonitas quanto isso. E isso começa a desenvolver essa auto-estima no
aluno” (OLIVEIRA); maior rendimento, estímulo, disciplina: “Eu vejo assim: eu dou
aula individual também, eu trabalho numa outra escola. E assim, o aproveitamento, o
rendimento dos alunos é muito superior. As grandes vantagens que eu vejo, é assim: o
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estímulo, porque um trabalho em grupo é muito mais interessante, eu tenho pouquíssimo


problema de disciplina, porque vêm as pessoas que estão realmente estão interessadas, as
que não estão interessadas não vem. Eles criam uma amizade muito grande, vira uma
turma mesmo, de amigos. O fato de um ver o outro desenvolvendo, ele se estimula para
aprender, ele troca experiências com os amigos. então assim, ás vezes o que um aluno
fala, um colega dele fala: ‘ah, eu vi uma música de tal pessoa’ é muito mais, talvez chame
mais a atenção do colega do que se eu falasse, chegasse e: ‘Olha vamos ouvir Hermeto
Pascoal, vamos ouvir Egberto Gismonti’” (BRAZIL); cooperação: “(...) um ajuda o outro
a entender, um está ajudando o outro a produzir, a crescer em muito pouco tempo”
(ROCHA); “se tem algum exemplo, o próprio colega dá o exemplo pra ele. Muda de
lugar, põe, senta ele do lado dele” (BRAZIL); “a outra coisa que eu vejo é o cara olha do
lado e não tá conseguindo e vê que não é uma coisa dele. Que vários ali não estão
conseguindo, e que outros conseguiram, o colega acaba conseguindo, daí ele descobre
que ele também pode conseguir” (BORBA); desinibição: “(...) você permite que as
pessoas avancem mais rapidamente e depois você pode também deixar essa pessoa mais
desinibida. É uma coisa assim, que é gritante. Os alunos de grupo, eles pra tocar, eles se
sentem melhor, mais à vontade do que um aluno que tem aula sozinho. E eu acho que de
uma certa forma, eles avançam mais rapidamente” (TOURINHO).
Sobre as possíveis desvantagens do ensino em grupo, três (3) professores
ressaltaram não ver desvantagem alguma: “Olha eu não vejo desvantagem nenhuma”
(BRAZIL); “Não, não vejo desvantagem. Não vejo desvantagem nenhuma. Aliás, eu acho
é que muito vantajoso. Tanto pra quem ensina, que tem um conjunto de alunos e o tempo
dele vai ser realmente praquele grupo todo” (ROCHA); “Desvantagem? Em se tratando
de crianças eu acho que não” (CHAN).
Alguns pontos considerados desfavoráveis em relação ao ensino coletivo
foram detectados. Primeiramente, foi questionado que o desenvolvimento de cada aluno
não é o mesmo. Cada indivíduo possui um desenvolvimento próprio, por isso, dificilmente
uma turma será homogênea. Este aspecto foi indicado por um educador musical: “(...)
desvantagens é o seguinte, ás vezes você tem que manter a turma homogênea (...) pra
manter a turma homogênea você acaba sacrificando alguns. Mas é uma opção de
democratização do ensino” (GALINDO). Outro aspecto é o referente ao tempo
estabelecido para o ensino coletivo. Dois (2) educadores acreditam que o ensino coletivo
de instrumentos musicais serve para a iniciação do aprendizado, depois do tempo previsto,
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o aluno deve recorrer ao ensino individualizado: “Não, o problema é, eu acho assim,


depois de um período você tem que encaminhar as crianças pra uma aula individual. Eu
acho que depois de uns dois anos, você de certa forma esgota aquela coisa que pode ser
feita junto, você precisa começar a burilar e a aprimorar, não é. Daí precisaria ter o
encaminhamento, certo? (BORBA); “E outra coisa, que eu não diria que é uma
desvantagem, mas que o professor tem estar ciente é que o ensino em grupo funciona pra
um ano, um ano e meio, dois anos, estourando. Depois disso, se o aluno quiser continuar,
tem que ir pra aula individual. Tem que deixar bem claro, principalmente pra quem faz
crítica ao ensino coletivo, é um trabalho de iniciação. Só pra você passar todos aqueles
conceitos básicos, para depois serem desenvolvidos na aula individual mais tarde”
(GALINDO). Por outro lado, outro entrevistado acredita que o ensino coletivo é possível
em nível médio, porém, a metodologia ainda está sendo testada para que se possa
aprimorar o ensino de instrumentos de maneira coletiva em níveis pós-iniciação: “(...)
alguns teóricos, colocam a questão do problema coletivo ser apenas para a iniciação.
Existem várias pesquisas realizadas atualmente em que tentam aplicar o processo coletivo
não apenas um processo de iniciação instrumental, mas também no estágio médio de
aprendizado”(OLIVEIRA). Outra questão estudada está relacionada com a periodicidade
das aulas. No ensino coletivo, segundo os depoimentos e revisão bibliográfica, o ideal
seria mais de um encontro semana, porém, devido ao ritmo de vida das pessoas na
atualidade e as grandes distâncias, ter mais de uma aula semanal é um empecilho para
quem trabalha com o ensino coletivo: “Eu acho que aqui no Brasil, a grande desvantagem
que a gente enfrenta é justamente a questão da periodicidade do número de aulas. Que o
processo coletivo exige que seja maior do que, aliás o número mínimo ideal de quatro (...)
E também, aqui no Brasil, uma outra desvantagem que nós temos, é que esse processo
coletivo não é aplicado dentro das escolas” (OLIVEIRA).
Para que se conhecesse melhor, qual era a clientela predominante nos projetos
que envolviam o ensino coletivo de instrumentos musicais, procurou-se saber com que
faixa etária os educadores musicais já haviam trabalhado. Os profissionais que trabalham
ou trabalharam no Projeto Guri de São Paulo (GALINDO, OLIVEIRA, BRAZIL, LOPES,
BORBA), relataram que a faixa etária é de oito (8) a dezoito (18) anos, atendendo a
proposta do projeto. Constatou-se através dos depoimentos que a faixa etária trabalhada
mais comumente no ensino coletivo de instrumentos musicais, varia entre oito (8) a
dezenove (19) anos: “a faixa etária é, aqui é assim, o mínimo é nove anos, nove a
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dezessete anos, alguns alunos às vezes passam, tem dezessete. Tem aluno que é novinho
né, que tem até oito anos e já, pequenininho é sério e já está estudando violino”
(ROCHA); “A gente divide por faixa etária mesmo. Têm duas pessoas que trabalham com
as crianças, né. Atualmente, nós só estamos trabalhando com oito crianças na escola,
entre oito e onze anos (...) Nosso público mesmo está entre quinze e dezenove anos”
(TOURINHO); “(...) de dez a dezessete anos que a gente trabalha, sabe, mais, né. Por
exemplo, alunos mais velhos se tornaram monitores hoje, até vinte e dois anos. Agora na
UFBA, nós trabalhamos já com uma faixa bem de adulto mesmo, de vinte até tem gente lá
de cinqüenta e sete anos” (BARBOSA); “A proposta inicial do professor Joel, de dez a
quatorze anos com o método coletivo e ele trabalha canções folclóricas e tal, canções de
várias regiões” (MARTINS).
Um conselho foi dado por um entrevistado que afirma que não se deve
misturar as faixas etárias porque cada uma tem suas características próprias: “Não se deve
misturar (...) Porque cada faixa etária tem características que são muito peculiares (...) Se
você mistura adulto com adolescentes, o adolescente pode se sentir inseguro”
(MORAES).
Um relato interessante refere-se à adequação dos métodos de ensino
coletivo à realidade do educando. Para tanto é necessário que se busque um repertório e
arranjos condizentes com as aspirações de determinado grupo, principalmente quando este
é formado por adolescentes: “Os meninos de quatorze anos hoje, não querem mais tocar.
Então, o que a gente faz? Tem que ou começar fazendo arranjo, que é muito escasso o
material pra banda, pra esse período, essa faixa etária, mas tem que colocar assim, temas
de filmes, o que tá acontecendo no momento, o que quê eles ouvem na televisão, alguma
coisinha que sustente essa visão da galera adolescente. Porque se ficar tocando Ciranda,
Cirandinha, tal, eles não querem mais” (MARTINS).
Outra questão é referente ao encaminhamento dos alunos para a continuidade
dos estudos após o período em grupo. No Projeto Guri a faixa etária delimitada é de oito
(8) a dezoito (18) anos, porém alguns alunos continuam no projeto, com é relatado no
trecho a seguir: “Agora no Guri tem o seguinte, tem limite de 18 anos, mas tem muita
gente que passa dos dezoito anos e quer continuar tocando. Por isso foi criado esse grupo
que eu dirijo, a Orquestra Paulista, onde gente com mais de dezoito anos é aceita. É o
único grupo do Guri que é assim, mas é pra tocar né, pra fazer apresentação numa
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pequena Orquestra de Cordas, pequena não, Orquestra de Cordas de 50 pessoas. Mas


nesse grupo a gente já deixa que as pessoas com mais de 18 anos atue” (GALINDO).
Outro aspecto comentado foi referente à carga horária mais comumente
utilizada pelos educadores no ensino em grupo. Com base nos depoimentos, observou-se
que a estipulação da carga horária depende de vários aspectos que envolvem o ensino-
aprendizagem. Fatores como quantidade de professores e alunos, local, transporte (acesso
dos alunos), entre outros, foram destacados como relevantes na escolha da carga horária.
No Projeto Guri, a carga horária semanal varia entre duas (2) a três (3) horas, com dois
encontros semanais: “Olha, as turmas iniciantes, eu tenho, assim, são duas vezes na
semana, tem turmas que tem aulas de uma hora e quinze, tem turmas que tem aula de uma
hora nesses dois dias, com exceção da turma mais avançada, que além dessa uma hora de
aula, eles tem o ensaio” (BRAZIL); “(...) a primeira turma, de manhã no caso, pelo fato
de ser muito pequenos, crianças, a gente tem a visão que é o seguinte: a criança, ela não
tem paciência pra agüentar a ficar sentada, fazendo aula, como tem um adolescente.
Mesmo o adolescente, ele já reclama. Então, a gente procura, a gente procura, fazer uma
aula logo no início, dá o máximo de nós, e pedir o máximo deles, no início que é a hora
que eles se concentram mais. Porque depois de, de meia hora, quarenta minutos, eles já
tão bem dispersos já, não conseguem mais se concentrar. Então, mas, normalmente, é uma
hora a primeira turma, a segunda, a gente já puxou pra fazer uma hora e quinze. E a tarde
também funciona assim” (LOPES); “Todo pólo que eu trabalhei são dois dias por semana,
cada turma mais ou menos uma hora e meia. Tem lugares que a gente tem instituições que
dão problema do ajuste interno com os horários deles, tem alguns projetos que a gente tem
aula de uma hora e quinze. Mas em geral é uma hora e meia semanal só e tem sempre um
ensaio de Orquestra, que a gente chama, que trabalha mais uma hora, uma hora e meia
dependendo do pólo” (BORBA).
Nos outros projetos, a carga horária varia de uma (1) a duas (2) horas
semanais, em apenas um encontro por semana: “(...) a quinta, sexta, a sétima e a oitava
tem duas aulas semanais, que são aulas seguidas, não são separadas, são todas no mesmo
dia têm as duas aulas. Somente o básico, ou os básicos que são dois, que tem uma aula
apenas semanal” (ROCHA); “A gente já trabalhou de várias maneiras lá, sabe? No
começo a gente fazia só uma aula semanal, sabe? Era lento (...). Depois eles passaram
assim a ter alguns dias que podiam ir lá, praticar. Tinha uma hora por semana e
praticava, sabe?” (BARBOSA); “Aqui são cinqüenta minutos. As aulas são germinadas,
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são juntas, aí ficam essas duas aulas juntas, que é um problema também. O menino só
teria contato no caso, uma vez por semana com o instrumento. Eles não levam o
instrumento pra casa. aí eu crio a possibilidade, analiso quem tem Educação Física no
período oposto, ou natação ou outro esporte que eles fazem, combino com os pais,
combino com a coordenação e aí, pego. esses meninos pra fazer um trabalho, nem que
seja individual, para eles ter um maior contato” (MARTINS); “Bom, depende do curso. O
curso básico que é o curso de extensão, a gente faz aulas em grupo, aulas semanais. Toda
terça-feira às 18:30 a gente se reúne” (MORAES). No curso de extensão da UFBA, há
uma (1) hora de instrumento (violão), uma (1) hora de teoria /percepção e uma (1) hora de
coral, somando três (3) horas semanais em todas disciplinas oferecidas: “(...) ele tem três
horas de música, e ainda tem acesso à biblioteca pra poder escutar disco (...)”
(TOURINHO).
Alguns educadores musicais relataram o que acham ser a carga horária ideal
para o melhor desenvolvimento dos alunos através do ensino coletivo: “(...) o ideal a gente
queria que fosse três aulas semanais, pelo menos. Hoje, nós temos duas aulas semanais e
fora esse período, alguns alunos vão lá praticar e acabam tendo chance de às vezes ter um
monitor tá lá, pra eles praticarem” (BARBOSA); “Se tivesse três aulas por semana de
duas horas, seria bárbaro. Aquela, dentro daquele conceito de Estudo Dirigido, de você
na aula, você ta dirigindo o estudo do aluno, ta cuidando dele. Isso é melhor que do ficar
em casa uma semana, tocando torto, pra depois você voltar na aula, você ter que
desentortar ele (...) Então, três aulas por semana eu acho o ideal. O trabalho vai render
muito rápido. Duas aulas, funciona também. Só você não ter expectativa de fazer um
concerto em dois meses. Muitas vezes acontece isso. Agora uma aula por semana, eu acho
que é perda de tempo mesmo. Não funciona. É muito pouco” (GALINDO); “O quê que é
ideal dentro do ensino coletivo? É que você tenha pelo menos uma periodicidade de
quatro vezes por semana, e uma hora e meia de aula. Ou seja, uma carga horária de seis a
oito horas por semana” (OLIVEIRA).
Nota-se que um grande reforço de aprendizagem é o maior contato semanal
com os alunos. Com isso, os alunos teriam um maior desenvolvimento, estimulando-os a
dar continuidade nos seus estudos. Como foi destacado por GALINDO, que esse tipo de
abordagem seria embasado no Estudo Dirigido, aquele conduzido pelo professor. Este
pensamento é comungado por BRAZIL, que acrescenta o fato de que os alunos se dedicam
pouco ao instrumento, devido aos outros afazeres da vida contemporânea. Com isso, um
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maior número de aulas configurar-se-ia como um reforço à aprendizagem, já que os


mesmos estudariam pouco em casa: “E eu acho inclusive que isso é um reforço muito
grande no aprendizado. Você não cria uma distância tão grande. Não é que o menino não
estude, a gente sabe que hoje em dia você pega um adolescente, ele tem trabalho de
escola, tem não sei quê( ...)” (BRAZIL).
Porém, esse propósito se torna difícil devido aos aspectos da vida
contemporânea:“O quê acontece é que alguns pólos do Projeto Guri, apesar de estar
muito próximo a população que eles atendem, a gente tem dificuldade em colocar uma
periodicidade de três vezes por semana. Porque significa gastos desse aluno com
transporte ou mesmo esse aluno precisa trabalhar, então em geral, dentro dos pólos do
Projeto Guri, a gente trabalha com duas vezes por semana, com uma média de uma hora e
meia de aula pra cada turma” (OLIVEIRA).
Para que se conhecesse mais profundamente o pensamento dos educadores
musicais e sua linha de atuação, perguntou-se qual seria o referencial teórico adotado.
MORAES não citou nem um autor específico. Relatou que além de utilizar o referencial
próprio da técnica do violoncelo, buscou subsídios nas áreas da psicopedagogia e da
neurolingüística.
GALINDO foi influenciado pelo professor Alberto Jaffé, que foi um dos
pioneiros a trabalhar com o ensino coletivo de cordas no Brasil. Já os educadores musicais
que trabalham com o ensino coletivo de cordas no Projeto Guri, BORBA e LOPES, foram
influenciados pelo trabalho do professor João Maurício Galindo. LOPES relatou que além
do trabalho de GALINDO, estudou as áreas de composição e regência para dar suporte à
sua atividade pedagógica.
OLIVEIRA citou quatro autores de metodologias específicas do ensino
coletivo: Paul Rolland, Samuel Applebaum; e ainda Anderson e Frost que trabalharam
juntos o “All for Strings” .
TOURINHO, em seu depoimento, citou as áreas da pedagogia geral,
pedagogia do instrumento, psicologia, psicologia da educação e da música como fontes
para a construção do seu pensamento nos trabalhos de mestrado e doutorado. Ainda citou
nomes como: Alda Oliveira, Swanick, Sá Pereira, Maria Lurdes de Junqueira Gonçalves,
Maria Isabel Montandon, e Diana Santiago.
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MARTINS relata que a Tese de Doutorado sobre o ensino coletivo de bandas


do professor Joel Barbosa (um dos nossos entrevistados), foi o seu primeiro referencial,
além do contato direto com o mesmo.
BARBOSA relatou que fez uma revisão bibliográfica extensa de vários
autores que trabalhavam com ensino coletivo. Porém, trabalhou a partir do pensamento de
dois educadores musicais: Kodály e Suzuki. Ainda, pesquisou o tema, ensino coletivo,
através de catorze dissertações de mestrado e doutorado, resultado de experimentos, dentro
do ensino coletivo de instrumentos de banda.
CHAN citou, como influenciadores de seu trabalho como educadora musical
e regente, músicos como: Villa-Lobos, Osvaldo Lacerda, Ronaldo Miranda, Camargo
Guarnieri, Eleazar de Carvalho, Emílio César de Carvalho, Levino Alcântara, Carlos
Alberto Pinto Fonseca, José Gramani, Roberto Manso, Benito Juarez, Joaquim Paulo
Espírito Santo. Citou também fonoaudiólogas no auxílio ao canto: Mara Behlau e Rose-
Marie Schoch.
ROCHA citou Suzuki e um método americano que não soube denominar, que
trabalha a partir das cordas soltas, com leitura de cifras. Já BRAZIL não encontrou
referencial teórico que lhe desse subsídio na sua atividade pedagógica: “Olha, método na
verdade, eu não, não achei nenhum que me desse suporte aqui” (BRAZIL).
Sobre a Pesquisa em Educação Musical e em Ensino Coletivo, dos onze
(11) entrevistados, seis (6) citaram com mais profundidade algumas questões relacionadas
com a pesquisa em música e em ensino coletivo. A partir dos relatos, foi observado que os
educadores musicais que conhecem mais o panorama de pesquisa na área musical e
especificamente, no ensino coletivo, são exatamente aqueles que têm mais tempo de
atuação na área, e pesquisas já realizadas.
ROCHA afirmou não conhecer nenhuma pesquisa na área do ensino coletivo
de instrumentos de corda e demonstrou interesse em fazê-lo, a partir de uma pós-
graduação. MARTINS citou conhecer apenas o trabalho do professor Joel Barbosa, mas
afirmou já ter conhecimento de alguns métodos de cordas, tendo citado um do Pará, porém
não lembrou quem era o autor de tal obra. BORBA relatou que leu alguns artigos. Afirmou
conhecer os trabalhos dos professores Enaldo Oliveira e João Maurício Galindo, mas
reconheceu a força da tradição oral no seu trabalho. BRAZIL relatou existir um
crescimento na área, mas não citou nenhum nome ou trabalho na área. LOPES afirmou que
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no início de sua atuação foi difícil (devido à falta de conhecimento prévio), mas reconhece
que os pedagogos que hoje atuam bem, tiveram as mesmas dificuldades.
MORAES destacou algumas questões sobre o tema. Em seu relato, afirmou
que grande parte dos professores de música ainda não atentaram para a importância da
pesquisa em música. Segundo seu relato: “Todos os professores de instrumentos sabe que
existe uma resistência muito grande. Porque a gente aprendeu de forma individual e é
muito mais cômodo ensinar da forma como a gente aprendeu”. No campo específico do
ensino coletivo, o entrevistado relatou que conhece alguns trabalhos, mas existe um
isolamento muito grande por parte dos educadores no sentido de trocar experiências: “Eu
sei de nomes de professores que trabalham com o ensino em grupo, mas eu pelo menos
não recebi nenhum convite e não me dirigi a nenhum. Existe um isolamento realmente que
separa, que deixa cada um trabalhando, meio que individualmente”. Porém, destaca que
na UEMG existe uma disciplina de um curso de especialização, ministrada por ele. E está
iniciando pesquisas na área e fazendo um intercâmbio dos professores que atuam na área
em Belo Horizonte.
BARBOSA relatou conhecer mais os aspectos da área de sopros, na qual atua.
Porém, citou como referência o trabalho de Diana Santiago, no piano e teclados; o de
Cristina Tourinho, no violão; e o Projeto Guri (não em um contato direto, mas através de
informações do amigo Daniel Tamborim). Citou ainda, o trabalho de Alberto Jaffé, sobre
o qual tomou conhecimento a partir do contato de pessoas ligadas a ele: “(...) eu morei com
pessoas que trabalharam, que foram alunos do Jaffé em vários pontos. Tanto pessoas que,
alguns estão até em Salvador hoje, que aprenderam ou em Fortaleza, que ele trabalhou,
Brasília teve, e em São Paulo”. Ainda informou ter tido contato com o trabalho escrito de
Linda Krüger, uma americana do Texas, que morou um período na cidade de Belém, para
elaboração de um método de cordas, usando a música brasileira. Finalizou a questão
dizendo conhecer o trabalho de Abel Moraes através de outras pessoas; um trabalho de
ensino coletivo de sopros, em Volta Redonda, no Rio de Janeiro; e completa que São Paulo
é um centro bem desenvolvido.
TOURINHO relatou a importância da criação dos cursos de pós-graduação no
sentido de se favorecer o pensar e o fazer pedagógico. Para ela, o contato entre
pesquisadores e as publicações dos cursos de pós-graduação são importantes para o
desenvolvimento da área. Ainda, afirmou que, nos últimos dez anos, o ensino em grupo
cresceu consideravelmente em todo país. Foram destacados pela pedagoga os trabalhos de
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Claúdio Jaffé na década de 80, no SESC em São Paulo; nos dias atuais, o trabalho de
Mário Ulloa e de Diana Santiago (que trabalham o ensino em grupo em nível superior) em
Salvador; e o trabalho de Flavia Maria Cruvinel, em Goiânia.Também destacou conhecer
trabalhos com ensino coletivo em Varginha, Recife, Rio Grande do Norte, Curitiba.
Finalizou com uma previsão otimista para a área: “Eu acho que vamos dar mais dez anos,
eu acho que a gente já vai ter uma série de trabalhos impressos e escritos, entende, pra
poder situar a gente melhor. O campo é incipiente, tá começando mas eu acho que tá
começando de pé direito” (TOURINHO).
OLIVEIRA observou um crescimento na área do ensino coletivo, ressaltando
que quando elaborou a sua dissertação sobre o tema, existia apenas um outro título na área.
Depois veio o trabalho de João Maurício Galindo e a presente pesquisa : “eu tô vendo que
as pessoas estão começando a despertar pra essa questão da pesquisa do ensino coletivo
instrumental” (OLIVEIRA). Sobre a questão da pesquisa em educação musical, o
entrevistado ressaltou que tem muita coisa a se fazer em relação à formação de educadores
musicais, principalmente na formação de professores de instrumento: “A gente tem pessoas
que dão aula mas sem essa preparação, sem esse perfil de professor e isso obviamente se
reflete na questão toda da pesquisa (...)” (OLIVEIRA).
GALINDO citou estar afastado da área de pesquisa desde a conclusão do seu
trabalho de dissertação, porém, citou os trabalhos de pós-graduação (mestrado) de José
Leonel Gonçalves e de Enaldo Oliveira, ambos pela USP. Ainda, relatou o conhecimento
de um trabalho de iniciação científica de Mauro Vieira, pela UNESP. No campo não
acadêmico, citou o trabalho do violonista Pedro Cameron, que criou um método de ensino
coletivo, na cidade de Rio Claro. Para finalizar, GALINDO afirmou que a pesquisa e
prática do ensino coletivo vem crescendo muito e que o Projeto Guri, de São Paulo, tem
um papel importante no cenário atual: “quando o Jaffé começou esse trabalho em São
Paulo, em 78, o preconceito era imenso dos outros professores. E hoje você vê a coisa se
difundindo de certa maneira. Muito por causa do Guri, se fala muito em ensino coletivo”
(GALINDO).
CHAN citou nomes como: Valquíria Passos e Josete Félix na pesquisa da
música para bebês; Eny Parejo na pesquisa sobre a musicalização; Gisele Cruz na área de
Coral Infantil; Marisa Fonterrada, Samuel Kerr , Marcos Leite na área Coral. Citou ainda,
nomes como Osvaldo Lacerda, Heitor Villa-Lobos e Levino Alcântara.
78

Para finalizar os depoimentos, foi perguntado aos educadores musicais se


teriam algumas Sugestões e/ou Considerações Finais.
No aspecto de sugestões, o professor BARBOSA sugeriu o contato direto
com o professor José Coelho de Almeida, ex-diretor do Conservatório de Tatuí, que
desenvolveu um importante trabalho com o ensino coletivo de instrumentos de sopros em
São Paulo.
No aspecto de considerações finais, MARTINS finalizou afirmando que a
área vem crescendo e enfatizou a importância da aplicação do ensino coletivo na
atualidade: “Nós vivemos num país em que as oportunidades são pouquíssimas (...) Nós
temos um mercado, a música tem mercado demais. Se todo mundo se interessasse por
música não tinha professor (...) não temos dinheiro pra pagar a cada professor pra
atender um e um aluno. Vamos pensar coletivamente. Eu acho que é uma grande saída”
(MARTINS). Ressaltou, ainda, a importância do professor acompanhar o mercado
musical, bem como aumentar seu conhecimento musical para que possa trabalha com o
ensino coletivo, que “oportuniza em pouco tempo milhares de pessoas a tocar
instrumento” (MARTINS).
Nessa questão, MORAES relatou que “o ensino em grupo, ele serve
perfeitamente para ser trabalho tanto em abordagens quanto em idades diferentes, pra
crianças, pra jovens, adolescentes, terceira idade”. Ressaltou a mudança da relação
música e sociedade e conseqüentemente, do trabalho de músico, professor ou intérprete, ou
seja, da sua função social. Para ele, com o advento da gravação, os referenciais da música
se modificaram: “a visão do século XX é uma visão muito tecnicista do músico, do
compositor também. O músico tem que ser absolutamente excelente, perfeito”. Destacou
que esse fato influencia o comportamento dos alunos e dos músicos no geral, como uma
espécie de neurose na busca da perfeição: “Se objetiva a perfeição. E sendo o quê
caracteriza a vida, a natureza e a própria arte é o elemento imperfeição. Se você ouvir o
computador tocando absolutamente afinado, no ritmo, você vai ver que falta o elemento
humano. O elemento humano é a irregularidade, é a sensibilidade, é a emoção que a gente
não controla, você entendeu? A falta de controle é algo que a gente tem que aprender a
conviver com ela”. Para ele, a partir do contato com o grupo, o ser humano passa a
enxergar melhor as suas limitações, observando as limitações do outro: “Por isso que o
ensino em grupo ele pode ser muito mais humano agora, no século XXI. O ensino em
grupo, a socialização, a visão de música como algo que pode servir, que pode servir com o
79

objetivo explícito, não só intrínseco. O Koellreutter chama de uma Educação Musical


Funcional, ou seja, que tenha função de socializar, de trazer a experiência de um
conhecimento simbólico. Que é algo que é perdido, que é algo que a gente tem que
resgatar. Então, eu acho que o, a principal ligação que eu vejo no ensino em grupo é como
a mudança de paradigma da própria visão, da própria função da música na sociedade e
na vida do homem. Eu posso dizer por mim, o processo de aprendizado musical, de
aprendizado instrumental é algo extremamente sacrificante, é algo que demanda um
esforço pessoal, uma transformação pessoal em cada,em cada estágio da vida. Então, se
isso pudesse ser visto como uma oportunidade de desenvolvimento pessoal, ao invés de
unicamente profissional, a gente pode democratizar, a gente poderia democratizar o
ensino de música como sendo algo terapêutico, como algo que trouxesse a possibilidade
de um desenvolvimento muito maior, muito mais amplo do que simplesmente você chegar a
tocar um concerto com uma orquestra. Então, é isso que eu vejo, é dessa forma que eu
ensino, é dessa forma que eu ensino professores a ensinarem, uma maneira de pela música
você entender o mundo de uma forma mais tolerante, porque é imperfeito, percebe?”
(MORAES). E finalizou, seu depoimento, afirmando acreditar que o professor de
instrumento deve estar atento às imperfeições do ser humano para conseguir transformar
verdadeiramente o seu aluno, cumprindo o seu papel como educador musical: “Cada aula
que eu dou, cada momento eu penso sempre nisso. Existe um ser humano tocando um
instrumento ali atrás. Se eu puder preparar esse ser humano, se eu puder lidar com ele,
pra aprender melhor o instrumento, ele vai aprender natação, culinária, direção, ele vai,
ele pode se relacionar melhor com a mulher dele, ele pode se aceitar mais nas suas
limitações, entendeu? Então, isso é que eu entendo como educação musical” (MORAES).
BORBA afirmou que a experiência com o ensino coletivo foi uma das mais
gratificantes da sua vida: “Olha foi uma das coisas mais gratificantes que eu fiz na área
musical, certo. Eu adoro tocar no meu quarteto, mas na hora, na área de ensino, isso aí
realmente mudou minha cabeça, abriu muito a minha cabeça. Eu tô adorando o Projeto
Guri porque trabalha também esse lado social que eu acho super importante. Eu tô vendo
o benefício que faz pra essas crianças” (BORBA).
TOURINHO afirmou desconhecer outra pesquisa na área enfocando a
transformação social através do ensino coletivo: “Eu acho que esse é um ponto bem
interessante a ser tocado porque por exemplo nos trabalhos que eu vi até agora, nos
trabalhos escritos, registrados de ensino em grupo eu não vi nenhum com essa
80

preocupação, eu acho que você tá tocando num ponto importante, que você pode explorar
realmente. Seria um diferencial no trabalho que você tá fazendo” (TOURINHO). E
finalizou afirmando acreditar na educação pela música com um poder de transformação e
de melhoria da forma de viver das pessoas.
Da mesma forma, OLIVEIRA afirmou que desconhece outro trabalho na área
enfocando o lado social do ensino coletivo: “Eu acho que o pesquisador é aquilo que você
ta fazendo, é muito importante, porque provavelmente vai ser o primeiro trabalho que
considera a questão do lado social” (OLIVEIRA). Finalizou destacando ter a
conscientização de qual é o seu papel social na formação do aluno: “(...) eu tenho que ter
sempre em mente qual é o meu papel como professor, como eu influencio enquanto
professor na formação de um ser humano? Na educação desse ser humano e caráter desse
ser humano. Então, eu tenho que utilizar todo esse conhecimento para tirar o máximo que
ele pode me dar” (OLIVEIRA).
GALINDO relatou a influência do conhecimento especializado que prejudica
a percepção do todo: “Bom, eu acho assim, acho que o novo da questão é o seguinte, a
gente passou por décadas aí de um ensino musical que era pra formar datilógrafos.
Extremamente bem treinados. Estou cansado de ver como regente, violinista que tem os
dedos treinados e não tem conhecimento musical amplo, sabe? É, quer dizer, eu acho que
é o caso de um país onde faltam músicos amadores, gente tocando música pra fazer parte
da vida” (GALINDO). Esse ensino altamente especializado, voltado para a
profissionalização do músico, seleciona quem deve fazer música e de que forma a mesma
deve ser feita. Com isso, o ensino musical torna-se muito específico, voltado para um
público seleto, em um processo antidemocrático: “Se você não é o violinista, se você não
consegue tocar os Caprichos de Paganini, isso é um problema. Isso não é um problema!
Você tem que estudar violino e tocar cançãozinha folclórica, qual é o problema? E se você
gostar, você continua estudando. É, quando Brahms estava vivo e compôs uma sinfonia e a
sinfonia era tocada, a platéia era toda de músicos amadores, todo mundo tocava piano,
violino, etc. Hoje todo mundo ouve CD. Então ficou um buraco aí. Então a gente ta num
país tentando criar orquestras, ensinando os músicos profissionais a tocar violino, os
Caprichos de Paganini, pra quem? Tem gente que não consegue ouvir” (GALINDO).
Pode-se afirmar que o ensino musical não está adequado à realidade atual. GALINDO
destacou a necessidade da formação de músicos amadores para que o cenário musical
possa ser desenvolvido através de um público mais crítico: “Tô cansado de reger
81

concertos de música erudita, e olho pra cara da platéia e a platéia não entende. Olhando
praquela orquestra como se fosse uma coisa estranha. Da uma dormida, conversa
bastante, durante o concerto, e bate palma no final pra ser educado. Então, acho que
formar músicos amadores é importante para o ambiente musical, pra que a profissão de
músico exista e é importante pra essas pessoas” (GALINDO). E finalizou seu depoimento,
afirmando que o ensino musical deve ser voltado para a formação do ser humano de
maneira lúdica e prazerosa: “Então, tá faltando o lúdico, o prazeroso, tá faltando um
ensino musical pela música, não pra formar virtuoses. Não pra professores de piano ou
violino fazer do aluno dele aquilo que ele queria ter sido e não foi. Entendeu? Eu acho que
é isso que eu tenho a dizer, assim de importante. Ensinar a música pela música, pras
pessoas se divertirem” (GALINDO).
BRAZIL se considera um defensor do ensino coletivo. Afirmou que o ensino
coletivo deve ser pesquisado e aplicado no sentido de oportunizar um melhor ensino
musical, de acordo com a realidade brasileira: “eu acho que tem que ser levado a diante,
tem que ser aplicado, tem que ser embasado isso, pra mostrar pras pessoas que funciona.
as pessoas, na maioria das vezes, não acreditam que possa funcionar esse tipo de coisa. E
ser levado pras universidades, pras escolas públicas. Inclusive é uma prática musical que
poderia ser feita nas escolas. Eu inclusive vejo nas escolas particulares que tem aula de
música, é muito pobre o ensino de música nas escolas, então, poderia ser muito rico. O
máximo que eles fazem é uma aula de flauta doce, ou coisa assim, que eu até tenho
algumas críticas, porque eu acho que é um instrumento que não reflete a realidade da
música brasileira, não reflete a cultura brasileira, não existe repertório brasileiro sobre
isso, não estimula o aluno a ir pra casa dele e tocar flauta doce no meio da família dele.
Tem tantos instrumentos que são até fáceis de se conseguir, aqueles que não tem um violão
na família, um cavaquinho, um pandeiro ou qualquer coisa e formar grupos de
instrumentos, que sejam populares, que possibilite o aluno tocar isso. Então, eu acredito
plenamente no ensino coletivo, acho que tem que ser estudado, tem que ser levado pra
frente” (BRAZIL)
Por fim, as considerações finais de ROCHA, LOPES E CHAN: “Espero que
surja daqui pra frente pelo menos um ensino coletivo pra orquestra (...) Quer dizer, uma
orquestra de cordas e de sopros” (ROCHA); “Eu achei muito legal. Você sair lá de
Goiânia, vir aqui fazer tudo isso. Eu acho que é um trabalho legal, pra mostrar para
bastante gente (...) Eu achei importante pra caramba, seria bom se todos as universidades,
82

todos os estados pudessem querer conhecer, tivesse essa idéia de montar uma tese assim.
Parabéns” (LOPES); “eu só tenho a dizer a você que eu espero que essa sua pesquisa
incremente ainda mais esse movimento no Brasil. Que você seja uma figura importante
que possa irradiar de Goiânia pro Brasil inteiro” (CHAN).
83

5. METODOLOGIA

Esta pesquisa, apesar de experimental na sua natureza, na condução das aulas,


resultou em dados e foi possibilitada a partir da intervenção constante da pesquisadora e de
seus auxiliares. Seguem-se as explicações teóricas acerca da condução e da análise dos
trabalhos realizados.

5.1. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

5.1.1. A PESQUISA EM EDUCAÇÃO NA ATUALIDADE

A pesquisa em Educação, a partir da investigação de metodologias de


pesquisa de práticas pedagógicas, vem sendo amplamente debatida por educadores e/ou
pesquisadores.
FAZENDA (1992) discorre sobre a dicotomia existente entre a teoria e a
prática. Dessa divisão, surgiram duas linguagens pedagógicas: uma voltada para a teoria e
a outra voltada para a prática. Porém, um fenômeno recente se faz notar: alguns
educadores/pesquisadores têm buscado nas questões do cotidiano algumas respostas acerca
da pesquisa educacional.
A autora prossegue afirmando que a tradição do educador/pesquisador é
muito recente. Antes, a pesquisa ficava a cargo de cientistas de outras áreas, que teria que
manter uma certa distância, se mantendo neutro a qualquer influência externa a
metodologia (extremamente rígida). Aos educadores cabia o isolamento de sala de aula, já
que os mesmos não possuíam formação na área de pesquisa. Com isso, destaca que muitas
experiências foram perdidas ou desconsideradas pela inexperiência na área de pesquisa por
parte dos educadores:

Um aspecto que venho considerando refere-se ao fato de que as


questões do cotidiano de uma sala de aula, de uma escola, de um
organismo administrativo ou técnico na educação vêm sendo
vivenciadas por seus atores, sem merecer o devido registro ou
análise – nesse sentido milhares de experiência bem-sucedidas
perdem-se no tempo. Essa ausência de registro gera o total
desconhecimento por parte dos que estão exercendo a prática
pedagógica, e com isso a necessidade de sempre precisarem partir
84

da estaca zero em seus projetos de trabalho e pesquisa


(FAZENDA, 1992, p.80).

CHIZZOTTI (1992) afirma que há um freqüente interesse pelas questões


cotidianas, do dia-a-dia, nas pesquisas e estudos da educação e ciências humanas e sociais.
Adverte que o conceito de cotidiano não é unívoco. Em sua visão, o cotidiano não pode ser
pensado como um conceito neutro, mas devem ser consideradas as injunções ideológicas
de que o mesmo é cercado.
O autor esclarece que a sociologia existencial, em oposição ao absolutismo
das pesquisas experimentalistas, trabalha com a existência das pessoas, no sentido de
procurar desvendar “esse universo de crenças, de visão de mundo, as contradições da ação
das pessoas, pressupondo que as pessoas carregam muito fortemente tanto a irracionalidade
quanto a emocionalidade” (CHIZZOTTI, p.96), já que a sociedade é pluralista, cheia de
disputas de poder e contradições. Nessa perspectiva, cabe ao pesquisador “adentrar esse
universo para poder desvendar que muito desses atos de representação social – que o
indivíduo acaba fazendo e repetindo – têm um sentido restrito ao mundo específico de seu
grupo” (CHIZZOTTI, p.96).
Portanto, vê-se que a pesquisa na área da educação, busca cada vez mais,
investigar o quê ocorre na prática do ensino e no cotidiano escolar.

5.1.2. A PESQUISA-AÇÃO

Buscou-se através da pesquisa-ação, ferramentas para investigar a prática


pedagógica através do Ensino Coletivo de Cordas. Segundo BARBIER (1997), a pesquisa-
ação surgiu como uma nova abordagem específica de pesquisa em Ciências Sociais. O
autor descreve que no ano de 1986, os pesquisadores do Institut National de Recherche
Pédagogique29, HUGON e SEIBEL, definiram a pesquisa-ação da seguinte maneira:
“Trata-se de pesquisas na quais há uma ação deliberada de transformação da realidade;
pesquisas que possuem um duplo objetivo: transformar a realidade e produzir
conhecimentos relativos a essas transformações” (BARBIER, 1997, p.6).
A pesquisa-ação conduz o pesquisador a uma nova postura: a ação está
interligada à necessidade de reflexão, ou seja, o agir implica em refletir e vice-versa. O

29
Instituto Nacional de Pesquisa Pedagógica.
85

pesquisador em pesquisa-ação não pode ser considerado apenas um “sociólogo” ou


“psicossociólogo”. BARBIER (1997) entende que a sua competência é múltipla, sendo que
no decorrer da sua prática, às vezes atuará como sociólogo, ou psicossociólogo, ou
filósofo, ou psicólogo, ou historiador, ou economista, ou interventor, ou militante etc. Para
ele, “o pesquisador desempenha então seu papel profissional numa dialética que articula
constantemente a implicação e o distanciamento, a afetividade e a racionalidade, o
simbólico e o imaginário, a mediação e o desafio, a autoformação e a heteroformação, a
ciência e a arte” (p.7). Nesse sentido, o pesquisador em pesquisa-ação é um sujeito
autônomo, autor de sua prática e seu discurso. É um agente da mudança, um interventor.
O autor entende que a pesquisa-ação é eminentemente pedagógica e política,
servindo “à educação do homem cidadão preocupado em organizar a existência coletiva da
cidade. Ela pertence por excelência à categoria da formação, quer dizer, a um processo de
criação de formas simbólicas interiorizadas, estimulado pelo sentido do desenvolvimento
do potencial humano” (BARBIER, 1997, p.7). A pesquisa-ação, supostamente, deve ter
uma conversão epistemológica, ou seja, uma mudança na postura do pesquisador
envolvido. “Quando a pesquisa-ação se torna cada vez mais radical, essa mudança resulta
de uma transformação da atitude filosófica do pesquisador envolvido com respeito à sua
própria relação com o mundo” (BARBIER, 1997, p.15). Portanto, a pesquisa-ação é a
ciência da práxis, sendo que o objeto de pesquisa é estudado a partir da elaboração da
dialética da ação, em um processo pessoal e único. Para BARBIER, esse processo é de
certa maneira, libertador no que se refere às imposições dos hábitos, dos costumes e da
sistematização burocrática.
O método em pesquisa-ação está relacionado a quatro temáticas, a saber: 1)
A identificação do problema e a contratualização (os sujeitos/atores devem saber que estão
sendo pesquisados); 2) o planejamento e a realização em espiral; 3) As técnicas de
pesquisa-ação; 4 ) A teorização, a avaliação e a publicação dos resultados.
No processo de investigação da pesquisa-ação, pode-se utilizar múltiplas
técnicas de implicação, tais como: diários, registros audiovisuais, análise de conteúdos,
entre outros. BARBIER (1997) entende que o rigor na pesquisa-ação está “na coerência
lógica empírica e política das interpretações propostas nos diferentes momentos de ação”
(p.34). Da mesma forma, a pesquisa-ação utiliza-se das chamadas técnicas do banal e do
cotidiano que são as formas de escuta e de observação não-codificadas, não estruturadas.
Por exemplo, “o pesquisador mantém sempre com ele uma caderneta destinada às
86

anotações. Ele tem igualmente interesse de possuir um pequeno gravador de bolso, se


quiser registrar imediatamente dados” (BARBIER, 1997, p.83). Os documentos oficiais
também são interessantes, como em uma pesquisa escolar, pode-se utilizar registros,
regulamento interno, balanços e atas de deliberação de conselhos de classe, quadros de
avisos, fotografia da turma, entre outros. E ainda, a produção imaginária dos membros dos
grupos deve ser sistematicamente pesquisada. São consideradas produções imaginárias os
desenhos, os contos, os refrões, os desenhos animados, relatos em prosa, romances,
documentos em vídeo, entre outros.
Em uma pesquisa-ação a teoria decorre da avaliação permanente da ação.
Com isso, a mesma encontra-se em processo de pesquisa em espiral:

“Situação problemática: planejamento e ação nº 1; avaliação e


teorização; retroação sobre o problema; planejamento e ação nº 2;
avaliação e teorização; retroação sobre o problema; planejamento
e ação nº 3; avaliação e teorização; retroação sobre o problema;
planejamento e ação nº 4; e assim sucessivamente” (BARBIER,
1997, p.93).

Portanto, uma pesquisa-ação suscita mais questões do que as resolve, “ela


incomoda quase sempre os poderes estabelecidos” (BARBIER, 1997, p. 94).
A pesquisa-ação existencial, constitui-se em um novo direcionamento da
pesquisa-ação, radicalizando os prolongamentos das dimensões mais pessoais e
comunitárias, “que não se sustentam unicamente nos alicerces das Ciências Sociais, mas
assumem a dimensão filosófica da existência humana requalificada” (BARBIER, 1997,
p.36). A mudança de atitude do sujeito (ou grupo) em relação a sua realidade, da realidade
que se impõe em última instância (o que se chama de princípio da realidade) é o que se
busca na pesquisa-ação existencial. Porém, para o autor não se trata de esperar uma
mudança milagrosa ou de permanecer numa atitude passiva. “Em verdade, na ação mesma
em prol da mudança social e pessoal, uma lúcida apreciação do princípio da realidade
permanece constante, sem se perder numa postura fria de todos os que repetem
continuamente que ‘não se deve sonhar!’” (BARBIER, 1997, p.41-42).
Por isso, BARBIER acredita que a pesquisa-ação existencial (P-A-E)
favorece “o imaginário criador, a afetividade, a escuta das minorias em situação
problemática, a complexidade humana admitida, o tempo de maturação, e o instante da
descoberta” (p.42). Nessa perspectiva, o autor conclui o seu pensamento afirmando que a
pesquisa-ação existencial “é talvez a que mais diretamente aborda as situações-limites da
87

existência individual e coletiva. A morte, o nascimento, a paixão, a doença, a velhice, a


solidão, a excentricidade, a criação... são campos de investigação que ela apreende com
habilidade e compreensão” (BARBIER,1997, p.43).

5.2. DESCRIÇÃO DO EXPERIMENTO

A presente pesquisa-ação existencial, com abordagem qualitativa, delimitou


como objeto de estudo, o ensino coletivo de cordas, como uma metodologia de ensino
eficiente para a iniciação instrumental, observado, passo a passo, o desenrolar de seu
processo, proposta como um dos meios de democratização do ensino musical e
conseqüentemente, de transformação social.
O experimento foi realizado através da Oficina de Cordas, do Programa de
Extensão Universitária da Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de
Goiás, projeto intitulado “Oficinas de Música e Teatro”30. Delimitou-se um semestre
letivo – agosto a dezembro de 2002 - para a realização da pesquisa de campo do
experimento 31.
Optou-se em delimitar como experimento de estudo, dois grupos de perfis
diferentes para oportunizar a observação da eficiência da metodologia.
O primeiro grupo foi formado por alunos que procuraram a Oficina de Cordas
da EMAC/UFG. Não houve seleção de candidatos com um perfil específico neste grupo, já
que a Oficina de Cordas tem como preceito, oferecer à comunidade goianiense em geral, o
ensino coletivo de instrumentos de corda. Este grupo foi denominado GRUPO
COMUNIDADE.
O segundo grupo foi estabelecido através do convênio não formal das
Oficinas de Música da EMAC/UFG com a Sociedade Cidadão 2000, núcleo CEACA, por
iniciativa desta pesquisadora, para que o trabalho realizado fosse um dos objetos da
presente pesquisa. O perfil dos sujeitos desse grupo reflete que ele é constituído por pré-
adolescentes e adolescentes que atuam no mercado informal de rua. Os alunos foram em
sua maioria engraxates, aqueles sujeitos excluídos de uma educação formal mais séria e

30
O Projeto “Oficinas de Música e Teatro” foi criado e registrado na PROEC, em 2000, com intuito de
oferecer a comunidade externa a UFG, cursos de Música e Teatro.
31
As entrevistas realizadas com os educadores musicais que atuam na área específica foram realizadas de
abril a agosto de 2002, com o intuito de justificar a importância da presente pesquisa e de conhecer como se
encontra o quadro do ensino coletivo em instrumentos musicais no país.
88

eficaz, e de qualquer tipo de educação musical. Este grupo foi denominado de GRUPO
CEACA32.
A coleta de dados teve como instrumentos de pesquisa: 1) Planejamento de
cada aula e do semestre; 2) Diário de Classe; 3) Fichas de questionário para detectar o
perfil dos sujeitos e suas expectativas; 4) Filmagens através de câmera de fitas de 8mm de
cada intervenção-aula (processo de desenvolvimento de aprendizagem e relações
interpessoais visando o aprendizado instrumental e a sociabilização dos sujeitos); 5)
Filmagens em 8mm de depoimentos dos sujeitos no final do semestre letivo (verificação
dos efeitos do ensino-aprendizagem); 6) Filmagens e Programas dos Recitais (verificação
do resultado musical final do ensino-aprendizagem); 7) Fitas de vídeos com a divulgação
do projeto veiculado na imprensa televisiva; e, 8) Recortes de jornais com a divulgação do
projeto na imprensa escrita.
As intervenções/aulas, filmadas em câmera 8mm, foram gravadas em 21
(vinte e uma) fitas, de 2 (duas) horas cada, totalizando 42 (quarenta e duas) horas de
gravações. Os recitais e depoimentos foram gravados em 2 (duas) fitas, totalizando
aproximadamente 2 (duas) horas. O material referido, somado às matérias veiculadas na
imprensa televisiva, totalizaram 8 fitas de vídeo cassete (VHS) 33, a saber: Fitas 1, 2 e 3 –
Intervenções/aulas do GRUPO COMUNIDADE; Fitas 4, 5, e 6 – Intervenções/aulas do
GRUPO CEACA; Fita 7 – As duas últimas intervenções/aulas do GRUPO CEACA, os
depoimentos de todos alunos de ambos os grupos e os recitais; por fim, Fita 8 -
Divulgação da metodologia de ensino coletivo de cordas e dos recitais, veiculados na
imprensa televisiva.
Os sujeitos, desde o início do experimento, estavam cientes de que a
professora estava pesquisando a metodologia de ensino coletivo de instrumentos de corda.
Os sujeitos (ou responsáveis) autorizaram a coleta de dados, bem como, as instituições
envolvidas (Escola de Música e Artes Cênicas – UFG/Projeto de Extensão – Oficinas de
Música e de Teatro; e Sociedade Cidadão 2000/Núcleo CEACA). Durante o semestre, os
sujeitos conviveram com a câmera filmadora (sempre foi posicionada em um canto da sala
para não chamar muita a atenção, levando a mudança comportamental dos grupos) e com

32
O CEACA – Centro de Atendimento à Criança e ao Adolescente – é uma unidade da sociedade Cidadão
2000, que tem como objetivo, atender a todos adolescentes inseridos no mercado do trabalho informal
(engraxates, vigias e lavadores de carros, vendedores ambulantes) nas ruas de Goiânia.
33
As fitas de 8mm quando transportadas para fitas de vídeo VHS através do sistema LCP, totalizam
aproximadamente 6 (seis) horas/fita.
89

questionários (identificando o perfil dos sujeitos e a experiência musical anterior), com


naturalidade, sem esboçar algum tipo de estranhamento. Da mesma forma, ao final do
semestre, gravaram espontaneamente depoimentos sobre os aspectos mais relevantes dessa
experiência musical.
A partir dessas medidas metodológicas, a seguir, descreveu-se e analisou-se o
desenvolvimento desses dois grupos de perfis diferenciados, com o objetivo de investigar
como o ensino musical, através do Ensino Coletivo de Cordas, influenciou o
desenvolvimento musical de cada grupo. Pretendeu-se investigar se o ensino coletivo de
cordas teve alguma influência na vida cotidiana dos sujeitos através da modificação de
pensamento, hábitos, conduta social, entre outros; buscando os elementos que
caracterizariam a ocorrência de uma transformação social.

5.3. PERFIL DOS GRUPOS E DOS SUJEITOS

Os dados das tabelas foram retirados de questionários (vide Anexo 5)


aplicados aos sujeitos, como o intuito de conhecer melhor o perfil cada um, suas
influências musicais cotidianas e os aspectos relacionados com a Oficina de Cordas.
Preferiu-se trocar o nome dos sujeitos, utilizando nomes fictícios, preservando a
identificação dos mesmos. O grupo COMUNIDADE iniciou o semestre com sete (7)
sujeitos. Na 8ª intervenção/aula completou-se o grupo, totalizando dez (10) sujeitos. Já o
grupo CEACA, iniciou o semestre com dez (10) sujeitos. Porém, até meados do semestre
alguns alunos foram levados à Oficina de Cordas, pelo CEACA, para que pudessem
“experimentar” a aula de música. Por isso, muitos alunos assistiram uma ou duas
intervenções/aulas, tendo um número expressivo de sujeitos flutuantes. Até a metade do
semestre, a quantidade de sujeitos/aula, em média, era nove (9), sete (7) fixos e dois (2)
“visitantes”. Durante o semestre, passaram pelo grupo CEACA 19 (dezenove) sujeitos.
Optou-se em colocar no quadro os sujeitos que se mantiveram durante todo o semestre (ou
a maior parte dele) e/ou participaram dos recitais e depoimentos.
90

5.3.1. Grupo COMUNIDADE

FIGURA 2 – Quadro de alunos do grupo COMUNIDADE


Aluno Idade Sexo Escolaridade Profissão
Antônio 13 anos masculino 6ª série estudante
Daniela 15 anos feminino 8ª série estudante
Elvira 46 anos feminino superior advogada
Juan 13 anos masculino 7ª série estudante
Heitor 17 anos masculino 2º ano, 2º Grau estudante
Hamilton 20 anos masculino 2º grau auxiliar de
produção
Milene 25 anos feminino superior professora de
incompleto música
Nalanda 14 anos feminino 7ª série estudante
Quênia 13 anos feminino 6ª série estudante
Sérgio 22 anos masculino 2º grau estudante

FIGURA 3 – Quadro de influências musicas I


Aluno Familiar Ouve Gosta de Freqüenta Qual gênero
estuda/estudou música? cantar? salas de musical
música? concerto? preferido?
Antônio sim/mãe sim sim sim clássico e axé
Daniela sim /pai e sim sim sim clássico,jazz,
irmão rock e pop
Elvira sim/cunhada sim sim sim -
Juan sim /pais, tio e sim sim às vezes clássico, rap,
primos pop e rock
Heitor não sim sim não rock , gothic e
metal
Hamilton sim/tios não não sei às vezes rock nacional
Milene sim /pais, sim sim sim clássico e
irmão, tios, avó MPB
e primos
Nalanda não sim sim não MPB,clássico,
rock e gospel
Quênia sim/irmão sim sim às vezes pop, rock e
clássico
Sérgio não sim não sim rock, clássico
91

FIGURA 4 – Quadro sobre a Oficina de Ensino Coletivo de Cordas I


Aluno Como Qual o A A carga Gosta de Como
soube da instrumento? metodologia horária é apresentar prefere
Oficina? de ensino é a ideal? em tocar?
eficiente? público?
Antônio jornal violoncelo sim sim sim em grupo
Daniela aluno contrabaixo sim não sim em grupo
Elvira amiga violino sim sim sim sozinho e
em grupo
Juan amigo violino sim sim sim em grupo
Heitor jornal/amiga violino sim sim sim sozinho
Hamilton jornal violino sim não sei sim em grupo
Milene cartaz no viola sim sim sim sozinho e
EMAC em grupo
Nalanda amigo violino sim sim sim em grupo
Quênia irmã violino sim sim sim em grupo
Sérgio amigos violoncelo sim sim não em grupo

5.3.2. Grupo CEACA

FIGURA 5 – Quadro de alunos do grupo CEACA


Aluno Idade Sexo Escolaridade Profissão
Daniel 14 anos masculino 4ª série engraxate
Gabriel 12 anos masculino 4ª série engraxate
Júnior 12 anos masculino 5ª série engraxate
Josimar 16 anos masculino 5ª série engraxate
João 17 anos masculino 4ª série vigia de carros
Luiz 14 anos masculino 4ª série engraxate
Pedro 12 anos masculino 6ª série engraxate
Rafael 15 anos masculino 7ª série engraxate
Roberto 12 anos masculino 4ª série engraxate
92

FIGURA 6 – Quadro de influências musicais II


Aluno Familiar Ouve Gosta de Freqüenta Qual gênero
estuda/estudou música? cantar? salas de musical
música? concerto? preferido?
Daniel não sim sim sim sertaneja
Gabriel não sim às vezes não pop e todas
Júnior não - sim sim todas
Josimar não sim sim sim rap, sertaneja
e romântica
João sim/irmão sim sim não samba
Luiz não não sim não axé e rap
Pedro não sim sim não rap e
sertaneja
Rafael sim não sim não caipira e
sertaneja
Roberto sim/irmão não não não sertaneja e
funk

FIGURA 7 – Quadro sobre a Oficina de Ensino Coletivo de Cordas II


Aluno Como Qual o A A carga Gosta de Como
soube da instrumento? metodologia horária é apresentar prefere
Oficina? de ensino é a ideal? em tocar?
eficiente? público?
Daniel CEACA violino sim não sim em grupo
Gabriel CEACA violino sim não sim em grupo
Júnior CEACA violino sim não sim em grupo
Josimar CEACA violoncelo sim sim sim sozinho
João CEACA contrabaixo sim sim não em grupo
Luiz CEACA viola - não sim em grupo
Pedro CEACA violino sim sim sim em grupo
Rafael CEACA violino sim não sim qualquer
tipo
Roberto CEACA viola sim sim sim em grupo
93

5.3.3. Análise do perfil dos grupos e dos sujeitos

Passa-se a analisar os dados expostos via tabelas. Primeiramente, constatou-se


que a faixa etária dos sujeitos do GRUPO COMUNIDADE é de 13 a 46 anos, enquanto a
dos sujeitos do grupo CEACA é de 12 a 17 anos. Outra variável analisada foi sexo.
Verificou-se que 50% dos sujeitos, do grupo COMUNIDADE são do sexo masculino e a
outra metade, do sexo feminino. Já no grupo CEACA, 100% dos sujeitos são do sexo
masculino. Sobre o grau de escolaridade dos sujeitos, foram detectados os seguintes
resultados: no grupo COMUNIDADE, dois (2) sujeitos encontram-se na 6ª série; dois (2),
na 7ª série; um (1), na 8ª série; um (1) no 2º ano/2º Grau; dois (2), terminaram o 2º Grau;
um (1), está cursando o 2º ano de Licenciatura em Educação Musical; e um (1), terminou
o curso superior de Direito. No grupo CEACA, cinco (5) sujeitos encontram-se na 4ª série;
dois (2), na 5ª série; um (1), na 6ª série; e um (1), na 7ª série.
Foi observado nos questionários dos sujeitos do grupo CEACA, que três (3)
pararam de estudar. A próxima variável analisada foi a que se referiu à profissão
(ocupação) dos sujeitos. No grupo COMUNIDADE, sete (7) sujeitos são estudantes, sendo
que os outros três (3) sujeitos trabalham como advogado, auxiliar de produção e professor
de música. No grupo CEACA, oito (8) sujeitos são engraxates, sendo que um (1) é vigia de
carros.
Sobre as influências musicais dos sujeitos, perguntou-se aos sujeitos se
algum membro de sua família estudou ou estudava música. No grupo COMUNIDADE,
70% dos sujeitos responderam afirmativamente, citaram pais, irmãos, tios, primos e avós
que estudaram música; e, 30%, responderam negativamente. Já no grupo CEACA, 66,6%
dos sujeitos responderam de maneira negativa; e, apenas 33,3% responderam de maneira
afirmativa. Outra questão refere-se o ouvir música com freqüência. No grupo
COMUNIDADE, 80% dos sujeitos responderam de maneira afirmativa e, 20%, de maneira
negativa. Por sua vez, 55,5% dos sujeitos do grupo CEACA responderam afirmativamente;
33,3%, negativamente e, 11,1%, não responderam. Outra variável relaciona-se ao gostar
de cantar. No grupo COMUNIDADE, 80% dos sujeitos responderam “sim”, 10%
responderam “não” e 10% não souberam responder. No grupo CEACA, 77,7% dos
sujeitos responderam “sim”, 11,1% responderam “não” e 11,1% responderam que “às
vezes” gostavam de cantar. Sobre a freqüência nas salas de concerto, 50% dos sujeitos
do grupo COMUNIDADE responderam “sim”, 30% responderam “às vezes” e 20%
94

responderam “não”. Já no grupo CEACA, 66,6% responderam de maneira negativa e


33,3% responderam de maneira afirmativa. Sobre o gênero musical preferido, os sujeitos
do grupo COMUNIDADE citaram: clássico, axé, jazz, rock, pop, rap, gothic, metal, rock
nacional, MPB, e gospel. Já os sujeitos do grupo CEACA citaram: sertaneja, pop, rap,
música romântica, samba, axé, caipira e funk.
Sobre a Oficina de Cordas fez-se alguns questionamentos. Primeiramente,
perguntou-se como se soube da Oficina de Cordas. No grupo COMUNIDADE, 50% dos
sujeitos responderam que souberam da Oficina de Cordas por um (a) amigo (a), 20%
responderam que foi através de matéria veiculada no jornal, 10% responderam que foi
através de um aluno veterano, 10% responderam que foi através de cartaz de divulgação da
Oficina de Cordas (vide Anexo 6) e 10% responderam que foi através da irmã. Já no grupo
CEACA, 100% dos sujeitos responderam que souberam da Oficina de Cordas no CEACA.
Sobre a escolha do instrumento, 60% dos sujeitos do grupo COMUNIDADE escolheram
o violino; 20%, violoncelo; 10%, viola e 10%, contrabaixo. Necessário se faz relatar que
20% dos sujeitos (dois alunos) estudavam um outro instrumento em outro grupo da Oficina
de Cordas. No grupo CEACA, 55,5% dos sujeitos escolheu violino; 22,2%, viola; 11,1%,
violoncelo e 11,1%, contrabaixo. Sobre a eficiência metodologia de ensino coletivo de
cordas, 100% dos sujeitos do grupo COMUNIDADE responderam de maneira afirmativa.
No grupo CEACA, 88% responderam afirmativamente e 11,1% (um aluno), não
responderam. Sobre se carga horária era ideal, 80% dos sujeitos do grupo
COMUNIDADE responderam “sim”, 10% não souberam responder e 10% responderam
“não”. Já os sujeitos do grupo CEACA, 66,6% responderam “não” e 33,3% responderam
“sim”. Todos sujeitos que responderam à questão de maneira negativa, gostariam que a
Oficina de Cordas tivesse carga horária maior. Sobre o gostar de apresentar em público,
90% dos sujeitos do grupo COMUNIDADE responderam de maneira afirmativa, e 10%,
de maneira negativa. Já 88,8% dos sujeitos do grupo CEACA responderam de maneira
afirmativa, e 11,1%, de maneira negativa. Por fim, perguntou-se de que maneira preferia-
se apresentar: sozinho ou em grupo. No grupo COMUNIDADE, 70% responderam “em
grupo”, 20% responderam “em ambos”, 10% responderam “sozinho”. No grupo CEACA,
77,77% responderam “em grupo”, 11,1% responderam “sozinho”, e 11,1% responderam
“qualquer tipo”.
95

5.4. INTERVENÇÕES/AULAS

Seguindo os preceitos da pesquisa-ação (BARBIER,1997), pressupôs-se que


o pesquisador é parte integrante da pesquisa, não havendo possibilidade de manter-se
distante ou neutro. Partiu-se do princípio de que a pesquisa-ação orienta-se em torno de
uma participação crescente das populações envolvidas e que o pesquisador exerce o papel
de interventor, de um agente de mudança. Nessa pesquisa, interferiu-se e intermediou-se
sempre, provocando mudanças e transformações na população pesquisada através de suas
intervenções diárias junto aos grupos. A partir desse preceito, denominou-se cada aula de
intervenção/aula, já que o pesquisador seria o agente condutor do processo: agindo,
refletindo e interferindo constantemente, em busca de mudanças.
As Intervenções/Aulas ocorreram no período de agosto a dezembro de 2002,
na Escola de Música e Artes Cênicas da Universidade Federal de Goiás, na Praça
Universitária, Campus I. As intervenções/aula ocorreram no auditório da referida
instituição, onde sempre se manteve a porta aberta para que quisesse ir e vir: observar,
assistir um pouco da aula, interagir de alguma forma com aquela proposta. Portanto, a sala
de aula era o auditório (que foi construído como uma espécie de teatro de arena coberto). O
ambiente era dotado de cadeiras (todas móveis), um quadro negro (também móvel) e um
piano. Os instrumentos da Escola eram guardados (trancados) em uma sala especial. Todo
dia de aula, o primeiro grupo ajudava a levar os instrumentos para a sala de aula e o último
grupo ajudava a retornar os instrumentos para o local de depósito. Ao todo, a EMAC/UFG
dispõe de catorze (14) instrumentos para a Oficina de Cordas: sete (7) violinos, quatro (4)
violas, dois (2) violoncelos e um (1) contrabaixo. O curso tem duração prevista de três (3)
a quatro (4) semestres. No primeiro semestre, os alunos dos grupos experimentais não
possuíam instrumento, portanto, só se tocava (estudava) na sala de aula. Isso foi possível a
partir do conceito Estudo Dirigido (vide p.48). Outro dado, se refere à disposição dos
sujeitos em sala de aula. Os alunos ficavam posicionados em semicírculos e o
professor/regente (no caso específico, a professora/pesquisadora) ficava na frente dos
alunos, na condução das atividades como um regente. O professor/assistente circulava pela
sala, auxiliando os alunos e fazendo a Assistência Manual (vide p.49). Como se percebe,
desde o primeiro contato, a disposição da sala era semelhante à de uma orquestra.
Durante a aplicação da metodologia sistematizada por GALINDO (2000),
percebeu-se que as intervenções/aulas possuíam na sua estrutura, diferentes momentos.
96

Alguns ocorriam durante as intervenções/aulas, com mais freqüência, outros foram criados
a partir das necessidades de cada grupo. Portanto, após o primeiro encontro com os
sujeitos, as Intervenções/Aulas foram estruturadas da seguinte maneira: 1) Momento
Inicial , que foi o momento de organização da sala (disposição das cadeiras e estantes de
música), de afinação dos instrumentos e de ambientação dos alunos; 2) Momento Revisão,
que foi o momento de revisão do conteúdo da aula anterior; 3) Momento Conteúdo Novo,
que foi o momento de introdução do(s) conteúdo(s) novo(s); 4) Momento Finalizador,
que foi o momento de finalização da intervenção/aula, apresentando algum conteúdo novo
como forma de antecipar o que ocorreria na próxima aula; ou apenas finalizando a mesma
através da exposição de qual seria o conteúdo programado para a próxima
intervenção/aula.
Em determinado momento do semestre letivo, os conteúdos novos foram
esgotados, seguindo o Planejamento Semestral. O Momento Revisão e o Momento
Conteúdo Novo deram lugar ao Momento Fixação e Amadurecimento. A introdução
desse momento, se deu a partir da necessidade de fixar os conteúdos que já tinham sido
dados anteriormente, com objetivo de amadurecimento técnico-musical dos sujeitos do
grupo. Eventualmente, ocorreu o Momento Relaxamento, principalmente com os sujeitos
do grupo CEACA, que foi caracterizado pela prática de exercícios com objetivo de relaxar
os sujeitos dos grupos (aliviar às tensões extras), trabalhando-se o alongamento muscular e
as articulações de todo o corpo. Buscou-se, da mesma forma, trabalhar-se nesse momento,
a consciência corporal34, coordenação motora, concentração e o despertar da afetividade,
modificando a auto-estima. No final do semestre, surgiu o Momento Ensaio, as
intervenções/aulas finais, com o objetivo de preparar os sujeitos para os recitais finais
(ênfase ao repertório).
Segue-se a descrição de cada intervenção/aula, abordando o conteúdo musical
dado, o processo de desenvolvimento do ensino-aprendizagem e relações interpessoais e
sociais de cada grupo, através da iniciação instrumental de cordas, pela metodologia do
ensino coletivo.

34
A autora define ser consciência corporal, o entendimento (a consciência) de que os movimentos corretos
(naturais) do corpo auxiliam de maneira bastante positiva na prática musical (e o bem-estar do ser humano).
Por isso, através de exercícios físicos, buscou-se a postura correta (e pessoal) em cada sujeito,
desenvolvendo mudanças de hábitos e atitudes, a partir do conhecimento (conscientização) do (seu) corpo.
97

5.4.1. Intervenções/Aulas do grupo COMUNIDADE

As intervenções/aulas do grupo COMUNIDADE ocorreram do dia 21 de


agosto a 29 de novembro de 2002, no Auditório da EMAC/UFG, Praça Universitária
(Campus I), totalizando vinte e oito (28) intervenções/aulas. O horário estabelecido foi o
seguinte: toda quarta e sexta-feira, das 19 às 20 h, totalizando duas (2) horas semanais, a
partir da 5ª intervenção/aula, já que antes a carga horária era de três horas semanais. A
diminuição da carga horária se deu por questões financeiras35. Na primeira semana de
dezembro, ocorreram os ensaios e recitais finais.

FIGURA 8 - 1ª Intervenção/Aula: 21.08.02

Momento Inicial: Ambientação dos alunos, afinação dos instrumentos e organização da


sala.
Momento Conteúdo Novo: Explicação sobre o curso e metodologia aplicada (ensino
coletivo); Nomenclatura das partes de cada instrumentos; Desenvolvimento Histórico de
cada instrumento (Noções Básicas); Manuseio e Conservação dos instrumentos;
Exploração sonora dos instrumentos em pizzicato; Trabalho com parâmetros sonoros de
duração (longo, curto), altura (grave, agudo) e intensidade (forte, fraco); Trabalho com a
pulsação.
Momento Finalizador: Expôs-se os conteúdos e objetivos da próxima intervenção/aula.

Comentário: Nessa intervenção/aula inaugural, primeiramente ocorreu uma breve


apresentação dos professores responsáveis, seguidos de cada sujeito do grupo. Após esse
início, explicou-se como o curso foi estruturado e como seria feito o trabalho semestral a
partir da metodologia de ensino coletivo. Os quatro instrumentos de arco (violino, viola,
violoncelo e contrabaixo) foram apresentados juntamente com um breve histórico sobre a
evolução dos mesmos. Também foram destacados alguns aspectos primários da
construção, manuseio e conservação dos instrumentos, bem como a nomenclatura de cada
parte dos instrumentos. Após essa fase, trabalhou-se os primeiros exercícios, sem leitura,
com o objetivo de apresentar as cordas soltas dos instrumentos, já sendo iniciadas algumas
noções dos parâmetros sonoros de altura e duração do som. Buscou-se trabalhar também, a
pulsação. A intervenção/aula foi positiva. Os alunos mantiveram-se concentrados,
comportando-se bem.

35
Os grupos que possuem menos de doze (12) alunos tem carga horária de duas (2) horas semanais, já os que
possuem mais de doze (12) alunos tem carga horária de três (3) horas semanais.
98

FIGURA 9 - 2ª Intervenção/Aula: 23.08.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização das estantes, distribuição dos
livros e dos instrumentos e a chamada.
Momento Revisão: conteúdo da aula anterior.

Comentário: Nesse segundo encontro, teve-se a presença de alguns alunos que não
estiveram presentes na primeira intervenção/aula. Com isso, trabalhou-se o mesmo
conteúdo afim de que todos pudessem compreender o que fora trabalhado anteriormente.

FIGURA 10 - 3ª Intervenção/Aula: 28.08.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Nomenclatura das partes de cada instrumentos; desenvolvimento
histórico, manuseio e conservação de cada instrumento; exercícios em pizzicato, sem
leitura explorando as cordas soltas dos instrumentos e os parâmetros sonoros de altura e
duração. 1) LA 4 RE 4 LA 2 LA 2 RE 4 2) RE 4 SOL 4 RE 1 RE 1 RE 1 RE 1
SOL 4  3) LA 4 RE 4 LA 2 LA 2 RE 4 RE 4 SOL 4 4) LA 4 RE 1 RE 1 RE 1
RE1 SOL 4 
Momento Conteúdo Novo: Apostila: Exercícios da série “Contando” (1ª Parte: Exercícios
1-6; 2ª Parte: Exercícios 1-5; e 3ª Parte: Exercícios 1-5). Introdução das notas musicais
(som), da pausa (silêncio), da barra de compasso, da barra dupla e do rittornello. Trabalho
com os compassos binário, ternário e quaternário; e com as figuras musicais, semibreve,
mínima, mínima pontuada, semínima e suas respectivas pausas (ainda de maneira
implícita, sem conceitos teóricos e a leitura musical tradicional).
Momento Finalizador: Introdução à leitura musical: Noções teóricas. Novos conceitos:
pauta ou pentagrama, claves (sol, do e fá), relação da altura do som à localização da nota
na pauta e em relação à clave. Transição da notação: a nota de 4 (quatro) segundos se
transforma em semibreve, a de 2 (dois) segundos se transforma em mínima e por fim, a de
1 (um) segundo se transforma em semínima. É introduzido o compasso quaternário.
Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 1 e 2).

Comentário: Esta foi a primeira Intervenção/aula filmada. Os alunos de violino e viola


ficavam na posição de “cavaquinho”. Primeiramente, pediu-se para o grupo solfejar a
seqüência, depois executá-la no instrumento. A seqüência foi repetida várias vezes, ora
pelo grupo todo, ora por duos, trios e/ou quartetos. Após os alunos terem dominado o
conhecimento de todas as cordas soltas, fazendo os exercícios na pulsação correta e
observando os valores das figuras musicais (ainda implícitas), foi introduzida a leitura,
através da escrita esquemática (vide p.56). A partir deste momento, os alunos passaram a
acompanhar os exercícios através de uma apostila36. Trabalhou-se a concentração,
memorização, ritmo, pulsação, movimentos corporais. Foi explicado aos alunos, o conceito
36
Galindo sistematizou a apostila do professor e a apostila do aluno.
99

de pulso/pulsação e a importância de se tocar em conjunto. Para tanto, a


professora/pesquisadora explicou a importância da regência. Para que os alunos pudessem
compreender melhor como tocar no exato momento e de forma conjunta, foram usadas as
seguintes comparações: uma bola quicando (para que os alunos compreendessem a hora
exata de se tocar, deu-se como exemplo uma bola quicando, quando a mesma chega ao
chão é o momento de ferir a corda) e o nado sincronizado (esporte coletivo que necessita
de sincronismo e entrosamento perfeito dos participantes). Explicou-se o por quê de uma
postura correta ao sentar-se e o por quê do posicionamento do instrumento junto ao corpo.
No decorrer do semestre, sempre foi pedido para que o aluno transferisse o peso do seu
corpo um pouco para frente, mantendo a coluna ereta e os ombros e braços relaxados. Para
tanto, foi necessário fazer um trabalho de consciência corporal, demonstrando o
posicionamento correto do corpo, pontos de apoio e questões de transferência de peso. Para
que os alunos compreendessem a maneira correta de posicionar-se, fez-se uma comparação
dos movimentos peculiares do dia a dia, do cotidiano dos alunos37, com os movimentos
específicos pedidos na execução dos instrumentos. Os exercícios foram iniciados de
maneira lenta, aumentando o andamento gradativamente. Buscou-se a participação dos
alunos, a partir de perguntas que despertassem o interesse dos mesmos, proporcionando
uma participação efetiva na intervenção/aula. Uma boa estratégia, utilizada com o intuito
de aumentar a participação dos alunos, foi perguntar qual a diferença existente em cada
exercício, chamando a atenção dos alunos para algo novo, desconhecido. Ao invés de,
simplesmente, introduzir o conteúdo novo de maneira expositiva, buscou-se trabalhar a
dedução lógica dos alunos, contribuindo para a assimilação e acomodação do
conhecimento abordado. Um ponto a ser comentado, se refere à maneira como a
professora/pesquisadora incentivou o grupo, com pequenos comentários ou mesmo pela
entonação de voz: “Muito Bem!”, “Estou gostando!”, “Pode ser mais juntinho!”. Uma
estratégia interessante, referiu-se à condução da aula: a cada novo exercício, explicou-se o
seu objetivo e a sua justificativa, ou seja, o que era, o que se queria e para que serviria tal
tarefa, demonstrando a seriedade e a importância de cada exercício. Destacou-se, de
maneira enfática, a importância do estar em grupo, do tocar em conjunto, de observar o
colega (enxergando o outro e seu espaço, bem como, enxergando a si mesmo dentro do
grupo). Outra estratégia a ser destacada, foi demonstrar aos alunos que a pulsação do grupo

37
O posicionamento dos alunos ao andarem, ao sentarem, comparações com a dança (balé) ou com algum
esporte.
100

era diferente da pulsação individual de cada um, daí a importância de observar o que estava
sendo proposto ao grupo, através da regência.

FIGURA 11 - 4ª Intervenção/Aula: 30.08.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Exercícios com as cordas lá, ré e sol (em pizzicato, sem leitura);
Apostila: “Contando” (1ª Parte: Exercícios 1-6; 2ª Parte: Exercícios 1-5; e 3ª Parte:
Exercícios 1-5); “Na Pauta” (Exercícios 1e 2).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (Exercício 3).
Momento Finalizador: Objetivos da próxima Intervenção/Aula.

Comentário: A intervenção/aula foi registrada apenas no início da aula, não havendo


condição de ser descrita e analisada.

FIGURA 12 - 5ª Intervenção/Aula: 04.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila: “Contando” (2ª Parte, 1-5 e 3ª Parte, 1-5); “Na Pauta” (1ª
Parte, Exercícios 1 e 2) – Revisão sobre os conceitos de pauta, claves, compasso, barra de
compasso, figuras musicais (semibreve, mínima e semínima), parâmetros sonoros de altura
(grave-agudo) e localização das cordas soltas lá, ré e sol na pauta, nas respectivas claves de
cada instrumento.
Momento Conteúdo Novo: Introdução da grafia e leitura da pausa da mínima e da figura
semínima. Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 3, 4 e 5; 2ª Parte, Exercícios 1-3).
Momento Finalizador: Objetivos da próxima Intervenção/aula.
Obs: A partir desta, carga horária da intervenção/aula é de 1 hora (nas anteriores a carga
horária era de 1 hora e 30 minutos).

Comentário: A intervenção/aula foi iniciada com explicações sobre postura e relaxamento


(como se sentar da melhor maneira e como posicionar os instrumentos corretamente).
Nesta aula, os alunos de violino e viola passaram da posição de “cavaquinho” para a
posição tradicional do instrumento. A assistência manual foi utilizada sempre que
necessário, para que cada aluno encontrasse a sua melhor postura e relaxamento. Foi
destacada a importância de sempre se observar à regência. Os alunos foram levados a
observar como estava a pulsação do grupo, despertando para uma maior consciência
grupal. Antes de cada exercício ser executado, realizou-se à leitura a primeira vista, através
do solfejo ou da leitura métrica. Observou-se nesta fase, que a maioria dos alunos deste
grupo teve dificuldade de executar as pausas (uns simplesmente as ignoravam, passando
para a nota seguinte, outros não respeitavam a sua duração total). Algumas vezes, quando o
101

grupo não executava o exercício de maneira satisfatória, a professora/pesquisadora


perguntava: “o que aconteceu?”, antes de dar o seu parecer. Com isso, os alunos foram
estimulados a se auto-analisarem e analisarem o grupo, desenvolvendo o senso crítico e a
independência.

FIGURA 13 - 6ª Intervenção/Aula: 06.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: “Apostila”: Na Pauta (1ª Parte, Exercícios 1-5; 2ª Parte, Exercícios 1-
3).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (2ª Parte, Exercícios 4 e 5; 3ª Parte,
Exercícios 1 e 2).
Momento Finalizador: Exposição dos conteúdos e objetivos da próxima Intervenção/aula.

Comentário: Como já foi mencionado, nunca se explicou um símbolo ou um conceito de


maneira teórica e abstrata. Por exemplo, quando um símbolo como a pausa da semínima
foi introduzida, chamou-se a atenção do grupo para esse aspecto diferente do exercício ou
simplesmente perguntou-se: “O que é essa cobrinha aí?”. Alguns já responderam
confiantes: “É uma pausa. É a pausa da semínima!”. Com o objetivo de reafirmar o
conteúdo dado, perguntou-se: “E nesse compasso, a pausa da semínima vale quanto?”. E
o grupo respondeu: “Vale um!”. Ou ainda, perguntou-se: “Que tijolinho é esse aí?”. O
grupo respondeu: “É uma pausa!”. Buscando-se estimular ainda mais a participação dos
alunos, perguntou-se: “Ele está sozinho no compasso?”. A partir do raciocínio dedutivo,
responderam: “É a pausa da semibreve!”. Dessa maneira, o grupo manteve o interesse na
aula, sendo os alunos estimulados a terem um raciocínio lógico-dedutivo, participando
ativamente da aula, mantendo um clima favorável ao ensino-aprendizagem. Em todas as
aulas, os exercícios começavam de maneira lenta e gradativamente o andamento ia sendo
aumentado. Conforme já foi explicitado, os aspectos referentes à postura e relaxamento
foram lembrados de maneira constante. Quando necessário, fez-se o uso da assistência
manual. Quando o exercício novo era considerado difícil, fez-se uma leitura à 1ª vista
através do solfejo ou de leitura métrica.
102

FIGURA 14 - 7ª Intervenção/Aula: 11.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: “Na Pauta” (1ª e 2ª Parte: Exercícios 1-4; 3ª Parte: Exercícios 1 e 2).
Momento Conteúdo Novo: “Na Pauta” (3ª Parte, Exercício 3).
Momento Finalizador: Exposição do conteúdo e objetivos da próxima Intervenção/aula.

Comentário: Iniciou-se a intervenção/aula com uma explanação minuciosa sobre a postura


e o posicionamento de cada instrumento. A professora/pesquisadora estimulou os alunos a
enxergarem no outro (colega) o quê estava certo e o que estava errado na postura,
chamando a atenção de todos para as diferenças e particularidades da postura de cada
indivíduo. Neste momento, foi feita a assistência manual em cada aluno. Em um outro
momento, um aluno teve dúvida sobre a leitura das notas musicais. Então, decidiu-se fazer
uma revisão de todas as notas aprendidas até o momento. Foram feitas, ainda, observações
sobre como manter o pulso, sendo comentada a tendência da maioria das pessoas de ir
acelerando a pulsação no decorrer do exercício e/ou trecho musical. Outra questão
abordada, foi à importância da aula e dos ensaios, no resultado musical, nas apresentações
públicas. Foi exposto que a mesma conduta que se tem dentro de sala ou no estudo
individual é transferida para o palco, daí a importância de sempre estudar e praticar de
maneira adequada. Foram também abordadas questões referentes à acústica, ambiente e
paisagem sonora da sala de aula. Apontou-se para a necessidade de se ter ensaios nos
auditórios e salas de concertos antes das apresentações públicas, para que os intérpretes
pudessem se ambientar melhor e conseqüentemente, não prejudicar a sua performance.

FIGURA 15 - 8ª Intervenção/Aula: 13.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala.


Momento Relaxamento: Introdução do relaxamento com o objetivo de melhor
ambientação, descontração da musculatura (consciência corporal) e concentração do aluno.
Foram feitos exercícios movimentando os braços, ombros, pescoços, pernas. Foi feito um
trabalho de conscientização da postura da coluna vertebral, a partir de exercícios de
transferência de peso.
Momento Revisão: Apostila: “Na Pauta” (2ª Parte, Exercícios 1-4; 3ª Parte, Exercícios 1-
2).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (3ª Parte, Exercícios 3-5) – Introdução do
ponto de aumento. “Dedos” (Exercício 1). Introdução da mão esquerda, notas mi, fá# e sol.
Trabalho de percepção mais acentuado.
Momento Finalizador: O encerramento ocorreu com a exposição do conteúdo e objetivos
da próxima intervenção/aula.
103

Comentário: Nessa intervenção/aula foi observada uma melhora sensível dos alunos em
relação à pulsação, as pausas e a leitura musical. O grupo estava mais harmônico e
concentrado. Em conseqüência disso, os exercícios foram tocados, de maneira mais nítida
e sincronizada. Um momento interessante a ser destacado, foi introduzir o conceito de
ponto de aumento. Quando a professora/pesquisadora explicava que o valor do ponto de
aumento estava ligado ao valor da nota, um aluno sugeriu como recurso pedagógico, a
comparação metafórica do ponto de aumento ao juro matemático. “O ponto de aumento é
igual ao juro”, disse o aluno ao expor que quanto maior o valor monetário, maior será o
valor dos juros cobrados. Ao ser introduzida a mão esquerda, intensificou-se o trabalho de
percepção dos intervalos. Primeiramente, a professora/pesquisadora tocou várias vezes no
piano o intervalo re-mi (segunda maior) e pediu para os alunos escutarem; em seguida foi
pedido que os alunos cantassem o intervalo mencionado; por fim, foi pedido aos alunos
que achassem o mi, na corda ré de cada instrumento. Após a execução da nota mi, foi
trabalhado o processo de transporte da nota para a pauta (Teoria Aplicada). Foi
demonstrada a localização do mi em cada clave, para todos os alunos no quadro negro. Em
seguida, foram explicadas as noções de linha e espaço na pauta, de acordo com a seqüência
das notas. Neste momento, perguntou-se para cada aluno individualmente qual era a nota
demonstrada. Após a introdução da nota mi, introduziu-se as notas fá# e sol. Uma série de
exercícios curtos foi criada, a partir desses intervalos (em graus conjuntos, tanto
ascendentes quanto descendentes). Porém, não se introduziu a leitura musical, apenas
solfejou-se e executou-se no instrumento. Um comentário importante a ser feito, se refere
à introdução do fá#. Neste momento, não foi explicado o que significava o sustenido por se
caracterizar excesso de informação ao aluno. Explicou-se apenas que o nome do símbolo é
sustenido e que no momento certo, voltar-se-ia à questão.

FIGURA 16 - 9ª Intervenção/Aula: 18.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila: “Dedos” (Exercício 1). Trabalho de percepção, solfejo e
afinação.
Momento Conteúdo Novo: Explicou-se o conceito de tom, semitom e intervalo. Foram
introduzidas as notas si, dó# e ré (mão esquerda). Apostila: “Dedos” (Exercício 2-3).
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula falando sobre o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.
104

Comentário: Os exercícios foram constantes e intensos, sendo feitos um na seqüência do


outro, sem parar, objetivando-se a manutenção da concentração do grupo e
conseqüentemente, uma maior precisão na afinação. A afinação do grupo melhorou
consideravelmente, sendo motivo de constantes elogios por parte da
professora/pesquisadora. O trabalho de percepção foi iniciado. Chamou-se a atenção do
grupo para a estrutura da escala de DO M, a relação entre os intervalos, conceituando-se
intervalo, tom e semitom. Para a melhor compreensão pelos alunos, o trabalho de
percepção foi feito com as escalas de DO M e de RE M, trabalhando-se a escuta e o
solfejo. Introduziu-se, na pauta, o fá# e o sol. Antes de introduzir o si, o dó# e o ré,
trabalhou-se os intervalos da mesma forma do modelo anterior: passou-se pelo processo
de escuta, solfejo e execução instrumental do intervalo lá-si. O mesmo foi feito com a
seqüência lá, si e dó# e depois lá,si, dó# e ré. Alguns exercícios com escala de RE M foram
feitos, sem leitura. Trabalhou-se a escala em pequenos trechos, com o intuito de melhorar a
afinação, sendo feita assistência manual. Nessa aula, foi demonstrado, com mais detalhes,
o posicionamento da mão esquerda e braço esquerdo do violoncelo. Foi falado sobre a
tessitura dos instrumentos e da voz humana.

FIGURA 17 - 10ª Intervenção/Aula: 20.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila: “Dedos” (Exercício 1-3).
Momento Conteúdo Novo: Apostila : Dedos (Exercícios 4-6), Escala de RE M (Exercício
1-3). Introdução do arco.
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula falando sobre o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.

Comentário: Nessa intervenção/aula, revisou-se os conteúdos relacionados com o


posicionamento dos dedos e da mão esquerda, afinação e leitura musical. O Momento
Revisão ocorreu de maneira detalhada, tomando grande parte do tempo. Após a execução
de todos os exercícios da apostila referentes à mão esquerda e à escala de RE M, em
pizzicato, decidiu-se pela introdução do arco através do processo de escolha democrática.
Faltando aproximadamente vinte (20) minutos para o término da intervenção/aula, a
professora/pesquisadora perguntou ao grupo, se gostariam de tocar a primeira peça
folclórica, em pizzicato, ou de iniciar o trabalho com o arco. A segunda proposta foi
vencedora, de maneira unânime. O trabalho foi iniciado através da exposição dos aspectos
105

relacionados ao arco (suas partes, nomenclatura e mecanismo de funcionamento) e com a


demonstração de como manuseá-lo. Demonstrou-se a maneira como se segura o arco.
Adotou-se para o contrabaixo, o modelo alemão 38. Após as primeiras explicações sobre o
arco e seu manuseio, foi proposto aos alunos, que tocassem aleatoriamente notas longas
nas cordas soltas, de maneira lenta, observando o posicionamento correto. Depois, foram
executados alguns exercícios com cordas soltas até o encerramento da aula. Um fato
interessante, se fez notar, quanto ao aluno Antônio. O aluno conseguiu tocar com o arco,
de maneira afinada, o tema da “9ª Sinfonia” de L.V. Beethoven, com apenas três (3) aulas
tocando violoncelo. O aluno já estudava outro instrumento na Oficina de Cordas, há dois
(2) semestres, o violino.

FIGURA 18 - 11ª Intervenção/Aula: 25.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Trabalho com o arco: posicionamento de como se sentar, como segurar
o instrumento e o arco. Apostila: “Dedos” (Exercícios 1-6 em pizzicato).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 1-3 com o arco).
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula falando sobre o conteúdo e objetivos da próxima
Intervenção/aula.

Comentário: Fez-se uma revisão detalhada sobre o posicionamento de como se sentar,


como segurar o instrumento e o arco. O professor/assistente explicou de maneira detalhista
como funciona o mecanismo de ataque do arco, sendo feito um trabalho intenso, a partir
das cordas soltas. A assistência manual foi feita em cada aluno. Na revisão do trabalho
com a mão esquerda, em pizzicato, a afinação esteve ótima, num processo de franco
desenvolvimento. Os exercícios foram feitos de maneira mais rápida, com pausas curtas
entre um e outro, às vezes, sem parar. A sonoridade e o pulso melhoraram de forma
acentuada. Um aspecto relevante, se referiu à boa assimilação sobre o posicionamento do
arco. Nesta intervenção/aula, mesclou-se o trabalho de arco e pizzicato, como forma de não
cansar os alunos, até que adquirissem resistência de tocar mais tempo com o arco.

FIGURA 19 - 12ª Intervenção/Aula: 27.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila : “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 1-3 com o arco).
38
A adoção do arco modelo alemão para o contrabaixo, deveu-se ao fato de que a professora que ocupa a
cadeira do instrumento no curso superior, Prof. Drª Sônia Ray, utiliza o referido modelo e oferece consultoria
para Oficina de Cordas.
106

Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 4 e 5; 2ª Parte,
Exercícios 1-5; 3ª Parte, Exercícios 1 e 2; “Dedos” (Exercícios 1- 3, com o arco).
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula falando sobre o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.

Comentário: Explicações sobre o mecanismo do arco e postura corporal. Ênfase no


trabalho de arcada. A dinâmica da aula foi dada através de exercícios, ora feitos pelo
grupo todo, ora individualmente, na tentativa de corrigir os erros de cada aluno. A
assistência manual foi feita visando a correção da postura.

FIGURA 20 - 13ª Intervenção/Aula: 02.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Exercícios sem leitura para mão esquerda.1) RE 2 MI 2 RE 2 MI 2
RE 4 2) RE 2 MI 2  FA# 2 MI 2 RE 4 3) RE 2 MI 2 FA# 2 SOL2 FA#2 MI 2 
RE 4 Apostila : “Dedos” (Exercícios 1-3).
Momento Conteúdo Novo: Exercícios sem leitura com a mão esquerda.
1) LA 2 SI 2  LA 2 SI 2 LA 4  2) LA 2 SI 2  DÓ# 2 SI 2 LA 2 P 2 3) LA 2 SI 2
 DÓ# 2 RE 2 DÓ# 2 SI 2  LA 2 P 2 Apostila: “Dedos” (Exercícios 4-6 com o arco);
Escala de REM ascendente e descendente (Exercícios 1-2).
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula falando sobre o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.

Comentário: A afinação estava em um nível bom. Foram comentadas questões para a


melhora da sonoridade, tais como, a construção do instrumento, as madeiras utilizadas, a
arcada, a importância do breu. Os exercícios foram executados de maneira mais rápida,
com pequenos intervalos entre um e outro. A intervenção/aula foi bastante produtiva
devido à concentração e ao desenvolvimento técnico-musical dos alunos.

FIGURA 21 - 14ª Intervenção/Aula: 04.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos e organização da sala.


Momento Revisão: Exercícios Técnicos com o arco, sem leitura.
Obs: Faltou a energia na escola, impossibilitando a filmagem e o trabalho de leitura.

Comentário: Realizou-se uma grande revisão. Exercitou-se o arco, com o objetivo de


melhorar a afinação e a sonoridade. Faltou energia e a intervenção/aula foi dada à meia luz,
onde os alunos puderam se concentrar apenas na sua relação com o instrumento,
trabalhando a percepção auditiva e a técnica instrumental. Foram trabalhados exercícios
com as cordas soltas e com a escala de RE M e variações. Uma excelente intervenção/aula.
107

FIGURA 22 - 15ª Intervenção/Aula: 09.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila: Escala em RE M (Exercícios 1 e 2).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: Escala em RE M (Exercício 3); 1ª Peça: “Brilha,
Brilha a estrelinha” – Peça tradicional norte-americana.
Momento Finalizador: Encerrou-se a aula expondo o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.

Comentário: A aula foi iniciada com exercícios técnicos com a escala de RE M. Foi
necessário trabalhar-se de maneira mais específica a arcada. Com isso, foram propostos
exercícios com cordas soltas, trabalhando-se os mecanismos de ataque do arco. Pediu-se
para os alunos colocarem mais peso no arco, com o objetivo de melhorarem a sonoridade,
explorando notas longas e curtas (duração do som), forte e fraco, crescendo e diminuindo
do arco (intensidade do som). Após os trabalhos técnicos com o arco, foi introduzida a 1ª
peça musical “Brilha, Brilha Estrelinha”. A peça foi lida por partes. Fez-se o solfejo, antes
da execução instrumental. Foram discutidas noções sobre frase e forma musical.

FIGURA 23 - 16ª Intervenção/Aula: 11.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Escala em RE M (sem leitura); Apostila : Brilha, Brilha Estrelinha.
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Frère Jacques” – Folclore Francês
Momento Finalizador: Encerrou-se a intervenção-aula expondo o planejamento da
seguinte.

Comentário: A aula foi iniciada com a Escala de RE M visando fixar os conteúdos


técnicos passados anteriormente. Para que os alunos direcionassem a atenção aos
movimentos corporais e à sonoridade produzida (otimização da afinação), foi dispensada a
leitura musical. Da mesma forma, com essa atividade, os alunos que não ainda haviam
memorizado a digitação da escala de RE M no instrumento, tiveram que fazê-lo. Após os
estudos técnicos, passou-se a trabalhar o repertório. Primeiramente, a peça “Brilha, Brilha
Estrelinha” foi estudada, sendo explorada a dinâmica pedida em cada frase. Para que a
dinâmica fosse feita a contento, foi pedido aos alunos dar mais velocidade na arcada e mais
pressão junto às cordas, para uma sonoridade mais forte; e menos velocidade na arcada e
menos pressão, para tocar-se mais fraco. Foram revistas algumas questões referentes à
frase, trecho e forma musical. Após este trabalho, introduziu-se “Frère Jacques”, peça
folclórica francesa.
108

FIGURA 24 - 17ª Intervenção/Aula : 16.10.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila: Escala em RE M, “Brilha,
Brilha Estrelinha” e “Frère Jacques”.
Momento Finalizador: Foi explicado aos alunos que naquela intervenção/aula, o grupo se
encontrava na metade do semestre letivo e do programa previsto. Expôs-se o planejamento
até o final do semestre e fez-se algumas considerações sobre as apresentações finais.

Comentário: No início da aula foi proposto como aquecimento à execução da escala de RE


M e variações. Porém, foi detectado que a afinação do grupo não estava muito boa. Houve
a necessidade de se trabalhar intensamente os intervalos, sendo criados alguns exercícios
técnicos para tal fim. Após essa atividade, trabalhou-se “Frère Jacques”, sendo observadas
tanto questões técnicas quanto musicais. Nesta aula, não houve nenhum conteúdo novo a
ser exposto (já que se trabalhava, mais detalhadamente, as questões técnico-musicais).
Deu-se prioridade à fixação do conhecimento, visando como objetivo final à apresentação
pública (de acordo com o planejamento semestral e os objetivos expostos aos alunos).

FIGURA 25 - 18ª Intervenção/Aula: 18.10.02

Momento Inicial : Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Exercícios técnicos de controle do
arco com cordas soltas. Apostila: Escala em RE M, “Brilha, Brilha Estrelinha” e “Frére
Jacques”.
Momento Finalizador: Encerrou-se expondo o conteúdo e objetivos da próxima
intervenção/aula.

Comentário: Como foi exposto, a partir da aula anterior, o objetivo principal das aulas foi
a fixação do conteúdo dado. Para que tal objetivo fosse alcançado com êxito, cada
exercício ou trecho musical foi repetido várias vezes, ou em conjunto ou individualmente.
A assistência manual foi feita para que os alunos relaxassem os músculos e encontrassem
uma melhor postura.

FIGURA 26 - 19ª Intervenção/Aula: 23.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Exercícios de Relaxamento e Consciência Corporal.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila: Escala em RE M,
“Frére Jacques” e “Brilha, Brilha Estrelinha”.
Momento Finalizador: O encerramento da intervenção/aula foi marcado pela explanação
sobre postura, os ensaios, programa do recital (nova peça que será trabalhada) e o
109

conteúdo da próxima intervenção/aula. Também foi discutido nos momentos finais da aula,
a música e suas várias áreas de desenvolvimento: percepção/sentidos; corporais/postura,
intelectuais, entre outros.

Comentário: A aula foi bastante produtiva. Naquele momento, faltavam nove (9)
intervenções/aulas, ou seja, pouco mais de 1 (um) mês para o recital final. O Grupo
COMUNIDADE, já havia trabalhado o programa que os grupos anteriores desenvolveram
durante o semestre inteiro. Portanto, o grupo citado, mostrou melhor desempenho que os
anteriores.

FIGURA 27 - 20ª Intervenção/Aula: 30.10.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila : Escala em RE M, “Frère
Jacques” e “Brilha, Brilha Estrelinha”.
Momento Conteúdo Novo: Cânone (“Frère Jacques”).
Momento Finalizador: Encerrou-se a intervenção/aula falando qual será o conteúdo da
próxima.

Comentário: A intervenção/aula foi bastante produtiva. Houve uma melhora sensível na


afinação e na sonoridade do grupo. Foi proposto ao grupo, o trabalho com cânone.
Primeiramente, explicou-se o que era a forma cânone, sendo esta trabalhada a duas (2)
vozes. O resultado foi tão bom, que a peça foi estudada à três (3) e à quatro (4) vozes.

FIGURA 28 - 21ª Intervenção/Aula: 01.11.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila: Escala em RE M, “Frére
Jacques”.
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “The Old Mac Donald’s Farm”, Folclore Norte-
Americano.
Momento Finalizador: Exposição dos conteúdos e objetivos da próxima intervenção/aula.

Comentário: A intervenção/aula foi iniciada com a fixação do conteúdo. Observou-se uma


melhora sensível na afinação do grupo. Houve repetições de exercícios e trechos musicais,
buscando-se, cada vez mais, o progresso técnico-musical do grupo. A assistência manual
foi feita com cada aluno, sendo observados as características e os aspectos específicos, de
cada um. Fez-se o trabalho de Leitura à 1ª Vista, executando-se a peça “The Old Mac
Donald’s Farm”, do folclore norte-americano.
110

FIGURA 29 - 22ª Intervenção/Aula: 06.11.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila: Escala em REM.
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Brincando na Neve”, Folclore Francês.
Momento Finalizador: Antes de encerrar-se a intervenção/aula, foi sugerido ao grupo,
uma rápida revisão de todo o repertório já estudado (visando os recitais).

Comentário: A aula foi iniciada com exercícios técnicos visando a otimização da afinação
e o refinamento técnico. Primeiramente, o grupo tocou várias vezes a escala de maneira
ascendente e descendente. Após essa etapa, foi proposto aos alunos que fizessem o
seguinte exercício: um aluno tocaria a escala de RE M ascendente, em seguida, mantendo a
pulsação, o outro tocaria a descendente e assim sucessivamente, em um efeito “dominó”. O
exercício teve como objetivo trabalhar a percepção, a concentração e a pulsação dos
alunos. Na introdução da peça nova, “Brincando na Neve” do folclore francês, antes de
tocar com o arco, pediu-se para que os alunos solfejassem e tocassem em pizzicato, a
referida peça.

FIGURA 30 - 23ª Intervenção/Aula: 08.11.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Apostila: Escala em REM e
“Brincando na Neve”, Folclore Francês, em uníssono.
Momento Conteúdo Novo: Arranjo harmonizado a 4 vozes de “Brincando na Neve” .
Momento Finalizador: A intervenção/aula foi encerrada com a informação de que,
provavelmente, o grupo iria tocar nas apresentações públicas com o grupo de veteranos, a
peça “Brincando na Neve”. Foi pedido para que ninguém faltasse à próxima
intervenção/aula.

Comentário: Devido a grande facilidade de leitura musical e condições técnico-musicais


consideradas ótimas para o nível e o tempo de estudo, foi proposto ao grupo
COMUNIDADE, que tocasse “Brincando na Neve” a quatro (4) vozes. Foi pedido para
que os alunos se empenhassem ao máximo, para que o grupo conseguisse tocar a referida
peça com o grupo de veteranos, nas apresentações públicas. A peça foi lida frase por frase,
chegando-se até a sua metade. A princípio, ensaiou-se cada naipe separadamente e depois
todos juntos.
111

FIGURA 31 - 24ª Intervenção/Aula: 13.11.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.
Momento Ensaio: Preparação para o Recital no SESI de Campinas; “Brincando na Neve”,
(Arranjo Harmonizado).
Momento Conteúdo Novo: Tema da “9ª Sinfonia”, L.V. Beethoven (Arranjo Harmonizado
a 3 vozes).
Momento Finalizador: A intervenção/aula foi encerrada com o aviso de que na próxima
intervenção/aula, os alunos deveriam chegar mais cedo para ensaiar as peças com o grupo
de veteranos, visando o recital do dia 22.11.02.

Comentário: A afinação e a sonoridade estavam muito boa, bem como, a leitura à 1ª vista.
Os alunos conseguiram tocar a peça “Brincando na Neve” inteira. Da mesma forma, os
alunos fizeram a leitura à 1ª vista de um arranjo do tema da “9ª Sinfonia”, de Beethoven.
Neste momento do semestre, os alunos estiveram somente trabalhando arranjos
harmonizados, à três e à quatro vozes.

FIGURA 32 - 25ª Intervenção/Aula: 20.11.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Ensaio: Preparação para o Recital no SESI de Campinas. “Brincando na Neve”,
Folclore Francês; Tema da “9ª Sinfonia, L.V. Beethoven” (Arranjos Harmonizados).
Momento Conteúdo Novo: “A Conquista do Paraíso” , Vangelis.
Momento Finalizador: A intervenção/aula foi encerrada com os avisos pertinentes ao
próximo encontro, já no dia do recital (SESI, Campinas, dia 22.11.02).

Comentário: Revisou-se as peças já estudadas. Repetiu-se, cada trecho que precisava ser
melhorado. Introduziu-se a peça “A Conquista do Paraíso” visando tocá-la com o grupo de
veteranos. A parte que coube ao grupo COMUNIDADE foi a do acompanhamento, sendo
trabalhadas linhas melódicas mais simples. A melodia principal ficou a cargo dos alunos de
violino do grupo de veteranos, bem como, outras linhas melódicas mais elaboradas. O
programa do recital foi passado várias vezes, de maneira ininterrupta (como se já fosse o
dia da apresentação).

FIGURA 33 - 26ª Intervenção/Aula: 22.11.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos e organização da sala.


Momento Ensaio: Repertório do recital do SESI.
112

Comentário: A intervenção/aula não foi gravada, já que este era o dia do recital, havendo
ensaio com o grupo de veteranos. Preferiu-se gravar o referido recital.

FIGURA 34 - 27ª Intervenção/Aula: 27.11.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos e organização da sala.


Momento Ensaio: Preparação do programa dos recitais finais. Repertório específico do
Grupo COMUNIDADE: “Brilha, brilha a estrelinha” (Tradicional); “Frére Jacques”
(Folclore Francês); Repertório do Grupo COMUNIDADE com as turmas dos veteranos:
“Brincando na Neve” (Folclore Francês/Arranjo Harmonizado); “Tema da 9ª Sinfonia”
(L.V. Beethoven/Arranjo Harmonizado); “A Conquista do Paraíso” (Vangelis).

Comentário: O grupo estava em ritmo de ensaios, em clima de encerramento de semestre.


O Grupo COMUNIDADE obteve um ótimo rendimento durante os ensaios e recitais.

FIGURA 35 - 28ª Intervenção/Aula: 29.11.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Ensaio: Preparação Programa dos Recitais Finais.
Momento Finalizador: Explicações sobre os recitais e calendários: Dia 03/12 -
Apresentação no Projeto “Terça tem Canja”, na Secult (Secretaria Municipal de Cultura),
às 19h; Dia 04/12 - Participação do Recital Coletivo das Oficinas de Música, no Auditório
Belkiss Spencière, da EMAC/UFG, Campus II, às 18h; Dia 8/12 - Recital da Oficina de
Cordas no Projeto “Manhãs Musicais”, da Sociedade Goiana de Música, no Centro
Cultural Martim Cererê, às 11h.

Comentário: Todo o repertório (5 peças) foi passado em ritmo de ensaio. Nesta


intervenção/aula, o grupo ensaiou as peças com o acompanhamento do piano. A
sonoridade e afinação do grupo estiveram ótimos, bem como a pulsação. Porém, foi
destacado aos alunos que poderiam melhorar, ainda mais, o posicionamento do arco e
alguns detalhes técnicos. A programação das intervenções/aulas previstas, encerrou-se
nesse dia. Todos outros encontros, podem ser considerados ensaios adicionais ou ensaios
extras.

FIGURA 36 - Semana Ensaio (29ª e 30ª Intervenção/Aula): 03 e 04.12.02 (Apresentações


e ensaios)
Momento Ensaio: Repertório estudado: “Brilha, brilha a estrelinha” (Tradicional); “Frère
Jacques” (Folclore Francês; “Brincando na Neve (Folclore Francês/Arranjo Harmonizado);
“Tema da 9ª Sinfonia” (L.V. Beethoven/Arranjo Harmonizado); “A Conquista do Paraíso”
(Vangelis).
113

Comentário: Nos dias de apresentações, os ensaios ocorreram horas antes dos recitais.
Primeiro, afinava-se os instrumentos e ensaiava-se na própria escola. Faltando uma hora
para iniciar o recital, ensaiava-se no local de cada evento. Foi importante para os alunos,
ensaiar nos locais das apresentações, para que se ambientassem, trazendo mais segurança e
tranqüilidade. Cada local tem um espaço físico diferente, que influencia na acústica. Por
isso, tornou-se importante conduzir o ensaio final no local da apresentação, para que se
decidisse como seriam dispostas as cadeiras, por onde entrar e sair do palco e ainda, para
que se soubesse de antemão como soaria as peças naquele ambiente específico. Nesses
dias, os ensaios não foram gravados. Somente os recitais foram registrados.

FIGURA 37 - Ensaio (31ª Intervenção/Aula): 06.12.02

Momento Ensaio: Preparação do Programa do Recital Final no Martim Cererê. Repertório:


“Brilha, brilha a estrelinha”, tradicional; “Frère Jacques” , Folclore Francês; “Brincando na
Neve”, Folclore Francês.
Momento Finalizador: Explicações sobre o ensaio do dia seguinte e o ensaio no dia do
recital.

Comentário: O grupo COMUNIDADE teve a seu último encontro sozinho (os outros dois
ensaios ocorreram com a presença do grupo de veteranos). As questões específicas do
grupo, como trechos das peças que deveriam ser melhorados e ajustes técnicos, foram
trabalhadas. Esse ensaio foi filmado.

FIGURA 38 - Ensaios Finais: 07 e 08.12.02

Momento Ensaio: Preparação do Programa do Recital Final no Martim Cererê. Repertório:


“Brilha, brilha a estrelinha”, Tradicional; “Frère Jacques”, Folclore Francês; “Brincando na
Neve”, Folclore Francês; “Tema da 9ª Sinfonia” , L.V. Beethoven; “A Conquista do
Paraíso”, Vangelis .

Comentário: Trabalhou-se o repertório do recital final. Esses dois últimos ensaios não
foram filmados.
114

5.4.2. Observações e/ou análises das Intervenções/Aulas do grupo COMUNIDADE

A partir da descrição e comentário sobre cada intervenção/aula do grupo


COMUNIDADE, analisar-se-á os principais aspectos observados no decorrer do processo
de desenvolvimento do grupo mencionado.
Primeiramente, constatou-se que 60% dos sujeitos, estavam entre a faixa
etária de 13-17 anos e o restante, 40% estavam entre 20-46 anos, com o nível de
escolaridade que variou da 6ª série ginasial até à formação superior. Apesar de se notar a
diferença de idade entre alguns sujeitos e o nível de escolaridade, esses fatores não foram
prejudiciais ao desenvolvimento do grupo.
O desenvolvimento musical dos sujeitos ocorreu de maneira homogênea. Até
meados do semestre, a aluna Quênia sentiu certa dificuldade na leitura musical e em
posicionar-se corretamente. Porém, a partir dos momentos de exercícios de relaxamento e
consciência corporal, e ainda, da ajuda constante da aluna Nalanda, Quênia conseguiu
transpor as dificuldades iniciais e acompanhar o restante do grupo. O auxílio de Nalanda
foi imprescindível para o desenvolvimento e motivação da aluna. Nota-se aí, que a relação
de cooperação e solidariedade foi estabelecida entre as alunas, auxiliando no processo de
ensino-aprendizagem coletivo.
Outro ponto a ser destacado se refere à boa freqüência dos sujeitos, durante
as vinte e oito (28) intervenções/aula. Dos dez (10) sujeitos do grupo, dois (2) tiveram
freqüência de 100%; dois (2), de 96,4%,; um (1), de 92,8%; três (3), de 89,2%; e dois (2),
de 82,1%. A média de freqüência dos sujeitos variou entre vinte e três (23) a vinte oito (28)
intervenções/aulas. Com isso, o rendimento do grupo foi considerado acima da média, se
comparado aos grupos anteriores39 (pré-experimentais), tanto no âmbito quantitativo
quanto qualitativo. O grupo conseguiu (com carga horária menor) preparar um repertório
de cinco (5) peças para as apresentações finais. A média dos grupos anteriores era de no
máximo duas (2) peças. Da mesma forma, o grupo COMUNIDADE foi o grupo de novatos
que fez o maior número de apresentações públicas/recitais, totalizando quatro (4)
apresentações. Por outro lado, as peças executadas tiveram um bom nível técnico-musical

39
Desde 2000, em seis (6) semestres de funcionamento da Oficina de Cordas, EMAC/UFG, , foram iniciados
sete (7) grupos de iniciantes/leigos em música.
115

para a iniciação instrumental e o grupo correspondeu, com uma boa técnica instrumental,
afinação e compreensão dos conteúdos teóricos.
Observou-se nas relações interpessoais, o respeito mútuo, a cooperação e a
solidariedade entre os sujeitos. Nesse sentido, notou-se uma mudança no
comportamento dos sujeitos do grupo, que gradativamente foram tendo uma maior
participação, disciplina, concentração, organização, desempenho, consciência
corporal e assimilação e acomodação dos conteúdos, provocando a transformação
individual, de cada sujeito e a transformação coletiva, do grupo.

5.4.3. Intervenções/Aulas do grupo CEACA

As Intervenções/Aula do grupo CEACA ocorreram do dia 28 de agosto a 06


de dezembro de 2002, no Auditório da EMAC/UFG, Praça Universitária (Campus I), em
um total de 26 (vinte e seis) Intervenções/Aulas. O horário estabelecido foi da seguinte
maneira: toda quarta e sexta-feira, das 14 às 15:30 h, totalizando 3 (horas) horas semanais.

FIGURA 39 - 1ª Intervenção/aula: 28.08.02

Momento Inicial: Ambientação dos alunos, afinação dos instrumentos e organização da


sala.
Momento Conteúdo Novo: Explicação sobre o curso e metodologia aplicada (ensino
coletivo); Nomenclatura das partes de cada instrumentos; Manuseio e conservação dos
instrumentos; Exploração sonora dos instrumentos em pizzicato; Trabalho com parâmetros
sonoros de duração (longo, curto) ;Trabalho de pulsação.
Momento Finalizador: Expôs-se os conteúdos e objetivos da próxima intervenção/aula.

Comentário: A aula foi tema de reportagens de duas emissoras de TV - TV Anhanguera/


Globo e TV Brasil Central/Cultura. Por se tratar de um projeto pioneiro na cidade, as
emissoras locais interessaram-se e foram registrar o início do trabalho com os meninos do
CEACA, que atuam no mercado informal de rua. Com isso, o desenvolvimento da aula foi
um pouco prejudicado, porém, os alunos foram motivados pela situação, se sentindo
valorizados e aumentando a auto-estima de todos. O clima da aula foi festivo.

FIGURA 40 - 2ª Intervenção/aula: 30.08.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos; organização das estantes e distribuição dos
livros e dos instrumentos; chamada.
116

Momento Revisão: conteúdo da aula anterior.

Comentário: Alguns alunos novatos estiveram presentes nessa aula. Com isso, os aspectos
abordados na aula anterior foram revisados, para que todos pudessem acompanhar o
conteúdo explorado. Neste grupo, a lista de freqüência era feita oralmente, para demonstrar
a importância da assiduidade, despertando o senso de responsabilidade e compromisso dos
alunos.

FIGURA 41 - 3ª Intervenção/aula: 04.09.02.

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Nomenclatura das partes de cada instrumentos; desenvolvimento
histórico, manuseio e conservação de cada instrumento. Posição de “cavaquinho” do
violino e viola; exercícios em pizzicato, sem leitura explorando as cordas soltas dos
instrumentos e o parâmetro sonoro de duração. Exercício 1: LA 4; Exercício 2: LA 7 ;
Exercício 3: LA 6; Exercício 4: LA 5; Exercício 5: LA 4; Exercício 6: LA 3; Exercício 7:
LA 2; Exercício 8: LA 1; Exercício 9: RE 4.
Momento Conteúdo Novo: Exercícios sem leitura :1) LA 4 RE 4 LA 4 RE 4 LA 4  
2) LA 3 RE 3 LA 3 RE 3 LA 3   ; 3) LA 2 RE 2 LA 2 RE 2 LA 2  ; 4) LA 1 
RE 1 LA 1 RE 1 LA 1  . Introdução da leitura através da escrita esquemática através
da apostila : “Contando” 1ª Parte (Exercícios 1-6)
Momento Finalizador: A equipe produtora, responsável programa de TV da campanha
eleitoral de Mariana Sant’Anna (PT)40, para o cargo de governador, chegou para as
filmagens. A aula é encerrada.

Comentário: Essa foi a primeira intervenção/aula filmada. O clima da aula estava agitado.
Os alunos não conseguiam ficar quietos: falavam simultaneamente com a
professora/pesquisadora. Assim, não conseguiam escutar o quê estava sendo solicitado a
eles. Perguntou-se a todos, qual era a nomenclatura das cordas soltas dos instrumentos.
Rafael respondeu corretamente, se destacando do restante do grupo. Iniciou-se o trabalho
de percepção através dos instrumentos. Pediu-se para que os alunos ferissem uma corda
deixando o som prolongar-se até não mais ouvi-lo. Da mesma forma, pediu-se para que
contassem esses sons longos. Essa atividade torna-se interessante pelo trabalho de
percepção e contagem dos sons, contribuindo para uma maior concentração de um grupo.
Porém, foi observado que os alunos tinham dificuldade em ficar quietos e em silêncio,
demonstrando a falta de concentração. Com isso, após a seqüência de notas longas, foi
trabalhado a contagem dos sons em voz alta, a partir do LA 7 segundos até o LA 1
40
A Sociedade Cidadão 2000 é uma ONG, porém, está ligada à prefeitura de Goiânia, a partir de uma
parceria. Por ser o prefeito de Goiânia do Partido dos Trabalhadores, o Professor Pedro Wilson, a aula foi
filmada para ser demonstrada como uma ação da prefeitura no campo social. Vê-se que o poder público já
enxerga, de certa forma, a função social da arte e da música, valorizando as experiências bem-sucedidas.
117

segundo. Perguntou-se ao grupo sobre a nomenclatura das partes dos instrumentos.


Somente Rafael respondeu. A professora/assistente explicou como é o posicionamento
correto do violino e viola, assim como, o posicionamento do violoncelo. Neste momento,
trabalhou-se a postura de cada um, através da assistência manual. Após essa atividade,
propôs-se como exercício, uma seqüência com duas notas, objetivando o treino de
memorização, pulsação, duração de notas, alternância de cordas e a escuta do grupo.
Primeiramente, a professora/pesquisadora solfejou a seqüência em voz alta. Na segunda
vez, foi proposto ao grupo que contassem em voz alta. Neste momento, Everton deu um
tapa em Ricardo, demonstrando a agressividade e a falta de respeito com o outro. Propôs-
se a mesma seqüência, mas contando-se em três. O exercício não ficou bem sincronizado,
com isso, os alunos passaram a criticar uns aos outros. Rafael criticou Josimar, porém a
professora/pesquisadora fez o seguinte comentário: “Não tem problema! Só eu corrijo! Eu
errava, ela (professora/assistente) também. Todos erram!”. Notou-se que os alunos
estavam dispersos, desconcentrados, porém, ninguém assumia a seu próprio erro:
gostavam de apontar um colega pela falhas do grupo. Propôs-se a mesma seqüência em
dois, porém, mais uma vez, os alunos se demonstraram desatentos na hora da contagem.
Novamente foram comentados alguns aspectos como: a falta de concentração, de respeito
ao colega e de união do grupo (havia sempre troca de crítica e insultos). Propôs-se a
mesma seqüência em um tempo.Após essa atividade, introduziu-se a leitura, através da
escrita esquemática, pela apostila. Quando a professora/pesquisadora começou a explicar
os objetivos do próximo exercício, a maioria dos alunos ficou dispersa. Somente dois
alunos se mantiveram concentrados, os outros começaram com conversas paralelas e a
olhar o instrumento do outro. Foi observado que o clima era sempre de comparação e
disputa. Foi proposto para que os alunos cantassem uma seqüência. Depois foi solicitado
que cada naipe tocasse. Enquanto os colegas tocavam, os outros alunos ficavam inquietos.
Em determinado momento, houve uma discussão entre dois alunos que disputavam uma
estante de música. Neste momento, novamente foi tentado o trabalho com leitura. Fez-se o
trabalho de leitura métrica, depois tocou-se os exercícios. Marcelo perdeu a paciência, por
que já estava cansado de fazer exercícios em pizzicato, e pediu para que fosse trabalhado
com o arco. Observou-se que os alunos não possuíam disciplina e concentração suficientes
para o melhor desenvolvimento da aula. Notou-se, em várias situações, a falta de respeito
mútuo entre alunos, o espírito competitivo. Muitas vezes, essa competitividade excessiva
118

contribuiu para algumas discussões, ocasionando um baixo nível de aproveitamento da


intervenção/aula.

FIGURA 42 - 4ª Intervenção/aula: 06.09.02


Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.
Momento Revisão: Apresentação e exercícios com as cordas soltas. Exercícios da
Apostila: “Contando”, 1ª Parte.
Momento Finalizador: A fita acabou nos momentos finais da intervenção/aula.
Obs: Não foi introduzido elemento novo devido o andamento da aula (muita interferência e
indisciplina).

Comentário: Dois alunos novos foram assistir a intervenção/aula. O grupo estava mais
tranqüilo do que na aula anterior. Na distribuição das apostilas por estante (é de praxe ser
utilizada uma estante para cada dois alunos), houve o primeiro conflito do dia: Everton não
queria dividir a estante. Após o conflito inicial ser resolvido, foi solicitado para que Rafael
lesse o exercício. No momento em que o aluno iniciou a leitura métrica, os outros alunos
começaram a ler simultaneamente. Iniciou-se aí, uma nova discussão e tumulto. Alguns
alunos reivindicaram que se iniciasse o trabalho com o arco. Foi explicado aos mesmos
que seria necessário passar por estágios, antes de iniciar o trabalho com o arco. No
momento da explicação da professora/pesquisadora, alguns alunos se movimentavam em
excesso, tocavam os instrumentos e conversavam sem se preocupar com o quê estava
sendo dito. Houve dispersão. Em um segundo momento, a professora/pesquisadora
perguntou ao grupo quais eram as notas soltas e seu posicionamento em cada instrumento.
Todos responderam. Foi observado que quando um aluno errava, os outros o criticavam,
denotando o espírito competitivo e desrespeitoso. Novamente a professora/pesquisadora
ressaltou: “Aqui todos podem errar! É bom errar!”. Propôs-se a divisão do grupo para a
execução dos exercícios. Foram iniciadas novas discussões. Foi observado que, na maioria
das vezes, que era solicitada à repetição de algum exercício, os alunos não gostavam e
reclamavam. Notou-se a falta de senso crítico e de comprometimento por parte dos
mesmos (do jeito que saísse o exercício estava bom). Dinâmicas de grupo foram utilizados
para modificar o clima da aula. Foi solicitado que quando um naipe tocasse, os outros
ficariam atentos, observando em silêncio. Porém, ainda, alguns tocavam juntamente com
os alunos solicitados, atrapalhando o grupo. Pediu-se pra que determinado exercício fosse
repetido. Nesse momento, Everton reclamou novamente de maneira agressiva. A
professora/assistente ressaltou que era preciso ter paciência e que os professores estavam
119

ali somente para ajudá-los. A professora/pesquisadora pediu para que um aluno lesse e
Everton interferiu, começando a ler. Foi explicado que cada um terá a sua vez de fazer a
leitura em voz alta. Novamente, Everton respondeu de maneira agressiva, instalando-se,
mais uma vez, um clima de confusão. A professora/pesquisadora disse aos alunos que os
mesmos não estavam contribuindo para o melhor desenvolvimento da aula. Foi observado
que a cada novo exercício, perdia-se muito tempo com a indisciplina. Foi dito ao grupo que
a aula só seria continuada se todos ficassem em silêncio. Everton tumultuou a aula
novamente. A professora/pesquisadora expôs que seria necessário ter vontade e respeito
para que eles pudessem aprender algo. Ainda, foi ressaltado que se poderia ficar com
apenas um aluno do grupo, mas se o mesmo quisesse realmente estudar. Pode-se observar
que a indisciplina e a falta de respeito são comuns na vida desses meninos. Além disso, a
atitude de Everton denota uma grande carência, querendo sempre chamar a atenção de
todos e se destacar. Reiniciou-se a seqüência de exercícios, porém, Everton ainda interferia
de maneira negativa, atrapalhando o andamento da aula. Foi solicitado que cada um
tocasse individualmente. Todos começaram a interagir no grupo de forma organizada, cada
um na sua vez. Everton pediu para ir ao banheiro, lhe sendo consentido. Quando o aluno
permaneceu fora de sala, o clima da aula foi mais tranqüilo, silencioso e concentrado. As
dinâmicas de grupo aconteceram, com o objetivo de motivar os alunos à participação, a
partir da colaboração e da disciplina de todos. O direcionamento da aula foi participativo:
ninguém era obrigado ou forçado a fazer alguma atividade e/ou exercício. Os conteúdos
foram colocados de maneira amistosa, através de perguntas, buscando a participação de
todos sem imposição ou obrigatoriedade. Porém, durante a aula sempre foi ressaltado o
respeito ao outro (colegas e professores) e quais as atitudes e o comportamento adequado
que deveriam desenvolver naquele ambiente.

FIGURA 43 - 5ª Intervenção/Aula: 11.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Apostila: “Contando”, 1ª Parte (Exercícios 1-6).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Contando”, 2ª Parte (Exercícios 2-5)
(Introdução do ritornello)
Momento Finalizador: A fita termina nos minutos finais da intervenção/aula.

Comentário: No início da intervenção/aula, todos estavam conversando e tocando. A aula


foi iniciada com o pedido de silêncio. Mais uma vez, Everton tumultuou a aula, discutindo
com Roberto. Logo em seguida, o aluno levantou-se, sem pedir permissão, sentando-se nas
120

cadeiras destinadas ao público no auditório. A professora/pesquisadora chamou a atenção


de todos: “Silêncio! Estou pedindo silêncio! Começou a aula! Não quero ficar pedindo
silêncio toda hora!”. O tom de desabafo dessa observação, foi causado pela aula anterior
tumultuada e pouco produtiva, devido às constantes interrupções pela falta de disciplina do
grupo. Pediu-se para que o grupo solfejasse ou fizesse a leitura métrica, antes de tocar o
exercício, com o intuito que o mesmo fosse assimilado da melhor maneira. Notou-se que,
entre um exercício e outro, os alunos ainda se dispersavam, conversando com colega do
lado ou mexendo nos instrumentos, provocando a desafinação dos mesmos. Um aluno
corrigiu o outro, provocando uma nova discussão. Nesse momento, foi pedido para que os
alunos não corrigissem seus colegas, já que quando isso ocorria, iniciavam-se novas
discussões. Para que os alunos compreendessem a importância do grupo, comparou-se a
Orquestra com um time de futebol, uma equipe. Os alunos foram alertados para o fato que
todos dentro de uma equipe são importantes, não importando a sua função. Por isso, deve-
se haver o respeito mútuo e o trabalho de equipe. Então, todos deveriam tocar e seguir
juntos: “A força está no grupo!”. Observou-se em determinados momentos, a melhora no
comportamento e na concentração, refletindo na pulsação do grupo. Na seqüência dos
exercícios, perguntou-se: “Na Orquestra quem determina o andamento da música?”. Um
aluno respondeu: “O maestro”. Iniciou-se uma nova seqüência de exercícios. Foi
solicitado aos alunos que repetissem um exercício, várias vezes. Everton interrompeu o
exercício e foi corrigido. Neste momento, os outros alunos riram de maneira debochada.
“Não precisa pagar sapo não!”, respondeu Everton, de maneira agressiva. Notou-se que
deveria ser enfatizado o trabalho de melhorar a auto-estima (os alunos não aceitavam
críticas e correções, se sentiam inferiorizados) e o respeito mútuo (convivência).
Novamente, o grupo começava a dispersar-se e os alunos passavam a ter atitudes
individualizadas. O grupo foi comparado a um time: “Se vocês ficarem conversando e
tocando na hora errada, o time não vai ganhar. Tem que ter respeito e união!”. Alguns
alunos insistiam em pedir o arco. A partir da realidade, da necessidade, do comportamento
e das motivações deste grupo específico, mudou-se nesta intervenção/aula, o planejamento
do semestre. Buscou-se a partir desta intervenção/aula, trabalhar além da educação
musical, a educação geral. Assim, introduziu-se o arco como uma forma de motivar o
grupo. Foi falado para os alunos que iria abrir-se uma exceção, já que o prazo previsto para
a introdução do arco era duas semanas posteriores. Foi feito um trato com os mesmos: o
121

arco seria distribuído se o grupo permanecesse em silêncio, de maneira comportada, ou


seja, os alunos só poderiam tocar com o arco quando lhes fosse permitido.

FIGURA 44 - 6ª Intervenção/aula: 13.09.02

Momento Inicial: Afinação dos instrumentos, organização da sala e exploração sonora dos
instrumentos.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento (consciência corporal).
Momento Revisão: Exercícios com as cordas soltas (seqüências criadas sem o uso da
leitura); Trabalho de postura: como sentar.
Momento Conteúdo Novo: Introdução momento relaxamento; nomenclatura das partes do
arco.
Momento Finalizador: A fita acabou nos momentos finais da intervenção/aula.

Comentário: A intervenção/aula foi iniciada, novamente, com uma discussão (um aluno
criticando o outro). Enquanto esperavam o início da intervenção/aula, no pátio da escola,
alguns alunos se envolveram em uma brincadeira – “Guerra de Água” - que terminou em
agressão. Como todos estavam molhados, foi permitido que fizessem a aula sem camisa.
Alertou-se aos alunos, que eles deveriam esperar pelo início da aula, de maneira mais
tranqüila, não se envolvendo em confusões. Foi frisado que, a partir do momento que
entrassem em sala, já seria considerada a aula como iniciada. Passou-se a um debate. Cada
aluno expôs sua opinião sobre o ocorrido (a “Guerra de Água”). Rafael expôs que eles
chegam muito cedo para aula, por isso, ficam esperando muito tempo. Desta forma,
prosseguiu, todos se cansavam de esperar e começavam a fazer bagunça. A
professora/assistente sugeriu que os alunos chegassem 14:10, ao invés de chegar mais
cedo. Até então, a aula sempre iniciava às 14h, com a afinação dos instrumentos. A partir
desta modificação, quando o grupo chegasse, os instrumentos já estariam afinados. Todos
concordaram com a sugestão, que passou a ser acatada. Josimar pediu para trocar de
instrumento (trocou a viola pelo cello), apesar de já se estar na 6ª intervenção/aula. Everton
iniciou uma discussão, dizendo que não se poderia mais trocar de instrumento e que ele
queria tocar o violoncelo sozinho. Neste momento, a maioria manifestou a vontade de
experimentar um outro instrumento. A professora/pesquisadora consentiu que todos
experimentassem, mais uma vez, outros instrumentos, porém, os alunos foram advertidos
que deveriam optar definitivamente por um instrumento. Após a experimentação, em um
segundo momento, foi pedido para que os alunos deixassem os instrumentos de lado e se
levantassem. Foi introduzido o Momento Relaxamento, com o objetivo de melhorar a
postura corporal de cada um, bem com, amenizar as tensões (tanto físicas quanto
122

emocionais). Lembrou-se de algumas técnicas trabalhadas por Chan41. Foi exposto ao


grupo, que o relaxamento era de extrema importância para a preparação do corpo de cada
um, para que os alunos pudessem tocar, da melhor maneira possível. Durante o
relaxamento, foi feito um trabalho de conscientização corporal e aumento da afetividade e
auto-estima. Foi pedido aos alunos que se abraçassem (auto-abraço). De maneira
espontânea, Marcelo abraçou a professora/assistente. Foi demonstrado o posicionamento
das costas e ombros relaxados quando se está nessa posição. Pediu-se para que lentamente
fosse abrindo os braços, para frente, sem sair da postura de relaxamento dos ombros e
costas. Foi pedido para que imaginassem que estavam tocando um violino. Essa atividade
além de ser positiva no sentido de conscientização corporal, é lúdica, explorando a
imaginação dos alunos. Neste momento, foi feita a Assistência Manual em cada aluno,
conferindo se as costas e os ombros estavam relaxados. Em seguida, pediu-se para que os
alunos imaginassem estar abraçando uma mulher bem gorda ou o Faustão ou o Jô Soares.
O objetivo dessa atividade, além da descontração, era trabalhar o mesmo grupo muscular,
reforçando a consciência corporal, fazendo com que os alunos alongassem e o máximo as
costas e relaxassem os ombros. Após esses passos, o instrumento foi colocado em cada
aluno de maneira correta e relaxada. O posicionamento correto dos instrumentos foi
trabalhado de maneira ostensiva, porém, com atividades e estratégias diferentes. A
professora/assistente foi colocada na frente do grupo como modelo/espelho42. Foi falado
que o violino e a viola, não devem ficar nem para baixo, nem para cima, mas na diagonal.
Foi perguntado aos alunos: “O quê é uma diagonal?”. Todos responderam: “Não sei!” .
A professora pesquisadora respondeu : “Vocês conhecem a Av. Goiás entre a Tocantins e a
Araguaia?”. Todos respondem: “Sim”. Complementou-se: “Ela é uma diagonal!”. A
estratégia utilizada foi a de solução de problema. Quando se introduzia algum conceito
novo ou se havia alguma dúvida, a resposta não era simplesmente dada: os alunos eram
levados à dedução das respostas corretas. Os exercícios da apostila foram feitos, e a
postura correta foi recomendada. Quando o arco foi introduzido, para que se
compreendesse o movimento do braço (cotovelo-antebraço) perguntou-se: “Quem já

41
Thelma Chan, pedagoga paulista, trabalha com musicalização infantil e Canto Coral. Utiliza técnicas de
aquecimento, alongamento, relaxamento corporal, despertando “o corpo para o trabalho, mas também
desenvolvem o ritmo interior, a coordenação, a atenção, a prontidão e a integração, entre outros objetivos que
você vai descobrindo a cada ensaio” (2001, sem página).
42
Cristina Tourinho (1995), em sua dissertação de mestrado e na entrevista concedida para a presente
pesquisa, também discorre sobre a importância do aluno ter um modelo “espelho” para ajudá-lo na
aprendizagem, destacando que no ensino em grupo, o “espelho” não está somente na figura do professor,
mas também do colega.
123

dançou break?Dança de rua?”. Foi demonstrado o movimento da articulação cotovelo-


antebraço da break dance correlacionando ao movimento correto da arcada. Em seguida,
pediu-se para que todos imaginassem estar na rua, dançando o break (e executando os
movimentos demonstrados). Essa estratégia foi denominada, pela a autora do presente
estudo, de imaginação contextualizada, que tem como objetivo trabalhar o imaginário
relacionando com os conteúdos trabalhados, facilitando a compreensão dos alunos. Nessa
intervenção/aula, trabalhou-se a imaginação contextualizada para resolver questões
corporais relacionadas ao movimento correto do antebraço/braço/cotovelo durante a
arcada, buscando o relaxamento e a articulação correta, a partir da memória de uma
situação cotidiana, que ajudaria na técnica instrumental. Por fim, explicou-se novamente, a
função do maestro/regente e a importância de observar-se sempre os sinais e gestos do
mesmo. Observou-se que os exercícios de relaxamento trouxeram mais disciplina e
concentração ao grupo. No encerramento da intervenção/aula, foi pedido para que os
alunos abraçassem seu pai, sua mãe, seus irmãos, professores, todas pessoas que pudessem,
como dever de casa. O intuito dessa “tarefa” foi despertar a afetividade e troca de
sentimentos positivos, através da expressão de carinho que é o abraço.

FIGURA 45 - 7ª Intervenção/aula: 18.09.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Revisão: Trabalho com arco cordas soltas; Apostila “Contando”, 1ª Parte
(Exercícios 1-6) e 2ª Parte (Exercícios 2-5).
Momento Finalizador: Atividade solista/público.

Comentário: Devido a problemas técnicos, foi gravado somente o final da aula. No


momento finalizador da intervenção/aula ficou registrado a atividade denominada
solista/público. Foi proposto que cada aluno fosse para frente do grupo, improvisando43
um pequeno trecho. Após o improviso, os outros alunos teriam que bater palmas como se
fosse a platéia em um recital. Com isso, cada aluno seria ora intérprete solista, ora público.
Nessa atividade procurou-se, primeiramente, trabalhar a auto-estima dos sujeitos, no
sentido de valorização da sua atividade como aluno das Oficinas de Cordas, explorando o

43
Gainza (1977) dedicou-se ao estudo da improvisação no processo de musicalização, e acredita que “el
juego musical libre y espontáneo, de caráter sonoro-rítmico-melódico-armónico, realizado a través de la
actividad vocal-corporal-instrumental, promueve uma metabolizacion o recreación totalmente personal de los
elementos absorvidos” (p.66)
124

lado criativo de cada um. Percebeu-se a satisfação dos alunos em receber os aplausos.
Buscou-se preparar os alunos para a situação de performance, trabalhando-se a postura de
palco, a disciplina, a concentração, a criação e o agradecimento ao público por parte do
“solista”. Por outro lado, o “público” deveria ficar em silêncio, apreciando a criação do
colega, trabalhando-se o ouvir através do respeito, da cooperação, da solidariedade, entre
outros. Pode-se afirmar que essa atividade foi bastante enriquecedora, onde foram
trabalhadas as questões mencionadas, em um clima de descontração positiva, propício ao
ensino-aprendizagem. Nota-se que o trabalho pedagógico foi redirecionado a partir das
necessidades do grupo, sendo visadas as questões relacionadas, à auto-estima e ao resgate
da cidadania através da educação. Ao final da aula, os alunos correram para ver a câmera
filmadora de perto e Francisco fez o seguinte comentário: “Cada um é mais feio que o
outro!!” . Marcelo fez um gesto obsceno. A professora/pesquisadora disse: “Gravou,
viu?”. Nota-se que a baixa estima foi demonstrada através do comentário depreciativo em
relação aos colegas, ao mesmo tempo, que o gesto obsceno pode ser interpretado como a
necessidade de chocar (de se fazer presente) através da agressividade e da falta de respeito.

FIGURA 46 - 8ª Intervenção/aula: 20.09.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento (trabalho de
conscientização corporal/postura); Despertar da afetividade (abraço) e da imaginação
contextualizada (break dance).
Momento Revisão: Cordas soltas dos instrumentos (em pizzicato); 1) RE4 LA4  RE4 
LA4 ; 2 ) SOL4 RE4 SOL4  RE4 ; Apostila : Contando 1ª Parte (Exercício 1-6), 2ª
Parte (Exercício 2 e 3).
Momento Finalizador: Trabalho do solista/público.

Comentário: Dois novos alunos foram recebidos em sala de aula. Os alunos novatos foram
trazidos pelo CEACA para terem a oportunidade de vivenciar uma aula de música e
instrumentos musicais. A intervenção/aula foi iniciada com o trabalho de relaxamento e
alongamento. Na seqüência, passou-se para a atividade do despertar da afetividade, através
do abraço imaginário. O Momento Relaxamento foi importante na ambientação do grupo
em sala, trazendo, além do relaxamento e alongamento, a atenção e a concentração. Ainda
neste momento, foi trabalhada a imaginação contextualizada. Pediu-se para que
imaginassem a dança de rua ou o break dance, com o intuito de manter os ombros
relaxados, braços fixos e movimentar apenas o antebraço, a partir do cotovelo.
Primeiramente, o movimento foi demonstrado e em seguida, os alunos fizeram o mesmo
125

movimento. Poderia ter sido pedido que os alunos repetissem o movimento, não utilizando
a imaginação contextualizada, ou seja, não relacionando o movimento ao cotidiano dos
alunos. Porém, a assimilação não seria a mesma. Antônio (aluno veterano e do grupo
COMUNIDADE) chegou para assistir a aula. O mesmo foi apresentado ao grupo,
estimulando a sociabilização e a integração de todos. O grupo estava agitado. Pedro e
Roberto queriam trocar de instrumento (o trato da aula anterior foi relembrado). O
Momento Revisão foi iniciado com a seguinte pergunta: “Quem vai falar para a Bruna
qual é a 1ª corda do violino? Todos levantando o dedo indicador:“Eu, eu”. Durante o
processo, buscou-se a integração e a participação dos alunos através de perguntas. Em um
outro momento, Pedro e Roberto insistiram em trocar de instrumento. A
professora/assistente advertiu: “Vocês tem que aprender a gostar do instrumento que vocês
tocam?”. Iniciou-se a revisão de alguns exercícios, a partir das cordas soltas (em
pizzicato) para que os alunos novos pudessem acompanhar o grupo e que os restantes
pudessem fixar o aprendizado. Insistiu-se no trabalho de otimizar a duração de notas e a
pulsação, reforçando o trabalho de concentração, memorização, percepção, sincronismo
(pulsação do grupo) e postura. Quando o trabalho de leitura foi iniciado, ocorreram alguns
incidentes, devido ao comportamento dos alunos, que criticavam e corrigiam uns aos
outros, de maneira desrespeitosa. Os mesmos foram advertidos pela
professora/pesquisadora: “Ninguém pode falar na hora do exercício (criticando o outro)! E
quem corrige aqui são só os professores!”. Observou-se a melhora da pulsação a partir de
uma melhor interação (sintonia entre os indivíduos) do grupo. Da mesma forma, observou-
se que ainda a duração das notas ainda não estava exata. Observou-se uma certa ansiedade
em relação a alguns integrantes do grupo, que queriam ir para frente, não vivenciando e
assimilando cada momento. Determinados alunos permaneciam inquietos. Luiz mexeu nas
cravelhas provocando a quebra de uma corda. Nesse momento, foi esclarecido para os
alunos que deveriam manter-se mais tranqüilos e serenos. Foi exposto que o Recital Final,
que era o objetivo final do semestre, já estava se aproximando e que todos deveriam
concentrar-se mais, levando mais “a sério” aquela atividade. No momento das explicações,
outro conflito surgiu: dois alunos “disputavam” a estante de música. Foi falado para o
grupo, que todo ser humano deve saber dividir as coisas e o espaço, tanto em casa, com a
família, como na escola, com os amigos. Retornando-se aos exercícios da apostila,
trabalhou-se da mesma forma que nas aulas anteriores: a primeira vez, com solfejo ou
leitura métrica, depois, tocando (ora todos juntos, ora em naipes), sendo observados as
126

questões musicais e técnicas, utilizando-se do recurso da assistência manual. Em


determinado momento, a professora/pesquisadora comentou que todos deveriam melhorar
a postura. Porém, elogiou a postura de um aluno, João, com o objetivo de incentivar e
valorizar o aluno, demonstrando ao grupo um modelo, para que os outros alunos
atingissem o mesmo padrão. Alguns alunos ficaram com ciúmes ou se sentiram
diminuídos, iniciando uma ligeira controvérsia. Neste momento, professora/pesquisadora
fez o seguinte comentário: “Aqui todo mundo é bonito!” e chamou a atenção para que
todos observassem como seria uma postura correta e que tentassem ficar da mesma forma.
Nota-se que ainda, um elogio direcionado a um aluno desencadeava uma série de conflitos
interiores, pela falta de auto-estima e autoconfiança por parte dos mesmos. Na visão do
restante do grupo, o elogio direcionado para um, significava a depreciação dos outros. Nos
15 minutos finais, trabalhou-se o arco. Em seguida, passou-se a atividade criativa,
solista/público. Cada aluno foi à frente improvisar uma seqüência, de maneira aleatória,
porém, observando a postura correta do instrumento e do arco (exploração sonora com o
cuidado técnico) e era aplaudido pelo público ao final da execução. Os objetivos da
atividade foram: motivar , incentivar, melhorar a auto-estima e auto-confiança dos alunos,
respeito mútuo e colaboração. Ao término da aula Paulo olhou para câmara e sorriu. A
professora/pesquisadora pediu um beijo e ele mandou para câmara (incentivo à afetividade
e aproximação da relação professor-aluno).

FIGURA 47 - 9ª Intervenção/aula: 25.09.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Revisão: Apostila: “Contando” 1ª Parte (Exercício 1-6); 2ª Parte (Exercício 2 e
3).
Momento Conteúdo Novo: Apostila : “Contando” 3ª Parte (Exercício 1).
Momento Finalizador: Trabalho com o arco sem leitura.

Comentário: A aula foi iniciada com atividade de alongamento e relaxamento, trabalhando-


se coluna, ombros e braços. Pediu-se para que soltassem o corpo, visando o total
relaxamento e rememorou-se o auto-abraço (alongamento das costas e afetividade) e o
braço da break dance (preparo da articulação utilizada na arcada).Iniciou-se o trabalho de
leitura dos exercícios da apostila. Foi observado que a postura dos meninos ainda não
estava boa. A professora/pesquisadora insistiu em falar da importância de sentar-se de
maneira adequada para o desenvolvimento instrumental. Para que pudessem compreender
127

qual era a postura desejada, o foco foi transferido para o cotidiano dos alunos. Perguntou-
se como era a postura de cada um no dia-a-dia: “Como vocês andam? Como vocês
carregam a caixa de engraxar? Como vocês sentam para engraxar o sapato?”. Todos
demonstraram. Após a demonstração de cada um, a professora/pesquisadora demonstrou a
forma correta de sentar para a atividade de engraxate e pediu para que todos imaginassem
estar engraxando sapatos naquele momento (imaginação contextualizada). Após a
atividade criativa de imaginação-mímica (criação e movimento/ mente e corpo), a mesma
postura foi transferida para a performance do instrumento. Pediu-se para que a
professora/assistente tocasse com o grupo, no semicírculo, no sentido de motivar e
estimular os alunos. Em determinado momento, a professora/assistente corrigiu Luiz, que
não aceitou o auxílio, ficando nervoso e emburrado. Percebe-se que os alunos não
aceitavam as correções como crítica construtiva, mas como uma repreensão. No momento
da execução do exercício 3, da fase “Contando”, 3ª Parte, foi pedido para que todos os
alunos tocassem sozinhos, para que fosse verificado o aprendizado técnico-musical de cada
um. Pediu-se que no final de cada execução que os demais alunos aplaudissem o colega
solista, reforçando o trabalho de respeito mútuo, cooperação e solidariedade. Após a
atividade, perguntou-se: “O quê é mais difícil: tocar sozinho ou em grupo?” . Alguns
responderam: “Sozinho!” e outros: “Em grupo!”. Insistiu-se na importância do trabalho
em grupo e de todos tocarem juntos, novamente utilizando-se a imagem do time de futebol:
“Quando a bola estiver com o zagueiro ou goleiro na defesa, o atacante deve observar
como a bola está sendo conduzida para ele fazer o gol !”. Pediu-se para que todos
prestassem atenção em si (perceber a si próprio/seu papel) e nos colegas dentro do grupo
(perceber o outro). A fita foi acabou e foi substituída por outra. Nesse momento, a
professora/pesquisadora pediu para que prosseguissem com os exercícios. Rafael, antes de
iniciar o novo exercício, disse: “Postura!”, como uma forma de participar ativamente do
processo pedagógico. Roberto completou na tentativa de agredir o colega: “Tem que ter
postura de macho!”. A professora/pesquisadora intervém: “Não quero saber dessa
brincadeira!(...) Isso é coisa séria (...) A primeira coisa que eu quero de vocês aqui é o
respeito! (...) Se você xingar ele, dá o direito para ele te xingar. Se você bate nele, dá
direito dele te bater. Tudo que a gente faz na vida tem conseqüência!”. A série de
exercícios foi interrompida para a discussão desse fato. A professora/pesquisadora falou da
importância de se ter respeito, esclarecendo que se alguém agride o outro, dá chance para o
outro revidar. Utilizando-se de metáfora, prosseguiu: “Tudo que a gente planta, a gente
128

colhe! Se planta coisa boa, se estuda, trabalha, colhe coisa boa. Se planta coisa errada,
colhe coisa errada. Tem que se plantar o respeito e o amor!”. Na tentativa de esclarecer
que ali ninguém era melhor que ninguém, que o elogio a um aluno não significa que o
mesmo é melhor do que os outros, que a correção não significa repreensão e o respeito
deve ser sempre mútuo, prosseguiu: “O quê eu sou de vocês?”. Eles responderam:
“Professora!”. Prosseguiu-se: “E a Esther?”. Os alunos responderam da mesma forma:
“Professora”. Insistiu-se: “Quando a gente vai para a escola a gente quer o quê?”. A
maioria do grupo responde: “Aprender!” e Roberto respondeu sorrindo: “Bagunça!”.
Nota-se a intenção do aluno de chocar, a partir do comportamento que julga ser
transgressor. A professora/pesquisadora esclareceu a relação professor/aluno: “Não é só
vocês que aprendem não! Eu aprendo, a Esther aprende (...) O ensino é uma troca. Vocês
ensinam a gente, a gente ensina vocês. A gente quer o melhor para vocês. Não leve a mal
quando a gente corrige vocês. A gente quer o melhor para vocês, que vocês aprendam
mais!”. Em seguida retornou-se aos exercícios e foi observada a mudança de
comportamento. O quê se buscou com essas discussões foi conscientizar o grupo, a partir
do estabelecimento de confiança entre as parte (os professores e o grupo). Os alunos estão
mais concentrados, executando os exercícios com mais exatidão (e essa mudança foi
destacada ao grupo). Porém, Roberto mantém o comportamento disperso e indisciplinado,
agredindo verbalmente o colega, Luiz. Nesse momento, o Roberto foi lembrado que deve
existir o respeito entre as pessoas. Para finalizar a aula, iniciou-se o trabalho com o arco.
Mais uma vez, a professora/pesquisadora pediu para terem cuidado com a postura, citando
os nomes, para facilitar a conscientização de cada aluno sobre a sua postura, para que
tentassem melhorá-la. Luiz reagiu com agressividade à crítica construtiva, demonstrando
que o trabalho de ensino-aprendizagem deve ser feito de acordo com a realidade do grupo,
sem pressa ou ansiedade. Após o encerramento da aula, Daniel correu para câmera e sorriu
acenando.

FIGURA 48 - 10ª Intervenção/aula: 27.09.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Revisão: Cordas soltas dos instrumentos; Apostila: “Contando” (2ª Parte,
Exercícios 2-5; 3ª Parte, Exercício 1).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Contando” (3ª Parte, Exercício 2-5).
Momento Finalizador: Trabalho solista/público. Expôs-se os objetivos da próxima
intervenção/aula.
129

Comentário: A aula foi iniciada com uma breve revisão, para que a aluna visitante (novata)
acompanhasse o grupo. Renato auxiliou a aluna, demonstrando solidariedade e cooperação.
A professora/pesquisadora convidou os alunos a irem ao concerto da Orquestra Sinfônica
Municipal, no Teatro Goiânia, no domingo, pela manhã (dia 29/09/02)44. Perguntou-se
para os alunos, quem gostaria de ir e ficou definido o encontro na porta do teatro às
10:30h. Prosseguiu-se com os exercícios, introduzindo o conteúdo novo. Em determinado
momento, durante a execução de um exercício, Roberto reclamou em voz alta, com
irritação, não ter entendido qual foi o exercício pedido. A professora/pesquisadora
esclareceu: “Eu disse número cinco. Se você não conseguiu, a gente passa de novo! A
gente está aqui para aprender!” . Porém, enquanto dialogava-se com Roberto, os outros
alunos começaram a dispersar, conversando com o colega ao lado. A
professora/pesquisadora falou: “Vocês querem que eu fale alto?” (aumentando o volume
da voz). Todos olharam espantados. Prosseguiu-se: “Mas eu não vou falar alto!”
(diminuindo o volume da voz) “Eu não gosto de gritar. Eu não vou gritar! Sabe por quê?
Eu tenho mais cinco aulas e eu não sou de gritar com ninguém. Eu gosto muito de todo
mundo aqui, mas eu estou trabalhando, estou trabalhando sério! Não quero brincar não!”
. Marcelo começou a conversar, quando lhe foi dito: “Vamos brincar Marcelo? Vamos
brincar? (...) Eu quero que você me escute com respeito porque eu estou respeitando
vocês! Não estou?” . A resposta foi afirmativa e prosseguiu-se: “Então, eu quero respeito
também! Eu estou aqui trabalhando com vocês e vocês vão ter que escutar a minha voz
dessa forma! (em um tom natural)”. Nota-se que os alunos estão acostumados a falar ao
mesmo tempo, a não respeitar o outro (nem o professor) de maneira involuntária. Foi
observado que os alunos se dispersavam com facilidade. Da mesma forma, nota-se que os
mesmos estão acostumados à repressão e a gritos. Para eles, felizmente, esse tipo de
abordagem (sic!) não funciona. Para finalizar a aula, os alunos pediram para fazer a

44
O episódio foi extremamente produtivo e torna-se interessante relatá-lo. Conforme o combinado, cheguei
ao Teatro Goiânia às 10:30h, lá já estavam Daniel, Luiz e Júnior (que ainda não era aluno da Oficina de
Cordas). Enquanto me esperavam, estavam vigiando os carros (para não perder a oportunidade de ganhar
mais uns “trocados”). Com suas vestes simples, adentraram no teatro em minha companhia. Expliquei como
seria o concerto e como deveriam se comportar. Para minha surpresa o comportamento dos meninos foi
impecável. Atentos, sem se moverem, olhos brilhavam. No intervalo, pediram para sair e não voltaram mais.
Fiquei encabulada. Pensei: “Pelo menos já haviam assistido a metade do concerto!”, um fato raro para
crianças daquela idade. Ao término do concerto, quando saí do teatro, os encontrei vigiando os carros, me
despedi e pensei : “Esses meninos não perdem tempo!” . Na aula seguinte, os alunos me contaram o quê
havia ocorrido: no intervalo foram ver ser recebiam alguns “trocados” por vigiarem os carros, quando
tentaram retornar, foram BARRADOS pelos porteiros e seguranças do teatro. Fiquei estarrecida! Um teatro
PÚBLICO, uma apresentação com ENTRADA LIVRE, não deveria atender a TODOS os cidadãos? Neste
momento, através desse relato, questionei se aquelas crianças poderiam ser consideradas cidadãs!
130

atividade solista/público. Desta vez, propôs-se que ao invés de improvisarem na frente,


escolheriam um exercício a fim de treinarem a leitura (ainda relativa). Todos vão à frente,
menos Andréia. Roberto teve dificuldade e pediu para repetir. A seguir, Rafael foi para
frente e perguntou: “É pra repetir?”. Foi respondido: “Você é quem sabe!”. Então o
aluno repetiu e todos os outros alunos reivindicaram: “Eu também quero!”. Nesse
momento todos repetem, inclusive Andréia que da 1ª vez não quis. Notou-se que o
comportamento da turma melhorou sensivelmente, depois da discussão sobre
comportamento. Todos estavam mais atentos, ouvindo o colega e disciplinados.

FIGURA 49 - 11ª Intervenção/aula: 02.10.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Revisão: Apostila: “Contando” (2ª Parte,Exercícios 2-5; 3ª Parte, Exercícios 1-
5).
Momento Conteúdo Novo: Introdução da Leitura Musical (Noções de Teóricas: pauta,
claves, compasso, figuras musicais). Apostila : “Na Pauta” (1ª Parte, Exercício1).
Momento Finalizador: Exploração sonora do instrumento através do trabalho de leitura
rítmica.

Comentário: A aula foi iniciada com comentários sobre o concerto. Os dois únicos alunos
do grupo que assistiram, Luiz e Daniel, relataram a experiência. Os alunos estavam
agitados e conversando muito. Foi perguntado: “O que mais te chamou atenção, Daniel?”.
Ele respondeu: “Foi os músicos tocando todos juntinhos!”. Em seguida, observou que
tinha gostado de um trecho de uma peça em pizzicato. Josimar (com ciúmes) respondeu
que o quê Daniel tinha mais gostado era a “comida lá de fora” do teatro. Perguntou-se,
ainda, para Daniel: “E a música estava bonita?”. A resposta foi: “tava!” . Iniciou-se o
trabalho de relaxamento. Na seqüência, os alunos começaram a conversar sobre um grande
roubo ocorrido no setor aonde eles moram. A professora/pesquisadora perguntou o quê
tinha ocorrido e os alunos passaram a relatar. Roberto afirmou que era melhor “travar”
(roubar) uma câmera filmadora (referindo-se a que se utilizava no experimento) do que
ficar estudando para ficar rico. Era melhor “travar” e comprar maconha. A
professora/pesquisadora questionou: “Vocês acham que (o crime) compensa?”. Roberto
respondeu assustado: “Não é eu não!”, referindo-se que não era vontade sua ter aquele
tipo de atitude. Prosseguiu-se: “Eu acho que não compensa. Sabe por quê? Porque tudo
que a gente faz hoje, reflete no futuro!” esclareceu novamente a professora/pesquisadora.
131

Exemplificou-se com dois casos verídicos. O primeiro retratava a estória de um casal de


namorados que brincando de roleta russa, disparou um tiro acidental provocando a morte
de um deles. O enamorado que sobreviveu está sendo processado. O outro caso, retratava a
estória de uma menina que brincando de enfiar a haste dos óculos no ouvido de um colega
de escola, acabou por provocar a sua surdez. Os dois casos foram contados, no intuito de
mostrar aos meninos que uma atitude impensada, em um determinado momento, pode
transformar a vida de cada um de maneira negativa. Foi começada uma grande discussão
sobre violência, pobreza, crimes e drogas, ou seja, a realidade que eles viviam. Alguns
alunos relataram algumas experiências e naturalmente iniciou-se uma discussão/debate.
Como conclusão, foi comentado que, o quê eles estavam fazendo naquele momento,
naquela aula, era buscar uma saída, uma solução para a realidade em que viviam. Falou-se
para os alunos: “Estamos plantando uma semente. Como se fosse de uma flor, de uma
rosa, de um cravo (...) Para que essa flor desabroche precisa-se de quê? Tem que cuidar,
tem que regar, trocar a terra e esperar crescer!Se não colocar água ela seca! Então, aqui
a gente já começou a plantar a semente. Não começamos? Mas se parar de estudar agora,
vai nascer a flor? Nós estamos plantando a semente do estudo, mas temos que ter
paciência para colher os frutos!”. Observou-se que os alunos demonstraram nesta aula, ou
melhor, neste “debate”, a confiança para a troca de experiência. Eles sentiram que o
ambiente era propício para desabafar suas realidades e discutir suas experiências com o
grupo. Todos queriam contar alguma experiência e contaram! Destaca-se o relato de
Rafael sobre um fato que ocorreu em seu bairro: policiais mataram bandidos que moravam
no seu setor. Então, o aluno perguntou o quê poderia ocorrer com os policiais. A discussão
foi longa. Foi falado para os alunos que os mesmos deveriam afastar-se da violência, das
drogas, através do estudo. Ressaltou-se que a violência proliferava em todos lugares, em
todas as classes, por isso: “Temos que tentar ficar longe da violência, das drogas, do
roubo, dessas coisas (...) Temos que tentar desempenhar o nosso papel na sociedade da
melhor forma!”. Os instrumentos foram distribuídos e os exercícios foram iniciados.
Destacou-se que, naquele dia, iriam começar a ler “as notinhas”, coisa que “muito médico,
muito advogado, muita gente rica não sabe”. O comentário teve o intuito de
incentivar/motivar o grupo. O ambiente da aula estava bastante positivo. Os exercícios
estavam sendo executados, sem interrupção, até que foi instaurado um “conflito” entre dois
alunos. E a professora/pesquisadora iniciou um trabalho de conscientização social:
“Ninguém vive sozinho no mundo, vive? A gente não vive, convive. Se a gente nascesse na
132

selva como o Tarzan, a gente iria procurar um cachorro, um macaco, um elefante para ser
nosso amigo. Na escola a gente fica isolado?”. Roberto respondeu: “Eu fico!”. Perguntou-
se: “Não faz amizade com ninguém?” . A resposta foi: “Não!” . Diante da resposta do
aluno, a professora/pesquisadora insistiu: “Todo mundo convive. A gente sempre convive
com o outro e por isso, a gente tem que fazer de tudo para que a convivência seja melhor
(...) Não se deve revidar quando alguém te xingar. Quando der vontade de xingar alguém,
faz um elogio!” . Voltou-se aos exercícios de leitura (escrita esquemática). Após esse
trabalho, introduziu-se a leitura musical. As noções teóricas foram passadas a partir do
quadro negro: pauta, claves (sol, fá e dó), compasso (quaternário, ternário e binário),
figuras musicais (semibreve, mínima, semínima). Nesta aula, optou-se por trabalhar a
leitura rítmica, sendo observados apenas o valor das figuras musicais (duração). Após a
leitura, passou-se a tocar a seqüência em alguma corda solta ou em cluster (blan)45. O saldo
da aula foi extremamente positivo: a boa concentração e a disciplina do grupo, acarretou
em uma boa leitura e pulsação. A aula terminou em clima de euforia e aplausos.

FIGURA 50 -12ª Intervenção/aula: 04.10.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Revisão: Trabalho de Musicalização : leitura musical/solfejo e ritmo. Apostila:
“Na Pauta” (1ª Parte, Exercício1).
Momento Finalizador: Exploração sonora do instrumento através do trabalho de leitura
rítmica.

Comentário: Faltou energia na escola, impossibilitando a filmagem. Júnior iniciou seu


estudo de violino nesta intervenção/aula. Continuou-se o trabalho iniciado na aula anterior.
Os conteúdos teórico-musicais foram enfatizados através da visualização dos símbolos
musicais no quadro negro. Observou-se uma melhora sensível no comportamento do
grupo, desencadeando a melhora na concentração, interesse, pulsação, duração das notas.

FIGURA 51 - 13ª Intervenção/aula: 09.10.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.

45
Lembrou-se de atividades e estratégias de exploração sonora e criativa de instrumentos musicais, utilizadas
pela autora em sua pesquisa anterior acerca do ensino coletivo de violão, para crianças, via metodologia
criativa (Cruvinel /2001).
133

Momento Revisão: Claves e Figuras Musicais. Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercício 1
(Leitura Rítmica em cluster/blan).
Momento Conteúdo Novo: Introdução das notas musicais ré e lá (cordas soltas) na pauta
Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercício 2 e 3).
Momento Finalizador: Distribuição de lembrancinhas em comemoração ao Dia das
Crianças (copo decorado com um coração, contendo pirulito, bombons e balinhas). Por
outro lado, os meninos distribuíram convites para uma atividade no dia 11/10/02, no circo,
em comemoração ao Dia das crianças.

Comentário: A aula foi iniciada com o trabalho de relaxamento. Foram revisados alguns
elementos e conceitos teóricos. Primeiramente, utilizou-se o quadro negro. Depois, os
conteúdos foram transpostos para os instrumentos: os alunos tocaram os exercícios da
apostila. Quando o trabalho com leitura musical foi iniciado, a intervenção/aula foi
interrompida pela imprensa46. Após as fotos, voltou-se para o trabalho de leitura musical,
porém já faltavam poucos minutos para o término da intervenção/aula. Observou-se que a
leitura melhorou, assim como o comportamento dos alunos.

FIGURA 52 - 14ª Intervenção/aula: 16.10.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Revisão: Apostila: “Na Pauta” (1ª Parte, Exercícios 1-3).
Momento Conteúdo Novo: Apostila: “Na Pauta” (2ª Parte, Exercícios 1-3).
Momento Finalizador: A fita acabou, impossibilitando o registro desse momento.

Comentário: A aula foi iniciada destacando ao grupo que o recital final já havia sido
marcado e que naquela altura já estávamos na metade do semestre. Portanto, eles deveriam
ter mais atenção e concentração. Procurou-se incentivar o grupo dizendo que o recital seria
em um teatro bonito, com um palco enorme e ar condicionado (referindo-se ao teatro da
EMAC/UFG, Campus II). Roberto disse que não queria ficar como um “palhaço” lá na
frente. Nota-se a baixa auto-estima do aluno. Porém, Rafael estimulou o colega: “Quando
um errar, quem está na platéia não saberá quem errou”. A professora/pesquisadora
advertiu que todos poderiam errar e que não precisavam ficar tensos e/ou inseguros. Pediu-
se para ninguém faltar mais às intervenções/aulas. Os alunos estavam agitados, tocavam e
mexiam nos instrumentos enquanto as professoras falavam. Foram iniciados os exercícios
de relaxamento. A cada novo exercício, fez-se a leitura métrica ou o solfejo antes de tocar.

46
A imprensa foi até a escola para tirar fotos do grupo, para uma matéria veiculada no Jornal “O Popular”, do
dia 12.10.02.
134

Porém, notou-se que os alunos, ainda, tinham dificuldade de manter-se na postura correta,
proporcionando um melhor posicionamento para o instrumento. Após essa
intervenção/aula os alunos ficaram catorze (14) dias sem ir a EMAC. No 18.10.02, todos
alunos faltaram, alegando terem confundido o horário (pensaram que não haveria aula por
causa do feriado); no 23.10.02, o grupo faltou devido à falta de transporte (já que eram os
funcionários do CEACA que levavam o grupo para a EMAC) e por fim, no 25.10.02, não
houve aula, pela ocasião de feriado municipal (Aniversário de Goiânia).

FIGURA 53 - 15ª Intervenção/aula: 30.10.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Revisão: Apostila: Na Pauta (1ª Parte, Exercício 1-3; 2ª Parte, Exercício 1-3).
Momento Conteúdo Novo: Introdução da mão esquerda: nota mi. Apostila: “Dedos”
Exercício 1.
Momento Finalizador: Término da aula falando dos objetivos da próxima aula.

Comentário: Depois de catorze (14) dias sem aula, expôs-se que faltava apenas um mês
para o recital. Josimar falou: “Então vamos ter que ter aula todos os dias!” . O grupo foi
advertido que deveria aproveitar-se, ao máximo, o tempo da aula, já que as professoras
tinham outros compromissos profissionais, por isso, o grupo teria que se esforçar, naquele
momento. No início da aula, o grupo estava disperso (as duas semanas sem aula,
prejudicou o desenvolvimento do grupo): “Vamos todo mundo concentrar? Não quero ver
ninguém olhando pro lado!”. Primeiramente, trabalhou-se a postura (os alunos
continuavam a ter problemas em se manter posição correta). Iniciou-se os exercícios
instrumentais, revisando a leitura musical. Os alunos continuavam inquietos, falando ao
mesmo tempo, sendo solicitado o silêncio de todos. Porém, grande parte dos alunos
começou a resmungar, iniciando uma discussão sobre a concentração e disciplina: “Na
Orquestra todos ficam quietos, na postura certa!”. Os alunos silenciaram-se: “Olha como
é bom quando vocês ficam em silêncio! Vocês não ficam com dor de cabeça quando todos
falam ao mesmo tempo? Quando todos falam, vocês não me entendem porque não
conseguem escutar! (...) Todos concentrados, com organização! Quando quiser sair,
levante o dedo, quando quiser falar, levante o dedo. Cada um deve falar de cada vez senão
ninguém entende nada!”. Os exercícios foram reiniciados. A professora/pesquisadora
pediu aos alunos que se esforçassem mais. Neste momento, um aluno disse que eles não
conseguiam por serem engraxates. Nota-se, mais uma vez, a baixa auto-estima e auto-
valorização: “Não é porque você é engraxate, que você é pior que os outros. Se você olhar
135

para o lado, vai ter gente que tem mais problemas que você!”. O comentário teve como
propósito incentivar, motivar e melhorar a auto-estima de todos. Rafael citou o exemplo de
um deficiente físico. A professora/pesquisadora discutiu um fato veiculado nacionalmente
em relação à recuperação do iatista Lars Grael, que após perder uma perna em um
acidente, não desanimou. Naquela semana o atleta competira, apesar da deficiência física,
sagrando-se vencedor. Através deste exemplo, buscou-se incentivar os mesmos à ação (ou
reação?): “Tem gente que tem mais dificuldade que vocês (...) Tem gente que não tem
condição de estudar, de trabalhar. Não tem condição mental de saúde (...) Vocês são
saudáveis, são pessoas inteligentes! Vocês têm potencial, mas estão desperdiçando esse
potencial !”. Citou-se um exemplo concreto: “Olha o Lula. Ele nasceu no nordeste, na
seca, tinha dia que não tinha o que comer. Poderia ter se transformado em um ladrão.
Olha hoje o quê ele é?”. Rafael disse sorridente: “Ele foi engraxate!” (como eles). E a
professora/pesquisadora completou o raciocínio: “Hoje é Presidente da República”.
Buscou-se conscientizá-los do potencial de cada um, reforçando à auto-valorização e a
auto-estima: “Vocês não são coitadinhos, não!”. Após a discussão, voltou-se aos
exercícios. Os alunos demonstraram não ter paciência em repetir os exercícios. A
ansiedade era demonstrada através de atitudes de irritação e impaciência (parecia que
queriam que tudo acontecesse de imediato, com em um passe de mágica). Foi demonstrado
a eles à importância do processo. A repetição os levaria ao desenvolvimento de
habilidades, possibilitando, com isso, que pudessem vir a tocar seus instrumentos. A
professora/assistente relatou o fato de que uma orquestra faz vários ensaios para tocar em
um único concerto. Por outro lado, a professora/pesquisadora destacou que em uma
academia, os bailarinos ficam o ano inteiro preparando-se para dançar um ou duas vezes no
final do ano. Com isso, para que eles pudessem atingir o objetivo principal (recital), teriam
que se esforçar ao máximo. Após a conversa, retornou-se aos exercícios. Os alunos
estavam mais calmos, pareciam ter compreendido o quê lhes foi dito. Antes de iniciar o
trabalho com a mão esquerda, foi feito um trabalho de percepção. Primeiro, os alunos
escutaram a escala de Do M e depois repetiram cantando. Para introduzir-se a nota mi, fez
um trabalho de percepção com o intervalo de 2ªM (re-mi). O primeiro passo, ouvindo, o
segundo passo, cantando. Depois de assimilado o intervalo, o terceiro passo foi transpor
para o instrumento. Finalizando a aula, foi criada uma seqüência com as notas ré e mi, para
que o grupo pudesse solfejar e tocar.
136

FIGURA 54 - 16ª Intervenção/aula: 01.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento. Musicalização
utilizando o corpo.
Momento Revisão: Apostila: “Dedos”, Exercício 1.
Momento Finalizador: Trabalho solista-público (Interrupção da fita nos minutos finais da
aula).

Comentário: Neste dia, recebeu-se um aluno novato, Gabriel, que permaneceu na Oficina
de Cordas até os recitais finais. No momento relaxamento, foi feito um trabalho
interessante de musicalização, revisando os conteúdos teóricos ligados à leitura musical.
Inicialmente, trabalhou-se os parâmetros sonoros, grave e agudo. Na seqüência, foram
trabalhados os intervalos da tríade maior, a partir da nota dó, utilizando como parâmetro o
corpo (a nota dó seria localizada no umbigo, a ré, no peito e o mi, no nariz). Os alunos
entoavam os intervalos fazendo o movimento com as mãos, nas partes do corpo citadas47.
Improvisou-se algumas seqüências. Pediu-se para a professora/assistente tocar no piano
uma seqüência, para que se tentasse “adivinhá-las”, como em um ditado de intervalos, sem
escrita. Após essa atividade, tocou-se o intervalo ré-mi nos instrumentos, sem a leitura
musical, com o objetivo de fixar a afinação (toda a atenção dos alunos voltada para o
mesmo). Foram feitas algumas observações sobre a postura dos alunos, sobre como sentar
e segurar da maneira correta o instrumento. Voltou-se para apostila, trabalhando-se mão
esquerda (notas re-mi) e leitura musical. Após a leitura, fez-se rapidamente, mais uma vez,
o relaxamento, mas desta vez os alunos se mantiveram sentados. Antes de introduzir o fá#,
optou-se por trabalhar o pentacorde dó-sol (sem trabalhar a nota fá).

FIGURA 55 - 17ª Intervenção/aula: 06.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento. Musicalização.
Momento Revisão: Apostila : “Dedos” , Exercício 1.
Momento Conteúdo Novo: Introdução da nota fá#. Apostila: “Dedos”, Exercício 2.
Momento Finalizador: Trabalho solista/público.

Comentário: A aula foi iniciada a partir do trabalho de percepção e solfejo do intervalo re-
mi. Em seguida foi demonstrada a localização da nota mi na pauta. Trabalhou-se o
exercício 1, ora em naipes, ora todo o grupo. Notou-se uma melhora sensível na afinação

47
Já existe uma técnica para o trabalho de percepção, utilizando-se às mãos, denominada Manossolfa (que
inspirou a criação da estratégia/exercício).
137

do grupo. Os alunos ainda eram resistentes à fixação do conteúdo, através da repetição.


Roberto perdeu a paciência quando foi pedido para que o grupo repetisse a seqüência
novamente. Foi introduzida a nota fá#, fazendo-se o trabalho de escuta, canto e execução
instrumental dos intervalos ré-mi, mi-fá#. Após essa atividade, demonstrou-se a diferença
entre fá e fá#. Fez-se o trabalho com o corpo, mas agora todos estavam sentados
(ré/barriga, mi peito, fá# pescoço, sol nariz). Trabalhou-se a leitura do exercício 2, da
apostila. Ao final da aula, cada um foi à frente fazer a leitura do exercício, sendo aplaudido
pelo restante do grupo.

FIGURA 56 - 18ª Intervenção/aula: 08.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento. Musicalização.
Momento Revisão: Notas re, mi e fá# e sol (sem leitura).
Momento Conteúdo Novo: Introdução das notas si, dó# e ré.
Momento Finalizador: Atividade Solista/Público.

Comentário: O trabalho de leitura musical foi abandonado, temporariamente, para que o


trabalho com a mão esquerda fosse desenvolvido. Para se trabalhar a mão esquerda, devem
ser observadas questões como: postura, percepção, afinação, concentração. A decisão foi
motivada pelo fato de que já se aproximava o fim do semestre, bem como, o recital. Pesou-
se o quê seria mais importante para o grupo naquela altura: continuar o programa (que ao
que tudo indicava não teria os resultados esperados) ou modificá-lo, buscando estratégias e
atividades alternativas para que o grupo tivesse condição de apresentar-se. A segunda
opção foi escolhida. Acreditava-se que naquele momento, a motivação de apresentar-se em
público e a experiência em si, seriam mais importantes para aqueles meninos do que o grau
de dificuldade técnica da peça a ser apresentada. Percebeu-se que o grupo estava tendo
grande dificuldade de equilibrar os aspectos: postura correta, percepção musical e
execução instrumental e a leitura. Optou-se, portanto, em descartar a leitura e intensificar o
trabalho de consciência corporal (postura), percepção musical e execução instrumental,
lembrando-se do exemplo de Suzuki48. Em determinado momento houve uma “disputa”
pela estante. A professora/pesquisadora advertiu: “Tem que saber dividir. Dividir o
espaço, a comida, as roupas (...) e dividir a estante com os colegas”. No dia 13.11.02,

48
O educador musical japonês Shinichi Suzuki, desenvolveu um método de iniciação instrumental para
crianças, partindo da escuta e da execução instrumental, antes de se introduzir a leitura musical.
138

mais uma vez, todos faltaram à aula, por falta de transporte, prejudicando ainda mais, a
seqüência e o desenvolvimento do processo pedagógico.

FIGURA 57 - 19ª Intervenção/aula: 18.11.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Trabalho com a postura.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: trabalho com a mão esquerda em
pizzicato, ré, mi, fá# e sol ; trabalho com o arco (cordas soltas).
Momento Finalizador: Trabalho solista/público.

Comentário: Marcou-se alguns encontros extras, devido ao excesso de faltas do grupo. A


intervenção/aula, ora comentada, teve carga horária menor (apenas 1 hora) e foi conduzida
somente pela professora/pesquisadora. Buscou-se a fixação e o amadurecimento do
conteúdo já dado. Primeiramente, trabalhou-se a percepção musical, através da escuta, do
solfejo e do transporte dos intervalos para o instrumento. Após esta atividade, trabalhou-se
as cordas soltas com o arco, observando-se o posicionamento correto e a afinação na
arcada.

FIGURA 58 - 20ª Intervenção/aula: 20.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Trabalho com re, mi, fá# , sol e lá,
si, do# , ré.
Momento Finalizador: Exposição dos objetivos e conteúdo da próxima aula.

Comentário: Optou-se em trabalhar mais detalhadamente a percepção e execução dos


intervalos já estudados. O objetivo maior era que o grupo fixasse o conteúdo passado,
visando à apresentação pública. Observou-se a mudança de comportamento do grupo. Os
alunos estavam cada vez mais disciplinados, melhorando o desenvolvimento do grupo.

FIGURA 59 - 21ª Intervenção/aula: 22.11.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Trabalho com as cordas soltas em
pizzicato e com arco.
Momento Finalizador: Improvisação e Criação.

Comentário: Iniciou-se a intervenção/aula trabalhando com as cordas soltas (lá, ré e sol),


primeiramente, em pizzicato e depois, com o arco. A professora/assistente tentou ajudar
139

Roberto a corrigir o seu posicionamento de arco, porém, ele não aceitou: “Me dá o arco
logo! Que enjoêra!” . A professora/assistente, por sua vez, observou: “Eu estou te
ajudando!”. Para que os alunos ficassem mais motivados, falou-se sobre o recital e o
programa previsto. Pediu-se para que a professora/assistente tocasse ao violino a peça “A
Conquista do Paraíso”, de Vangelis. Quando a mesma iniciou a execução, Roberto afirmou
agressivamente: “Que palhaçada!”. A professora/pesquisadora perguntou: “Ah é? Por
quê?”. Roberto abaixou a cabeça e começou a resmungar. Nota-se que o aluno não estava
pronto para apreciar a execução da peça, sem se sentir diminuído. Pediu-se que a
professora/assistente tocasse novamente. Após a execução, todos aplaudiram. Para que os
alunos sentissem a seriedade de apresentar-se em público e a liberdade de escolha que
tinham, a professora/pesquisadora perguntou: “Vocês querem participar do recital? Quem
quiser levante a mão?”. Todos levantaram. Nota-se que não há imposição. O quê sempre
se tentou demonstrar foi que depois de feita a escolha, o grupo deveria cumprir com o
compromisso assumido. Para isso, era preciso dedicação e seriedade. Discutiu-se o
programa do recital e o fato de estar estudando música ser uma oportunidade única. por
isso, não deveriam desperdiçar. Neste momento, a aluna Elvira, do grupo COMUNIDADE
entrou em sala de aula, sendo apresentada para o grupo. Aproveitando a oportunidade da
aluna estar em sala, buscou-se o relato da aluna, a partir da pergunta: “Elvira, quando você
era criança, você teve oportunidade de estudar música?”. Elvira respondeu: “Não. Eu era
louca para estudar música mas meus pais não tinham condições de pagar professores
para mim”. Após a resposta, a professora/pesquisadora comentou: “Estão vendo. Tem
muita gente rica que nunca teve a oportunidade de estudar música!”, demonstrando aos
alunos a valiosa oportunidade que estavam tendo. A aula foi encerrada com um trabalho de
criação e improvisação.

FIGURA 60 - 22ª Intervenção/aula: 25.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Trabalho com cordas soltas em
pizzicato e com o arco; ênfase no trabalho de manutenção da pulsação (contagem em voz
alta).
Momento Finalizador: Encerrou-se anunciado os objetivos da próxima intervenção/aula.

Comentário: A intervenção/aula foi iniciada com um trabalho de pulsação. Buscando-se a


concentração do grupo, pediu-se para cada aluno fizesse a contagem em voz alta, inclusive
dando a entrada para os demais. A professora/pesquisadora ensinou o grupo, a fazer a
140

contagem e como dar o sinal de entrada. Cada um teria a chance de ser o spalla49, fazendo
a contagem e dando a entrada. O trabalho foi feito com as cordas soltas lá, ré e sol. Foram
reafirmados conteúdos ligados à postura e a arcada. Planejou-se a preparação da peça
“Conquista do Paraíso” para o recital, onde os alunos tocariam com os veteranos. A parte
destinada ao grupo CEACA, seria a do acompanhamento, a partir das cordas soltas, em
mínimas pontuadas. Durante a aula, a professora/assistente tocou a melodia e o grupo, a
parte inicial do acompanhamento, especialmente arranjado para o grupo. Porém, os alunos
não conseguiram concentrar-se e manter-se na postura por muito tempo. Encerrou-se a
intervenção/aula, alertando aos alunos de que não deveriam mais faltar, pois o recital
estava próximo.

FIGURA 61 - 23ª Intervenção/aula : 27.11.02

Momento Inicial: Organização da sala e chamada.


Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento. Atividade visando a
integração e a socialização do grupo.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Trabalho de arcada com cordas soltas.
Momento Finalizador: Encerrou-se anunciado os objetivos da próxima intervenção/aula.

Comentário: A aula iniciou com o relaxamento (já que os alunos chegaram em sala de aula
muito agitados). Em seguida, foi proposta uma atividade visando à integração e a
socialização do grupo. Pediu-se para fazer a atividade de dupla, onde os alunos deveriam
rapidamente conversar sobre o seu dia-a-dia. Após a conversa, trocaria-se os papéis, cada
um falaria sobre a vida do outro. Porém, no meio da atividade Roberto gritou: “Olha a
porrada!”. E todos correram para fora da sala. Depois do incidente, os alunos foram
advertidos para que não tomassem mais essa atitude e se concentrassem mais nas
atividades e exercícios propostos. Foram iniciados os exercícios com cordas soltas. A aula
estava tumultuada, devido ao clima de “bagunça”, instaurado pelos alunos antes que a
intervenção/aula fosse iniciada. O fato ocorrido extra-sala, influenciou no comportamento
geral do grupo. Foi falado para que não perdessem a oportunidade de aprender, que
ficassem mais atentos. Luiz ficou emburrado. A professora/pesquisadora explicou:“Não
fica chateado com o quê a gente fala. Nós queremos o bem de vocês. Queremos que vocês
aproveitem bem essa oportunidade” . Rafael complementa: “É única!”. Rafael levanta e

49
Spalla : “Termo internacionalmente utilizado para designar o principal primeiro-violino de uma orquestra”
(Dicionário GROVE de Música, p.891).
141

foi conversar com Luiz para ver o quê estava acontecendo. Rafael demonstrou
preocupação com o colega, e foi tentar ajudá-lo. Nota-se o desenvolvimento do sentimento
de solidariedade e companheirismo. Trabalhou-se o arco, a partir das cordas soltas, de
maneira enfática. Depois de encerrada a intervenção/aula, alguns alunos se retiraram da
sala e Pedro continuou tocando violino. Rafael e Josimar esperaram e escutaram o colega.
Observa-se o aumento do respeito, através do ouvir o outro.

FIGURA 62 - 24ª Intervenção/aula : 29.11.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Relaxamento: Exercícios de alongamento e relaxamento.
Momento Fixação e Amadurecimento do Conteúdo: Trabalho de arcada com cordas
soltas.
Momento Conteúdo Novo: Trabalho rítmico com a estrutura da canção folclórica
“Bambalalão” . Acompanhamento da peça Bambalalão (RE2 LA2 RE2 LA2 RE2
MI2 LA2 RE2 )
Momento Finalizador: Tocou-se a toda a seqüência da peça preparada para p o Recital.

Comentário: A abertura da intervenção/aula foi com um aviso, informando que o recital de


encerramento já havia sido marcado e seria no dia 08.12.02, no Centro Cultural “Martim
Cererê”. Falou-se que a peça “Bambalalão” seria trabalhada, visando a apresentação.
Também foi dito que, conforme o aprendizado do grupo, poderia ser trabalhada uma outra
peça folclórica, “Nesta Rua”. Fez-se um arranjo para a peça, onde os alunos tocariam o
acompanhamento, com cordas soltas e um pianista faria a melodia. O trabalho foi iniciado,
a partir da estrutura rítmica. Pediu-se para que todos falassem, várias vezes, a letra50 da
peça, no ritmo correto. Depois todos pensariam na letra, mas fariam a percussão nos
instrumentos. Os alunos foram alertados que a percussão deveria ser suave, feita com os
dedos indicador e médio da mão direita. Pediu-se a professora/assistente que tocasse ao
violino a melodia da peça. Em seguida, a professora/pesquisadora tocou junto com a
professora/assistente, o acompanhamento destinado ao grupo, para que os alunos
entendessem o quê estava sendo pedido e como soaria a melodia e o acompanhamento. O
acompanhamento foi passado ao grupo. Primeiramente, todos tocaram juntos. Depois,
ouviu-se um a um. Josimar começou a fazer comentários e brincadeiras, causando
dispersão. Os alunos foram advertidos para terem mais responsabilidade e seriedade com o
compromisso assumido: “A vida é assim. Se você não tem seriedade e compromisso com

50
“Bambalalão, Senhor Capitão. Espada na cinta e ginete na mão”.
142

as coisas e o outro tem, você tá fora!”. Em tom de desabafo, perguntou-se a Josimar, que
estava fazendo cursos de mecânica: “E no SENAI? Você faz essa bagunça?”. Josimar
respondeu:“Não”. A professora/pesquisadora prosseguiu : “Porque se você fizer bagunça,
lá, você está fora. Não tem segunda chance!”. Portanto, buscou-se através do diálogo 51,
que os alunos se conscientizassem de que aquela era uma aula séria, como as outras, e que
deveriam ter o comportamento adequado. Não era porque se trabalhava o lúdico nas
atividades de improvisação, criação, relaxamento, buscando a melhora do corpo, da mente
e do espírito, resgatando a auto-estima, a auto-valorização e a alegria, que aquela não era
uma aula séria. Pelo contrário, aquela aula era muito séria! No decorrer da aula trabalhou-
se a peça, a partir da percussão e do canto, além do trabalho instrumental.

FIGURA 63 - 25ª Intervenção/aula: 04.12.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Ensaio: “Bambalalão” Folclore Brasileiro.
Momento Finalizador: Imaginou-se estar no palco (entrada, execução, agradecimento e
saída).

Comentário: A intervenção/aula foi iniciada com o trabalho rítmico (percussão no


instrumento). Primeiramente, pediu-se para que os alunos falassem a letra com o ritmo.
Depois, que falassem a letra, fazendo o ritmo através da fala e de palmas. Por fim, a
seqüência foi executada através da percussão, no instrumento. Para que os alunos
rememorassem o acompanhamento, escreveu-se no quadro negro, através da escrita
esquemática, a seqüência: RE2 LA2 RE2 LA2 RE2 MI2 LA2 RE2 . Pediu-se para
que todos falassem a seqüência, várias vezes, até que memorizassem. Após esta fase, foi
pedido para que tocassem (primeiramente, em pizzicato e depois, com o arco) a seqüência.
Algumas vezes, a seqüência foi executada por naipes, outra vezes, cada aluno
individualmente. Para que os alunos se sentissem mais motivados, pediu-se para que a
professora/assistente sentasse no semicírculo e tocasse junto com o grupo. Decidiu-se que
a peça iniciaria com a percussão, depois com o acompanhamento (o piano faria a melodia)
e no fim, voltaria com percussão e voz (todos falando a letra). Tentou-se fazer com quê os
alunos cantassem a melodia, porém, muitos não conseguiram entoar algumas notas de
maneira afinada. Quando estava sendo explicado como seria a seqüência da peça, Luiz
irritou-se. Ficou impaciente, queria tocar. A professora/pesquisadora teve que advertir: “Se

51
Vide “Pedagogia do Oprimido”, Paulo Freire.
143

eu estou explicando, é importante!”. Nesse dia, a pulsação do grupo não estava boa, os
sons estavam desencontrados. No fim da aula, foi proposto ao grupo que imaginassem que
já estavam no dia da apresentação e que a sala de aula era o palco. Ensaiou-se a entrada, a
execução da peça, os agradecimentos e a saída. Luiz pediu para que fizesse a atividade
solista/público. A professora/pesquisadora disse que faltava apenas uma aula (ensaio) para
o recital e que não seria possível trabalhar individualmente (já que iriam se apresentar em
grupo). Novamente, Luiz ficou aborrecido. A professora/pesquisadora esclareceu: “Aqui
todos temos que tocar em grupo. Você tem que ter paciência para esperar!”. Já
finalizando a intervenção/aula, Roberto provocou Luiz e levou um chute.

FIGURA 64 - 26ª Intervenção/aula: 06.12.02


Momento Inicial: Organização da sala e chamada.
Momento Ensaio: “Bambalalão”, Folclore Brasileiro.
Momento Finalizador: Avisos sobre o recital.

Comentário: A fita estava estragada, não sendo possível a filmagem.

5.4.4. Observações e/ou análises das Intervenções/Aulas do grupo CEACA

Seguindo as categorias listadas na análise das intervenções/aulas do grupo


COMUNIDADE, passar-se-á a análise dos principais aspectos observados no decorrer do
processo de desenvolvimento do grupo CEACA.
Primeiramente, constatou-se que a faixa etária dos sujeitos estava entre de
12-17 anos e o nível de escolaridade, variava da 4ª a 7ª série ginasial. O desenvolvimento
musical dos sujeitos do grupo CEACA ocorreu de forma diferenciada, abaixo dos grupos
de iniciantes (pré-experimentais) que já participaram da Oficina de Cordas. Esse fator é
decorrente de alguns aspectos referentes às categorias freqüência, rendimento e relações
interpessoais.
Em relação à freqüência, observou-se que até a 16ª intervenção/aula, houve
uma alta rotatividade de sujeitos. Só pode-se ter nove (9) sujeitos fixos, que chegaram até o
término do semestre, a partir da intervenção/aula mencionada. Apesar de sete (7) sujeitos
terem iniciado desde as primeiras intervenções/aulas, a alta rotatividade de sujeitos, ou
seja, a grande quantidade de sujeitos “flutuantes”, atrapalhou o planejamento e
desenvolvimento semestral. Esse fato ocorreu devido o caráter experimental do trabalho. A
144

CEACA tem como norma à inserção social através de atividades que possam desenvolver
as habilidades e capacitações de cada sujeito. Com isso, sempre que um sujeito pedia para
“experimentar” à aula de música, os educadores do CEACA encaminhavam os sujeitos
para a Oficina de Cordas. Tomando como base o aspecto inserção social, a alta
rotatividade dos sujeitos pode ser analisada como uma oportunidade de sujeitos menos
favorecidos terem experiências musicais, em contato com um ambiente diferenciado, que é
o universitário. Porém, esse foi um dos fatores que prejudicou o desenvolvimento musical
dos alunos. Um outro fator ligado à categoria analisada, refere-se a um período de catorze
(14) dias que o grupo ficou sem freqüentar a Oficina de Cordas, devido a problemas de
transporte e/ou confusões com o horário (já que o CEACA era responsável pelo mesmo). A
partir do dia 18.10.2002, que seria a 15ª intervenção/aula, o grupo passou a faltar ou
chegar atrasado pelos motivos mencionados, prejudicando o desenvolvimento do mesmo.
Da mesma forma, por se tratar de um projeto pioneiro na cidade, a imprensa, tanto
televisiva quanto impressa, visitou constantemente a Oficina de Cordas durante as
intervenções/aulas, interrompendo-as.
Com isso, o rendimento (técnico-musical) do grupo analisado, ficou
prejudicado. O grupo, foi o único dos iniciantes já trabalhados, que não conseguiu tocar as
peças “Brilha, Brilha Estrelinha” e “Frère Jacques”, pelos motivos mencionados, pela
dificuldade de leitura e acompanhamento na partitura (até mesmo através da escrita
esquemática). Pelos motivos expostos, o repertório estudado foi adaptado (arranjado),
especialmente para o grupo, ou seja, trabalhou-se a peça folclórica “Bambalalão”. Apesar
destes aspectos, o grupo conseguiu apresentar-se em público, que era o objetivo principal
do semestre, por duas vezes, fazendo duas (2) apresentações públicas/recitais. O nível
técnico-musical da peça foi adaptado de acordo com as condições e a compreensão dos
sujeitos.
As questões relacionadas ao desenvolvimento musical, da mesma forma,
estão diretamente ligadas às relações interpessoais entre os sujeitos. Observou-se, no
início do experimento, que o comportamento do grupo não colaborava para o
desenvolvimento do ensino-aprendizagem, faltando ao grupo, disciplina, organização,
respeito mútuo, cooperação e solidariedade. Porém, com o desenvolvimento do
processo pedagógico, a partir do trabalho de conscientização e discussões em sala de aula,
observou-se com clareza, uma mudança de comportamento do grupo, levando tanto a
transformação individual dos sujeitos, quanto à transformação coletiva.
145

5.5. PROTOCOLOS: DEPOIMENTOS E RECITAIS

5.5.1. Depoimentos

A coleta dos depoimentos ocorreu entre os dias 27.11.02 a 11.12.02, portanto,


já no final do semestre. Os depoimentos dos sujeitos do grupo COMUNIDADE, ocorreram
em salas de aulas fechadas, na própria Escola de Música e Artes Cênicas, na Praça
Universitária, Campus I (com exceção do depoimento da aluna Milene que ocorreu no
pátio da EMAC, no Campus II).
Os depoimentos dos sujeitos do grupo CEACA, ocorreram no pátio da própria
instituição, no horário de almoço. Esta foi à opção mais viável, já que não foi possível
coletar os depoimentos em sala de aula ou em sala fechada (os alunos eram transportados
pela instituição, tendo horário a cumprir). Com isso, decidiu-se ir ao CEACA e fazer as
entrevistas no local onde os alunos almoçavam, no pátio. De certa maneira, esses
depoimentos foram prejudicados, pois, em determinados momentos, alguns sujeitos
interferiram no depoimento do colega.

5.5.1.1. Roteiro para a coleta dos depoimentos

O roteiro para a coleta dos depoimentos dos sujeitos foi semi-estruturado,


com o objetivo de extrair o máximo de elementos possíveis, de acordo com as respostas e
comportamento de cada sujeito. BORGES (2001), no seu estudo intitulado: “O Ensino do
Piano e Desenvolvimento da Autonomia: Uma Experiência Inovadora” e ZANINI (2002)
em “Coro Terapêutico – Um Olhar do Musicoterapeuta para o Idoso no Novo Milênio” ,
também utilizaram o mesmo tipo de roteiro.
Um aspecto interessante a ser comentado, é que alguns componentes do grupo
CEACA tiveram dificuldade em compreender algumas palavras ou o sentido de algumas
perguntas. Por isso, o roteiro foi adaptado de acordo com a realidade do grupo
mencionado. A pergunta 11, referente à apresentação pública só foi mencionada para os
sujeitos que já haviam se apresentado no dia em que o depoimento foi colhido. No grupo
COMUNIDADE não se conseguiu entrevistar Sérgio. Da mesma forma, no grupo
CEACA, João não foi entrevistado.
146

Antes ser iniciado o depoimento com as questões abaixo relacionadas, pediu-


se para que cada sujeito se apresentasse, falando seu nome e idade. Este trecho das
entrevistas , bem como, as saudações finais não foram transcritas.

FIGURA 65 – Roteiro dos depoimentos dos sujeitos


ROTEIRO

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


2. Você está gostando?
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
7. Você recomendaria para outras pessoas?
8. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?

5.5.1.2. Depoimentos dos sujeitos do grupo COMUNIDADE

FIGURA 66 – Depoimento 1
DEPOIMENTO 1: Nalanda (13 anos)

1. O quê significa para você estar participando das Oficinas de Cordas?


N: Um sonho.
2. Me fale um pouco desse sonho?
N: Quando eu era menor meu pai sempre tinha vontade que eu tivesse um instrumento, só
que meu negócio era cantar. Mas aí um dia, porque eu sou evangélica, um dia Deus deu
uma revelação para a minha irmã dizendo que ia botar um instrumento na minha mão. Aí,
meu pai pegou, ele tinha vontade que eu fizesse violino, eu fiz uma aula experimental e
gostei. Aí, depois não quis mais parar.
3. Você está gostando de participar das Oficinas?
N: Tô. Tô indo melhor do que quando eu fazia aula particular. Individual é muito ruim.
Você não tem motivação. Igual eu tinha que treinar uma hora todo o dia por semana. Eu
não tinha motivação pra ficar fazendo aquele trem sozinha, sem ninguém. Era ruim. Eu não
via ninguém tocar. O máximo que eu fazia era quando o meu professor ia fazer recital, aí
eu ia. Ou então, tinha assim, quando alguém chamava e tal.
4. Qual é a diferença entre o ensino individual e o coletivo?
N: Tem motivação. Você vê pessoas começando juntos com você. Aprendendo. Igual, eu
não fazia, não tinha progresso, por isso que eu mudei. Aí, é melhor. Você vê pessoas
tocando, você vê que você tá acompanhando. É muito melhor. Eu não conhecia o cello.
147

Estou morrendo de vontade de aprender a tocar o cello também.


5. O quê você mais está gostando ? Qual é o aspecto que você mais gosta?
N: Ah, aprender! É mais motivante.
6. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
N: Acho bom. Não sei.
7. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
N: Eu acho que funciona. Porque eu não dava conta de ler partitura, agora eu dou conta. Eu
não dava conta. Eu não sabia o que era mínima, semínima, o que era isso. Mesmo eu
fazendo, eu decorava para mim tocar. Agora eu não decoro, eu dou conta.
8. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
N: Hã, hã (acenando positivamente com a cabeça)
9.Você recomendaria para outras pessoas?
N: Recomendaria.
10. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
N: O que eu mais queria, tocar violino! Sei lá, aprendi tipo, eu era muito tímida, se alguém
pedisse para eu tocar violino na frente, eu saía correndo. Agora não, se pedir, eu já toco. Eu
não desinibi totalmente, mas eu já desinibi, muito.
11. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
N: Mudou. Sei lá, agora assim, eu fiz mesmo para tocar na igreja, que meu pai quer que eu
toque na igreja e eu também quero. Sei lá. Muita, muita coisa. Agora eu sei tocar. Arrumei
uma atividade pra mim.
12. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
N: Muito bom. Apesar do nervosismo, da confusão, do medo na hora de entrar. Foi bom!
13. Você gostou de tocar em grupo?
N: Gostei. É bom. Porque você tem a ajuda dos colegas, sabe? Você vê eles fazendo isso,
você vai querer fazer junto.
14. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
N: Eu acho que as aulas são boas. Pelo que eu já vi, eu acho que o projeto devia continuar
enquanto tiver como.

COMENTÁRIO 1: A aluna confirmou os depoimentos dos educadores musicais


entrevistados, bem como, o referencial teórico do capítulo 3, que aborda as vantagens
didáticas do ensino coletivo, quando afirmou que a motivação da aula em grupo era um dos
aspectos que a fez gostar das aulas coletivas. Perguntada sobre estar gostando da
experiência coletiva, a aluna afirmou: “Tô indo melhor do que quando eu fazia aula
particular. Individual é muito ruim. Você não tem motivação. Igual eu tinha que treinar
uma hora todo o dia por semana. Eu não tinha motivação pra ficar fazendo aquele trem
sozinha, sem ninguém”. A aluna comentou ainda que não conhecia o violoncelo, o que
significa que o ensino coletivo heterogêneo faz com que o aluno conviva com instrumentos
não muito populares, ampliando a sua formação musical e cultural. Sobre a metodologia de
ensino coletivo, a aluna afirmou: “Eu acho que funciona, Porque eu não dava conta de ler
partitura, agora eu dou conta (...) Eu não sabia o que era mínima, semínima, o que era
isso. Mesmo eu fazendo, eu decorava para mim tocar. Agora eu não decoro, eu dou
148

conta”. A partir desse depoimento, notou-se que o aprendizado em grupo é eficiente no


sentido de ajudar na construção do conhecimento do aluno, ligando os conceitos teóricos à
prática musical. Sobre as habilidades que a Oficina de Cordas teria desenvolvido na aluna,
a mesma afirmou que a atividade musical em grupo proporcionou uma melhora na sua
inibição e timidez: “eu era muito tímida, se alguém pedisse para eu tocar violino na
frente, eu saía correndo. Agora não, se pedir, eu já toco”. Sobre o tocar em grupo, a aluna
destacou o companheirismo estabelecido pelos sujeitos: “É bom. Porque você tem a ajuda
dos colegas, sabe?”. Ao final sugeriu que o projeto de ensino coletivo estabelecido pela
Oficina de Cordas continuasse enquanto fosse possível.

FIGURA 67 – Depoimento 2
DEPOIMENTO 2: Elvira (47 anos)

(A aluna ao se apresentar, iniciou os comentários sem ser perguntada previamente)


Eu comecei a fazer no semestre anterior, o ano passado. Eu comecei a fazer viola, mas a
turma já tinha 6 (seis) semanas de aula. Eu peguei tudo de ouvido, nada de partitura. Eu
não tinha condição pegar. E resolvi, nesse semestre, voltar para pegar desde o comecinho
né. Que eu senti assim, foi bom, mas seria muito melhor se eu tivesse praticado em casa,
porque só aqui, parece que a gente entende, grava tudo, mas é preciso memorizar mais as
notas na partitura. Eu já identifico muito, a maioria, mas tem hora, eu vou muito pelo
número do dedo, do que pela nota.
1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?
(A aluna emocionou-se e pediu para a filmagem fosse interrompida)
E: O quê significa estar nessa Oficina de Cordas? Significa ... pra mim está tendo uma
importância muito grande, porque tá me dando mais tranqüilidade, tá me dando acho que
mais alegria. Eu estava numa depressão muito grande e muito estressada, sabe? De
trabalho. Eu dei uma parada e vim procurar a música como uma terapia, para fazer uma
coisa mais prazerosa. Mas eu sinto que ainda tô meio... essa dificuldade me bota, ás vezes,
ansiosa. É muito importante pra mim, não deixo a música por nada nessa vida.
2. Você está gostando?
E: Tô. Eu gosto. Eu queria estar sabendo mais, ter treinado mais. Às vezes, eu acho assim,
foi tanta coisa no finalzinho, né, que foi jogado assim, mas eu acho que eu tô evoluindo
bem. É gostoso, o ambiente, essas relações nossas de, entre colegas, a gente descobrir que
o colega da gente é colega de escola do meu filho. É bom, apesar de ser tão rápido o
contato antes das aulas, mas é gostoso. E a música também é prazerosa. A gente toca.
Tocar em conjunto é muito bom porque uma dificuldade sua é suprida pelo conjunto e aí
fica gostoso.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
E: Como que a coisa flui. Às vezes você nem assimilou ainda, nem captou e já está
tocando porque o método permite tocar. Eu acho que o que me chama atenção, às vezes, é
a facilidade de aprender e o conjunto, a beleza da música. A música clássica é muito
bonita!
4. O quê você não está gostando ?Tem algum aspecto que você não gosta?
E: Não, não. Eu acho é que eu senti dificuldade de tá passando as fases, de memorizar as
149

notas, né. Como aprendi violão de ouvido, eu também fui pra essa mesma ala, por esse
mesmo caminho. Agora que eu percebi que eu tenho que tirar. Eu tô fazendo percepção
musical. Isso tá me ajudando muito a identificar as notas. Tá bom.
5. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
E: Eu vou continuar.
6. Você recomendaria para outras pessoas?
E: Ah recomendo! Eu tenho até uma colega de percepção musical, ela é muito alta e fala
que tem vontade de tocar cello. Ela disse que vem o semestre que vem.
7. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
E: Gostei. Ela é muito boa. Adorei.
8. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
E: Eu acho que no conjunto me ajudou até na prova de teoria, agora, a identificar a nota na
pauta. Mas eu só dei o clique, assim, no finalzinho, quando eu peguei nas músicas para
fazer o primeiro recital, né, que nós fizemos na semana passada. Aí que eu comecei a ligar
a teoria com a prática. Mas eu estava tomando os remédios, por isso que eu demorei, eu
vinha ainda meio sonolenta para a aula. Aí depois que eu comecei a captar a música. Eu tô,
desde que eu comecei, entrar no caminho.
9. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
E: Mudou. Parece que dá mais, parece que segurança, mais autonomia. Parece que é
impressionante com é que ta, a melhoria que eu sinto, eu deixei de fazer análise, que estava
fazendo, né, foi tanta mudança que eu dei na minha vida. Eu dei um basta. E eu acho que a
música está me ajudando a caminhar para esse lado também. Está me dando mais
tranqüilidade.
10. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
E: No primeiro, eu fiz, eu fiquei bem nervosa. Ainda mais que o meu filho tava gravando,
filmando, aí eu falei: ‘Aí!!’. Mas parece que o segundo, parece que foi mais tranqüilo. O
segundo foi bem tranqüilo.
11. E sobre tocar sozinha? Você sentiu diferença em tocar em grupo?
E: Eu participava assim, tocava na igreja violão em conjunto. Eu não tenho muita inibição
não. Eu fico nervosa de, às vezes, não tá dominando a música quando eu tocava. O fato de
tocar em público não me inibe. Me inibe se eu estiver nervosa, insegura em relação a
música. O que eu tiver tocando.
13. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
E: Eu acho que eu tô no caminho certo. Não sei. Teria que ter mais treino, eu teria que
estudar mais. Eu acho que tá bem Flavia. nós precisamos é tocar.

COMENTÁRIO 2: No início do depoimento da aluna, percebeu-se que a mesma tem


consciência que a metodologia funciona, mas para que atinja o resultado esperado, o aluno
deve iniciar seus estudos desde a primeira intervenção/aula: “Eu comecei a fazer no
semestre anterior, o ano passado. Eu comecei a fazer viola, mas a turma já tinha 6 (seis)
semanas de aula. Eu peguei tudo de ouvido, nada de partitura. Eu não tinha condição
pegar. E resolvi, nesse semestre, voltar para pegar desde o comecinho, né”. Ao ser
perguntada sobre o que significava estar participando da Oficina de Cordas, a aluna
emocionou-se e a gravação foi interrompida. Essa reação se deveu ao fato da aluna,
naquele momento, estar passando por um processo de recuperação de uma depressão. E a
150

Oficina de Cordas contribuiu para ajudá-la nesse processo: “pra mim está tendo uma
importância muito grande, porque tá me dando mais tranqüilidade, tá me dando acho que
mais alegria. Eu estava numa depressão muito grande e muito estressada, sabe? De
trabalho. Eu dei uma parada e vim procurar a música como uma terapia, para fazer uma
coisa mais prazerosa. Mas eu sinto que ainda tô meio... essa dificuldade me bota, ás vezes,
ansiosa. É muito importante pra mim, não deixo a música por nada nessa vida”. Quando a
aluna foi perguntada se estava gostando da Oficina de Cordas, a mesma destacou que a
atividade era prazerosa e que as relações existentes entre os colegas era bastante positiva.
Ressaltou que a dificuldade individual era suprida pelo grupo. Um ponto detectado no
depoimento, se refere à preocupação excessiva da aluna com o seu desenvolvimento (sua
ansiedade foi demonstrada na resposta anterior): “Eu queria estar sabendo mais, ter
treinado mais”. Da mesma forma, quando lhe foi perguntado se haveria algum aspecto
negativo, a aluna respondeu como se a pergunta fosse direcionada para as suas falhas
individuais: “Eu acho é que eu senti dificuldade de tá passando as fases, de memorizar as
notas (...)”. Outro ponto interessante a ser destacado, está relacionado às habilidades que a
aluna acreditou ter desenvolvido. No depoimento, a aluna afirmou que o trabalho em
conjunto a ajudou na prova de teoria, fazendo com que identificasse melhor a notação na
pauta, ligando a teoria à prática musical: “quando eu peguei nas músicas para fazer o
primeiro recital, né, que nós fizemos na semana passada. Aí que eu comecei a ligar a
teoria com a prática”. Sobre a experiência musical em grupo estar refletindo na sua vida, a
aluna afirmou que se sente mais segura, tranqüila e com mais autonomia, tendo deixado de
fazer análise: “Mudou. Parece que dá mais, parece que segurança, mais autonomia.
Parece que é impressionante com é que tá a melhoria que eu sinto, eu deixei de fazer
análise, que estava fazendo, né, foi tanta mudança que eu dei na minha vida. Eu dei um
basta. E eu acho que a música está me ajudando a caminhar para esse lado também. Está
me dando mais tranqüilidade”.

FIGURA 68 – Depoimento 3
DEPOIMENTO 3: Juan (12 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


J: Apertou. Significa. Sempre tive curiosidade para aprender música, aprender um
instrumento. Então, é uma espécie de obra. Eu venho aqui para aprender e para divertir
também. Por curiosidade sobre tudo. A oficina para mim é como uma saída para mim de
aprendizado, explorando, como se estivesse explorando um novo horizonte.
151

2. Você está gostando?


J: Estou.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
J: Dos recitais. Até agora não participei de nenhum mas achei bom. Quero participar, quero
aprender mais.
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
J: Não.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
J: Acho que é melhor do que o individual. Além de aprender ser mais companheiro um do
outro. Você aprende com seus próprios erros e aprende com os erros dos outros. Aprende
com as virtudes dos outros. Em conjunto, um ajuda o outro. Acho muito melhor do que
estudar individualmente.
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
J: Gostaria
7. Você recomendaria para outras pessoas?
J: Recomendei.
8. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
J: Gostei. Na verdade nós temos 5 (meses)?
Não, menos de 4 (quatro).
J: Menos de 4 (quatro) e já, a gente já tá tocando! Se fosse qualquer outro método, nós
ainda estávamos na teoria. Eu acho que eu não tenho paciência para a teoria, por isso, que
eu venho nessa Oficina de Cordas, sem teoria.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
J: Pulsação. Não tinha nada, quase nada. Pulsação, ouvido, quê mais? Pulsação. Ouvido.
Movimentos mais corretos e um punhado de coisas...
Você poderia lembrar desse punhado de coisas?
J: Ler partitura, interpretar tempo, seguir a pulsação, não só do professor, mas do grupo. E
só.
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
J: Mudou. Agora eu já sinto uma pessoa que conhece pouco mais da música. Que pode
aplicar um pouco mais de música na vida. Por exemplo: eu não tenho nada pra fazer, vou
lá e toco uma música (...). E eu acho muito legal. Além de você poder tocar, por exemplo,
em uma igreja, uma coisa assim.
11. Você não tocou no recital passado, mas como você se imagina tocando no recital ?
J: Vai ter nervo. Vai ter nervo. Vai ser bom.
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
J: Não.

COMENTÁRIO 3: O aluno iniciou o seu depoimento da seguinte maneira: “Sempre tive


curiosidade para aprender música, aprender um instrumento. Então, é uma espécie de
obra. Eu venho aqui para aprender e para divertir também. Por curiosidade sobre tudo. A
oficina para mim é como uma saída para mim de aprendizado, explorando, como se
estivesse explorando um novo horizonte”. O aluno demonstrou que sempre teve a vontade
de aprender a tocar um instrumento e que a Oficina de Cordas foi o local onde ele teve a
oportunidade de iniciar seus estudos musicais, de forma lúdica, “explorando um novo
152

horizonte”. Ao ser perguntado sobre o ensino em grupo, o aluno afirmou que o mesmo
seria melhor do que o ensino individual, por despertar um sentimento de companheirismo,
onde “você aprende com seus próprios erros e aprende com os erros dos outros. Aprende
com as virtudes dos outros. Em conjunto, um ajuda o outro. Acho muito melhor do que
estudar individualmente”. Nota-se que a experiência coletiva desperta o sentido de
cooperação, além do companheirismo já mencionado, proporcionando aos indivíduos um
maior entendimento sobre a importância e benefícios das práticas coletivas. Quando o
aluno foi perguntado sobre a metodologia aplicada, o aluno demonstrou que soube captar a
filosofia do ensino coletivo se comparada a outros métodos tradicionais: “Menos de 4
(quatro) e já, a gente já ta tocando ! Se fosse qualquer outro método, nós ainda estávamos
na teoria. Eu acho que eu não tenho paciência para a teoria, por isso, que eu venho nessa
Oficina de Cordas, sem teoria”. Nota-se que na fala do aluno, a observação de que nos
métodos tradicionais de ensino de música, há um apego excessivo ao ensino da teoria
musical, sem a valorização da prática musical (que é a razão da existência da teoria da
música!). Portanto, há um contra-senso: deve-se valorizar, cada vez mais, as práticas e
vivências, principalmente, as coletivas, no sentido de reforçar a sensibilização e o
entendimento do indivíduo para a sua existência dentro do grupo (e da sociedade!). Sobre
as mudanças em sua vida provocadas pelo ensino musical, Juan afirmou que: “agora eu já
sinto uma pessoa que conhece pouco mais da música. Que pode aplicar um pouco mais de
música na vida. Por exemplo: eu não tenho nada pra fazer, vou lá e toco uma música (...)
E eu acho muito legal. Além de você poder tocar, por exemplo, em uma igreja”. Observa-
se que o aluno já conseguiu fazer uma conexão entre o ensino musical e a sua vida
cotidiana.

FIGURA 69 – Depoimento 4
DEPOIMENTO 4: Heitor (17 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


H: Aprimorar. Assim, ter alguma coisa pra fazer. Por que assim, tem gente que não faz
nada. Ah, não sei como é que explica”.
2. Você está gostando?
H: Bastante.
3. O quê você mais está gostando ? Qual é o aspecto que você mais gosta?
H: Deixa eu ver. Tudo. As apresentações estão sendo legais. Só. Acho assim, tudo tá legal!
4. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
H: A gente poderia tocar músicas mais difíceis. Assim, ter música mais difícil assim.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
153

H: É aquele negócio: você aprende com os erros seus e com os dos outros também. Vendo
o quê eles tão errando, coisas assim (...) Dá mais força pra você continuar também.
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
H : (Fez sinal positivo com a cabeça).
7. Você recomendaria para outras pessoas?
H: Ah, tem gente que fala: “ai, quero fazer violino também”. Sei lá, aí eu falo: “Vai lá nas
Oficinas”. Eu falo pra vim pra cá.
8. Você está gostando da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
H: Tô. Dá pra aprender bem. No começo, começou bem devagar e agora tá indo bem, sim.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
H: Talvez ritmo. Deixa eu ver, sei lá.
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
H : Assim, antes de eu vir pra cá, assim... falar pros amigos que eu sei fazer alguma coisa
pelo menos.
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
H: Gostei. Sei lá. Aprendi assim, alguma coisa. Ah, sei lá. Eu tinha um pouco de medo de
público, uma coisa assim.
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
H: Não. Acho que tá bom. Assim, só queria as coisas mais difíceis, mais matérias, tal,
assim.
Se você quer coisas mais difíceis é por que você acha que está valendo a pena né?
Aprendeu muita coisa e em pouco tempo...
H: É bastante.

COMENTÁRIO 4: Ao iniciar seu depoimento, o aluno expressou o significado de estar


estudando música da seguinte maneira: “Aprimorar. Assim, ter alguma coisa pra fazer.
Por que assim, tem gente que não faz nada”. Nota-se nesse trecho inicial, a ansiedade do
aluno em buscar novos conhecimentos, aprimorar-se, e ao mesmo tempo, livrar-se da
ociosidade, buscando através da música, uma experiência positiva para sua vida. Um ponto
interessante no depoimento, refere-se ao fato de o aluno ter afirmado querer conteúdos
(repertório) mais difíceis: “A gente poderia tocar músicas mais difíceis”. Observa-se que
se o aluno pediu um conteúdo mais complexo, isto significa que o mesmo se sentiu
instigado, estimulado a buscar novos conhecimentos musicais, em tão pouco tempo de
aula. Sobre a metodologia, o aluno afirmou: “Dá prá aprender bem. No começo, começou
bem devagar e agora tá indo bem sim”. Quando o aluno refere-se ao “aprender devagar no
começo” significa que os conteúdos foram passados de forma organizada, respeitando as
etapas de assimilação e acomodação do conhecimento, para depois acelerar o processo de
informação de novos conteúdos.
154

FIGURA 70 – Depoimento 5
DEPOIMENTO 5: Daniela (15 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


D: Pra mim as Oficinas de Cordas, a música, é como se fosse um complemento da minha
vida. É como assim, quando eu não fazia música, sempre faltava alguma coisa pra mim. Aí
eu comecei a fazer a música, aí eu senti que era isso que eu precisava. Porque eu fiz muitos
cursos e não era exatamente o quê eu procurava. Aí eu vim na música e foi o quê eu gostei
de fazer.
2. Você está gostando?
D: (entusiasmada) Tô amando. A turma é boa, a professora melhor ainda.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
D: O grupo. Ah, eu acho assim: a parte do ouvir mesmo, eu acho assim, algo especial. A
parte do ouvir. Porque a gente não só ouve o nosso instrumento, tem que ouvir dos outros
aspectos também. É tipo uma participação. Se você errar tem um outro lá pra passar em
cima e disfarçar seu erro. É assim, é tipo uma família, um cobrindo o erro do outro.
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
D: Não, eu acho que não.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
D: Eu nunca cheguei a fazer sozinha. Mas assim, o sozinho quando você faz, você percebe
bem mais aonde está o seu erro, porque você não treina o ouvido quando você faz sozinha.
Seu ouvido fica assim, só você. Agora se você faz em grupo, você tem que ouvir também o
dos outros. Acho que é isso a diferença.
6.Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
D: Claro, eu amo isso aqui!
7.Você recomendaria para outras pessoas?
D: Eu não só recomendaria como eu recomendo pra outras pessoas fazerem a música,
principalmente aqui.
8. Você está gostando da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
D: Tô amando. Mas só que eu queria mais tempo de música, tem muito pouco tempo a
aula, queria mais tempo.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
D: As habilidades ... a memória, o ouvir. Porque a memória a gente tem que ficar com a
memória concentrada em alguma coisa. Você tem que concentrar nas partituras. A
memória melhorou bem muito. As táticas, a coordenação motora melhorou demais e o
ouvir também. Porque você fica bem concentrado. Você tem que ter concentração na
música, tudo é concentração. Tudo parte da concentração.
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
D: Ah, muita coisa. Nossa assim, eu acho que a música me acalma. Eu sempre fui meio
estressada. Então, eu faço a música, eu chego aqui tensa e saio daqui relaxada, calma, bem
melhor! Melhorei em todas as hipóteses.
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
D: Ah, eu acho ótimo. Pra mim, eu acho ótimo! Mas tipo assim, como se fosse uma
retribuição de tudo o quê eu fiz. A gente fica meses e meses e depois vai mostrar pro
público. Aí eu acho ótimo, porque sempre o público gostou! Nossa! Eu acho que é uma
certa retribuição que nós ganhamos pelo nosso esforço. Porque a música realmente não é
fácil, é só pra quem tem garra mesmo e gosta da música. Porque quem não gosta não
consegue ficar na música.
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
155

D: Assim, eu quero que aumente as horas de aula porque tá muito pouquinho. É bom ter
aulas longas, muito longas. E se abrisse a oportunidade para as pessoas de fora, pra tipo
ganhar a bolsa com o desconto. Porque tem muita gente querendo entrar, aí o preço fica
meio assim, meio inacessível para certas pessoas. Só.

COMENTÁRIO 5: A aluna iniciou o depoimento expressando que a música seria um


complemento da sua vida. Afirmou que antes de ter iniciado a atividade musical na Oficina
de Cordas, “sempre faltava alguma coisa” para a sua vida: “Aí eu comecei a fazer a
música, aí eu senti que era isso que eu precisava. Porque eu fiz muitos cursos e não era
exatamente o quê eu procurava. Aí eu vim na música e foi o quê eu gostei de fazer”. Nota-
se uma grande afetividade da aluna em relação à música e as aulas. Quando a aluna foi
perguntada sobre o quê mais gostava na Oficina de Cordas, respondeu: “O grupo”.
Complementou que “o ouvir” o grupo era algo especial, não só por se ouvir, mas ouvir os
colegas dentro do grupo. E complementou : “É tipo uma participação. Se você errar tem
um outro lá pra passar em cima e disfarçar seu erro. É assim, é tipo uma família, um
cobrindo o erro do outro”. Nota-se que o vínculo afetivo da aluna era muito forte pois
comparou o grupo com uma família, demonstrando sua segurança de estar participando do
grupo, pelo sentido de cooperação, solidariedade e companheirismo do mesmo. Em outro
aspecto, a aluna demonstrou ter consciência da seriedade dos vários aspectos que
envolvem uma aula de música, porém, sem perder o prazer e o lado lúdico. Quando
comentou: “A gente fica meses e meses e depois vai mostrar pro público. Aí eu acho
ótimo, porque sempre o público gostou! Nossa! Eu acho que é uma certa retribuição que
nós ganhamos pelo nosso esforço. Porque a música realmente não é fácil, é só pra quem
tem garra mesmo e gosta da música. Porque quem não gosta não consegue ficar na
música”, a aluna demonstrou estar consciente do esforço e da disciplina que demandaram
as aulas, sendo os aplausos e elogios do público, a grande recompensa. Na finalização do
seu depoimento, a aluna declarou: “eu quero que aumente as horas de aula porque ta
muito pouquinho. É bom ter aulas longas, muito longas”. Nesse trecho, a aluna
demonstrou, mais uma vez, ter gostado das aulas. Porém, necessário se faz informar que, a
aluna estudava outro instrumento, em um outro grupo, dentro da Oficina de Cordas,
ficando envolvida com os estudo musicais no mínimo 5 (cinco) horas semanais. Outro
aspecto referiu-se a mensalidade cobrada ser R$ 40,00, por uma carga horária de três (3)
horas. Além disso, mais de 50% dos alunos da Oficina de Cordas são bolsistas (inclusive
Daniela): todos tem insenção total de taxas e mensalidades.
156

FIGURA 71 – Depoimento 6
DEPOIMENTO 6: Quênia (13 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas ?


Q: Ai assim, porque eu sempre gostei da música. Quando eu era menor, eu sempre cantava
né, depois deu vontade de fazer piano e violino. Aí minha irmã aqui, aí minha mãe me
botou aqui também.
2. Você está gostando ?
Q: Sim.
3. O quê você mais está gostando ? Qual é o aspecto que você mais gosta ?
Q: Ah assim, porque todo mundo estudando em grupo, todo mundo pode se ajudar o outro
nas dificuldades. E isso é bom!
4. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
Q: Não. Ah tem. A aula é muito, tem pouco tempo.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo ?
Q: Ah, acho legal! Igual eu falei, cada um ajuda um pouco o outro. Eu tava com muita
dificuldade, aí eu comecei a conversar com a Nalanda. Aí ela foi me ajudando.
6.Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
Q: Sim.
7.Você recomendaria para outras pessoas?
Q: Recomendaria.
8.Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
Q: Sim.
9.Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
Q: Porque antes eu não gostava de tocar. Eu já tinha feito música, né. Aí eu só fazia teoria
e cantava. Aí aqui na Oficina de Cordas, eu fui aprendendo a gostar de tocar. Que não era
só cantar a música, tem que tocar também.
10.O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
Q: Ah, mudou assim. Porque antes na minha família era só o um irmão que tocava. Então a
gente via ele com dificuldade e pensava que era moleza dele. Aí depois que a gente
começou a fazer, a gente aprende que o instrumento é como nosso corpo, e devemos
conduzi-lo bem. E assim, comecei ter um toque diferente, assim, comecei a gostar mais:
“Toda quarta e sexta eu vou ter aula de música”. E é bom!
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
Q: Assim, foi bom, mas eu fiquei morrendo de vergonha porque eu sou um pouco tímida.
Aí a gente fica lá, eu fiquei com vergonha, podia errar, tinha muita gente conhecida, então,
a gente ficou assim com medo, né.
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
Q: Não. Pra mim tá tudo bom.

COMENTÁRIO 6: A aluna ao ser perguntada se estava gostando do ensino coletivo,


afirmou que no ensino em grupo todos podem ajudar-se mutuamente e para ela “isso é
bom!”. Relatou a sua experiência no grupo da seguinte forma: “cada um ajuda um pouco o
outro. Eu tava com muita dificuldade, aí eu comecei a conversar com a Nalanda. Aí ela foi
me ajudando”. Nota-se que a aluna tem consciência da cooperação e da solidariedade da
colega, ajudando-a no seu desenvolvimento. Ao ser perguntada sobre o quê teria mudado
157

em sua vida, a aluna fez o seguinte comentário: “Porque antes na minha família era só o
um irmão que tocava. Então a gente via ele com dificuldade e pensava que era moleza
dele. Aí depois que a gente começou a fazer, a gente aprende que o instrumento é como
nosso corpo, e devemos conduzi-lo bem. E assim, comecei ter um toque diferente, assim,
comecei a gostar mais”. Observa-se nesse trecho que a aluna após ter iniciado os estudos
musicais, através da sua vivência musical, aprendeu a valorizar mais a música, e
principalmente, o esforço daqueles que se propõem a estudar um instrumento. Somente,
após de ter passado por essa experiência, foi capaz de entender o que seu irmão sentia ao
estudar um instrumento. Portanto, a aluna a partir dessa experiência, saberá valorizar a
atividade musical como uma forma de expressão artística e cultural, que demanda esforço e
dedicação.

FIGURA 72 – Depoimento 7
DEPOIMENTO 7: Hamilton (20 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


H: Tinha muitos anos que eu tinha vontade de aprender um instrumento, mas eu não tinha
possibilidade por causa do tempo. Aí surgiu essa oportunidade, pra mim tá sendo uma
ótima.
2. Você está gostando ?
H: Tô.
3. O quê você mais está gostando ? Qual é o aspecto que você mais gosta?
H: O quê eu mais gosto? O quê eu mais gosto mesmo é do interesse do grupo. Eu não sou
muito ligado nas questões individuais (?).
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
H: No momento até agora não.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
H: Principalmente porque eu fiz só uma vez aula individual, e realmente senti dificuldade
de praticar sozinho. Só tinha um aluno em sala. Agora em grupo, é mais fácil, mais
desinibido, uma experiência mais renovadora.
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
H: Gostaria, realmente, gostaria.
7. Você recomendaria para outras pessoas?
H: Recomendaria.
8. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
H: Tô achando que ela é eficiente. Pra mim ela tá sendo eficiente.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
H: É, deixa eu ver aqui... relaxamento. Eu tinha um monte de dificuldade em relaxamento.
Eu era super-tenso!
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
H: (Pensativo) Uma mudança muito boa. Me ajuda acalmar as tensões que eu tinha.
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
H: Gostei. Apesar do nervosismo. Gostei. Foi bom, principalmente porque eu nunca tinha
158

subido no palco. Nunca tinha entrado e apresentado. Foi uma ótima experiência!
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
H: No momento não tenho nada em minha mente. Só isso mesmo.

COMENTÁRIO 7: O aluno inicia seu depoimento falando de “oportunidade”: “Tinha


muitos anos que eu tinha vontade de aprender um instrumento, mas eu não tinha
possibilidade por causa do tempo. Aí surgiu essa oportunidade, pra mim tá sendo uma
ótima”. Quando foi perguntado sobre o que mais estava gostando afirmou, ser o interesse
do grupo. Um dado interessante, abordado pelo aluno, relaciona-se com a diferença entre a
iniciação instrumental individual e coletiva: “eu fiz só uma vez aula individual, e
realmente senti dificuldade de praticar sozinho. Só tinha um aluno em sala. Agora em
grupo, é mais fácil, mais desinibido, uma experiência mais renovadora”. Nota-se nesse
trecho que o aluno foi bastante motivado pela experiência coletiva, destacando o ambiente
positivo quando referiu-se ao fato de desinibir-se. Pode-se afirmar que se o aluno se sente
em um ambiente seguro, amigável e caloroso, e que o mesmo, colaborou com o seu
“desinibir”, lhe permitindo uma maior entrega, sendo por isso, uma “experiência
renovadora”. Quando o aluno foi perguntado sobre qual seria a habilidade desenvolvida, o
mesmo afirmou: “relaxamento. Eu tinha um monte de dificuldade em relaxamento. Eu era
super-tenso!”. Nota-se que o aluno desenvolveu a habilidade de relaxar e referiu-se a
tensão como um hábito antigo, quando flexionou o verbo no passado (“eu era super-
tenso!”). Da mesma forma, em outro trecho, afirmou que depois de ter iniciado os estudos
musicais, na Oficina de Cordas, ficou mais calmo: “Uma mudança muito boa. Me ajuda
acalmar as tensões que eu tinha”. Novamente o aluno flexionou o verbo no passado (“as
tensões que eu tinha”). As afirmações denotam uma consciência da melhora do seu
comportamento após a experiência musical coletiva, desenvolvendo hábitos saudáveis. Ao
ser perguntado sobre como foi a experiência do recital, o aluno afirmou: “Gostei. Foi bom,
principalmente porque eu nunca tinha subido no palco. Nunca tinha entrado e
apresentado. Foi uma ótima experiência!”. Nota-se que a Oficina de Cordas oportunizou
uma nova experiência para o aluno, já que o mesmo nunca tinha subido em um palco, para
apresentar-se em público.

FIGURA 73 – Depoimento 8
DEPOIMENTO 8: Antônio (13 anos)
159

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


A: Porque desde pequeno eu tô querendo tocar os instrumentos que eu toco hoje, e quando
apareceu essa oportunidade, eu vi no jornal, eu vim. Só que não era pra minha idade, aí
você me deixou entrar. No começo eu morria de medo. Acabou que eu fiquei até hoje.
2. Você está gostando?
A: Tô gostando.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
A: Tocar em grupo. O que eu gosto mais é do grupo. A harmonia do grupo.
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
A: Não, não.
5. Como é que está sendo estudar através do ensino em grupo?
A: Eu acho assim, que as vantagens de estudar em grupo é porque um vai ajudando o
outro, entendeu? É assim: quando um erra, o outro vai, ensina, explica. Você ouve o do
lado: “Opa errei aqui!”. Aí vai e pega. Então é isso, o companheirismo do grupo.
6.Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
A: Gostaria.
7.Você recomendaria para outras pessoas?
A: Recomendaria. Eu já recomendei pra uns 4 (quatro), que talvez vão vim aqui tocar.
8. Você está gostando da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
A: Tô gostando.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
A: Bom pra mim foi mais o raciocínio, assim sabe, pra ler as notas, agilidade.
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
A: É assim, eu comecei, eu não sei como é que fala... eu fiquei assim, mais leve, assim, no
início aquela empolgação, sabe? Quando você é iniciante mesmo. Mas depois, foi assim,
levando mais a sério, como se fosse uma profissão. Ai, eu não sei como falar assim, sabe?
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
A: Antes assim, antes de entrar aqui, eu pensava que recitais era só pra profissionais, sabe?
Aí depois foi uma surpresa pra mim quando eu fiquei sabendo que tinha recitais, assim, pra
alunos. Foi uma surpresa ! Pra mim é uma maravilha! Eu fico feliz de tocar em grupo.
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
A: Não.

COMENTÁRIO 8: Antônio era um aluno especial, assim como Daniela, fazia dois
instrumentos: em uma turma fazia violino, que começou há dois semestres, e no grupo
pesquisado, estudava o violoncelo. O aluno iniciou seu depoimento falando da
“oportunidade” de estudar música: “desde pequeno eu tô querendo tocar os instrumentos
que eu toco hoje, e quando apareceu essa oportunidade, eu vi no jornal, eu vim. Só que
não era pra minha idade, aí você me deixou entrar”. Observa-se que o aluno tem
consciência da oportunidade que teve, inclusive, referindo-se ao seu caso em específico (na
época em que o aluno entrou, o projeto era voltado somente para pessoas maiores de 14
anos). Talvez, se naquele momento, a sua entrada no projeto tivesse sido cerceada, o aluno
poderia ter se desinteressado, ou ainda, não ter uma outra oportunidade futura. Antônio era
um dos alunos mais brilhantes do projeto e o fator idade, nunca foi empecilho para o seu
160

desenvolvimento. Nota-se aí, que o professor deve ter sensibilidade em tratar e em


observar cada caso. Quando o aluno iniciou seus estudos musicais, a
professora/pesquisadora propôs uma “fase de experiência”, ou seja, se o aluno se adaptasse
a um grupo de jovens e adultos poderia ficar, sendo que foi isso que ocorreu. Portanto, não
se pode ter uma visão tecnicista, observando regras como se fossem estruturas rígidas. Ao
ser perguntado sobre o quê mais gostava na Oficina de Cordas, afirmou ser tocar em grupo.
O aluno considerou ser um aspecto vantajoso do ensino em grupo, o sentimento de
companheirismo grupal: “Eu acho assim, que as vantagens de estudar em grupo é porque
um vai ajudando o outro, entendeu? É assim: quando um erra, o outro vai, ensina, explica.
Você ouve o do lado, ‘Opa errei aqui!’. Aí vai e pega. Então é isso, o companheirismo do
grupo”. Sobre as habilidades desenvolvidas pelo ensino coletivo, o aluno observou que se
sente mais leve, sendo que “no início aquela empolgação, sabe? Quando você é iniciante
mesmo. Mas depois, foi assim, levando mais a sério, como se fosse uma profissão”. Nota-
se que o aluno tem plena consciência do que significa para si, estudar música e o nível de
importância que essa atividade ocupa em sua vida, quando destacou a seriedade com que
encara tal atividade, comparando-a com uma profissão. Sobre o recital, o aluno afirmou
que antes de iniciar os estudos musicais, acreditava que só podiam se apresentar nos
recitais, músicos profissionais: “Antes assim, antes de entrar aqui, eu pensava que recitais
era só pra profissionais, sabe? Aí depois foi uma surpresa pra mim quando eu fiquei
sabendo que tinha recitais, assim, pra alunos. Foi uma surpresa ! Pra mim é uma
maravilha! Eu fico feliz de tocar em grupo”.

FIGURA 74 – Depoimento 9
DEPOIMENTO 9: Milene (25 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


M: Olha, eu optei por isso porque eu tava, pra eu tá aprendendo um outro instrumento,
completamente diferentes dos que eu já sei. E eu gostei muito das Oficinas pelo fato de
você tá tendo um aprendizado mais rápido, mais... sem ter muitas regras, sem ter aquelas
coisas individuais que eu acho que você demora mais tempo pra pegar o básico do
instrumento. Eu achei muito interessante por causa disso.
2. Você gostou?
M: Gostei, gostei do curso.
3. O quê você mais gostou ? Qual é o aspecto que você mais gostou?
M: O quê eu mais gostei? Do trabalho em grupo mesmo. De estar conhecendo pessoas
diferentes, né, de tá vendo com todo mundo os erros, os acertos, eu gostei muito desse
trabalho em grupo, que eu acho muito interessante. Até mesmo porque eu trabalho muito
em grupo também, como professora. Eu achei mais interessante isso, de estar trabalhando
161

em grupo.
4. O quê você não gostou? Tem algum aspecto que você não gostou?
M: Eu acho que poderia ter, por exemplo, preocupação maior, às vezes, com a postura, ou
de um aluno que tenha mais dificuldade, tá tendo uma disponibilidade de horário, tá
pegando ele, de tá fazendo ele ir pra frente. Até mesmo pra não tá atrasando o grupo por
causa de um aluno.
5. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
M: Eu gostei das Oficinas, só que assim, como eu te falei, eu queria tá aprendendo um
outro instrumento, só que agora eu gostaria de continuar agora num processo
individualizado. Porque aí eu acredito, que no meu caso, como eu já sei teoria e já faço
música, pra mim agora vai ficar mais fácil eu pegar aula individual e seguir num processo
mais rápido, no meu caso.
6. Você recomendaria para outras pessoas?
M: Claro, claro. Vivo recomendando pra todo mundo, pra ir pras Oficinas, pras Oficinas de
Música, tá aprendendo outros instrumentos, outras coisas. Isso é o que eu vivo fazendo pra
todo mundo.
7. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
M: Gostei. Eu achei muito interessante. Porque, às vezes, a gente entra em sala de aula pra
dar aula pros alunos, você não sabe como é que faz pra ir passando a teoria pra eles. Como
você faz pra tá colocando um método mais rápido. Então, eu achei muito interessante. Eu
nunca tinha conhecido um método assim, que qualquer pessoa já pode tá lendo, já
entendendo sobre tempo, duração de nota, nome de nota, num processo muito rápido.
Gostei!
8. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você? Eu sei que
você já é musicista, mas você acredita que desenvolveu alguma habilidade com o
ensino em grupo?
M: No instrumento? Eu creio que a didática mesmo desse projeto, dessa didática de como
eu vou falar, da forma de leitura, de tá passando isso pros meus alunos, né. E do trabalho
em grupo, que é bem diferente em termos de trabalhar mais pessoas, de uma forma mais
rápida também. Você pega uma hora e meia e trabalha 8 (oito), 10 (dez) pessoas, vários
instrumentos ou só aquele instrumento... Então, a didática mesmo.
9. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Eu sei que você tem outras
experiências em recitais, mas como foi essa experiência em grupo?
M: Dos recitais? Eu achei interessante. Você tá até tocando com pessoas que praticamente
são leigas em música e vê que tem um avanço muito legal de todo mundo. Eu achei
interessante tocar com outras pessoas. Eu acho legal.
10. Mudou alguma coisa na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
M: Não assim... Eu sou uma apaixonada em música. Eu quero aprender a tocar tudo quanto
é tipo de instrumento. Eu quero aprender a tocar tudo. Então, eu gostei muito! Eu gostei
muito mesmo! Eu gostei muito do instrumento que eu fiz, quero tá aprendendo outros. Eu
sou viciada mesmo!
11. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
M: Uma sugestão? A Oficina é muito legal. Eu gostei do trabalho, da didática, de ta
passando o processo de leitura pros meus alunos, por saber isso melhor, entender isso
melhor. Precisava, como eu te falei, de repente, tem alguns alunos que tão com mais
dificuldade. Acho que seria interessante tá pegando eles, mais individualizado, né, pra eles
estarem avançando melhor, até pro grupo ir pra frente mais rápido. Só isso que eu queria
dizer!
162

COMENTÁRIO 9: A aluna Milene tem o perfil diferente do restante do grupo. É aluna


do curso do 2º ano do curso de Licenciatura em Educação Musical, da EMAC/UFG, já
possuindo, portanto, uma formação musical mais sólida que os demais colegas. Porém, ao
ser perguntada sobre o quê significaria participar da Oficina de Cordas, a aluna destacou
que optou por conhecer um outro instrumento através da Oficina citada, tendo gostado
muito da metodologia empregada: “E eu gostei muito das Oficinas pelo fato de você tá
tendo um aprendizado mais rápido, mais... sem ter muitas regras, sem ter aquelas coisas
individuais que eu acho que você demora mais tempo pra pegar o básico do instrumento.
Eu achei muito interessante por causa disso”. Perguntado qual seria o aspecto mais
positivo, a aluna destacou o trabalho em grupo, a experiência de conhecer outras pessoas,
do intercâmbio de experiências, frisando foi uma experiência interessante por trabalhar
como professora em aulas coletivas. Sobre um aspecto negativo, sugeriu que fosse criado
um horário específico para atendimento individual dos alunos que sentem maior
dificuldade. Sobre a metodologia aplicada afirmou ter gostado, chamando a atenção para a
eficiência do método em passar conteúdos de maneira direta, fazendo a ligação da teoria
com a prática musical de maneira rápida: “Gostei. Eu achei muito interessante. Porque, às
vezes, a gente entra em sala de aula pra dar aula pros alunos, você não sabe como é que
faz pra ir passando a teoria pra eles. Como você faz pra tá colocando um método mais
rápido. Então, eu achei muito interessante. Eu nunca tinha conhecido um método assim,
que qualquer pessoa já pode tá lendo, já entendendo sobre tempo, duração de nota, nome
de nota, num processo muito rápido. Gostei!”. Interessante notar que, mesmo sendo aluna
do curso superior de música, Milene não conhecia essa abordagem de iniciação
instrumental/musicalização. Outro ponto a ser destacado, diz respeito à habilidade que a
aluna acreditava que teria desenvolvidi durante o processo do ensino coletivo. A aluna
destacou ser a didática da teoria aplicada, transferindo essa experiência para seus próprios
alunos: “Eu creio que a didática mesmo desse projeto, dessa didática de como eu vou
falar, da forma de leitura, de tá passando isso pros meus alunos, né. E do trabalho em
grupo, que é bem diferente em termos de trabalhar mais pessoas, de uma forma mais
rápida também. Você pega uma hora e meia e trabalha 8 (oito), 10 (dez) pessoas, vários
instrumentos ou só aquele instrumento... Então, a didática mesmo”. Nota-se que o contato
da aluna com o ensino coletivo, já modificou a maneira como age pedagogicamente,
transformando a sua abordagem e conseqüentemente, a experiência de seus alunos, como
num efeito dominó: a Oficina de Cordas transformou a maneira de pensar e agir da aluna e
163

ela transferiu a mesma experiência para seus alunos (como professora), transformando, da
mesma forma, a maneira dos seus alunos vivenciarem a música. Sobre os recitais, a aluna
demonstrou ter gostado, confirmando, mais uma vez, a eficiência metodológica no
desenvolvimento dos alunos: “Dos recitais? Eu achei interessante. Você ta até tocando
com pessoas que praticamente são leigas em música e vê que tem um avanço muito legal
de todo mundo”. Por fim, a aluna demonstrou , mais uma vez, ter modificado a sua ação
como educadora musical: “A Oficina é muito legal. Eu gostei do trabalho, da didática, de
ta passando o processo de leitura pros meus alunos, por saber isso melhor, entender isso
melhor”.

5.5.1.3. Depoimentos dos sujeitos do grupo CEACA

FIGURA 75 – Depoimento 10
DEPOIMENTO 10: Daniel (14 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas ?


D: Bão.
2. Você está gostando? Você gostou?
D: Hã, hã (acenou positivamente com a cabeça).
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta ?
D: Violino e tocar com o arco.
4. Você gosta de tocar em grupo?
D: Gosto.
5. O quê você mais gostou, além do violino e do arco? O quê a Oficina trouxe para
você de conhecimento musical?
D: É o quê eu sempre quis... Eu conheci o violino, aí toquei...
6. Você prefere tocar sozinho ou com seus colegas?
D: Com os meus colegas.
7. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
D: Não
8. Gostou de tudo?
D: É.
8. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
D: Hã, hã (acenou positivamente com a cabeça).
9. Você recomendaria para outras pessoas?
D: (acenou positivamente com a cabeça) Bão, tocar é bão pra aprender.
10. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
D: Gostei.
11.Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você? O quê você
desenvolveu nas aulas?
D: Antes eu tinha dor na coluna, agora eu sento reto.
12. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas? Mudou
alguma coisa?
164

D: Mudou. Eu tô aprendendo a tocar, antes eu não sabia. Mudou.


13. O quê você espera da Oficina? O quê você espera da música no futuro?
D : Vou ser um tocador de violino, tocar na orquestra.
14. Você gostaria de ser músico?
D: Gostaria de ser.
15. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
D: Não, nada.

COMENTÁRIO 10: No depoimento de Daniel, nota-se a dificuldade de se expressar


através de palavras. O aluno respondeu as questões com respostas curtas, com uma palavra
ou uma pequena frase. Primeiramente, quando se perguntou o quê significava para ele,
estar na Oficina de Cordas, o aluno respondeu: “Bom!”. Afirmou estar gostando da
atividade, sendo que o aspecto que mais estava gostando era do violino e do arco. Quando
o aluno foi perguntado se recomendaria para outras pessoas, respondeu acenando
positivamente com a cabeça: “Tocar é bom pra aprender”. O aluno demonstrou nessa fala
ter, de certa forma, a consciência de que estudar era uma atividade importante para a sua
vida. Perguntou-se, quais eram as habilidades que a Oficina de Cordas ajudou a
desenvolver, o aluno respondeu: “Antes eu tinha dor na coluna, agora eu sento reto” .
Observa-se que o aluno desenvolveu uma consciência corporal, através do trabalho de
relaxamento da Oficina de Cordas, modificando a sua maneira de sentar, ou seja,
melhorando a sua saúde (não sentindo mais dor) e postura corporal. Sobre o que teria
mudado em sua vida após a experiência musical, o aluno respondeu: “Eu tô aprendendo a
tocar, antes eu não sabia”, demonstrando mais uma vez uma atitude positiva em relação
ao aprendizado musical. Ao final do depoimento, o aluno demonstrou o interesse em se
tornar um músico profissional.

FIGURA 76 – Depoimento 11
DEPOIMENTO 11: Gabriel (12 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


G: Que Oficina?
2. A Oficina de Cordas, a aula de orquestra?
G: Bão, muito bão!
3. O quê você acha que tá aprendendo?
G: Aprendendo violino... quando eu crescer ser igual a senhora...
4.Você está gostando?
G: Demais!
5. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
G: Não, não tem.
165

6. O quê você mais está gostando na Oficina de Cordas? Qual é o aspecto que você
mais gosta?
G: (O aluno não entendeu a pergunta) O quê eu tô mais gostando? Ai...
7. Assim, como está sendo estudar através do ensino em grupo? O quê você está mais
gostando?
G: O grupo está mais ou menos... o grupo está meio vai, meio vem, tem dia que tá bom,
tem dia que tá ruim.
8. Mas você está gostando?
G: Tô.
9. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
G: Sim, gostaria.
10. Você está gostando da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
G: Tô.
11. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
G: Quando eu cheguei lá, eu não estava sabendo quase nada, agora eu tô sabendo muita
coisa... a corda lá.
12. O quê significa a música hoje na sua vida?
G: Ah, aí eu não sei .
13.Você recomendaria para outras pessoas?
G: Não (O aluno não entendeu, pensou que estava sendo perguntado se ele transferiria sua
vaga para outra pessoa).
14. Se você falaria que estudar nas Oficinas é bom para outras pessoas também?
G: Ah, eu tava entendendo que eu ia dar a minha vaga para outra pessoa. Eu recomendaria,
o violino é bom.
15. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas? Mudou
alguma coisa na sua vida?
G: Mudou. Antes de fazer aula de violino eu não sabia como era uma aula de violino,
como é que tocava. Agora eu sei como é que é... já vi tocar...
16. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
G: Comentar?
17. Falar alguma coisa para mim sobre a Oficina de Cordas?
G: Não sei.
18. Então, você está gostando ?
G: Eu gostaria de fazer aulas para apresentar.

COMENTÁRIO 11: O aluno demonstrou estar gostando das aulas da Oficina de Cordas.
Quando Gabriel foi perguntado sobre o que estaria aprendendo, respondeu: “Aprendendo
violino”. Em seguida perguntou-se se ele estava gostando e Gabriel respondeu com
entusiasmo: “Demais!”. Quando se perguntou sobre as habilidades que ele estaria
desenvolvendo na Oficina de Cordas: “Quando eu cheguei lá, eu não sabia nada. Agora
eu tô sabendo... a corda lá”. Nota-se na resposta que o aluno reconhece que a experiência
musical proporcionou um início de formação musical, porém, ainda não sabe expressar de
maneira mais específica o quê aprendeu e/ou desenvolveu. Quando foi perguntado ao
aluno se recomendaria a atividade musical da Oficina de Cordas, o aluno não compreendeu
166

a pergunta e respondeu negativamente. Depois de explicado o sentido real da pergunta, o


aluno respondeu que ele pensava que “recomendar” seria “dar” a sua vaga para outra
pessoa. Essa passagem demonstra a dificuldade dos alunos em compreender certos
conceitos ou idéias devido a dificuldade de compreensão do vocabulário, daí a necessidade
de explicar e exemplificar de maneira tal, para que os alunos pudessem assimilar o que
estava sendo dito. Quando se perguntou se a experiência musical proporcionada pela
Oficina de Cordas, teria modificado a sua vida, Gabriel respondeu: “Mudou. Antes de fazer
aula de violino eu não sabia como era uma aula de violino, como é que tocava. Agora eu
sei como é que é...”. Observa-se que o aluno tem consciência da oportunidade que teve de
entrar em contato com um novo mundo, antes desconhecido.

FIGURA 77 – Depoimento 12
DEPOIMENTO 12: Rafael (15 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


R: É uma experiência nova, né? É bom porque a gente aprende. Muita gente não tem
oportunidade de fazer aula de cordas como eu tô tendo. Por isso, eu quero aprender
bastante, pra falar que eu sei, eu aprendi!
2. Você está gostando?
R: Tô.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
R: Tudo, de tudo.
4. O quê você acha que você tá aprendendo, além de aprender o instrumento? Você
acha que tá aprendendo outra coisa?
R: Tô. Companheirismo. Mesmo que lá não sendo muito, mas é...
5. E o trabalho de grupo, você está gostando? Você acha que ta aproximando vocês?
Trabalhando respeito, trabalhando a confiança, a auto-confiança...
R: Em algumas partes sim, em outras não.
6. O quê você acha que não?
R: Ah por causa que têm meninos que estão fazendo bagunça, estragando a aula.
7. Tem alguma coisa na Oficina que você não gosta ? Tem algum aspecto que você
não gosta?
R: (Acenou negativo com a cabeça).
8. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
R: (Acenou positivo com a cabeça).
9. O quê você vê no futuro? A música vai fazer parte da sua vida?
R: Não sei.
10. Você gostaria de ser músico profissional?
R: Hã, hã (acenando positivamente com a cabeça).
11. Você recomendaria para outras pessoas?
R: Recomendaria.
12. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
R: Hã, hã (acenando positivamente com a cabeça).
167

13. Você está gostando?


R: Tô.
14. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
R: Não sei, não sei. Eu acho que é bom, porque lá a gente aprende a manusear o
instrumento da maneira certa, aprende a ouvir, a coordenar, ter mais agilidade com os
braços e com as mãos, várias coisas.
15. Mudou alguma coisa na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
R: Mudou. Porque agora eu tenho mais interesse. Antes eu ouvia as pessoas falando que
fazia isso e aquilo outro, e eu não dava tanta importância. Agora se a pessoa fala que toca
violino, eu já dou mais importância, começo a perguntar isso e aquilo, pra mim ficar
sabendo.
16. Você largou de engraxar e está fazendo um curso de quê?
R: Vou começar a fazer um curso de Injeção Eletrônica, na segunda-feira.
17. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
R: Tô achando bom, mas poderia melhorar se os alunos prestassem mais atenção. Tá
faltando o grupo se entrosar mais.
18. Mas as aulas estão boas?
R: Estão.

COMENTÁRIO 12: Rafael foi perguntado sobre o quê significava para ele a experiência
de participar da Oficina de Cordas e iniciou seu depoimento da seguinte maneira: “É uma
experiência nova, né? É bom porque a gente aprende. Muita gente não tem oportunidade
de fazer aula de cordas como eu tô tendo. Por isso, eu quero aprender bastante, pra falar
que eu sei, eu aprendi!”. O aluno demonstrou ter consciência da importância daquela
experiência em sua vida e que a mesma deveria ser aproveitada da melhor maneira
possível. Enfatizou ser uma experiência nova, de aprendizado, destacando que muitas
pessoas não tinham a “oportunidade” que ele estava tendo, por isso, ele gostaria de
aprender bastante. Afirmou estar gostando de tudo e que além do instrumento, estava
aprendendo a ter mais “...companheirismo. Mesmo que lá não sendo muito, mas é...”.
Nota-se que o aluno conseguiu identificar o trabalho de cooperação, solidariedade e
socialização através do ensino em grupo. Da mesma forma, tem consciência de que o
relacionamento do grupo ainda pode melhorar. O aluno destacou que a “bagunça”
atrapalhava a aula e o trabalho em grupo: “Ah por causa que tem meninos que estão
fazendo bagunça, estragando a aula”. Quando Rafael foi perguntado sobre quais seriam as
habilidades que ele teria desenvolvido, a partir da experiência musical, respondeu: “Eu
acho que é bom, porque lá a gente aprende a manusear o instrumento, da maneira certa,
aprende a ouvir, a coordenar, ter mais agilidade com os braços e com as mãos, várias
coisas”. O aluno demonstrou que já consegue identificar o seu desenvolvimento nas áreas
de percepção musical (ouvir) e coordenação motora (manusear o instrumento, coordenar e
168

ter agilidade com os braços e mãos). Sobre as mudanças em sua vida, o aluno afirmou que
a experiência na Oficina de Cordas mudou a sua vida: “Porque agora eu tenho mais
interesse. Antes eu ouvia as pessoas falando que fazia isso e aquilo outro e eu não dava
tanta importância. Agora se a pessoa fala que toca violino, eu já dou mais importância,
começo a perguntar isso e aquilo”. Rafael demonstrou ter consciência da sua mudança de
atitude em relação à música, procurando ter mais interesse e conhecimento. No final do
depoimento afirmou que o comportamento dos alunos, em sala de aula, poderia melhorar e
que o grupo poderia se entrosar mais.

FIGURA 78 – Depoimento 13
DEPOIMENTO 13: Júnior (12 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


J: (O aluno estava envergonhado) Significa muita coisa, significa aprender.
2. Você está gostando?
J: Muito.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
J: De tudo.
4. O quê significa para você estar na orquestra?
J: (Não respondeu).
5. É bom pra você?
J: É.
6. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
J: (Acenou negativamente com a cabeça).
7. Você gosta de tudo?
J: (Acenou positivamente com a cabeça).
8. Você recomendaria para outras pessoas? Falaria para outras pessoas fazerem
também a aula?
J: Falaria.
9. Você está gostando da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
J: Tô.
10. O quê mais você gosta?
J: De tocar violino.
11. Você gosta de estar lá?
J: (Acenou positivamente com a cabeça).
12. O quê você aprendeu mais?
J: Tocar violino.
13. E o quê mais?
J: (Não soube responder).
14. Mudou alguma coisa na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
J: Mudou muita coisa.
15. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
J: Tocar violino, eu gosto mais de tocar violino.
16. Você aprendeu a gostar de ouvir mais música?
169

J: (Acenou positivamente com a cabeça).


17. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
J: (Não sabou responder).
18. Você imagina sua vida sem a música, sem o violino? Você sempre quer fazer
violino?
J: Quero sempre fazer aula de violino!

COMENTÁRIO 13: Júnior durante o depoimento se portou de maneira tímida,


encabulada, em oposição ao seu comportamento no dia-a-dia. Ao ser perguntado o quê
significava, estar participando da Oficina de Cordas, respondeu: “Significa muita coisa,
significa aprender”. O aluno demonstrou na resposta que sabe qual é a importância do
aprendizado em sua vida e que a experiência musical estava sendo de grande valia
(“significa muita coisa”). Afirmou estar gostando “de tudo”, sendo que tocar violino era o
que mais gostava. Perguntou-se o que mais gostava na Oficina de Cordas, além de tocar
violino. O aluno não soube responder. Da mesma forma, ao ser perguntado se a
experiência musical teria modificado sua vida, o aluno respondeu que: “Mudou muita
coisa”. Sobre qual seria a habilidade que desenvolveu na Oficina de Cordas, Júnior
afirmou ser tocar violino, já que ele gosta muito de tocar o instrumento. A mensagem final
revela a sua relação com o instrumento: “Quero sempre fazer aula de violino!”.

FIGURA 79 – Depoimento 14
DEPOIMENTO 14: Pedro (12 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


P: Significa muita coisa, significa que quando a gente crescer a gente, tem um futuro
garantido.
2. Você está gostando?
P: Estou.
3. O quê você mais está gostando?
P: Violino.
4. Qual é o aspecto que você mais gosta?
P: Tocar.
5. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
P: Tem. A bagunça dos meninos. Quando eles desatam a fazer bagunça...
6. O quê pode ser feito para melhorar essa situação?
P: Melhorar? É dar chance para os meninos que tá fazendo bagunça. Se eles ficarem
fazendo bagunça ainda, vai tirando... Quem não quer fazer, os outros querem.
7. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
P: Sim.
8. Você recomendaria para outras pessoas?
P: Como assim? (Não entendeu a pergunta).
9. Você falaria para outras pessoas fazerem também?
170

P: Sim.
10. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
P: Gostei. É bom.
11. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
P: Tocar cordas, que eu não sabia ... com arco que eu tô aprendendo.
12. O quê você espera da Oficina de Cordas, da música?
P: Espero ... vou ter pelo menos um futuro garantido, se eu não tiver trabalho, eu vou ter
pelo menos um futuro garantido.
13. Mudou alguma coisa na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
P: Mudou bastante coisa. Eu não sabia tocar violino. Peguei, eu aprendi, tô aprendendo. Tá
mudando bastante coisa.
14. E esse contato com a Escola de Música ?
P: É bom.
15. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
P: Não.

COMENTÁRIO 14: Ao ser perguntado sobre o quê significaria a experiência musical na


Oficina de Cordas, Pedro fala de “futuro”: “Significa muita coisa, significa que quando a
gente crescer, a gente tem um futuro garantido”. Observa-se a preocupação do aluno
quanto ao seu futuro e a esperança que tem em relação a essa experiência musical, quando
afirmou que a mesma significava seu “futuro garantido”. O aluno disse estar gostando de
participar da Oficina de Cordas, sendo que o quê mais gostava era de tocar violino.
Observou que a “bagunça dos meninos” era o aspecto negativo das intervenções/aula.
Nesse momento foi perguntado ao aluno o quê poderia ser feito para que essa situação
fosse modificada e Pedro respondeu: “Melhorar? É dar chance para os meninos que tá
fazendo bagunça. Se eles ficarem fazendo bagunça ainda, vai tirando... Quem não quer
fazer, os outros querem”. Pode-se observar nesta resposta, que o aluno tem uma postura
implacável diante do comportamento dos colegas, sugerindo que quem fizesse bagunça
teria uma chance, depois se não se comportassem, os alunos indisciplinados deveriam ser
retirados. Assim como Gabriel, não compreendeu quando perguntado se recomendaria a
Oficina de Cordas para outras pessoas. Após ter sido explicado o significado da palavra
recomendar, Pedro afirmou que recomendaria para outras pessoas. Sobre uma habilidade
desenvolvida pela Oficina de Cordas, Pedro afirmou ser: “Tocar cordas, tocar com arco
que eu tô aprendendo”. Sobre se a experiência musical modificou a sua vida, o aluno
respondeu: “Mudou bastante coisa. Eu não sabia tocar violino. Peguei, eu aprendi, tô
aprendendo. Mudou bastante coisa”. Nota-se que o aluno reconheceu que tocar um
instrumento provocou mudanças em sua vida, porém, ainda não soube especificar, mais
detalhadamente, quais seriam essas mudanças. O aluno demonstrou ter compreendido a
171

seriedade do trabalho e a oportunidade que o grupo teve, ao reafirmar que esperava ter um
futuro garantido, através desta experiência musical: “Espero ... vou ter pelo menos um
futuro garantido, se eu não tiver trabalho”.

FIGURA 80 – Depoimento 15
DEPOIMENTO 15: Roberto (12 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


R: (O aluno estava disperso) Bom, ótimo.
2. O quê você mais está gostando ? Qual é o aspecto que você mais gosta?
R: Da aula de violino. Precisa melhorar uma coisa: bagunça! Pra ficar mais bom
(brincando com o boné na mão).
4. O quê você não está gostando ? Tem algum aspecto que você não gosta?
R: Não.
5. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
R: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
6. Você recomendaria para outras pessoas?
R: (Acenou positivamente com a cabeça).
7. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
R: Não.
8. Por quê não?
R: Porque tem muita bagunça. Um faz bagunça, o outro quer fazer também.
9. Mas tirando a bagunça. Você está gostando de fazer a aula em grupo?
R : Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
10. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
R: Muita coisa.
11. O quê você aprendeu mais?
R: Arco, a corda ré, sol. Qual é o nome daquela, tia?
Dó.
R: lá, dó
12. Mudou alguma coisa na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
R: (Não respondeu, abaixou a cabeça. Depois se dispersou, olhando e conversando com os
outros meninos).
Roberto, olha a entrevista!
R: (Agressivo) Ah, peraí (A filmagem foi interrompida)
13. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
R: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça). A bagunça dos meninos aqui, o Gabriel
tem orelha grande (Gabriel deu um tapa em Roberto). A professora ensinar bem, melhorar
os meninos para gente ir pra frente, pra um dia a gente virar formado em violino (tampa o
rosto com o boné). Os meninos ficam aqui, a gente fica com vergonha..
14. O quê está faltando para melhorar?
R: Nada.

COMENTÁRIO 15: Roberto esteve disperso, sendo a entrevista interrompida algumas


vezes. No início, o aluno respondeu que era “Bom, ótimo!” estar participando da Oficina
172

de Cordas. Quando foi perguntado qual o aspecto que mais gostava, respondeu ser a aula
de violino (apesar de tocar viola). Porém, complementou que precisava melhorar a
bagunça. Quando foi perguntado sobre se teria gostado da metodologia em grupo, o aluno
respondeu negativamente: “(...) tem muita bagunça. Um faz bagunça, o outro quer fazer
também”. A professora/pesquisadora perguntou se fosse retirando o fator “bagunça”, se o
aluno estaria gostando da aula em grupo. Roberto acenou positivamente com a cabeça.
Sobre quais eram as habilidades desenvolvidas pela Oficina de Cordas, o aluno se limitou a
afirmar: “Muita Coisa!”. A professora/pesquisadora insistiu em perguntar o quê ele teria
aprendido, de maneira mais contundente, Roberto respondeu: “Arco, a corda ré, sol. Qual
é o nome daquela? (...) lá, dó”. Quando se perguntou sobre o quê teria modificado em sua
vida, o aluno abaixou a cabeça e se dispersou, olhando e conversando com os outros
meninos. A professora/pesquisadora chamou sua atenção, alertando que naquele momento,
estava dando o seu depoimento. Roberto reagiu agressivamente: “Ah, peraí”. A entrevista
foi interrompida. Após a interrupção, foi perguntado se o aluno teria algum comentário
e/ou sugestão a fazer, Roberto respondeu da seguinte maneira: “A bagunça dos meninos
aqui, o Gabriel tem orelha grande”. Nesse momento, Gabriel deu um tapa em Roberto.
Nota-se que o aluno ainda não desenvolveu atitudes como, respeito ao colega, seriedade e
compromisso com a atividade. Durante o semestre aluno esteve, ora alheio às atividades
propostas em sala de aula, ora envolvido em “bagunças”.

FIGURA 81 – Depoimento 16
DEPOIMENTO 16: Josimar (16 anos)

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


J: Bão.
2. Você está gostando?
J: Tô.
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
J: Tudo.
4. O quê é mais legal na aula?
J: Tocar com o arco.
5.O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
J: Não.
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
J: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça) Bom, pra gente ser alguém na vida.
7.O quê a música significa na sua vida hoje?
J: Bão.
8.Você recomendaria para outras pessoas?
J: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
173

9. Por quê?
J: Porque é bom. Tudo que é melhor para mim, é melhor pra eles também.
10. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
J: Gostei.
11. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
J: Sentar direito e aprendi também o nome das notas, tocar.
12. O convívio com o grupo é bom?
J: Bom pra alguns né? Porque têm alguns que conversa demais e atrapalha.
13. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas?
J: Nada.
14. Você está indo lá, na aula de música, tem alguma coisa que mudou dentro de
você?
J: A música é bom porque eu tô indo nela e não tô ficando na rua. Não tô nem engraxando
mais.
15. Você se vê no futuro tocando um instrumento?
J: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
16. Você gostaria de ser músico profissional?
J: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
17. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão?
J: Ah eu queria falar que tocar violino e cello é bom.

COMENTÁRIO 16: O aluno respondeu, de maneira suscinta às perguntas. Afirmou que


estava gostando de participar da Oficina de Cordas, que gostava de tudo, e aspecto que
mais gostava era “tocar com arco”. Quando foi perguntado porque recomendaria para
outras pessoas essa atividade musical, Josimar respondeu: “Porque é bom. Tudo que é
melhor para mim, é melhor pra eles também”. O aluno demonstrou ter compreendido que
o compartilhar e a cooperação são essenciais para a convivência. E ainda, que as
experiências válidas para um indivíduo, podem ser igualmente positivas para um outro.
Sobre quais foram as habilidades desenvolvidas nas Oficinas de Cordas, Josimar afirmou
que aprendeu a sentar, o nome das notas e tocar. Sobre o trabalho em grupo, o aluno
afirmou ser “Bom pra alguns né? Porque têm alguns que conversa demais e atrapalha”.
Josimar demonstrou ter consciência de que o mal comportamento de alguns indivíduos
atrapalha todo o grupo. Quando foi perguntado sobre o que teria mudado em sua vida, após
esta experiência musical, afirmou que “nada” havia modificado. Porém, quando foi
perguntado se gostava de música, o aluno revelou a grande mudança em sua vida,
provocada pelo início dos estudos musicais: “A música é bom porque eu tô indo nela e não
tô ficando na rua. Não tô nem engraxando mais”.

FIGURA 82 – Depoimento 17
DEPOIMENTO 17: Luiz (14 anos)
174

1. O quê significa para você estar participando da Oficina de Cordas?


L: É bom, ninguém nasce sabendo, a gente aprende alguma coisa na vida.
2. Você está gostando?
L: (Animado) Amando!
3. O quê você mais está gostando? Qual é o aspecto que você mais gosta?
L: Viola.
4. O quê você não está gostando? Tem algum aspecto que você não gosta?
L: Não, lá tudo é bom, gosto de tudo.
5. Como é para você estar em uma orquestra?
L: Um orgulho.
6. Você gostaria de continuar na Oficina de Cordas?
L: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
7. Você recomendaria para outras pessoas?
L: Hã, hã (Acenou positivamente com a cabeça).
8. Você gostou da metodologia aplicada no Ensino em grupo?
L: Gostei.
9. Qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em você?
L: Eu não sei falar, mas desenvolvi muito.
10. O quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de Cordas? Mudou
alguma coisa?
L: (Em tom melancólico) Pra mim não muda nada, mas tá bom!
11. Sobre o recital, você gostou de tocar em grupo? Fale dessa experiência...
L: Foi uma alegria porque eu nunca tinha apresentado. Não, nunca sabia que era apresentar
(Roberto interrompeu e ele ficou sério).
12. Você quer fazer mais algum comentário ou dar alguma sugestão? Alguma coisa
que você acha que pode melhorar?
L: O quê pode melhorar é todo mundo ficar quieto, obedecer, só.

COMENTÁRIO 17: Antes do início do depoimento, o aluno demonstrou um misto de


timidez, satisfação e alegria ao ser filmado (Luiz ria sem parar!). Sobre o que significava
estar participando da Oficina de Cordas, o aluno respondeu: “Bom, ninguém nasce
sabendo. A gente aprende alguma coisa na vida”. O aluno demonstrou saber a importância
da oportunidade. Perguntado se estaria gostando da experiência musical, Luiz respondeu,
animado, que estava “amando!”, sendo que o quê mais gostava era a viola. Quando
perguntou-se sobre o quê estava sentindo participando de em uma orquestra, Luiz
respondeu: “Um orgulho!”. Nota-se pelas respostas, que o aluno desenvolveu um
sentimento de afetividade em relação às experiências proporcionadas pela Oficina de
Cordas. Em um outro momento, ao ser perguntado sobre o quê teria mudado em sua vida,
após o início dos estudos musicais, Luiz, em tom melancólico, respondeu : “Pra mim não
muda nada, mas tá bom!”. Notou-se um tom de desabafo, uma falta de perspectiva de vida
e o conformismo com a realidade vivida. Sobre o recital, com brilho nos olhos, Luiz
175

revelou: “foi uma alegria porque eu nunca tinha apresentado. Não, nunca sabia que era
apresentar”. Observa-se que essa nova experiência trouxe ao aluno o sentimento alegria,
mas também, de valorização, melhorando a sua auto-estima. Ao fazer seu comentário final,
o aluno demonstrou ser o único a ter a consciência de que o mal-comportamento parte de
todos: “O quê pode melhorar é todo mundo ficar quieto, obedecer, só” (grifo nosso).

5.5.1.4. Observações e/ou análises dos depoimentos dos sujeitos

Ao se descrever e se comentar os depoimentos dos sujeitos dos grupos,


COMUNIDADE e CEACA, observou-se alguns aspectos relevantes para o enriquecimento
das discussões, da presente pesquisa.
Inicialmente, quando foi perguntado para os sujeitos do grupo
COMUNIDADE, o quê significava estar participando da Oficina de Cordas, obteve-se
respostas como:
- um sonho;
- a atividade tem muita importância por dar mais tranqüilidade;
- aprende e se diverte, explorando novos horizontes;
- aprimorar;
- a música como complemento da vida;
- sempre gostou de música;
- sempre quis estudar música; a Oficina de Cordas deu a “oportunidade”;
- sempre quis tocar os instrumentos que hoje toca;
- optou em aprender um outro instrumento através da Oficina de Cordas.

Os sujeitos do grupo CEACA responderam a mesma questão da seguinte


forma:
- bom, muito bom e/ou ótimo (5 sujeitos);
- uma experiência nova para aprender muita coisa, uma “oportunidade”;
- significa muita coisa, significa aprender;
- significa muita coisa, significa ter o futuro garantido.

A outra questão perguntada foi se os sujeitos estariam gostando de estudar


na Oficina de Cordas: 100% dos sujeitos, de ambos os grupos, responderam
176

positivamente. Da mesma forma, quando foram perguntados sobre se gostaria de


continuar na Oficina de Cordas, se recomendaria para outras pessoas, e se gostou da
metodologia aplicada no Ensino em grupo, todos os sujeitos responderam de maneira
afirmativa.
Quando se perguntou, qual é o aspecto que você mais gosta, obteve-se as
seguintes respostas dos sujeitos do grupo COMUNIDADE:

- do trabalho em grupo, do grupo ou aprender pelo ensino em grupo (6 sujeitos);


- como a coisa flui, a facilidade de aprender e o conjunto;
- dos recitais (2 sujeitos);

Os sujeitos do grupo CEACA responderam a mesma questão, da seguinte


forma:
- violino (3 sujeitos);
- de tudo (2 sujeitos);
- de tudo, mais de tocar com o arco;
- viola;
- da aula de violino.

Quando se perguntou se teria algum aspecto que você não gosta, seis (6)
sujeitos do grupo COMUNIDADE responderam que não havia aspecto algum, que não
gostassem; dois (2) sujeitos responderam não existir aspectos negativos, porém,
ressaltaram os seguintes aspectos: deveriam ser estudadas músicas mais difíceis e ter um
atendimento individualizado para os alunos que têm mais dificuldade, em horário
separado. Um (1) único sujeito respondeu de maneira afirmativa, dizendo que o aspecto
negativo seria, a duração da aula. Gostaria que tivesse mais aula. Acredita-se que este
aspecto não deva ser considerado como negativo, já que se o aluno queria mais aula,
significa que a aula era boa e que ele estaria gostando. No grupo CEACA, sete (7) sujeitos
responderam não existir aspecto algum que não gostassem. Somente um (1) sujeito
respondeu ser a “bagunça”, um aspecto negativo.
Sobre qual (is) habilidade (s) que a Oficina de Cordas desenvolveu em
você, obteve-se as seguintes respostas do grupo COMUNIDADE:
177

- tocar violino, menos tímida e desinibida (desinibição);


- ajudou na prova de teoria, ligando a teoria e prática;
- pulsação, ouvido, movimentos corretos, ler partitura, interpretar o tempo;
- ouvir, memória, coordenação motora, concentração;
- antes não gostava de tocar, agora gosta;
- ritmo;
- relaxamento;
- raciocínio, agilidade;
- a didática.

Os sujeitos do grupo CEACA responderam a mesma questão, da seguinte


forma :

- sentar de maneira correta (2 sujeitos);


- antes não sabia nada, agora está sabendo;
- manusear o instrumento de forma correta, ouvir, coordenar os movimento e maior
agilidade;
- tocar violino;
- tocar com o arco;
- muita coisa;
- não sabe falar, mas desenvolveu muito.

Sobre o quê mudou na sua vida após você ter iniciado na Oficina de
Cordas, dos sujeitos do grupo COMUNIDADE , se obteve as seguintes respostas:

- pode tocar na igreja;


- mais segurança, mais autonomia, uma melhoria que fez com que deixasse a análise;
- conhece um pouco mais de música; pode aplicar a música na vida;
- faz alguma coisa;
- acalmou as tensões, a música acalma (2 sujeitos);
- começou a gostar e valorizar mais a música;
- ficou mais leve; mudança de postura (leva a sério como se fosse uma profissão);
- aprendeu mais um instrumento.
178

Os sujeitos do grupo CEACA responderam a mesma questão da seguinte


forma :

- está aprendendo a tocar, antes não sabia (3 sujeitos);


- tem mais interesse pela música e pelo violino;
- mudou muita coisa (mas não sabe dizer);
- não está indo mais para a rua;
- não muda nada, mas está bom!

Um outro aspecto a ser comentado diz respeito ao trabalho em grupo. Para os


sujeitos do grupo COMUNIDADE, estudar em grupo significou:

- uma motivação a mais;


- o prazer de aprender com os colegas;
- estar numa família;
- conhecer outras pessoas;
- aprender mais rápido;
- conhecer novos instrumentos, entre outros.

Nos depoimentos dos sujeitos do CEACA, observou-se que todos têm


consciência de que o mal-comportamento dos sujeitos, atrapalhou o desenvolvimento do
grupo:

- “o grupo tá mais ou menos (...) tem dia que tá bom, tem dia que tá ruim” (Gabriel);
- “tá faltando o grupo se entrosar mais”, “têm meninos que estão fazendo bagunça,
estragando a aula (Rafael);
- “precisa melhorar uma coisa: bagunça!” (Roberto);
- precisa melhorar “a bagunça dos meninos” (Pedro);
- “alguns conversa demais e atrapalha” (Josimar);
- “o quê pode melhorar é todo mundo ficar quieto, obedecer, só” (Luiz).

Um ponto a ser destacado, refere-se à motivação proporcionada pelas


apresentações públicas. Todos os sujeitos mencionaram os recitais, de maneira positiva,
179

denotando a satisfação, o reconhecimento pelo esforço, a alegria, a valorização que leva o


aumento da auto-estima. Notou-se que, para a maioria dos alunos, de ambos os grupos, a
apresentação pública (subir ao palco), aconteceu pela primeira vez, através dos recitais da
Oficina de Cordas. Verifica-se que nesses momentos, oportunizou-se para os sujeitos, uma
nova experiência de vida.

5.5.2. Recitais

5.5.2.1. Descrição dos recitais

Para demonstrar o resultado do processo pedagógico musical da Oficina de


Cordas, do Projeto de Extensão, EMAC/UFG, programou-se cinco (5) apresentações
públicas para o encerramento do semestre letivo. O Grupo COMUNIDADE participou de
quatro (4) apresentações e o Grupo CEACA, de duas (2). A primeira apresentação ocorreu
no dia 22.11.02, às 18 h, na IV Semana Cultural Religiosa (Movimento pela Paz), no Salão
Social do Colégio do SESI-Campinas. Somente o grupo experimental COMUNIDADE,
apresentou-se nesse evento, ao lado dos grupos de veteranos. O programa apresentado pelo
Grupo COMUNIDADE (vide Anexo 7 e 8) e pelos veteranos foi: “Brincando na Neve”,
do Folclore Francês; o “Tema da 9ª Sinfonia”, de L.V.Beethoven; e “A Conquista do
Paraíso”, de Vangelis.
A segunda apresentação ocorreu dentro do Projeto “Terça Tem Canja” –
Secretaria Municipal de Cultura, no dia 03.12.02, às19h, na Sede da Secretaria Municipal
de Cultura – Rua. 84, n º 535 - Setor Sul. Da mesma forma, o Grupo COMUNIDADE
tocou com os veteranos, as seguintes peças: “Brilha, Brilha a Estrelinha”, Tradicional;
“Brincando na Neve”, do Folclore Francês; o “Tema da 9ª Sinfonia”, de L.V.Beethoven;
e “A Conquista do Paraíso”, de Vangelis.
A terceira apresentação ocorreu dentro do Recital de Encerramento das
Oficinas de Música, do Projeto de Extensão, da EMAC/UFG, no dia 04.12.02, às 19h, no
Auditório da Escola de Música e Artes Cênicas, no Campus II. Neste recital, o Grupo
COMUNIDADE subiu ao palco tocando sozinho a peça “Frère Jacques”, do Folclore
Francês. Para finalizar o recital, tocou com os veteranos as peças: “Brilha, Brilha a
Estrelinha” , Tradicional; “Brincando na Neve” do Folclore Francês; o “Tema da 9ª
Sinfonia”, de L.V.Beethoven; e “A Conquista do Paraíso”, de Vangelis.
180

A quarta apresentação aconteceu no dia 08.12.2002, às 11h, no Teatro Yguá, do


Centro Cultural “Martim Cererê”. O recital ocorreu dentro do “Projeto Manhãs Musicais”,
promovido pela Sociedade Goiana de Música, e contou com a participação dos dois grupos
experimentais: Grupo CEACA e Grupo COMUNIDADE. O primeiro grupo apresentou a
peça “Bambalalão” do Folclore Brasileiro; já o segundo, executou duas peças: “Brilha,
Brilha a Estrelinha” , Tradicional; e “Frère Jacques”, do Folclore Francês. Como nas outras
apresentações, o Grupo COMUNIDADE e os veteranos subiram ao palco para o
encerramento do recital, tocando as seguintes peças: “Brilha, Brilha a Estrelinha”,
Tradicional; “Brincando na Neve”, do Folclore Francês; o “Tema da 9ª Sinfonia”, de
L.V.Beethoven; e “A Conquista do Paraíso”, de Vangelis. Essa apresentação marcou o
encerramento do semestre letivo para todas as turmas, com exceção ao Grupo CEACA,
que se apresentou posteriormente.
A quinta apresentação ocorreu no dia 18.12.02, às 18 h, no Auditório da
Caixa Econômica Federal, dentro da I Mostra de Educação Social da Coordenação de
Proteção Integral, “Pelos Direitos da Criança e do Adolescente”, promovido pela
Sociedade “Cidadão 2000”. O Grupo CEACA apresentou a peça “Bambalalão”, do
Folclore Brasileiro.

5.5.2.2. Observações e/ou análises dos recitais

As apresentações públicas foram extremamente motivadoras, para ambos os


grupos. O clima era de alegria e entusiasmo. Como já foi dito, para grande parte dos
sujeitos, as apresentações públicas foram a primeira oportunidade de estar em um palco, ou
mesmo, em um teatro. Os alunos do grupo CEACA (com exceção de Daniel, Júnior e Luiz,
que foram levados a um recital no Teatro Goiânia pela professora/pesquisadora), nunca
haviam estado em algum teatro ou sala de concerto. Alguns de seus familiares relataram,
da mesma forma, ser a primeira vez que estavam em um teatro, assistindo a um “concerto”
e ainda, que não conheciam os instrumentos de cordas de arco. Observou-se, a partir dessa
experiência, o brilho nos olhos de todos, pais e filhos; e o sentimento de pertencimento,
inserção e valorização.
Mesmo para os sujeitos do grupo COMUNIDADE, o significado dessas
experiências (de se apresentar em menos de quatro meses, em vários locais, e ainda, com o
grupo de veteranos), foi demonstrado através da seriedade, do comprometimento, da
181

alegria nos sorrisos, da satisfação. O grupo COMUNIDADE foi a turma que, se comparada
à todas as outras que passaram pela Oficina de Cordas, desde 200052, apresentou mais
peças, em menos tempo, totalizando cinco (5). Também foi a única turma de novatos que
conseguiu tocar com o grupo de veteranos (juntava-se grupos veteranos, em diferentes
estágios). Da mesma forma, foi o grupo de iniciantes que mais se apresentou, em uma
mesma “temporada”: quatro (4) recitais.
Já o grupo CEACA, devido à realidade do grupo, suas necessidades, seu
cotidiano, desenvolveu durante o semestre, um programa diferenciado dos grupos
anteriores, inclusive do grupo COMUNIDADE. Modificou-se a metodologia, inserindo
novas estratégias, para a sua adequação ao grupo CEACA. O desempenho dos alunos no
palco foi surpreendente (nada de bagunça ou inquietação). Trabalhou-se uma única peça,
explorando sonoridades e efeitos percussivos. O resultado sonoro foi bastante interessante,
porém, o resultado daquela experiência e oportunidade na vida desses meninos, acredita-se
ser maior do que qualquer outro aspecto. Notou-se um grande crescimento no
comportamento e interesse dos sujeitos, nos ensaios visando as apresentações. Acredita-se
que foi recompensador para todos, o trabalho e o esforço empreendidos durante o semestre.
Outro ponto interessante, que merece ser destacado, se refere ao fato de que o
ensino coletivo propicia uma grande motivação causada pelas apresentações públicas; ao
contrário da aula individual, onde o solista, por estudar e tocar sozinho, sente medo ou
insegurança no palco. Os alunos que estudam através do ensino coletivo, se sentem
confiantes e querem mostrar (para todas pessoas possíveis!) o trabalho desenvolvido em
conjunto, em várias apresentações e locais diferentes. Com isso, três dos cinco recitais
apresentados, foram sugeridos pelos próprios alunos. Daniela nos convidou para o recital
do SESI, já que a mesma estuda no colégio. Quando ficou sabendo da “IV Semana
Cultural Religiosa (Movimento pela Paz)”, a aluna não hesitou, e propôs ao colégio a
apresentação de “sua Orquestra de Cordas”. Da mesma forma, Lucas (do grupo de
veteranos) nos convidou para tocar no Projeto “Terça têm Canja”, da Secretaria Municipal
de Cultura. A sua avó trabalhava nesta Secretaria e encaixou a Oficina de Cordas na
programação. Por fim, o recital de encerramento, no Martim Cererê, foi intermediado pela
aluna Kamila. Seu pai é clarinetista e pertence à Sociedade Goiana de Música. Com isso, a
aluna ficou encarregada de acertar os “detalhes” da organização do evento.

52
Com os grupos COMUNIDADE e CEACA, já são 7 (sete) turmas de iniciantes desde a implantação da
metodologia pesquisada.
182

Como se pôde observar, o ensino coletivo de cordas propicia a participação


efetiva dos alunos, tanto durante as aulas propriamente ditas, como nos outros casos
descritos.

5.6. OBSERVAÇÕES DO JÚRI

Para enriquecer as análises e observações sobre o desempenho dos grupos,


formou-se um júri, composto por três observadores neutros (um educador musical, um
musicoterapeuta e um musicólogo), que não conheciam o processo ensino-aprendizagem
da Oficina de Cordas. Foram disponibilizadas, para os observadores, 8 (oito) fitas cassetes,
com aproximadamente 42 (quarenta e duas) horas gravadas, contendo as
intervenções/aulas de cada grupo, bem como, todas as apresentações finais, depoimentos
dos sujeitos e a repercussão na imprensa televisiva. Seguem-se as observações do júri e os
comentários referentes às mesmas. As observações 1 e 2 foram transcritas na íntegra, já a
observação 3, resultou da retirada de excertos (trechos principais), pois continham grande
quantidade de informações.

FIGURA 83 – Observação 1
OBSERVAÇÃO 1

1. Ensino gradativo, os conceitos se sucedem;


2. Prática da descoberta das cordas, para depois entrar na partitura com identificação de
elementos/símbolos musicais;
3. Diálogos começam a aparecer a partir de propostas de soluções de problemas, questões
que fixam a aprendizagem e apontam para elementos novos via descoberta;
4. Utilização de práticas de memória, palavras como “relembrar” levam à fixação de
aprendizagem;
5. Noções de situações são sempre fixadas via controle pela marcação do tempo, que levam
à integração da turma, participação atenta, auto-disciplina, respeito pelo outro e
necessidade de relações coordenadas e conjuntas. Novas habilidades são apreendidas, a
cada passo novo dado;
6. Grupo se expandindo em número;
7. Atitudes de um valorizar e esperar pela execução e tentativa de acerto do outro, levam à
disciplina e relações de respeito;
8. Aprender por imitação ao outro;
9. A posição do instrumento e da postura exige também disciplina, imitação e solução de
problemas constantes; a repetição leva à perfeição;
10. Trabalho árduo, requer interação constante do instrutor com cada elemento do grupo, e
paciência dos integrantes;
11. Muita explanação sobre os conceitos, justificando cada orientação;
12. Execução e posturas corporais (segurar o arco, posição do braço, relaxamento) foram
183

corrigidas individualmente;
13. Imitação de gestos para a conscientização do movimento correto;
14. As perguntas formuladas com termos difíceis para algumas crianças (a pesquisadora
teve que adaptar);
15. Sobre os depoimentos dos sujeitos revelou os seguintes aspectos: possuem a
consciência do grupo; noção de papel do grupo (contra bagunça); noção de que a atitude
importa; consciência de que a experiência ampliou as perspectivas; consciência de
mudança; mudança de comportamento; auto-controle por parte dos sujeitos; melhora da
auto-estima; os sujeitos estão muito envolvidos com as ações ligadas ao processo.

FIGURA 84 – Observação 2
OBSERVAÇÃO 2

Observações das aulas:


- Sobre o método, é interessante notar a condução, simultânea da leitura através do solfejo
rítmico-melódico e através da prática no instrumento;
- Outro dado é o trabalho com compassos ora ternários, ora quaternários;
- As indicações da professora são muito claras, dando segurança ao grupo;
- A presença de um outro professor (assistente) parece dar mais ênfase aprendizagem; há
preocupação com a afinação e com a postura, pontos cruciais na aprendizagem de
instrumentos de corda.
Grupo CEACA:
- A ansiedade para aprender parece grande pois um aluno (grupo CEACA) reclama quando
repete muito o mesmo exercício;
- Há uma certa dificuldade em aguardar o tempo de aprendizagem dos colegas (nas
primeiras aulas), levantam muito, entrando e saindo da aula;
- A necessidade de impor limites e chamar a atenção para o trabalho realizado
(aprendizagem) faz parte do processo deste grupo. Educar é também saber dar limites na
“hora certa”. Estes limites, esta educação, se estenderá para momentos do dia-a-dia de cada
participante, pois não se restringe às aulas;
- Observa-se que há uma inconstância na freqüência, o que pode dificultar o processo de
aprendizagem do grupo como um todo. Questionou-se o motivo das faltas?
Reportagens e Depoimentos:
- Contato com instrumentos – uma experiência inesperada para crianças/adolescentes
carentes;
-A descoberta de um potencial inexplorado para cada participante e o vislumbrar de uma
oportunidade de vida profissional ligada à música;
- Vê-se a importância da valorização do “ser” em sua integralidade;
Observações sobre os depoimentos dos sujeitos do Grupo CEACA:
- Poderia ter sido feita a entrevista numa sala;
- Mudanças – contato com o violino/interesse/auto-valorização;
- Os participantes recomendariam para outras pessoas;
- O companheirismo é apontado como algo trabalhado. Pode melhorar se houver mais
atenção do grupo, reclamam da “bagunça”;
- Metodologia – só a falta de disciplina que atrapalha;
- Roberto – desatento/se distrai com o ambiente em que é feita a entrevista);
184

- Destacou-se nos depoimentos : “Se é melhor para mim é melhor para eles também”
“Não estou ficando mais na rua” (Josimar, 16 anos); ter “orgulho” (Luiz, 14 anos) – sente-
se o aumento da auto-estima;
- Todos reclamam da bagunça, ou seja, percebem que o comportamento, a falta de
disciplina, influenciam no processo de aprendizagem.
Observações sobre os depoimentos dos sujeitos do Grupo COMUNIDADE:
- Praticar em casa pode proporcionar uma contínua aprendizagem;
- Ter colegas, tocar em conjunto é uma forma de motivar a aprendizagem;
- Melhoria na vida – mais segurança, motivação, mais autonomia, mais tranqüilidade;
- Ao tocar, liga-se a prática à teoria, ao estimular a percepção auditiva;
- “Vir para aprender e para me divertir” (motivação)
- A música como um complemento necessário à vida;
- A memória, o raciocínio, a concentração e o ouvido (percepção auditiva) como
habilidades desenvolvidas. Uma das alunas aponta que a nova didática, pois já estuda
música e não conhecia o método;
- O recital é uma oportunidade de valorizar a aprendizagem, é como um desafio vencido;
-Todos evidenciam o trabalho em grupo, o companheirismo, o método aplicado. Aprende-
se com os próprios erros e com os erros dos outros;
Recitais :
- Os arranjos mais simples possibilitam a oportunidade do tocar em grupo, mesmo com
pouco tempo de aprendizado, motivando os participantes em função do resultado sonoro;
- A quantidade de apresentações é uma razão a mais para a motivação do grupo para obter
melhores resultados. aumenta a auto-valorização, a auto-estima individual e grupal;
- Saliento a união dos grupos (com maior e menor tempo de estudo) para as apresentações,
pois os quê têm menos tempo de estudo vêm a continuidade do processo ao tocarem com
os que já têm mais experiência, mais tempo de contato com os instrumentos de corda;
- A professora demonstra segurança ao falar e ao conduzir o grupo no decorrer do
processo, mesmo sendo uma metodologia mais nova.
“Parabéns pela coragem ao realizar este projeto!”

FIGURA 85 –Observação 3
OBSERVAÇÃO 3

1. As fitas com as gravações das aulas, recitais e depoimentos de alunos das Oficinas
Coletivas de Cordas são documentos valiosos, e propiciam o acompanhamento gradativo
do processo educacional por que passaram as duas turmas de iniciantes do segundo
semestre/2002. Apesar das dificuldades técnicas de áudio, que impossibilitam o
discernimento completo dos diálogos entre professora e alunos, alguns aspectos chamam a
atenção de quem assiste as fitas e tornam-se relevantes em uma análise sobre o desenrolar
das ações e os seus resultados.
2. (..) destaco o fato das oficinas coletivas de música propiciarem modificações não só na
área educativo-musical, mas também em aspectos que se referem aos fatores
comportamentais, culturais e sociais;
3. É um Projeto voltado muito mais para as ações educativas do que para as ações
culturais. Entretanto, um estudo mais detalhado revela aspectos deste Projeto que
ultrapassam o ensino-aprendizagem musical e evidenciam uma integração entre as áreas
educativa, cultural e, também, social.
185

4. As oficinas coletivas de cordas visam uma iniciação aos instrumentos musicais através
de processo didático pedagógico interessante, implementado no Brasil inicialmente por
Alberto Jaffé e que, sem dúvida, exerce função cultural e social ao possibilitar o
barateamento das aulas e o conseqüente acesso de um maior número de alunos. Desta
forma, é propiciada uma sociabilização que as aulas individuais não oferecem, bem como é
possibilitado o conhecimento sobre instrumentos e repertórios geralmente distantes da
realidade da maioria da população. Há, ainda, maiores condições de o aluno exercitar o
trabalho conjunto, aprender a ouvir o “outro” e a observar as orientações do maestro, e
desenvolver seu senso de harmonia e de equipe, bem como traçar parâmetros para
identificar se as suas dificuldades com o instrumento são também as dificuldades dos
outros integrantes do grupo. Assim, além das observações feitas pelo professor, o aluno
tem condições de se auto-avaliar quanto ao seu desenvolvimento e ao de seus colegas.
5. Um outro exemplo, que ilustra com clareza a integração entre as ações educativas,
culturais e sociais neste Projeto é um dos desdobramentos propiciados pelo ensino
coletivo. Trata-se das oficinas oferecidas para garotos e garotas em situação de rua em
parceria com a Organização Não Governamental “Sociedade Cidadão 2000”. Esse
trabalho, realizado pela primeira vez no segundo semestre de 2002, é oferecido
gratuitamente, a fim de auxiliar o trabalho das ONGs e propiciar a musicalização das
crianças através dos instrumentos de cordas e arco e de um coral.
6. Ao assistir as fitas, que documentam da primeira à última aula, inclusive os recitais,
pode-se perceber as várias modificações ocorridas com os dois grupos. Os resultados
obtidos mostram que os alunos, tanto da turma da comunidade quanto da turma vinculada a
ONG, considerados os níveis de dificuldade de cada qual, demonstraram crescimento
quanto ao aspecto musical. Mas o que chama a atenção, principalmente no caso da turma
de alunos “em situação de rua”, não é só o aspecto musical. São evidentes algumas
mudanças comportamentais, como, por exemplo, o melhor relacionamento em grupo, a
melhor disciplina, o despertar para a cidadania, a recuperação da auto-estima, as noções de
respeito ao próximo e ao maestro. Em seus depoimentos, gravados no encerramento das
aulas do semestre, os alunos das oficinas ressaltam o bom resultado obtido, e demonstram
a importância da experiência para eles: “...aprendi melhor postura. Acabou a dor nas
costas por que aprendi a sentar” (Daniel); “É uma experiência nova. Muitos não têm essa
oportunidade. (...) Aprendi a manusear o instrumento. Aprendi a ouvir, a ter mais
agilidade com os braços. Tenho mais interesse, dou mais importância quando vejo alguém
falando em violino.” (Rafael;)“Quando crescer, um futuro garantido.(...) Eu não sabia
tocar violino, daí aprendi. Tá mudando bastante coisa.” (Pedro); “Ser alguém na vida. (...)
Se quero o melhor pra mim, quero o melhor pra eles também. (...) Aprender a sentar
direito, nome das cordas, tocar. (...)Têm uns que fazem bagunça demais, conversa e
atrapalha. (...) Eu tô indo e não tô ficando na rua.” (Josimar)
7. A partir das gravações assistidas e dos estudos desenvolvidos para a elaboração da
monografia acima citada, pode-se observar que as Oficinas Coletivas possibilitam uma
iniciação musical mais ágil, motivando o aluno e incentivando o contato constante com o
instrumento (esse fato é ressaltado nos depoimentos colhidos individualmente com os
alunos). Nos parece, portanto, que o método adotado nas Oficinas Coletivas acompanha as
tendências da sociedade atual, e possibilita uma relativa flexibilização para se adaptar às
necessidades dos grupos. Assim, pode ser considerado um método importante no
atendimento a uma população cada vez mais carente de ações culturais, sociais e
educativas que se preocupem com a formação qualificada de um maior número de pessoas,
em todas os estratos da sociedade.
8. Aspectos relevantes a serem destacados:
186

- As formas de atuação do professor – a postura do educador musical que trabalha com


oficinas coletivas deve ser adequada ao que o método propõe. Ou seja, é necessário que
este educador tenha uma visão social e cultural abrangente e que considere a arte como um
elemento intrínseco às sociedades, e não como privilégio de determinados grupos apenas.
Deve, portanto, considerar a música, como uma das formas de sociabilizar as pessoas,
democratizar o conhecimento, e trabalhar aspectos variados que não se restrinjam à técnica
e ao domínio do instrumento musical. É preciso, enfim, que o educador musical seja um
facilitador, aproximando-se da realidade do aluno e adaptando suas aulas às necessidades
detectadas. Se por um lado, cabe a esse educador direcionar o ensino, por outro lado ele
deve ter o cuidado de não assumir um papel paternalista ou assistencialista (principalmente
no caso de turmas como a do CEACA). É, portanto, um desafio para o educador e este
deve ter ciência do que pretende alcançar com seus alunos.
- Também chama a atenção de quem assiste as fitas as modificações que foram ocorrendo
com alguns alunos (quanto à disciplina em sala de aula, concentração e atenção ao
professor) e também com o educador (que, diante das dificuldades detectadas sentiu
necessidade de redirecionar suas estratégias de ação com os alunos). Precisou, por
exemplo, introduzir o uso do arco antes do previsto para a turma do CEACA, a fim de
diminuir as ansiedades dos alunos; necessitou também adotar exercícios de relaxamento, e
adaptar uma nova música para o Recital, visto que o processo de aprendizagem foi
diferenciado de um grupo para o outro. Já no caso da turma da Comunidade, alguns
depoimentos demonstram aspectos muito interessantes observados pelos alunos em relação
às aulas. Eles destacam, por exemplo, a maior facilidade de assimilar a teoria quando a
prática do instrumento é dada concomitantemente; as alterações quanto à concentração e
memorização, o relaxamento e a redução das ansiedades, o maior gosto pelo estudo regular
depois que começou a estudar música e a cooperação mútua que o ensino coletivo
proporciona (depoimentos como: “É como uma família. Um cobrindo os erros do outro”,
“Possibilita aprender com seus erros e os dos outros” , “desenvolvi a coordenação motora,
a pulsação e a audição de todos os instrumentos no conjunto e não só do meu
instrumento”).
9. Considero, portanto, que as Oficinas Coletivas de Música cumprem seu papel e
desempenham uma função social e cultural de grande importância, conforme já foi
ressaltado anteriormente.

5.7. ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES DO JÚRI

Os vídeos que continham as intervenções/aulas, os depoimentos dos sujeitos,


os recitais e as reportagens na imprensa televisa, foram analisados pelo júri. Da análise
foram detectados os aspectos mais relevantes e os elementos comuns dos fenômenos.
Pontos relevantes, sobre a metodologia do Ensino Coletivo de Cordas e a
didática utilizadas no experimento, foram destacados e observados:

- “Ensino gradativo, os conceitos se sucedem” (Obs.1).


- “Prática da descoberta das cordas, para depois entrar na partitura com
identificação de elementos/símbolos musicais” (Obs. 1).
187

- “Diálogos começam a aparecer a partir de propostas de soluções de problemas,


questões que fixam a aprendizagem e apontam para elementos novos via
descoberta” (Obs. 1).
- “Utilização de práticas de memória, palavras como ‘relembrar” levam à fixação
de aprendizagem” (Obs. 1).
- ‘Novas habilidades são apreendidas, a cada passo novo dado” (Obs.1).
- “Aprender por imitação ao outro” (Obs. 1).
- “A posição do instrumento e da postura exige também disciplina, imitação e
solução de problemas constantes; a repetição leva à perfeição” (Obs. 1).
- “Trabalho árduo, requer interação constante do instrutor com cada elemento do
grupo, e paciência dos integrantes” (Obs. 1).
- “Muita explanação sobre os conceitos, justificando cada orientação” (Obs. 1).
- “Execução e posturas corporais (segurar o arco, posição do braço, relaxamento)
foram corrigidas individualmente” (Obs. 1).
- “Imitação de gestos para a conscientização do movimento correto” (Obs. 1).
- “Sobre o método, é interessante notar a condução, simultânea da leitura através
do solfejo rítmico-melódico e através da prática no instrumento” (Obs. 2).
- “Outro dado é o trabalho com compassos ora ternários, ora quaternários”
(Obs.2).
- “As indicações da professora são muito claras, dando segurança ao grupo” (Obs.
2).
- “A presença de um outro professor (assistente) parece dar mais ênfase à
aprendizagem; há preocupação com a afinação e com a postura, pontos cruciais
na aprendizagem de instrumentos de corda” (Obs. 2).
- “A professora demonstra segurança ao falar e ao conduzir o grupo no decorrer do
processo, mesmo sendo uma metodologia nova” (Obs. 2).
- “Vê-se a importância da valorização do ‘ser’ em sua integralidade” (Obs. 2).
- “Ao tocar, liga-se à prática à teoria, ao estimular a percepção auditiva” (Obs. 2).
- “Os arranjos mais simples possibilitam a oportunidade do tocar em grupo, mesmo
com pouco tempo de aprendizado, motivando os participantes em função do
resultado sonoro” (Obs.2).
- “a maior facilidade de assimilar a teoria quando a prática do instrumento é dada
concomitantemente” (Obs.3).
188

- “(...) as Oficinas Coletivas possibilitam uma iniciação musical mais ágil,


motivando o aluno e incentivando o contato constante com o instrumento” (Obs.3).
- “(...) o método adotado nas Oficinas Coletivas acompanha as tendências da
sociedade atual, e possibilita uma relativa flexibilização para se adaptar às
necessidades dos grupos. Assim, pode ser considerado um método importante no
atendimento a uma população cada vez mais carente de ações culturais, sociais e
educativas que se preocupem com a formação qualificada de um maior número de
pessoas, em todas os estratos da sociedade” (Obs.3).
- “As formas de atuação do professor – a postura do educador musical que trabalha
com oficinas coletivas deve ser adequada ao que o método propõe. Ou seja, é
necessário que este educador tenha uma visão social e cultural abrangente e que
considere a arte como um elemento intrínseco às sociedades, e não como privilégio
de determinados grupos apenas” (Obs.3).

Quanto à disciplina, à integração, à relação de respeito, à união do grupo,


o “ouvir” o outro e à socialização, pôde-se destacar os seguintes trechos:

- “Noções de situações são sempre fixadas via controle pela marcação do tempo,
que levam à integração da turma, participação atenta, auto-disciplina, respeito
pelo outro e necessidade de relações coordenadas e conjuntas” (Obs.1).
- “(...) possuem a consciência do grupo; noção de papel do grupo (contra
bagunça)” (Obs.1).
- “(...) auto-controle por parte dos sujeitos” (Obs.1).
- “(...) os sujeitos estão muito envolvidos com as ações ligadas ao processo”
(Obs.1).
- “O companheirismo é apontado como algo trabalhado” (Obs.2).
- “Todos evidenciam o trabalho em grupo, o companheirismo, o método aplicado.
Aprende-se com os próprios erros e com os erros dos outros” (Obs.2).
- “Saliento a união dos grupos (com maior e menor tempo de estudo) para as
apresentações, pois os que têm menos tempo de estudo vêm a continuidade do
processo ao tocarem com os que já têm mais experiência, mais tempo de contato
com os instrumentos de corda” (Obs.2).
189

- “(...) maiores condições de o aluno exercitar o trabalho conjunto, aprender a ouvir


o ‘outro’ e a observar as orientações do maestro, e desenvolver seu senso de
harmonia e de equipe, bem como traçar parâmetros para identificar se as suas
dificuldades com o instrumento são também as dificuldades dos outros integrantes
do grupo. Assim, além das observações feitas pelo professor, o aluno tem
condições de se auto-avaliar quanto ao seu desenvolvimento e ao de seus colegas”
(Obs.3).

Quanto à motivação, à afetividade, à valorização, à auto-valorização, à


auto-estima, destacaram-se os seguintes relatos:

- “melhora da auto-estima” (Obs.1).


- “Vim para aprender e para me divertir (motivação)” (Obs. 2).
- “O recital é uma oportunidade de valorizar a aprendizagem, é como um desafio
vencido” (Obs. 2).
- “A quantidade de apresentações é uma razão a mais para a motivação do grupo
para obter melhores resultados. Aumenta a auto-valorização, a auto-estima
individual e grupal” (Obs. 2).

Quanto à mudança de hábitos e de atitudes, ao desenvolvimento e à


transformação do indivíduo, pôde-se destacar as seguintes observações:

- “(...) noção que a atitude importa; consciência de que a experiência ampliou as


perspectivas; consciência de mudança; mudança de comportamento” (Obs.1).
- “A descoberta de um potencial inexplorado para cada participante e o vislumbrar
de uma oportunidade de vida profissional ligada à música” (Obs.2).
- “Mudanças – contato com o violino/interesse/auto-valorização” (Obs. 2)
- “(...) pode-se perceber as várias modificações ocorridas com os dois grupos. Os
resultados obtidos mostram que os alunos, tanto da turma da comunidade quanto
da turma vinculada a ONG, considerados os níveis de dificuldade de cada qual,
demonstraram crescimento quanto ao aspecto musical. Mas o que chama a
atenção, principalmente no caso da turma de alunos ‘em situação de rua’, não é só
o aspecto musical. São evidentes algumas mudanças comportamentais, como, por
190

exemplo, o melhor relacionamento em grupo, a melhor disciplina, o despertar para


a cidadania, a recuperação da auto-estima, as noções de respeito ao próximo e ao
maestro” (Obs.3).
- “Também chama a atenção de quem assiste as fitas às modificações que foram
ocorrendo com alguns alunos (quanto à disciplina em sala de aula, concentração e
atenção ao professor) e também com o educador (que, diante das dificuldades
detectadas sentiu necessidade de redirecionar suas estratégias de ação com os
alunos)” (Obs. 3).
- “(...) as alterações quanto à concentração e memorização, o relaxamento e a
redução das ansiedades, o maior gosto pelo estudo regular depois que começou a
estudar música e a cooperação mútua que o ensino coletivo proporciona” (Obs.3).

5.8. RESULTADOS

Após a descrição e análise dos dados, via metodologia adotada, chegou-se aos
resultados abaixo relacionados que, a partir do ensino coletivo de cordas, comprovaram
que:

- há eficiência da metodologia na iniciação instrumental;


- o desenvolvimento dos elementos técnico-musicais para a iniciação do instrumento
é acelerado;
- o resultado musical acontece de maneira rápida, motivando os alunos a darem
continuidade ao estudo do instrumento;
- a teoria musical é associada à prática instrumental, facilitando a compreensão dos
alunos;
- 100% dos sujeitos gostaram de estudar da Oficina de Cordas, e gostariam de
continuar seus estudos, recomendando para outras pessoas o ensino coletivo
oferecido pela Oficina de Cordas;
- 100% dos sujeitos gostaram da metodologia aplicada no Ensino em grupo;
- houve baixo índice de desistência;
- houve desenvolvimento da percepção auditiva, coordenação motora, concentração,
memória, raciocínio, agilidade, relaxamento, disciplina, autoconfiança, autonomia,
independência, cooperação, solidariedade, entre outros;
191

- houve o desenvolvimento do senso-crítico, a partir de estímulos e condução


democrática da intervenção/aula;
- houve o desenvolvimento da consciência política e a noção de cidadania, através da
discussão de temas relacionados ao cotidiano;
- constatou-se a mudança no comportamento, nas atitudes e condutas; enfim, na vida
dos sujeitos;
- a performance em grupo em apresentações públicas, além de ser um fator de
motivação, trouxe segurança e desinibição aos alunos;
- as relações interpessoais entre os sujeitos, contribuem de maneira significativa no
processo de desenvolvimento da aprendizagem, causando maior motivação,
expressão de afetividade, auto-valorização e a auto-estima;
- o processo de interação entre os alunos, sociabilizando-os, desenvolve o respeito
mútuo, a cooperação, a solidariedade e a união do grupo;
- a didática e a metodologia de ensino devem ser adequadas ao perfil e às
necessidades de cada grupo;
- o educador musical deve estar atento às manifestações culturais da
contemporaneidade para um melhor diálogo com os alunos e conseqüentemente um
melhor desenvolvimento do ensino-aprendizagem;
- o educador musical deve compreender o contexto sócio-econômico, político e
cultural em que está inserido, para que sua atuação seja crítica e eficaz no sentido
de transformação social.

5.9. ANÁLISE FINAL

Neste item, far-se-á a análise de todos os comentários apresentados até o


presente momento, analisando as relações e as seqüências que fundamentam as discussões
dos dados encontrados, tendo como categorias principais de análise: (1) Eficiência da
metodologia do ensino coletivo de cordas; (2) Desenvolvimento de habilidades musicais
nos sujeitos; (3) Desenvolvimento das habilidades não-musicais nos sujeitos; (4) Mudança
de comportamento dos sujeitos.
Para comprovar a eficiência da metodologia do ensino coletivo de cordas (1),
buscou-se responder às questões referentes à metodologia do ensino coletivo de cordas e
192

à didática utilizadas no experimento. Constatou-se, tanto nos depoimentos dos sujeitos


quanto nas observações dos jurados, a eficiência da metodologia e da didática. No pré-teste
(questionário para a identificação dos sujeitos), todos os sujeitos pesquisados (com exceção
de um que não respondeu) acreditavam que a metodologia seria eficiente. No pós-teste
(depoimento final), 100% dos sujeitos pesquisados responderam que gostaram da
metodologia aplicada. Da mesma forma, o júri revelou ter observado aspectos importantes
advindos de metodologia adequada, em observações como: ensino gradativo, prática da
descoberta, propostas de soluções de problemas, utilização de práticas de memória,
aprendizado por imitação, aprendizado por repetição, muita explanação sobre os
conceitos, imitação de gestos para a conscientização do movimento correto, condução
interessante, indicações claras, junção da prática com a teoria, peças arranjadas de
acordo com cada grupo, uma iniciação musical mais ágil o método adotado nas Oficinas
Coletivas acompanha as tendências da sociedade atual. Da mesma forma, questionou-se
os educadores musicais sobre quais seriam as vantagens do ensino coletivo, obtendo-se as
seguintes respostas: a interação entre os alunos, despertando a socialização, o respeito
mútuo, a cooperação, a motivação, entre outros; o ambiente lúdico, provocado por esta
interação; o desenvolvimento do repertório de maneira mais rápida; a afinação do grupo
é melhor do que a de um iniciante sozinho; o desenvolvimento do ouvido harmônico do
aluno; a economia de tempo, já que se trabalha os mesmos aspectos e princípios
instrumentais e/ou musicais com todos os iniciantes; maior rendimento; e a baixa
desistência por parte dos alunos.
O desenvolvimento de habilidades musicais nos sujeitos (2) foi, igualmente,
constatado pelas análises das intervenções/aulas, pelos depoimentos dos sujeitos e pelas
observações dos jurados. Pelas análises das intervenções/aulas constatou-se que o
desenvolvimento musical dos sujeitos do grupo COMUNIDADE ocorreu de maneira mais
homogênea e acima da média se comparado aos grupos anteriores de iniciantes (pré-
experimentais). Já o grupo CEACA ocorreu de maneira diferenciada, abaixo da média dos
grupos anteriores de iniciantes, pelos motivos já dispostos, a saber: excesso de sujeitos
“flutuantes”; excesso de faltas (coletivas) e atrasos; aspectos comportamentais dos sujeitos:
indisciplina, baixa concentração, baixo respeito mútuo, pouca cooperação e solidariedade.
A diferença de comportamento dos sujeitos dos grupos pode ser oriunda das diferenças
sociais e econômicas, descritas e analisadas anteriormente (vide p.93). Relacionado com a
mesma variável, perguntou-se aos sujeitos quais habilidades que a Oficina de Cordas
193

poderia ter desenvolvido nos mesmos. Obtiveram-se as seguintes respostas: tocar violino;
ajudou na prova de teoria, ligando a teoria e prática; pulsação, ouvido, movimentos
corretos, ler partitura, interpretar o tempo; ouvir, memória, coordenação motora,
concentração; ritmo; relaxamento; raciocínio; agilidade; didática; sentar de maneira
correta e manusear o instrumento de forma correta. Da mesma forma, nas observações do
júri, contatou-se o desenvolvimento musical aliado ao desenvolvimento pessoal/social dos
sujeitos na prática coletiva: “demonstraram crescimento quanto ao aspecto musical (...)
maiores condições de o aluno exercitar o trabalho conjunto, aprender a ouvir o ‘outro’ e a
observar as orientações do maestro, e desenvolver seu senso de harmonia e de equipe,
bem como traçar parâmetros para identificar se as suas dificuldades com o instrumento
são também as dificuldades dos outros integrantes do grupo. Assim, além das observações
feitas pelo professor, o aluno tem condições de se auto-avaliar quanto ao seu
desenvolvimento e ao de seus colegas” (Obs.3). Com isso, através da iniciação
instrumental coletiva eficiente, os sujeitos se desenvolveram não só musicalmente, mas
também, adquiriram habilidades próprias para o desenvolvimento pessoal e social mais
amplo.
Nesse sentido, detectou-se o desenvolvimento de habilidades não-musicais (3)
nos sujeitos. Nas análises das intervenções/aulas de ambos os grupos, uma melhora
sensível dos sujeitos, nos seguintes aspectos: disciplina, organização, cooperação,
solidariedade, respeito mútuo, concentração, participação, desempenho, consciência
corporal, assimilação e acomodação dos conteúdos. Da mesma forma, nas análises dos
protocolos mencionados (depoimento dos sujeitos e observações do júri), observou-se o
desenvolvimento de habilidades não-musicais, tais como: a disciplina, a organização, a
integração, a relação de respeito, a união do grupo, o “ouvir” o outro, a socialização, a
cooperação, a motivação, a valorização, a auto-valorização, a desinibição, a
afetividade, a auto-estima. Confirma-se da mesma forma, os depoimentos dos educadores
musicais que atuam na área, quando afirmaram que o ensino coletivo promoveria nos
alunos: melhora da auto-estima; maior estímulo; maior disciplina; cooperação; e
desinibição.
Por fim, constatou-se a mudança de comportamento por parte dos sujeitos (4),
levando-os à observação de transformações ocorridas com os mesmos. Na análise das
intervenções/aulas observou-se que gradativamente os sujeitos melhoraram o seu
comportamento individual, e conseqüentemente, o comportamento grupal. Notou-se, da
194

mesma forma, a melhora dos aspectos relacionados anteriormente. Com o objetivo de


comprovar a ocorrência de transformação nos sujeitos, perguntou-se nos depoimentos o
que teria mudado na vida de cada um após o início dos estudos instrumentais na Oficina de
Cordas. Pôde-se obter respostas como: pode tocar na igreja; mais segurança, mais
autonomia, uma melhoria que fez com que deixasse a análise; conhece um pouco mais de
música; pode aplicar a música na vida; faz alguma coisa; acalmou as tensões, a música
acalma; começou a gostar e valorizar mais a música; ficou mais leve; mudança de postura
(leva a sério como se fosse uma profissão); aprendeu mais um instrumento; está
aprendendo a tocar, antes não sabia; tem mais interesse pela música e pelo violino; não
está indo mais para a rua. Da mesma forma, o júri observou mudanças, desenvolvimento e
transformação do indivíduo, a serem destacados: mudança de comportamento; noção que a
atitude importa; consciência de que a experiência ampliou as perspectivas; consciência de
mudança; a descoberta de um potencial inexplorado; o vislumbrar de uma oportunidade
de vida profissional ligada à música; evidências de algumas mudanças comportamentais,
como, por exemplo, o melhor relacionamento em grupo, a melhor disciplina, o despertar
para a cidadania, a recuperação da auto-estima, as noções de respeito ao próximo e ao
maestro; “(...) as alterações quanto à concentração e memorização, o relaxamento e a
redução das ansiedades, o maior gosto pelo estudo regular depois que começou a estudar
música e a cooperação mútua que o ensino coletivo proporciona”.
Parte-se, enfim, para a conclusão da presente pesquisa.
195

6. CONCLUSÃO

A descrição e análise dos dados, realizadas nos capítulos anteriores,


permitiram confirmar as hipóteses que nortearam a pesquisa: 1) O Ensino Coletivo de
Cordas, oferecido pela Oficina de Cordas da EMAC/UFG à comunidade goianiense,
promove a iniciação instrumental do aluno; 2) O Ensino Coletivo de Cordas democratiza o
ensino em música e promove a transformação do ser humano e conseqüentemente, a da
sociedade.
A princípio, o objetivo de introduzir a metodologia de Ensino Coletivo de
Cordas em Goiânia, se deu através da percepção de que era possível trabalhar o ensino
instrumental em grupo, de maneira mais prazerosa, lúdica, obtendo um resultado técnico-
musical mais rápido que a aula individual. Da mesma forma, poder-se-ia alcançar um
maior número de pessoas. Com isso, o objetivo principal era didático-musical. Com o
passar dos tempos, percebeu-se que os sujeitos estavam buscando algo a mais do que
simplesmente a instrução musical. Buscavam um novo horizonte através da realização de
“sonhos” acalentados. Finalmente, concluiu-se que a partir da experiência coletiva, os
sujeitos estavam exercitando o conhecimento e a crença de que poderiam vivenciar novas
possibilidades através do desenvolvimento de suas potencialidades, enquanto trabalhando
com música e em grupo.

A matéria-prima da música é o som. Nesse sentido, pensou-se que a música


esteve ligada, por vários séculos, apenas ao abstrato, ao sensorial, ao mundo das
impressões e dos sentimentos. É inegável que a prática musical é uma atividade que tem
ação através de vários conhecimentos subjetivos e ainda inexploráveis. Porém, é preciso
transpor as barreiras do subjetivismo, buscando entender o objetivo, o concreto, e qual é a
função que a música exerce na sociedade. Primeiro, a música é feita de maneira concreta e
segundo, exerce influências observáveis ao ser humano.
Nesse sentido, muitos estudantes de música e alguns profissionais ainda não
entendem que a atividade musical pode ser significativa para sua vida social quando
praticada. Por muitos anos, os educadores musicais ensinavam a partir da concepção de
que a educação era a redentora da sociedade (LUCKESI, 1994), como uma prática exterior
à sociedade. Contrariamente, como prática inerente à sociedade, a educação musical crítica
196

e transformadora, aquela proposta neste estudo, ajudaria o sujeito a compreender qual é o


papel da música na sua vida, bem como, o grupo em que vive, facilitando a sua atuação na
sociedade.
O educador musical deve propiciar ao sujeito ferramentas para, a partir do
conteúdo que está sendo trabalhado em sala de aula, levá-lo a se situar no mundo em que
vive, trazendo-lhe o saber para sua “vida real”, seu cotidiano. O que se espera de um
educador musical consciente é que, através da procura em “perceber” o sujeito/aluno na
sua realidade/condição, mergulhe em um mundo cheio de dúvidas, incertezas e
contradições - já que esse é o mundo da natureza do homem e sua historicidade, numa
intricada rede de conhecimentos e acontecimentos. Pode-se afirmar, sem dúvida, que o
educador musical necessita dominar os conteúdos e metodologias de ensino, contudo, é
preciso que ele esteja consciente do papel que desempenha na sociedade, deve ter
consciência de qual é a filosofia de ensino que adota e a quem a mesma serve.
Neste estudo especificamente, com base nos dados descritos e analisados,
constatou-se que a metodologia de Ensino Coletivo de Cordas foi eficiente dentro desta
perspectiva, quando objetivou a iniciação instrumental. Através do experimento,
pesquisou-se e viu-se que o resultado musical é rápido quando há a integração entre a
prática e a teoria. Da vivência, surgem questões que através do encaminhamento didático,
são solucionadas através do raciocínio dedutivo. Esta vivência, aliada às práticas lúdicas,
desperta a criatividade e autonomia, que levam ao desenvolvimento da independência e da
consciência crítica. Viu-se que vários aspectos e conteúdos foram trabalhados a partir da
necessidade da prática, da situação concreta, chegando à assimilação e à acomodação do
conhecimento.
Pensa-se que o sujeito constrói o seu conhecimento; porém, ele deve ser
estimulado à ação. No contexto escolar, este estímulo deve partir do educador, utilizadas as
didáticas e estratégias de ensino, que despertarão no aluno o desenvolvimento da
autonomia, do pensar e do agir. Nesse sentido, deve-se motivar o aluno a utilizar o
conhecimento trabalhado em sala de aula, no seu dia-a-dia, na sua vida, buscando
relacionar os conteúdos dados ao seu contexto. Dessa forma, o professor é o agente que
cria as condições favoráveis para que seus alunos aprendam (a agir).
Daí a necessidade de, através do uso do imaginário, levar os alunos à
compreensão dos conteúdos, a partir de enfoques e aspectos do seu cotidiano. Buscou-se,
através da imaginação contextualizada, levar o sujeito a compreender o que estava sendo
197

discutido e trabalhado, utilizada da sua vivência anterior (e exterior) à sala de aula. Com
isso, a imaginação contextualizada auxiliou o sujeito a fazer ligações entre a sua
experiência, já adquirida no seu cotidiano, e o que estava sendo pedido. Pode-se afirmar
que trabalhar a vivência musical, a partir de imagens que levem ao contexto social, é mais
eficiente do que falar de técnica instrumental, de maneira minuciosa e/ou abstrata: o que
todo sujeito/aluno iniciante quer é tocar (praticar). Nesse sentido, valorizou-se as questões
cotidianas e as vivências dos sujeitos/alunos. Valorizou-se a “bagagem” que traziam
consigo, considerando os aspectos sócio-econômicos e culturais em que estavam inseridos.
Os sujeitos/alunos foram incentivados a conhecer, analisar e discutir o conteúdo,
relacionando-os ao seu cotidiano. Com isso, os alunos foram despertados a relacionar o
conhecimento apreendido com o seu cotidiano, aplicando-o em sua vida.

Pensa-se que a abordagem utilizada foi coerente com as atuais correntes da


educação musical no país, que valorizam a contextualização da prática musical, a partir de
uma visão crítica (FREIRE,1992), e buscam no cotidiano uma pedagogia musical
adequada à contemporaneidade (SOUZA,2000).
Demonstrou-se através de grupos experimentais com perfis diferenciados, que
a metodologia aplicada teve de ser adequada a cada grupo, a partir da realidade dos
mesmos. O conteúdo, o programa, e as estratégias de ensino foram utilizados de acordo
com a necessidade de cada grupo, a partir de cada fato novo surgido em sala de aula.
Nesse sentido, com embasamento em DELVAL (1998, p.151), pensa-se que essa “nova
escola” (Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais) seria caracterizada por uma postura
em que o professor não poderia ficar limitado à utilização de fórmulas ou receitas, mas
precisaria ser um criador constante, sempre atento ao desenvolvimento de seus alunos,
proporcionando-lhes as oportunidades para a aprendizagem. O professor não poderia
receber um conjunto de receitas fixas, pois, ele mesmo estaria criando novas situações para
que os sujeitos aprendessem. A formação do professor consistiria, então, em se tornar
capaz de criar essas novas situações e tirar delas o máximo de proveito para beneficiar de
seus alunos.
Por isso, pode-se afirmar que a base metodológica aplicada nas Oficinas de
Cordas, prática nova dentro dessa “nova escola”, inspirada nas propostas de GALINDO
(2000), observadas as necessidades de cada grupo, somadas à utilização das estratégias e
198

abordagens de educadores musicais como GAINZA53, SUZUKI54, DALCROZE55,


ORFF56, WILLEMS57, CHAN58, resultou no que se pode observar na coleta dos dados. Os
referidos educadores musicais, também como Galindo, são ligados, à visão humanista de
que o desenvolvimento musical auxilia o desenvolvimento do homem. Esta “nova escola” ,
além de se preocupar com o desenvolvimento musical e humano, também se preocupou,
com o desenvolvimento social dos alunos.

No decorrer do processo pedagógico, a trajetória e os objetivos foram


diferentes, tendo em vista as características específicas de cada grupo. No grupo
COMUNIDADE, formado em sua maioria por alunos vindos da classe média, a aplicação
do método foi mais específica, sem grandes modificações, direcionada à formação
instrumental e musical dos alunos. Já o grupo CEACA, comportou-se de maneira
diferenciada do outro grupo.
Quando se propôs a aplicação do método para meninos e meninas em
“situação de rua”, apesar de imaginar-se a realidade em que viviam, acreditava-se que o
método seria aplicado sem problemas, já que esses “meninos e meninas” são tão
inteligentes quanto qualquer outro sujeito/aluno. Porém, à medida que o processo
pedagógico foi sendo desenvolvido, aos poucos, revelou-se o “drama” de cada sujeito. Em
cada situação nova, a cada novo conflito, a cada nova discussão, tecia-se uma rede de
questionamentos: o que estava por trás de cada expressão, de cada reação, de cada atitude,
de cada sentimento? Por que esses meninos se comportavam de maneira tão agressiva com
quem estava tentando colaborar? Por que não conseguiam se concentrar? Por que os corpos

53
Violeta Hemsy de Gainza, educadora musical e pesquisadora argentina, trabalha os aspectos da
musicalização e iniciação instrumental, a partir de técnicas de improvisação, criação, jogos criativos,
movimentos corporais, utilizando a tanto peças tradicionais como canções folclóricas e populares.
54
Shiachini Suzuki, educador musical japonês, desenvolveu um método de iniciação instrumental para
crianças, partindo da escuta e execução instrumental, antes de introduzir-se à leitura musical. Suzuki
acreditava que o acompanhamento próximo dos pais em sala de aula e nos estudos diários, contribuíam para
o melhor desenvolvimento técnico-musical da criança.
55
Emile Jaques Dalcroze, compositor e educador musical austríaco, desenvolveu o “eurhythics”, que era uma
série de exercícios e jogos rítmicos que trabalhava a vivência rítmica com todo corpo, a partir de movimentos
corporais.
56
Carl Orff, compositor e educador musical alemão, desenvolveu método de ensino musical, onde trabalhava
a percepção musical a partir de intervalo descendente sol-mi. Criou o instrumental Orff-Schulwerk, onde
propôs o trabalho integrado entre canto e instrumentos, trabalhando-se o ritmo e a melodia, através da
improvisação, criação e execução de peças folclóricas ou compostas pelo próprio compositor.
57
Edgar Willems, educador musical belga, trabalhou seus estudos sobre o ensino musical a partir da
abordagem sensorial, trabalhando a escuta e a fala no processo de musicalização. Da mesma forma, partiu
para estudos filosóficos e psicológicos para auxiliar a sua atuação pedagógica.
58
Thelma Chan, compositora, regente e educadora musical paulista, trabalha a musicalização através de
canções, movimentos corporais, jogos com a voz e com o corpo, todos criados por ela.
199

não respondiam quando algum posicionamento era pedido? E muitos outros porquês,
foram aparecendo, necessitando de respostas e soluções.
Para entender a realidade de cada um (tão distante da realidade da
professora/pesquisadora), visitou-se cada família na tentativa de encontrar, de alguma
forma, respostas e soluções. Nas visitas constatou-se uma realidade estarrecedora: pais
desajustados, uns desempregados, outros exploradores do trabalho dos filhos; enfim, uma
realidade triste e cruel. Notou-se que, de alguma forma, os pais também eram tão
“crianças” e tão desprotegidos quanto os filhos. Não há nenhuma veia romântica nessa
observação. A carência estava presente em todos os sentidos, não era somente em
decorrência da miséria monetária, mas da miséria do conhecimento, da miséria de
oportunidade, miséria de não terem condições de vislumbrar uma saída, um futuro melhor
para si mesmos. Após essa jornada, teve-se a certeza de que os sujeitos/alunos não
precisavam naquele momento de uma educação musical, mas trabalhar-se a educação geral
através da música.

Para uma pessoa desavisada, o resultado da produção sonora, expressos nas


apresentações (em quantidade de recitais e grau de dificuldade do repertório) poderia ser
ponto referencial do desenvolvimento de cada grupo, tomando como produção final a
observar. Porém, o desenvolvimento de cada grupo não pôde ser medido somente pelo
resultado sonoro, mas como ponto de partida, para que fosse observado até onde eles
puderam chegar. Nesse sentido, levou-se em conta não somente o desenvolvimento
musical, mas sobretudo o desenvolvimento do ser humano envolvido na atividade musical.
Nesse sentido, o Ensino Coletivo de Cordas visou, não somente, buscar a
formação do solista, do virtuose, mas a do ser humano criativo, sensível, conhecedor de
música, com possibilidades de se transformar em público interessado e crítico, presente nas
salas de concerto, e em outros ambientes musicais. O aluno/sujeito, a partir de sua
condição e escolha, poderia seguir, com a prática, caminhos diversos. Poderia se tornar um
solista sim, mas também, um camerista, um apreciador/crítico musical, um
musicoterapeuta, um educador musical, além de um produtor musical e cultural.
Contribuiria com a cultura, com as manifestações vindas da sociedade, englobando com
isso, com sua participação, toda e qualquer manifestação artística e musical.
200

A integração do grupo foi trabalhada sob vários aspectos. Das discussões e


práticas lúdicas às atividades corporais, buscou-se a aproximação de cada sujeito ao grupo,
a partir do estabelecimento de relações de confiança e respeito mútuo. O trabalho corporal
foi importante para o melhor desenvolvimento da prática instrumental, sendo observadas as
questões referentes à postura e ao posicionamento dos instrumentos junto ao corpo. Da
mesma forma, as atividades corporais possibilitaram aos alunos trabalhar os aspectos
corporais, bem como, os aspectos relacionados à criatividade, à expressão e à integração.
A partir dessas atividades, alguns alunos conseguiram se ambientar e se expressar com
mais liberdade, contribuindo para o despertar de habilidades esquecidas ou não exploradas
no dia-a-dia, levando ao auto-conhecimento, à autonomia, à segurança e à melhora da auto-
estima. Possibilitou-se também, estabelecer entre os sujeitos dos grupos, e entre os grupos
e os educadores, relações de confiança, através da afetividade.
Desde o primeiro encontro foi feito um trabalho de conscientização, em
ambos os grupos, acerca do comportamento e papel social de cada um, através do
estabelecimento de regras para uma melhor convivência, objetivando-se sua integração ao
ambiente da “nova escola” e conseqüentemente, ao ambiente social. Porém, no grupo
CEACA, a convivência foi um fator que teve que ser trabalhado de maneira diferenciada.
A partir desta intenção desenvolveram hábitos como cooperação, companheirismo,
solidariedade, respeito ao próximo, tolerância, disciplina e organização. Por isso, estes
pontos foram bastante trabalhados, buscando a mudança desses hábitos em sala de aula e
no dia-a-dia de cada sujeito/aluno59.
Por isso, acompanhou-se o desenvolvimento de cada aluno, desse grupo
específico, de maneira mais próxima. Visitou-se o CEACA em algumas oportunidades, na
hora do almoço, na tentativa de aproximação e acompanhamento. Os alunos “engraxavam”
durante as manhãs e depois se encaminhavam ao CEACA para o almoço. À tarde,
participavam de cursos (a Oficina de Cordas era um deles). Nesses encontros, extra-sala,
notou-se que a relação professor-aluno ficou mais próxima. Nas visitas conversava-se
sobre assuntos diversos, ajudava-se em atividades como “montar o quebra-cabeça” e
outros “jogos inteligentes”, e a relação de confiança foi se estabelecendo aos poucos.
Participou-se de atividades como: mostra de atividades artísticas em um circo em
comemoração ao “Dia das Crianças”; “I Mostra da Consciência Negra” e “I Mostra de

59
A partir desse trecho, o “sujeito” da pesquisa será citado como aluno. Além de facilitar a redação, o termo
“aluno” refere-se ao “sujeito” transformado pela “nova escola”.
201

Educação Social”. Nessas mostras, os alunos apresentaram-se em várias modalidades:


teatro, circo, artes plásticas, capoeira, maculelê e música. Para adquirir a confiança e o
respeito desses alunos, não bastou demonstrar a preocupação e o cuidado em sala de aula,
mas foi preciso mergulhar no dia-a-dia daquele grupo, demonstrando, com mais ênfase,
que aquela ação/intervenção não era fictícia, mas sim real e presente.
Da mesma forma, buscando a aproximação professor/aluno
(pesquisadora/sujeito), entendeu-se que o uso da assistência manual no ensino coletivo não
foi útil (somente) para corrigir posturas visando uma melhor técnica instrumental, mas
também foi uma forma de aproximação do professor com o aluno, despertando a
afetividade e confiança. Por isso, o ambiente em sala de aula foi preparado de maneira
apropriada para que o ensino-aprendizagem ocorresse da melhor maneira possível.
O papel do professor foi de extrema importância no “despertar” da
criatividade, do interesse, da percepção, da sensibilidade do aluno. Por isso, precisou-se
criar um ambiente que fizessem os alunos, além de vivenciar e conhecer, também sonhar,
criar, inventar, imaginar, para deixar com que o pensamento criativo fluísse. Nesse sentido,
o meio ambiente não pôde ser entendido apenas como a referência espacial, o lugar
propriamente dito; mas, segundo CRUVINEL (2001, p.12), seria um ambiente lúdico e
encorajador criado pelo professor para que o aluno expressasse de maneira livre e natural.
A partir dessa confiança mútua, o canal da percepção e do conhecimento estaria aberto
para receber vários e diferentes estímulos, fazendo com que os mesmos se consolidassem
em matéria expressiva.
A partir desses conceitos, o educador musical no ensino coletivo, teve o
cuidado em observar e conhecer, cada indivíduo dentro do grupo. Da observação,
procurou-se desvendar a personalidade de cada aluno, seus anseios, seus interesses,
partindo do princípio de que cada aluno desempenha um papel dentro deste microcosmo
social, que é a aula coletiva. Cada grupo tinha uma identidade única, fruto da combinação
de individualidades que o formava. Por isso, o professor teve a preocupação (e
sensibilidade) de enxergar e conhecer as características do grupo, sem se esquecer de
enxergar cada indivíduo dentro desse grupo.
Buscou-se, desde os primeiros grupos trabalhados, que fosse mantida uma
atitude de objetividade, clareza e honestidade com os alunos. Com isso, o princípio
norteador do relacionamento foi a honestidade. Pode-se afirmar que a prática pedagógica
começa a partir da maneira como o professor age (atua) diante dos alunos. Já no primeiro
202

encontro, da educadora musical para com os alunos, dividindo conhecimentos,


experiências e responsabilidades, exercitou-se a honestidade. Por exemplo, informou-se
aos alunos que a metodologia a ser trabalhada era nova na cidade e que ainda estava em
processo de implementação, através de experiências e pesquisas. Nesse sentido, a
educadora musical não se colocou como detentora do “conhecimento universal”, mas como
uma mediadora, uma propositora de idéias e situações. Demonstrou-se que a aula coletiva
muitas vezes constituiu-se de um espaço para que os alunos expressassem seus
pensamentos e emoções. Assim, a aula coletiva resgatou, muitas vezes, situações
necessárias à formação do aluno. Resgatou a sensibilidade dos alunos, a afetividade, novos
gestos, novas posturas, novos comportamentos, proporcionando a possível
mudança/transformação dos mesmos. Da mesma forma, procurou-se conduzir cada
intervenção/aula de maneira democrática, levando à participação dos alunos e ao
desenvolvimento da consciência crítica

Partindo do entendimento de que o estudo da música deve fazer parte da


formação do ser humano e que a educação crítica leva ao desenvolvimento e a
transformação social, discutir-se-á as questões que envolvem o estudo sob dois aspectos:

1) O Ensino Coletivo de Cordas como uma metodologia eficiente visando a


transformação do ser humano e conseqüentemente, da sociedade (aprendizagem
social).
2) O Ensino Coletivo de Cordas como uma metodologia eficiente para a
democratização do ensino musical e conseqüentemente, de transformação social
(inserção social)

Pôde-se afirmar que, o Ensino Coletivo de Cordas é uma metodologia


eficiente, que transforma o sujeito em aluno/ser humano/cidadão, que conseqüentemente
transformará a sociedade. Partindo das propostas da pesquisa-ação existencial (BARBIER,
1997), buscou-se, a transformação dos sujeitos. Com o desenvolvimento do processo
pedagógico coletivo, constatou-se mudanças em todos os sujeitos, inclusive nos
educadores. Nesse sentido, a educadora musical (e pesquisadora) esteve submersa nesse
processo, ensinando conteúdos musicais, relacionando, intervindo, observando, propondo,
refletindo, mas sobretudo, aprendendo! Dessa experiência, a partir daquele microcosmo
203

particular, a “nova escola”, procurou-se compreender as relações existentes entre os seres


humanos, suas expectativas, seus objetivos, suas dificuldades, suas facilidades, suas
alegrias e tristezas. Essa experiência em particular, se comparado com o que ocorre no
universo maior, pode antever que a transformação ocorrida em cada aluno/ser humano,
causará também, uma mudança no meio em que cada um vive.
Esse pensamento não é fruto de uma visão ingênua. Pelo contrário.
Comprovou-se que do contato com a Oficina de Cordas ocorreram mudanças nos alunos,
tanto no âmbito musical quanto no pessoal, que se refletiram em suas realidades,
constatadas através de seus depoimentos. E essa mudança se deu, primeiramente, nas
práticas do pensar, ou melhor, através do conhecer. Depois, na mudança de hábitos e de
atitude, ou seja, através do agir. Afirmar que houve uma transformação nos alunos
envolvidos e em suas relações com o mundo e com a sociedade não é inadequado neste
contexto. Com isso, pode–se arriscar a afirmação de que houve uma transformação social.

A inserção social dos “meninos do CEACA” é indiscutível, a começar pelo


fato de que os mesmos puderam conviver no espaço universitário. Geralmente, os
professores é que se dirigem até os locais de formação, preparados “especialmente” para os
desfavorecidos (nota-se que aí, já há um princípio de exclusão social). Nesse sentido, as
intervenções/aulas provocaram transformações, não só nos atores principais, mas na
comunidade universitária ali presente. Estudantes universitários, alunos do programa de
extensão, professores de outras oficinas e/ou departamentos, funcionários, guardas-
noturnos, faxineiros, todos interagiram com aquela experiência. Observou-se no princípio,
um certo “estranhamento”, principalmente por parte da comunidade acadêmica, ali
representados pelos sujeitos citados (como ocorre em todas as experiências novas e
inesperadas). Com o passar do tempo, as “diferenças” e os “estranhamentos” foram dando
lugar a uma nova realidade: “os meninos do CEACA” passaram a circular no ambiente
universitário com naturalidade, assim como todos os outros alunos.
Da mesma forma, houve mudanças nos alunos do grupo COMUNIDADE.
Nos seus depoimentos pôde-se constatar a modificação em todos os sujeitos. Porém, um
relato deve ser evidenciado: Milene, a aluna universitária que participou do grupo
mencionado, afirmou que o que mais lhe chamou a atenção na Oficina de Cordas foi a
didática usada no experimento. Afirmou que já estaria “passando” os conteúdos teóricos a
204

partir do “modelo” (Teoria Aplicada/Estudo Dirigido) das aulas propostas, multiplicando


estes procedimentos para outros contextos, à sociedade (Vide p.160-163).
Por tudo o que já foi exposto, pode-se afirmar, que houve mudanças em todos
os sujeitos, e em sentido amplo, poderá haver uma transformação na sociedade, partindo do
princípio que cada ação individual reflete-se no sistema social, dado ao seu efeito
multiplicador. As relações existentes entre Educação e Sociedade, já discutidas no capítulo
2 da presente pesquisa, fortalecem o pensamento de que não adianta conhecer sem agir, ou
seja, não adianta o saber, sem ação. Deve-se buscar uma Educação Libertadora
(FREIRE,1975), ou mesmo, partir para uma Educação Radical (GIROUX, 1999). Nesse
sentido, a ação pode ser ampliada a partir da democratização do ensino musical.
Constatou-se o Ensino Coletivo de Cordas, é uma metodologia eficiente para
a democratização do ensino musical, transformando o ser humano, sobretudo o cidadão,
através de uma educação musical mais crítica, permitindo o acesso de um maior número de
alunos.
A democratização do ensino musical deve ser uma bandeira para todos
educadores musicais que entendem que a música (e todo conhecimento artístico), é parte
integrante (e primordial) da formação do ser humano. Nesse sentido, o educador musical,
deve intervir no mundo através de sua ação pedagógica com muita sensibilidade, no
sentido de contribuir para a formação de um ser humano mais crítico, sensível e criativo. E
como iniciar o processo de democratização da Educação Musical através do ensino
coletivo?
Primeiramente, buscando-se, através de discussões e pesquisas (como a que
foi proposta), sistematizar metodologias eficientes para o ensino musical coletivo. Nesse
sentido, como já foi exposto, o educador musical deve estar consciente de qual é o papel
que desempenha na sociedade, e que tipo de aluno (ser humano/cidadão) pretende (ajudar)
formar. Após esse passo, o educador musical deve ter o interesse em discutir e viabilizar
políticas e sobretudo ações em torno de uma escola democrática, ligada ao esforço coletivo
de democratização da sociedade.
Demonstrou-se a partir da revisão bibliográfica, que os Conservatórios e
Escolas de Música ainda estão ligados ao conceito clássico de cultura, pregando o conceito
de cultura como sinônimo de civilização. Viu-se que a ideologia do conceito de cultura
está ligada à concepção de que o saber musical (mais elevado) é um conhecimento
destinado a poucos, isto é, a aqueles que possuem um talento extraordinário para tal
205

atividade. Viu-se também, que a ideologia do conceito de cultura trabalhada (pregada),


pelos educadores musicais nas Escolas de Música de nível universitário, ainda está presa à
formação de um ser humano com uma alta capacitação técnica; mas, não se discute qual é
o espaço que esse profissional ocupará na sociedade, qual é seu papel, a quem ele estará
servindo. As Escolas de Música, dentro do circuito universitário, ainda não assumiram um
papel mais crítico diante do contexto cultural contemporâneo. Como o próprio nome diz,
são “Conservatórios” onde o que se busca, é conservar as práticas de aquisição do
“conhecimento”, já exercitadas na história da humanidade. Nesse sentido, alguns
educadores musicais ainda permanecem distantes do contexto social em que vivem,
“repassando” e perpetuando as antigas fórmulas metodológicas como “verdades” (quase)
absoluta, imutáveis.
Torna-se necessário que o educador musical compreenda o processo de
ensino-aprendizagem, não só através do estudo e pesquisa de metodologias de ensino, mas
sobretudo, através da compreensão da sua força e inserção no contexto sócio-econômico,
político e cultural, para que a atuação do professor seja crítica e eficaz no sentido de
transformação do aluno. Deve ter portanto, consciência sobre qual é a ideologia ou
ideologias que estão influenciando a sua atuação e a que propósitos está servindo. Isto
precisa estar claro tanto para agir pensando na mudança ou aceitar o que é dado
historicamente permanecendo inerte.
Portanto, a partir da constatação dos resultados significativos do
desenvolvimento dos sujeitos pesquisados e da comprovação da eficácia da metodologia
aplicada pela Oficina de Cordas, proporcionando à comunidade goianiense o acesso a uma
formação musical diferenciada, conclui-se, que o ensino coletivo de cordas promove a
formação do ser humano/cidadão e pode ser utilizado com uma metodologia eficiente para
a democratização do ensino musical, se objetivada a transformação social. Nesse sentido, a
hipótese desta pesquisa-ação, de que o ensino coletivo de cordas é uma metodologia
eficiente para a iniciação instrumental do indivíduo e para a democratização do ensino
musical, se constituindo um dos meios de transformação social, foi comprovada.
Por fim, sugere-se, recomenda-se firmemente, por tudo o que foi exposto e
discutido, que as escolas específicas de música e/ou as escolas regulares, tanto da rede
pública quanto da privada, elaborem e implementem programas educacionais em Música,
baseando-se no Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais, sobretudo na metodologia
pesquisada. Para tanto, seria necessário, além do engajamento das escolas, investindo no
206

treinamento de professores especializados, pesquisar e discutir permanentemente as


questões didático-metodológicas que envolvem o processo, bem como, o contexto
contemporâneo em que se vive, a fim de se ver proporcionado um ensino musical mais
eficiente.
207

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por mais esforço e empenho que se pôde empregar para descrever e analisar o
objeto de estudo da presente pesquisa, chegando-se à conclusão do quanto é importante ter-
se como ponto de partida e filosofia, que a educação transforma - valoriza o ser humano
através do desenvolvimento da consciência crítica, da democratização do conhecimento, da
inclusão social - nada se compara, nada é tão forte como a experiência da pesquisa
realizada e vivida.
Sabe-se que o fundamento da presente pesquisa está, primordialmente, na
ação. A ação que necessitou ser, constantemente, refletida. Nenhuma teoria, nenhum
escrito, por mais bem elaborado que seja, pode trazer com cores (e sons) reais, a verdadeira
dimensão da intervenção, da mudança, da transformação provocada pela prática
pedagógica.
Nesses três anos de trabalho, passaram pela Oficina de Cordas, EMAC/UFG,
vários alunos, que hoje estão na sociedade. Alguns estão nos cursos superiores de música,
outros estão nos escritórios, outros nos laboratórios, enfim, estão no mundo, mas de
alguma forma, sempre em contato com a Oficina de Cordas. Às vezes aparecem durantes
as aulas dos “novatos”, outros nos recitais, outros ligam, mas sempre se têm notícias desses
alunos. O elo não foi quebrado pelo distanciamento. Observou-se em cada grupo aspectos
similares e outros característicos. Porém, um específico chamou a atenção e merece
menção. Esse grupo marcou pela diversidade, devido ao fato de que os alunos possuíam
perfis bastante diferentes: a dona de casa, o guarda noturno, o advogado, a universitária, o
auditor fiscal, a jornalista aposentada, o marceneiro, a publicitária, os estudantes. A faixa
etária, bem como, o nível sócio-econômico e cultural dos alunos eram diferentes. Porém, o
que chamou a atenção, é que nenhum dos alunos se incomodou com essas diferenças
(gritantes). No ambiente da sala de aula, todos eram tratados como iguais, todos se
tratavam como iguais, todos eram iguais! Sabe-se que a igualdade é um conceito
inatingível, já que cada ser humano possui, desde o nascimento, características pessoais, a
partir da sua família e do seu contexto social, desenvolvendo de maneira mais intensa ou
não, suas potencialidades, seus talentos, dando uma direção a sua trajetória. Mas naquela
sala, naquele momento, aqueles alunos eram iguais, porque estavam tendo a mesma
oportunidade de se desenvolverem, de se transformarem, de modificarem a sua trajetória
208

através da sua própria condição e vontade, resultando da sua escolha. Através da música,
naquele momento, todos tinham o seu momento de igualdade, vivenciando a
“humanidade” pouco exercida.
A vida contemporânea, cada vez mais, limita a capacidade de percepção do
homem. Sem dúvida, o avanço tecnológico trouxe grandes benefícios para o mundo.
Porém, da mesma forma, trouxe mais desigualdades, diferenças sociais e limitações. Cada
vez mais, o homem afasta-se de seus hábitos e suas atividades milenares essenciais. A
partir do contexto tecnológico, o homem já não toca um instrumento, prefere ouvir música
pelo rádio, pela televisão, ou pelo Cd. O artesanato está fora de moda. O homem já não
constrói com as próprias mãos. Compra tudo.
É preciso resgatar certas características “humanas” que com passar do tempo
se perderam ou se deturparam. O homem, está perdendo sua essência. Não se contempla
mais a natureza, as pessoas, as belezas do mundo. Quando se fala em artesanato, fala-se
também, do contato do homem consigo mesmo. Através do processo artesanal, o homem
pensa, cria, transforma. Por isso, não se pode limitar a capacidade do homem em utilizar
suas habilidades em busca de uma vida melhor, de um mundo melhor.
A música é necessária, assim como toda arte, é necessária. A música é uma
manifestação cultural que sempre esteve presente na vida do homem e sempre estará. Ela
reflete o pensamento, o sentimento, os valores culturais, de grupos sociais específicos e de
toda a humanidade. Quando se fala em música, também se fala do respeito e amor à
natureza, ao próximo, enfim, ao mundo no qual se vive. A atividade musical expande às
percepções, objetivas e subjetivas, levando o homem a ter contato consigo mesmo, com o
próximo.
O homem contemporâneo se sente acuado, sem espaços para o debate. E a
Oficina de Música abriu esse espaço. No ambiente da sala de aula, em todos os grupos, não
raro a aula era interrompida para um comunicado, para um desabafo, para uma defesa de
um ponto de vista. O pensamento humano teve (e tem!) o seu espaço para fluir, expressar
ou sociabilizar conhecimentos.
Lembremo-nos de Paulo Freire, da Pedagogia do Amor, que acreditava que a
educação deveria ajudar o ser humano a amar e a respeitar o próximo. Isto significaria
amar e respeitar a humanidade, contribuindo para a transformação da sociedade. Advertiu
o sábio mestre que não adianta amar de maneira abstrata. É preciso amar com ação!
Entende-se que amar o próximo é antes de tudo, respeitá-lo como ser humano, respeitar as
209

diferenças, na busca do conviver pacífico. E é papel do educador, ajudá-lo a amar e a agir.


Educar o ser humano, é proporcionar as ferramentas necessárias através do saber, dando-
lhe condição de construir a sua trajetória, construir a sua cidadania.
Por isso, não basta o professor atuar de maneira democrática e transformadora
somente em sala de aula. Ele deve buscar a mobilização geral da sociedade. E isso foi
demonstrado na Oficina de Cordas: da abertura das portas da sala-de-aula para quem
quisesse ir e vir (e observar), na quantidade de recitais em diversos locais, ou pela
repercussão nos jornais (vide Anexo 12) e imprensa televisiva – que já é uma
caracterização do respaldo da comunidade a esse tipo de atividade pedagógica - sempre se
buscou a participação efetiva de todos (do secretário ao vigilante, da faxineira ao professor
universitário, da criança aos alunos da chamada terceira idade).
Um dado importante, resultante dessa “abertura”, refere-se ao fato de que
nesses três (3) anos de existência, saíram da Oficina de Cordas, cinco (5) trabalhos
acadêmicos de pesquisa (uma monografia de final de curso, uma pesquisa através de
bolsista PIBIC, dois trabalhos de disciplina de Mestrado, e a presente pesquisa), cumprindo
com isso, as três finalidades indissociáveis da universidade: Ensino, Pesquisa e Extensão.
A Oficina de Cordas exercitou esta indissociabilidade.
Nesse sentido, por tudo que já foi exposto, o educador musical deve ter uma
visão transformadora da realidade, comprometida com a mudança social. Deve ter o
compromisso de formação do ser humano, mas sobretudo, deste na forma de cidadão. Na
medida em que o educador musical entra no universo dos alunos, ele deverá encontrar
desafios. Na busca da compreensão desse mundo particular, por muitas vezes, ele
encontrará uma realidade desconhecida, devido às diferenças sociais, econômicas e
culturais. Mas essa realidade não deve ser um desestímulo, pelo contrário, constitui-se em
um fator que levará à novas descobertas.
Por fim, acredita-se de maneira inequívoca na capacidade de transformação (e
superação) do ser humano. Como diz BOFF (2000, p.22-23) somos seres essencialmente
em protest-ação, já que “não há sistema social, por mais fechado que seja, que não tenha
brechas por onde o ser humano possa entrar, fazendo explodir essa realidade. Por mais
aprisionado que ele esteja, nos fundos da Terra, ou dentro de uma nave espacial no espaço
exterior, mesmo aí o ser humano transcende tudo. Por que em seu pensamento, ele habita
as estrelas, rompe todos os espaços. Por isso, nós, seres humanos temos uma existência
condenada – condenada a abrir caminhos, sempre novos e sempre surpreendentes”.
210
210

FONTES E REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

Fontes orais (Entrevistas):

BARBOSA, Joel Luís. Salvador-BA, 31.05.2002

BORBA, Carmen. São Paulo-SP, 23.05.2002.

BRAZIL, Marcelo. São Paulo-SP, 21.05.2002.

CHAN, Thelma. São Paulo-SP, 14.08.2002.

GALINDO, João Maurício. São Paulo-SP, 11.08.2002

LOPES, Luciano. São Paulo-SP, 21.05.2002

MARTINS, José Alípio de Oliveira. Salvador-BA, 27.05.2002

MORAES, Abel. Belo Horizonte-MG, 30.04.2002.

OLIVEIRA, Enaldo. São Paulo-SP, 10.08.2002.

ROCHA, Marcos Antônio de Oliveira. Salvador-BA, 27.05.2002

TOURINHO, Ana Cristina. Salvador-BA, 30.05.2002

Teses, Dissertações e Monografias:

BORGES, Maria Helena Jayme. O Ensino do Piano e o Desenvolvimento da Autonomia:


uma experiência inovadora. Araraquara: Tese de Doutorado – Programa de Pós-Graduação
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216

REFERÊNCIAS AUDIOVISUAIS

Fitas cassete (áudio)

FITA 1- Entrevista de Abel Moraes


FITA 2 - Entrevistas de Luciano Lopes e Marcelo Brazil
FITA 3 - Entrevistas de Carmen Borba, Alípio Martins, Marcus Rocha e Joel Luís
Barbosa
FITA 4 - Entrevistas de Joel Barbosa e Ana Cristina Tourinho
FITA 5 - Entrevista de Enaldo Oliveira
FITA 6 - Entrevista de João Maurício Galindo
FITA 7 - Entrevista de Thelma Chan

Fitas 8mm

FITA 1- 3ª e 4ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE


FITA 2 - 5ª, 6º e 7ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 3 - 8ª, 9ª e 10ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 4 - 10ª, 11ª e 12ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 5 - 12ª, 14ª e 15ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 6 - 16ª, 17ª e 18ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 7 - 19ª, 20ª e 21ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 8 - 22ª, 23ª e 24ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 9 - 24ª, 25ª e 27ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 10 - 28ª Intervenção/Aula do GRUPO COMUNIDADE
FITA 11 - 3ª e 4ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 12 - 5ª e 6ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 13 - 7ª, 8ª e 9ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 14 - 9ª, 10ª e 11ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 15 - 11ª, 13ª e 14ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 16 - 15ª e 16ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 17 - 17ª, 18ª e 19ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 18 - 19ª, 20ª e 21ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
217

FITA 19 - 21ª, 22ª e 23ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA


FITA 20 - 24ª e 25ª Intervenção/Aula do GRUPO CEACA
FITA 21 – Depoimentos dos Sujeitos
FITA 22 – Recitais SESI e Martim Cererê
FITA 23 – Recitais EMAC/UFG e SECULT

Fitas VHS

FITA 1 - Intervenções/aulas do GRUPO COMUNIDADE (3ª-10ª)


FITA 2 - Intervenções/aulas do GRUPO COMUNIDADE (11ª-19ª)
FITA 3 - Intervenções/aulas do GRUPO COMUNIDADE (20ª-28ª)
FITA 4 - Intervenções/aulas do GRUPO CEACA (3ª-9ª)
FITA 5 - Intervenções/aulas do GRUPO CEACA (9ª-16ª)
FITA 6 – Intervenções/aulas do GRUPO CEACA (16ª-23)
FITA 7 –Intervenções/aulas do GRUPO CEACA (24ª e 25ª), os depoimentos de todos
alunos de ambos os grupos e os recitais
FITA 8 – Divulgação, da metodologia de ensino coletivo de cordas e dos recitais,
veiculada na imprensa televisiva.
ANEXOS

ANEXO 1 – ENTREVISTAS COM OS EDUCADORES MUSICAIS ................................220

ANEXO 2 - EXCERTOS DAS ENTREVISTAS DOS EDUCADORES MUSICAIS...........281

ANEXO 3 - AUTORIZAÇÃO DOS EDUCADORES MUSICAIS.....................................

ANEXO 4 – AUTORIZAÇÃO DOS SUJEITOS....................................................................

ANEXO 5 - QUETIONÁRIO (SUJEITOS)............................................................................

ANEXO 6 – CARTAZ/FOLDER DE DIVULGAÇÂO DAS OFICINAS DE MÙSICA E


TEATRO..................................................................................................................................

ANEXO 7 - PARTITURAS DAS PEÇAS (GRADE).............................................................

ANEXO 8 - PROGRAMA DE RECITAIS ............................................................................

ANEXO 9 – CARTAZ DE DIVULGAÇÃO DO RECITAL ................................................

ANEXO 10 – CONVITE DE DIVULGAÇÃO (CEACA)......................................................

ANEXO 11- DIVULGAÇÃO INTERNA CEACA................................................................

ANEXO 12 - DIVULGAÇÃO NA IMPRENSA ESCRITA..................................................

ANEXO 13 – DESENHOS DOS MENINOS DO CEACA...................................................


218

ANEXO 1 – ENTREVISTAS COM OS EDUCADORES MUSICAIS


219

Entrevista nº1 : ABEL MORAES


Local : Belo Horizonte-MG
Data : 30.04.02
Horário : 20: 15h

1. Boa Noite Abel !


Boa Noite!
Eu gostaria de saber, primeiramente, como se deu seu primeiro contato com a música?
Bom, eu sou filho de uma professora de piano, e eu cresci ouvindo aulas de piano em casa, ouvindo
piano e tocando piano de ouvido, tirando músicas que eu ouvia na televisão, ouvia na escola,
sentava e tocava. Pedi à minha mãe para me ensinar tocar piano e tal. Só que, talvez por frustração
da profissão, ela foi professora, dificuldades por morar em cidade do interior, essa coisa toda, acho
que ela não me incentivou muito a estudar música. E eu falava muito em medicina, me interessava
por muitos outros assuntos, além de, de música. Então ela torceu para que eu escolhesse uma outra
profissão que não música. De forma que, eu precisei chegar aos dezoito anos para realmente tomar
uma iniciativa por vontade própria de estudar música. Mas eu sempre tive contato, de alguma
forma, eu acho que eu me musicalizei, de alguma forma, mesmo antes dos dezoito anos, e a
experiência com música sempre foi muito boa, muito forte. Eu sentava ao piano e tocava,
improvisava, e ficava, era uma experiência muito boa pra mim.
2. E a sua formação ?
Minha formação foi um pouco irregular. Eu comecei, como eu sou de São João Del Rei, eu
comecei a estudar na Orquestra Ribeiro Bastos. Primeiro fazendo uma introdução, tendo uma
introdução, depois participando do coral da orquestra, depois mais ou menos eu já tinha começado
a estudar violoncelo, na época com seis meses de violoncelo, quatro meses de violoncelo, eu entrei
pra orquestra. Ou seja, o que qualquer pessoa condenaria como sendo uma atitude precipitada de
entrar pra orquestra, eu comecei muito cedo. Nesse sentido, eu tive a experiência musical de tocar,
de sentir no ambiente social, participar de uma atividade musical em grupo, dentro de uma
circunstância, é, muito além de simplesmente tocar em grupo, social de tocar na igreja, tocar nas
missas, mais em termos de desenvolvimento musical, é eu posso dizer que eu comecei desenvolver
mais, quando eu entrei para o Conservatório de São João Del Rei. Fiz aula de violoncelo, aula de
solfejo, toda formação que o estudante passa normalmente. Isso coincidiu com a minha, com a
minha escolha de uma faculdade, de uma escolha profissional, e eu optei por Medicina. Fui para
Juiz de Fora, fiquei dois meses fazendo cursinho e desisti por que descobri que não podia viver sem
música. E desde daquela época eu passei a estudar, já com intenções profissionais. Então, passei a
vir ter aulas em Belo Horizonte, quinzenalmente, em 84 me mudei para Belo Horizonte, e fiz aula
normalmente, toda semana, e no final de 84 fiz vestibular e passei. Entrei para a graduação muito
precipitado, não estava preparado. Mas como todo aluno que tem facilidade e chega na prova, e de
alguma forma convence e toca o repertório exigido, eu entrei pro, pra graduação. Entrei
despreparado. Precisava tanto de uma formação musical, quanto instrumental melhor. De forma
que, minha formação foi um pouco atribulada, desenvolvi, estudei bastante, tive acesso a alguns
professores, mas foi uma formação um pouco atribulada, um pouco atropelada.
3. E, Abel, como surgiu o seu interesse em trabalhar com o ensino coletivo?
Bom, enquanto eu era aluno da graduação na UFMG, lá pelos idos de 86, 87, eu comecei a atuar
como monitor do curso de formação musical, que é um curso de extensão, trabalhava com
adolescentes. E do CMI, que era o Centro de Musicalização Infantil, que trabalhava com crianças.
E eu dava aula de violoncelo, pouco tempo depois, eu me interessei em trabalhar com orquestra e
acabei regendo orquestra infantil. Em São João Del Rei eu tive uma experiência com regência coral
também. Então eu tive uma experiência ainda como estudante de violoncelo, de trabalhar com
orquestra, de trabalhar com grupos. O que me chamava muita atenção, era a facilidade com que as
crianças se interagiam, e aprendiam e estavam muito ligadas ali nas atividades. E por conseqüência
eu percebia que a atenção e a produtividade era muito maior do que nas atividades individuais. É,
isso ficou, eu fiquei trabalhando no CMI durante, no curso de formação durante um bom tempo,
quando eu me formei, em 91, eu comecei a especialização, o curso de especialização na UFMG, na
220

mesma escola, em Educação Musical e tinha que escolher um tema no final do curso, no final do
curso tinha que escolher um tema, e como a pedagogia sempre me interessou muito, eu sempre tive
muito interesse, gostei, gostava muito, eu escolhi realmente ensino em grupo na época, a minha
primeira monografia, foram sobre os aspectos psicopedagógicos do ensino em grupo. E foi o
primeiro trabalho que eu realmente sistematizei uma experiência que eu tinha com os trabalhos da
orquestra. Foi assim que eu me interessei.
4. E no caso, a orquestra era uma Orquestra de Violoncelo ou era uma Orquestra de
Câmara?
Era uma Orquestra Jovem, uma Orquestra de Cordas.
(...)
Uma Orquestra Jovem. Naquela época eu já fazia algumas aulas coletivas, não com muitos alunos,
mas com três alunos, quatro alunos. È uma espécie, um tipo modificado do Master Class. Porque o
Master Class continua sendo muito direcional, o aluno toca, o professor critica, fala e os outros
alunos presentes só ouvem. Não existe uma participação maior de quem está presente ali.
5. E nesse trabalho seu, monográfico, você direcionou o trabalho com ensino coletivo em
violoncelo, ou para o ensino também em cordas em geral?
Eu direcionei mais pra questão do violoncelo. Porque ele é específico, foi específico pra minha
experiência. Haviam questões técnicas relativas, específicas ao violoncelo, mais como eram
aspectos psicopedagógicos, a maior parte do trabalho é relativo à qualquer tipo de atividade em
grupo, de aprendizado em grupo. Lhe dava com propriedade de grupos, com maneiras mais
eficientes de comunicação em grupo, interação entre os participantes. Então, o conteúdo maior
dessa primeira monografia da especialização, era muito mais voltada pro geral, e não
especificamente para o violoncelo, tinha algumas questões específicas.
6. E no caso, no seu referencial teórico, você teve alguma influência teórica ou foi baseado
nessa sua experiência, na sua observação pessoal?
Na época eu me interessei muito por neuroligüística. Mas não foi um referencial embasado, uma
coisa que eu embasei a bibliografia toda na programação neurolingüística. Foram sugestões, foram
idéias que eu apliquei, não foi necessariamente o referencial teórico não.
7. E no caso, você depois fez o mestrado em Londres, né? Como você vê o ensino coletivo em
música, em instrumento musical no caso? Quais são as vantagens e desvantagens do ensino
coletivo em instrumentos musicais?
Bom, tem duas perguntas ai, primeiro sobre Londres, né?
Isso.
Bom, em Londres, o meu projeto de mestrado foi sobre ensino em grupo, tanto é que foi aceito.
Tinha o interesse da escola, e havia o interesse que eu desenvolvesse esse projeto. Quando eu
cheguei em Londres, eu comecei a ler bastante coisa sobre o ensino em grupo, teses, mestrado,
doutorado, artigos. E eu comecei a descobrir que a parte mais frágil, a parte menos sistematizada,
menos trabalhada, eram as questões técnicas, do desenvolvimento técnico, trabalhadas no contexto
de grupo. As questões metodológicas existiam mas elas não, mas elas não abordavam de uma
forma teórica as diferenças de desenvolvimento musicais, técnicos, ou psicológicos. De forma que,
a maioria dos artigos, das pesquisas, enfatizava o maior desenvolvimento musical advindo do
trabalho em grupo, mas falava muito pouco da questão técnica. Então, eu resolvi pesquisar essa
questão técnica, porque que, que poderia ser considerada o tendão de Aquiles do ensino em grupo.
Porque realmente, quando a gente trabalha individualmente com o aluno a gente pode atender a
especificidade dele, de facilidades, dificuldades, e quando você está num grupo, não é possível se
fazer isso. Porque, não dá pra você, senão você acaba fazendo uma seqüência de pequenas aulas
individuais e não é esse o objetivo. O principal objetivo é que haja interação o tempo todo ou a
maior parte do tempo. Então, eu comecei a pesquisar uma forma de trabalhar, de abordar a questão
técnica de uma forma integrada, com tudo ao mesmo tempo. Eu tive que estudar desenvolvimento
psicomotor. Aprendizado de habilidades psicomotoras e métodos de aprendizagem, de ensino de
habilidades psicomotoras, as fases de aprendizado pra poder fazer uma relação com o ensino do
instrumento. Como que o professor de grupo poderia conduzir três, quatro alunos ao aprendizado
sistematizado, todos ao mesmo tempo. Isso é uma forma ideal. Na prática, não tem como você
fazer isso. Tanto é que existe a necessidade da aula individual exatamente pra, pra compensar uma
221

defasagem que o aluno apresente na aula em grupo. É possível trabalhar desta forma? É. Mas a aula
individual, ela é insubstituível. Como uma manutenção, um prolongamento daquilo que se fez na
aula em grupo.
8. No caso, você já trabalhou a iniciação instrumental? Assim, você pegar algum aluno leigo
ou algum aluno iniciante e iniciar o aluno através do ensino coletivo, sem a aula individual, e
depois num segundo momento...
(Interrompendo) Já. Já. É muito mais simples. Porque quando você pega um aluno iniciante, em
termos de experiência com o instrumento, ele não tem nenhuma experiência. Ele tem experiência
cinestésica dele com o corpo dele, o tato o gesto, e você precisa vivenciar o aluno na gesticulação
básica, da postura básica. Então, quanto mais iniciantes são os alunos mais fácil é você conseguir
sistematizar o aprendizado. Porque basicamente, todos têm que fazer a mesma coisa. E o início,
vendo por essa ótica, é muito simples. Eles têm que fazer o gesto, a sonoridade vem como
conseqüência do gesto, percebe? A primeira coisa que se aprende é a posição e o gesto, os
movimentos. De forma que, quanto mais iniciante, mais esse processo pode ser feito de forma
sistemática com todos eles, pela minha experiência.
9. E retornando aquela pergunta sobre quais são as vantagens de se trabalhar com o ensino
coletivo e as desvantagens, depois de um certo momento? Se é que existem ...
É. Para te responder isso, eu tinha, eu tinha que... eu devo te falar que existem muitas abordagens
de ensino em grupo. Existem muitas abordagens. Abordagens de iniciação, é uma abordagem
diferente da abordagem que eu uso. Quer dizer, pode ser, a abordagem que eu uso pode ser usada
em iniciação. Mas a abordagem que eu uso é uma abordagem de interação social , de aprendizado
colaborativo, ou seja, de constate troca de informação dentro, dentro do grupo. O professor é o que
eles chamam de facilitador. O professor, claro que ele dá informação, ele corrige postura, mas o
que o professor puder fazer através de outro aluno, é muito melhor. Porque ele vai estar
envolvendo a percepção do outro em relação ao colega, em relação às limitações e as facilidades do
colega. Então, neste aspecto, o objetivo de uma interação com grupo menor é muito mais rica do
que a interação com grupo maior. Num grupo de alunos a interação social é muito pequena. Ou
seja, o professor num grupo maior, ele tem uma participação muito mais direta, muito mais
decisiva e é ele quem coordena as atividades... quer dizer, as atividades, não digo, mas é ele quem
coordena o aprendizado. E numa, numa interação de um grupo pequeno, os alunos se coordenam,
se instruem, se verificam, e é muito mais rico em termos de aprendizado.
10. E no caso, a sua atividade pedagógica em grupo, então, atualmente, é um complemento
da aula individual? Você reúne ...
(Interrompendo) É um complemento.
Mas seria... poderia ser chamado de música de câmara?
Não. Não. Porque dentro do, da atividade de grupo, existe um momento de música de câmara, no
qual eles ensaiam uma peça. Eles ensaiam discutindo questões musicais, questões técnicas entre
eles, e eu jogo as questões, eu falo : “E a questão do ritmo?”, “E a questão da melodia?”. Eles
discutem a princípio, cada questão que eu proponho, entendeu? E, mas é um momento, a música de
câmara é um momento. Um outro momento, por exemplo, é trabalhar uma questão técnica : um
golpe de arco, mudança de posição, fazer dentro de um trabalho de escalas, você tem uma série de
elementos técnicos a serem trabalhados, entendeu? Então, o professor dá atividade, e eles lidam
com aquele conhecimento, com aquela atividade, entre eles. Eu participo também como professor,
mas eu participo como um... eu sugiro um exercício, eu sempre faço perguntas. Eu mais faço
perguntas do que dou as respostas. Porque um deles sempre vai ter uma resposta de alguma coisa.
O que acontece é que muitas vezes eles percebem coisas que eu não percebo, entendeu? Cinco
cabeças pensando, ouvindo, percebendo melhor que uma.
11. E a faixa etária trabalhada? Você trabalha com alunos mais velhos, já trabalhou com
crianças, adolescentes...
Já. Já. Não se deve misturar. Porque cada faixa etária tem uma ...
(interrupção)
Porque cada faixa etária tem características que são muito peculiares... Se você mistura adulto com
adolescentes, o adolescente pode se sentir inseguro. O adolescente tem uma insegurança natural de
personalidade que faz com que o se apresentar em performance, seja uma experiência dolorosa para
222

ele. Eles estão em crise de identidade, então a experiência, ou a troca de experiência com uma
pessoa mais madura, que fala as coisas com mais sinceridade, com mais desinibição, pode causar
uma reação de defesa no adolescente. Então, eu procuro deixar idades próximas. Idades próximas,
mas muitas vezes, níveis diferentes.
12. E no caso, você já trabalhou com todas as faixas etárias? Crianças , adolescentes e
adultos, ou geralmente, são jovens e adultos?
Já trabalhei com várias idades. Com várias idades.
13. E você sentiu dificuldade de trabalhar com alguma, ou você acha que esse fator não é tão
significativo neste caso?
Olha é diferente porque depende muito da característica pessoal do professor , da formação dele.
Eu lido melhor com adolescentes e adultos. Porque eu trabalhei mais tempo com adolescentes e
adultos. Com criança, você tem que diluir a aula com brincadeiras, com joguinhos, com atividades
que são o tempo inteiro tem que ser lúdico. Não adianta você pedir disciplina, exigir disciplina, que
não é por aí. Você tem que tá seduzindo, tem que tá chamando a atenção para alguma atividade ali ,
a atividade tem que ser sempre interessante. Por isso que a aula tem que ser mais curta. Porque não
adianta você argumentar que eles têm que se concentrar, eles têm que, porque não é por aí. Eles
concentram enquanto tá divertido. Se deixou de ser divertido, acabou. Então, pra mim, é mais fácil
trabalhar com adolescentes. Adultos eu gosto também, é outra abordagem. Mas com adolescente, é
um desafio porque eles se defendem, eles se atacam, então essa interação que acontece, que a gente
espera que aconteça com os adolescentes é muito maior, é mais viva.
14. E Abel, atualmente você trabalha o Ensino Coletivo aqui na UEMG.
Isso.
Na Universidade Estadual de Minas Gerais. A carga horária, como você administra isso?
Você tem, eles têm aulas semanais, quinzenais? Qual é a carga horária de cada aula?
Bom, depende do curso. O curso básico que é o curso de extensão, a gente faz aulas em grupo,
aulas semanais. Toda terça –feira às 18:30 a gente se reúne. Às vezes vem um, às vezes vem cinco,
às vezes vem alunos que não são meus alunos particulares, vêm alunos de outros professores. É
uma aula em aberto. Muitas vezes, a maioria das vezes vem três a quatro. Que é o número ideal, na
verdade. Pela minha abordagem é o número ideal. Agora, a graduação, as exigências do repertório,
do desenvolvimento é maior. Então, a gente faz aulas esporádicas, uma vez por mês. Num sistema
não de Master-Class. O Master-Class é um momento da aula em grupo, é o momento em que a
pessoa toca e os outros criticam, os outros observam, elogiam e se for necessário. Mas se trabalham
questões técnicas, trabalham questões filosóficas e musicais, interpretação. É uma discussão bem
ampla.
15. E no caso, além de ser trabalhado aqui na UEMG, você trabalhou em alguma outra escola
com o ensino coletivo em instrumentos?
Eu participo muito de cursos de férias. São João del Rei, Porto Alegre, Domingos Martins no
Espírito Santo, são cidades que tem uma atividade, Ouro Preto, são cidades que tem uma atividade,
sempre em Festival de Inverno que eu vou, participo, sempre faço aulas, a maioria das aulas de
festival é em grupo. Porque o tempo é muito pequeno, e é uma semana só, dez dias às vezes, e
quanto mais eles puderem ter experiências intensas de convivência, de, de conhecer estudantes de
outras cidades, de abordagem técnica diferente, que sugerem discussões muito saudáveis. E , é
muito prazeroso pra mim porque são alunos que eu não conheço. Então, é sempre um desafio você
lidar com alunos novos e você sempre se surpreende, isso mantém a gente mais concentrado, mais
atento, mais vivo. A gente aprende muito mais com os alunos que a gente não conhece, numas
situações dessas.
16. E Abel, na área da pesquisa em Música, em Educação Musical, como você vê o quadro no
Brasil sobre o Ensino Coletivo? Se você conhece o trabalho de outras pessoas fora, em Belo
Horizonte e fora de Belo Horizonte, a atuação de outros professores e a questão da pesquisa
em Ensino Coletivo?
Todos os professores de instrumentos sabe que existe uma resistência muito grande. Porque a gente
aprendeu de forma individual e é muito mais cômodo ensinar da forma como a gente aprendeu.
Mas eu acho que o quê tem feito as pessoas procurarem o ensino em grupo é, sinceramente,
demanda. Demanda de professores mais versáteis, que consigam tornar o ensino mais interessante,
223

mais eficiente, mais atrativo. Porque ensino de instrumento tem que ser alguma coisa
extremamente sacrificante. Então eu acho que esse lado lúdico que os cursos, principalmente de
iniciação, e os cursos básicos, precisam ter pra poder trabalhar com quantidade também.
Quantidade. A gente não, não pode negar que de cada dez alunos, um ou meio, segue a carreira, a
carreira profissional. O objetivo é, também vai fazer diferença aí. Se é iniciação, é simplesmente
pra socializar o ensino de música, ou se é pra, pra tirar, se você está dentro de uma universidade, se
é pra tirar uma porcentagem que vai preencher o curso de graduação. Mas, eu acho que a demanda
tem crescido, pelo, pela... porque tem, tem crescido a procura de estudantes também, para começar
a estudar música. E, e otimizar esse tempo. O curso de música é um curso muito caro. É, as escolas
de música das universidades são as escolas mais caras, exatamente porque o ensino é só individual,
percebe? Eu acho que, que é uma das razões também que, que tá fazendo com que o ensino em
grupo esteja muito procurado. Outra que eu acredito é uma, uma (interrupção). Eu acho que com o
próprio desenvolvimento da pedagogia, utilização da, da psicologia humanística na, na educação
tem se chegado à conclusão de que o ensino deve ser mais socializado, mais interativo. Eu acho
que os professores estão começando a se abrir para esse tipo de pedagogia mais moderna. Quer
dizer, na verdade, a psicologia humanística tem cinqüenta anos, né? Isso é, essa, essa transição
demora a chegar até o ensino de música. Primeiro, tradicionalmente, o conhecimento novo começa
com a filosofia, ou a ciência, que andam muito de braços dados. E isso chega na pedagogia, de uma
forma geral, com vinte anos de atraso, trinta anos e isso vai chegar pra nós, professores de música,
ás vezes, muito tempo depois. Então, é uma forma da gente, os bons, os bons professores eles estão
ligados, em termos de paradigma, em termos de, do quê que a filosofia tá pensando, digamos
assim, ultimamente e aplicando isso, tentando aplicar isso, na prática do ensino.
17. E sobre essa questão, você conhece alguém especificamente, que trabalha aqui em Belo
Horizonte, ou nomes fora de Minas, fora de Belo Horizonte? Ou não, você acha que ainda
falta um maior entrosamento entre os educadores musicais, divulgando seus trabalhos,
fazendo um intercâmbio?
Eu sei de nomes de professores que trabalham com o ensino em grupo, mas eu pelo menos não
recebi nenhum convite e não me dirigi a nenhum. Existe um isolamento realmente que separa, que
deixa cada um trabalhando, meio que individualmente. Em Belo Horizonte têm professores que já
trabalharam o ensino em grupo e depois foram ser meus alunos na especialização, aqui na UEMG,
que na verdade foi uma troca de informações porque não existe uma metodologia única. Existem
princípios pedagógicos que são aplicados em abordagens diferentes. Então, não existe uma
metodologia que eu ensino a você. Isso pode acontecer, mas entre dois professores que, que já
trabalham com isso e o que acontece é uma troca de informação. Como dois profissionais. Mas eu
acho que falta um entrosamento, e isso pode acontecer sim, pode melhorar porque só vai
enriquecer.
18. E Abel, para finalizar, você tem alguma consideração a fazer sobre essa nossa conversa,
alguma sugestão a fazer, no caso, para mim, para a minha pesquisa? O que você tem como
palavra final?
Eu acho que o trabalho com o grupo é uma opção, uma modalidade de trabalho, uma abordagem de
ensino que serve a muitos objetivos, a muitos objetivos. Se a gente pensar que a gente no final das
contas de um aprendizado musical a gente vai tocar em público, porque que a gente não pode
aprender em grupo, estudar em grupo, estudar com o colega, ter aula com o colega. Então, qualquer
abordagem que você tiver, que você tiver, desde de uma, de uma abordagem de educação liberal,
sem objetivos profissionalizantes, que você inicia uma quantidade de alunos até uma, com
objetivos profissionalizantes. O ensino em grupo, ele serve perfeitamente para ser trabalho tanto
em abordagens quanto em idades diferentes, pra crianças, pra jovens, adolescentes, terceira idade.
Agora, o mais importante eu acho que é o que eu tenho percebido, isso aconteceu em mim, é uma
mudança, é uma mudança de visão do trabalho como músico, como professor, como intérprete. A
visão do século XIX é uma visão muito, muito mítica, tanto do compositor quanto do intérprete. E
a visão, a visão do século XX é uma visão muito tecnicista do músico, do compositor também. O
músico tem que ser absolutamente excelente, perfeito. O advento do CD, da gravação do CD deu
uma neurose dos alunos de instrumento, dos instrumentistas de não, de eliminar o fator imperfeição
do, da pauta de aprendizado. Se objetiva a perfeição. E sendo o quê caracteriza a vida, a natureza e
224

a própria arte é o elemento imperfeição. Se você ouvir o computador tocando absolutamente


afinado, no ritmo, você vai ver que falta o elemento humano. O elemento humano é a
irregularidade, é a sensibilidade, é a emoção que a gente não controla, você entendeu? A falta de
controle é algo que a gente tem que aprender a conviver com ela. As limitações é algo que a gente
consegue enxergar muito mais no colega do que na gente. Por isso que o ensino em grupo ele pode
ser muito mais humano agora, no século XXI. O ensino em grupo, a socialização, a visão de
música como algo que pode servir, que pode servir com o objetivo explícito, não só intrínseco. O
Koellreutter chama de uma Educação Musical Funcional, ou seja, que tenha função de socializar ,
de trazer a experiência de um conhecimento simbólico. Que é algo que é perdido, que é algo que a
gente tem que resgatar. Então, eu acho que o, a principal ligação que eu vejo no ensino em grupo é
como a mudança de paradigma da própria visão, da própria função da música na sociedade e na
vida do homem. Eu posso dizer por mim, o processo de aprendizado musical, de aprendizado
instrumental é algo extremamente sacrificante, é algo que demanda um esforço pessoal, uma
transformação pessoal em cada,em cada estágio da vida. Então, se isso pudesse ser visto como uma
oportunidade de desenvolvimento pessoal, ao invés de unicamente profissional, a gente pode
democratizar, a gente poderia democratizar o ensino de música como sendo algo terapêutico, como
algo que trouxesse a possibilidade de um desenvolvimento muito maior, muito mais amplo do que
simplesmente você chegar a tocar um concerto com uma orquestra. Então, é isso que eu vejo, é
dessa forma que eu ensino, é dessa forma que eu ensino professores a ensinarem, uma maneira de
pela música você entender o mundo de uma forma mais tolerante, porque é imperfeito, percebe? Na
música existe a imperfeição assim como nós somos imperfeitos, existe contradição assim como nós
somos contraditórios. Então a convivência com música, não numa visão tecnicista e perfecionista,
para se moldar um intérprete. Mas no sentido simbólico, artístico. Aí é que tá o casamento com, aí
é que entra o casamento com o nosso lado humano. Eu acho que essa é a abordagem de ensino
musical que a gente deve buscar, de agora em diante. É o que eu tenho buscado. Cada aula que eu
dou, cada momento eu penso sempre nisso. Existe um ser humano tocando um instrumento ali
atrás. Se eu puder preparar esse ser humano, se eu puder lidar com ele, pra aprender melhor o
instrumento, ele vai aprender natação, culinária, direção, ele vai, ele pode se relacionar melhor com
a mulher dele, ele pode se aceitar mais nas suas limitações, entendeu ? Então, isso é que eu
entendo como educação musical.
Educação do ser humano...
É.
19. E no caso, você acredita então que o ensino coletivo poderia ser um instrumento para a
democratização do ensino e conseqüentemente a música como uma forma de transformar
uma realidade dentro da sociedade?
Acho. Acho. Com certeza.
Porque você vai dar mais acesso as pessoas iniciarem, ter um contato com música num país
tão sem oportunidades. As pessoas, de ter um momento consigo mesmo, um momento
cultural, um momento com a música. Nisso vão ser tocadas essas questões que você falou.
Eu acho que o sucesso, o sucesso de se alcançar alguns objetivos está na maior parte na mão do
professor. E principalmente de como o professor faz música e aborda a música. Porque o professor
tem que ser um exemplo. Não adianta ele ensinar uma coisa e ser outra coisa. Por isso que o
processo de ensino não tá desvinculado do processo de desenvolvimento pessoal. Quando a gente
pensa em uma abordagem democrática, de estender a alunos talentosos, alunos não talentosos,
alunos de maneira geral, o professor tem que estar muito claro a abordagem que ele tem que usar,
tem que estar muito clara, senão ele, ele pode ter uma abordagem teórica no papel e quando ele
chega em sala de aula ele pode estar repetindo inconscientemente uma receitinha, que é o
tradicional do ensino do instrumento. Então, a primeira coisa que o professor tem que, tem que
entender, ele assumir aquela abordagem sem violência. Um professor tradicionalmente concertista,
instrumentista, que se força uma abordagem dessa, ele não está convicto, e o professor precisa ter
uma convicção. Ele precisa ter uma convicção pra ele ser original na abordagem dele. Eu acho que
esse é o maior perigo. No papel todas as abordagens são ótimas, são excelentes. Você tem
argumentos fantásticos, seja qualquer abordagem que você, que você utilizar. Agora, quando se
entra na sala de aula, o papel ficou lá na sala, ficou lá na sua casa. Então, você tem que ter um
225

compromisso com o aqui, agora, com aquele momento. E se você tiver só a teoria e não conseguir
realizar isso na prática, você tá fazendo uma coisa terrível, você não sabe o quê que você tá
causando ali como conseqüência nos alunos. Você não sabe as conseqüências que os alunos vão ter
com o passar do tempo. Você pode ter um discurso e na prática você ter um, você ter uma direção
completamente diferente. esse que eu acho que é o perigo de você trabalhar com o grupo numa
determinada abordagem porque os danos que você pode causar podem ser muito maiores porque o
número de pessoas envolvidas é maior. Entendeu? A coerência da abordagem que o professor
escolhe tem haver com a vocação deles. Tem professores que são excelentes para se formar um
concertista numa forma tradicional. Esse professor não deve mudar a abordagem dele. Entendeu?
Só que não é democrático. Vai ter um número de alunos restrito que vai se, que vai conseguir
estudar com aquele professor, entendeu? Mas se ele for original, ele tá autêntico na abordagem
dele, entendeu? Eu posso dizer que eu consigo trabalhar de formas diferentes, tanto para alunos
que se profissionalizam porque aí você tem um objetivo, um repertório, um, objetivos muito claros
a cumprir. Mas a abordagem humanística ela tá ali o tempo inteiro. O repertório nunca é mais
importante que o aluno, nunca é mais importante que o intérprete. Porque se você preparar ele
praquele repertório, você prepara ele também pra, pra outro tipo de peça. É a educação da reflexão.
Você nunca dá a resposta. Você sempre dizer coisas que se aplicam a outras situações, entendeu?
Pra ele ter condições de aplicar o conhecimento. O grande objetivo é você tornar o aluno
independente. É você dar pra ele condições dele pensar sozinho, dele estudar sozinho. E prá isso
você não pode dar respostas, se você responder ele acomoda, ele vai depender de você. A
dependência vem desse tipo de relação, se você ensinar ele a pensar, se você ensinar ele a estudar e
a pensar tecnicamente, musicalmente, artisticamente, percebe? Então, eu acho que é uma mudança
de foco. Antigamente se tinha uma, um foco em cima do, da habilidade, do que tem que ser feito,
você tem que. É a Educação Comportamental, baseada na Psicologia Comportamental. Você tem
um objetivo. O objetivo é aquele. Então, você tem que seguir essas etapas do aprendizado até você
alcançar esse objetivo. No final do ano você tem que se capaz de, dois pontos, aí vem o repertório a
cumprir, percebe? De alguma forma, a gente não pode abandonar isso. Porque é uma referência. Lá
fora quando o aluno se formar, ele vai encontrar, ele vai encontrar exatamente isso, abre aspas, pra
você entrar nessa orquestra você tem que ser capaz de. O professor não pode ignorar isso. Mas ele
não pode ignorar que existe um ser humano atrás, que esse ser humano tem que ser preparado, tem
que ser moldado pra ele prosseguir sozinho no, na jornada de aprendizado.
20. Mas alguma consideração, Abel?
Não. Eu acho que já conclui tudo.
Então está bom. Então eu quero agradecer você imensamente pela, por me receber aqui e
espero revê-lo em breve.
Eu também.
Agradeço imensamente.
O prazer foi meu.

Entrevista nº2 : LUCIANO LOPES


Local : São Paulo-SP
Data : 21.05.02
Horário : 11: 30h

1. Bom Dia, Luciano. Primeiramente, eu queria saber, como se deu o seu primeiro contato
com a música?
Bom, meu primeiro contato foi, eu tinha nove anos de idade. E eu estava assistindo TV quando vi
uma orquestra tocando na TV, eu fiquei apaixonado. E no outro dia, acordei de manhã, e fui falar
com o meu pai : “Pai, quero comprar violino”, “Eu quero um violino”. E enchi o saco dele até ele
arrumar um violino pra mim. Ele comprou na época um violininho de fundo de quintal, sabe?
Aqueles que você passava a mão parecia uma lixa. E aí, eu comecei a estudar. O meu primeiro
contato foi assim. Eu comecei a estudar, eu comecei a fazer aula particular com a Dona Edna
Nogueira, em Araraquara. E esse foi o meu primeiro contato, depois foi dando continuação, na
Orquestra e tudo.
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2. E qual é a sua formação musical? Você fez alguma universidade...


(Interrompendo) Bom... termina.
Você fez seus estudos com a Professora Edna e deu continuidade...
É eu iniciei em Araraquara, eu era pequeno, tinha nove anos. Depois quando eu tava com quase
onze anos eu fui pra Ribeirão Preto, no Conservatório Carlos Gomes. Eu estudei no conservatório,
saí de lá com quatorze anos, saí de lá formado no conservatório, aí eu voltei para Araraquara e eu
viajava pra Piracicaba na Enerst Mahle, outro conservatório. E eu fui lá e fiquei lá até meus
dezessete anos de idade. Fiquei lá e me formei lá também. Depois eu fui para Tatuí, Conservatório
de Tatuí. Aí eu estudei lá também e terminei lá também. Aí eu vim pra cá, pra São Paulo e fiz USP
em São Paulo, terminei agora, o ano passado.
3. E como surgiu esse interesse em trabalhar com o ensino coletivo em cordas? Como você
começou a trabalhar? Como você se interessou pelo ensino coletivo? Fale um pouco da sua
experiência.
Olha, quando eu entrei, eu entrei aqui, na época eu tava, eu tava no último ano em Tatuí, estudando
lá. E eu precisava de trabalhar, música é aquela coisa né. Eu precisava arrumar algum emprego,
alguma coisa, eu só tocava em orquestra. E orquestra éramos bolsistas ainda, não tínhamos
formado. Então, apareceu o Pedro, que é o coordenador técnico do projeto. Ele ligou para mim e
falou diretamente comigo sobre dar aula em grupo e tal. Eu nunca tinha, nunca tinha imaginado
que esse tipo de coisa existia. Isso há, há quase seis anos atrás já. E eu aceitei. E na época era em
São Roque, né. E aí eu fui pra lá e cheguei lá, dei de cara com um monte de aluno assim, foi, eu
me assustei né. Eu nunca tinha feito curso do Galindo, ele dava, ele dá e nem os cursos que ele dá.
Eu nunca tinha feito os cursos do Galindo ainda, eu tava, eu fiquei perdido. Mas, eu comecei a
gostar daquilo, eu comecei a gostar daquilo, que no entanto, eu acho que hoje, hoje foi, hoje é o.
Eu prefiro dar aula coletiva do que dar aula individual, né. Eu aprendi muita coisa durante todo
esse tempo. Com as pessoas com que quem eu trabalhei, com quem eu trabalho. Uma delas é a
Carmem. Nossa, ela era, ela foi uma grande escola para mim. Ela me ensinou muita coisa assim,
eu não sabia nada, né. Macetes, aquelas coisas já, fui fazer os cursos com o Galindo também, né,
Então foi essa a minha. O que eu posso dizer assim, realmente, eu prefiro dar aula hoje individual,
tenho muito amor no que faço, né, do que, não, coletiva do que dar aula individual.
4. E Luciano, na sua opinião quais são as vantagens do ensino coletivo? E você acredita que
exista alguma desvantagem? Como você, você enxerga aí o ensino coletivo em relação aos
benefícios para os alunos?
Olha eu acho assim : quando a gente dá aula individual, só tá você e o aluno numa sala. O aluno,
ele tem um único incentivo que é o do professor, né. Agora, agora quando é aula coletiva, quando
não tem só o incentivo de uma única pessoa, têm o incentivo de todos os alunos. Porque é aquela
coisa, eu acho que a vantagem é essa, dos alunos estarem sentados, todos estão fazendo a mesma
coisa. Então, o aluno que tá tocando menos, ele olha, ele olha pro outro que tá do lado e vê, “ele tá
tocando melhor que eu”. ele pensa isso com ele, porque eu já ouvi esse tipo de comentário e tudo.
Ele olha pro aluno do lado e ele pega e pensa com ele, fala assim : “Não ele tá tocando. Porque eu
não vou tocar também?”. E vai atrás e consegue isso né. E são várias coisas assim. É engraçado
que a maioria, aliás todas as crianças que vem fazer aula, que entram numa turma pra poder
começar e iniciar a aula, eles não conhecem nada de música, eles não conhecem nada. Então, a
gente procura passar um pouco de teoria e aos poucos ir acrescentando as coisas né. Então, acho
que tem muita coisa boa né, que dá pra tirar muito proveito disso tudo né? E os alunos se
interessam, assim, é engraçado que você vê. Hoje mesmo você assistiu à aula e você viu aquele
pequenininho lá, há dois meses atrás o pequenininho não conseguia se concentrar, o Natan. Ele não
conseguia, ele não conseguia colocar na cabeça que ele tinha que ficar parado, ele tinha que
colocar o violino no ombro e ficar quieto no cantinho dele. Só que aos poucos ele vai percebendo
porque as ouras pessoas do lado vão fazendo isso e ele tem que colocar na cabeça e pensar que
realmente tem que ficar de uma forma pra conseguir tocar legal. E ele já está saindo, ele já tá
tocando, acho que isso.
5. Então, o incentivo do grupo é a grande vantagem?
É, a grande vantagem.
227

Além de aprender mais rápido, assim, no sentido que eles podem tocar num recital, em três,
quatro meses, porque cada um faz uma voz, ou então, tocando uma escala, ele já pode tocar
canções folclóricas em um grupo que tem aquela sonoridade maravilhosa, né. Então, isso é
um incentivo.
É, exato né. É diferente. Você tá com uma turma que tem vinte e cinco do que você tá sozinho com
o aluno, né. O aluno se sente motivado, ainda mais quando coloca peças com vozes diferentes, né.
Eles ficam assim : “Nossa que bonito!”. Eles acostumam a tocar só uníssono, que é uma voz só e
de repente eles se deparam com outras vozes, eles realmente sentem, eles se sentem, eles sentem
que estão numa Orquestra. Porque é uma Orquestra, sai e fala pro pai e pra mãe : “Mãe e Pai”
sabe? Isso incentiva eles, e a cada aula, eles querem fazer algo diferente, a cada aula eles se
concentram mais. Agora, por quê? Porque é o ensino em grupo. É diferente, bem diferente do que
ensino individual. Eu já dei aula individual, né. Mas eu acho que é isso daí.
6. E você trabalha com qual faixa etária aqui?
Olha a idade é de 8 a 18 anos. Isso é o projeto que colocou essa idade porque a gente tem que
trabalhar com crianças e adolescentes, né, a adolescência vai até os 18 anos. Agora tem a
Orquestra Paulista, que é a orquestra paralela que montaram, né, que tem já alguns alunos, se eu
não me engano, só seu eu tiver muito enganado, mas parece que tem alunos mais velhos, que
começaram a aprender no projeto, né. Então, montaram essa orquestra, pra quê? Pra dar
continuação ao trabalho deles. Porque às vezes, que nem tem alunos que não têm condições
nenhuma, né. De viajar,de viajar, de gastar né, não tem condições nenhuma. Então, eles montaram
estas orquestras aqui pra quê? Pra ser mais acessível né, pra todos os alunos que estão aqui, ao
redor, vir e fazer.
7. E essas turmas? Vocês misturam todas as faixas etárias? Ou vocês trabalham de 8 a 12, 14
e depois tem a turma de adolescentes, como é que é? Ou depende da disponibilidade?
É engraçado isso. A gente normalmente, que nem, música é um, é uma, é um ensino livre. Que
nem você vai em uma escola de música como um conservatório e você vê – inclusive eu quando
estudava, eu tinha um amigo que tinha 16 anos, eu era mais velho que ele, eu tinha um amigo de
16 anos e ele estava se formando primeiro que eu. O moleque tocava muito, né. Mas aqui acontece
isso, de você entrar numa sala de aula e deparar com crianças, de 8 a 10, e já adolescentes de 12
anos pra cima, né. Então, aí quando você senta você vê de frente com eles, as palavras que você
usa nem sempre tem que ser a mesma, né. Porque de repente com criança você usa mais
diminutivo, né. Agora com adolescentes, mesmo eles estando na mesma turma, se você usar esses
diminutivos, ele vai achar muito babaca, muito quadrado, muito careta, né. É a visão que eles tem.
Mas, é junto isso né. É misturado realmente. Mas aí vai assim. eu já. já chegou acontecer isso
comigo, eu chamar os mais velhos e falar : “Olha, eu, quando eu tiver falando: ‘Vamos tocar essa
notinha! Vamos tocar isso assim dessa forma. Olha o arquinho, toma cuidado!’ Vocês sabem que
não vai ser pra vocês”. Lógico, né. Porque quando eu falo eles dão risada, eles pulam, eles fazem
alguma coisa. Então, é isso daí. è junto realmente, não tem, não tem separação nenhuma, que nem,
você vê aqui na segunda turma, que é o pessoal que fica pra fazer ensaio com a orquestra, tem
pequenininho junto, lá, né. Mas o Dasso (?), quando ele chega, ele fala igual pra todo mundo, né.
A bronca quando a gente dá bronca, é igual pra todo mundo. Não tem diferença não.
8. E você atua no ensino coletivo só aqui, no Projeto Guri ?
É eu trabalho aqui, né.
E você trabalha em outros pólos, mas dentro do projeto?
É, dentro do projeto. Eu cheguei a trabalhar fora, também, no Conservatório em Sorocaba, ???
Julião, mas eu dei só, eu só comecei. Eu montei tudo lá, montei uma estrutura legal. Aí eu
consegui, eu peguei alguém pra colocar no meu lugar, né, pra dar continuação ao trabalho. E o
trabalho esta sendo feito até hoje, né.
Ah, que bom!
9. E a carga horária aqui ? São duas aulas? Qual que é a carga horária? De uma hora, de
uma hora e meia? Qual que é a carga horária?
É. A primeira turma, a primeira turma, de manhã no caso, pelo fato de ser, ser muito pequenos, né,
crianças, a gente tem a visão que é o seguinte: a criança, ela não tem paciência pra agüentar a ficar
sentada, fazendo aula, como tem um adolescente, né. Mesmo o adolescente, ele já reclama. Então,
228

a gente procura, a gente procura, fazer uma aula logo no início, dá o máximo de nós, e pedir o
máximo deles, no início que é a hora que eles se concentram mais. Porque depois de, de meia hora,
quarenta minutos, eles já tão bem dispersos já, não conseguem mais se concentrar, né. Então, mas,
normalmente, é uma hora a primeira turma, a segunda, a gente já puxou pra fazer uma hora e
quinze, né. E a tarde também funciona assim.
10. Luciano, o seu referencial teórico, então, o método que você aplica é o método do
Galindo, e quais são as outras fontes? Você tem arranjos próprios, onde você busca.
(Interrompendo) É, que nem, eu estudei, eu fiz composição, regência, então, a gente tenta se
esmerar em querer aproveitar isso, né. Normalmente, a gente usa o método do Galindo mesmo, né,
vai até o final dele. Dou aula no Pólo São Roque também, já cheguei no final do método e voltei
pro começo, de maneiras diferentes, assim, fazia, é estranho, mas é interessante pros alunos, para
eles terem reflexo, terem leitura boa, lia todas as peças, de trás pra frente, todas as peças, ao invés
de tocar as notas que estão escritas, dividir tipo colcheia, semicolcheia, fazer tudo, sabe, alternar
tudo, mudar tudo. E aí, quando tem peças de orquestras, ou quando a gente vai fazer alguma
audição, como você ouviu agora, eu ensaiando, o que a gente estava fazendo, tem arranjos,né. A
gente escreve, né. Eu escrevi um bem básico realmente, ali prá eles, mas a gente faz os arranjos,
são próprios nossos também. Só que aqui tem o maestro aqui, né. Eu, a Andréa, a gente dá aula
né, tudo que a gente faz chega no maestro e mostra pra ele, fala assim : “Maestro, passa isso pra
eles lá, dá uma olhada aí, pra vê se tá legal”. Se falar que tá, tudo bem, se ele falar assim : “Vamos
mudar aqui” e eu falo : “Então, mude, então!”. Se você acha que tem que mudar, então muda.
Então, muda você.
Mas é isso daí.
11. E na sua opinião, você acha que a pesquisa em ensino musical, em ensino coletivo vem
crescendo? Como você vê essa área da pesquisa em Educação Musical? E como você vê a
questão do ensino coletivo? Você acha que está crescendo a prática, as pessoas tem sido mais
receptivas, como é que você vê isso aí?
Olha, eu tô, eu acho que eu já disse isso a você, eu tô no projeto a quase cinco, seis anos já. Então,
quando eu entrei não sabia nada. Eu perdido completamente, então, com o tempo a gente vai
acostumando, vai pegando, né, e eu acho que isso acontece com os outros, com os outros
professores também. Hoje, hoje tem professores daquela época que eu entrei, que hoje eles atuam
muito bem, trabalham muito bem, né. E isso é importante pras crianças também. O ensino coletivo
pra eles ali é, como posso dizer, eles têm, assim, eles têm vontade de sair da casa de cada um e vir
prá cá fazer, vim fazer a aula e tudo. E, eu fugi um pouco de sua pergunta.
Não, assim, sobre a questão social ... Você acha que a pesquisa no ensino coletivo, com a
temática, vem aumentando? Você conhece além da dissertação do João Maurício, do
Enaldo, alguma outra? E sobre a questão mesmo do ensino coletivo, você acha que vem
crescendo em São Paulo ? Ou é só aqui no Guri, como é que você vê isso?
Não, não, isso vem, realmente vem crescendo assim. Eu tô há tempo aqui, você vê, você vê o
desenvolvimento assim, cada vez, cada vez tá indo pra melhor. Você vê os professores, eles se
empenhando, sabe, dando o máximo de cada um pra conseguir fazer um trabalho legal, pra
conseguir, sabe, que nem hoje aqui. Você vê que a gente trabalha, eu e a Andréia dentro de uma
sala de aula, isso faz render muito mais o trabalho, isso faz. O pessoal costuma falar que eu sou
bravo né, que eu sou o casca grossa daqui do pólo. A Andréia é mais calma, então, sempre têm
essa, essa coisa assim, todos alunos eles gostam. Porque às vezes eu brinco, faço uma palhaçada ou
outra, né. Mas eu acho que isso vem do tempo, do trabalho. Acho que quanto mais tempo o
professor tiver dentro do projeto, tiver trabalhando, melhor vai ser o rendimento dele.
12. Luciano, para finalizar nossa entrevista, nossa pequena entrevista, você tem alguma
consideração final, alguma sugestão a fazer sobre a pesquisa? Sobre a minha pesquisa, no
caso, alguma consideração final?
Eu achei muito legal. Você sair lá de Goiânia, vir aqui fazer tudo isso. Eu acho que é um trabalho
legal, pra mostrar para bastante gente. Porque esse projeto é só aqui em São Paulo. Então, não sei,
eu acho que você tinha comentado comigo que estão querendo levar pra lá, ou alguma coisa assim.
229

É. A gente trabalha há dois anos e meio como o método Galindo. A gente trabalha com esse
método que vocês trabalham aqui, há dois anos e meio em Goiânia. Mas é só Cordas. Então,
a gente veio conhecer aqui.
Eu achei importante pra caramba, seria bom se todos as universidades, todos os estados pudessem
querer conhecer, tivesse essa idéia de montar uma tese assim. Parabéns.
Então tá. Então, muito obrigada Luciano.
Por nada.
Até mais!

Entrevista nº3 : MARCELO BRAZIL


Local : São Paulo-SP
Data : 21.05.02
Horário : 13 h

1. Marcelo, Boa tarde! Eu gostaria de iniciar a entrevista perguntado : como se deu seu
primeiro contato com a música? Como você começou a estudar violão?
Eu tive contato com violão, principalmente, com meus irmãos mais velhos. Os dois tocam violão e
eu, apesar de não ter passado a minha infância toda com eles, eu morei aqui em São Paulo até os
nove anos de idade e convivi com meus dois irmãos que tocavam violão. Apesar de que os dois
eram canhotos. Então, eu nunca pude experimentar o violão deles porque o violão deles era de
cordas trocadas para mim. E depois, eu fui morar na Paraíba, e lá que eu comecei a estudar mesmo.
Mas a minha primeira iniciação musical foi com o meu irmão, que até hoje foi o meu incentivador,
meu irmão mais velho. Que sempre me mostrava discos, me mostrava as coisas, ele que me levou
pra frente.
2. E qual que é a sua formação musical? Você falou que iniciou seus estudos na Paraíba, e
qual é assua formação, depois disso o quê que você estudou?
Eu lá, aos quinze anos comecei a estudar violão. Comecei com um colega de escola que me
ensinou algumas coisas, depois eu comecei a fazer aulas. Mas eu trabalhava em outra área, eu fazia
curso técnico, era técnico em eletrônica, e depois fui morar em Recife, e estudando Engenharia, e aí
uma hora me deu na telha assim, eu disse : “Ah, vou começar a estudar música”. Aí, comecei a
estudar em um Conservatório em Olinda, né, fazia aula de violão, e tal. E aos vinte e cinco anos eu
entrei na Licenciatura em Música, na Universidade Federal, na época eu desencanei de Engenharia,
de tudo e disse : “Vou estudar música”, entrei na Federal. Aí fiz os cinco anos de Licenciatura lá, e
vim embora prá São Paulo, tentar fazer Pós-graduação, essas coisas. E aqui eu entrei com a
intenção de fazer Mestrado, mas cheguei aqui tive dificuldade de entrar direto no mestrado aqui. Aí
entrei na UNESP, comecei a fazer Composição e Regência. Fiz três anos de Composição e
Regência na UNESP. E aí, entrei no mestrado agora, meu mestrado é em Musicologia, vou estudar
a obra do Baden Powell. Fora isso, aqui em São Paulo, eu estudei na ULM, eu fiz Violão Popular
na ULM, estudei eu acho que uns três a quatro anos na ULM, aí parei agora porque entrei no
mestrado, aí eu tive que parar.
3. E quando se deu esse interesse em ensinar através do ensino coletivo? Como surgiu esse
contato com o ensino coletivo?
Eu dava aula já no Projeto Guri em 98. Mas eu dava aula de Canto Coral. Fiz formação, estudei,
cantei em coral, fiz um monte de coisa e dava aula no coral infantil. E o pessoal da coordenação
sabia que eu tocava violão e estavam precisando de professor de violão no pólo aqui. E aí eu fui.
Não sabia que era aula em grupo, não sabia como era e cheguei lá e me deparei com uma turma, e
disse : “não vou ter que fazer alguma coisa né”. E diante daquela situação eu comecei a criar, eu
comecei a experimentar um monte de coisas e algumas coisas deram certo, algumas coisas não
deram certo, a gente vai experimentando né. Comecei a escrever arranjos, já em 98, tem arranjos
que eu toco até hoje, aquele é um arranjo de 98. E algumas coisas que eu aprendi lá e de lá pra cá
sempre trabalhei muito com aula em grupo.
4. E quais são as vantagens de se trabalhar com o ensino coletivo? E se existe alguma
desvantagem? Fale sobre isso.
230

Olha eu não vejo desvantagem nenhuma. Eu vejo assim : eu dou aula individual também, eu
trabalho numa outra escola. E assim, o aproveitamento, o rendimento dos alunos é muito superior.
As grandes vantagens que eu vejo, é assim : o estímulo, porque um trabalho em grupo é muito mais
interessante, eu tenho pouquíssimo problema de disciplina, porque vêm as pessoas que estão
realmente estão interessadas, as que não estão interessadas não vem. Eles criam uma amizade
muito grande, vira uma turma mesmo, de amigos, né. O fato de um ver o outro desenvolvendo, ele
se estimula para aprender, ele troca experiências com os amigos. então assim, ás vezes o que um
aluno fala, um colega dele fala : “ah, eu vi uma música de tal pessoa é muito mais, talvez chame
mais a atenção do colega do que se eu falasse. Chegasse e :“Olha vamos ouvir Hermeto Pascoal,
vamos ouvir Egberto Gismonti” , pra eles talvez, não significasse nada. mas chega um colega :
“Ah eu ouvi uma música de tal e tal”. Aí o cara : “Pô deve ser legal”. è uma outra referência né.
Tem isso do desenvolvimento, do interesse, e eu acho que eles criam uma prática que eles levam
pra vida. Assim, tocar em grupo, fazer uma rodinha de violão. É um instrumento muito popular no
Brasil. Então é fácil de fazer o menino tocar, e toca muito o quê ele quer. Instrumentos de Cordas
às vezes têm essa dificuldade, ele toca algumas coisas que ele não conhece né, e o violão ele
consegue tocar o repertório que ele gosta, seja axé, pagode, ele sai tocando né. Ele consegue
perceber que isso, que essa parte do instrumento pode ser aplicada de qualquer forma. E isso na
prática de grupo é muito mais fácil. E assim, uma outra coisa que eu gosto de sempre ressaltar é
que sempre a gente consegue fazer a música chegar no fim. Porque sempre alguém vai conseguir
tocar até o fim né. Quando a gente está no aluno individual, ele fica naquele, ele erra, pára ou você
toca junto com ele e aí né. E eu aqui, inclusive, na aula, os meninos até comentam, acham
engraçado, porque eu não toco prá eles. Eu dificilmente preciso toca porque sempre tem alguém
que consegue mostrar. Então se tem algum exemplo, o próprio colega dá o exemplo pra ele. Muda
de lugar, põe, senta ele do lado dele. Então, não fico naquela deu mostrar, que é uma coisa, que é
uma experiência que eu vivi. Eu via meu professor tocando e achava que ele tocava aquilo porque
tinha estuda quinze anos a mais do que eu, que eu nunca ia conseguir fazer aquilo, o colega tocando
é outra coisa.
É outra coisa.
5. E Marcelo, nesta metodologia que você desenvolveu através do ensino coletivo, qual, você
tem algum referencial teórico? Algum método que você se espelhou ou algumas coletâneas...
Olha, método na verdade, eu não, não achei nenhum que me desse suporte aqui. Mas eu sempre
segui por dois caminhos. Na verdade por três caminhos: a leitura por partitura, sempre aliada à
prática do instrumento, sempre. Desde a primeira notinha, ele toca junto, até ele se conscientizar de
que aquilo que ele tá vendo, é o que ele tá tocando. E ainda assim, é difícil. Eles lêem a partitura, lê
a nota : “Ah, isso é dó, isso é ré”, mas olha para o instrumento e não sabe aonde tá. E sempre
paralelo a isso, a parte de harmonia funcional, sempre. Desde o começo, entender o quê é cifra,
entender o que é um dó maior, entender o que é um ré. E evoluindo um pouco o trabalho, eu
sempre faço com que eles descubram os acordes no violão né. Não fico eu, desenhando o tempo
todo, dizendo né. Se é um acorde de lá, e às vezes ele quer fazer um lá com sétima, eu digo : “Põe
um sol aí” e se virá, dá um jeito, até eles descobrem uma maneira de montar um acorde e aprendem
desta forma, não esquecem. Se a gente for lá e colocar o dedo dele lá, ele vai esquecer, ele tira a
mão e não sabe mais. E uma outra coisa que eu gosto de fazer, mas isso desde o começo, é fazer
com que eles entendam como funciona o violão. É engraçado que eu dou aula, às vezes, pra
pessoas mais antigas assim, (...?) né, e quando eu mostro pra ele assim, que o mesmo acorde, fá e
fá# são iguais, os caras ficam olhando para a minha cara e dizem : “Nossa, eu toco violão há dez
anos e ninguém nunca me falou isso” né. E eu faço eles descobrirem isso, que é o grande, grande
recurso que o instrumento têm, ele vai contra todas as regras de harmonia, porque é de um
paralelismo absurdo né, mas é o recurso do instrumento, então se ninguém aprende a fazer o fá, ele
aprende a fazer todos os acordes maiores, menores, com sétima e aí (...?). E diz : “Não, vamos
fazer um dicionário de acorde?”. Não precisa. Se você entende o instrumento, você toca. Você se
vira, você sabe onde é o sol, você sabe onde é o sol sustenido, né? É um mecanismo. Eu até brinco
assim, eu digo : “Engraçado, vocês compram um teclado e fica lendo o manual três dias até
aprender mexer em tudo. O violão também, tem que aprender como é que funciona, tem que
apertar, tem que, é a lógica do instrumento”.
231

6. E Marcelo, e as turmas aqui de ensino coletivo, que você trabalha no Projeto Guri, qual
que é a carga horária semanal?
Olha, as turmas iniciantes, eu tenho, assim, são duas vezes na semana, tem turmas que tem aulas de
uma hora e quinze, tem turmas que tem aula de uma hora nesses dois dias, com exceção da turma
mais avançada, que além dessa uma hora de aula, eles tem o ensaio, né. e aí, como são dois dias na
semana, um dia de ensaio geralmente é uma hora e meia, eles tocam com a orquestra e dia de
ensaio, eles ficam aqui fazendo a Camerata. Mas duas vezes na semana.
Então, no total, mais ou menos, duas horas e meia.
Mais ou menos. O pessoal da Camerata é isso mesmo, têm cinco horas de aula.
Ai que bom!
E eu acho inclusive que isso é um reforço muito grande no aprendizado. Você não cria uma
distância tão grande. Não é que o menino não estude, a gente sabe que hoje em dia você pega um
adolescente, ele tem trabalho de escola, tem não sei quê, não sei quê. Então, eu até brinco assim, se
não estudar em casa, pelo menos duas vezes por semana eu sei que ele vai ficar aqui, que ele vai
tocar um pouquinho né, e vai levando pra frente.
7. E além daqui, você trabalhou em outro lugar com o ensino coletivo ou a sua experiência é
só aqui?
De ensino coletivo de violão, só aqui. Já trabalhei em outros projetos sociais e dou aula individual.
Já trabalhei com canto coletivo, né, mas de violão, só no Projeto Guri.
8. Você está começando o mestrado, então eu gostaria de saber se você acha que a pesquisa, se
você tem notícia na USP...
(Interrompendo) Na UNESP
na UNESP da pesquisa na área do ensino coletivo? Você acha que vem crescendo o interesse
dos professores e conseqüentemente o interesse da pesquisa nessa área?
Olha, eu acho que sim. Na minha turma da UNESP não tem ninguém que tenha problema com
pesquisa nesta área. Mas eu vejo um crescimento nesta área de ensino coletivo. Eu não consegui,
ainda, encontrar uma maneira de fazer isso em escola particular de música. Embora na nossa
cabeça, seja interessante financeiramente, né. Mas perde uma grande mágica da coisa que é o não
ser obrigado a fazer. Eu acho que aqui, por exemplo, funciona porque o aluno vem se ele quer, no
dia que ele não quer mais ele não vem, né. Se você pegar uma turma em escola que o pai leva o
menino, enfia lá na sala de aula, mesmo que seja em grupo, seja turma vai ter aquele que não quer
fazer aula né. E as escolas, elas, as escolas particulares, elas também ficam receosas de criar este
tipo de mecanismo né, porque de repente, vão dizer que eles estão querendo ganhar dinheiro fácil,
que o ensino não é assim, tem as pessoas mais tradicionais que dizem : “Imagina, vocês estão
enrolando todo mundo”. E a gente sabe que não é.
No caso, precisa de um investimento maior, né. No violão nem tanto, porque o violão é um
instrumento mais acessível. Mas outros instrumentos precisam de uma estrutura que ás vezes
a escola particular não está muito interessada em gastar...
E tem outro problema né, uma escola que o pai tá pagando, a família tá lá, fazendo um esforço, de
repente o menino não vai pra frente, e você de repente não tem com explicar para o pai que ele
aprendeu menos que o outro. Ele pensa : “Pôxa, mas ele está a um ano, todos os colegas dele agora
tão tocando, porque que ele não toca? O meu filho tem que ficar naquela turma”. Cria esse
problema que a gente não tem como dizer pro cara isso. “Não eu tô pagando, ele tem que ficar aí” ,
não tem como tirar,aí fica difícil.
É complicado.
Aqui é assim : a gente tem essa possibilidade, “Não esse ano ele ainda tá no começo, a gente vai
deixar ele na primeira turma”, nunca tive qualquer problema com isso, pra mim, isso é tranqüilo.
9. E pra finalizar Marcelo, você tem alguma consideração a fazer sobre o ensino coletivo?
Alguma sugestão?
Olha, eu sou um defensor assim, ferrenho do ensino coletivo, né. Eu acho que ele tem que ser
aplicado a tudo, tem que ser levado pras universidades, mesmo que vá entrar pras práticas de
conjunto das universidades. Eu quando estudava na UNESP era muito fraco isso, né. E instrumento
se aprende tocando, né. E na maioria, na grande maioria das vezes a gente vai tocar em grupo, não
232

tem jeito. Se é instrumento de orquestra, você vai tocar numa orquestra, se é instrumento popular
ele acaba tocando dentro de um grupo.
(Interrupção - a fita acabou)
Então Marcelo pra finalizar, você tem alguma consideração a fazer sobre ensino coletivo?
Alguma sugestão?
Bom, vou repetir (risos).
É, repete (risos).
A minha resposta, eu acho que tem que ser levado a diante, tem que ser aplicado, tem que ser
embasado isso, pra mostrar pras pessoas que funciona. as pessoas, na maioria das vezes, não
acreditam que possa funcionar esse tipo de coisa. E ser levado pras universidades, pras escolas
públicas. Inclusive é uma prática musical que poderia ser feita nas escolas. Eu inclusive vejo nas
escolas particulares que tem aula de música, é muito pobre o ensino de música nas escolas, então,
poderia ser muito rico, né. O máximo que eles fazem é uma aula de flauta doce, ou coisa assim, que
eu até tenho algumas críticas, porque eu acho que é um instrumento que não reflete a realidade da
música brasileira, não reflete a cultura brasileira, não existe repertório brasileiro sobre isso, não
estimula o aluno a ir pra casa dele e tocar flauta doce no meio da família dele. Tem tantos
instrumentos que são até fáceis de se conseguir, aqueles que não tem um violão na família, um
cavaquinho, um pandeiro ou qualquer coisa e formar grupos de instrumentos, que sejam populares,
que possibilite o aluno tocar isso. Então, eu acredito plenamente no ensino coletivo, acho que tem
que ser estudado, tem que ser levado pra frente.
E até mesmo pra democratizar o acesso a educação musical, né?
Lógico, você tem, aqui eu tenho oitenta e cinco alunos, né. Então, eu tô possibilitando o acesso a
uma aula de música pra oitenta e cinco crianças, né, num dia só eles tem oitenta e cinco crianças
que passam por aqui. Então, se eu tivesse dando aula particular eu ia dar aula pra meia dúzia, né?
É.
Então, é uma gama de alcance (interrupção, entrevista encerrada).

Entrevista nº4 : CARMEN BORBA


Local : São Paulo-SP
Data : 23.05.2002
Horário : 10 h

1. Carmen, eu gostaria de saber primeiramente, como se deu seu primeiro contato com a
música? Como você começou a estudar música?
Bom, primeiramente, foi através de um concerto que assisti no Teatro Municipal, há muito tempo
atrás eu vi o Antônio Jonigro tocando violoncelo e fiquei assim fascinada com o som do
instrumento. Eu era muito pequena e minha mãe nem queria saber daquela história e eu acabei
estudando violão porque tinha violão em casa e daí, acabei fazendo violão erudito e mais tarde
quando eu tinha condições, eu acabei estudando violoncelo. Foi através daí que eu acabei
envolvendo completamente na música.
2. E qual é a sua formação? Você chegou a cursar universidade?
Eu fiz faculdade, fiz bacharelado em violão, na realidade. Daí, estudei na Escola Municipal de
Música aqui, que é uma escola da Prefeitura de São Paulo. Os professores são, em geral, o pessoal
que toca na Sinfônica né. Então, é uma excelente escola e também não é uma escola cara, então,
facilitou muito, uma vez que instrumento é muito caro, material, manter o instrumento, então eu
estudei o violoncelo ali, na Escola Municipal de Música. E na Faculdade eu fiz o trabalho com
percussão, com o núcleo de percussão, cantei em coral muito tempo, fiz o estágio com uma
professora que dava o Método Orff de musicalização para criança né. Então, eu transitei meio
assim, com várias áreas, assim, musicais.
3. E como é que surgiu o seu interesse pelo ensino coletivo ?
Ah, foi o seguinte : eu trabalho na Fundação de São Caetano, era professora lá, e lá nós temos, nós
tínhamos um quarteto de cordas. E o professor Enaldo Oliveira fazia parte deste quarteto e quando
ele foi abrir os pólos lá, ele me convidou para fazer parte. Então, ele me ensinou a maneira com ele
faz o ensino coletivo e eu fiquei encantada por ver o resultado. Isso me impressionou muito, a
233

rapidez com que a criançada conseguia tocar, tão diferente daqueles alunos, eu só dava aula
particular até então não é. E eu fiquei muito interessada e daí eu li a tese dele e daí prá cá eu tô cada
vez mais envolvida nesta coisa.
4. E faz quanto tempo que você está no ensino coletivo? Desde (...)
(Interrompendo) Desde quer ver, faz uns quatro anos. Mais ou menos uns quatro anos. Quatro ou
cinco anos que eu estou no ensino coletivo.
5. E fale um pouquinho da sua experiência como professora no Projeto Guri, no ensino
coletivo? E ainda : quais as vantagens do ensino coletivo em relação ao ensino individual?
Eu acho que o ensino coletivo, primeiro, é muito mais lúdico. Uma turma inteira, existe uma troca
de energia de idéias que é muito maior do que numa aula individual. Você está conduzindo pra uma
música o estudo, também é muito mais interessante, eu acho, né. Você não fica só em cima daquela
coisa técnica no começo, e o grupo acaba eliminando aquele som feio do começo, e a outra coisa
que eu vejo é o cara olha do lado e não tá conseguindo e vê que não é uma coisa dele. Que vários
ali não estão conseguindo, e que outros conseguiram, o colega acaba conseguindo, daí ele descobre
que ele também pode conseguir. Existe uma competitividade, assim, boa, exatamente, no sentido de
instrutivo. E é muito rápido, eu acho. Essa é a coisa mais fantástica que logo, logo, eles conseguem
tocar alguma coisa, isso é muito legal, viu. No olho da criança, quando ela consegue acertar todas
as notas, e brilha o olho, ele não precisa nem dizer, porque eu sei que ele conseguiu. E no começo
eu vejo, que a gente trabalha com criança, baixa renda, baixa auto-estima, né, eu vejo que no
começo eles dizem que não conseguem, não sei, “Ah, é muito difícil!” e isso no decorrer do ensino
vai se transformando, né. Eles acabam pedindo pra você passar mais uma vez, que ele ainda não
conseguiu. Ele tem a absoluta certeza que se passar de novo ele vai conseguir. Isso é muito legal.
Isso aí eu acho que é o mais importante pra mim.
6. E você, nesse início, você vê alguma desvantagem no ensino coletivo ou você só vê
vantagens?
Não, o problema é, eu acho assim, depois de um período você tem que encaminhar as crianças pra
uma aula individual. Eu acho que depois de uns dois anos, você de certa forma esgota aquela coisa
que pode ser feita junto, você precisa começar a burilar e a aprimorar, não é. Daí precisaria ter o
encaminhamento, certo? Aqui quando acontece isso no Projeto Guri, a gente de certa forma, as
pessoas que se interessam, porque muitas crianças acabam saindo e tudo, o que foi acrescentado a
elas, ninguém vai tirar. Isso aí é muito legal. Mas a gente procura mandar para a ULM, a gente aqui
tem um, de certa forma consegue. Já se conseguiu instrumentos pra quem não pode comprar,
porque a gente trabalha numa faixa muitas vezes de muita baixa renda, é complicado isso. Mas eu
não vejo tanta desvantagem assim. Acho bem legal.
7. Carmen, você atua com ensino coletivo aqui no Projeto Guri, só aqui você atua?
É, só aqui no Projeto Guri.
8. E a carga horária aqui? Como é que é dividida as aulas? São duas vezes por semana? Qual
é a carga horária semanal?
Todo pólo que eu trabalhei são dois dias por semana, cada turma mais ou menos uma hora e meia.
Tem lugares que a gente tem instituições que dão problema do ajuste interno com os horários deles,
tem alguns projetos que a gente tem aula de uma hora e quinze, né. Mas em geral é uma hora e
meia semanal só e tem sempre um ensaio de Orquestra, que a gente chama, que trabalha mais uma
hora, uma hora e meia dependendo do pólo.
9. E Carmen sobre as turmas, geralmente, qual que é o número de alunos? A quantidade de
alunos por turma depende de cada pólo, da procura, mas geralmente qual é a quantidade?
O padrão é de uns quatorze violinos, três violas, três cellos e um contrabaixo. Têm pólo que não
tem contrabaixo ainda, porque tem crianças muito pequenas. O pólo que eu trabalho lá na Casa da
Solidariedade foi um pólo que tinha muitas crianças e eu tinha mais crianças na sala, não é. Quando
eu juntava as minhas turmas eu tinha uns vinte e três violinos mais ou menos lá. O ensaio da
Orquestra seria maior né. Mas normalmente é isso, quatorze violinos, três violas...
10. E sobre as pesquisas? Você disse que leu a dissertação do Enaldo, né? Além da pesquisa
do Enaldo, você conhece outra pesquisa que trata do ensino coletivo?
Eu li alguns artigos né. Mas não peguei.
Tem a do Galindo também.
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Do Galindo eu não li ainda.


Que é adotado aqui.
Do Galindo também eu só pela instrução dele, eu fiz cursos com ele também né. Mas só na tradição
oral, só nesse sentido aí. Não li ainda, mas eu preciso ler a tese dele.
11. E Carmen, como você o ensino coletivo no futuro? Assim, você acredita que é um campo
que está crescendo e que é importante até mesmo pra democratizar o ensino de música, pra
tirar as crianças da rua como vocês fazem aqui no Guri. Como é que você vê esse campo de
atuação para o professor de música?
Eu tô vendo que tá crescendo sim, né. Mesmo lá em São Caetano, onde eu trabalho, que é uma
fundação, a gente tem adotado esse esquema. Porque a gente tem assim, quatro, três, quatro
professores, e de repente a gente tem uma lista assim de quarenta crianças inscritas pra fazer
violino e você tem duas vagas pra oferecer. Então, em função disso, nós resolvemos trabalhar com
também lá, a classe de cello não tem porque são pequenos, ainda não tem a procura é bem menor,
dá pra gente cobrir ainda. Mas de violinos, que nós temos assim número de procura, a gente acabou
implantando esse esquema de ensino coletivo, né. E daí, vai selecionando naturalmente o pessoal
que vai se desenvolvendo, e que você sente que realmente quer, daí vai distribuindo essas vagas
que estão sobrando. Então, eu acho que o futuro do ensino musical vai ser nessa base mesmo.
Porque essa coisa de você ter um professor pra um aluno é muito cara, não é. Em função, inclusive,
da questão econômica mundial, não é. então, eu acho que o ensino coletivo é uma maneira de você
criar bons ouvintes, você trabalha a audição destas crianças né, e mesmo numa classe muito grande
muita gente não segue, não vai seguir. Então é só (...)
(Interrompendo) faz parte da formação.
Da formação, exatamente. E você cria bons ouvintes né, exigentes também e eu acho que
naturalmente você acaba selecionando e você elimina essa problemática inicial do custo de um
professor pra um aluno, né. Outro dia eu estava conversando com a professora Marília Pilli (?), não
ser se você conhece, ela é da área de História da Música, ela é uma pessoa muito entendida, ela
acha que o futuro mundial do ensino vai ser na base do coletivo. Só uma pessoa muito especial,
inclusive ela acha que esse pessoal que toca em Orquestra vai ser um trabalho mais ou menos
coletivo que vai ser feito. E só esses grandes solistas é que vão sair pro ensino particularizado e
mais refinado, não é, mais burilado, vamos dizer assim. Ela acha que é isso e de certa forma eu
concordo com ela que existe um caminho pra isso aí, né. está sendo adotado no mundo inteiro o
ensino coletivo, ainda que muita gente fale, “Não funciona” (risos). A pessoa que fala que não
funciona, é uma pessoa que nunca viu, nunca ouviu.
Nem testou, nem leu sobre.
É, exatamente.
12. E Carmen, pra finalizar essa nossa pequena entrevista, quais as considerações finais que
você tem a fazer sobre a sua experiência com ensino coletivo mais uma vez e se sugestão pra
gente, pra nossa pesquisa?
Olha foi uma das coisas mais gratificantes que eu fiz na área musical, certo. Eu adoro tocar no meu
quarteto, mas na hora, na área de ensino, isso aí realmente mudou minha cabeça, abriu muito a
minha cabeça. Eu tô adorando o Projeto Guri porque trabalha também esse lado social que eu acho
super importante. Eu tô vendo o benefício que faz pra essas crianças. A única coisa que eu acho
que devia ter, e que se devia começar numa faixa etária menor, fazendo musicalização porque lá na
casa aonde eu pego as crianças, as crianças de sete anos, eles começam com Côro e Flauta. Quando
eles passam por violino, é assim, eles já, quando eles descobrem o esquema, entendem o esquema
do instrumento, eles já começam a transportar tudo que eles aprenderam pro instrumento, então, é
muito legal, muito legal. Então, eu acho que isso faz falta. A gente, acho que poderia ser ainda mais
rápido se por exemplo começasse, depois desse período essas crianças, seria muito mais
interessante. E tivesse uma coisa mais, também concreta, pra continuação do pessoal que cresce
dentro do projeto. Porque às vezes eles ficam meio...
Eles saem com dezoito anos.
Exatamente, eles ficam fora numa época que eles querem tocar.
Querem tocar.
Exatamente.
235

Então tá, Carmen. Muito obrigada pela hospitalidade aqui, eu visitei esse pólo essa semana, e
gostei muito do trabalho de vocês e muito obrigada pelo carinho e atenção. Tá bom?
Muito obrigada você (risos).

Entrevista nº5 : JOSÉ ALÍPIO DE OLIVEIRA MARTINS


Local : Salvador-BA
Data : 27.05.2002
Horário : 13 h

1. Alípio, Boa Tarde! Primeiramente eu gostaria de começar a entrevista perguntando como


se deu seu primeiro contato com a música? Como surgiu o interesse de tocar um
instrumento?
Na verdade eu comecei a tocar, criar interesse em escola mesmo, na escola onde eu estudava. De
primeiro grau né. Então, na 6ª série, mais ou menos, eu conheci um conjunto musical que tinha na
escola, que fazia baile né, e tinha uma banda marcial. Então, as possibilidades eram o quê?
Começar aonde desse oportunidade. Eu comecei tocando percussão na Banda Marcial. Depois
comecei a me interessar por violão, aí fui tocar guitarra nesse conjunto posteriormente. Voltei a
morar no interior, porque minha turma é oriunda do interior, comecei a participar de Bandas,
participando de bandas, não perdi também o contato com o violão. E fiquei tocando trompa,
percussão, bombardino, trombone e retornei a Salvador, fiz um curso de violão, chamado de violão
clássico né, daí então, para me aprofundar mais com a banda voltei para o interior novamente, essa
ida e vinda. Com retorno ao interior, eu mexia já com alguns instrumentos, aí veio aquele papo :
“Ah, você é maestro. Já toca muitos instrumentos” e tal. Aí, eu passei a pensar nisso, né, e já dava
aula e tal no interior. E aí fui fazer universidade de Regência. Fiz o curso de Regência e no meio do
caminho vi que a minha mesmo era trabalhar com a Educação Musical, ensinando música com o
instrumento de banda. Entrei em alguns projetos né, que já desenvolvo aqui em Salvador, e tô
caminhando.
2. Então, como surgiu então, esse interesse pelo ensino coletivo em sopros e em cordas? Foi a
partir desse contato?
Eu acho que na verdade ensinar música é até mais agradável quando a gente tem uma turma mista,
eclética, com vários instrumentos, é mais gostoso para o professor. E quando você já tem essa
habilidade ou você constrói essa habilidade, que você pega a dificuldade de cada instrumento,
começa a buscar caminhos que facilite esse aprendizado, eu acho que aí, a coisa se torna gostosa de
se trabalhar, eu acho que meu interesse maior foi justamente obtendo essa facilidade né, de
contornar, de encontrar uma ponte, entre um instrumento e outro e tal. É uma coisa, no início sem
metodologia, sem nada né, e depois com o conhecimento que existe métodos pra esse trabalho, aí
interesse foi bem maior.
3. E qual, você está falando dos métodos, qual que é o seu referencial teórico? Quais métodos
você utiliza nesse projeto de sopros?
Há cinco anos atrás, eu conheci o método do professor Joel Barbosa, que na verdade é uma Tese de
Doutorado do professor, baseado no que hoje é feito nos Estados Unidos, no Japão, na Alemanha,
em cima do ensino coletivo de bandas. Com a chegada dele aqui a Salvador, eu comecei a
participar de cursos né, que ele promovia e montamos uma banda trabalhando esse método. Mas a
frente um pouquinho, eu montei esse mesmo trabalho, agora já inserido no currículo escolar, na
escola particular aqui em Salvador. Aí comecei a trabalhar esse método. Mas vejo que existia
possibilidades diferentes dentro desse mesmo método e essas possibilidades eram apresentados em
outros métodos e eu comecei trabalhar com um método americano chamado Essencial Elements .
Esse método tem uma questão de intervalos que trabalham alguns instrumentos diferentes do
método do professor Joel. Tipo a trompa começa com uma nota diferente do que é a proposta dele,
mas trabalha todo mundo em uníssono, na verdade, e não é a proposta dele que é em quintas e tal.
4. E Alípio, eu queria saber : além de você trabalhar aqui na Escola Adventista, você atuou
em outros lugares?
236

Eu tô em vários lugares, Graças á Deus. Eu trabalho aqui na Escola Adventista e na Universidade


Adventista no interior da Bahia. Trabalho no projeto com o professor Joel, que já, vamos fazer
cinco anos já juntos, nos Alagados, que é uma região da periferia de s Orquestras Filarmônicas que
a gente segue, pela Bahia toda, promovendo cursos né, reciclando os professores de banda e tal.
5. E a faixa etária trabalhada? Nesses grupos que você trabalha, qual que é a faixa etária?
Aqui na Escola Adventista, nós temos de 5ª ao 1º ano do Ensino Médio, né. Então na 5ª série os
meninos geralmente estão com onze anos. Então vamos botar aí o mais novo, dez anos e dezesseis
anos. No projeto dos Alagados nós começamos com a proposta de dez a quatorze anos. Hoje os
meninos já estão com, os meninos que começaram com quatorze, estão com dezoito, dezenove e
continuam no projeto, aí nós não tiramos do projeto por isso e por aquilo. Então fica em torno de,
vamos pensar assim de onze a dezenove, vinte anos, né. Nesse pessoal todo trabalhado né.
Então você não trabalha ainda com crianças menores de dez? Assim seis, sete, oito aninhos,
né? E não trabalha co a faixa etária mais avançada, mais a juventude né?
Essa turma avançada o trabalho já é com as bandas mesmo, com eu falei, no interior. Já tem suas
bandas montadas, tem até senhores que tocam né. Agora dentro dessa metodologia, dentro desse
processo, inclusive dentro dessa metodologia, o quê que eu tenho visto? A proposta inicial do
professor Joel, de dez a quatorze anos com o método coletivo e ele trabalha canções folclóricas e
tal, canções de várias regiões né. No início praticamente tudo uníssono com intervalo de quintas,
mais pra frente distribui com, o arranjo já com jeito de banda mesmo e no final, tem alguns
arranjos, algumas composições, mas trabalhando basicamente música brasileira. Os meninos de
quatorze anos hoje, não querem mais tocar, né. Então, o que a gente faz? Tem que ou começar
fazendo arranjo, que é muito escasso o material pra banda, pra esse período, essa faixa etária, mas
tem que colocar assim, temas de filmes, o que tá acontecendo no momento, né, o que quê eles
ouvem na televisão, alguma coisinha que sustente essa visão da galera adolescente né. Porque se
ficar tocando Ciranda, Cirandinha, tal, eles não querem mais. E até porque se pegar o método
mesmo, não vai dar mais do que um ano, você pega um método que dá pra fazer em um ano.
6. E a carga horária dessas aulas? Aqui na Escola Adventista é quanto tempo?
Aqui são cinqüenta minutos né. As aulas são germinadas, são juntas né, aí ficam essas duas aulas
juntas, que é um problema também. O menino só teria contato no caso, uma vez por semana com o
instrumento. Eles não levam o instrumento pra casa. Aí eu crio a possibilidade, analiso quem tem
Educação Física no período oposto, ou natação ou outro esporte que eles fazem, combino com os
pais, combino com a coordenação e aí, pego esses meninos pra fazer um trabalho, nem que seja
individual, para eles ter um maior contato. Aqui como eles têm no dia de sexta-feira o período
menor de aulas, as dez e meia às doze horas, ao meio-dia, eu promovo um grande encontro aí, com
os melhores da semana pra fazer o ensaio geral. E a mesma coisa acontece no período da tarde.
Tem que ser uma manobra porque eles não têm instrumentos, a maioria não tem instrumentos, não
pode levar os instrumentos pra casa e tal.
Isso. Então, a escola que cede os instrumentos para eles?
É. Aí tem que ser na escola mesmo. A gente sabendo que um contato só não funciona, não vai ter,
não vai ter, não tem mágica né, aí é preciso promover esses encontros individuais, ou pequenos
grupos né.
7. E Alípio, em relação à, quais a vantagens que você vê do método do ensino coletivo de
instrumento em relação ao ensino individual?
Eu vejo que (interrupção).
Então, quais são as vantagens do ensino coletivo em relação ao ensino individual de
instrumento?
O ensino coletivo entusiasma mais os alunos e até os professores. Vamos supor que você pegue o
pique de trabalhar em grupo né, tem que dominar a classe, aquele papo todo, mas a aula se torna
mais gostosa, pra eles, o aprendizado é isso, pela comparação do aluno que faz, sempre tem alguém
que faz com mais facilidade, o outro já ouve, repete, tem aquela ajuda mútua né. E aí a musiquinha
sai diferente, os instrumentos também participam já na sua independência depois de certo
período,né, na sua função exatamente. A tuba já faz papel de tuba, o trompete é o solista, isso e
aquilo, aí começa esse trabalho é muito gostoso. A vantagem eu vejo é que é um trabalho que
aparentemente confuso, assim pra ser moldado porque você tem que combinar arranjos que facilite
237

no geral né, mas depois a coisa começa se tornar fácil. E não é cansativo como você pegar um
aluno por aluno né, tentar resolver todos os problemas e não dá. Aí resolve um probleminha aqui, o
restante da música vai ser construído, eu acho que eles pegam mais coisas, é muito mais contagioso
né.
8. E você vê alguma desvantagem a princípio, ou não?
É, aí tem que ter alguns critérios a gente tem que estabelecer, principalmente questões técnicas né.
Tem que tá bem atento pra que não, a gente não ache que um probleminha acumulado não possa
trazer milhões de problemas. Tipo postura de como se tocar um instrumento, o professor tem que
estar bem atento. Eu tenho visto alguns professores ligados às bandas no interior que eu ando
dando assessoria, o pessoal vai deixando o trompete mal colocado, a postura dos meninos, o cara
cansa de ficar chamando a atenção, de repente isso vai ficando normal e a pessoa acaba não tendo
êxito futuro no instrumento por causa da observação do mestre da banda, né. Então, o professor
deve estar bem atento, ter critério mesmo, estar seguro, da técnica de cada instrumento, pra não dar
bobeira, né. Eu vejo que às vezes individual, a pessoa pára mais pra observar o aluno, e não deve
esquecer desse ponto.
9. E aqui na sua aula de sopros, quais instrumentos que você utiliza?
Nós temos uma banda completa né. Temos flauta, oboé, fagote, todos os saxofones, o alto, o tenor,
o barítono, depois temos os trompetes, trompas, trompa profissional, trompa em fá. Os
instrumentos aqui, graças a Deus, são todos bons, instrumentos importados de alta qualidade né.
Temos bombardino, trompas como eu falei, bombardino, tuba, clarinetas, clarineta alto que é um
instrumento raro, clarone, tudo aqui, a banda sinfônica.
A banda completa.
A banda completa. Percussão e tudo.
10. E você tinha me dito que nessas andanças que você tem feito, como é que você acha que
está à questão do ensino coletivo em Educação Musical? Você tem percebido, como você tem
percebido essa área na Educação Musical?
Ainda em relação á?
Ao ensino coletivo de banda, de instrumentos? Você falou que tem andado pelo interior da
Bahia, por São Paulo até o Pará, né, e como você tem visto a atividade do ensino coletivo de
instrumentos?
O que eu tenho observado é o seguinte : ninguém está fazendo, ainda não vi, ainda se está
construindo este pensamento, né. Eu vejo pessoas juntarem meninos, tentarem montar banda e tal, a
proposta de tocar repertório.
Mas não tem uma metodologia ainda específica?
Não tem. E eu acho também que o pessoal não tá preocupado com isso. O que se tem feito, o
pessoal nunca consegue isso dentro desses projetos, o ensino de instrumentos através da banda e
montar repertório, os professores não tem a preocupação, eu não vejo pelo menos, não tenho visto,
essa preocupação, primeiro, desse acompanhamento técnico preciso e estar integrado a questão
musical mesmo, de trabalhar música, no fazer musical né. não só tocar repertório, né. E outro
ponto, essa inclusão como nós fizemos aqui da banda de música, da orquestra dentro do currículo
escolar, como proposta mesmo, que é avaliada, tem prova, tem programa né, que acompanha todo o
processo da escola normal, é uma disciplina que o aluno tem que cumprir a carga horária, que
como eu falei a pouco, tem a semana da prova, tem as apresentações da escola, tem as
apresentações das avaliações, eu não tenho visto isso. Eu tenho visto um pessoal que quer formar
um grupo de pessoas que tocam, pra ensinar instrumento através da, eu não vejo a preocupação da
Educação Musical, de todo o contexto, né, de toda a vivência, dos compositores, de fazer música,
de compor, de improvisar, eu não vejo, isso nós fazemos aqui. Temos a proposta até esse ano da
gravação de um CD, que tá muito fácil de hoje gravar, num pequeno estúdio aí, nós já promovemos
isso aí, armamos quem é o diretor musical da turma, os compositores já estão escrevendo as
músicas, aí vamos promover um festival através desse festival, fazer a seleção dos temas, trabalhar
quem vai ser os arranjadores né. Busca a fonte normal, como se diz, nessa produção.
11. E além do trabalho que você citou do professor Joel Barbosa, você conhece outros
trabalhos acadêmicos em relação ao ensino coletivo? Ai no caso, de sopros ou de outros
instrumentos?
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Eu tenho um método que trouxe agora do Pará, não tô lembrado, posso ver aqui o nome do autor,
pra cordas, pra sopro não conheço ninguém que eu vejo assim, como o professor Joel né. Eu
também já ouvi falar de outros de cordas né, mas de sopros não conheço.
12. E Alípio, em relação à questão social do ensino coletivo, como é que você vê esse lado?
Você enxerga aqui no seu grupo fatores que vão além da música?
Sem dúvida, na própria escola a gente sempre é solicita na coordenação, pela direção, pra atender
aquele aluno que tá um pouco indisciplinado, parece que não que nada nas outras disciplinas, talvez
se você dá uma força pra ele, vê se abre o caminho dele ou fica mais feliz, né, com a banda de
música. A gente sabe que a música não dá pra curar todos os problemas né, mas pelo entusiasmo,
por ser a banda é uma aula prática né, que tem instrumento ali, o aluno pega o instrumento, faz a
coisa viva né, então, eu, sempre dá resultado, sempre tem um aluno que é disperso e acaba se
entrosando ali, ele também não quer ficar por baixo, né, que ele é tido como indisciplinado, (?)
então ele quer mostrar também o potencial e acaba, eu tenho um bando de exemplo disso aí. Agora,
fora de escola o pessoal sempre pega, querendo colocar até palavras pra gente dizer : “A música
tira as crianças das drogas” e tal. Eu acho que a música pra ter essa função, teria que ter um
trabalho voltado pra essa coisa, talvez a criança ocupada com música não tenha a mesma
possibilidade de ficar vulnerável as drogas, mas tirar da marginalidade, e tirar das drogas, aí é outra
conversa, tinha que ser um outro método específico, que eu não conheço, né, e que ocupa. Os
meninos dos Alagados por exemplo, essa região periférica aqui em Salvador, eles tem hoje, eles
são o xodó do bairro, já gravaram disco e a mãe vem com o orgulho, o pai, ás vezes, cachaceiro e
tudo mais, mas chega feliz, “Meu filho toca na banda!” . Então, eles são vistos hoje com outros
olhos, e eles também tinham aquela coisa de dizer “Não, eu vou ser música profissional”, nós
temos lá, quatro agora, tocando profissionalmente, que comprou o telefone da mãe, né, deu um
presente pro pai através da música, estão querendo fazer vestibular pra música. Mas que eu não
vejo essa coisa toda desse trabalho, dizer que vai tirar, ou está tirando, talvez não tenha, não esteja
oportunizando o uso de drogas ou a marginalidade. Acho que tinha de ser outro trabalho.
13. Então, pra finalizar, você tem alguma sugestão, alguma consideração final a fazer em
relação ao ensino coletivo em música? Alguma consideração final?
O que eu acho é que a coisa tá cada dia mais, tá crescendo né. Quando surgiu o ensino coletivo em
outros países como citei, Alemanha, Estados Unidos, Japão, era a proposta de baratear custos. Nós
vivemos num país em que as oportunidades são pouquíssimas. Hoje a gente sabe que a
universidade, se a universidade tivesse uma proposta de criar educandos né, educadores pra
trabalhar esse pessoal todo que a gente pode, essa massa toda que são escolas públicas, escolas
particulares, não ia ter profissional, a gente sabe que não. E se fosse pra trabalhar individualmente
ainda é pior. Nós temos um mercado, a música tem mercado demais. Se todo mundo se interessasse
por música não tinha professor. Então, o que acontece, pra baratear o custo a Alemanha pensou
assim depois da Segunda Guerra, nós precisamos colocar aí, ativa nossas orquestras e precisamos
de um método que em pouco tempo tem um bom resultado. Não podemos, não temos dinheiro pra
pagar a cada professor pra atender um e um aluno, né. Vamos pensar coletivamente. Eu acho que é
uma grande saída. Agora o professor, ele deve estar atento essas questões né, os futuros
profissionais que tem esse mercado, um mercado muito gostoso de se trabalhar, ninguém tenha
dúvida, você começa a fazer música mesmo, e todo dia tem, enfrenta barreiras pra você transpor, eu
acho que as pessoas devem ficar cada dia mais estimuladas. Aumentar mais o seu, abrir mais seu
leque de conhecimento instrumental né, e partir para uma proposta dessa que oportuniza em pouco
tempo milhares de pessoas a tocar instrumento.
Então Alípio eu quero agradecer imensamente a atenção e espero revê-lo em breve, tá bom.
Muito Obrigada.
Tá bom. A você também muito obrigado, apareça sempre.

Entrevista nº6 : MARCOS ANTÔNIO DE OLIVEIRA ROCHA


Local : Salvador-BA
Data : 27.05.2002
Horário : 14 h
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1. Marcos, a princípio eu gostaria de saber como se deu seu primeiro contato com a música ?
Eu nasci numa família em que desde pequenininho todos cantam na minha casa, a gente ia igreja
cedo e cantava na classe das crianças, às vezes cantava na frente da Igreja. Meus irmãos mais
velhos, também cantavam e transmitiam pra nós algum, algum toque sobre música né, educação
musical, educação vocal também,e isso era muito interessante pra nós também, para o nosso
crescimento. A partir daí, a gente foi crescendo né, e começamos a ter contato também com a
música instrumental, os irmãos meus tocavam violão, o mais velho já tocava clarinete e sax, e
realmente esse já, já tinha um conhecimento mais profundo em música foi que começou a me
instruir no conhecimento da música e também no, na execução de um instrumento musical, que
meu primeiro instrumento foi sax, né. Quer dizer, o primeiro foi flauta doce né, mas com ele foi
saxofone e a partir daí eu comecei a conhecer também novos instrumentos até chegar no que eu
toco hoje, que é violino.
2. Qual é a sua formação musical ? Você chegou a fazer faculdade? Qual é a sua formação?
Olha, eu ainda faço faculdade, mas estou praticamente formado, né, já faz seis anos que em curso o
curso de Violino na UFBA. Antes eu tinha entrado como Licenciatura, mas depois eu já tocava
violino, ai depois eu pedi a transferência, passei pra violino e agora eu posso me formar
normalmente o ano que vem eu estou formado né.
3. E como se deu o seu interesse pelo ensino coletivo em Cordas? Como você se interessou em
trabalhar pelo ensino coletivo?
Eu já trabalhei a, eu trabalho há muito tempo né, coletivamente. Aqui na escola tem só três anos,
mas na igreja que eu dou aula, eu sempre trabalhei, faz mais de oito anos que eu dou aula na igreja
e lá o ensino é mais coletivo, né. Eu comecei a trabalhar mesmo com todos instrumentos, de
cordas, de sopros né, ensino assim em conjunto. Já aqui na escola, só dava aula particular,
individual, até que surgiu esse projeto do professor Alípio de trabalhar em grupo, montar uma
Orquestra e uma Banda. Aí como eu era professor aqui, ele me incentivou a trabalhar, a ajudá-lo, e
já trabalhava com isso. E estava empolgado, já fazia curso do Método Suzuki e trabalhava
coletivamente, nunca tive a oportunidade de trabalhar com o Método Suzuki coletivamente, mas
sempre tive vontade né, também por um motivo de experiência né, pra ter um conhecimento. E foi
interessante pra mim, e tô gostando né, é muito bom, legal mesmo. Você vê o crescimento dos
alunos, um ajuda o outro, apóia o outro, eles se apóiam, assim vai tendo aquele joguinho né? Muito
interessante pros alunos.
4. E qual é o método que você utiliza ou quais são os métodos que você utiliza nessas aulas
coletivas?
Olha, estamos utilizando um método americano, não sei, esqueci o nome dele agora, um método
americano que antes a gente começava já com esse método que ele começa primeiro com leitura de
cifras né, corda ré D, corda mi E, depois que o aluno começa a ler notas musicais na pauta, na
música. Só que esse ano eu fiz diferente, o grupinho aqui começou novo, eu estou trabalhando
como se fosse método Suzuki, por meio de transmissão oral, que são sempre as primeiras músicas
do Suzuki pra eles aprenderem primeiro a tocar, sem ler partitura né, pra eles terem condições de
estar apenas ligado no que eles estão fazendo com o violino né. Isso vai dar até mais facilidade pra
eles assimilarem o aprendizado e desenvolver mais rápido e depois quando eles já tiverem tocando
umas duas músicas, aí a gente começa a trabalhar a leitura de notas.
5. E nessas turmas você tem os quatro instrumentos de cordas friccionadas? Você tem violino,
viola, cello e o baixo?
Não temos nenhuma, mas temos aqui os quatro instrumentos.
E os alunos? Eles têm os instrumentos ou eles utilizam os instrumentos da escola?
Aqui na escola, a gente faz milagre. Os alunos, quero dizer, os alunos é que fazem milagres porque
alguns, talvez dois por cento dos alunos têm o instrumento em casa né. O violino que é mais barato,
né, e os pais compram pra eles estudarem, o restante não tem instrumento, então, quando eles
podem, eles vêm na escola praticar. Mas o que a gente, o que eu falo que eles fazem milagre é que,
que eles fazem mais é na hora. Muitas vezes o aluno fica uma semana sem pegar no instrumento,
vai pegar na aula né. Tenho que lembrar tudo que passou na outra aula, revisar, depois dar
continuação ao trabalho. Por isso que é um milagre estar fazendo isso né.
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6. E você inicia desde com o arco, através do arco ou você, como é que você inicia as crianças
coletivamente ?
Sim através do arco.
Cordas soltas?
Cordas Soltas, cordas soltas, entendeu? Eu faço mais pra eles fazer um acompanhamento quando
eles tocavam em grupos, ás vezes, eu toco no piano uma música e eles fazem mais
acompanhamento com cordas soltas, entendeu? Isso também pra eles perceberem o que eles estão
fazendo na música, isso pra mim vai educando o ouvido deles.
7. E quais são as vantagens que você vê do ensino coletivo em relação ao ensino individual de
instrumento?
Bom, o ensino coletivo é o ensino que não deixa o aluno desanimar né. Quando o aluno tá
precisando de um, de um, tá meio assim, vê o colega tocando ele anima né, quer fazer o mesmo né.
E ás vezes eu, um ajuda o outro né, a entender, um está ajudando o outro a produzir, a crescer em
muito pouco tempo. Individual também tema suas vantagens né, apesar de ser melhor porque está
direcionado a uma pessoa só né. Então tem como você corrigir defeitos, mas você precisa estar com
um, só que individual ele está aí sozinho, não tem um conjunto de colegas pra ele se apoiar, ajudá-
los até na própria afinação né. Quando eles tiverem tocando um instrumento, a afinação dele já
muda e seria interessante né.
8. E você vê alguma desvantagem no ensino coletivo?
Não, não vejo desvantagem. Não vejo desvantagem nenhuma. Aliás, eu acho é que muito
vantajoso. Tanto pra quem ensina, que tem um conjunto de alunos e o tempo dele vai ser realmente
praquele grupo todo, distribuído praquele grupo quanto também pros alunos, entendeu? É tanta
gente pros alunos ganhando e é animado também. Mais animado que a pessoa tocar sozinho, aqui,
a pessoa tem vergonha né, de ter aula sozinho, assim, isso afeta até a sua produção. Em conjunto
não, o aluno se solta, quer tocar mesmo, quer fazer música. É interessante, é animador.
9. E qual que é a carga horária aqui da escola? Quantas aulas por semana e quantas horas
por dia eles têm?
Os alunos têm, a gente trabalha aqui na escola com os alunos da quinta ao básico, ao primeiro ano
né, chamado básico. A quinta série, a sétima, a quinta, a sexta, a sétima, a quinta, sexta, a sétima e
a oitava tem duas aulas semanais né, que são aulas seguidas né, não são separadas, são todas no
mesmo dia têm as duas aulas. Somente o básico, ou os básicos que são dois, que tem uma aula
apenas semanal. Só vem naquela aula e depois espera a outra aula.
10. Então a faixa etária trabalhada é entre dez e dezesseis anos, mais ou menos? Qual que é a
faixa etária?
É, a faixa etária é, aqui é assim, o mínimo é nove anos, nove a dezessete anos, alguns alunos ás
vezes passam, tem dezessete. Tem aluno que é novinho né, que tem até oito anos e já,
pequenininho é sério e já está estudando violino.
11. E Marcos, eu queria saber o seguinte : em sua opinião, você acredita que o ensino coletivo
em música, em instrumentos em específico, vem crescendo? Como é que está a pesquisa em
Educação Musical? Você sabe se tem pessoas trabalham com o ensino coletivo na Bahia ou
em outros lugares? Você sabe de pesquisas?
Na Bahia eu sei. Em Salvador, eu trabalho né. Tem uma escola também que trabalha é a EMIM (?),
que trabalha sobre, investe em métodos, que trabalha sobre, investe no método Suzuki, trabalha
com o método Suzuki. E tem um projeto também, interessante até, um projeto na periferia, aula
coletiva né. Tá crescendo, esse projeto começou esse ano né, lá na periferia, trabalha com mais de
cem alunos o ensino coletivo. E tá crescendo. Aqui em Salvador, pelo menos já é o segundo projeto
que apareceu a respeito do ensino coletivo. Na Bahia em geral não sei, o trabalho aqui está muito
atrasado nesse, no âmbito da música instrumental, especialmente de cordas.
E pesquisa? você sabe de alguma pesquisa em nível de mestrado ou doutorado, de pós-
graduação aqui na Bahia ou em outro lugar?
Não, não.
Em Cordas não?
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Em Cordas não. Na verdade, em nenhuma área né, ainda não sei. È interessante até que depois eu
tenho que pesquisar mesmo, até mesmo pra aprofundar o meu conhecimento, eu quero fazer pós-
graduação em música.
12. E você falou que o seu suporte teórico é o Suzuki e tem outros métodos americanos?
É, eu uso um americano, só que também tem muita coisa que eu tenho que fazer né. Porque ás
vezes eu preciso de certos, dependendo do grupo, né, isso varia muito. Ás vezes eu vejo que esse
estão necessitando de certos exercícios né, exercícios de técnica, exercícios de arco, então, eu
mesmo é que tenho que fazer. Porque também a gente só tem um método americano e algumas
músicas. Algumas músicas já até avançadas, entendeu. Então, pra você equilibrar tudo, você tem
que fazer isso. Você mesmo criar alguma atividade pra que eles possam desenvolver até chegar
naquele ponto de tocar aquela música, entendeu?
13. E há quanto tempo você atua no ensino coletivo? Você falou que atua aqui e em outra
escola, em outros projetos. E faz quanto tempo mais ou menos que você está atuando no
ensino coletivo?
Já tens uns, já tem uns oito anos. Oito anos que eu trabalho nessa área.
14. E pra finalizar, você tem alguma consideração final a fazer sobre o ensino coletivo,
alguma coisa que você ache interessante de colocar? Alguma consideração final?
Eu, eu ainda tô pensando né. Espero que surja daqui pra frente pelo menos um ensino coletivo pra
orquestra, pra orquestra toda né. Quer dizer, uma orquestra de cordas e de sopros. Porque pra
conciliar esses dois é um pouco complicado. De sopro tem instrumentos transpositórios né. A
orquestra você só vai tocar por enquanto, no início, com tonalidades de Re e de Sol e de Lá , são
quatro né. Pra conciliar os dois fica muito difícil. Sopros se for transpor, vai ficar com muito
sustenido, mas estou esperando isso acontecer né.
Ou você tem que se animar a fazer um , desenvolver um método próprio.
Eu também penso em desenvolver eu só preciso ter tempo pra pensar. Pensar e depois também por
em prática. Eu acho que vai ser muito bom porque aí vai ter como trabalhar os dois juntos. Apesar
de que sopros o desenvolvimento é bem mais rápido do que com cordas, mas aí a gente vai vendo
depois o que pode surgir. Tudo é uma questão de experiência, e aprendizagem, vai crescendo junto.
Então Marcos, muito obrigada pela entrevista e espero que a gente mantenha esse contato. Tá
bom?
Obrigado!

Entrevista nº7 : ANA CRISTINA TOURINHO


Local : Salvador-BA
Data : 30.05.2002
Horário : 11 h

1.Bom dia, Cristina!


Bom dia!
Primeiramente eu gostaria de saber como se deu seu primeiro contato com a música?
Eu comecei a tocar violão, eu tinha 11 anos de idade. Comecei a tocar de ouvido com o filho de
uma amiga do meu pai. E eu toquei mais ou menos durante uns dois anos de ouvido. Depois meu
pai decidiu que era melhor eu fosse aprender música. E depois de alguma relutância, porque eu, eu
não sabia bem o quê queria né, eu fui com ele numa escola, que era o Instituto de Música da
Universidade Católica de Salvador, e ele me apresentou a diretora, que era amiga dele. Então, ela
me levou lá pro professor de violão, e foi aí que eu conheci o professor Josimar Assis. Eu estava
com treze anos e ele foi meu primeiro professor de violão. Daí eu fiquei, estudei oito anos no
Instituto de Música e saí de lá graduada em professora de violão. Depois eu, e durante esse tempo,
que foi que eu fiz? Eu não só aprendi a ler, mas como Josimar tinha uma grande, ele tocava muito
chorinho, muito acompanhamento, então, ele de uma certa forma eu continuei tocando música
popular. Foi assim que eu comecei.
2. E qual foi a sua formação posterior? Qual foi a sua formação musical?
Olha, eu acabei o curso de graduação em, eu fiquei como professora de violão pelo Instituto de
Música da Universidade Católica de Salvador em 1975. Depois de, em 76, eu prestei vestibular pra
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Universidade Federal da Bahia, fiz outra graduação, dessa vez meu diploma foi como
instrumentista. Foi já de, foi em 1982 que eu conclui meu curso. Eu fiquei de 82 a 90 só
trabalhando e ensinando e fazendo curso, me aperfeiçoando, mas em 90 eu entrei no mestrado, e
em 97 eu entrei no doutorado e acabei em 2001.
3. E como surgiu o interesse em ensino coletivo em música? No caso, em violão?
Foi engraçado porque nós éramos, eu era professora de música da Escola de Música da
Universidade Federal da Bahia, desde 82. Foi engraçado porque eu entrei pra ser professora seis
meses antes de concluir a minha graduação na própria escola, eu entrei com o diploma da
Universidade Católica né. Fiz concurso, passei e a gente, nós éramos na época dois, três
professores de violão, e a demanda era muito grande, a procura pelo curso de violão era muito
grande. Então, o que acontecia, pra você entrar na escola de música, na extensão da escola, né, no
que o pessoal chamava do curso preparatório, você precisava ler música e não tinha escola de
música em Salvador. Então, era uma inconsistência né, você exigir que a pessoa soubesse música
se ela não tinha uma escola pra ela se preparar antes. Então se escreviam tipo duzentos candidatos e
entravam dez, doze porque era a carga que sobrava pra gente pra atender a extensão, porque a gente
também atendia na época só tinha a graduação, só atendia a graduação. Então foi vendo assim, de
que eu, eu também me sentia perdendo tempo no início porque eu ficava repetindo a mesma coisa
pra uma porção de gente, e depois percebendo também que aquele teste que a gente fazia pro
ingresso era um teste que não era verdadeiro. Porque num contato de dez, quinze minutos você não
pode avaliar muito à pessoa. Então, eu ás vezes me sentia perdendo tempo, né. E quando chegou
em 89, o diretor da Escola de Música, na época Paulo Costa Lima, Paulo me propôs fazer aula de
grupo. A gente conversou num dia informalmente, ele falou : “Porque você não faz?”, eu disse :
“Paulo, eu não sei porque eu me sinto ... é como se eu tivesse (como é que eu digo) enganando os
outros, eu não sei se vai dar certo, eu fico com medo”. Ele disse : “Faça a experiência! Pegue, por
exemplo, quem você não admitiu e faça um grupo”. Aí a minha experiência foi essa. Eu peguei um
galpão enorme, e comecei a trabalhar, acho que trinta pessoas de uma vez só. Bom, não deu certo.
Não deu certo em termos. Porque eu vi por exemplo assim, poderia dar certo, mas não era com essa
quantidade de pessoas que ia funcionar. Então, de trinta eu baixei pra três turmas de dez. Depois
três turmas de dez, eu peguei fiz turmas de quatro alunos. Aí, eu comecei, né. E foi assim, foi numa
coisa assim, que eu fiquei observando, fui observar também na época, já existia as aulas de piano
em grupo na escola, que a professora Alda Oliveira dava, que ela chamava do IMIT - Iniciação
Musical com Iniciação ao Teclado. E eu observando as aulas de Alda, eu comecei a ver a
metodologia. Como eu sempre me interessei por ensinar, o que aconteceu, eu de repente me vi,
pensando em como que eu poderia fazer aquilo pras pessoas. E aí foi uma seqüência natural assim,
sabe? De, como que eu digo, olhar outros instrumentos, no caso violino também, que estava assim,
tinha uma escola boa de instrumento em grupo por causa do Suzuki, de ver as experiências da
escola de começar a ler e tentar ver como eu poderia fazer com o mesmo material, a metodologia
pro trabalho em grupo. Foi assim.
4. E nessa sua experiência de muitos anos já, com o ensino coletivo, quais são as vantagens
que você enxerga em relação a aula individual de instrumento? E se você enxerga alguma
desvantagem?
Olha, tem coisas que funcionam na aula de grupo que não funcionam na aula individual e ao
contrário, não enxergo exatamente nem vantagem, nem desvantagem. Tem coisas que funcionam
e tem coisas que não funcionam. A desvantagem é que se você não preparar o professor pra ele
trabalhar em grupo, ele vai tornar a aula, a aula não vai funcionar, entende? E se você preparar o
professor, a aula vai funcionar, mas ela vai funcionar de maneira diferente. Então, primeira coisa
que eu acho, olhando a parte, digamos assim, de economia de tempo. Você gasta menos tempo pra
poder fazer o mesmo trabalho, né. E se você for pensar, ainda, não é o meu caso, porque eu
trabalho na universidade, eu não ganho por hora de aula, mas eu sempre falo quando estou dando
algum curso, que eu digo : “Gente, se vocês quiserem, é uma maneira também de ganhar um pouco
mais de dinheiro”, né, tem o fator econômico também. Agora, as vantagens pedagógicas, que eu
considero são inúmeras, né. Como você poder, por exemplo, oferecer pra um iniciante parâmetros
muito mais facilmente, né. A pessoa que começa, ela tem do lado um, espelhos como chamam, né.
Então, tem pessoas que estão com as mesmas dificuldades que ela, ou com um pouco mais, ou com
243

um pouco menos, mas naquele mesmo nível de aprendizagem, diferente da aula individual, onde
você tem um professor que é mais um modelo que você segue. Eu aprendi muito com os meus
alunos quando eles chegavam pra mim e eu, eles faziam alguma coisa, e eles : “Olha, veja isso
aqui! Isso aqui é fácil. Não isso aqui não é fácil. É fácil só pra quem sabe”, não é? E foi, as
vantagens pra mim, basicamente assim, eram essas, que você permite que as pessoas avancem mais
rapidamente e depois você pode também deixar essa pessoa mais desinibida. É uma coisa assim,
que é gritante. Os alunos de grupo, eles pra tocar, eles se sentem melhor, mais a vontade do que um
aluno que tem aula sozinho. E eu acho que de uma certa forma, eles avançam mais rapidamente. Se
a gente começa uma Oficina com quatro pessoas que não tocam o instrumento, tem mais ou menos
a mesma faixa etária, isso é importante também fazer a seleção bem né, porque se você não, não é
você juntar quatro pessoas quaisquer, mas saber primeiro, eu acho que é a faixa etária é importante
né, e depois a habilidade, toca ou não toca, e depois a um outro nível que é possível realmente hoje
já encontrar, se a pessoa lê música ou não lê música, que aí a abordagem é diferente né. Então, se a
gente junta essas quatro pessoas, em três meses de aula, com quinze aulas você vê que você já
diferencia muito. A gente lá na escola, geralmente tem várias turmas de iniciação no mesmo dia e
horário trabalhando em salas simultâneas, por quê? Porque depois do primeiro semestre, eu
reagrupo essas turmas, ou mesmo durante o primeiro semestre, a gente troca às pessoas de nível,
porque aquela pessoa que a gente não detecta, digamos assim, nenhum, nenhuma habilidade
especial naquele primeiro contato, que era com se fosse o teste seletivo, você vê aquela pessoa se
revelar e progredir de uma maneira que você nunca esperava ao passo que aquela que você
depositava mais esperança, né, estou falando em termos antigos, da antiga concepção, aquela
pessoa fica lá, estacionada né. Então, é imprevisível realmente. Eu tô, eu sempre tô tendo surpresas
com os alunos.
5. E Cristina,eu queria que você descrevesse a sua atividade pedagógica? Então, desde
quando começou essa, as oficinas de ensino coletivo em violão, como foi a trajetória em
termos de quantidade alunos, né? No início, qual que era o seu referencial teórico, o quê você,
qual metodologia você se espelhou, em quais autores, em quais pessoas você se espelhou pra
montar esse programa? Como é que era, como é que foi essa trajetória?
Olha, a primeira experiência foi com aquele grupão doa trinta alunos né. Aliás eu tinha tido uma
experiência antes, anterior, que eu não fiz na escola, eu fiz, na época eu trabalhava na Fundação
Cultural do Estado, então eu fiz um turma, eu posso até te dar esse relatório por escrito, porque esse
relatório espelha bem o que foi na época, né. Eu acho assim, quanto mais inexperiente você é, mas
você perde aluno entre aspas. Com experiência agora, eu já tive semestre em que eu não tive
nenhuma desistência, eu tinha assim, tipo assim, cinco ou seis turmas eu dando aula, e ninguém
desistia, ninguém ia embora, a não ser claro, aquelas coisas que você não controla, o cara muda de
cidade, vai transferido, e essas coisas, a mãe morre alguma coisa assim né. Então, né, só, aonde eu
tava mesmo? Sim. Como foi? Então, tinha um grupão, né, o grupão não funcionava então eu me
desgastava muito. Depois eu reduzi pra dez e eu vi que eu podia fazer com dez pessoas, desde que
eu não quisesse que essas pessoas lessem música, se eles pudessem fazer música popular,
funcionava bem legal, só música popular e foi o quê eu fiz durante uns cinco a seis anos na
Fundação Cultural, no “Projeto Viver com Arte”, foi o que eu fiz. Depois na escola, eu disse,
quatro é bom, por que eu digo quatro é bom? Porque o círculo você armando, você trabalhando em
grupo em círculo, todo mundo se vê, fica junto o suficiente né, pra você poder consertar um aluno,
interagir com ele, por uma questão de olhar, de contato e tudo. Porque a gente trabalha muita coisa
também, com co-repetição, por imitação, então, quatro são dois a dois, quatro também são dois a
dois mesmo se um falta e quatro são, é um a um, se dois faltam. Então, eu acho que quatro, esse
número é bom por isso, né. Depois a gente trabalhou com uma hora de violão prática por semana,
que eu continuo achando até hoje achando pouco. Mas pra gente. Continuar cobrando um preço
acessível, tem que ser esse preço infelizmente. O ideal é que fosse duas vezes por semana, mas a
gente nunca conseguiu fazer, principalmente logo no início. Onde a pessoa, o professor tem que se
assegurar que a pessoa entendeu aquilo que ele tá querendo, então ele vai levar uma semana
estudando errado, né. Foi outra coisa que eu aprendi também com o tempo, o importante na aula é
deixar que o cara entenda exatamente o que ele tem que cumprir pra próxima. Se ele souber o que
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ele vai ter que fazer pra próxima, aí você ganhou a aula. E não deixar com que ele saia da aula sem
saber o que ele tem que fazer.
6. E em relação ao referencial teórico? Você tinha alguma pessoa em que você se espelhava ou
algum autor? Como é que foi a construção desse...
(Interrompendo) É, porque olha, eu comecei em 89 na Fundação Cultural e 90 eu entrei para o
mestrado. O mestrado foi uma experiência muito rica pra mim porque eu entrei num outro mundo
onde eu comecei realmente a ler em outras línguas alguma bibliografia que eu não tinha acesso
antes, e eu tenho a agradecer muito a professora Alda Oliveira porque ela realmente me abriu as
portas pra essa coisa de você saber que não sabe tudo e procurar saber sempre mais do que você tá
sabendo hoje, né. E, aí foi realmente uma busca, eu li muito sobre pedagogia em geral, não
pedagogia de música, mas pedagogia geral, sabe? De trabalho, como se portar em classe, atitude
em classe, eu mudei muito a minha atitude em classe, sabe? No sentido de que eu passei a situar os
alunos sempre nas coisas que eles estavam fazendo, eu não fazia isso anteriormente, entende? E no
grupo, quando você trabalha com o grupo, é importante você dizer se o cara acertou ou se o cara
errou, ou como ele pode fazer para melhorar instantaneamente, né, naquilo que você chama de
correção imediata, o quê a pessoa fez errado você vai e corrige imediatamente, não deixa ele ficar
fazendo o que não devem né. Depois o quê aconteceu? Eu comecei a ler muito. Eu não sei, eu
poderia, a bibliografia é tão grande.
Mais na área de psicologia e pedagogia ?
Psicologia e pedagogia, e depois, jogo. A parte de esporte. Toda aquela parte que trabalha com
interatividade, com troca. Depois eu comecei fazer a coisa com jogos, quer dizer como se fosse,
não é uma, não é uma competição, mas é um jogo realmente, sabe? Você pode acertar ou pode
errar, pode ficar fora. Não nesse sentido de.
Competitividade.
É, no sentido ruim não, mas na parte positivo dessa coisa, sabe? Aí eu li também muita coisa de
esporte, porque as pessoas de esporte têm esse negócio de fazer a equipe, de fazer o grupo não é?
E foi, deixe-me ver, nos últimos cinco anos, olha, eu li bastante sobre, sobre psicologia da
educação e na parte de música, no doutorado agora, eu trabalhei em cima do referencial teórico do
Swanick. Eu acho que ele foi muito feliz quando ele incorporou no que fosse uma aula de música,
as atividades de tocar né. A atividade de você, você toca, mas escuta, você improvisa, você lê
sobre, né, e você cria né. Então, ele foi muito, então eu procurei fazer as aulas realmente de
maneira que elas fossem umas aulas muito dinâmicas e organizadas, né. Agora de uma maneira
geral assim, pedagogia instrumental eu li, sem restrição, muita coisa. Mesmo as coisas antigas que,
sabe? Vai lá pra Sá Pereira e tem as coisas de, e piano também. Piano, o pessoal tem uma escola
organizada né. Maria Lurdes de Junqueira Gonçalves, Maria Isabel Montandon, a própria Alda
mesmo, numa maneira muito prática, porque se Alda não escreveu nada sobre isso, o livrinho dela
“O tempo de tocar” tá até hoje aí sem edição, mas eu tive a oportunidade de convivendo com ela,
vê muita prática né. Eu conversei também, vi muitas coisas com Diana Santiago, foram às pessoas
mais próximas assim.
7. E atualmente, como é que está sendo desenvolvido o ensino coletivo das Oficinas da
Universidade da Bahia? Qual que é a carga horária? Como é que funciona? Agora é uma
hora por semana com quatro alunos?
Isso.
Como é que é ?
Olha a gente tem trabalhado assim, com pessoas da graduação depois de apanhar muito, nossos
melhores estagiários pra trabalho realmente são os estagiários da graduação de violão. Então, esse
pessoal tem no máximo quatro horas de aulas por semana, porque permite pra a eles também não
se sobrecarregarem com a atividade de dar aula. Porque você precisar estar pronto na aula pra estar
sempre né. Então, eles trabalham uma hora por semana como aluna, ela vem tem uma aula de
instrumento, depois ele tem uma hora de Teoria Musical, quer dizer, que não é verdade, não é bem
Teoria Musical, seria leitura e percepção musical né, que a gente chamava antigamente de Teoria.
Então, ele vem pra essa aula também e se ele quer, ele pode participar também do coral da escola.
A escola tem um Coral Infantil, um Coral Infanto-Juvenil, Juvenil e Adulto. Tem coral para todas
as idades. Então, na verdade ele tem três horas de música, e ainda tem acesso a biblioteca pra poder
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escutar disco, e a gente comprou, a gente tem assim uns sessenta Cds de, só de violão, sabe? Pro
pessoal escutar. Porque embora eles, você pode dizer : “Não o aluno precisa escutar música”, mas
ele no início, ele tá muito centrado, aquela coisa mesmo do, da fase manipulativa, ele quer
realmente manipular um instrumento, e o repertório que mais interessa pra ele, é o repertório que
diz respeito ao instrumento que ele tá tocando. Então, é isso aí.
8. E a faixa etária trabalhada nessas aulas?
A gente divide por faixa etária mesmo. Tem duas pessoas que trabalham com as crianças, né.
Atualmente, nós só estamos trabalhando com oito crianças na escola, entre oito e onze anos. Essas
meninas têm aulas com outro projeto, que não é oficina, é oficina mas não é oficina, é iniciação
musical com iniciação ao violão. Quer dizer, a gente usa um instrumento como instrumento pra
ensinar música, né. então, elas também tocam um pouco de metalofone, tocam instrumento de
percussão e vão fazer daquela, daquela leitura, gradativa, né. Como se fosse uma iniciação musical,
mas ela já tem o instrumento, né. Não é uma iniciação musical sem instrumento. Aí, a partir da
Oficina de Violão a gente aceita, tem meninos de até doze, mas são exceção. Inclusive, como eles
são menos, as turmas dessas são menores. Nosso público mesmo está entre quinze e dezenove anos.
É a grande né, já que ao todo são cento e vinte alunos. Então, é muita gente. Seriam quase quarenta
turmas, não tem quarenta, são trinta e três turmas, nesse semestre agora, dois mil e dois. E eles tão
divididos em quatro, têm uma hora de aula de violão por semana, e aos poucos a gente tá tentando
fazer um material pra esse trabalho, né. Já tinha um material, mas ele tava muito desorganizado. Eu
agora com o professor Robson Barreto, a gente sentou nesse primeiro semestre, fez um
experimental, é esse que você tá levando, e ele já vai sofrer alteração agora pro segundo semestre.
Quer dizer, você aplica, conversa com o pessoal, porque a gente tem reunião de coordenação uma
vez por mês e os instrutores, eles são obrigados a vir nessas reuniões, inclusive a gente faz questão
de pagar como hora aula para poder garantir a presença. E deles, deles vem às sugestões pra gente
fazer as modificações, entende? Então, esse segundo volume vai sair com mais alguns arranjos, as
queixas agora deles são que a gente precisa ao mesmo tempo ao lado do repertório clássico, um
repertório popular que use aquele mesmo tipo de técnica. A gente tem alguma coisa de música
popular, mas eles tão pedindo mais, mais possibilidades e a gente tem dado liberdade pra que eles
usem esse material, introduzam nas aulas o quê eles acham interessante desde que seja relatado,
seja conversado para gente colocar como modificação.
9. E Cristina, quais os locais que você já atuou como professora em ensino coletivo do
instrumento?
Na Escola de Música, pela Fundação Cultural do Estado da Bahia, eu trabalhei no espaço X, foi na
Biblioteca Central durante um tempo, depois eu trabalhei no Teatro Miguel Santana, no Pelourinho,
depois eu trabalhei no SESI da Casa Branca, esse foi o tempo que eu demorei mais foram quase
cinco anos lá no SESI. E eu saí e já deixei uma pessoa no lugar fazendo esse trabalho, entende?
Tem um menino lá, Fábio. Fábio já tá fazendo o trabalho que eu fazia e muito bem por sinal. E fico
contente também porque sabe, essa, essa maneira de trabalhar, eu venho conseguindo que mais
pessoas acreditem nisso né, e que também trabalhem desse jeito e os resultados são sempre bons.
10. E como é que você vê a pesquisa na Educação Musical e em específico no Ensino coletivo?
Eu acho que a criação dos cursos de pós-graduação realmente favoreceram muito o pensar sobre o
fazer pedagógico, né. Então se antigamente a gente ficava restrito as publicações prática dos
professores, né, e digamos assim, ou você saia daqui pra fazer um curso com um professor fulano
de tal pra saber como é que ele tava pensando, né, que é o caso por exemplo da Maria de Lurdes
Junqueira, que os livros que eu tenho da Maria de Lurdes Junqueira são da década de 70, entendeu?
Quer dizer, eu tô falando de coisas de trinta anos atrás, né. Mas, a pós-graduação permitiu que as
pessoas começassem a conversar sobre o assunto, não é, trocar idéias e as publicações, eu acho que
as publicações dos cursos de pós-graduação são muito importantes porque permite que a gente
acesso a trabalhos de outras das pessoas. Eu acho que isso melhorou bastante, né, tanto que você tá
vendo aí que tem gente que você nem conhece pessoalmente né, mas já tá lendo sobre o trabalho
até já, quer dizer, conhece sem conhecer né, através do que a pessoa escreve e publica sobre o
assunto. Acho que isso aí foi um passo muito importante.
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11. E você acredita que a pesquisa em ensino coletivo e a prática também pedagógica a partir
desse método, vamos falar assim, dessa metodologia, dessa prática coletiva, vem aumentando,
tanto a pesquisa quanto a ...
(Interrompendo) Ela vem aumentando muito, se eu pensar aqui em Salvador à dez anos atrás só
tinha uma Escola de Música, hoje eu sei que muitos outros lugares estão fazendo, não exatamente
do jeito que a gente faz, mas vamos assim, percebendo as vantagens que é você ensinar em grupo.
O quê eu temo é que alguns, em alguns lugares as pessoas fiquem fascinadas pelo ganhar dinheiro e
esqueçam da parte pedagógica mesmo né. Por exemplo, a gente na escola não permite você tá no
meio do semestre não matricula uma pessoa que vá começar do zero com a turma que tá iniciada né
e eu sei que tem algumas escolas que fazem isso o tempo inteiro. Algumas escolas não, alguns
cursos. Eu acho que isso aí não é legal porque prejudica o trabalho e o professor tem que estar
preparado pra poder lhe dá com essa situação nova, né. Chegou um aluno que não toca nada junto
com um grupo de três que já tão fazendo um trabalho mais adiantado. Eu ouço muitas queixas dos
professores, de escolas, de outras escolas particulares que fazem esse tipo de coisa. E vejo também,
que muitos professores lá na Escola de Música não só de violão mas também de piano trabalham
em grupo em nível mais avançado. Já, eu vou dá como exemplos, o professor Mário Ulloa,
professora Diana Santiago que pega os alunos da graduação e juntam esses alunos uma vez por
semana e conversam sobre problemas em comum, tentando, digamos assim, encontrar soluções ou
fazer com que as pessoas pensem em soluções pra ajudar os outros e se ajudarem. Isso é bem
interessante.
12. E você citaria além desses, algum método, algum professor que trabalhe a iniciação
instrumental através do ensino coletivo? Algum trabalho que você goste? Você gostaria de
citar algum nome?
Olha (pensativa), pra não ser injusta né, bom, o quê que eu vi por aí de trabalho em São Paulo, há
muito tempo atrás eu vi o trabalho do Cláudio Jaffé, que impressionou muito na época, eu nem
pensava em trabalhar grupos e eu fui ver o Jaffé lá em São Paulo, no SESC?
É no SESC de São Paulo, mas tem muito tempo, assim, tem uns vinte anos. Depois eu tive agora
também no SESC da Consolação e vi um trabalho bem interessante de Cordas também, vi o seu
próprio trabalho lá em Goiânia. Eu acho que prática, não sei se eu tô sendo injusta, se eu tô
esquecendo alguma coisa, mas não acompanhei de perto assim mais pessoas não.
É um campo muito recente né?
É recente sim, agora tem coisas escritas né. Eu peguei várias, de onde eu vou eu pego as
monografias, os trabalhos de especialização, de mestrado das pessoas né, pra, porque eu acho que
estudar é isso né, é você fazer o seu trabalho e se situar, realmente junto com as outras pessoas que
tão fazendo uma coisa parecida, não necessariamente até no seu próprio instrumento. Eu andei
fazendo uns trabalhos em, no ano passado, eu fui a Varginha, né, falar com os professores lá, no
outro ano eu fui a Recife, fui no Rio Grande do Norte, dei aula em Curitiba também, quer dizer, é
uma coisa assim que tem muita gente querendo fazer, entende? Eu acho que vamos dar mais dez
anos, eu acho que a gente já vai ter uma série de trabalhos impressos e escritos, entende, pra poder
situar a gente melhor. O campo é incipiente, tá começando mas eu acho que tá começando de pé
direito.
13. E Cristina você acredita no ensino coletivo em instrumentos, no nosso caso, como uma
forma de democratização ao ensino de música, à Educação Musical? de dar acesso a um
maior número de pessoas a começar? E eu também gostaria que você falasse um pouco, se
você acredita nessa abordagem social, da questão social, o quê o ensino coletivo pode levar
comunidades, a música, como você vê isso?
Mais pessoas sim, mais pessoas sim com certeza porque sobretudo se você pega, digamos assim,
violão que é um instrumento que muita gente tem, mas não tem como pagar a aula né, então,
comprar um violão de péssima qualidade é até relativamente fácil, agora pagar o professor pra dar
aula, realmente é complicado. O ensino em grupo dá essa possibilidade também, mas eu vejo tanta
gente, sabe, acho que a gente também já teria, teria espaço para escolas inteiras de aula de
instrumento em grupo e eu vejo que mesmo assim, é muito difícil, é uma utopia você achar que vai
levar música pra todo mundo, não é? Eu acho que é meio difícil, mas é uma possibilidade sim. Por
exemplo, pelo caso pequeno lá da escola né que a gente tá atendendo, claro, praticamente mil por
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cento a mais da pessoas que a gente poderia atender se a gente fosse fazer um atendimento
individual. É mais democrático sim. Mas ainda custa caro pra muita gente né. Eu acho que tem
campo pra fazer projetos sociais.
(Acabou a fita)
Então Cristina, a gente interrompeu a fita terminou, mas como é que você vê essa questão
social e o ensino coletivo, essa relação?
Então, a possibilidade de você ensinar em grupo realmente você aumenta o número das pessoas né.
Mas por exemplo, na Escola de Música ainda é uma coisa elitista, que a pessoa que se dirige até
uma escola pra tentar aprender um instrumento, ela já passou por um, a gente poderia tentar chegar
mais nas pessoas, ao invés de ficar no canto da gente, esperando que as pessoas viessem. Tem
alguns projetos no ensino coletivo que vão até a lugares mais pobres né. Eu sei que o projeto de
Joel de Bandas, o projeto de Oscar Dourado em Cordas, tá indo lá para periferia, pras comunidades
mais carentes e tal. A gente poderia pensar em fazer isso com o violão também, porque é uma
chance, entende, de você dá pra essas pessoas, eu acho, claro, que a música vai colaborar pra
melhorar a pessoa como, como indivíduo não é. Não é só pra ela ficar contente ou ficar mais feliz,
mas pra ela ser uma pessoa melhor porque tem um contato com música, né.
14. E Cristina, pra finalizar, você tem alguma consideração final a fazer sobre o seu trabalho
ou uma sugestão pra minha pesquisa? Fica livre essa pergunta pra você.
Uma sugestão para sua pesquisa? Se vai olhar o lado social né? Eu acho que esse é um ponto bem
interessante a ser tocado porque por exemplo nos trabalhos que eu vi até agora, nos trabalhos
escritos, registrados de ensino em grupo eu não vi nenhum com essa preocupação, eu acho que
você tá tocando num ponto importante, que você pode explorar realmente. Seria um diferencial no
trabalho que você tá fazendo. No mais eu espero, realmente, que daqui a mais alguns anos a gente
possa ter mais pessoas trabalhando com ensino em grupo. Porque alguns modelos aí que são
defendidos, eu acho que eles já não cabem mais né. Aquele modelo do aluno virtuoso, do aluno
talentoso, que só esse merece chance, eu acho que isso aí cada vez mais, graças a Deus, né. Se bem
que nas escolas eu ainda vejo que tem muito isso, né, por parte dos professores, a pessoa quer
trabalhar com aquele aluno que pode render muito né, e não com aquela pessoa que pode
simplesmente ser uma pessoa melhor porque tem o contato com música, né. Nisso aí eu acredito
sim, na educação pela música, na música com um poder de transformação e de melhoria da sua
forma de viver né.
Então tá Cristina. Muito obrigada.
Obrigada Também.
Até a próxima oportunidade.

Entrevista nº8 : JOEL LUÍS DA SILVA BARBOSA


Local : Salvador-BA
Data : 31.05.2002
Horário : 11 h

1. Bom dia, Joel! Primeiramente, eu gostaria de saber como se deu seu primeiro contato com
música?
Eu comecei a aprender música na Guarda Mirim Municipal de Piracicaba, São Paulo, né. Uma
entidade para menores carentes. E lá tinha uma banda e um coral e um conjunto de flautas doce. E
quando eu entrei lá, prestava serviços pra bancos, entidades da cidade né, recebia um salário, um
salário mínimo acho na época, e junto com isso, eu tinha banda, onde eu comecei a aprender
música na banda e no conjunto de flauta doce e no coral.
2. E qual é a sua formação? Depois desse primeiro contato, quais foram às outras escolas que
você estudou?
Lá eu comecei a aprender clarineta, depois de lá, eu fui pro Conservatório de Tatuí, onde eu morei
lá com a bolsa do governo do estado. Depois de lá, eu fui pra UNICAMP, fui fazer o bacharelado
em clarineta. Depois do bacharelado em clarineta, eu fui pros Estados Unidos fazer o mestrado e o
doutorado em clarineta, sendo que a minha tese foi o método de ensino coletivo para instrumentos
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de banda. Mas durante esse percurso todo, eu sempre trabalhei tocando clarineta em diversos
grupos, orquestra, banda e música popular. E trabalhando com bandas, regendo bandas,
trabalhando ensinando e formando bandas em escolas, bandas municipais em São Paulo e também
bandas escolares né.
3. E como se deu esse interesse pelo ensino coletivo? Como é que você iniciou esse trabalho em
ensino coletivo em sopros no caso?
Eu dava aula no Instituto Adventista de Ensino, em São Paulo, né. E lá tinha uma banda, quer
dizer, eu fui responsável pra formar a banda que existia e tinha acabado. Quando eu tava dando
aula lá e montando essa banda, eu trombei na Biblioteca muito material americano que tinha lá, e
no meio tinha três, tinha uma coleção completa do Hal Leonard pra banda né. Os três volumes e
cada volume são pra cada instrumento. Então, um monte de métodos de banda,né. Aí eu comecei.
Eu peguei o método elementar, intermediário e o avançado. Comecei a usar individualmente nas
aulas, pra conhecer né. Aí falei : “Pô, que legal!”, aí fui entendendo a partir de como funcionava o
ensino coletivo, embora lá é uma escola particular, a aula lá, os atendimentos eram individuais.
Dois anos depois, eu tô já na UNICAMP e em Nova Odessa eu começo a trabalhar com a banda de
Nova Odessa, onde um amigo meu era o regente da banda. Ele me chama pra dar aula lá pra ajudar
ele a formar instrumentistas novos. Eu disse pra ele assim : “Vamos experimentar esse método
aqui!”, que era o método elementar do Hal Leonard, que aquele é da década de 70, eu acho que o
método é de 72, uma coisa assim, eu tenho lá anotado em detalhe, aí eu peguei esse método,
tiramos xerox e começamos a usar com os meninos iniciantes da banda de Nova Odessa. E o
resultado foi interessante porque a média de desistência na banda era muito alta, não só ali como na
região toda, que a gente conhecia toda região : Nova Odessa, Sumaré, Americana, Brotolândia (??),
Piracicaba, né, toda a região de Campinas. Então a média de desistência dos alunos era muito alta,
era muito alta a média. Aí conseguimos começar o ano com vinte e cinco alunos e acabar com vinte
e seis. Aí eu pensei : “Pôxa esse negócio funciona!”. E no final do ano, a gente não tinha como
tradicionalmente lá, a gente forma lá de vinte e poucos alunos, a gente formava dois que entrava na
banda dois anos depois, né. Com esse método no final do ano, nós tínhamos uma banda nova, quer
dizer, tinha a banda municipal e formamos uma banda mirim. Aí entusiasmamos com a idéia, tanto
ele quanto eu. Aí ele falou assim : “Joel, no Sumaré, que é pregado com Nova Odessa, outra
prefeitura, a banda de lá vai ter um apoio maior, a gente quer ter uma equipe maior de professores,
não só você e eu, mas outras pessoas. Vamos aplicar um outro método lá?”. Aí começamos lá, no
ano seguinte com outro método realmente, que agora não me lembro o autor do método, mas é um
método em Tatuí. A gente preocupava, “vamos experimentar um outro método agora”. Montamos
uma equipe lá, aí começamos o trabalho coletivo naquele ano né, quando foi em agosto, tive que ir
embora pros Estados Unidos né, mas ele continuou. Essa banda formada ali, no ano seguinte, em
dois anos foi campeã do estado no Concurso de Bandas e três anos depois no Concurso Nacional de
bandas. Então, funciona. O problema é que, quer dizer, que eu comecei a perceber nesse dois anos
trabalhando dentro do ensino coletivo com os meninos né, porque antes eu usei o método em São
Paulo, mas individualmente, né, no atendimento individual. Foi que, era tudo em inglês. O primeiro
método do Hal Leonard tinha as letras a ser cantadas, porque o método não era pra ensinar apenas a
ler partitura e dominar a técnica do instrumento, mas educar o menino né. Embora as bandas
trabalhem na mesma direção, inicialmente trabalha-se nesta direção, né. Aí, nós percebemos assim
: que o quê o menino interessava quando conhecia a melodia. No método americano tinha a “Jingle
Bells”, aí quando eles achavam uma música conhecida eles gostavam, vibravam. Aí eu falei assim :
“Pô, imagina se eles conhecessem mais melodias desse método”. Não conheciam porque era
americano né. Eles não podiam cantar porque era inglês e ainda, o método americano de bandas
tem um problema porque eles usam o dó móvel, não o dó fixo. Era outro problema no ensino da
teoria pra eles. E tudo era inglês no ensino do pentagrama, tudo né, a teoria toda. Então, dificultava
né. Então pensamos assim : “Pô, então, vamos fazer um método em português, sistema brasileiro e
as melodias, sejam melodias brasileiras” , né. Então, essa foi à idéia que surgiu, mas que não é
uma idéia originalmente minha não. É uma idéia, na verdade, que eu já tinha ouvido falar lá do
professor Coelho, José Coelho de Almeida, lá de Tatuí, que era né. Porque lá em Tatuí, antes de ir
pra São Paulo, o José Coelho de Almeida na banda, pegou o método e leu uma vez na banda. Eu
não sabia do que se tratava aquele método, depois que eu conheci : “Ah, esse método!”, entende?
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Mas ele nunca aplicou em Tatuí, só passou e leu pra gente conhecer o método. E nesse trabalho que
ele fez lá ficou a mensagem assim dele, de maneira inconsciente, que era bom ter um método de
banda brasileiro. Bom esse foi o contato com a?
Com o ensino coletivo. E em qual ano você começou esse trabalho lá?
Ah sim, Nova Odessa, deixa eu recordar aqui, 80, 90, 84 eu tomo contato em São Paulo com o
método, 84, né. Em 85, eu entro na UNICAMP e começo aplicar em Nova Odessa, no prédio, no
Conjunto das Artes. Deixa eu lembrar tudo certinho. Em 84 eu tomo contato em São Paulo e
começo a usar individualmente. Em 89, a gente usou em Sumaré, e no ano anterior, 88, nós usamos
em Nova Odessa, né. Foi isso aí. Na verdade, eu tomo contato com o método, mas vou usando
individualmente porque não tinha como usar de maneira coletiva lá, né. fui conhecendo aos poucos,
assim. Mas antes de 84, nesse período de 80 a 83 é quando Coelho num certo momento do ensaio,
parou e leu um desses bem facinho, que eu não consigo lembrar do autor, mas tenho anotado, esse
método a gente usou em Sumaré né, mas eu não entendia o que era aquilo lá ainda, né. Essas datas,
eu tô meio confuso na minha cabeça assim.
Isso é na década de 80.
Década de 80, isso acontece.
4. E na sua opinião, quais são as vantagens de se ensinar a partir do método coletivo? E se
existe alguma desvantagem que você acredite?
Olha só. Quer dizer, na minha experiência inicial que nós tivemos né, o quê marcou muito foi : que
os alunos, a desistência foi muito pequena, a evasão, né foi muito pequena, quer dizer não teve pra
primeiro caso. No segundo não acompanhei até o final, mas até onde eu fiquei de março a agosto,
março a setembro na verdade, em Sumaré, não tinha nenhuma né, depois eu não acompanhei mais
assim, os detalhes todos, embora, eu sei que foi muito baixo. Mas a grande vantagem que nós
vimos foi a seguinte : de um lado, vamos dizer, o método tradicional que a gente usava lá em São
Paulo e que se usa aqui, que se usa em Belém, eu já trabalhei no Pará, na Universidade do Pará,
onde eu tenho trabalhado há um bom tempo né e os mestres de banda nos encontros que eu vou, a
gente conversa, “Como é o ensino da banda?”, do ensino de instrumento nas bandas, né, e que
também é (?) assim, individualmente. O quê acontecia era, nas bandas, o aluno passa por uma fase
onde ele aprende a ler partituras. Nesse processo, ele gasta muito tempo em geral, no Brasil, com o
BONNA. Aqui na Bahia, eles chamavam de harpinha, quando o professor, como chama, é quase
um ensino quase que personalizado. Pra cada aluno, o professor fazia uma liçãozinha pra ele
aprender a dividir, a leitura musical. Então, tem uma fase só de, pra desenvolver a leitura. Essa fase
com o BONNA, você sabe, é quase um exercício silábico, quer dizer (demonstra). Nesta fase,
perdia-se muito aluno. E o aluno não tem o contato direto com a experiência musical, ali no
momento, porque fazer divisão musical, ainda que não é solfejo né, é só divisão musical, né. Aí,
entravam na segunda parte aonde pegavam o instrumento. Aí, quando ele pegava o instrumento, os
métodos usados, no caso, (?) , esses métodos todos, em geral, são métodos que mais trabalham
técnica do instrumento, sabe? Com poucas melodias. E muitas vezes, a melodia, quando ouvia,
tirava de ouvido era meio proibido nas bandas assim, né, no ensino né. Ficava muito no método e o
método e o método era técnico. Aí, depois que ele conseguia, no final desse período, a começar
trabalhar o repertório, ele trabalhava o repertório da banda, os dobrados, a marcha e tudo mais, né.
Aí, quando ele começava a dominar esse repertório, o Hino Nacional e tal, aí ele entrava na banda,
ele entra na banda. Ainda é assim nos dias atuais, né.Aí ele passava um período de aprendiz na
banda pra depois se tornar um músico da banda. Então, nesse processo se perdia muitos alunos. No
começo, sem conhecimento musical, aí na segunda fase muita técnica do instrumento, técnica
instrumental e pouca música, depois entra música, mais a música é o repertório da banda, né. Aí,
quando entrava pra banda, entrava pouquíssimos alunos na banda, muitos alunos que entravam no
começo, sobravam pra banda só os corajosos. No outro método coletivo, quando nós começamos a
trabalhar, a gente começava logo no primeiro dia com o instrumento na boca do menino, né. A
gente já “Pum”, já punha o instrumento. Aí a experiência do menino, ele veio pra tocar saxofone,
ele não quer ficar dois, três meses ou às vezes, esperar um ano aprendendo a ler partitura, de seis
meses a um ano lendo partitura pra depois pegar o instrumento, aí faz todo o trabalho técnico do
instrumento. Não. Desde o começo a gente trabalhava com o instrumento na boca e trabalhando
música. A gente trabalha desde o começo com melodias mesmo sabe, coisas bem simples, duas
250

notas, três notas. Então ele já vai desde o começo assim, tendo essa experiência musical e essa
afinidade com o instrumento, com, uma experiência musical com, relacionado com o instrumento
mesmo, onde a técnica é desenvolvida dentro de melodias. E além disso, desde o primeiro contato,
ele já percebe que faz parte do grupo, divide o grupo em pequenos grupos menores, depois junta
um grande número, a banda mesmo né. Aí, desde o começo, ele percebe assim : “Eu faço parte de
uma banda!”. Então, essa, essa, ligação com o grupo, acho que tá prendendo ele, sabe? Então, quer
dizer, ele trabalhando tudo isso junto, quando chega, quando chegava no final, a gente tem uma
outra banda montada, entendeu? Acho que isso entusiasmou e foi a grande vantagem que nós
vimos, o entusiasmo, e o desenvolvimento do menino, musicalmente falando né, eu achava que era
bem maior do que o outro método individual. Porque desde o começo ele desenvolvia habilidades
auditivas, né, em todos os sentidos, ele cantava as melodias do método,né. Aí desenvolvia melodia,
harmonia, ritmo, cantando a melodia né. E como chama? Quando a gente trabalhava musicalmente
tocando as melodias, as melodias tinham várias texturas musicais, desde a melodia acompanhada,
né, cânones, texturas corais, então, quando ia tocando aquilo, ele já é exposto à diversas texturas
musicais e já se depôs desde o começo, em tudo, nessa questão musical muito mais ampla do que
ficar seis meses a um ano batendo, fazendo divisão musical com o BONNA, né. E além de
desenvolver essa habilidade toda, ele desenvolvia a habilidade de se tocar em grupo desde do
começo, né. Percebendo o que o outro tá fazendo né. E ele aprendia muito também com o aluno do
lado, né. Por exemplo, o som dele, às vezes, falava assim, “a embocadura é assim”, na embocadura
do outro ele via “Opa!” , já corrigia a embocadura e já via, “Ah o professor faz igual dele”. Então,
ele buscava o som do vizinho, sabe? Ele ia tendo assim, modelos dentro do próprio grupo, aqueles
que iam se destacando, para que todos aprendessem. Quer dizer, vinha há muito tempo com isso,
né. Com esses modelos né. Então, tudo nesse mesmo mecanismo incentivou a acreditar no método
coletivo, né.
5. E no seu método, que você acabou desenvolvendo, os alunos a princípio não tem o
instrumento? Como é que se dá essa estrutura?
No meu método, eles já começam com o instrumento mesmo.
Mas eles possuem os instrumentos? A maioria, o curso mesmo é que oferece o instrumento ou
eles estudam em casa? Como é que é essa estrutura?
Ah sim! Bom, quer dizer, onde eu trabalho hoje, com os meninos, numa região carente, então não
tem instrumento pra casa né. Hoje já alguns já conseguiram e tem o instrumento em casa. Mas os
instrumentos ficam na sede da banda né, ou na escola. Aí, com aquele instrumental, por exemplo eu
tenho vinte e seis instrumentos né. No horário, por exemplo, das 8 às 10 da manhã, eu não faço isso
hoje lá porque não dá tempo de fazer isso lá, mas a idéia que a gente tem uma turma pegando
instrumento das 8 às 10 da manhã né; das 10 ao meio-dia outra turma usa aquele instrumento, aí à
tarde, quer dizer que tem um instrumento pelo menos sendo para quatro pessoas utilizarem, sabe?
Então, tipo assim, vamos dizer com trinta instrumentos você tem cento e vinte alunos, né. Porque,
por ser caro o instrumento naquela região carente, né. Mas a gente não faz isso não porque a gente
não tem pessoal suficiente da UFBA né, na universidade pra trabalhar lá, assim né. Então, a gente
faz cada instrumento pra dois, por enquanto, porque a gente consegue atingir no máximo duas
turmas, né, 46 alunos lá hoje, né, e alguns são monitores da UFBA da própria cidade (?), lá da
região, né. Então, a idéia do método é, o ideal é que ele tenha o instrumento em casa pra estudar em
casa. Mas por ser complicado, ele vem até a banda pra estudar, limpa, aí um outro usa aquele
instrumento e assim, né. Então, essa é a idéia.
6. E Joel o seu método prevê depois de algum tempo aulas individuais ou não? Quanto tempo
que dura essa parte coletiva de iniciação?
Quer dizer, eu acredito assim, o trabalho ideal seria o coletivo e o individual paralelo sabe? Eu
acredito que isso seria assim, o ideal né? Porque se hoje você trabalha só o coletivo, você não
consegue ver muitas coisas, carências pessoais de certos alunos sabe? Embora eu tô trabalhando o
coletivo, eu tenho aquele momento pra atender individualmente né. mas como se diz, não há uma
atenção tão específica com podia ser se fosse só individual. Então, eu tenho os monitores que me
ajudam individualmente em alguns casos né. Mas ainda assim, eu acho que o ideal seria os alunos
participarem realmente do ensino coletivo e ter o apoio individual. Mas como isso é caro, então, a
gente fica mais no coletivo e faz o atendimento individual dentro do que a gente consegue fazer na
251

carga horária né. Alguns momentos a gente fala : “Hoje depois da aula fica você” e atende aquele
aluno. Mas o processo que a gente trabalha é o seguinte, assim, dentro da metodologia mesmo : a
gente não começa com o coletivo total não, né. A gente faz o recrutamento dos alunos, aí faz a
reunião com os pais, aí os alunos são divididos em dois grupos : um grupo que eu chamo de grupo
recreativo e outro grupo cultural, que organiza as outras atividades do grupo né, aí logo depois
disso, é o primeiro contato com instrumento. A gente passa pra uma fase pra conhecer os
instrumentos e decidir qual instrumento que eu vou estudar. Aí você marca o quê eles querem
estudar né. “Ah, eu quero estudar saxofone!”. A gente passa um período, onde eles vão lá, a gente
monta um instrumento, eles tocam, eles tocam algumas músicas de duas notas, tipo (Canta) :
“Berimbau, Berimbau”. Com duas notas eles aprendem a tocar música, sem partitura sem nada.
Tudo de ouvido né. A gente vai tocando, uma metodologia que a gente desenvolveu assim : a gente
punha o instrumento na mão do menino e ensina soprar e vamos tocar junto. Aí, ele passa essa fase
: “Ah professor, na outra aula eu gostaria, eu gostei do saxofone, mas prefiro estudar trompete
hoje”. A gente dá mais um período aí de duas, três aulas, uma semana né, a gente faz três aulas
semanais coletivas né, e duas aulas de prática monitorada. Ele tá estudando e temos o monitor tira a
dúvida, né. Então, nessa semana, ele experimenta vários instrumentos e decide : “Oh, eu quero tal
instrumento!”, né. Aí quando decidiu, a gente passa uma fase, aulas de naipes. Vamos dizer,
dependendo dos alunos, a gente tem aula de saxofone e clarineta juntos. Então, nessas aulas em
naipes, que a gente trabalha já com embocadura, postura, respiração, montagem, montar, desmontar
o instrumento, enxugar, como conserva o instrumento né. E já entra no método e começa a ler, ler a
partitura no método e ler, começa a leitura musical já no método nessa segunda semana né. Aí,
então, as aulas em metais agudos, metais graves, percussão, madeiras, são os naipes. Aí depois que
passou essa fase dos naipes, quando a gente sente que todo mundo já consegue tocar a primeira e a
segunda fase do método né, todinha, assim, sem problema com divisão e né, aí a gente marca o
encontro.A primeira aula com tudo junto, embora eles já tiveram essa aula com todo mundo junto
naquela semana onde todos experimentavam os instrumentos sabe? Aí passa uma aula todo mundo
junto pra conhecer o instrumento sem a leitura de partitura, aí no outro período específico de
técnica individual de instrumento né, aí começou a ler a partitura, aí todo mundo junto. Aí quando
chega na aula coletiva agora, eu já sei quem vai ter dificuldade em embocadura. Então, quando eu
tô fazendo o ensaio coletivo, eu fico corrigindo um : “Olha abaixa a embocadura!”, “Olha a
postura!”, sabe?, “Olha a respiração de fulano!”. Quer dizer, aí vai seguindo, né. Aí vai seguindo e
dando o acompanhamento individual dentro do necessário sabe? E agora, chega um certo
momento, que o método realmente, depois que fica um ou dois anos, dependendo do
desenvolvimento do menino, e a partir daí, vem encaminhando para a aula individual mesmo, sabe?
Musicalmente, eu posso dar de fato, para todos instrumentos ali né, mas tecnicamente, eu me limito
mais aos instrumentos que eu conheço mais, né. E quando não conheço, tento arranjar alguém que
possa encaminhar. Assim que é possível né, porque quando eu trabalho no caso lá, tem pessoas que
não tem condições de pagar outra pessoa, né. Mas eu acho que é só isso, as fases todas, né.
7. Então, a princípio a carga horária desse aluno iniciante é qual, no começo?
A gente já trabalhou de várias maneiras lá, sabe? No começo a gente fazia só uma aula semanal,
sabe? Era lento, mas o aluno tinha chance de, no começo de tudo, eles não tinham essa chance, era
só uma aula por semana mesmo. Depois eles passaram assim a ter alguns dias que podiam ir lá,
praticar. Tinha uma hora por semana e praticava, sabe? A aula era de uma hora à uma hora e meia,
né. Assim, depois, quer dizer, o ideal a gente queria que fosse três aulas, né, semanais, pelo menos
né. Hoje, nós temos duas aulas semanais e fora esse período, alguns alunos vão lá praticar e acabam
tendo chance de às vezes ter um monitor tá lá, pra eles praticarem. Não é, o trabalho lá ainda não tá
assim totalmente bem definido nesse sentido, porque nós não temos financiamento pra pagar um
monitor, pra, então, a gente comenta, “Pode vim?” , “Posso!Ah eu vou atender os alunos X tal dia”,
né. É muito mais na base da amizade, né. Com exceção dos alunos da UFBA que vão lá e dão essa
aula, uma aula ou duas aulas semanais acontecessem. Aí a prática monitorada que eu chamo, que
depende dos meninos que moram lá estarem disponíveis, esse negócio todo, né. Mas o quê, o
método que eu conheço, como funciona bem esse método na escola, é assim : chega pro cara :
“aula de uma hora por dia, cinco dias na semana”. É porque meu horário todo mundo vem pra aula
de banda, senta pega o instrumento e toca, fica lá hora tocando mesmo. Esse sistema que eu tenho
252

visto faz funcionar, ou pelo menos, três aulas semanais. È, em se pensando que o aluno não leva o
instrumento pra casa pra estudar, o contato dele é naquele horário de ensaio, cinco dias na semana.
Quer dizer, ou cinco aulas coletivas, ou três aulas coletivas e mais dois períodos monitorados. O
problema das aulas monitoradas é que, se o cara não for estudar uma música diferente, não tem
espaço. Tem que ter espaço físico pra dividir cada um numa salinha, pra eu passar pra conferir.
Então, o ensino carece e não tem salas. Então, às vezes, acaba sendo ideal que seja cinco aulas
semanais mesmo, que todo mundo está estudando a mesma coisa, o mesmo horário, tem só vinte e
cinco. “Agora só você”, “Agora vocês dois”, sabe aquele negócio todo. Então, eu passei uma
prática, é um ensaio né, é uma prática de instrumento coletiva, um ensaio coletivo, entendeu?
8. E a faixa etária trabalhada? Qual é?
A gente pega assim, de dez a dezessete anos que a gente trabalha, sabe, mais, né. Por exemplo,
alunos mais velhos se tornaram monitores hoje, até vinte e dois anos. Agora na UFBA, nós
trabalhamos já com uma faixa bem de adulto mesmo, de vinte até tem gente lá de cinqüenta e sete
anos.
9. Então, fala pra mim um pouquinho do trabalho, onde você atuou com o ensino coletivo e
onde você atua nesse projeto? Onde que é e como é que está sendo desenvolvido? Então,
primeiro onde você atuou e agora na Bahia onde é que você atua?
Quer dizer, lá em São Paulo foi na Banda Municipal de Nova Odessa em Sumaré, né. É, usando o
método individual e não coletivo, mas ??? em São Paulo. Aqui, inicialmente comecei aplicar na
UFBA mesmo, duas turmas de alunos no curso de extensão.Pagavam o curso na verdade, alguns
tinham o instrumento, outros não tinham. Os alunos lá da UFBA né? Depois eu consegui uns
recursos na Sociedade de 1º Maio, nesse convênio com a Escola de Música, conseguiu-se do
governo, aí começamos a trabalhar nesse convênio que estamos até hoje. Há quase quatro anos,
chama-se Sociedade 1º de Maio. È uma ONG que trabalha com várias, vários cursos, sabe? Tem
escola de 1º Grau, tem creche, tem tudo quanto é coisa assim, curso de serigrafia, mecânica de
automóvel, aí implantaram música porque dentro desse programa tem uma aula de reforço escolar,
é tudo através da arte, das diversas linguagens : teatro, pintura né, aí e música né. E aí que eu entrei
com a música. Então, lá nós estamos já há quatro anos. Lá você chama laboratório assim, onde
além do método, nós já fechamos o método, agora estamos usando um repertório didático que é o
que acompanha o método, o método né, a questão didática para uma banda coletiva tocar né,
arranjos com composições né. Que a gente faz, que os alunos fazem, eu faço, a gente experimenta e
vê o que funciona e o que não funciona pra, se de cada nível da Sociedade 1º de Maio. Aí, eu passei
mais um período de um ano, agora não tô mais, aqui Centro Social Urbano de Mussurunga, em
Salvador também, com, foi começado por um ano, mas depois por questões governamentais a coisa
não funcionou, não tinha recursos, parou, assim não dava para trabalhar com, lá, aí desistimos do
trabalho lá. È, paralelo com isso, a gente, eu faço, dando cursos em vários lugares, onde pessoas
passaram a aplicar o método, né. A Weril financia experimentar esse método lá na ULM, na
Universidade Livre de Música em São Paulo né, ligado ao foco das artes, que eu freqüentei o curso
várias vezes, em cursos em vários pontos no Brasil, né, e em São Paulo, tem diversos lugares
usando o método também que eu acabei fazendo né, nessa metodologia, vários pontos no interior,
Rio, aqui em Sergipe, em uma banda municipal ??, e no Pará, tem cursos, tem um projeto de
bandas muito grande dentro do Pará. Aqui na Bahia tem Cachoeira e Salvador. E Minas Gerais
começou, mas ainda a faixa etária, o pessoal já sabia tocar, aí então, partiram já para um outro
nível, e disse que ia começar uma turma de iniciantes.
10. E atualmente, hoje você tem um projeto social, também envolvido com a banda? Aonde...
(Interrompendo) Isso. Esse projeto social que é na Sociedade 1º de Maio, que é, que funciona
assim, tem uma, no começo, eu comecei conforme eles pediram, um bocado de música lá, fui e
alguns dos meus alunos como voluntários fazerem o trabalho. Aí a UFBA tinha um programa
chamado “UFBA em Campo”, um programa de extensão. Aí pegava os alunos da Escola de
Música, eles iam comigo e ganhavam um crédito de disciplina né, de extensão. Aí depois desse
programa individual começou um outro programa individual, começou um outro programa o ano
passado chamado “ACC – Atividade Curricular em Comunidade”. Os alunos iam comigo para
trabalhar com o método, conhecer, mas os alunos da UFBA eram treinados, Licenciatura e
Bacharelado, para trabalhar com essa metodologia coletiva, né. E ao mesmo tempo, os alunos de
253

Composição e Arranjo faziam composições para experimentar o que funcionava dentro daquele
nível didático. Eles aprendem a escrever só música para profissional tocar na UFBA né. Ali é o
contrário, um pouco vai escrever para iniciante de seis meses e um ano tocar né. Quer dizer, não
conhece o instrumento com detalhe. É, então, aí, nessa Atividade Cultural em Comunidade, ACC,
que estamos até hoje com ela, acontece dentro da sociedade sob a parceria UFBA e Sociedade 1º de
Maio, nesse projeto que eu estou engajado até hoje com eles né, embora isso não é uma atividade
fixa lá na UFBA né. Tá pra ser aprovada né.
11. E Joel, como é que você vê a pesquisa e os trabalhos, no geral, em ensino coletivo no país?
Fale um pouco sobre o quê você conhece, o trabalho de outras pessoas não só em sopros, mas
em cordas, em violão. Então, assim, como está o panorama no Brasil de metodologias para o
ensino coletivo? O quê que você conhece, o quê que você já viu por aí?
Quer dizer, eu conheço mais, realmente, o, na área de sopros, né, na qual eu convivo. Aqui eu
acompanhei Diane Santiago nos teclados, piano e teclados, acompanhei Cristina com o violão, o
Projeto Guri eu sabia, mas nunca pude acompanhar de perto né, apenas com esse amigo Daniel
Tamborim que me informava : “Tá indo assim, legal!”, mas faz um bom tempo que eu não o via né,
mas ?? com sessenta e quatro pontos. É aí eu conheci esses pontos aonde essas pessoas que vieram
fazer o curso comigo, de vários lugares do Brasil até na Colômbia, alguma coisa assim, tem
pessoas se interessando realmente, querendo usar, mas que alguns que pegavam o método
americano, tentando usar, mas tendo dificuldade por causa da língua, esse negócio todo, né, e esse
foi o caso de um regente, como é que chama? De uma cidade em São Paulo, na beira do mar, numa
cidade praiana, não lembro o nome, e começou a usar lá, né, questões de alguns anos atrás. E aí,
quando ele conheceu meu método, ele inverteu, ele deixou o método americano, agora tem em
português, vou levar para as crianças, né. Esse eu acompanhei, em Tatuí né, desde que eu voltei nos
Estados Unidos, aí, alguns, alguns amigos lá e colegas de trabalho, começaram a usar o meu
método lá, né, dentro do Conservatório. Mas eu tenho acompanhado assim, mais em relação aos
sopros mesmo, aos sopros. Antes disso, eu acompanhei, por exemplo, quando eu estava fazendo a
pesquisa com o meu trabalho de doutorado, eu, na verdade, acompanhei tanto depoimento de
pessoas quanto li né, o trabalho do Jaffé né, em vários pontos, e dessa Linda Kruger, que é uma
americana do Texas, que passou um período em Belém, tentando fazer um trabalho de, um método
como é que chama de cordas né, usando música brasileira. Aí na verdade, eu nem sabia que existia
isso, quando eu tava numa biblioteca nos Estados Unidos pegando material bibliográfico para a
minha dissertação, eu acho uma tese exatamente, eu falo assim : “Pô, essa mulher fazendo aquilo
que eu exatamente queria fazer, só que pra cordas!”. Aí, quando eu estava lendo a tese dela, eu vejo
tudo isso e digo : “que legal !”, né. Quer dizer, eu vejo assim, que a minha idéia não era uma idéia
sozinha né. Então, quer dizer, eu morei com pessoas que trabalharam, que foram alunos do Jaffé
em vários pontos. Tanto pessoas que, alguns estão até em Salvador hoje né, que aprenderam ou em
Fortaleza né, que ele trabalhou, Brasília teve, e em São Paulo né. Mas São Paulo como é
desenvolvido. Mas, quer dizer, eu tenho visto assim e o trabalho do Abel, ??? pessoas que me
comentam né. Então, tem um trabalho muito bonito de sopros, é que o ensino toca com o coletivo
mas numa outra, numa outra direção, que acontece em Volta Redonda, no Rio com, esqueci o nome
do professor lá, conversamos várias vezes por telefone trocando idéias, coisas assim, né. Eu tenho o
nome dele escrito, se precisar... Lá em Volta Redonda, ele tem um trabalho ligado à escolas
municipais, né. isso um trabalho acompanhado, de, quer dizer, aí eu acompanhando, o pessoal que
passou a usar meu método, em lugares como São Paulo, o pessoal sempre mantém contato como ta
indo esse trabalho, tando assim, tudo isso, tudo aquilo, não passou disso, não faz aquilo.
12. E professor, sobre a questão da função social da música, você acredita que o método
coletivo de ensino de instrumentos ele democratiza o acesso do cidadão comum, do cidadão à
Educação Musical? Como é que você vê essa ligação entre o ensino coletivo e a função social
da música ?
Na minha própria experiência pessoal, eu comecei numa entidade pra menores carentes né. Se não
fosse aquela oportunidade, hoje eu não seria o músico (acabou a fita).
Então Continuação da entrevista com o professor Joel Barbosa. Joel, então, a questão da
relação entre a, o ensino coletivo e a função social ? Como é que você vê essa questão?
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E, pensando na minha própria experiência pessoal, se não fosse, embora não era ensino coletivo na
época né, se não fosse a música ali, sendo oferecida pra menores carentes, eu não tinha tanta
experiência, nem a oportunidade de me tornar um músico profissional né, hoje né, trabalhando com
isso. É, depois disso né, eu trabalhei em algumas bandas municipais de São Paulo, onde a clientela,
eram crianças, realmente, de, carentes né. E depois, eu pude acompanhar o processo dessas
crianças que hoje são profissionais de música né. E histórias interessantes, assim, como na época
quando a gente estava aprendendo, isso já é com o ensino coletivo né, em Nova Odessa e Sumaré,
onde o pai vinha e dizia assim : “Ò professor, eu vou tirar o meu filho porque eu prefiro que ele
trabalhe na lanchonete, em algum lugar aí, pra ajudar em casa e ter dinheiro, né”. E eu tentando
segurar o filho lá, uma coisa assim, e quando eu volto depois de três anos depois, aquele menino
ganhava três vezes mais que o pai né, com música. Então quer dizer, essa coisa toda né. E agora,
mas, na Sociedade 1º de Maio, numa maneira de falar, existe uma ?? trabalhando com os meninos,
o que a gente vê assim, é a dimensão da cabeça dos meninos sabe? Passa a ser, passa a buscar
outros horizontes mesmo, sabe? Tanto a questão social , a questão política, a questão educacional, a
maioria, eles querem ser hoje músicos profissionais, querem fazer vestibular pra música na UFBA
sabe? Quer dizer, alguns alunos estavam assim com a escola e hoje querem estudar realmente na
escola, sabe, todo, por estar envolvido nesse processo de aprendizado no instrumento, sabe e
coletivo né. Agora, o preço do aprendizado é caro né. Porque a aula individual é cara e o
instrumento é caro né, pensando nessa faixa da sociedade né. Então, com o ensino coletivo, você
consegue um ensino eficiente, né, pedagogicamente falando, e ao mesmo tempo, você consegue
baratear muito, porque o professor vai ser pago por diversos alunos né, àquela hora aula que os
alunos estão pagando e o instrumento pode ser usado por vários alunos. Desde que exista um
sistema de que o aluno vai até lá, né, pra, realmente pra aprender o instrumento. Então, eu acho que
com o método coletivo a gente consegue como se fosse democratizar, ou realmente deixar a música
disponível, num preço acessível, para uma maior parte da população. E facilitando até para a
música entrar realmente, na escola de 1º e 2º Grau, quer dizer, não tinha outra maneira da música
instrumental estar presente na escola de 1º e 2º Grau, a não ser pelo ensino coletivo, não é?
13. É. E Joel, em relação ao seu método, eu queria que você falasse mais sobre o seu
referencial teórico.
Então, o método quando eu fui elaborá-lo, né. Eu fiz uma revisão bibliográfica extensa de vários
autores que trabalhavam com ensino coletivo (Interrupção).
Joel, eu queria que você falasse sobre o seu referencial teórico? É, qual foi o referencial
teórico que você desenvolveu a sua metodologia?
Na verdade, quando eu comecei a fazer o método para a iniciação, a revisão bibliográfica inicial, eu
trabalhei dentro de diversos educadores, né. Então, Kodály, o método do, do japonês...
Suzuki.
Suzuki, né. A metodologia geral deles né. E depois diversos autores que trabalham com ensino
coletivo de instrumentos de banda especificamente né e diversos livros afim, e por último, eu
peguei foram vinte e um métodos de banda, pegando assim, desde da década de 40 que eu
encontrei, até no momento que eu tava escrevendo, que foi em 92, 93. Assim, os que eu pude ter
acesso, né. E fiz uma, e analisando esses trabalhos todos, e tinham diversas dissertações que eu
pude, olhar de mestrado e doutorado, nessa que trabalhavam, e experimentavam diversas
metodologias de ensino, dentro da metodologia coletiva né. Aí, eu acho que foram, olha, os autores
todos, não quero impressionar, acho que teve uns catorze dissertações, de mestrado e doutorado,
que fizeram experimentos, dentro do ensino coletivo de instrumentos de banda, o que usar, se
ensina isso e se ensina aquilo primeiro, sabe?
Todas essas americanas?
Todas essas americanas, todas americanas né? Então, quando eu passei, incluindo essa da Linda
Kruger que eu né, que era pra cordas. Então, a partir desse arcabouço de idéias né, eu podia passar
mais ou menos só uma linha desses métodos todos né, que todos eles trabalhavam. Aí eu decidi,
como seria mais ou menos o método, porque o método poderia sair. Quer dizer, eu baseei
francamente, em cinco itens, depois de organizar essa, essa bibliografia toda. E em geral, o ensino
de instrumento individual é muito em leitura de partituras e técnica instrumental (interrupção).
Então, são cinco pontos importantes que eu achei que devia incluir no método a partir das
255

experiências que eu vi né. Umas das experiências que foram feitas, experimentos científicos que
foram feitos, que realmente mostravam que podiam ser incluídos no método e outros que eu ainda
estava em dúvida, sabe? Principalmente assim, uma linha de Educação Musical muito forte nos
Estados Unidos na época que eu tava lá, o Comprehensive Musicianship, que é trabalhar a
musicalidade inteira do aluno né. E aí tem métodos de banda que trabalham muita criatividade,
improvisação, trabalham composição desde o início né, e com menos ênfase em técnica
instrumental, esse negócio todo? Mas quando eu olhei pra tudo isso, eu bati em cinco pontos
importantes, que era realmente, a leitura, né, a técnica instrumental, logo em seguida a percepção,
então, do método uma grande linha fazia em cima de cantar né. Edgar Willems que através das
canções que você canta né, cantando que você desenvolve as questões rítmicas, as questões de
afinação, questões de textura musical, de interpretação das frases, das canções né. È, isso ainda,
quer dizer, o método todo em cima de Canções Brasileiras baseado no que Kodály diz que
“aprender o desconhecido através do conhecido”, né. E esse conhecido né, ele disse que é a língua
musical mãe que nós temos né. Então, isso tá presente na nossa música folclórica, na nossa música
popular. Então, e o desconhecido seria exatamente a leitura musical e auxiliar (??) a técnica
instrumental. Quer dizer, o instrumento, aprender música através da nossa língua musical mãe,
como Kodály coloca né. Por isso que é um método todo ensina o repertório de música folclórica
brasileira, né. Bom, então vamos lá, leitura musical, técnica, aí depois percepção, cantando em
cânones, em cantando o método todo ali, teoria da música atualmente né, tem diversas teorias,
organizando a teoria da música toda ali, e por último, a criatividade, onde o método inclui
atividades de improvisação, né, eu ainda inclui composição, né, alguns métodos inclui, mas eu
coloco improvisação dentro do método, logo no começo, já, o aluno sabe duas notas, a gente já
começa a trabalhar improvisação. Com esses cinco itens que eu retirei de vários autores que
pesquisaram e analisam todo o ensino coletivo né, para buscar né.
14. E Joel, pra finalizar, você tem alguma consideração final a fazer sobre o seu trabalho,
sobre o ensino coletivo, e até mesmo uma sugestão a fazer?
Deixa eu pensar aqui (risos).
Sobre alguma sugestão, alguma coisa, alguma pessoa que você acha que eu deva entrevistar,
alguma, alguma palavra final?
Eu acho assim, uma pessoa que seria interessante se você voltar pra São Paulo e conversar, embora
a área dele é mais de sopro também né, mas ele desenvolveu um trabalho de ensino coletivo
também no SESC, atualmente, é o José Coelho de Almeida, que é o ex-diretor do Conservatório de
Tatuí. Ele reside em Tatuí novamente. Ele foi diretor por muitos anos né, foi uma pessoa que, acho
que, deu o pontapé, eu vi o método coletivo, mas eu não conheci e não entendi nada também, né.
Depois que eu fui entender e fui entender a idéia dele né.È igual a idéia dele, ele traduziu o método
americano pro português. Hoje, quer dizer, o que eu to fazendo hoje, quer dizer, foi um erro que eu
fiz ao fazer o método que hoje eu estou tentando corrigir, se você for, fazer um novo método ou
não né. Mas, por exemplo, eu achei que essa história da língua musical mãe que a gente usava no
método bastava eu usar a música, o código? brasileiro ou a música brasileira. Mas na verdade, na
construção do método, tipo assim, o quê que aprende primeiro? Aprende isso, depois aprende
aquilo. O quê que aprende primeiro? Qual é o intervalo brasileiro? O intervalo de segunda maior,
segunda menor, terças? O que vamos aprender primeiro no instrumento? Qual ritmo que a gente vê
primeiro? Vai vim isso, vai vim sincopas, seguida de pontuadas, seguida de colcheia? Quer dizer,
nessa seqüência toda, eu quando arranjei os métodos americanos, eu vi que quase todos eles tinham
a mesma seqüência dos elementos que deviam ser aprendidos, tanto em teoria quanto em ritmo,
quanto à seqüência de notas nos instrumentos. Eles tinham uma seqüência muito parecida, sabe?
Vinte e um métodos, tanto os antigos quanto os mais recentes. Aí quando eu vi isso, eu falei assim :
“Ah, vou seguir!”. Eu peguei mais ou menos um padrão geral daquilo lá. Eu peguei a seqüência dos
elementos a serem ensinados em cada página do método, certo? Aí eu fui encaixando música
brasileira de acordo que, com, atingisse aquele andamento do aprendizado, sabe? Hoje a minha
pesquisa mudou, eu tô procurando estabelecer através do que a professora Alda de Oliveira na tese
dela, ela analisa elementos musicais mais freqüentes na nossa música. O quê é mais freqüente, é o
tom maior ou o tom menor. O quê é mais freqüente? A escala pentatônica? O quê é mais freqüente,
o ritmo de síncopa ou semínima pontuada com, semínima pontuada com colcheia? Sabe? Então,
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quais são os ritmos na seqüência? Então, a partir disso, a gente vê, se isso é mais freqüente do que
aquilo, então isso deve ser aprendido antes do que outra coisa? Então, isso eu baseei, inicialmente,
do método americano, certo? Eu tirei de lá e encaixei na brasileira. Hoje, pelo contrário, eu tento
estabelecer essas seqüências, ?? a serem aprendidos. “Ah, primeiro eu vou ensinar...” . A primeira
nota do meu instrumento é sol, né, talvez a segunda deva ser um fá, intervalo de segunda maior, ou
então, deve ser um fá sustenido, porque a segunda menor é mais recorrente. Nós estamos fazendo
um estudo de freqüência de elementos musicais pra estabelecer essa ordem de metodologia , pra
depois, a partir daí, encaixar as músicas, né. Eu quis, eu baseei na música brasileira porque na
música brasileira, mais esse cerne né, que era assim, o quê aprenderia antes né. Quer dizer, baseado
nos resultados que nós temos hoje, tanto na pesquisa da professora Alda de Oliveira quanto o que
nós tínhamos feito, quer dizer, não fugiu muito do que o método tem de importado dos Estados
Unidos, mais uma adaptação né, com exceção da coisa rítmica né, que realmente a síncopa aparece
??? um pouco mais cedo no método né. ??? E um pouco mais de músicas com, em tom menor.
Porque lá é uma, é bem menos, a música é mais em tons maiores né. As escalas nordestinas, como
conhecemos, e mais, tem muito pouca, acho que posso incluir mais. Então, quer dizer, hoje a
pesquisa, olhando para nossa língua musical mãe, eu acho assim, eu to refazendo o método
sozinho.
Então Joel, muito obrigada ! Espero te reencontrar, revê-lo em breve! Muito Obrigada!
Às ordens!

Entrevista nº9 : ENALDO OLIVEIRA


Local : São Paulo
Data : 10.08.2002
Horário : 10 h

1. Bom Dia, Enaldo! Para iniciar essa entrevista, eu gostaria de saber como se deu seu
primeiro contato com a música?
Eu comecei a estudar música quando eu tinha sete anos, em Belém do Pará. Primeiro eu fiz um
curso de musicalização, somente pensando na preocupação do fazer musical, sem uma abordagem
instrumental. Aos nove anos eu comecei a estudar violino, com dezessete anos, eu fiz a, eu mudei
pra São Paulo pra fazer o bacharelado na Faculdade Santa Marcelina e depois eu fiz o mestrado na
Universidade de São Paulo e é basicamente essa a minha formação musical, né.
2. E como se surgiu o seu interesse pelo ensino coletivo?
O ensino coletivo foi mais ou menos a uns, deixa eu ver, meu filho tem oito anos, mais três onze
com mais dois (risos), mais ou menos, uns treze a quinze anos atrás, por intermédio de um amigo
meu chamado Mário Vergio que foi aluno do professor Alberto Jaffé. E ele me mostrou um CD que
o professor Alberto Jaffé gravou com os alunos do SESC pra demonstração do trabalho dele. Esse
CD foi, esse CD não, esse LP, na verdade, foi gravado com oito meses de trabalho dos alunos e o
resultado musical desse, desse disco, despertou toda a minha curiosidade pra como se realiza essa
questão do aprendizado musical coletivo. O aprendizado instrumental coletivo.
3. E qual é a sua experiência em relação ao ensino coletivo? Aonde você trabalhou? Em que
lugares você atuou e atua?
Bom, a partir dessa, desse despertar para o ensino instrumental coletivo, eu comecei a querer a
trabalhar com essa prática de ensino. Trabalhei alguns anos na Escola Britânica de São Paulo, onde
eu tinha classes de ensino de cordas, foi muito bom porque eu trabalhei junto com o professor
Coelho de Almeida, José Coelho, que é um excepcional professor de banda, também pra fazer
iniciação instrumental. E depois eu fui trabalhar na Universidade Livre de Música, eu tinha um
projeto lá pra criar classes coletivas e heterogêneas, você sabe muito bem o que significa classes
heterogêneas, violino, viola, violoncelo e contrabaixo. Mas infelizmente não havia disponibilidade
de recursos pra fazer dessa maneira, aí eu comecei fazendo ensino coletivo de violino, com classes
de dez a quinze alunos. Foi quando surgiu a oportunidade de eu trabalhar no Projeto Guri, que o
Projeto Guri estava no início, tinha apenas dois pólos e eu vim justamente pra fazer uma
sistematização pedagógica dos procedimentos que o Projeto Guri precisava. Porque ele tinha mais
257

ou menos um ano de fundação, tava trabalhando em termos de metodologia de uma maneira um


pouco curiosa e aí eu vim justamente, consegui fazer uma reestruturação de toda essa área
pedagógica do projeto, criando quanto alunos precisamos ter em turma, qual é a periodicidade das
turmas, como se trabalha dentro do ensino coletivo, né.
4. E Enaldo, então me fala sobre essa experiência no Projeto Guri? Como se dá, qual é a
carga horária das aulas, qual é o número ideal de alunos que você acha, me fala um pouco
como funciona?
Olha, eu queria falar antes um pouco do quê que é ideal para o aprendizado de música, né? O ideal
para o aprendizado de música é que você tenha aulas individuais diárias com pelo menos uma hora,
duas horas de aula, com um professor. Obviamente isso tem um custo fenomenal e nós teríamos
que ter milhões de pessoas como Airton Pinto, Maria Vishnia, como Watson Kliss??, para dar aula
pra tanta gente, nessa maneira. O ensino coletivo vem justamente pra tentar utilizar a questão de
recursos de infra-estrutura e de pessoal né, pra que um professor com uma qualidade, de uma boa
qualidade, possa atender a um número maior de alunos. Dentro do projeto, eu comecei trabalhando
na FEBEM com turmas de, que tinha, três vezes, aula três vezes por semana durante duas horas.
Eram turmas de violino, viola, violoncelo e contrabaixo e a gente tinha mais ou menos dentro de
cada turma, de vinte e cinco a trinta alunos, né. O quê que é ideal dentro do ensino coletivo? É que
você tenha pelo menos uma periodicidade de quatro vezes por semana, e uma hora e meia de aula.
Ou seja, uma carga horária de seis a oito horas por semana, né. Como dentro da FEBEM a gente
tinha facilidade de os alunos estarem no local de, aonde aprendiam os instrumentos, então a gente
conseguiu fazer três vezes por semana. O quê acontece é que alguns pólos do Projeto Guri, apesar
de estar muito próximo a população que eles atendem, a gente tem dificuldade em colocar uma
periodicidade de três vezes por semana. Porque significa gastos desse aluno com transporte ou
mesmo esse aluno precisa trabalhar, então em geral, dentro dos pólos do Projeto Guri, a gente
trabalha com duas vezes por semana, com uma média de uma hora e meia de aula pra cada turma
né. Os sopros dependendo da carga horária que a gente tem pra cada pólo, varia de uma hora a uma
hora e meia também.
5. E em relação, você acredita que existe alguma, quais são as vantagens dessa abordagem de
democratização do ensino de música e dar uma maior acesso as pessoas iniciarem o
instrumento...
(Interrompendo) Isso.
Quais as vantagens desse ensino, as outras vantagens de se iniciar através do ensino coletivo e
se existe algumas desvantagens? Como é que você vê em relação ao ensino individual?
Olha, as vantagens que o método tem é principalmente a otimização de recursos instrumentais, ou
seja, tem um número de instrumentos que você pode utilizar para vários alunos ao mesmo tempo,
né. E também, a otimização do tempo do professor, em que eu tenho que, eu tenho um professor
que pode atender, um bom professor que pode atender um bom professor que pode atender um
grande número de alunos. Eu acredito que realmente essa seja a melhor das vantagens né. Porque o
Projeto Guri hoje está indo pra 106 (cento e seis) pólos, pra atender vinte mil crianças. Se eu
tivesse que atender esse número de crianças com professores individuais, a gente teria que ter um
número enorme de professores individuais, né. Tanto quanto no processo coletivo quanto no
processo individual, a periodicidade do número de aulas por semana precisa ser grande,
infelizmente aqui no Brasil, a gente sempre tem aquele costume de que o professor tem uma aula
por semana com o aluno e esse aluno vai embora pra casa e passa sete dias. Se você for pensar um
pouco como é que se aplica aulas individuais, por exemplo, na Rússia. Você vai ter que, você vai
ver que os alunos têm pelo menos duas aulas por semana de duas horas, individualmente. Então,
também é uma grande carga horária de aula, né. Então, como eu tava falando, a questão da
otimização do número de professores, perdão eu me perdi. Tanto faz no processo individual quanto
no processo coletivo, o aluno precisa de um grande número de aulas, né. Então, qual é a tendência
desse número enorme de alunos, vinte mil, com aulas individuais, ele precisaria de um número
enorme de professores. E que todos esses professores, fossem capacitados para formar alunos, né,
utilizando essa prática coletiva, precisa de um número muito menor de professores. E, necessitando
de um número menor de professores, eu tenho a possibilidade de escolher melhor quem são esses
professores, e que tem o perfil para trabalhar com os alunos. Porque a gente tem algumas falhas lá.
258

Por exemplo, ninguém possui uma formação específica para ser professor de instrumento. Em geral
o instrumentista que aprendeu a tocar, e aí vai transmitir seus conhecimentos pros alunos. Isso
muitas vezes, isso muitas vezes da certo, mas muitas vezes também dá errado. Porque você precisa
toda uma formação metodológica, pedagógica de como ensinar o aluno que isso não é passado
quando você aprende a tocar o seu instrumento, né. Então, pra gente ter dentro do Projeto Guri um
número, eu já nem sei quantos funcionários a gente tem hoje, mas eu acredito que esteja por volta
de uns quinhentos a seiscentos funcionários, dentre esses, pelo menos uns quinhentos devem, ser
professores, né. Pra gente ter quinhentos professores com o perfil pedagógico de forma, que tenha
uma formação para dar aulas, independente se elas são coletivas ou individuais, é necessário um
grande esforço pra formar esses professores. Imagina atender esses vinte mil alunos, eu precisaria,
chutando alto, pelo menos uns quatro mil professores, né. Então, pelo menos, oito vezes a mais
esse número de professores. Então, eu acredito que realmente, a principal vantagem do ensino
coletivo, se reside nisso, de utilizar um número pequeno de recursos e ampliar esse número de, de
recursos em relação a questão do número de atendimentos. Obviamente, que existem outras
vantagens, existe a questão da socialização desse aluno porque ele está justamente começando
dentro de uma prática coletiva, ele aprende a respeitar e a manter as relações com seus colegas, né,.
Por exemplo, se hoje nós estamos dentro da mesma sala de aula e eu tenho uma dificuldade, e você
não respeitar esse meu momento, amanhã pode ser que você tenha uma dificuldade e eu também
vou me sentir no direito de não respeitar. Então, essa questão do respeito mútuo e do respeito em
viver na coletividade, é muito aprendida pelos alunos, né. Você respeitar o teu semelhante, aquele
que é aluno como você, é uma das lições que se aprendem rapidamente, né. Por outro lado, o fazer
musical coletivo, o professor Jaffé tinha uma frase que era muito boa, ele dizia assim : “Quando
você aprende a tocar um instrumento de cordas, como por exemplo, o violino as sonoridades
iniciais são extremamente ruins, a produção do som e tudo mais é uma coisa que realmente não dá
muita satisfação, quando você coloca isso dentro de um grupo, né, do processo ensino coletivo,
essas, essas, esses sons não muito agradáveis, eles vão se amenizando e aí, a sonoridade em si fica
quase aceitável”. Essa era mais ou menos a frase dele. Porque ele queria dizer com isso é que
quando você ta estudando violino, por exemplo, individualmente a sonoridade é muito ruim. A
somatória dessas sonoridades dentro de um grupo, ela fica quase aceitável. Não fica tão ruim
quanto individualmente. Bom isso gera pro aluno, um estímulo realmente adicional, porque ele não
percebe tanto as coisas ruins que tem no seu próprio som e o resultado musical acaba
entusiasmando ele porque ele ta percebendo uma coisa melhor do que realmente a realidade
individual dele, né. Tem esse aspecto. Um outro aspecto que a gente pode abordar (interrupção).
Então, continuando...
Nós estávamos falando do incentivo ao aprendizado musical pela questão de uma percepção um
pouco mais satisfatória pela questão do processo coletivo. Dentro do Projeto Guri, eu pude
perceber também um aspecto muito interessante relacionado a auto-estima do aluno,
principalmente em relação a Febem. Por exemplo, como é que se, como é que se pode perceber
essa melhora da auto-estima. Os alunos vão pra Febem ou todos os nossos alunos que tem um perfil
culto, social desfavorável, eles recebem a seguinte mensagem da sociedade : “Você não serve para
viver em sociedade ou você não serve para ter um bom atendimento médico ou você não serve para
ter uma boa casa”, né. Então, isso deixa a auto-estima do aluno, a realidade social dele, deixa uma
auto-estima muito baixa, né. a mensagem básica que ele tem dentro dele é “você não serve pra
nada”. Com o desenvolver do processo de aprendizagem instrumental, ele começa a perceber que
ele serve pelo menos para aprender a tocar um instrumento. E se ele é capaz de aprender a tocar um
instrumento e produzir algo tão bonito quanto à música, ele capaz de fazer outras coisas tão bonitas
quanto isso. E isso começa a desenvolver essa auto-estima no aluno. Por exemplo, dentro da
Febem, pra preparação do primeiro concerto, eu deixei que eles escolhessem a roupa que eles
queriam tocar. Extremamente preocupado porque eu achei que ia dar tênis, calça de boca larga e
camiseta. Eles escolheram sapato social, meia social, calça social, cinto social e camisa social, né.
Eles tinham um extremo orgulho de ir para o palco e receber os aplausos, né. Porque isso tudo
significava a prova pra eles e pra sociedade que eles servem sim para alguma coisa, né. Isso eu
também percebi dentro de vários outros locais economicamente desfavoráveis que eu trabalhei.
Outra coisa importante que me aconteceu dentro da Febem foi mais ou menos em maio, final de
259

maio daquele ano, nós estávamos preparando para fazer o concerto de Campos de Jordão. E ouve
uma grande rebelião dentro da Febem, eu não sei se você conhece a Febem, mas ela é um
quadrilátero imenso e dentro desse quadrilátero tem várias casas separadas e todos as casas têm um
sistema único de direção e de organização e de instalações. Então dentro de uma delas ouve uma
grande rebelião em que só não fugiu quem realmente não queria. E os alunos que não quiseram
fugir foram meus dois alunos do projeto, eles disseram : “Não” . Eles disseram pros colegas: “Nós
não vamos fugir porque tem concerto em Campos e nós queremos tocar”, né. Isso demonstra que
era uma opção deles entre a vida economicamente e socialmente desfavorável e uma atividade que
provava que eles serviam sim, pra alguma coisa. Por exemplo, mesmo dentro da Febem, eu tinha
muitos alunos que não queriam sair da Febem pra continuar estudando no projeto. E tinha alunos
que saiam e pediam para retornar só para as aulas, pra poder continuar aprendendo e tocando,
aprendendo os instrumentos e tocando junto com a Orquestra da Febem, né. Então, isso tudo
mostra um, uma melhora na auto-estima desse aluno e nessa própria concepção, né. Ele começa a
se sentir inserido dentro de um mundo, né. Mesmo que a realidade dele não seja ainda aquela que
nós gostaríamos que fosse, mas ele começa a se sentir inserido dentro daquilo, vamos dizer, dos
cidadãos brasileiros. Porque a idéia anterior era, a situação anterior, o status anterior era “não sirvo
pra nada”, “não sou cidadão”, “não tenho direitos” e tudo mais, né. Bom, já falamos da questão
musical, já falamos da questão social, existe um outro ponto que é que não se refere
especificamente ao aprendizado coletivo, mas acontece também dentro dele, que é a questão da
melhora no aprendizado formal, né. E aqui o processo coletivo tem uma grande importância no que
se refere à massificação desse estudo, né. Ou seja, ao acesso que toda a população brasileira
deveria ter e não tem. Quando você, como é que funciona o processo de aprendizagem do ser
humano, né? A grosso modo, o ser humano aprende através do seu sentidos, ou seja, existe um
determinado objeto que precisa ser apreendido, esse objeto é captado pelo, pelo sentidos, existe
todo o processo de elaboração do envio dessa informação para o cérebro, o cérebro decodifica e aí,
emite um resposta aquele objeto. Esse é basicamente o processo de aprendizagem do ser humano.
Com a aprendizagem instrumental, né, o quê que você está fazendo, quando você aprende a tocar
um violino, você tá treinando o seu tato, você está treinando a sua visão, você tá treinando a sua
audição, você ta envolvendo a maioria ou quase todos os seus sentidos nesse processo de
aprendizagem e refinando, né. A gente não pode esquecer que aprender a tocar um violino significa
trabalhar as habilidades motoras finas, né. Ou seja, habilidades que você precisa fazer com extrema
precisão, né. Então, o aprendizado musical ajuda no desenvolvimento do, da, dos sentidos né. No
treinamento desses sentidos. Por outro lado, quando você ta na frente de uma partitura que você
olha a partitura e você precisa dar uma resposta motora a essa partitura você também, ou seja, o
processo da leitura musical você também ta acelerando o seu processo de captar informação e dar
uma resposta. Você ta acelerando e treinando esse processo, né. Então você já tem um ganho na
melhoria de dois fatores que estão envolvidos no, na aprendizagem humana. E a terceira parte, ou
seja, o treinamento da elaboração da informação dentro do, específica dentro do encéfalo, existem
muitos, muitos estudos sobre como funciona, como funciona o encéfalo humano e as ligações
sinápticas. Você tem um pouco de conhecimento sobre esse assunto?
Não. Eu tenho mais sobre desenvolvimento cognitivo mas não entrei na parte...
(interrompendo) na parte fisiológica, né. Bom existem algumas discordâncias em relação a isso,
mas a grosso modo, os técnicos hoje em dia dizem que o ser humano nasce com um número X de
neurônios mas que esses neurônios não estão interligados através das ligações sinápticas, né.O
estímulo humano, né, quando uma criança recebe um determinado estímulo, é justamente isso que
força com que o neurônio comece a entrelaçar essas ligações. o estudo instrumental, o estudo da
música já foi mapeado em, em, e se notou que numa determinada parte do encéfalo existe um
número muito grande de ligações naqueles indivíduos que, que mexem, o que aprenderam música
ou que aprendem música, né. Então, essas ligações, o maior número significa a maior capacidade
de processo da informação né. Então, o processo de aprendizagem instrumental melhora o,a
questão do dos sentidos, melhora a veiculação dessa informação captada pelos sentidos pra chegar
ao cérebro e melhora a manipulação dessa informação dentro desse ?? Então, por conta disso, o
aprendizado da música é fundamental pro ser humano porque se você tem toda essa melhoria ao
estudar música, isso faz com que automaticamente você melhore também o aprendizado das outras
260

matérias, como matemática, como história, geografia e tudo mais, né. Aonde é que ensino coletivo
tem a sua importância? quando ele faz a massificação do aprendizado instrumental, né. Só por isso,
é uma vantagem que o ensino coletivo tem, vamos dizer, em relação ao individual. não que o
individual também não tenha todo esse treinamento. Também tem, mas o coletivo faz com que esse
treinamento seja em número exponencial de alunos, né. Porque o individual tem bastante
dificuldade (acabou a fita).
Continuando a entrevista com o professor Enaldo Oliveira.
Sobre desvantagens do processo coletivo, bom, a grande, quer dizer, existem algumas desvantagens
sim. Pra trabalhar dentro de um processo coletivo o professor é, precisa ter uma qualificação muito
melhor do que um individual. Eu acho que essa é um dos grandes problemas do processo coletivo
precisa enfrentar. Ou seja, se hoje em dia nós quiséssemos dar acesso e tivéssemos instrumental
disponível para dar acesso a toda população brasileira, nós não teríamos profissionais capazes de
lhe dar com esse processo coletivo. Individual também não, mas um professor, vamos dizer assim,
mediano individual ele até consegue fazer com que seus alunos aprendam, um professor de nível
mediano do processo coletivo, ele tem extrema dificuldade em fazer com que os alunos aprendam.
Por quê? Porque o processo coletivo ele ta baseado muito nas habilidades do professor em ensinar e
o aluno aprende obviamente independente de sua habilidade de aprender, ou seja, o aluno, um
aluno que tem facilidade de aprendizado, não tô falando só de aprendizado instrumental, mas
aprendizado de qualquer, qualquer tópico da Ciência Humana, um aluno médio, um aluno que tem
muita facilidade e um aluno que tem muita dificuldade, todos eles dependem do, da habilidade do
professor em ensinar. No processo individual, que é aquele processo muito de amostragem, olha
como eu toco e tenta imitar, é, no processo coletivo não funciona, né. Então, eu acho que essa é
uma das principais desvantagens que o processo coletivo enfrenta hoje em dia. Bom, algumas
pessoas, alguns teóricos, colocam a questão do problema coletivo ser apenas para a iniciação, né.
Existem várias pesquisas realizadas atualmente em que tentam aplicar o processo coletivo não
apenas um processo de iniciação instrumental, mas também no estágio médio de aprendizado, né.
Ou seja, quando ele acaba com o processo de ensino coletivo, ele pode sim, continuar dentro do
processo coletivo, muitas vezes não heterogêneo, mas sim, homogêneo, né, mas ainda dentro de
uma classe de alunos maior que o individual. Então, eu acho que isso é um desafio que, que os
pesquisadores estão tentando enfrentar hoje em dia. Quer dizer, levar o ensino coletivo também
para o ensino médio. No ensino avançado, realmente não tem como ser aplicado, né. Porque muita
gente diz : “Tudo bem!” , o sistema Master Class.. Você tem noção exata do que significa coletivo
heterogêneo, coletivo homogêneo, Master Class? Então, o, muita gente acredita que a Master Class,
por exemplo, seja uma maneira de se ensinar coletivamente para os avançados. Eu discordo disso.
Eu acho que Master Class é um processo individual de aprendizagem, né. Apesar de ter gente na
platéia assistindo. Então, pros alunos de nível avançado, realmente, ele, o processo coletivo não
funciona, né. Que mais a gente tem de desvantagem? Eu acho que aqui no Brasil, a grande
desvantagem que a gente enfrenta é justamente a questão da periodicidade do número de aulas. Que
o processo coletivo exige que seja maior do que, do que, aliás o número mínimo ideal de quatro,
né. Dentro das grandes cidades como São Paulo, isso se torna quase que inviável, pela questão de
distância de tempo de deslocação, de custo financeiro pra esse aluno que tem que pegar três
conduções, ás vezes, é uma criança de sete anos, então, são duas conduções pra vir ou mais duas
pra voltar, pelo menos, no mínimo, né. Então, essa é uma outra desvantagem, de que eu acredito
que atualmente no Brasil, nós estamos trabalhando com um número muito inferior aquilo que eu
acho que deveria ser esse processo coletivo. E também, aqui no Brasil, uma outra desvantagem que
nós temos, é que esse processo coletivo não é aplicado dentro das escolas, né. Se você aplica esse
processo coletivo dentro das escolas, primeiro lugar, o aluno já tem que ir cinco vezes por semana
para escola estudar, né, você colocar isso dentro da carga horária do aluno mais quatro aulas de
música, é fácil desde que tenha vontade política para fazer isso, né. E aí quando eu digo vontade
política, não apenas nos políticos, mas de diretores, coordenadores, professores, colegas e próprios
professores de música, né. Então, eu acho que realmente o ensino coletivo tem estar, o ensino
instrumental tem que estar dentro das escolas, né. Eu acho que uma escola como a Universidade
Livre de Música ou como o Conservatório de Tatuí, precisa se concentrar no nível de
aperfeiçoamento, não de, não de massificação, né.
261

6. E Enaldo, me fale um pouco do seu estudo, da sua dissertação de Mestrado que fala sobre o
ensino coletivo? E nessa pergunta você pode abordar o seu referencial teórico, onde você se
baseou?
Tá legal. O meu trabalho de mestrado, ele é o estudo analítico de três metodologias, né. Uma delas
foi do professor Paul Rolland que trabalhou no estado de Illinois e criou um projeto de ensino
coletivo de violino, viola, também aplicado a violoncelo e contrabaixo, por todo estado. Ele fez
um, uma pesquisa trabalhada na questão do equilíbrio postural, movimentos, como se realiza
movimentos pra tocar e exercícios não musicais, vamos dizer assim, exercícios motores para
auxiliar no aprendizado dos movimentos do instrumento. O segundo autor foi Samuel Applebaum
que dentro dos Estados Unidos, vamos dizer assim, foi o primeiro, ou foi um dos primeiros a ter
um extenso material escrito para o aprendizado coletivo, né. Os livros deles, porque tem várias
séries, tem o “String Builder”, tem o “First Program For String Orchestra”, tem vários, vários. Eu
acho que foi a primeira coleção sistematizada e de grande porte para aprendizado coletivo. E o
terceiro, o terceiro, a metodologia, ela foi feita pelo Anderson e pelo Frost que é o “All for Strings”
é uma abordagem mais moderna, já daí, da década de 80, 90, né. E que é um sucesso editorial nos
Estados Unidos, né. Então, o quê que eu fiz, eu peguei essas três metodologias, fiz uma, fiz um
estudo analítico de como, do conteúdo programático dessas três metodologias, né, e propus uma
síntese dessas três dentro de um programa específico, né. Então, por exemplo, o Rolland, ele tem
exercícios motores de como segurar o instrumento, como segurar o arco, como desenvolver uma,
toda essa movimentação. O Samuel Applebaum, a metodologia dele tá muito baseada na troca de
cordas e na aprendizagem da leitura musical imediatamente, né. Então você introduz o primeiro
dedo na corda ré, depois na corda lá, depois na corda mi e depois na corda sol, no caso específico
do violino, né. Então, toda vez que você introduz um problema, você acaba introduzindo ele nas
quatro cordas e com leitura musical. O “All for Strings” ele já, primeiro estabelece um padrão em
cada corda, ou seja, ele coloca primeiro, segundo e terceiro dedos, no caso do violino, na corda ré,
pra depois levar isso pra corda lá, né. E só bastante tempo depois é que ele aborda a corda sol e a
corda mi. Então, eu comecei a pensar isso tudo bastante grosseiramente porque tem um monte de
minúcias aí em relação à, a toda abordagem pedagógica de cada um. Eu comecei a pensar como
que seria um, um conteúdo programático que utilizasse esses três conceitos ao mesmo tempo. E
propus uma síntese dos três num determinado conteúdo programático, né. Então, por exemplo, a
questão do “All for Strings” que primeiro estabelece um padrão na corda ré, isso eu mantive, mas
eu antecipei e muito a utilização desse padrão nas quatro cordas, que é justamente o conceito do
Samuel Applebaum, né. E o Paul Rolland, ele tem uma, a questão daquilo que ele colocou no, da
não necessidade da leitura musical para aprender a movimentação do violino, né, porque na
verdade, no início você não precisa do aprendizado teórico, você ta ensinando a tocar um
instrumento, você ta ensinando a realizar movimentos. Então, mais importante que a gente se
concentre na minha opinião na realização dos movimentos do que não, do que necessariamente na
leitura musical, né. E aí, eu peguei isso e apliquei também na metodologia do Anderson e Frost do
“All for Strings” que tem o seu início em que eles intitulam “Start by Root”, né, em que eles
utilizam uma simbologia criada por eles para, para, para desenvolver a primeira parte do programa
antes da introdução da leitura musical, né. Então, eu juntei tudo isso e tentei criar um conteúdo
programático específico (Pausa/interrupção).
7. Enaldo, em sua opinião, como é que está a Pesquisa em Educação Musical, no geral e em
específico, no Ensino Coletivo? Você conhece algumas dissertações? Como é que você vê a
área do Ensino Coletivo e na Educação em geral, na Educação Musical?
Olha, no Ensino Coletivo, graças a Deus, eu to vendo a coisa começar a crescer. Quando eu fiz a
minha dissertação, só existia um outro título nessa área de Ensino Coletivo de Cordas. Depois da
minha já teve a do João Maurício, to sabendo da sua do...
Abel
sei da do Abel, também a do, como é que chama lá da Bahia?
Joel Barbosa.
Joel Barbosa. Então, eu to vendo que as pessoas estão começando a despertar pra essa questão do,
da pesquisa do ensino coletivo instrumental, né. A questão da Educação Musical em si, ela, eu acho
que a gente ainda tem muita coisa pra pensar, tem muita coisa pra resolver, a gente não tem aqui no
262

Brasil, uma formação de Educadores Musicais e principalmente a formação de professores em


instrumento. A gente tem pessoas que dão aula mas sem essa preparação, sem esse perfil de
professor e isso obviamente se reflete na questão toda da pesquisa e também, não só de pessoas que
não produzem a pesquisa, mas também, pesquisas que não, não, não estão, não estão, vamos dizer
assim, não conseguem ainda formar os professores que a gente precisa. Eu tive chance, eu fiz um
curso na Austrália o ano passado, em julho do ano passado, eu tive chance de ter contato com três
pessoas muito interessantes, um deles é o professor Bob Kuber (?) da Universidade de Michigan,
em que ele me mostrou como é que é o curso de Bacharelado para a formação de um professor de
música instrumental. no primeiro ano, o aluno, entre todo o resto que ele precisa aprender, ele
precisa aprender de verdade dois instrumentos de cordas, no segundo ano, dois instrumentos de
sopro, no terceiro ano, percussão e durante os quatro anos regência e no quarto ano também
arranjo. Então, a pessoa sai de lá, completamente capacitada pra sozinha tocar um programa de
música dentro de uma escola nos Estados Unidos. Em nenhum lugar, eu vejo isso aqui no Brasil, e
nem as pessoas começando a pensar um professor de música precisa ter essa formação.
Obviamente, além de estudar esses instrumentos ainda tem matérias sobre pedagogia e didática, né.
o próprio professor Bob Kuber tem um trabalho muito interessante que ele chama “Master Teacher
Profile”, né e que é muito bem pensado como precisa ser esse perfil do professor, em relação não
só à questão do conhecimento do instrumento, mas a questão do conhecimento de como é sua
própria postura dentro da sala de aula e como é o aluno que ele enfrenta. Esse tipo de coisa, eu não
vejo muitas pessoas se, preocupadas aqui no Brasil, né. Elas estão questionando pontos específicos
e também ainda preocupada com a questão da musicalização infantil, né. E uma musicalização que
não necessariamente está voltada para o aprendizado de instrumento. Eu não acredito muito nesse
processo de Educação, de Musicalização sem abordagem do instrumento né. Eu não, pra mim é
como uma criança aprender a ler antes de aprender a falar, né. Por isso também, que eu coloco a
leitura musical não em segundo plano, mas atrás do aprendizado da produção do som do
instrumento né. Eu acredito que o aluno precisa primeiro emitir o som pra depois aprender o
símbolo que representa esse som, né. Então, eu acho que ainda precisa, nós temos muita coisa a
fazer nessa da Pesquisa em Educação Musical e na Pesquisa dos Instrumentos de Cordas, a gente
não pode esquecer que a primeira classe de instrumentos de cordas nos Estados Unidos, de
instrumento coletivo musical nos Estados, da primeira classe de ensino instrumental coletivo nos
Estados Unidos que se tem registro foi em, por volta de 1800. O primeiro método editado foi antes
de 1950, 1851, né. E a gente só tem alguns pensamentos sobre esse assunto em meados do século
passado, nós temos o trabalho do professor Jaffé que aconteceu na década de 70 e 80 e as pesquisas
que estão surgindo agora. Então, tem um campo muito, muito grande pra ser desenvolvido.
8. E pra finalizar, Enaldo, você tem alguma sugestão a fazer em relação a pesquisa, a minha
pesquisa? Ou você tem outra sugestão? A palavra é sua...
Opa! Olha eu acho que é assim : eu posso falar algumas coisas em relação a professora e em
relação a pesquisa, ao pesquisador. Eu acho que o pesquisador é aquilo que você ta fazendo é
muito importante, porque provavelmente vai ser o primeiro trabalho que considera a questão do
lado social. Eu acho que você pode também além de se preocupar com o lado social e aí você vai
precisar realmente de uma ajuda de alguém da área social, porque são conceitos que obviamente
você pode aprender sozinha, mas se você tiver a ajuda de um, de um co-orientador da área social
vai ser extremamente benéfico, você pode também ampliar isso um pouco mais pro lado do, da
questão da aprendizagem e também talvez ir um pouco mais a fundo na questão da, do processo de
aprendizagem instrumental. Bom, a primeira, a segunda coisa que eu te falei, o que significa,
explorar um pouco mais a questão de como o ser humano aprende e como é que é esse processo,
como é que o processo instrumental coletivo influencia isso. E o segundo ponto, fazer uma
pesquisa maior sobre métodos, porque o material escrito, a parte menos importante de um “Master
Teacher Profile”, né. Mais importante é você ter na cabeça todas as possibilidades que você
precisa explorar, você ter na cabeça exatamente aquilo que você precisa ensinar em dois anos. E
dependendo da turma, você vai pegando o item A, ou o item C, ou o item F, ou o item Z, né. Você
ser capaz de ter essa mobilidade com todas as turmas que você tem, né. Se você tem uma turma de
crianças de sete anos, você precisa ir com uma determinado, é, com um determinado cronograma
né, e com determinado conteúdo programático, com uma determinada linha de conteúdo
263

programático, né. Se você tem uma turma de nove a onze, você já pode mexer nisso bastante. Se
for de onze a treze, muito mais, né. Se for de quarenta a cinqüenta, é um outro perfil
completamente diferente e você precisa ter o conhecimento de vários métodos né, escritos, pra
poder utilizar tudo isso a seu favor, né. Então, eu acho que você deveria ampliar. Por exemplo, a
minha pesquisa foi análise de três métodos né. Então, eu conheci profundamente três métodos,
conheço outros, né, e dentro da minha prática de ensino eu consigo utilizar todos esses, todos esses,
vamos dizer assim, esse material impresso a minha disposição. O conteúdo, a linha do conteúdo
programático eu faço de acordo com a minha necessidade dentro da sala de aula. Então, por
exemplo, na ULM no semestre passado, eu iniciei quatro turmas de violino. Uma turma em que os
alunos já tinham algum conhecimento musical e até algum conhecimento instrumental, então, essa
turma teve um desenvolvimento bastante rápido. Uma turma que é de cinco alunos apenas, uma
turma que tinha alunos com dificuldade de aprendizagem e uma quarta turma que tinha alunos com
dificuldades de aprendizagem, de desenvolvimento motor, com problemas de bloqueios
psicológicos grandes e com problemas sociais, porque tinham três alunos que eram de um orfanato,
isso tudo dentro da mesma turma, então, eu tenho que ser capaz de utilizar a, todo o meu
conhecimento, de como ser humano aprende, de qual é essa realidade social desse ser humano, e
todos os métodos de, de violino que eu tenho a mão para utilizar, pras quatro turmas diferentemente
e tirar dessas turmas, o melhor que eles podem dar né, porque apesar de eu estar da ULM, eu tenho
a completa, a ULM é uma instituição que está preocupada com a formação de instrumentistas, né,
eu tenho que ter sempre em mente qual é o meu papel como professor, como eu influencio
enquanto professor na formação de um ser humano? Né, na educação desse ser humano e caráter
desse ser humano, né. Então, eu tenho que utilizar todo esse conhecimento para tirar o máximo que
ele pode me dar, né. Eu nunca esqueço, eu estudei com a professora Maria Vischnia que foi aluna
do Max Rostal. E ele sempre dizia : “eu não to interessado naquilo que você pode enquanto aluno
me dar, ou seja, se você tem talento, ou sei que lá, eu to interessado naquilo que eu posso te
ensinar”, né. Se eu for capaz de te ensinar muita coisa né, você com sua capacidade vai conseguir
aprender aquilo que você puder. Agora, se eu só puder te ensinar um grão, né, independentemente
da sua capacidade, você não vai conseguir aprender mais do que aquilo, né. Então, eu acho que é
bem isso, você se preocupar nessas três linhas, né.
Então ta Enaldo! Muito obrigada e até a próxima!
Nada!

Entrevista nº10 : JOÃO MAURÍCIO GALINDO


Local : São Paulo
Data : 11.08.2002
Horário : 12:30 h

1. Bom Dia, Galindo! Primeiramente, eu gostaria de saber como se deu o seu primeiro
contato com a música?
Primeiro foi com minha mãe falando que achava a música linda (risos), e não tinha nenhuma
tradição de música na família. Não sou filho de músicos como acontece com freqüência aí. Minha
mãe falava muito e aí, eu achei um dia uns discos de 78 rotações, aqueles antigos e comecei a ouvir
e ficava ouvindo aquilo o dia inteiro. Aí com, engraçado que eu pedia para estudar música e minha
mãe não, nada. Até que eu tava com dez anos de idade e na escola tinha uma professora que
organizou um coro, aí eu comecei a cantar nesse coro. E ela era uma professora meio atípica, ela
era muito legal. Aí eu adorava! Foi a primeira experiência musical foi cantar nesse coro mesmo, né.
Aí com 15 anos resolvi a estudar música, comprei um violão, fui ter aula de violão. Fui ter aula de
Jazz. E aos 17 comecei a estudar viola. Aí fui pra viola, fui estudar, cai num trabalho de ensino em
grupo e em um ano eu já tava tocando na Orquestra Jovem, aqui em São Paulo, aí foi indo. Fiz
vestibular, entrei na Faculdade de Música, sabendo pouca coisa, e fui indo. Foi assim que começou.
2. Ah, que bom! E a essa formação musical, depois da faculdade você fez mestrado?
Bom eu sempre tive aula de instrumento individualmente, aula particular, sempre procurei com
vários professores que eu podia e na faculdade fiz Composição e Regência, né. Foi até difícil eu
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tirar o atraso das matérias teóricas, porque eu não tinha feito no conservatório nada. Mas também
na faculdade, eu encontrava gente que tinha feito anos de conservatório e não sabia nada de
Harmonia, nada, nada de Contraponto. O mestrado eu fui fazer muito tempo depois porque durante
a faculdade eu comecei a trabalhar dando aula no SESC aqui em São Paulo, aulas de ensino
coletivo. Então, quando, quando acabou, eu acabei a faculdade, já tava trabalhando com isso e fiz
concurso pra Sinfônica do Estado e entrei. Então, já tinha dois trabalhos, deixei de lado a idéia de
pós-graduação. Até que depois de vários anos, um amigo meu, pós-graduando da USP começou a
me incentivar. Então, você precisa fazer, precisa fazer. Me apresentou pro maestro Olivier Toni,
que disse que me aceitaria como, como orientando, né, então, me animei e fiz mestrado. Agora to
aí, pensando no dia em que vou fazer doutorado, continuo trabalhando muito. Respondeu ou não?
3. Respondeu. E Galindo, como surgiu esse interesse pelo ensino coletivo? Em trabalhar né?
Primeiro você teve esse contato com as oficinas do Alberto Jaffé na época do SESC. Então,
fale um pouquinho dessa experiência como aluno e como professor no ensino coletivo.
Bom, acho que a, eu fui estudar através do ensino coletivo por acaso. Eu fiquei sabendo desse
trabalho, li no jornal, um amigo me falou. Fui lá e comecei a ter aula. Inclusive no começo eu tava
muito cético, eu achava que aquilo lá não ia dar certo. Depois de uns meses eu vi que dava certo
que eu tava conseguindo tocar mesmo o instrumento. Eu não sei se é uma coisa meio inata, assim,
esse interesse meu especulativo, eu começava a perguntar pro Jaffé, como é que era pra dar aula,
né. E depois de um, de um tempo eu fui ter aula individual com ele particular, porque o ensino
coletivo funciona por um tempo, depois de um ano e meio dois anos de trabalho coletivo, até ele
veio se, dizer pra mim que eu tinha que ter aula individual, que eu era ali, um dos melhores alunos
do grupo, se eu quisesse ter aula com ele, ele gostaria de dar aula pra mim. eu fiquei super
envaidecido, honrado e fui ter aula com ele. E nas aulas individuais, ele, ele, ele era um grande, ele
é, né? Ta vivo coitado! Grande pedagogo. Ele tem um, uma facilidade didática impressionante,
sabe dar aula. E pesquisou o assunto, na área dele de ensino de cordas, ensino coletivo. Então, eu
aprendi, ele não só me ensinava a tocar um instrumento, como ele ensinava como dar aula. Ele
muitas vezes falava : “Olha, o dia que você tiver dando aula, cê também, isso que eu te ensinei
agora também pode ser ensinado de um outro jeito assim, pra você não precisou, mas pode ser que
um aluno assim assado precise, então, veja pode ser ensinado assim também”. Uma coisa assim, o
trinado : “Ò fazer trinado é assim!Tem outra técnica de trinado, você não precisou já ta fazendo,
mas olha é assim que faz, de repente pega um aluno diferente pode ser...”. Então, ele ensinava. e eu
ia anotando essas coisas, eu guardava. O próprio Jaffé chegou a fazer em Campos do Jordão, num
festival em Campos do Jordão, por exemplo, um curso que ele chamou de “Pedagogia de
Instrumentos de Arco”, quer dizer, tinha vários professores de violino lá, no Festival de Campos,
três ou quatro professores, ele era mais um. Só que ele não dava aula de violino, ele dava aula de
como dar aula de violino, né. eu não fiz esse curso, ele falou que eu não precisava fazer : “Pô você
já tem aula comigo, isso aí eu já to ensinando no dia a dia”. Mas ele era um professor, mas ele é um
professor especial. E na época ele era um muito especial. Eu acho que era o único que fazia isso. E
qual era a pergunta mesmo? Eu já fugi da pergunta (risos).
4. E agora em relação à, quando você iniciou a atuar? Sua experiência no SESC e no Projeto
Guri?
Então, o Jaffé foi embora pros Estados Unidos e convidaram um professor pra ficar no lugar dele, o
professor Ailton Pinto, que na época ele era spalla da Sinfônica do Estado. Grande violinista,
grande músico, tinha sido violinista da Boston Simphony, né, e era professor de Música de Câmara
e de Violino na UNESP, onde eu estava estudando, né. Então, ele foi pro SESC, aí ele me convidou
pra trabalhar. Eu era aluno do, ex-aluno do SESC, mas continuava lá no SESC tocando na
Camerata. O Jaffé tinha organizado uma Camerata com os alunos antigos dele, então, essa
Camerata fazia concertos em nome do SESC, a Camerata SESC. Então, de uma certa maneira, eu
ainda tava ligado ao SESC, não era mais aluno do SESC, mas estava nessa camerata. Então, como
eu era aluno do Ayrton e tava na Camerata SESC, ele falou : “João, não quer vir trabalhar lá
comigo, como meu assistente? Assim, vai ser bom pra mim, eu to chegando lá pra ver como é que
é, você é uma pessoa que eu conheço...”. Então, por causa desta ligação com a UNESP, ele me
convidou. Então, eu comecei a funcionar como monitor. Aí, o Ailton, que não era uma pessoa com
experiência de ensino em grupo, o que ele fez? Ele pediu o SESC para contratar um professor de
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cada instrumento. Um professor de violino, de viola, de violoncelo e contrabaixo. Esses quatro


professores davam aulas individuais por pequenos grupos. Quer dizer, ele foi coerente com a
experiência dele. Ele não era um cara conhecedor de ensino em grupo. Então, ele falou pro SESC :
“Eu venho trabalhar aqui, então que seja do jeito que eu conheço. Contrata quatro professores!”. E
ele se tornou regente da própria camerata. E eu? O quê que eu fui fazer? Dar aula pros iniciantes.
Jogaram os iniciantes pra mim. Na verdade, uma das características do ensino individual,
tradicional, assim, de cordas, é que ninguém gosta de dar aula pra iniciante. Então, na hora que ele
contratou quatro professores, eles davam aula para os alunos mais adiantados e os iniciantes
ficavam comigo. Aí eu comecei a botar em prática tudo aquilo que eu tinha vivenciando com o
Jaffé durante dois anos em grupo e mais quatro anos em aula individual. Então, eu era muito cara
de pau. Então, eu tentava lembrar como o Jaffé dava as aulas, e imitava as aulas dele e olhava nas
anotações que eu tinha. E foi dando certo. As pessoas gostavam da minha aula. E aconteceu uma
coisa também interessante que assim, o Jaffé tinha criado um método dele, né, e quando ele saiu do
SESC, ele soube que eu ia dar aula lá, por que aconteceu logo em seguida, ele ainda tava no Brasil,
ele pediu pra não usar o livro dele. Falou : “João, eu quero editar esse método!”, né, “Eu to tirando
SESC todo os meus (...)”, era tudo manuscrito, tudo xerox, “eu to levando comigo, porque eu quero
editar, o SESC não quis editar, eu usei enquanto eu tava aqui. Então, eu pediria pra você não usar!
Se ficar usando, nenhuma editora vai se interessar”. Então, o quê que aconteceu? Em respeito a
isso, eu comecei, eu ia inventar meus próprios exercícios. Então, por exemplo, o Jaffé tinha um
exerciozinho, um dos primeiros que ele usava pra treinar musculação de mão esquerda. Ele
chamava de ginástica, “Ginástica número 1”, era (cantando) “re, fá, re, fá,mi,fá,mi,fá,re,fá,ré,fá, mi,
lá, re, fá, re, fá”. Então eu falei : “Não vou usar a Ginástica número 1, mas vou fazer um negócio
parecido pra treinar a musculação”. Então, eu inventava os meus. Aí eu comecei a comprar método
de violino, ler o prefácio dele, ler as instruções, tocar, comprei um violino, comprei mais violinos,
comecei a tocar, comecei a tocar métodos de viola, comecei a fuçar a método de violoncelo.
Cheguei a fazer um curso de contrabaixo, aulas de contrabaixo pra saber como é que era o
instrumento, e fui fuçando”. E pelo fato, por esse cerceamento que o Jaffé me, me pediu né, de não
usar o método dele, eu acabei inventando um próprio! (risos). Quer dizer, eu não inventei nada, eu
segui a linha dele, só que eu, eu fiz exercícios pra mim, a pedido dele. Depois quando eu fui fazer o
mestrado, eu catei toda aquela papelada que eu tinha feito durante anos, e fui organizando, fui
preenchendo umas lacunas, e acabou virando o meu trabalho de mestrado, entendeu?
5. E nesse início do SESC, quando você pegou as turmas de iniciantes, já era o ensino em
grupo dos quatro instrumentos, né?
Ta, o Jaffé fazia o heterogêneo.
E você não fazia?
Ele botava todo mundo na sala e ensinava. Quando o Ailton Pinto chegou, ele não sabia disso. Ele
não conhecia o assunto como a maioria dos professores do Brasil, né. Então, ele determinou que o
ensino ia ser homogêneo, classe só de violino, só viola, então, eu ia dar aula pros violinos
iniciantes, entendeu?
Ah, ta. Já dava aula em grupo.
Era em grupo. Mas, o que aconteceu, logo o Ailton não ficou muito tempo. Ele saiu, ficou um ano,
eu acho, um ano e aí, ficamos só nós, os professores. Quer dizer, e os professores que ele levou, e
os professores que ele levou também saíram com ele, aí o SESC contratou outros professores.
Então, eu fiquei sendo o professor de viola, eu deixei de ser monitor, eram quatro professores, um
de violino, um de viola, um de violoncelo, um de contrabaixo, né. Depois eu fiquei sendo o de
viola, depois o de viola, de violino saiu. Então, fiquei eu cuidando de violino e viola. E aí, nós
dividíamos as tarefas. Aí a gente, entre nós a gente fazia eventualmente aula, aula com turmas
heterogêneas, né. E eu passei a ensaiar a orquestra, a orquestra dos alunos. A orquestra dos alunos
mais antigos, né. Aí passou a ser um trabalho, voltou a ser um pouco o heterogêneo. Tinha aulas
com grupos homogêneos e também tinha heterogêneos. Eu, professor Leonel Gonçalves Dias, que
é de violoncelo, que foi esse amigo que me incentivou a fazer o mestrado, ele é doutor pela USP e
o Gerson Frutuoso, que ensina contrabaixo, e que continuam, os dois continuam no SESC até hoje,
dando aula, no SESC-Vila Mariana 1, SESC-Consolação 1.
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6. E o Projeto Guri? Como é que surgiu esse início do Projeto Guri? Você está desde o
começo, como se deu esse...
(Interrompendo) O Projeto Guri começou por iniciativa de um, de uma outra pessoa e tava lá
funcionando. E nessa época, eu já era regente da Orquestra Jovem do Estado, que era ligada a
ULM, Universidade Livre de Música. A ULM era um departamento da Secretaria de Cultura,
Secretaria de Cultura do Estado, acho que em 1990, criando um departamento pra cuidar só, só das
atividades musicais, e chamou de Universidade Livre de Música. Escola de Música a qual estavam
ligados como grupos de status : Banda Sinfônica, Orquestra Jovem, eu tava lá. E um dia a diretora
geral do Projeto Guri bateu na porta da ULM pra pedir socorro de ajudo, disse que a parte
pedagógica do Guri não tava legal, ela percebia que as cordas não iam bem, né. Então, ela bateu lá
na ULM, falou com o professor Sidney Lullevantal (?) que era o diretor pedagógico da ULM na
época, “Sidney nós precisamos de ajuda aqui no Guri, a coisa não vai bem na área de cordas, a
gente percebe que a desistência, o número de desistência é muito grande, os pólos fazem muitos
concertos, depois afunda e depois a gente abre pólo em outro lugar, faz outro concerto depois
afunda. Então, o quê que o Sidney fez, ele chamou várias pessoas ligadas à área de cordas, pra uma
reunião com a diretora do Guri. Então tava lá eu, o professor Enaldo Oliveira, que é uma outra
pessoa que se dedica ao ensino coletivo, que tem mestrado no assunto, pela USP também, o
mestrado dele ele fez um ano antes do meu, é uma obra interessante de você consultar, né, chamou
a professora Maria Vischnia, que era uma professora emérita assim de violino, da ULM, o Dario
Sotero que é maestro de Tatuí, e um outro núcleo do governo do estado, onde existe o
conservatório, é uma atividade musical muito importante. E o Dario cuidava de orquestras de,
cuida, acho que até hoje, de orquestras jovem lá em Tatuí, né, orquestra das crianças, de
adolescentes. Não sei se tinha mais algum na época, eu lembro disso : eu, Dario, Enaldo e a Maria
Vischnia. Talvez tivesse mais alguém. Então, ele fez ali uma, um encontro com pessoas ligadas à
área de cordas pra tentar conversar com, com a diretora do Guri. E a gente já conhecia um pouco o
quê tava acontecendo no Guri né, e a gente deu a nossa opinião, deu nossa opinião e desse encontro
ela acabou, pra ser mais objetivo, me convidando pra trabalhar lá, depois de um tempo, pra ajudar
na área de cordas. Eu e o Enaldo fomos trabalhar lá, né. Então, eu propus, nessa época, que se
fosse, que se, que se adotasse um método, que se adotasse um método de ensino. Era meio assim,
cada, cada pólo a pessoa fazia o quê dá na telha, era bem isso mesmo. Não tinha um método. Então,
eu propus assim : “Oh, compra um método, tem tanto método, compra um método do Samuel
Applebaum, por exemplo. Institui que esse método, é o método oficial do Guri. “Ah, mas que
método é esse?”. “Ah, mas é inglês. Inglês a gente não quer. Precisamos de um método em
português!”. Eu falei : “Em português não tem. Só se escrever um”. Aí pediram pra escrever um.
Eu passei a bola pro Enaldo. O Enaldo não quis. Tava muito ocupado, eu não queria. Enaldo não
quis, por, sei lá por que razão, não me disseram e voltou a bola pra mim. Eu falei : “Então, ta
bom!Então eu faço!”. Aí fui fazendo, levou um ano pra ficar pronto. E foi assim que aconteceu.
Realmente o trabalho com cordas, vou ser bem franco, era bem problemático. E até hoje é pelo
seguinte : você vai para o interior do estado de São Paulo, você não tem professores qualificados.
Você não tem professores qualificados pra ensino em grupo em lugar nenhum, né. Os professores
de ensino tradicional tem muito preconceito né. Eles não sabem do que se trata direito, e ficam sem
conhecimento de causa. Hoje em dia ta havendo uma aceitação maior, muito por causa do Guri.
Então, a gente percebeu que os professores não tinham qualificação. Às vezes era, determinada
região do estado você não achava um bom professor de violino, nem pra dar aula individual quanto
mais pra aula em grupo. Aí nós começamos a tentar a fazer treinamentos, fizemos vários já. Eu ia
lá pro interior e juntava um monte de professores da região, lá na divisa com Mato Grosso, do, da
região de Presidente Prudente, do Pontal do Paranapanema, levava o método, o livro dos
professores e alunos, fazia uma orquestra com os professores. Eu passava a dar aula em grupo pra
eles. Eu fazia assim : eu pegava, aparecia um grupo lá de 20 da região, todo mundo tocava
violoncelo ou contrabaixo, eu mandava pegar o violino e a viola e vice-versa. Para eles se sentirem
no começo. Eu começava dar aulas pra eles do zero. Fazia isso no 1º dia, no 2º dia, aí eu mandava
eles irem lá na frente dar aulas, 15 minutos, 20 minutos cada um, né. Fizemos isso várias vezes.
Mas mesmo assim é difícil. Alguns só que entendem o assunto, né. Como a gente costuma a dizer :
“cai a ficha”. Outros fazem aquilo, não entendem, leva tempo. Daí pra cá, o Guri melhorou muito.
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No final do ano passado, por exemplo, eu fui fazer, eu visitei, eu fui assistir apresentações de fim
de ano, acho que de 12 ou 15 pólos. E realmente estava uma coisa muito melhor, graças a Deus!
Algum resultado deu, né. A gente ainda tem problemas de professor com deficiência, professor
fraco, mas eu assisti esses 12 pólos e não teve nenhuma apresentação que foi uma coisa ruim de se
ouvir, né. Porque no começo era. Era sofrível! Então, foi assim que eu entrei no Guri e essa é mais
ou menos a função que eu tento tentado exercer, treinar professor, escrever um método e depois,
agora pediram pra eu cuidar de um dos grupos, a Orquestra Paulista. Eu dizia que não queria reger,
já estava cansado de dar aula em grupo, fiquei 14 anos no SESC dando aula em grupo e regendo
grupo de estudantes, estava meio cansado de tudo isso, né. Mas, me convenceram. E estou
cuidando desse grupo aí.
7. Galindo, me fala um pouco, qual é o perfil do professor que você acha ideal para trabalhar
com ensino em grupo?
Bom, primeiro o cara tem que ter um certo carisma, que agente, é difícil definir objetivamente, né.
Tentando definir, o quê eu poderia dizer? O professor que vai lá na frente pra uma turma de vinte,
trinta alunos, ele tem que ter uma voz clara, ele tem que saber impor disciplina, ele não pode ser
muito tolerante demais na disciplina, mas também não pode ser muito áspero, senão você
desestimula a turma. Isso é mais ou menos um perfil de um regente, né. Um maestro de uma
orquestra, ele tem que ser um cara que impõe uma disciplina de trabalho, mas também não pode ser
muito áspero, senão não tem, não se faz música. Isso o professor do Guri tem que ter, né. E ele tem
que misturar característica de professor e de maestro, isso ta escrito na minha, no meu trabalho de
mestrado. No Guri é muito comum a gente vê uma coisa engraçada, se vê um pólo numa
cidadezinha no interior lá de São Paulo, em São Paulo, aí você estabelece professores e os
professores a gente coloca pra fazer os concertos. Aí quando o cara já se acha já maestro, aquilo
sobe a cabeça, ele fica convencido, a vaidade vai lá pra cima, tem cada caso hilário. Tem uma
cidade, logo no começo, que eu fui assistir o concerto final de ano deles, cujo o regente lá era o
único na cidade que tinha uma escolinha de música. O dono da escolinha tocava violino, era o
único professor de violino na cidade, mas também era cantor, estudava canto, toda apresentação de
fim de ano, ele cantou várias árias de ópera com os coitadinhos dos meninos acompanhando ele,
teve que chamar ele e dizer : “Escuta meu querido, o Guri não é pra você aparecer!”. Tinha vários
casos, o cara se achava maestro. Eu, quantas vezes eu falei : “tira esse título!”, quer dizer, quando
se estabelecia a hierarquia do pólo se escolhia um professor pra ser o maestro. Ah, isso era um
Deus nos acuda! Então, é ridículo, mas é verdade, entendeu? Então é um caso né, um caso. Então,
tem essa, essa característica que você, o professor tem que saber dosar, até que ponto ele é
professor, até que ponto ele já é o regente do grupo. Desde a primeira aula do grupo heterogêneo,
você é o regente do grupo. Você tem que saber fazer o gesto direito, você tem que ensinar eles a
interpretar, decifrar o código de, dos gestos de regência, você tem que ter um carisma positivo, de
não ser áspero demais com as pessoas, e não ser mole. Outra dificuldade que a gente vê, é assim, o
professor organizar na cabeça dele, o quê ele vai ensinar naquela aula e quais as técnicas de
aprendizagem que ele vai buscar, né. As pessoas misturam isso. tem professor que fala demais.
Tem professor que não fala nada, né. O quê fala demais é o mais comum, fala, fala pelos cotovelos.
A aula em grupo tem que ser prática, objetiva. Por exemplo, uma das coisas que a gente tem lá no
meu trabalho, tem no trabalho do Enaldo, ce vai dar aula no grupo, faz uma solicitação de cada vez.
As vezes o professor ele pede pra, diz que está desafinado em uma determinada passagem, diz que
é prá segurar o arco não sei como e também pra fazer um final de frase, são três coisas ao mesmo
tempo. Então, isso é difícil de entrar na cabeça dele. Faz treinamento e vê que é difícil entrar na
cabeça do professor. Meu amigo faz, pede uma coisa de cada vez, né. E peça com poucas palavras.
Com essas características de boa comunicação são as mais difíceis que a gente encontra por aí, né.
Outra coisa interessante, é você saber que o Guri é um trabalho que não visa formar músico
profissional. É um trabalho que tem um cunho social, tem todo um departamento do Guri que é
formado por assistentes sociais, de gente que cuida da parte social, que um dos objetivos é você
usar música pra passar noções de convívio, de sociabilidade, de cidadania e tudo mais né. Às vezes,
o professor...acabou?
Não. Acabou não.
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O professor mistura as coisas. Tem professor que, de instrumento que não consegue entender esse
lado e começa a exigir do aluno como se o cara fosse, tivesse se preparando pra fazer um concurso,
né. Não sabe colocar um limite na exigência dele. Isso é uma coisa complicada. Essa garotada ta
aqui fazendo música e o aspecto lúdico, aonde é que ta? Você ta exigindo dele como eles fossem
orquestras profissionais. Você esquece o lado social, somente a questão lúdica. Ele tem que se
divertir. Ele tem que ser gostoso pra eles, pra garotada, são garotos, adolescentes e crianças, tem
que ser divertido, tem que ser gostoso. Com disciplina, mas tem que ser. E isso é uma outra coisa
difícil, o ensino musical que veio do ensino musical tradicional é meio militar, às vezes, né.
Começa com as bandas que a gente vê pelo interior. É militar e tem aspecto punitivo né, de
punição, isso a gente demora também pra tirar da cabeça das pessoas aí. Bom, tem essas
características principais, as críticas que faço, as coisas que a gente tenta combater e melhorar nos
treinamentos de professores que a gente faz.
8. E Galindo, o Guri trabalha com a faixa etária de 8 a 18, não é isso?
Isso.
E no SESC também trabalhava essa faixa etária ou todas as faixas etárias?
(Interrompendo) Não. No SESC é bem complicado porque é assim : o SESC é uma instituição
voltada pra cultura e lazer. Então, o SESC não queria que houvesse limite de idade. Então, a gente
tinha que trabalhar com quem aparecesse. E infelizmente, dos quatorze anos que eu fiquei lá, eu vi
que a partir de uma certa idade, realmente era muito difícil aprender a tocar um violino, violoncelo.
Por mais, quer dizer apareciam pessoas de idade, idosos, mas com uma disposição pra aprender,
todo tempo do mundo, ficava lá o dia inteiro, mas era difícil, não conseguia, não conseguia, a gente
tinha, eu tinha a maior paciência, tentava. Olha, a gente tentou fazer uma época um grupo só de 3ª
idade, mas também a coisa não ia pra frente. E o SESC insistia, isso era uma briga no SESC. E um
dos motivos que, uma das coisas que me deu alívio quando eu saí do SESC é não ter que trabalhar
com isso, não assim, que fosse uma carga, não porque era uma carga pra mim trabalhar com
pessoas mais velhas, mas porque eu senti que eu não tava fazendo bem eles.
(Acabou a fita). Então olha, se tiver alguém que descubra o método que funcione com pessoas de
mais idade, eu vou ficar muito feliz, eu tenho toda a humildade do mundo pra dizer : “Eu não
consegui!” , entendeu, eu não consegui, eu tentei, não sei, ficaria feliz se eu visse turmas de idosos
aprendendo a, muitas vezes não precisava ser idosos não, gente assim, a partir de 30 anos já tinha
problema de tensão muscular, de, em geral são muito críticos, muito críticos, faz uma coisinha
errada já travam. A criança é menos crítica né, ela vai fazendo por brincadeira, uma hora sai, a
coisa funciona. Então, o SESC era isso. Não tinha, não tinha limite de idade, eles queriam que
atendesse todo mundo. Agora no Guri tem o seguinte, tem limite de 18 anos, mas tem muita gente
que passa dos dezoito anos e quer continuar tocando. Por isso foi criado esse grupo que eu dirijo, a
Orquestra Paulista, onde gente com mais de dezoito anos é aceita. È o único grupo do Guri que é
assim, mas é pra tocar né, pra fazer apresentação numa pequena Orquestra de Cordas, pequena não,
Orquestra de Cordas de 50 pessoas. Mas nesse grupo a gente já deixa que as pessoas com mais de
18 anos atue.
9. E a carga horária ideal semanal? Qual você acha, quantas aulas por semana? Quantas
horas cada aula?
Isso Jaffé dizia. Se tivesse três aulas por semana de duas horas, seria bárbaro. Aquela, dentro
daquele conceito de Estudo Dirigido, de você na aula, você ta dirigindo o estudo do aluno, ta
cuidando dele. Isso é melhor que do ficar em casa uma semana, tocando torto, pra depois você
voltar na aula, você ter que desentortar ele. Muita gente critica o ensino coletivo dizendo assim :
“É, mas como é que o aluno, que o aluno, é você vai vigiar a postura de trinta alunos na tua frente,
né? Eles vão ficar tortos”. Mas eu rebato dizendo o seguinte : “Pois é, no ensino individual você dá
aula pro cara e manda ele ir pra casa, ele fica seis dia estudando torto. Sem ter ninguém pra
vigiar!”. Uma das coisas que o Jaffé dizia era assim: “Três aulas por semana e os outros dias da
semana não estuda em casa!”. Aí os professores tradicionais ficavam mais escandalizados ainda.
Que pra mim é muito fácil de entender. Você faz três aulas por semana, tem duas horas de aula, o
professor ta olhando você, você tem o professor assistente, que fica circulando pela classe,
encostando em você pra tirar seus pontos de tensão, você e o aluno né, pra tirar os pontos de tensão,
consertando a postura e os outros dias da semana, ele não estuda em casa, o aluno não estuda em
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casa, né. Agora o quê a gente vê na prática, principalmente numa cidade como São Paulo, pra você,
um aluno se dispor, uma criança fazer três aulas por semana é muito. Porque aqui você vê a criança
fazendo natação num dia, inglês no outro, né. Eu não sei, talvez em comunidades mais carentes,
você, numa comunidade que não tenha outras opções de lazer, outros interesses, se você propuser
três aulas por semana, talvez. No Guri, eu já soube de alguns pólos que isso funcionou. Foi criado
um pólo, acho que em Osasco, queriam fazer uma apresentação de inauguração do pólo, eles
tinham aulas todos os dias e eles iam. Mas também porque não tinha uma outra opção mesmo.
Então, três aulas por semana eu acho...
O ideal.
O trabalho vai render muito rápido. Duas aulas, funciona também. Só você não ter expectativa de
fazer um concerto em dois meses. Muitas veze4s acontece isso. Agora uma aula por semana, eu
acho que é perda de tempo mesmo. Não funciona. È muito pouco.
10. E Galindo, eu queria que você falasse quais são as vantagens, pra você, da iniciação
instrumental do ensino coletivo em relação ao ensino individual? Quais são as vantagens que
você vê? E se existe alguma desvantagem?
Isso tem bem explicadinho na minha dissertação.
É. Na dissertação.
Mas, pra quem quiser ler, ta lá. Vantagem. Motivação. Você motiva o aluno, né. Pega um aluno,
alguém, é muito fácil encontrar gente foi estudar violino através do ensino individual, teve uma
aula, foi pra casa com o violino, tentou tocar saiu aquele som horroroso. Porque tirar som do
violino é complicado ou do viola, do violoncelo, do contrabaixo, é complicado né. Aquilo raspa,
aquilo apita e a pessoa se desestimula rapidinho, principalmente se for jovem ou crianças né. É, no
ensino em grupo você pega aquele som, que sai, e você se diverte com ele, você até brinca : “E
pessoal, que som feio!Vamos melhorar esse som!”. A criançada dá risada. E ela vê que o
amiguinho do lado ta tendo o mesmo problema, entendeu? Isso é muito comum, você : “Puxa não
sou eu que estou tirando som!” . E você através do Estudo Dirigido, você vai, você vai dando as
instruções para o som melhorar : “O põe o arco longe do cavalete!”, “Pega o arco só com a
pontinha do dedo, não aperta”. Pronto você já resolve a questão do som. Eu tô dando um exemplo,
que é a questão do som. Então, você estimula, eu, isso é um exemplo e na minha experiência, vejo
que realmente você consegue estimular o aluno, você, outra coisa você tem que cuidar como
estratégia de ensino pra que eles toquem uma melodiazinha o mais rápido possível. No ensino
individual, muito comum você vê o professor, fazer o aluno ficar fazendo nota longa durante três
meses até a posição do arco estar totalmente perfeita, pra depois ensinar mão esquerda. Isso é
desestimulante. O Jaffé falava em Gestalt, né. Você não precisa fazer o arco ficar perfeito pra
começar introduzir a mão esquerda, você deixa o arco numa posição aproximada, uma
configuração básica da posição, gestálticamente falando assim, né. Aí você já vai entrar na mão
esquerda e você vai vigiando, vai cuidando aos poucos de todos os assuntos. Então, é, em vez de
você fazer um ensino sintático, passo a passo, ensina mão direita, corda solta durante três meses, aí
agora que ta bom, aí você estudo o primeiro dedo, durante três meses, quando ta bom, você ensina
o segundo, né. Não você faz o principal do ensino panorâmico, né. Você ensina três, vai colocando,
coloca um conceito não espera ele ficar perfeito, já coloca o segundo, vai cuidando dos dois, aí
coloca o terceiro. Arco, faz um pouco de corda solta, duas, três aulas, aí já começa a mexer com a
mão esquerda, né. E você vai cuidando das duas ao mesmo tempo. Isso é possível. E com isso você
estimula mais o aluno, né. Então na verdade, assim, tem muita coisa que é própria do ensino
coletivo e outras coisas são próprias da estratégia de ensino, como é que você vai ensinar. Se o
professor individual usar essas estratégias, se ele fizer aula três vezes por semana, com o aluno dele
individualmente usando essa estratégia de ensino do Estudo Dirigido e a estratégia do ensino não
sintático, que eu chamo do panorâmico, ele vai conseguir um bom resultado, né. O quê vai ficar
faltando é assim, que o ensino coletivo tem, aí sim, que o ensino individual você não tem, é você
tocar uma música a três ou quatro vozes logo de cara. Isso é muito estimulante. Quando a
criançada, a garotada ouve, a harmonia a quatro vozes acontecendo, eles ficam encantados. Isso eu
já cansei de ver. Eu quando tive aula coletiva, e toquei a minha primeira música a quatro vozes, eu
fiquei encantado, né. E aí, você fazer apresentações com uma orquestra, sentir que você ta dentro
de uma orquestra, dignificar um trabalho de uma orquestra, valorizar isso. Isso também estimula os
270

alunos, né. È agora, desvantagens é o seguinte, ás vezes você, você tem que manter a turma
homogênea. Às vezes você encontra um, é difícil hein, superlotado, mas às vezes acontece. Eu em
catorze anos no SESC nunca vi. mas se você encontra tem que tirar ele fora. Ele vai aprender mais
rápido e vai ficar esperando os outros. Quer dizer, ce tem aqueles que são muito lerdinhos, que
também não dá pra você querer manter a turma homogênea. No SESC a gente fazia uma avaliação
a cada três, quatro meses, os que não estavam acompanhando a gente pedia pra se matricular de
novo, né. Aparece muita gente que tem dificuldade de aprendizado, por mais que a gente tente.
Agora esse que tem dificuldade em grupo, vão ter dificuldade na aula individual também. Pra
manter a turma heterogênea você acaba sacrificando alguns. Ou melhor, pra manter a turma
homogênea você acaba sacrificando alguns. Mas é uma opção de democratização do ensino. Você
vai ensinar pra muita gente as noções básicas da coisa. Aí, que quiser ser músico profissional,
quem quiser usar aquilo como hobby vai escolher depois, né. E outra coisa, que eu não diria que é
uma desvantagem, mas que o professor tem estar ciente é que o ensino em grupo funciona pra um
ano, um ano e meio, dois anos, estourando. depois disso, se o aluno quiser continuar, tem que ir pra
aula individual. Tem que deixar bem claro, principalmente pra quem faz crítica ao ensino coletivo,
é um trabalho de iniciação. Só pra você passar todos aqueles conceitos básicos, para depois serem
desenvolvidos na aula individual mais tarde. Então, por exemplo, você pode ensinar, você deve
ensinar o aluno a fazer um spicatto com todos os conceitos básicos, o arco fazendo movimento
circular, porque a quantidade de crina influi, que o funcionamento do seu dedinho no spicatto pra
funcionar não deve apertar, você vai ensinar tudo pra fazer um bom spicatto. Agora você não
precisa do ensino coletivo nem deve, trabalhar velocidade, o cara fazer spicatto muito rápido. Você
pode deixar pra quando ele for ter aula individual, mas você ensinou spicatto limpo e com todos os
conceitos bem ensinados. Mas ou menos igual ao esporte né? A questão de fundamentos, então
você vai jogar vôlei, você vai pra dar um saque, ensina fazer, ensina os fundamentos certos.
Levanta a bola com a mão esquerda, bate com a direita espalmada, então o saque por baixo que é,
pisa não sei aonde, você ensina os fundamentos, direito. Se ele vai desenvolver mais ou menos,
dependendo do biótipo dele com o instrumento. Deu pra entender? Falei muito né?
Não falou não.
11. Galindo, em relação à pesquisa em ensino coletivo, como é que você vê essa área? Você
conhece além da do Enaldo alguma outra? Como é que você ta vendo esse ramo da pesquisa
em ensino coletivo?
Olha, eu pra ser sincero eu to um pouco fora porque eu fiz esse meu trabalho já faz uns anos e
tenho profissionalmente trabalhado muito mais como regente, desses anos pra cá, né. Tem o
trabalho do Enaldo, tem o trabalho anterior que é do Zé Leonel Gonçalves Dias, é outro também,
foi esse amigo que trabalho comigo, deu aula no SESC muitos anos. Tem o trabalho dele, não
conheço outros. Acredito que deva existir. Tem um rapaz na UNESP, antes fez um trabalho de
iniciação científica sobre ensino coletivo, ele até me entrevistou, mas isso já faz vários anos, o
nome de era, não lembro o nome dele, é Mauro, Mauro Vieira, UNESP. Mas é um trabalho muito
simplezinho, iniciação científica, um trabalho bem simplezinho. Em Rio Claro, o maestro Pedro
Cameron fez um método de ensino coletivo, que nem você, violonista. Trabalhou com esse método
muito tempo lá, mas não é um trabalho acadêmico. mas foi uma outra iniciativa que houve. É e eu
não tenho notícia de outro da área acadêmica, realmente não. O quê eu posso te dizer, não sei se
ajuda aí, é que eu acho que quando o Jaffé começou esse trabalho em São Paulo, em 78, o
preconceito era imenso dos outros professores. E hoje você vê a coisa se difundindo de certa
maneira. Muito por causa do Guri, se fala muito em ensino coletivo. Não é todo mundo que
entende, não é todo mundo que leu o, quando eu faço treinamento no interior, eu levo o meu livro
do professor, ele tem um extrato, um sumariozinho do, da minha dissertação, falando das vantagens
e desvantagens, do preconceito. Eu nem sei se todos esses professores que passaram pelo
treinamento comigo leram isso. É difícil, mas eu acho que muito por causa desse, dessa
disseminação do Guri, pelo menos, se fala mais no assunto, tem algumas pessoas levando a sério,
esse monte de professores que passou pelo treinamento, alguns estavam interessados, quer dizer, eu
acho que a coisa na prática ta caminhando, ta dando fruto. E agora, trabalho na área acadêmica eu
só conheço esses que eu te falei. Talvez existam outros, se existirem, vou ficar feliz de saber.
271

12. E Galindo pra finalizar, eu queria saber se você tem alguma sugestão a fazer em relação a
minha dissertação né? Ou alguma consideração final sobre o ensino coletivo, alguma coisa
que você queira falar... A palavra é sua (risos).
Bom, eu acho assim, acho que o novo da questão é o seguinte, a gente passou por décadas aí de um
ensino musical que era pra formar datilógrafos. Extremamente bem treinados. Estou cansado de ver
como regente, violinista que tem os dedos treinados e não tem conhecimento musical amplo, sabe?
È, quer dizer, eu acho que é o caso de um país onde faltam músicos amadores, gente tocando
música pra, pra fazer parte da vida isso. O ensino musical é sempre, parece que é sempre voltado
pra idéia de formar o profissional. E eu acho que é mais importante é que o ensino musical seja
para ensinar música mais rápido possível, que op aluno consiga fazer um pouco de música mais
rápido possível e depois, com os fundamentos bem, bem trabalhados. Mas parece que o ensino
tradicional é pra formar virtuose. Se você não é o violinista, se você não consegue tocar os
Caprichos de Paganini, isso é um problema. Isso não é um problema! Você tem que estudar
violino e tocar cançãozinha folclórica, qual é o problema? E se você gostar, você continua
estudando, né. É, quando Brahms estava vivo e compôs uma sinfonia e a sinfonia era tocada, a
platéia era toda de músicos amadores, todo mundo tocava piano, violino, etc. Hoje todo mundo
ouve CD. Então ficou um buraco aí. Então a gente ta num país tentando criar orquestras, ensinando
os músicos profissionais a tocar violino, os Caprichos de Paganini, pra quem? Tem gente que não
consegue ouvir. Porque o público pra qual a música erudita foi composta para um público de
músicos amadores. Não temos público. O público, a culpa também não é do público. Se a gente
ensina música pra muita gente, essas pessoas vão curtir música, ensinar sem stress de querer fazer
deles um, Paganinis, né? Ou Chopins, pra eles gostarem de música. Eu vão assistir concertos, vocês
vão gostar de assistir concertos, vão prestigiar a atividade de músico profissional. Acho que aí a
vida musical passa a funcionar, né. Porque eu não vejo ela funcionar, né. Porque eu não vejo ela
funcionar. Tô cansado de reger concertos de música erudita, e olho pra cara da platéia e a platéia
não entende. Olhando praquela orquestra como se fosse uma coisa estranha. Da uma dormida,
conversa bastante, né, durante o concerto, e bate palma no final pra ser educado. Então, acho que
formar músicos amadores é importante para o ambiente musical, pra que a profissão de músico
exista e é importante pra essas pessoas. Porque o que tem de gente frustrada : “Ah, eu estudei
música na minha infância, mas, ah, já nem quero ver um piano mais na minha frente!” . Cansei de
ver gente falando isso. “É porque o professor batia na minha mão porque eu não conseguia tocar
aqueles exercícios!”. Então, ta faltando o lúdico, o prazeiroso, ta faltando um ensino musical pela
música, não pra formar virtuoses. Não pra professores de piano ou violino fazer do aluno dele
aquilo que ele queria ter sido e não foi. Entendeu? Eu acho que é isso (risos) que eu tenho a dizer,
assim de importante. Ensinar a música pela música, pras pessoas se divertirem.
Pra formar o ser humano.
E pronto! O resto acontece, né.
Então ta Galindo! Então, muito obrigada e até a próxima!
Não faltou nada aí?
Não.

Entrevista nº11 : THELMA CHAN


Local : São Paulo
Data : 14.08.2002
Horário : 13 h

1. Bom, para iniciar Thelma, eu gostaria de saber como se deu o seu primeiro contato com a
música?
Bem Flavia, desde os meus cinco anos, eu estudo música. Então, meus pais sempre gostaram
muito, meu avô era um tocador de bandolim, um português que sempre que tinha oportunidade, ele
pegava o bandolim e tocava um pouquinho pra gente, gostava muito que a gente cantasse pra ele,
sabe? E meus pais também. Então, aos cinco anos, minha mãe me pôs primeiro no ballet. Aí, eu
não fui muito bem com o ballet. Uma criança meio gordinha, uma professora meio sem, sem
pedagogia e aí então, eu desisti do ballet. Minha mãe disse : “Bom, você não quiser fazer ballet,
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você vai fazer piano!”. Aí eu falei : “Então tá bom!”. Aí eu peguei o piano aos cinco anos e hoje
quase aos quarenta e nove, ainda continuo na mesma vida (risos).
2. E qual é a sua formação musical?
Bem, eu fiz como todo mundo, comecei fazendo Conservatório, e depois eu fiz a primeira
Faculdade de Música de São Paulo, a primeira turma. Eu estava terminando o Conservatório e o
diretor do Conservatório tava mudando de Conservatório para Faculdade de Música. Ele disse pra
mim : “O quê você vai fazer da tua vida daqui pra frente?”. Eu falei: “Não sei ainda!”. Eu fazia
Normal, essa coisa, Magistério, Sempre gostei de ser professora. Aí ele disse : “Então, você vai
fazer música”. Aí eu falei : “Ah, então tá bom!”. Aí continuei o quê eu vinha fazendo no
Conservatório, só que então agora, num nível superior e tal. Então, é isso. Primeira turma da
primeira Faculdade de Música.
3. Thelma como se deu o seu interesse em trabalhar com o ensino coletivo, com côro, com
grupos?
Bem, eu sempre gostei de coisas pessoas juntas. Eu sempre achei que a coisa quando você junta as
pessoas, ela acaba bonita, ela fica mais bacana. Sei lá, cria uma força né. Então, eu sempre fui de
trabalhar com o coletivo mesmo. É, e surgiu como? Surgiu porque eu sempre gostei de cantar com
mais gente, né. Sempre gostei de participar de coral, de conjuntos, de, por exemplo, no
Conservatório tinha aula de Música Popular, né. Então, eu ligava pra participar dos conjuntos de,
de Música Popular, tal. Aí eu vi que eu tinha um gostinho por essa coisa de estar junto com mais
gente, fazendo música. Aí, eu fui pra Brasília, morei em Brasília, trabalhei na Escola de Música de
Brasília, mas eu já vinha com essa formiguinha da, de juntar as pessoas pra cantar, principalmente,
que era sempre o meu grande tesão, é verdade, sempre falta à coisa do canto. Então, o piano eu fiz
assim meio que empurrado, entendeu? Não era uma coisa que eu gostava tanto assim de me
dedicar. Meu lance era mais, a coisa da voz, da regência principalmente, de fazer os outros
cantarem, né. Aí quando eu fui pra Brasília, eu tive a oportunidade de expor, de risco (??). Eu fui
pra Brasília muito nova, tinha vinte e dois anos, eu tava com a minha carreira começando e a
Escola de Música de Brasília foi, e o Maestro Levino, que era o diretor na época, foram grandes
responsáveis assim, pelo deslanchar da minha carreira, né. Então, no I Festival de Verão de
Brasília, tava o Carlos Alberto Pinto Fonseca, grande regente mineiro né, e foi dá pra gente aula de
regência. E eu fui pela primeira vez me mostrar para um profissional dessa categoria. E ele achou
que eu tinha talento. Então, isso veio reforçar minha vontade de ser regente e de fazer as pessoas
cantarem. Eu sempre achei que trazia alegria, sei lá, e nunca parei, não sei. A harmonia das vozes é
uma coisa que arrepia muito. Então, tudo que me arrepia, eu gosto (risos).
4. E Thelma, Em relação ao ensino coletivo, quais são as vantagens que você vê em relação,
comparado ao ensino individual?
Olha, eu acho que crianças fazendo música juntas, uma ajuda a outra, sabe? Então, no caso do coral
por exemplo, você tem um superafinados, os médios, os normais, né, e os desafinadinhos. Então,
quando você tem o desafinado, por quê que ele é desafinado, né? Por quê ele não cantava nunca na
casa dele? Por quê a mãe dele era desafinada? Por quê ele ouviu ninguém cantando? Porque... Por
quê? Então, sempre tinha uma razão. Daí, você colocava o desafinado aqui e um afinado a sua
direita, e outro afinado a sua esquerda, e um outro afinado atrás. Então, essa coisa dessa vibração,
né, que vinha, atrás da orelha do desafinado, ele afinava, entendeu? Então, essa é uma vantagem, eu
acho que assim, um ajuda o outro, e esse cara sozinho, esse desafinado fazendo mal, já pensou que
sacrifício? Aí, fora isso, é, a gente tem também a coisa do, do, da própria convivência mesmo
social, né, a coisa do grupo mesmo, dentro de um, de fazer música coletivamente, eu falo da parte
do coral, a pessoa, ela se reconhece né, e se faz reconhecer. Então, às vezes assim, uma criança que
era apagadinha, sabe, porque não tinha grandes talentos, de repente ela descobre que ela tem uma
voz superafinada, então, ela cresce dentro do grupo, ela cresce nela mesma, autoconfiança, sabe? E
ela fica outra. Ela aprende a sorrir, ela aprende a levantar a cabecinha, porque ela viu que ela tem
um dom, né? Que é esse de cantar afinado e ela tá cantando junto de uma série de pessoas. Então,
tem todas as vantagens. Sem colocar assim, porque, como você no instrumento, quando eu faço
coral infantil, eu também não ensino, num primeiro momento a leitura de notas né. Nada acontece
porque ela vai praticar tanto aquela, aquela música, ela vai subir e descer tantas vezes né, que
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quando ela pegar uma partitura, certamente aquilo vai facilitar né, pra que ela enfim leia né. Então,
eu acho que é tudo isso, né. Eu sou muito favorável a essa coisa.
5. E você acha que tem alguma desvantagem, a princípio ou não?
Desvantagem? Em se tratando de crianças eu acho que não. Porque assim, eu acho legal também o
trabalho pela consciência, né. Você que já trabalhou com a gente, cê sabe que a gente busca a
conscientização, não é? Pra cantar e quero conhecer exatamente como é o meu instrumento, né. Só
que assim, pra criança, eu acho que isso pode vir mais tarde. Então, num primeiro momento eu não
tenho muito...
6. E Thelma, em relação ao seu referencial teórico, às suas influências? Você pode falar um
pouco ?
Ah, com maior prazer! Assim, de medalhões da música brasileira, meus grandes influenciadores
são Villa-Lobos - é influenciadores acho que inventei essa palavra agora – Osvaldo Lacerda, que eu
amo de paixão. E depois vem assim, os outros. Porque assim, os outros porque assim, eu tive uma
vivência maravilhosa com o canto lírico, que era um grupo de coral adulto, né, jovem na verdade,
mas uns jovens com muita capacidade. Então, a gente teve a oportunidade de conhecer muitos
compositores e fazer a música desses compositores, né. E arranjadores também.Então, veio o Zé
Ronaldo Miranda, por exemplo, que eu admiro demais, né. Bem, depois eu tive a influência de
todos os regentes possíveis com os quais eu cantei. E eu tive a felicidade de cantar com Camargo
Guarnieri, com Eleazar de Carvalho, né, com Emílio César de Carvalho, depois em Brasília com o
próprio Levino Alcântara, com o Carlos Alberto Pinto Fonseca, com Zé Gramani, que foi meu
professor na faculdade, de percepção, até foi meu regente mas também meu professor também, que
me influenciou pra caramba, não é ? O Roberto Manso depois, que não é tão conhecido, já foi,
também já morreu. Bom, e assim, na regência eu acho que foi isso, aí em São Paulo, no tempo em
que eu comecei a reger corais, tinha um movimento efervescente de corais, era uma loucura, né.
Ah, eu não posso esquecer do Benito Juarez, que é um supercara também, músico maravilhoso, me
ensinou muita coisa, né. E toda a vivência que eu tive cantando em corais, viu Flavia. Você tem
Joaquim Paulo Espírito Santo, que também não é um músico tão conhecido, mas que também me
ensinou demais, e uau, né. E eu fiz uma faculdade, quer dizer, então, lá todos os professores e toda
a literatura me ajudou. Depois teve uma coisa importante na minha vida que foi o fonoaudiólogo
Mara Behlau que me deu uma série de coisas pra estudar, depois teve Rose-Marie Schoch, que
também tá com Deus, que me deu uma outra série de, de teorias pra ver, entendeu? Então, tô
fazendo assim meu mestrado.
7. E trabalhos interessantíssimos em relação a corpo, expressão corporal?
Ah sim! Isso começou com Ivaldo Bertazzo que é um cara aqui de São Paulo, um coreógrafo, ele é
um pesquisador, ele vai pesquisar o mundo, assim, especialmente na Índia e na Bélgica, e trás
muita coisa desses lugares. Uma mulher maravilhosa que tem lá na Bélgica que faz um estudo
super de corpo né. Então, estudei em dois anos, em dois anos com Ivaldo Bertazzo, intensamente,
né. E veio dele essa necessidade, né. Inclusive nesse segundo trabalho “Dos pés a cabeça”, surgiu
muito por causa do Ivaldo, das aulas que a gente fazia lá, né. E ele foi me mostrando que meu
corpo era um instrumento realmente, então, se eu, seu eu não mantinha uma postura corporal eu
não era um ser humano que fui feito né. E aí, eu comecei a ver através da própria Mara Behlau, do
Roberto Zimberman e depois da Rose-Marie, é que era importante mesmo ter essa consciência,
entende? Então, se você tá esticado, seu som sai de um jeito, se você tá caído seu som sai de outro.
è como qualquer instrumento que você, a flauta você soprou extremamente você apitou, não é? O
violino cê passou o arco com força você arranhou. Então, mesma coisa o corpo. E aí o, porque é ir
atrás da voz, né Flavia? Sempre atrás da voz e até eu morrer eu vou ficar atrás da minha voz, né.
Então, tudo que pudesse me ajudar, eu vi que o corpo era fundamental, né. Porque assim, tem gente
que nasce, sabe? Então, se tiver que cantar de quatro, ela canta. Se tiver que cantar de bruços,
deitada, ela canta. Porque assim, parece que Deus pois a mão e disse : “Você vai cantar!”. E ela não
faz nada. Ela acorda de manhã e tomando banho ela cantava (...), entendeu? Agora, os pobres
mortais assim, que tem que ir atrás, tem que aprender, né. Mas eu acho também que, que Deus fez
direitinho porque se eu não tivesse ido tanto atrás da minha voz, eu não teria descoberto sabe,
tantos artifícios bacanas pras pessoas descobrirem as delas (risos).
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8. Thelma em relação ao, vamos falar sobre os lugares em que você atuou, primeiramente, e
depois, eu queria que você falasse pra mim, assim, em termos de côro pra criança, pra adulto,
qual que é a carga horária que você acha a ideal, pra ter um rendimento bom, quantas vezes
por semana? Eu queria que você falasse um pouco sobre essa área de atuação sua?
Onde eu atuei. Eu comecei a reger coral infantil, então, em Brasília, né. Que depois eu tive um
aluno, que eu nunca vou esquecer disso, um já mocinho, que era do canto lírico, uma vez ele usou
assim a expressão : “Thelma, eu fui lá reger, e regi com vibratto!” (risos). E foi uma coisa que eu
sempre me sinto, porque eu achei assim muito bacana. Então, “eu regi com vibratto” em Brasília,
primeira vez. Daí eu fui pra São Paulo, aliás eu já tinha tido uma parca experiência, nos meus
dezoito, dezenove anos, quando eu dava aula no conservatório, né, de pedagogia musical. Então, eu
já tinha vontade de fazer uma coisa coletiva e tal, com as alunas e comecei dar coral. E assim, eu
tinha tanto desconhecimento da área, que eu pegava aqueles livrinhos de flauta doce, que tinha
duas vozes pra flauta, e fazia elas cantarem aquilo. Não sabia nem aonde procurar repertório, nada
disso. Então, e isso realmente foram os rudimentos, os primórdios, foi nesse conservatório. Depois
eu fui pra Brasília. então, foi a primeira vez que eu regi em público, com o tal do vibratto lá (risos)
Tremendo de medo!! Depois eu voltei de Brasília, aí reassumi o Conservatório que eu estava, aí,
definitivamente, comecei a reger o grupo, que depois se tornou o Canto Livre, né. E paralelo a isso,
eu regi vários corais de empresa, de faculdade, né. Nossa Senhora! Teve épocas assim, que eu tinha
muitos coros! E teve uma coisa importantíssima na minha vida que foi onde eu comecei reger
corais infantis de verdade, que foi a Escola Municipal de Iniciação Artística. Então, de volta a São
Paulo, eu, depois de morar dois anos e meio em Brasília, aí eu precisei retornar né. retornar?
Começar aqui em São Paulo, porque eu não tinha começado nada praticamente. Eu fui embora com
vinte e dois anos, eles achavam que eu já tinha começado alguma coisa. Aí, eu voltei e fui para na
Escola de, na Escola Municipal de Iniciação Artística, por vias de amigos meus que me indicaram,
enfim, eu fui lá conversar com as pessoas até que eu consegui uma vaga nessa escola. E eu cheguei
lá não tinha coral infantil, mas eu já tinha um grande trabalho na área do coral adulto, né. Já tava
superadiantada como eu te disse. Naquela época São Paulo fervia, assim, de corais adultos. Era
uma loucura, sabe? Era uma coisa assim : “Gente vamos caprichar porque o coral da fulana vai ta
lá!”, sabe? O coral de Mara, coral de Esmeralda. Olha Marcos Júlio, então a gente assim, tinha
aquela, aquela coisa que a gente sabia que ia pintar de coral e a gente não podia fazer feio, sabe?
Porque os corais eram tinindo, era um melhor que o outro. Então, eu atuava nessa área, nos corais
adultos. Quando eu cheguei lá na Escola de Iniciação Artística tinha piano, tinha flauta, tinha
violino, percepção e não tinha coral. “Ah porque nós não temos regente!”. Eu falei : “Muito prazer!
Então cheguei!”, né. E comecei a aula coral infantil que existe até hoje e daí já emendei coral de
mães, entendeu e daí foi. Depois trabalhei em várias escolas particulares também fazendo corais,
né. E passei pra Universidade Livre de Música também, aí eu já, já tinha toda aquela vivência de
Ivaldo Bertazzo, Mara Behlau etc. Então, já comecei a dar canto popular pras pessoas e reger coral
adulto de novo. Porque depois que acabou o Canto Livre, eu parei com essa estória de coral adulto,
até hoje não tem mais. E fui me apaixonando pela área coral infantil. E aí assim, na Escola
Municipal de Iniciação Artística a gente tinha uma hora e meia de aula, uma vez por semana, né. È
da turma de ensaio. Eu meio que peguei esse parâmetro, sabe? De ficar com essa uma hora e meia,
uma vez por semana. Mas se você tiver uma hora e meia duas vezes por semana, melhor ainda, né.
Depois eu tive um, o ano passado e o ano retrasado a oportunidade de trabalhar num projeto com as
crianças na favela de Heliópolis, um projeto muito bonito do maestro Baccarelli, aqui de São Paulo,
que inclusive trabalhou com ensino coletivo né, de cordas, também com o pessoal da Heliópolis,
com a Renata Jaffé, então, e aí lá a gente fazia duas, uma vez por semana de três horas. E esse ano,
se eu tivesse continuado com eles, a gente ia fazer duas vezes por semana de duas horas, que eles
tão fazendo com maestro Elias, um maestro que eu deixei lá. E então trabalhando com criança,
quando eu cheguei na área de coral infantil que foi em 82, não tinha nada de infância aqui em São
Paulo! Era uma loucura! Eu olhava do lado assim, me via num deserto! Eu falei : “Não, isso não ta
certo! Onde que ta o pessoal que trabalha coral infantil?”. O coral adulto era uma efervescência
total, como é que o coral infantil ... Aí eu comecei a procurar as pessoas, entendeu? Aí fiz o I
Encontro de Corais Infantis. Aí lance a Associação de Regentes de Corais Infantis , que existe até
hoje, a ARCI. E fui inventando moda, entendeu? Pra você vê como eu gosto do coletivo (risos). Fui
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inventando moda e fui juntando os regentes e tive um coral de cem crianças e depois na própria
associação a gente juntou trezentas crianças pra cantar, entendeu e aí foi indo assim.
9. Que Bom! Eu queria que você falasse um pouquinho, já que você trabalhou com as
crianças carentes e tal, dessa função social da música...
(Interrompendo) Nossa Senhora!
Como você vê a nossa função como educador na sociedade e da música na sociedade?
Nossa Senhora! Olha é uma coisa assim, absurda, né. Assim, é claro, você tem que ser músico
educador mesmo e aja educador nisso, entendeu! Porque assim, se você for só músico, você vai só
se preocupar com, com o resultado sonoro né, não daquele corpo que ta na tua frente, daquela alma
daquele ser. se você for educador, você vai olhar primeiro praquela pessoa, praquela alma, praquele
ser, pra depois né, saber porque ele tá suando daquela forma, né. Aí você vai se preocupar assim,
escovou os dentes? Com que roupa ele ta? Ele ta cheiroso? Ele tomou banho, né? Quando ele tira o
tênis, o quê que acontece? Desmaia meia dúzia? É ou não é, né? Então, foi a primeira coisa que eu
falei pras crianças né? Não foi a primeira vez que eu trabalhei com carentes, mas foi a mais efetiva.
Então, eu falei pra eles o seguinte : “Olha, eu quero todo mundo de banho tomado no ensaio”. Aí
você vê, começa daí a coisa. E a música, levou ele pra lugares que ele jamais imaginaria entrar, né.
Porque aquelas são crianças que se admiram, que se admiravam né, porque hoje elas já conhecem,
um secador de mão, sabe? Que você põe embaixo e vuuum. “Ah, que diversão!”, sabe? Lugares
bonitos porque eles não vêem lugares bonitos, né. Eles moram numa favela onde tem até casa de
alvenaria, mas tudo pobre, feio e sujo, né. Então, de repente, ele entra num lugar que tem um lustre
de cristal, tem um tapete alto. Tudo isso é bobagem, mas assim, dá um parâmetro de vida pra eles,
você entende? Não que isso seja importante, o lustre de cristal ou o tapete, não é? Mas o mostra pra
eles que eles estão indo a esses lugares. Então, por eles estarem indo nesses lugares, eles tem que
ter um certo comportamento, não é? Ele vão se sentar à mesa de um restaurante, eles vão tomar um
lanche perto de autoridades, de gente importante, eles vão conhecer. Então, enfim, todo esse lado
de como é que você é perante o outro, como é que você se comporta, como é que você se cuida né.
Sabe? Pra daí poder fazer a sua música legal, limpa, cheirosa e tudo mais né. É fundamental, né?
Fundamental. Por que ao invés deles preocuparem com quantos mataram na minha rua hoje,
entendeu? Ele tem que chegar da escola e tomar banho e saí porque ele tem que ir pro ensaio.
Então, é assim, maravilhoso!
10. E Thelma, em relação à pesquisa em música, você destacaria algum trabalho que você
goste nessa área de ensino coletivo? Como é quê você vê a pesquisa em música...
(Interrompendo) Você tá falando em termos gerais?
É, pode ser em termos gerais, em ensino coletivo e em música em geral. Assim, tem algum
trabalho que você destaque?
Olha, tem muita gente fazendo coisas legais né? Porque assim, sabe Flavia, eu nunca fui de estudar
coisas de fora, sabe? Eu nunca, por exemplo, eu nunca estudei, nunca ensinei método Kodály, eu
nunca ensinei aquele outro que todo mundo faz...
Dalcroze.
Dalcroze. O Willems, nunca liguei pra esse tipo de coisa, sabe? Eu sempre achava que a gente tinha
que fazer uma coisa a partir da nossa realidade, que tudo o quê vinha de fora não servia pra gente,
entendeu? Até hoje eu acho assim, não sei se até por desconhecimento dos métodos afundo, porque
eu nunca estudei mesmo, e falo isso sem medo nenhum, porque acho que criei uma coisa
totalmente diferente e minha que então até hoje eu não posso entender que as crianças vão ficar
meses a fio fazendo : nã nã, nã nã, nã nã, nã nã (canta o intervalo de terça maior descendente),
sabe? Não consigo ver isso. Então eu só posso alcançar as pessoas que eu acho que trouxeram
coisas importantes, né? Então, por exemplo, tem a Valquíria Passos que trouxe a música pra bebê,
depois seguida pela Josete Félix que trouxe a música pra bebê. É tem a Eny Parejo que faz um
trabalho de musicalização também, bela, uma coisa bela que ela pesquisa, que ela vai atrás, eu acho
bárbaro. Aula de musicalização que a gente ta falando né? Bom, ensino coletivo não preciso nem te
falar, nomes que você conhece acho todos assim, bárbaros, pessoas que trabalham com isso, que
tão mantendo isso né. Na área Coral Infantil tem o SESC através da Gisele Cruz né, que também
faz, ta supercolaborando assim, com o trabalho, a Marisa Fonterrada que eu também gosto tanto de
citar. O Samuel que embora não seja um cara na música infantil dentro da educação. Ele trouxe
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uma idéia nova, sabe? Assim, pro coral, eu acho que foi fundamental. O meu querido amigo finado
Marcos Leite, que eu também acho que foi uma figura importantíssima que trouxe coisas assim, da
música popular pra música erudita que foi bárbaro né? Isso que eu já citei pra você, que são meus
grandes mestres, né ? Lacerda e Villa-Lobos (risos) e maestro Levino.
11. E Thelma, pra finalizar, você tem alguma sugestão a fazer em relação a minha pesquisa
em ensino coletivo e alguma consideração final a fazer? A palavra é sua em relação ao grupo,
ao ensino em grupo...
Olha Flavia, eu só tenho a dizer a você que eu espero que essa sua pesquisa incremente ainda mais
esse movimento no Brasil. Que você seja uma figura importante que possa irradiar de Goiânia pro
Brasil inteiro.
Que Bom! Obrigada!

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