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Química Orgânica I

Profª. Clarice Fedosse Zornio

2018
Copyright © UNIASSELVI 2018

Elaboração:

Profª. Clarice Fedosse Zornio

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

Z88q
Zornio, Clarisse Fedosse
Química Orgânica I. / Clarice Fedosse Zornio – Indaial:
UNIASSELVI, 2018.

224 p.; il.


ISBN 978-85-515-0192-4

1.Química orgânica – Brasil. II. Centro Universitário


Leonardo Da Vinci.
CDD 547

Impresso por:
Apresentação
Prezado estudante, seja bem-vindo ao mundo da química orgânica,
uma área do conhecimento (bastante extensa, por sinal) integrante da grande
área da ciência que é a química. O grande objetivo desse livro é fazer você
compreender os conceitos que fundamentam a química orgânica e, mais ainda,
entender o porquê de os químicos dedicarem a ela toda uma importância.

O estudo da química já é por si só fundamental para entendermos as


leis da natureza e a química orgânica serve justamente para aprofundarmos
esse conhecimento, tendo como foco os compostos de carbono, o que
torna, essencialmente, a química orgânica interessante é que, por meio
dela, podemos buscar entender mais e mais a própria vida. Isso porque a
vida, como conhecemos na Terra, é baseada em compostos de carbono (ou
seja, é fundamentada pela química orgânica). Na Unidade 1, iniciaremos
nossos estudos da química orgânica buscando compreender a base, ou
seja, estudaremos a estrutura atômica, para depois estudarmos as ligações
químicas entre os átomos, para assim, definirmos como os compostos
interagem entre si e, para em seguida, começarmos a estudar os compostos
orgânicos propriamente ditos (na verdade, estudaremos grupos de compostos
orgânicos, classificados como grupos funcionais orgânicos). Esses passos são
importantes para não tornar o aprendizado confuso, por isso, muitas vezes
durante o texto, busco resgatar os conceitos já discutidos para que você possa
acompanhar da melhor forma possível o que está sendo estudado.

Na Unidade 2, começaremos a estudar a química dos hidrocarbonetos


(precisamente os alcanos e alcenos). Veremos, além das regras de nomenclatura
desses compostos, as principais propriedades relacionadas aos compostos
que fazem parte desses grupos funcionais. Nessa unidade também serão
introduzidas as ideias fundamentais em que se baseiam as reações químicas das
moléculas orgânicas (ou, mais simplesmente, as reações orgânicas). Entender
isso será importante para, posteriormente, entendermos as propriedades
químicas (ou a reatividade química) de cada grupo funcional.

Na Unidade 3, estudaremos mais um grupo pertencente aos


hidrocarbonetos, os alcinos, buscando entender sua estrutura química
e alguns fatores relacionados as suas reatividades. Nessa unidade,
também, estudaremos a estereoquímica dos compostos orgânicos, ou seja,
estudaremos como os compostos orgânicos estão arranjados tridimensionais
e quais as consequências desses arranjos. Por fim, estudaremos os compostos
aromáticos, que possuem certas especificidades no modo como as ligações
químicas estão estruturadas.

Antes de prosseguirmos, é importante pontuar que você não deve


tratar a química orgânica como uma subárea fragmentada da química como
um todo. Na verdade, a subdivisão da química em química orgânica, química
inorgânica, química analítica, físico-química e bioquímica tem um caráter
estritamente didático, que guia nossa compreensão como um todo. Por isso,
o que você aprendeu nas disciplinas anteriores deve sempre ser resgatado e
III
o conhecimento que você adquirir aqui, com esse livro, tem que ser levado
adiante. Muitas vezes, tendemos a deixar para lá algo que estudamos em
uma disciplina, principalmente se foi algo em que tivemos certa dificuldade.
Mas asseguro a você, vamos lapidando nosso conhecimento com o tempo
e, por isso, revisitar um conceito antes não muito bem compreendido, pode
ser uma experiência muito importante, fazendo com que você olhe aquele
conceito com outros olhos, entendendo-o melhor e, assim, consolidando seu
conhecimento. Na verdade, mesmo formados, seremos sempre estudantes,
pois a busca pelo conhecimento não para.

Tenha também em mente que estudar a química é também


compreender o que caracteriza a humanidade como um agente racional
e transformador, que sempre buscou, desde os seus primórdios, tentar
explicar os fenômenos da natureza, não apenas para compreendê-los, mas
para modificar as condições de vida no planeta Terra. Claro que essas ações
de transformação, muitas vezes, geram problemas, mas precisamos também
reconhecer que só chegamos até aqui hoje graças à curiosidade, que pode ser
vista como uma característica intrínseca de qualquer ser humano.

Dito isso, convido você a adentramos no mundo da química orgânica!

Profª. Clarice Fedosse Zornio

NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano,
há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o


material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato
mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação
no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir
a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de
estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.

Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar
dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.

Bons estudos!

IV
UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais
os seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais
que possuem o código QR Code, que é um código
que permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

V
VI
Sumário
UNIDADE 1 - FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA....................................................1

TÓPICO 1 - FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I......................................................3


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................3
2 BREVE HISTÓRICO...........................................................................................................................4
3 A QUÍMICA ORGÂNICA E A TABELA PERIÓDICA................................................................6
4 O CARBONO........................................................................................................................................8
5 ESTRUTURA ATÔMICA...................................................................................................................9
5.1 ORBITAIS ATÔMICOS...................................................................................................................10
5.2 CONFIGURAÇÃO ELETRÔNICA DO ESTADO FUNDAMENTAL.....................................15
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................18
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................20
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................21

TÓPICO 2 - FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II.....................................................23


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................23
2 LIGAÇÃO QUÍMICA.........................................................................................................................23
3 LIGAÇÕES COVALENTES I: TEORIAS DE LIGAÇÃO QUÍMICA........................................26
3.1 TEORIAS DE LIGAÇÃO QUÍMICA............................................................................................28
3.2 TEORIA DE LIGAÇÃO DE VALÊNCIA.....................................................................................29
3.2.1 Orbitais Híbridos Sp3............................................................................................................31
3.2.2 Orbitais Híbridos Sp2............................................................................................................35
3.2.3 Orbitais Híbridos Sp..............................................................................................................37
3.3 TEORIA DOS ORBITAIS MOLECULARES................................................................................39
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................41
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................44
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................45

TÓPICO 3 - FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III...................................................47


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................47
2 LIGAÇÕES COVALENTES II: ELETRONEGATIVIDADE
E MOMENTO DE DIPOLO...............................................................................................................47
2.1 ELETRONEGATIVIDADE............................................................................................................48
2.2 MOMENTO DE DIPOLO..............................................................................................................51
3 INTERAÇÕES INTERMOLECULARES.........................................................................................55
4 REPRESENTAÇÃO DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS.............................................................57
5 CLASSIFICAÇÃO DAS CADEIAS CARBÔNICAS.....................................................................61
6 INTRODUÇÃO AOS GRUPOS FUNCIONAIS ORGÂNICOS.................................................65
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................72
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................73

UNIDADE 2 - GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS...........................................75

TÓPICO 1 - HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS...................................77


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................77

VII
2 ALCANOS.............................................................................................................................................77
2.1 NOMENCLATURA DOS ALCANOS..........................................................................................78
2.1.1 Substituintes Alquila ............................................................................................................78
2.1.2 Regras de nomenclatura para os alcanos...........................................................................79
2.2 ESTEREOQUÍMICA DOS ALCANOS.........................................................................................88
2.3 ISOMERIA DOS ALCANOS.........................................................................................................88
2.4 CONFORMAÇÕES DOS ALCANOS..........................................................................................89
2.5 PROPRIEDADES DOS ALCANOS..............................................................................................93
3 CICLOALCANOS................................................................................................................................96
3.1 REGRAS DE NOMENCLATURA PARA OS CICLOALCANOS............................................96
3.2 ESTEREOQUÍMICA DOS CICLOALCANOS............................................................................98
3.2.1 Isomeria dos cicloalcanos.....................................................................................................98
3.2.2 Tensão no anel........................................................................................................................99
3.2.3 Conformações dos cicloalcanos...........................................................................................101
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................105
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................106

TÓPICO 2 - INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS..........................................................107


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................107
2 REAÇÕES ORGÂNICAS...................................................................................................................107
2.1 TIPOS DE REAÇÕES ORGÂNICAS............................................................................................107
3 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS MECANISMOS DE REAÇÃO QUÍMICA...........................115
3.1 REAÇÕES POLARES.....................................................................................................................117
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................122
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................124

TÓPICO 3 - HIDROCARBONETOS II: ALCENOS.........................................................................127


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................127
2 ALCENOS..............................................................................................................................................127
2.1 NOMENCLATURA DOS ALCENOS..........................................................................................128
3 ESTEREOQUÍMICA DOS ALCENOS............................................................................................133
3.1 ISOMERIA CIS-TRANS NOS ALCENOS...................................................................................133
3.1.1 Nomenclatura E, Z.................................................................................................................135
4 PROPRIEDADES DOS ALCENOS..................................................................................................138
4.1 REATIVIDADE DOS ALCENOS..................................................................................................141
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................146
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................148
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................149

UNIDADE 3 - GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA


E COMPOSTOS AROMÁTICOS.............................................................................151

TÓPICO 1 - HIDROCARBONETOS III: ALCINOS........................................................................153


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................153
2 ALCINOS...............................................................................................................................................153
3 NOMENCLATURA DOS ALCINOS...............................................................................................154
3 PROPRIEDADES DOS ALCINOS...................................................................................................159
4.1 REATIVIDADE DOS ALCINOS...................................................................................................161
4.1.1 Estabilidade do carbocátion.................................................................................................166
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................170
RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................172
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................173

VIII
TÓPICO 2 - ESTEREOQUÍMICA........................................................................................................175
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................175
2 ISOMERIA............................................................................................................................................175
3 QUIRALIDADE E O CARBONO ASSIMÉTRICO.......................................................................178
4 ENANTIÔMEROS...............................................................................................................................182
4.1 REPRESENTAÇÃO DOS ENANTIÔMEROS.............................................................................184
4.2 NOMENCLATURA R,S.................................................................................................................188
4.3 PROPRIEDADES DOS ENANTIÔMEROS.................................................................................191
5 DIASTEREOISÔMEROS .................................................................................................................195
LEITURA COMPLEMENTAR..............................................................................................................197
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................202
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................203

TÓPICO 3 - BENZENO E AROMATICIDADE.................................................................................205


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................................205
2 A ESTRUTURA DO BENZENO.......................................................................................................206
3 CONTRIBUINTES E HÍBRIDOS DE RESSONÂNCIA...............................................................210
4 NOMENCLATURA DOS COMPOSTOS AROMÁTICOS.........................................................212
RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................216
AUTOATIVIDADE................................................................................................................................217
REFERÊNCIAS........................................................................................................................................219

IX
X
UNIDADE 1

FUNDAMENTOS DA
QUÍMICA ORGÂNICA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:

• compreender um pouco sobre o desenvolvimento histórico da química e


da química orgânica;

• aprender os fundamentos que regem a química orgânica como área da


química;

• compreender o papel central do átomo de carbono na química orgânica;

• compreender o papel central da ligação covalente na química orgânica;

• familiarizar-se com alguns do modelos de representação de moléculas;

• identificar as diferentes cadeias carbônicas;

• compreender o conceito de grupos funcionais orgânicos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade
você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo
apresentado.

TÓPICO 1 –­ FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

TÓPICO 2 –­ FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

TÓPICO 3 –­ FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

FUNDAMENTOS DE QUÍMICA
ORGÂNICA I

1 INTRODUÇÃO
A primeira parte deste livro tem como objetivo maior discutir e apresentar
os fundamentos que levaram à definição da química orgânica como parte
integrante da grande área da química. No entanto, devemos ter em mente que
as subdivisões da química em química orgânica, química inorgânica, química
analítica, físico-química e bioquímica têm um caráter mais didático. Desse modo,
os conceitos estudados em cada uma dessas áreas não são excludentes, mas sim
complementares para o entendimento da química como ciência.

Essa unidade é dedicada aos conceitos que fundamentam o estudo da


química orgânica, pois é essencial que você compreenda primeiro a estrutura
atômica e o que faz do átomo de carbono tão especial para, assim, estudar os
diversos grupos funcionais orgânicos e suas especificidades. Dessa forma, no
primeiro tópico, começaremos nossos estudos com um pequeno histórico que
mostra a relação do homem com o mundo que o cerca, focando, obviamente,
na sua interação com os compostos extraídos da natureza e na sua gana por
compreender suas funções, propriedades, métodos de obtenção e etc., que acabou
culminando no desenvolvimento da química orgânica (e também da química
como área da ciência). Veremos que existem milhões de compostos orgânicos já
conhecidos e tentaremos compreender o porquê de existirem tantos compostos
assim, mesmo eles sendo formados, principalmente, pela combinação entre dez
elementos químicos.

Aqui, será estudado o que faz do átomo de carbono tão especial e


essencial para a vida na Terra. Estudaremos a estrutura atômica, com o intuito de
compreendermos, principalmente, o modo como os elétrons estão distribuídos
nos átomos. Entender isso é de suma importância, pois, como veremos nos tópicos
seguintes, os elétrons são os responsáveis pela formação de ligações químicas e,
consequentemente, da obtenção dos diferentes compostos orgânicos.

Com isso em mente, vamos ao que interessa!

3
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

2 BREVE HISTÓRICO
A história da química orgânica começa com a história da própria química.
Ao traçarmos uma linha temporal, podemos dizer que no momento em que o
Homo erectus dominou o fogo, a humanidade começou a dominar a química. Isso
porque, além da produção do fogo ser uma reação química por si só, o ato de
cozinhar alimentos envolve a transformação de compostos orgânicos. O domínio
do fogo data do período mais antigo da Pré-história (aparecimento dos primeiros
hominídeos até 4000 a.C.), o paleolítico, e por isso o mais antigo da história da
humanidade. Por esse motivo, podemos ser um pouco pretenciosos e dizer que
a história da química começa com a história da própria humanidade. Todavia,
apenas com o advento da linguagem escrita é que foi possível entender a relação
entre o homem e a química de uma forma mais contundente.

Papiros egípcios da Idade Antiga (4000 a.C. até 476 d.C.) descrevem o
uso e a produção de diversas fórmulas medicinais obtidas a partir de ervas. Os
mesmos antigos egípcios, assim como os romanos, os fenícios e outras civilizações
da época já conheciam técnicas de obtenção e de utilização de corantes, como o
índigo, a alizarina e o púrpura. Vestígios de vinho foram encontrados em tumbas
de faraós e mesmo na Bíblia há descrições do processo de fermentação da uva
para a obtenção do vinho (e, consequentemente, do álcool etílico) e sua posterior
oxidação para preparar o vinagre. Os povos da antiguidade também já estavam
familiarizados com o processo de fabricação do sabão a partir da banha de origem
animal e das cinzas da madeira.

A Idade Média (476 até 1473) foi um período histórico marcado pelo trabalho
dos alquimistas, que foi muito importante para consolidar, posteriormente, as
bases tanto da química moderna, quanto da medicina, da física e da matemática,
por exemplo. Apesar do caráter místico da alquimia, que se apoiava em conceitos
religiosos, espirituais e metafóricos, a tentativa de produzir a chamada Pedra
Filosofal (que permitiria a transmutação de qualquer metal em ouro e a obtenção
do Elixir da Longa Vida) contribuiu para o desenvolvimento do conhecimento
acerca dos metais e de alguns processos químicos (e suas aparelhagens), como a
destilação e a filtração. O trabalho dos alquimistas foi especialmente importante
para a química orgânica porque diversos novos compostos foram descobertos e
isolados, principalmente de plantas, como o ópio e a estricnina.

Durante a Idade Moderna (1473 até 1789) a química se desenvolveu a


passos largos. O interesse prático nos novos compostos descobertos, utilizados,
muitas vezes, para fins medicinais, levou à criação, junto ao ensino de medicina,
das primeiras cátedras universitárias de química durante o século XVII. Também,
durante a Idade Moderna, surgiu uma maior preocupação em obter esses novos
compostos nas suas formas mais puras, culminando em novas metodologias de
extração e purificação, além do maior interesse em conhecer suas propriedades e

4
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

composições. Assim, em meados dos anos 1770, Carl Wilhelm Scheele (químico
e farmacêutico sueco, 1742 – 1786) conseguiu extrair e isolar com maior grau de
pureza ácidos orgânicos já conhecidos pelos alquimistas da Idade Média, como o
ácido tartárico, obtido da uva, o ácido cítrico, do limão, e o ácido lático, do leite.

Antoine Laurent Lavoisier (químico francês, 1743 – 1794) foi capaz


de determinar que a composição de tais ácidos, assim como de muitos outros
compostos extraídos de fontes naturais, era de, principalmente, carbono e
hidrogênio – Lavoisier criou uma metodologia para a determinação da composição
de materiais baseada em testes de combustão: compostos orgânicos eram
queimados em presença de ar ou oxigênio e seus produtos, basicamente, água e
gás carbônico, eram mesurados –. De fato, Lavoisier contribui imensamente para
o desenvolvimento da química moderna, sendo comumente chamado de o pai
da química, enquanto que o século XVIII é conhecido como o século da química.

Até então, a obtenção de todo e qualquer composto orgânico era realizada


apenas através da extração de fontes naturais (tanto vegetal, quanto animal).
Assim, no início da Idade Contemporânea (1779 até os dias atuais), Jöns Jacob
Berzelius (químico e médico sueco, 1779 – 1848) cunhou o termo “química
orgânica” para se referir a tais compostos. Nessa época, devido à dificuldade em
sintetizar esses mesmos compostos em laboratório, disseminou-se a teoria da
força vital (ou vitalismo), que defendia que os compostos orgânicos poderiam
ser produzidos apenas por organismos vivos devido a uma energia vital inerente
à própria vida. No entanto, a ideia do vitalismo começou a ser derrubada em
1828, quando Friedrich Wöhler (químico alemão, 1800 – 1882) sintetizou a ureia
(composto produzido durante o metabolismo proteico e eliminado pela urina e
suor) a partir de um sal inorgânico. O trabalho de Marcellin Berthelot (químico
e político francês 1827 – 1907) também foi muito importante nesse sentido. Tanto
que em 1860 Berthelot compilou seus estudos e publicou o livro Chimie organique
fondée sur la synthèse (Química Orgânica Baseada na Síntese, em tradução livre) no
qual descrevia a síntese de inúmeros compostos orgânicos, como hidrocarbonetos,
gorduras e açúcares – é importante ressaltar que foi Berthelot que usou pela
primeira vez o termo “síntese” com o intuito de se referir a toda uma metodologia
utilizada para preparar um composto a partir de seus reagentes. Assim, devido
à necessidade de uma nova definição, Friedrich August Kekulé (químico alemão,
1829 – 1896) propôs o conceito utilizado até hoje: a química orgânica é a parte da
química que estuda os compostos que contém carbono.

É fato que de 1860 até os dias atuais houveram avanços científicos no que
concerne a química orgânica – como maior compreensão do átomo do carbono, a
elaboração de teorias sobre a ligação atômica, desenvolvimento de metodologias
para síntese de diversos compostos orgânicos, síntese de compostos orgânicos
não encontrados na natureza, surgimento e aperfeiçoamentos de técnicas de
caracterização, entre outros –, assim muitos desses avanços serão tratados nos
subtópicos seguintes deste livro de estudos.
5
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

DICAS

Existem diversas publicações que tratam da história da ciência, da química e da


química orgânica que são importantes para que possamos entender melhor os processos
que determinaram o mundo que conhecemos hoje. Desse modo, para que você possa se
aprofundar nesse tema, recomendamos a leitura dos seguintes textos: Um olhar sobre a história
da química no Brasil (OLIVEIRA; CARVALHO, 2002); A história da ciência e o objeto de seu estudo:
confrontos entre a ciência periférica, a ciência central e a ciência marginal (FILGUEIRAS, 2001);
Vinte e cinco anos de reações, estratégias e metodologias em química orgânica (CORREIA;
COSTA; FERREIRA, 2002); e A química na educação da princesa Isabel (FILGUEIRAS, 2002).

3 A QUÍMICA ORGÂNICA E A TABELA PERIÓDICA


Como vimos, a definição de Kekulé coloca o carbono como elemento
central da química orgânica, enquanto que Lavoisier já havia descoberto a
presença do hidrogênio nos compostos orgânicos. Mais tarde, foi possível
determinar que muitos desses compostos também continham oxigênio e
nitrogênio, e alguns outros também poderiam ser formados por enxofre,
fósforo e halogênios (flúor, cloro, bromo e iodo). Na tabela periódica, exposta
na Figura 1, estão destacadas as localizações dos átomos mais frequentemente
encontrados em compostos orgânicos. No entanto, atente-se ao fato de que
existem compostos cuja estrutura contém também outros elementos químicos,
porém seu número é limitado em relação aos compostos contendo carbono,
hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, flúor, fósforo, enxofre, cloro, bromo e iodo.
Podemos encontrar elementos químicos metálicos como o cobre, o zinco, o lítio
e o paládio em reagentes orgânicos, ao passo que compostos contendo rutênio
e ouro, por exemplo, são utilizados como catalisadores.

FIGURA 1 – TABELA PERIÓDICA NA QUAL SE DESTACAM OS ELEMENTOS QUÍMICOS


QUE MAIS APARECEM NA ESTRUTURA DE COMPOSTOS ORGÂNICOS

FONTE: A autora

6
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

Como exemplos de compostos orgânicos que contenham cada um


dos elementos químicos destacados na tabela periódica da Figura 1, podemos
citar: 1) o butano, cuja estrutura é formada apenas por carbono e hidrogênio;
2) o etanol, formado por átomos de carbono, hidrogênio e oxigênio; 3) todas
as bases nitrogenadas, adenina, timina, citosina e guanina, cujas estruturas
contêm carbono, hidrogênio e nitrogênio (as três últimas contêm ainda o
oxigênio); 4) a alicina, formada por carbono, hidrogênio, oxigênio e enxofre; 5)
o glifosato formado por carbono, hidrogênio, nitrogênio, oxigênio e fósforo; e 6)
o diclorodifeniltricloroetano (DDT), que contém em sua estrutura os átomos de
carbono, hidrogênio e cloro. Na Figura 2, estão representadas as nomenclaturas
(tanto os nomes comuns, quanto os nomes segundo a União Internacional de
Química Pura e Aplicada – IUPAC – do inglês International Union of Pure and
Applied Chemistry), as estruturas esqueléticas e as fórmulas químicas de todas
as moléculas citadas, de forma a irmos nos familiarizando com tais formas de
identificação, muito utilizadas na química orgânica. Não se preocupe que vamos
entender melhor o que cada um desses termos significa adiante.

FIGURA 2 – EXEMPLOS DE COMPOSTOS ORGÂNICOS

FONTE: A autora

7
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

DICAS

Aprenda mais sobre os compostos orgânicos presentes no nosso dia a dia


com a leitura dos seguintes textos: A História sob o olhar da química: as especiarias e
sua importância na alimentação humana (RODRIGUES; SILVA, 2010); A química dos chás
(BRAIBANTE, MARA ELISA FORTES et al., 2014); e A química dos agrotóxicos (BRAIBANTE,
ELISA MARA FORTES; ZAPPE, 2012).

4 O CARBONO
Hoje em dia já se conhecem mais de 16 milhões de compostos orgânicos
diferentes, com as mais variadas propriedades e desempenhando as mais variadas
funções: de sólidos cristalinos a óleos, de compostos biodegradáveis a plásticos
resistentes, de compostos do petróleo a corantes, de bactericidas a drogas
antitumorais, do simples metano (formado por um átomo de carbono e quatro
de hidrogênio) a complexa palitoxina (formada por 129 átomos de carbono, 221
átomos de hidrogênio, 54 átomos de oxigênio e três átomos de nitrogênio), dentre
outros. Existem ainda compostos orgânicos (naturais e sintetizados em laboratório)
que servem como fontes nutricionais (carboidratos, proteínas e vitaminas), de
energia (petróleo, gás natural e etanol), para confecção de vestimentas (algodão,
lã, seda e poliéster), para produção de fármacos etc.

Dessa forma, considerando o breve histórico e os exemplos de compostos


orgânicos descritos nas páginas iniciais deste livro de estudo já é possível perceber
a importância da química orgânica tanto para a evolução e manutenção da vida
em si quanto para nos proporcionar uma melhor qualidade/expectativa de vida.
De fato, como explicitado por Stephen Hawking – físico e cosmólogo britânico,
1942–2018 (1996, s.p.) “o que nós geralmente entendemos como ‘vida’ é baseado
em cadeias formadas por carbono, contendo alguns (poucos) outros átomos”, ou
seja, a vida na Terra é baseada no carbono.

Agora você deve estar se perguntando: o que torna o átomo de carbono tão
especial? A resposta vem exatamente da posição ocupada pelo carbono na tabela
periódica (lembre-se de que o número atômico do carbono é seis, o que significa
que seu núcleo é formado por seis prótons e sua eletrosfera por seis elétrons):

• por pertencer ao grupo 14 (ou 4A), a configuração eletrônica da camada de


valência do carbono é 2s22p2, ou seja, apresenta quatro elétrons de valência;
• por ocupar a posição intermediária do período dois da tabela periódica, o
carbono apresenta a tendência de compartilhar elétrons, podendo formar
ligações covalentes tanto com os átomos mais eletronegativos quanto com os
mais eletropositivos.

Tais características permitem que o carbono possa formar quatro ligações


covalentes, sejam elas com outros átomos de carbono (formando as cadeias de
8
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

carbono), sejam com outros átomos (como o mais eletropositivo, hidrogênio, e os


mais eletronegativos, nitrogênio, oxigênio e flúor).

Até aqui pudemos ter contato com a ideia geral que explica o papel central
do átomo de carbono na química orgânica, mas para entendermos melhor os
fundamentos dessa área da química precisamos rever alguns conceitos estudados
na química geral, como a estrutura do átomo, as teorias que explicam as ligações
covalentes e a geometria molecular, porém com um enfoque no átomo do carbono
e nas estruturas moleculares dos compostos orgânicos.

5 ESTRUTURA ATÔMICA
O estudo detalhado da estrutura dos átomos é considerado como um
domínio da física, enquanto que a química se baseia mais precisamente no
comportamento e nas propriedades de três partículas fundamentais: prótons,
nêutrons e elétrons. Dessa forma, retomando o que foi estudado na química
geral, o modelo nuclear do átomo considera que o átomo consiste em um núcleo
denso, o qual é rodeado pelos elétrons (formando uma nuvem eletrônica ao redor
do núcleo). O núcleo possui carga positiva, uma vez que é formado por prótons
(partículas subatômicas de carga positiva) e por nêutrons (partículas subatômicas
eletricamente neutras), enquanto que os elétrons possuem carga negativa.

Também é importante lembrar que as massas dos prótons e dos nêutrons são
1836 vezes maiores que a massa dos elétrons, o que significa que a massa do átomo
está concentrada quase que totalmente no núcleo. Por sua vez, os elétrons ocupam
a maioria do volume do átomo, devido à nuvem eletrônica ao redor do núcleo. A
Figura 3 mostra a representação esquemática do modelo nuclear do átomo, no qual
o centro é ocupado por um núcleo denso (positivamente carregado) rodeado por
elétrons (negativamente carregados) – atente-se para o fato dessa figura ser apenas
uma representação do modelo do átomo, o volume ocupado pelos elétrons é na
realidade muito maior em relação ao volume ocupado pelo núcleo.

FIGURA 3 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO MODELO NUCLEAR DO ÁTOMO

FONTE: A autora

9
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

5.1 ORBITAIS ATÔMICOS


Precisamos tomar certo cuidado relativo a essa representação esquemática,
já que uma análise apressada do modelo nuclear do átomo mostrado na Figura
3 pode nos induzir ao erro se imaginarmos que os elétrons orbitam o núcleo
como os planetas orbitam o sol, por exemplo, em uma trajetória bem definida e
periódica (lembre-se do modelo de átomo de Bohr). Isso porque o movimento dos
elétrons não pode ser descrito pelas leis da mecânica clássica, uma vez que, como
demonstrado em 1924 por Louis de Broglie (físico francês, 1892–1987), o elétron,
por possuir dimensões subatômicas, apresenta características tanto ondulatórias
quanto corpusculares (um conceito conhecido como dualidade onda-partícula).

Dessa forma, o comportamento do elétron deve ser analisado sob o domínio


da mecânica quântica, obedecendo o princípio da incerteza formulado por Werner
Heinseberg (físico alemão, 1901-1976), que afirma que as propriedades de uma
partícula atômica não podem ser determinadas simultaneamente. O princípio
da incerteza vem de uma demonstração matemática, mas em termos práticos,
podemos dizer que não é possível determinar a posição da partícula ao mesmo
tempo em que se determina a evolução temporal dessa partícula (ou o momento
dessa partícula). Isso porque o próprio ato de mesurar uma propriedade de uma
partícula de dimensões atômicas acaba por perturbar o sistema.

Assim, com base na mecânica quântica, Erwin Schrödinger (físico


austríaco, 1887–1961) postulou que o comportamento dos elétrons em um
átomo poderia ser descrito por funções de onda, cujas resoluções acabam por
descrever um volume no espaço tridimensional (eixos cartesianos xyz). A partir
desse volume, denominado de orbital atômico, é possível determinar as possíveis
posições ocupadas por um determinado elétron (a uma dada energia) durante
seu movimento ao redor do núcleo de um átomo. Assim, um orbital atômico é
definido para um elétron com uma determinada energia e expressa a região de
maior probabilidade de se encontrar tal elétron em sua trajetória ao redor do
núcleo. Você pode pensar em um orbital atômico como sendo a sobreposição de
todas as posições ocupadas pelo elétron durante seu percurso.

Essa ideia é representada na Figura 4, imagine que possamos tirar


fotografias de um elétron orbitando o núcleo de um átomo, assim, se tirarmos
milhares dessas fotografias e depois montarmos uma imagem sobreposta de
todas essas imagens, teremos uma representação de todos os pontos em que o
elétron ocupou durante sua órbita em torno do núcleo, o que representaria a ideia
do orbital atômico.

10
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

FIGURA 4 – ESQUEMA MOSTRANDO A IDEIA DE QUE O ORBITAL ATÔMICO SERIA A SOBREPOSIÇÃO DE


TODAS AS POSIÇÕES OCUPADAS PELO ELÉTRON DURANTE SUA TRAJETÓRIA AO REDOR DO NÚCLEO

FONTE: A autora

Até aqui pudemos entender um pouco sobre o modo com que os elétrons,
em um átomo, movimentam-se ao redor do núcleo ao definirmos o conceito de
orbital atômico. Como os elétrons ocupam esses orbitais atômicos? Quais são as
suas formas?

Primeiramente, de acordo com os princípios da mecânica quântica, para


que as funções de onda do elétron possam ser resolvidas, é preciso que cada
um dos elétrons em um átomo tenha uma identidade única e bem definida.
Basicamente, essa identidade é caracterizada por quatro números quânticos. O
estudo dos números quânticos foge um pouco ao escopo do foco de nosso estudo,
por isso, vamos nos concentrar nas definições que possibilitam que possamos
entender um pouco sobre o modo que os elétrons ocupam os orbitais atômicas e
também as formas que esses orbitais assumem. Assim:

• O número quântico principal (n) define o nível (ou camada) de energia ocupado
por um elétron. Vai de n = 1 (para o primeiro nível, de menor energia e mais
próximo do núcleo), para n = 2 (para o segundo nível), n = 3 (para o terceiro
nível) e assim por diante.

O número quântico principal (n) define a energia do orbital e governa seu


tamanho (assim, quanto maior n, mais longe do núcleo, e maior e mais
energético o orbital).

• O número quântico azimutal ou número quântico do momento angular


(l) define o momento angular do orbital do elétron (pense em algo como a
velocidade com a qual o elétron circula o núcleo). O número quântico do
momento angular indica a subcamada (da camada de energia definida pelo
número quântico principal) ocupada pelo elétron.

Existem n valores diferentes para l para cada valor de n.

11
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

Por exemplo:

Por convenção, decidiu-se chamar os orbitais l = 0 de orbitais s, l = 1 de


orbitais p, l = 2 de orbitais d e l = 3 de orbitais f.

O número quântico azimutal (l) indica a subcamada ocupada pelo elétron


e define a forma do orbital atômico (ou seja, os orbitais s, p, d e f possuem
formas bem distintas).

• O número quântico magnético (ml) indica a orientação do movimento orbital


do elétron em torno de um eixo específico no espaço tridimensional xyz,
definindo os orbitais presentes em cada um dos orbitais s, p, d e f (essa frase
pode parecer estranha, mas na prática significa que os orbitais s, p, d e f,
definidos por l, são na verdade um grande grupo de orbitais, que são agora
definidos um a um devido ao ml).

A quantidade de orbitais definidas por ml é encontrada fazendo-se a distribuição


unitária de -l até -l, ou seja:
Se l 0 (orbital s)=
= → ml 0 ; o que significa que o orbital s é composto por
apenas um orbital;
Se l 1(orbital p) → ml tem os valores - 1, 0 e + 1 ; portanto, o orbital p é
=
formado por três orbitais;
Se l 2 (orbital d) → ml tem os valores - 2, - 1, 0, + 1e + 2 ; assim, o orbital d
=
é formado por cinco orbitais;
Se l 3 (orbital f) → ml tem os valores - 3, - 2, - 1, 0, + 1, + 2 e + 3 ; assim, o
=
orbital f é formado por sete orbitais.

O número quântico magnético (ml) determina a orientação do momento


angular do orbital no espaço (em termos práticos, é como se indicasse a
orientação cartesiana xyz dos diferentes orbitais s, p, d e f).

• O número atômico magnético de spin (ml) indica o sentido da rotação do


elétron. Devido ao princípio de exclusão de Pauli, no máximo dois elétrons
podem ocupar um mesmo orbital e, para que não haja repulsão entre eles,
é preciso que esses elétrons tenham spins opostos, assim, por convenção, ml
1 1
pode assumir o valor de ms = - ou ms = + .
2 2
12
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

O número atômico magnético de spin (ms) indica o sentido da rotação do


elétron no orbital.

A Figura 5 apresenta um resumo do papel dos números quânticos para a


obtenção dos orbitais na resolução das funções de onda, assim como a hierarquia
das camadas, subcamadas e orbitais das subcamadas. Há dois pontos principais
a serem notados aqui: 1) a energia dos orbitais aumenta à medida em que n e l
aumentam, isso porque a distância do elétron até o núcleo aumenta, tornando o
nível mais energético; por outro lado, os valores de ml não influenciam na energia
do orbital, assim os orbitais definidos por ml para um mesmo n e l possuem a
mesma energia, sendo chamados de orbitais degenerados; 2) os nomes dos
orbitais são definidos a partir da combinação de n, l e ml, assim, o orbital s da
primeira camada (n = 1, l = 1 e ml = 0) é denominado orbital 1s, enquanto que o da
segunda camada (n = 2, l = 0 e ml = 0) é denominado orbital 2s; os orbitais p, d e f
também seguem a mesma regra, porém eles são também definidos de acordo com
o eixo em que se encontram, como os três orbitais p, px, py e pz.

FIGURA 5 – ARRANJO E DIREÇÃO DO AUMENTO DE ENERGIA DAS CAMADAS


SUBCAMADAS E ORBITAIS ATÔMICOS DE ACORDO COM OS NÚMEROS QUÂNTICOS

FONTE: Adaptado de Atkins e Jones (2012)

Até o momento, pudemos ter uma noção do modo como os elétrons


ocupam os orbitais, as energias desses orbitais, a nomenclatura dos orbitais,
mas, visualmente, como são esses orbitais? Como visto, existem quatro tipos de
orbitais (s, p, d e f) e cada um deles possui uma forma específica. Para o estudo
da química orgânica, vamos focar apenas nos orbitais s e p (que são os orbitais
ocupados do átomo do carbono), cujas formas são mostradas na Figura 6. Lembre-
se de que os orbitais indicam a probabilidade de localização do elétron em uma
dada energia, o que gera como resultado todos os pontos em que o elétron pode
ocupar, obtendo-se uma nuvem obscura (como esquematizado na Figura 4), sem
uma fronteira nítida. No entanto, para a representação esquemática dos orbitais é
necessário delimitar uma fronteira, chamada de superfície-limite, que representa
13
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

em 90 a 95% o espaço ocupado pelo elétron. Assim, os orbitais s apresentam uma


superfície-limite esférica e os três orbitais p têm a forma de halteres, sendo que
cada um deles se orienta sobre um dos eixos cartesianos xyz (px, py e pz). Para os
orbitais p também é importante notar que há duas regiões distintas com diferentes
sinais de função de onda (positivo ou negativo), representado por cores diferentes
(cinza claro e cinza escuro).

Na Figura 6 também estão representados os orbitais s para as primeiras


camadas de energia, ou seja, orbitais 1s, 2s e 3s. Assim, podemos visualizar que as
superfícies-limite apresentam diâmetro progressivamente maior (ou seja, à medida
em que o orbital sobe de nível e, consequentemente, de energia, ele aumenta de
tamanho). O mesmo princípio vale para os orbitais p, d e f, o que significa, por
exemplo, que os orbitais 3p são maiores que os orbitais 2p, por exemplo.

FIGURA 6 – REPRESENTAÇÃO DA SUPERFÍCIE-LIMITE (QUE DEFINE AS FORMAS) DOS


ORBITAIS ATÔMICO S E P

FONTE: A autora.

NOTA

Observe a figura anterior, note que existem três orbitais p, cada um orientado
sobre um dos eixos cartesianos (px, py e pz). A figura acima à direita mostra as diferenças
nos tamanhos dos orbitais 1s, 2s e 3s.

14
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

Estudar o conceito de orbitais atômicos é importante porque assim


conseguimos entender melhor como os diferentes elétrons se comportam e
interagem com o núcleo em um dado átomo, também nos ajuda a compreender
que cada elétron de um átomo possui uma identidade própria, caracterizada,
principalmente, por sua energia e seu spin. Para a química orgânica, essas
informações são especificamente importantes no que se refere à reatividade e às
ligações químicas entre os diferentes átomos.

DICAS

Recomendamos as leituras dos seguintes textos para ajudar no entendimento do


conceito dos orbitais atômicos: Modelos teóricos para a compreensão da estrutura da matéria
(ALMEIDA; SANTOS, 2001); A representação pictórica de entidades quânticas da química
(PESSOA JÚNIOR, 2007); Química quântica. Parte I: o átomo de hidrogênio (PEIXOTO, 1978);
e A informática no ensino: IV. Os orbitais atômicos hidrogenóides (DEGRÈVE, 1991).

5.2 CONFIGURAÇÃO ELETRÔNICA DO ESTADO FUNDAMENTAL


No subtópico anterior, vimos que os elétrons ocupam determinados
orbitais em um átomo. Porém, como podemos prever a ordem que os elétrons
ocupam esses orbitais? Temos que sempre ter em mente que na natureza as
configurações que envolvem menor energia são as mais estáveis. Pode-se inferir,
portanto, que os elétrons se arranjam de modo que a energia total do átomo seja
a mínima possível: para isso, os elétrons ocupam, primeiramente, os orbitais
atômicos menos energéticos. A descrição das posições ocupadas pelos elétrons
nos orbitais atômicos de menor energia é chamada de configuração eletrônica do
estado fundamental, que pode ser determinada utilizando três princípios:

• Princípio aufbau ou de edificação: os orbitais de menor energia são preenchidos


primeiramente, cuja sequência energética é: 1s < 2s < 2p < 3s < 3p < 4s < 3d < 4p
< 5s < 4d < 5p < 6s < 4f < 5d < 6p < 7s < 5f < 6d < 7p (diagrama de Pauling). (Nota:
“aufbau” significa “construção/edificação”, em alemão).

• Princípio da exclusão de Pauli: no máximo dois elétrons podem ocupar


um mesmo orbital, sendo que esses elétrons têm spin opostos. O modo
convencional de representar os elétrons com spins opostos é representar um
elétron com um spin em uma direção por uma seta apontada para cima (↑) e o
outro na direção contrária por uma seta apontada para baixo (↓).

• Regra de Hund: quando há orbitais degenerados (orbitais com a mesma


energia, o caso dos três orbitais p ou dos cinco orbitais d de uma mesma
camada de energia, por exemplo), os elétrons ocupam os orbitais diferentes
antes de se emparelharem (ou seja, quando elétrons de spin opostos ocupam
um mesmo orbital), a regra de Hund minimiza a repulsão entre os elétrons, o
que diminui a energia total do átomo.

15
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

EXEMPLO – Qual a configuração eletrônica no estado fundamental


para os átomos de hidrogênio e de carbono?

RESPOSTA

O primeiro passo é determinar o número de elétrons do átomo:

• pela tabela periódica, determinamos que o número atômico do átomo


de hidrogênio é 1 (Z=1), ou seja, o átomo de hidrogênio contém apenas
um próton em seu núcleo; em um átomo de carga neutra (caso do
hidrogênio neutro), o número de elétrons é igual ao número de prótons
desse átomo, assim, podemos determinar que o hidrogênio contém
apenas um elétron;

• do mesmo modo determinamos que número atômico do átomo de carbono


é 6 (Z=6), o que nos leva a definir que o carbono contêm seis elétrons.

Agora podemos aplicar o princípio aufbau, o princípio de exclusão


de Pauli e a regra de Hund para determinar a configuração eletrônica do
estado fundamental para os átomos de hidrogênio e de carbono.

Para fixar:

• Princípios aufbau: determina que os elétrons ocupam, primeiramente,


o orbital disponível de menor energia. O diagrama a seguir mostra os
orbitais de menor energia e as suas energias relativas, que vamos usar
como base para determinar a configuração no estado fundamental para
os átomos de hidrogênio e carbono:

• Princípio de exclusão de Pauli: determina que no máximo dois elétrons podem


ocupar um orbital atômico, sendo que esses elétrons possuem spin opostos.

• Regra de Hund: quando há orbitais degenerados, os elétrons ocupam os


orbitais diferentes antes de se emparelharem.

Vamos agora fazer a atribuição dos elétrons:

16
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

• Vimos que o átomo de hidrogênio possui apenas um elétron, que, pelo


princípio aufbau, vai ocupar o orbital menos energético, ou seja, 1s. Assim:

• O átomo de carbono possui seis elétrons, assim vemos que dois desses
elétrons (com spins opostos) vão ocupar o orbital 1s e mais dois outros
(também com spins opostos) o orbital 2s (isso porque esses orbitais são
os menos energéticos e apenas dois elétrons podem ocupar cada um
dos orbitais). Os dois elétrons restantes se acomodam de forma a cada
um ocupar um orbital 2p (que são degenerados), pois de acordo com a
regra de Hund, o arranjo mais estável é aquele com o número máximo
de elétrons desemparelhados. Assim:

A tabela a seguir descreve as posições ocupadas pelos elétrons,


os átomos de número atômico entre 1 e 8, seguindo os princípios listados
acima, para determinar a configuração eletrônica do estado fundamental
para cada um desses elementos.

TABELA 1 – CONFIGURAÇÃO ELETRÔNICA NO ESTADO FUNDAMENTAL PARA OS ÁTOMOS


DE NÚMERO ATÔMICO ENTRE 1 E 8

Elemento Número Orbital Configuração


químico atômico 1s 2s 2px 2py 2pz eletrônica fundamental
Hidrogênio (H) 1 ↓ 1s1
Hélio (He) 2 ↑↓ 1s2
Lítio (Li) 3 ↑↓ ↑ 1s22s1
Berílio (Be) 4 ↑↓ ↑↓ 1s22s2
Boro (B) 5 ↑↓ ↑↓ ↑ 1s22s22px1
Carbono (C) 6 ↑↓ ↑↓ ↑ ↑ 1s22s22px12py1
Nitrogênio (N) 7 ↑↓ ↑↓ ↑ ↑ ↑ 1s22s22px12py12pz1
Oxigênio (O) 8 ↑↓ ↑↓ ↑↓ ↑ ↑ 1s22s22px22py12pz1
FONTE: A autora

17
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

LEITURA COMPLEMENTAR

A QUÍMICA ORGÂNICA E A INDÚSTRIA

O que é a química orgânica?

A química orgânica é o estudo da estrutura, das propriedades, da composição,


das reações e da preparação de compostos contendo carbono, que incluem não apenas
hidrocarbonetos, mas também compostos contendo outros elementos químicos,
principalmente o hidrogênio (a maioria dos compostos contém pelo menos uma
ligação carbono-hidrogênio), o nitrogênio, o oxigênio, os halogêneos, o fósforo,
o silício e o enxofre. No início, esse ramo da química era limitado aos compostos
produzidos por organismos vivos, mas, posteriormente, passou a englobar as
substâncias preparadas pelo homem. A faixa de aplicação de compostos orgânicos
é enorme e inclui (mas não se limita a esses) os plásticos, produtos farmacêuticos,
petroquímicos, alimentícios, explosivos, tintas e cosméticos.

Onde a química orgânica é utilizada?

Os compostos orgânicos estão ao nosso redor. Eles são centrais para


o crescimento econômico de diversos países, principalmente nas indústrias
de borracha, de plásticos, de combustíveis, farmacêutica, de cosméticos, de
detergentes, de revestimentos, de corantes e de agroquímicos, só para citar
algumas. Os próprios fundamentos da bioquímica, da biotecnologia e da medicina
são construídos sobre os compostos orgânicos e seu papel nos processos da vida.
Além disso, muitos dos materiais de alta tecnologia são ao menos parcialmente
feitos de compostos orgânicos.

A química orgânica é uma ciência altamente criativa, que permite aos


químicos explorarem as propriedades dos compostos existentes, além de criarem
novas moléculas. Muito do tempo dos químicos orgânicos é dedicado aos
processos de sínteses de novos compostos e ao desenvolvimento de melhores
maneiras de sintetizar compostos previamente conhecidos.

Quais indústrias contratam químicos orgânicos?

Os químicos na academia, geralmente, estão envolvidos em pesquisas


de cunho mais fundamental, enquanto que os químicos industriais trabalham,
principalmente, no desenvolvimento de novos produtos. Os químicos orgânicos
são geralmente empregados em áreas da biotecnologia industrial e nas indústrias
química, de bens de consumo, petrolífera e farmacêutica.

• Biotecnologia industrial: a biotecnologia é uma área que envolve a biologia


aplicada, focando, basicamente, na manipulação de organismos vivos e de
bioprocessos para criar ou modificar produtos para um determinado uso. O
cultivo de plantas é amplamente considerado como o primeiro exemplo do uso
da biotecnologia, sendo também o precursor da engenharia genética moderna
e das tecnologias de cultura de células e de tecidos. Praticamente todos os
produtos biotecnológicos são resultado da química orgânica.

18
TÓPICO 1 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA I

A biotecnologia é usada nas áreas ambiental, de cuidado da saúde, de


produção agrícola, e para a produção de plásticos biodegradáveis, de óleos
vegetais e biocombustíveis, por exemplo.

• Indústria química: A indústria química é crucial para a economia da maioria


dos países, trabalhando para converter matérias-primas como o petróleo, o gás
natural, os metais e os minerais, e até mesmo o ar e água, em mais de 70.000
produtos diferentes.

Os produtos obtidos pela indústria química são usados para fazer uma
ampla variedade de bens de consumo, bem como milhares de produtos que são
insumos para as indústrias agrícola, de manufatura, de construção civil e de
serviços. Mais de três quartos da produção mundial da indústria química vêm
do processamento de plásticos e polímeros em geral, mas pode-se citar também
a ampla produção de materiais têxteis, de papel e celulose, de metais e do refino
do petróleo. É interessante citar que a própria indústria química consome cerca
de um quarto de sua própria produção.

• Indústria de bens de consumo: as indústrias de bens de consumo produzem


produtos a serem utilizados no dia a dia, como sabões, detergentes, xampus,
produtos de limpeza, cosméticos e artigos de plástico.

• Indústria petrolífera: a indústria petrolífera inclui os processos de exploração,


de extração, de refino, de transporte e de comercialização de produtos
petrolíferos. Os principais produtos, em volume, da indústria petrolífera,
são o óleo combustível e a gasolina, mas o petróleo também é amplamente
utilizado como matéria-prima para a produção de fármacos, de solventes, de
fertilizantes, de pesticidas e de plásticos.

• Indústria farmacêutica: a indústria farmacêutica é responsável por desenvolver,


produzir e comercializar medicamentos para uso humano ou animal. Todos
os produtos farmacêuticos estão sujeitos a um grande número de leis e
regulamentações (específicas de cada país) que se referem, principalmente, às
patentes, aos testes de segurança, eficácia e toxicológico de cada fármaco e às
estratégias de venda desses produtos.
FONTE: THE ACS DIVISION OF ORGANIC CHEMISTRY. Technical disciplines: organic chemistry.
Disponível em: <https://www.acs.org/content/acs/en/careers/college-to-career/areas-of-
chemistry/organic-chemistry.html>. Acesso em: 21 mar. 2018.

DICAS

Para se aprofundar mais no assunto, recomendamos a leitura dos textos: A


importância da síntese de fármacos (MENEGATTI; FRAGA; BARREIRO, 2001); Indústria química:
evolução recente, problemas e oportunidades (GALEMBECK et al., 2007); e Carboidratos
como fonte de compostos para a indústria de química fina (FERREIRA; SILVA; FERREIRA, 2013).

19
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Química orgânica é a parte da química dedicada ao estudo dos compostos


formados por carbono; vimos que além do átomo de carbono, outros elementos,
como hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, flúor, fósforo, enxofre, cloro, bromo e
iodo também são frequentemente encontrados em moléculas orgânicas.

• O papel central do carbono é explicado devido à capacidade do átomo de


carbono em formar quatro ligações covalentes, seja com outros átomos de
carbono (formando as cadeias de carbono), seja com átomos de elementos
químicos diferentes (como o mais eletropositivo hidrogênio, e os mais
eletronegativo nitrogênio, oxigênio e o flúor).

• O modelo atômico em voga consiste em um núcleo de carga positiva (formado


por prótons e nêutrons) rodeado por elétrons de carga negativa.

• O comportamento dos elétrons em um átomo é descrito pela mecânica quântica,


sendo os orbitais atômicos definidos como a região de maior probabilidade de
se encontrar tal elétron em sua trajetória ao redor do núcleo.

• Os orbitais atômicos possuem energia e formas diferentes, os orbitais s


apresentam uma superfície-limite esférica e os três orbitais p têm a forma de
halteres, sendo que cada um deles se orienta sobre um dos eixos cartesianos
xyz (px, py e pz).

• A configuração eletrônica do estado fundamental descreve as posições


ocupadas pelos elétrons de um átomo nos orbitais atômicos de menor energia,
sendo determinada seguindo-se três princípios: o princípio aufbau, o princípio
da exclusão de Pauli e a regra de Hund.

20
AUTOATIVIDADE

1 Sobre as razões que definem porque existe um número tão elevado de


compostos orgânicos, julgue as seguintes asserções em verdadeiro ou falso:

a) ( ) O carbono reage vigorosamente com quase todos os elementos


químicos.
b) ( ) O átomo de carbono tem uma valência variável.
c) ( ) Os átomos de carbono podem unir-se formando cadeias.
d) ( ) O átomo de carbono pode se ligar tanto a elementos químicos mais
eletronegativos, quanto a menos eletronegativos.

2 Sabendo que a composição química dos seres vivos é feita por compostos
inorgânicos e orgânicos, classifique as substâncias a seguir em Orgânicas ou
Inorgânicas:

a) Água (H2O).
b) Ureia (CH4NO2).
c) Vitamina A (C20H30O).
d) Carbonato de cálcio (CaCO3).

3 Sobre os orbitais atômicos, julgue as afirmativas a seguir em Verdadeira ou


Falsa:

a) ( ) Os orbitais atômicos possuem as formas e energias diferentes que


dependem dos seus números quânticos.
b) ( ) Um orbital atômico expressa a região de maior probabilidade de se
encontrar um determinado elétron em sua trajetória ao redor do núcleo.
c) ( ) O orbital 3s possui menor energia que o orbital 1s.
d) ( ) Os três orbitais p são degenerados porque possuem mesma energia.

4 Escreva a configuração eletrônica do estado fundamental de cada um dos


seguintes elementos químicos:

a) Flúor:
b) Fósforo:
c) Bromo:
d) Iodo:

21
22
UNIDADE 1
TÓPICO 2

FUNDAMENTOS DE QUÍMICA
ORGÂNICA II

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1, estudamos um pouco da história da química orgânica e
as especificidades do átomo de carbono que permitem que uma infinidade de
compostos orgânicos exista. Agora, no Tópico 2, dedicaremo-nos ao entendimento
de como o átomo de carbono se combina tanto com outros átomos de carbono,
quanto com os átomos de outros elementos químicos para formar os mais
diferentes compostos orgânicos. Assim, começaremos estudando a razão principal
dos átomos se ligarem por meio das ligações químicas e os três diferentes tipos de
ligações químicas (ligação iônica, metálica e covalente).

A partir daqui, focaremos apenas no estudo das ligações covalentes, pois


é por meio delas que são formados os compostos orgânicos (chamados também
de moléculas, a partir dos estudos desse tópico você entenderá porque).

Estudaremos a tetravalência do carbono e as teorias de ligações químicas


(teoria de ligação de valência e teoria do orbital molecular). Focaremos um pouco
mais na teoria de ligação de valência, pois ela traz um conceito muito importante:
o conceito de hibridização de orbitais atômicos.

2 LIGAÇÃO QUÍMICA
À exceção dos gases nobres (grupo 18 da tabela periódica), que são
encontrados na natureza como átomos isolados, todos os outros elementos químicos
tendem a se combinar entre si, formando ligações químicas. Essa tendência é
observada porque a energia resultante da ligação química entre os núcleos e elétrons
de dois (ou mais) átomos é menor do que a energia total desses átomos isolados, ou
seja, a ligação química entre átomos gera substâncias mais estáveis.

A ligação química é governada pela interação dos elétrons dos átomos


que participam dessa ligação, por isso, analisar a configuração eletrônica do
estado fundamental dos átomos é essencial para entender como esses átomos se
ligam. Aqui, os elétrons de valência (elétrons que ocupam os orbitais da camada
mais externa) adquirem especial importância, uma vez que são esses elétrons que
participam ativamente das ligações químicas. Assim a configuração eletrônica de
valência do átomo acaba por determinar o tipo de ligação química que esse átomo
pode formar, que são três: ligação iônica, ligação metálica e ligação covalente.
23
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

• Ligação iônica: é caracterizada pela transferência completa de elétrons entre os


átomos, um composto iônico é formando por um cátion (íon positivo, ou seja,
perdeu elétrons) e um ânion (íon negativo, ganhou elétrons) que se atraem
eletrostaticamente devido a suas cargas opostas.

• Ligação metálica: ocorre quando um grande número de cátions metálicos


é mantido ligado através de um mar de elétrons que fluem livremente pela
estrutura metálica (esse mar de elétrons é proveniente dos elétrons de valência
dos elementos que formam os cátions metálicos).

• Ligação covalente: é caracterizada pelo compartilhamento dos elétrons de


valência de dois átomos para formar uma nova substância; essa nova substância
não é formada por íons (os átomos não perdem ou ganham elétron), sendo
também chamada de molécula.

Todas as ligações químicas (iônica, covalente e metálica) são determinadas


por forças que possibilitam que os átomos de uma determinada substância se
mantenham unidos. Dessa forma, por serem forças que agem no “interior” da
substância, elas são chamadas de forças intramoleculares.

Aqui foram apresentados os três principais tipos de ligação química, mas,


no que concerne à química orgânica, qual é o tipo principal de ligação química
a ser considerado? Com o desenvolvimento da química moderna, uma das
grandes preocupações dos cientistas era justamente entender como se formavam
os compostos orgânicos e como se mantinham unidos. Assim, novos estudos
foram sendo desenvolvidos a fim de se compreender melhor a química do átomo
de carbono e a forma como os compostos orgânicos se estruturavam. Kekulé e
Archibald Scott Couper (químicos escoceses, 1831-1892) puderam definir, em
1848, em trabalhos realizados de forma independente, o caráter tetravalente do
carbono, ou seja, em toda e qualquer molécula orgânica cada átomo de carbono é
capaz de formar quatro ligações com outros átomos.

Mais tarde, em 1874, Jacobus Van’t Hoff (químico holandês, 1852-1911)


e Joseph Le Bel (químico francês, 1847-1930) propuseram que as quatro ligações
realizadas pelo carbono são estruturadas tridimensionalmente na forma de um
tetraedro regular, no qual o carbono ocupa a posição central do tetraedro e os
outros átomos da ligação estão posicionados sobre os vértices (veja esquema
da figura a seguir). Somente em 1911, Gilbert Newton Lewis (físico-químico
americano, 1845-1946) pôde determinar que o carbono não perdia ou ganhava
elétrons quando formava um composto orgânico, definindo então que as ligações
em compostos orgânicos se davam por compartilhamento de elétrons (ligação
covalente). Dessa forma, foi possível determinar que os compostos orgânicos
eram precisamente moléculas orgânicas (ou seja, compostos cujos átomos são
ligados entre si exclusivamente por ligações covalentes).

A figura a seguir mostra a representação da conformação espacial


tetraédrica do metano utilizando o modelo de bolas e varetas e a projeção de
Haworth. Vale citar que o modelo de bolas e varetas é um modelo tridimensional

24
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

que possibilita mostrar a conformação de uma molécula no espaço, mostrando


seus ângulos de ligações. Nesse modelo, os átomos são mostrados como esferas,
ou bolas – no caso do metano, as esferas brancas indicam os hidrogênios e a
cinza o carbono – e as ligações são representadas como varetas ligando essas
esferas. A projeção de Haworth é um modelo que indica, no plano do papel, a
conformação tridimensional de uma molécula. Para isso, usamos três tipos de
linhas para representar as ligações: 1) linhas finas e sólidas para representar as
ligações posicionadas no plano do papel; 2) linhas mais espessas e sólidas para
indicar as ligações saindo do plano do papel; e 3) linhas espessas e tracejadas para
representar as ligações entrando no plano do papel).

FIGURA 7 – ESTRUTURA TETRAÉDRICA DO METANO REPRESENTADA PELO MODELO DE


BOLAS E VARETAS E PELA PROJEÇÃO DE HAWORTH

FONTE: A autora

Um estudo mais detalhado dos diferentes tipos de ligações químicas


pode ser obtido em livros de química geral. No que se refere à química orgânica,
concentraremo-nos nas ligações do tipo covalente, que são as ligações presentes
nos compostos (ou moléculas) orgânicos (as).

DICAS

Recomentados a leitura do texto Ligações químicas: ligação iônica, covalente


e metálica (DUARTE, 2001).

25
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

NOTA

Até o momento, usamos a designação “compostos orgânicos” para nos referirmos


às substâncias estudadas neste livro de estudo, porém, de agora em diante, usaremos
o termo “molécula”, de modo a enfatizarmos o papel da ligação covalente na formação
desses compostos.

3 LIGAÇÕES COVALENTES I:
TEORIAS DE LIGAÇÃO QUÍMICA
Uma das primeiras formas de teorizar o modo como as ligações químicas
acontecem foi proposta por Lewis, que indica que um átomo seria mais estável
se sua camada de valência tivesse a mesma configuração eletrônica de valência
dos gases nobres, conhecidos por sua grande estabilidade. Desse modo, para
formar ligações covalentes, os átomos passam a compartilhar elétrons a fim
de “completarem” suas camadas de valência (ou seja, alcançar a configuração
de valência do gás nobre). Assim, o número de ligações covalentes que cada
átomo pode realizar depende justamente da quantidade de elétrons adicionais
necessários para completar sua camada de valência. Por exemplo:

• Olhando na tabela periódica, vemos que o gás nobre mais próximo do


hidrogênio (número atômico 1) é o hélio (número atômico 2). Portanto, para
que o hidrogênio forme ligações covalentes com outros átomos, é preciso que
ele compartilhe elétrons de forma a obter a configuração eletrônica de valência
do hélio. A configuração eletrônica do hidrogênio é 1s1 e a do hélio 1s2, assim,
o hidrogênio precisa de um elétron para alcançar a configuração eletrônica do
hélio, o que significa que o hidrogênio pode formar uma ligação covalente com
outro átomo.

• No caso do carbono, o gás nobre mais próximo é o neônio, assim o carbono


precisa alcançar a configuração eletrônica de valência do neônio para formar
ligações covalentes. A configuração eletrônica de valência do carbono é
2s22p2 (ou seja, o carbono possui quatro elétrons de valência) e a do neônio é
2s22p6 (o neônio possui oito elétrons de valência), então, o carbono necessita
de mais quatro elétrons para alcançar a configuração do neônio. Portanto, o
carbono forma quatro ligações covalentes com outros átomos (lembre-se da
tetravalência do carbono, proposta por Kekulé e Couper).

• Da mesma forma que o carbono, o neônio é o gás nobre mais próximo tanto
do nitrogênio, quanto do oxigênio. O nitrogênio tem cinco elétrons de valência
(2s22p3) e o oxigênio tem seis (2s22p4), assim o nitrogênio precisa de mais três
elétrons, formando três ligações covalentes, enquanto que o oxigênio precisa
de dois elétrons, formando duas ligações covalentes.

26
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

Analisando os exemplos apresentados anteriomente, podemos


perceber que os átomos de um certo elemento químico tendem a alcançar a
configuração eletrônica de valência dos gases nobres mais próximos a eles
na tabela periódica. Como, à exceção do hélio (cuja camada de valência é
composta por apenas dois elétrons), todos os outros gases nobres possuem
oito elétrons na sua camada de valência. Assim, o modelo proposto por Lewis
passou a ser chamado de regra do octeto.

ATENCAO

Recapitulando: de acordo com a regra do octeto, uma molécula orgânica


estável é formada quando todos os átomos participantes de cada uma das ligações
covalentes atingem a configuração eletrônica de valência dos gases nobres (dois elétrons
para o hidrogênio e oito elétrons para os demais); a regra do octeto também dita que
o número de ligações realizadas por cada átomo depende da quantidade necessária de
elétrons que ele precisa ganhar para atingir tal configuração eletrônica.

Um modo bastante prático de representar os elétrons de valência de um


átomo é utilizar a estrutura de Lewis (também chamada de estrutura de pontos),
no qual cada ponto indica um elétron. Podemos observar na figura a seguir (à
esquerda) a representação de Lewis para os elétrons de valência para os átomos
de hidrogênio, carbono, nitrogênio e oxigênio. Perceba, na figura, que os átomos
de valência podem estar isolados ou em pares (por exemplo, o átomo de carbono
apresenta quatro elétrons de valência e todos eles estão isolados, enquanto que
o nitrogênio tem cinco elétrons de valência, dos quais três estão isolados e dois
estão formando um par), é importante notar isso porque apenas os elétrons
isolados que participam da ligação covalente, como também indicado na figura
(à direita), mostram as estruturas de Lewis e de Kekulé para as moléculas de
metano, metanol e metilamina. Perceba, nas estruturas de Lewis, que com a
formação das ligações covalentes das moléculas todos os átomos (o carbono,
hidrogênio, o nitrogênio e o oxigênio) completaram sua camada de valência a
fim de obedecerem à regra do octeto (agora, com as ligações, cada hidrogênio
tem dois elétrons na sua camada de valência e os outros átomos têm oito
elétrons). A estrutura de Kekulé mostra as ligações covalentes por traços e os
elétrons isolados continuam sendo indicados por pontos.

27
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 8 – À ESQUERDA: ELÉTRONS DE VALÊNCIA DE ALGUNS ÁTOMOS DE ACORDO COM A


REPRESENTAÇÃO DE LEWIS. À DIREITA: MOLÉCULAS REPRESENTADAS DE ACORDO COM AS
ESTRUTURAS DE LEWIS E DE KEKULÉ

FONTE: A autora

3.1 TEORIAS DE LIGAÇÃO QUÍMICA


A regra do octeto é útil para explicar porque dois átomos compartilham
seus elétrons para formar ligações covalentes, no entanto, não é suficiente para
entendermos como esse compartilhamento leva à formação de uma ligação
química. A regra do octeto trata os elétrons como partículas, não considerando
o caráter de onda desses elétrons (lembre-se da dualidade onda-partícula) e,
portanto, não leva em conta o papel dos orbitais atômicos no processo de formação
de uma ligação química. Assim, dois modelos teóricos foram desenvolvidos a fim
de explicar a formação de ligações covalentes seguindo os preceitos da mecânica
quântica: a teoria de ligação de valência e a teoria dos orbitais moleculares.

28
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

Vale ressaltar que ambos os modelos são aceitos e usados de acordo com
as circunstâncias. Isso significa que há casos que podem ser melhor explicados se
baseados na teoria de ligação de valência, enquanto outros são melhor descritos
pela teoria dos orbitais moleculares.

3.2 TEORIA DE LIGAÇÃO DE VALÊNCIA


A teoria de ligação de valência prega que uma ligação covalente se
forma pela sobreposição dos orbitais de dois átomos. Essa sobreposição leva
à união dos átomos, pois ela permite que os elétrons participantes da ligação
ocupem simultaneamente os orbitais de ambos os átomos e sejam atraídos por
seus núcleos.

Podemos citar, como exemplo, o caso da formação da molécula H2 (gás


hidrogênio). Como pode ser visto na figura a seguir, a ligação covalente H­–H é
resultado da sobreposição frontal dos orbitais 1s dos dois átomos de hidrogênio
(cuja configuração eletrônica de valência é 1s1, ou seja, o orbital 1s de cada
hidrogênio é ocupado por um elétron). Os orbitais sobrepostos apresentam a
forma de um ovo (esfera “alongada”) e a ligação covalente formada devido à
sobreposição frontal dos orbitais atômicos é chamada de ligação s.

É importante citar que uma ligação s é dita cilindricamente simétrica, pois


os elétrons que participam da ligação têm a probabilidade de ocupar esses orbitais
sobrepostos de maneira simétrica em torno de uma linha imaginária que conecta
os centros dos dois átomos unidos pela ligação simples. O esquema à direita na
figura a seguir mostra exatamente isso: tal figura representa a molécula de H2,
em que a região cinza representa os orbitais 1s sobrepostos e os pontos pretos o
núcleo dos átomos; assim, podemos ver que a sobreposição dos orbitais atômicos
gera uma densidade de probabilidade eletrônica (ou seja, a região onde é mais
provável encontrar os elétrons da molécula) que é simétrica ao redor do eixo de
ligação (determinado pelas posições dos núcleos dos dois átomos do hidrogênio).
É indispensável fixar que uma ligação simples sempre é uma ligação s.

FIGURA 9 – À ESQUERDA: SOBREPOSIÇÃO DOS ORBITAIS 1S DOS ÁTOMOS DE HIDROGÊNIO PARA


A FORMAÇÃO DA LIGAÇÃO COVALENTE DA MOLÉCULA DE H2. À DIREITA: SIMETRIA CILÍNDRICA
DOS ORBITAIS 1S SOBREPOSTOS DO H2

FONTE: A autora

29
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

Em uma ligação covalente, cada elétron, antes atraído apenas pelo seu
próprio núcleo, passa também a ser atraído pelo núcleo do outro átomo que
participa da ligação. Esse processo diminui os efeitos de repulsão, fazendo com
que o sistema fique mais estável e libere energia. No entanto, a sobreposição dos
orbitais e a formação da ligação covalente ocorre somente quando os dois átomos
se encontram a uma determinada distância entre si: se os átomos estiverem muito
separados, não será possível que seus orbitais se sobreponham; se estiverem
extremamente próximos, haverá repulsão entre os núcleos positivos dos dois
átomos. Dessa forma, a distância ideal é definida para que seja possível sobrepor
os orbitais atômicos dos átomos e para que a energia do sistema seja mínima (não
havendo problemas de repulsão). Essa distância específica ideal é definida como
comprimento de ligação e é característica de cada ligação covalente (por exemplo,
o comprimento da ligação H–H é de 7,4 x10-11 m, ou 74 picômetros, e a do C–C no
etano, C2H4, é 153 picômetros).

Na figura a seguir, apresenta-se um esquema que retrata a energia do


sistema em função da distância entre os núcleos (distância internuclear) de dois
átomos de hidrogênio. Podemos perceber que, na posição 1, os átomos estão
muito afastados e a energia total do sistema é a soma das energias de cada um
dos átomos. A posição 2 mostra que à medida que os átomos se aproximam e seus
orbitais começam a se sobrepor, a energia do sistema começa a diminuir até atingir
um valor mínimo, dado pela posição 3, que é justamente a distância ideal entre
os núcleos e que dita o comprimento de ligação. Caso a distância internuclear
continue a diminuir, a energia do sistema aumentará significativamente, devido
aos efeitos de repulsão entre os núcleos (posição 4).

FIGURA 10 – ENERGIA DO SISTEMA EM FUNÇÃO DA DISTÂNCIA ENTRE DOIS ÁTOMOS DE


HIDROGÊNIO

FONTE: A autora

30
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

A formação da ligação covalente para o H2 é um caso mais simples para


explicar a sobreposição dos orbitais atômicos e a teoria de ligação de valência,
pois há uma sobreposição direta de dois orbitais s. No entanto, para moléculas
formadas por mais de dois átomos e por átomos cujos elétrons de valência ocupem
outros orbitais (p, d ou f) a situação é um pouco mais complexa. De fato, a simples
sobreposição direta de orbitais não explica as ligações covalentes obtidas para as
moléculas orgânicas e, para uma melhor interpretação, um novo conceito precisa
ser definido, o dos orbitais híbridos.

3.2.1 Orbitais Híbridos Sp3


Conforme já exposto, o carbono apresenta configuração eletrônica de
valência 2s22p2, ou seja, dois dos seus elétrons de valência ocupam o orbital 2s
e dois os orbitais p (px, py ou pz), como demostrado na figura a seguir. Lembre-
se das regras utilizadas para determinar a configuração eletrônica no estado
fundamental de um átomo (atente-se que os orbitais 2s são menos energéticos
que os orbitais p, e os três orbitais p, px, py e pz são degenerados, ou seja, possuem
a mesma energia).

FIGURA 11 – DISTRIBUIÇÃO ELETRÔNICA DOS ELÉTRONS


DA CAMADA DE VALÊNCIA DO CARBONO

FONTE: A autora

Analisando a distribuição eletrônica do carbono, podemos perceber certas


dificuldades para completar a camada de valência do carbono a fim de atingir
a configuração eletrônica do neônio (2s22p6). Pela figura acima percebemos que
os quatro elétrons necessários para completar a camada de valência deveriam
ocupar os orbitais 2p (já que o orbital 2s já está completo) de forma que dois
átomos cederiam um elétron cada para completar os orbitais 2px e 2py e um
terceiro átomo precisaria ceder dois elétrons para ocupar o orbital 2pz. De acordo
com esse arranjo, o carbono faria apenas três ligações covalentes, o que contradiria
a tetravalência do carbono, já provada.

31
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

Linus Pauling (químico americano, 1901-1994) pôde solucionar esse


impasse formulando a ideia da hibridização de orbitais. A hibridização de orbitais
é demonstrada matematicamente e indica que o orbital 2s e os três orbitais 2p do
carbono podem se combinar entre si gerando quatro orbitais atômicos degenerados,
denominados orbitais híbridos sp3 (perceba que esse orbital é denominado “s-p
três” e que o índice 3 indica que três orbitais p se combinam com um orbital s). Na
figura a seguir, é possível visualizar a forma dos orbitais híbridos sp3, assim como
a distribuição eletrônica no carbono com hibridização sp3.

FIGURA 12 – FORMAÇÃO DOS ORBITAIS HÍBRIDOS SP3 DO CARBONO

FONTE: A autora

Como indicado na figura, à esquerda, os quatro orbitais sp3 são formados


por uma combinação matemática entre um orbital s e três orbitais p. Isso faz com
que os orbitais híbridos sejam degenerados entre si e apresentem uma energia
intermediária entre os orbitais que lhes deram origem (s e p). Já à direita é
possível ver que, com a hibridização, cada um dos quatro elétrons de valência do
carbono ocupa um orbital degenerado 2sp3. Dessa forma, cada um desses orbitais
híbridos pode aceitar um elétron para formar uma ligação covalente, explicando
a tetravalência do carbono.

A formação de orbitais sp3 explica, de forma concisa, porque as quatro


ligações covalentes do metano são idênticas (resultado da sobreposição dos
orbitais 1s do hidrogênio com os quatro orbitais degenerados sp3 do carbono), e
também seu arranjo tetraédrico. A figura a seguir demonstra um esquema para
visualização das orientações espaciais de cada um dos orbitais híbridos sp3 do
carbono, a fim de mostrar o arranjo tetraédrico. Na Figura 14 é exposta a formação
da molécula de metano através da sobreposição dos orbitais 1s do hidrogênio e
dos orbitais híbridos sp3 do carbono (formação da ligação C–H).

De fato, o arranjo tetraédrico é a melhor forma com que orbitais sp3 podem
se orientar ao redor do núcleo do carbono de modo a minimizar a repulsão entre os
elétrons. Essa geometria tetraédrica específica também é responsável por definir
os ângulos de ligação em um carbono com hibridização sp3: todas as ligações
C–H do metano possuem ângulo de 109,5º, conhecido como ângulo tetraédrico. A
força da ligação C–H no metano é de 438 kJ.mol-1 (a força de ligação mede a força
que mantém dois átomos juntos, assim, quanto maior a força de ligação, maior a
atração entre os átomos e mais difícil separá-los). Na Figura 14 estão indicados o
comprimento e o ângulo da ligação C–H.

32
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

FIGURA 13 – ORIENTAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS SP3 DO ÁTOMO DE CARBONO

FONTE: A autora

FIGURA 14 – À ESQUERDA: ESQUEMA PARA A FORMAÇÃO DO METANO. À DIREITA: PROJEÇÃO


DE HAWORTH E COMPRIMENTOS DAS LIGAÇÕES PARA O METANO

FONTE: A autora

A hibridização sp3 também é capaz de explicar a ligação covalente entre os


átomos de carbono. Por exemplo, o etano (C2H6) é obtido devido à sobreposição de
dois orbitais sp3 de dois átomos de carbono, formando a ligação σ C–C, assim como
a sobreposição dos orbitais 1s do hidrogênio aos orbitais híbridos sp3 restantes
de cada átomo de carbono, formando as ligações C–H, como esquematizado na
figura a seguir (à esquerda). Os ângulos de ligação no etano são de 111º, bem
próximos ao valor definido para o ângulo tetraédrico (isto é, 109,5º). A formação
da molécula do etano pode ser melhor visualizada de acordo com o esquema
mostrado na Figura 16. O etano possui ligações C–H e C­–C, assim o comprimento
da ligação e a força da ligação C–H são 110 pm e 420 kJ.mol-1 (bem próximos dos
valores para o metano), respectivamente, enquanto que para a ligação C–C tem-
se um comprimento de ligação de 154 pm e uma força de ligação de 376 kJ.mol-1
(a figura a seguir à direita mostra a representação da estrutura do etano usando a
projeção de Haworth, além dos comprimentos da ligação C–C e C–H e o ângulo
de ligação C–H). Note que a força de ligação da ligação C–C é menor que a da
C–H, o que indica que os átomos de carbono estão mais fracamente ligados do
que os átomos de carbono e hidrogênio, sendo, portanto, mais fácil quebrar a
ligação C–C do que a ligação C–H do etano.

Na Figura 16 são mostradas algumas outras formas de representação da


molécula do etano.

33
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 15 – À ESQUERDA: ESQUEMA PARA A FORMAÇÃO DO ETANO. À DIREITA: PROJEÇÃO


DE HAWORTH E COMPRIMENTOS DAS LIGAÇÕES PARA O ETANO

FONTE: A autora

FIGURA 16 – ALGUMAS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO ETANO (C2H6)

FONTE: A autora

O mesmo princípio para a formação da molécula do etano pode ser


estendido para qualquer outra molécula em que haja ligação covalente simples
entre átomos de carbono. Assim, a sobreposição de orbitais híbridos sp3 é
a maneira com que as ligações covalentes simples são formadas, tanto para o
pequeno etano, quanto para estruturas mais complexas com cadeias de carbono
mais extensas.

Vale lembrar que toda sobreposição de orbitais sp3 gera uma ligação simples
(compartilhamento de apenas um par de elétrons), designada ligação s, pois os
elétrons participantes se distribuem uniformemente ao redor do eixo de ligação.

NOTA

O termo híbrido se refere a algo que resulta da mistura de dois ou mais elementos
diferentes.

34
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

3.2.2 Orbitais Híbridos Sp2


Muitas moléculas orgânicas apresentam, além de ligações simples, ligações
duplas (compartilhamento entre dois átomos de dois pares de elétrons) e/ou triplas
(compartilhamento entre dois átomos de três pares de elétrons). E, diferentemente
das moléculas orgânicas em que há ligação simples entre os carbonos (caso em
que os orbitais de valência do átomo de carbono estão hibridizados na forma
sp3), nas moléculas em que há ligações múltiplas (ligações duplas ou triplas) os
átomos de carbono apresentam outras formas de hibridização.

De acordo com a teoria de ligação de valência, a ligação dupla entre


átomos de carbono ocorre quando os orbitais de valência do carbono se combinam
para formar orbitais híbridos sp2. Agora, apenas dois dos orbitais 2p do carbono
se combinam com o orbital 2s, gerando três orbitais sp2, degenerados entre si,
enquanto que um orbital 2p permanece inalterado (e possui energia maior que
os orbitais sp2). Veja o esquema que mostra também a distribuição eletrônica no
carbono com hibridização sp2:

FIGURA 17 – FORMAÇÃO DOS ORBITAIS HÍBRIDOS SP2 DO CARBONO

FONTE: A autora

Os três orbitais híbridos sp2 e o orbital 2p remanescente também se orientam


no espaço ao redor do núcleo do átomo de carbono com a finalidade de reduzir a
repulsão entre os elétrons. Porém, eles adotam uma configuração espacial diferente
da configuração tetraédrica do carbono sp3. No espaço cartesiano tridimensional
xyz tem-se que os três orbitais 2sp2 se orientam uniformemente no plano xz (com
um angulo de 120º entre eles) e o orbital 2p se posiciona perpendicularmente a
eles no eixo y, como pode ser visto no esquema da figura a seguir.

35
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 18 – ORIENTAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS HÍBRIDOS SP2 (VISTA DE


CIMA E VISTA LATERAL)

FONTE: A autora

Para entendermos como a hibridização sp2 do carbono leva à ligação


dupla entre os átomos de carbono, podemos tomar como exemplo o caso do eteno
(também chamado de etileno, C2H4). Assim, quando dois átomos de carbono com
hibridização sp2 se aproximam, ocorre a sobreposição frontal entre dois orbitais
sp2 (do mesmo modo que os orbitais sp3 do carbono se sobrepõem para formar o
etano), formando uma ligação covalente s sp2-sp2 entre esses carbonos, no entanto,
essa aproximação dos átomos de carbono também permite que os orbitais 2p de
cada átomo de carbono interajam entre si por meio de uma superposição paralela
e lateral, gerando uma ligação covalente do tipo p (pi). Dessa forma, de maneira
resumida, podemos declarar que a ligação dupla C=C envolve o compartilhamento
de quatro elétrons (dois pares) e que uma parte da ligação dupla C=C vem da
sobreposição frontal de dois orbitais sp2 de dois átomos de carbono (formação de
uma ligação s), e a outra vem da superposição lateral dos orbitais p não hibridizados
(formação de uma ligação p). O esquema da Figura 19 mostra essa sobreposição e
superposição dos orbitais dos átomos de carbono para a formação da ligação dupla
C=C da molécula de eteno (são também indicadas as sobreposições dos orbitais 1s
do hidrogênio e sp2 do carbono para a formação da ligação C–H).

A estrutura do eteno é plana com os ângulos de ligação C­–C de 120º.


É importante citar que a ligação dupla é mais curta e mais energética do que
uma ligação simples, justamente porque há a sobreposição de quatro orbitais
(dois a dois) para formar a ligação dupla, fazendo com que os quatro elétrons
compartilhados atraiam concomitantemente o núcleo de ambos os átomos de
carbono ­– por exemplo, o comprimento da ligação C=C do eteno é de 134 pm e
tem energia de 728 kJ.mol-1, enquanto que a ligação C–C do etano é de 154 pm e
377 kJ.mol-1. Por fim, o comprimento e a força de ligação C–H para o eteno são de
108 pm de 444 kJ.mol-1, respectivamente. A Figura 20 mostra algumas formas de
representação para a molécula de eteno.

36
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

FIGURA 19 – À ESQUERDA: ESQUEMA PARA A FORMAÇÃO DO ETENO. À DIREITA:


PROJEÇÃO DE HAWORTH E COMPRIMENTOS DAS LIGAÇÕES PARA O ETENO

FONTE: A autora

FIGURA 20 – ALGUMAS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO ETENO (C2H4)

FONTE: A autora

3.2.3 Orbitais Híbridos Sp


Um outro tipo de orbital híbrido do carbono são os orbitais sp, que são
gerados quando ocorrem ligações covalentes triplas entre dois átomos de carbono
(ou seja, quando esses átomos compartilham três pares de elétrons entre si). A
formação dos orbitais híbridos sp ocorre quando apenas um dos três orbitais 2p
do carbono se combina com o orbital 2s, gerando dois orbitais sp degenerados,
enquanto que dois orbitais 2p permanecem inalterados. Os dois orbitais sp estão
posicionados sobre o eixo x (separados em 180º), enquanto que um dos orbitais
2p está posicionado ao longo do eixo y e o outro ao longo do eixo z. Veja esquema
que mostra também a distribuição eletrônica no carbono com hibridização sp:

37
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 21 – FORMAÇÃO DOS ORBITAIS HÍBRIDOS SP DO CARBONO

FONTE: A autora

Para a formação do etino (também chamado de acetileno, C2H2), por


exemplo, a aproximação de dois átomos de carbono com hibridização sp faz
com que haja a sobreposição frontal dos orbitais sp (um orbital sp de cada um
dos carbonos) para formar uma ligação s sp-sp. A sobreposição lateral entre os
orbitais py dos dois átomos de carbono faz com que ocorra uma ligação p py–py.
De maneira semelhante, os orbitais pz se sobrepõem formando outra ligação
p pz­–pz. Dessa forma, de maneira resumida, podemos declarar que a ligação
tripla C≡C é resultado do compartilhamento de seis pares de elétrons devido à
sobreposição frontal de dois orbitais sp de dois átomos de carbono (formação de
uma ligação s) e da superposição lateral de quatro orbitais p não hibridizados
desses dois átomos de carbono (formação de duas ligações p). O esquema da
figura a seguir mostra essa sobreposição e superposição dos orbitais dos átomos
de carbono para a formação da ligação tripla C≡C.

FIGURA 22 – À ESQUERDA: ORIENTAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS PARA O CARBONO COM


HIBRIDIZAÇÃO SP. À DIREITA: PROJEÇÃO DE HAWORTH E COMPRIMENTOS DAS LIGAÇÕES
PARA O ETINO

FONTE: A autora

Devido ao posicionamento em 180­º dos orbitais sp do carbono, a


sobreposição desses orbitais entre si (ou seja, para a formação da ligação entre os
átomos de carbono) ou com os orbitais 1s do hidrogênio faz com que a molécula
do etino, por exemplo, seja linear com ângulos de ligação C–H e C–C de 180º.
O comprimento e a força da ligação C–H no etino é de 106 pm e 552 kJ.mol-1 (os
comprimentos das ligações C≡C e C–H e o ângulo de ligação C–H são indicados
na Figura 22). A Figura 23 traz algumas formas de representação do etino.
38
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

FIGURA 23 – ALGUMAS FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO ETINO (C2H2)

FONTE: A autora

É relevante citar que a ligação tripla C≡C é considerada como a ligação


mais forte entre dois átomos de carbono, uma vez que o comprimento de ligação
e a energia de ligação são menores e maiores, respectivamente, em relação às
ligações simples e dupla. A tabela a seguir traz um comparativo entre os valores
para os ângulos de ligação, comprimento de ligação e força de ligação para o
metano, etano, eteno e etino.

TABELA 2 – COMPARAÇÃO ENTRE AS LIGAÇÕES QUÍMICAS PRESENTES NO METANO, ETANO,


ETENO E ETINO

Ângulo de Comprimento
Molécula Ligação Força de ligação
ligação de ligação
Metano (CH4) C(sp3)–H(1s) 109,5 ­º 110 pm 438 kJ.mol-1
C(sp3)–H(1s) 111 º 110 pm 420 kJ.mol-1
Etano (C2H6)
C(sp3)–C(sp3) 180 º 154 pm 376 kJ.mol-1
C(sp2)–H(1s) 120 º 108 pm 444 kJ.mol-1
Eteno (C2H4)
C(sp2)–C(sp2) 180 º 133 pm 611 kJ.mol-1
C(sp)–H(1s) 180 º 106 pm 552 kJ.mol-1
Etino (C2H2)
C(sp)–C(sp) 180 º 120 pm 835 kJ.mol-1

FONTE: Bruice (2006)

A teoria de ligação de valência explica a ligação covalente entre dois


átomos através da sobreposição de seus orbitais atômicos de valência. O conceito
de orbitais atômicos híbridos justifica a tetravalência do átomo de carbono e
explica a geometria espacial das moléculas ao considerar o modo como esses
orbitais se orientam em torno do núcleo do átomo.

3.3 TEORIA DOS ORBITAIS MOLECULARES


A teoria dos orbitais moleculares explica as ligações covalentes através da
formação de orbitais moleculares, ou seja, que pertencem à molécula como um
todo, a partir da combinação dos orbitais atômicos dos átomos que participam

39
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

da ligação (diferentemente da teoria de ligação de valência que considera a


sobreposição dos orbitais de valência dos átomos para a formação da ligação). Um
orbital molecular, do mesmo modo que um orbital atômico, descreve o espaço de
maior probabilidade de se encontrar o elétron em torno da molécula, e assim,
possuem tamanhos, formas e energias específicas.

Segundo a teoria dos orbitais moleculares, a combinação de dois orbitais


atômicos deve levar à formação de dois orbitais moleculares, assim como que a
combinação de seis orbitais atômicos forma seis orbitais moleculares (de forma
sucinta: a quantidade de orbitais atômicos combinados induz a formação da
mesma quantidade de orbitais moleculares). Essa regra é devido às propriedades
de onda do elétron. Assim, dois orbitais atômicos (ou mais) se combinam da
mesma forma que as ondas se combinam, de maneira construtiva ou de maneira
destrutiva. A combinação construtiva gera um orbital molecular com energia
menor em relação às energias dos orbitais atômicos que lhe deram origem, portanto
mais estável. Esse orbital é denominado orbital molecular ligante justamente por
ser o orbital de menor energia e de maior probabilidade de encontrar os elétrons
da ligação. De modo contrário, a combinação destrutiva gera um orbital atômico
mais energético, chamado de orbital molecular antiligante. De maneira prática,
podemos declarar que os orbitais ligantes possuem menor energia, pois sua forma
permite que os elétrons estejam mais próximos ao núcleo, unindo efetivamente
os átomos, enquanto que os antiligantes possuem nós, regiões que não podem
ser ocupadas por elétrons, diminuindo a densidade eletrônica entre os núcleos e
limitando a atração entre o elétron e o núcleo.

A figura a seguir exemplifica a formação dos orbitais moleculares da


molécula de H2 a partir da combinação dos dois orbitais atômicos 1s dos átomos
de hidrogênio. Essa combinação gera dois orbitais moleculares: um, chamado
de orbital molecular ligante, de menor energia e preenchido pelos elétrons que
participam da ligação covalente, e outro, chamado de orbital molecular antiligante,
de maior energia e não preenchido.

FIGURA 24 – ORBITAIS MOLECULARES DA MOLÉCULA DE H2

FONTE: A autora

40
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

DICAS

Para um aprofundamento dos conceitos de hibridização de orbitais e das teorias


de ligação química, recomendamos os seguintes textos: A química orgânica na
consolidação dos conceitos de átomo e molécula (CAMEL; KOEHLER; FILGUEIRAS, 2009);
O Conceito de hibridização (RAMOS et al., 2008); e A química quântica na compreensão de
teorias de química orgânica (LEAL et al., 2010).

LEITURA COMPLEMENTAR

VIDA MESCLA SILÍCIO E CARBONO PELA PRIMEIRA VEZ


Ligações carbono-silício

Biólogos e químicos conseguiram pela


primeira vez fazer com que um organismo
vivo realize ligações carbono-silício, algo até
hoje só realizado por processos sintéticos.

É um mistério por quê o silício, o


segundo elemento mais abundante da Terra,
depois do oxigênio, não é utilizado pelos
seres vivos. Afinal, o carbono e o silício são
quimicamente muito semelhantes: Ambos
podem formar ligações com quatro átomos
simultaneamente, o que é bastante adequado
Representação artística da vida para formar as longas cadeias de moléculas
baseada em organossilício (Crédito: encontradas nos seres vivos, como nas
Lei Chen and Yan Liang para o Caltech) proteínas e no DNA.
Os cientistas há muito se perguntam se a vida na Terra poderia ter
evoluído com base no silício em vez do carbono e, mais recentemente, os
astrobiólogos levantaram a possibilidade de isso ocorrer em exoplanetas. Os
autores de ficção científica, claro, já imaginaram mundos alienígenas com vida
baseada em silício, como as criaturas Horta retratadas em um episódio da série
Jornada nas Estrelas.

Sek Bik Kan e seus colegas da Universidade de Tecnologia da Califórnia


(CalTech) trouxeram agora tudo isso para a realidade, demonstrando que a
natureza pode ser convencida com um pequeno auxílio da biologia sintética, a
incorporar o silício em suas moléculas baseadas em carbono, que são os blocos
fundamentais de construção da vida, formando ligações C–Si.

41
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

Medicamentos e outras formas de vida

Além de ajudar a procurar formas de vida como não conhecemos, ou


mesclar o silício nas formas de vida que conhecemos, para ver no que isso pode
dar, a técnica deverá ter um impacto direto e substancial no setor industrial, da
fabricação de LEDs e componentes eletrônicos até a sintetização de novos fármacos.

Compostos com moléculas silício-carbono – organossilício ou


organossilicatos – são largamente utilizados em produtos farmacêuticos, defensivos
agrícolas, tintas, semicondutores e telas de computador e TV. Sobretudo, a área
de medicamentos pode ter um grande impulso com a possibilidade de sintetizar
compostos ativos à base de silício que possam ser usados pelas rotas metabólicas
dos seres humanos.

Uma vez que as ligações silício-carbono não são encontradas na


natureza, estes produtos são hoje fabricados sinteticamente. E o processo
sintético para fazer ligações silício-carbono normalmente usa catalisadores
de metais preciosos e solventes tóxicos, e requer processamentos extras para
remover subprodutos indesejáveis, tudo contribuindo para aumentar o custo
de produção desses compostos.

"Nosso catalisador à base de ferro e geneticamente codificado é barato,


não tóxico e fácil de ser modificado em comparação com outros catalisadores
usados na síntese química. A nova reação também pode ser feita à temperatura
ambiente e em água" contou Sek Bik.

Evolução dirigida

Os pesquisadores usaram um
método chamado de evolução dirigida, no
qual enzimas são criadas em laboratório por
seleção artificial, de forma similar à utilizada
para desenvolver melhores cultivares ou
aprimorar raças de animais de criação. As
enzimas são uma classe de proteínas que
catalisam, ou facilitam, reações químicas.
Estrutura da proteína citocromo c,
O processo de evolução dirigida do microrganismo Rhodothermus
começa com a enzima que se deseja marinus, mostrando um átomo
aprimorar. O DNA que a codifica é mutado de ferro (vermelho) no centro. Os
de forma mais ou menos aleatória, e as pesquisadores induziram mutações
nas enzimas (rosa) para melhorar a
enzimas resultantes são testadas para avaliar capacidade da proteína em formar
a característica desejada. Aquela que atingir ligações carbono-silício (Crédito:
o melhor desempenho é então mutada Frances Arnold Lab/Caltech)
novamente, e o processo é repetido até que
uma enzima descendente consiga executar a tarefa com um ganho substancial em
relação à enzima original.

42
TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA II

Neste caso, Sek Bik queria convencer a proteína a fazer algo que ela
nunca faria naturalmente. A melhor candidata encontrada foi uma proteína de
uma bactéria que cresce nas fontes termais da Islândia. Essa proteína, chamada
citocromo c, normalmente troca elétrons com outras proteínas, mas também é
capaz de agir como uma enzima para criar ligações silício-carbono em baixo
nível. Então, foi uma questão de usar a evolução dirigida, que permitiu obter a
enzima otimizada depois de apenas três rodadas evolutivas.

A enzima "evoluída" é 15 vezes melhor do que o melhor catalisador


inventado até hoje pelos químicos para fazer o mesmo trabalho. Além disso, ela é
altamente seletiva, o que significa que ela produz menos subprodutos indesejados
que precisem ser separados quimicamente.
FONTE: Disponível em: <http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=vida-
mescla-silicio-carbono-pela-primeira-vez&id=010160161129#.WrkOyZPwYWo>. Acesso em: 20 mar. 2018.

43
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• As ligações químicas em compostos orgânicos são devido ao compartilhamento


de elétrons entre dois átomos (ligação covalente).

• A regra do octeto define que os átomos formam ligações covalentes a fim de


formar uma molécula mais estável seguindo a configuração dos gases nobres.

• A teoria de ligação de valência diz que uma ligação covalente se forma pela
sobreposição dos orbitais de dois átomos; essa sobreposição leva à união dos
átomos, pois ela permite que os elétrons participantes da ligação ocupem
simultaneamente os orbitais de ambos os átomos e sejam atraídos por seus
núcleos.

• De acordo com a ligação de valência, o carbono utiliza orbitais híbridos para


formar as diversas moléculas orgânicas.

• A teoria dos orbitais moleculares explica as ligações covalentes através da


formação de orbitais moleculares, ou seja, que pertencem à molécula como
um todo, a partir da combinação dos orbitais atômicos dos átomos que
participam da ligação.

44
AUTOATIVIDADE

1 Sobre as ligações covalente, determine se as afirmativas a seguir são


verdadeiras ou falsas:
a) ( ) Dizer que o carbono é tetravalente é uma forma de dizer que o carbono
forma quatro ligações covalentes.
b) ( ) A ligação covalente ocorre quando íons se ligam e, por isso, os
compostos orgânicos são chamados de moléculas.
c) ( ) A hibridização sp3 explica porque as quatro ligações C–H do metano
são iguais.
d) ( ) Um composto orgânico pode possuir apenas ligações p.

2 A seguir, é mostrada a representação de uma molécula orgânica, na qual os


átomos de carbono da cadeia estão numerados de 1 a 7:

Dessa forma, sobre as ligações covalentes nessa molécula, julgue as seguintes


alternativas em verdadeiras ou falsas:

a) ( ) Existem três ligações π na estrutura.


b) ( ) O átomo de carbono 2 forma três ligações π e uma ligação σ.
c) ( ) O átomo de carbono 5 forma três ligações σ e uma ligação π.
d) ( ) O átomo de carbono 1 forma quatro ligações σ.

3 Que tipo de hibridização é esperada para cada átomo de carbono nas


seguintes moléculas?

a) Propano:
b) 2-metilpropano:
c) But-1-en-3-ino:

4 Proponha estruturas para as moléculas que se adequem às descrições:


a) Contêm quatro carbonos, todos com hibridização sp2.
b) Contêm dois carbonos hibridizados sp2 e dois carbonos hibridizados sp3.

45
46
UNIDADE 1
TÓPICO 3

FUNDAMENTOS DE QUÍMICA
ORGÂNICA III
1 INTRODUÇÃO
O Tópico 3 é dedicado ao aprofundamento dos conceitos relacionados às
ligações covalentes. No Tópico 2, vimos que as ligações covalentes são o resultado
do compartilhamento de elétrons da camada de valência entre dois átomos, agora,
entenderemos melhor como esse compartilhamento ocorre. Veremos que existem
ligações covalentes definidas como polares ou apolares e para entender esses
fenômenos, estudaremos o conceito de eletronegatividade e o que é o momento
de dipolo (que é diretamente relacionado com a diferença de eletronegatividades
entre os átomos pertencentes a uma determinada ligação química). Entendendo
então o caráter polar ou apolar de uma ligação química, seguiremos e estudaremos
os diferentes modos com que as moléculas podem interagir entre si, por meio das
interações intermoleculares.

Nessa parte (subdivisão), também, aprenderemos algumas das representações


mais utilizadas para descrever (no papel) as estruturas das moléculas orgânicas. De
fato, existem diversas maneiras de representar moléculas e precisamos ter em mente
que não existe uma maneira mais correta do que a outra, uma vez que a forma de
representação escolhida depende da sua adequação ao foco do estudo.

Por fim, iniciaremos nossos estudos dos diversos grupos funcionais


orgânicos. Como exposto, existem milhões de moléculas orgânicas já conhecidas
atualmente, mas, apesar de serem diferentes, essas moléculas podem ser
classificadas em grupos, baseados na similaridade das suas estruturas.

2 LIGAÇÕES COVALENTES II: ELETRONEGATIVIDADE E


MOMENTO DE DIPOLO
Dos estudos do Tópico 2, pudemos definir que uma ligação covalente consiste
no compartilhamento de elétrons da camada de valência entre dois átomos – o que
significa que um par de elétrons compartilhados é atraído simultaneamente pelo
núcleo de ambos os átomos –. Também pudemos compreender um pouco como as
ligações covalentes se formam e ditam as geometrias das moléculas através do estudo
das teorias de ligação química (teorias de ligação de valência e do orbital molecular)
e do conceito de hibridização de orbitais atômicos. No entanto, esses estudos não
foram suficientes para responder uma questão: será que, em uma ligação covalente,
o par de elétrons compartilhados é atraído com a mesma intensidade por ambos os

47
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

átomos? A resposta para essa questão depende da diferença da eletronegatividade


entre os átomos que participam de uma ligação covalente.

2.1 ELETRONEGATIVIDADE
A eletronegatividade é uma característica intrínseca de cada elemento
químico e é definida como a tendência relativa de um átomo em atrair para si o
par de elétrons compartilhados em uma ligação covalente. A eletronegatividade é
uma propriedade periódica (ou seja, apresenta uma tendência baseada na posição
dos elementos químicos na tabela periódica). Assim, a eletronegatividade tende
a crescer da esquerda para a direita ao longo de um período devido ao aumento
da carga nuclear (ou seja, um aumento da carga positiva do núcleo pode atrair
mais efetivamente os elétrons negativos) e a decrescer de cima para baixo ao
longo de um grupo como consequência do aumento do raio atômico (o que leva
a um afastamento da camada de valência do núcleo, havendo menor interação
entre o núcleo e esses elétrons). Os valores de eletronegatividade são definidos
com base em uma escala arbitrária, com o flúor sendo o elemento químico mais
eletronegativo (eletronegatividade igual a 4,0) e o césio o menos eletronegativo
(eletronegatividade igual a 0,7). A periodicidade da eletronegatividade pode ser
vista na figura a seguir (elementos químicos de fundo cinza escuro são os mais
eletronegativos, os cinzas intermediários possuem eletronegatividade mediana e
os de fundo cinza claro são os menos eletronegativos).

FIGURA 25 – VALORES DE ELETRONEGATIVIDADE RELATIVOS PARA ALGUNS ELEMENTOS


QUÍMICOS DA TABELA PERIÓDICA

FONTE: A autora

Com base no conceito de eletronegatividade podemos classificar as


ligações covalentes em duas categorias, respondendo à questão colocada no
início deste tópico.

48
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

• Ligações covalentes apolares: casos em que os elétrons de uma ligação covalente


são compartilhados de forma equivalente, ou seja, os elétrons são atraídos de
forma similar pelos núcleos de ambos os átomos, resultando em uma distribuição
de carga simétrica em torno da ligação. Uma ligação covalente apolar é formada
quando não há grande diferença de eletronegatividade entre os átomos, casos em
que os átomos são iguais (e têm, consequentemente, mesma eletronegatividade)
ou nos quais essa diferença não ultrapasse o valor de 0,5.

Por exemplo, a ligação covalente na molécula de H2 é considerada apolar,


pois é formada por dois átomos de hidrogênio de mesma eletronegatividade.
As ligações no metano também são consideradas covalentes apolares, pois a
diferença de eletronegatividade entre o carbono (eletronegatividade igual a 2,5) e
o átomo de hidrogênio (eletronegatividade igual a 2,1) é de 0,5.

• Ligações covalentes polares: casos em que a diferença de eletronegatividade


entre os átomos da ligação difere entre 0,5 e 2,0. Isso faz com que o átomo
que possui maior eletronegatividade atraia mais eficientemente o par de
elétrons na direção do seu núcleo, afastando-o do átomo que possuir menor
eletronegatividade, e criando uma polaridade na molécula (isso é, regiões
com maior ou menor densidade eletrônica). Quanto maior a diferença de
eletronegatividade entre os átomos, mais polar a ligação.

Por exemplo, em uma ligação covalente entre o carbono (eletronegatividade


igual a 2,4) e o oxigênio (eletronegatividade igual a 3,5) a diferença de
eletronegatividade entre os átomos é de 1,0, o que a classifica como uma ligação
covalente polar. Nesse caso, o oxigênio, mais eletronegativo, atrai em sua direção
o par de elétrons compartilhados com o carbono.

A consequência da diferença da eletronegatividade em uma ligação


covalente é que o elemento mais eletronegativo, por atrair mais fortemente os
elétrons, acaba por gerar uma carga parcial negativa (ou seja, uma região rica em
elétrons), enquanto que o elemento menos eletronegativo fica mais distante dos
elétrons compartilhados, gerando uma carga parcial positiva (ou seja, uma região
pobre em elétrons). Uma forma de representar a polaridade de uma ligação
covalente é indicar essas cargas parciais negativas e positivas utilizando-se os
símbolos d- e d+, respectivamente.

Na figura a seguir é mostrado o modo como se determina as diferenças


de eletronegatividade entre os átomos que formam uma ligação covalente: para
a molécula de metano, a diferença entre as eletronegatividades do carbono
e do hidrogênio não é muito expressiva, o que define a ligação C–H como
predominantemente polar; já na molécula de metil-lítio, há uma diferença de
eletronegatividade mais significativa entre o carbono e o lítio, o que torna a
ligação C–Li polar, com uma carga parcial positiva, d+, sobre o átomo de lítio (que
é menos eletronegativo) e uma carga parcial negativa, d-, sobre o átomo de carbono
(mais eletronegativo). O mesmo caráter polar da ligação C–O é observado para
o metanol, porém, agora, a carga parcial positiva está sobre o carbono, pois ele é
menos eletronegativo que o oxigênio.

49
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 26 – DIFERENÇAS DE ELETRONEGATIVIDADE ENTRE OS ÁTOMOS DE CARBONO E


HIDROGÊNIO NO METANO E DO CARBONO E DO LÍTIO NO METIL-LÍTIO

FONTE: A autora

EXEMPLO – Dentre as ligações covalentes colocadas em destaque


nas seguintes moléculas:

a) use os símbolos d- e d+ para mostrar a direção de polaridade da ligação


covalente;
b) defina qual apresenta a ligação covalente mais polar e qual apresenta a
ligação covalente menos polar.

Moléculas: H3C ___ K, H3C ___ F, H3C ___ MgBr e H3C ___ OH

RESPOSTAS

a) A questão pede para definirmos a polaridade das ligações usando o


conceito de cargas parciais, indicado pelos símbolos d- (carga parcial
negativa) e d+ (carga parcial positiva). Podemos fazer essa análise com
base nos valores de eletronegatividade para cada elemento (cujos valores
são dados na tabela periódica da Figura 24). Assim:

Eletronegatividade do carbono ⇒ EC = 2,5


Eletronegatividade do potássio ⇒ EK = 0,8
Eletronegatividade do flúor ⇒ EF = 4,0
Eletronegatividade do magnésio ⇒ EMg = 1,2
Eletronegatividade do oxigênio ⇒ EC = 3,5

Podemos agora definir o sentido da polaridade, já que sabemos que


elementos mais eletronegativos tendem a atrair os elétrons de uma ligação
covalente gerando uma carga parcial negativa sobre ele, enquanto que
sobre o elemento menos eletronegativo, por se afastar desses elétrons da
ligação, é gerada uma carga parcial positiva:

50
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

b) A polaridade aumenta de acordo com o aumento da diferença entre as


eletronegatividades dos átomos que participam da ligação covalente. A
questão pede para compararmos a polaridade de ligações entre o átomo
de carbono e um outro elemento químico, para isso vamos definir a
diferença de eletronegatividade de cada ligação covalente:

Diferença de eletronegatividade entre os elementos da ligação


H C ___ K
3
E - E = 2,5 - 0,8 = 1,7
C K

H C ___ F
3
EF - EC = 4,0 - 2,5 = 1,5
H3C ___ MgBr EC - EMg = 2,5 - 1,2 = 1,3
H C ___ OH
3
EO - EC = 3,5 - 2,5 = 1,0

Baseado na diferença de eletronegatividade para cada ligação,


podemos então classificar a polaridade das ligações na seguinte ordem (da
menos polar para a mais polar): H3C­–OH < H3C­–MgBr < H3C­–F < H3C­–K.
Assim, a ligação covalente mais polar é entre o carbono e o potássio (H3C­-
–K) e a menos polar é entre o carbono e o oxigênio (H3C­–OH).

2.2 MOMENTO DE DIPOLO


Analisando a figura anterior, vemos que as ligações C–Li (no metil-lítio)
e C–O (no metanol) são polares, isso porque elas apresentam uma extremidade
negativa, ou seja, uma carga parcial negativa (representada por d-) e outra positiva
(d+), devido a uma diferença considerável entre as eletronegatividades do carbono
e do lítio e do carbono e do oxigênio. Podemos afirmar então que essa ligação
polar tem um dipolo.

51
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

O dipolo de uma ligação covalente polar pode ser medido em termos de


momento de dipolo (m) pela seguinte equação:

momento de dipolo ⇒ m = e x d

Em que e é a grandeza da carga no átomo em ambas as extremidades e d


é a distância entre essas duas cargas.

Na tabela seguinte, estão listados os valores do momento de dipolo para


algumas ligações (o momento de dipolo é expresso em debyes, D).

TABELA 3 – MOMENTOS DE DIPOLOS DE ALGUMAS LIGAÇÕES COVALENTES

Ligação Momento de dipolo


H–H 0
C–C 0
C–H 0,4 D
C–N 0,2 D
C–O 0,7 D
C–F 1,6 D
FONTE: Bruice (2006)

Note que para as ligações H–H e C–C o momento de dipolo é igual a zero,
caracterizando uma ligação covalente apolar, justamente porque a ligação é entre
átomos do mesmo elemento químico, com mesma eletronegatividade. À medida
em que cresce a diferença de eletronegatividade entre os átomos da ligação, o
momento de dipolo da ligação aumenta devido ao aumento da polaridade na
ligação covalente.

EXEMPLO – Considerando que uma carga positiva e uma carga


negativa em uma ligação covalente estão separadas por 100 pm, determine
o momento de dipolo para essa ligação.

(DADOS: carga unitária do elétron = 1,60 x 10-19 C)

RESPOSTA
Sabendo que o momento de dipolo é dado por m = e x d, que d é a
distância entre os átomos da ligação covalente (100 pm, o que equivale a 100
x 10-12 m) e que e é a carga unitária do elétron, podemos calcular o momento
de dipolo dessa ligação covalente como se segue:

52
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

m =e × d =(1, 60 ×10-19 C ) × (100 ×10-12 m ) =160 ×10-31 Cm

Dessa forma, obtemos o valor do momento de dipolo em coulomb


metros (ou seja, Cm, como mostrado na resolução da equação); no entanto,
a unidade de medida geralmente utilizada para expressar o momento de
dipolo é o debye (D), assim, vamos transformar o valor de momento de
dipolo dado em Cm em D (sabendo que 1 D = 3,336x10-30 Cm):

1D 3,336 ×10-30 Cm
= = ⇒ x 4,8 D
x 160 ×10-31 Cm

Assim, o momento de dipolo da ligação é 4,8 D.

A Figura 25 e a Tabela 3 mostram as cargas parciais (positivas e negativas)


e os momentos de dipolo, a fim de indicar a polaridade de cada uma das ligações
covalentes de uma molécula. Porém, como é de se esperar, assim como as ligações
individuais, as moléculas como um todo também podem ser polares.

Para determinar se uma molécula é polar ou não, a geometria dessa


molécula deve ser levada em conta. Isso porque a polaridade de uma molécula
é o resultado das contribuições de todas as polaridades das ligações covalentes
individuais.

O momento de dipolo total da molécula é dado pela soma vetorial dos


dipolos das ligações, e, portanto, depende da magnitude e da direção desses
momentos de dipolo. Assim, moléculas simétricas não possuem momento de
dipolo, pois os momentos de dipolo das ligações individuais (que são grandezas
vetoriais) acabam por se anular quando somados. Por exemplo, na molécula do
metano, o átomo de carbono usa os orbitais híbridos sp3 para formar as quatro
ligações C–H, de forma a se obter uma geometria tetraédrica (como já mostrado).
Individualmente, ou seja, para cada uma das ligações C–H, existe um momento de
dipolo, porém quando esses momentos de dipolo são somados, eles se cancelam
devido à simetria da geometria tetraédrica, fazendo com que o momento de
dipolo da molécula de metano seja nulo. Já no caso de moléculas assimétricas, os
momentos de dipolo das ligações individuais não são de mesma magnitude e não
estão alinhados na mesma direção, o que faz com que a soma vetorial não seja nula.
No caso do metanol, por exemplo, a contribuição da ligação C­–O, cujo momento
de dipolo é maior do que o da ligação C–H, faz com que o momento de dipolo
da molécula seja alinhado na direção da ligação C–O. A figura a seguir mostra
a distribuição das cargas entre as ligações covalentes de algumas moléculas e o
valor do momento de dipolo para essas moléculas.

53
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 27 – O MOMENTO DE DIPOLO TOTAL DE MOLÉCULAS QUE TÊM MAIS DO QUE UMA
LIGAÇÃO COVALENTE

FONTE: A autora

Os mapas de potencial eletroestático são modelos que mostram o perfil da


distribuição da densidade de carga na molécula. Seguindo o mesmo princípio dos
símbolos d- e d+, as cores em um mapa de potencial eletroestático indicam a polaridade
de uma molécula de acordo com a seguinte escala: vermelho (regiões mais ricas em
elétrons) < laranja < amarelo < verde < azul (regiões mais pobres em elétrons).

Na figura a seguir são mostrados os mapas de potencial eletroestático


para o tetracloreto de carbono e para o metanol. Podemos verificar que, para o
tetracloreto de carbono, a distribuição de carga é relativamente uniforme sobre
a molécula, o que indica que seu momento de dipolo é nulo (consequência
da geometria tetraédrica da molécula). De outro modo, o mapa de potencial
eletroestático do metanol mostra a região ocupada pelo átomo de carbono bem
avermelhada (região rica em elétrons, segundo a escala de cor), enquanto que as
regiões mais próximas dos átomos de hidrogênio são azuladas (região pobre em
elétrons). Tal perfil indica que o momento de dipolo da molécula é considerável.

FIGURA 28 ­­– MAPA DE POTENCIAL ELETROESTÁTICO E MODELO DE BOLAS E VARETAS PARA


O TETRACLORETO DE CARBONO E O METANOL

FONTE: A autora

54
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

DICAS

Sobre o conceito de eletronegatividade, recomendamos a leitura do texto O conceito


de eletronegatividade na educação básica e no ensino superior (SANTOS; SILVA; WARTHA, 2011).

3 INTERAÇÕES INTERMOLECULARES
Até o momento, estudamos as moléculas de forma isolada, contudo essa
não é a realidade do nosso mundo macroscópico. Isso porque não conseguimos
trabalhar com uma molécula isolada e tudo o que conhecemos como matéria
é, na realidade, um conjunto de milhares de moléculas. Por exemplo, quando
estudamos as propriedades da água (como densidade, pressão de vapor,
temperatura de ebulição etc.) estamos estudando, de fato, as propriedades do
conjunto de moléculas de água.

Quando temos um conjunto de moléculas, temos moléculas muito


próximas e, por isso, interagindo entre si (lembre-se de que uma interação
química significa que as moléculas não sofrem transformação química, ou seja,
não há quebra ou formação de ligações covalentes, apenas efeitos de atração
ou repulsão entre as moléculas). As interações que ocorrem entre as moléculas
são denominadas de interações intermoleculares – essas interações podem
ocorrer tanto entre moléculas iguais, isso é, de uma mesma substância, ou entre
substâncias diferentes em uma mistura. Você já deve estar habituado com o
conceito de interações intermoleculares, uma vez que já estudou isso na disciplina
de química geral, por isso não vamos nos aprofundar nesse assunto. A ideia aqui
é apenas recapitular, a fim de entendermos os principais tipos de interações
intermoleculares entre moléculas orgânicas.

As interações intermoleculares são ditadas pela geometria e polaridade


das moléculas. De fato, as interações intermoleculares são consequência da atração
entre uma região com carga parcial positiva de uma molécula, e a região com
carga parcial negativa de outra molécula. Assim, as interações intermoleculares
dependem da magnitude dessas cargas parciais e da distância entre as moléculas.

Existem quatro tipos de interações intermoleculares especialmente


importantes para a química orgânica: forças dipolo-dipolo, ligações de hidrogênio,
forças de dispersão e forças de dipolo-dipolo induzido.

• Forças de dipolo-dipolo: são os tipos de interação intermolecular que ocorrem


entre moléculas polares, devido, justamente, à atração entre suas cargas parciais.
As forças dipolo-dipolo induzem as moléculas se orientarem de forma com que
as cargas parciais negativas de uma molécula fiquem próximas às cargas parciais
positivas de outra molécula. São interações intermoleculares fortes, mas diminuem
à medida que as moléculas se distanciam (por exemplo, são mais fortes quando o
sistema está na fase líquida e mais fracas quando no estado gasoso).

55
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

• Ligações de hidrogênio: as ligações de hidrogênio são um caso particular de


interação intermolecular entre moléculas polares. Ocorre entre moléculas que
possuem o átomo de hidrogênio ligado a um átomo de flúor, de oxigênio
ou de nitrogênio, ou seja, ligações covalentes muito polarizadas (lembre-se
dos valores de eletronegatividade, o flúor, o oxigênio e o nitrogênio são os
elementos químicos mais eletronegativos). São as interações intermoleculares
mais fortes, justamente devido à alta polaridade das ligações H–F, H–O e H–N
e ao tamanho do átomo de hidrogênio, que por ser pequeno possibilita uma
maior aproximação com uma outra molécula.

• Forças de dispersão (forças de London): ocorrem entre moléculas apolares.


Nesse caso, a aproximação de uma molécula apolar acaba perturbando
a densidade eletrônica de outra molécula, fazendo com que haja uma
distribuição (momentânea) desigual de elétrons na molécula, dando origem a
polos momentâneos e permitindo que essas moléculas se atraiam e interajam.
Dentre todas as interações intermoleculares, é a mais fraca.

• Forças de dipolo-dipolo induzido: ocorrem entre uma molécula polar e


uma molécula apolar (ocorrendo, portanto, apenas em misturas). Dessa
forma, a molécula polar, ao se aproximar, induz o aparecimento de um polo
momentâneo na molécula apolar, possibilitando a interação entre as moléculas.
É uma interação fraca, mas mais forte que as forças de dispersão.

FIGURA 29 – ALGUNS TIPOS DE INTERAÇÕES INTERMOLECULARES

FONTE: A autora

56
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

Compreender o modo como as moléculas interagem é importante porque


nos permite prever e explicar algumas das propriedades intrínsecas de uma
substância. Por exemplo, se compararmos os pontos de ebulição do propano, da
propanona e do propanol veremos que ele cresce na seguinte ordem: propano
(-42 ºC) < propanona (56 ºC) < propanol (82 ºC). É interessante notar que a
diferença entre as moléculas do propano, da acetona e do propanol é apenas a
substituição de uma ligação C–H por uma ligação C=O ou C–OH, porém isso
induz uma mudança drástica no ponto de ebulição das substâncias. No propano
as moléculas interagem por forças de London, muito fracas que não conseguem
fazer com que as moléculas fiquem unidas a temperaturas maiores; já as moléculas
da propanona e do propanol interagem entre si por forças de dipolo-dipolo e
ligação de hidrogênio, respectivamente, interações mais fortes que aumentam
drasticamente o ponto de ebulição desses materiais.

DICAS

Recomendamos os textos Interações intermoleculares (ROCHA, 2001) e O


estado da arte da ligação de hidrogênio (OLIVEIRA, 2015) para ampliar seus entendimentos
sobre as interações intermoleculares. O texto Solubilidade das substâncias orgânicas é
recomendado para o entendimento da solubilidade de algumas moléculas orgânicas com
base nas suas estruturas, isso porque a solubilidade dos compostos são extremamente
dependentes do tipo de interações intermoleculares entre o solvente e o soluto (MARTINS;
LOPES; DE ANDRADE, 2013).

4 REPRESENTAÇÃO DAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS


O estudo da química orgânica (assim como da química como um todo)
é um processo complexo que busca entender a maneira como as moléculas se
formam e se estruturam, e a relação entre essas estruturas e as propriedades
do material (tanto as propriedades físico-químicas, como densidade, ponto de
ebulição, solubilidade, quanto da reatividade desse material). Como não podemos
ver os átomos e moléculas, cujos tamanhos estão inseridos em uma escala muito
pequena (ordem de angstrons), que foge à nossa capacidade visual, precisamos
então nos utilizar de formas que possam descrever “visualmente” os compostos
químicos. Existem diversas maneiras de representar moléculas ­– neste livro de
estudos você já se deparou com algumas delas (estruturas de Lewis, de Kekulé,
projeção de Haworth ou modelo de bolas e varetas) –, sendo que não existe uma
maneira mais correta do que a outra, pois a forma de representação utilizada vai
depender da sua adequação ao foco do estudo.

A forma mais simples de representar uma molécula é dada pela fórmula


molecular, que informa a quantidade de átomos presentes em uma molécula
(por exemplo, a fórmula molecular do metano é CH4). No entanto, a fórmula

57
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

molecular não traz nenhuma informação sobre a estrutura da molécula, o que


não é interessante para o estudo da química orgânica, pois muitas vezes estamos
interessados no comportamento da molécula, o que é extremamente dependente
do modo que os átomos estão ligados na molécula. Para isso, podemos nos utilizar
das fórmulas estruturais, que são representações que mostram a conectividade
entre os átomos de uma molécula. Vejamos algumas delas:

• Estrutura de Lewis: utiliza-se de pontos para representar os elétrons de


valência dos elementos químicos a fim de mostrar a ligação entre os átomos e
os pares de elétrons livres que podem existir em uma molécula.

FIGURA 30 – COMO REPRESENTAR UMA MOLÉCULA USANDO A ESTRUTURA DE LEWIS

FONTE: A autora

• Estruturas de Kekulé: as ligações entre os átomos são indicadas por traços e,


geralmente, os pares de elétrons livres são omitidos (podem ser mostrados
caso seja necessário chamar a atenção de alguma propriedade química da
molécula).

FIGURA 31 – COMO REPRESENTAR UMA MOLÉCULA USANDO A ESTRUTURA DE KEKULÉ

FONTE: A autora

• Estruturas condensadas: as ligações simples C–H e C–O não são desenhadas,


sendo mostradas de forma implícita. Ligações entre outros átomos ou
ramificações da cadeia de carbonos podem ser indicadas entre parênteses ou
por traços.

58
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

FIGURA 32 – COMO REPRESENTAR UMA MOLÉCULA USANDO A ESTRUTURA CONDENSADA

FONTE: A autora

As fórmulas estruturais de Lewis, de Kekulé e condensadas definem as


ligações covalentes entre os átomos, mas não indicam a geometria da molécula.
Caso seja importante determinar o arranjo espacial das moléculas (isto é, os
ângulos de ligação e o arranjo tridimensional), podemos utilizar outras fórmulas
estruturais, como as estruturas esqueléticas.

• Estrutura esquelética: geralmente, os átomos de carbono e de hidrogênio são


mostrados de forma implícita, sendo indicados na forma de traços. Fornece
mais indicações da geometria da molécula porque as ligações da cadeia
carbônica são mostradas em zigue-zague (o que dá a ideia de um ângulo de
109º, ou seja, o ângulo característico das ligações tetraédricas sp3).

Para se desenhar uma estrutura esquelética, temos que seguir basicamente


três regras:

1. Desenhe a cadeia de carbono utilizando traços em zigue-zague, sem indicar o


símbolo do carbono. Cada uma das interseções entre as linhas em zigue-zague
e as extremidades das linhas indicam um carbono.
2. Não escreva o símbolo do hidrogênio quando ele estiver ligado ao átomo de
carbono. Lembre-se de que o carbono faz sempre quatro ligações, então o
número de átomos de hidrogênio em cada ligação é dado mentalmente com o
intuito de completar as quatro ligações do carbono.
3. Todos os outros átomos que não forem o carbono e o hidrogênio são indicados
por seus símbolos – todo átomo da cadeia carbônica que não é o carbono ou o
hidrogênio pode ser chamado de heteroátomo.

59
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

FIGURA 33 – REPRESENTÇÃO ESTRUTURAL DE TRAÇOS EM ZIGUE-ZAGUE E ESQUELÉTICA


PARA O ÁCIDO LINOLEICO

FONTE: Adaptado de Clayden, Greeves e Warren (2012)

Como visto na figura anterior, a ligação dupla C=C não foi desenhada em
zigue-zague, mas sim de forma linear. Nesse caso, escolhemos identificar a ligação
dupla de forma linear apenas para enfatizá-la, mas, muitas vezes, podemos optar
por desenhar as ligações duplas também em zigue-zague, a fim de indicar que
essas ligações têm um ângulo de 120º devido à hibridização sp2 dos orbitais do
carbono. Para a ligação tripla C≡C, o modo mais usual é representá-la de forma
linear, respeitando o ângulo de 180º formado entre as ligações de um carbono sp
(veja os exemplos na Figura 34).

Se necessário, também, podemos indicar na estrutura esquelética a estrutura


tridimensional com a qual os átomos (ou grupos de átomos) se ligam ao carbono
presente na cadeia carbônica. Para isso, podemos utilizar a projeção de Haworth.

FIGURA 34 – EXEMPLOS DE REPRESENTAÇÃO DE MOLÉCULAS COM LIGAÇÕES DUPLAS OU TRIPLAS

FONTE: A autora

60
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

A representação das moléculas utilizando a estrutura esquelética é, de


fato, o tipo de representação mais utilizado em química orgânica. Isso porque,
além de indicar a geometria molecular, a estrutura esquelética facilita o desenho
das moléculas e a sua observação. Vemos isso comparando as representações da
estrutura do ácido linoleico, a estrutura esquelética, além de ser desenhada mais
rapidamente porque não necessita indicar todos os elementos, é, visualmente,
mais limpa e menos confusa (compare os dois exemplos mostrados na Figura 33).

Existem ainda muitas outras maneiras de descrever moléculas orgânicas


através de fórmulas de representação, sendo que cada uma serve a um propósito
específico. Veremos mais algumas dessas representações durante o curso de orgânica.

5 CLASSIFICAÇÃO DAS CADEIAS CARBÔNICAS


Neste material, você já se deparou algumas vezes com o termo “cadeia
carbônica”, mas o que é exatamente uma cadeia carbônica? Uma cadeia carbônica
nada mais é do que a sequência de átomos de carbono ligados entre si por ligações
covalentes. Basicamente, é como se fosse o esqueleto sobre o qual a molécula
orgânica se estrutura.

Podemos classificar as cadeias carbônicas de acordo com os seguintes


critérios:

• Classificação dos átomos de carbono da cadeia carbônica:


o Carbono primário: o átomo de carbono está ligado a apenas um outro
átomo de carbono.
o Carbono secundário: o átomo de carbono está ligado a dois outros átomos
de carbono.
o Carbono terciário: o átomo de carbono está ligado a três outros átomos de
carbono.
o Carbono quaternário: o átomo de carbono está ligado a quatro outros
átomos de carbono.

FIGURA 35 – CLASSIFICAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DA CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

61
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

E
IMPORTANT

Os hidrogênios também podem ser classificados em primários, secundários,


terciários e quaternários. Assim, se um átomo de hidrogênio está ligado a um carbono
primário, ele será denominado de hidrogênio primário. Caso ele esteja ligado a um carbono
secundário, será denominado de hidrogênio secundário e assim por diante.

• Classificação quanto ao fechamento da cadeia carbônica:

o Cadeia aberta ou acíclica: a cadeia carbônica possui duas ou mais


extremidades livres, ou seja, o encadeamento dos átomos não sofre nenhum
fechamento.
o Cadeia fechada ou cíclica: a cadeia carbônica apresenta fechamento da
cadeia para formar um ciclo (também chamado de anel).

FIGURA 36 – CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO FECHAMENTO DA CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

• Classificação quanto à disposição dos átomos na cadeia carbônica:

o Cadeia linear: a cadeia carbônica apresenta apenas duas extremidades, ou


seja, o encadeamento dos átomos de carbono segue uma sequência única,
só aparecendo carbonos primários e secundários.
o Cadeia ramificada: a cadeia carbônica apresenta mais de duas extremidades
devido ao surgimento de ramificações. Além de carbonos primários e
secundários, deve-se observar carbonos terciários e/ou quaternários.

62
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

FIGURA 37 – CLASSIFICAÇÃO QUANTO À DISPOSIÇÃO DOS ÁTOMOS NA CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

Note que o segundo carbono possui ligado a ele, além do resto da cadeia,
uma cadeia menor, constituída de dois átomos de carbono. Essa cadeia menor
é chamada de ramificação, o que torna a cadeia carbônica ramificada. A cadeia
maior (ou seja, aquela que contém o maior número de carbonos ligados entre si)
é chamada de cadeia principal.

• Classificação quanto aos tipos de ligação entre os átomos de carbono na


cadeia carbônica:

o Cadeia saturada: a cadeia carbônica apresenta apenas ligação simples entre


os átomos de carbono.
o Cadeia insaturada: a cadeia carbônica apresenta ao menos uma ligação
dupla ou tripla entre os átomos de carbonos.

FIGURA 38 – CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TIPO DE LIGAÇÃO ENTRE OS ÁTOMOS DE


CARBONO NA CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

Observação: se não houver nenhuma ligação dupla entre carbonos, mas


apenas com outro átomo (oxigênio, por exemplo), a cadeia carbônica é classificada
como saturada.

• Classificação quanto à natureza dos átomos que compõem a cadeia carbônica:

o Cadeia homogênea: a cadeia carbônica é constituída apenas por átomos de


carbono e de hidrogênio.

63
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

o Cadeia heterogênea: a cadeia carbônica é constituída, além dos átomos


de carbono e de hidrogênio, por heteroátomos (geralmente oxigênio,
nitrogênio e fósforo).

FIGURA 39 – CLASSIFICAÇÃO QUANTO À NATUREZA DOS ÁTOMOS QUE COMPÕEM A


CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

EXEMPLO – Dada a fórmula estrutural do 5-metil-hex-2-en-4-ol,


classifique sua cadeia carbônica:

RESPOSTA

64
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

6 INTRODUÇÃO AOS GRUPOS FUNCIONAIS ORGÂNICOS


Atualmente, mais de 16 milhões de moléculas orgânicas são conhecidas e,
com o avanço da tecnologia e do conhecimento, mais e mais compostos poderão
ser sintetizados em laboratório. É certo que cada uma dessas moléculas apresenta
propriedades físicas e químicas próprias, e, caso precisássemos estudar cada uma
dessas moléculas separadamente para entender seu comportamento, seria uma
empreitada quase que impossível. Felizmente, percebeu-se que algumas moléculas
orgânicas diferentes continham grupamentos químicos idênticos, fazendo com que
suas propriedades químicas fossem relativamente semelhantes. Por exemplo, se
analisarmos as reatividades químicas do metano e do etano (moléculas orgânicas
cujas estruturas diferem pela quantidade de átomos de carbono e de hidrogênio que
as compõem), veremos que ambas as moléculas são praticamente inertes. Por outro
lado, o eteno e o menteno (nome comum dado ao 1-isopropil-4-metilciclohexeno,
um composto extraído da hortelã) reagem facilmente com o Br2, por exemplo.
Como mostrado na figura a seguir, vemos que ambas as moléculas de partida (isso
é, o eteno e o menteno) apresentam uma dupla ligação entre átomos de carbono,
após a reação com o Br2, essa dupla ligação é desfeita (sendo agora uma ligação
simples) e os dois átomos de bromo formaram ligações com os carbonos que antes
formavam a dupla ligação. Assim, percebe-se que o Br2 reage exatamente da mesma
forma com o eteno e com o menteno, apesar da maior complexidade da molécula
de menteno em relação ao eteno.

FIGURA 40 – REAÇÕES DO ETENO E DO MENTENO COM O BR2

FONTE: A autora

65
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

Assim, ao invés de termos que estudar cada molécula individualmente,


conhecer o grupo ao qual uma molécula faz parte já é um grande passo para que
possamos prever suas propriedades químicas.

A característica estrutural que determina a classificação das moléculas


orgânicas em grupos é denominada de grupo funcional. Basicamente, as
estruturas das moléculas orgânicas são constituídas por uma cadeia carbônica e
por um (ou mais) grupo(s) funcional(ais) – é importante ressaltar que uma dada
molécula orgânica pode possuir mais de um grupo funcional, sendo chamada
de polifuncional, sendo que as propriedades do composto é o resultado da
influência desses grupos funcionais, que podem influenciar ou não as atividades
dos outros grupos. De forma geral, a cadeia carbônica exerce maior influência
nas propriedades físicas da molécula (como pontos de fusão e ebulição, e
solubilidade), enquanto que o grupo funcional da molécula determina suas
propriedades químicas (reatividade, acidez e basicidade).

NOTA

Grupos funcionais determinam a química das moléculas, assim, diferentes


moléculas orgânicas contendo um mesmo grupo funcional possuem propriedades
químicas semelhantes, independentemente do tamanho e da complexidade da molécula.

Existem diversos grupos funcionais e iremos estudar nas disciplinas de


química orgânica alguns dos mais comuns entre eles. Como dito, cada grupo
funcional possui estrutura e induz propriedades químicas similares às moléculas
orgânicas, mas existem algumas semelhanças entre os grupos funcionais que
permitem que eles sejam agrupados em categorias ainda maiores, como:

Grupos funcionais com ligações múltiplas entre os carbonos (C=C e


C≡C): as moléculas cujos grupos funcionais se adequam à essa categoria são os
alcenos (possuem ligação C=C), os alcinos (ligação C≡C) e os arenos (compostos
aromáticos, formados por um anel aromático, no qual um anel de seis membros
está ligado por ligações duplas e simples alternadas).

66
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

ATENCAO

1. Há ainda o grupo dos alcanos, que são as moléculas cuja estrutura é


formada apenas por átomos de carbono e hidrogênio ligados entre si por ligações simples.
Os alcanos são considerados o grupo mais simples de moléculas orgânicas e, assim, não
possuem um grupo funcional.

2. Os alcenos, alcinos e arenos, juntamente com os alcanos, também são classificados


como hidrocarbonetos, designação dada aos compostos que possuem apenas carbono e
hidrogênio em sua estrutura.

• Grupos funcionais nos quais o carbono forma ligações simples com átomos
mais eletronegativos (nitrogênio, oxigênio, enxofre, fósforo e halogênios):
esses grupos funcionais apresentam como característica ligações polares,
formadas pela ligação entre o carbono (que exibe uma carga parcial positiva,
d+ e o átomo mais eletronegativo (que exibe uma carga parcial negativa, d-).

São exemplos dos grupos funcionais que se adequam a essa categoria: os


haletos de alquila (que possuem um halogênio ligado ao carbono, C–X – atente-se
ao fato de que, muitas vezes, o halogênio, que pode ser um átomo de flúor, cloro,
bromo ou iodo, é representado por X); álcoois (o grupo hidroxila está ligado
ao carbono, C–OH – o grupo hidroxila é formado pela ligação O–H); os éteres
(que possuem um átomo de oxigênio ligado em dois carbonos, C–O–C); aminas
(carbono ligado ao nitrogênio, C–N); os tióis (carbono ligado ao grupo S–H,
C–SH); os sulfetos (que possuem um átomo de enxofre ligado a dois carbonos,
C–S–C).

• Grupos funcionais nos quais o carbono forma ligação dupla com o oxigênio
(grupo carbonila, C=O): a ligação dupla entre o carbono e o oxigênio forma o
grupo C=O, designado como grupo carbonila. A ligação carbonila é polarizada,
sendo que o carbono exibe uma carga parcial positiva (d+ e o oxigênio, mais
eletronegativo, exibe uma carga parcial negativa d-).

Como exemplos dos grupos funcionais dessa categoria podemos citar: os


aldeídos (que possuem ao menos um átomo de hidrogênio ligado ao grupo C=O);
as cetonas (nas quais dois átomos de carbono se ligam ao grupo C=O); os ácidos
carboxílicos (nos quais um grupo hidroxila, ­–OH, está ligado ao grupo C=O);
os ésteres (oxigênio ligado a um carbono que se liga ao grupo C=O); as amidas
(nitrogênio ligado a dois carbonos que se liga ao grupo C=O).

67
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

TABELA 4 – ALGUNS GRUPOS FUNCIONAIS MAIS COMUNS

Fórmula
Estrutura do
Grupo funcional molecular Exemplo
grupo funcional
genérica
Alcano (na realidade,
Possui apenas
os alcanos não
RH ligações C–C e CH3CH3
possuem grupo
C­–H
funcional)
Alceno (o grupo
funcional é a ligação C C H2C=CH2
RHC=CHR
dupla C=C)
Alcino (o grupo
funcional é a ligação RC≡CR C C HC≡CH
C≡C)
H
Hidrocarbonetos

C H C H
Areno (o grupo C C C C
funcional é um anel ArH
C C C C
aromático) C H C H

Haleto de alquila
(o grupo funcional
RX C X H3C–Cl
é a ligação C–
Halogênio)
Álcool (o grupo
funcional é a ligação ROH C OH H3C–OH
C–O)
Éter (o grupo
funcional é a ligação ROR C O C H3C–O­–CH3
C–O–C)
Ligação simples C e N, O, S ou X

C NH2
Amina (o grupo
funcional é a ligação Amina primária
C–NH2. Porém estes H3C–N­H2
dois hidrogênios C NH H3C–N­H–CH3
RNH2
também podem H3C–N­(CH3)2–
ser substituídos Amina secundária CH3
por outros grupos
alquila)
C N

Amina terciária

68
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

Tiól (o grupo
H3C–SH
funcional é a ligação RSH C SH
C–SH)

Sulfeto (o grupo
H3C–S–CH3
funcional é a ligação RSR C S C
C–S–C)
Aldeído (o grupo
O
funcional é o C=O, O O
com pelo menos um C C H
H3 C C H
hidrogênio ligado ao R H
carbono)
Cetona (o grupo
O
funcional é o C=O, O O
com dois grupos C C C
H3 C C CH3
alquila ligados ao R R
carbono)
O
Ácido carboxílico (o O O
grupo funcional é o C C OH
H3 C C OH
COOH) R OH

O
O O
Éster (o grupo
C C O C
funcional é COOR) H3 C C O CH3
R OR

C C NH2

Amida (o grupo O
Amida primária
funcional é o H3 C C NH2
O
CONH2. Os O O
hidrogênios ligados C C NH
H
Grupo carbonila

ao nitrogênio podem R NH2 H3 C C N CH3


Amida secundária O
ser substituídos por O H H2
grupos alquila) H3 C C N C CH3
C C N

Amida terciária

Observação: a letra “R” presente nas fórmulas moleculares genéricas dos


grupos funcionais se refere a uma cadeia carbônica qualquer, usada quando
não sabemos ou quando não há necessidade de determinar a cadeia carbônica
de uma molécula. É uma denotação muito utilizada em química orgânica.
FONTE: A autora

69
UNIDADE 1 | FUNDAMENTOS DA QUÍMICA ORGÂNICA

EXEMPLO 1 – Considere a representação da metionina, um


aminoácido que faz parte das proteínas da maioria dos seres vivos:

a) Identifique qual tipo de representação está sendo


utilizada para descrever a molécula de metionina.
b) Represente a estrutura da metionina utilizando
a representação esquelética.
c) Escreva sua fórmula molecular.
d) Identifique os grupos funcionais presentes na
molécula de metionina.

RESPOSTAS
a) A representação usada é a condensada, pois as ligações simples C–H e C–O
não estão desenhadas, sendo mostradas de forma implícita, enquanto que
as ligações com heteroátomos são indicadas por traços (ligação C=O e C–N).

b) Estrutura esquelética:
c) Fórmula molecular: C5H11O2NS.

d) Grupos funcionais:

EXEMPLO 2 – Identifique os grupos funcionais presentes na


molécula de capsaicina, componente irritante das pimentas chili.

Grupos funcionais:

70
TÓPICO 3 | FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA III

DICAS

Recomendamos a leitura de três artigos que discutem novas abordagens


para o ensino de funções orgânicas para os alunos do ensino médio: Uma abordagem
diferenciada para o ensino de funções orgânicas através da temática medicamentos
(PAZINATO et al., 2012); Plantas medicinais: uma oficina temática para o ensino de grupos
funcionais (LOYOLA; SILVA, 2017); e Perfumes e essências: a utilização de um vídeo na
abordagem das funções orgânicas (MARCELINO-JR et al., 2004).

71
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• A eletronegatividade é uma propriedade periódica e é definida como a tendência


relativa de um átomo em atrair para si o par de elétrons compartilhados em
uma ligação covalente.

• As ligações covalentes são classificadas em duas categorias, de acordo com


a diferença de eletronegativa entre os átomos da ligação: ligações covalentes
apolares (os elétrons de uma ligação covalente são compartilhados de
forma equivalente, resultando em uma distribuição de cargas simétricas em
torno da ligação) e ligações covalentes polares (o átomo que possui maior
eletronegatividade atrai mais eficientemente o par de elétrons na direção do
seu núcleo e gera uma carga parcial negativa, d-, enquanto que o elemento
menos eletronegativo fica mais distante dos elétrons compartilhados, gerando
uma carga parcial positiva d+).

• O dipolo de uma ligação covalente polar pode ser medido em termos do


momento de dipolo.

• Os mapas de potencial eletroestático são modelos que mostram o perfil da


distribuição da densidade de carga na molécula.

• As interações intermoleculares são aquelas que ocorrem entre as moléculas, e


existem quatro tipos de interações intermoleculares especialmente importantes
para a química orgânica: forças dipolo-dipolo, ligações de hidrogênio, forças
de dispersão e forças de dipolo-dipolo induzido.

• Existem diversos modelos para a representação estrutural de moléculas


orgânicas, sendo que estudamos a forma de representação de Lewis, de
Kekulé, condensadas e esqueléticas.

• Uma cadeia carbônica mostra a sequência de átomos de carbono ligados entre si


por ligações covalentes, podendo ser classificada quanto ao fechamento (cadeia
aberta ou cíclica), à disposição dos átomos na cadeia (cadeia linear ou ramificada),
aos tipos de ligação entre os átomos de carbono (cadeia saturada ou insaturada) e
à natureza dos átomos que a compõem (cadeia homogênea ou heterogênea).

• São os grupos funcionais que determinam a química das moléculas, assim,


diferentes moléculas orgânicas, contendo um mesmo grupo funcional, possuem
propriedades químicas semelhantes, independentemente do tamanho e da
complexidade da molécula.

72
AUTOATIVIDADE

1 Use a convenção d- e d+ para indicar a polaridade esperada para as ligações


covalentes destacadas nas seguintes moléculas:

a) H3C­–F:
b) H3C-NH2 :
c) H2N–H :
d) H3C­–MgBr :

2 Usando os valores relativos de eletronegatividade mostrados na tabela


periódica da Figura 25, indique qual das ligações covalentes é mais polar para
cada par de substâncias:

a) H3C­–Cl ou Cl-Cl
b) H3C-Li ou Li-OH
c) H3C­–Cl ou H3C–H

3 As moléculas mostradas a seguir possuem a mesma fórmula molecular,


porém possuem estruturas diferentes. Analisando essas estruturas, indique
qual possui um momento dipolo:
OH OH

OH

HO

4 Converta as estruturas de traços em estruturas esqueléticas e dê a fórmula


molecular para cada composto:

CH3 O OH
H C H
N N O
C C HO C C C C C OH
H C
C N O H OH H O
N C CH3
H3 C Ácido cítrico
O
Cafeína

73
5 Classifique as seguintes cadeias carbônicas:

NH CH3 CH3

S CH2
Cl Cl H3C
OH
Caprolactona Gás mostarda Linalol

6 Identifique os grupos funcionais presentes em cada uma das seguintes


moléculas orgânicas:

OH H

HO N O

CH3 OH
H 3C O HO

Fenilefrina Acetato de propila Etilenoglicol

74
UNIDADE 2

GRUPOS FUNCIONAIS I:
ALCANOS E ALCENOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você será capaz de:

• entender os conceitos fundamentais que regem a química dos alcanos e


dos cicloalcanos;

• saber como nomear corretamente os alcanos e os cicloalcanos;

• compreender a estereoquímica dos alcanos e dos cicloalcanos;

• compreender as ideias fundamentais em que se baseiam as reações orgânicas;

• saber identificar corretamente os tipos de reações orgânicas;

• familiarizar-se com as representações utilizadas para indicar um mecanis-


mo de reação química;

• entender os conceitos fundamentais que regem a química dos alcenos;

• saber como nomear corretamente os alcenos;

• compreender a estereoquímica dos alcenos;

• compreender a reatividade dos alcenos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 –­ HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

TÓPICO 2 –­ INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

TÓPICO 3 –­ HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

75
76
UNIDADE 2 TÓPICO 1
HIDROCARBONETOS I: ALCANOS
E CICLOALCANOS

1 INTRODUÇÃO
Na Unidade 1 desse livro, estudamos os fundamentos que regem a
química orgânica, podendo entender o papel central do carbono. Vimos conceitos
relacionados à estrutura atômica, ligação química, orbitais híbridos, interações
intermoleculares com o intuito de podermos estudarmos os diferentes grupos
funcionais orgânicos.

De fato, na primeira unidade deste livro de estudos, já entendemos


a importância de agrupar as moléculas orgânicas: para simplificar nosso
entendimento, uma vez que existem milhões de moléculas orgânicas e se tornaria
uma empreitada quase que impossível estudá-las exaustivamente de forma isolada.

Assim, o Tópico 1 desta unidade é dedicada ao estudo dos hidrocarbonetos


mais simples, os alcanos, e dos cicloalcanos, que são os compostos de carbono
formados por átomos de carbono e de hidrogênio ligados apenas por ligações
químicas. Verificaremos como é determinada a nomenclatura sistemática desses
compostos, mais importante, estudaremos os aspectos relacionados às suas
estruturas.

2 ALCANOS
Como mencionado na Unidade 1 deste livro de estudos, os alcanos integram
a classe de hidrocarbonetos, ou seja, são formados apenas por átomos de carbono e
hidrogênio. O metano e o etano, já citados neste livro de estudos, são alcanos. Essa
classe de moléculas é geralmente descrita como hidrocarbonetos saturados, pois
possuem apenas ligações simples C–C e H–H, o termo saturado se refere ao fato
de que, por haver apenas ligações simples, a quantidade de átomos de hidrogênio
ligados a cada átomo de carbono da molécula é máxima. Isso significa que todos os
átomos de carbono da molécula possuem hibridização sp3 e as ligações formadas
são do tipo σ devido à sobreposição frontal entre os orbitais sp3. Devido ao fato
de que as eletronegatividades do carbono e do hidrogênio serem semelhantes,
a ligação C–H é apolar, ou seja, os elétrons da ligação C–H são compartilhados
igualmente pelos átomos, não havendo polaridade sobre a molécula.

Sabendo, então, que os alcanos possuem apenas carbonos e hidrogênios


ligados entre si por ligações simples, e analisando o número de átomos e carbonos

77
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

nos alcanos, é possível definir que a fórmula geral dos alcanos é CnH2n+2, em que
n pode ser qualquer número inteiro. Desse modo, o metano – o alcano mais
simples – é constituído por um átomo de carbono e quatro átomos de hidrogênio;
do mesmo modo, o etano é formado por dois átomos de carbono e seis átomos
de hidrogênio. Perceba essa relação analisando os dados presentes na tabela a
seguir, que mostra as estruturas de alguns alcanos e suas fórmulas moleculares.

TABELA 1 – ALCANOS MAIS SIMPLES DE CADEIA LINEAR

Fórmula Estrutura Fórmula Estrutura


na Nome na Nome
molecular condensada molecular condensada
1 CH4 Metano CH4 8 C8H18 Octano CH3(CH2)6CH3
2 C2H6 Etano CH3CH3 9 C9H20 Nonano CH3(CH2)7CH3
3 C3H8 Propano CH3CH2CH3 10 C10H22 Decano CH3(CH2)8CH3
4 C4H10 Butano CH3(CH2)2CH3 11 C11H24 Undecano CH3(CH2)9CH3
5 C5H12 Pentano CH3(CH2)3CH3 12 C12H26 Dodecano CH3(CH2)10CH3
6 C6H14 Hexano CH3(CH2)4CH3 20 C20H42 Icosano CH3(CH2)18CH3
7 C7H16 Heptano CH3(CH2)5CH3 30 C30H62 Triacontano CH3(CH2)28CH3
a
n = número de carbonos
FONTE: A autora

2.1 NOMENCLATURA DOS ALCANOS


É certo que não seria prático indicar os isômeros apenas através de suas
representações estruturais, por isso a comunidade científica elaborou uma série
de regras que possibilita nomear uma determinada substância baseando-se em
sua estrutura. Isso possibilita que a estrutura de um composto seja facilmente
deduzida a partir do seu nome. Veremos logo mais as regras utilizadas para
nomear os alcanos, mas antes precisamos saber o que são e como se nomeiam os
substituintes alquila, pois eles são a base para esse tipo de nomenclatura.

2.1.1 Substituintes Alquila


Os substituintes alquila (também chamados de grupo alquila) são, por
definição, partes de uma molécula maior e não existem de forma isolada. O
termo “substituinte” é usado para se referir a um grupo alquila justamente para
enfatizar que esse grupo é parte integrante de uma molécula (como pode ser
melhor entendido na figura a seguir). Sua estrutura é dada a partir da estrutura
de um dado alcano que “perdeu” um de seus átomos de hidrogênio e o sufixo
-ano do alcano é substituído pelo sufixo -ila – nós já vimos alguns dos nomes de
alcanos, como o metano, o etano, butano, propano entre outros –, e pudemos

78
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

perceber que todos esses nomes apresentam um sufixo em comum, -ano, mas
esse assunto será melhor analisado adiante. Assim, o grupo alquila, derivado do
metano, é chamado de metila, e o derivado do etano de etila. Na figura a seguir
são mostradas algumas estruturas dos substituintes alquila de cadeia linear, nos
quais o átomo de hidrogênio “retirado” foi de um carbono terminal.

FIGURA 1 – ALGUNS SUBSTITUINTES ALQUILA

FONTE: A autora

2.1.2 Regras de nomenclatura para os alcanos


Neste livro de estudos já foram citados vários exemplos de moléculas
orgânicas, as quais, juntamente com as suas representações estruturais, foram
identificadas por um nome. Alguns desses nomes, como a guanina e a timina
(bases nitrogenadas) ou os ácidos cianídrico e linoleico, são na verdade os nomes
comuns desses compostos, ou seja, os nomes com os quais eles são conhecidos,
mas que não indicam a estrutura do composto. De fato, antigamente, as moléculas
orgânicas que iam sendo descobertas eram nominadas pelo seu descobridor, que
se utilizava de alguma característica marcante da molécula: por exemplo, a ureia
(CH4N2O) tem esse nome porque foi isolada da urina; já a morfina (C17H19NO3),
um analgésico pertencente ao grupo dos opioides com alto poder analgésico,
foi nomeada em referência ao deus grego do sonho, Morfeu; e o ácido acético
tem esse nome porque é o composto responsável pelo cheiro característico do
vinagre, cujo termo em latim é acetum. No entanto, com o desenvolvimento da

79
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

química como ciência, milhares de outros compostos foram sendo descobertos


e sintetizados, o que tornou necessário o uso de uma nomenclatura mais
precisa. Como dito anteriormente, um método de nomenclatura, chamado
de nomenclatura sistemática, foi desenvolvido com base na estrutura desses
compostos, permitindo, portanto, que a partir do seu nome sistemático possamos
deduzir facilmente sua estrutura.

A nomenclatura sistemática foi designada por uma comissão da União


Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC, do inglês International Union of
Pure and Applied Chemistry) e, por isso, também pode ser chamada de nomenclatura
IUPAC. As primeiras regras para a nomenclatura sistemática foram definidas em
1892, e desde então têm sido constantemente revisadas.

Assim, de acordo com as regras determinadas pela IUPAC, o nome


sistemático de uma molécula orgânica é determinado por quatro partes principais,
que aparecem na seguinte ordem: os localizadores, o prefixo, a cadeia principal
e o sufixo. Os localizadores indicam as posições (ou seja, qual átomo de carbono)
em que se encontram os grupos funcionais e/ou os substituintes, o prefixo indica
quais são os substituintes na molécula, a cadeia principal indica quantos átomos
de carbono formam essa cadeia e o sufixo indica o grupo funcional principal –
para os alcanos, esse sufixo é o -ano.

FIGURA 2 – ORDEM A SER SEGUIDA PARA NOMEAR UM COMPOSTO DE ACORDO COM AS


REGRAS DA NOMENCLATURA SISTEMÁTICA DA IUPAC

FONTE: A autora

Assim, veremos como nomear os alcanos (tanto os de cadeia linear, quanto


ramificada), seguindo quatro ou cinco etapas – aprenderemos também algumas
regras gerais de nomenclatura, mas as regras mais específicas serão introduzidas
à medida que estudarmos os diferentes grupos funcionais orgânicos.

• Etapa 1: identificar a cadeia principal

a) A cadeia principal é definida pela cadeia de carbono mais longa (ou seja, que
contém maior número de átomos de carbono ligados entre si). Devemos nos
atentar para o fato de que nem sempre a cadeia principal está representada de
forma linear e aparente, em alguns casos, teremos que fazer “curvas”.

80
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 3 – IDENTIFICAÇÃO DA CADEIA PRINCIPAL: CADEIA DE CARBONO MAIS LONGA

FONTE: A autora

b) Caso haja na estrutura da molécula duas cadeias diferentes, mas de mesmo


comprimento, devemos determinar aquela com maior número de ramificações
(também chamadas de substituintes) como a principal.

FIGURA 4 – IDENTIFICAÇÃO DA CADEIA PRINCIPAL: CADEIA COM MAIOR NÚMERO DE


RAMIFICAÇÕES

FONTE: A autora

Na tabela seguinte são expostos os prefixos usados para indicar a


quantidade de átomos de carbono da cadeia principal. É aconselhável sabermos
de cabeça os prefixos para as cadeias contendo de um a dez carbonos.

81
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

TABELA 2 – PREFIXOS USADOS PARA INDICAR A QUANTIDADE DE ÁTOMOS


DE CARBONO DA CADEIA PRINCIPAL

Número de carbonos Prefixo


1 met-
2 et-
3 prop-
4 but-
5 pent-
7 hept-
8 oct-
9 non-
10 dec-
11 undec-
13 tridec-
14 tetradec-
15 pentadec-
20 eicos-
21 heneicos-
23 tricos-
30 triacont-
31 hentriacont-
32 dotriacont-
40 tetracont-
FONTE: A autora

• Etapa 2: enumerar os átomos presentes na cadeia principal

a) Para enumerar os átomos da cadeia principal, devemos começar pelo átomo


de carbono presente na extremidade da cadeia que esteja mais próximo a uma
ramificação.

82
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 5 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS PRESENTES NA CADEIA PRINCIPAL: INICIAR PELO


CARBONO QUE ESTEJA MAIS PRÓXIMO DA PRIMEIRA RAMIFICAÇÃO

FONTE: A autora

b) Caso existam ramificações presentes a uma mesma distância dos átomos da


extremidade, devemos começar a enumerar pela extremidade mais próxima
de uma segunda ramificação.

FIGURA 6 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS PRESENTES NA CADEIA PRINCIPAL: INICIAR PELO


CARBONO MAIS PRÓXIMO DA SEGUNDA RAMIFICAÇÃO

FONTE: A autora

• Etapa 3: identificar e enumerar os substituintes

a) Devemos identificar os números dos carbonos da cadeia principal na qual


cada um dos substituintes está ligado, de modo que possamos localizar esse
substituinte.

83
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 7 – IDENTIFICAÇÃO E ENUMERAÇÃO DOS SUBSTITUINTES: IDENTIFICAÇÃO DOS


CARBONOS DA CADEIA PRINCIPAL AOS QUAIS OS SUBSTITUINTES ESTÃO LIGADOS

Cadeia de carbono mais longa: 9 átomos de carbono ( nomeada como um nonano)

Substituintes:

No carbono de número 3: -CH2CH3 (nomeado como 3-etil, pois é um substituinte


etila e está ligado ao carbono de número 3 da cadeia principal)

No carbono de número 4: -CH3 (nomeado como 4-metil, pois é um substituinte


metila e está ligado ao carbono de número 4 da cadeia principal)

No carbono de número 7: -CH3 (nomeado como 7-metil, pois é um substituinte


metila e está ligado ao carbono de número 7 da cadeia principal)

FONTE: A autora

b) Se houver dois substituintes ligados a um mesmo carbono da cadeia principal,


esses substituintes serão identificados pelo mesmo número. Ambos os
localizadores devem ser designados no nome da molécula.

FIGURA 8 – IDENTIFICAÇÃO E ENUMERAÇÃO DOS SUBSTITUINTES: IDENTIFICAÇÃO DOS


SUBSTITUINTES LIGADOS AO MESMO CARBONO DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

• Etapa 4: escrever o nome do composto em uma única palavra

Devemos nomear o composto seguindo a ordem: localizador ­– prefixo


– cadeia principal – sufixo. Isso significa que os localizadores são usados para
indicar a localização dos substituintes (ou seja, os átomos de carbono ao qual um
substituinte está ligado) e o prefixo indica o nome do substituinte. Para separar
diferentes localizadores, devemos utilizar vírgulas, e para separar os diferentes
prefixos devemos usar hifens.

No caso em que haja mais de um substituinte igual na molécula, devemos


indicar usando os prefixos multiplicadores di­- (dois substituintes iguais), tri-
(três), tetra- (quatro) e assim por diante. Já no caso de substituintes diferentes na
cadeia carbônica, devemos citá-los em ordem alfabética (assim, um substituinte
etil deve aparecer antes do substituinte metil, por exemplo), no entanto, os
prefixos multiplicados (di-, tri-, tetra-) são ignorados quando os substituintes são
postos em ordem alfabética.
84
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

Para recordar, a cadeia principal é nomeada de acordo com o número


de átomos que ela é formada (veja a tabela anterior) e o sufixo indica o grupo
funcional (-ano para os alcanos).

FIGURA 9 – ESCRITA DO NOME DO COMPOSTO

FONTE: A autora

• Etapa 5: nomear um substituinte ramificado como se ele mesmo fosse um


composto

Esta etapa não é necessária em todos os casos, apenas naqueles em que


um dos substituintes é ramificado. Assim, primeiramente, devemos nomear o
substituinte de acordo com as regras mostradas nas quatro etapas anteriores.
Depois, devemos seguir as mesmas etapas a fim de nomear o composto como um
todo, sendo que o substituinte ramificado é indicado entre parênteses.

85
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 10 – NOMEAÇÃO DE UM SUBSTITUINTE RAMIFICADO COMO SE ELE MESMO FOSSE UM


COMPOSTO

FONTE: A autora

EXEMPLO – Escreva o nome sistemático da seguinte molécula seguindo


as regras da IUPAC

RESPOSTA

Para determinarmos o nome sistemático da molécula, precisamos seguir


os seguintes passos:

1) Identificar e enumerar os átomos da cadeia principal:

86
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

2) Identificar e enumerar os substituintes da cadeia principal:

3) Nomear o composto, em uma única palavra, seguindo a ordem: localizador


­– prefixo – cadeia principal – sufixo.

• Localizador: indica as posições e o nome dos substituintes na cadeia carbônica.


• Prefixo: indica os substituintes (os substituintes devem ser colocados em
ordem alfabética); então, localizador + prefixo fica: 2-etil-2,4-dimetil.
• Cadeia principal: indica o número de átomos da cadeia principal, no caso a
cadeia principal tem sete átomos (hept-).
• Sufixo: indica o grupo funcional (-ano, para os alcanos).

Portanto, a cadeia principal + o sufixo fica: heptano.

Juntamos tudo em uma única palavra e temos o nome sistemático da


molécula: 2-etil-2,4-dimetilheptano.

NOTA

União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC)

A IUPAC foi formada em 1919 por químicos – que trabalhavam tanto na indústria,
como na área acadêmica – que reconheceram a necessidade de uma padronização
internacional da química, uma vez que a padronização de pesos, medidas, nomes e símbolos
é essencial para o bom desenvolvimento e crescimento da pesquisa e do comércio a nível
internacional. Foi justamente esse desejo por uma cooperação internacional mais efetiva
que motivou a criação da IUPAC e que levou às padronizações que conhecemos hoje,
como: a nomenclatura de compostos orgânicos e inorgânicos; a padronização das massas
atômicas; a padronização de constantes físicos; a compilação em tabelas das propriedades
da matéria; e a padronização dos formatos das publicações na área de química.

Para saber mais, acesse a página da IUPAC: Disponível em: <https://iupac.org/>. Acesso em:
19 abr. 2018.

87
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

DICAS

Para consolidar seu conhecimento acerca da nomenclatura de compostos


orgânicos, recomendamos o texto Recomendações da IUPAC para a nomenclatura de
moléculas orgânicas (RODRIGUES; JOSÉ AUGUSTO R., 2011). Recomendamos também a
leitura do artigo Temática Chás: Uma Contribuição para o Ensino de Nomenclatura dos
Compostos Orgânicos (DA SILVA et al., 2017) que trata de uma nova metodologia para
trabalhar a nomenclatura de compostos orgânicos em sala de aula.

2.2 ESTEREOQUÍMICA DOS ALCANOS


Até agora estudamos um pouco o arranjo espacial dos átomos em
uma molécula. Entretanto, não podemos esquecer do caráter tridimensional
das substâncias, pois muitas das propriedades de uma dada molécula são
consequência do modo com que os átomos se arranjam no espaço tridimensional.
A área da química que estuda os aspectos tridimensionais das moléculas é
chamada de estereoquímica.

Cada grupo funcional apresenta algumas especificidades acerca da sua


estereoquímica, que serão tratadas ao longo do curso de química orgânica. Para os
alcanos, dois pontos principais devem ser analisados: sua isomeria constitucional
e suas conformações.

2.3 ISOMERIA DOS ALCANOS


Um ponto importante deve ser considerado acerca da estrutura dos
alcanos. No caso dos alcanos formados por um, dois ou três átomos de carbono,
existe apenas um modo que os átomos de hidrogênio e carbono podem se
combinar para estruturar essas moléculas: o metano (CH4), o etano (C2H6) e o
propano (C3H8), respectivamente. No entanto, à medida que o número de carbono
da molécula aumenta, o número de combinações entre os átomos de carbono e
de hidrogênio também aumenta, o que significa que para uma mesma fórmula
química, tem-se diferentes estruturas. Por exemplo, existem duas moléculas
diferentes com a fórmula molecular C4H10 e três moléculas cuja fórmula é C5H12.
Uma dentre essas moléculas de mesma fórmula molecular será de cadeia linear,
enquanto que as restantes serão de cadeias ramificadas (veja a figura a seguir).

88
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 11 – ISÔMEROS DE FÓRMULA MOLECULAR C4H8 E C5H10

FONTE: A autora

Lembre-se de que os compostos que apresentam mesma fórmula


molecular, mas estruturas diferentes são chamados de isômeros. Existem alguns
tipos de isomeria, como veremos ao longo do curso de química, e como no caso
das moléculas mostradas na figura anterior, nas quais os átomos têm arranjos
diferentes, podemos expor que esses isômeros apresentam isomeria constitucional
de cadeia (também chamada de isomeria plana); em outras palavras, esses
isômeros diferem entre si no modo em que a cadeia carbônica se estrutura, em
cadeia linear ou ramificada, por exemplo.

2.4 CONFORMAÇÕES DOS ALCANOS


Como visto, uma ligação simples C–C é formada pela sobreposição dos
orbitais sp3 de dois carbonos. Vimos também que tal ligação é designada como
ligação σ porque é cilindricamente simétrica (isto é, os elétrons que participam
da ligação têm a probabilidade de ocupar esses orbitais sobrepostos de maneira
simétrica em torno de uma linha imaginária que conecta os centros dos dois
átomos unidos pela ligação simples – volte ao tópico dos orbitais híbridos sp3
se necessário). Essa simetria permite, então, que a rotação em torno da ligação
simples C–C possa ocorrer livremente nas moléculas de cadeia aberta sem que
haja qualquer mudança na sobreposição dos orbitais sp3. Para ficar mais claro,
imagine que na molécula do etano (C2H6) um dos átomos de carbono (assim
como as ligações C–H nesse átomo) fique parado, enquanto que o outro átomo
de carbono (e suas ligações C–H) é rotacionado em torno do eixo de ligação
(veja na figura seguinte o esquema) – é válido apontar que a ideia de que o
Carbono 1 está parado é só um meio de visualizar essa rotação da ligação C–C, na
realidade, ambos os carbonos rotacionam em torno do eixo de ligação livremente,
constantemente e varrem todos os ângulos (não apenas os de 60, 120 e 180º, mas
variam de 0 a 360º).

89
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 12 – ROTAÇÃO EM TORNO DE UMA LIGAÇÃO C–C PARA UM ALCANO (a figura acima
mostra a vista lateral e a debaixo a vista frontal do arranjo das ligações da molécula do etano em
função da rotação da ligação C–C)

FONTE: A autora

Essa livre rotação gera diferentes arranjos espaciais dos átomos em


torno de uma ligação simples, sendo que cada um desses arranjos é chamado
de conformação. As moléculas que resultam dessas conformações são então
denominadas de confôrmeros. Assim, como esquematizado na figura anterior,
cada uma das conformações espaciais geradas pela rotação de 60, 120 ou 180º é
um confôrmero do etano.

Já sabemos que as substâncias são tridimensionais, mas como somos


limitados à noção bidimensional da folha de papel, precisamos aprender
uma nova forma de representação estrutural para representar os diferentes
confôrmeros, sendo a projeção de Newman a mais utilizada para este fim. A
projeção de Newman representa a molécula de uma forma bem parecida com a
representação da vista frontal da figura anterior: despreza-se o comprimento de
uma ligação C–C específica e os carbonos da ligação são mostrados um em frente
ao outro (o carbono de trás é representado por um círculo e o da frente por um
ponto); as outras ligações realizadas pelo carbono da frente são representadas
por linhas que saem do ponto e as do carbono de trás por linhas que saem das
bordas do círculo.

90
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 13 – À ESQUERDA: VISTA FRONTAL DO ARRANJO DAS LIGAÇÕES DO ETANO. À DIREITA:


PROJEÇÕES DE NEWMAN PARA AS CONFORMAÇÕES ECLIPSADA E ALTERNADA DO ETANO

FONTE: A autora

Dissemos, anteriormente, que existem diversas conformações na


molécula do etano, devido à rotação livre em torno da ligação C–C. No entanto,
isso não é bem verdade, pois os diversos confôrmeros apresentam na verdade
diferentes energias, o que significa que as conformações de menor energia (e,
portanto mais estáveis) serão predominantes. Analisando a molécula de etano,
tem-se duas conformações extremas: uma em que as seis ligações C–H ficam
o mais longe possível, chamada de conformação alternada; e a outra em que
essas ligações se aproximam ao máximo, chamada de conformação eclipsada.
Como há repulsão entre os elétrons, a conformação em que eles estejam o mais
distante possível é a mais estável. De fato, a energia para os confôrmeros em
conformação eclipsada é 12 kJ.mol-1 maior do que para os confôrmeros em
conformação alternada, o que faz com que a conformação alternada seja a
mais estável. Essa energia extra de 12 kJ.mol-1, chamada de tensão de torção, é
efeito justamente da repulsão entre os elétrons quando as ligações estão muito
próximas. O gráfico do potencial de energia em função da rotação (de 0 a 360º)
em torno da ligação C–C para o etano é mostrado na figura a seguir, na qual
podemos observar que os pontos máximo e mínimo de energia correspondem
às conformações eclipsadas e alternadas, respectivamente.

FIGURA 14 – POTENCIAL DE ENERGIA EM FUNÇÃO DA ROTAÇÃO (DE 0 A 360º) EM TORNO


DA LIGAÇÃO C–C PARA O ETANO

FONTE: A autora

91
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

Analisamos aqui as conformações extremas para a molécula de etano


e vimos como a energia dos confôrmeros muda de acordo com a aproximação
das ligações C­–H. Essa situação fica mais complicada à medida que se analisa
os confôrmeros dos alcanos mais complexos, por exemplo, as conformações
extremas para o propano (também chamadas de conformação alternada e
eclipsada, porém com um grupo –CH3 no lugar de um hidrogênio), todavia a
diferença energética entre elas, ou seja, a tensão de torção, é levemente superior
à do etano, pois agora a aproximação máxima se dá entre um hidrogênio e um
grupo –CH3, que é volumoso e tem maior número de elétrons, aumentando,
consequentemente, a repulsão eletrônica.

FIGURA 15 – À ESQUERDA: PROJEÇÃO DE NEWMAN PARA A ROTAÇÃO ENTRE OS CARBONOS 1


E 2 DO PROPANO. À DIREITA: PROJEÇÕES DE NEWMAN PARA AS CONFORMAÇÕES ECLIPSADA
E ALTERNADA DO PROPANO

FONTE: A autora

Para o butano, a situação fica ainda mais complexa, pois agora há dois
grupos –CH3, o que faz com que haja quatro conformações limite: duas alternadas,
que diferem na posição relativa dos grupos ­–CH3 (uma mais estável, na qual os
dois grupos –CH3 estão o mais distante possível a 180º, chamada de conformação
anti e outra, um pouco menos estável devido à aproximação dos grupos –CH3
em um ângulo de 60º, chamada de conformação gauche), vale salientar que a
conformação gauche é 3,8 kJ.mol-1 mais energética do que a anti, porque nessa
conformação os grupos –CH3 estão muito próximos e há o efeito do impedimento
estérico, que resulta de uma interação de repulsão forte entre dois grupos que
são forçados a permanecerem próximos além do permitido pelo seu raio atômico;
há ainda duas conformações eclipsadas, sendo uma delas a menos estável de
todas devido ao efeito combinado da tensão de torção e do impedimento estérico
entre os grupos ­–CH3. A figura a seguir mostra essas conformações e o gráfico do
potencial de energia em função da rotação para o butano.

92
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 16 – À ESQUERDA: PROJEÇÕES DE NEWMAN PARA AS CONFORMAÇÕES ECLIPSADA E


ALTERNADA DO BUTANO. À DIREITA: POTENCIAL DE ENERGIA EM FUNÇÃO DA ROTAÇÃO EM
TORNO DA LIGAÇÃO C–C DO BUTANO

FONTE: A autora

É valido para os alcanos de cadeias maiores o mesmo princípio do


butano, ou seja, a conformação anti será a mais estável, seguida pela gauche; e
as eclipsadas serão cada vez mais energéticas, devido ao impedimento estérico
gerado pelo aumento do tamanho dos grupos ligados ao carbono analisado.

2.5 PROPRIEDADES DOS ALCANOS


Como exposto anteriormente, os alcanos são formados por átomos de
carbono e de hidrogênio através de ligações σ apolares. Essa característica faz
com que os alcanos sejam pouco reativos, pois as ligações σ são fortes e difíceis
de serem quebradas e a falta de polaridade da ligação evita que espécies reativas
sejam atraídas em direção à ligação. De fato, inicialmente, os alcanos eram
denominados parafinas (termo vindo do latim, parum affinis, que significa pouca
afinidade) justamente devido a sua baixa reatividade.

Os alcanos são obtidos principalmente a partir do petróleo ­– o petróleo é


basicamente uma mistura de diversos hidrocarbonetos e sua composição varia de
acordo com o lugar em que é extraído ­–, assim, existem petróleos mais ricos em
compostos acíclicos, outros em compostos cíclicos, outros em aromáticos, entre
outros. A destilação fracionada do petróleo, processo chamado pela indústria
de refino do petróleo, permite que a grande mistura de hidrocarbonetos seja
separada em misturas que contenham frações menores desses hidrocarbonetos,
permitindo sua aplicação posterior.

93
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

A destilação fracionada do petróleo só é possível devido ao aumento


regular do ponto de ebulição com o aumento da massa molar do alcano. Como os
alcanos são moléculas apolares, eles interagem entre si por forças de dispersão.
Sabe-se que as forças de dispersão aumentam com o aumento da cadeia carbônica
dos alcanos devido a uma maior área de contato entre as moléculas. Assim,
alcanos de cadeias maiores apresentam forças intermoleculares de dispersão mais
fortes do que os alcanos de cadeia menor, fazendo com que, consequentemente,
seja necessária uma maior energia para permitir que essas moléculas maiores
passem da fase líquida para a gasosa. A tendência que mostra esse aumento da
temperatura de ebulição com o aumento da cadeia pode ser vista na figura a
seguir. É importante apresentar que as ramificações nos alcanos levam a uma
diminuição do ponto de ebulição, isso porque a presença de ramificações limita a
interação e a área de contato entre as moléculas, fazendo com a energia necessária
para a mudança de fases de conglomerados de moléculas ramificadas seja menor
do que para as moléculas de cadeia linear.

FIGURA 17 – À ESQUERDA: TEMPERATURA DE EBULIÇÃO DE ALCANOS DE CADEIA LINEAR. À


DIREITA: TEMPERATURA DE EBULIÇÃO DOS ISÔMEROS DE FÓRMULA MOLECULAR C5H12

FONTE: A autora

Em relação às aplicações do alcanos, a baixa reatividade e o caráter


apolar dos alcanos permite que eles sejam utilizados como removedores de óleos
e solventes para diluição de tintas (o thinner e a aguarrás, por exemplo, são
produtos formados pela mistura de diferentes alcanos).

Fique atento, baixa reatividade não significa falta de reatividade. Sob


condições apropriadas, os alcanos reagem com o gás oxigênio seguindo uma reação
de combustão. O uso de alcanos como fonte de energia térmica é extremamente
comum, uma vez que eles são bons combustíveis. De fato, muitos dos combustíveis
que utilizamos diariamente são misturas de alcanos: o gás de cozinha é uma mistura
gasosa de propano e butano; o gás natural é composto basicamente de metano; a
94
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

gasolina é formada principalmente por alcanos, contendo de seis a dez carbonos; e


o óleo diesel é constituído por uma mistura de alcanos maiores, contendo de 12 a 22
átomos de carbono. Outra reação que envolve os alcanos é a pirólise, muito utilizada
na indústria petroquímica – a pirólise, também denominada de craqueamento na
indústria petrolífera, é uma reação que leva à quebra de uma molécula em frações
menores pela ação do calor. Como dito, o petróleo é formado por uma mistura de
diversos hidrocarbonetos, porém, geralmente, a quantidade de um determinado
composto presente nessa mistura não é suficiente para atender à demanda. Assim,
as frações do refino do petróleo que contém hidrocarbonetos mais pesados (ou seja,
hidrocarbonetos com grande cadeia carbônica) sofrem determinadas reações que
acabam por quebrar essas moléculas muito grandes em frações menores. Também
em relação às reações típicas dos alcanos, tem-se a reação com os halogênios, que
gera uma classe de compostos chamada de haletos de alquila. Essas reações são
geralmente conduzidas sob luz ultravioleta e envolvem a substituição dos átomos
de hidrogênio pelos átomos de halogênios; dependendo da quantidade dos
reagentes e do tempo de reação, pode-se obter produtos com graus de substituição
diferentes (isso é, apenas um átomo de hidrogênio é substituído, ou dois ou três ou
até mesmo os quatro átomos são substituídos pelos átomos de halogênio).

FIGURA 18 – REAÇÕES QUÍMICAS TÍPICAS QUE OCORREM COM OS ALCANOS

FONTE: A autora

95
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

DICAS

Recomendamos a leitura de alguns textos sobre o petróleo que servem tanto


para um melhor entendimento da indústria do petróleo, quanto para trazer ideias de como
trabalhar esse tema em sala de aula: A indústria petroquímica no próximo século: Como
substituir o petróleo como matéria-prima? (SCHUCHARDT; RIBEIRO; GONÇALVES, 2001);
Petróleo: um tema para o ensino de química (MARIA et al., 2002); e Craqueamento térmico
de alcanos: uma aula prática de química orgânica para a graduação (CUNHA et al., 2005).

3 CICLOALCANOS
Os cicloalcanos, como o próprio nome sugere, são os alcanos de cadeia
fechada (ou cíclica), cuja fórmula geral é CnH2n, sendo n qualquer número
inteiro. Como apresentado, uma cadeia fechada também é denominada de anel
e o tamanho do anel é determinado pela quantidade de átomos de carbono que
fazem parte dessa estrutura.

Os cicloalcanos, assim como os alcanos de cadeia aberta, estão presentes


no petróleo, sendo também abundantes na natureza. Quanto à aplicação,
podemos citar os usos do ciclopentano e o ciclopropano como anestésicos e do
ciclo-hexano como removedor de tintas e combustível. Por serem alcanos, muitas
das propriedades discutidas para os alcanos de cadeia aberta valem para os
cicloalcanos, uma vez que eles também são moléculas apolares (por exemplo, os
pontos de ebulição para os cicloalcanos também aumentam linearmente com o
aumento do tamanho do anel).

3.1 REGRAS DE NOMENCLATURA PARA OS CICLOALCANOS


A nomenclatura sistemática (ou a nomenclatura IUPAC) dos cicloalcanos
seguem as mesmas regras usadas para a nomenclatura dos alcanos de cadeia
aberta. Porém, geralmente, apenas duas etapas são suficientes para se determinar
o nome de um cicloalcano:

• Etapa 1: identificar a cadeia principal

Ao analisar a estrutura de uma molécula que contém tanto uma cadeia


aberta quanto uma cadeia cíclica, é essencial determinar qual é a cadeia principal
(lembre-se de que a cadeia principal é sempre aquela que contém mais átomos
de carbono ligados entre si) e qual é o substituinte. Assim, se o anel tiver um
número de átomos de carbono maior ou igual ao número de carbono da cadeia
aberta, então o composto é nomeado como um cicloalcano alquil-substituído
(caso a cadeia principal seja a cadeia aberta, esse composto será nomeado como
um alcano cicloalquil-substituído).
96
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

• Etapa 2: identificar e enumerar os substituintes

a) Devemos identificar os substituintes e começar a numerá-los de forma que os


seus números de localização sejam os menores possíveis.

FIGURA 19 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS DA CADEIA PRINCIPAL: INICIAR PELO CARBONO


QUE ESTEJA MAIS PRÓXIMO DA SEGUNDA RAMIFICAÇÃO

FONTE: A autora

b) Se houver dois ou mais substituintes que podem receber os mesmos números


de localização, comece a numerá-los em ordem alfabética (isso vale tanto para
os substituintes alquila, quanto para os halogênios).

FIGURA 20 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS DE CARBONO DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

97
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

3.2 ESTEREOQUÍMICA DOS CICLOALCANOS


Como estudamos os alcanos, veremos agora como os átomos dos
cicloalcanos estão dispostos espacialmente, uma vez que, principalmente, por
serem compostos cíclicos, os cicloalcanos possuem arranjo tridimensional distinto
dos alcanos. Assim, veremos que os cicloalcanos podem possuir isomeria cis-trans.

3.2.1 Isomeria dos cicloalcanos


Os cicloalcanos apresentam ligação σ C–C, porém, diferentemente dos
alcanos de cadeia aberta, a rotação em torno dessa ligação não é necessariamente
livre. Para os cicloalcanos de cadeia pequena (contendo de três a sete átomos de
carbono), a rotação em torno da ligação C–C é na verdade impedida, pois tais
moléculas apresentam uma estrutura muito rígida, fazendo com que a rotação
induza quebra do anel. Já para os cicloalcanos de cadeia maior, há uma maior
flexibilidade no anel, o que permite essa rotação.

Devido à estrutura cíclica dos cicloalcanos, essas possuem dois lados: o


lado de cima e o lado de baixo. Isso faz com que, como a rotação do anel para
os cicloalcanos de cadeia pequena é impedida, os cicloalcanos com mais de um
substituinte apresentem isomeria, pois esses substituintes podem estar ligados
acima ou abaixo do anel. O caso de isomeria dos cicloalcanos é diferente da
isomeria dos alcanos de cadeia aberta, pois agora os substituintes estão ligados
ao mesmo carbono, porém em lados diferentes do anel. Assim, isômeros de
cicloalcanos que apresentam as mesmas ligações entre os átomos, mas são
geometricamente diferentes, são chamados de estereoisômeros.

Um caso particular de estereoisômeros muito comum em cicloalcanos são


os chamados isômeros cis-trans: o isômero cis é aquele em que os substituintes
estão do mesmo lado do anel (por exemplo, acima do anel), e o isômero trans é
aquele em que um substituinte está posicionado acima do anel, enquanto que o
outro está abaixo (veja os exemplos mostrados na figura a seguir).

98
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 21 – EXEMPLOS DE ISÔMEROS CIS-TRANS

FONTE: A autora

NOTA

Os prefixos cis- e trans- vêm do latim e significam “no mesmo lado” e “no lado
contrário, respectivamente.

3.2.2 Tensão no anel


Desde o século XIX diversos compostos formados por anéis de cinco
e de seis membros (ou seja, contendo cinco ou seis átomos de carbono,
respectivamente) já haviam sido extraídos de fontes naturais, enquanto que
moléculas formadas por anéis de três ou quatro membros eram mais raras. Tal
fato sugere, então, que os cicloalcanos de cinco e de seis membros são mais
estáveis. De onde vem essa estabilidade?

Primeiramente, precisamos analisar como os cicloalcanos estão


estruturados geometricamente. Diferentemente dos alcanos de cadeia linear,
nos quais a formação da ligação σ C–C se dá pela sobreposição frontal dos
orbitais sp3 do carbono (isto é, os orbitais sp3 sobrepostos apontam diretamente
um para o outro) a formação das ligações covalentes nos cicloalcanos é como
se fosse inclinada, pois a sobreposição dos orbitais sp3 não é frontal. As
consequências dessa sobreposição não frontal são uma ligação mais fraca do
que as ligações dos alcanos de cadeia linear e ângulos de ligação diferentes do
ângulo tetraédrico (109,5º). Essa possível distorção em relação aos ângulos de
ligação tetraédrico gera então uma tensão no anel, chamada de tensão angular.

99
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

Além da tensão angular, os cicloalcanos também podem estar submetidos a


dois outros tipos de tensão: a tensão de torção, gerada pela repulsão entre os
elétrons (que participam da ligação) dos diferentes substituintes, próximos
entre si, ligados aos átomos de carbono; e a tensão estérica (também chamada
de impedimento estérico, como já vimos).

FIGURA 22 – COMPARAÇÃO DA SOBREPOSIÇÃO DOS ORBITAIS SP3 DE DOIS ÁTOMOS DE


CARBONO PARA A FORMAÇÃO DE UM ALCANO DE CADEIA ABERTA (À DIREITA) E DE UM
CICLOALCANO (À ESQUERDA)

FONTE: A autora

Caso os cicloalcanos fossem moléculas planares, as tensões nos anéis


seriam muito altas, uma vez que os ângulos de ligação C-C seriam muito diferentes
do ângulo tetraédrico. Isso faria com que fossem, consequentemente, muito
energéticas e, por isso, muito instáveis (lembre-se sempre que todo composto
tende a adotar a configuração de menor energia, assim, quanto menor sua energia,
mais estável esse composto). Na figura a seguir são mostrados os ângulos de
ligação C–C caso essas moléculas fossem planares, para o ciclopropano (C3H6), o
ciclobutano (C4H8), o ciclopentano (C5H10) e o ciclo-hexano (C6H12). Vemos, assim,
que o ciclopropano apresenta ângulos de ligação C–C de 60º, desviando em 49,5º
do ângulo ideal tetraédrico (109,5º). Já o ciclobutano apresenta ângulos de ligação
de 90º, indicando que o ciclobutano é mais estável que o ciclopropano, pois desvia
do ângulo tetraédrico em 19,5º. Seguindo essa linha de raciocínio, esperaríamos
que o ciclopentano fosse mais estável que o ciclo-hexano, uma vez que os ângulos
de ligação C–C (108º) desviam em apenas 1,5º do ângulo tetraédrico, enquanto
que para o ciclo-hexano (ângulo de ligação C–C igual a 120º) esse desvio é de
10,5º. Porém, não é isso o que acontece, já que há uma predominância muito
maior na natureza de compostos contendo anéis de seis membros do que anéis
de cinco membros. A explicação para isso é que os cicloalcanos não são planares
e, portanto, não adotam os ângulos de ligação mostrados na figura seguir (exceto
o ciclopropano, como veremos adiante).

100
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

FIGURA 23 – ÂNGULO DE LIGAÇÃO C–C NO ANEL CASO OS CICLOALCANOS FOSSEM


MOLÉCULAS PLANAS

FONTE: A autora

Os cicloalcanos acabam por se orientar no espaço de modo a minimizar as


tensões do anel, ou seja, fazendo com que as ligações se aproximem dos ângulos de
ligação tetraédrico (a fim de diminuir a tensão angular), adotando conformações
eclipsadas e buscando deixar os substituintes o mais longe possível (para diminuir
a tensão de torção e o impedimento estérico). As estruturas tridimensionais dos
cicloalcanos dependem do tamanho do seu anel, o que significa que os cicloalcanos
de cinco e de seis membros podem se orientar de maneira mais favorável (ou
seja, minimizando os efeitos das tensões no anel) em relação aos de três e quatro
membros, explicando sua maior estabilidade. Estudaremos essas conformações
mais estáveis adiante.

3.2.3 Conformações dos cicloalcanos


Analisaremos agora as conformações do ciclopropano (C3H6), do
ciclobutano (C4H8), do ciclopentano (C5H10) e do ciclo-hexano (C6H12) para
podermos entender a diferença de estabilidade entre eles.

Primeiramente, vemos que os três átomos do anel do ciclopropano (anel


de três membros) definem um plano, o que significa que o ciclopropano adota
realmente uma geometria planar (igual a mostrada na figura anterior). No entanto,
essa estrutura planar não é a mais estável, pois os ângulos de ligação C–C no anel
são de 60º, o que significa que estão muito tensionados (pois são muito diferentes
do ângulo tetraédrico). Além disso, as ligações C–H estão eclipsadas (de fato,
essa é a única conformação do ciclopropano, já que vimos que a rotação livre da
ligação C–C é impedida para os cicloalcanos de cadeia pequena), o que induz
uma tensão de torção relativamente alta. A tensão total para o ciclopropano é de
aproximadamente 115 kJ.mol-1, o que é, na verdade, uma energia alta, explicando
que a geometria do ciclopropano não é muito favorável. Na figura a seguir são
demonstradas algumas formas de representação do ciclopropano.

101
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 24 – FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO CICLOPROPANO (C3H6)

FONTE: A autora

A tensão total do ciclobutano é de aproximadamente 110 kJ.mol-1, valor


bem próximo ao do ciclopropano, o que nos indica que a geometria do ciclobutano
também não é muito favorável. Diferentemente do ciclopropano, a geometria do
ciclobutano não é planar, mas levemente angular. Um dos átomos de carbono do
anel se posiciona acima dos outros três átomos, o que aumenta a tensão angular,
mas diminui a tensão de torção, pois essa geometria faz com que as ligações
C–H não fiquem completamente eclipsadas. Na figura a seguir são apresentadas
algumas formas de representação do ciclobutano.

FIGURA 25 – FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO CICLOBUTANO (C4H8)

FONTE: A autora

O ciclopentano, por sua vez, apresenta tensão total de 26 kJ.mol-1, valor


bem mais baixo do que para o ciclopropano e o ciclobutano, explicando a maior
estabilidade desse composto. Esse valor mais baixo é resultado da conformação
não planar adotada pelo ciclopentano, em que quatro átomos de carbono do anel
estão no plano, enquanto que o quinto átomo se orienta para fora do plano. Essa
geometria (chamada de forma envelope, pois ela lembra um envelope retangular

102
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS I: ALCANOS E CICLOALCANOS

com a aba levantada), mesmo aumentando a tensão angular da molécula, permite


que os hidrogênios das ligações C–H adotem uma conformação alternada,
fazendo com que a tensão de torção seja praticamente nula. Na figura a seguir
são mostradas algumas formas de representação do ciclopentano.

FIGURA 26 – FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO CICLOPENTANO (C5H10)

FONTE: A autora

Apresentamos, anteriormente, que existem muitos compostos na


natureza que contêm anéis de cinco e de seis membros, no entanto, há uma
predominância dos compostos contendo anéis de ciclo-hexano. Isso acontece
porque o ciclo-hexano adota uma conformação que é completamente livre de
tensão (ou seja, a tensão total é nula), fazendo com que ele seja energeticamente
estável. Essa conformação permite que todos os ângulos de ligação estejam em
111º (valor muito próximo do ângulo tetraédrico), assim como todos os átomos de
hidrogênio das ligações C–H estejam em conformação alternada. Tal conformação
é obtida quando um dos átomos de carbono se orienta acima do plano e outro
átomo se orienta abaixo do plano, enquanto que os outros quatros átomos de
carbono permanecem planares; ela é chamada de conformação cadeira, pois sua
forma lembra uma cadeira reclinável. A seguir são expostas algumas formas de
representação do ciclo-hexano.

103
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 27 – FORMAS DE REPRESENTAÇÃO DO CICLO-HEXANO (C6H12)

FONTE: A autora

O ciclo-hexano também pode adotar um outro tipo de conformação,


chamada de conformação em bote, porém menos estável que a conformação em
cadeia, uma vez que algumas das ligações estão eclipsadas, o que gera uma tensão
de torção na molécula – dados gerados por simulação matemática indicam que
em um conjunto de mil moléculas de ciclo-hexano, no máximo duas moléculas
adotam a conformação em bote.

FIGURA 28 – CONFORMAÇÃO EM CADEIRA E EM BOTE PARA O CICLO-HEXANO

FONTE: A autora

104
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os alcanos integram a classe dos hidrocarbonetos e possuem apenas carbonos


e hidrogênios ligados entre si por ligações simples em cadeias abertas.

• A fórmula geral dos alcanos é CnH2n+2, em que n pode ser qualquer número
inteiro.

• As regras e passos utilizados para nomear os alcanos de acordo com a


nomenclatura sistemática (nomenclatura IUPAC).

• Os alcanos apresentam isomeria constitucional.

• Os confôrmeros dos alcanos de cadeia mais simples (que são cada uma das
moléculas resultantes como consequência da livre rotação em torno de uma
ligação simples em um alcano) e suas energias relativas.

• Os cicloalcanos são os alcanos de cadeia fechada (ou cíclica), cuja fórmula geral
é CnH2n, sendo n qualquer número inteiro.

• A isomeria cis-trans (o isômero cis é aquele em que os substituintes estão do


mesmo lado do anel e o isômero trans é aquele em que um substituinte está
posicionado acima do anel, enquanto que o outro está abaixo).

• As tensões do anel típico dos cicloalcanos, que podem ser a tensão ângula
(gerada por uma possível distorção em relação aos ângulos de ligação
tetraédrico), a tensão de torção (gerada pela repulsão entre os elétrons que
participam da ligação dos diferentes substituintes) e a tensão estérica.

• As estruturas tridimensionais dos cicloalcanos dependem do tamanho do


anel, o que explica as diferenças de estabilidade entre os cicloalcanos.

105
AUTOATIVIDADE

1 Determine a nomenclatura sistemática para as seguintes moléculas:

a) b) c) d)

2 Determine a estrutura para as seguintes moléculas:

a) 3-etil-4,4-dimetilpentano
b) 3,3-dietil-2,5-dimetilnonano
c) cis-1,2-dimetilciclobutano
d) trans-1,2-dimetilciclobutano

3 Proponha a estrutura para dois isômeros com a fórmula molecular C6H14 e


determine seus nomes sistemáticos.

4 Compare cada par de moléculas e determine qual tem maior ponto de


ebulição:

a)

b)

106
UNIDADE 2 TÓPICO 2

INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES
ORGÂNICAS

1 INTRODUÇÃO
Na Unidade 1 deste livro de estudos vimos alguns dos fundamentos
que regem a química orgânica, como os orbitais atômicos, a teoria da ligação
química, a hibridização que ocorre nos orbitais do carbono e os aspectos sobre
a ligação covalente. Também introduzimos os grupos funcionais orgânicos, e
tratamos dos aspectos mais importantes da química dos alcanos e cicloalcanos.
Apresentamos que os grupos funcionais determinam as propriedades químicas
de moléculas contendo um mesmo grupo funcional e, assim, vimos que os
alcanos e cicloalcanos, hidrocarbonetos saturados apresentam baixa reatividade,
sendo até chamados, anteriormente, de parafinas. No entanto, percebeu-se que a
maioria dos outros grupos funcionais sofrem reações químicas mais facilmente.
Por isso, vamos introduzir as ideias fundamentais nas quais se baseiam as
reações químicas das moléculas orgânicas (ou, de modo mais simples, as reações
orgânicas), a fim de que possamos estudar posteriormente os aspectos reativos
de cada grupo funcional.

2 REAÇÕES ORGÂNICAS
Uma reação química ocorre quando duas substâncias diferentes se
chocam com energia suficiente para quebrar alguma ligação específica entre os
átomos dessas substâncias, permitindo que esses átomos se rearranjem a fim de
formar uma nova ligação e, portanto, uma nova substância. Esse processo de
quebra e formação de ligações não é tão simples assim, pois existe um caminho
a ser percorrido e condições favoráveis que permitem a ocorrência da reação
química. Veremos nos subtópicos seguintes alguns dos fatores que influenciam
as reações orgânicas especificamente, mas, antes, precisamos nos familiarizar
com alguns pontos importantes.

2.1 TIPOS DE REAÇÕES ORGÂNICAS


As reações orgânicas podem ser classificadas em quatro tipos, a saber:

107
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

• Reações de adição: são aquelas em que os reagentes contrapõem entre si de


modo a formarem um único produto. Podemos citar como exemplos de reações
de adição muito comuns em química orgânica a hidrogenação (a adição de
hidrogênio), a halogenação (adição de halogêneos) e a hidratação (adição de
um hidrogênio e de um grupo hidroxila, –OH, a partir da reação com a água).
Veja a seguir exemplos de reações de adição.

FIGURA 29 – REAÇÕES DE ADIÇÃO

FONTE: A autora

É interessante saber que a reação de adição de hidrogenação é realizada


em óleos vegetais para a obtenção de gorduras vegetais hidrogenadas, sendo
esse o processo utilizado para a obtenção da margarina, por exemplo. Os óleos
vegetais e as gorduras vegetais hidrogenadas são moléculas orgânicas muito
longas (ou seja, são formadas por uma cadeia carbônica extensa e aberta) e se
diferenciam apenas pelo fato de que os óleos possuem algumas duplas ligações
entre os átomos de carbono na molécula, enquanto que as gorduras possuem
apenas ligações simples. Desse modo, para transformar um óleo em uma gordura
vegetal é preciso apenas submeter o óleo a uma reação de adição de hidrogenação,
fazendo com que suas ligações duplas reajam com os átomos de hidrogênio a
fim de gerar uma gordura vegetal hidrogenada com ligações simples (veja um
exemplo na figura a seguir).
108
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

FIGURA 30 – REAÇÃO DE ADIÇÃO DE HIDROGENAÇÃO DO ÁCIDO OLEICO

FONTE: A autora

A reação de adição de halogenação com o bromo também é muito


utilizada na indústria alimentícia, mas para testar a qualidade do óleo vegetal.
Como vimos na figura anterior, o Br2 reage com moléculas saturadas (isso é,
que contenham ligações duplas ou triplas entre os carbonos), assim, essa reação
pode ser realizada para identificar se o óleo vegetal sofreu alguma adulteração.
A solução de Br2 em água possui uma coloração castanha bem característica,
assim, se um determinado óleo for adicionado a essa solução e ela ficar incolor
significa que o Br2 reagiu com as duplas ligações do óleo, atestando a qualidade
do produto. No entanto, se a solução permanecer com cor castanha significa que
não houve reação de adição, pois não existem mais insaturações na molécula e o
óleo na verdade não é mais um óleo e sim uma gordura hidrogenada.

DICAS

Recomendamos a leitura dos textos A hidrogenação de óleos e gorduras


e suas aplicações industriais (PINHO; SUAREZ, 2013); e O que é uma gordura trans?
(MERÇON, 2010).

• Reações de eliminação: são aquelas em que um único reagente gera dois


produtos (geralmente um dos produtos é uma molécula orgânica, enquanto
que o outro é uma substância menor, como a água, ou H2, ou ácidos simples,
como o HBr ou HCl). Exemplos comuns de reações de eliminação são as reações
de desidratação de álcoois e ácidos carboxílicos, a eliminação de hidrogênios,
de halogênios e de haletos orgânicos. Veja na figura seguinte exemplos de
reações de eliminação.

109
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 31 – REAÇÕES DE ELIMINAÇÃO

FONTE: A autora

A reação de eliminação de hidrogênios do etano é uma prática bem


comum da indústria de plásticos (ou polímeros), pois é um método bem
eficiente para a obtenção do eteno, utilizado como molécula de partida para a
produção do polietileno. A obtenção industrial do polietileno se dá pela reação
de polimerização do eteno, que é um tipo de reação que origina os polímeros,
macromoléculas formadas pela repetição de muitas (de centenas a milhares)
unidades menores ­– no caso discutido aqui, o polietileno é o polímero e o eteno é
essa unidade menor. A reação de polimerização é iniciada pela quebra da ligação
110
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

dupla de uma molécula de eteno que pode, assim, reagir com outras moléculas
de eteno, gerando o polietileno (veja o esquema na Figura 33, à direita, tem-se
a representação comumente utilizada para representar um polímero: dentro do
colchetes, tem-se a estrutura da unidade menor que dá a origem ao polímero
(chamada de monômero) e a letra n ao lado do parênteses indica que a repetição
do monômero ocorre inúmeras vezes).

FIGURA 32 – Esquema para a reação de polimerização do polietileno

FONTE: A autora

Atualmente, o eteno é obtido predominantemente pelo beneficiamento do


petróleo. No entanto, devido ao petróleo ser uma fonte não renovável, existem
muitas linhas de pesquisa que visam propor novas rotas de produção, tanto
para o eteno, quanto para outros hidrocarbonetos (como o propano e o butano).
Uma dessas linhas se baseia na obtenção do eteno pela reação de desidratação do
etanol, que pode ser obtido, por sua vez, pela fermentação da sacarose da cana-
de-açúcar, uma fonte natural renovável.

DICAS

Para um melhor entendimento do que são plásticos e polímeros, recomendamos


a leitura dos seguintes textos: Polímeros sintéticos (WAN; GALEMBECK; GALEMBECK,
2001); Biodegradação: uma alternativa para minimizar os impactos decorrentes dos
resíduos plásticos (CANGEMI; SANTOS; CLARO NETO, 2005); e Polietileno: principais tipos,
propriedades e aplicações (COUTINHO; MELLO; SANTA MARIA, 2003).

• Reações de substituição: são aquelas em que os reagentes trocam átomos ou


pequenos grupos entre si para formar dois novos produtos. As principais
reações de substituição são a halogenação (ao menos um hidrogênio de uma
molécula orgânica é substituído por um halogênio), a nitração (um hidrogênio
da molécula orgânica é substituído pelo grupo nitro, –NO2) e a sulfonação
(um hidrogênio da molécula orgânica é substituído por um grupo sulfônico,
–SO3H). Veja na figura a seguir exemplos de reações de substituição.
111
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 33 – REAÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO

FONTE: A autora

Um exemplo de reação de substituição de nitração é para a produção da


nitroglicerina, um explosivo utilizado na dinamite, e obtido a partir da glicerina
(que é, por sua vez, uma molécula orgânica atóxica muito utilizada como emoliente
e umectante em cosméticos). A glicerina reage com o ácido nítrico (na presença do
ácido sulfúrico), fazendo com que os três hidrogênios do grupo –OH da glicerina
sejam substituídos por três grupos nitro, gerando então a nitroglicerina, um óleo
de cor amarelada – vale mencionar que o efeito explosivo da nitroglicerina vem
da liberação e da expansão dos gases N2, O2 e CO2, que são liberados no momento
em que a molécula sofre um choque ou é aquecida.

FIGURA 34 – REAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO DE NITRAÇÃO DA GLICERINA PARA A FORMAÇÃO


DA NITROGLICERINA

FONTE: A autora

112
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

Outra aplicação muito importante das reações de substituição é para a


preparação de diversos detergentes sulfonados. A primeira etapa da síntese do
decilsulfonato de sódio (um detergente) envolve uma reação de substituição de
sulfonação de um átomo de hidrogênio do decano, que é seguida por uma reação
de neutralização com hidróxido de sódio, gerando o detergente (um sal de cadeia
longa) como produto. Já a síntese do p-dodecilbenzeno (outro tipo de detergente)
envolve duas reações de substituição e posterior neutralização. A primeira reação
de substituição é uma reação de substituição de alquilação, ou seja, a substituição
de um hidrogênio do benzeno, no caso, por um grupo alquila, especificamente
o dodecil, –C12H23. A segunda substituição é a sulfonação do produto gerado na
etapa anterior, seguida pela neutralização pelo hidróxido de sódio.

FIGURA 35 – ETAPAS PARA A FORMAÇÃO DO DECILSULFONATO DE SÓDIO OBTIDO A


PARTIR DO DECANO

FONTE: A autora

FIGURA 36 – ETAPAS PARA A FORMAÇÃO DO P-DODECILBENZENO SULFONATO DE


SÓDIO OBTIDO A PARTIR DO BENZENO E DO 1-CLORODODECANO

FONTE: A autora

113
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

DICAS

Para um melhor entendimento da química dos detergentes e sabões,


recomendamos a leitura dos seguintes textos: As questões ambientais e a química dos
sabões e detergentes (RIBEIRO; MAIA; WARTHA, 2010); Xampus (BARBOSA; SILVA, 1995); e
Sabões e detergentes como tema organizador de aprendizagem no ensino médio (VERANI;
GONÇALVES; NASCIMENTO, 2000).

• Reações de rearranjo: são aquelas em que um único reagente origina um único


produto pelo rearranjo de um átomo ou um grupo (ou seja, o regente tem
alguma das suas ligações reorganizadas para formar um novo produto). Note
que o reagente e o produto são isômeros. Podemos citar como exemplos de
reações de rearranjo o rearranjo de Claisen e de Beckmann. Veja na figura a
seguir exemplos de reações de rearranjo.

FIGURA 37 – EXEMPLOS DE REAÇÕES DE REARRANJO

FONTE: A autora

DICAS

Deixamos como sugestão a leitura do texto Rearranjos de Claisen mais usados


em síntese orgânica: uma revisão (FREITAS et al., 2017).

114
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

3 CONSIDERAÇÕES SOBRE OS MECANISMOS


DE REAÇÃO QUÍMICA
Como exposto, em todas as reações químicas orgânicas há a quebra de
ao menos uma ligação covalente dos reagentes e, consequentemente, a formação
de ao menos uma nova ligação para a formação dos produtos. Esse processo de
quebra e de formação de novas ligações é consequência apenas do movimento
dos elétrons, que fluem da ligação que se quebra em direção à ligação que se
forma – lembrem-se de que a formação de ligação covalente nada mais é do que
o compartilhamento de um par de elétrons entre dois átomos.

Existem dois modos em que uma ligação covalente pode ser quebrada:
a quebra homolítica, em que ocorre uma quebra simétrica da ligação, ou seja,
após a quebra cada um dos átomos permanece com um dos elétrons do par
compartilhado; e a quebra heterolítica, aquela em que a quebra é assimétrica, ou
seja, apena um único átomo fica com o par de elétrons. Do mesmo modo, existem
duas maneiras em que uma ligação covalente nova pode se formar: de maneira
eletronicamente simétrica, em que cada átomo compartilha um elétron para a nova
ligação; e de maneira eletronicamente assimétrica, em que um átomo contribui
com dois elétrons, enquanto que o segundo átomo aceita esses dois elétrons. As
figuras a seguir mostram o fluxo de elétrons nas quebras homolítica e heterolítica
e nas formações de novas ligações simétrica e assimétrica, respectivamente (os
elétrons de cada ligação são mostrados de acordo com a representação de Lewis,
que estudamos na Unidade 1 deste livro de estudos, assim, cada pontinho nas
Figuras 38 e 39 indicam um elétron).

FIGURA 38 – MODOS EM QUE UMA LIGAÇÃO COVALENTE PODE SER QUEBRADA

FONTE: A autora

FIGURA 39 – MODOS QUE UMA LIGAÇÃO COVALENTE PODE SER FORMADA

FONTE: A autora

115
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

As reações químicas caracterizadas pela quebra homolítica de uma ligação (ou


seja, a quebra que ocorre nos reagentes) e a formação simétrica de uma nova ligação
(para a obtenção do produto) são chamadas de reações radicalares. Já as reações
que envolvem as quebras heterolíticas e a formação assimétrica de uma ligação são
denominadas de reações polares. Ambas as reações radicalares e polares ocorrem
para a formação de compostos orgânicos, no entanto, a grande maioria das reações
orgânicas são polares.

Antes de discutirmos um pouco sobre as reações polares, voltemos às figuras


anteriores. Podemos observar algumas setas curvas que servem para indicar o fluxo
dos elétrons durante uma reação química (ou seja, indica como o movimento dos
elétrons na quebra e na formação de novas ligações). De fato, essas setas curvas são
muito utilizadas para descrever o mecanismo de uma dada reação química, que é o
caminho pelo qual uma reação se processa. Até agora, a representação de uma reação
química foi feita através de uma equação química (que indica as fórmulas moleculares
dos reagentes seguida por uma flecha que mostra a formação dos produtos). No
entanto, uma reação química é na verdade seguida de várias etapas, ou seja, antes
dos reagentes se transformarem nos produtos propriamente ditos, algumas outras
transformações intermediárias podem acontecer. Sendo justamente isso que indica
um mecanismo de reação: ele descreve em detalhes as mudanças que ocorrem em
cada etapa de uma reação química, mostrando, por exemplo, quais ligações químicas
são quebradas e formadas, e a ordem na qual elas ocorrem (para isso são utilizadas as
setas curvas, para indicar o movimento dos elétrons durante a quebra e a formação de
cada ligação), além de indicar a estrutura das substâncias intermediárias (chamadas
de intermediários) até a obtenção do produto final. Para entendermos melhor,
analisaremos o mecanismo de reação de hidratação do propeno para a formação do
propanol. Essa reação, geralmente, ocorre em meio ácido, o que explica a presença
do cátion de hidrogênio (H+), uma vez que a dissociação de um ácido em solução
aquosa libera os cátions de hidrogênio e os ânions correspondentes (por exemplo, a
dissociação do ácido clorídrico, HCl, libera H+ e Cl- em solução).

FIGURA 40 – EQUAÇÃO QUÍMICA E MECANISMO DE REAÇÃO QUÍMICA PARA A


FORMAÇÃO DO 2-PROPANOL A PARTIR DA REAÇÃO DE HIDRATAÇÃO DO PROPENO

FONTE: A autora

116
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

Observando a figura anterior, vemos que a etapa 1 da reação de hidratação


do propeno se inicia quando a ligação p da dupla ligação do propeno doa um
par de elétrons para o cátion de hidrogênio (H+). A consequência dessa doação
de par de elétrons (também chamada de ataque) é que em um dos carbonos
participantes da antiga ligação C=C há a formação de uma nova ligação C–H,
enquanto que o outro carbono fica deficiente de elétrons (pois agora ele tem
apenas seis elétrons na sua camada de valência, diferentemente da ligação C=C,
em que ele tinha oito elétrons de valência), o que é indicado pela carga positiva
acima do átomo de carbono (C+) na estrutura do intermediário mostrado na etapa
2. Seguindo, o carbono positivo presente na estrutura do intermediário da etapa
2 é atacado por um par de elétrons do oxigênio da molécula de água (H2O), como
indicado pela seta curva. Esse ataque resulta no intermediário mostrado na etapa
3, o qual apresenta uma nova ligação C–OH2, completando a camada de valência
do carbono antes positivo, mas deixando, agora, o oxigênio deficiente em elétrons
(gerando a carga positiva, O+). A fim de restaurar a camada de valência do oxigênio
(deixando-a novamente com oito elétrons), o par de elétrons de uma ligação –OH
ataca o oxigênio positivo, quebrando essa ligação e liberando o H+ na solução.
Assim, na etapa 4, temos a formação do 2-propanol.

Explicamos que a seta curva mostra o movimento dos elétrons durante


a reação química. Voltando à figura acima, repare que na etapa 1, por exemplo,
a seta curva se inicia na dupla ligação C=C e vai em direção ao H+, e, na etapa 2,
ela sai do átomo de oxigênio e vai para o carbono positivo. Isso significa que, por
convenção, as setas curvas saem de um local rico em elétrons e vão para um local
pobre em elétrons.

3.1 REAÇÕES POLARES


Lembre-se da Unidade 1, na qual estudamos as ligações covalentes.
Vimos que, dependendo da diferença de eletronegatividade entre os átomos que
formam uma ligação, a ligação covalente pode ser apolar (quando os átomos da
ligação possuem eletronegatividade semelhante) ou polar (quando a diferença de
eletronegatividade é significante). Assim, uma ligação apolar indica que há uma
distribuição simétrica dos elétrons da ligação entre os dois átomos participantes da
ligação, enquanto que na ligação polar os elétrons da ligação estão concentrados
sobre o átomo mais eletronegativo da ligação, gerando uma carga parcial negativa
(d-) sobre ele e, consequentemente, uma carga parcial positiva (d+) sobre o átomo
menos eletronegativo. As ligações presentes nos grupos funcionais orgânicos são,
na sua grande maioria, polares.

117
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

TABELA 3 – POLARIDADE DAS LIGAÇÕES DE ALGUNS GRUPOS FUNCIONAIS ORGÂNICOS

Grupo Grupo
Polaridade da ligação Polaridade da ligação
funcional funcional

Álcool Nitrila
(polar) (polar)

Alceno e Ácido
alcino carboxílico
(apolares) (polar)

Haleto de
Aldeído
alquila
(polar)
(polar)

Amina Cetona
(polar) (polar)

Éter Éster
(polar) (polar)

FONTE: A autora

Estudamos que a maioria dos grupos funcionais apresentam ligações


polares, mas o que isso interfere na reatividade e nos mecanismos de reação dos
compostos orgânicos? Devemos lembrar que cargas opostas se atraem. Assim,
quando colocamos diferentes substâncias com diferentes polaridades para reagir,
elas se atraem devido às cargas parciais (a região com carga parcial positiva atrai
a região de carga parcial negativa, e vice-versa), o que facilita a reação (lembre-se
de que para uma reação química acontecer é necessário que ocorra um choque
efetivo entre os reagentes, tanto em orientação quanto em energia). Além disso,
a polaridade das ligações é especialmente importante para as reações orgânicas,
porque elas fazem com que uma região rica em elétrons (com carga parcial
negativa, d-) de uma molécula possa doar um par de elétrons para uma região
pobre em elétrons (com carga parcial positiva, d+) de outra molécula. Um exemplo
pode ser visto na figura a seguir, que traz a reação entre a amônia e o ácido
clorídrico para a formação do cloreto de amônio. A amônia é uma molécula polar,
cuja região rica em elétrons está próxima ao átomo de nitrogênio (isso porque
o nitrogênio é mais eletronegativo que o hidrogênio, fazendo com que apareça
uma carga parcial negativa, d-, no nitrogênio; e uma carga parcial positiva, d+,
nos hidrogênios), permitindo que o átomo de nitrogênio ataque (ou doe um par
de elétrons) o hidrogênio da molécula, também polar, de ácido clorídrico. O
nitrogênio da amônia ataca o hidrogênio do ácido clorídrico porque o átomo de
cloro é mais eletronegativo do que o hidrogênio, assim, o hidrogênio na molécula
de ácido clorídrico está pobre em elétrons (com carga parcial positiva, d+).
118
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

FIGURA 41 – REAÇÃO POLAR ENTRE A AMÔNIA E O ÁCIDO CLORÍDRICO PARA A


FORMAÇÃO DO CLORETO DE AMÔNIO

FONTE: A autora

Existe uma denominação própria para nos referirmos às espécies ricas em


elétrons e às pobres em elétrons que participam de uma reação química polar:
nucleófilos e eletrófilos, respectivamente. O sufixo “filo” deriva do grego philo,
que significa amar/gostar; assim, a denominação de “nucleófilo” remete a uma
espécie “que gosta de núcleos” (ou seja, é atraída por cargas positivas), enquanto
que “eletrófilo” significa uma espécie que “gosta de elétrons” (sendo atraída
por cargas negativas). Então, voltando à figura acima, vemos que o átomo de
nitrogênio da amônia é um nucleófilo (pois é rico em elétrons, sendo assim atraído
por uma carga positiva) e o hidrogênio do ácido clorídrico é um nucleófilo (já que
é pobre em elétrons, sendo atraído por uma carga negativa). Desse modo, uma
reação polar ocorre quando um nucleófilo doa um par de elétrons (ou ataca) para
um eletrófilo, gerando uma nova ligação química entre essas duas espécies.

Assim, quando analisamos uma reação química polar, precisamos


identificar o nucleófilo e o eletrófilo:

• Nucleófilo é um bom doador de elétrons, podendo ser, portanto:

a) Um ânion: é uma espécie negativamente carregada (ou seja, há um excesso de


elétrons em relação ao número de prótons), o que a caracteriza como uma boa
doadora de elétrons.
b) Um átomo com um par de elétrons isolados: o par de elétrons isolados de um
átomo possui alta energia e não participa de nenhuma ligação no nucleófilo,
podendo então facilmente ser doado em uma reação polar (veja o exemplo da
amônia na figura a seguir, pois é justamente o par de elétrons do átomo de
nitrogênio que ataca o eletrófilo).

119
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

c) Uma molécula com uma ligação dupla: lembre-se de que uma dupla ligação
é formada por uma ligação s e uma ligação p, assim, a ligação p se quebra e o
par de elétrons ataca o eletrófilo.
d) Um átomo muito eletronegativo ligado a um outro átomo pouco eletronegativo:
como vimos, o átomo muito eletronegativo atrai aos elétrons da ligação para
si, ficando com uma carga parcial negativa, d-; assim, esse átomo concentra o
par de elétrons da ligação sobre ele, doando-o para o eletrófilo.

Na figura a seguir, são apresentados exemplos de espécies que se


comportam como nucleófilos. Note que uma espécie genérica [Eletrófilo] é
indicada na figura a fim de mostrar como seria, de maneira geral, o mecanismo de
reação – com a seta curva “saindo” do nucleófilo e indo em direção ao eletrófilo
– e a estrutura do produto.

FIGURA 42 – EXEMPLOS DE ESPÉCIES QUE SE COMPORTAM COMO NUCLEÓFILOS

FONTE: A autora

• O eletrófilo é um bom receptor de elétrons, podendo ser:

a) Um cátion: um cátion é uma espécie positivamente carregada (ou seja, ela está
com falta de elétrons), o que a caracteriza como uma boa receptora de elétrons.
b) Uma molécula com um orbital p vazio: esse orbital p vazio pode facilmente
acomodar os elétrons doados pelo nucleófilo.
c) Um átomo ligado por dupla ligação com um elemento muito eletronegativo:
se a ligação p se quebra o átomo eletronegativo atrai para si os elétrons dessa
ligação, fazendo com que o outro átomo participante da ligação fique com
deficiência de elétrons, sendo, portanto, um bom receptor.
d) Um átomo pouco eletronegativo ligado a um outro átomo muito eletronegativo:
surge uma carga parcial positiva, d+, sobre o átomo menos eletronegativo,
fazendo com que ele seja um bom aceptor de elétrons.

Na figura seguinte são expostos exemplos de espécies que se comportam


como eletrófilos. Novamente, indicamos uma espécie genérica [Nucleófilo] na
figura a fim de mostrar como seria, de maneira geral, o mecanismo de reação e a
estrutura do produto.

120
TÓPICO 2 | INTRODUÇÃO ÀS REAÇÕES ORGÂNICAS

FIGURA 43 – EXEMPLOS DE ESPÉCIES QUE SE COMPORTAM COMO ELETRÓFILOS

FONTE: A autora

EXEMPLO – Determine o nucleófilo e o eletrófilo da reação entre a


trifenilfosfina e o iodometano:

P + CH3I P CH3 + I

Trifenilfosfina Iodometano

RESPOSTA: Analisando os reagentes, podemos perceber que o


átomo de fósforo na trifenilfosfina possui um par de elétrons isolados,
e o iodometano possui uma ligação C–I polar, com uma carga parcial
positiva sobre o átomo de carbono, uma vez que o carbono está ligado a
um elemento com eletronegatividade alta, o iodo. Assim, a trifenilfosfina
(devido ao átomo de fósforo) é o nucleófilo (já que o par de elétrons isolado
pode ser doado em uma reação polar), enquanto que o iodometano é o
eletrófilo, que aceita os elétrons do fósforo, formando uma ligação P–C,
ao passo que a ligação C­–I é quebrada. Já que identificamos o eletrófilo
e o nucleófilo e essa reação é relativamente simples, podemos ir além e
escrever o mecanismo para essa reação:

Algumas espécies neutras podem agir como um nucleófilo ou um


eletrófilo, dependendo da reação química. A molécula de água, por exemplo, pode
agir como um nucleófilo quando um dos pares isolados do oxigênio é doado; ou
pode agir como um eletrófilo quando um dos átomos de hidrogênio participa da
reação na forma de um íon H+, aceitando um par de elétrons de outra substância.
121
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:

• Em todas as reações químicas orgânicas há a quebra de pelo menos uma ligação


covalente dos reagentes e, consequentemente, a formação de pelo menos uma
nova ligação para a formação dos produtos.

• As reações orgânicas podem ser classificadas em quatro tipos: reações de


adição, de eliminação, de substituição e de rearranjo.

• As reações de adição são aquelas em que os reagentes reagem entre si de modo


a formarem um único produto.

• As reações de eliminação são aquelas em que um único reagente gera dois


produtos.

• As reações de substituição são aquelas em que os reagentes trocam átomos ou


pequenos grupos entre si para formar dois novos produtos.

• As reações de rearranjo são aquelas em que um único reagente origina um


único produto pelo rearranjo de um átomo ou um grupo.

• O processo de quebra e de formação de novas ligações é consequência do


movimento dos elétrons, que fluem da ligação que se quebra em direção à
ligação que se forma.

• As reações orgânicas são classificadas em reações radicalares (caracterizadas


pela quebra homolítica das ligações nos reagentes e a formação simétrica de
uma nova ligação (para a obtenção do produto) e polares (que são as reações
que envolvem quebras heterolítica das ligações dos reagentes e a formação
assimétrica das ligações dos produtos).

• Os passos pelo qual uma reação orgânica se processa são chamados de


mecanismo de reação.

• Um mecanismo de reação descreve em detalhes as mudanças que ocorrem em


cada etapa de uma reação química (mostrando as ligações químicas que são
quebradas e formadas, a ordem em que elas ocorrem e indica a estrutura das
substâncias intermediárias até a obtenção do produto final).

• As setas curvas utilizadas em um mecanismo de reação servem para indicar o


fluxo dos elétrons durante uma reação química (ou seja, indica o movimento
dos elétrons na quebra e na formação de novas ligações).

122
• O sentido das representações das setas curvas é de um local rico em elétrons
em direção a um local pobre em elétrons.

• Existe uma denominação própria para identificar as espécies ricas em


elétrons e as pobres em elétrons que participam de uma reação química polar:
nucleófilos (espécie “que gosta de núcleos”, ou seja, é atraída por cargas
positivas), e eletrófilos (espécie que “gosta de elétrons”, ou seja, é atraída por
cargas negativas), respectivamente.

• Um nucleófilo é um bom doador de elétrons, podendo ser um ânion, um


átomo com pelo menos um par de elétrons isolados, uma molécula com uma
ligação dupla ou um átomo muito eletronegativo ligado a um outro átomo
pouco eletronegativo.

• Um eletrófilo é um bom receptor de elétrons, podendo ser um cátion, uma


molécula com um orbital p vazio, um átomo ligado por dupla ligação com um
elemento muito eletronegativo e um átomo pouco eletronegativo ligado a um
outro átomo muito eletronegativo.

123
AUTOATIVIDADE

1 Classifique as reações como reação de adição, de eliminação, de substituição


ou de rearranjo:

a)
b)
c)

2 Qual é a estrutura esperada para o produto (ou produtos) nas seguintes


reações?

a) Desidratação do etanol:

b) Reação entre o metano e o iodo (I2) (seguindo uma reação de substituição


de halogenação):

3 A reação de neutralização com o hidróxido de sódio para a obtenção de


detergentes (exemplo abaixo) pode ser classificada como?

4 Determine se as substâncias abaixo se comportam como nucleófilos ou


eletrófilos:

a) +NO2
b) -C≡N
c) CH3S-
d) CH3NH2

124
5 Determine o sentido da seta curva nos reagentes para a formação dos
produtos nas seguintes reações:

a)

b)

125
126
UNIDADE 2 TÓPICO 3

HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

1 INTRODUÇÃO
No Tópico 1 dessa Unidade, iniciamos nossos estudos sobre os
hidrocarbonetos, estudando os alcanos e os cicloalcanos, que são, na realidade,
os hidrocarbonetos mais simples. Agora, ampliaremos nosso conhecimento sobre
os hidrocarbonetos e estudaremos o grupo funcional dos alcenos.

Veremos que os alcenos, também formados apenas por átomos de carbonos


e hidrogênio (sendo por isso classificados como hidrocarbonetos), possuem uma
especificidade: ter pelo menos uma ligação dupla entre os carbonos (C=C), o que
os torna compostos ditos insaturados (enquanto que os alcanos e cicloalcanos são
denominados compostos saturados).

Como fizemos com os alcanos, estudaremos a estrutura dos alcenos, as


regras de nomenclatura sistemática para eles, e suas propriedades físicas gerais.
No entanto, veremos que os alcenos, diferentemente dos alcanos, são reativos. Por
isso, também estudaremos algumas das reações típicas relacionadas aos alcenos.

2 ALCENOS
Os alcenos, assim como os alcanos, integram a classe de hidrocarbonetos,
pois são formados apenas por átomos de carbono e de hidrogênio. A cadeia
carbônica de um alceno contém pelo menos uma ligação dupla C=C, além das
ligações simples C–C e H–H, fazendo com que os alcenos sejam classificados
como compostos insaturados. Dessa forma, na estrutura de um alceno existem
carbonos com hibridização sp3, que são os que possuem ligações simples s,
assim como carbonos com hibridização sp2, que são aqueles que participam das
duplas ligações C=C (lembre-se dos conceitos já estudados: uma dupla ligação é
resultado da sobreposição frontal entre os orbitais sp2 dos carbonos, formando
uma ligação s, e da superposição lateral dos orbitais p não hibridizados, formando
uma ligação p). É importante expor que os alcenos são moléculas apolares, pois
as eletronegatividades do carbono e do hidrogênio são semelhantes, tornando
a ligação C–H apolar (ou seja, os elétrons da ligação C–H são compartilhados
igualmente pelos átomos), não havendo polaridade sobre a molécula.

127
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

Devido às duplas ligações, os alcenos possuem menor quantidade de


hidrogênios em sua estrutura se comparado aos alcanos. Assim, a fórmula geral
dos alcenos é CnH2n, em que n pode ser qualquer número inteiro. O eteno (também
chamado de etileno) é o alceno mais simples, sendo constituído por dois átomos
de carbono e quatro átomos de hidrogênio. Na tabela a seguir são apresentadas as
fórmulas moleculares e as estruturas condensadas para alguns dos alcenos mais
simples (contendo apenas uma ligação C=C).

TABELA 4 – ALCENOS MAIS SIMPLES DE CADEIA LINEAR

Fórmula
na Nome Estrutura condensada
molecular
2 C2H4 Eteno H2C=CH2
3 C3H6 Propeno CH3CH=CH2
4 C4H8 1-buteno CH2=CHCH2CH3
4 C4H8 2-buteno CH3CH=CHCH3
5 C5H10 1-penteno CH2=CHCH2CH2CH3
5 C5H10 2-penteno CH3CH=CHCH2CH3
6 C6H12 1-hexeno CH2=CHCH2 CH2CH2CH3
a
n = número de carbonos
FONTE: A autora

Podemos perceber que os alcenos de cadeia maior (a partir de quatro


carbonos) apresentam isomeria, como são os casos do 1-buteno e do 2-buteno, que
diferem entre si apenas pela posição da dupla ligação na cadeia carbônica. Isso
nos permite afirmar que os alcenos possuem isomeria de posição de insaturação.
Veremos mais adiante um caso de isomeria dos alcenos que engloba a isomeria de
posição de insaturação, mas por enquanto é importante nos atentarmos ao fato de
que a dupla ligação pode existir em qualquer posição da cadeia carbônica.

2.1 NOMENCLATURA DOS ALCENOS


As mesmas regras usadas para a nomenclatura dos alcanos são estendidas
para a nomenclatura dos alcanos, porém, agora utilizaremos o sufixo- eno, que
é o sufixo usado para identificar o grupo funcional dos alcenos. Assim, para
determinarmos o nome sistemático de um alceno, devemos continuar seguindo a
ordem mostrada na figura a seguir.

128
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

FIGURA 44 – ORDEM A SER SEGUIDA PARA NOMEAR UM COMPOSTO DE ACORDO COM AS


REGRAS DA NOMENCLATURA SISTEMÁTICA DA IUPAC

FONTE: A autora

Como exposto, as regras são sempre as mesmas, mas algumas considerações


específicas para a nomenclatura dos alcenos devem ser feitas:

• Etapa 1: identificar a cadeia principal

A cadeia principal é definida pela cadeia de carbono mais longa (ou seja,
que contém maior número de átomos de carbono ligados entre si) que contenha
as ligações duplas C=C.

FIGURA 45 – IDENTIFICAÇÃO DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

• Etapa 2: enumerar os átomos presentes na cadeia principal

Para enumerar os átomos da cadeia principal, devemos começar pelo


átomo de carbono presente na extremidade da cadeia que esteja mais próximo a
uma dupla ligação C=C.

129
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 46 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

• Etapa 3: identificar e enumerar os substituintes

Devemos identificar os números dos carbonos da cadeia principal em


que cada um dos substituintes está ligado, de modo que possamos localizar esse
substituinte. Se houver dois substituintes ligados a um mesmo carbono da cadeia
principal, esses substituintes serão identificados pelo mesmo número, sendo que
os localizadores devem ser designados no nome da molécula.

FIGURA 47 – IDENTIFICAÇÃO E ENUMERAÇÃO DOS SUBSTITUINTES

FONTE: A autora

• Etapa 4: escrever o nome do composto em uma única palavra

Devemos nomear o composto seguindo a ordem: localizador ­– prefixo –


cadeia principal – sufixo. Lembrando que os localizadores são usados para indicar
a localização dos substituintes e o prefixo indica o nome do substituinte. Para
separar diferentes localizadores, usamos vírgulas, e para separar os diferentes
prefixos usamos hifens.

No caso em que haja mais de um substituinte igual na molécula, devemos


indicar usando os prefixos multiplicadores di­- (dois substituintes iguais), tri-
(três), tetra- (quatro) e assim por diante. Já no caso de substituintes diferentes na
cadeia carbônica, devemos citá-los em ordem alfabética, no entanto, os prefixos
multiplicados (di-, tri-, tetra-) são ignorados quando os substituintes são postos
em ordem alfabética.

130
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

Para recordar, a cadeia principal é nomeada de acordo com o número


de átomos que ela é formada e o sufixo indica o grupo funcional (-eno para os
alcenos). É importante lembrar que a posição da dupla ligação na molécula deve
ser indicada (lembre-se dos isômeros 1-buteno e 2-buteno, por exemplo); assim,
as localizações das ligações duplas aparecem antes do nome da cadeia principal
e são dadas indicando o número do primeiro carbono que faz parte da ligação.

FIGURA 48 – EXEMPLOS DE NOMENCLATURA DE ALCENOS

FONTE: A autora

EXEMPLO ­– Desenhe as estruturas dos seguintes alcenos:


a) 3-etil-2,2-dimetil-3-hepteno
b) 2,3,3-trimetil-1,4,6-octatrieno

RESPOSTAS

a) O primeiro passo para desenhar uma estrutura a partir do seu nome


sistemático é identificar a cadeia principal. Assim, definimos, portanto, que
a cadeia principal dessa molécula contém sete átomos de carbono (já que é o
prefixo usado para a cadeia principal é o hept-), se trata de alceno, pois o sufixo
característico do grupo funcional é -eno e o localizador precedente ao nome da
cadeia principal indica que a ligação dupla C=C é entre os carbonos três e quatro.
Dessa forma, a cadeia principal é:

131
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

Agora, precisamos adicionar os substituintes e adequar o número de


hidrogênios ligados aos carbonos da cadeia principal (já que na etapa anterior nós
apenas definimos a cadeia principal e ignoramos os substituintes). Pelo nome do
composto, vemos que existe um substituinte etila ligado ao carbono 3 da cadeia
principal e dois substituintes metila ligados ao carbono 2. Assim, temos que a
estrutura do 3-etil-2,2-dimetil-3-hepteno é:

b) Como no exercício anterior, a primeira etapa consiste em determinar


a cadeia principal do composto. Assim, a cadeia principal do 2,3,3-trimetil-1,4,6-
octatrieno contém oito átomos de carbono (devido ao prefixo octa-) e indica
que se trata de alceno (devido ao sufixo -eno). No entanto, percebemos que,
diferentemente do composto do exercício anterior, agora existem três localizadores
antes do nome da cadeia (1, 4 e 6) e existe um sufixo tri- antes do nome do grupo
funcional (trieno); na verdade, os localizadores 1, 4 e 6 dizem que essa molécula
contém três ligações duplas, o que é enfatizado pelo sufixo tri-. Levando isso em
conta, temos que a cadeia principal é:

A segunda etapa é adicionar os substituintes e adequar o número de


hidrogênios ligados aos carbonos da cadeia principal. Assim, o 2,3,3-trimetil-1,4,6-
octatrieno tem três substituintes metilas, um ligado ao carbono 2 e outros dois
ligados ao carbono 3. Dessa forma, a estrutura do 2,3,3-trimetil-1,4,6-octatrieno é:

132
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

3 ESTEREOQUÍMICA DOS ALCENOS


Lembre-se de que a estereoquímica é a área da química que estuda a
organização tridimensional das substâncias, ou seja, o modo como os átomos de
uma substância estão arranjados no espaço.

3.1 ISOMERIA CIS-TRANS NOS ALCENOS


Na Unidade 1, estudamos que a rotação em torno da ligação C–C dos
alcanos é livre. Essa livre rotação faz com que existam diferentes conformações
para os alcanos. No entanto, essa livre rotação não ocorre para as ligações duplas
C=C. Para entendermos o porquê precisamos relembrar como é feita uma ligação
dupla: quando analisamos a estrutura do eteno, vimos que a ligação C=C era
formada tanto pela sobreposição frontal dos orbitais híbrido sp2 (gerando
uma ligação covalente s), quanto pela superposição lateral dos orbitais p não
hibridizados (gerando uma ligação covalente p). Assim, uma ligação dupla C=C é
o resultado de uma ligação s e de uma ligação p.

E
IMPORTANT

É válido voltar à Unidade 1 para relembrar o conteúdo.

FIGURA 49 – SOBREPOSIÇÃO DOS ORBITAIS DE DOIS ÁTOMOS DE CARBONO COM HIBRIDIZAÇÃO


SP2 PARA A FORMAÇÃO DA LIGAÇÃO DUPLA C=C

FONTE: A autora

133
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

Dessa forma, como a formação da ligação p se dá pela superposição


paralela dos orbitais p não hibridizados, qualquer rotação em torno da ligação
C=C faria com que tal ligação p fosse quebrada (já que mudaria a posição dos
orbitais p e eles não estariam mais paralelos entre si, como mostrado no esquema
da figura a seguir).

FIGURA 50 – A ROTAÇÃO EM TORNO DA LIGAÇÃO DUPLA C=C LEVARIA À RUPTURA DA


LIGAÇÃO ∏

FONTE: A autora

Assim, a ausência da rotação em torno da ligação dupla C=C faz com


que os alcenos apresentem estereoisomeria (ou seja, as moléculas apresentam as
mesmas ligações químicas, porém geometrias diferentes). Por exemplo, existem
dois estereoisômeros do 2-buteno: um em que os hidrogênios (da ligação
C–H) estão ligados no mesmo lado em relação à ligação dupla C=C (chamado
de estereoisômero cis), e outro em que os hidrogênios estão ligados em lados
opostos da ligação dupla C=C (chamado de estereoisômero trans). O mesmo
ocorre para o 2-penteno e para diversos outros alcenos, mas o estereoisômero cis é
sempre aquele em que os hidrogênios estão do mesmo lado em relação à ligação
dupla C=C e o isômero trans é aquele em que os hidrogênios estão posicionados
em lados opostos. Na figura a seguir é apresentado os estereoisômeros cis e
trans para o 2-buteno e o 2-penteno. Repare como realmente as geometrias dos
compostos são diferentes.

134
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

FIGURA 51 – ESTEREOISÔMEROS CIS E TRANS DO 2-BUTENO E DO 2-PENTENO

FONTE: A autora

3.1.1 Nomenclatura E, Z
A nomenclatura cis-trans funciona muito bem para os alcenos não
substituídos (ou seja, que não contém ramificações/substituintes) ou que contém
apenas uma ligação dupla, pois nesses casos os carbonos que participam da
ligação dupla C=C também se ligam ao hidrogênio. No entanto, como você
classificaria os estereoisômeros 1 e 2 do 1-bromo-2-cloropropeno de acordo com
a nomenclatura cis-trans?

Analisando as estruturas dos estereoisômeros 1 e 2, vemos que não


existem dois grupos iguais ligados aos carbonos da ligação dupla C=C nos
isômeros do 1-bromo-2-cloropropeno. Dessa forma, não conseguimos definir os
estereoisômeros cis e trans.

Assim, uma nova metodologia de nomenclatura deve ser empregada para


os alcenos substituídos ou com mais de uma ligação dupla: a nomenclatura E,
Z. A nomenclatura E, Z se baseia nas prioridades relativas dos grupos ligados
135
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

aos carbonos da ligação dupla C=C e essa prioridade relativa é determinada de


acordo com o número atômico dos átomos ligados à ligação dupla (o átomo de
maior número atômico é prioritário em relação ao de menor número atômico).
Por fim, se os grupos de maior prioridade estiverem no mesmo lado da ligação
dupla C=C, o estereoisômero é classificado como Z (essa denominação Z vem
da palavra alemã zusammen, que significa “junto”); caso os grupos de maior
prioridade estejam em lados opostos da ligação dupla C=C, o estereoisômero é
classificado como E (E vem da palavra alemã entgegen, que significa “oposto”).
Na figura a seguir é mostrado o esquema para a nomenclatura E, Z.

FIGURA 52 – ESTEREOISÔMEROS E, Z

FONTE: A autora

Voltando aos estereoisômeros 1 e 2 do 1-bromo-2-cloropropeno, podemos


definir suas nomenclaturas E, Z. Primeiro, para o estereoisômero 1, vemos que um
dos carbonos da ligação dupla C=C está ligado ao bromo e ao hidrogênio, assim, o
primeiro passo é determinar qual desses dois grupos tem maior prioridade: como
o número atômico do bromo é 35, maior que o do hidrogênio (Z=1), o bromo
tem maior prioridade relativa. O outro carbono da ligação dupla C=C está ligado
ao cloro (Z=17) e ao carbono (Z=6), sendo que o cloro possui maior prioridade.
Assim, no estereoisômero 1, os grupos de maior prioridade estão do mesmo lado,
o que o define como o estereoisômero Z.

De outro modo, o estereoisômero 2 tem os grupos de maior prioridade


de lados opostos, o que o classifica como o estereoisômero E. Na figura a seguir
podemos observar as prioridades relativas de cada um dos grupos unidos à
ligação dupla C=C.

136
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

FIGURA 53 – DEFINIÇÃO DOS ESTEREOISÔMEROS E, Z DO 1-BROMO-2-CLOROPROPENO

FONTE: A autora

Para os casos em que dois ou mais grupos ligados aos carbonos da ligação
dupla C=C se iniciem com o mesmo átomo, devemos observar os outros átomos
(em sequência) desses grupos para, assim, definir a prioridade relativa entre eles.
Para ficar claro, vamos determinar se a molécula mostrada a seguir se trata do
estereoisômero Z ou E:

Analisando a estrutura da molécula, vemos que existe um hidrogênio e


um grupo –CH3 ligados ao carbono à direita da ligação dupla C=C. Dessa forma,
definimos que o grupo –CH3 é o grupo de maior prioridade, pois o carbono (que
é o primeiro átomo do grupo –CH3 ligado ao carbono da ligação dupla C=C) tem
maior número atômico (Z=6) do que o hidrogênio (Z=1). Já, o outro carbono da
ligação dupla C=C está ligado a um grupo –CH(CH3)2 e um grupo –CH2OH. Nesse
caso, não podemos definir a prioridade desses grupos analisando o primeiro
átomo ligado ao carbono da ligação dupla C=C, pois em ambos os casos o átomo
é o mesmo (um carbono). Assim, devemos analisar o próximo átomo na ligação
de cada um desses grupos: para o –CH(CH3)2, temos um outro átomo de carbono
(Z=6), mas para –CH2OH temos um átomo de oxigênio (Z=8), o que indica que o
grupo –CH2OH tem maior prioridade. Portanto, como os dois grupos de maior
prioridade relativa estão do mesmo lado, temos que esse é o estereoisômero Z
(observe a Figura 54).

137
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 54 – DETERMINAÇÃO DOS GRUPOS DE MAIOR PRIORIDADE RELATIVA

FONTE: A autora

ATENCAO

Lembre-se do que você aprendeu na química geral: o número atômico, cujo


símbolo é Z, indica o número de prótons do núcleo de um determinado elemento químico.

4 PROPRIEDADES DOS ALCENOS


Apesar do grupo funcional C=C, muitas das propriedades físicas dos
alcenos são semelhantes às dos alcanos, justamente porque os alcenos também
são moléculas apolares (uma vez que não existe diferença significativa entre as
eletronegatividades do carbono e do hidrogênio, fazendo com que as ligações
C­–H sejam consideradas apolares).

138
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

Dessa forma, os pontos de ebulição dos alcenos tendem a aumentar


à medida que a cadeia carbônica aumenta (do mesmo modo que acontece
para os alcanos). Lembre-se de que isso ocorre porque os alcenos, por serem
moléculas apolares, interagem entre si por forças de dispersão, assim, as forças
de dispersão aumentam com o avanço da cadeia carbônica, pois a área de
contato entre as moléculas aumenta, aumentando os sítios de interação. Desse
modo, os alcenos de cadeias maiores apresentam forças intermoleculares
de dispersão mais fortes do que os alcenos de cadeia menor, fazendo com
que, consequentemente, seja necessária uma maior energia para permitir que
essas moléculas maiores passem da fase líquida para a gasosa. Vale lembrar
que do mesmo modo que para os alcanos, a presença de ramificações nos
alcenos também leva à diminuição da temperatura de ebulição do composto.
A tendência que mostra esse aumento da temperatura de ebulição com o
aumento da cadeia pode ser vista na figura a seguir.

FIGURA 55 – TEMPERATURA DE EBULIÇÃO DE ALCENOS DE CADEIA


LINEAR EM FUNÇÃO DO TAMANHO DA CADEIA CARBÔNICA

FONTE: A autora

A obtenção industrial do eteno, propeno e buteno vem, principalmente,


do craqueamento dos alcanos mais simples (até oito átomos de carbono) obtidos
no petróleo. É importante salientar que o eteno e o propeno são, na verdade,
os compostos orgânicos com maior produção industrial mundial. Isso porque
eles são essenciais como material de partida para a produção de uma quantidade
significativa de outras substâncias. As figuras a seguir mostram alguns exemplos
de substâncias obtidas a partir do eteno e do propeno, respectivamente.

139
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

FIGURA 56 – EXEMPLOS DE SUBSTÂNCIAS OBTIDAS A PARTIR DO ETENO NA INDÚSTRIA

FONTE: A autora

FIGURA 57 – EXEMPLOS DE SUBSTÂNCIAS OBTIDAS A PARTIR DO PROPENO NA INDÚSTRIA

FONTE: A autora

É interessante saber que os alcenos ocorrem abundantemente na natureza


e desempenham os mais diferentes papéis nos processos biológicos. O eteno, por
exemplo, funciona como um hormônio em plantas, controlando seu crescimento.
Muitos dos feromônios liberados por insetos também são alcenos, como o cis-9-
tricoseno produzido pela mosca doméstica, o multifideno liberado pela fêmea
de uma espécie de alga marrom e o (Z)-1,8-heptadecadieno produzido por
uma espécie de besouro. Os alcenos também são responsáveis por compostos
que dão a cor característica de alguns alimentos, como betacaroteno, molécula

140
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

presente em grande quantidade na cenoura, beterraba e abóbora, e o licopeno


que dá a cor avermelhada ao tomate, à melancia e à goiaba. Além disso, muitas
das fragrâncias produzidas por diversas plantas pertencem ao grupo dos alcenos,
como a (Z)-jasmona (responsável pelo cheiro característico do óleo de jasmim), o
limoneno (encontrado nos óleos essenciais do limão e da laranja) e o filandreno
(componente do óleo de eucalipto). Na figura a seguir estão representadas as
estruturas para essas moléculas.

FIGURA 58 – EXEMPLOS DE ALCENOS ENCONTRADOS NA NATUREZA

FONTE: A autora

DICAS

Para ler mais exemplos de alcenos encontrados na natureza, recomendamos a


leitura do texto Terpenos, aromas e a química dos compostos naturais (FELIPE; BICAS, 2017).

4.1 REATIVIDADE DOS ALCENOS


Quando estudamos os alcanos, vimos que esses compostos possuem baixa
reatividade. Essa baixa reatividade vem do fato de que as ligações simples C–C e
C–H (ligações s) são fortes, o que significa que os elétrons estão fortemente presos
entre os núcleos dos átomos dessas ligações e, por isso, pouco acessíveis para a
reação com outras moléculas (lembre-se de que, como visto no Tópico 2, as reações
químicas ocorrem pela quebra das ligações dos reagentes para que novas ligações
sejam formadas nos produtos, e que essa quebra e formação de nova ligação se
deve justamente ao fluxo de elétrons do nucleófilo em direção ao eletrófilo).

De outro modo, por possuírem ligações duplas C=C, os alcenos são


moléculas bastante reativas. Isso porque as ligações p são mais fracas que as

141
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

ligações s e, assim, os elétrons da ligação p não estão muito protegidos, podendo,


portanto, reagir facilmente com outras moléculas – lembre-se de que uma ligação
dupla é uma ligação covalente e é o resultado de uma ligação s e de uma ligação
p. Como as ligações duplas são ricas em elétrons porque possuem quatro elétrons
(devido ao compartilhamento de dois pares de elétrons para a formação da
ligação covalente), podemos inferir que, em uma reação química, a ligação dupla
dos alcenos se comporta como um nucleófilo, doando um par de elétrons (que
vem da ligação p) a um eletrófilo. Dessa forma, como a maioria das reações dos
alcenos envolve o ataque da dupla ligação (o nucleófilo) a um eletrófilo para
formar um único componente contendo apenas ligações simples C–C, as reações
dos alcenos são, portanto, reações de adição. Alguns exemplos de reações de
adição de alcenos são:

• Halidrificação: é a reação entre um alceno e um ácido halogenado (ácido


clorídrico, HCl, ácido bromídrico, HBr, ou ácido iodídrico, HI) para a formação
de um haleto de alquila (cujo grupo funcional é a ligação C–X, em que X é um
halogênio).

Geralmente, a reação de halidrificação ocorre com a passagem do ácido


halogenado anidro (ou seja, sem a presença de água) na fase gasosa através de
um recipiente contendo o alceno. A seguir é demostrado o mecanismo de reação
para a halidrificação do propeno pelo ácido bromídrico.

FIGURA 59 – MECANISMO DE REAÇÃO DE HALIDRIFICAÇÃO DO PROPENO COM O ÁCIDO


CLORÍDRICO

FONTE: A autora

A reação de halidrificação se inicia com o ataque do par de elétrons da


ligação p da ligação dupla C=C (nucleófilo) ao hidrogênio do HBr (o hidrogênio
possui carga parcial positiva, d+, por estar ligado ao bromo, que é muito

142
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

eletronegativo, e por isso pode aceitar facilmente o par de elétrons doado pela
ligação p do propeno). Esse ataque nucleófilo faz com que a ligação p se quebre,
formando uma nova ligação s C–H e gerando um intermediário carbocátion
(um carbocátion nada mais é do que um cátion de carbono, ou seja, uma espécie
intermediária que possui um átomo de carbono deficiente em elétrons, e,
portanto, positivo). O átomo de carbono positivo do carbocátion é então atacado
pelo brometo, resultando em uma ligação C–Br para a obtenção do produto final,
o 2-bromopropano.

• Halogenação: é a reação entre um alceno e o Br2 ou o Cl2 para a formação de


1,2-dialeto.

Geralmente, a reação de halogenação ocorre à temperatura ambiente e


é relativamente rápida, sendo esse o modo mais utilizado para a produção de
dialetos. A figura a seguir apresenta o mecanismo de reação da halogenação do
propeno com o Cl2.

FIGURA 60 – MECANISMO DE REAÇÃO DE HALOGENAÇÃO DO PROPENO COM O CLORO

FONTE: A autora

A reação de halidrificação se inicia com o ataque do par de elétrons


da ligação p da ligação dupla C=C (nucleófilo) a um dos átomos de cloro do
Cl2. É importante expor que a molécula de Cl2 é apolar (assim como a de Br2)
e, portanto, inicialmente, ambos os átomos da molécula possuem a mesma
densidade eletrônica (ou seja, não existem cargas parciais positivas ou negativas).
No entanto, quando o Cl2 se aproxima do propeno para a reação, há a formação
de um dipolo induzido na molécula de cloro devido à influência da ligação dupla
C=C rica em elétrons, que tende a repelir os elétrons da ligação Cl–Cl, fazendo com
que o átomo de cloro que esteja mais próximo à ligação dupla do propeno fique

143
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

relativamente mais positivo (ou seja, com uma carga parcial positiva), enquanto
que o outro átomo de cloro, mais afastado, tenha uma carga parcial negativa.
Portanto, voltando ao mecanismo da reação, o ataque nucleófilo da ligação dupla
C=C faz com que a ligação p se quebre, formando uma nova ligação s C–Cl e
gerando um intermediário carbocátion. Assim, o átomo de carbono positivo do
carbocátion é atacado pelo cloreto, resultando em uma outra ligação C–Cl para a
obtenção do 1,2-dicloropropano.

• Hidratação: é a reação entre um alceno e a água para a formação de álcoois.


Geralmente, na indústria, a reação de hidratação é catalisada por ácidos e
ocorre a temperatura relativamente alta (cerca de 250 ºC). A figura a seguir
expõe o mecanismo de reação da hidratação do propeno com a água utilizando
o ácido fosfórico como catalisador.

FIGURA 61 – MECANISMO DE REAÇÃO DE HIDRATAÇÃO DO PROPENO COM A ÁGUA EM


MEIO ÁCIDO

FONTE: A autora

A reação de hidratação se inicia com o ataque do par de elétrons da ligação


p da ligação dupla C=C (nucleófilo) a um H+ (proveniente do ácido fosfórico). Esse
ataque nucleófilo faz com que a ligação p se quebre, formando uma nova ligação
s C–H e gerando um intermediário carbocátion. Assim, o átomo de carbono
positivo do carbocátion é atacado por um par de elétrons isolados do átomo de
oxigênio da água, resultando em uma ligação C–OH2, na qual o oxigênio fica
144
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

com uma carga positiva. Assim, o íon dihidrogenofosfato ataca um átomo de


hidrogênio da ligação C–OH2, o que faz com que uma ligação O–H se quebre,
regenerando o ácido fosfórico e formando o 2-propanol.

É válido expor que o catalisador é uma substância usada para diminuir a


energia de ativação necessária para que a reação ocorra. Porém, o catalisador não
é consumido na reação, ou seja, ele entra como reagente da reação, mas também
sai como produto. Isso é possível de ocorrer porque:

• Hidrogenação: é a reação entre um alceno e o gás hidrogênio para a formação


de alcanos.

A reação de hidrogenação de alcenos ocorre sob a presença de um


catalisador metálico (como o paládio, a platina e o níquel), que diminui a energia
de ativação para a quebra da ligação H–H. O uso do catalisador é essencial,
pois a ligação H–H é muito forte e, sem a presença de um catalisador, a barreira
energética para a reação seria muito alta, o que impediria a reação de ocorrer. A
figura a seguir apresenta o esquema para a reação de hidrogenação do eteno na
presença de um catalisador metálico.

FIGURA 62 – ESQUEMA DE REAÇÃO DE HIDRATAÇÃO DO ETENO COM O GÁS HIDROGÊNIO


SOB A AÇÃO DE UM CATALISADOR METÁLICO

FONTE: A autora

Os detalhes do mecanismo da hidrogenação de alcenos ainda não são


completamente compreendidos. Na figura anterior, vemos que a primeira etapa
da reação consiste na adsorção do gás hidrogênio e do alceno na superfície do
145
UNIDADE 2 | GRUPOS FUNCIONAIS I: ALCANOS E ALCENOS

catalisador metálico. Isso permite que o gás hidrogênio se dissocie em dois


átomos de hidrogênio e que a ligação dupla C=C do alceno seja rompida devido
às interações com o metal. Assim, é possível que o alceno com a ligação p rompida
reaja com os átomos de hidrogênio dissociados, formando duas novas ligações
C–H e originando o alcano.

LEITURA COMPLEMENTAR

COMO AS FRUTAS FICAM MADURAS? PERGUNTE AO ETILENO

Este fito-hormônio gasoso desconecta genes antimaturação, permitindo


que a fruta amadureça e se torne saborosa

Mandy Kendrick
Um cacho de bananas pendurado
na bananeira ou na banca de frutas do
supermercado, geralmente, está verde, bem
duro e nada saboroso. Com o passar do
tempo, as frutas se tornam macias e doces.
O que as faz amadurecer é uma substância
química natural que, na forma sintética,
é usada para produzir canos e sacolas
plásticas de PVC (cloreto de polivinil) – um
fito-hormônio gasoso chamado etileno.

Durante milhares de anos se


utilizaram várias técnicas para incrementar
Amadurecimento natural: O fito-
a produção do etileno, mesmo sem saber
-hormônio etileno é o agente res-
da sua existência. Antigos colhedores de ponsável pelo processo de ama-
frutas egípcios abriam os figos com um durecimento das frutas (Crédito:
corte para acelerar o amadurecimento, e HPUSCHMANN/ISTOCKPHOTO).
fazendeiros chineses colocavam peras em
salas fechadas onde queimavam incenso. Pesquisas revelaram mais tarde que
cortes e temperaturas elevadas estimulam a produção de etileno nas plantas.

Em 1901, o cientista russo Dimitry Neljubow notou que as plantas ao redor


de um gasoduto apresentavam um crescimento anormal. Ao analisar a causa,
verificou que um vazamento da tubulação liberava vapores de um composto
identificado como etileno. Três décadas depois, pesquisadores descobriram que
as plantas não apenas reagem ao etileno como também podem produzi-lo: ao
talhar a fruta com uma faca, a produção do gás aumentava.

Posteriormente, descobriu-se que as plantas produzem etileno em diversos


tecidos em resposta a estímulos além do estresse decorrente do calor e cortes. Isso
acontece durante certas condições de desenvolvimento para orientar a germinação

146
TÓPICO 3 | HIDROCARBONETOS II: ALCENOS

das sementes, a mudança de cor das folhas e o fenecimento das pétalas das flores.
Por se difundir facilmente, o gás pode se deslocar através da planta de célula
para célula bem como para plantas vizinhas, servindo como um sinal de alerta de
perigo próximo e de ativação de sistemas defensivos apropriados.

Receptores especiais nas células vegetais se prendem ao etileno. Os


primeiros genes vegetais conhecidos envolvidos nesse processo, ETR1 e CTR1,
foram identificados em 1993. Eles impedem a ativação dos genes da maturação
até que o etileno seja produzido e, quando isso acontece, o ETR1 e o CTR1 se
desligam, o que provoca uma reação em cascata que, finalmente, prende outros
genes que produzem várias enzimas: pectinase para quebrar as paredes celulares,
promovendo o amolecimento da fruta, amilase para converter carboidratos em
açúcares simples e hidrolase para reduzir a quantidade de clorofila da fruta, o que
resulta na mudança da cor. Essas alterações atraem os animais que consumem as
frutas, dispersando suas sementes maduras não digeridas por meio das fezes.

O caminho percorrido pelo etileno, desde sua produção até respostas


finais como a morte de células, ainda intriga os cientistas. As plantas terrestres são
os únicos organismos conhecidos que contêm um sistema de resposta completo.
As cianobactérias são sensíveis ao etileno, mas não se sabe se podem produzi-
lo. Esses micro-organismos têm um gene semelhante ao ETR1, mas não tem o
gene CTR1, portanto seu sistema de resposta ao etileno deve ser diferente dos das
plantas terrestres. As algas verdes, geralmente situadas entre as cianobactérias
e as plantas terrestres na árvore evolucionária, não são sensíveis ao etileno, por
isso interessa aos pesquisadores saber como as respostas ao etileno saltaram
diretamente das cianobactérias para as plantas terrestres.

Por razões econômicas, os pesquisadores continuam a explorar os detalhes


biomoleculares do ciclo de produção e resposta do etileno, na esperança de
desenvolver métodos melhores para evitar o amadurecimento de frutas recém-
colhidas durante o transporte em longas distâncias. O problema é garantir que
a fruta não se torne insensível ao etileno e, portanto, nunca amadureça. Afinal,
quem quer comer bananas verdes com gosto de isopor?
FONTE: KENDRICK, Mandy. Como as frutas ficam maduras? Pergunte ao etileno. Disponível em:
<http://www2.uol.com.br/sciam/noticias/como_as_frutas_ficam_maduras__pergunte_ao_etileno.
html>. Acesso em: 25 mar. 2018.

147
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:

• Os alcenos integram a classe dos hidrocarbonetos e possuem apenas carbonos


e hidrogênios contendo ao menos uma ligação dupla C=C.

• A fórmula geral dos alcanos é CnH2n, em que n pode ser qualquer número inteiro.

• As regras e passos utilizados para nomear os alcenos de acordo com a


nomenclatura sistemática (nomenclatura IUPAC).

• A isomeria e a nomenclatura cis-trans dos alcenos.

• A isomeria e a nomenclatura E, Z dos alcenos (incluindo como determinar a


prioridade relativa dos grupos ligados aos carbonos da ligação dupla C=C).

• Os pontos de ebulição dos alcenos tende a aumentar devido ao aumento da


cadeia carbônica e a diminuir se existem ramificações.

• A obtenção industrial dos alcenos mais simples (eteno, propeno e buteno) vem
do craqueamento do petróleo.

• O eteno e o buteno são os compostos orgânicos com maior produção industrial


mundial, pois eles são essenciais como material de partida para a produção de
uma quantidade significativa de outras substâncias.

• Os alcenos ocorrem abundantemente na natureza, desempenhando os mais


diferentes papéis nos processos biológicos.

• Os alcenos são moléculas bastante reativas por possuírem ligações duplas C=C
(isso porque os elétrons da ligação p não estão muito protegidos, podendo,
portanto, reagir facilmente com outras moléculas).

• A ligação dupla C=C dos alcenos se comporta como um nucleófilo, doando um


par de elétrons (que vem da ligação p) a um eletrófilo.

• As reações dos alcenos são reações de adição (como exemplos de reações de


adição de alcenos podemos citar a halidrificação, que é a reação entre um
alceno e um ácido halogenado para a formação de um haleto de alquila, a
halogenação, que é a reação entre um alceno e o Br2 ou o Cl2 para a formação
de 1,2-dialeto, a hidratação, que é a reação entre um alceno e a água para a
formação de álcoois, e a hidrogenação, que é a reação entre um alceno e o gás
hidrogênio para a formação de alcanos).

148
AUTOATIVIDADE

1 Determine a nomenclatura sistemática para as seguintes moléculas:

a) b) c) d)

2 Determine a estrutura para as seguintes moléculas:

a) 2,3-dimetil-1,3-ciclohexadieno
b) 3,4-diisopropil-2,5-dimetil-3-hexeno
c) 2-metil-1,5-hexadieno
d) 1-isopropil-4-metilciclohexeno

3 Determine se a molécula tem configuração E ou Z:

a) b) c) d)

149
150
UNIDADE 3

GRUPOS FUNCIONAIS II:


ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E
COMPOSTOS AROMÁTICOS

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir dos estudos desta unidade, você será capaz de:

• entender os conceitos fundamentais que regem a química dos alcinos;

• saber como nomear corretamente os alcinos;

• familiarizar-se com a reatividade dos alcenos;

• compreender os fatores que regem a estabilidade dos carbocátions inter-


mediários;

• compreender o que é estereoquímica;

• saber identificar os enantiômeros e os diastereoisômeros;

• saber utilizar a nomenclatura R,S;

• compreender a estrutura do benzeno;

• saber identificar e representar estruturas de ressonância.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você en-
contrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 –­ HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

TÓPICO 2 –­ ESTEREOQUÍMICA

TÓPICO 3 –­ BENZENO E AROMATICIDADE

151
152
UNIDADE 3
TÓPICO 1

HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

1 INTRODUÇÃO
Na Unidade 2 deste livro de estudos, já estudamos os alcanos e cicloalcanos;
e os alcenos. Agora, para continuarmos nossos estudos sobre os hidrocarbonetos,
passaremos para o grupo funcional dos alcinos.

Assim, por pertencerem ao grande grupo dos hidrocarbonetos, os alcinos,


são também formados apenas por átomos de carbonos e hidrogênio. No entanto,
esse grupo funcional é caracterizado por possuir pelo menos uma ligação tripla
entre os átomos de carbono da cadeia principal (C≡C), o que os torna compostos
insaturados (assim como os alcenos, no entanto, lembre-se de que os alcenos são
caracterizados por possuírem ao menos uma ligação dupla C=C).

Como para os outros hidrocarbonetos, estudaremos, neste tópico, a


estrutura dos alcinos, as regras de nomenclatura sistemática associadas a eles, e
suas propriedades físicas gerais. Como os alcinos possuem insaturações, sabemos
que eles são moléculas reativas e, por isso, também estudaremos algumas das
reações típicas relacionadas a eles.

2 ALCINOS
Os alcinos são formados apenas por átomos de carbono e de hidrogênio,
assim, com os alcanos e os alcenos, integram a classe de hidrocarbonetos. Os
alcinos são classificados como compostos insaturados, pois suas cadeias carbônicas
contêm, ao menos, uma ligação dupla C≡C (além das ligações simples C–C e C­–H).
Dessa forma, na estrutura de um alcino existem carbonos com hibridização sp3,
que são os que possuem ligações simples s, assim como carbonos com hibridização
sp, que são aqueles que participam das ligações triplas C≡C (como estudados no
Tópico 1 da Unidade 1 deste livro de estudos, uma ligação tripla C≡C é resultado
da sobreposição frontal entre os orbitais sp dos carbonos, formando uma ligação
s, e da superposição lateral de dois orbitais p não hibridizados, formando duas
ligações p). Vale dizer que, devido à ligação tripla, os alcinos possuem quatro
átomos de hidrogênio a menos que os alcanos correspondentes. Desse modo, a
fórmula geral dos alcinos é CnH2n-2, em que n pode ser qualquer número inteiro.
Na Tabela 1, são mostradas as fórmulas moleculares e as estruturas condensadas
de alguns dos alcinos mais simples (contendo apenas uma ligação C≡C).
153
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

TABELA 1 – ALCINOS MAIS SIMPLES DE CADEIA LINEAR

Fórmula
na Nome Estrutura condensada
molecular
2 C2H2 Etino HC≡CH
3 C3H4 Propino CH3C≡CH
4 C4H6 1-butino HC≡CCH2CH3
4 C4H6 2-butino CH3C≡CCH3
5 C5H8 1-pentino HC≡CCH2CH2CH3
5 C5H8 2-pentino CH3C≡CCH2CH3
6 C6H10 1-hexino HC≡CCH2CH2CH2CH3
a
n = número de carbonos
FONTE: A autora

Assim como os alcenos, os alcinos também possuem isomeria de posição


de insaturação (como vemos na Tabela 1, em que são mostrados os exemplos dos
isômeros 1-butino e 2-butino e do 1-pentino e do 2-pentino), o que mostra que a
ligação tripla C≡C pode existir em qualquer posição da cadeia carbônica.

3 NOMENCLATURA DOS ALCINOS


A nomenclatura dos alcinos é realizada do mesmo modo como vimos
para a nomenclatura dos outros hidrocarbonetos. Porém, agora, utilizaremos o
prefixo -ino para identificar o grupo funcional dos alcinos. As regras são sempre
as mesmas, mas vamos relembrá-las focando nas estruturas de alcinos.

• Etapa 1: identificar a cadeia principal

A cadeia principal é definida pela cadeia de carbono mais longa (ou seja,
que contém maior número de átomos de carbono ligados entre si) que contenha
as ligações triplas C≡C.

154
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

FIGURA 1 – IDENTIFICAÇÃO DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

• Etapa 2: enumerar os átomos presentes na cadeia principal

A enumeração dos átomos da cadeia principal se inicia pelo átomo de


carbono presente na extremidade da cadeia que esteja mais próxima a uma
ligação tripla C≡C.

FIGURA 2 – ENUMERAÇÃO DOS ÁTOMOS DA CADEIA PRINCIPAL

FONTE: A autora

• Etapa 3: identificar e enumerar os substituintes

É necessário identificar os números dos carbonos da cadeia principal nos


quais cada um dos substituintes está ligado, de modo que possamos localizar
esse substituinte. Se houver dois substituintes ligados a um mesmo carbono da
cadeia principal, esses substituintes serão identificados pelo mesmo número
(ambos os localizadores devem ser designados no nome da molécula).

155
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 3 – IDENTIFICAÇÃO E ENUMERAÇÃO DOS SUBSTITUINTES

FONTE: A autora

• Etapa 4: escrever o nome do composto em uma única palavra

Devemos nomear o composto seguindo a ordem mostrada na Figura 1:


localizador –­ prefixo – cadeia principal – sufixo.

A cadeia principal é nomeada de acordo com o número de átomos pelo


qual ela é formada (veja a Tabela 1 do Tópico 1) e o sufixo indica o grupo funcional
(-ino para os alcinos). É importante lembrar que a posição da ligação tripla na
molécula deve ser indicada (lembre-se dos isômeros 1-butino e 2-butino, por
exemplo, mostrados anteriormente); assim, as localizações das ligações duplas
aparecem antes do nome da cadeia principal e são dadas indicando o número
do primeiro carbono que faz parte da ligação (veja nos exemplos mostrados
na Figura 5). Caso necessário, volte ao Tópico 3 da Unidade 2 para recordar as
especificidades utilizadas para a nomenclatura dos hidrocarbonetos.

FIGURA 4 – EXEMPLOS DE NOMENCLATURA DE ALCENOS

FONTE: A autora

156
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

EXEMPLO 1 –­ Desenhe a estrutura do 3-etil-5-metil-1,6,8-decatri-ino.

RESPOSTA

O primeiro passo para desenhar uma estrutura a partir do seu nome


sistemático é identificar a cadeia principal. Assim, definimos, portanto, que
a cadeia principal dessa molécula contém dez átomos de carbono (já que o
prefixo usado para a cadeia principal é o deca-), trata-se de alcino, pois o sufixo
característico do grupo funcional é -ino e, mais ainda, possui três ligações
triplas C≡C devido ao termo “tri” indicado antes do sufixo -ino (tri-ino), cujos
localizadores 1, 6 e 8 (precedentes ao nome da cadeia principal) indicam que as
ligações triplas C≡C estão entre os carbonos 1 e 2 (localizador 1), 6 e 7 (localizador
6) e 8 e 9 (localizador 8). Dessa forma a cadeia principal é:

Agora, precisamos adicionar os substituintes e adequar o número de


hidrogênios ligados aos carbonos da cadeia principal (já que na etapa anterior
nós apenas definimos a cadeia principal e ignoramos os substituintes). Pelo nome
do composto, vemos que existe um substituinte etila ligado ao carbono 3 da
cadeia principal e um substituinte metila ligado ao carbono 5. Assim, temos que
a estrutura do 3-etil-5-metil-1,6,8-decatri-ino é:

EXEMPLO 2 – Dê o nome sistemático para o seguinte composto:

157
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

RESPOSTA

A primeira etapa consiste em determinar a cadeia principal do composto.


Sabemos que a cadeia principal é definida pela maior cadeia carbônica que
contém a ligação tripla C≡C, assim, a cadeia principal contém nove carbonos e
uma ligação tripla, sendo nomeada de nonino.

O segundo passo é enumerar os átomos presentes na cadeia principal


para que possamos determinar, em um primeiro momento, a posição da ligação
tripla. Lembre-se de que devemos enumerar os carbonos da cadeia principal de
modo que o átomo de carbono presente na extremidade da cadeia esteja o mais
próximo da ligação tripla C≡C, assim:

O terceiro passo é identificar os substituintes (tanto pelo nome, quanto


pela sua localização na cadeia principal). Então:

Portanto, o nome sistemático desse composto é: 6-bromo-7-cloro-4-


nonino

158
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

3 PROPRIEDADES DOS ALCINOS


Diferentemente dos alcanos e, principalmente dos alcenos, que são
facilmente encontrados na natureza, existe uma quantidade ínfima de alcinos
naturais. Podemos citar como exemplos de alcinos de ocorrência natural a capilina
(um fungicida extraído do óleo do crisântemo), o ácido tarírico (extraído de grão
de espécies da família da Pricamnia) e o ictiotereol (encontrados nas plantas da
família timbó e muito utilizado por indígenas da Amazônia como veneno de
pesca). Na Figura 5, são mostradas as estruturas para esses compostos. Note que
esses compostos apresentam outros grupos funcionais além do alcino; a capilina
também é composta por um anel aromático e um grupo cetona, o ácido tarírico
possui uma função de ácido carboxílico e o ictiotereol possui um grupo alcóolico
e uma função éter.

FIGURA 5 – EXEMPLOS DE MOLÉCULAS COM GRUPO FUNCIONAL ALCINO

FONTE: A autora

O alcino mais utilizado na indústria é o etino (comumente denominado


acetileno), o mais simples dos alcinos. A obtenção do etino é através das reações
de craqueamento do petróleo ou a partir da reação entre o carbeto de cálcio (CaC2)
e a água. O etino é bastante importante para a indústria, pois ele é matéria-prima
para diversas moléculas orgânicas, como o etanol, o etanal, o anídrico acético e
a propanona. A importância da síntese dessas moléculas é que depois elas são
empregadas como material de partida nas indústrias de plásticos, de borracha
sintética, de corantes, de solventes e até mesmo na indústria farmacêutica.
De fato, a maior parte do etino é utilizada na indústria química para a síntese
dessas moléculas, no entanto, ele também é utilizado em maçaricos usados
para cortar chapas de aço e para soldagem, devido à capacidade de liberar
grandes quantidades de calor durante a combustão (na figura a seguir está
demostrada a reação de combustão do etino). Existem também alguns fármacos
formados por alcinos, como o noretinodrel (usado em uma das primeiras pílulas
anticoncepcionais lançadas no mercado) e a terbinafina (um antifúngico), cujas
estruturas são mostradas na Figura 7.

159
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 6 – REAÇÃO DE OBTENÇÃO DO ETINO A PARTIR DO CARBETO E


REAÇÃO DE COMBUSTÃO DO ETINO

FONTE: A autora

FIGURA 7 – ESTRUTURAS DO NORETINODREL E DA TERBINAFINA

FONTE: A autora

Os alcinos (do mesmo modo que os alcanos e alcenos) são moléculas


apolares (devido às ligações pouco polares C­–H), assim, eles são insolúveis em
água, mas podem ser solubilizados em alguns solventes orgânicos apolares (como
o benzeno e o éter). Na verdade, as propriedades físicas dos hidrocarbonetos
são similares, desse modo é de se esperar que os pontos de ebulição dos alcinos
também aumentem com o aumento do tamanho da cadeia carbônica. A tabela a
seguir mostra as temperaturas de ebulição dos hidrocarbonetos (alcanos, alcenos
e alcinos) mais simples a fim de que possamos observar essa tendência (ou seja,
aumento do ponto de ebulição). Vale observar que os pontos de ebulição dos
alcinos são mais elevados do que os dos seus alcenos homólogos (por exemplo, o
etino ebule a -84 °C, enquanto que o eteno ebule a -104 °C). Isso acontece porque
os alcinos são mais lineares (lembre-se do que discutimos na Unidade 1, na qual
vimos que o ângulo das ligações C–H dos carbonos da ligação dupla C=C são de
120º, enquanto que para a ligação tripla C≡C, esse ângulo é de 180º, tornando a
região onde está a ligação tripla da molécula linear), fazendo com que seja mais
fácil aproximar duas moléculas de alcino do que duas moléculas de alceno, o
que gera, consequentemente, uma maior área de contato entre essas moléculas.
Além disso, a ligação tripla C≡C é mais polarizável do que a ligação C=C, porque
a ligação tripla tem maior quantidade de elétrons, ou seja, maior densidade
eletrônica, sendo mais fácil deformar essa nuvem eletrônica, tornando a atração
160
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

entre os alcinos mais forte. Assim, a combinação desses fatores faz com que as
interações intermoleculares (que, para todos os hidrocarbonetos, ocorrem devido
às forças de dispersão, pois se tratam de moléculas apolares) entre os alcinos
sejam mais fortes do que para os alcanos, tornando mais difícil a ebulição desses
compostos (lembre-se de que um ponto de ebulição maior indica que é necessário
fornecer uma energia maior para permitir que as moléculas de uma determinada
substância passem da fase líquida para a gasosa).

TABELA 2 – PONTOS DE EBULIÇÃO DE ALGUNS HIDROCARBONETOS HOMÓLOGOS

Ponto de Ponto de Ponto de


Alcano Alceno Alcino
ebulição ebulição ebulição
Etano Eteno Etino
-89 ­°C -104 ­°C -84 ­°C
CH3CH3 CH2=CH2 CH2≡CH2
Propano Propeno Propino
-42 ­°C -47 ­°C -23 ­°C
CH3CH2CH3 CH3CH=CH2 CH3CH≡CH2
Butano 1-Buteno 1-Butino
-1 ­°C -7 ­°C 8 ­°C
CH3(CH2)2CH3 CH3CH2CH=CH2 CH3CH2CH≡CH2
Pentano 1-Penteno 1-Pentino
36 ­°C 30 ­°C 39 ­°C
CH3(CH2)3CH3 CH3(CH2)2CH=CH2 CH3(CH2)2CH≡CH2
Hexano 1-Hexeno 1-Hexino
69 ­°C 63 ­°C 71 ­°C
CH3(CH2)4CH3 CH3(CH2)3CH=CH3 CH3(CH2)3CH≡CH3
FONTE: Bruice (2006, p. 237)

4.1 REATIVIDADE DOS ALCINOS


Como já sabemos, os alcinos possuem uma ligação tripla C≡C formada
pela combinação de uma ligação s com duas ligações p. Lembre-se de que vimos
que a ligação dupla C=C dos alcenos, por ser rica em elétrons, age como um
nucleófilo, fazendo com que os alcenos reajam com eletrófilos devido à quebra
dessa ligação dupla (devido à quebra da ligação p). Assim, do mesmo modo, é de
se esperar que os alcinos sejam moléculas reativas, reagindo com eletrófilos devido
à quebra da ligação tripla C≡C que age como nucleófilo. No entanto, é importante
saber que os alcinos podem reagir em etapas, já que ele possui duas ligações p.
Assim, em uma primeira etapa, um par de elétrons da ligação tripla age como
o nucleófilo atacando (ou seja, doando esse par de elétrons para o nucleófilo),
gerando como produto um alceno (note que nessa primeira etapa apenas uma
das ligações p da ligação tripla C≡C é quebrada). Assim, caso mais reagente for
adicionado à reação, ela pode acontecer em uma segunda etapa, fazendo com que
a outra ligação p se quebre devido ao ataque nucleofílico ao eletrófilo, formando
um alceno. Resumindo: um alcino reage para formar um alceno que reage, por
sua vez, formando um alcano. Isso é exemplificado na figura a seguir, que mostra

161
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

a reação do butino com o ácido acético, gerando o 2-cloro-2-buteno (etapa 1);


se, por exemplo, houver uma quantidade suficiente de ácido clorídrico no meio
reacional, o 2-cloro-2-buteno pode reagir com esse ácido, gerando como produto
final o 2,2-diclorobutano (etapa 2).

Portanto, como as reações dos alcinos ocorrem, em sua grande maioria,


devido ao ataque do nucleófilo (os elétrons das ligações p da ligação tripla C≡C) a
um eletrófilo, as reações dos alcinos são reações de adição. Assim, vamos estudar
alguns exemplos de reações de adição de alcinos:

• Halidrificação: é a reação entre um alcino e um ácido halogenado (ácido


clorídrico, HCl, ácido bromídrico, HBr, ou ácido iodídrico, HI) para a formação
de um haleto de vinila (cujo grupo funcional é a ligação C=C–X, em que X é
um halogênio). Caso o ácido halogenado esteja em excesso, a reação pode ser
processada em uma segunda etapa, produzindo um derivado dihalogenado.

A figura a seguir mostra o mecanismo de reação para a halidrificação do


propino com ácido bromídrico.

FIGURA 8 – MECANISMO DE HALIDRIFICAÇÃO DO PROPINO COM O ÁCIDO BROMÍDRICO

FONTE: A autora

162
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

A reação de halidrificação se inicia com o ataque do par de elétrons de


uma das ligações p da ligação tripla C≡C (nucleófilo) ao hidrogênio do HBr (veja
que o hidrogênio possui carga parcial positiva, d+, por estar ligado ao bromo,
que é muito eletronegativo, e por isso pode aceitar facilmente o par de elétrons
doado pela ligação p do propeno). Esse ataque nucleófilo faz com que essa ligação
p se quebre, formando uma nova ligação s C–H e gerando um intermediário
carbocátion vinílico (que contém um grupo vinílico, ou seja, com uma ligação
C=C). O átomo de carbono positivo do carbocátion é então atacado pelo brometo,
resultando em uma ligação C–Br para a obtenção do 2-bromopropeno.

Se for adicionado HBr em excesso, a reação pode continuar em uma


segunda etapa, que se inicia com o ataque da ligação p da ligação dupla C=C
(nucleófilo) ao hidrogênio do HBr, resultando na quebra dessa ligação p e na
formação da ligação s C–H para a formação do carbocation alquílico (em que só
existem ligações simples entre os carbonos). O átomo positivo do carbocátion é
então atacado pelo brometo, formando o 2,2-dibromopropano.

• Halogenação: é a reação entre um alcino e o Br2 ou o Cl2 para a formação de


1,2-dihaleto. E, de novo, se houver excesso do halogêneo, a reação se processa
em uma segunda etapa resultando em um derivado tetrahalogenado. A figura
a seguir mostra o mecanismo de reação da halogenação do propino com o Cl2.

FIGURA 9 – MECANISMO DE HALOGENAÇÃO DO PROPINO COM O CLORO

FONTE: A autora

163
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

A reação de halogenação se inicia com o ataque do par de elétrons de uma


das ligações p da ligação tripla C≡C (nucleófilo) a um dos átomos de cloro do
Cl2. Lembre-se de que o Cl2 é apolar (assim como o Br2) e, portanto, inicialmente,
ambos os átomos da molécula possuem a mesma densidade eletrônica (não
existem cargas parciais positivas ou negativas). No entanto, quando o Cl2 se
aproxima do propino para a reação, há a formação de um dipolo induzido na
molécula Cl2 devido à influência da ligação tripla C≡C rica em elétrons, que
tende a repelir os elétrons da ligação Cl–Cl, fazendo com que o átomo de cloro
que está mais próximo à ligação tripla do propino fique com uma carga parcial
positiva, enquanto que o outro átomo de cloro, mais afastado, tenha uma carga
parcial negativa. Assim, voltando ao mecanismo da reação, o ataque nucleófilo
da ligação tripla C≡C faz com que essa ligação p se quebre, formando uma nova
ligação s C–Cl e gerando um carbocátion vinílico. O átomo de carbono positivo
do carbocátion é, então, atacado pelo cloreto, resultando em outra ligação C–Cl e
produzindo o 1,2-dicloropropeno.

A segunda etapa da reação ocorre se o Cl2 estiver em excesso. Assim, a


ligação p da ligação dupla C=C ataca um átomo de cloro do Cl2, resultando na
quebra dessa ligação p e na formação da ligação s C–H. O átomo positivo do
carbocátion é atacado pelo cloreto, formando uma nova ligação C-Cl, produzindo
o 1,1,2,2-tetracloropropano.

• Hidratação: é a reação entre um alcino e a água para a formação de um enol


(grupo funcional em que a hidroxila, –OH, está ligada a um carbono com
hibridização sp2, ou seja, um carbono de uma ligação dupla C=C). A figura a
seguir mostra o mecanismo de reação da hidratação do propino com a água
em meio ácido (caracterizado pela presença de íons H+).

FIGURA 10 – MECANISMO DE HIDRATAÇÃO DO PROPINO

FONTE: A autora

164
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

A reação de hidratação se inicia com o ataque do par de elétrons da


ligação p da ligação tripla C≡C (nucleófilo) a um H+ (proveniente do ácido). Esse
ataque nucleófilo faz com que a ligação p se quebre, formando uma nova ligação
s C–H e gerando um intermediário carbocátion vinílico. O átomo de carbono
positivo do carbocátion é, então, atacado por um par de elétrons isolados do
átomo de oxigênio da água, resultando em uma ligação C–OH2, na qual o átomo
de oxigênio fica com uma carga positiva. Por fim, ocorre a desprotonação, ou seja,
uma das ligações O–H se quebra, gerando o 2-propenol.

Um fenômeno interessante decorrente da hidratação de um alcino é que


o enol (grupo funcional caracterizado por ter uma hidroxila ligada a um carbono
sp2) é facilmente rearranjado em uma cetona (que contém como grupo funcional
uma carbonila, C=O). Assim, esse rearranjo do enol em cetona e vice-versa é
chamado de tautomerismo ceto-enólico. As formas ceto e enólica são chamadas
de tautômeros, termo utilizado para se referir aos isômeros constitucionais
que podem se interconverter facilmente um no outro. Na maioria das vezes, o
tautômero ceto é mais estável, por isso ele predomina sobre a forma enólica.
Na figura a seguir são mostrados exemplos de reações de hidratação de alcinos
cujos produtos são tautômeros ceto-enolícos (note que a flecha apontando para a
produção da forma ceto é maior do que a flecha em direção à forma enólica, o que
indica que o tautômero ceto é mais favorável).

FIGURA 11 – EQUILÍBRIO CETO-ENÓLICO

FONTE: A autora

Com base no que foi exposto, note que as reações dos alcinos são muito
semelhantes às reações dos alcenos. No entanto, é importante saber que os alcinos
são menos reativos que os alcenos. Isso pode parecer estranho a um primeiro
momento, já que os alcinos possuem maior quantidade de elétrons em torno da
ligação tripla C≡C em comparação à ligação dupla C=C dos alcenos, o que poderia
fazer com que os alcinos doassem mais facilmente elétrons a um eletrófilo do que
os alcenos. Na verdade, para poder entender essa diferença de reatividade entre
os alcenos e os alcinos, precisamos analisar a estrutura do intermediário que é
formado durante a reação.

165
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

DICAS

Recomendamos a leitura do texto Metátese em síntese orgânica e o prêmio


Nobel em química de 2005: do plástico à indústria farmacêutica, que relata a descoberta
do método de metátese e algumas de suas aplicações (incluindo as reações com alcinos)
que permitiram a obtenção, por exemplo, de novos fármacos, substâncias biologicamente
ativas e polímeros de forma mais ecologicamente favorável (FERREIRA; SILVA, 2005).

4.1.1 Estabilidade do carbocátion


Quando analisamos os mecanismos de reação tanto dos alcenos quanto
dos alcinos, pudemos observar que a reação se processa com o surgimento de
diferentes estruturas intermediárias, os carbocátions (lembre-se de que um
carbocátion é o resultado de um carbono que possui apenas três ligações, sendo,
portanto, uma espécie deficiente em elétrons, ou seja, um cátion de carbono).
Assim, quanto menor a energia desse intermediário, mais estável ele é, e mais fácil
de a reação se processar. No entanto, como podemos determinar a estabilidade
de um carbocátion? Dados experimentais revelam que os carbocátions terciários
(aqueles em que a carga positiva está sobre um carbono terciário) são os mais
estáveis, seguidos pelos carbocátions secundários (a carga positiva está sobre
um carbono secundário), e, consequentemente, os carbocátions primários (a
carga positiva está sobre um carbono primário) são os menos estáveis. Dessa
forma, a estabilidade do carbocátion cresce em função do aumento do número
de substituintes do carbono deficiente em elétrons (carbono com carga positiva),
como mostrado na figura a seguir. Note que o termo “substituinte” se refere às
espécies orgânicas que aparecem substituindo os átomos de hidrogênio ligados
ao carbono (assim, um carbono terciário tem três substituintes, pois existem três
espécies orgânicas ligadas a esse carbono, enquanto que um carbono primário
tem apenas uma espécie orgânica ligada a ele).

FIGURA 12 – ESTABILIDADE RELATIVA DOS CARBOCÁTIONS

FONTE: A autora

166
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

A maior estabilidade dos carbocátions terciários em relação aos


secundários e aos primários é consequência do efeito indutivo (que é o
deslocamento dos elétrons em uma ligação química devido à diferença de
densidade eletrônica entre as espécies da ligação). Assim, a carga positiva no
carbocátion age como um centro de atração, fazendo com que a densidade de
elétrons se desloque em sua direção. Dessa forma, quanto maior a disponibilidade
de elétrons no carbocátion para compensar a carga positiva, maior a estabilidade
e a facilidade do carbocátion ser formado. Uma espécie orgânica (ou seja, um
substituinte), por ser formada por mais átomos, tem maior número de elétrons
(maior densidade eletrônica) do que um átomo de hidrogênio, o que torna mais
fácil o deslocamento de elétrons do substituinte em direção à carga positiva no
átomo de carbono. Perceba na figura a seguir que para um carbocátion primário
apenas um substituinte contribui para a estabilização desse intermediário. No
carbocátion secundário existem dois substituintes que deslocam sua densidade
eletrônica em direção à carga positiva contribuindo um pouco mais para essa
estabilização. Já nos carbocátions terciários existem três substituintes que
contribuem mais ainda para estabilizar a carga positiva, explicando a maior
estabilidade dos carbocátions terciários.

Toda essa discussão que tivemos até agora vale para os carbocátions em
geral, ou seja, para uma mesma série, a estabilidade do carbocátion cresce na
seguinte ordem: carbocátion primário < carbocátion secundário < carbocátion
teciário. Porém, é importante notar que os carbocátions formados a partir
dos alcenos são diferentes dos carbocátions formados a partir dos alcinos
(precisamente na etapa 1). Para os alcenos, o carbocátion formado pela adição
de um átomo de hidrogênio ao carbono da ligação dupla C=C é um carbocátion
alquílico (lembre-se de que um grupo alquila é um grupo em que todos os
átomos de carbonos estão ligados por ligações simples), enquanto que a adição
do hidrogênio ao carbono da ligação tripla C≡C é um cátion vinílico (um grupo
vinil é aquele em que existe uma ligação C=C). Como dito, os alcinos são
menos reativos que os alcenos e isso se deve à estabilidade do intermediário
(do carbocátion), assim, podemos inferir que um carbocátion alquílico é mais
estável que um cátion vinílico. No entanto, por que isso acontece? Um cátion
vinílico é menos estável porque a carga positiva está sobre um carbono sp, que
é mais eletronegativo do que um carbono sp2 do carbocátion alquila. Isso faz
com que o cátion vinílico consiga “suportar” menos essa carga positiva do que
o carbocátion alquílico, já que espécies mais eletronegativas têm a tendência
(quase que uma necessidade, por assim dizer) de atrair os elétrons da ligação
para si, ficando com uma carga parcial negativa, para se estabilizarem. Dessa
forma, a estabilidade relativa dos cátions vinílicos e carbocátions alquílicos está
descrita na figura a seguir.

167
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 13 – ESTABILIDADE RELATIVA DOS CÁTIONS VINÍLICOS E CARBOCÁTIONS ALQUÍLICOS

FONTE: A autora

É importante identificar o carbocátion mais estável, pois ele vai


determinar o produto ou o produto majoritário de uma reação orgânica. Por
exemplo, à primeira vista, na reação do propeno com o ácido clorídrico, o
ataque dos elétrons da ligação p (nucleófilo) ao H+ proveniente do HCl poderia
ocorrer de dois modos: 1) com o H+ se adicionando ao carbono 1 da ligação
dupla, formando um carbocátion secundário ou 2) com o H+ se adicionando ao
carbono 2 da ligação dupla, formando um carbocátion primário. Isso acabaria
gerando dois produtos, o 2-cloropropano e o 1-cloropropano, respectivamente.
No entanto, o carbocátion primário é tão instável que é praticamente impossível
que ele se forme, assim, apenas a reação que gera o carbocátion secundário se
processa, e, consequentemente, apenas o 2-cloropropano é formado.

FIGURA 14 – PRODUTOS DA REAÇÃO ENTRE O PROPENO E O ÁCIDO CLORÍDRICO

FONTE: A autora

168
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

Já a reação do 2-metil-2-buteno com o ácido clorídrico acaba gerando


dois produtos, pois agora o ataque dos elétrons da ligação p (nucleófilo) ao H+
realmente pode ocorrer de dois modos: 1) com o H+ se adicionando ao carbono
1 da ligação dupla, formando um carbocátion terciário, e gerando o 2-cloro-
2-metilbutano como produto e 2) com o H+ se adicionando ao carbono 2 da
ligação dupla, o que forma um carbocátion secundário, e gerando o 2-cloro-
3-metilbutano como produto. Nessa reação, ao contrário da reação do ácido
clorídrico com o propano discutida acima, existe a formação de dois produtos
porque ambos os carbocátions terciário e secundário são formados, pois são
relativamente mais estáveis que o carbocátion primário. No entanto, como o
carbocátion terciário é mais estável que o secundário, o 2-cloro-2-metilbutano é
o produto majoritário da reação, enquanto que apenas uma pequena quantidade
do 2-cloro-3-metilbutano é formada.

Note que o 2-cloro-2-metilbutano e o 2-cloro-3-metilbutano são


isômeros constitucionais (possuem a mesma fórmula molecular, mas a
estrutura é diferente).

FIGURA 15 – PRODUTOS DA REAÇÃO ENTRE O 2-METIL-2-BUTENO E O ÁCIDO CLORÍDRICO

FONTE: A autora

Os exemplos discutidos acima se referiram a reações de adição de


alcanos (o propeno e o 2-metil-2-buteno são alcanos), mas é importante ressaltar
que o mesmo é observado para as reações de adição dos alcinos. Assim, o
produto majoritário de uma reação de adição é sempre aquele proveniente do
carbocátion mais estável.

É importante saber, ainda, que reações em que isômeros constitucionais


podem ser obtidos, mas nas quais um desses isômeros é obtido de forma
majoritária sobre o outro, são chamadas de reações regiosseletivas. Existem

169
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

as reações completamente regiosseletivas, que são aquelas em que um dos


possíveis produtos não é formado (como é o caso da reação do propeno com
o ácido clorídrico discutida anteriormente), e as altamente regiosseletivas, que
são aquelas em que um dos produtos é altamente majoritário em relação ao
outro (como é o caso da reação do ácido clorídrico com o 2-metil-2-buteno).

AUTOATIVIDADE

Quais os produtos esperados para as reações:

a)

b)

b) De novo, devemos primeiro analisar os reagentes para se determinar o


tipo de reação que pode ocorrer entre eles. Agora, temos a reação do 2-penteno
com o ácido bromídrico, portanto, ocorre uma reação de adição entre eles, na qual
os elétrons da ligação p do alceno (nucleófilo) atacam o H+ (eletrófilo).

O segundo passo é analisar a estrutura dos intermediários. Essa reação


pode ser processada dos dois modos: 1) com o H+ se adicionando ao carbono
de número 2 da ligação dupla (indicado a seguir), formando um carbocátion
secundário ou 2) com o H+ se adicionando ao carbono de número 3 da ligação dupla
(indicado a seguir), formando, também, um carbocátion secundário. Percebemos,
então, que ambos os intermediários (apesar de serem estruturalmente diferentes)
são secundários, possuindo, portanto, a mesma estabilidade, o que indica que a
reação do 2-penteno com o ácido bromídrico gera esses na mesma proporção (50

170
TÓPICO 1 | HIDROCARBONETOS III: ALCINOS

% de cada um). Assim, com a continuação da reação (a adição do íon brometo


ao carbono positivo desses carbocátions) os produtos, o 3-bromopentano e
o 2-bromopentano, respectivamente, seriam ambos formados e na mesma
proporção (50% de cada), não havendo produto majoritário para essa reação.

DICAS

Para saber sobre os preceitos da Química Verde, recomendamos a leitura do


texto Green chemistry – os 12 princípios da química verde e sua inserção nas atividades
de ensino e pesquisa, que aborda, de forma detalhada, cada um dos 12 princípios que
encontra-se na referência: LENARDÃO, Eder João et al. “Green chemistry” - Os 12 princípios
da química verde e sua inserção nas atividades de ensino e pesquisa. Quimica Nova v. 26,
n. 1, p. 123–129 , 2003. Disponível em: <http://quimicanova.sbq.org.br/imagebank/pdf/
Vol26No1_123_19.pdf>.0100-4042>. Leia também a pesquisa da FAPESP sobre reações
verdes. Disponível em: <http://revistapesquisa.fapesp.br/2017/10/25/reacoes-verdes/>.

171
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os alcinos integram a classe dos hidrocarbonetos e possuem apenas carbonos


e hidrogênios ligados entre si por ligações simples em cadeias abertas.

• A fórmula geral dos alcinos é CnH2n-2, em que n pode ser qualquer número
inteiro.

• As regras e passos utilizados para nomear os alcinos de acordo com a


nomenclatura sistemática (nomenclatura IUPAC).

• Os alcinos, diferentemente dos alcanos e dos alcenos, têm baixa ocorrência na


natureza.

• Os pontos de ebulição dos alcinos tendem a aumentar devido ao aumento da


cadeia carbônica e a diminuir se existem ramificações.

• Os alcinos são moléculas bastante reativas por possuírem ligações triplas C≡C
(isso porque os elétrons da ligação p não estão muito protegidos, podendo,
portanto, reagir facilmente com outras moléculas).

• A ligação tripla C≡C dos alcinos se comporta como um nucleófilo, doando um


par de elétrons (que vem da ligação p) a um eletrófilo.

• Os alcinos tendem a reagir em etapas, sendo a primeira etapa a reação


propriamente dita do alcino, gerando um alceno como produto, e a segunda
etapa a reação desse alceno para a formação de um alcano.

• As reações dos alcinos são reações de adição (como a halidrificação, a


halogenação, a hidratação e a hidrogenação).

• Os carbocátions (ou seja, os produtos intermediários das reações de adição dos


alcinos e dos alcenos) mais estáveis são os carbocátions terciários, seguidos
pelos secundários e pelos primários (na verdade, o carbocátion primário
é tão instável, que é muito difícil dele ser formado), ou seja, a estabilidade
do carbocátion cresce em função do aumento do número de substituintes do
carbono deficiente em elétrons (carbono com carga positiva).

• É importante identificar o carbocátion mais estável, pois ele vai determinar o


produto ou o produto majoritário de uma reação orgânica.

172
AUTOATIVIDADE

1 Determine a nomenclatura sistemática para as seguintes moléculas:

2 Determine a estrutura para as seguintes moléculas:

a) 3,3-dimetil-4-octino
b) 2,2,5,5-tetrametil-3-hexino
c) 2 3-etil-5-metil-1,6,8-decatriino

3 Coloque os intermediários abaixo em ordem de estabilidade (do menos


estável ao mais estável):

4 Preveja os produtos das seguintes reações (aproveite e dê os nomes


sistemáticos dos regentes e dos produtos):

173
174
UNIDADE 3
TÓPICO 2

ESTEREOQUÍMICA

1 INTRODUÇÃO
Estereoquímica se refere ao estudo dos aspectos tridimensionais das
moléculas. Para entender o que ela é, deve-se entender primeiro o que é isomeria
e como ela se divide.

Desde o início deste livro de estudos já nos deparamos com alguns isômeros
e os analisamos. De fato, entender o que são isômeros é muito importante para
o estudo da química orgânica porque existem muitas moléculas orgânicas que
apresentam isomeria e é essencial saber reconhecer o tipo de isomeria e qual as
influências dessa isomeria nas propriedades dos compostos.

2 ISOMERIA
Isomeria é um fenômeno em que duas ou mais substâncias, denominadas
isômeros, compartilham a mesma fórmula molecular (ou seja, possuem o mesmo
conjunto de átomos), porém apresentam diferentes estruturas químicas (ou seja,
diferente arranjo entre os átomos).

A observação de que as substâncias químicas podem apresentar uma


mesma fórmula molecular, mas possuírem estrutura química diferente data do
início do século XIX, que foi um momento muito importante do desenvolvimento
da química como ciência. Um dos primeiros isômeros a serem detectados foram
justamente os compostos que participaram da reação da ureia, que, como vimos
na Unidade 1, foi a primeira molécula orgânica a ser preparada em laboratório.
Quando Whöler sintetizou a ureia, ele determinou que tanto o produto (ou seja,
a ureia), quanto um dos reagentes, o cianato de amônio, possuíam a mesma
fórmula molecular, N2H4CO, no entanto, apresentam propriedades distintas (veja
na figura a seguir as estruturas do cianato de amônio e ureia). Poucos anos mais
tarde, Berzelius e Justus von Liebig (químico alemão, 1803-1873) propuseram que
esses compostos, apesar de serem formados pelo mesmo conjunto de átomos,
tinham propriedades diferentes porque o arranjo dos átomos dos compostos
era diferente. Assim, Berzelius cunhou o termo “isômeros”, que deriva do grego
e significa algo como “partes iguais” (“iso”, mesmo, e “meros”, partes) para
identificar compostos desse tipo.

175
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 16 – ESTRUTURAS DO CIANATO DE AMÔNIO E DA UREIA

FONTE: A autora

A descoberta da isomeria foi muito importante para o entendimento da


química orgânica porque mostrou que as propriedades dos compostos não eram
resultado apenas da composição química dessas substâncias, mas também do
modo como esses átomos se arranjam no espaço. Vale dizer que o fenômeno da
isomeria também ocorre nos compostos inorgânicos, a quantidade de isômeros
orgânicos é muito superior devido, justamente, ao grande número de combinações
possíveis para a formação das cadeias de carbono.

Os isômeros se dividem em duas classes principais: os isômeros


constitucionais e os estereoisômeros. De fato, nós já vimos vários exemplos tanto
de isômeros constitucionais, quanto de estereoisômeros nas unidades anteriores
deste livro de estudos, mas para relembrar:

• Isômeros constitucionais: são os compostos com mesma fórmula molecular


cujos átomos estão ligados de maneira diferente. Como exemplos de
isômeros constitucionais, podemos citar os isômeros de posição, nos quais os
substituintes estão em carbonos diferente (ou seja, ocupam posições diferentes
na cadeia carbônica), como o 1-bromopropano e o 2-bromopropano e a
propilamina e a 2-propilamina. Existem também os isômeros de cadeia, nos
quais os átomos que compõem a cadeia carbônica se arranjam em diferentes
estruturas, criando cadeias lineares, ramificadas, abertas ou fechadas. Por
exemplo, o isobutano e o butano têm fórmula molecular C4H10, mas o isobutano
tem uma cadeia ramificada enquanto que o butano é linear; do mesmo modo,
o 1-penteno e o ciclopentano têm fórmula molecular C5H10, mas o 1-penteno
está estruturado em uma cadeia aberta (e tem uma ligação dupla C=C) e o
ciclopentano em uma cadeia fechada. Nos isômeros de grupo funcional os
átomos agrupam-se de modo a originarem moléculas com diferentes grupos
funcionais e ocorre com grande frequência entre cetonas e aldeídos (como
para o propanal, um aldeído, e a propanona, uma cetona), álcoois e éteres (o
etanol, um álcool, e o éter dimetílico, um éter), ácidos carboxílicos e ésteres
(o ácido propanóico, um ácido carboxilico, e o etanoato de metila, um éster),
por exemplo. Na figura a seguir são mostradas as estruturas dos isômeros
constitucionais citados anteriormente.

176
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

FIGURA 17 – EXEMPLOS DE ISÔMEROS CONSTITUCIONAIS

FONTE: A autora

• Estereoisômeros (também chamados de isômeros configuracionais): são os


compostos com mesma fórmula molecular cujos átomos estão ligados nas
mesmas posições, porém com orientação espacial diferente. Eles podem ser
divididos ainda em duas categorias: os enatiômeros e os diasteroisômeros. A
figura a seguir traz um fluxograma que mostra os diferentes tipos de isomeria
encontrados para as moléculas orgânicas.

FIGURA 18 – FLUXOGRAMA DOS DIFERENTES TIPOS DE ISÔMEROS

FONTE: A autora

177
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Veremos nos subtópicos seguintes o que define os enatiômeros e os


diasteroisômeros, mas, primeiramente, precisamos entender o conceito de
quiralidade.

3 QUIRALIDADE E O CARBONO ASSIMÉTRICO


O termo “quiral” se refere a qualquer objeto que não pode ser sobreposto
a sua imagem especular (ou seja, à imagem no espelho). Por exemplo, se
colocarmos nossa mão direita na frente de um espelho, temos a impressão de que
estamos vendo nossa mão direita e se sobrepormos a nossa mão direita com a sua
imagem especular, veremos que elas não se encaixam, o que indica que as nossas
mãos são entidades quirais. Por outro lado, um balão de Erlenmeyer é um objeto
cuja imagem especular pode ser perfeitamente sobreposta ao objeto em si, o que
define, portanto, o Erlenmeyer como um objeto aquiral.

NOTA

É interessante saber que o termo “quiral” é derivado da palavra grega “cheir”, que
significa “mão”.

FIGURA 19 – OBJETOS QUIRAIS E AQUIRAIS

FONTE: Socratic (2015, s.p.)

178
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

Pelos exemplos mostrados na figura anterior, vimos então que um objeto


quiral é aquele cuja imagem especular não se sobrepõe a ele, e, de outro modo, um
objeto aquiral é definido por se sobrepor perfeitamente a sua imagem especular.
O que determina se o objeto vai ser quiral ou aquiral? Um objeto é definido como
aquiral se ele possui um plano de simetria, e como quiral se ele não o possui.
Um plano de simetria é definido como um plano que passa no meio do objeto de
forma que as duas metades do objeto sejam idênticas. Assim, como mostrado na
figura a seguir, uma mão não possui um plano de simetria, o que a define como
quiral, enquanto que o Erlenmeyer sim, definindo-o como quiral.

FIGURA 20 – OBJETOS QUIRAIS E AQUIRAIS

FONTE: Socratic (2015, s.p.)

Não apenas os objetos podem ser definidos como quirais ou aquirais, as


moléculas também podem ser classificadas desse modo. Por exemplo, o ácido
propanoico tem um plano de simetria, o que o define como uma molécula
aquiral; já o ácido lático não possui nenhum plano de simetria, sendo, portanto,
uma molécula quiral.

179
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 21 – ESTRUTURAS DO ÁCIDO PROPANOICO (MOLÉCULA AQUIRAL) E DO ÁCIDO


LÁTICO (MOLÉCULA QUIRAL)

FONTE: McMurry (2012, s.p.)

O fator mais importante para definir a quiralidade de uma molécula


é a presença de ao menos um átomo de carbono assimétrico, ou seja, um
carbono ligado a quatro grupos diferentes. Assim, analisando a estrutura do
ácido lático, vemos que o carbono central é um carbono assimétrico, pois está
ligado a quatro grupos diferentes (–H, ­–CH3, –OH e –CO2H). Na figura a seguir
são mostrados outros exemplos de moléculas com carbono assimétrico, que
são indicados por um asterisco (*). O carbono de número 4 do 4-octanol é um
carbono assimétrico porque está ligado aos quatro grupos diferentes –H, –OH,
–CH2CH2CH3 e –CH2CH2CH2CH3; o carbono de número 4 do 2,4-dimetilhexano
também é um carbono assimétrico, pois está ligado aos grupos –H, –CH3, –
CH2CH3 e –CH2CH(CH3)CH3. Carbonos assimétricos também são comumente
chamados de centros assimétricos, ou de centros de quiralidade, ou de centros
esterogênicos ou de carbonos quirais.

FIGURA 22 – ESTRUTURA DO ÁCIDO LÁTICO, DO 4-OCTANOL E DO 2,4-DIMETILHEXANO,


MOSTRANDO O CARBONO ASSIMÉTRICO (INDICADO POR *)

FONTE: A autora

180
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

Perceba que apenas os carbonos com hibridização sp3 podem ser


classificados como carbonos assimétricos, uma vez que apenas esse tipo de carbono
pode formar quatro ligações com outros átomos e/ou grupos. Os carbonos com
hibridização sp2 e sp formam ligações duplas C=C e tripla C≡C, respectivamente,
o que os “impede” de realizar quatro ligações com grupos diferentes.

EXEMPLO – Determine se as moléculas a seguir são quirais ou aquirais:

RESPOSTA

Primeiro, analisando a estrutura do metilciclohexano, vemos que não


existe nenhum carbono assimétrico na sua estrutura, já que nenhum dos átomos
de carbono da molécula está ligado a quatro grupos distintos:

Carbono de número 1: ligado ao –H, ao –CH3 e aos grupos


ligados aos carbonos de número 2 e 6, que são idênticos
(analise a estrutura cíclica para perceber que esses grupos são
idênticos).

Carbonos de número 2, 3, 4, 5 e 6: apresentam duas ligações


­–H e estão ligados a grupos equivalentes.

Como moléculas que não possuem nenhum carbono assimétrico são


definidas como aquirais, definimos que o metilciclohexano é aquiral. Por
meio do modelo de bolas e varetas do metilciclohexano, fica fácil ver que essa
molécula possui um plano de simetria, que passa exatamente na metade do
anel, sendo, portanto aquiral.

181
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Por outro lado, a 2-metilciclohexanona possui um carbono assimétrico,


como descrito a seguir:

Carbono de número 2: ligado ao –H, ao –CH3 aos grupos


ligados aos carbonos de número 1 e 3, que não são iguais.

Assim, como há pelos menos um carbono assimétrico na molécula (o


carbono de número 2), isso a torna uma molécula quiral. O modelo de bolas e
varetas da 2-metilciclohexanona mostra que não há um plano de simetria para
essa molécula, o que confirma seu caráter quiral.

4 ENANTIÔMEROS
De forma visual, podemos perceber que uma molécula contendo pelo
menos um carbono assimétrico é quiral, observando as moléculas genéricas
representadas pelas fórmulas moleculares CH3X, CH2XY e CHXYZ (em que X, Y
e Z representam grupos quaisquer e diferentes). Como esquematizado na figura
anterior, as moléculas CH3X e CH2XY (que não têm carbono assimétrico, pois os
átomos de carbono das moléculas não estão ligados a quatro grupos diferentes)
possuem eixo (ou plano) de simetria, assim, suas imagens especulares podem
ser sobrepostas. Isso indica que a molécula “real” (aquela colocada em frente ao
espelho) é idêntica à imagem formada no espelho, o que indica que a molécula
“real” e a molécula “imagem” são idênticas, ou seja, tratam-se da mesma molécula.
Lembre-se de que moléculas diferentes precisam ter fórmula molecular diferente
ou configuração espacial diferentes. Como, portanto, as moléculas CH3X e CH2XY
apresentam uma única configuração espacial, elas não possuem isômeros.

De outro modo, a molécula representada pela fórmula genérica CHXYZ


possui um carbono assimétrico (pois está ligado aos quatro grupos distintos, –H,
–X, –Y e –Z), o que faz com que ela não tenha eixo de simetria, não possa ser
sobreposta, e sua imagem especular é distinta da molécula “real”. Assim, existem
duas moléculas distintas com fórmula molecular CHXYZ, que diferem na
configuração espacial dos grupos ligados ao carbono (veja o esquema mostrado
na figura a seguir, que mostra a diferença entre as moléculas de fórmula genérica
CH3X, CH2XY e CHXYZ).
182
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

FIGURA 23 – DIFERENÇAS ESTRUTURAIS ENTRE MOLÉCULAS DE FÓRMULA GENÉRICA CH3X,


CH2XY E CHXYZ

FONTE: A autora

Assim, moléculas com um carbono assimétrico apresentam quiralidade e


um par de isômeros, que são chamados de enantiômeros. Dessa forma, o ácido
lático, o 4-octanol e o 2,4-dimetilhexano, mostrados anteriormente, existem, cada
um, como um par de enantiômeros devido à presença do carbono assimétrico.

FIGURA 24 – PAR DE ENANTIÔMEROS DO ÁCIDO LÁTICO, DO 2,4-DIMETILHEXANO E DO


4-OCTANOL

FONTE: A autora

183
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Para não restar dúvidas, observe a figura a seguir. Mesmo orientandos o


par de enantiômeros dos mais diversos modos, não existe nenhuma forma que
seja capaz de sobrepô-los. Se, por exemplo, conseguimos sobrepor os grupos
–H e –CH3, os grupos –OH e –CO2H não se sobrepõem; da mesma maneira, ao
sobrepormos os grupos –CH3 e –CO2H, os grupos –H e –OH não se sobrepõem.
Isso confirma que os enantiômeros são moléculas distintas.

FIGURA 25 – TENTATIVA DE SOBREPOSIÇÃO DOS ENANTIÔMEROS DO ÁCIDO LÁTICO

FONTE: A autora

4.1 REPRESENTAÇÃO DOS ENANTIÔMEROS


Imaginar os enantiômeros não é uma tarefa muito fácil, pois é preciso ter
uma boa visualização tridimensional para determinar as posições em que cada
grupo está orientado no espaço. O uso de modelos moleculares é uma ótima
alternativa para uma melhor compreensão dos aspectos estruturais das moléculas
orgânicas. No entanto, como discutido nas unidades anteriores, existem formas
de representação estrutural das moléculas que indicam sua geometria. Para
representar os enantiômeros, as representações mais utilizadas são a fórmula em
perspectiva e a projeção de Fischer.

Para relembrar, a fórmula em perspectiva é um modelo que indica, no


plano do papel, a configuração tridimensional de uma molécula. Para isso,
usamos três tipos de linhas para representar as ligações: 1) linhas finas e sólidas
para representar as ligações posicionadas no plano do papel; 2) linhas mais
espessas e sólidas para indicar as ligações saindo do plano do papel; e 3) linhas
espessas e tracejadas para representar as ligações entrando no plano do papel).
A figura a seguir mostra os pares de enantiômeros do ácido 2-bromopropanoico
representado segundo a fórmula em perspectiva.
184
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

Vale ressaltar que para desenhar o par de enantiômeros utilizando a


fórmula em perspectiva, um modo muito usual é desenhar um deles colocando os
grupos ligados ao carbono assimétrico em qualquer ordem (respeitando o arranjo
tridimensional das ligações, em que duas dessas ligações estão posicionadas no
plano do papel, uma está direcionada como que saindo do papel, e a outra está
como que entrando no papel), e, depois, desenhar o segundo enantiômero como
a imagem especular do primeiro.

FIGURA 26 – PAR DE ENANTIÔMEROS DO ÁCIDO 2-BROMOPROPANOICO


DE ACORDO COM A FÓRMULA EM PERSPECTIVA

FONTE: A autora

A projeção de Fischer foi desenvolvida por Emil Fischer (químico alemão,


1852-1919) com o intuito de representar as estruturas dos carboidratos, mas
pode ser utilizada para indicar enantiômeros mais simples (como aqueles que
possuem apenas um carbono assimétrico e cujos grupos ligados a ele não são
muito complexos), pois com o aumento da complexidade da molécula, a projeção
de Fischer pode se tornar confusa.

A projeção de Fischer representa as quatro ligações do carbono assimétrico


na forma de linhas que se cruzam. Dessa forma, o carbono assimétrico é indicado
pelo ponto de intersecção das duas linhas perpendiculares, sendo que linhas
horizontais representam as ligações que se projetam para fora do plano do
papel e linhas verticais representam as ligações que se direcionam para dentro
do plano do papel. A figura a seguir mostra o par de enantiômeros do ácido
2-bromopropanoico representado segundo a projeção de Fischer.

Para desenhar o par de enantiômeros utilizando a projeção de Fischer,


desenhamos o primeiro dos enantiômeros colocando os grupos ligados ao
carbono assimétrico em qualquer ordem. Depois, desenhamos o segundo
enantiômero mudando de lugar ou os grupos colocados na linha horizontal ou os
grupos colocados na linha vertical. De fato, não importa se mudarmos os grupos
na horizontal ou na vertical, mas de forma visual, se mudarmos os grupos das
ligações na horizontal os enantiômeros vão parecer imagens especulares no papel
(como feito para identificar os enantiômeros na Figura 27).

185
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 27 – PAR DE ENANTIÔMEROS DO ÁCIDO 2-BROMOPROPANOICO


DE ACORDO COM A PROJEÇÃO DE FISCHER

FONTE: A autora

EXEMPLO – Desenhe o par de enantiômeros do 2-bromobutano de


acordo com a:

a) Fórmula em perspectiva.
b) Projeção de Fischer.

RESPOSTA

a) O primeiro passo é identificar o carbono assimétrico na molécula.


Para isso, é importante desenhar a estrutura da molécula usando, por exemplo,
a fórmula condensada ou a fórmula de traços de Kekulé. Aqui, utilizaremos a
fórmula de traços de Kekulé.

Então, pelo nome da molécula, podemos definir a estrutura do


2-bromobutano como tendo a cadeia carbônica principal formada por quatro
carbonos, tendo um substituinte bromo no carbono de número 2 e sendo um
alcano (cujos átomos de carbono da cadeia principal têm todos hibridização
sp3, ou seja, são ligados entre si por ligações simples). Assim, a estrutura do
2-bromobutano é:

Analisando essa estrutura, podemos ver que apenas o carbono de número


2 possui quatro grupos distintos ligados a ele (–H, –Br, –CH3 e –CH2CH3), sendo
assim, o único carbono assimétrico da molécula (confirme essa informação

186
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

analisando os grupos ligados aos outros carbonos). Assim, um modo de


representar o primeiro enantiômero do 2-bromobutano utilizando a fórmula em
perspectiva é:

Lembre-se de que podemos escolher a ordem em que vamos representar


os grupos no primeiro enantiômero. É apenas preciso lembrar que a estrutura
geométrica tetraédrica quando representada no plano do papel tem dois dos grupos
ligados ao carbono assimétrico colocados no plano do papel, e representados
pelas linhas finas e sólidas, um grupo saindo do plano do papel, representado
por uma ligação com linha mais espessa e sólida, e um grupo entrando no plano
do papel, cuja ligação é representada por uma ligação espessa e tracejada. Assim,
para a representação do primeiro enantiômero, escolhemos colocar os grupos –H
e –Br no plano do papel, o grupo –CH2CH3 como que saindo do plano do papel e
o grupo –CH3 entrando no plano do papel.

Agora, para desenhar o segundo enantiômero, faremos como a imagem


especular do primeiro enantiômero. Assim:

b) Para desenhar os enantiômeros de acordo com a projeção de Fischer,


devemos colocar o carbono assimétrico na intersecção entre as linhas horizontais
e verticais (que representam as ligações entre o carbono assimétrico e os grupos
ligados a ele) e definir uma ordem qualquer para desenhar o primeiro enantiômero.
Desse modo, podemos representar o primeiro enantiômero como:

187
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Da mesma forma que utilizados para a representação dos enantiômeros


de acordo com a fórmula em perspectiva, o segundo enantiômero é desenhado
como imagem especular do primeiro enantiômero (para isso, apenas trocamos de
lugar os grupos representados na horizontal). Assim:

Perceba que, nos exemplos anteriores, referimo-nos ao par dos


enantiômeros do 2-bromobutano como “enantiômero 1” e “enantiômero 2”.
É claro que se os enantiômeros são moléculas diferentes, com configurações
diferentes, é necessário também que elas sejam nomeadas de um modo que
possam ser identificadas. Veremos, no subtópico a seguir, como são nomeados
os enantiômeros.

NOTA

Os modelos moleculares são modelos de representação tridimensional de


entidades químicas que utilizam esferas de diversas cores e varetas para representar
os átomos e as ligações químicas (assim como os ângulos teóricos dessas ligações),
respectivamente. Os modelos moleculares permitem a visualização das ligações
químicas que ocorrem entre os átomos que compõe uma molécula, mas contribuem
significativamente no desenvolvimento da percepção espacial das moléculas.

4.2 NOMENCLATURA R,S


Este subtópico é mais explicativo, pois foge um pouco do escopo deste
livro de estudos, foi desenvolvido para que você saiba que existe um sistema de
nomenclatura para identificar cada um dos enantiômeros do par e para que você
tenha uma ideia geral de como é determinada essa nomenclatura.

Esse sistema é chamado de nomenclatura R,S e é utilizado para identificar


a configuração dos grupos ligados ao carbono assimétrico de uma determinada
molécula (ou seja, para identificar os enantiômeros). A nomenclatura R,S
identifica o enantiômero de configuração R (que vem do termo em latim “rectus”,
que significa “direito”) e o enantiômero de configuração S (que vem do termo em
latim “sinister”, que significa “esquerdo”) e foi desenvolvido por Robert Sidney
Cahn (químico inglês, 1899-1981), Christofer Ingold (químico inglês, 1893-1970) e
Vladimir Prelog (químico bósnio, 1906-1998).

188
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

Essa nomenclatura se baseia nas regras de prioridade relativa entre os


grupos ligados ao carbono assimétrico (que segue as mesmas regras para a
definição da nomenclatura E,Z para os isômeros de alcenos). Para relembrar,
para definirmos a prioridade relativa dos grupos, temos que seguir duas regras
principais:

• Regra 1: devemos identificar o carbono assimétrico e os grupos ligados a ele;


assim, precisamos atribuir as prioridades relativas desses grupos, de modo que
precisamos identificar os átomos de cada grupo que estão ligados diretamente
ao carbono assimétrico. Como para a nomenclatura E,Z, átomos de maior
número atômico têm maior prioridade, desse modo, a maior prioridade relativa
é definida para o átomo de número atômico maior e a menor prioridade é
dada ao átomo de número atômico menor.

• Regra 2: se não for possível determinar a prioridade relativa analisando os


átomos ligados diretamente ao carbono (ou seja, quando esses átomos são
iguais), devemos analisar o segundo átomo dos grupos; se ainda não for
possível determinar a prioridade, devemos continuar observando os átomos
em sequência até atingir o ponto (ou o átomo) diferente.

Vamos atribuir a ordem de prioridade para os grupos ligados ao carbono


assimétrico no ácido lático. O primeiro passo é identificar quais são esses grupos,
que são: –H, –OH, –CH3 e –COOH. Assim, o grupo de maior prioridade é o –OH
(já que o átomo de oxigênio tem o número atômico maior entre os grupos, Z=8). O
–CH3 e –COOH possuem como átomo ligado diretamente ao carbono assimétrico
o átomo de carbono, o que indica que eles empatam para definir a prioridade
relativa desses grupos, e, desse modo precisamos analisar o próximo átomo na
ligação de cada um desses grupos: para o –CH3 temos um átomo de hidrogênio
(Z=1) e para o –COOH temos um átomo de oxigênio (Z=8), o que indica que o
grupo –COOH tem maior prioridade. Por fim, o grupo –H é definido como o
de menor prioridade. Na figura a seguir estão indicadas as prioridades relativas
desses grupos (numeradas de 1 a 4, sendo 1 a maior prioridade e 4 a menor).

FIGURA 28 – PRIORIDADE RELATIVA DOS GRUPOS LIGADOS AO CARBONO


ASSIMÉTRICO DO ÁCIDO LÁTICO

FONTE: A autora

189
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Definidas as prioridades relativas, devemos agora orientar os pares


de enantiômeros do ácido lático de modo que o grupo de menor prioridade
(ou seja, o –H) esteja direcionado para trás. É importante sempre lembrarmos
do caráter tridimensional das moléculas, por isso, na figura a seguir são
mostradas as representações dos enantiômeros de acordo com o modelo de
bolas e varetas (para que você possa visualizar melhor a orientação do grupo
de menor prioridade para trás, ou seja, mais afastado, e a consequência disso na
configuração dos outros grupos). A partir dessa representação de bolas e varetas,
podemos também desenhar as fórmulas em perspectiva para esses enantiômeros.
Perceba que as representações em perspectiva estão um pouco diferentes das
representações que estávamos acostumados até esse momento (ou seja, com dois
grupos orientados no plano do papel, um orientado para trás do plano do papel
e outro para frente do plano do papel), agora, temos o grupo –H orientado no
plano do papel e os outros grupos orientados para fora do plano do papel. Isso
acontece apenas porque estamos representando a molécula tridimensional sob
uma nova perspectiva, mas ela continua a mesma (perceba então a necessidade
de visualizar a química sob a ótica tridimensional).

Assim, tendo definido as prioridades relativas dos grupos ligados ao


carbono assimétrico e os enantiômeros 1 e 2 do ácido lático representados em
perspectiva, podemos finalmente atribuir a nomenclatura R,S. Dessa forma,
desenhamos uma seta que parte do grupo de maior prioridade em direção ao
grupo de segunda maior prioridade: se essa seta apontar para o sentido horário,
o enantiômero tem a configuração R; se a seta apontar no sentido anti-horário, o
enantiômero tem a configuração S. Finalmente, o enantiômero 1 tem seu nome
oficial como (S)-ácido lático, e o enantiômero 2 é o (R)-ácido lático.

190
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

FIGURA 29 – DETERMINAÇÃO DA NOMENCLATURA R,S DO ÁCIDO LÁTICO

FONTE: A autora

4.3 PROPRIEDADES DOS ENANTIÔMEROS


As propriedades físicas do par de enantiômeros R,S são exatamente as
mesmas, como mostrado na Tabela 3, que traz os pontos de ebulição e fusão e as
densidades dos isômeros R,S do ácido lático.

TABELA 3 – ALGUMAS PROPRIEDADES DO PAR DE ENANTIÔMEROS R,S DO ÁCIDO LÁTICO

Enantiômero Ponto de fusão Ponto de ebulição Densidade


(R)-ácido lático 17 ºC 122 ºC 1,20 g/cm3
(S)-ácido lático 17 ºC 122 ºC 1,20 g/cm3
FONTE: Bruice (2006, p. 213)

191
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

As propriedades físicas descritas na Tabela 3 são idênticas para os pares


de enantiômeros porque elas não dependem do modo como os grupos ligados
aos carbonos assimétricos estão organizados no espaço (por exemplo, o modo
como os pares de enantiômeros interagem entre si é idêntico, pois as interações
intermoleculares possuem mesma intensidade). Assim, os enantiômeros
apresentam diferença apenas nas propriedades que dependem do arranjo
espacial desses grupos, que são, principalmente o modo como interagem com a
luz polarizada e algumas propriedades biológicas.

As propriedades ópticas das substâncias quirais foram descobertas por


Jean Baptiste Biot (médico e físico francês, 1774-1862) ao estudar a luz plana
polarizada (também chamada de luz polarizada). Biot estudou o efeito da
passagem da luz polarizada através de amostras de compostos orgânicos e
percebeu que alguns desses compostos desviavam o plano de polarização da
luz polarizada. Mais tarde, Joseph Achille Le Bel (químico francês, 1847-1930) e
Jacobus Henricus van't Hoff (químico holandês, 1852-1911) determinaram que
esse desvio da luz polarizada estava associado às substâncias que continham ao
menos um carbono assimétrico (ou seja, são moléculas quirais).

Vale ressaltar que entre os compostos que desviam a luz polarizada,


existem aqueles que giram a luz no sentido horário e aqueles que a giram no
sentido anti-horário. Determinou-se chamar essas moléculas que são capazes de
desviarem a luz polarizada, ou seja, moléculas quirais, de opticamente ativas,
sendo que as moléculas que giram a luz polarizada no sentido anti-horário (para
a esquerda) são denominadas de levógiras e as que giram a luz polarizada no
sentido horário (para a direita) são denominadas de dextrógiras ­– por convenção,
escolheu-se indicar que uma substância é levógira ou dextrógira utilizando o
sinal de menos ou de mais, respectivamente colocado entre parênteses antes do
seu nome (assim, o (–)-ácido lático é uma substância levógira, enquanto que o
(+)-ácido lático é dextrógiro).

De outro modo, quando a luz polarizada passa através de uma solução


de moléculas aquirais, a luz emerge da solução sem sofrer rotação. Assim,
uma molécula aquiral não é capaz de girar o plano de polarização, sendo
opticamente inativa.

É interessante saber que um feixe de luz comum consiste em ondas


eletromagnéticas que oscilam nas mais diferentes posições, já a luz polarizada
oscila em um único plano perpendicular à direção da propagação da luz. A
figura a seguir mostra o esquema para a produção da luz polarizada através
da passagem da luz e a aparelhagem usada para a determinação da rotação da
luz polarizada devido à passagem dessa luz através de uma amostra contendo
moléculas orgânicas quirais.

192
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

FIGURA 30 – EQUIPAMENTO PARA ANÁLISE DE UMA AMOSTRA ORGÂNICA UTILIZANDO A LUZ


POLARIZADA

FONTE: Mcmurry (2012)

Como exposto, outra propriedade que depende da natureza do


enantiômero são algumas propriedades biológicas. Um exemplo clássico é que
o enantiômero levógiro do limoneno, (–)-limoneno, tem odor característico da
laranja, enquanto que o dextrógiro, (+)-limoneno, tem o odor do limão. Além
disso, os enantiômeros podem ser diferenciados por outra substância quiral,
como é o caso de muitos receptores biológicos – em biologia, “receptor” é o
termo utilizado para designar uma dada proteína que tem a capacidade de
se ligar a uma substância específica –. A esta diferenciação dá-se o nome de
reconhecimento quiral, e o receptor quiral interage de maneira diferente com
cada um dos enantiômeros. Basicamente, isso ocorre porque um receptor
é capaz de reconhecer apenas um dos enantiômeros. Na figura a seguir está
esquematizado na forma de um brinquedo de encaixe como o receptor quiral
e o enantiômero interagem: apenas um dos enantiômeros vai se encaixar
perfeitamente ao receptor, sendo assim, reconhecido e apresentando uma
determinada função biológica.

FIGURA 31 – INTERAÇÃO ENTRE OS ENANTIÔMEROS E O RECEPTOR BIOLÓGICO QUIRAL

FONTE: Universidade da química (s.d.)

193
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

Um exemplo muito conhecido e que foi um problema muito importante


nas décadas de 1950 e 1960 foi o caso do fármaco talidomida. Foi identificado que o
enantiômero dextrogiro, (+)-talidomida, possuía efeito sedativo. No entanto, a droga
era vendida como uma mistura racêmica (uma mistura racêmica, também chamada
de racemato, é a mistura em quantidades iguais dos dois enantiômeros de uma
molécula quiral), e logo se percebeu que o enantiômero levógiro, (–)-talidomida,
é um agente teratogênico (ou seja, uma substância que, estando presente durante
a vida embrionária ou fetal, pode causar má formação nos fetos). Atualmente,
não se utiliza os dois enantiômeros de uma droga sem testá-los exaustivamente
e, geralmente, utiliza-se somente um deles, pois, a exemplo do que normalmente
acontece na natureza, apenas um dos enantiômeros é produzido (e não uma
mistura racêmica), já que existe apenas um deles que tem atividade biológica – a
penicilina V, por exemplo, é isolada do fungo Penicillium, apenas com a configuração
2S,5R,6R (isso significa que a penicilina V tem três carbonos assimétricos, e que
o carbono assimétrico identificado pelo número 2 tem configuração S, enquanto
que os carbonos assimétricos de número 5 e 6 têm configuração R), pois apenas
esse enantiômero é um antibiótico; o outro enantiômero da penicilina V pode ser
produzido em laboratório, mas não tem qualquer atividade biológica.

E
IMPORTANT

DROGAS QUIRAIS

Até muito recentemente, a maioria das drogas eram comercializadas como misturas
racêmicas devido ao alto custo da separação de enantiômeros. Em 1992 o FDA (Food and
Drug Administration — instituição americana que regulamenta o uso de medicamentos
e alimentos naquele país) estabeleceu uma política que encorajava as companhias
farmacêuticas a usar os avanços recentes em técnicas de sínteses e separação para
desenvolver drogas com um único enantiômero. Agora um terço de todas as drogas
vendidas são enantiômeros puros. Um novo tratamento para a asma utiliza um enantiômero
puro chamado Singulair. Os antidepressivos Zoloft® e Paxil® (enantiômeros puros)
estão reduzindo o mercado do Prozac® (um racemato). O exame de uma droga com
enantiômero puro é simples, pois se a droga é vendida como um racemato o FDA requer
que ambos os enantiômeros sejam testados. Testes mostraram que a (S)-(+)-cetamina é
um analgésico quatro vezes mais potente que a (R)-(–)-cetamina e, ainda mais importante,
o distúrbio dos efeitos colaterais parecem estar associados somente ao enantiômero (R)-
(–). A atividade do ibuprofeno, analgésico popular comercializado como Advil®, Nuprin® e
Motrin®, reside principalmente no enantiômero (S)-(+). O FDA tem algumas preocupações
com a aprovação de drogas como enantiômeros puros devido à possibilidade de overdose
das drogas. As pessoas que estão tomando duas pílulas poderiam tomar somente uma?
O vício da heroína pode ser mantido com o (–)-α-acetilmetadol por um período de 72
horas quando comparado com as 24 horas da metadona racêmica. Isso significa visitas
menos frequentes à clínica, e uma única dose pode ser dada ao viciado por um final de
semana inteiro. Outra razão para o aumento das drogas enantiomericamente puras é que
as companhias farmacêuticas podem estender a patente pelo desenvolvimento de uma
droga como um enantiômero puro que foi comercializado anteriormente como racemato.

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TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

FONTE: BRUICE, Paula Yurkanis. Contribuintes de ressonância e híbridos de ressonância.


Química Orgânica. 4. ed. [S.l.]: Pearson Education do Brasil, 2006.

UNI DICA: Recomendamos a leitura dos seguintes textos:


COELHO, Fernando A. S. Fármacos e quiralidade. Cadernos temáticos de química nova
na escola. v. 3, n. 3, p. 23–32, 2001. Disponível em: <http://qnesc.sbq.org.br/online/
cadernos/03/quiral.pdf>.

CALIXTO, Carolina Maria Fioramonti; CAVALHEIRO, Éder Tadeu Gomes. Penicilina: Efeito
do acaso e momento histórico no desenvolvimento científico. Química nova na escola. v.
34, n. 3, p. 118–123, 2012. Disponível em: <http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc34_3/03-
QS-92-11.pdf?agreq=quiral&agrep=qnesc,qnint>.

PILLI, Ronaldo Aloise. Catálise assimétrica e o prêmio nobel de química de 2001. Novos
paradigmas e aplicações. Química nova na escola. v. 14, p. 16–24 , 2001. Disponível em:
<http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc14/v14a04.pdf?agreq=quiral&agrep=qnesc,qnint>.

5 DIASTEREOISÔMEROS
Até agora tratamos de moléculas que apresentam apenas um carbono
assimétrico, originando, portanto, um par de enantiômeros que se diferenciam
pelo modo com que os grupos estão organizados no espaço, como é o caso dos
pares de enantiômeros do ácido lático, do 4-octanol e do 2,4-dimetilhexano e do
2-bromobutano. No entanto, como já introduzido anteriormente, foi dito que
a penicilina V possuía três carbonos assimétricos, muitos compostos orgânicos
encontrados na natureza apresentam mais de um carbono assimétrico. Dessa
forma, moléculas com mais de um carbono assimétrico terão mais configurações
possíveis além do par de enantiômeros. Por exemplo, o ácido 2-amino-3-
hidroxidobutanóico (chamado comumente de aminoácido treonina) possui dois
carbonos assimétricos, existindo na forma dos quatro estereoisômeros mostrados
na figura a seguir. Na verdade, sabendo quantos carbonos assimétricos uma
substância tem, pode-se calcular o número máximo de estereoisômeros possíveis
para aquela substância: uma substância pode ter o máximo de 2n estereoisômeros,
em que n é igual ao número de carbonos assimétricos (como o ácido 2-amino-3-
hidroxidobutanóico tem dois carbonos assimétricos, então, 22=4 estereoisômeros).

FIGURA 32 – ISÔMEROS DO 2-AMINO-3-HIDROXIDOBUTANOICO

FONTE: Universidade da química (s.d.)

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UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

De fato, como podemos ver na figura, os quatro estereoisômeros do ácido


2-amino-3-hidroxidobutanóico se constituem de dois pares de enantiômeros.
Os estereoisômeros 1 e 2 (ou seja, com configuração 2R,3R e 2S,3S) são imagens
especulares um do outro, assim como os estereoisômeros 3 e 4 (com configuração
2R,3S e 2R,3S). Assim, os pares que possuem imagens especulares entre si são,
portanto, enantiômeros, como já vimos. No entanto, qual a relação entre os
estereoisômeros 1 e 3, por exemplo? Como eles são estereoisômeros entre si,
mas não são imagens especulares um do outro, dizemos, então, que eles são
diastereoisômeros. Desse modo, diastereoisômeros é o termo utilizado para se
referir aos estereoisômeros que não são enantiômeros. Para o ácido 2-amino-3-
hidroxidobutanóico, além dos estereoisômeros 1 e 3, os estereoisômeros 1 e 4, 2
e 3, e 2 e 4 também são diastereoisômeros (vale dizer que os isômeros cis-trans
também são considerados diastereoisômeros, pois são estereoisômeros que não
são imagens especulares, ou seja, não são enantiômeros).

Como vimos, os enantiômeros têm as mesmas propriedades físicas, mas


interagem diferentemente com a luz polarizada e possuem atividade biológica
distinta. Já os diastereoisômeros apresentam diferentes pontos de fusão, pontos de
ebulição, solubilidades, assim como giram a luz polarizada em modos diferentes.

EXEMPLO – Considere os isômeros do 3-cloro-2-butanol mostrados a


seguir e determine quais são enantiômeros e quais são diastereoisômeros.

RESPOSTA

Para relembrar, o 3-cloro-2-butanol tem dois carbonos assimétricos, assim,


ele pode ter quatro estereoisômeros (22=4 estereoisômeros), que se constituem
de dois pares de enantiômeros. Então, analisaremos quais desses isômeros são
imagens especulares um do outro, para definir quais são os pares de enantiômeros.
O método mais fácil para isso é utilizar a analogia do espelho, como temos feito
neste livro de estudos. Assim, podemos determinar que o estereoisômero 1 tem
imagem especular (e não sobreponível) ao estereoisômero 4, e o estereoisômero
2 ao estereoisômero 3. Sendo assim, os estereoisômeros 1 e 4 são um par de
enantiômeros e os estereoisômeros 2 e 3, o outro par de enantiômeros.

196
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

De outro modo, se analisarmos os enantiômeros 1 e 2, veremos que eles


não são imagem especular um do outro e, assim, podemos definir que eles são
diastereoisômeros. O mesmo ocorre entre os enantiômeros 1 e 3, 2 e 4, e 3 e 4,
como mostrado a seguir:

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UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

LEITURA COMPLEMENTAR

O TRIUNFO DOS CANHOTOS


Estudo da Unicamp explica como os aminoácidos se organizam no momento
de formar as proteínas de qualquer ser vivo

Francisco Bicudo

A incessante busca de explicações científicas para a origem da vida apenas


começou com Louis Pasteur, o químico francês que, há um século e meio, provou
que os seres vivos nascem necessariamente de sua própria espécie – no século 19
acreditava-se que fungos, insetos e escorpiões poderiam surgir espontaneamente
do lixo ou de animais em decomposição. As dúvidas sobre a origem da vida que
hoje persistem remetem, curiosamente, a uma propriedade química descoberta
pelo próprio Pasteur: há moléculas formadas pelos mesmos elementos e ligações
químicas, mas se apresentam em dois tipos distintos, que apontam para direções
opostas – um para a esquerda, outro para a direita –, como se estivessem diante
da própria imagem refletida no espelho.

Um fenômeno que envolve essas formas espelhadas e ainda intriga os


cientistas é a formação das proteínas, moléculas formadas por blocos menores,
os aminoácidos, e essenciais a qualquer ser vivo. Fazem parte da estrutura dos
cromossomos, controlam a expressão dos genes, viabilizam a divisão celular,
regulam a produção de energia, atuam na diferenciação das células que vão
formar os tecidos, participam do desenvolvimento embrionário e determinam,
enfim, como os organismos vão se formar, crescer e morrer, pois da formação de
proteínas participam apenas os aminoácidos canhotos, quimicamente chamados
levógeros ou simplesmente L. As moléculas destras, conhecidas como dextrógeros
ou D, são simplesmente eliminadas do jogo, embora as duas formas se apresentem
juntas e em proporções iguais na natureza. Mas como os aminoácidos se separam,
antes de formarem as proteínas, e por que apenas os canhotos triunfam? O
químico Marcos Eberlin, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tem
algumas respostas para a primeira parte da pergunta.

Por meio da espectrometria de massas, uma técnica de análise química


que permite visualizar com precisão o universo molecular, as equipes de Eberlin
e do norte-americano Robert Cooks, da Universidade de Purdue, nos Estados
Unidos, detectaram um processo nunca antes observado: a atração de aminoácidos
canhotos (L) e destros (D) por seus semelhantes. Essa forma de organização, que
permite compreender a separação entre essas moléculas no momento anterior
à síntese de proteínas, deve-se principalmente à geometria: os encaixes são tão
seletivos que impedem que os aminoácidos L se misturem com os D. Tanto os
aminoácidos canhotos e destros formam estruturas cilíndricas, diferenciadas
apenas pelo fato de serem espelhadas, com oito aminoácidos do mesmo tipo.

São os chamados octâmeros, como o da ilustração desta página, que


representa a serina, um dos 20 aminoácidos essenciais que, em diferentes
198
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

combinações, formam milhares de proteínas das plantas e dos animais. Os


octâmeros conectam-se entre si por meio das chamadas ligações hidrogênio,
como as que mantêm unidas as moléculas de água, e formam estruturas cada vez
maiores. “Foi literalmente um achado, um primeiro passo para entender por que
apenas as moléculas L participam da formação das proteínas”, comenta Eberlin,
que coordena o Laboratório Thomson de Espectrometria de Massas do Instituto
de Química.

As informações fornecidas pelo espectrômetro e as simulações


computacionais realizadas por Fábio Gozzo, químico da equipe do Laboratório
Thomson, permitem ver os aglomerados de serinas como se as moléculas
estivessem brincando de roda, dando-se apenas a mão esquerda, no caso dos L,
com os encaixes ajustados nas laterais da estrutura cilíndrica. Se um dos membros
sai do grupo e o substituto só pode dar a mão direita, quebra-se o encadeamento.
“O processo de seleção química dos aminoácidos é uma consequência desse
arranjo tridimensional perfeito”, ressalta Eberlin. “Todas as moléculas apontam
para a mesma direção. Se alterar a dinâmica, o círculo não se fecha com perfeição.
Por isso é que as diferentes são excluídas”.

Outra surpresa foi observar que o cilindro de serina L, colocado em contato


com as formas L e D de outro aminoácido, capturava somente as moléculas L.
Descrito em um artigo publicado em maio na edição internacional da revista
alemã Angewandte Chemie, esse processo – também inédito – ganhou o nome de
transmissão de quiralidade. Quiralidade (de chiros, mão, em grego) é o fenômeno
descrito por Pasteur com o ácido tartárico: as moléculas, quando sobrepostas,
formam um desenho parecido com o que aparece quando colocamos uma mão ao
lado da outra, com a palma e os polegares voltados para a frente. “Observamos
também um mecanismo inédito de propagação de quiralidade da serina para
outros aminoácidos naturais quirais, como cisteína, asparagina, leucina, aspartato
e metionina”, informa Eberlin.

Poluentes e sangue

As descobertas só se viabilizaram com os aperfeiçoamentos da


espectrometria de massas, uma técnica versátil, aplicada, por exemplo, em
exames antidoping, no controle de qualidade de combustíveis e até mesmo no
sequenciamento do conjunto de proteínas de um organismo (proteoma). Com ela,
a equipe de Eberlin não desvenda apenas a organização das moléculas essenciais
à vida. Também amplia o uso da técnica, com sucessivas inovações. Uma das mais
recentes é um método de análise de poluentes, derivado da espectrometria de
massas convencional, mas com uma inovação: usa uma fibra recoberta de silicone
que, depois de uma exposição de apenas um minuto, absorve os poluentes do
ar, do vapor e de líquidos. A fibra facilita a captação, transporte e avaliação das
substâncias, depois transferidas para o espectrômetro, no qual são examinadas.
A descrição dessa técnica, chamada espectrometria de massas por introdução via
fibra (Fims), será publicada em breve na Analytical Chemistry.

199
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

A Fims é a filha mais nova de outras técnicas para análise de poluentes


desenvolvidas no próprio laboratório. A primeira delas é a espectrometria de
massas por introdução via membrana com aprisionamento criogênico (CT-
Mims), que se vale de uma membrana de silicone acoplada ao espectrômetro
para separar os poluentes e reter a água. Esse processo aumenta a sensibilidade
em até cem vezes e em poucos minutos se conhece a concentração em água de
clorofórmio, benzeno e tolueno, por exemplo.

Há também inovações ligadas diretamente à saúde humana. No ano


passado, uma parceria com Nelci Fenalti Höehr, da Faculdade de Ciências
Médicas (FCM) da Unicamp, resultou no uso de uma derivação de uma técnica
criada no próprio laboratório para determinar a quantidade de cisteína e de
homocisteína no sangue. Os dois aminoácidos, que, em concentrações elevadas,
representam fator de risco para doenças cardiovasculares, são capturados do
plasma sanguíneo pela membrana de silicone. Nelci envia as amostras de sangue
ao Instituto de Química e, em minutos, o espectrômetro dá o resultado. “Nossa
meta é oferecer esse serviço como rotina no complexo hospitalar da Faculdade de
Ciências Médicas”, afirma Nelci.

“Vencidas as limitações, hoje podemos trabalhar com qualquer tipo de


molécula, desde as pequenas até os polímeros, sais, açúcares, peptídeos, proteínas
e moléculas gigantescas como até mesmo um vírus intacto”, afirma Eberlin. Sem
dúvida, um avanço e tanto para uma técnica criada no início do século passado
pelo físico britânico Joseph John Thomson (1856-1940), o mesmo que inspirou o
nome do laboratório da Unicamp. Indispensável nos laboratórios de química
e física desde que surgiu, a espectrometria de massas permite isolar estruturas
atômicas e moleculares desde que estejam isoladas, portanto em forma gasosa, e
ionizadas (com carga positiva ou negativa). Desse modo, torna-se possível medir
suas propriedades, como massa, ligações químicas, acidez, reatividade e estruturas.

Piloto em perigo

No início, a ordem dos procedimentos adotados durante as análises


limitava as aplicações: a observação só pode ser feita quando as moléculas são
volatilizadas e recebem uma carga elétrica positiva ou negativa. Esse procedimento
é essencial porque só podem ser separadas ou direcionadas às moléculas cargas
positivas ou negativas – as neutras fogem ao controle. Até o início da década
de 90, no entanto, era preciso que a molécula primeiro vaporizasse dentro do
equipamento, a uma temperatura de até 300 ºC, para só depois ser ionizada. As
análises se restringiam a substâncias orgânicas volatilizáveis e relativamente
pequenas. Nem pensar em açúcares ou proteínas, que se decompõem quando
aquecidos, antes de atingir a fase de vapor.

Para avançar, era preciso inverter a ordem – primeiro ionizar e depois


volatilizar. Foi o que fez, no final dos anos 80, o químico norte-americano John
Fenn, atualmente na Virginia Commonwealth University, Estados Unidos, ao
criar a técnica de Electrospray, que permitiu aos pesquisadores da Unicamp e

200
TÓPICO 2 | ESTEREOQUÍMICA

de Purdue descobrir as formas de organização dos aminoácidos. Primeiro, eles


colocaram as moléculas de serina em água. Com a solução, fizeram um spray
eletrolítico (uma espécie de aerossol formado por gotas minúsculas e carregadas
com carga elétrica positiva ou negativa). Com o aquecimento e a evaporação da
água, as gotas diminuíram de volume – e os octâmeros de serina passaram a se
repelir tão fortemente, que, em determinado momento, foram literalmente ejetados
das gotas para a fase gasosa – sem se decomporem, como certamente ocorreria na
técnica anterior de ionização. “É um processo que tem certa semelhança ao que
acontece quando um piloto de avião pressente o perigo e ejeta-se da aeronave
para o espaço”, compara Eberlin.

Tanto as versões canhotas quanto as destras da serina participaram do


experimento. Como ambas apresentam a mesma massa molecular, à serina
L se adicionou um isótopo de carbono de massa 13, de modo a se diferenciar
as duas formas. Colocadas em água, de maneira aleatória, as moléculas
surpreendentemente reconhecem suas semelhantes e originam dois conjuntos de
oito moléculas, os octâmeros, um contendo somente serinas D e outros reunindo
apenas as L. Os pesquisadores observaram ainda a ligação entre octâmeros
gêmeos, que origina estruturas que reúnem 16, depois 32 e na sequência 64
aminoácidos – e assim sucessivamente. “Para a serina, oito é um número mágico”,
afirma Eberlin.

Os avanços da espectrometria de massas poderão também solucionar a


segunda parte da pergunta: por que os organismos vivos selecionam apenas o
conjunto de aminoácidos esquerdos na construção das proteínas, deixando os
destros apenas assistindo ao jogo? Em busca da resposta, a equipe de Arnaldo
Naves de Brito, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), trabalha em
colaboração com o Laboratório Thomson. Confiante e animado, Brito diz que os
resultados do estudo devem ser conhecidos em breve.

A dificuldade não é apenas reproduzir o ambiente terrestre primitivo,


quando a separação e a seleção teriam ocorrido pela primeira vez. O obstáculo
maior são as propriedades químicas e físicas das moléculas L e D – são quase
idênticas e não indicam, com clareza, os caminhos de investigação a serem
seguidos. Cogita-se até mesmo outro cenário para os encaixes primordiais. “A
seleção de aminoácidos podem ter ocorrido na Terra ou em outra região do
universo, como meteoritos ou cometas, chegando depois aqui”, afirma Ricardo
de Carvalho Ferreira, pesquisador da Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE), que já na década de 50 se dedicava a estudar os sistemas quirais. Apesar
das armadilhas, a tarefa pode ser gratificante. “Estamos tentando entender a
arquitetura química dos seres vivos”, diz Eberlin.

FONTE: BICUDO, Francisco. O triunfo dos canhotos. Pesquisa FAPESP. p. 36–39, set.
2002. Disponível em: <http://revistapesquisa.fapesp.br/2002/09/01/o-triunfo-dos-
canhotos/>. Acesso em: 18 jun. 2018.

201
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma molécula quiral tem imagem especular não sobreponível, enquanto que
uma molécula aquiral tem imagem especular sobreponível.

• Uma molécula é dita quiral se ela tem ao menos um carbono assimétrico.

• Um carbono assimétrico é um carbono ligado a quatro grupos (ou átomos)


diferentes.

• Moléculas de imagem especular não sobreponíveis são chamadas de


enantiômeros.

• A nomenclatura utilizada para identificar os enantiômeros do par é a


nomenclatura R,S.

• Substâncias quirais são opticamente ativas (elas giram o plano da luz


polarizada), enquanto que substâncias aquirais são opticamente inativas.

• Diastereoisômeros são estereoisômeros que não são enantiômeros.

• Os diastereoisômeros aparecem quando uma molécula tem mais de um


carbono assimétrico.

202
AUTOATIVIDADE

1 Qual das moléculas mostradas a seguir é quiral? Identifique os carbonos


assimétricos.

2 Identifique os carbonos assimétricos nas seguintes moléculas.

3 Defina se os isômeros são um par de enantiômeros ou são diastereoisômeros:

203
204
UNIDADE 3
TÓPICO 3

BENZENO E AROMATICIDADE

1 INTRODUÇÃO
O termo “aromático” foi proposto por August Wilhelm von Hoffmann (químico
alemão, 1818-1892) para se referir a uma classe de moléculas que possuía odores
característicos, como o benzaldeído, que é o composto que dá o cheiro de certas frutas
e das amêndoas, o tolueno, extraído do bálsamo de tolu, e o benzeno, responsável pelo
cheiro do carvão destilado. No entanto, com o avanço do conhecimento, determinou-se
que, na verdade, esses compostos tinham estruturas e propriedades químicas que as
diferenciavam dos outros compostos orgânicos. Desse modo, o termo “aromático” é
agora utilizado para se referir ao benzeno e aos seus derivados.

Existem diversos compostos aromáticos extraídos de fontes naturais, como


os aminoácidos fenilalanina, tirosina e triptófano, o opioide morfina (isolado
da papoula) e o hormônio estrona (secretado pelo ovário). Outros compostos
aromáticos, como o próprio benzeno, o xileno e o naftaleno, são encontrados no
carvão mineral, que é, na verdade, a fonte principal para a obtenção de compostos
aromático. A figura a seguir mostra as estruturas para esses compostos.

FIGURA 33 – ESTRUTURA DE ALGUNS COMPOSTOS AROMÁTICOS

FONTE: A autora
205
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

2 A ESTRUTURA DO BENZENO
Desde sempre, sabia-se que o benzeno era um composto insaturado
formado por ligações duplas C=C, tendo como fórmula molecular C6H6,
característico dos alcenos. No entanto, o benzeno é muito mais estável que os
alcenos, além de reagir de maneira distinta ao modo como os alcenos reagem.
Isso confundiu os químicos da época, pois eles perceberam que, apesar de
ter uma fórmula molecular condizente com a fórmula geral definida para os
alcenos, a estrutura do benzeno tinha suas particularidades que distinguia suas
propriedades químicas desse grupo funcional.

Durante muito tempo tentou-se definir a estrutura do benzeno. Sabendo


sua fórmula molecular, os químicos pensavam que ou o benzeno era formado por
uma cadeia carbônica aberta contendo dois carbonos com hibridização sp2 (ou seja,
duas ligações duplas C=C) distribuídos de forma alternada na cadeia, ou era uma
estrutura cíclica formada por seis carbonos contendo três carbonos com hibridização
sp2 (três ligações duplas C=C) também distribuídos de forma alternada.

FIGURA 34 ­– IDEIA DAS POSSÍVEIS ESTRUTURAS DO BENZENO

FONTE: A autora

Todavia, nenhuma dessas estruturas era ainda condizente com o modo


com que o benzeno reagia, não explicando, portanto, os produtos das reações
químicas envolvendo o benzeno. Assim, Kekulé, em 1865, sugeriu que o benzeno
tinha uma estrutura cíclica com ligações duplas C=C e simples C–C alternadas,
que, na verdade, não era uma substância única, mas uma mistura de duas
substâncias que se convertiam uma na outra rapidamente.

FIGURA 35 – ESTRUTURA DO BENZENO DE ACORDO COM KEKULÉ

FONTE: A autora

206
TÓPICO 3 | BENZENO E AROMATICIDADE

As estruturas dinâmicas do benzeno propostas por Kekulé conseguiram


explicar a fórmula molecular e algumas das propriedades químicas relacionadas
às reações que o benzeno sofre. Porém, não foram suficientes para explicar, por
exemplo, a grande estabilidade do benzeno frente aos alcenos. Somente em
1930, com o desenvolvimento de técnicas mais avançadas de caracterização de
substâncias, foi possível, finalmente, determinar a estrutura real do benzeno.
Com resultados obtidos por raios-X, chegou-se que o benzeno é uma molécula
cíclica planar cujas seis ligações entre carbonos possuem exatamente o mesmo
comprimento e a mesma energia. Isso indica que as ligações entre os carbonos
são iguais e, portanto, não existem ligações duplas C=C e simples C–C alternadas,
como sugerido por Kekulé anteriormente. Como essas ligações podem ser iguais,
considerando a fórmula molecular C6H6 do benzeno e o preceito de que o carbono
sempre faz quatro ligações químicas?

A resposta para isso é baseada no conceito de deslocalização eletrônica.


Pode-se dizer que elétrons ligantes (ou seja, os elétrons de valência que participam
de uma ligação química) quando limitados a uma única ligação entre dois átomos,
ou seja, restritos a uma região específica da molécula, são chamados elétrons
localizados. De outro modo, existem muitas moléculas orgânicas que possuem
elétrons chamados de deslocalizados, que são aqueles que não estão limitados a
uma ligação química entre dois átomos, sendo, portanto, compartilhados por três
ou mais átomos.

Na figura a seguir são apresentados exemplos de moléculas que


contém apenas elétrons localizados e moléculas que possuem também elétrons
deslocalizados (em química, o modo de se indicar que existem elétrons
deslocalizados é por meio das linhas tracejadas colocadas nas ligações químicas
da molécula). É importante notar que elétrons deslocalizados sempre são elétrons
que participam de ligações p e nunca os que participam das ligações s, portanto,
apenas moléculas que possuem carbonos com hibridização sp2 vão apresentar
deslocalização eletrônica. Isso porque essa deslocalização ocorre devido à
superposição lateral dos orbitais p não hibridizados dos carbonos sp2, que é o
que, justamente, define uma ligação p. Para ficar mais claro, vamos ver como a
deslocalização eletrônica ocorre no benzeno.

207
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 36 – EXEMPLOS DE MOLÉCULAS COM ELÉTRONS LOCALIZADOS E DESLOCALIZADOS

FONTE: A autora

Voltando então ao benzeno, em 1930, determinou-se sua estrutura.


A partir de agora, sabe-se que o benzeno é uma molécula planar, como dito
anteriormente, e que cada um dos seis átomos de carbono da estrutura cíclica
do anel possui hibridização sp2 (são, portanto, iguais). Para a formação das
ligações entre os carbonos, cada carbono sp2 sobrepõe dois dos seus orbitais sp2
aos orbitais sp2 de dois outros carbonos, enquanto que o terceiro orbital sp2 se
sobrepõe ao orbital s de um hidrogênio. Como os carbonos possuem hibridização
sp2, existe ainda um orbital p não hibridizado para cada carbono que, devido
ao benzeno ser planar, os orbitais p dos seis átomos de carbono do anel estão
paralelos entre si (caso você precise relembrar esses conceitos de hibridização e
sobreposição de orbitais para a formação de ligações químicas, volte à Unidade
1). Esses orbitais p não hibridizados estão próximos o suficiente, o que permite
uma superposição lateral entre eles, fazendo com que cada orbital p de cada um
dos carbonos se sobreponha aos orbitais p dos dois carbonos ligados a ele. Assim,
essa superposição lateral dos orbitais p forma uma espécie de nuvem eletrônica
que engloba todos os carbonos do anel, fazendo então com que os elétrons
das ligações p (ou seja, das ligações decorrentes das superposições laterais de
orbitais p não hibridizados) estejam deslocalizados, ou seja, são compartilhados
igualmente pelos seis carbonos do anel de benzeno. A figura a seguir traz os
esquemas que mostram como os orbitais p não hibridizados de cada carbono
com hibridização sp2 estão dispostos no plano tridimensional (paralelos entre
si), a nuvem eletrônica formada devido à superposição lateral desses orbitais p
e o mapa de potencial eletrostático para o benzeno, mostrando que a densidade
eletrônica em toda a molécula é igual, pois todas as ligações entre os carbonos são
iguais (já que a molécula é simétrica (vemos que a densidade eletrônica é igual
por toda a molécula, pois não há regiões com cores diferentes, indicando que não
há regiões mais ricas ou pobres em elétrons).

208
TÓPICO 3 | BENZENO E AROMATICIDADE

FIGURA 37 – ESTRUTURA ELETRÔNICA DAS LIGAÇÕES p E MAPA DE POTENCIAL


ELETROESTÁTICO DO BENZENO

FONTE: Adaptado de Bruice (2016)

Assim, com base no que foi exposto, cada um dos elétrons participantes
das ligações p do benzeno não estão limitados a uma única ligação entre dois
carbonos (como aconteceria em um alceno, por exemplo). Como esses elétrons
estão deslocalizados (são compartilhados por todos os seis carbonos), eles acabam
como que por vagar livremente por toda a extensão da nuvem eletrônica formada
pela superposição lateral dos orbitais p, tornando todas as ligações entre carbonos
do anel idênticas. Os modos mais usuais de representar essa deslocalização
eletrônica da molécula de benzeno é desenhar os elétrons deslocalizados por
linhas tracejadas ou por um círculo que englobe todo o interior do hexágono (que
representa o anel cíclico de seis carbonos).

FIGURA 38 – REPRESENTAÇÃO DA ESTRUTURA DO BENZENO

FONTE: A autora

UNI

Diz-se que em 1890, Kekulé, em um discurso realizado durante a comemoração


do seu primeiro artigo sobre a estrutura cíclica do benzeno, alegou que ele havia conseguido
definir a estrutura do benzeno por meio de um sonho. Nesse sonho, ele viu as cadeias
carbônicas se movendo como uma cobra, quando, inesperadamente, essa cobra mordeu
seu próprio rabo, formando um anel que ficava constantemente girando. Isso o ajudou a
criar a ideia de que a estrutura do benzeno era uma interconversão entre duas estruturas,
como discutido.

209
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

3 CONTRIBUINTES E HÍBRIDOS DE RESSONÂNCIA


O uso de linhas tracejadas, como mostrado na figura anterior, é importante
para enfatizar que na verdade não existem puramente ligações duplas C=C, mas
sim uma estrutura sobre a qual existe uma nuvem de elétrons deslocalizados.
No entanto, ela não deixa claro quantos elétrons estão participando das ligações
p. Assim, existe uma outra forma de representar a estrutura do benzeno, que
se utiliza de estruturas aproximadas, nas quais os elétrons deslocalizados
acabam sendo indicados como elétrons localizados. Assim, o benzeno pode ser
representado na forma de duas estruturas aproximadas, em que cada uma é
chamada de contribuinte de ressonância. A combinação dos dois contribuintes de
ressonância gera o híbrido de ressonância, que é representado pela estrutura com
linhas tracejadas. A figura a seguir mostra os dois contribuintes de ressonância
e o híbrido de ressonância para o benzeno. Note que a partir dos contribuintes
de ressonância, os elétrons participantes das ligações p são representados
como ligações duplas C=C e, de um contribuinte de ressonância para o outro,
temos a impressão de que essas ligações duplas estão como que girando ao
redor das ligações entre carbonos do anel, como se houvesse a interconversão
dessas estruturas (o que está errado, como discutido). Apesar de essa ideia estar
incorreta, agora é possível determinar que existem seis elétrons que participam
das ligações p (um par de elétrons para cada ligação dupla), o que é importante
para se analisar, por exemplo, a reatividade de compostos aromáticos ou com
elétrons deslocalizados.

FIGURA 39 – REPRESENTAÇÃO DOS CONTRIBUINTES DE RESSONÂNCIA E DO


HÍBRIDO DE RESSONÂNCIA DO BENZENO

FONTE: A autora

210
TÓPICO 3 | BENZENO E AROMATICIDADE

Na figura, os contribuintes de ressonância estão representados com


uma seta de ponta dupla colocada entre eles. É importante que você entenda
que a seta não indica que esses contribuintes estão em equilíbrio (ou seja, estão
se interconvertendo um no outro indefinidamente), mas sim que a estrutura
verdadeira (representada pelo híbrido de ressonância) existe de algum modo entre
esses contribuintes de ressonância. Assim, os contribuintes de ressonância são
apenas um modo conveniente de indicar os elétrons que participam das ligações
p, não demonstrando a distribuição eletrônica real da molécula. Por exemplo,
a ligação entre os carbonos de números 1 e 2 não é uma ligação dupla, apesar
do contribuinte de ressonância à esquerda na Figura 39 mostrar que sim; e do
mesmo modo, não é uma ligação simples, como representado pelo contribuinte de
ressonância à direita. Assim, os contribuintes de ressonância não representam a
estrutura real do benzeno, que é, na verdade, como que uma média das estruturas
desses dois contribuintes de ressonância (o híbrido de ressonância). Isso pode ser
melhor entendido com a seguinte analogia feita por Bruice (2006, p. 265):

Imagine que você está tentando descrever para um amigo o que é


um rinoceronte. Você poderia dizer que um rinoceronte é o resultado
do cruzamento entre um unicórnio e um dragão. O unicórnio e o
dragão não existem realmente, portanto são como contribuintes de
ressonância. Eles não estão em equilíbrio: um rinoceronte não pula
para trás e para frente entre os dois contribuintes de ressonância,
uma hora se parecendo com um unicórnio e outra com um dragão.
O rinoceronte é real, então ele é como o híbrido de ressonância. O
unicórnio e o dragão são simplesmente meios de representar com o que
a estrutura real, o rinoceronte, se parece. Contribuintes de ressonância,
como unicórnios e dragões, são imaginários, não são reais. Somente o
híbrido de ressonância, o rinoceronte, é real.

FIGURA 40 – ANALOGIA PARA DEFINIR O QUE SÃO OS CONTRIBUINTES DE RESSONÂNCIA


E O HÍBRIDO DE RESSONÂNCIA

FONTE: Bruice (2006, p. 265)

211
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

4 NOMENCLATURA DOS COMPOSTOS AROMÁTICOS


Um composto aromático é definido por um composto orgânico que tem na
sua estrutura ao menos um anel benzênico (ou seja, a estrutura de um benzeno).
Assim como os alcanos, alcenos e alcinos, a IUPAC (2018) também define regras
para a nomenclatura sistemática dos compostos aromáticos:

Primeiramente, os benzenos monossubstituídos (ou seja, que possuem


apenas um grupo substituintes) são nomeados seguindo exatamente as
mesmas regras para a nomenclatura dos alcanos, alcenos e alcinos, discutidas
anteriormente, mas agora, o sufixo utilizado é o -benzeno. Na figura a seguir
são mostrados alguns exemplos da nomenclatura sistemática dos benzenos
monossubstituídos.

FIGURA 41 – EXEMPLOS DE COMPOSTOS AROMÁTICOS MONOSSUBSTITUÍDOS

FONTE: A autora

Como mostrado, o nitrobenzeno e o clorobenzeno possuem como


substituintes o grupo nitro e o cloro, respectivamente. Já o propilbenzeno tem
como grupo substituinte um grupo alquila e, com grupos alquila é preciso tomar
um certo cuidado. A nomenclatura do propilbenzeno está correta de acordo com
as regras da IUPAC, já que o grupo propila é definido como o substituinte do anel
benzênico, pois ele possui cadeia carbônica menor do que o benzeno (o grupo
propila tem três carbonos, enquanto que o benzeno tem seis). No entanto, se o
grupo alquila for formado por uma cadeia carbônica maior que seis carbonos, o
composto será identificado como um alcano substituído que contém um grupo
fenil – o termo “fenil” é o nome dado ao anel benzênico quando ele é um grupo
substituinte. Como mostrado na figura a seguir, o 2-fenil-heptano e o 3-metil-2-
fenil-hexano são considerados como alcanos substituídos porque a cadeia aberta
do alcano é maior do que a cadeia carbônica do benzeno, o que faz com que a
primeira seja definida como a cadeia principal e a segunda como substituinte.

212
TÓPICO 3 | BENZENO E AROMATICIDADE

FIGURA 42 – EXEMPLOS DE ALCANOS SUBSTITUÍDOS COM O ANEL BENZÊNICO

FONTE: A autora

No caso em que o composto é um benzeno dissubstituído (possuem dois


grupos substituintes). Se os substituintes ocuparem as posições 1 e 2 do anel,
eles serão nomeados utilizando-se o prefixo orto-; agora, se esses substituintes
estivem nas posições 1 e 3, e 1 e 4, eles serão indicados utilizando-se os prefixos
meta- e para-, respectivamente. É comum também identificar os compostos orto,
meta e para utilizando-se apenas os prefixos o-, m- e p-, respectivamente.

FIGURA 43 – COMPOSTOS AROMÁTICOS COM SUSBTITUINTES NAS POSIÇÕES ORTO,


META E PARA

FONTE: A autora

Benzenos com mais de dois substituintes são nomeados identificando


a posição dos substituintes no anel. Para isso, deve-se associar as posições de
menores números possíveis, como indicado.

213
UNIDADE 3 | GRUPOS FUNCIONAIS II: ALCINOS, ESTEREOQUÍMICA E COMPOSTOS AROMÁTICOS

FIGURA 44 – COMPOSTO AROMÁTICO TRISSUBSTITUÍDO

FONTE: A autora

Existe ainda uma consideração a se fazer sobre a nomenclatura dos


compostos aromáticos. Alguns aromáticos monossubstituídos possuem
nomenclatura especial, que já foi incorporada nas regras de nomenclatura
sistemática da IUPAC devido ao grande uso. Assim, um benzeno contento um
grupo –CH3 como substituinte, ao invés de ser nomeado de acordo com as
regras clássicas como metilbenzeno, é chamado simplesmente de tolueno. Da
mesma forma, um benzeno contendo o –OH ou o –NH3 como grupo substituinte
é chamado de fenol ou de anilina, respectivamente. Na tabela a seguir são
mostradas as estruturas e os nomes respectivos de alguns desses compostos
aromáticos que possuem um nome especial de acordo com as normas sistemáticas
de nomenclatura da IUPAC.

TABELA 4 – NOMENCLATURA COMUM DE ALGUNS COMPOSTOS AROMÁTICOS

Nomenclatura Estrutura

Ácido benzoico

Anilina

Benzaldeído

214
TÓPICO 3 | BENZENO E AROMATICIDADE

Benzonitrila

Cumeno

Estireno

Fenol

Tolueno

FONTE: A autora

Essa nomenclatura especial dos compostos aromáticos monossubstituídos


apresentados na Figura 45 acaba se refletindo na nomenclatura de compostos
contendo outros grupos substituintes. Por exemplo, o benzeno dissubstituído
contendo um grupo –OH e dois grupos –CH3 vai ser chamado de 2,5-dimetilfenol
(o sufixo não é mais -benzeno e sim -fenol); do mesmo modo, o benzeno
tetrassubstituído contendo um grupo –CH3 e três grupos –NO2 vai ser chamado
de 2,4,6-trinitrotolueno (o sufixo não é mais -benzeno e sim -tolueno).

DICAS

Sugerimos a leitura do texto a seguir:


VASCONCELOS, Yuri. Procura-se um ar mais limpo. Pesquisa FAPESP. p. 72–75 , jun. 2009.
Disponível em: <http://revistapesquisa.fapesp.br/wp-content/uploads/2009/06/72-75_160.pdf>.

215
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Elétrons localizados pertencem a apenas um átomo (na forma de par de


elétrons isolados) ou estão limitados a uma ligação entre dois átomos; já os
elétrons deslocalizados são compartilhados por mais de dois átomos; eles
resultam de um orbital p que se sobrepõe aos orbitais p dos átomos adjacentes.

• A estrutura do benzeno é planar, em que cada um dos átomos de carbono está


hibridizado em sp2 e os seis elétrons das ligações p são compartilhados por
todos os seis carbonos do anel.

• Os contribuintes de ressonância são utilizados para se aproximar da estrutural


real (chamada de híbrido de ressonância) de uma substância que tem elétrons
deslocalizados.

• A nomenclatura de compostos aromáticos.

216
AUTOATIVIDADE

1 Identifique os contribuintes de ressonância e o híbrido de ressonância para


o tolueno:

2 Determine a nomenclatura sistemática para as seguintes moléculas:

3 Determine a estrutura para as seguintes moléculas:

a) Meta-cloroanilina
b) 1-cloro-3,5-dimetilbenzeno
c) Orto-bromotolueno
d) Para-clorotolueno.

217
218
REFERÊNCIAS
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