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MACROECONOMIA

Conceitos, Teorias e Métodos


Em desenvolvimento... não circular, não citar

João Basilio Pereima


Departamento de Economia
Universidade Federal do Paraná - UFPR
Curitiba - Paraná
Brasil

joaobasilio@ufpr.br

23 de novembro de 2023
Sumário

I MACROECONOMIA: Conceitos, Teorias e Métodos 4

1 Introdução 5
1.1 Contabilidade Social e Teoria Macroeconômica . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Questões Metodológicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
1.3 Porque usar Modelos na Economia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.4 Teoria e Dados: o problema da dedução e indução na macroeconomia . 12

2 Uma Breve História das Teorias Macroeconômicas 15

II OFERTA E DEMANDA AGREGADA 16

3 Funções de Produção na Macroeconomia 17


3.1 Tipos de Funções de Produções e Propriedades . . . . . . . . . . . . . . 17
3.2 Função de Produção Leontief . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
3.3 Função de Produção Cobb-Douglas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
3.4 Função de Elasticidade Substituição Constante - CES . . . . . . . . . . 23
3.5 Função de Produção e Tecnologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
3.6 Exemplos Numéricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

4 Oferta e Demanda Agregada 31


4.1 OA-DA - Uma visão geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
4.2 Modelo OA-DA Básico - Dedução das equações do lado da oferta . . . . 33
4.2.1 Curva de Oferta Agregada e Demanda de Mão de Obra . . . . . 34
4.2.2 Oferta de Mão de Obra e Equilı́brio no Mercado de Trabalho . . 40
4.2.3 Equilı́brio Geral do Modelo OA-DA Básico . . . . . . . . . . . . 44
4.3 Modelo OA-DA com flexibilidade de salários nominais - O fechamento
Clássico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
4.4 Modelo OA-DA com rigidez de salários nominais - O fechamento Keynesiano 48
4.5 Modelo OA-DA Básico - O lado da demanda agregada . . . . . . . . . . 50
4.5.1 A Curva de Demanda Agregada no Modelo Clássico - PY=MV . 51
4.5.2 A Curva de Demanda Agregada no Modelo Keynesiano . . . . . 53

5 Polı́ticas Macroecônomicas nos modelos OA-DA 54


5.1 Polı́ticas Monetárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
5.2 Polı́ticas de Gastos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

1
5.3 Polı́ticas Tributárias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54

6 O Modelo IS-LM 55
6.1 Curva IS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
6.2 Curva LM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
6.2.1 A oferta de moeda pelo Banco Central . . . . . . . . . . . . . . . 59
6.3 Equilı́brio Geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
6.4 Casos Especiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
6.4.1 Armadilha da Liquidez . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
6.5 Politicas Macroecnômicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65

III DEMANDA EM ECONOMIA ABERTA 67

7 Conceitos 68
7.1 Balanço de Pagamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
7.2 Taxa de Câmbio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
7.2.1 Taxa de Câmbio Nominal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
7.2.2 Taxa de Câmbio Real . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
7.3 Taxa de Juros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
7.3.1 Paridade Descoberta da Taxa de Juros . . . . . . . . . . . . . . . 71

8 Regimes Cambiais e Mobilidade de Capital 72


8.1 Cambio Flutuante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
8.2 Bandas Cambiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74
8.3 Macroeconomia aberta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74

9 Modelo IS-LM-BP 75
9.1 O Modelo Mundell-Fleming . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
9.2 Algebra do Modelo IS-LM-BP . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
9.3 Polı́ticas Macroeconômicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
9.3.1 POLÍTICA MACROECONÔMICA SEM MOBILIDADE DE CA-
PITAIS E CAMBIO FIXO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
9.3.2 POLÍTICA MACROECONÔMICA SEM MOBILIDADE DE CA-
PITAIS E CAMBIO FLUTUANTE . . . . . . . . . . . . . . . . 84
9.3.3 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE PER-
FEITA E CÂMBIO FIXO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
9.3.4 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE PER-
FEITA E CÂMBIO FLUTUANTE . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
9.3.5 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE IMPER-
FEITA E CÂMBIO FIXO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
9.3.6 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE IMPER-
FEITA E CÂMBIO FLUTUANTE . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
9.4 Polı́ticas Cambiais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
9.5 A Condição de Marshall-Lerner . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
9.6 A Curva J . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96

2
IV MICROFUNDAMENTOS 97

10 Microfundamentos 98
10.1 Consumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
10.1.1 Teoria da Renda Permanente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
10.1.2 Escolha Intertemporal ou Modelo de Fischer - 2 perı́odos . . . . 101
10.1.3 Teoria do Ciclo de Vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104
10.1.4 Escolha Intertemporal - Horizonte Infinito . . . . . . . . . . . . . 106
10.2 Investimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
10.3 Governo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
10.3.1 Déficit e Dı́vida Pública . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112
10.3.2 Imposto Inflacionário e Senhoriagem . . . . . . . . . . . . . . . . 113
10.3.3 O problema da sustentabilidade da dı́vida pública . . . . . . . . 114

Bibliografia 116

3
Parte I

MACROECONOMIA: Conceitos,
Teorias e Métodos

4
1. Introdução

A teoria e a análise macroeconômica é importante parte da teoria econômica. Sua


principal preocupação é entender os determinantes das flutuações do nı́vel de emprego e
produção, preços, salários, taxas de juros, taxas de câmbio, gastos públicos e tributação,
fluxos de comércio de bens e serviços, fluxos de capitais na forma de investimento estran-
geiro direto ou fluxos de capital financeiro. Como a própria expressão dá à entender, o
comportamento e as relações entre estas variáveis se dão no plano macro, mais do que no
plano microeconômico, o que significa dizer que a complexidade do comportamento e das
interações entre os agentes econômicos, firmas, consumidores, trabalhadores, instituições
financeiras, não são diretamente exploradas pela teoria macroeconômica. Existem te-
orias e modelos macroeconômico elaborados à partir dos chamados microfundamentos,
alguns dos quais serão abordados neste livro. No entanto, como se verá, a aborda-
gem microfundamentada utiliza a noção de agente representativo com uma forma de
conseguir alcançar o plano macroeconômico por meio da agregação (soma) das partes.
Realizada a agregação, os procedimentos de análise são os mesmos. Resumidamente,
os procedimentos de análise incluem correlações e causalidades teóricas e empı́ricas en-
tre as variáveis, impulso e resposta da economia à choques nas variáveis, determinação
das condições e existência de equilı́brio de uma economia, trajetórias de ajustamento.
Compreendido o funcionamento do sistema econômico, sob uma perspectiva macroe-
conômica, pode-se utilizar tais conhecimentos para formulação de polı́ticas econômicas
de curto e longo prazo, uma tarefa não trivial que pertence ao campo da economia
normativa, ou à economia polı́tica, se assim preferir.

1.1 Contabilidade Social e Teoria Macroeconômica

A macroeconomia utiliza-se com frequência de dados agregados fornecidos por sistemas


de contabilidade nacional ou de contas nacionais, mas sua preocupação, em termos me-
todológicos é radicalmente diferente dos objetivos contábeis. Enquanto a contabilidade
nacional ou social é um método de registro e mensuração ex-post, que mostra fatos
acontecidos, a teoria macroeconômica envolve métodos e adota pressupostos comporta-
mentais e relações de causalidade entre variáveis ex-ante, o que lhe permite analisar o
comportamento dinâmico de um sistema econômico e fazer afirmações sobre o futuro da
economia no curto e longo prazo.
A demanda agregada da economia, pode ser calculada a partir da soma do consumo
das famı́lias (C), investimento privado ou formação bruta de capital fixo ou abriviada-
mente FBKF (I), gastos do governo (G) e saldo da balança comercial dado pela diferença
entre exportações (X) e importações (M ). Neste caso a renda agregada é dada pela soma
dos compenentes de dispêndio ou demanda, dado por Y DA ≡ C + I + G + X − M . Ainda
em termos contábeis a renda da economia pode ser obtida pela soma da remuneração

5
Tabela 1.1: Renda pela ótica do dispêndio e remuneração dos fatores

Famı́lias Empresas Governo Setor Renda


(Trabalho) (Capital) Externo Total
Remuneração Fatores W +A+J Π T - YF at

Destinação da Renda C I G X −M YDis


Sf am Semp Sgov Sext

dos fatores trabalho (salário, W ), propriedade do capital (lucros, Π), aluguel A, e juros
sobre capital monetário J, com o que Y ≡ W + Π + A + J. Estas duas formas de cálculo
encontram-se resumidas na tabela 1.1.
Uma terceira forma de apurar contabilmente a renda de uma economia é pela
alocação ou destinação dada à renda, na forma de consumo e poupança, onde as famı́lias
alocam a renda entre consumo pessoal e poupança individual das famı́lias (C +Sf am ), as
empresas alocam os lucros não distribuı́dos entre investimento ou poupanças das empre-
sas na forma de lucros acumulados (I + Πac ou I + Semp ). No caso do governo supondo
que a arrecadação do governo seja apenas gasta em despesas de custeio na prestação de
serviços públicos, haverá uma formação de poupança pública se a arrecadação for maior
que os gastos. Por fim a renda da economia será maior se as exportações superarem as
importações e será menor, no caso das importações excederem as importações. Quando
uma economia importa mais do que exporta sua renda nacional é insuficiente para cobrir
todo o dispêndio e portanto ela precisa de alguma forma financiar este consumo exce-
dente, e neste caso dizemos que a economia precisa financiar seu consumo e investimento
com poupança externa (Sext = X − M > 0).
Outra maneira de entender estas relações macroeconômicas é demonstrando que
a igualdade da renda pelo lado da remuneração dos fatores e pelo lado do dispêndio
(YF at = YDis ) é a mesma coisa que assumir que a poupança é igual ao investimento
(I = S = Sf am + Semp + Sgov + Sext ). Para tanto considere a identidade contábil dada
pela equação (1.1):

Y DA ≡ C + I + G + X − M (1.1)
Para convertê-la em igualdade I = S precisamos fazer aparecer as expressões para a
poupança. Para tanto podemos deduzir tributos dos dois lados da equação sem alterar
os resultados, com o que obtemos:

Y DA − T ≡ C + I + G − T + X − M (1.2)
Em seguida deixamos o investimento no lado esquerdo e todos os demais termos no
lado direito, obtendo-se a identidade (1.3), na qual agrupamos os termos afins entre os
parêntesis. O primeiro termo do lado direito é a poupança das famı́lias (Sf am ). Dada
uma renda bruta Y DA , uma parte desta renda é recolhida na forma de imposto, uma
parte é gasta em consumo e o que resta é a poupança das famı́lias. Se assumirmos que
as empresas reinvestem todo o lucro(Π = I), não distribuindo nada às famı́lias nem
acumulando uma parte para investimento futuro, então a poupança das empresas será
zero. O segundo termo da expressão é a poupança do governo e por fim o último termo
é a poupança externa.

6
I ≡ (Y DA − T − C) + (T − G) + (M − X) (1.3)
Portanto, podemos substituir os termos do lado direito da identidade, pelos seus
respectivos valores em termos de poupança com o que temos:

I ≡ Sf am + Sgov + Sext = S (1.4)


De acordo com a identidade contábil (1.4), se a economia quiser manter um nı́vel
de renda de equilı́brio ou fazer com que toda a renda seja dispendida, é preciso que o
montante de investimentos seja tal que toda a poupança, de todos os agentes, sejam
utilizados ou mobilizados pelo investimento. Se investimento for maior que a poupança
interna da sociedade, isto é, maior que a poupança das familias, empresas e governo,
esta identidade contabil diz que a única forma dos investimentos serem mantidos é
recorrendo à poupança externa externa, isto é, fazendo com que as importações sejam
maior que as exportações, o que significa dizer que o paı́s deve incorrer em déficits na
balança comercial. E para financiar estes déficits ele precisa recorrer à mecanismos de
financiamento externo.
Neste ponto termina a contabilidade social e começa a teoria macroeconômica pro-
priamente dita, pois raramente, ou até mesmo nunca, uma economia está em equilı́brio
perfeito. A quantidade de decisões autônomas de milhares de famı́lias e empresas, as
decisões de governo e seus inúmeros orgãos não perfeitamente coordenados, os diversos
choques naturais, sociais, polı́ticos, tecnológicos, financeiros estão constantemente mo-
vendo a economia do seu ponto de equilı́brio. Portanto as identidades contábeis tem uma
utilidade limitada na teoria macroeconômica. Por dois motivos. Os fatos contábeis são
sempre fatos realizados. São informações ex-post, e qualquer sistema contábil baseado
em partidas dobradas, como é o sistema de contabilidade nacional, irá sempre produzir
um resultado de equilı́brio. A teoria macroeconômica, por sua vez, está precupado com
a dinâmica da economia, e com as decisões que os agentes estão a todo tempo tomando
no sentido de explicar o que vai acontecer com a economia. A teoria macroeconômica é
um esforço de entendimento executado ex-ante, entendimento este que pode ser usado
para fazer previsões e calibrar polı́ticas econômicas com objetivos diversos. Por exemplo,
Bancos Centrais precisam entender o mecanismo de formação de preços, expectativas e
diversas relações entre variáveuis macroeconômicas para saber onde, quando e quanto
mexer numa variável instrumento qualquer, para obter no futuro imediato os resultados
esperados.
Em termos formais, para migrarmos do território contábil para o nebuloso terreno da
teoria macroeconômica, precisamos adicionar comportamento nas identidades contábeis.
Um exemplo de como fazer isso, e isso será feito a todo o momento, do inı́cio ao fim deste
livro, é explicitando o comportamento dos consumidores quanto as decisões de consumir
e poupar, o comportamento das firmas quanto as decisões de investir. Podemos supor
por exemplo que o consumo das famı́lias no perı́odo t dependa da renda disponı́vel no
perı́odo t − 1 e que elas gastem em média uma fração constante da renda, digamos 90%,
e poupem o resto. Da mesma forma podemos afirmar que uma firma decide quando vai
investir baseando-se na renda e na taxa real de juros. Se a renda da economia estiver
crescendo então isto significa que haverá demanda pelos seus bens e serviços fabricados
e que portanto. No entanto se as taxas de juros forem muito altas, o custo de captação

7
de recursos financeiros poderá desencorajar alguasm empresas. Estes comportamentos
podem ser representados explicitamente pelas seguintes equações:

Ct = Co + c1 (Yt−1 − Tt−1 ) onde 0 < c1 < 1 (1.5)

It = Io + b1 Yt−1 − b2 rt−1 onde 0 < b1 < 1 (1.6)


Se estas equações comportamentais forem válidas então, a identidade contábil na
equação (1.1) é agora transformada num modelo macroeconômico que procura explicar
como a economia vai se comportar, e não como ela se comportou.

YtDA = Co + c1 (Yt−1 − Tt−1 ) + Io + b1 Yt−1 − b2 rt−1 + Gt + Xt − Mt (1.7)


Boa parte do processo de modelagem macroeconômica consiste em pressupor compor-
tamentos dos agentes, no caso famı́lias, trabalhadores, empresas, instituições financeiras,
investidores, formuladores de polı́ticas públicas entre outros e então encontrar soluções
analı́ticas para as equações dos modelos. No exemplo acima temos um modelo muito
simplificado com três equações, (1.5)-(1.6)-(1.1), que são consolidadas numa equação só
(1.7), a qual, se resolvida para a variável Y DA permite calcular a renda agregada da
economia pelo lado dos componentes da demanda. Se este valor estará em equilı́brio
com a renda pelo lado da oferta é um problema adicional que só poderá ser resolvido se
expandirmos este simples modelo adicionando mais equações que expliquem as variações
da oferta agregada a partir do comportamento das firmas.
Quando estamos pressupondo comportamento e incluindo-os em equações, estamos
de fato fazendo teoria macroeconômica. As diversas escolas de pensamento macroe-
conômico e as diversas opiniões assumidas por diferentes economistas, advém de suas
discordâncias quanto ao verdadeiro comportamento dos agentes, quanto as formas fun-
cionais das equações e as vezes quanto ao método utilizado para modelar uma economia.
Por exemplo, a equação do consumo (1.5) acima é apenas uma forma, a mais simplifi-
cada, de representar uma decisão de consumo. Há inúmeras teorias sobre decisões de
consumo, como por exemplo a teoria da renda permanente de Friedman [1954], a teoria
do consumo intertemporal de Fisher [1930], a teoria do ciclo de vida de Modigliani and
Brumberg [1954], a lei psicológica fundamental de ?, entre outras. Uma função con-
sumo ao estilo de Fischer-Modigliani por exemplo, diferente da equação (1.5), além da
renda leva em conta também a taxa de juros e a taxa de desconto intertemporal1 do
consumidor para calcular o consumo atual. Dependendo das variáveis incluı́das numa
função os resultados previstos por um modelo pode mudar completamente e isto é uma
das fontes que tanto tem divido os macroeconomistas: qual teoria e modelo que mais
verdadeiramente representam a realidade.

1.2 Questões Metodológicas

Um aspecto importante que deve ser mantido sempre presente ao se estudar macroeco-
nomia são as questões metodológicas envolvidas na construção de uma teoria e de um
1
Esta taxa é utilizada pelo consumidor para trazer o seu consumo futuro para o valor presente.
Um consumidor totalmente indiferente entre consumir hoje ou no futuro terá uma taxa de desconto
intertemporal igual à zero.

8
modelo. Uma das primeiras distinções a ser feita é exatamente a compreensão de que
teoria e modelo são conceitos distintos. Quando nos referimos à uma teoria estamos nos
referindo ao conjunto de pressupostos ou fatos empı́ricos usados na construção de uma
explicação a cerca da natureza e do funcionamento do mundo real, ou da economia e seus
agentes. Uma teoria portanto é construı́da por métodos de raciocı́nio dedutivo e indu-
tivo e contém afirmações sobre como o mundo, ou uma parte dele, funciona. Um modelo
é apenas uma representação simplificada por meio de uma linguagem matemática, es-
quemática ou forma descritiva, de um sistema mais complexo. A parte mais importante
desta última afirmação diz respeito à simplificação da realidade na construção de um
modelo. O modelo em si não é o objetivo final e constitui apenas num meio de se analisar
e representar uma parte da realidade de um modo conciso. Uma teoria pode ser expressa
por meio de um ou vários modelos. Com mais ou menos sofisticação matemática, ou
mais ou menos detalhamento descritivo, todo modelo conta uma história, e para efeitos
de teoria macroeconômica e ciência de uma forma mais geral, a história que está sendo
contada é que é o aspecto mais importante da teoria. O uso de modelos em economia e
especialmente em macroeconomia é abordado com mais detalhes na seção (1.3).

Macroeconomia e Microfundamentos

Os fenômenos observados no plano macroeconômico são resultados de inúmeras de-


cisões nem sempre sincronizadas de uma mirı́ade de agentes econômicos. O que ob-
servamos no plano macro é a emergência de determinados padrões regulares e mais
ou menos estáveis no tempo. Os modelos macroeconômicos procuram reproduzir esses
padrões bem como estudar as consequências de mudanças nas relações entre as variáveis
sobre a dinâmica e o equilı́brio da economia. Do ponto de vista metodológico, pode-
mos separar três grandes linhas de investigação: a primeira poderı́amos de chamar de
macroeconomia sem agentes, onde as teorias e modelos representam apenas os padrões
agregados sem se importar de onde eles vieram; a segunda que poderı́amos chamar
de macroeconomia com microfundamentos representativos utiliza-se da figura do agente
representativo, onde assume-se, geralmente movido por um desejo de simplificação, que
uma população de agentes (firmas, trabalhadores, consumidores, credores, investidores
financeiros, indivı́duos) possuem comportamentos iguais e portanto, o que um indivı́duo
faz é exatamente o que os demais fariam e portanto, o resultado agregado pode ser fa-
cilmente computado como sendo a soma simples das partes, de forma que ao fim não há
muita diferença, por exemplo, entre a função de produção de uma firma e a função de
produção agregada; a terceira linha de investigação é muito recente e baseia sua análise
na interação entre agentes com comportamentos distintos e mais que isso, que interagem
entre si, afetando as decisões uns dos outros, de forma que as propriedades emergentes
detectadas no nı́vel macroeconômico não podem ser simplesmente a agregação (soma)
das partes como no caso anterior. Esta última linha de investigação usa noções de
ciência da complexidade e metodologicamente faz uso dos chamados modelos baseados
em agentes ou Agent-Based Model - ABM.

• Macroeconomia sem agentes

• Microfundamentos com Agentes Representativos (sem interação)

• Microfundamentos com Agentes Heterogêneos (com interação)

9
Microfundamentos e Agentes Representativos

O uso da noção de agente representativo merece um pouco mais de comentário,


dada sua larga utilização pelos economistas atualmente. Tome-se o caso da função de
produção de uma firma e da economia como um todo. Uma maneira de expressar a
oferta agregada é supor que as firmas são homogêneas ou iguais, de tal forma que o todo
é um múltiplo simples das suas partes constituintes. Isto não é uma maneira realista
de representar a economia, pois como é possı́vel igualar um hospital, uma serralheria e
uma software-house? Mas é um procedimento lógico que assume a ideia de que relações
macroeconômicas podem ser analisadas a partir de agentes representativos, supondo-se
comportamentos e estruturas semelhantes. Há evidentemente uma perda de detalhes,
ao tornar todas as empresas, consumidores e trabalhadores iguais. No entanto há um
ganho nada desprezı́vel em termos de compreensão de efeitos globais representados por
modelos sintéticos, agregados e com soluções analı́ticas, que mesmo sendo tão simples,
possuem um razoável poder de explicação. Empresas, consumidores e trabalhadores
diferentes podem possuir, e geralmente o fazem, comportamentos iguais ou pelo menos
muito semelhantes de forma que pode fazer muito sentido assumir a ideia de agente
representativo, desde que não esteja em jogo o fato de que o resultado esperado dependa
da interação em rede destes agentes entre si.
O uso de agentes representativos é comum na teoria do consumidor e da firma e
muitos modelos macroeconômicos agregados nem sequer fazem referência ao nı́vel mi-
croeconômico para fundamentar suas equações e relações de causalidade. Tome-se o
caso de um consumidor, com sua respectiva função utilidade. Se os demais consumido-
res possuı́rem a mesma função utilidade com os mesmos valores de parâmetros, torna-se
fácil derivar uma função de bem estar social e uma função de demanda agregada, que
poderá ser utilizada para desenvolver alguma teoria sob a ótica macroecônomica. Em
seu famoso trabalho intitulado “Social Choices and Individual Values” ? demonstrou,
através de um rigoroso exercı́cio matemático o que ficou chamado de Teorema da Im-
possibilidade de Arrow, o qual diz que é impossı́vel obter uma função de bem estar social
que seja eficiente e justa para todos, no caso em que as funções utilidades de cada con-
sumidor sejam diferentes, a menos que uma decisão arbitrária de um suposto planejador
social escolha autoritariamente qual função utilidade deve prevalecer sobre as demais.
Para contornar este e outros tipos de problemas e prosseguir na análise econômica
e social, pressupostos simplificadores como este dos agentes representativos precisam
ser assumidos, mesmo ao custo de cortar na carne, tornando os modelos simplificações
da realidade,as vezes simplificações por demais exageradas. De fato todos os modelos,
na economia e em outras ciências, caminham sempre num fio de navalha tentando se
equilibrar entre uma descrição tão completa e complexa quanto a própria realidade que
representa e uma descrição que de tão simplificada pode distorcer a própria realidade
que se quer representar.

1.3 Porque usar Modelos na Economia

O uso de modelos matemáticos em economia tem sido um tema polêmico ao mesmo


tempo que tem se consolidado como uma tendência na ciência contemporânea. A
polêmica não se restringe à área de economia e envolve outras áreas de ciências humanas
também. O uso de modelos, bem como polêmicas sobre sua utilidade e pertinência, são

10
tão antigos quanto seu uso por Arquimedes (287 a.C. - 212 a.C) um dos primeiros cien-
tistas (na moderna acepção da palavra) a usar deliberadamente modelos matemáticos
para representar o mundo real. As teorias macroeconômicas fazem uso intensivo dos
mais diversos tipos de modelos, de forma que a compreensão sobre o que é, como se
constrói e para que e porque se utiliza um modelo ajudará a esclarecer o tema e evitar
enganos metodológicos e conceituais para os economistas. E evitará talvez discussões
fúteis baseadas em concepções mal definidas.
Modelos são de importância central em muitos contextos cientı́ficos e são usados em
toda parte. Modelos como os de comportamentos dos gases a partir de comparações
com bolhas de bilhar, o modelo de atomos de Niels Bohr, modelo de cadeia de Gauss
(Gaussian-chain) de um polı́mero, o modelo atmosférico de Lorenz, o modelo de interação
entre presa-predator de Lotka-Volterra, modelo de hélice dupla do DNA, os modelos
baseados em agentes largamente utilizados em ciências sociais, modelos de equilı́brio
de mercados são alguns exemplos. Os cientistas dispendem uma enorme quantidade
de tempo construindo , testando, comparando e revisando modelos, e muito espaço em
jornais cientı́ficos é dedicado à explicar, aplicar e interpretar estes modelos. Em resumo,
modelos são uma das principais ferramentas da ciência moderna.
Em economia não tem sido diferente, o uso de modelos tem se estendido à todas as
áreas da economia, até mesmo em economia polı́tica, como por exemplo o modelo de
Rebelião Popular de ? e ?, entre muitos outros.

O que é um modelo e para que serve

Modelos são representações simplificadas e aproximadas da realidade. Sua utili-


dade provém da relativa facilidade de manuseio comparada à complexidade da reali-
dade. Neste sentido modelos funcionam como mapas que enfatizam determinadas ca-
racterı́sticas da realidade enquanto “escondem” outras. Pense num mapa de uma cidade.
Se você é um turista, estará interessado nos principais locais de visita, restaurantes e
sistema de transporte, e terá pouco interesse num mapa do sistema elétrico, dos esgotos
e das tubulações de gás que percorrem os subterrâneos da cidade. O que temos então é
uma coleção de mapas sobre uma mesma realidade, cuja utilidade depende de interesse
e necessidade distintas. O mapa oferece ainda outra justificativa igualmente importante.
Para que serve um mapa desenhado numa escala real, contendo todos os detalhes da re-
alidade: seria um esforço cientı́fico inútil produzir um modelo tão completo e complexo
quanto a própria realidade. Por isso muitos afirmam que os modelos são substitutos
imperfeitos da realidade. O “defeito” da imperfeição, ou incompletude, é compensada
pela usabilidade proporcionada pelo modelo. Um modelo é mais fácil de manipular e
simular do que realizar experimentos com todos os detalhes da realidade. Uma tarefa
que seria de fato impossı́vel, até onde se sabe, para o espı́rito humano.
Modelos podem assumir formas diversas. Uma planta estrutural desenhada por
um engenheiro civil, um túnel de vento por um engenheiro espacial, um desenho de
moléculas, um sistema de equações matemáticas, um ou mais gráficos plotados por um
economista, um livro contendo uma narrativa extensa, e se levarmos as coisas um pouco
mais longe, até mesmo uma obra de arte que representa uma forma de pensar, como por
exemplo as pinturas impressionistas. Seria o caso de afirmar que existe arte, no trabalho
cientı́fico de construir modelos?
Seja como for, o fato é que o ser humano, e acredita-se também que animais e

11
até mesmo formas rudimentares de vida constroem modelos da realidade à sua volta
para tomar decisões. No caso da espécie humana, os bebes aprendem com adultos
imitando alguns movimentos e hábitos, inclusive alimentares. Em muitos casos após
algum uso, alguns movimentos e hábitos são descartados pela criança que seguem sua
exploração do mundo. As primeiras palavras aprende-se por repetição e a medida que o
conjunto de informações cresce o pensamento se torna cada vez mais sofisticado e é capaz
de compreender um conjunto cada vez maior de fenômenos e tomar decisões cada vez
mais complexas. Fazemos isso por que nosso repertório de modelos de interpretação da
realidade foi aumentando com as experiências de vida e aprendizado baseado na razão.
Com um repertório maior, escolhemos em cada circunstância e necessidade de decisão
qual o modelo mais adequado e se for necessário, podemos até combinar e recombinar
modelos produzindo novos, para lidar com situações novas. Modelos sempre existiram
entre os seres vivos, em diversos graus de complexidade. Em essência todo o modelo
constitui num método de obter informações, analisar, construir uma representação da
realidade que pode ser usada para se tomar uma decisão. OU alternativamente, “apenas”
compreender mlehor o mundo que cerca do qual fazemos parte.
Um modelo não necessariamente precisa ser matemático. Decisões intuitivas não são
antı́teses de decisões baseadas em modelos. Na verdade, constituem-se em aplicações
ultra velozes de modelos, pois a intuição não é a negação da razão. Decisões intuiti-
vas e instantâneas se mostram ser posteriormente processos lógicos e racionais quando
analisados com a calma permitida pela passagem do tempo, e fazem isso muito mais
frequentemente do que se imagina. Bem este é um assunto complicado e é melhor pa-
rar por aqui pois estamos iniciando um estudo de macroeconomia e não um tratado
filosófico-psicológico sobre o desenvolvimento da inteligência, tarefa hercúlea que está
além do objetivo de um economista e de um só área da ciência.

1.4 Teoria e Dados: o problema da dedução e indução na macroeconomia

Uma teoria pode ser construı́da a partir de duas maneiras distintas de abordar um
problema, as quais não são excludente e podem ser usadas complementarmente. A
primeira, que chamamos de dedução consiste em assumir alguns pressupostos iniciais
e então analisar as consequências e conclusões lógicas que podem ser obtidas a partir
destes pressupostos. Dados os pressupostos, deduzimos o resto seguindo um caminho
lógico. Teorias formuladas a partir de métodos dedutivos de pensamento só podem ser
refutadas questionando-se seus pressupostos e geralmente em economia o que se discute
a cerca da validade de alguma teoria é se seus pressupostos são razoáveis ou reais. A
segunda maneira é partir do conjunto de observações, coleta de dados e experiências e
extrair padrões e caracterı́sticas especı́ficas que podem ser usadas para fazer afirmações
genéricas. Neste caso, estaremos sendo mais empı́ricos, pois primeiro observamos, e de-
pois concluı́mos e fazemos afirmações sobre o comportamento da economia, do indivı́duo,
ou de uma forma mais geral, do mundo real.
Veja o seguinte exemplo. Einstein formulou a Teoria Geral da Relatividade em
torno de 1916 a qual previa que o espaço era curvo e a existência de ondas gravitacio-
nais. A curvatura do espaço foi provada empiricamente por Eddington em 1919, mas a
existência das ondas gravitacionais levou 100 anos e foi demonstrada somente em 2016

12
por um complexo experimento2 . É um caso em que os pressupostos vieram primeiro
(Einstein só uso uma caneta), mas a comprovação empı́rica só veio depois. Em outro
exemplo, entre muitos em economia, em 1958 Arthur Phillips usando dados do Reino
Unido entre 1861-1957 calculou uma correlação negativa entre salário e desemprego a
qual ficou conhecida até os dias de hoje como curva de Phillips sendo utilizada em
inúmeros modelos macroeconômicos. Neste caso os dados vieram antes da teoria. É
muito comum em economia, que se utilizem os dois métodos simultaneamente, ou que
se aplique os dois métodos para um mesmo problema, mesmo que isso possa levar algum
tempo. Uma teoria, deduzida de pressupostos apriorı́sticos precisa ser comprovada pos-
teriormente pelos dados, que foi o que aconteceu com a Teoria da Relatividade Geral:
tanto a curvatura do espaço quanto as ondas gravitacionais somente foram demonstradas
posteriormente à elaboração da teoria. Em geral os economistas são muitos céticos com
teorias abstratas e estão sempre à procura de comprovação empı́rica para suas teorias.
Há quem diga que um bom economista deve sempre partir dos dados para a teoria, mas
isso nem sempre é possı́vel. Karl Popper (1902-1994), um dos filósofos da ciência mais
importantes do século XX, dizia que nunca saberemos a verdade absoluta e que nossas
teorias sobrevivem algum tempo como verdadeiras, até que possamos comprovar que ela
está errada ou incompleta, isto é, até que se possa demonstrar que a afirmação teórica
é falsa, e não verdadeira. Enquanto não conseguirmos provar que uma teoria é falsa,
devemos aceitá-la, mesmo que provisoriamente como verdadeira. É que ficou conhecido
na filosofia da ciência como falsificacionismo de Popper.
A escassez e até mesmo a inexistência de dados é uma realidade que atormenta as
mentes mais criativas. Simplesmente não temos estatı́sticas para tudo. E pior ainda,
quando as temos, em geral temos apenas uma série de dados, especialmente quando es-
tamos lidando com séries temporais. Diferente de um fı́sico que pode realizar repetidos
experimentos controlados de um colizor de partı́culas por exemplo, um economista tem
à sua disposição uma única série de dados geradas pela complexa realidade.

Modelos estruturais e Modelos a-teóricos

Na macroeconomia empı́rica, aquela que parte dos dados para elaborar, ou comprovar
ou falsificar uma teoria, é muito comum fazer o uso de métodos empı́ricos distintos que
é importante destacar. O primeiro é o que poderı́amos chamar de modelos estruturais.
Os modelos estruturais descrevem o comportamento dos agentes ou do sistema macroe-
conômico a partir de equações previamente atribuı́das. O autor então assume determi-
nadas formas funcionais para estas equações, determina quais variáveis são endógenas e
exógenas, que variáveis e parâmetros entram numa e noutra equação e então testa, cali-
bra e estima este modelo por métodos estatı́sticos adequados. Chamamos estes modelos
de estruturais porque as equações apenas traduzem a estrutura (e a dinâmica) existente
no mundo real para um formato de modelo, o qual pode posteriormente ser utilizado
de vários fins. Estes modelos podem ser calibrados ou estimados econometricamente.
Na calibragem de um modelo seu autor atribui o valor dos parâmetros de forma que
a dinâmica do modelo produza resultados esperados ou que façam sentido lógico. No
caso da estimação os parâmetros são calculados estatisticamente a partir de métodos
2
A história Einstein e Eddington está brilhantemente contata em um filme da BBC de 2008 intitulado
Einstein and Eddington, o qual recomendo que se assista.

13
econométricos e somente depois disso são usados no modelo. Neste caso, mesmo a es-
timação econométrica parte de um modelo, e mais genericamente de uma teoria, para
determinar o valor dos parâmetros e calculador as variáveis.
Um outro procedimento muito utilizado pelos economistas são os chamados mo-
delos estatı́sticos à-teóricos, como por exemplo os modelos de séries temporais auto-
regressivos (ARIMA e famı́lia) e os modelos de múltiplas equações ou vetores auto-
regressivos (VAR). Neste caso, não se assume nenhum pressuposto e nenhuma estrutura
refletida em formas funcionais de equações e em escolhas de defasagens de variáveis. O
que se faz é estimar vários modelos econométricos e deixar que os dados indiquem quais
variáveis são relevantes ou estatisticamente significativas, com que sinal e com quais as
defasagens elas devem entrar em cada equação. Neste caso os dados falam primeiro e a
teoria, ou mais especificamente, o modelo vem depois. A macroeconometria é uma área
vasta que atrai muitos pesquisadores e deve ser sempre levada em conta nos estudos.

14
2. Uma Breve História das Teorias Macroeconômicas

• Uma breve história geral

• Macroeconomia Clássica - Os primórdios

• Macroeconomia Keynesiana

• Macroeconomia Sı́ntese Neoclássica I

• Macroeconomia Contra Revolução Monetarista

• Macroeconomia Novo-Clássica - Expectativas Racionais

• Macroeconomia Novo-Keynesiana

• Macroeconomia Ciclos Reais de Negócios

• Macroeconomia Teorias do Crescimento

• Macroeconomia Estruturalista

[Em desenvolvimento....]

15
Parte II

OFERTA E DEMANDA
AGREGADA: O problema da
flexibilidade de preços e salários

16
3. Funções de Produção na Macroeconomia

Este capı́tulo é uma revisão sobre funções de produção e seu uso na macroeconomia. As
funções de produção são de grande importância para a elaboração de teorias e modelos
macroeconômicos e, portanto, conhecer os tipos e suas propriedades é parte essencial
da compreensão dos fenômenos macroeconômicos, principalmente aqueles que dizem
respeito ao lado da oferta agregada. As funções de produção são importantes tanto para
análise de curto prazo (flutuação da produção, preço, salário e emprego) quanto de longo
prazo (crescimento econômico e mudança estrutural).
O estudo teórico e empı́rico do lado da oferta da economia não é possı́vel sem o
desenvolvimento de uma teoria da produção, a qual constitui um vasto campo de pes-
quisa que ganhou grande impulso com o trabalho seminal de Charles W. Cobb e Paul H.
Douglas em 1928 intitulado A Theory of Production [Cobb and Douglas, 1928] onde os
autores utilizaram a forma funcional1 Y = bLk C 1−k que ficou conhecida até os dias de
hoje como função Cobb-Douglas, e depois com as contribuições de Arrow et al. [1961]
e Uzawa [1962] os quais desenvolveram a chamada função de Elasticidade de Substi-
tuição Constante-CES que devido a sua forma polinomial genérica pode se ajustar à
qualquer situação, inclusive assumir a forma Cobb-Douglas dependendo apenas do va-
lor de um parâmetro. Isto deu um novo impulso a toda uma literatura empı́rica sobre
mensuração da produção fı́sica de uma economia e sobre a maneira como os insumos
capital e trabalho são combinados em diversas situações.
Do ponto de vista macroeconômico as funções de produção são importantes pois
são os micro-fundamentos da curva de oferta agregada. A curva de oferta agregada
por sua vez é parte essencial da explicação sobre flutuação do nı́vel de produto e de
emprego no curto prazo, ou do crescimento econômico e acumulação de capital no longo
prazo, e mais ainda pelos efeitos do progresso tecnológico sobre a atividade econômica
e riqueza das sociedades. A forma como os agentes, no caso trabalhadores e firmas, se
comportam em relação a fixação de salários e preços irá posteriormente determinar a
forma da curva de oferta agregada. Tais análises e teorias não seriam possı́veis sem o
ponto de partida da teoria da produção, representada formalmente por alguma função
de produção qualquer.

3.1 Tipos de Funções de Produções e Propriedades

Existem vários tipos de funções de produção sendo as mais utilizadas as funções Leontief,
Cobb-Douglas e Elasticidade de Substituição Constante-CES, as quais serão explicadas e
terão suas propriedades demonstradas neste capı́tulo. Exemplos de funções de produção
estão listadas na tabela (3.1). A primeira parte da tabela mostra as funções de forma
1
Conforme grafia original.

17
implı́cita e destaca a forma como a tecnologia pode ser incorporada num modelo e
abordada teoricamente. A segunda parte da tabela mostra a forma funcional explı́cita
dos três casos mais importantes de funções de produção, os quais serão explicados em
detalhes à seguir.
Tabela 3.1: Funções de Produção mais comuns

Forma implı́cita geral Y (t) = F [K(t), L(t), A(t)]

Com Progresso Tecnológico


Tech. genérica em K,L Y (t) = A(t)F [K(t), L(t)] Hicks [1932] neutra
Tech não muda a relação K/L
Tech. poupadora de capital Y (t) = F [A(t)K(t), L(t)] Solow [1969] neutra
capital-augmenting
Tech. poupadora de trabalho Y (t) = F [K(t), A(t)L(t)] Harrod neutra Okuguchi [1968]
labour-augmenting
Forma funcional explı́cita
Leontief ou Coef. Fixos Y (t) = min {aK(t), bL(t)} Proporção K/L constante
Elasticidade Subs = 0

Cobb-Douglas com Retornos Y (t) = A · K(t)α L(t)1−α K e L são substitutos


Constantes de Escala (RCE) Elasticidade Subs = 1

Elasticidade de Substituição Y (t) = A(t){aK(t)ρ + Arrow et al. [1961]


Constante (CES) (1 − a)L(t)ρ }1/ρ Elasticidade Subs 0 < e < 1
constante

Existem muitas maneiras de abordar os efeitos do progresso tecnológico mas as três


maneiras que constam na primeira parte da tabela (3.1) são as mais comuns2 .
A inovação tecnológica pode aumentar a produtividade da mão de obra ou de uma
máquina, permitindo que os preços baixem ou que mão-de-obra seja dispensada, pode
ainda significar melhoria da qualidade de um produto, com o que se justifica talvez um
preço maior, ou ainda de forma mais radical a inovação pode significar criação de no-
vos bens que vão fazer parte da cesta de consumo da sociedade. Na pratica tudo isso
ocorre ao mesmo tempo, mas os economistas procuram medir ou analisar o progresso
tecnológico de forma isolada em função da complexidade que é colocar tudo ao mesmo
tempo em um modelo. Isso foi feito de forma abrangente e descritiva por exemplo por
Adam Smith e sua fábrica de alfinetes, mas somente após a década de 1950, o pro-
blema do progresso tecnológico passou a incorporar de forma mais explı́cita os modelos
macroeconômicos.
As funções de produção e suas propriedades são de fundamental importância para
a análise macroeconômica. Muitos pressupostos teóricos utilizados em modelos ma-
croeconômicos estão apoiados nas propriedades da função de produção eventualmente
assumida em algum modelo. Por exemplo, em muitos modelos macroeconômicos de
curto prazo, define-se curto prazo por um perı́odo relativamente curto dentro do qual
oscilações na oferta agregada causam ajustes na quantidade de mão de obra demandada
L(t) assumindo-se que o estoque de capital K̄(t) é constante. Se assim for, podemos as-
2
Uma boa referência sobre funções de produção bem como sobre teoria da produção é ? e Chambers
[1994].

18
sumir uma versão simplificada da função de produção de Leontief fazendo Y (t) = bL(t),
normalizando-se aK̄(t) = 1. Isto é muito útil, por simplificar os modelos de curto prazo
interessados em avaliar as flutuações no mercado de trabalho e no nı́vel de preços. Já
nos modelos de longo prazo, supõem-se que todos os fatores são flexı́veis.

3.2 Função de Produção Leontief

A função de produção de Leontief estabelece que a capacidade de produção de uma


firma é dada pela quantidade mı́nima dos insumos que entram na produção de um
bem, ponderados pela sua produtividade, no caso do nosso exemplo a e b para capital e
trabalho respectivamente e conforme figura (3.1). O argumento min da função significa
que se a firma aumentar apenas a quantidade de trabalho de L0 para L1 o nı́vel de
produção ficará constante em Y0 . Para se aumentar a produção de Y0 para Y1 deve-se
aumentar simultaneamente L e K para L1 e K1 , quando então a curva de produção
(isoquanta) move-se para um nı́vel mais alto. Note que o aumento da produção requer
que a relação capital/trabalho (K/L) seja constante. Não faz sentido a firma aumentar a
quantidade de um dos fatores de produção, incorrendo em mais custo e simultaneamente
ficar no mesmo nı́vel de produção e receita. Ela só aumentaria seus custos sem produzir
mais, portanto seu equilı́brio de maximização de lucros ocorre quando a condição Y =
aK = bL é satisfeita. Portanto pode-se ver facilmente que a relação capital/trabalho
será constante ao longo de todas as isoquantas (pontos A, B e C) K/L = b/a, razão pela
qual se chama a função de produção de Leontief de coeficientes fixos. Como K e L são
combinados de modo proporcional e constante, no caso da função Leontief os insumos
não são substitutos entre si.
Assim sendo, as propriedade da função de produção Leontief podem ser expressas
como: a.) o produto marginal do capital e do trabalho é constante; b.) capital e trabalho
são insumos complementares; c.) a relação capital trabalho é constante. Neste último
caso, como os insumos são combinados em proporções constantes, eles são considerados
insumos complementares. Isto fica mais explı́cito calculando-se o produto marginal do
capital e do trabalho. Tomando-se a derivada de Y em relação à K e L temos produtos
marginais constantes, iguais à a e b, conforme equação (3.1):

Y (t) = min {aK(t), bL(t)}


K(t) b
Y (t) = aK(t) = bL(t) → = no equilı́brio (3.1)
L(t) a
dY dY
=a e =b
dK dL

3.3 Função de Produção Cobb-Douglas

A função de produção de Cobb-Douglas3 , por suas propriedades mais flexı́veis, tem sido
muito utilizada na macroeconomia especialmente na teoria do crescimento econômico.
No exemplo que se segue vamos utilizar somente dois insumos, capital e trabalho. A
principal caracterı́stica da função de produção Cobb-Douglas é que os insumos K, L e
3
Há de fato uma certa injustiça com este nome da função, pois quem descobriu este tipo de função
foi......

19
Figura 3.1: Função de Produção Leontief

eventuais outros insumos que podem ser adicionados à função, são substitutos imper-
feitos uns dos outros. Isto significa que uma firma pode escolher a melhor combinação
de capital e trabalho para ajustar a produção, mas a proporção com que podem ser
combinados varia de acordo com a produtividade marginal decrescente de cada um dos
fatores. Essa proporção K/L varia não linearmente, o que lhe faz com que as isoquantas
sejam convexas garantindo-lhes assi, a propriedade de substitutos imperfeitos. Quando
a firma estiver maximizado lucros, os preços relativos dos fatores (retorno unitário do
capital e salário) e suas respectivas produtividades irão determinar a quantidade de cada
que será utilizada. Quando o preço da mão de obra se torna muito alto a tendência é
que haja substituição de trabalho por capital. Isto é muito diferente do que ocorre na
função de produção de Leontief onde a proporção dos insumos é constante. Além disto
dependendo dos valores dos expoentes de cada insumo a função pode apresentar retornos
decrescentes ou crescentes de escala ao mesmo tempo que apresenta retornos decrescen-
tes ao nı́vel do fator. Esteja atento à diferença que existe quando a função de produção
é avaliada no seu conjunto (escala), ou quando é avaliada em termos de um fator apenas,
mantendo-se os demais constantes. Estas propriedades podem ser demonstradas mais
claramente com as equações e gráficos a seguir.
Assumindo a seguinte função de produção multiplicativa:

Y (t) = AK(t)α L(t)β (3.2)


onde α ≥ 0 e β ≥ 0 são parâmetros da função que indicam a proporção com que cada
fator contribui para geração de uma unidade de produto e A é um parâmetro (constante)
que define a produtividade total dos fatores K e L em conjunto. Se A é constante e
for normalizado para A = 1 então a função de produção assume a forma mais simples
Y (t) = K(t)α L(t)β .

Retornos de Escala

A função (3.2) terá diferentes comportamentos dependendo dos valores de α e β.


Analisando a função no seu conjunto, isto é, em termos de escala, temos três situações
distintas com diferentes e importantes significados econômicos:

• se α + β < 1 Retornos Decrescentes de Escala


• se α + β = 1 Retornos Constantes de Escala (β = 1 − α)
• se α + β > 1 Retornos Crescentes de Escala

20
A propriedade de retornos constantes de escala estabelece que quando a quantidade
dos fatores de produção dobrar de valor, a quantidade produzida de bem final também
dobrará. Ou mais genericamente se os fatores aumentarem por um múltiplo λ qualquer,
então o produto final também aumentará λ. Isto pode ser representado matematica-
mente pela seguinte demonstração:

λY = λF (K, L) = F (λK, λL) ∀λ (3.3)


Esta e outras propriedades da função de produção estão demonstradas na figura
(3.2) a seguir a qual representa a função de produção Cobb-Douglas sobre três pontos
de vistas: substituibilidade, rendimento ao nı́vel da escala, e rendimento ao nı́vel do
fator.

(a) Isoquantas e substituibilidade entre os fa- (b) Avaliada ao nı́vel do fator trabalho
tores

(c) Avaliada ao nı́vel da escala (d) Prod. Marginal do Trabalho-PMgL

Figura 3.2: Função de Produção Cobb-Douglass

A figura (3.2a) mostra que existe diferentes combinações de K e L compatı́veis com


um mesmo nı́vel de produção, representado pelas isoquantas Y1 , Y2 e Y3 . Neste caso
podemos calcular a taxa marginal de substituição entre capital e trabalho em cada ponto
da isoquanta, que será dada pela inclinação da reta tangente em cada ponto de uma
isoquanta. As isoquantas são convexas em relação à origem do gráfico, indicando que
quando um fator se torna muito intensivo sua produtividade cai e mostra também que
eles são substitutos imperfeitos.
A questão da escala está representada na figura (3.2c). No caso em que α + β > 1,
quando os insumos K e L aumentam em uma unidade o produto Y aumenta mais que

21
proporcionalmente e dependerá de quanto maior que um for a soma dos expoentes. Há
retornos crescentes de escala porque se dobrarmos o número de insumos, a produção
mais que dobra. Um problema difı́cil para a teoria econômica é explicar a origem dos
retornos crescentes de escala. Uma outra situação, na qual α + β < 1 há retornos de-
crescentes de escala. Este caso também é de difı́cil explicação econômica. Imagine uma
firma que possui uma linha de produção e resolve duplicar a produção criando uma
nova linha de produção num novo barracão ao lado do primeiro. Não haveria motivos
aparente para que o segundo barracão com as mesmas máquinas, trabalho e tecnolo-
gia produzisse menos. Uma situação mais comum, e utilizada mais frequentemente na
análise macroeconômica é o caso em que há retorno contante de escala, representada
pela linha reta na figura (3.2c).

Retornos ao Nı́vel do Fator

A figura (3.2b) ainda mostra duas funções onde o produto marginal do trabalho
é decrescente, uma consequência da convexidade das isoquantas. A figura mostra dois
exemplos de formas funcionais de uma função de produção com rendimentos decrescentes
ao nı́vel do fator. A primeira é uma função de produção Cobb-Douglas e o segundo caso
é uma função quadrática em L. Em ambos os casos quando aumentamos a quantidade
do fator trabalho, mantendo constante a quantidade de capital, o produto aumenta, mas
em taxas decrescentes. A diferença é que na forma funcional quadrática, a partir do
ponto L∗ = A/2, o produto começa a cair, o que não ocorre no caso Cobb-Douglass.
E por fim a figura (3.2d) mostra o produto marginal do trabalho (P M gL) para três
diferentes valores do parâmetro α, o qual regula a intensidade ou a contribuição de cada
insumo na produção.
Tomando-se a função de produção Cobb-Douglas Y (t) = AK(t)α L(t)β podemos
calcular a TMS e demonstrar que o produto marginal do trabalho é positivo porém
decrescente. A TMS é uma medida de quantas unidades de um insumo (capital) deve ser
acrescida em troca de outro insumo (trabalho) de forma à manter a produção constante.
Simplesmente a TMS é a razão entre a variação dos dois insumos e por definição será
negativa, pois quando um insumo aumenta o outro possui variação negativa. A TMS
entre capital e trabalho é calculada como segue:

dK dK/dY dK dY 1 dY P M gL
T M SK,L = − ≡− ≡ ≡ ≡− (3.4)
dL dL/dY dY dL dY /dK dL P M gK
onde dividimos o numerador e o denominador na primeira igualdade por dY sem alterar
a função. Ao fazer isso transformamos a razão entre duas variações (dK/dL) em uma
razão entre os produtos marginais, o que torna o conceito de TMS mais interessante
ainda.
Os rendimentos decrescentes ao nı́vel do fator podem ser demonstrados tomando a
derivada primeira e segunda de Y em relação a cada um dos insumos, com o que temos:

1−α
dY 2 L1−α
  
dY L
P M gK = = αA >0 = −α(1 − α)A < 0(3.5)
dK K d2 K K 2−α

dY 2 Kα
  
dY K
P M gL = = (1 − α)A >0 = −α(1 − α)A < 0 (3.6)
dL L d2 K L1+α

22
onde pode-se ver claramente que em ambos os insumos, a derivada primeira é positiva,
porém a derivada segunda é negativa. A derivada primeira comprova que o aumento da
quantidade de um dos fatores aumenta a produção, porém a derivada segunda afirma
que este aumento diminui quando a quantidade de insumo vai se tornando muito grande.
Seu efeito é decrescente4 .
Além da convexibilidade, demonstrada pela deriva primeira e segunda, outra pro-
priedade importante da função de produção Cobb-Douglas é que ela atende o que
convencionou-se chamar de condições de Inada [1963], segundo a qual quando K → 0
ou L → 0 o produto marginal de cada fator será infinito e quando K → ∞ ou L → ∞
o produto marginal será zero. As condições de Inada são importantes mais do ponto de
vista matemático do que econômico pois garantem que a função se comporta adequada-
mente nos extremos ou nos limites inferior (zero) ou no infinito. Matematicamente as
condições de Inada podem ser representadas por:

∂Y ∂Y
lim = +∞ lim =0
K→0 ∂K K→∞ ∂K
(3.7)
∂Y ∂Y
lim = +∞ lim =0
L→0 ∂L L→∞ ∂L

A função de produção Cobb-Douglas é mais genérica que a função Leontief, que de


fato é um caso especial da função Cobb-Douglas. Observe que no caso em que α = 0
temos Y = AL e no caso α = 1 temos Y = AK. No equilı́brio a função Leontief era
Y = aK = bL, portanto dependendo do qual fator de produção, K ou L seja escolhido
tem-se um ou outro extremo da função Cobb-Douglas.
Note finalmente que na função Cobb-Douglas a TMS varia ao longo de uma iso-
quanta. Quando por exemplo K é muito alto, sua produtividade marginal é muito
baixa e portanto a firma estaria disposta a trocar uma quantidade grande de K por
uma quantidade pequena de L, o mesmo ocorrendo na outra ponta da isoquanta quando
L for muito alto. Isto seria diferente numa função de produção com elasticidade substi-
tuição constante.

3.4 Função de Elasticidade Substituição Constante - CES

A função de produção com elasticidade substituição constante é um caso mais geral


ainda de função de produção. Sua importância e utilização em diversos modelos teóricos
e análises empı́ricas decorre exatamente desta generalidade, onde apenas ajustando o
valor de um parâmetro (ver a seguir, parâmetro σ ou ρ), podemos reproduzir qualquer
situação5 . As funções Leontief e Cobb-Douglas são um caso especial da função CES.
A função CES foi originalmente desenvolvida por Arrow et al. [1961] e Uzawa [1962].
Um outro motivo que justifica a importância da função CES é que as versões empı́ricas
desta função permite que se avalie a forma como uma economia está se ajustando no
4
No caso da figura (3.2c), função de produção quadrática Y = AL − L2 também tem as mesmas
propriedades, pois P M gL = dY /dL = A − 2L e P M gL = dY /dL = −2. Com a diferença que a
derivada primeira torna-se negativa quando 2L > A, de forma que a produção para de aumentar, isto
é, dY /dL = 0 no ponto Lmax = A/2.
5
Para uma longa descrição e estimações empı́ricas desta função de produção, ver Grandville [2009] e
?)

23
mercado de trabalho e bens de capital, substituindo-os entre si ao longo do processo de
crescimento econômico de longo prazo, e portanto, é possı́vel especificar em que medida
o preço dos fatores, salário e retorno do capital, determinam como os insumos podem
estar sendo substituı́dos. Este é um problema de grande relevância para a economia,
pois afeta diretamente a vida de milhões de pessoas, seja pela determinação do valor do
salário, ou pela determinação do nı́vel de emprego no longo prazo.
A forma funcional da função de produção CES é:
h σ−1
i σ
σ−1 σ−1
Y (t) = A αK(t) σ + (1 − α)L(t) σ (3.8)

onde σ é um parâmetro que determina como os insumos podem ser substituı́dos entre
si, o qual dependendo do valor σ ∈ (0, ∞] transforma a equação (3.8) em qualquer um
dos casos adiante. Em muitos casos a equação (3.8) é escrita de forma um pouco mais
simplificada fazendo-se ρ = (σ − 1)/σ:
1
Y (t) = A [αK(t)ρ + (1 − α)L(t)ρ ] ρ (3.9)
onde A é uma parâmetro de eficiência tecnológica, α é o coeficiente que determina a
proporção entre os fatores e σ ou ρ é um parâmetro que regula a substituibilidade entre
os fatores, aproximando-a ora do caso linear (ou CES propriamente dita), ora do caso
Cobb-Douglas com diferentes inclinações, e ora do caso Leontief6 .

• se σ=0 ρ → −∞ Insumos complementares: a função reproduz o caso Leontief


• se σ=1 ρ=0 Substitutos imperfeitos: a função reproduz o caso Cobb-Douglas
• se 1<σ<∞ 0<ρ<1 Substitutos imperfeitos
• se σ→∞ ρ=1 Substitutos perfeitos: a isoquanta é linear

Como o próprio nome diz, este tipo de função tem uma propriedade importante sobre
a forma como K e L (ou outros insumos quaisquer) podem ser substituı́dos. Neste caso
a proporção ou a elasticidade de substituição é constante. A elasticidade substituição
no caso da função CES pode ser obtida como segue. A derivação da elasticidade é uma
demonstração um pouco trabalhosa e está além do no nosso objetivo no momento. O
leitor interessado poderá consultar a bibliografia deste capı́tulo, especialmente Grand-
ville [2009, cap. 3] e ?, mas em linha geral o raciocı́nio é o seguinte. A elasticidade
substituição é uma relação entre duas taxas de variações percentuais, genericamente
εx,y = ∆%x/∆%y = (dx/x)/(dy/y). No caso da função CES esta relação é dada pela
variação percentual na relação K/L em relação à variação percentual nos preços rela-
tivos w/r, onde P M gL = w e P M gK = r. Assim, conceitualmente, a elasticidade
substituição entre duas variáveis x e y é:

∆%x dx/x d ln(x) dx y


σ= = ≡ ≡ (3.10)
∆%y dy/y d ln(y) dy x
6
Note que a função CES na forma da equação (3.8) ou (3.9) é um polinômio genérico com dois
termos do tipo z = (xn + y n )1/n . Se por exemplo n = 1 então a função é extremamente simplificada
para z = x + y de modo que uma isoquanta para um valor constante qualquer de z̄ ficaria x = z̄ − y o
que daria uma linha reta com inclinação negativa no plano (x, y) - (ver figura 3.3c.). Se por exemplo
√ √ √ √
n = 1/2 então terı́amos z = ( x + y)2 ou z = x + 2 x y + y. Neste caso a isoquanta deixa de ser
linear por causa do segundo termo multiplicativo no polinômio. Imagine quantos termos multiplicativos
existem quando ρ = 3, 4, 5, ... e temos polinômios de graus mais elevados.

24
(a) (b) (c)

Figura 3.3: (a) σ é igual à zero indicando que os fatores de produção não são substitutos, mas complementares,
só podem ser usados em proporções fixas com o que a função se comporta como uma Leontief; (b) σ é maior
que zero e menor que infinito indicando que os bens são substitutos imperfeitos e no caso em que σ = 1 obtemos
a função Cobb-Douglas; (c) σ é infinito e há substituição perfeita entre os insumos, pois as isoquantas ficam
lineares.

Em termos da função de produção F (K, L), conceitualmente a elasticidade assume


a forma a seguir:

d(K/L)
∆%(K/L) K/L d ln(K/L)
σ= = d(P M gL/P M gK)
= (3.11)
∆%(P M gL/P M gK) d ln(P M gL/P M gK)
P M gL/P M gK

onde, a partir da equação (3.9) podemos calcular P M gK e P M gL como sendo:

1
(1−ρ)
P M gK = r = αA2 [αK(t)ρ + (1 − α)L(t)ρ ] ρ K ρ−1
(3.12)
1
2 ρ ρ (1−ρ) ρ−1
P M gL = w = (1 − α)A [αK(t) + (1 − α)L(t) ] ρ L
ou, substituindo (3.9), a parte da função de produção que permaneceu a original, por
Y:

P M gK = r = αA2 Y 1−ρ K ρ−1


(3.13)
P M gL = w = (1 − α)A2 Y 1−ρ Lρ−1
Com um pouco mais de transformações algébricas e substituições é possı́vel demons-
trar que:
1
σ= (3.14)
1−ρ
A correspondência entre os parâmetros σ e ρ pode ser vista na figura (3.4):

3.5 Função de Produção e Tecnologia

A tecnologia é um componente importante que afeta a dinâmica da economia. O as-


sunto não é novo e remonta até os fundadores da economia como Adam Smith e Ri-
cardo, ganhando impulso com Joseph Schumpeter em 1916 e mais recentemente com

25
Figura 3.4: Correspondência entre σ e ρ

a moderna teoria do crescimento endógeno desenvolvida ao longo dos anos 1990. O


progresso tecnológico tem recebido um tratamento mais rigoroso e detalhado recente-
mente se consolidando como uma área de pesquisa com suas próprias especificidades.
Pelo seu caráter abrangente a tecnologia é um assunto complexo pois se manifesta de
várias maneiras e tem impactos profundos no dia a dia de uma firma, das famı́lias e
consumidores e do progresso das sociedades como um todo. Problemas como surgi-
mento de inovações, frequência, amplitude, difusão, etc fazem parte do quebra-cabeça
da inovação. Um problema ainda não resolvido na economia, entre muitos, é o fato
de se uma inovação constitui um processo otimista de criação-destrutiva, ou um pro-
cesso nocivo de destruição-criadora que desaloja indivı́duos dos seus postos de trabalhos
obsoletos sem criar novas oportunidades de emprego.
Em termos macroeconômicos o progresso tecnológico pode se manifestar de três
maneiras distintas:

• Aumento de produtividade dos fatores

• Melhoria da qualidade

• Criação de novos bens na cesta do consumidor

Cada um destes processos possui efeitos distintos na economia. Por exemplo, um


aumento de produtividade na economia tem três consequências macroeconômicas: a.) as
empresas podem repassar os ganhos de produtividade diminuindo os preços e aumentar
a produção, b.) podem manter os preços e manter a produção reduzindo a quantidade de
mão-de-obra contratada, ou finalmente, c.) repassar parte do aumento de produtividade
para os lucros e parte para os salários. O efeito final do aumento de produtividade ainda
é um assunto a ser melhor estudado na teoria macroeconômica e qual dos três efeitos
do aumento de produtividade predomina afinal depende do contexto. Não há uma res-
posta definitiva. Um aumento na qualidade, não necessariamente significa aumento na
produtividade e pode vir seguida de um aumento de preço. Por fim a criação de novos
bens pode significar um aumento do número de bens na cesta do consumidor e a criação
de um novo setor de atividade econômica com aumento da diversificação produtiva, ou
então a criação pode significar a expulsão de um outro bem do mercado: por exemplo,
motores elétricos em carros estão começando a substituir motores à explosão. Com isso

26
toda uma indústria de fabricação de motores e sua cadeia produtiva deverá ser subs-
tituı́da por outra com todos os efeitos sobre mercado de trabalho e demais consequências
para a sociedade e o meio ambiente. O assunto é vasto e complexo e nesta introdução às
funções de produção pretendemos apenas chamar a atenção para este instigante assunto
que atormenta os economistas a anos.
Os efeitos tecnológicos do aumento de produtividade podem ser visto na figura (3.5)
a seguir.

Figura 3.5: Efeitos macroeconômicos da produtividade

A figura mostra possı́veis ajustamentos macroeconômicos na produção e no mercado


de trabalho de um choque tecnológico que aumenta a produtividade da mão de obra. O
aumento de produtividade é dado por A1 > A0 , que desloca a função de produção para
cima. A condição inicial no ponto A é tal que a economia, antes da inovação, utiliza
uma quantidade L0 de mão de obra e produz Y0 com a tecnologia A0 . Quando ocorre
uma inovação no processo produtivo a produtividade aumenta para A1 . O ajustamento
macroeconômico que se segue depende de como o mercado se comportará. A empresa
pode escolher manter o preço dos bens finais e diminuir a quantidade de mão de obra
empregada, mantendo a quantidade total de bens produzidos em Y0 . Neste caso a firma
move-se para o ponto B. Outra possibilidade é a firma diminuir o preço dos bens finais
mantendo o salário nominai constante, com o que as famı́lias teriam uma renda maior
e portanto poderiam consumir mais do referido bem. O que terı́amos então em termos
macroeconômicos é uma aumento na quantidade produzida para Y1 , com o mesmo nı́vel
de emprego L0 . A economia se moveria para o ponto C. Evidentemente que o ponto
C, em termos de bem estar social é uma situação melhor, pois não apenas aumenta a
quantidade de bens produzidos, como também mantém o nı́vel de emprego. A primeira
alternativa (ponto B) produz desemprego, o que é uma situação indesejável em termos
sociais. Não há nada na economia a priori que determine se a economia vai para o ponto
B ou C após uma inovação. De fato, o mecanismo de ajustamento é mais complexo do
que se supõe, e em geral um ajustamento intermediário, combinando as duas situações
extrema parecer ser o caso mais realista. O tema é de fato, muito controverso e está
longe de um consenso por parte da teoria econômica.
De uma maneira mais formal, a tecnologia na forma de produtividade pode entrar
de três maneiras diferentes numa função de produção, cada uma com suas consequências
especı́ficas, conforme segue:

27
Y =AF (K, L) = A(K α L1−α ) → Hicks neutra, K/L constante
α 1−α
Y =F (AK, L) = (AK) L → Solow neutra, poupadora de capital (3.15)
α 1−α
Y =F (K, AL) = K (AL) → Harrod neutra, poupadora de mão de obra

Os exemplos são dados a partir de uma função Cobb-Douglas, cuja representação é


mais simples do que o caso geral CES. No primeiro caso a tecnologia impacta a função
de produção como um todo mantendo a relação capital/trabalho constante. O situação
foi descrita por Hicks [1939] e devido à isto também é chamada de Hicks-neutra. O
segundo caso reflete uma situação descrita por Solow [1969] segundo a qual o progresso
tecnológico incide exclusivamente sobre o capital. A medida que aumenta a produtivi-
dade menos capital é necessário para produzir a mesma quantidade de produtos, com
o que a situação descreve um processo chamado de poupador de capital ou capital aug-
menting. Finalmente o terceiro caso corresponde à situação descrita por ? na qual o
aumento da produtividade incide sobre a mão de obra, e como tal, na medida que A
aumenta menos mão de obra é necessária para produzir a mesma quantidade de pro-
duto. Neste temos o que se convencionou chamar de progresso tecnológico poupador de
mão de obra ou labor augmenting. As expressões poupador e augmenting significam os
dois possı́veis processos de ajustamento mostrados na figura (3.5), onde o ajustamento
poupador refere-se movimento da economia em direção ao ponto C, e o ajustamento do
tipo augmenting da inovação refere-se ao movimento em direção ao ponto B.

28
3.6 Exemplos Numéricos

Os exemplos abaixo simulam graficamente as funções de produção do tipo Cobb-Douglas


e CES para diferentes parâmetros e valores. Os gráficos foram gerados no R.

Exemplos de função Cobb-Douglas

(a) Y = ĀK α L1−α (b) dY /dL = (1 − α)Ā(K/L)α (c) Y = ĀK α L1−α

(d) Y = Ai K 0.5 L0.5 (e) Y = Ai K 0.5 L0.5 (f) Y = AK α L1−α

Figura 3.6: Exemplos Cobb-Douglas:


(a) Produto Y como função de L para diferentes combinações de K e L - diferentes α;
(b) Produto Marginal do Trabalho-PMgL para diferentes α;
(c) Nı́vel de produto Y em função de K e L com isoquantas projetadas em 2D;
(d) Produção em 3D para diferentes nı́veis de A;
(e) Produção com função apenas de L para diferentes nı́vel de produtividade A;
(f) Produção em 3D para diferentes relações K/L - diferentes valores de α.

29
Exemplos de função com Elasticidade Substituição Constante - CES

 − 1  1   1
(a) A αK −100 + (1 − α)L−100 100 (b) Y = A αK 0 + (1 − α)L0 0 (c) Y = A αK 0.5 + (1 − α)L0.5 0.5

1
(d)

Y = A αK 1 + (1 − α)L1 1 (e) Y = (f) Y =
  1   1
A 0.25K −3 + (1 − 0.75)L−3 −3 A 0.75K −3 + (1 − 0.25)L−3 −3

Figura 3.7: Exemplos CES - Elasticidade Substituição Constante:


(a) Caso Leontief;
(b) Caso Cobb-Douglas - substitutos imperfeitos;
(c) Caso Geral - substitutos imperfeitos ;
(d) Caso Linear - substitutos perfeitos;
(e) CES com α = 0.25
(f) CES com α = 0.75

30
4. Oferta e Demanda Agregada

Os modelos de oferta e demanda agregada (OA-DA) constituem o que poderı́amos cha-


mar de building blocks da teoria e análise macroeconômica. Os pressupostos teóricos que
fundamentam os modelos de oferta e demanda agregada são utilizados praticamente em
toda a parte da teoria macroeconômica, de forma que a compreensão destes fundamentos
e dos modelos básicos é o mı́nimo que se requer para uma formação sólida nesta área.
A principal caracterı́stica destes modelos é sua ênfase nos ajustamentos da econo-
mia no curto prazo, em respostas a choques de demanda via moeda, gastos públicos
e tributação ou outro choque qualquer. Não se trata por tanto, de modelos de longo
prazo. Questões relativas à crescimento de econômico, mudança estrutural, produtivi-
dade e tecnologia não fazem parte do escopo deste modelos. Os modelos de oferta e
demanda agregada estudados neste capı́tulos são considerados modelos de curto prazo
porque estão voltados a explicar e prever as oscilações de produto (mercado de bens) e
emprego (mercado de trabalho), preços e salários mais do que a acumulação de capital
e o aumento da riqueza de uma sociedade.
Neste capı́tulo apresentaremos um modelo de OA-DA geral ou básico, genérico, o
qual pode ser ajustado para dois tipos de fechamento gerando dois modelos derivados que
por sua vez fazem parte dos primórdios da teoria macroeconômica desenvolvida ainda
nos anos 1930/40, o fechamento clássico e o keynesiano. A essência do modelo OA-DA é
a mesma nos dois casos e a diferença entre os dois residem em certos pressupostos sobre
flexibilidade de preços e salários que condicionam a forma como a economia se ajusta
a choques de oferta ou demanda. O modelo OA-DA básico é uma derivação algébrica
geral, que pode ser adaptado para qualquer um dos dois casos.
Apesar de antigos estes modelos e teoria ainda são importantes pois algumas das
suas hipóteses e conceitos são utilizados até os dias hoje, com algumas modificações.
A primeira versão é o chamado modelo clássico e a segunda a versão keynesiana. O
modelo clássico tem como principal pressuposto a hipótese de que os preços (P ) dos
bens e serviços e o salário nominal (W ) são flexı́veis de forma que os ajustamentos de
curto prazo na economia se fazem rapidamente pelo lado das quantidades, isto é, pela
oscilação do produto, consumo e nı́vel de emprego. Neste caso choques de demanda
são transitórios e a economia rapidamente restabelece o pleno emprego no mercado
de trabalho e o equilı́brio no mercado de bens. No caso keynesiano alguma forma de
rigidez, no preço ou no salário nominal ou ainda em ambos, altera o mecanismo de
ajustamento da economia à choques de modo que o pleno emprego não é restabelecido
automaticamente pelos mecanismo de mercado. Choques de demanda provocam ajustes
nos preços (e não somente em quantidades) e novos equilı́brios podem ocorrer com
distintos nı́veis de preço, salário real, produto e emprego, portanto, a volta ao pleno
emprego requer intervenção do governo e seu arsenal de polı́ticas macroeconômicas.
A despeito da grande controvérsia que divide os economistas atualmente em ne-

31
oclássicos e keynesianos, a distinção que os separam é muito tênue e sutil e poderia ser
resumida numa questão prática de determinar o grau de rigidez de duas variáveis ma-
croeconômicas importantes: preços e salários nominais. Numa análise mais fria, isenta
de paixões, parece ser um exagero que uma questão facilmente resolvı́vel empiricamente
possa ter criado tanta divisão no passado. Os modelos OA-DA clássico e keynesiano
apresentados neste capı́tulos vigoraram entre as décadas 1940-1980, com diversos deba-
tes sobre os efeitos de choques de demanda via polı́tica monetária e fiscal e portanto
sobre as polı́ticas macroeconômicas mais adequadas. A eloquente disputa entre mone-
taristas e keynesianos nos 1960 e 1970 e depois novamente após a grande crise financeira
de 2008 é um episódio tı́pico das diferenças de visões. A partir dos anos 1980 e até os
anos 2000 as diferenças reapareceram manifestadas no que convencionou-se chamar, na
falta de maior criatividade, de “novos clássicos” e “novos keynesianos”. Essencialmente
o ponto de disputa permanecia o mesmo, se os preços e salários são rı́gidos ou não e
se a economia se ajusta via preços ou quantidades e se o nı́vel de pleno emprego e o
equilı́brio são automaticamente restabelecidos ou requerem intervenção de polı́ticas ma-
croeconômicas públicas. Mas desta vez a explicação da origem ou da causa de rigidez
ou flexibilidade das variáveis macroeconômicas proveio de uma explicação engenhosa
baseada na hipótese de que os agentes antecipam o futuro e portanto tentativas do go-
verno de interferir na economia seria frustrada pois os agentes antecipariam as ações do
governo precificando os resultados antecipadamente. Isto ficou conhecido como hipótese
das expectativas racionais 1 .

4.1 OA-DA - Uma visão geral

A interação entre oferta e demanda agregada para diferentes casos pode ser resumida
no gráfico 4.1. O gráfico mostra três situações possı́veis para as relações entre oferta e
demanda agregada: o caso clássico, onde a curva de oferta é vertical, o caso keynesiano
puro, onde a curva de oferta agregada é horizontal e o caso intermediário, mais realista,
onde deslocamentos da curva de demanda causam variações simultâneas nos preços e
quantidades. No caso keynesiano, onde a curva de oferta agregada é horizontal, os preços
são rı́gidos e variações da demanda ao longo da curva de oferta causam variações nas
quantidades, aqui Y , o nı́vel de produto fı́sico e seu correlato nı́vel de emprego. No
caso clássico a curva de oferta é vertical e deslocamentos da curva de demanda causam
variações no nı́vel de preço, sem efeito real nenhum, o que demonstra a ineficácia das
polı́ticas macroeconômicas pelo lado da demanda como as polı́ticas monetárias e fiscais.
Por fim há o caso intermediário, entre as duas visões extremas. A questão essencial,
portanto, é determinar a verdadeira inclinação da curva de oferta agregada, a qual
determinará se choques de demanda têm efeito maior sobre o produto e o emprego
(quantidade) ou sobre o nı́vel de preços produzindo inflação.
Os modelos macroeconômicos de oferta e demanda agregada, especialmente os mo-
delos de curto e médio prazo, são criados para analisar as variações de preços e do nı́vel
de emprego mais do que explicar os determinantes do crescimento econômico. Uma
diferença dos modelos de oferta e demanda em relação aos modelos de crescimento é que
1
A palavra ‘racional’ neste contexto não significa a hipótese de se os agentes se comportam irracional-
mente ou não. A palavra é usada no sentido de capacidade de raciocı́nio ou capacidade computacional
que permite ao ser humano, e mais especificamente no caso, aos agentes econômicos, avaliar e antecipar o
futuro, trazendo-o para o valor presente por algum tipo de processo (cálculo) otimizador intertemporal.

32
Figura 4.1: Oferta e demanda agregada - três casos

estes últimos em geral assumem que os preços são flexı́veis e que as principais variáveis
que explicam o deslocamento da curva de oferta são os efeitos do investimento sobre a
ampliação do estoque de capital e aumentos de produtividade. Nos modelos macroe-
conômicos de curto e médio prazo em geral assume-se que a curva de oferta é dada, isto
é, a capacidade de produção da economia é constante ou pode variar de forma exógena.
Nestes modelos o investimento é um componente da demanda agregada apenas e seu
efeito capacidade ou de ampliação da oferta não é levado em conta diretamente. Um
modo de expressar esta ideia de exogeneidade é assumir que o produto potencial (ou
capacidade de produção) da economia cresce à uma taxa constante e que a inflação pode
ser expicada por uma variação da demanda maior que a variação do produto potencial.
Assim sendo, nos modelos de oferta e demanda de curto e médio prazo, em geral são
enfatizados os determinantes da curva de demanda a qual pode se deslocar ao longo de
uma curva de oferta dada, cuja posição num gráfico é fixa e cuja inclinação pode ser um
dos três casos tal como mostrado na figura 4.1.

4.2 Modelo OA-DA Básico - Dedução das equações do lado da oferta

Isto posto, a construção de um modelo do tipo OA-DA em geral é realizado em três


etapas: a.) a primeira consiste em encontrar uma curva de oferta agregada que expresse
as relações entre Y e P , isto é, derivar uma função Y OA = F (P ) onde dY /dP >
0, a qual como será visto, é derivada de uma condição de equilı́brio no mercado de
trabalho; b.) a segunda etapa consiste em encontrar uma curva de demanda agregada
que também relacione Y e P e que contenha outras variáveis exógenas como consumo
das famı́lias, gastos e tributos do governo, investimento, saldo da balança comercial
e por fim alguma variável que represente a polı́tica monetária, como por exemplo o
estoque nominal de moeda ou meios de pagamentos (M ). Esta função incluirá por tanto
as seguintes variáveis: Y DA = F (C, T, G, I, BC, M ), onde podem ser dados choques
de polı́tica fiscal ou monetária que provoquem deslocamentos da curva de demanda
agregada ao longo da curva de oferta agregada; c.) e finalmente a terceira etapa consiste
em encontrar o ponto de equilı́brio geral no mercado de bens e mercado de trabalho
fazendo Y OA = Y DA = Y , com o que obtêm-se os valores de equilı́brio para a variável
preço (P ∗ ) e quantidade (Y ∗ ). Estas três etapas são explicadas a seguir.

33
Em linhas gerais, o pressuposto da flexibilidade de preços e salários significa afirmar
que eventuais choques de demanda provocam ajustes rápidos nos preços e no salário
nominal enquanto as quantidades são mantidas estáveis. Ao fim do processo de ajuste
da economia, um excesso de demanda em termos agregados provoca inflação, fazendo
variar o nı́vel dos preços (dP/dt > 0) sem aumentar o nı́vel de renda ou produto (Y )
ou, em outras palavras, sem aumentar a quantidade de bens e serviços ofertados. No
caso de um choque negativo de demanda, os preços e salários caem, mas as quantidades
de bens e serviços e o nı́vel de emprego são mantidos. O principal motivo pelo qual as
quantidades de bens e serviços e o próprio nı́vel de emprego não caem é o fato de que
o salário real (W/P ) se mantém constante. Com o salário real constante as empresas
continuam contratando a mesma quantidade de trabalho os trabalhadores continuam
ofertando a mesma quantidade de mão de obra e adquirindo as mesmas quantidades de
bens e serviços.
Este mecanismo será explicado em mais detalhes ao longo deste capı́tulo. Tal meca-
nismo descreve o funcionamento agregado da economia na visão dos economistas cha-
mados clássicos, e se contrapõe a explicação keynesiana segundo a qual variações na
demanda agregada podem provocar simultaneamente variações nos preços, nas quanti-
dades de bens e serviços e no nı́vel de emprego. A visão macroeconômica “keynesiana”
será apresentada na seção (4.4).

4.2.1 Curva de Oferta Agregada e Demanda de Mão de Obra


A construção de uma curva de oferta, passo a passo e em detalhes, é um processo muito
instrutivo para o aprendizado da teoria macroeconômica. Ao deduzi-la neste capı́tulo
estamos interessados não apenas em encontrar a curva de oferta agregada propriamente
dita, a qual não passa, do ponto de vista matemático, de uma simples equação ou função
matemática que relaciona produto e preço na forma de uma equação Y = F (P ) ou sua
inversa P = F −1 (Y ), estamos interessados também em compreender o que acontece no
mercado de trabalho e compreender os vários pressupostos sobre o comportamento das
firmas e trabalhadores. Veremos ao fim do processo de dedução, que uma curva de oferta
agregada significa os pontos para os quais o mercado de trabalho, demanda e oferta de
mão de obra, está em equilı́brio. A importância maior da dedução não está no resultado
final em si, o qual tem também o seu valor, mas no processo de sua obtenção e nas várias
teorias econômicas intermediárias utilizadas para construir a curva de oferta. A principal
conclusão a que chegaremos é que a oferta agregada representa as várias combinações
de salário nominal (W ), preços (P ) e quantidade de trabalho que equilibram o mercado
de trabalho.
No final desta seção também ficará inequivocamente claro a diferença entre o que
convencionou-se chamar de macroeconomia “clássica” e “keynesiana”, cuja diferença
reside num ponto aparentemente inócuo, que é a flexibilidade dos salários nominais e
dos preços. Se os salários nominais e preços forem perfeitamente flexı́veis, estaremos no
mundo clássico onde obtemos uma curva de oferta vertical no plano Y, P . Se os salários
nominais forem rı́gidos estaremos no mundo keynesiano, onde obtemos uma curva de
oferta positivamente inclinada e no limite da rigidez, uma curva horizontal (ver figura
4.1, novamente). Isto será discutido com mais riqueza de detalhes ao final deste capı́tulo,
depois de deduzirmos a curva de oferta agregada.
A curva de oferta significa uma combinação de Y e P para as quais o mercado de

34
trabalho está em equilı́brio. A construção da curva de oferta agregada é a etapa mais
trabalhosa, mas pode ser obtida mais diretamente a partir da demanda de mão de obra
pela firma.
Ela consiste em encontrar o nı́vel de produção e a quantidade de mão de obra de
equilı́brio a partir do comportamento maximizador das firmas e dos trabalhadores. A
partir da função de produção das firmas e da sua maximização de lucros encontra-
se a curva de demanda de mão de obra (Ld ). A partir da função utilidade sujeita à
restrição orçamentária do trabalhador encontra-se a curva de oferta de mão de obra (Ls ).
Igualando-se as duas curvas obtém-se o nı́vel de emprego de equilı́brio (Ld = Ls = L∗ ).
Por fim, substituindo-se o nı́vel de emprego de equilı́brio de volta na função de produção
obtém-se o nı́vel de produto de equilı́brio Y ∗ = F (K̄, L∗ ), onde o estoque de capital é
mantido constante, uma vez que estamos supondo o curto prazo, com ajustamentos
apenas no mercado de trabalho. Ao substituir Ld na função de produção encontraremos
a curva de oferta agregada na forma Y = F (x, P ) com dY /dP ≥ 0, onde x representa
todos os demais parâmetros e variáveis exógenas que possam estar presente na expressão
que não seja o preço P .
Para mostrar todo este quebra cabeça vamos fazer uso de um modelo completo
baseado em funções de produção e utilidade do tipo Cobb-Douglas, derivando passo as
decisões das firmas e dos trabalhadores. Em termos mais didático a derivação da curva
de oferta agregada e do equilı́brio no mercado de trabalho segue as etapas a seguir:

a.) Obter a curva de demanda de mão de obra das firmas na forma de uma equação
Ld = f (W/P ), via maximização de lucros, a qual é negativamente inclinada, isto é,
f ′ < 0;

b.) Substituir a demanda de mão de obra na função de produção de modo a obter a


curva de oferta agregada, Y = f (x, P ) ou sua inversa P = f −1 (x, Y ), onde x são
outras variáveis e parâmetros que aparecem na função que não o preço P .;

c.) Obter a curva de oferta de mão obra dos trabalhadores via maximização da utilidade
entre trabalho e laser na escolha do trabalhador, na forma de uma equação Ls =
g(W/P ), onde g ′ > 0;

d.) Obter a solução de equilı́brio para o mercado de trabalho fazendo L∗ = Ld = Ls e


levar este resultado para a função de produção. Isto significa calcular a função de
produção no ponto de equilı́brio do mercado de trabalho Y ∗ = F (K, L∗ ) = K α L∗1−α .

e.) Analisar e efetuar o fechamento do modelo sob os pressupostos de flexibilidade ou


rigidez de salário nominal.

a.) Demanda de mão de obra por parte da firma - Ld

A curva de demanda de mão de obra expressa a quantidade de mão de obra que


as firmas estão dispostas a contratar para cada nı́vel de salário nominal e preço, ou
juntando os dois, para cada nı́vel de salário real (W/P ). Para encontrar esta curva
partimos de uma função de produção qualquer Y = F (K̄, L). A barra sobre a variável
capital significa que no curto prazo as empresas ajustam-se aos ciclos econômicos fazendo
variar primeiro a quantidade de trabalho. Variações no estoque de capital são processos
de longo prazo, geralmente tratados nas teorias de crescimento e acumulação de capital.

35
No momento estamos preocupados com o curto e médio prazo, portanto soa bastante
razoável admitir que único fator de produção que varia é o trabalho. Existe uma grande
quantidade de formas funcionais especı́ficas para representar uma função de produção.
Uma das mais conhecidas é a forma Cobb-Douglas, cujas propriedades matemáticas
facilitam muito a obtenção de soluções analı́ticas, como veremos a seguir. Assumindo
então que a função de produção seja expressa pela função Cobb-Douglas2 a seguir:

Y = K α L1−α onde 0<α<1 (4.1)


podemos usá-la para encontrar o produto marginal do trabalho (P M gL) tomando a
derivada parcial do produto Y em relação ao trabalho L, com o que obtemos:

dY
=P M gL = (1 − α)K α L−α > 0
dL
(4.2)
dY 2 Kα
= − α(1 − α) <0
d2 L L(1+α)
A função de produção Cobb-Douglas possui duas propriedades importantes que faci-
lita a obtenção de uma solução analı́tica relativamente simples, devido à sua concavidade.
A primeira propriedade diz que a função possui rendimentos constantes ao nı́vel da es-
cala, pois trata-se de um polinômio (mais precisamente de um monômio) com grau 1
(soma dos expoentes da função = 1)3 ; a segunda propriedade diz que a função possui
rendimentos positivos (derivada primeira maior à zero), porém decrescentes ao nı́vel do
fator (derivada segunda menor que zero) e que portanto a função de produção é côncava.
A figura (4.2) abaixo mostra estes resultados de forma conjunta.
A parte superior da figura mostra a função de produção, na qual observa-se que o
produto aumenta a medida que a quantidade L de mão de obra contratada, porém este
aumento é progressivamente menor. A função de produção é côncava. A parte inferior
da figura mostra o produto marginal do trabalho, o qual é positivo (primeira derivada
maior que zero) e decrescente (segunda derivada menor que zero) o que equivale dizer
que há retornos decrescentes ao nı́vel do fator trabalho.

b.) Produto Marginal do Trabalho, Maximização de Lucros e Salário Eficiência


- Obtendo a Curva de Oferta Agregada

Uma vez conhecido o produto marginal do trabalho o próximo passo é encontrar a


curva de demanda de mão obra da firma como uma função dos salário real. O problema
econômico da firma é decidir pela quantidade de mão de obra a ser contratada e isto
depende do salário real W/P . Para ver como essa decisão é tomada é preciso supor
algum comportamento da firma que reflita seu interesse em contratar mão de obra. O
modo mais simples de fazer isso é supor que a firma opera em um mercado de bens finais
competitivo, onde o preço é determinado pela demanda, restando à firma negociar o nı́vel
de salário nominal W e com isso ajustar a quantidade de mão de obra a ser contratada
para produzir a quantidade de bens finais desejada. O comportamento da firma é tal que
2
Neste caso temos um função de produção com retornos constantes ao nı́vel de escala pois a soma dos
expoentes é igual a um. No entanto os rendimentos ao nı́vel do fator são positivos, porém decrescentes,
como pode ser evidenciado pelas derivadas (4.2).
3
Uma outra forma de dizer isso a afirma que a função é homogênea de grau 1.

36
Figura 4.2: Produtividade marginal do trabalho - PMgL

ela procura ajustar sua produção Y e, portanto, sua demanda de mão de obra L, num
nı́vel que possa maximizar seus lucros Π. Neste caso de mercados competitivos, onde o
preço e a demanda são determinados pelo mercado, a maximização de lucros por parte
da firma dependerá apenas de ajustar a mão de obra olhando para o produto marginal
do trabalho e seu respectivo nı́vel salário nominal comparando-o com a receita marginal
a ser obtida. Para maximizar lucros a empresa toma informações externas, preço no
mercado de bens e salário nominal no mercado de trabalho, e ajusta-se internamente
via quantidades variando a demanda de mão de obra. A equação de lucros totais é dada
pela remuneração do capital e do trabalho conforme a seguir:

Π = P Y − rK̄ − W L (4.3)
onde r é o preço unitário do capital e W o valor unitário da mão de obra, ou salário
hora, por exemplo, se o trabalho for medido em quantidade de horas trabalhadas. Como
estamos interessados em analisar o curto prazo, podemos assumir que o estoque de
capital (K) é constante e não varia. Dado o nı́vel de preço e o salário nominal, a firma
irá maximizar lucros ajustando a quantidade de mão de obra e a produção. Além da
maximização de lucros assumimos outra hipótese comportamental importante que é o
fato de que os salários reais da economia são determinados de acordo com a teoria do
salário eficiência, a qual diz que o salário real será igual a produtividade marginal do
trabalho. Isto fica claro quando diferenciamos a equação (4.3) no tempo, em relação
as variáveis Π, Y, K e L4 . Relembrando que estamos no curto prazo, de forma que K
4
Nota metodológica: A equação (4.3), bem como todas as demais foram omissas em relação
ao tempo. Isto está sendo feito porque estamos desenvolvendo um modelo para análise estática e não
dinâmica. Com a análise estática podemos comparar diversos pontos de equilı́brios após os ajustamentos
entre as diversas partes do sistema econômico terem sido processados. Na análise dinâmica, estarı́amos
interessados em explicar as trajetórias temporais de cada variável durante o processo de ajustamento,

37
também não varia, então a equação pode ser reescrita, no seu ponto de máximo, como:

dΠ = P dY − W dL = 0 (4.4)
A firma maximiza seu lucro quando o custo de variar a mão de obra é igual receita
que ela obtém com a venda da respectiva produção, de forma que a variação do lucro
é zero (dΠ = 0). Após igualar à zero, podemos reorganizar os termos e obter uma
expressão para o produto marginal do trabalho, que é a própria afirmação da teoria do
salário eficiência:

dY W
P M gL ≡
= (4.5)
dL P
Esta igualdade do produto marginal do trabalho com o salário real é fruto de dois
pressupostos sobre o comportamento da firma: o primeiro refere-se à estratégia de ma-
ximizar lucros no curto prazo e o segundo de negociar salários de acordo com o produto
marginal do trabalho. Para finalmente encontrar a curva de demanda de mão de obra
tudo o que temos que fazer é substituir a equação (4.2) na equação (4.5) e resolver para
L. Resumidamente, para encontrar a demanda de mão de obra basta igualar o produto
marginal do trabalho ao salário real fazendo P M gL = W/P e resolver a expressão para
Ld , onde o sobrescrito d identifica que é a demanda de mão obra, a qual posteriormente
será confrontada com a oferta Ls . Fazendo isto obtemos:
 α
K W
(1 − α) = (4.6)
L P
Isolando L obtemos:
entre um ponto de equilı́brio e outro. A análise dinâmica requer outra metodologia de desenvolver
modelos, baseadas em equações diferenciais (no caso de tempo contı́nuo) ou em diferenças finitas (no
caso de tempo discreto). Por ora estamos interessados apenas nas posições de equilı́brio. Mas, para
entender como o lucro máximo é obtido, podemos imaginar que as variáveis da equação de lucros são
dinâmicas no tempo, portanto, poderı́amos escrever:

Π(t) = P Y (t) − rK(t) − W L(t)

onde o subscrito t aparece apenas para as variáveis dinâmicas, de forma que que r e W são constantes no
tempo e K(t), L(t) são as quantidades que se alteram por escolha maximizadora da firma, especialmente
K e L, pois Y é resultado da quantidade de insumos utilizada na produção. Então, diferenciando a
expressão inteira em relação ao tempo podemos escrever:

dΠ(t) dY (t) ¯
dK(t) dL(t)
=P −r −W
dt dt dt dt
e se finalmente assumirmos, sem alterar a dinâmica das variáveis, que tempo varia discretamente de 1
em 1 perı́odo, isto é, dt = 1, então pode escrever a diferenciação inteira da equação de lucros em relação
ao tempo, simplesmente como:

dΠ(t) = P dY (t) − rdK(t) − W dL(t)

Dada a hipótese de curto prazo, então dK = 0. Por fim, o lucro será máximo quando variações no
trabalho e no produto fazem com que dΠ = 0, com o que podemos simplesmente reescrever a equação de
lucros no ponto de lucro máximo fazendo 0 = P dY (t) − r0 − W dL(t), o que ao fim permite-nos escrever:
dY (t) W
=
dL(t) P
que nada mais é do que afirmar que o produto marginal do trabalho é igual ao salário real.

38
 1/α
d P α
L = (1 − α)K (4.7)
W
A equação (4.7) representa a curva de demanda de mão de obra que tanto pro-
curávamos, ou seja Ld = f (α, K, P, W ) ou basicamente Ld = f (W/P ) como aparece em
vários manuais de macroeconomia, e onde W/P , o inverso de P/W , está negativamente
correlacionado com Ld . Note que a mesma equação poderia ser escrita numa forma
ligeiramente diferente, porém matematicamente equivalente:
 1/α
1
Ld = (1 − α)K α (4.8)
W/P
Como pode ser observado, esta curva é negativamente inclinada no plano (L, W/P ),
pois dado P quanto maior o salário nominal W menor será a demanda de mão de obra.
Além disto a função é côncava para cima, dado que o termo W/P depende de α o qual
se situa entre 0 < α < 1.
Por fim a curva de oferta agregada pode ser obtida substituindo a equação (4.7) na
função de produção (4.1), com o que obtemos:

" 1/α #1−α


OA α P α
Y =K (1 − α)K
W
(4.9)
  (1−α)
P α
Y OA = K (1 − α)
W

A equação (4.9) é curva de oferta agregada a qual depende do salário real. A sua
forma funcional decorre da utilização de uma função de produção do tipo Cobb-Douglas
com retornos constantes de escala. Outras formas funcionais poderiam produzir resulta-
dos semelhantes. De forma mais geral, estes diversos resultados poderiam ser expressos
em termos qualitativos, como uma curva de oferta agregada relacionando as variáveis Y
e P de uma forma genérica como:

Y OA = f (P ) onde dY /dP > 0 (4.10)


Dado o valor do salário nominal, a quantidade de capital e sendo α um parâmetro, a
função varia conforme P , o qual depende ainda de como se comporta o lado da demanda
da economia. Por ora, a equação reflete a disposição da firma em variar a produção em
função do preço. Um aumento de preço, permite que a firma contrate mais mão de obra
quando ela estiver maximizando o lucro. Como P está no numerador da expressão um
aumento de P conduz à um aumento da produção. Neste caso da função Cobb-Douglas
P ainda está elevado ao expoente (1 − α)/α e portanto a relação entre Y e P pode ser
não linear se α ̸= 0.5. Dependendo do valor de α a curva de oferta agregada (4.9) pode
apresentar um dos formatos mostrados no gráfico (4.3), todos com inclinação positiva.
A curva de oferta agregada acima é uma expressão geral, que independe do modelo
ser clássico ou keynesiano. Os fechamentos do modelo a ser realizado mais adiante é que
determinará como a economia de fato se comportará. Por ora é importante notar que
se ambos, preços e salários nominais, forem flexı́veis e variarem de forma sincronizada,

39
Figura 4.3: Curva de Oferta Agregada a partir de uma Função Cobb-Douglas

então o salário real W/P ou seu inverso P/W ficarão constantes e a curva de oferta,
ou o produto real Y, não será afetado por variações nos preços, pois o efeito positivo
um aumento de preço é seguido por um efeito negativo do aumento do salário nominal
deixando o salário real e por conseguinte o nı́vel de produto ofertado constante. E se
assim for, a quantidade de mão de obra associada à Y também ficará constante, o que
no caso clássico, corresponde ao pleno emprego, como será explicado mais adiante.

4.2.2 Oferta de Mão de Obra e Equilı́brio no Mercado de Trabalho


c.) Escolha ótima entre trabalho e laser. A oferta de mão de obra dos tra-
balhadores (Ls )

Tendo obtido a curva de oferta agregada acima, o próximo passo importante é de-
terminar a curva de oferta de mão de obra por parte dos trabalhadores e o equilı́brio no
mercado de trabalho.
A derivação da oferta de trabalho é realizada a partir de pressupostos teóricos acerca
do comportamento dos trabalhadores em sua decisão de disponibilizar ou vender seu
tempo de trabalho no mercado, em troca de um salário real. Para construir a curva
de oferta de mão de obra dos trabalhadores o procedimento mais fácil é assumir que os
trabalhadores procuram maximizar uma função utilidade que depende da quantidade
de horas trabalhadas e horas destinadas ao laser. O aumento de ambas as horas, se
fosse possı́vel, proporcionaria mais bem estar, no entanto, o trabalhador não consegue
aumentar as duas coisas ao mesmo tempo e precisa fazer uma escolha que dependerá
da taxa de substituição entre as duas. Para aumentar uma, precisa diminuir a outra.
Consideremos então que um trabalhador representativo oferta uma quantidade H de
horas trabalhadas por dia, por semana ou por mês, em troca de um salário real hora,
semanal ou mensal ou por unidade de produto correspondente à W/P , que lhe dá acesso
à uma quantidade C de bens de consumo e cujo consumo lhe proporciona um certo
nı́vel de satisfação material medido por alguma função utilidade. O trabalhador pode
aumentar também seu bem estar quando decide por alocar uma quantidade de horas
L para seu laser, mas deverá diminuir sua renda se quiser ter mais laser. Assim, se a
quantidade total de horas disponı́veis por dia for 24 horas, então temos 24 = H + L ou
ainda, generalizando 24 como sendo um certo total de horas disponı́veis num perı́odo de

40
tempo qualquer, T = H + L.
O problema do trabalhador pode ser expressado então pelo seguinte problema de
maximização de utilidade, sujeita à uma restrição dada pela quantidade de bens de
consumo que o trabalhador pode adquirir com um certo nı́vel de salário W obtido por
uma certa quantidade de horas trabalhadas H:

max U = U(C, L)
(4.11)
suj. a P C = W H = W (T − L)

A problema do trabalhador é semelhante ao problema do consumidor que procura


decidir a melhor combinação de bens de consumo dada uma restrição orçamentária. Ao
assumir a forma Cobb-Douglas para a função utilidade do trabalhador estamos impondo
um pressuposto de que consumo e laser são substitutos imperfeitos entre si. A restrição
orçamentária do trabalhador, tal como formulada, assume a sua forma mais simples
dizendo que a única fonte de renda do trabalhador é o salário e que não há imposto
sobre a renda de forma que todo o salário será gasto em consumo. Nem mesmo será
poupado e acumulado para consumo futuro. O consumo futuro é um problema de
consumo intertemporal, que será estudado em outro capı́tulo. Da forma como estamos
abordando aqui, o processo de maximização (otimização) é estático. O problema de
otimização do trabalhador pode ser observado na figura (4.4):
Figura 4.4: Problema de otimização do trabalhador

A figura (4.4) mostra as três diferentes curvas de indiferença do trabalhador dadas


pelas suas respectivas funções utilidades U1 , U2 e U3 . Uma curva de indiferença relaciona
as diferentes combinações de consumo e laser para as quais a utilidade do trabalhador é
constante. A curva de indiferença é negativamente inclinada pois o aumento de consumo,
possibilitado por um aumento do rendimento do trabalhador (aqui só salário), requer
menos horas de laser e portanto mais horas de trabalho. No exemplo dado um salário
nominal W , o salário real depende do nı́vel de preço, portanto o preço é tal que P1 >
P2 > P3 para que o salário real W/P3 seja maior. O aumento do salário real, que significa
mais horas trabalhadas e menos laser, desloca a restrição orçamentária do trabalhador
para cima permitindo atingir curvas de indiferenças mais altas. Para que isto funcione
adequadamente, um pressuposto importante é o de que o efeito renda supere o efeito
substituição, de forma que os pontos de equilı́brio C, B, A se posicionem acima e à

41
esquerda um dos outros, do contrário a curva de oferta de mão de obra na segunda parte
do gráfico não ficaria positivamente inclinada. Note que o segundo gráfico relaciona no
eixo horizontal as horas trabalhadas enquanto que o primeiro relaciona as horas de laser,
dado que T = H + L.
Podemos assumir uma forma funcional especı́fica para a função utilidade do traba-
lhador U(C, L) como sendo uma forma Cobb-Douglas, com o que teremos o seguinte
problema de otimização:

max U = U = C β L1−β
(4.12)
suj. a WT − PC − WL ≥ 0

onde a restrição orçamentária foi obtida considerando que H = T − L, portanto P C =


W H = W (T − L). A restrição orçamentária diz que o trabalhador não pode consumir
mais que sua renda obtida pelas horas de trabalho, isto é, C ≤ W H = W (T − L). No
formato (4.12) o problema de maximização tem uma solução analı́tica fácil de encontrar.
Note que a quantidade C de bens a serem consumidos está multiplicada pelo preço dos
bens, de forma que a restrição é avaliada em termos reais. O lagrangeano desta equação
é:

L = C β L1−β + λ(W T − P C − W L) (4.13)


e as condições de primeira ordem são:

∂L
=βC β−1 L1−β − λP = 0
∂C
∂L
=(1 − β)C β L−β − λW = 0 (4.14)
∂L
∂L
=W T − P C − W L = 0
∂λ
Uma vez obtida as condições de primeira ordem, podemos calcular os valores de
equilı́brio de C ∗ , L∗ e H ∗ , e também deduzir a curva de “demanda de laser ” e a sua
equivalente curva de oferta de horas trabalhadas, Ls = g(W/P ), onde g ′ > 0.
Os valores de equilı́brio podem ser obtidos como segue, resolvendo as duas condições
de primeira ordem para λ e em seguida igualando as duas, com o que obtemos:

 1−β
β L
λ=
P C
 β
(1 − β) C
λ= (4.15)
W L
 1−β  β
β L (1 − β) C
=
P C W L

42
Por fim, resolvendo a equação (4.15) para L obtemos a quantidade de horas de laser
de equilı́brio do trabalhador ao salário nominal e preços vigentes.

(1 − β) P
L∗ = C (4.16)
β W
ou para C ∗ , para obter o consumo de equilı́brio, obtendo:

βL W
C∗ = (4.17)
(1 − β) P
Os resultados obtidos pelas equações (4.16) e (4.17) correspondem à um ponto de
equilı́brio tal como os pontos A, B ou C da figura (4.4). Por fim, sabendo que H = T −L
podemos obter a curva de oferta de mão de obra substituindo a equação (4.16) nesta
igualdade, com o que obtemos:

(1 − β) P
Ls ≡ H = T − C (4.18)
β W
Na equação (4.18) o salário W está no denominador, porém o segundo termo tem um
sinal negativo, portanto quanto maior W , menor é o segundo termo negativo e portanto
maior é o número de horas ofertadas H. Isso fica evidente quando tomamos a derivada
primeira dH/dW e em seguida a derivada segunda, a qual é:

dH (1 − β) P
= C 2 >0
dW β W
(4.19)
dH 2 (1 − β) P
2
=−2 C 3 <0
d W β W
Este resultado mostra a oferta de mão de obra é positivamente inclinada no plano
W/P, L e que um aumento no salário real leva á um aumento na oferta de mão de obra.

Nı́vel de produto de equilı́brio no caso Cobb-Douglas

Uma vez que temos as curvas de demanda e oferta de mão de obra, dadas pelas
equações (4.7) e (4.18), basta tomar a quantidade de mão de obra de equilı́brio L∗ no
mercado de trabalho e levar este resultado para dentro da função de produção, de modo
a obter uma expressão do tipo Y ∗ = F (K, L∗ ). Com esta expressão obtemos o nı́vel
de produto de equilı́brio correspondente ao equilı́brio no mercado de trabalho. Fazendo
Ld = Ls e resolvendo para P/W ∗ obtemos um valor de equilı́brio do inverso do salário
real, com o qual em seguida podemos voltar à uma das equações Ld ou Ls e calcular a
quantidade de equilı́brio de mercado da mão de obra L∗ . Igualando, obtemos:
 1/α
P (1 − β) P
(1 − α)K α =T − C (4.20)
W β W
onde para simplificar as passagens algébricas definimos:

43
1
ϕ =[(1 − α)K α ] α (4.21)
(1 − β)
γ= C (4.22)
β
com o que podemos escrever:
 1/α
P P
ϕ =T −γ (4.23)
W W
onde coletando os termos em P/W obtemos:
 1/α
P P
ϕ +γ =T (4.24)
W W
A equação (4.24) é um polinômio não homogêneo. Sendo 0 < α < 1 o primeiro
termo será um termo com expoente maior que 1 e o segundo um termo com expoente
igual a 1, portanto haverá mais de uma raiz que soluciona o polinômio, o que quer dizer
que haverá mais de um P/W de equilı́brio. O número de raı́zes poderá ser até maior
que 2, dependendo do valor de α. Se por exemplo α = 0.333... terı́amos um polinômico
com um termo elevado à 3 e portanto terı́amos três raı́zes como solução, o que significa
dizer que terı́amos, matematicamente, três resultados para o salário real de equilı́brio
W ∗ /P ∗ , sendo uma delas a de maior significado econômico. A solução matemática
deste problema é apenas indicada aqui, ademais a solução de um polinômio nem sempre
é uma tarefa trivial. Uma opção ao problema acima seria log-linearizar o polinômio
todo, mas ao fim o resultado deveria retornar à escala original tomando-se o anti-log da
solução final, um procedimento também um pouco trabalhoso que desviaria ainda mais
as atenções ao problema econômico que estamos analisando. Não prosseguiremos em sua
demonstração para não se desviar em demasia do objetivo principal que é compreender
os aspectos teóricos da teoria macroeconômica, em dois regimes salariais distintos, o
clássico e o keynesiano. Obtendo-se (W/P )∗ de equilı́brio, bastaria substituir em uma
das duas equações Ls ou Ld para obter a quantidade mão de obra de equilı́brio, já que
no equilı́brio L∗ = Ls = Ld .
Por fim, o produto de equilı́brio final poderia ser encontrado, com um pouco de
trabalho algébrico, substituindo o salário real de equilı́brio encontrado pelo procedimento
descrito, na própria função de produção com o que obterı́amos Y ∗ = f (x, W ∗ /P ∗ ).

4.2.3 Equilı́brio Geral do Modelo OA-DA Básico


d.) Equilı́brio no mercado de trabalho, produção e mercado de bens-L∗ =
Ls = Ld → Y ∗

O equilı́brio geral do modelo OA-DA é determinado pelo equilı́brio do mercado de


bens simultaneamente ao equilı́brio no mercado de trabalho. Enquanto o equilı́brio no
mercado de bens, pela interação entre oferta e demanda, determina o nı́vel de preços P ,
o equilı́brio no mercado de trabalho determina o valor do salário nominal W . Conhecido
estas duas variáveis nominais, é possı́vel determinar o valor das variáveis reais do modelo,
à saber: Y, L e W/P , com o que tem-se o equilı́brio geral do modelo, pelo lado da oferta.

44
O funcionamento completo do lado da oferta agregada, desde o mercado de trabalho até
a função de produção pode ser observado na figura (4.5).
Figura 4.5: Oferta Agregada e Equilı́brio no Mercado de Trabalho

A figura mostra o efeito de um choque exógeno de demanda reduzindo inicialmente a


produção e os preços conforme gráfico (a). Com a queda da produção as firmas reduzem
a quantidade de trabalho de L0 para L1 e consequentemente a produção de Y0 para Y1 ,
conforme gráfico (c). O mercado de trabalho irá se ajustar com o deslocamento da curva
de oferta de mão de obra até o ponto em que equilibra-se com a demanda de mão de obra
das firmas, afinal, esta será a quantidade de postos de trabalhos existentes na economia
após o choque de demanda. Os gráfico mostram os efeitos de primeira ordem. A queda de
preços de P0 para P1 , dado um salário nominal W0 , significa um aumento real de salário
e é isso que faz também com que as empresas diminuam a demanda de mão de obra até
o novo ponto de maximização de lucros. A nova curva de oferta de trabalho, grafada
em pontilhado, poderá permanecer definitivamente nesta nova posição, com geração de
desemprego com o que o ponto B no gráfico (d) seria um equilı́brio final. Mas esse
poderia não ser o fim da história. O ponto B poderia ser um equilı́brio transitório. A
economia somente permanecerá no ponto B se o salário nominal for rı́gido. Se o salário
nominal for flexı́vel é possı́vel que W0 também caia para W1 acompanhando os preços
de forma que no final nada mude, com o salario real voltando aos seu valor original de
equilı́brio, W0 /P0 = W1 /P1 . Qual dos dois resultados efetivamente ocorrerá depende
portanto da hipótese básica que distingue o modelo OA-DA básico com flexibilidade de
preços e salários (caso clássico) do modelo OA-DA com rigidez do salário nominal (caso
keynesiano). Estes dois fechamentos do modelo serão analisados em mais detalhes a

45
seguir.

4.3 Modelo OA-DA com flexibilidade de salários nominais - O fechamento


Clássico

O fechamento do modelo sob a hipótese de flexibilidade total de preços e salários no-


minais é mostrado na figura (4.6). Suponha inicialmente que a economia esteja em
equilı́brio com pleno emprego no ponto A. Neste ponto toda a oferta de mão obra é
absorvida pela produção de forma que o desemprego é zero, ou permanece em seu nı́vel
mı́nimo devido à outras razões, como por exemplo, fricções no mercado de trabalho. Em
geral a taxa de desemprego numa economia nunca será zero, devido ao processo de ajuste
contı́nuo diário de movimentações da força de trabalho. Este desemprego mı́nimo é mui-
tas vezes chamado de taxa natural de desemprego. Assim, definimos a quantidade L0
como a quantidade máxima de emprego possı́vel na economia, dado o nı́vel tecnológico
e o estoque de capital existente. À este nı́vel de emprego, associamos também o nı́vel
de produção máxima desta economia no curto prazo dado por Y0 , o que chamamos de
produto potencial da economia.
Comparativamente à figura (4.5) do modelo geral a figura (4.6) contém um gráfico a
mais, apenas com o salário nominal, para destacar a dinâmica de ajustamento dos preços
e salários nominais e seus efeitos sobre o nı́vel de emprego e produção. Partindo então
do ponto de equilı́brio de pleno emprego (ponto A no gráfico (a)), suponha um choque
exógeno positivo do lado da demanda agregada, deslocando a curva DA0 para DA1 a
qual se desloca ao longo da curva de oferta existente ao nı́vel de salário real W0 /P0 .
Num primeiro momento o aumento de demanda provoca um aumento de preço de P0
para P1 conforme pode ser visto no gráfico (a). Este aumento de preço faria aumentar
a produção levando a economia ao ponto B’ com um nı́vel preço um pouco abaixo de
P1 (não mostrado). O aumento de produção implica em um aumento de demanda de
mão de obra de L0 para L1 conforme gráfico gráfico (c). Neste momento, o que acontece
no mercado de trabalho em termos de salário nominal será crucial para os ajustes de
segunda ordem que virão em seguida. Num primeiro momento o aumento de preço com
o salário nominal constante diminuiu o salário real para W0 /P1 conforme gráfico (e),
e é exatamente isso que faz com que as empresas demandem mais mão de obra. Mas
se a hipótese de flexibilidade plena de salários nominais for válida, então o excesso de
demanda de mão de obra irá pressionar os salários aumentando-o de W0 para W1 e tal
aumento se consolidará rapidamente graças à flexibilidade. Quando este ajuste ocorrer
o nı́vel do salário real será restabelecido, de tal forma que W0 /P0 = W1 /P1 , tal como
mostrado no gráfico (d). Ocorre então um fenômeno importante que merece atenção: a
flexibilidade do salário nominal faz com que o salário real na economia seja constante.
Desta forma o ponto B’ é um ponto falso, pois de fato a economia tende para este ponto
logo após o choque de demanda, mas o contı́nuo ajustamento do salário nominal em
resposta às pressões de excesso de demanda de mão de obra faz com que continuamente
o salário nominal vá subindo neutralizando o efeito. O resultado final é que a economia
permanece no nı́vel de emprego de equilı́brio em L0 com o respectivo nı́vel de produção
Y0 . No mercado de bens, não houve mudança real, pois a oferta de bens continua a
mesma. O que houve foi apenas um efeito inflacionário com aumento de preços de P0
para P1 .
Se o choque positivo de demanda continuar, elevando o preço para P2 , o mesmo pro-

46
Figura 4.6: Equilı́brio com Flexibilidade de Preços e Salários - Caso Clássico

cesso de ajustamento flexı́vel entrará em ação, mantendo ao fim o salário real constante.
Neste caso um aumento de demanda não teve efeitos reais na economia, provocando
apenas efeitos nas variáveis nominais, preço (P ) e salário nominal (W ), com o nı́vel de
produto e emprego constante e em permanente equilı́brio em seu nı́vel natural ou de
pleno emprego. Está é a essência do modelo clássico de oferta e demanda agregada.
Em situação de plena flexibilidade de salário a economia se ajusta pelo lado dos preços
nominais e não pelo lados das quantidades (produto emprego). O resultado final é que
embora a derivação algébrica da curva de oferta mostre uma inclinação positiva, con-
forme equação (4.9), de fato o salário real nunca mudará, o que faz com que este termo
fique constante e portanto a curva de oferta agregada se torna efetivamente vertical. A
principal conclusão do modelo clássico é uma corva de oferta agregada vertical.
O mecanismo de ajuste seria o mesmo no caso de um choque negativo de demanda.
Inicialmente os preços cairiam, seguidos de uma queda no salário nominal mantendo o
salário real, o emprego e o produto contante.

47
Todo este raciocı́nio tem sido utilizado por economistas de viés clássico (e atualmente,
por motivos adicionais, mas que não mudam este mecanismo básico, pelos chamados
novos clássicos) para justificar a ineficácia de polı́ticas macroeconômicas, especialmente
polı́ticas fiscais e monetárias, pelo lado da demanda. Somente polı́ticas econômicas pelo
lado da oferta, que levem à acumulação de capital ou aumento de produtividade por
exemplo, poderiam aumentar o nı́vel de emprego e produção. Outro corolário importante
da flexibilidade de preço e salários nominais é que a economia teria um mecanismo
automático de correção de choques adversos, sejam eles positivo e negativo, de forma a
sempre manter o pleno emprego com alto grau de utilização da capacidade produtiva.

4.4 Modelo OA-DA com rigidez de salários nominais - O fechamento Key-


nesiano

Em contraste com o caso de flexibilidade plena de preços e salários nominais, o chamado


caso Keynesiano, assume o pressuposto de rigidez no salário nominal, especialmente
nos casos de recessão econômica com queda no nı́vel de produto e emprego. Neste caso
o processo de ajustamento da economia em resposta a um choque de demanda será
completamente diferente do caso com flexibilidade. A rigidez no salário nominal, com
preços de bens e serviços flexı́veis, significa ao fim que o salário real é variável. O oposto
do que ocorria antes. Sendo o salário nominal rı́gido, uma queda de preço por exemplo
de P0 para P1 faz com o salário real aumente de W0 /P0 para W0 /P1 alterando a partir
dai o equilı́brio no mercado de trabalho o qual, dada a rigidez do salário nominal, não
retornará ao nı́vel de pleno emprego como antes. Neste caso a economia se ajustará
num novo ponto de equilı́brio com um produto e nı́vel de emprego menor. Se o choque
negativo de demanda for muito grande, a taxa de desemprego poderá ser alta, como
ocorreu na crise de 1929 e na crise de 2008, com implicações sociais enormes.
Independentemente do tamanho dos choques que causem oscilação no produto e
emprego, a questão importante no momento é determinar como se dá, em detalhes,
o ajustamento da economia sob a hipótese de rigidez nos salários nominais e porque,
segundo a interpretação de ?, 1936, este caso abre espaço para polı́ticas econômicas
pelo lado da demanda agregada. Keynes dedicou dois capı́tulos em sua mais importante
obra, a Teoria Geral do Emprego do Juro e da Moeda, ao problema do ajustamento
dos salários e nı́vel de emprego, o capı́tulo 2, intitulado “Os Postulados da Economia
Clássica” e o capı́tulo 19 “Variações nos Salários Nominais” cuja leitura é elucidativa e
altamente recomendável.
O ajustamento da economia no caso de rigidez de salário nominal está representado
na figura (4.7). Suponha um choque negativo exógeno de demanda que desloque a curva
DA0 para a esquerda até um nova posição em DA1 movendo a economia do ponto A
para o ponto B tal como mostrado no gráfico (a). Originalmente a curva de oferta
agregada aqui é positivamente inclinada, mas não horizontal, pois admite-se uma certa
flexibilidade de preço.
Com este nı́vel de demanda os preços caem de P0 para P1 . Num primeiro momento
as empresas ajustam o nı́vel de produção reduzindo a demanda de trabalho de L0 para
L1 como mostrado no gráfico (c), de acordo com a função de produção. Sendo o salário
nominal rı́gido a redução de preço significa ao fim um salário real maior. A fim de maxi-
mizar seus lucros no curto prazo a empresa teria que diminuir a quantidade de trabalho
contratada até que um novo equilı́brio fosse alcançado com uma produtividade maior

48
Figura 4.7: Equilı́brio com Rigidez de Salário Nominal - Caso Keynesiano

da mão de obra. Ainda no gráfico (c) este novo equilı́brio da firma significa reduzir
a produção do ponto A para o ponto B. O gráfico (d), o qual mostra o equilı́brio no
mercado de trabalho, permite visualizar melhor a relação entre preço e salário e oferta
de demanda de mão de obra. Com um nı́vel de preços menor, agora em P1 e salário
nominal constante, o salário real torna-se maior, pois W0 /P0 < W0 /P1 . O salário real
maior tem dois efeitos sobre a economia. O primeiro deles é aumentar a oferta de mão de
obra pelos trabalhadores, aumentando assim o hiato do mercado de trabalho. Embora
o total de horas ofertadas ao salário real vigente (maior), as firmas estão demandando
menos, de forma que a quantidade efetiva de mão obra contratada é a curva Ls1 (ponti-
lhado vermelho) no gráfico (d). O mercado de trabalho se ajusta ao longo da curva de
demanda de mão de obra reduzindo as horas trabalhadas de L0 para L1 com um salário
real igual W0 /P1 tal como no ponto B no gráfico (d). O segundo ajuste na economia é
que há um efeito renda que atinge os trabalhadores que não perderam o emprego, pois
o salário real maior permite-lhes um nı́vel maior de consumo. Estre efeito já está com-
pensado pela inclinação positiva da curva de oferta agregada, no gráfico (a). para ver
este efeito, poderı́amos imaginar que a queda de demanda não tivesse reduzido o preço
o qual permaneceria em P0 após o choque. Neste caso a economia iria repassar todo o
choque de demanda e o nı́vel de produto de equilı́brio seria aquele correspondente ao
ponto B’ no gráfico (a), e não ao ponto B. Note que o ponto B’ situa-se mais à esquerda
de B. Este seria o caso de um curva de oferta agregada horizontal, com uma combinação
perniciosa de rigidez de salário nominal, combinada com rigidez de preço.

49
4.5 Modelo OA-DA Básico - O lado da demanda agregada

A descrição do equilı́brio no mercado de bens e mercado de trabalho nos casos de fle-


xibilidade e rigidez de salário nominal, resume as diferentes trajetórias de ajustamento
macroeconômico, por argumentos aplicados ao lado da oferta. As diferenças entre os
economistas keynesianos e clássicos não terminam ai. Há também diferenças pelo lado
da demanda agregada, que afetam a forma como a moeda e a taxa de juros afetam a
economia. As próximas seções deste capı́tulo abordarão sucintamente esta questão, onde
daremos ênfase à teoria quantitativa da moeda. No próximo capı́tulo o problema da de-
manda agregada será analisado em detalhes através do que convencionou-se chamar de
modelo IS-LM, que sintetiza as principais ideias keynesianas e serve de base para com-
preender o problema macroeconômico entre monetaristas e keynesianos que se instaurou
nos anos 1960 em diante e cujo debate se arrasta até os dias de hoje, especialmente a
controvérsia instalada após a inundação de moeda que se sucedeu à crise financeira de
2008 nos EUA e Europa. Os economistas nunca entraram em consenso sobre este tema.
O lado da demanda agregada no modelo clássico não foi muito desenvolvimento,
porque a teoria clássica dá pouca importância aos fatores pelo lado da demanda, baseada
no fato de que toda a oferta gera sua própria demanda. A renda total da economia é
gerada no momento da produção e portanto a remuneração dos fatores de produção,
principalmente capital e trabalho, é suficiente para determinar o nı́vel de demanda da
economia. Os determinantes da renda, portanto, são formados pelas variáveis pelo lado
da oferta no mercado de trabalho e de capitais. E como já demonstrado ao londo deste
capı́tulo anteriormente, devido a flexibilidade de preços e salários nominais, qualquer
variação da demanda causa apenas variações no nı́vel de preço, sem impacto nas variáveis
reais produto e emprego, não sendo necessário, de acordo com esta teoria, embrenhar-se
numa teoria da demanda agregada.
Mas mesmo assim, existe um argumento clássico que poderia ser utilizado como
uma teoria da demanda, a qual está baseada numa versão da teoria quantitiva da moeda
(TQM), que é a chamada versão de Cambridge 5 da equações das trocas da TQM.
Com base nesta versão da teoria quantitativa da moeda, também desenvolveu-se uma
teoria da taxa de juros e uma intepretação dos efeitos de uma polı́tica monetária sobre
o mecanismo de oferta e demanda de poupança na economia. Basicamente os clássicos
assumem que a moeda tem apenas uma função de facilitar as transações reais da eco-
nomia e portanto a quantidade de moeda em circulação deve manter uma proporção
fixa, com o nı́vel produto da economia. Variações na oferta de moeda causam apenas
inflação ou delfação, sem impacto real. A moeda é usada apenas para fins de transação.
Esta explicação também foi questionada por Keynes em seu longo tratado sobre moeda
[Keynes, 1930, Tratease on Money], onde afirmava que a moeda é também demanda
pelos agentes para fins especulativos, além dos motivos de transações, e que portanto
variações na oferta de moeda pelos bancos centrais6 podem ter impacto na demanda
agregada, que por sua vez terá impacto na produção e no emprego.
Nas próximas duas subseções veremos estas duas teorias brevemente. A teoria key-
nesiana monetária, por ora será apresentada de forma simplificada, pois o capı́tulo (5)
5
Devido aos seus formuladores Alfred Marshall e Arthur C. Pigou, então professores e economistas
da Universidade de Cambridge/UK.
6
Na época de Keynes não havia a figura dos bancos centrais atuantes na economia como vemos hoje,
mas sim um conjunto de bancos privados atuando de forma nem sempre completamente coordenada.

50
tratará do tema com mais profundidade e detalhamento.

4.5.1 A Curva de Demanda Agregada no Modelo Clássico - PY=MV


No modelo clássico a demanda agregada não possui efeitos reais, devido à curva de oferta
agregada vertical. No entanto, para efeitos de fechamento completo de um modelo OA-
DA, a curva demanda agregada numa economia fechada, contendo apenas efeitos de
polı́ticas monetárias através da variação da oferta de moeda a partir da teoria quanti-
tativa da moeda (TQM) a qual, por sua vez, culmina na chamada versão da equação de
Cambridge (UK) dada pela equação:

MV = PY (4.25)
onde M é a quantidade de moeda em circulação, que modernamente pode assumir
qualquer um dos conceitos M1, M2, M3 ou M4, muito embora originalmente era uma
quantidade fı́sica entre papel moeda em poder do público (PMPP); V é a velocidade de
circulação da moeda; P é o nı́vel de preços, e Y é a quantidade de bens e serviços ou a
produção fı́sica da economia.
A teoria clássica assume que a moeda é usada na economia apenas para fins transa-
cionais, para facilitar as trocas, ou o que convencionou-se chamar de demanda de moeda
por motivos de transação. Na equação (4.25) V e Y são constantes no curto prazo.
No caso da velocidade de circulação da moeda, esta depende do estágio tecnológico da
economia e reflete de forma genérica o grau de organização social e dos mercados finan-
ceiros e o acesso do público ao PMPP e depósitos a vista em contas bancárias. Pelo lado
da produção o produto também é fixo no curto prazo devido a flexibilidade de salários
(W ) e preços P de forma que o equilı́brio no mercado de trabalho praticamente deixa a
curva de oferta Y OA numa posição vertical. Portanto, no modelo clássico, e de acordo
com a TQM, variações na oferta de moeda causam apenas variações nos preços, pois a
equação (4.25) teria a forma final a seguir:
1
M= P Ȳ (4.26)

Em termos implı́citos, a demanda de moeda no esquema clássico é uma função ape-
nas do nı́vel de produto, isto é, a demanda de moeda, dada uma velocidade de circulação
da moeda, deve manter uma relação constante com o nivel de produto e pode ser re-
presentada pela função M d = f (Y ). Se o produto aumentar, por alguma alteração
da oferta agregada, então a quantidade de moeda ofertada M s deve variar na mesma
proporção para equilibra-se com a nova demanda de moeda necessária para suportar as
novas transações. A única polı́tica monetária factı́vel, sem causar inflação ou deflação
seria calibrar a oferta de moeda, tal que:
1
M s (t) = M d (t) =P Y (t) (4.27)

Este fato conduz a conclusão que no modelo clássico a moeda é neutra, pois não é
capaz de alterar o nı́vel de emprego e produto, mas tão somente o nı́vel de preços.
Além disto a maior ou menor oferta de moeda não tem efeitos sobre a taxa de juros.
A taxa de juros é formada no mercado financeiro pelo mecanismo de mercado ou, em

51
Figura 4.8: Oferta e Demanda de Fundos e Taxa de Juros

r
S(r)

I(r)

I,S

outras palavras, pela oferta (poupança) e demanda (investimentos) de fundos, conforme


figura (4.8).
Conforme a figura (4.8), a taxa de juros é determinada pelo comportamento dos
agentes (familias) poupadoras, que não consomem toda sua renda, ofertando fundos na
forma de poupança no mercado financeiro intermediado por bancos. O desequilı́brio no
fluxo de renda não gasto, é fechado pela demanda de fundos para investimentos por
parte de agentes (firmas) interessadas em operações de crédito emprestando fundos no
mercado financeiro, de forma que S(r) = I(r). A taxa de juros não é determinada pela
oferta de moeda, mas pela interação entre agentes poupadores e investidores. Se houver
mais demanda de fundos por motivos de investimentos do que oferta de poupança a
taxa de juros sobe, encarecendo o crédito e estimulando a poupança até que um novo
equilı́brio se estabeleça.
Juntando todas as partes do quebra-cabeça temos o equilı́brio geral no mercado de
bens, mercado de trabalho e mercado financeiro dado pela figura (4.9):

52
Figura 4.9: Equilı́brio Geral no Modelo Clássico

P
YOA
YDA

P0

Y0
Y

r I(r)
S(r)

r0

Y0
Y

4.5.2 A Curva de Demanda Agregada no Modelo Keynesiano

53
5. Polı́ticas Macroecônomicas nos modelos OA-DA

5.1 Polı́ticas Monetárias

5.2 Polı́ticas de Gastos

5.3 Polı́ticas Tributárias

54
6. O Modelo IS-LM

O modelo IS-LM representa uma economia fechada no curto prazo, em que não há va-
riações de preços. Assumir rigidez de preços no modelo IS-LM não é um pressuposto
necessário, mas ao fazê-lo neste momento tornamos mais fácil o entendimento dos me-
canismo de causa e efeito entre as variáveis macroeconômicas numa economia fechada.
Em resumo o modelo IS-LM representa o equilı́brio de uma economia em dois mercados
distintos: no mercado de bens e serviços e no mercado monetário. Estes dois merca-
dos, como se verá em detalhes, estão conectados por uma variável macroeconômica que
é a taxa de juros. A taxa de juros afeta simultaneamente a demanda agregada pois
pode influenciar as decisões de consumo, poupança e investimento, e ao mesmo tempo
determina a oferta de moeda ou a liquidez da economia por parte dos agentes no mer-
cado financeiro. Assim, polı́ticas monetárias adotadas pelas autoridades monetárias, na
forma de variação da quantidade de moeda em circulação, ou mais abrangentemente,
pela variação dos meios de pagamentos, podem afetar a taxa de juros e indiretamente a
demanda agregada e o nı́vel de renda ou emprego da economia. Neste capı́tulo este me-
canismo é apresentado em detalhes. Na seção 6.1 apresentamos o equilı́brio do mercado
de bens, na forma de igualdade entre oferta e demanda ou investimento e poupança,
daı́ a expressão IS. Na seção 6.2 apresentamos o equilı́brio no mercado monetário, onde
analisamos as curvas de oferta e a demanda de moeda e como elas determinam a taxa
de juros da economia. Na seção 6.3 apresentamos o equilı́brio geral, que consiste na
determinação da taxa de juros e nı́vel de renda que equilibra simultâneamente os dois
mercados. Na seção 6.4 será visto dois casos especiais do modelo geral, uma situação
chamada de “armadilha da liquidez”, em que a polı́tica monetária é ineficaz, e um se-
gundo caso que é o caso clássico ou monetarismo extremo, que é o caso em que a polı́tica
fiscal é ineficiente. Por fim, a última seção, 6.5, aplica o modelo IS-LM para analisar o
efeitos da combinação de diversas polı́ticas macroeconômicas sobre o nı́vel de renda e
taxas de juros.

6.1 Equilı́brio no Mercado de Bens - Curva IS

O modelo IS-LM mais simples é uma versão linear de uma abordagem estática (análise
dos diferentes pontos de equilı́brio) composta de uma equação de equilı́brio entre oferta
e demanda, assumindo que existe capacidade produtiva para atender qualquer nı́vel de
demanda da economia, tal que Y OA = Y DA = Y .
Algebricamente a curva IS de uma economia fechada, pode ser representada a partir
das equações abaixo:

Y =C +I +G (6.1)

55
C = C0 + c1 (Y − T ) (6.2)

I = I0 + b1 (Y ) − b2 r (6.3)

G = G0 (6.4)
onde a função consumo é uma função simples em que o consumo agregado depende
apenas da renda disponı́vel Y d = Y −T ), e a função investimento depende positivamente
da renda (Y ) e negativamente da taxa real de juros e por fim o governo realiza um gasto
fixo ao nı́vel G0 . Existem inúmeras variações deste caso básico, algumas das quais serão
analisadas em exercı́cios complementares.
Substituindo cada equação na equação (6.1) e resolvendo para a variável renda (Y )
obtemos uma expressão que nos permite calcular o nı́vel de renda pelo lado da demanda
agregada da economia.

1 b2
Y DA = Y = (C0 − c1 T + I0 + G0 ) − r (6.5)
(1 − c1 − b1 ) (1 − c1 − b1 )
Definindo A = C0 −c1 T +I0 +G0 como sendo os componentes autônomos ou exógenos
da demanda agregada, podemos exprimir a equação da renda de forma mais compacta
como:

1 b2
Y DA = Y = A− r (6.6)
(1 − c1 − b1 ) (1 − c1 − b1 )
A equação 6.6 é a curva IS do modelo IS-LM. Embora o modelo não esteja completo,
com base nesta equação ja é possı́vel analisar alguns efeitos de variações nos gastos do
governo, tributos e taxas de juros, sobre o nı́vel da demanda agregada.
O gráfico 6.1 representa o efeito de uma queda na taxa de juros sobre a demanda
agregada.
De acordo com a equação 6.6 há uma relação negativa entre taxa de juros e nı́vel de
renda, ou seja, uma elevação na taxa de juros provoca uma redução no nı́vel de renda da
economia e vice-versa. Com uma taxa de juros menor, haverá um aumento no nı́vel de
renda, deslocando a curva DA para cima até ser atingido o novo equilı́brio entre renda e
produto. A nova curva de demanda agregada passa a ser DA’ e o novo equilı́brio entre
renda e produto passa a ser representado pelo ponto B. Observe que neste novo ponto
de equilı́bro o nı́vel de renda da economia será maior, Y1 > Y0 . O efeito da redução na
taxa de juros sobre o nı́vel de renda pode ser visualizado no gráfico representativo da
curva IS. Observe que houve um deslocamento ao longo da curva IS, na qual ocorreu
um incremento no nı́vel de renda, passando de Y0 para Y1 e uma redução na taxa de
juros de R0 para R1 . A redução na taxa de juros provoca um deslocamento ao longo
da curva IS, deslocando a economia para o ponto B, ou seja, para um nı́vel maior de
renda. O deslocamento ao longo da curva IS ocorre em virtude de a taxa de juros ser
um componente endógeno ao modelo.
O gráfico 6.2 ilustra o que acontece quando ocorre elevações nos gastos do governo.
Haverá, neste caso, um aumento no nı́vel de renda deslocando a curva DA para cima
até ser atingido o novo equilı́brio entre renda e produto. Como no caso anterior, a nova

56
Figura 6.1: Efeito de uma redução na taxa de juros sobre o nı́vel de renda da economia

Figura 6.2: Efeito de um aumento nos gastos do governo sobre o nı́vel de renda da economia

curva de demanda agregada passa a ser DA’ e o novo equilı́brio entre renda e produto
passa a ser representado pelo ponto B. Neste novo ponto de equilı́brio o nı́vel de renda
será maior, Y1 > Y0 . Atente para o fato de que, até aqui, a elevação nos gastos do
governo possui o mesmo mecanismo que a redução na taxa de juros. A diferença entre
o impacto dessas variáveis sobre o nı́vel de renda pode ser melhor visualizada quando
observamos a curva IS. No caso anterior, uma redução na taxa de juros provocou um
deslocamento ao longo da curva IS na qual foi obtido um nı́vel de renda maior. Neste
caso, uma elevação nos gastos do governo provocará um deslocamento da curva IS para
a direita, com um nı́vel de renda maior (Y1 > Y0 ) e uma taxa de juros maior (R1 > R0 ).

57
6.2 Equilı́brio no Mercado Monetário - Curva LM e Bancos Centrais

Na seção anterior foi demonstrado o equilı́brio no mercado de bens e serviços. Agora


será demonstrado o funcionamento do mercado financeiro. Esta seção responderá à per-
guntas como: de que modo se dá a oferta de moeda? ; quais instituições são responsáveis
por essa oferta? ; de que modo é determinada a demanda por moeda? ; quais são os fa-
tores condicionantes desta demanda? ; de que forma a taxa de juros afeta o mercado
financeiro? ; de que modo a renda afeta este mercado?.

A) Demanda por moeda (Md )

Difenrente da teoria clássica, onde a demanda por moeda se dava apenas por fins de
transação, na teoria keynesiana a demanda por moeda ocorre por dois motivos: o motivo
da transações e adicionalmente um motivo de especulação, que o o Keynes chamou de
preferência pela liquidez.
A demanda por moeda pode se dar pela necessidade da realização de trocas entre
os indivı́duos, deste modo quanto maior o volume de trocas que os indivı́duos realizam
maior será a demanda por moeda. Neste aspecxto a teoria keynesiana não se diferencia
da abordagem da equação de Cambridge, dos clássicos. Essas trocas consistem basi-
camente no pagamento aos bens e serviços adquiridos pelos agentes. Outra forma de
se demandar moeda está relacionada ao que se denomina de motivo portfólio, ou mo-
tivo de especulação ou preferência pela liquidez: a moeda, neste caso, é considerada
igual a um ativo financeiro qualquer, tais como tı́tulos tanto públicos quanto privados
e aplicações financeiras em geral, tal qual a aquisição de ações de uma determinada
empresa. Nesta caso, a demanda por moeda depende da taxa de juros vigente na econo-
mia. Isto ocorre não porque a moeda requerida pelo motivo portfólio renda juros e sim
pelo custo de oportunidade de reter moeda. Se a taxa de juros for baixa o suficiente,
o custo de oportunidade de reter moeda será baixo e os agentes preferirão reter moeda
ao invés de assumir um certo risco ao aplicar em tı́tulos. Devido sua liquidez imediata,
a moeda não oferece riscos, comparados aos demais ativos financeiros. Caso a taxa de
juros seja elevada, os agentes se desfazem da moeda, ou deixam de demandar moeda e
preferirão aplicar seus recursos em tı́tulos. Agora há um elevado custo de oportunidade
em demandar moeda.
É importante ressaltar que a demanda por moeda depende do nı́vel de preços da
economia. Quanto mais elevados forem os preços, mais moeda será exigida em uma
transação e, deste modo, o público desejará reter mais moeda.
Assim é possı́vel estabelecer uma função de demanda de moeda com uma função do
nı́vel de renda e da taxa de juros da economia. Uma elevação no nı́vel de renda causa
um aumento na demanda por moeda. Uma vez que com um nı́vel de renda mais elevado
os agentes procurarão realizar mais transações. Uma redução na taxa de juros provocá
um incremento na demanda por moeda, uma vez que reduz o custo de oportunidade de
se reter moeda. Deste modo, a demanda por moeda é uma função positiva da renda e
negativa da taxa de juros. Isso explica a inclinação negativa da curva da demanda por
moeda em relação a taxa de juros (a curva LM). Esta relação pode ser visualizada no
gráfico abaixo:
A função de demanda de moeda, considerando preços constantes, é dada então pela
seguinte equação:

58
Figura 6.3: Demanda por moeda e taxa de juros

M d = L(Y, r) (6.7)
onde:

d(M d )
>0 ou Ly > 0
dY
d(M d )
<0 ou Lr < 0
dr

6.2.1 A oferta de moeda pelo Banco Central


O banco central possui diversas funções, entre as quais a emissão de papel moeda e con-
trole dos meios de pagamentos. A função mais importante para a teoria macroeconomia
é a de emissão de meios de pagamentos e devido a isto será o objeto de análise deste
capı́tulo. A tı́tulo de curiosidade será apresentada abaixo algumas das funções exercidas
pelos BCs:
1) Controle da liquidez da economia: o banco central possui instrumentos que o
permite controlar a quantidade de moeda em circulação na economia.
2) Auxilio aos bancos comerciais: realiza empréstimos e desconto de tı́tulos dos ban-
cos comerciais. Mantém parte das reservas destes bancos, sejam as reservas obrigatórias
exigidas pelo banco central (depósitos compulsórios), ou as reservas voluntárias desses
bancos (depósitos voluntários).
3) Regulação do sistema financeiro: Os bancos centrais podem regular as atividades
dos bancos comerciais e das instituições financeiras.
4) Depositário de reservas internacionais: o banco central retêm moeda estrangeira
para atende a demanda dos agentes que têm de realizar operações no exterior e evitar
situações de escassez de divisas.
A teoria macroeconômica considera que a única forma de a moeda entrar na econo-
mia é através da criação de moeda pelos bancos centrais, ou seja, essa instituição possui
o monopólio sobre a oferta de moeda de uma economia.

Mas de que forma os bancos centrais criam moeda?

59
O Banco Central pode expandir ou contrair a quantidade de moeda em circulação
em uma economia através das operações de mercado aberto, nas quais o BC atuará na
compra e venda de tı́tulos governamentais. Quando o Banco Central do Brasil (BACEN)
deseja aumentar a quantidade de moeda em circulação ele atua comprando tı́tulos por
parte do público, desta forma a uma enxurrada de dinheiro novo na economia. Caso o
BACEN deseje diminuir a quantidade de moeda em circulação, atua vendendo tı́tulos
do governo e retendo desta forma parte da moeda em circulação na economia.
Abaixo, há um esquema algébrico utilizado para ajudar na compreensão da demanda
e oferta de moeda:
Em que:

• M d - Demanda de Moeda

• PMPP - Papel Moeda em Poder do Público

• DV - Depósitos a Vista nos Bancos Comerciais

• M1 , M2 , M3 , M4 = Meios de Pagamentos

• M1 = PMPP + DV

• M2 = M1 + Depósitos de Poupança + Tı́tulos Privados

• M3 = M2 + Tı́tulos de Renda Fixa + Operações Compromissadas

• M4 = M3 + Tı́tulos Federais (Selic) + Tı́tulos Estrangeiros e Monetário

• R = Reservas Bancárias (Voluntárias e Compulsórias)

• H d = Demanda de Moeda proveniente do Banco Central

Para o Banco Central determinar a Oferta (M s ) ele precisa calcular a Demanda de


Moeda pelos Agentes.

Demanda Total de Moeda

M d = P M P P + DV (6.8)
A demanda por moeda é representada pela soma de papel moeda em poder do público
com os depósitos à vista dos bancos comerciais. O papel moeda em poder do público
nada mais é do que a soma de dinheiro que o público deseja reter em mãos. No caso do
Brasil o PMPP é a soma das notas com as moedas de reais que os agentes mantêm em
mãos. Os depósitos à vista dos bancos comerciais, nada mais são, do que a demanda por
reservas por parte dos bancos. A soma de PMPP com os DV representam o indicador
M1 .
Neste caso o Depósito à Vista (DV) é o conceito de Meios de Pagamentos na forma M1 .

Seja c a propensão de PMPP em relação a M d .

M d = cM d (6.9)
onde 0 < c < 1

60
Sendo c a propensão da demanda por moeda do banco central em função do papel
moeda em poder do público, (1-c) será a propensão da demanda por depósitos à vista.
Deste modo tem-se:

M d = DV = (1 − c)M d (6.10)
A partir das propensões de demanda por papel moeda e de depósitos à vista, basta
substituir 1.3 em 1.4 para obter:

M d = cM d + DV (6.11)

DV = (1 − c)M d (6.12)
Demanda por Reservas por parte dos Bancos

R = (1 − c)θDV (6.13)
Os Bancos mantêm um percentual θ dos depósitos à vista na forma de reserva obri-
gatórias ou compulsórias, este percentual (R) é mantido para atender aos saques e aos
depósitos à vista necessitados pelos seus clientes.

Substituindo 6.12 em 6.13 tem-se:

R = (1 − c)θM d (6.14)
4) Demanda de Moeda ofertada pelo Banco Central (H d )

Hd = P M P P + R (6.15)
Conforme explicitado acima a moeda ofertada pelo Banco Central ficará na forma
de PMPP e em reservas bancárias.
Substituindo ?? e 6.14 em 6.15 tem-se:

H d = [c + (1 − c)θ]M d (6.16)
Esta equação determina qual deve ser a oferta de moeda (base monetária) para
atender a demanda. Se usarmos a equação de demanda por moeda, de um modelo
IS-LM, M d = L(Y, i) ou M d = KY − hi então:

H d = [c − (1 − c)θ]f (y, i) (6.17)


o termo f (y, i) é dependente do estado da economia.
O banco central, como autoridade monetária, controla H d como forma de administrar
a liquidez do sistema monetário. verificar se esta informação está correta a forma pela
qual os BCs controlam H d é a mesma explicitada acima, ou seja, atravez das operações
de mercado aberto

H d = [c + (1 − c)θ]M d (6.18)
Oferta e Demanda de Moeda, novamente:
Base Monetária, controlada pelo BC:

61
Figura 6.4: Equilı́brio entre oferta e demanda por moeda

H
= L(Y, r) > 0
[c + θ(1 − c)]
O lado esquerdo da equação representa a oferta de moeda ao passo que o lado direito
representa a demanda por moeda.
1
→ (Multiplicador da Base Monetária)
c + θ(1 − c)

• Meios de Pagamento = P M P P + DV

• Base Monetária = P M P P + Reservas

• Meios de Pagamento = Base Monetária x Multiplicador da Base

Obs.: Não confundir multiplicador da base com multiplicador bancário.

A Curva LM

Um exemplo de equação de demanda na forma linear é:

Md
M d = L(Y, r) nominal ou = L(Y, r) em termos reais (6.19)
P
onde:
L=Oferta de Moeda
Y =Renda Nominal
r=Taxa de Juros
M =Demanda de Moeda

Neste caso a demanda por moeda é uma função positiva da renda e negativa da
taxa de juros. Incrementos na renda resultam em aumento na demanda por moeda em
proporção idêntica a constante k, a análise oposta pode ser feita para reduções no nı́vel
de renda. Com relação a taxa de juros se verifica o efeito oposto, ou seja, incrementos
na taxa de juros acarretam em redução na demanda por moeda igual a h e vice e

62
versa. A explicação para a relação negativa entre demanda por moeda e taxa de juros
está no mercado financeiro, uma vez que para taxas de juros mais elevadas os agentes
procurarão aplicar seu dinheiro, ao passo que para taxas de juros menos elevadas os
agentes procurarão reter moeda.

Md
= kY − hr
P
Resolvendo para r obtem-se a expressão para a curva LM, dada pela equação 6.20 a
seguir. Esta equação está representada no gráfico 6.3.

1 Md
i= (kY − ) (6.20)
h P

Figura 6.5: Curva LM

O gráfico 6.5 demonstra a construção da curva LM. A partir do ponto de equilı́brio


A do gráfico a esquerda(M s = M d ) observa-se o que acontece com uma elevação no
nı́vel de renda da economia. Com o nı́vel de renda Y0 a demanda por moeda era igual
a M0d . Um aumento no nı́vel de renda para Y1 , dada uma determinada taxa de juros,
causa uma elevação na demanda por moeda, conforme demonstra a equação equação
1.3, e esta passa a ser Md1 . A alteração no nı́vel de renda desloca a curva de demanda
por moeda para a direita. Caso a oferta de moeda permaneça constante, esse aumento
na demanda por moeda causará uma elevação na taxa de juros (a demanda por moeda
excederá a oferta e deste modo o preço da moeda medido através da taxa de juros irá
subir). O novo equilı́brio se dará no ponto B. Para a taxa de juros retornar ao patamar
inicial é necessário que haja um aumento na oferta de moeda em magnitude semelhante
a elevação ocorrida na demanda por moeda. Toda a interação que ocorreu no gráfico
da esquerda é representado no gráfico a direita. Os pontos A e B que formam a curva
LM no gráfico a direita são obtidos através dos pontos A e B do equilı́brio entre oferta
e demanda por moeda do gráfico a esquerda, ou seja, a curva LM nada mais é do que
uma junção de pontos que representam os diversos equilı́brios entre oferta e demanda
por moeda. Ela é positivamente inclinada, indicando que elevações no nı́vel de renda
causam aumentos na taxa de juros.

63
6.3 Equilı́brio Geral do Modelo IS-LM

Para determinar o nı́vel de produto e da taxa de juros de uma economia é necessário


combinar o modelo IS e LM obtendo, deste modo, o modelo macroeconomico represen-
tativo de uma economia.

O modelo IS, conforme descrito no inı́cio do capı́tulo é representado por:

1 b2
Y = A− r (6.21)
(1 − c1 − b1 ) (1 − c1 − b1 )
Em que A são os componentes dos gastos autonômos.

O modelo LM , conforme descrito anteriormente é dado por:

Md
= kY − hr (6.22)
P
Agregando os dois modelos encontra-se o nı́vel de produto de equilı́brio.

h b M
Y = + × (6.23)
[(1 − c1 )h + bk] [(1 − c1 )h + bk] P
Se substituirmos a equação 6.23 no lugar de Y da equação 6.22 e isolarmos r obte-
remos a taxa de juros de equilı́brio da economia.

k bk 1
Y = A0 + [ − 1] f racM P (6.24)
[(1 − c1 )h + bk] [(1 − c1 )h + bk] h
A equação 6.23 representa o produto de equilı́brio de uma economia, condiderando
tanto o mercado de bens e serviços quanto o mercado financeiro. Ao passo que a equação
6.24 demonstra a taxa de juros de equilı́brio da economia.
A figura abaixo ilustra as curva IS e LM em um mesmo gráfico. Qualquer ponto ao
longo da curva IS representa o equilı́brio no mercado de bens e serviços, ao passo que
qualquer ponto ao longo da curva LM demonstra o equilı́brio no mercado monetário.
A intersecção entre as duas curvas, representada pelo ponto A, nos dá o equilı́brio geral
de uma economia, ou seja, o ponto em que há equilı́brio tanto no mercado de bens
e serviços quanto no mercado monetário. Por demonstrar o equilı́brio entre os dois
tipos de mercado estudados na macroeconomia, a agregação das relações IS e LM nos
permite obter informações importantes sobre nı́vel de consumo, investimento, demanda
por moeda, gastos do governo de uma economia. Daı́ resulta a importância deste modelo.

6.4 Casos Especiais do Modelo IS-LM

6.4.1 Armadilha da Liquidez


A situação conhecida por armadilha de liquidez é caracterizada por uma demanda de
moeda infinita em relação a taxa de juros. A taxa de juros é tão baixa que os agentes

64
Figura 6.6: Equilibrio Geral - IS=LM

formam expectativas sobre os preços dos ativos considerando que o preço esperado é tão
alto que não vale a pena comprar o ativo agora. Os Agentes sabem que o preço somente
cairá quando a taxa de juros subir. Como ela está num nı́vel muito baixo, é preferı́vel
ficar com moeda em mãos, esperando os juros subir ou, em outras palavras, o preço dos
ativos baixar (de acordo com a teoria keynesiana há uma relação negativa entre preços
dos ativos e taxa de juros, ou seja, para taxas de juros reduzidas o preço dos ativos será
elevado). Esta situação foi verificada na crise de 1929 e na de 2008. Nestas ocasiões
o nı́vel de investimento torná-se insensı́vel com relação a taxa de juros. O único modo
de tirar a economia da recessão, neste caso, é através do uso da polı́tica fiscal, ou seja,
diminuição da tributação e aumento nos gastos do governo.

dl
=∞ (6.25)
di
O gráfico 6.7 representa a situação de armadilha de liquidez. Quando a taxa de juros
é i0 , os agentes detêm uma parte de seus recursos sob a forma de moeda e outra parte
sobre a forma de ativos. Quando a taxa de juros se reduz a patamares próximos a zero,
os agentes preferirão reter todo incremento na sua renda sob a forma de moeda. Isto
ocorre a partir da taxa de juros i1 = i2 .
esta parte era para sair em baixo da figura 6.7 A figura acima representa a curva LM
em casos de armadilha de liquidez. Lembre-se de que a curva LM é obtida através dos
diversos pontos que representam o equilı́brio entre oferta e demanda por moeda. Desta
forma, o gráfico 6.8 é obtido através do gráfico 6.7.
A teoria denominada Mmonetarismo tipo I surgiu dentro da Universidade de Chicago
e possui como um de seus representantes Milton Friedman, economista ganhador do
prêmio nobel de 1976. A principal proposição deste tipo de monetarismo é a adoção de
uma regra monetária. De acordo com esta teoria a inflação é um fenômeno monetário.
De acordo com este modelo o moeda é neutra no longo prazo, ou seja, variações no
estoque monetário não afetam as variáveis reais da economia.

6.5 Politicas Macroecnômicas no Modelo IS-LM

Polı́tica Monetária Expansionista

65
Figura 6.7: Demanda e oferta por moeda na armadilha de liquidez

Figura 6.8: Curva LM na armadilha de liquidez

Polı́tica Fiscal Expansionista

Polı́tica Coordenação de Polı́ticas

66
Parte III

DEMANDA AGREGADA EM
ECONOMIA ABERTA

67
7. Balanço de Pagamentos, Câmbio e Juros

Definições e Pontos de Partida

Em economia fechada os agentes tomam decisão entre consumir (C) e poupar (S).
No caso de economia aberta a decisão de consumo e poupança é desmembrada entre
consumo interno (C int ) e consumo externo (C ext ) e poupança interna (S int ) e poupança
externa (S ext ), e consequentemente o investimento é separado em investimento de ori-
gem doméstica e investimento estrangeiro direto (IED) realizado no paı́s. A abertura
da economia portanto envolve fluxo de divisas (moedas estrangeiras), que podem en-
trar a sair da economia por dois motivos básicos: motivos transacionais, em função da
importação e exportação de bens e serviços, e por motivos financeiros, acarretando flu-
xos financeiros motivados por diferenciais de juros entre a economia nacional e o resto
do mundo. O primeiro caso impactas o saldo de transações estrangeiras na conta de
transações correntes do balanço de pagamentos e o segundo caso na conta financeira.
A variável macroeconômica que regula as transações e movimentos de capitais é a taxa
de câmbio, cujas variações são importantes para determinar o nı́vel interno dos preços,
a demanda agregada e a oferta. A taxa de juros também afeta o fluxo financeiro de
forma que câmbio e juros são duas variáveis macroeconômicas importantes para anali-
sar a dinâmica macroeconômica de uma economia aberta. Por exemplo, um aumento da
taxa interna de juros, atrai capital financeiro especulativo que ao entrar no paı́s provoca
valorização cambial a qual por sua vez, afetará os fluxos de exportações e importações,
turismo, etc, alterando não apenas o saldo do balanço de pagamentos, mas a própria de-
manda interna. Estas relações de causa a efeito serão estudadas em detalhes através de
modelos algébricos que capturam a intensidade e direção (positiva ou negativa, aumento
ou redução) destes efeitos no sistema econômico.

7.1 Balanço de Pagamentos

O valor dos fluxos de todas as transações de uma economia com o exterior é registrado
contabilmente no Balanço de Pagamentos (BP). O BP é dividido em duas grandes par-
tes, a conta de transações correntes, onde se registram os fluxos de negócios “reais” e as
conta de capital e a conta financeira, onde se registram os fluxos de capitais pelo mer-
cado financeiro. A expressão “negócios reais” significa apenas que são fluxos oriundos de
transações econômicas de exportações, importações, remessas de lucros, transferências
de numerário e pagamentos de serviços. Esses fluxos se originam de alguma operação
de compra e venda de bens (tradables), serviços (no-tradables) ou remessas de lucros e
renda cuja origem também é resultado de uma atividade econômica no mercado de bens
e serviços. Imagine um trabalhador no estrangeiro, recebendo salário no estrangeiro, en-
viando parte de sua renda-salário para sua famı́lia no paı́s de origem. Isto é interpretado

68
como uma transferência de renda. Igualmente, imagine uma empresa nacional com um
filial no estrangeiro, enviando parte do seu lucro lá fora para o paı́s de origem. Todas
essas transações serão registradas e totalizadas na conta transações correntes. Por ou-
tro lado, investimentos especulativos no mercado financeiro, investimentos estrangeiros
no paı́s, empréstimos diversos e amortizações de dı́vidas, etc, são registrados na conta
financeira. Neste contexto, a palavra capital não significa capital fı́sico, tal como se-
ria interpretada numa função de produção, mas significa capital financeiro. É comum
também destacar apenas os fluxos de importações e exportações de bens, os chamados
tradables, como balança comercial.

7.2 Taxa de Câmbio

7.2.1 Taxa de Câmbio Nominal


A taxa de câmbio representa o preço de uma determinada moeda em relação a uma
outra, ou seja, mostra o preço relativo entre ambas. Ela pode ser escrita de duas formas
distintas, onde o (*) significa preço estrangeiro:

• Na forma direta E = P
P∗ = R$
U S$
P∗
• Na forma indireta E = P = U S$
R$

Em ambos os casos, estamos falando em taxas de câmbio nominal, que é dado


pelos termos de troca, também chamada de versão absoluta da paridade de poder
de compra. Quando se ouve falar que a moeda nacional se desvalorizou, significa
que precisamos de mais moeda doméstica para comprar a mesma quantidade de moeda
estrangeira, isto é, um aumento de E na forma direta. E dizemos que houve uma
valorização cambial quando precisamos de menos moeda doméstica para comprar uma
unidade de moeda estrangeira. Uma taxa nominal de câmbio de R$ 3,00/US$ significa
que precisamos de três reais para comprar um dólar. Se a taxa de cambio mudar para R$
3,30, houve então uma desvalorização de 10%. Resta saber o que aconteceu na prática,
se foi a moeda doméstica que desvalorizou então aumentou o numerador, mas se foi a
moeda estrangeira, então diminuiu o denominador. Em geral costuma-se raciocinar que
é o numerador que está variando, como no caso R$/US$, em que o real é moeda que
está sofrendo alteração.
Em essência variações na taxa de câmbio refletem diferenças na inflação entre dois
paı́ses, pois a inflação é a velocidade com que os preços variam. Existe portanto uma
versão relativa da paridade do poder de compra (PPP), dada pela diferença entre duas
taxas de inflação:
(1 + π)
(1 + ∆E) = ≈ ∆E = π − π ∗ (7.1)
(1 + π ∗ )
Nesse caso, torna-se necessário corrigir as taxas de câmbio através da inflação naci-
onal e estrangeira.

7.2.2 Taxa de Câmbio Real


Apesar da taxa de câmbio nominal nos dar uma ideia sobre preços das moedas, a melhor
taxa de câmbio para determinar os fluxos comerciais entre os paı́ses seria a taxa de
câmbio real. Na forma indireta, podemos descreve-la como:

69
P
θ= (7.2)
EP ∗
A taxa de câmbio real demonstra a razão entre o preço de um produto nacional
e o preço de um produto estrangeiros, ambos medidos em moeda nacional. A seguir,
segue-se um exemplo. Suponha:
RS2,00
• Uma taxa de câmbio nominal de U SS1,00

• Um automóvel que custa R$25.000,00 no Brasil

• O mesmo automóvel custa US$10.000 nos EUA

Portanto, qual a taxa de câmbio?


Comparado em US$:

P BR 25.000 25.000
ε = ER = EU A
= = = 1, 25
EP 2 · 10.000 20.000
Comparado em R$:

P EU A E 2 · 10.000 20.000
ε = ER = BR
= = = 0, 80
P 25.000 25.000

Inflação e Variação Cambial

Agora, suponha uma inflação no preço do automóvel de 10% nos dois paı́ses:

P BR /E 25.000 · 1, 10
ε= EU A
= = 1, 25
P 2(10.000 · 1, 10)
É interessante observar que a taxa de câmbio real não mudou, pois o preço do
automóvel variou na mesma proporção nos dois paı́ses, visto que a taxa de câmbio
nominal permaneceu constante.
Outro exemplo:

• Um automóvel custa R$20.000,00 no Brasil

• O mesmo automóvel custa €12.000 na França

• Considere a taxa de câmbio real θ = 1

20.000
E= = 1, 667
12.000
Se houver 5% de inflação no Brasil e 10% de inflação na França

Taxa de câmbio nominal


P · 1, 05 20.000(1, 05)
E= ∗
= = 1, 59
P · 1, 10 12.000(1, 10)

70
Também podemos escrever da seguinte maneira:
1, 05
E = 1, 67 · = 1, 59
1, 10
Isso significa que, quando ocorre uma inflação da moeda estrangeira maior do que a
nacional, a moeda nacional se valoriza (baseando-se no câmbio direto).

Taxa de câmbio real


20.000 · 1, 05
θ= = 0, 95
1, 667 · 12.000 · 1, 10
Como anteriormente, com uma inflação estrangeira maior que a nacional, a taxa de
câmbio real diminui, portanto a moeda nacional se valorizou em 5

7.3 Taxa de Juros

7.3.1 Paridade Descoberta da Taxa de Juros

Seja θ = EP P ∗
∗ a taxa real de câmbio e i a taxa nominal interna de juros e i a taxa de

juros de algum paı́s de referencia. Então um investidor financeiro brasileiro, no Brasil e


no exterior, tomará suas decisões da seguinte maneira: um investimento no Brasil em t0
em R$ equivale a ER$ t0
em US$ nos EUA. Após um certo perı́odo de tempo, por exemplo
um ano, t1 , o investimento aqui no Brasil valerá R$ (1 + i), enquanto no exterior ele
valerá ER$
t+1
· (1 + i∗). Portanto, o agente tomará suas decisões levando em conta as
seguintes variáveis:
• 1) O valor da taxa de juros interna
• 2) O valor da taxa de juros externa
• 3) A valorização (ou a tendência de valorização) da taxa de câmbio nominal
Sendo assim, o investidor decidirá investir seu capital no Brasil caso a taxa de juros
interna seja maior do que a externa (i > i∗) ou caso ele acredite que a moeda nacional
irá se valorizar em relação à moeda norte-americana. Caso contrário, se a taxa de juros
externa for maior do que a interna (i < i∗) e o investidor acredite que a moeda nacional
irá se desvalorizar em relação à norte-americana, ele irá decidir investir seu capital no
exterior. Portanto, para que os dois rendimentos sejam iguais, teremos que fazer os
seguintes cálculos.

R$(1 + i) = U S$ · Et+1 (1 + i∗)


R$
R$(1 + i) = Et+1 (1 + i∗)
Et
Sendo assim:

Et+1
(1 + i) = (1 + i∗) (7.3)
Et
A equação acima é denominada de equação da paridade descoberta da taxa
de juros (PDTJ), e representa o valor das variáveis para que os rendimentos nos dois
paı́ses sejam iguais.

71
8. Regimes Cambiais e Mobilidade de Capital

Por regimes cambiais nos referimos a forma como um paı́s, através do seu banco central,
determina o comportamento da taxa de câmbio. E mobilidade de capital é o sistema de
regulação, em geral baseado em legislação, que classifica e seleciona que tipo de divisas
estrangeiras podem entrar no paı́s e quais as condições em que deve permanecer ou sair
do paı́s.
Por exemplo, em alguns paı́ses os governos não permitem a entrada de capital fi-
nanceiro especulativo ou quando permitem, determinam um perı́odo de “quarentena”
dentro do qual o capital não pode ser retirado. Restrições na mobilidade de capital em
geral é uma polı́tica macroeconômica que tem por objetivo reduzir a volatilidade da
taxa de câmbio. Os anos 1990 e 2000 foram décadas marcadas por desregulamentação
do sistema financeiro internacional e a maioria dos paı́ses permite hoje que o capital
financeiro possa circular livremente em suas economias internas, seja para compra de
tı́tulos e ações no mercado privado, como compra de tı́tulos públicos.
Quanto maior a mobilidade de capitais, maiores tendem a ser os ingressos ou saı́das
de capitais e maior a dificuldade dos banco centrais em manter a taxa de câmbio fixa.
Por tanto, existe uma combinação adequada do grau de mobilidade de capitais com
o tipo de regime cambial adotado. Em geral regimes de cambio fixo, em que o banco
central realiza compra e vendo de moeda estrangeira com a finalidade de evitar variações
na taxa de cambio, requer a redução no grau de mobilidade de capitais, pelo simples
motivos de que o montante de fluxos de capital financeiro que entra e sai no curto prazo,
pode ser tão grande que não há reservas internacionais suficientes para o banco central
bancar o fluxo de compra ou venda. Vários são os casos na economia internacional, de
crises cambiais em que os banco centrais foram incapazes de evitar uma desvalorização
cambial especulativa por parte dos grandes fundos de investimentos financeiros, mesmo
nos paı́ses industrializados.
São três os regimes cambiais básicos:

• Cambio Fixo

• Cambio Flutuante

• Bandas Cambiais

e são três as possibilidades de graus distintos de mobilidade cambial:

• Sem Mobilidade

• Mobilidade Perfeita

• Mobilidade Imperfeita

72
No regime de câmbio o paı́s em questão por um motivo de polı́tica macroeconômica
adota uma polı́tica cambial de manutenção de uma taxa de cambio, seja ela valorizada
ou desvalorizada. qualquer que seja o nı́vel da taxa de cambio o objetivo é manter o
cambio estável, sem flutuação. Por exemplo, a China tem mantido sua taxa de cambio
desvalorizada por décadas, como uma maneira de estimular suas exportações tornando
seus produtos no resto do mundo, mais baratos. No Brasil, durante o Plano Real entre
jun/1994 a dez/1999 a taxa de cambio foi mantida fixa, e valorizada na proporção de
R$ 1,00 por US$ 1,00, como uma forma de manter os produtos estrangeiro mais barato
e com isso conter a inflação. Este regime cambial também ficou conhecimento como
“ancora cambial”, por ter ancorado a inflação interna à uma polı́tica cambial.
Para manter o cambio fixo, um banco central deve ser capaz de realizar operações
de compra e venda de moeda estrangeira no montante desejado pelos agentes, princi-
palmente fundos de investimentos financeiros. Suponha que existe um volume alto de
investidores querendo retirar seus investimentos de um determinado paı́s. Estes agentes
criam uma demanda por moeda estrangeira, predominantemente o dolar atualmente,
e portanto desejam comprar moeda estrangeira. Este desejo de compra faz com que
os vendedores cambio cobrem uma taxa maior, a qual será tanto maior quanto mais
escassa é a moeda estrangeira. Se o mercado não cobrir as ofertas de compra o banco
central deverá intervir no mercado ofertando moeda estrangeira de suas reservas, com
o objetivo de manter o cambio estável. A venda de divisas pelo banco central, se este
tiver estoque suficiente, neutralizará as pressões por desvalorização e manterá o cambio
estável.
Em geral, quando os deficit no balanço de pagamentos, são crônicos e não há fluxos
de entrara de capital financeiro para equilibrar o mercado de moedas, é muito difı́cil
para qualquer banco central manter o cambio fixo, em função da grande hipertrofia
dos mercados financeiros, que movimentam volumes altı́ssimos de recursos, para muito
além da capacidade de intervenção dos bancos centrais. É por isso que alguns paı́ses,
como o Brasil, procuram manter um certo estoque de reservas cambiais, como forma de
desestimular corridas cambiais ou ataques especulativos.
Do ponto de vista macroeconômico as intervenções do banco central no mercado
cambial envolve a troca de moedas, e no fim, estas trocas acabam condicionando a
polı́tica monetária. Quando o banco central vende moeda estrangeira para alimentar
o fluxo de saı́da, ele está no fundo, adotando uma polı́tica monetária contracionista,
reduzindo quantidade de moeda em circulação, com todos os efeitos negativos em termos
de crescimento econômico que uma polı́tica monetária causa. O inverso ocorre quando
há saldos positivos de transações correntes e fluxos de capitais financeiros. Neste caso
o banco central precisa comprar estas dividas e ao fazer isso, amplia a oferta de moeda
nacional, o que acaba se transformando numa polı́tica monetária expansionista, que
pode ser boa em termos de crescimento, mas poderá ser nociva ao estimular a inflação,
especialmente numa situação de pleno emprego.

8.1 Cambio Flutuante

Dadas as dificuldades inerentes de um banco central controlar a taxa de cambio durante


um certo e longo perı́odo, especialmente num contexto de mercados financeiros hiper
desenvolvidos, em que o montante de recursos financeiros chega a ser dezenas de vezes
maior que a economia real, muitos bancos centrais desistiram de administrar suas taxas

73
de cambio para fins diversos. Com isso readquirem a capacidade de executar uma polı́tica
monetária independente, para outros fins. No regime de cambio flutuante o banco central
não intervém no mercado de divisas, e permite que a taxa flutue livremente ao sabor do
mercado, se na direção de desvalorizações ou valorizações.
Ocorre que o regime de cambio flutuante leva à muita instabilidade macroeconômica.
Suponha que uma economia esteja passando por um perı́odo de aceleração da inflação
e, por outros motivos, haja tendência de desvalorização cambial. Isto irá colocar mais
pressão sobre a inflação. Embora o padrão geralmente adotado e anunciado por diversos
paı́ses seja o cambio flutuante, na prática todos os banco centrais realizam algum grau de
intervenção, através de compra e venda, no mercado cambial com o objetivo de reduzir a
instabilidade cambial, o que ficou conhecido na literatura como fear of floting, ou medo
de flutuar.

8.2 Bandas Cambiais

Assim, na prática, o que os bancos centrais tendem a fazer é um certo pragmatismo


em que permitem o cambio flutuar dentro de uma banda, com um limite superior e
inferior, geralmente não declarado mas subentendido pelos agentes. O regime de banda
cambial permite maior margem de manobra pelo banco central, que se desobriga de
realizar intervenções de compra e venda com muita frequência, e de realizar uma queda
de braços com o mercado que poderia ser muito custo em termos de queima de reservas
e descontrole da polı́tica monetária.

8.3 Macroeconomia aberta

A combinação de regimes cambiais, especialmente os casos de cambio fixo e flutuante com


grau de mobilidade de capitais, foi abordada mais formalmente pelos economistas Robert
A. Mundell (premio Nobel 1999) e Marcus Fleming [Mundell, 1960, 1963, Fleming, 1974].

74
9. Modelo IS-LM-BP

Considere um modelo de curto prazo com as seguintes equações:

Y = C + I + G + (X − M ) (9.1)
onde X e M representam o fluxo de exportações e importações respectivamente, de
bens e serviços, sem incluir movimentações financeiras. As exportações e importações
são componentes da demanda agregada, onde X é uma demanda externa por bens
e serviços produzidos internamente, enquanto as importações significa uma parte da
demanda interna que é satisfeita com produtos e serviços produzidos no exterior.
Para efeito de entendimento do que está em jogo, podemos separar os componentes
internos e externos da demanda agregada, fazendo:

Y = C + I + G + (X − M )

Y = C − T + T − G + I + (X − M )
(Y − C − T ) + (T − G) + (X − M ) = I
onde separamos a poupança privada da poupança pública e por fim, da poupança ex-
terna:
Sp = Y − C − T
Sg = T − G
Sx = X − M
e portanto no caso de uma economia fechada temos que, contabilmente, o investi-
mento é igual à poupança privada das famı́lia e a poupança pública, do governo:

I = Sp + Sg (9.2)
No caso de uma economia aberta, teremos mais um componente de poupança que é
a poupança externa, formada pelo saldo da balança comercial

I = Sp + Sg + Sx (9.3)
onde

BP = BC = X − M = Sx (9.4)
A equação (9.3) mostra que, contabilmente, o investimento total da economia cor-
responde à somas das poupanças. A equação (9.4) mostra que o saldo em transações
correntes (X − M ) é igual a poupança externa, o que faz com que em alguns contextos

75
macroeconômicos, alguns autores se refiram ao saldo do balanço de pagamentos (aqui
balança comercial) como poupança externa. São duas maneiras de ver a mesma coisa.
Para aumentar o investimento na economia deve-se incorrer em aumento do superavit
em transações correntes ou no balanço de pagamentos. No caso em que o crescimento
econômico aumentar as importações e causar um deficit na balança comercial, será ne-
cessário que o paı́s obtenha recursos financeiros via conta de capitais, o que leva muitos
economistas a afirmar que paı́ses sem poupança interna só podem crescer se aumentar
o investimento com aumento de dı́vida externa ou deficit nas transações correntes. Mas
isto não é um mecanismo estável e duradouro, pois em algum momento o excesso de
divida externa ou dependência externa irá desestabilizar a taxa de cambio com efeitos
diversos e deletérios para a dinâmica macroeconômica.
Há um ponto importante, para a teoria macroeconômica, que não vamos aprofundar
aqui devido ao espaço e ao objetivo de apresentar a mecânica do modelo IS-LM-BP,
que é a coordenação de decisões dos agentes. Na prática as decisões de investimento
são tomadas por um tipo de agente (firmas) e as decisões de poupança por outros
(famı́lias, governo, setor externo), além do problema de decisões ex-ante e fatos ex-post.
Quando assumimos, como o faremos, que I = S, além de ser uma identidade contábil,
estamos assumindo que é uma imposição ex-post que não necessariamente significa uma
coordenação perfeita ex-ante das decisões dos agentes. Há um vasto debate na literatura
sobre isso, que não iremos tratar neste capı́tulo, cujo objetivo é somente apresentar o
modelo macroeconômico de economia aberta, num mundo perfeito de coordenação entre
decisões de investimento e decisões de poupança.
A relação entre nı́vel de renda e equilı́brio no balanço de pagamentos pode ser melhor
visualizada na figura (9.1), para o caso em que a taxa de juros interna não afeta os fluxos
de capitais. Dado um nı́vel de exportação X, que depende da taxa de cambio e da renda
externa, e dado uma elasticidade renda das importações, um aumento na renda interna
irá aumentar as importações e gerar um deficit no balanço de pagamentos (painel a),
quando M > X. Desta forma, pontos situados à direita da curva BP significam deficit e
pontos à esquerda superavit (painel b). Além disso como não há mobilidade de capital
(φ = 0) variações na taxa de juros não causam variações de capital, significando que
qualquer nı́vel de taxa de juros não irá provocar fluxos de capitais, fazendo com que a
curva BP seja vertical.

9.1 O Modelo Mundell-Fleming

Para examinarmos a eficácia de polı́ticas monetárias e fiscais em um modelo macroe-


conômico de economia aberta, nós utilizaremos o modelo desenvolvido pelos economistas
Robert Mundell (Mundell [1960], ?) e Marcus Fleming (Fleming [1974]). Para isso, uti-
lizaremos as ferramentas já discutidas nos capı́tulos anteriores, do modelo IS-LM em
economia fechada, porém agora incluindo mais um mercado no esquema de análise: o
mercado cambial e respectivo equilı́brio no setor externo. O equilı́brio no setor externo
significa que a economia atingiu um nı́vel de renda que equilibra as exportações e im-
portações, ou o balanço de pagamentos como um todo. Assim a relação de equilı́brio do
setor externo é dada pela curva BP, cuja inclinação dependerá do grau de mobilidade
de capitais, com será visto detalhes logo adiante.
A curva BP completa, incluindo fluxos de capitais financeiros induzidos por diferen-
cial de taxas de juros, pode ser escrita como:

76
Figura 9.1: Nı́vel de Renda e Equilı́brio no BP

X,M (a)
M(Y)

( - ) Deficit

X
( + ) Superávit

i (b)
CurvaBP = BC

( + ) Superávit ( - ) Deficit

BP = BC(E, Y ∗ , Y ) + CF (i, i∗ ) (9.5)


ou

BP = X(E, Y ∗ ) − M (E, Y ) + CF (i, i∗ ) (9.6)


Os dois primeiros termos (X − M ) representam as exportações e importações de
bens e serviços ou de maneira mais genérica o saldo em transações correntes do balanço
de pagamentos. Já o terceiro item representa a entrada lı́quida de capitais financeiro.
Esse último item demonstra que a entrada lı́quida de capitais financeiros depende do
diferencial das taxas de juros interna e externa. Caso a taxa de juros interna seja
maior do que a externa, haverá uma tendencia à entrada de capitais no paı́s local, caso
contrário, haverá uma tendência e saı́da de capitais do paı́s local. No que se refere a
fluxos de capitais financeiros, vale a paridade descoberta da taxa de juros (PDTJ), em
que i = i∗ + ρ, ou na versão sem o prêmio de risco i = i∗ . Quando esta condição for
satisfeita não haverá fluxos de entradas ou saı́das de capital financeiro e portanto não
haverá impactos na taxa de câmbio por excesso de oferta ou demanda de divisas causadas
por motivos especulativos ocasionados por arbitragem internacional de taxa de juro. A
curva BP tem inclinação positiva na situação de mobilidade imperfeita de capitais (como
demonstrado no gráfico 9.2). A inclinação da curva BP depende do grau de mobilidade
de capitais, nos termos de Mundell-Fleming. Portanto, caso a renda interna aumente,

77
Figura 9.2: Curva BP

a quantidade de importação irá aumentar, causando um desequilı́brio no balanço de


pagamentos. Para compensar esse desequilı́brio, é necessário que se aumente as taxas
de juros interna, visando atrair a entrada de capitais estrangeiros.
Entretanto, outros fatores irão deslocar paralelamente a curva BP no plano (y, i),
que é o plano de análise do modelo IS-LM-BP. Estes fatores são eles:

• Variação da renda externa (Y ∗ )

• Variação da taxa de câmbio (E)

• Variação da taxa de juros externa (i∗ )

• Variação da taxa interna de juros (i) causa variação ao longo da curva BP

No primeiro caso, uma variação da renda externa levará a um aumento nas ex-
portações e deslocará a curva BP paralelamente para a direita. Já no segundo caso, um
aumento na taxa de câmbio (desvalorização da moeda nacional) levará a um incentivo
às exportações e uma queda nas importações, também deslocando a curva BP para a
direita. Finalmente, caso haja uma queda nas taxas de juros internacionais, isto pro-
vocará um aumento ao longo da curva BP, o que significa que quando a taxa de juros
interna subir, é possı́vel que a economia aumente a renda e as importações para um nı́vel
mais alto. O equilı́brio no setor externo é alcançado com fluxos de capitais atraı́dos pela
taxa de juros mais alta.

9.2 Algebra do Modelo IS-LM-BP

A curva IS é determinada incluindo o setor externo, que passa a fazer parte da demanda
agregada.

Y =C +I +G+X −M (9.7)

C = C0 + c1 (Y − T ) (9.8)

78
I = I0 + b1 Y − b2 i (9.9)

G = G0 , T = T0 (9.10)

BC = X − M = (x1 E + x2 Y ∗ ) − (m1 E + m2 Y )
(9.11)
onde x1 , x2 , m2 > 0 e m1 < 0

onde x1 e m1 são as elasticidades câmbio (preço) e x2 e m2 são as elasticidades renda das


exportações e importações respectivamente. Um paı́s tecnologicamente desenvolvido e
estrutura produtiva diversificada terá uma elasticidade renda das exportações elevadas
e uma elasticidade renda das importações mais baixa.
Em economia aberta há um novo componente da demanda agregada composto de
exportação e importação (X − M ) e como pode ser observado as exportações aumentam
a demanda agregada interna e as importações diminuem. Quando um paı́s exporta mais,
ele está atendendo também uma demanda externa e fará isso produzindo e contratando
mão de obra e insumos internamente, aumentando portanto seu PIB. Com importações
ocorre o contrário.
Substituindo as equações da curva IS na equação de equilı́brio do mercado de bens
(equação 9.7) e resolvendo para Y teremos a seguinte curva IS:

1 x1 − m 1
Y = (C0 − c1 T + I0 + G0 ) + E
1 − c1 − b1 + m2 1 − c1 − b1 + m2
x2
+ Y∗ (9.12)
1 − c1 − b1 + m2
b2
− (i − i∗ )
1 − c1 − b1 + m2
onde o segundo termo representa o efeito da taxa de câmbio E, a terceiro termos o efeito
do crescimento da economia mundial Y ∗ e o último termo a influência da taxa de juro
sobre a curva IS ocasionada pelo setor externo. Note o aparecimento do parâmetro m2
no multiplicador simples da curva IS. A abertura da economia torna o multiplicador
menor. O novo multiplicador simples da curva IS, comparado com economia fechada
passa a ser:
1
ms = (9.13)
1 − c1 − b1 +m2
o qual tem um termo a mais dado por +m2 que aparece no denominador. Este termo
reflete o efeito da elasticidade das importações e seu impacto é reduzir o multiplicador
simples. Portanto o multiplicador simples da economia aberta é menor que o multipli-
cador de uma economia fechada. A inclinação da curva IS no plano Y, i será menor e
consequentemente a curva IS em economia aberta será mais vertical, como demonstrado
na figura (9.3):
A curva LM é a mesma usada anteriormente:

M/P = kY − hi (9.14)

79
Figura 9.3: Curva IS Economia Aberta

IS
Economia Fechada
IS
Economia Aberta

E a terceira curva é o saldo do balanço de pagamentos com um todo, incluindo


transações correntes pelo lado real da economia e fluxos de capitais pela conta financeiro
do balanço de pagamentos:

BP = x1 E + x2 Y ∗ − m1 E − m2 Y + φ(i − i∗ ) (9.15)
onde o parâmetro φ determina o grau de mobilidade de capitais, sendo possı́vel três
casos:

• Sem mobilidade: φ = 0
• Mobilidade imperfeita: 0 < φ < ∞
• Mobilidade perfeita: φ → ∞

A partir da equação (9.15), podemos traçar a curva BP no plano Y, i que é a curva


que mostra todas as combinações de renda e taxa interna de juros para as quais o setor
externo está em equilı́brio. Igualando a equação à zero, obtemos o seguinte resultado:

(x1 − m1 ) x2 ∗ φ
Y BP = E+ Y + (i − i∗ ) (9.16)
m2 m2 m2
onde novamente se φ = 0 estamos diante de uma situação em que a taxa interna de
juros não afeta o equilı́brio do setor externo, que é o caso descrito por Mundell-Fleming
de modelo sem mobilidade de capitais. O último termo da equação (9.16) determina a
inclinação da curva BP e no caso em que φ = 0, caso sem mobilidade de capital, a curva
BP será vertical e no caso em que φ → ∞, a curva BP será horizontal.
A inclinação da curva BP é dada por:

dY φ φ
= ≥0 ou =∞ (9.17)
di BP m2 m2
onde o resultado por ser dY /di = 0, no caso sem mobilidade de capital com a curva
BP vertical, ou 0 < dY /di < ∞ no caso de mobilidade imperfeita com uma curva BP

80
positivamente inclinada, e no limite dY /di = ∞ com mobilidade perfeita de capital, com
um curva BP estritamente horizontal.
Para analisar os diversos efeitos de polı́ticas macroeconômicas monetárias, fiscais
e cambiais devemos levar em consideração a combinação de regimes cambiais (fixo e
flutuante) com regimes de mobilidade de capitais (sem mobilidade, mobilidade perfeita
e mobilidade imperfeita), o que gera seis possı́veis casos que poderiam ser assumidos
como casos canônicos, isto é, casos referências que servem como modelos para outras
situações. A seção seguinte contém estas análises.

9.3 Polı́ticas Macroeconômicas em Ecomonia Aberta

As polı́ticas macroeconômicas fiscal e monetária terão efeitos diversos na economia, de-


pendendo da combinação de regimes cambiais com grau de mobilidade cambial. Com-
binado os casos abaixo, existem seis distintas possibilidades:

• Grau de mobilidade de capitais

– sem mobilidade
– mobilidade perfeita
– mobilidade imperfeita

• Regime Cambial

– Câmbio Fixo: Sem conversibilidade, Currency Board, “Dolarização”


– Câmbio Flutuante

Portanto, para determinarmos se a polı́tica escolhida é eficaz ou não, teremos que


analisar seus efeitos para cada combinação.

81
9.3.1 POLÍTICA MACROECONÔMICA SEM MOBILIDADE DE CAPITAIS E CAM-
BIO FIXO

Figura 9.4: Regime Sem Mobilidade e Cambio Fixo


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i
BP BP LM1
LM0 LM0

LM1

IS1
IS0 IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Suponha que o banco central aumente a oferta de moeda e reduza a taxa de juros,
deslocando a LM para direita. Se a taxa de juros cair, ao longo da curva IS o nı́vel de
renda irá aumentar e consequentemente aumentará as importações. Os importadores
demandam moeda estrangeira pressionando o cambio e forçando uma desvalorização
cambial. Mas como o cambio é fixo o banco central se obriga a vender mais moeda
estrangeira para conter a pressão altista no mercado de câmbio. Mas as operações cam-
biais no mercado de moedas acaba retirando a quantidade de moeda que inicialmente
foi injetada na economia, fazendo com que a curva LM retorne à sua posição original.
Ao final o cambio fixo anula a polı́tica monetária a qual torna-se ineficiente para afetar
o nı́vel de atividade econômica.

M
↑ P
↓ i1 ↑I ↑ Y1 ↑M ↓ BP

M
↓ BP ↑E ↓ P
↑ i0 ↓I ↓ Y0

Figura 9.5: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária expansionista, em regime sem mobilidade
de capitais e cambio fixo.

Polı́tica fiscal expansionista

Suponha que o governo resolva aumentar seus gastos de forma geral, deslocando a
curva IS para a direita. O mecanismo multiplicador dos gastos fará com que a renda
aumente e com isso aumenta também a demanda de moeda para fins de transação, o que
acaba por elevar a taxa de juros. Porém existe um segundo efeito, uma vez que o aumento

82
da renda provoca um aumento das importações e demanda de moeda estrangeira pelos
importadores, o que faz, como antes, com que o Banco Central venda divisas para
neutralizar a pressão por desvalorização cambial. A operação de venda de divisas contrai
a quantidade de moeda em circulação e provoca um deslocamento da curva LM para a
esquerda, como se fosse um polı́tica monetária contracionista involuntária. O resultado
final é uma taxa de juros muito alta e uma polı́tica fiscal, também ineficiente.

↑ Md ↑ i1

↑G ↑ Y1

↑M ↓ BP

M
↓ BP ↑E ↓ P
↑ i2 ↓I ↓ Y0

Figura 9.6: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime sem mobilidade de
capitais e cambio fixo.

83
9.3.2 POLÍTICA MACROECONÔMICA SEM MOBILIDADE DE CAPITAIS E CAM-
BIO FLUTUANTE

Figura 9.7: Regime Sem Mobilidade e Cambio Flutuante


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i
BP0 BP1 BP2 BP0 BP1 BP2
LM0 LM0

LM1

IS1
IS2
IS1
IS0 IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Quando o cambio flutua, mas ainda sob o regime sem mobilidade de capital, os
resultados são completamente diferentes, comparado ao regime de câmbio fixo. A di-
ferença básica do regime de cambio flutuante, é que o Banco Central não precisa mais
intervir no mercado de divisas para estabilizar, ou manter o cambio fixo. Suponha
uma polı́tica monetária expansionista que desloca a curva LM para a direita, de LM0
para LM1 . A taxa de juros baixa ao longo da curva IS0 , induzindo um aumento de
renda. Este aumento de renda, dada a elasticidade renda das importações, aumenta
as importações e a demanda por moeda estrangeira, e ao fim desvaloriza o câmbio, já
que este é flutuante. O câmbio desvalorizado, por sua vez, põe em movimento um se-
gundo efeito que é provocar um aumento das exportações e uma queda das importações,
provocando um deslocamento paralelo da curva IS0 para IS1 (observe o segundo termo
da equação 9.12). A curva BP0 inicialmente se desloca para um ponto de passagem
situado na interseção da LM1 com a IS0 , antes dos efeitos da desvalorização cambial, e
depois segue seu caminho até a BP2 , quando as desvalorização cambial produziu uma
nova rodada de ajustes macroeconômicos. O resultado final é uma taxa de juros cons-
tante e um nı́vel de renda muito maior. Neste caso a polı́tica monetária é super eficiente.

84
M
↑ P
↓ i1 ↑I ↑Y ↑M ↓ BP

↑X

Deslocamento
↓ BP ↑E da curva IS ↑ Y2 ↑ i0
IS0 → IS1

↓M

Figura 9.8: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária expansionista em regime sem mobilidade
de capitais e cambio flutuante.

Polı́tica fiscal expansionista

No caso de uma polı́tica fiscal expansionista ocorre, com a curva IS, os mesmos efeitos
acima. Inicialmente, um aumento de gastos do governo desloca a curva IS0 para IS1 ,
aumentando a taxa de juros. Como a polı́tica monetária está constante, a taxa de juros
fica mais alta. O deslocamento da curva IS1 aumenta a renda e as importações e faz com
que o cambio se desvalorize, desta vez sem intervenção cambial no mercado de cambio.
Então uma nova rodada de ajustes tem inı́cio cocm um aumento das exportações e
diminuição das importações, com a balança de pagamentos se deslocando de BP0 para
BP1 e depois BP2 . O equilı́brio no setor externo, com X = M é atingido quando o
aumento da taxa de juros reduz a renda e retira um pouco o efeito do aumento de
gastos, de forma que o resultado final é uma renda maior, porém mais baixa que o caso
da polı́tica monetária expansionista. O resultado final neste caso é uma renda maior,
com dois efeitos cumulativos, porém com uma taxa de juros também maior.

↑ Md ↑ i1

O efeito juros é maior


↑G ↑Y que o efeito via BP
uma vez que φ = ∞
↑M ↓ BP

↑X

Deslocamento
↓ BP ↑E da curva IS ↑ Y2 ↑ i2
IS0 → IS1

↓M

Figura 9.9: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime sem mobilidade de
capitais e cambio flutuante.

85
9.3.3 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE PERFEITA E CÂMBIO
FIXO

Figura 9.10: Regime Mobilidade Perfeita e Cambio Fixo


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i

LM0 LM0

LM1 LM1

BP BP

IS0 IS1
IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Com mobilidade perfeita a curva BP é estritamente horizontal, pois φ = ∞, em


termos da equação (9.16). Neste caso, a taxa interna de juros (i) precisa ser igual a taxa
externa de juros (i∗ ) para que não ocorra um fluxo de capitais via conta financeira do
balanço de pagamentos. Da mesma forma que anteriormente no caso sem mobilidade de
capital, o cambio fixo obrigará sempre o Banco Central intervir no mercado de divisas
para neutralizar as tendências de variação cambial, limitando as polı́ticas monetárias.
Assim, com uma combinação de mobilidade perfeita e cambio fixo, uma polı́tica mo-
netária expansionista que desloca a LM0 para LM1 , baixará a taxa de juros ao longo da
curva IS, tal que i < i∗ . Uma taxa menor de juros causaria uma fuga em massa de capi-
tal financeiro, e uma demanda de moeda estrangeira levando à uma corrida por divisas
e à uma pressão para desvalorização cambial. No intuito de proteger a taxa de cambio
e evitar a desvalorização o Banco Central intervém no mercado vendendo suas reservas
de moeda estrangeira. Estas operações acabam retirando moeda de circulação anulando
a polı́tica monetária inicialmente expansionista. Com mobilidade perfeita de capital é
preciso que a paridade descoberta da taxa de juros PDTJ, ou i = i∗ , seja uma condição
respeitada para que não haja fluxos cambiais. Neste caso, a polı́tica monetária é inefi-
ciente e não afeta o produto e o emprego, e portanto os preços. A única diferença em
relação ao regime sem mobilidade de capitais, é que o diferencial de juros i ̸= i∗ devido
à hipersensibilidade dos fluxos de capitais à taxa de juros (por isso mobilidade perfeita),
provocaria uma fuga em massa de capital especulativo exigindo do Banco Central, uma
grande capacidade de atuação no mercado de divisas. Será necessário grandes volumes
de reservas internacionais para evitar um ataque especulativo com a moeda nacional,
seja no sentido da desvalorização, quanto da valorização.

86
M
↑ P
↓ i1 ↑I ↑ Y1 ↑M ↓ BP

M
↓ BP ↑E ↓ P
↑ i0 ↓I ↓ Y0

Figura 9.11: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária, em regime de mobilidade perfeita e
cambio fixo.

Polı́tica fiscal expansionista

No caso de uma polı́tica fiscal, um aumento de gastos leva à um deslocamento da IS0


para IS1 e causa um aumento na taxa de juros ao longo da curva LM. Este aumento de
juros i > i∗ atrai um fluxo de entrada de capitais causando uma pressão para valorização
cambial. Mas como o cambio é fixo, o Banco Central se obriga a comprar todo o
excedente de moeda estrangeira e acaba por ampliando a oferta de moeda e reduzindo
a taxa de juros até a PDTJ seja satisfeita, deslocando a LM0 para LM1 atingindo um
nı́vel de renda de equilı́brio muito alto, com uma taxa de juros constante. A polı́tica
fiscal é super eficiente.

↑ Md ↑ i1

O efeito juros é maior


↑G ↑Y que o efeito via BP
uma vez que φ = ∞
↑M ↓ BP

M
↑ i1 ↓E ↑ P
↓ i0 ↑I ↑ Y0

Figura 9.12: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime com mobilidade
perfeita de capitais e cambio fixo.

87
9.3.4 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE PERFEITA E CÂMBIO
FLUTUANTE

Figura 9.13: Regime Mobilidade Perfeita e Cambio Flutuante


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i

LM0 LM0

LM1 LM1

BP BP

IS1 IS1
IS0 IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Um aumento da moeda em circulação desloca a curva LM0 para direita até LM1 e
reduz a taxa de juros para i1 , aumenta o investimento e a renda. Um maior nı́vel de
renda, dada uma elasticidade renda de importação, aumenta o volume de importação e
gera um deficit na balança comercial. O balanço de pagamentos é duplamente afetado.
Uma parte do déficit decorre do aumento de importação, mas a queda da taxa de juros
faz com que i1 < i∗ , e devido ao fato de que φ = ∞, isto é, mobilidade perfeita, ocorre
uma saı́da massiva de capital especulativo pela conta financeira do BP. Esses fluxos,
além de grandes, também são rápidos, de modo que há uma tendência de desvalorização
cambial muito forte e de curto prazo. A taxa de cambio aumenta para E1 e o aumento de
X e queda em M que daı́ decorre desloca paralelamente a curva IS0 para IS1 aumentando
o nı́vel de renda para Y2 . (conforme equação 9.12). Esse aumento de renda, aumenta a
demanda por moeda para fins de transação e ao fim faz a taxa de juros aumentar de i1
para i0 , restabelecendo a PDTJ (i0 = i∗ ) e o equilı́brio no balanço de pagamentos. O
resultado final é uma taxa de juros constante e um grande impacto positivo na renda.
A polı́tica monetária é super eficiente.

88
Saı́da de capitais uma
vez que φ = ∞

M
↑ P
↓ i1 ↑I ↑ Y1 ↑M ↓ BP

↑X

Deslocamento
↓ BP ↑ E1 da curva IS ↑ Y2 ↑ i0
IS0 → IS1

↓M

Figura 9.14: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária, em regime de mobilidade perfeita e
cambio flutuante.

Polı́tica fiscal expansionista

Um aumento do gasto do governo causa um deslocamento da curva IS0 para IS0


aumentando a renda para Y1 e a taxa de juros para i1 . O aumento de renda, dada a
elasticidade renda das importações, aumenta o volume de importação e causa um déficit
na balança comercial. Como estamos em um regime de mobilidade perfeita, a queda da
taxa de juras rompe com a PDTJ tal que i1 > i∗ , causando uma entrada massiva de
capitais financeiros. Assim tempos dois efeitos contrários no setor externo. Uma pressão
para desvalorizar o câmbio em função do aumento das importações, e uma pressão para
valorizar o câmbio decorrente do aumento da taxa interna de juros. O segundo efeito,
via juros, em razão de que φ = ∞ é muito maior que o primeira, portanto, predomina a
valorização cambial ou queda em E1 . Com um cambio valorizado, caem as exportações
(X) e aumentam as importações (M ) de modo que há um deslocamento para a esquerda
da curva IS1 para IS0 e uma diminuição da renda de Y1 para Y0 , retornando para o nı́vel
inicial. O resultado final é que a polı́tica fical é ineficiente.

↑ Md ↑ i1

O efeito juros é maior


↑G ↑Y que o efeito via BP
uma vez que φ = ∞
↑M ↓ BP

↓X

Contrai a
↑ i1 ↓ E1 curva IS ↓ Y0 ↓ i0
IS1 → IS0

↑M

Figura 9.15: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime com mobilidade
perfeita de capitais e cambio flutuante.

89
9.3.5 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE IMPERFEITA E CÂMBIO
FIXO
O regime de mobilidade imperfeita de capital é alguma coisa entre os dois extremos de
regimes sem mobilidade e mobilidade perfeita. O que distingue este regime é a existência
de um fluxo de entrada e saı́da de capital pela conta financeira que é influenciado pelo
diferencial da taxa interna e externa de juros, porém com algum tipo de resistência ou
imperfeição, de forma que pequenas variações de juros podem não ter efeito. As razões
que tornam os movimentos de capitais “imperfeitos” são várias. Pode ser qualquer outro
motivo que não o diferencial de juros, como por exemplo, o fato de que alguns fundos
de investimentos só operarem com ativos ou paı́ses com grau de risco abaixo de certo
threshold, ou valor. Podem ocorrer legislações e regulamentações próprias para certos
tipos de ativos por parte do Banco Central, ou simplesmente uma situação geral de
percepção de risco ou ambiente institucional não completamente precificado por alguma
avaliação de risco paı́s. A condição geral, para equilı́brio da conta capital continua
sendo a PDTJ completa, dada por, i = i∗ + ρ, onde ρ é o premio de risco precificável.
Assim a mobilidade imperfeita de capital é uma situação algebricamente caracterizada
por 0 < φ < ∞, de forma que a curva BP é positivamente inclinada, conforme equação
(9.16). Esta inclinação pode ser maior ou menor que a inclinação da curva LM, o que
leva a resultados ligeiramente distintos quando se analisam as polı́ticas macroeconômicas
neste tipo de regime. Nos exemplos a seguir vamos supor uma curva BP mais inclinada
que a curva LM, o que aproxima o regime como maior rigidez de fluxos de capital, ou
em outros termos, menor valor de φ.

Figura 9.16: Regime Mobilidade Imperfeita e Cambio Fixo


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i BP0
BP LM1
LM0 LM0

LM1
2

IS1
IS0 IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Seja o caso de uma polı́tica fiscal expansionista com aumento de moeda em circulação.
Taxa interna de juros cai abaixo da taxa de juros internacional, i1 < i∗ , causando dois
efeitos. O primeiro efeito é um aumento interno dos investimentos e o consequente
aumento da renda para Y1 . Dada uma elasticidade renda das importações, haverá um
aumento do volume de importações e uma déficit na balança comercial (BP1 ). O segundo

90
é o efeito da menor taxa interna de juros sobre os fluxos de capitais via conta financeira
do balanço de pagamentos. Haverá uma fuga de capitais, com uma demanda grande de
moeda estrangeira por parte do capital especulativo (BP2 ). A balança comercial e a
conta financeira serão deficitárias e a taxa de cambio se desvalorizará, aumentado para
E1 . Por conta do duplo deficit, haverá uma desvalorização muito grande do cambio.
Como o cambio é fixo, o Banco Central deve intervir vendendo divisas o que faz com
que a oferta de moeda se contraia, deslocando a curva LM1 para LM0 , anulando a
intenção inicial de aumentar a moeda e baixar a taxa de juros. A renda retorna para o
equilı́brio inicial Y0 e a taxa interna de juros para i0 , de forma que a polı́tica monetária
é ineficiente.

↑I ↑ Y1 ↑M ↓ BP1

Fuga de Capitais i1 < i∗


M
↑ P
↓ i1 ↓ BP2

M
↓ BP ↑E ↓ P
↑ i0 ↓I ↓ Y0

Figura 9.17: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária expansionista, em regime de mobilidade
imperfeita de capitais e cambio fixo.

Polı́tica fiscal expansionista

No caso de uma polı́tica fiscal expansionista, com aumento de gastos, ocorre uma
sequencia de eventos já analisada. O aumento de gastos, portanto, eleva a renda para Y1
e a taxa de juro para i1 , conforme ponto 1 na figura (9.17). Há um deslocamento da IS0
para IS1 , com um aumento da renda e taxa interna de juros, tal que i1 > i∗ . Pelo lado
da balança comercial, dada a elasticidade renda das importações, haverá um aumento do
quantum de importações e um deficit na balança comercial. Como a taxa de juro interna
é maior que a taxa de juro externa, haverá um ingresso de capital financeiro. Neste ponto
da cadeia de efeitos, importa saber qual dos dois efeitos predomina, pois os mesmos
atuam em sentido contrário. O déficit na balança comercial provoca uma desvalorização
cambial, e o ingresso de capital financeiro, uma valorização cambial. Tendo em vista o
fenômeno da hipertrofia dos mercados financeiros, em geral, predomina o segundo da
taxa de juros, de forma que ao fim, podemos assumir que haverá um ingresso de capital
financeiro maior que o aumento de exportação. O balanço de pagamentos como um
todo será superavitário e o cambio tende a valorizar. O Banco Central, no intuito de
evitar valorização cambial, já que estamos diante de um regime de cambio fixo, realizará
compras de divisas e aumentará a quantidade de moeda em circulação, deslocando a
LM0 para LM1 , reduzindo a taxa de juros de i1 para i2 e aumentando a renda para Y2 ,
levando a economia do ponto 1 ao ponto 2.

91
↑ Md ↑ i1 ↑ BP1

Predomina o efeito
↑G ↑ Y1
BP1

↑M ↓ BP2

M
↑ BP1 ↑E ↑ P
↓ i2 ↑I ↑ Y2

Figura 9.18: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime de mobilidade
imperfeita de capitais e cambio fixo.

92
9.3.6 POLÍTICA MACROECONÔMICA COM MOBILIDADE IMPERFEITA E CÂMBIO
FLUTUANTE

Figura 9.19: Regime Mobilidade Imperfeita e Cambio Flutuante


(a) Polı́tica monetária expansionista (b) Polı́tica fiscal expansionista
i i
BP0 BP1
LM0 BP0 BP1
LM0
LM1

2
0
1
2
1 0

IS2
IS1 IS1
IS0 IS0

Y Y

Polı́tica monetária expansionista

Com mobilidade imperfeita a curva BP é positivamente inclinada, pois 0 < φ < ∞,


em termos da equação (9.16). A inclinação poderá ser maior ou menor que a inclinação
da curva LM e nestes casos, os resultados podem ser ligeiramente diferente, em termos
de nı́vel final de renda e taxa de juros. Vamos nos ater ao caso em que a BP é mais
vertical que a LM. Uma polı́tica monetária expansionista gera os efeitos tradicionais,
de deslocar a LM para a direita fazendo baixar a taxa de juros. Dois efeitos ocorrem
simultaneamente. A queda na taxa de juros aumenta o investimento, a renda e por fim
aumenta as importações, causando uma pressão para desvalorizar o cambio. Mas ao
mesmo tempo, quando i < i∗ ocorre um fluxo de saı́da de capitais que pressiona mais
ainda o cambio para desvalorizar. Como o cambio é flutuante o resultado final será
uma grande desvalorização cambial, deslocando a curva BP para a direita. Havendo
desvalorização cambial, haverá um aumento de X e queda de M , deslocando a IS para
a direita levando a economia do ponto 1 ao ponto 2. O resultado final é que a polı́tica
monetária é eficiente, pois consegue aumentar a renda e manter os juros praticamente
constante.

Polı́tica fiscal expansionista

No caso da polı́tica fiscal, um aumento dos gastos do governo gera dois efeitos sobre
o balanço de pagamentos. O primeiro efeito é aumentar a renda deslocando a curva IS
para a direita até o ponto 1. Neste ponto há um deficit no balanço de pagamento e uma
pressão para desvalorizar a taxa de cambio (aumentar E). Mas o aumento de renda,
aumenta a demanda por moeda para fins de transação e com isso aumenta a taxa de
juros de forma que i > I ∗ , o que por sua gera um fluxo de entrada de capitais e portanto
uma pressão por valorização cambial. Ha duas forças atuando simultaneamente e o

93
resultado final dependerá da inclinação da curva BP em relação à curva LM. Vamos
assumir o caso em que a curva BP é mais vertical que a curva LM. Nesta situação
predomina o efeito da balança comercial (efeito BP) o qual é maior que o efeito juros,
ou em outras palavras, o efeito desvalorização é maior que o efeito valorização cambial e
ao fim a taxa de cambio será mais alta. Isso desloca novamente a curva IS para o ponto
2, aumentando ainda mais o nı́vel de renda e simultaneamente induzindo mais demanda
por moeda para fins de transação e ao fim uma taxa de juros maior. O resultado final
é um aumento do nı́vel de renda e da taxa de juros.

M
↑ P
↓ i1 ↑I ↑ Y1 ↑M ↓ BP

↓ i1 ↑X

Deslocamento
↑E da curva IS ↑ Y2 ↑ i2
IS0 → IS1

↓ BP ↓M

Figura 9.20: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica monetária expansionista em regime de mobilidade
imperfeita de capitais e cambio flutuante.

↑ Md ↑ i1 O efeito BP é maior que o


Deslocamento efeito via juros uma vez que
↑G da curva IS ↑ Y1 0 < φ < ∞ faz com que a
IS0 → IS1 curva BP seja mais vertical
↑M ↓ BP que a LM

↑ i1 ↑X

Deslocamento
↑E da curva IS ↑ Y2 ↑ i2
IS1 → IS2

↓ BP ↓M

Figura 9.21: IS-LM-BP: Sequência de causa-efeito da polı́tica fiscal expansionista em regime de mobilidade
imperfeita de capitais e cambio flutuante.

94
9.4 Polı́ticas Cambiais

Em uma economia aberta, os fluxos de comércio de bens e serviços, como visto anterior-
mente, nos vários regimes cambiais e de mobilidade cambial a variável macroeconômica
câmbio tem um papel determinante no saldo da balança de pagamentos (transações cor-
rentes), sobre a demanda agregada e consequentemente sobre o crescimento econômico,
mas não apenas isso. A taxa de cambio também tem efeitos sobre a taxa de inflação e
nı́vel de salário real. Nesta seção vamos dar um passo mais na análise macroecônomica
e analisar os efeitos de variações na taxa de câmbio no médio e longo prazo, relaxando
a hipótese adotada anteriormente de preços fixos.
......
......
......

9.5 A Condição de Marshall-Lerner

A condição Marshall Lerner diz que uma desvalorização da moeda só terá um efeito
positivo sobre o saldo da balança comercial se a soma elasticidade preço das exportações e
importações for maior que 1, em valores absolutos. Uma desvalorização cambial significa
uma redução no preço das exportações (X) e com isso um aumento na quantidade
exportada. Ao mesmo tempo o preço dos produtos importados sobem e sua quantidade
diminui. O efeito lı́quido sobre a balança comercial dependerá das elasticidades de preço:

• Ef1 : Se os bens exportados forem elásticos, sua quantidade irá aumentar mais do
que proporcionalmente à queda de preços, e a receita total aumentará.

• Ef2 : Se os bens importados forem elásticos, a quantidade importada cairá mais do


que proporcionalmente ao aumento de preços e a despesa total com importação.

Sendo assim, os efeitos Ef1 e Ef2 garantem que a balança comercial fique positiva se
Ef1 +Ef2 > 1 então uma desvalorização cambial melhorará o saldo da balança comercial.

Derivação Matemática

dBC
O objetivo é encontrar uma expressão para dBC = F (dϵ) ou dE

BC = X − EM (9.18)

Diferenciando a Equação:

dBC = dX − (EdM + M dE) (9.19)


Dividindo por dE:

dBC dX E
= − · dM − M (9.20)
dE dE dE
Dividindo ambos por X:
dBC 1 1 dX E dM M
· = · − · −
dE X E X dE X X

95
Para se obter o equilı́brio na balança comercial, aplicamos a regra que X = EM,
então:

dBC 1 1 dX E dM M
· = · = · −
dE X dE X dE EM EM
dBC 1 1 dX 1 dM 1
· = · − · −
dE X dE X dE M E
Multiplicando por E:

dBC E E dX E dM
· = · − · −1
dE X dE X dE M
Onde:

• E
dE · dX
X é a elasticidade câmbio(preço) das exportações

• E
dE · dM
M é a elasticidade câmbio(preço) das importações

9.6 A Curva J no Curto Prazo

Para que a Condição Marshall-Lerner se verifique é necessário que o ajuste das ex-
portações e importações ocorram simultaneamente. Como visto anteriormente, dado
uma desvalorização da moeda nacional, é de se esperar que as exportações sejam esti-
muladas e as importações desestimuladas, melhorando a situação da Balança Comercial.
Entretanto, essa desvalorização pode demorar para exercer uma força na quantidade de
X e M . No curtı́ssimo prazo, essa desvalorização afetará antes os preços dos produ-
tos, tornando as exportações mais baratas e as importações mais caras, permanecendo
as quantidades constantes, afetando a balança comercial negativamente. Após algum
tempo apenas é que os agentes se ajustam à essa nova realidade e ajustam suas quantida-
des de produtos exportados e importados, melhorando a situação da balança comercial,
causando uma trajetória em forma de J. Essa trajetória pode ser vista no gráfico 9.22.
Figura 9.22: Curva J

96
Parte IV

MICROFUNDAMENTOS

97
10. Microfundamentos

O tema dos microfundamentos é um tema recente na evolução de teoria macroeconômica,


o qual tem por objetivo dotar a teoria de explicações causais sobre fenômenos emergen-
tes observados no nı́vel macro. Os fenômenos e dinâmicas observados no plano ma-
croeconômico não existem por si só, eles decorrem de inúmeras decisões de agentes,
motivadas pelos mais diversos interesses.
A teoria macroeconômica pode ser classificada, em relação ao tema dos microfunda-
mentos, em três tipos de teorias:

• Teoria macroeconômica sem microfundamentos

• Teoria macroeconômica com agentes representativos

• Teoria macroeconômica com agentes heterogêneos, ou agent-based models

No primeiro caso temos uma teoria que não faz qualquer referência ao comporta-
mento das partes, e simplesmente correlaciona e estabelece relações de causalidade entre
variáveis agregadas, no intuito de reproduzir dinâmicas agregadas como inflação, cres-
cimento, emprego, taxa de juro, câmbio, etc. Muitos, senão a maioria, dos estudos
aplicados em macroeconomia, como contabilidade do crescimento, modelos de previsões
macroeconômicas e outros, são efetuados a partir de séries temporais agregadas, como
por exemplo, os chamados modelos econométricos do tipo Stock-and-flow ou os modelos
baseados em vetores auto-regressivos (VAR ou VEC). Em termos teóricos, boa parte
da teoria macroeconômica desenvolvido após a publicação de Teoria Geral de Keynes,
foi desenvolvida utilizando-se apenas representações dos padrões agregados. Assim é a
teoria keynesiana desenvolvida até os anos 1990, bem como a teoria do crescimento, in-
clusive a teoria do crescimento endógeno, e também a teoria dos ciclos reais de negócios
(real business cicle). O grande problema dos modelos macros, é que não há explicação
das origens dos padrões dinâmicos observados nesta nı́vel, os modelos e teorias apenas se
detectam esses padrões e os reproduzem, sem explicam porque ou de onde eles surgem.
No intuito de resolver as limitações dos modelos eminentemente macro, os economis-
tas procuraram aperfeiçoar os modelos macroeconômicos agregados, adicionando com-
portamentos causais aos modelos macros, através do que ficou sendo conhecido como o
problema dos microfundamentos, da macro. Isto foi alcançado através do uso da figura
do agente representativo. A ideia do agente representativo é muitos simples, embora
sua implementação as vezes seja matematicamente mais difı́cil. Em geral assume-se que
um tipo de comportamento predomina entre os agentes e então assume-se, por pres-
suposto, que todos os agentes se comportam da mesma maneira, e seguem as mesmas
regras decisórias. Se é razoável supor que um consumidor maximiza sua utilidade, então

98
assume-se que todos façam isso. Se uma firma maximiza lucros, e contrata trabalha-
dores negociando um salário eficiente em um mercado competitivo, e se uma firma tem
uma certa função de produção, então todas tem a mesma produção. O problema da
agregação então é facilmente resolvido, pois o total macro é a soma simples das partes,
ou mais sinteticamente a multiplicação de uma valor unitário do agente pelo total da
população (n). Assim, por exemplo, a produção agregada por ser obtida da seguinte
forma:
n
X
Y = Pi Qi = nPi Qi = P Q (10.1)
i=1

Se todas as firmas são iguais, então um firma significa a mesma coisa que o todo,
ou o agregado e não há diferenças entre elas. A teoria macroeconômica baseada em
agentes representativos as vezes é um pouco mais elaborada, admitindo algum grau de
diferenciação de agentes, mas por questões operacionais, algébricas e computacionais,
não consegue lidar com muita diferenciação entre os agentes. Além disso, se os agentes
são representativos, e utilizando-se de um agente para construir os processos macros,
a teoria ignora uma faceta muito importante da realidade que é o fato dos agentes
interagirem entre si.
Após a década de 1980, e diante do avanço de métodos e ferramentas computacionais,
o problema da ausência de heterogeneidade e interação entre os agentes foi resolvido
pela teoria macroeconômica baseada em agentes, ou agent-based economics (ABE) e
seus respectivos modelos baseados em agentes ou agent-based models (ABM), que é
hoje uma importante fronteira de pesquisa na teoria econômica.
Este capı́tulo aborda o problema dos microfundamentos da teoria macroeconômica
a partir do uso do pressuposto de que os agentes, notadamente famı́lias (consumidores),
trabalhadores e firmas, possuem o mesmo comportamento, isto é, tomam as mesmas
decisões, no mesmo instante do tempo e possuem estrutura interna comum, no caso das
firmas. Esta simplificação permite o uso da expressão agente representativo. Se por um
lado, perde-se em realismo, uma vez que nem famı́lias, nem trabalhadores e firmas são
agentes tão iguais assim, podendo haver muita heterogeneidade entre eles, por outro
lado ganha-se em simplicidade analı́tica. Formalmente, muitas conclusões e descrições
da dinâmica econômica não seria possı́vel sem o recurso do agente representativo. Entre
os grandes benefı́cios do uso do pressuposto de agentes representativos é possibilidade
de agregação. Obter resultados macroeconômicos a partir da agregação de agentes
representativos é uma tarefa relativamente fácil, bastando para isso extrapolar o que
acontece com um agente para todo o sistema econômico que está sendo retratado. A
agregação é obtida pelo simples somatório, no caso discreto, ou pela simples integração,
no caso contı́nuo, da população de agentes. O consumo agregado será a soma ou a
integral do consumo de n famı́lias, com as mesmas funções utilidades. A produção
agregada será o somatório ou a integração da função de produção de n firmas com a
mesma tecnologia ou função de produção. No caso da produção, a consequência mais
difı́cil de assimilar, num primeiro momento, é o fato de sendo as funções de produções
das firmas, todas iguais, o que obtemos ao final, em termos agregados, é uma economia
que produz um único bem, que serve simultaneamente para consumo e investimento.
Todos os macroeconomistas sabem do irrealismo desta representação, mas o fato é que
a metáfora de uma economia de um bem único é muito útil para simplificar um parte da

99
realidade caracterizada por uma estrutura diversificada e um comportamento complexo.
Sem esta simplificação ficarı́amos num mundo pior, sem mesmo compreender sequer,
uma parte da dinâmica macroeconômica.
Outro aspecto importante da microfundamentação é seu aspecto dinâmico, mais do
que estático. O comportamento do agente é abordado dinamicamente e não de forma
estática. Isto significa dizer que as decisões estão sendo tomadas no tempo, isto é, as
variáveis econômicas e os modelos econômicos que emergem dos microfundamentos são
modelos dinâmicos, formados por equações em diferenças finitas, no caso discreto, e
equações diferenciais, no caso contı́nuo. Portanto é importante saber lidar matematica-
mente com estas equações.
No restante deste capı́tulo serão analisados aspectos do microfundamento de três ele-
mentos importantes da formação da demanda agregada de um modelo macroeconômico:
o consumo, investimento e gastos do governo.

10.1 Consumo

As teorias microeconômicas do consumidor constituem os fundamentos para o desenvol-


vimento do lado da demanda agregada. As principais teorias do consumidor utilizadas
como microfundamentos para a macroeconomia são, a teoria da renda permanente, a
escolha intertemporal, e a teoria do ciclo de vida.

10.1.1 Teoria da Renda Permanente


A teoria da renda permanente parte de princı́pio que o consumo das famı́lias em um
determinado momento do tempo depende não apenas de sua renda corrente, mas também
de sua renda futura, e esta pode variar no tempo, causando incerteza no consumidor
quanto à sua renda considerada disponı́vel para consumir. Em sı́ntese a teoria da renda
permanente separa a parte da renda que é estável da parte flutuante e considera somente
a primeira na decisão de consumo. A teoria da renda permanente foi originalmente
desenvolvida por Friedman [1954] em um estudo que posteriormente se tornou referência
na teoria macroeconômica, intitulado A Theory of Consumption Function.
De acordo com o modelo da renda permanente o consumo depende da parcela de
renda considerada como constante ou permanente, sendo a parte variável da renda, por
envolver incerteza, desconsiderada na função consumo.
Simplificadamente o problema da renda permanente e consumo é exemplificado pelas
duas equações a seguir. A renda total do consumidor é dividida em permanente e
temporária:

Y T ot = Y P + Y T (10.2)
e o consumo depende apenas da renda permanente:

C = cY P (10.3)
O problema prático que se segue é como estimar a renda permanente. Uma maneira
de fazer isso dinamicamente é supor que apenas um percentual θ variação da renda entre
um perı́odo t e t − 1 é considerada como parte da renda permanente do perı́odo t. Então
podemos escrever:

100
YtP = Yt−1 + θ(Yt − Yt−1 ) where 0<θ<1 (10.4)
o que produz a seguinte equação:

YtP = θYt + (1 − θ)Yt−1 (10.5)


A equação acima pode ser usada na descrição na equação de consumo linear abaixo,
para avaliar o efeito real da renda permanente na propensão marginal a consumir:

Ct = c0 + c1 Y P (10.6)
Ct = c0 + c1 (θYt + (1 − θ)Yt−1 ) (10.7)

De forma que a hipótese básica da teoria da renda permanente é de que a propensão


marginal a consumir dada por dC/dY = c1 θ é menor do que a propensão considerada
num modelo que não leve em conta este fato. O parâmetro θ aqui é uma medida de
instabilidade da renda que afeta o consumo. Um consumidor com muita instabilidade
de renda entre um perı́odo e outro, aqui t e t − 1, tende a atribuir um θ baixo. Do ponto
de vista macroeconômico, efeitos de variações no nı́vel de renda, tende a afetar menos o
consumo quanto mais baixo for o valor de θ, isto é, quanto mais instabilidade no próprio
nı́vel de renda. Isto faz com que em momentos de alta oscilação da renda, mesmo em
termos agregados, a variável consumo tenha seus efeitos sobre o próprio nı́vel renda.
Tenha em mente que a variação do consumo aqui ocorre entre um perı́odo e outro e que
portanto o efeito da renda contém um termo regressivo defasado.

10.1.2 Escolha Intertemporal ou Modelo de Fischer - 2 perı́odos


A modelagem da decisão do consumidor na teoria macroeconômica é realizada a partir de
um problema de escolha intertemporal, onde o consumidor procura otimizar sua função
utilidade a qual aumenta quanto mais bens o consumidor puder adquirir à um dado nı́vel
de preços mas sujeita à uma restrição orçamentária que inclui sua renda, geralmente
salário, ou ainda algum estoque de riqueza, como por exemplos tı́tulos públicos. Nas
próximas seções explicaremos estas duas principais teorias e em seguida apresentaremos
formalmente o problema de maximização intertemporal do consumidor. Para resolver o
problema de maximização intertemporal, primeiro vamos resolver um problema simples
de maximização em dois perı́odos de tempo, e em seguida desenvolver um procedimento
genérico para o que se chama de problema de escolha intertemporal com horizonte
infinito. Existem outras abordagens como o problema de escolha de gerações sobrepostas
que é uma variante do problema de horizonte infinito que não iremos abordar aqui.
O problema principal, para teoria macroeconômica, é determinar como os consu-
midor alocam sua renda ao consumo e à poupança, determinando simultaneamente a
demanda agregada e os recursos disponı́veis para realização de investimento, cuja fonte
de financiamento é a poupança das famı́lias.
Como as teorias da renda permanente e do ciclo de vida envolvem respectivamente
uma expectativa sobre o comportamento da renda no futuro e uma estratégia de alocação
dos gastos ao longo do ciclo de vida, iniciaremos a exposição pelo problema da escolha
intertemporal em dois perı́odos, o qual constitui a base para todos as demais teorias e
modelos.

101
Considere a seguinte função utilidade, com preferências temporais separáveis, isto é,
as preferências temporais são aditivas:
1
U [c1 , c2 ] = u(c1 ) + u(c2 ) (10.8)
(1 + ρ)
onde a função utilidade U (ct ) é convexa e duplamente diferenciável, com U ′ (c) > 0 sig-
nificando que mais consumo é melhor, e U ′′ (c) < 0 significando que a utilidade marginal
do consumo é decrescente. O aspecto aditivo da função acima significa que as utilidades
temporais dos bens são independentes. A utilidade em consumir o produto no tempo
t = 1 não é afetada pela utilidade no tempo t = 2 e vice versa. Isto fica claro ao se
tomar a derivada parcial de dU (c1 , c2 )/dc1 não contém o termo c2 .
Uma forma funcional especı́fica muito utilizada, por satisfazer as condições descritas
e porque é matematicamente fácil de manipular, é assumir que a utilidade tem forma
de logaritmo natural, com o que obtemos:
1
U [c1 , c2 ] = ln c1 + ln c2 (10.9)
(1 + ρ)
onde o segundo termo, dividido por (1 + r), significa o valor presente daquele termo. O
que a equação estabelece é que o valor presente do consumo nos dois perı́odos deve ser
igual ao valor presente da renda dos dois perı́odos, somadas, e que portanto, o consu-
midor gasta exatamente o que recebe, sem deixar herança ou dı́vida. Além disto, em
termos de preferência intertemporal, o consumidor poderá ter três atitudes em relação
às suas preferências:

• −1 < ρ < 0: o consumidor dá mais importância ao consumo futuro

• ρ = 1: o consumidor é indiferente ao tempo, presente é igual ao futuro

• ρ > 1: o consumidor dá mais importância ao consumo presente

Supondo que o consumidor tenha um estoque inicial de riqueza igual a zero e que
ele gaste toda sua renda ao final do segundo perı́odo, sem deixar herança para a geração
futura então, sua restrição orçamentária será:
c2 y2
c1 + = y1 + (10.10)
(1 + r) (1 + r)
Se o agente dispusesse de algum estoque inicial de riqueza A(0), então sua restrição
orçamentária poderia ser expressa como:
c2 y2
c1 + = A0 + y 1 + (10.11)
(1 + r) (1 + r)
A equação (10.10) estabelece que o valor presente do consumo nos dois perı́odos,
descontados à uma taxa real de juros r, deve ser igual ao valor presente do fluxo de
renda nos dois perı́odos. Reescrevendo a equação temos:
c2 − y2
c1 − y1 + =0 (10.12)
(1 + r)
O problema do consumidor pode então ser escrito como:

102
1
Max ln c1 + ln c2
(1 + ρ)
(10.13)
c2 − y2
suj. a c1 − y1 + =0
(1 + r)
Este problema significa que o consumidor deve escolher a quantidade ótima de con-
sumo em cada perı́odo de tempo c1 e c2 levando em conta a taxa de juros r e sua
preferência temporal ρ. O problema da equação 10.13 pode ser resolvido a partir da
equação lagrangeana dada por:
 
1 c2 − y2
L = ln c1 + ln c2 + λ c1 − y1 + (10.14)
(1 + ρ) (1 + r)
Igualando a condição de primeira ordem à zero temos:

∂L 1
= 0 =⇒ + λ = 0
∂c1 c1

∂L 1 λ
= 0 =⇒ + =0 (10.15)
∂c2 (1 + ρ)c2 (1 + r)

∂L c2 − y2
= 0 =⇒c1 − y1 + =0
∂λ (1 + r)
O sistema de equações (10.15) pode ser resolvido para c1 e c2 utilizando-se somente
as primeiras duas condições e desprezando a terceira. Resolvendo a primeira condição
para λ e substituindo o resultado na segunda condição obtemos:

1 −1/c1
+ =0 (10.16)
(1 + ρ)c2 (1 + r)
Resolvendo esta equação para o consumo intertemporal ótimo do consumidor, en-
contraremos uma relação entre o consumo do perı́odo t = 2 e o consumo do perı́odo
t = 1 a qual indica o quanto o consumidor deve aumentar ou diminuir o consumo do
perı́odo 2 para se ajustar ótimamente quando variar a taxa de juros r e/ou sua taxa de
preferência intertemporal ρ. Com isso obtemos a seguinte expressão:
c2 1+r
= (10.17)
c1 1+ρ
Subtraindo c1 /c1 = 1 de ambos os lados e reorganizando a equação obtemos a taxa
de variação do consumo como um função de r e ρ:
c2 c1 1+r
− = −1
c1 c1 1+ρ
a qual resulta em:

∆c r−ρ
= (10.18)
c1 1+ρ

103
O resultado acima determina qual a variação na quantidade consumida em cada
perı́odo para que o consumidor desfrute da trajetória ótima. A equação (10.18) é a
famosa expressão de Frank Ramsey para o caso discreto.
No caso em que ρ = 1 um consumidor alocando seu consumo eficientemente entre
dois perı́odos será indiferente em relação à consumir uma unidade a mais de consumo
no perı́odo t = 1 ou no perı́odo t = 2. O consumo não varia entre os perı́odos pela
preferência intertemporal, isto é, ∆c/c1 = 0, se r = ρ.
Se a taxa de juros for maior que a taxa de preferência intertemporal, r > ρ o
consumo no perı́odo 2 será maior que o consumo do perı́odo 1 e se r < ρ o consumo do
perı́odo 1 deverá ser maior para que consumo ótimo seja alcançado. Se um consumidor
é indiferente em relação ao tempo, então ρ = 0 e neste caso o consumo do perı́odo 2
tende a ser o maior possı́vel. No caso em que o consumidor é muito imediatista, dando
preferência a consumir em t = 1 e não em t = 2 então ρ = 1 e, portanto, o consumo do
perı́odo 2 será o menor dos casos.

10.1.3 Teoria do Ciclo de Vida


A teoria do ciclo de vida do consumo pode ser entendida facilmente a partir de consumo
intertemporal de Fischer, mesmo o caso mais simples de dois perı́odos. Em uma série de
trabalhos com seus colaboradores Modigliani [1963] desenvolveram a hipótese chamaram
de “Ciclo de Vida”, em um trabalho intitulado The ’Life Cycle’ Hypothesis of Saving:
Aggregate Implications and Tests e publicado na American Economic Review. A rigor a
teoria do ciclo de vida do consumo é uma aplicação da teoria de Fischer pois envolve uma
decisão intertemporal, no entanto com alguns motivos microeconômicos de longo prazo
a mais. A hipótese do ciclo de vida considera que os indivı́duos planejam seu padrão de
vida ao longo do tempo de forma a ter um padrão de consumo estável e uniforme entre
dois perı́odos de vida, o perı́odo considerado ativo, onde obtém renda e pode acumular
poupança na forma de riqueza, para posteriormente usar esta riqueza acumulada para
consumo. De fato o que o consumidor está fazendo é reduzir o consumo quando jovem
para manter um consumo elevado na velhice.
Seu problema, então é escolher um nı́vel de consumo adequado, igual nos dois
perı́odos de vida, considerando simultaneamente seu tempo de vida, sua renda e seu
tempo de trabalho e aposentadoria. O teoria do ciclo de vida é base para muitos mode-
los de previdência social e estudos intergeracionais. No que se segue, iremos apresentar a
versão mais simples, que considera que o consumidor guarda ou poupa uma parte de sua
renda quando jovem, para consumi-la na velhice. Supomos ainda que não há inflação e
que portanto a renda poupada não perde valor no tempo e que consumidor acumula sua
poupança sem recebimentos de juros. Não seria difı́cil introduzir juros tanto no perı́odo
de acumulação como no perı́odo de saque. Tornaria o problema mais real, mas desviaria
a atenção dos aspectos teóricos, que é o que gostarı́amos de enfatizar no momento.
Seja então um consumidor que espere viver por mais T anos a partir de hoje, e
que atualmente ela disponha, como herança por exemplo, de uma riqueza no valor de
W e que terá um fluxo de renda Y pelo próximos R anos, quando irá se aposentar. R,
portanto, é o tempo de vida “útil”, aqui entendido como tempo de trabalho remunerado.
Assim sendo, sua riqueza total e fluxo de renda disponı́vel para consumidor ao longo de
toda sua sua vida T será:

104
A + RY
C= (10.19)
T
note que o consumidor recebe renda durante R anos, mas deverá consumir ao longo de
T anos, então ele tem que distribuir equilibradamente a renda ganha em R anos, ao
longo do T anos. A equação acima pode ser reescrita como:

1 R
C= A+ Y (10.20)
T T
Com esta nova formulação, fica evidente que uma das razões para que a a propensão
marginal a consumir seja menor que 1 é o fato de que o consumidor está poupando
parte de renda hoje para poder consumidor durante o perı́odo de vida que não tiver
mais renda. A propensão marginal a consumidor, aqui é dada por c1 = R/T . A figura
(10.1) ajudará a entender melhor o que está em jogo aqui.
Figura 10.1: Hipótese do Ciclo de Vida do Consumo

ST - Poupança

Y - Renda

S=Y-C

C - Consumo

0 R T

No eixo vertical plotamos o nı́vel de renda Y , o consumo e a poupança do consumidor


e no eixo horizontal a linha do tempo. Até o perı́odo R o consumidor está consumido
menos que sua renda e acumulando poupança que ao final do perı́odo de trabalho R
anos totalizará ST . Neste gráfico o consumidor possui uma riqueza inicial A = 0. Entre
o perı́odo R e T sua riqueza começa a diminuir, mas seu consumo permanece estável, no
mesmo nı́vel que possuı́a antes de se aposentar. O nı́vel de consumo que o consumidor
calculou é suficiente para que ele gaste toda sua riqueza acumulada ST ao longo do curto
perı́odo T − R e termine sem dı́vidas e sem herança para futuras gerações.
Este esquema básico pode ser ampliado em diferentes direções, adicionando taxa de
juros sobre a riqueza, antes e depois da aposentadoria, colocando incerteza no fluxo de
renda ou ainda permitindo que o consumidor se comporte altruisticamente, deixando
riqueza para futuras gerações, ou egoisticamente consumindo mais do que a renda e
riqueza, o importante é o motivo pelo qual um consumidor é levado a poupar e reduzir
seu consumo hoje, para consumir mais amanhã, ou no futuro.

Exemplo numérico

105
Considere uma pessoa de 20 anos de idade, com expectativa de vida de 80 anos que se
aposentará aos 65 anos de idade e que ganha $100.000 por ano.

a) Considerando que ela poupe 20% de sua renda, qual será o consumo antes e depois
da aposentadoria, no caso em que ela não deixa herança;

b) Qual deveria ser o consumo e a poupança caso ela planejasse ter um padrão de renda
constante antes e depois da aposentadoria;

c) Qual deveria ser o consumo e a poupança caso ela planejasse ter um padrão de renda
constante antes e depois da aposentadoria e além disso deixar uma herança de 30%
de sua poupança para seus descendentes.

10.1.4 Escolha Intertemporal - Horizonte Infinito


Os modelos de horizonte infinito são úteis para analisar uma situação agregada onde o
padrão de consumo se mantém estável entre gerações, de forma que, mesmo que ocorra
nascimento e morte no plano individual, em termos agregado o consumo se mantém
estável, como se os indivı́duos vivessem para sempre. Situações mais gerais, onde existem
diferenças populacionais e hábitos entre gerações, podem ser analisadas com os modelos
de Gerações Sobrepostas. Estes modelos são mais abrangentes, mas também são mais
trabalhosos do ponto de vista matemático e não serão apresentados no momento. Nos
modelos de Horizonte Infinito, na verdade, o consumo varia no tempo, em função da
decisão do consumidor entre alocar renda ao consumo e à poupança dependendo da
taxa de juros e dada de preferência intertemporal (ρ). A estabilidade que nos referı́amos
antes era devida ao fato de não haver diferenças entre gerações, o que torna possı́vel
considerar o consumidor como um agente representativo para toda a população e não
parte dela.
O problema intertemporal do consumidor pode ser resolvido matematicamente de
forma mais simples através do caso contı́nuo. No caso discreto, por exemplo, a restrição
orçamentária do consumidor, generalizando o resultado anterior obtido em (10.12) agora
não mais para 2 perı́odos, mas sim para n perı́odos à frente é dada por:
y1 − c1 y2 − c2 y2 − c2 yn − cn
+ + + ... + =0
(1 + r)0 (1 + r)1 (1 + r)2 (1 + r)n
n (10.21)
X yn − cn
=0
(1 + r)n
0

A equação (10.21) estabelece que ao longo de um horizonte de vida n = ∞ o consu-


midor não poderá acumular dı́vida nem riqueza, de tal forma que a diferença acumulada
entre a renda e consumo ao longo de todo o horizonte é nula. É a mesma hipótese
assumida anteriormente, no caso de dois perı́odos, apenas com a diferença de que agora
ela é válido para todo o horizonte de tempo. Esta equação está representada na forma
discreta. Reescrevendo-a na forma contı́nua temos a seguinte equação:
Z ∞
[y(t) − c(t)] e−rt = 0 (10.22)
0

106
que nada mais é do que uma expressão para calcular o valor presente de todo fluxo de
renda e consumo futuro descontado à uma taxa de juros r, ao longo do tempo t → ∞.
Note que a renda e consumo são variáveis endógenas que mudam no tempo. a renda
do consumidor provém de sua renda trabalho, em função da oferta de mão de obra no
mercado de trabalho. Uma maneira mais direta de representar o problema do consumi-
dor, sem se importar diretamente com a quantidade de trabalho que ele deverá ofertar
para obter sua renda-trabalho, é assumir diretamente para o consumidor uma função
utilidade que lhe confira maior bem estar material a medida que ele consumir mais pro-
dutos, entendendo que estamos falando aqui de bens de consumo que não proporcionem
dados colaterais ao próprio consumidor ou à outrem.
A utilidade do consumidor também pode variar no tempo de forma que o consumi-
dor estaria continuamente determinando a valor presente da utilidade atual e futura,
descontada à uma taxa subjetiva de preferência intertemporal igual à ρ:

Z ∞
Max U = u[C(t)]e−ρt dt
0
Z ∞ (10.23)
suj. a [y(t) − c(t)] e−rt = 0
0

Por questão de simplicidade matemática é desejável que a função utilidade seja


duplamente diferenciável em relação ao tempo, convexa, com u′ (c) > 0 e u′′ (c) < 0. Isto
é, que as curvas de utilidade sejam concavas, de forma que a restrição orçamentária,
no ponto de ótimo, toque a curva isoquanta em apenas um único ponto. em outras
palavras, que o problema de otimização tenha apenas uma solução matemática. Existem
várias formas funcionais que satisfazem estas propriedades. Uma das funções utilidades
muito utilizada é a chamada função utilidade com coeficiente de aversão ao risco relativo
constante ou CRRA - constant-relative-risk-aversion.
C(t)1−θ
(
1−θ if θ ̸= 1
u[C(t)] = (10.24)
ln C(t) if θ = 1
onde θ é o coeficiente que mede a aversão ao risco do consumidor. O risco aqui significa
o quanto que o consumidor está disposto a variar seu consumo entre os perı́odos de
tempo para obter mais utilidade, ou em outras palavras é taxa marginal de substituição
intertemporal do consumo (a qual não deve ser confundida com ρ) que é taxa subjetiva
de desconto para computar o valor atual da utilidade futura. O formato da equação
(10.24) pode ser visto na figura (10.2) abaixo:

107
Figura 10.2: Função Utilidade CRRA

Deste modo o problema completo do consumidor passa a ser:


C(t)1−θ −ρt
Z
Max U = e dt
0 1−θ
Z ∞ (10.25)
suj. a [y(t) − c(t)] e−rt dt = 0
0

cujo Lagrangeano é:


∞ ∞
C(t)1−θ −ρt
Z Z
L = e dt + λ [y(t) − c(t)] e−rt dt (10.26)
0 1−θ 0
As condições de primeira ordem são:

∂L
=0
∂C(t)
(10.27)

C(t)−θ e−ρt − λe−rt = 0

linearizando a equação (10.27) por logaritmo natural obtemos:

ln[C(t)−θ ] + ln(e−ρt ) − ln λ − ln(e−rt ) = 0


(10.28)
−θ ln C(t) − ρt − ln λ + rt = 0

Diferenciando a equação em relação ao tempo t obtemos finalmente:

108
1 dC(t)
−θ −ρ−0+r =0
C(t) dt
1 dC(t)
θ =r−ρ (10.29)
C(t) dt
Ċ(t) r−ρ
=
C(t) θ

A equação (10.29) no caso contı́nuo equivale à equação (10.18) do caso discreto. O


coeficiente de aversão ao risco θ não apareceu no caso discreto porque lá nós assumidos
que θ = 0 sem no entanto referir-se ao coeficiente. A equação (10.29) determina qual a
taxa de variação do consumo necessária como resposta à variação de um dos coeficientes
ρ, r or θ, de forma que a trajetória intertemporal do consumo seja sempre a trajetória
ótima.

10.2 Investimento

Nesta seção analisaremos algumas teorias e conceitos a respeito da decisão de investi-


mento tomada por parte das firmas. Em termos agregado o investimento possui dois
efeitos importantes sobre o sistema econômico, uma pelo lado da demanda e outro pelo
lado da oferta. Pelo lado da demanda o investimento, ou formação bruta de capital fixo
como as vezes é chamado contabilmente, é um dos componentes da demanda agregada
e portanto a variação do investimento ao longo do tempo é causa da variação do PIB
pelo lado da renda e do dispêndio. Esta variação do investimento pelo lado da demanda
é um importante componente dos ciclos de curto prazo da economia. No longo prazo,
o investimento provoca alteração na capacidade de produção da economia, por meio
do processo de acumulação de capital que ao fim produz o fenômeno do crescimento
econômico. A teoria macroeconômica, deste modo, quando enfatiza os efeitos de curto
prazo do investimento, leva em consideração somente o efeito demanda, e quando en-
fatiza o longo prazo, considera principalmente o efeito capacidade. Investimento, neste
caso significa conversão de recursos em ampliação fı́sica do estoque de capital da eco-
nomia, mesmo que medida monetariamente. Acumulação de capital, base das teorias
do crescimento econômico significa portanto, construção de novas fábricas, aquisição de
novas máquinas, aumento da fronteira agrı́cola, se é que atualmente ainda existe espaço
para isso no planeta, construção de estradas, lançamentos de satélites, construção de
uma casa ou até mesmo ampliação e todo o gênero de grandes e pequenos novos empre-
endimentos deste gênero que se possa imaginar.
A questão básica da teoria microeconômica do investimento é distinguir as variáveis
relevantes que faz com que uma firma ou empresário decida por realizar um determinado
montante de investimento em determinado perı́odo de tempo. Dentre as principais
variáveis, três delas tem recebido massiva atenção por parte dos economistas: o nı́vel
de demanda em relação a capacidade produtiva existente, a taxa de lucro e a taxa de
juros. Mas o problema mais importante na decisão de investimento é que esta é uma
decisão em ambiente de incerteza, sujeito à altas doses de risco, pois a ampliação do
estoque de capital e capacidade produtiva hoje é uma antecipação do futuro. toda
firma ou empresário que investe hoje, aposta num fluxo de caixa futuro, e neste aspecto

109
assume correr riscos de diversas natureza. Seu fluxo de caixa futuro, bem como a taxa
de juros futura que será usada para descontar seu fluxo de caixa para valor presente
podem oscilar, lá no futuro, por diversos motivos. Assim, tudo o que podemos fazer
no presente é calcular o valor presente deste futuro incerto, assumindo valores a taxas
esperadas, isto é, formando expectativas sobre o futuro.
Assim, assuma que um investimento qualquer poderá gerar um fluxo de caixa de
lucros (Π) no perı́odo t + 1 e este valor possa ser descontado a uma taxa de juro r, então
o valor presente deste fluxo de caixa único é:

Πet+1
Πt = (10.30)
1+r
onde o sobrescrito e significa expectativa ou valor esperado, uma vez que não há certeza
sobre seu real valor, por tratar-se de um evento futuro. Por sua vez, na expressão acima,
a taxa de juros contratada hoje é fixa e conhecida, portanto é simplesmente denotada
por r, sem sobrescrito. Estendendo o fluxo de caixa para dois perı́odos, a valor presente
de um fluxo de caixa Πe será

Πet+1 Πet+2
V (Πt ) = + (10.31)
1 + r (1 + r)2
Se mantivermos a taxa de juros fixa no longo prazo para efeito de simplificação,
algo extremamente raro nos dias de hoje, então um valor presente de um fluxo de caixa
infinito pode ser representado discretamente pela seguinte equação, onde cada fluxo de
lucro Πet+i pode variar no tempo:
n
X Πet+i
Πe Πet+2 Πet+n
V (Πt ) = t+1 + + . . . + = (10.32)
1 + r (1 + r)2 (1 + r)n (1 + r)i
i=1

Se mantivermos uma hipótese simplificadora de que os fluxos de lucros no futuro são


iguais e constantes, poderı́amos reescrever a equação acima como sendo:
n
Π Π Π X Π
V (Πt ) = + 2
+ . . . + n
= (10.33)
1 + r (1 + r) (1 + r) (1 + r)i
i=1

Esta expressão, se colocarmos Π em evidência, obtemos a expressão abaixo, onde a


parte dentro dos colchetes é uma progressão geométrica decrescente de razão 1/(1 + r):
 
1 1 1
V (Πt ) = Π + + ... + (10.34)
1 + r (1 + r)2 (1 + r)n
ou
 
Π 1 1 1
V (Πt ) = 1+ + + ... + (10.35)
1+r 1 + r (1 + r)2 (1 + r)n−1
Esta progressão geométrica pode ser resolvida pela soma de uma progressão infinita,
cujo valor é dado por:

a1 (q n − 1)
Sn = (10.36)
q−1

110
onde q = 1/(1 + r) < 1. Podemos separar a equação em dois termos e como o tempo
vai até o infinito (n → ∞) o primeiro termo é zero, pois q ∞ = 0, com o que podemos
escrever:

a1 (q n ) a1 a1 a1
Sn = − =0− = (10.37)
q−1 q−1 q−1 1−q
e então substituindo a1 = 1 e q obtemos:
1 1 1 1+r
Sn = 1 = 1+r−1 = r = (10.38)
1 − 1+r 1+r 1+r r
ou simplesmente:

Π
V (Πt ) = (10.39)
r
Este resultado acima é impressionante e equivale ao inverso do ı́ndice Preço/Lucro
ou P/L = r/Π utilizado correntemente na bolsa de valores para avaliar o valor de uma
empresa e comparar com seu preço de mercado.
No caso da teoria do investimento, é muito comum encontrar funções investimentos
que relacionam a função investimento com o chamado q de Tobin, nome dado em função
da contribuição de James Tobin que incorporou o valor de mercado da empresa à função
macroeconômica de investimento:
 
Π
I = I[V (Π)] = I (10.40)
r+δ
onde δ é a depreciação.
Em termos de microfundamentos, este raciocı́nio todo mostra outra maneira de como
a taxa de juros afeta a função investimento. Normalmente afirma-se que uma elevação
na taxa de juro torna o crédito ao investimento mais caro, diminuindo o montante de
investimentos da economia. Outro caminho, mais adequado, diga-se de passagem, é que
uma elevação da taxa de juro diminui o valor presente de um investimento, pois ao se
descontar um fluxo de caixa por uma taxa maior, obtém-se um valor presente menor.
Esse é o raciocı́nio que está por detrás também das práticas de valuation ou valoração
de empresas pelo fluxo de caixa, e é o mesmo raciocı́nio pelo qual se avalia o valor de
uma empresa na Bolsa, pelo ı́ndice PL, como comentado.

10.3 Governo

A terceira variável macroeconômica objeto de aprofundamento, em busca razões mi-


croeconômicas para os fenômenos observados em nı́vel agregado é o governo. Aqui, de
partida, já nos deparamos com uma dificuldade decorrente da própria variável, uma vez
que governo só existe um, deforma que não nos referimos à uma população de agentes,
como fizemos no caso das familias (consumo) e firmas (investimento). No entanto a
variável governo, pode ser separada em diversos nı́veis de agregação, para representar
gastos gerais do governo com mais detalhamento, como por exemplo, separar despesas
correntes (gastos) e despesas de capitais (investimento público) entre outras formas de
desagregação. Poderı́amos separar despesas com salários de despesas com consumo do
governo, ou despesas previdenciárias, e assim sucessivamente.

111
Além disto, um aspecto importante do papel desempenhado pelo governo na teoria
macroeconômica é a análise da dı́vida pública diante dos fluxos tributários e de despesas.

10.3.1 Déficit e Dı́vida Pública


Um importante aspecto da análise macroeconômica do setor diz respeito ao equilı́brio
de curto e longo prazo da dı́vida pública. Basta ter em mente que a maioria dos paı́ses,
mesmo muitos paises industrializados como EUA, França, Japão, Itália e outros pos-
suem dı́vidas públicas acima de 100% do PIB, chegando em 180 e 200% em alguns casos.
A dı́vida pública do Brasil em ago/2023 atingiu impressionantes R$ 6,265 trilhões, re-
presentando aproximadamente 74,5% do PIB, segundo o Tesouro Nacional.
Uma dı́vida pública, do tamanho que for, é financiada pela emissão de tı́tulos públicos
emitidos pelo Tesouro Nacional e vendido basicamente à dois agentes:

• Ao setor privado

• Ao Banco Central

O setor privado, especialmente grandes bancos e fundos de investimento são os prin-


cipais financiadores da dı́vida. Mas uma parte significativa da dı́vida é mantida pelo
Banco Central que a utiliza basicamente como instrumento de controle da liquidez (mo-
eda em circulação) da economia. Em tese, e conceitualmente o Tesouro Nacional é o
gestor da dı́vida pública e sua missão é gerenciar a dı́vida pública no longo prazo, en-
quanto o Banco Central usa o estoque de dı́vida em sua carteira para gerenciamento de
curto prazo da liquidez da economia. Se o Banco Central está interessado em imple-
mentar uma polı́tica monetária expansionista, basta realizar operações de comprar de
tı́tulo da dı́vida pública que estão de posse do setor privado.
A contabilidade do setor público, por acordo internacional de padronização de contas
públicas, segue algumas normas e nomenclaturas comuns à vários paı́ses. Dentre esses
conceitos temos o conceito de Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP)
que é calculado em dois momentos:

• NFSP Operacional (antes dos juros da dı́vida)

• NFSP Nominal (depois dos juros da dı́vida)

Assim temos, em termos nominais

N F SPtnom = Gt − Tt + iBt−1 (10.41)


onde G são os gastos totais do governo, T a arrecadação tributária e outras arrecadações,
i a taxa nominal de juros que financia a dı́vida (Selic) e B o estoque de dı́vida.
O estoque da dı́vida, portanto, é determinado por

Bt = Gt − Tt + iBt−1 − At (10.42)
onde At é o total amortizado da dı́vida em cada perı́odo considerado. A amortização
sempre será um valor igual ou maior que zero (At ≥ 0) de forma que quando o governo
não consegue amortizar a dı́vida vencendo no perı́odo, ele deve rolar o principal. O
mais comum hoje em dia é inclusive os governos rolarem os serviços (juros) da dı́vida

112
incorporando para de iBt−1 ao estoque da dı́vida, o que faz com que a bola de neve
cresça, podendo atingir dimensões crı́ticas que conduzem a crises de financiamento do
governo. Isto já aconteceu inúmeras vezes na história de diversos paı́ses.
Em geral, paı́ses altamente endividados necessitam de altos impostos para manter
a dı́vida estável no longo prazo. No entanto altos impostos levam a problemas de co-
ordenação e comportamentos dos agentes. Quanto maior a carga tributária, mais os
agentes e firmas desenvolvem estratégias, até mesmo subterfúgios ilı́citos, para evitar
de pagar impostos. Este comportamento levou alguns economistas especializados em
finanças públicas a elaborar a hipótese do comportamento não linear da carga de impos-
tos, tal como proposto pelo economista Arthur B. Lafer, ao propor o seguinte quadro:
Figura 10.3: Curva de Lafer para a tributação

De acordo com Lafer, existe um ponto de ótimo, ou de máximo para a arrecadação


tributária,a partir do qual ela se torna ineficiente.

10.3.2 Imposto Inflacionário e Senhoriagem


O imposto inflacionário é um fenômeno que ocorre por conta do pagamento de despesas
do governo por meio de emissão de moeda, com consequente geração de inflação. A
quantidade de moeda emitida é interpretada como uma fonte alternativa de arrecadação.
É um subterfúgio, ao invés do governo aumentar os impostos para cobrir o excesso de
gasto, o governo emite moeda. A inflação gerada pelo governo corrói o poder de compra
dos agente que retiveram moeda. Como a população em geral não se percebe disto
imediatamente, é muito mais fácil para o governo emitir moeda (gerando inflação) do
que aumentar impostos. Por isto a emissão de moeda, para pagametos de despesas do
governo, é denominada de imposto inflácionário.
Em geral a demanda por moeda em uma economia ocorre, como visto em outras
partes do livro pelo motivo transação e especulação. Atendo-se à demanda por mo-
tivo de transações, haverá mais necessidade de moeda quando a economia cresce, mas
também quando há inflação e os preços sobem. Em geral, pela visão corrente das teorias
quantitativas da moeda, uma polı́tica monetária expansionista, ao estimular a atividade
econômica, próxima de uma situação de pleno emprego, ao fim apenas gera inflação.
Agora imagina um governo com gastos elevados que não consegue elevar a carga tri-
butária, por algum motivo qualquer, seja a curva de Lafer acima, ou impossibilidade

113
polı́tica, eleitoral. Uma saı́da para essa situação é financiar os gastos ou fechar a conta
da NFSP com emissão de moeda, o que acaba sendo uma maneira de criar receita, mas
por um mecanismo engenhoso, chamado de imposto inflacionário, que nada mais é do
que emitir moeda para complementar a arrecada tributária insuficiente gerando com isso
inflação na economia.
Formalmente ou imposto inflacionário é representado por:
 
Pt − Pt−1 Mt dP M M
Tinf = = = πt (10.43)
Pt Pt P P P
onde Tinf é o montante em $ de imposto inflacionário, π é a taxa de inflação e M/P é a
quantidade de moeda em circulação ou a demanda de moeda. Na parte final da equação,
omitimos o subscrito do tempo. O que a equação mostra é que o imposto inflacionário
corresponde ao poder de compra perdido pela população em função da inflação por reter
moeda.
Sendo a demanda por moeda para fins de transação e especulação dada por M d /P =
L(Y, i), podemos substituir a demanda por moeda na equação (10.43) obtendo a ex-
pressão para o imposto inflacionário:
A senhoriagem (S) é a receita retida pelo governo como resultado da sua capacidade
de emitir moeda. Senhoriagem é um termo antigo, usado na era medieval onde os senho-
res feudais emitiam sua própria moeda como forma de pagar suas despesas. Atualmente
a senhoria é um termo usado para designar o montate real de moeda criada pelo governo,
detentor do monopólio de criação da moeda, assim como acontecia na idade medieval.
Algebricamente a senhoriagem é definida como:

Mt − Mt−1 dM M
St = = (10.44)
Pt M P
onde dM/M é o percentual ou a taxa de variação nominal da moeda e M/P é o total
de moeda em circulação, retida pelos agentes.

10.3.3 O problema da sustentabilidade da dı́vida pública


O problema da dı́vida pública não se restringe ao seu tamanho ou nı́vel. Há casos de
paı́ses com relação dı́vida pública alta combinada com taxa de juro baixa e crescimento
elevado, em que o peso da dı́vida não é uma restrição macroeconômica do setor público.
É entendimento corrente entre os economistas que a questão da dı́vida pública seja ana-
lisado em relação ao seu comportamento de médio e longo prazo, e se a trajetória da
dı́vida é sustentável ou não. Assim a análise da dı́vida pública é efetuado a partir de
um modelo algébrico que leva em conta não apenas o estoque da dı́vida, os gastos, a
arrecadação e o juro ou serviço da dı́vida, mas também a taxa de crescimento da econo-
mia. A questão do problema da sustentabilidade da dı́vida pública pode ser formalizado
como segue.
Assuma a seguinte equação dinâmica para variação da dı́vida pública (Bt ) no tempo,
onde B, de bônus como também é chamado os tı́tulos públicos, denota o estoque da
dı́vida:

Bt+1 = Bt + Gt − Tt + iBt + hĖBt (10.45)

114
onde i é a taxa nominal de juro, o parâmetro h é a proporção da dı́vida total atrelada
ao câmbio ou a parcela da dı́vida externa e Ė é a variação da taxa de câmbio e B é o
total da dı́vida, incluindo dı́vida interna e externa. A equação pode ser reescrita como:

Bt+1 = (1 + i)Bt + Gt − Tt + hĖBt (10.46)


Podemos analisar o efeito real, levando em conta a taxa real de juro e a inflação,
onde por definição:

(1 + i)
(1 + r) = ou (1 + i) = (1 + r)(1 + π) (10.47)
(1 + π)
e substituindo em (10.46)

Bt+1 = (1 + r)(1 + π)Bt + Gt − Tt + hĖBt (10.48)


Para obter a relação dı́vida/PIB podemos dividir toda a equação (10.46) por Pt+1 Yt+1 ,
com o que obtemos:

Bt+1 Bt Gt − Tt Bt
= (1 + r)(1 + π) + + hĖ (10.49)
Pt+1 Yt+1 Pt+1 Yt+1 Pt+1 Yt+1 Pt+1 Yt+1
a assumindo as seguintes constatações onde g é a taxa de crescimento da economia num
ado instante do tempo:

Bt
Pt+1 = (1 + π)Pt ; Yt+1 = (1 + g)Yt ; bt = (10.50)
Pt Yt
e substituindo (10.50) em (10.49) obtemos finalmente:

(1 + r) 1 1
bt+1 = bt + dt + hĖ bt (10.51)
(1 + g) (1 + π)(1 + g) (1 + π)(1 + g)
a equação da sustentabilidade da dı́vida, onde dt = GtY−T t
t
é o resultado primário do
governo em termos proporcionais ao PIB. Considerando o problema da dı́vida como
uma proporção do PIB, se ... > bt+2 > bt+1 > bt é sinal que a dı́vida está aumentando
em relação ao PIB e isto é visto como um problema de trajetória insustentável da dı́vida,
colocando o governo na defensiva e em saia justa para conseguir rolar a dı́vida, e muitas
vezes pressionado para diminuir gastos e aumentar impostos como forma de equacionar o
problema, com todas as consequencias negativas que tais medidas irão impor è economia
e à sociedade.

115
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