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Internalização e Apropriação - Vygotsky e Bakhtin

Outro importante conceito de Vygotsky, além daquele de ZPD, abordado


em artigo anterior, é o de internalização.

Internalizar seria transformar “um processo interpessoal num processo


intrapessoal”; como uma reconstrução de uma operação externa em uma
operação interna. Para ele “todas as funções no desenvolvimento da
criança aparecem duas vezes: primeiro no nível social e, depois, no nível
individual; primeiro entre as pessoas (interpsicológico), e, depois, no
interior da criança (intrapsicológico)”. Essas influências externas no
processo de desenvolvimento da criança envolveriam, para ele, operações
com signos.

A noção vygotskyana de “internalização” vem sendo reinterpretada com


base em Bakhtin.

Bakhtin nos coloca que as influências externas “têm uma importância


especial nas primeiras fases da evolução do homem. Estas influências
estão revestidas de palavras (ou de outros signos) e tais palavras
pertencem a outras pessoas; acima de tudo, trata-se da palavra da mãe.
(...) Estas ‘palavras alheias’ se reelaboram dialogicamente em ‘palavras
próprias alheias’ com ajuda de outras ‘palavras alheias’ escutadas
anteriormente e, depois, em palavras próprias (com, poder-se-ia dizer, a
perda das aspas) que possuem um caráter criativo”.

Poderíamos dizer que, para Bakhtin, a internalização seria um processo de


apreensão, de apropriação da “palavra do outro”, transformando-a em
“palavra própria”, através da “palavra própria alheia”. Haveria, na
aprendizagem, um movimento progressivo de apreensão da palavra
alheia, para transformá-la em palavra própria. Esse processo se daria a
partir das interações sociais por meio da linguagem.

Bakhtin afirma que entre os meios externos da cultura que devemos nos
apropriar e usar para nos comunicarmos estão os gêneros de discurso. Os
gêneros são instrumentos (ferramentas) que se encontram entre o
indivíduo que age e a situação sobre o qual age.

Segundo Bakhtin, cada esfera de utilização da linguagem, por suas práticas


verbais, elabora "tipos relativamente estáveis de enunciados" que são os
gêneros do discurso. Estas práticas de linguagem são reflexos das
interações sociais e, ao mesmo tempo, instrumento de interação social.

Dito de outra forma, os gêneros do discurso são formas de dizer, por


escrito ou oralmente, socialmente construídas, produtos das interações
nas diferentes esferas de atividades humanas, e são relativamente
estáveis. Os gêneros refletem e refratam o lugar social, o espaço e o
tempo (ou seja, o contexto e\ou esfera) onde está aquele que diz, o
interlocutor a quem ele se dirige e a finalidade do que se quis dizer – a
situação de comunicação. Os gêneros carregam elementos valorativos,
apreciações daquele que escreve ou fala.

Os gêneros, orais e escritos, são justamente os instrumentos linguísticos a


serem ensinados e apropriados pelos aprendizes para atuarem no mundo.
Ensinar/aprender, nesse caso, é ter como objeto de ensino/aprendizagem
os diferentes gêneros formais de discurso, instrumentalizando o aluno
para que se transforme em um leitor, produtor textual e falante
proficiente.

Os gêneros formais, para serem mediadores entre o indivíduo que age


verbalmente e a situação, precisam ser apropriados, ou seja, é necessário
que o sujeito domine os modelos de prática de linguagem disponibilizados
no ambiente social - os diferentes gêneros de discurso.

O professor, segundo Vygotsky, é figura essencial do saber por


representar um elo intermediário entre o aluno e o conhecimento
disponível no ambiente, no caso entre os alunos e os gêneros de discurso.

Para que haja apropriação por parte dos alunos, o professor deve dispor
de estratégias de ensino que visam trabalhar com eles os recursos
necessários para tal apropriação, supõe intervenções que favoreçam o
domínio dos gêneros e das situações de produção correspondentes.

A prática de sala de aula suposta é triangular: aluno, professor e objeto de


estudo – o gênero. O professor concentra seu trabalho sobre um
determinado gênero, num espaço de tempo, articulando a leitura, escrita
e oralidade.

Eliana Gagliardi

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