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Helena Petrovna Blavatsky

por Ligia Cabús

Helena Petrovna von Han, a esotérica que


ficou conhecida como H.P. Blavatsky ou
Madame Blavatsky, nasceu na cidade de
Ekaterinoslav, sul da Rússia, atual Ucrânia, em
12 de agosto de 1831, filha do coronel Peter
von Han e da famosa novelista da época,
Helena de Fadeyev. As primeiras horas de vida
da futura ocultista e paranormal pareciam
anunciar seu destino incomum: recém-nascida,
era tão fraca que foi desenganada. O batizado
foi providenciado apressadamente para evitar
que a criança morresse pagã e a cerimônia foi
marcada por acidente, considerado mau
agouro:

Na Rússia ortodoxa, a cerimônia de batismo


era pomposa: velas acesas nas mãos de todos os participantes, vários pares de padrinhos
e madrinhas. As pessoas tinham de ficar em pé durante todo o rito batismal, sem poder
sentar. ...A tia do bebê, que era uma criança pequena, cansada de ficar de pé por quase
uma hora, sentou-se no chão... A cerimônia estava quase no final, os padrinhos fazendo
o ato de renúncia ao Demônio e seus atos ─ renúncia enfatizada na Igreja Ortodoxa por
três cusparadas sobre o inimigo invisível ─ quando a menininha, brincando com a vela
acesa, inadvertidamente incendiou as longas vestes do sacerdote. Várias pessoas,
especialmente o sacerdote, acabaram seriamente queimadas. [CALDWELL, p 20]

Quando Helena tinha 11 anos, em 1842, sua mãe morreu. Ela e os irmãos, Vera e
Leonid, foram morar com os avós maternos, em Saratov; o avô, general André
Mikaelivitch Fadeyev [ou Fadeef], era governador de província e a avó, Princesa Helena
Dolgorukov, era botânica e escritora. A mansão dos avós, enorme construção do século
XVIII, tinha uma atmosfera de mistério: galerias subterrâneas, passagens abandonadas,
inúmeros recantos e esconderijos; lugares onde a menina se escondia quando queria
fugir da disciplina doméstica. Não raro, se perdia naqueles labirintos mas dizia que não
tinha medo porque jamais ficava sozinha: tinha a companhia de estranhas criaturas às
quais chamava "corcundinhas".

Ainda assim, era muito nervosa: tinha ataques de riso, de eloqüência, era sonâmbula e
as vezes dizia-se perseguida pelos "terríveis olhos brilhantes". Definitivamente,
Blavatsky não foi uma criança normal. Teve uma educação esmerada, com rica
biblioteca à sua disposição: devorava os livros. Era inteligente: aprendia outros idiomas
com facilidade, tocava piano muito bem, pintava com maestria, era uma amazona
destemida que montava cavalos poderosos usando cela masculina.
Desde cedo, também demonstrava seus poderes ocultos, ainda crus, sem controle, como
a clarividência ─ faculdade inspiradora das incríveis histórias de eras passadas que
contava a adultos e crianças ─ a telecinese com a qual movia objetos com a mente e
produzia pancadas, a telepatia, comunicação à distancia através do pensamento e leitura
do pensamento de terceiros e o mesmerismo [capacidade de hipnotizar pessoas e
animais]. Ainda na infância, tinha visões de um homem de feições orientais que, mais
tarde, revelou-se como seu mestre espiritual, um Mahatma [grande espírito], Irmão da
Fraternidade Branca, Mestre Morya.

Casamento

A jovem não se preocupava em casar porém, geniosa como era, foi desafiada: uma ama
ou dama de companhia afirmou que com aquele temperamento a moça jamais casaria e
apontando um velho e feio amigo da família, Nicephoro V. Blavatsky, a quem Helena
chama de "corvo sem penas", disse que nem mesmo ele a aceitaria como esposa [na
verdade Nicephoro tinha cerca de três vezes a idade dela, algo em torno de 51 anos].
Assim instigada e sem pensar no que fazia a moça dirigiu-se àquele senhor e conversou
com ele poucos minutos. Três dias depois ele fez o pedido de casamento. O pai
consentiu e não houve como escapar. O casamento foi realizado em 1848; outras fontes
indicam a data de 07 de julho de 1849; ela tinha 17 anos.

Consta que a união jamais foi consumada [no sentido bíblico da expressão]. Três meses
depois ela fugiu do abrigando-se com os avós que a enviaram à casa do pai. No
caminho, temendo ser obrigada a voltar para o marido, fugiu de novo e, desta vez,
abandonou a Rússia dando início à grande aventura que foi sua vida. Durante dez anos
viajou pelos mais diferentes e remotos lugares do mundo: Ásia Central, Índia, América
do Sul, África, Leste Europeu, Turquia, Egito, Grécia, México, Ilha de Java, entre
outros. Apesar do escândalo, o pai não a desamparou e patrocinou suas viagens
providenciando regulares remessas de dinheiro. Daquele casamento ela conservou
apenas o nome com o qual tornou-se famosa e somente voltou à Rússia depois que a
separação foi legalizada.

* Este casamento de Blavatsky é objeto de controvérsia entre os biógrafos. Um bom


apanhado das diferentes versões pode ser encontrado no artigo de Marina Cesar Sisson,
Novas Luzes Sobre o Primeiro Casamento de HPB, disponível on-line em
BLAVATSKY.NET. No mesmo site, há outro artigo, da mesma autora, sobre um
suposto filho! de HPB, Yuri, um tema pouquíssimo comentado pelos que conhecem, em
linhas gerais, a vida ocultista: HPB Com Seu Filho Yuri.

Aventuras e Treinamento Esotérico

Em 1851, aos 20 anos, H.P. Blavatsky estava em Londres onde, finalmente, teve seu
primeiro encontro, no plano físico, com o Mestre Morya, aquele que aparecia em suas
visões de infância. Soube, então, que ele era um Iniciado oriental, um indiano nascido
no clã dos Rajput, descendente de uma dinastia de guerreiros. Sobre este episódio, a
condessa Constance Wachtmeister escreveu:

Em Londres, em 1851, andando um dia na rua viu um homem indiano alto ao lado de
uma princesa também indiana. Imediatamente o reconheceu como a entidade astral que
sempre a acompanhava. Seu primeiro impulso foi correr até ele para conversar, mas o
homem lhe fez um sinal para que não se aproximasse... No dia seguinte, Helena foi ao
Hyde Park para um passeio solitário... quando viu o homem do dia anterior se
aproximando. Foi então que seu Mestre lhe disse [que] ...queria muito encontrar Helena
pessoalmente porque precisava pedir sua cooperação num trabalho que precisava ser
implantado. Explicou que uma sociedade teosófica estava para ser formada e gostaria
que ela fosse a fundadora... Disse que ela teria de passar três anos no Tibete para ser
preparada para essa importante missão [CALDWELL, p 31].

Naquele mesmo ano [1851] ela empreendeu novas viagens. Em 1854, nos Estados
Unidos, cruzou as Montanhas Rochosas em um carroção de imigrantes.Em 1855, foi
para a Índia, via Japão [que mulher!] e conseguiu entrar no Tibete [era a segunda vez
que tentava; na primeira, 1852, fracassou]. Ali, sob a orientação do Mestre Morya,
durante três anos, foi adequadamente treinada e iniciada no teoria e na prática das
ciências ocultas. Entre 1860 e 1865, novamente viajando, desta vez pelo Cáucaso,
passou por uma séria crise física e psíquica que, uma vez superada, resultou no domínio
completo de seus poderes paranormais. Em 1865, em carta para sua irmã, Vera P. de
Zhelihovsky, Blavatsky comenta: "Agora, não estarei mais sujeita a influências
externas".

Estranha Doença

Como foi mencionado, Blavatsky passou um período com a saúde abalada.


Aparentemente, tudo começou durante uma viagem uma viagem, nas estepes asiáticas,
onde sofreu um ferimento grave na altura do coração [segundo ela mesma, um golpe de
sabre]. Sobre ferimentos que sofreu em suas aventuras, consta, ainda, que na Itália,
filiada à associação carbonária em 1856, lutou ao lado de Garibaldi, em Viterbo, e
depois, em Montana, onde foi ferida tantas vezes que foi dada como morta no campo de
batalha [CARDILLO, p 10]. Mas aquele ferimento no peito não se curava totalmente.
A chaga se abria e, então, ela tinha convulsões e entrava em estado de transe comatoso.
Este estado durava entre três e quatro dias ao fim dos quais a ferida fechava
espontaneamente sem deixar seqüelas.

Em 1859, quando estava na Rússia, morando, em uma casa de campo, com o pai e a
irmã, Vera, que desconheciam os detalhes do problema, ocorreu umas crises. O médico
foi chamado mas antes que pudesse examinar a paciente: "... viu uma mão grande e
escura colocar-se entre entre a sua e o ferimento que ia costurar... aquela mão movia-se
vagarosamente, a intervalos, do pescoço até a cintura. Para piorar mais as coisas,
começou a ser ouvido no quarto um barulho terrível, um verdadeiro caos de sons e
ruídos vindos do teto, do piso, das vidraças e de todas as peças do mobiliário do
apartamento. O médico, apavorado, implorou para não ser deixado sozinho com a
paciente" [CALDWELL, p 36].

No mesmo período, independente da questão do ferimento, ela sucumbia em estado de


semiconsciência e uma febre branda a consumia. Nada comia ou bebia. Chegou a passar
uma semana sem se alimentar. Em quatro meses, ficou cadavérica. Quando recobrava os
sentidos, dizia que era tomada por um "outro eu" que sequer conhecia H.P. Blavatsky. O
"outro eu", vivia em um país distante.

Uma dessas ausências aconteceu em Ozorgeti, vila militar da Migrelia, onde ela tinha
comprado uma casa. Era uma cidade pequena e sem recursos. O médico local,
impotente diante da estranha moléstia, decidiu enviá-la para Tiflis, onde poderia ser
diagnosticada e tratada. O transporte foi feito pelo rio, estreito, cercado de densa mata.
Acompanharam-na empregados nativos que testemunharam, aterrorizados, cenas
extraordinárias. Blavatsky saía da embarcação e deslizava sobre a água rumo à floresta.
Todavia, seu corpo continuava prostrado no barco. É de se supor que viam o
deslocamento do corpo astral da doente.

Fracasso no Egito

No outono de1865 ela retomou suas viagens: Balcãs, Grécia, Egito, Síria, Itália. Em
1868, estava novamente no Tibete onde ficou hospedada com outro Mestre Iniciado,
Koot Hoomi. Em 1871, na Grécia, embarcou em um navio com destino ao Egito. O
navio naufragou. Ela escapou do naufrágio e se estabeleceu no Cairo onde tentou fundar
uma Sociedade Espírita, iniciativa que fracassou vergonhosamente sob acusação de
produzir fenômenos de forma fraudulenta. Blavatsky justificou o episódio atribuindo os
truques, grosseiros, a membros da Sociedade que agiam de má fé. Em 1872, ela deixou
o Cairo.

Nova Iorque

Em 1873, H.P. Blavatsky chegou a Nova Iorque onde começaria uma nova fase de sua
trajetória no Ocultismo. Fase marcada por um trabalho mais sistemático na divulgação
da Doutrina Secreta. Já famosa em seu próprio pais e em toda a Europa, seu prestígio e
também o número de seus admiradores e opositores expandiram-se na metrópole norte-
americana. A fama foi conquistada não somente pelos comentários das muitas pessoas
que, até então, haviam testemunhado os prodígios que realizava mas, também, porque
Blavatsky foi uma jornalista: obtinha parte de seus recursos escrevendo artigos e ensaios
sobre temas ocultistas, relatos sobre países exóticos, suas viagens e temas da vida russa.

No primeiro período que passou em Nova Iorque, Madame Blavatsky passou por muitos
endereços. Logo em sua chegada, ficou sem dinheiro. O pai falecera e os trâmites legais
relativos à herança suspenderam temporariamente as remessas. Ela foi morar em uma
comunidade de "mulheres trabalhadoras respeitáveis", casa n°222, Madison Street.
Quando a situação financeira foi regularizada, mudou-se para a esquina da rua 14 com a
avenida 4. Entretanto, rapidamente, gastou todo dinheiro da herança. Madame era
assim: quando muito tinha, muito gastava, proporcionando-se luxos; quando a bolsa
ficava vazia, adotava hábitos modestos e mudava-se para lugares mais
baratos.Blavatsky

HPB Encontra H.S. Olcott ─ 1874

O coronel Henry Steele Olcott, advogado e militar muito honrado pela sua participação
na Guerra Civil, foi o grande companheiro de H.P. Blavatsky, co-fundador da Sociedade
Teosófica. Estudioso do Espiritismo, Olcott conheceu Blavatsky em Chittenden, estado
de Vermont, numa fazenda chamada Hospedaria Eddy, onde estavam ocorrendo
fenômenos espantosos: materialização de formas fantasmagóricas, conforme vinha
sendo divulgado no periódico Banner Light. As aparições, sensacionais, atraíam muitos
visitantes. Olcott foi ao local e lá ficou quatro dias.
De volta a Nova Iorque, escreveu um artigo que foi publicado no New Iorque Sun. O
artigo fez muito sucesso e o pesquisador foi convidado por outro jornal, o New Iorque
Daily Graphic para fazer uma série de reportagens sobre o tema. Olcott voltou à
Hospedaria Eddy e ali encontrou Madame que, atraída pelas reportagens, foi ver de
perto os tais fenômenos. Ela fez mais do quer ver: depois de sua chegada, os fenômenos
ganharam um novo colorido porque ela mesma produziu fenômenos: "Até o momento
em que HPB apareceu em cena, as figuras que se mostravam ali eram de índios pele-
vermelha, americanos ou europeus parecidos com os visitantes. Mas na primeira noite
de sua chegada, figuras de outras nacionalidades começaram a se mostrar... Havia um
jovem servo georgiano do Cáucaso, um mercador muçulmano de Tiflis, uma camponesa
russa e outros" [CALDWELL, p 59].

Em Nova Iorque, Olcott procurou Blavatsky, que estava morando em Irving Place,
nº16. Com ela, o coronel transpôs os limites do espiritismo kardecista e conheceu os
filósofos orientais, o budismo e a existência dos adeptos [os Mahatmas ou Irmãos do
Himalaia]. Mais tarde, foi adotado como discípulo pelo Mestre Koot Hoomi.

Sociedade Teosófica & Ísis Sem Véu

Em 17 de novembro de 1875, Blavatsky, Olcott e William Q. Judge fundaram


oficialmente a Sociedade Teosófica sendo Olcott o presidente, Judge o conselheiro e
Blavatsky, secretária para correspondências. Entre os objetivos da Sociedade destacam-
se: estudo comparativo das religiões, filosofias e ciências de todo o mundo e todas as
culturas; investigação dos fenômenos inexplicáveis da Natureza. A idéia de formar a
Sociedade foi de Olcott porém ele desconfiava que a inspiração fora "colocada" em sua
mente porque no livro de anotações de HPB havia um escrito de julho de 1875 onde a
ocultista registrou: "Ordens recebidas da Índia são de estabelecer uma sociedade
filosófico-religiosa e escolher um nome para ela também escolher Olcott"
[CALDWELL, p 76].

Ainda em 1875, poucos meses antes da fundação da Sociedade Teosófica, Blavatsky


começou a redigir Ísis Sem Véu [Isis Unveiled]. Na época, morava em Irving Place, rua
34, nº 433, onde ela e Olcott eram vizinhos, ela no primeiro andar, ele, no segundo. As
fontes de pesquisa, citações, referências a livros e autores, muitos deles, obras raras,
sempre foram um dos grandes mistérios da ocultista. A biblioteca de Madame contava
com poucos títulos que cabiam em um pequena estante. Ela explicava que obtinha as
informações acessando os livros diretamente em Akasha, a Luz Astral ou, ainda,
materializando temporariamente os livros que consultava. Essas referências foram
cuidadosamente checadas por seus revisores que constataram a autenticidade das fontes.
A "precipitação" ou "aporte" de objetos tais como livros, cartas, jóias, entre outros,
era um dos mais surpreendentes prodígios que Blavatsky realizava e, em numerosas
ocasiões, diante de várias testemunhas, em qualquer ambiente, à luz do dia e ao ar livre.

A redação de Ísis Sem Véu continuou na rua 47, nº 302, no local que ficou conhecido
como Lamaseria, considerado quartel-general nos primeiros tempos da Sociedade
Teosófica em Nova Iorque. Ísis Sem Véu foi publicado em 1877 pelo editor J.W.
Bouton e vendeu mil exemplares somente nos primeiros dez dias [e continua vendendo
até hoje]. O sucesso de público tornou sua autora ainda mais conhecida. Blavatsky
naturalizou-se norte-americana em 08 de julho de 1878 e, em dezembro do mesmo ano,
ela e Olcott viajaram para a Índia com a missão de fundar um núcleo da Sociedade
naquele país.

Índia

Em 16 de fevereiro de 1779, Olcott e Blavatsky chegaram a Bombaim sendo


recepcionados por simpatizantes que já conheciam Madame HPB e as atividades da
Sociedade Teosófica. Durante dois anos visitaram várias cidades e vilarejos indianos.
Também foram a Sri-Lanka [Ceilão]. Naquele primeiro ano foi lançada a revista mensal
Theosophist [publicada até hoje, 2008]. A revista gerou recursos da para se sustentar
desde o início e logo começou a render pequenos lucros.

Em Allahabad, encontraram A.P. Sinnet, editor e articulista do periódico Pionner.


Viajavam em grupo no qual se encontravam dois fundadores de uma comunidade
budista: Edward Wimbridge e Damadar k. Kalavankar. Com este grupo foram ao Sri-
Lanka onde permaneceram entre maio e julho de 1880. Em 25 de maio, Blavatsky e
Olcott fizeram os votos do Pansil, em língua pali: uma declaração de observância aos
princípios budistas. Seguiram para Panadure e, depois, em Kandy, visitaram o templo
do Sagrado Dente de Buda, Dalada Maligawa. A relíquia tinha o tamanho de um ente
de jacaré. Perguntaram a Blavatsky se ela acreditava que o objeto era genuíno. Ela
respondeu: "Claro que é o dente dele; aquele que tinha quando nasceu como tigre"
[CALDWELL, p 122].

O Broche da Sra. Hume

Entre setembro e outubro de 1880, HPB e Olcott estavam em Simla, norte da Índia. Ali,
Blavatsky realizou vários prodígios do tipo "aporte de objetos", fazendo surgir do nada
cartas, cigarros, xícaras, água, bordados em lenços, jóias, como no famoso caso do
"broche da Sra. Hume". Ela perguntou à Sra. Hume: "Quer alguma coisa especial?
pense em algo que gostaria... alguma coisa que queira não apenas por motivos
mundanos; alguma coisa difícil de obter". A senhora, então, referiu-se a um broche que
sua mãe lhe dera e ela perdera:

Madame Blavatsky então enrolou em dois papéis de cigarro uma moeda que trazia presa
na pulseira do relógio e a colocou em seu vestido, dizendo que esperava trazer de volta
aquele broche ainda naquela noite.... Um pouco mais tarde, no salão, avisou que o
broche não seria trazido para dentro da casa, mas que deveriam procurar por ele no
jardim. ...Uma prolongada e cuidadosa busca foi então efetuada com a ajuda de
lanternas até que um pequeno pacote de papel de cigarro foi encontrado entre as folhas
pela senhora Sinnet. Ao ser aberto, mostrou conter um broche que correspondia
exatamente à descrição feita previamente e que a senhora Hume identificou como sendo
o dela [CALDWELL, p 135].

O episódio presenciado e o relato escrito foi assinado por nove testemunhas: A.O.
Hume, M.A, Hume, Fred R. Hogg, Alice Gordon, Wm. Davidson, Stuart Beatson, P. J.
Maitland, A. P. Sinnett, Patience Sinnett.

Madras: Sociedade Teosófica & O Caso Coulomb


Em maio de 1882 a Sociedade Teosófica estabeleceu sua sede indiana em uma ampla
propriedade situada as margens do rio Adyar, perto de Madras. Blavatsky e Olcott
mudaram-se para lá em dezembro daquele ano. Foi nesta sede que aconteceu a chamada
"Conspiração dos Coulomb". Alexis e Emma Coulomb, um casal de missionários
cristãos, ambos dizendo-se interessados na Teosofia, foram acolhidos na casa. Emma já
conhecia HPB de longa data, desde a malograda experiência da Sociedade Espírita no
Egito. Eles forjaram uma situação a fim de denegrir os Teósofos acusando-os de fraude.
Cartas, atribuídas a Blavatsky, foram publicadas atraindo a atenção da Society For
Psyphical Research, de Londres. O caso ganhou ampla repercussão.

Formou-se uma comissão a fim de apurar a veracidade das denúncias e Richard


Hodgson foi enviado à Índia para investigar a questão. O relatório final, em 1885,
sentenciou: Madame Blavatsky era uma impostora! Abalada com a traição e a acusação,
a ocultista ficou seriamente enferma. Foi desenganada, todavia, recuperou-se. Apesar
disso, o médico insistiu que ela fosse para a Europa o quanto antes.

Os Coulomb e o Relatório Hodgson não ficaram sem resposta. Outros estudiosos


ocuparam-se do assunto até que ficou definitivamente demonstrado que o casal havia se
infiltrado na Sociedade justamente para criar [ou "plantar"] os fatos que resultaram nas
denúncias: foi provado, por exemplo, que as cartas apresentadas como sendo escritas
por HPB eram falsificadas.

Em 1880, ela e o marido [os Coulomb] estavam passando por dificuldades financeiras e,
sabendo que a Madame estava em Bombay, pediram-lhe ajuda. O casal juntou-se ao
pequeno grupo de trabalhadores, ainda em Bombay, em troca de casa e comida. Emma
Coulomb trabalhava como governanta da casa e Alexis Coulomb, que era um
marceneiro habilidoso, na manutenção. Em 1884, Emma Coulomb entregou para o rev.
Patterson cartas que ela alegava terem sido escritas por HPB, onde a Madame
combinava detalhes de truques para a realização de seus fenômenos, "provando", assim,
que os fenômenos eram fraudes e HPB uma impostora. As cartas foram publicadas pelo
Christian College Magazine, sob o título de "O Colapso de Koot Hoomi" [SISSON,
2000].

Dispositivos, como um alçapão e um boneco que serviriam para iludir pessoas crédulas
freqüentadoras da sede indiana foram providenciadas pelo casal durante um período em
que Blavatsky e Olcott se ausentaram da propriedade: no quarto de HPB, "Alexis
Coulomb havia construído buracos e painéis deslizantes os quais, mais tarde, eles
afirmariam tratar-se de artimanhas mecânicas utilizadas por HPB para a produção de
seus fenômenos" [SISSON, 2000]. Os Coulomb foram expulsos de Adyar e acusados de
desvio de verbas, difamação e fraude.

A Doutrina Secreta

O projeto editorial de A Doutrina Secreta, expressão máxima da Teosofia, começou a


ser esboçado, com as primeiras anotações, seleção dos temas etc. em 1779 mas o livro
somente começou a ser escrito, de fato, em 1885, depois do caso Coulomb, quando
HPB deixou a Índia e foi para a Europa a conselho médico. O trabalho retomado na
Alemanha. As repercussões da difamação dos Coulomb, que continuaram, por muito
tempo, gerando controvérsias e notícias de jornal perturbou profundamente a ocultista.
Ela perdia a concentração e somente quando superava o desânimo retomava a escrita.
Em julho de 1886, na Bélgica e completamente dedicada à Doutrina Secreta, Blavatsky
foi acometida por uma séria doença renal. Sua saúde debilitava-se cada vez mais e
consta que não morreu, na Índia mesmo, por intervenção direta do seu Mestre, o
Mahatma Morya. Os médicos davam-lhe pouco tempo de vida. Morya, que a socorrera
em sucessivas crises, ofereceu-lhe a opção: morrer ou continuar escrevendo a obra
monumental; ela viveu! Em março de 1887 foi para Londres, de onde não mais sairia, e
ali residiu em pelo menos três diferentes endereços até a morte.

A doutrina Secreta exigiu da ocultista um esforço titânico de vontade e uma severa


disciplina de trabalho, das primeiras horas da manhã até o anoitecer. Não raro, era vista
escrevendo até altas horas da madrugada quando todos pensavam que já se recolhera.
Mais uma vez, a "biblioteca astral" foi utilizada em cerca de 1.400 citações e
referências. Muitos discípulos e o próprio Mestre Morya auxiliaram nas revisões,
correções e preparação das provas dos originais.

Finalmente, o primeiro volume de A Doutrina Secreta, tratando da Cosmogênese, foi


publicado em 20 de outubro de 1888. O lançamento foi simultâneo em Londres e Nova
Iorque. A edição inglesa vendeu 500 exemplares mesmo antes mesmo do lançamento.
[O segundo volume apareceu no fim daquele ano]. Demonstrando uma determinação
extraordinária, considerando a saúde seriamente comprometida, Blavatsky acumulou o
labor da Doutrina com a elaboração de artigos para a revista Lúcifer, porta-voz da
Sociedade Teosófica em Londres, e também para outros periódicos, como Path. [Olcott,
na Índia, continuou editando a Theosophist]. Depois de concluir a Doutrina Secreta,
Madame ainda escreveu outros livros notáveis, como A Voz do Silêncio e A Chave da
Teosofia, ambos em 1889.

Magia Negra! Curiosa Cura

Em 1891, o norte-americano James Morgan Prayse estava em Londres. Ele vivera em


uma comunidade esotérica, em Minnesota e já tinha vivenciado numerosas experiências
paranormais. Para ele, deslocar-se ou comunicar-se com personalidades distantes
através do corpo astral era uma experiência comum. Estudioso da obra do ocultista
Paracelso, em 1899, Prayse tentou entrar em contato com aquele mestre através de
Akasha [a Luz Astral] e, para tanto, concentrou-se na personalidade que tanto admirava:

"...quando meditava, o rosto de HPB veio à minha mente. Eu a reconheci pelo retrato
em Ísis... Pensando que o retrato astral era uma divagação fantasiosa, tentei apagá-lo;
mas nisso o rosto deu sinais de impaciência, e imediatamente fui tirado do meu corpo e
levado "no astral" para HPB, em Londres... [Ou seja...] ... Buscando Paracelso ...não
tentando me intrometer com HPB... acabei por encontrá-lo. Porque HPB era
Paracelso. ...Uma noite... [estando Prayse em Londres no começo de 1891] ...chegou a
notícia de que HPB estava tão doente que os médicos achavam que ela não passaria
daquela noite... Resolvi tentar um experimento.

Em anos passados eu havia realizado inúmeras experiências hipnóticas... algumas vezes


usando meu prana [força vital] como força curativa. Já que HPB estava morrendo por
falta de força vital... decidi transferir para ela metade do meu prana... Assim que
comecei a me concentrar para fazer a transferência, HPB me chamou de forma bem
audível: "Não faça isso, é magia negra". Determinado, respondi: "Muito bem, Velha
Senhora, magia negra ou não, eu vou fazer". E fiz. Na manhã seguinte, eu me sentia
debilitado, mas isso era uma coisa sem muitas conseqüências; demoraria uns dias para
eu recobrar as forças. Na mesa do desjejum, recebi boas notícias. HPb estava se
recuperando... [CALDWELL, p 297-299]

Morte

Apesar do esforço de "magia negra" do jovem Prayse, meses depois, o inevitável


aconteceu. Em 03 de julho de 1890 foi inaugurada a sede central européia da Sociedade
Teosófica. Era a casa de Anne Besant, na 19 Avenue Road, St, John's Wood. Blavatsky
passou a morar ali. Besant, jornalista, pesquisadora de ciências humanas e esoterismo,
aderiu a S.T. em 1889. HPB, muito debilitada, quase não comparecia às reuniões;
preferia ficar sozinha em seus aposentos.

Na noite de 23 de abril de 1891 ela passou mal: tinha calafrios. O médico, Dr. Mennel,
diagnosticou influenzza. Várias pessoas da casa também ficaram doentes. HPB
apresentava o quadro mais grave: febre alta, tosse, dificuldade para engolir e respirar,
amigdalite. Apesar de ter apresentado discreta melhora, a situação não era animadora.
No fim da tarde de 07 de maio ela ofereceu um cigarro ao médico. Foi o último cigarro
que enrolou na vida. Às 11:30 h da manhã de 08 de maio, tendo à cabeceira Laura M.
Cooper e Mr. Wright, assistida por uma enfermeira, ela morreu lenta e suavemente. Seu
corpo foi cremado no Woking Crematorium, Surrey, Inglaterra. O coronel Olcott, que
estava em Sidney, onde daria uma palestra, soube que ela tinha morrido através de
mensagem telepática enviada pela própria Blavatsky.

Ocultista em vida, Madame ou quem quer que fosse no plano espiritual, continuou
ocultista em seu post mortem. Poucos dias depois da morte, ela apareceu para a
discípula Julia Keightley:

Ela me acordou à noite. ...Ela me olhou com seu olhar leonino. Então sua figura foi se
adelgaçando, espichando, ficando mais alta, assumindo formas masculinas; seu rosto se
alterou lentamente até que um homem alto e forte apareceu diante de mim, os últimos
vestígios do rosto dela desaparecendo no dele. Apenas o olhar leonino, radiante,
permaneceu. O homem levantou a mão e disse: "veja isso". Andou pelo quarto e
colocou a mão sobre o retrato de HPB. Desde então, ele tem aparecido para mim várias
vezes, dando instruções, até em plena luz do dia, enquanto estou atarefada, trabalhando.
Uma vez ele saiu de um grande retrato de HPB. [CALDWELL]

Cigarros ─ A Figura ─ A Personalidade

Madame Blavatsky tinha uma personalidade forte, um gênio irritável e muitas vezes,
irritante, um senso de humor satírico, especialmente com aqueles que ansiavam ver
prodígios e uma característica assinalada por muitos que a conheceram era o hábito de
fumar desbragadamente, cigarros mas, também haxixe. Vários testemunhos referem-se à
sua aparência física e ao seu excêntrico modo de ser para uma mulher ocidental do
século XIX. Os relatos abaixo, entre muitos outros, foram extraídos do livro de Daniel
Caldwell [que, aliás, é uma coletânea de relatos]:

Eu a via, dia após dia, sentada ali [na casa nº222 da Madison Street], enrolando seu
cigarro e fumando sem parar. Trazia no pescoço uma espécie de cabeça de animal
peludo, na qual guardava seu fumo... Creio que devia ser mais alta do que aparentava,
porque era forte; tinha rosto e ombros largos; o cabelo era marrom claro, todo
encrespado, como o dos negros. [Elizabeth G. K. Holt, p 51].

Seu nariz era uma catástrofe, mais um apêndice utilitário do que um ornamento, e a
boca, animalesca. A forma da cabeça indicava inteligência, e seu cabelo era a coisa mais
estranha que eu já havia visto; muito grosso, preso num birote na parte de trás da
cabeça. Embora de cor clara, tinha a textura de cabelo de negro. Era macio, bonito e
iluminado, mas enrolado como carapinha. ...Era evidente que fumava demais, e descobri
que usava também o haxixe... Disse que já fumara ópio, mas as sensações produzidas
pelo haxixe eram celestiais ou infernais; nunca tinha encontrado nada que se
comparasse a ele para estimular a imaginação. [Hannah M. Wolf, p 53]

Madame costumava usar uma roupa larga e uma espécie de jaqueta bordada, com os
papéis de cigarro num bolso e o fumo no outro. ...O tabaco que ela usava era do tipo
popular; talvez devido à sua falta de dinheiro. Os cigarros eram incontáveis,e os vasos
de flores ficavam lotados de tocos. [Eugene Rollin Corson - 1875, p 69]

Para Saber Mais

Livros de Blavatsky

Ísis Sem Véu (1877)


A Doutrina Secreta, vol. I e II (1888)
Glossário Teosófico (editado em 1892)
A Chave para a Teosofia (1889)
Ocultismo Prático
A Voz do Silêncio (1889)
No País das Montanhas Azuis
Pelas Grutas e Selvas do Hindustão
Cinco Anos de Teosofia (artigos da revista The Theosophist
Gemas do Oriente (pensamentos para cada dia do ano)

Livros sobre Blavatsky:

Caldwell, Daniel. [Trad. Vera Lucia Leitão Magyar]. O Mundo Esotérico de Madame
Blavatsky: Cenas da Vida de Uma Esfinge Moderna. São Paulo: Madras, 2003.

CARDILLO, Edmundo. Blavatsky e Sua Obra. In A Chave da Teosofia, de H.P.


Blavatsky. [trad. Ilka Arnaud]. São Paulo: Ed. Três, 1983 ─ Biblioteca Planeta.

RANSOM, Josephine. H.P. Blavatsky: Sinopse de Sua Vida. In A Doutrina Secreta,


vol. I Cosmogênese - p 19. [Trad. Raymundo Mendes Sobral] São Paulo: Pensamento,
2000.

SISSON, Marina Cesar. O Caso Coulomb. In Informativo HPB nº10, 2000. Publicado
em Blavatsky.net | português.

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