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Violas e violeiros na música brasileira

Rennê Marinho
Samara Sampaio

Origem e Organologia
O nome viola designa uma vasta quantidade de instrumentos que podem ser
divididos em: cordofones de corda friccionada (violas d’arco) e cordofones de corda
dedilhada (violas de mão). A viola tem como ancestral, o alaúde trazido pelos árabes
que chegaram à Península Ibérica em 722 d.C. O alaúde árabe possui 5 ordens duplas
(em uníssono) que também pode contar com um bordão abaixo das cordas agudas. A
viola herdou o padrão de 5 ordens (há exceções) que se mantem independentemente do
número de cordas que variam de 4 até 15. As ordens representam cordas simples, duplas
e triplas que podem ser fabricadas a partir de fibras de plantas, tripas de animal, arame
(fim do século 18) e náilon (atualmente).
A viola é um instrumento de estirpe portuguesa, trazida ao Brasil no início da
colonização. Se tem como prova viva, uma viola de cinco ordens e possuía um cravelhal
de 10 cravelhas, feita por Belchior Dias, em Lisboa, em 1581. As violas portuguesas do
século 18, também de 5 ordens, contavam com 12 cravelhas, A respeito da construção,
apresentavam: cravelhas de madeira, cavalete adornado e escala (contendo 10 trastos até
o bojo) no mesmo nível do tampo do instrumento, algumas continham trastos extras e
estes eram fixados no próprio tampo. No Brasil, essas características perduraram até o
meio do século 20, pois, a influência da luteria violonística acarretou em mudanças
físicas como: aumento de trastos (19), escala sobreposta, indo até a boca da viola, 12
trastos até o bojo e tarraxas de metal.
No Brasil, as violas de cordas dedilhadas são divididas em duas categorias,
sendo estas; violas de arame, por serem encordoadas com cordas de metal e as violas
encordoadas com tripa de animal ou náilon. No grupo de violas de arame brasileiras,
temos: viola caipira, viola de samba (machete e três-quartos), viola de fandango (viola
caiçara ou viola branca), viola repentista (de cantoria) e viola nordestina. As violas
encordoadas com tripa de animal e náilon são: a viola de buriti e a viola de cocho.
A viola caipira é encontrada na região de influência histórica paulistana, a região
caipira do Brasil que abrange uma ampla área: São Paulo, parte de Goiás, Mato Grosso,
Paraná e de Minas Gerais, com a área afim do Rio de Janeiro rural e do Espírito Santo.
Ela apresenta cinco ordens de cordas (duplas) metálicas, sendo dois pares de cordas
lisas de aço, afinadas em uníssono, e três pares de cordas afinadas em oitavas. As
afinações (reentrantes) são diversas, as mais utilizadas são: Cebolão [A2-A1, D3-D2,
F#3-F#2, A2-A2, D3-D3], Natural [A2-A1, D3-D2, G3-G2, B2-B2, E3-E3], Boiadeira
[G2-G1, D3-D2, F#3-F#2, A2-A2, D3-D3], Rio-Abaixo [G2-G1, D3-D2, G3-G2, B2-
B2, D3-D3] e Meia-guitarra [G2-G1, C3-C2, G3-G2, B2-B2, D3-D3].
A viola de cocho é encontrada nos estados de Mato Grosso e de Mato Grosso do
Sul. Possui o corpo de madeira escavada, há um pequeno furo circular no tampo
(ultimamente tem-se fabricados tampos sem boca) feito de raiz de figueira, o braço e
cravelhal é de tamanho reduzido e os trastos ou pontos são feitos de barbante revestidos
com cera de abelha e variam de 2 a 3. Se a viola possuir três trastos, os intervalos serão
de semitom, ao passo que com apenas dois trastos, terá um intervalo de tom e um
subsequente intervalo de semitom. Suas cinco ordens são de cordas singelas, sendo
quatro cordas de tripa e uma de aço encapada, esta última é chamada de canotio. A viola
de cocho dispõe de finações básicas e também reentrantes: canotio solto [G2, D2, E2,
A2, D3] e canotio preso [G2, C2, E2, A2, D3].
A viola de samba (três-quartos e machete) é um instrumento encontrado no
Recôncavo Baiano. A viola machete possui comprimento de 76 cm e trasteira ou regra
com 18 cm, já a três-quartos, possui comprimento de 89,5 cm e regra com 23 cm.
Possui cinco ordens duplas de cordas metálicas, sendo as três primeiras afinadas em
uníssono e as duas últimas afinadas em oitavas. A saber sobre sua afinação: [E3-E2,
A3-A2, D3-D3, F#3-F#3, B3- B3].
Viola de fandango (viola branca ou viola caiçara) é encontrada no litoral sul, a
mesma apresenta seis ou sete cordas dispostas em cinco ordens, estas onde as três
primeiras são singelas, a quarta ordem com apenas o bordão (ou com o bordão
acompanhado de sua oitava em intervalo de quinta ou oitava) e a quinta ordem com
bordão e oitava. Sua régua ou trasteira contém dez trastos e está no nível do tampo, há
um pequeno cravelhal afixado ao lado da caixa de ressonância, em cima do braço, com
uma cravelha. A corda presa a este pequeno cravelhal, chama-se cantadeira. A viola de
fandango também pode ser construída sem o cravelhal complementar. As principais
afinações são: Intaivada [C4 (cantadeira), F2-F1, G2-G1, C3, E3, A2], Pelo-meio [B3
(cantadeira), B2-B1, E2, A2, C#3, F#2] e Pelas-três [A3 (cantadeira), A2-D2, G2, C3,
E3, A2].
A viola repentista (viola de cantoria) apresenta sete cordas distribuídas em cinco
ordens de cordas metálicas, sendo a quinta ordem tripla e as demais singelas. A saber
da afinação, segunda e terceira cordas são afinadas uma oitava acima, assim temos:
[A3-A2-A1, D2, G3, B3, E3]. Em 1942, Luís Heitor Corrêa de Azevedo analisou no
Ceará, violas com cinco ordens de cordas duplas: a primeira ordem em uníssono e as
demais ordens em oitavas. Modelo de instrumento mais utilizado pelos repentistas é a
viola dinâmica, a mesma construída e patenteada pela Del Vecchio nos anos 30,
apresenta um grande disco de alumínio em formato de cone encontrado no bojo maior.
Há uma peça circular de madeira que faz contato com as cordas transmitindo as
vibrações (das cordas) para o disco de alumínio que funciona como um amplificador
natural e modifica o timbre do instrumento.
A viola nordestina pouco se diferencia da viola caipira. A principal diferença está na
afinação, sendo esta: [A2-A1, D3-D2, G3-G2, B2-B2, E3-E3]. Sabe-se, também, de
uma viola de 12 cordas distribuídas em cinco ordens (duplas e triplas), pertencente ao o
violeiro Manoel Galdino encontrado pelos pesquisadores da Missão de Pesquisas
Folclóricas em 1938.

A presença da viola em gêneros e manifestações musicais populares.

Samba de Roda

No recôncavo Baiano temos o Samba Chula, modalidade do Samba de Roda. A


Viola é fundamental no samba chula, inclusive uma das nomenclaturas do samba chula
é samba de viola.
São encontrados dois tipos de viola empregados no samba de roda: Viola
industrial ou paulista, menor que o violão é bastante usada em todo o Brasil e a viola de
machete, digamos que é a soprano da família das violas.
Até poucas décadas atrás era possível encontrar, no Recôncavo Baiano, três
modelos específicos de violas de dez cordas: a viola industrializada, chamada viola
paulista, regra-inteira ou simplesmente, viola; a viola artesanal do tipo três quartos; e a
viola artesanal do tipo machete.
Hoje em dia a prática de tocar viola machete está quase extinta na Bahia. Isso
vem ocorrendo porque as novas gerações não estão dando continuidade à esta tradição,
rompendo assim o elo de transmissão de conhecimentos orais existente entre as
gerações de sambadores.
Cinco machetes foram encontrados no recôncavo: um em Saubara, danificado. O
segundo, em São Francisco do Conde, em perfeito estado, e tocada por seu Zé de
Lelinha. Dois machetes estão em Maracangalha, no município de Candeias, um do
senhor José da Glória, tocador de prato-e-faca e triângulo no grupo Samba Chula de
Maracangalha, necessitado de reforma, pois está todo pintado de azul claro e sem
cordas. O outro está em bom estado e pertence ao senhor Pedro, o líder do grupo de
Maracangalha, que o emprestou para um jovem, filho de um dos cantadores de chula e
tocador de cavaquinho no mesmo grupo. Esse músico estuda machete e já se apresentou
algumas vezes com o instrumento.

Modas de Viola

Para o termo modas de viola existem muitas significações. O mais utilizado


refere-se a um determinado ritmo de origem rural, musica rural executada no contexto
da cultura caipira e para definir músicas de origem rural executadas na viola caipira.
Manifesta-se no interior da região sudeste e centro-oeste e parcelas do estado do Paraná.
Essa área é chamada de lençol caipira.
Os assuntos das letras das modas de viola abordam a vida caipira desde morte de
boi preferido a todo tipo de infortúnio. Gado, rejeição, amor, separações, desencantos,
fatos engraçados, impressão de viagens. A dupla Tonico e Tinoco atuou por cerca de 52
anos e representa bem o gênero.
As letras normalmente transmitem sensação de veracidade dos fatos, inclusive
indicando locais onde ocorreram, embora muitas vezes não serem reais. A característica
descritiva, leva o ouvinte ao local mencionado.
O acompanhamento instrumental fica em evidencia entre as estrofes e muitas
vezes cria um clímax, gerando expectativas para o ouvinte. O andamento é lento, versos
quase falados, melodias que se repetem e vozes terçadas, prática comum na música
rural.
Cantoria de Viola Nordestina

Jogo de improviso poético denominado repente. Seu principal agente, o repentista,


tem como finalidade demonstrar habilidade com as palavras no improviso e entreter o
público em troca, muitas vezes de dinheiro, pois muitos repentistas sustentam-se através
de sua cantoria.
Existem sete tipos de cantoria. Sendo elas a cantoria de romance, cantoria de cego,
cantoria ao pé da parede, cantoria de praia, cantoria de festival, cantoria de show e
cantoria de estúdio.
Todas essas modalidades resultam de transformações ao longo da história. A
cantoria de romance não existe mais, a de cego é rara assim como a de pé-de-parede. As
outras formas são mais modernas e comuns.
Em todos os tipos, a poética e sua beleza são sempre preservadas. A métrica, rima e
oração são mantidas com rigor. Há também repentistas que se utilizam de neologismos
para não perder a rima.
O improviso é o valor máximo da cantoria e o desafio requer dois repentistas que se
enfrentam na rima. O vencedor ganha estima e respeito por parte dos ouvintes e também
entre os outros repentistas, além da própria comunidade a que pertence.

A situação sociocultural da viola e dos violeiros, na atualidade.

Os achados mais antigos sobre a viola no Brasil são do século XVI. É trazida
para o país pelos portugueses. Era o principal instrumento que acompanhava a voz.
Também era comum a viola ser utilizada para acompanhar versos de poetas e em
festejos religiosos. Gregório de Matos, também chamado de Boca do inferno, utilizava a
viola em seus versos. As modas de viola tocadas atualmente são oriundas das modinhas
e lundus tocados para a corte.
A viola se expandiu nas regiões nordeste e centro-sul do Brasil. Neste último, a
viola vem com os bandeirantes, tinham como característica uma variedade maior de
ritmos e utilizavam do improviso – uma vez que não tinham domínio de muitos recursos
técnicos. Na cultura nordestina, a viola vem com os portugueses, que concentraram
maior tempo na região visto a atividade econômica da cana-de-açúcar, desse modo a
prática da viola no nordeste requer maior técnica.
A tradição da viola no país vai se incorporar nos festejos religiosos. O
instrumento está presente na festividade da dança de São Gonçalo e das folias de reis e
do Divino. Essas festas não eram comemoradas nas principais igrejas, mas eram
mantidas pelo povo. O “Catolicismo Popular” englobava essas manifestações religiosas.
A viola migra para o meio rural através das quadrilhas, polcas entre outras
danças que caíram em desuso no meio urbano. Esses estilos vão ganhando espaço
dentro das periferias para depois migrarem para o campo.
A música se torna cotidiano das pessoas. Na religião, servia como uma
conexão entre o povo e Deus, no dia a dia, está presente nos cantos de trabalho, em que
os homens trabalhavam cantando. A viola está presente em muitas dessas funções.
O violeiro é personagem importante nesse cenário. A viola servia como
manifestação social e musical das pessoas. O papel do violeiro ganha importância para
os festejos religiosos e para as festividades das regiões. Também ganha prestígio,
criando uma imagem da viola como um instrumento que poucos são capazes de tocar.
Diante disso, surgem também as lendas e misticismos do violeiro que faz pacto com o
demônio para tocar melhor ou que possui uma força que o faz tocar bem. Desse modo,
cria-se um jogo entre o sagrado e o profano, que se incorporam na cultura da viola no
Brasil.
A viola no Brasil tem expoentes importantes. Nomes como Tião Carreiro,
Renato Andrade, Tião do Carro, Zé Carreiro, Heraldo do Monte, Zé Mulato, Adauto
Santos, índio Cachoeira e Helena Meirelles foram e são essenciais para o legado da
viola no país. Na nova geração – da década de 1980 até os dias vigentes -, vê-se Almir
Sater, Pereira da Viola e Ivan Vilela, que foram mais repercutidos na mídia. Dentre
esses, encontram-se também a dupla, Zé Mulato e Cassiano, Roberto Corrêa, Penna
Branca, dentre tantos outros. No âmbito da música instrumental para viola, Ivan Vilella
se destaca. Almir Sater repercutiu de forma mais incisiva na mídia, com a entrada de
suas músicas nos cenários das novelas.
Atualmente, percebe-se o avivamento e a expansão da viola no Brasil. A viola
caipira, típica da cultura do interior da região centro-sul do país, vem ganhando espaço
em demais estilos musicais. A viola está desde as rodas de samba, até uma sala de
concerto, como solista. Essa proporção é decorrente das composições próprias para
violas, das gravações de discos instrumentais de violeiros, além da grande influência
midiática, ao mostrar o instrumento.
Outro cenário a se destacar é o da introdução da viola nos cursos superiores,
como o bacharelado em viola caipira. Um avanço de extrema relevância para a
manutenção dessa cultura. Partindo para o âmbito da pesquisa, os registros de
documentos sobre as violas avançaram nos últimos anos, outro fator importante para
preservação dessa tradição.

Referências:

VILELA, Ivan et al. Vem viola, vem cantando. Estudos avançados, v. 24, n. 69, p.
323-347, 2010.

Violas brasileiras: circuito 2015/2016. – Rio de Janeiro: Sesc, Departamento Nacional,


2015. 56 p.: il.; 28,5 cm. – (Sonora Brasil).

Organologia.
Definição.Sistemas de classificação (classificação tradicional, as orquestras
ocidentais)Classificações científicas (sistema de Mahillon, Hornbostel-Sachs)
Musica de rabeca: a identificação e como se identificam os rabequeiros. a rabeca nos
folguedos. O que são práticas e fazer musical. A prática de canto com rabeca.
Rabequeiros tradicionais e uso de cordas duplas. Teoria da criação musical e criação
musical entre rabequeiros.Violas e violeiros:Origem e organologiaViola caipira, viola
de cocho, viola de samba, viola de fandango, viola de cantoria, viola nordestina, viola
de buriti (não precisa estudar as afinações)Pífanos:Formação instrumental e
denominações.Função socialPífanos e gaitas.Anexo:
Assuntos_para_a_prova_de_etnomusicologia.docxCadastrado por: AGOSTINHO
JORGE DE LIMA

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