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All content following this page was uploaded by Nathalie Albuquerque on 10 November 2018.
Resumo
Este artigo é uma revisão conceitual e técnica sobre arquiteturas penais. Seu obje-
tivo é identificar tipologias recorrentes e relacioná-las a pesquisas acerca de res-
postas sócio-comportamentais nos seus usuários. Sob o olhar da Psicologia Ambi-
ental, reflete-se sobre o envolvimento da arquitetura em questões políticas, sociais
e culturais, relacionando as tipologias brasileiras e suas gerências a soluções repe-
tidas do passado, que desconsideram reflexos psicossocias. Conclui-se que é ne-
cessário repensar as atividades humanas nesses lugares, o tipo de gerência desses
ambientes, seus objetivos e público da atualidade, tendo a arquitetura como resul-
tante e coparticipante.
INTRODUÇÃO
Dreyfus (1995) defende que prisões não podem ser compreendidas como um con-
junto de mecanismos repressivos, e sim como uma função social complexa. A temática
prisional não deve ser restrita às áreas jurídicas, ou entendida como efeito refletido das
estruturas sociais, ou encarada apenas como espírito de uma época, mas todos juntos e
associados.
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Assim, a arquitetura penal não deve ser pensada isoladamente, pois o espaço físico
é influente ao considerar que a existência de vínculos emocionais sempre envolverá a di-
mensão física do lugar (FELIPE; KUHNEN, 2012). Evans e McCoy (1998) já apontavam
que espaços podem gerar impactos na saúde física e mental das pessoas, refletindo em
seus comportamentos. Portanto, para adequar projetos às necessidades humanas precisa-
mos compreender as relações pessoa-ambiente nesses lugares.
Questiona-se, portanto, que reflexos podem advir dos diferentes tipos de prisão. Sob
olhar da Psicologia Ambiental, o objetivo deste artigo é identificar tipologias arquitetônicas
penais e relacioná-las a pesquisas acerca de respostas psicológicas e sócio-relacionais nos
seus usuários.
MÉTODOS
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Tomando como referencial Tartaro (2003) e Agostini (2002), foi possível identificar
no contexto internacional três tipologias arquitetônicas recorrentes, apresentando diferen-
ças entre si pela distribuição espacial e pelo tipo de gerência do lugar.
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identificados problemas como celas sem privacidade, distribuídas em ambos
os lados de um corredor, falta de controle individual sobre aberturas de ilumi-
nação e ventilação, e agentes isolados dos internos, mesmo durante as ron-
das – figura 1.
Figura 1: Planta da distribuição das celas dessa tipologia e foto da galeria da prisão Alburn. Fonte: Agostini
(2002, p.25).
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Figura 2: Planta do esquema espacial dessa tipologia e fotografia da penitenciária Super-Max Thompson.
Fonte: Agostini (2002, p.26).
Figura 3: Planta com espacialização de celas da tipologia. Fonte: Agostini (2002, p.26).
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Tendo em vista essas três tipologias, pesquisas sobre ambientes penais com refle-
xos psicológicos e comportamentais podem ser relacionadas. Em 1980 por exemplo, Wener
e Olsen, estudam projetos arquitetônicos com objetivo de avaliar as diretrizes projetuais e
os resultados de efetividade das unidades correcionais de Nova Iorque e Chicago pós-ocu-
pação – figura 4 –, considerando a percepção das pessoas naqueles espaços por mapas
comportamentais e entrevistas.
Figura 4: Unidades correcionais de Nova Iorque (à esquerda) e Chicago (à direita). Fonte: (WIKIPEDIA, 2018)
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Observou-se que as condições de liberdade de movimentação dentro das unidades
de vivência e a possibilidade de retiro em celas individuais, promoveram resultados positi-
vos no comportamento dos detentos. Técnicas projetuais com baixa presença de elementos
símbolos prisionais, uso de cores vivas, variação de texturas e mobília confortável, eviden-
ciaram redução de estresse dentro das instituições estudadas (WENER;OLSEN, 1980).
Morris e Worral (2014), por sua vez, fazem correlação entre comportamento e arqui-
teturas penais distintas do Texas. Duas tipologias foram diferenciadas pela solução de dis-
tribuição espacial, sendo a primeira nomeada Telephone-pole, e a segunda nomeada por
Campus-style – que se constitui por pequenas unidades edificadas envoltas de espaços
livres e amplos – referentes à segunda e terceira gerações de tipologias arquitetônicas pe-
nais (TARTARO, 2003). Os resultados dessa pesquisa revelaram que o projeto dos espa-
ços reflete no grau de isolamento das pessoas, atributo significativamente associado a in-
frações de segurança, drogas, contrabando e violência envolvendo detentos funcioná-
rios(MORRIS; WORRALL, 2014).
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atender às necessidades desses profissionais e aceitação social do sistema de gerência
específico, no qual os agentes adotam papel de educadores no lugar de vigilantes.
Figura 5: À direita, planta típica da tipologia (p. 34); ao centro, Casa de Detenção de São Paulo (p. 35); à
esquerda, penitenciária Lemos Brito, Bahia, com vista para o pátio central (p. 42). Fonte: Esteca (2017).
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apelido “Espinha de Peixe” se deu por sua espacialização lembrar o formato
de uma espinha dorsal de peixe – figura 6.
Figura 6: À direita, esquema espacial do padrão. Ao centro, Penitenciária do Estado de São Paulo. À
esquerda, foto aérea da Penitenciária de Itirapina. Fonte: Esteca (2017, p.42); GoogleMaps (2018).
Diante do exposto por Farbstein e Wener (1982), Cordeiro (2010), Esteca (2017) e
Albuquerque (2018), essas tipologias arquitetônicas dificultam qualquer outro tipo de ge-
rência, principalmente pelas superpopulações alojadas em cada ala, pela reduzida quanti-
dade de agentes para suporte, e pela distribuição espacial que dificulta a visibilidade entre
os espaços. Representam soluções do passado, comparadas às primeiras gerações de
arquiteturas penais indicadas em pesquisas no exterior.
Cordeiro (2010) também coloca em questão o sentido social desse tipo de instituição
e destaca que o papel da arquitetura vai além da sua funcionalidade e operabilidade. Os
ambientes transmitem mensagens, cujos significados podem refletir e influenciar os mais
profundos sentimentos e as subjetividades humanas em seus comportamentos. Corrobora
com essa visão o estudo de Albuquerque (2018), quando entrevista usuários de uma uni-
dade penal brasileira e conclui que presos se percebem como vítimas da prisão. Para eles,
o aprisionamento é uma cruel demonstração do poder da sociedade, que força ruptura de
seus vínculos familiares e comunitários, provocando sentimento de perda de sua identidade
grupal.
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Há um discurso generalizado em defesa da “segurança” com base no controle sobre
pessoas presas, norteando decisões normativas dos ambientes penitenciários em estraté-
gias projetuais ultrapassadas. Segundo Sommer (1974), esse tipo de diretriz se mostra an-
tagônica à consideração da humanidade do indivíduo. Arquiteturas penais projetadas para
resistir às ações humanas têm características duras, opressoras, além de caras. Não há
evidências suficientes que indiquem que o isolamento ou que uma cela nua e nada além
de concreto reforçado em uma gaiola de ferro irão colaborar para reduzir o “mau” compor-
tamento, ou qualquer coisa ruim considerada pela coletividade. O autor ainda alerta que
ambientes como esses reduzem a autoimagem e ajudam a convencer a pessoa da sua
pequenez e pouca importância para a sociedade.
CONCLUSÕES
Ademais, este trabalho permitiu uma visão abrangente sobre arquiteturas penais,
contudo pode-se dizer que há muito a ser investigado e exposto a respeito. Questiona-se:
o que é humanizar uma arquitetura penal? Como humanizá-la sem ferir limitações jurídi-
cas? Seria possível fazer do aprisionamento uma estratégia humanista, ou seria este mais
um paradoxo imbricado a temática? Enfim, os resultados e discussões advindas dessa
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breve aproximação com o sistema penal e suas arquiteturas nutrem esperança de refinar
debates futuros em prol de ações transformadoras da realidade em questão.
REFERÊNCIAS
CONECTAS. Brasil é o país com 3a maior população carcerária. Notícias Brasil, p. 0–4,
8 jan. 2018.
EVANS, G.; MCCOY, J. When Buildings don’t work: The role of architexture in human
health. Journal of Environmental Psychology, n. 18, p. 85–94, 1998.
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FAIRWEATHER, L.; MCCONVILLE, S. Prison Architecture: policy, design and
experience. Oxford: Architectural Press, 2000.
SOMMER, R. Tight spaces: hard architecture and how to humanize it. New Jersey:
Prentice-Hall Inc., 1974.
AGRADECIMENTOS
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humano na cidade. Igualmente, é necessário reconhecer o papel fundamental do Labora-
tório de Estudo das Relações Humano-Ambientais (LERHA – PPGPSI, UNIFOR), que foi
acolhimento e porta de entrada para uma jornada na Psicologia Ambiental que jamais fin-
dará.
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