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E NÃO SOBROU NENHUM

Baseado no texto de Agatha Christie


Adaptado por Jessica Freytag e Luisa Bonelli
CENA 1 – TRÊM
Lawrence John Wargrave
(Lendo um jornal enquanto pensa)

Deve ser um lugar muito interessante essa “Ilha do Soldado”, eu me lembro de ler
sobre o local. Parece que um americano milionário comprou a ilha e construiu uma
mansão luxuosa no lugar. Alguns anos depois, ele a vendeu para outra pessoa…
Ninguém sabe ao certo.

Mas realmente fiquei surpreso quando recebi este convite.

Eu passei três anos sem ouvir sobre minha querida Constance, e duas semanas atrás
eu recebi está estranha carta dela. Típico dela, sempre me surpreendendo.

Vai ser bom passar alguns dias nesta ilha com ela, eu estava precisando de férias.

Vera Elizabeth Claythorne


Que viagem longa. Bem, não posso reclamar, encontrar um emprego durante o verão
normalmente envolve cuidar de um bando de crianças, e eu estou cansada disso. Essa
oportunidade de trabalhar como secretaria é perfeita para mim.
Deixa eu ver o que é pra fazer:
“O trem parte meio dia e quarenta, de Paddington até a estação Oakbridge. Terão sete
outros convidados vindo no trem, por favor, leve-os com você até o barco do Sr. Fred
Narracott e ele vai os levar para a Ilha do Soldado.”
Não é o melhor trabalho do mundo, mas normalmente as pessoas não gostam de
contratar alguém que já foi investigada em um caso de morte suspeita.

Phillip Lombard
Preciso me manter focado no trabalho!
(Pausa)
Mas que tipo de trabalho é esse? Aquele homem estranho, “Morris”, não me falou
nada a respeito. Ele só disse:
“Não posso te dizer nada! Meu cliente sabe da sua incrível reputação em situações
complicadas. Vamos te pagar o valor que o Senhor pediu, e só precisará ficar na ilha
por uma semana, preparado para qualquer tipo de situação.”
Gostaria de poder recusar, mas eu realmente preciso do dinheiro…Bom, eu já estive
em apuros antes. Eu sempre me livro de qualquer problema.

Emily Caroline Brent


(Olhando para Vera)
Não consigo acreditar no quanto as moças de hoje em dia são desleixadas! Elas não
ligam para boas maneiras, postura, nada. E no verão é ainda pior! As roupas de praia
são completamente indecentes, graças a Deus estou livre disso este ano. Graças ao
Senhor existem pessoas como a Sra. Dowich, ela sim é uma verdadeira dama!
É uma pena que passamos tanto tempo sem nos ver. Já faz cinco anos.
Estou tão feliz com este convite, duas semanas em uma ilha é tudo que eu preciso.

Gen. John Gordon MacArthur


E pensar que depois deste trem vou precisar pegar um barco…
Mas sempre vale a pena encontrar alguns velhos amigos.
Quem é este Sr. Owen? Deve ser um sujeito muito rico para comprar um lugar como a
Ilha do Soldado. Eu não me lembro dele… Bom, Spoof e Johnny estarão lá.
Já faz muito tempo que não os vejo, ou qualquer outro amigo… Tudo porque alguém
espalhou aqueles boatos sobre mim, malditos mentirosos!
Eu não deveria pensar nisso agora... vou apenas aproveitar a viagem.

Dr. Edward George Armstrong


Meu Deus, como estou cansado. Eu sinto que poderia dormir por dias. Eu não reclamo
da minha carreira, mas nem sempre é fácil ser um médico. É como se eu estivesse
sempre cansado.
Eu adoraria estar indo para essa ilha a passeio… Deve ser um lugar lindo.
E este Sr. Owen deve ser um homem muito rico. É típico de gente rica fazer coisas
deste tipo. Imagine só… Convidar um médico para ir até sua ilha como se fosse um
amigo, para que sua mulher seja examinada sem que perceba. Quanta besteira.
Mas enquanto pagarem, podem ser o quão loucos quiserem.

Anthony James Marston


Que viagem mais longa! Este trem poderia andar mais devagar? Parece que estamos
indo de carroça.
Espero que este lugar seja tão bom quanto Bobby me falou. Mas vindo dele, deve ser.
Aquele sortudo sempre é convidado para as melhores festas, com as pessoas mais
ricas do país. Ele sim sabe curtir a vida!
Eu vou aproveitar essa viagem ao máximo, afinal só se vive uma vez. Não consigo
entender essas pessoas que veem a vida passar, presas em seus trabalhos patéticos e
rotinas medíocres. Eu nunca viveria assim.
Uma semana numa ilha, com uns drinks e boa companhia. Mal posso esperar!

William Henry Blore


(Observando todos e fazendo anotações)
Estão todos aqui, todos os sete: Emily Brent, Vera Claythorne, Dr.Edward Armstrong,
Gen. John MacArthur, Phillip Lombard, o juiz Lawrence Wargrave e Anthony Marston.
Meu trabalho será muito fácil, não sei como pode dar errado.
Meu nome essa semana será “Mathew Harris”, e vou dizer que sou da Austrália. Eu li
muito sobre o país e tenho informação o suficiente para falar sobre ele, penso no resto
no caminho.

(As 8 personagens saem do trem)


Anthony – Com licença, vocês estão indo para a Ilha do Soldado? Somos os únicos que
sobraram na estação.
Vera – Ah, sim! Sou a nova secretaria do Sr. Owen. Ele disse que viriam sete
convidados no trem. Sou responsável por levar todos até o barco que nos levará para a
ilha.
Anthony – Bem, eu sou um deles!
Phillip – Também sou um dos convidados do Sr. Owen.
Lawrence – Eu também.
Edward – A Ilha do Soldado? Também vou.
(O resto dos convidados somente confirma sua presença em silêncio.)
Vera – Estão todos aqui, ótimo! Por favor, sigam-me.
(Todos saem de cena)
CENA 2 – SALA DE ESTAR DA MANSÃO
(Alguém bate na porta, e Sr. Rogers atende)
John – Boa tarde, somos os convidados do Sr. Owen.
Thomas – Estávamos esperando por vocês. Por favor, entrem.
(Todos entram em cena, olhando em volta)
Thomas – Eu sou Thomas Rogers. Permitam que eu apresente minha esposa, Ethel
Rogers.
Ethel – É um prazer recebê-los. Iremos servir os senhores durante toda sua estadia.
Anthony– O prazer é todo nosso! Os outros convidados já estão aqui?
Ethel– Quais outros convidados?
Anthony – Eu estava esperando encontrar outras pessoas por aqui. Conhece Bob
Miller? Um rapaz ruivo, narigudo, um pouco fora de forma...
Thomas – Que eu saiba são apenas vocês oito.
Emily – E onde está o nosso anfitrião?
Ethel – Ele não está presente, mas é previsto que chegue a tempo do jantar ás oito,
senhora.
Thomas – Vamos arrumar os quartos dos senhores, um momento por favor.
(Ethel e Thomas saem de cena)
(Todos se acomodam na sala em silêncio)
Lawrence– Há uma história na Irlanda. Diz ela que dois homens ingleses ficaram presos
em uma ilha por três anos, sem sequer trocar uma palavra. Isso por que nunca se
apresentaram.
Anthony – Não estamos na Irlanda. Meu nome é Anthony Marston, podem me chamar
de Tony!
Lawrence – O gelo acaba de se partir. Eu sou o Juíz Wargrave.
Edward – Prazer, sou Doutor Armstrong.
Phillip – Lombard. Phillip Lombard.
John – Eu sou... O general MacArthur.
Vera – Meu nome é Vera Claythorne, prazer.
William – Matthew Harris.
Emily – Senhorita Emily Brent.
(Os Rogers entram em cena novamente, e o General cai no sono)
Ethel – Os quarto já estão arrumados.
Thomas – Peço aos senhores que por gentileza me sigam até eles.
(Todos menos Tony e o General se levantam e começam a sair de cena com os Rogers)
Anthony – (pensando alto) Se o Bobby não está aqui, quem foi que me convidou?
Talvez a alta sociedade tá finalmente me dando o reconhecimento que eu mereço!
(Tony começa a andar pela sala, e acaba encontrando o piano com a partitura do
poema)
Anthony – Olha só, é aquela rima dos soldadinhos! Vamos ver:
“Dez soldadinhos vão jantar enquanto não chove,
Um deles se engasgou, então ficaram nove.
Nove soldadinhos vão dormir, e nenhum está afoito.
Um deles dormiu demais, então sobraram oito.
Oito soldadinhos foram a Devon de charrete,
Um não quis voltar, então voltaram sete.
Sete soldadinhos cortam lenha com rapidez, um se cortou,
Então sobraram seis.
Seis soldadinhos em uma colmeia. Trabalhando com afinco,
Um deles é picado, e então sobraram cinco.
Cinco soldadinhos vão julgar um fato,
Um deles é condenado, então sobraram quarto.
Quatro soldadinhos foram pescar, todos de vez

Um deles caiu no mar, e então sobraram três.

Três soldadinhos vão a mata caçar leões,

Um urso abraçou um deles, e então voltaram dois.

Dois soldadinhos ficam de jejum,


Um deles desmaiou, e então sobrou só um.

Um soldadinho fica sozinho, só resta ele,

Ele se enforcou, e não sobrou nenhum.”

(No meio da música, o general acorda e se aproxima do piano)


Anthony – Hm, eu nunca gostei desse poema. Pelo menos eu não estou enferrujado!

John – Pois é, meu jovem, é bom ser isento da ferrugem. (dá um tapinha no ombro
dele) Mas cantigas de ninar são para a hora de dormir.

Anthony – (fazendo uma pequena saudação militar) Sim senhor! Acho que é melhor
irmos aos quartos agora, falando em dormir.

John – Sim vamos lá...

(Os dois andam para fora de cena)

CENA 3 – SALA DE JANTAR

(Todos os convidados sentados na mesa de jantar, enquanto os Rogers ficam de lado)

Emily – Deveríamos esperar pelo nosso anfitrião para comer.

John – Com toda certeza! Sr. Rogers, onde está nosso anfitrião, o Sr. Owen?

Thomas – O Sr. Owen infelizmente se atrasou. Está previsto que chegará na ilha
amanhã.

Edward – Isso é uma pena.

Tony – Não tem nada que podemos fazer, certo? Vamos comer.

Emily – Quanta má educação...

Anthony – A senhorita pretende fazer jejum até amanhã?

John – (rindo) Não me parece uma boa ideia.

Lawrence – De fato.

Anthony – Esse banquete foi feito para nós. Vamos atacar!

(Todos começam a comer)

Phillip– Essa sopa está fantástica.

Vera – Muito bom.

(Blore somente concorda com a cabeça. Os outros ficam quietos)

(Enquanto isso, Thomas vai até o gramofone e coloca o disco para tocar)

Anthony – Posso lhe pedir uma taça de vinho?


(Ethel coloca vinho no copo de Tony. A música é interrompida e todos ouvem uma voz
vinda do gramofone).

“Senhoras e senhores, silencio por favor! Este é seu anfitrião, Sr. Owen falando.

Vocês estão sendo julgados pelas seguintes acusações:

Dr. Edward George Armstrong, você causou a morte de Louisa Mary Clees sob a
influência do álcool.

Emilly Caroline Brent, você é responsável pela morte de Beatrice Taylor.

William HenryBlore, você ocasionou a morte de James Stephen Landor.

Vera Elizabeth Claythorne, você matou Cyril Hamilton.

Phillip Lombard, você é culpado pela morte de 20 homens.

General John Gordon Macarthur, mandou o amante de sua mulher, Arthur Richmond,
para a morte.

Anthony James Marston, você é culpado pelo assassinato de John e Lucy Combes.

Thomas e Ethel Rogers, vocês são responsáveis pela morte de sua empregadora,
Jennifer Brady.

Juíz Lawrence Wargrave, você mandou Edward Seton à forca injustamente.

Prisioneiros da justiça, o que tem a dizer em sua defesa?”

(Um grande momento de silêncio entre os convidados, que trocam olhares.)

Ethel – Ah meu Deus, eu não acredito! Thomas... (Desmaia)

(Dr. Armstrong vai acudi-la, e Thomas também)

John – Oh céus, ela está morta?

Edward – Ela apenas desmaiou, estava com falta de ar.

Lawrence– Sr. Rogers, vá buscar um copo d’água para ela.

(Thomas corre para fora de cena)

Vera – Quem era aquela pessoa falando? Não pode ser o Sr. Owen.

(Blore começa a procurar pela sala, e tira o disco do gramofone)


William – Aqui está.

Phillip – Uma péssima, péssima piada, na minha opinião.

Lawrence – Você acha mesmo que isso foi uma piada?

Anthony – Ei, vocês estão se esquecendo de uma coisa, quem diabos que ligou esse
gramofone?!

(Ethel começa a recuperar a consciência)

Edward – Ah, você voltou. Ficará bem, Sra. Rogers, só respire fundo e com calma.

Ethel – Eu desmaiei?

Edward – Sim.

Ethel – Foi aquela voz, aquela voz horrível! Parecia um julgamento…

Thomas – (volta em cena e dá a ela um copo d’água) Tome isto, Ethel...

Ethel – (toma a água) Eu estou bem, estou melhor...

Lawrence – Então, Sr. Rogers, quem ligou o gramofone? Foi o Senhor?

Thomas – Sim… Mas eu não sabia o que era, o disco estava lacrado!

Ethel – Só estávamos obedecendo ordens, senhor!

William – Ordens de quem?

Ethel – Do Sr. Owen!

Phillip– Mas quem é este Sr. Owen a final?

Thomas – Nós não o conhecemos, na verdade..

Emily – É muito difícil acreditar nisso!


Ethel – Chegamos aqui faz só dois dias, com todas as instruções sobre a casa, a ilha e
os convidados em cartas.

Thomas – E uma delas era colocar este disco no primeiro jantar.

Lawrence – É uma história e tanto!

Ethel – É verdade! Juro por deus que esta é a verdade!

Lawrence – Pela minha experiência como juiz, acho que deveríamos analisar os fatos, e
juntar tudo o que sabemos sobre o Sr. Owen.

Edward– Eu concordo.

Anthony – Quanta perda de tempo... Do que os senhores estão com medo?

John – Isso tudo não te parece estranho?

Anthony – Não estou preocupado com o lunático do gravador.

Vera – Esse lunático é o nosso anfitrião!

Edward – E nos trouxe para uma ilha!

William – Vamos analisar os fatos, como o Meritíssimo sugeriu.

Lawrence – Primeiramente, quem convidou cada um de vocês para vir para à ilha?

Vera – Eu estava procurando um emprego, e recebi esta proposta para ser a secretaria
do Sr. Owen.

Emily – Bom, eu recebi uma carta de uma antiga amiga me convidando para vir… Eu
achei que ela estaria aqui.

Lawrence – Para mim foi o mesmo. E quanto a você, Dr Armstrong?

Edward – No meu caso,o Sr. Owen me chamou para examinar sua esposa sem que ela
percebesse.
John – Também recebi uma carta de meus amigos…

Lawrence – Sr.Lombard?

Phillip – Sim, mesma coisa… Amigos!

Anthony – Ora, eu também!

William – Eu também.

Emily – Um Segundo, Sr. Harris. Aquela voz te chamou de “William Henry Blore”, não?
Acho que está escondendo alguma coisa de nós!

Phillip – É, o que que o senhor está escondendo de nós?

William – Okay, okay… Eu posso explicar! Eu sou o William Henry Blore. Sou um ex
policial, e trabalho como detective particular. Este Sr. Owen me contratou, e não
explicou muito bem o trabalho. Ele queria ter certeza de que todos vocês chegassem
aqui.

Lawrence – Vamos seguir adiante. Vamos falar do disco… Alguém tem algo a dizer
sobre as acusações feitas?

Ethel – É mentira! Uma terrível mentira descarada!

Anthony – Este Owen é um doido varrido! Deve ter fugido de algum manicômio, e está
por aí andando com uma camisa de força.

Emily – E isso não te assusta?

Anthony - Vocês estão se preocupam atoa.

Lawrence – Nosso amigo me acusou do assassinato de Edward Seton. Eu me lembro


deste homem. Ele foi acusado de matar uma mulher, ele fez um bom trabalho em
convencer o júri, mas pelas evidências... Ele era claramente culpado. O júri o declarou
culpado, eu o sentenciei à morte. Minha consciência está tranquila quanto a isso.
Vera – Eu queria falar sobre a criança, Cyril Hamilton. Eu era sua babá, e ele sabia que
não podia nadar sozinho. Um dia eu me distraí e ele foi para o mar. Eu nadei atrás
dele, mas não consegui chegar a tempo… Foi horrível. Mas não sou culpada!

Lawrence – Isso com certeza não foi culpa sua.

John – Eu também gostaria de esclarecer. Este homem, Richmond... Era um dos meus
soldados. Eu o mandei para o campo de batalha e ele foi morto. Causa natural dos
eventos naquela época. Ele não era amante da minha mulher, este Sr. Owen é louco.

Phillip – Sobre os 20 homens… É verdade. Eu os deixei para trás. Nós estávamos


perdidos na selva, quase sem comida ou água. Estão eu peguei o que restava e fugi.

John – Você deixou que morressem de fome?

Phillip – Chama-se “auto-preservação”.

Anthony – Estou pensando... John e Lucy Combes. Devem ser as duas crianças que eu
atropelei em Cambridge. É claro que foi um acidente! Eu estava dirigindo muito rápido,
nem consegui vê-los entrando no meio da rua!

Edward – Motoristas como você são um perigo para a sociedade.

Anthony – Ei, eu tive o que mereci! Perdi minha carteira de motorista por um ano!

Thomas – Se me permite dizer algumas palavras, Sr. Wargrave.

Lawrence – Vá em frente, Rogers.


Thomas – Eu e minha esposa trabalhamos para Madame Brady até seu último suspiro.

Ethel – Ela sempre teve problemas de saúde. Houve uma tempestade naquela noite.
Ficamos sem telefone… Não tivemos como chamar um médico para ela.

Thomas – Eu fui correndo até a cidade, mas quando o médico chegou, já era tarde
demais.

William – Mas vocês ganharam dinheiro com a morte dela, não foi?
Ethel – Madame Brady nos deixou uma herança, mas foi por nossos fiéis serviços! Isso
não significa nada!

Edward – Sua esposa precisa descansar, Sr.Rogers. Leve-a para seu quarto e a dê estas
pílulas. Ela vai dormir até amanhã.

(Thomas guia Ethel para fora de cena)

Phillip – E quando a você, Sr. Blore?

William – O que tem eu?

Phillip – Seu nome também está na lista.

William – Landor? Eu era o policial encarregado do caso dele. Landor pegou prisão
perpétua e morreu um ano depois. Ele era um homem delicado. O caso era bastante
claro, eu só estava fazendo meu trabalho.

Lawrence – Eu me lembro deste caso. Você foi promovido depois, não?

William – Sim senhor... E quanto a você, doutor? Vendendo órgãos? Operações


ilegais?

Edward – Eu estou completamente perdido aqui. O nome Louisa Clees não me faz
lembrar nada. Não me lembro de nenhum paciente com este nome, pode ter sido
alguém que morreu em cirurgia. Sempre aparece alguém querendo culpar o médico.

(Todos eles olham para Emily)

Emily – Vocês estão esperando que eu diga alguma coisa? Não tenho nada a dizer.

Lawrence – Nada, Srta Brent?

Emily – Nada! Não fiz nada de errado, e minha consciência está limpa!

(Rogers volta)

William – Sr. Rogers, tem mais alguém nessa ilha?

Thomas – Não senhor!

John – Você tem certeza?


Thomas– Tenho, senhor.

Vera – Eu não sei vocês, mas eu sugiro irmos embora daqui agora mesmo. Esse Sr.
Owen pode ser perigoso.

Thomas – Não há barcos nesta Ilha, senhorita. Fred Narracott vem toda manhã e nos
trás o jornal e as correspondências.

Lawrence – Então iremos embora amanhã de manhã.

(Todos concordam menos Tony)

Anthony – Ir embora? Eu não vou embora! Se este Sr. Owen quer brincar com a gente,
vamos brincar! Eu não tenho medo dessa situação. Enquanto tivermos boa comida e
bebidas o bastante, eu ficarei!

A vida comum é um saco, eu vivo pelo crime! Um brinde a isso!

(Tony bebe da taça de vinho, mas começa a tossir antes decair no chão, imóvel)

Edward – (se aproxima dele) Oh meu deus!

Emily – Ele está vivo?

Edward –(tenta sentir o pulso dele) ...Não.

Emily – Ele morreu engasgado?

(O Dr. Pega o copo de Tony e cheira)

Dr. Armstrong – Eu acredito que ele tenha sido envenenado!

(Todos ficam chocados)

Vera – Meu Deus! Quem que faria uma coisa dessas?

William – Talvez o Sr. Rogers esteja errado, talvez tenha mais alguém nesta ilha! (Pega
o copo e coloca um pano em volta dele)

Emily – O que nós devemos fazer agora?

Lawrence – Primeiro vamos colocar o corpo em seu quarto.


Phillip – Depois, eu sugiro irmos todos para os nossos quartos, e tranquem suas
portas. Amanhã vamos achar um jeito de sair dessa maldita ilha!

CENA 4 – QUARTO DOS ROGERS

(Thomas guia Ethel até a cama, e ela se senta)

Ethel – Eu disse que a gente não devia ter vindo trabalhar aqui! Eu sabia que alguém ia
descobrir, mais cedo ou mais tarde...

Thomas – Fala mais baixo, Ethel. Mesmo que os convidados achem que seja verdade,
eles também tem acusações contra eles.

Ethel – Se a gente tivesse socorrido a Madame enquanto ainda dava tempo, a gente
não teria que lidar com isso, Thomas! A idéia foi sua a final!

Thomas – Eu estava pensando no que era melhor pra nós! Você também não estava
cansada de servir aquela velha?

Ethel – Sim, mas não significa que eu queria viver com o fato de que a gente deixou ela
morrer! Mentiras pra esquerda e pra direita, eu não sei como que você aguenta.

Thomas – Olha Ethel, já chega desse assunto! Você cisma com ele nas piores horas, e
principalmente quando você fica emotiva assim. Toma os remédios e vai dormir.
(oferece ela o copo e os comprimidos)

Ethel – Mas e o doutor...? É seguro eu tomar o que ele recomendou mesmo com o que
o gramofone disse?!

Thomas – Eu já disse pra parar de cismar com as coisas! O doutor não faria algo tão
incompetente.

Ethel – ...Tá bem. (ela toma a água e os comprimidos)

(blackout)

(A cena está escura, mas dá para ver que Ethel está em sua cama)

(Uma pessoa se aproxima dela, e ela está acordada)

??? – Você precisa de uma segunda dose do medicamento.


Ethel – Hã...? O que disse?

??? – Aqui, tome isso. (dá a ela um copo d’água com alguma coisa)

Ethel – Mas eu já estou exausta...

??? – E acordada. Assim nunca vai conseguir dormir.

Ethel – Tem razão... (toma do copo)

CENA 5 – QUARTO DA VERA


(Vera em seu quarto andando de um lado pro outro e pensando)

Como que sabem sobre o Cyril? Eu nunca contei pra ninguém a verdade!

(pausa)

Talvez os outros convidados sejam tão culpados de seus crimes quanto eu.

(pausa)

Eu era jovem, idiota e apaixonada. A morte de Cyril era a única forma de eu poder
ficar com Hugo. Sem o ele, Hugo ficaria com todo o dinheiro da família, e nós
finalmente poderíamos ficar juntos. Mas as coisas não são tão fáceis assim… Quando
ele olhou para mim depois que o garoto se afogou… Era como se ele soubesse do que
aconteceu. Ah, eu preciso parar de pensar nisso! Se não eu não vou conseguir
descansar.

CENA 6 – QUARTO DOS ROGERS, SALA DE JANTAR

(A cena começa no quarto que agora está iluminado, Thomas entra em cena)

Thomas – Ethel, acorda. Temos que preparar o café da manhã para os convidados. Eu
já preparei a nossa lista de afazeres. (tira a coberta de cima dela)

(ela não responde, imóvel)

Thomas – Ethel? Ethel, acorda! (começa a chacoalhar ela) Meu deus... Não pode ser.

(Thomas corre para fora de cena)

(Depois do blackout, Blore aparece entrando na sala de jantar)


William – Nada de café da manhã, hein?

(Thomas entra desesperado)

Thomas – Sr Blore, me ajude, por favor!

William – O que aconteceu, Rogers?

Thomas – É minha esposa! Acho que ela está morta!

William – Fique com ela! Vou chamar o Dr. Armstrong!

(Eles saem correndo. Entra Emily)

Emily – Ah meus Deus, quanta baderna. E ainda por cima não tem café da manhã!

(Lawrence entra)

Lawrence – Bom dia, Srta. Brent.

Emily – Bom dia. Sabe o que aconteceu com o café de hoje?

Lawrence – Não, não fui informado.

(Eles se sentam. Vera entra e se senta em seguida.)

Vera – Bom dia.

( Blore, Thomas e Dr Amstrong entram)

Emily – Aí está você, Rogers. Onde está nosso café da manhã?

(Thomas fica em silêncio, e o doutor dá um tapinha em seu ombro)

Edward – Por esta manhã, teremos que ficar sem café...

William – (interrompe) A Sra. Rogers está morta.

Vera – O que?

Emily – O que aconteceu com ela?

Edward – Ela morreu enquanto dormia, não sei ao certo como.

Lawrence – Sr. Rogers, vá chamar os outros por favor. Precisamos discutir o que fazer.
(Rogers sai)

Vera– Nós precisamos é sair daqui!

(Rogers, MacArthur e Lombard entram)

Phillip – O que aconteceu?

Lawrence – A Sra Rogers faleceu.

John – Hein? O Sr. Rogers está logo ali. (aponta pra ele)

Edward – Não, General, a esposa dele.

John – O que?

(quase todos repetem “a esposa dele”)

John – Esposa...? Creio que um homem nunca mataria sua esposa, não importa o
quanto ela possa ser culpada...

(breve silêncio enquanto ele sai de cena)

Phillip – Mas como que ela morreu?

Lawrence – Não sabemos ao certo.

William – Dr. Armstrong, o que você deu para ela tomar ontem à noite?

Edward – Só um calmante, que nem era pra ser tão forte.

Phillip – Então porque ela está morta?

Edward – Eu não sei!

William – Ela morreu após ser medicada por você, e quer nos convencer que você não
sabe de nada?

Edward – Eu estava tentando ajudar, não vou tolerar mais acusações!

Phillip – Bem, vocês podem continuar discutindo por aqui. Eu vou ficar lá fora e
esperar pelo barco do Sr. Narracott!

Vera – Eu vou com você!


(Vera e Phillip saem de cena)

Lawrence – Bem, vamos arrumar as malas, e nos prepararmos para sair daqui. Sr.
Rogers, nós lamentamos muito pela perda da sua esposa, mas o senhor devia vir
conosco.

Rogers – Sim, Senhor. Obrigado.

William – Vamos, não temos tempo a perder. Duas mortes acidentais em menos de
doze horas não pode ser coincidência!

(todos saem de cena)

CENA 7 – BEIRA DA ILHA

(Vera e Phillip esperam pelo barco de Narracott, de pé.)

Phillip – Já são dez e meia... E nenhum sinal dele.

Vera – Ai ai, onde ele está?

Phillip – Talvez ele não venha hoje.

Vera – Não fala isso, eu não aguento mais nenhuma noite nessa ilha!

Phillip – Espera, aquele ali é...? (aponta pro General do outro lado) Esquece, é só o
MacArthur. Achei que era Narracott.

(Vera se aproxima dele, e Phillip fica observando)

Vera – O senhor também está esperando o barco?

John – O barco nunca virá, Juliet. Estamos aqui para sempre.

Vera – General! Por que está dizendo isso?

John – Ah, desculpe, minha jovem. Mas viemos aqui para morrer, pois nós sabemos
exatamente o que fizemos…

Vera – Eu não fiz nada! E não quero morrer nesta ilha!

John – A senhorita não acredita nisso.

(Vera fica em silêncio, olhando entre John e Phillip)


John – Confesso que para mim é um alívio. Sim, eu mandei Arthur Richmond para a
morte, e minha vida nunca mais foi a mesma desde então...

Vera – Então é verdade!

John – Hoje em dia não me restam amigos, minha esposa está morta e eu tenho que
viver com a culpa. Mas agora, tudo o que temos que fazer é apreciar essa vista e
esperar pela morte. A verdade não falha... E ela esta vindo buscar a todos nós.

(Ficam em silêncio por mais um momento, depois Vera volta para o lado de Phillip)

Phillip – Pobre homem, ele está ficando louco!

Vera – Você acha que ele tem razão?

Phillip – Claro que não! Vamos voltar pra dentro, e deixar ele quieto por enquanto.
(Os dois saem de cena)

(A cena escurece, e uma pessoa se aproxima do general, segurando um objeto pesado)

??? – Diga-me, General. Não tem nada para que queira voltar fora desta ilha, não é?

John – Ah, é você. Não enrole, só quero ver Juliet... Sinto que ela está me esperando.

??? – Como queira. Boa viagem a Devon, Almirante. (acerta ele na cabeça com o
objeto, depois sai de cena)

CENA 8 – SALA DE ESTAR

(Armstrong já está em cena, e o Juíz entra na sala)

Edward – Então, Wargrave, você acha que o Sr. Narracott vai vir amanhã?

Lawrence – Honestamente, eu não sei. Mas acho que nosso tempo está acabando!

Edward – Realmente não estamos a salvo aqui. Acredito que tenha mais alguém nessa
ilha.

Lawrence – É uma boa teoria. Precisamos testar isso o quanto antes, doutor.

Emily (fora de cena) – O chá está servido!

Lawrence – Vamos!
(Os dois vão para a sala de jantar, sentando com todo mundo)

William – E o barco?

Vera – Não apareceu ainda...

Edward – O que faremos se ele não vier amanhã?

(enquanto ninguém olha, Lawrence abaixa um dos soldadinhos)

Emily – É melhor discutirmos isso com todos presentes. A final, onde está o General?

Vera – Eu vi ele lá fora a mais ou menos uma hora.

Phillip – Eu vou chamá-lo.

Vera – Não, tudo bem. Eu chamo.

(Vera sai, e começam a comer em silencio)

Vera (fora de cena) – Ah meu Deus! Dr. Armstrong!

(Dr Armstrong, Lombard, e Blore correm para os bastidores)

William – Cadê ele?

Phillip – Ali, lá no meio da areia! Ele está morto mesmo?

Edward – ...Sim.

William – Ah meu Deus!

(Eles voltam para a sala de jantar)

Lawrence – O que aconteceu com ele?

Edward – Parece que foi atingido na cabeça.

Vera – Precisamos descobrir quem está fazendo isso!

William – Eu vou procurar por toda essa ilha e vou achar essa droga de assassino!

Phillip – Vou com você! Não podemos deixar nenhum lugar despercebido.

Thomas – Eu também vou, senhores. Conheço bem os arredores...


Edward – Vou acompanhá-los. Preciso ver o corpo mais de perto.

(Eles saem. Vera, Lawrence e Emily ficam na sala de jantar.)

Emily – Tenho que dizer algo a vocês. Eu notei algo muito estranho sobre esses
soldadinhos na mesa.

Vera – O que foi?

Emily – Ontem à noite, antes de ir dormir, eu vi que tinham apenas nove de pé. Pensei
que uma poderia ter caído e não dei muita atenção. Essa manhã, Sra. Rogers estava
morta, e na mesa tinham apenas oito de pé. Pensei que estava vendo coisas, mas
agora que MacArthur está morto...

Vera – Só tem sete!

Lawrence – Sem dúvida, alguém está tentando mexer com as nossas cabeças.

Vera – Temos que fazer alguma coisa!

Emily – As estatuas nos representam... E estão sumindo. O nosso Senhor é conhecido


pelo julgamento que executa: o mal enreda-se na obra de suas próprias mãos.

Lawrence – O doutor comentou que deve haver mais alguém aqui na ilha, mas duvido
que seja Cristo, Srta Brent.

Vera – Eu estou falando que precisamos sair daqui! Não importa se é de barco ou
nadando no mar frio!

Lawrence – Acalme-se, Srta. Claythorne! Vamos esperar os outros voltarem, talvez


tenham achado alguma coisa.

(Edward, Thomas, William e Phillip voltam)

Emily – E então? Acharam algo ou alguém?

William – Nada.

Phillip – Essa ilha está completamente vazia. Só nós sete estamos aqui.

Vera – E... O que que isso quer dizer?

William – Exatamente o que está pensando! O assassino está entre nós!


(Eles permanecem em silencio, olhando um para o outro)

Emily – Você está insinuando que um de nós aqui é um assassino?

William – Não tem outra explicação!

Emily – Bom, provavelmente não é uma mulher.

Edward – Isso não é totalmente verdade. Até uma mulher poderia ter cometido esses
crimes.

Vera – Até bater na cabeça do General?

Edward – Bem, com as ferramentas certas, tudo é possível…

Phillip – Qual é o plano agora?

William – Precisamos continuar investigando...

Edward – E é bom não nos separarmos numa hora dessas! Ainda mais com aquela
tempestade formando lá fora.

Phillip – Vamos investigar o interior da casa por agora, em grupos.

Emily – Ah, eu não quero sair por aí que nem louca procurando o invisível! Estarei em
meus aposentos se precisarem de mim. (sai de cena)

Edward – Bem... O quanto antes começarmos melhor.

(todos saem de cena juntos)

CENA 9 – SALA DE ESTAR

(Vera, Phillip e Rogers entram em cena, olhando em volta)

Vera – (se aproximando do piano) Hmm, que partitura é essa?

Thomas – A rima dos dez soldadinhos, senhorita. Já estava aí quando... Eu e minha


esposa chegamos.

Phillip – O Sr. Owen gosta muito desses soldadinhos, não?

(de repente, a cena fica mais escura)


Vera – Ah não!

Philip – Era só o que me faltava.

(William, Lawrence e Edward entram em cena)

Edward – O gerador já era!

Lawrence – Precisamos ligá-lo de novo, se não estaremos no escuro com um


assassino!

Thomas – Eu o farei, não se preocupem.

William – Espera um segundo, não parece uma boa idéia deixar Rogers fazer isso. A
final, foi ele que serviu a bebida de Anthony, e que deu o medicamento a Sra. Rogers!

Vera – Você está mesmo dizendo que o Sr. Rogers mataria a própria esposa?

Lawrence – Vi muitos casos onde isso aconteceu, não é totalmente impossível.

Thomas – Não, não, não senhor! Eu nunca faria isso, eu e ela estávamos juntos a mais
de quinze anos! (Ficando muito nervoso). Eu posso ir até o gerador sozinho e dormir
por lá para provar minha inocência! Quando verem a luz voltar, vão saber, é só
esperarem! (Ele apressadamente sai de cena, e os outros não conseguem pará-lo.)

Edward – ...Acho melhor deixarmos ele lá.

Vera – Mas ele vai estar sozinho!

William – Sozinho, armado e louco, Srta. Claythorne.

Phillip – Contanto que a gente tranque as portas da casa, Rogers não pode fazer nada!

Lawrence – Realmente. Rogers está muito suspeito, e dependendo do que acontecer


essa noite, nós saberemos se ele é o Sr. Owen ou não.

Edward – Acho que é bom também trancarmos as portas dos quartos. E avisar a Srta
Brent.

(todos concordam com a idéia, e logo dão boa noite uns pros outros antes de saírem, a
cena fica semi escura novamente, e Rogers aparece resmungando para si enquanto
anda em círculos, segurando um machado.)
Thomas – Ah Ethel, eles acham que eu sou um assassino! Tudo sempre sobra pro
mordomo, é tudo sempre culpa dele. Mesmo ela me culpava só por querer o melhor
só pra nós dois!

(??? Entra na cena em silêncio, até que limpa a garganta para chamar a atenção de
Rogers.)

Thomas – Quem está aí? Se afaste, eu estou armado! (levanta machado)

??? – Rogers, não me ataque! O machado só serve para cortar lenha, e eu acredito na
sua inocência.

Thomas – Mas como que eu vou saber se você veio aqui para me matar ou não?!

??? – Eu não vim com nenhuma arma.

Thomas – É verdade... (abaixa a arma). Eu só não aguento mais essas mortes. Sem
contar que todo mundo fica insistindo em me culpar!

??? – Sabe, Rogers... Há vezes em que a culpa finalmente chega aos que merecem.

Thomas – O que você está- ?!

(Rogers é interrompido quando ??? toma o machado de suas mãos e o acerta na


cabeça)

(blackout)

(a cena fica semi escura de novo, e dá para ver Emily andando)

Emily – Hm, nada como uma boa caminhada matinal para agradecer a esse novo dia.

(??? entra em cena e se junta a Emily)

??? – Não está cedo demais para sair do quarto, Srta Brent?

Emily – De jeito nenhum. Conhece o ditado: Deus ajuda quem cedo madruga.

??? – Ah, é claro. Vamos, eu te acompanho até o quarto.

Emily – Estou perfeitamente bem a sós. Mas está bem, pode me acompanhar.
??? – Eu queria discutir uma coisa com a senhorita. Sempre achei interessante a forma
que os cristãos se isentam de suas más ações por meio de justificativas religiosas.

Emily – Ora, se for blasfemar logo na minha frente eu não quero conversa. Se for sobre
a gravação, a menina era impura! Engravidou antes do casamento, era uma desgraça.
Só fiz o que era certo, e nada vai mudar isso.

??? – Mesmo assim, Srta Brent, um dos mandamentos é não matarás. Mas não
importa, já que também vou desobedecê-lo. (injeta o veneno nela com a seringa)

(Emily dá um leve grito antes de cair dura no chão. Blackout)

(Luz. Vera bate na porta fora de cena, mas Emily está caída perto da cama)

Vera – Srta Brent? Srta Brent! Está tudo bem por aí?

(Blore também fala fora de cena)

William – Para trás, Srta Claythorne. Eu abro a porta! (entra em cena, e avista o corpo)
...O senhor Owen ataca novamente, ou devo dizer, Rogers.

Vera – Impossível, todo mundo viu as portas sendo trancadas, Sr. Blore!

William – Ele deve ter encontrado um jeito. (começa a contar nos dedos) Rogers tinha
fácil acesso à garrafa de vinho que seria servida ao Tony, fato! Foi ele que deu
sedativos pra esposa, fato! Ele conhece bem a ilha, e assim que ele deve ter
encontrado o General para dar um fim nele, fato!

(Phillip entra em cena)

Phillip – Meu deus, mais um! Enfim, tem um fato de que está esquecendo, Sr. Blore.

(Enquanto os dois conversam, Vera arruma a posição do corpo de Emily)

William – E que fato é esse, Lombard?!

Phillip – O Sr. Rogers também está morto. Wargrave e Armstrong estão na cena do
crime.

Vera – E como foi que ele morreu?


Phillip – Pelo visto, levou uma machadada na parte de trás da cabeça. Consegue achar
o fato que acabou com a vida da Srta Brent, Blore?

William – Não seja ridículo, claro que sim. (vai até o corpo e começa a examinar ele)
Tem uma marca de seringa hipodérmica no pescoço.

Vera – Vamos nos encontrar com os outros dois na sala de estar, pra poder discutir
isso melhor!

CENA 10 – SALA DE ESTAR

Vera – Eu preciso mostrar pra vocês um poema que estava aqui na casa quando
chegamos...

Olhem: “Dez soldadinhos vão jantar enquanto não chove,

Um deles se engasgou, então ficaram nove.”

Dr Armstrong – Igual Tony Marston…

Vera– “Nove soldadinhos vão dormir, e nenhum está afoito.

Um deles dormiu demais, então sobraram oito.”

Blore – Essa seria a Sra. Rogers.

Vera – Oito soldadinhos foram a Devon de charrete,

Um não quis voltar, então voltaram sete.

Sete soldadinhos foram cortar lenha, um deles se cortou na sua vez,

Então sobraram seis.

Blore– Cortando lenha… Como o Sr. Rogers!

Vera - Seis soldadinhos em uma colmeia. Trabalhando com afinco,

Um deles é picado, e então sobraram cinco.

Wargrave– Como A Srta. Brent... O que vem depois?

Vera – Cinco soldadinhos vão ao tribunal julgar um fato, um deles é condenado, então
sobraram quatro
Lombard – Ótimo! Então não vamos a nenhum tribunal e todos ficaremos bem!

Vera – Não brinque com isso!

Lombard – Isso é ridículo! É só um poema!

Vera – Eu vou para o meu quarto. Não estou me sentindo bem...

Blore – Eu a acompanho...

Vera – Não! Prefiro ficar sozinha!

Wargrave– Preciso perguntar a vocês. Tem alguém aqui que possui uma arma?

Dr Armstrong – Não, senhor.

Blore – Eu também não.

Lombard– Eu tenho. Por quê?

Wargrave– Talvez precisaremos dela.

Lombard– Sinto muito, Sr. Wargrave, mas eu não darei minha arma para ninguém
aqui. O assassino pode ser qualquer um de nós.

Blore – Nós temos que sair dessa ilha, nem que seja nadando!

Armstrong – Já pensei sobre isso, mas tem uma tempestade vindo. Poderíamos morrer
se tentarmos nadar.

Wargrave – Além do mais, a agua é muito gelada nesta época do ano.

Blore – Acho que uma arma poderia ajudar a proteger a todos nós...

Lombard– Todos nós, inclui um assassino.

Armstrong – E se o assassino for você?

Lombard– Até agora ninguém foi morto por um tiro, Dr. Embora uma pessoa tenha
morrido após ser medicada pelo Sr. E outra foi morta com uma seringa.

Armstrong – O que o Sr está insinuando?

Lombard – Estou só afirmando que não entregarei minha arma, está fora de questão!

Blore –Por que trouxe uma arma?


Lombard– Sou um homem prevenido, Sr. Blore... Eu não tinha a menor ideia do que
encontraria nessa ilha e devo dizer, graças a Deus eu a trouxe!

(ouvimos um grito de Vera)

Wargrave – Sr. Lombard, vá pegar sua arma.

(Ele sai e volta)

Lombard– Minha arma sumiu.

(todos correm para o seu quarto, menos Wargrave)

CENA 11 – QUARTO DA VERA

Lombard– O que aconteceu, Vera?

Vera – Alguém tentou me matar! Eu senti uma coisa! Tenho certeza!

Blore – Se acalme Srta. Claythorne, foi apenas essa corda. Alguém queria te assustar.

Vera – O que essa corda está fazendo aqui?

Blore – Sr Lombard, vá pegar um pouco de água!

(Lombard quase sai para buscar)

Vera – Eu não vou beber nada! Nada que alguém outro me traga!

Blore – Temos que nos manter juntos a partir de agora.

Vera – Onde está o juiz?

Blore (olhando ao redor) – Onde está Wargrave?

(Todos eles voltam para a sala de jantar. Wargrave está sentado em uma cadeira, mas
não conseguimos ver sua face. Dr. Armstrong chega mais perto dele.)

Dr Armstrong – Ele está morto. Alguém atirou na cabeça dele.

Vera – Ah meu Deus! Olhem! Tem apenas quatro soldadinhos na mesa!

Lombard– Isso é loucura!


Blore – Sr. Lombard, você era o único com uma arma.

Lombard– Sim, mas minha arma desapareceu, eu te disse! Alguém a roubou para
matar o juíz!

Dr Armstrong – Isso é o que você diz…

Lombard –Emily Brent foi morta com uma seringa, uma seringa que o Sr trouxe para a
ilha!

Dr. Armstrong – Se eu fosse matar alguém nesta ilha, garanto que não seria a Sra
Brent!

Blore – Vamos parar com isso! Já temos problemas demais. Já está escuro lá fora, não
há mais nada que possamos fazer hoje. Eu sugiro que cada um vá para o seu quarto e
tranquem as portas. É o que eu vou fazer (Diz olhando para Lombard).

Cena 12

(Todos vão para seus quartos. Depois de um tempo, nós vemos Dr. Armstrong
atravessando o palco, e segundos depois Blore vai atrás dele. Ele para, pensa e volta
para os quartos)

Blore(bate na porta) – Sr. Lombard, você está aí?

Lombard– Não abrirei a porta para você, Sr. Blore!

Blore – Eu vi alguém saindo da casa.

Lombard(abrindo a porta) – Vamos ver se a Srta. Claythorne está no quarto dela.

Blore (batendo em outra porta) – Srta. Claythorne?

Vera – Sim?

Blore – Vamos ver o quarto do Dr. Armstrong.

Lombard (batendo em outra porta) – Dr Armstrong? (Para Blore). Não tem ninguém
aqui!
Blore – É ele! (Para o quarto de Vera) Vera, nós sabemos quem é o assassino! Fique aí,
e se a Dr. Armstrong voltar, não abra a porta para ele!

Vera – Tudo bem! Tomem cuidado!

Lombard– Vamos achá-lo! Espera! (Ele vai pegar sua arma em seu quarto) Achei minha
arma ontem a noite...

Blore – Achou? Onde estava?

Lombard - Na sala de estar. Talvez precisaremos dela! (Pausa). Ainda está desconfiado
de mim, Blore?

Blore – Não confio em ninguém nessa casa.

Lombard – Você não tem muita opção..

(Eles saem e voltam minutos depois)

Blore– Vera, somos nós. Abra a porta!

(Vera abre a porta)

Vera – Vocês acharam ele?

Blore– Não! Mas agora sabemos que ele é a assassino e temos que ser cuidadosos.

Lombard– Temos que ficar juntos.

Vera – Não quero mais ficar nessa casa. Vamos lá fora! Vamos esperar por um barco!

Blore – Ok, vamos!

(Eles saem da casa e se sentam em uma pedra)

Lombard – Já está amanhecendo...

Blore– Quanto tempo ficaremos aqui? Deveríamos entrar e comer alguma coisa...

Vera – Não vou voltar para aquela casa! O Dr. Armstrong pode estar lá!

Blore – Nós vamos ter que comer...

Lombard – Muitas pessoas passam dias sem comer. Não é grande coisa...
(Blore e Vera olham para Lombard)

Blore– Que irônico ouvir isso do senhor! (Pausa) Bom, eu vou para dentro, estou
faminto! Quem vem comigo?

Lombard – Eu não! É muito arriscado!

Blore – Pode me emprestar sua arma?

Lombard– Não! Desculpe, mas talvez precisaremos dela aqui.

Blore – Tudo bem. Vou de qualquer jeito.

(Ele sai)

Vera – Que babaca!

(Eles esperam em silencio)

Lombard – É um imbecil! Vai perder a vida por um pedaço de pão.

(Eles continuam aguardando)

Vera – Você realmente matou 20 companheiros seus?

Lombard – Não matei ninguém. Apenas me salvei! As circunstâncias os mataram.


(Pausa). Você realmente matou o menino Cyril?

(Vera não responde nem olha para Lombard)

Lombard – Deveríamos ir atrás dele?

Vera – Não, é muito perigoso. Ele pode estar morto agora!

(Eles esperam em silencio)

Vera – Ele não vai voltar... Talvez devemos ir lá. Pegue a sua arma!

Lombard– Ok!

(Eles saem. Depois de um tempo, ouvimos dos bastidores.)

Vera – Eu sabia!

Lombard– Meu Deus! Olha a cabeça dele! Esse relógio gigante caiu em cima dela!
Vera – Tenho certeza que não foi um acidente. Que homem estúpido, eu disse que era
perigoso!

Lombard– Venha! Precisamos sair daqui, ainda é perigoso. Dr Armstrong pode voltar...

(Os dois sentam nas pedras de novo)

Lombard– Talvez devêssemos tentar nadar…

Vera – Eu não sei... Parece muito longe.(Ela olha para algo na água) O que é aquilo?

Lombard– Onde?

Vera – Na água, parece com um corpo. (Pausa) É o corpo do Dr. Armstrong!

(Lombard imediatamente aponta a arma para Vera)

Lombard – Então é isso, Vera.

Vera – Não tem mais ninguém nessa ilha!

Lombard– Então nós dois sabemos a verdade! Esse é o fim!

Vera – Eu sei! (Pausa) Pobre Dr. Armstrong. Deveríamos pelo menos tirar seu corpo da
água antes que você me mate.

Lombard – Como desejar.

(Eles pegam o corpo de Armstrong, o colocam na pedra, e enquanto fazem isso, Vera
pega a arma de Lombard de seu bolso e aponta para ele)

Lombard– Muito esperta para uma secretária!

Vera – Esse é o fim, Lombard.

(Ela atira em Lombard, o matando. Depois, ela volta para a casa. Tem apenas um
soldado na mesa. Ela o pega e o olha. Ela deixa a arma cair e vai até seu quarto, se
sentindo extremamente cansada. Quando ela entra no quarto, vê uma corda. Ela a
olha, parada. E então pega uma cadeira, sobe nela..)

Cena 13
(Um detective e seu assistente estão na casa)

Detetive – Esse é um caso muito estranho. Dez corpos e ninguém mais nessa ilha.

Detetive 2 – Em 15 anos trabalhando nunca encontrei nenhum caso parecido.

Detetive – Aparentemente, essa garota “Vera Claythorne”, conseguiu matar todos eles
e se matar no final. Só não consigo entender o “porque”. O que estas pessoas que não
tinham nenhuma relação aparente, estavam fazendo nesta ilha?

Detetive 2 – Senhor, nós achamos essa garrafa na água com uma carta dentro. Pode
ser útil!

Detetive lendo:

Desde a infância, percebi que minha natureza era um amontoado de contradições.


Sempre tive muita imaginação e era um romântico incorrigível, e é por isso que agora,
lanço minha confissão ao mar, sabendo que as chances dessa carta ser encontrada são
mínimas.

Outro traço da minha personalidade é um pouco mais sombrio: sempre gostei da


morte. Mas em contradição, sempre tive um forte senso de justiça. Talvez isso
explique porque segui a carreira jurídica.

O crime e o castigo sempre me fascinaram. E meu trabalho como juiz satisfazia boa
parte dos meus instintos. Por isso, sempre fui considerado um juiz carrasco, mas
extremamente integro e justo. E foi com essa integridade que julguei e condenei
Edward Seton, um homem que havia matado uma senhora que nele confiava.

Com o passar dos anos, percebi que fui tomado por uma forte vontade de agir e não
apenas julgar: queria eu mesmo cometer um assassinato. Mas ainda assim, nenhum
inocente deveria sofrer.

E então finalmente tive uma ideia. Quando conversava com um médico, me disse que
havia um grande número de homicídios em que a lei não chegava ao culpado, e citou o
exemplo de uma paciente falecida recentemente.

Estava certo de que a morte da senhora era consequência da negligencia de um casal


que trabalhava em sua casa. Um crime impossível de se comprovar com a lei.
Naquele momento, tracei meu plano. Eu faria um único crime em grande escala.
Lembrei-me de um poema da minha infância, o poema dos 10 soldadinhos. Este
poema sempre me fascinou com a redução do número de soldados, e a sensação de
inevitabilidade.

Comecei a colecionar vítimas em sigilo, sempre que havia a oportunidade.

Durante o planejamento do meu crime, tomei ciência do meu estado de saúde. Meu
médico me informou que eu precisaria de um tratamento rigoroso, que deixaria
minhas chances de me recuperar baixas. Não o informei sobre minha decisão. Mas eu
não ia morrer em uma cama de hospital. Antes de morrer eu viveria a minha obra
prima.

Comprei a ilha usando um nome fictício de Sr. Owen. E elaborei diferentes motivos
para que cada vítima viesse. E assim, no dia oito de agosto eu e minhas vítimas
chegamos á ilha.

Decidi que os menos culpados seriam os primeiros a morrer e que não passariam pela
espera. Assim matei as três primeiras vítimas.

Escolhi Dr. Armstrong para que fosse o “aliado” de que precisaria, já que nunca
poderia imaginar que um juiz renomado como eu estaria por trás de tudo. Ele
suspeitava de Lombard e eu fingia concordar. Combinei com ele que faríamos um
plano para pegar o assassino, e para isso precisaria forjar minha morte. Quando todos
achassem que eu estava morto, eu poderia investigar quem estava de fato por trás das
mortes. Ele adorou a ideia.

Após isso, combinei de encontrá-lo de noite na parte externa da casa para contar o
que havia descoberto. E assim, silenciei o médico.

Restavam apenas três pessoas desesperadas, suspeitando umas das outras. E uma
tinha um revolver em mãos.

Quando Blore se encontrava sozinho, eu já estava o aguardando. Da janela, vi a Srta.


Claythorne matar Lombard. Uma jovem inteligente e ousada, eu sabia que ela era uma
adversária a altura de Lombard, ou até superior. Assim que caiu morto, preparei o
quarto para o retorno de Vera a casa.
Precisava contar com a sua culpa. Será que a culpa que Vera Claythorne arrastava
consigo, somada ao fato de ter acabado de matar um homem, a levaria ao suicídio? Eu
achava que sim, e estava certo.

Ela se enforcou bem diante dos meus olhos.

Para o grande final, eu peguei o revolver usado por Vera, com a cautela de não
estragar suas digitais. E agora colocarei minha confissão em uma garrafa e a jogarei ao
mar. Em seguida me deitarei na cama onde meu corpo foi anteriormente colocado.
Aos meus. Amarrarei o cordão em torno da maçaneta da porta ao lado prendendo-o
sem muita força ao revolver.

Minha mão protegida por um lenço apertará o gatilho. o revolver, puxado pelo
elástico, recuará até a porta. Serei encontrado na cama, morto com um tiro na testa.

Quando o mar se acalmar, barcos e homens virão da terra firme.


E encontrarão na ilha do soldado dez cadáveres e um crime indecifrável.

Assinado: Lawrence John Wargrave.

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