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14.501
Este livro foi composto na ortografia usada pela Editora, ou seja, a de 1943, com
algumas das modificações propostas pela de 1915.
Yvonne A. Pereira
Devassando o Invisivel
2 edição
Do 6’ ao 15’ milhar
Indice
Pág.
Introdução . 7
Cap. 1 — Nada de novo 9
Cap. II — Como se trajam os Espiritos 39
Cap. III — Frederico Chopin, na Espiritualidade 61
Cap. IV — Nas Regiões Inferiores 84
Cap. V — Mistificadores Obsessões 103
Cap. VI — Romances mediúnicos 116
Cap. VII O amigo beletrista 145
Cap. VIII Sutilezas da Mediunidade 174
Cap. IX — As virtudes do Consolador 198
Cap. X Os grandes segredos do Além 215
Introdução
Devassando o Invisível
YVONNE A. PEREIRA
CAPÍTULO 1
Nada de novo...
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volume, não são frutos do nosso raciocínio pessoal, como o não são de nossas
concepções doutrinárias, visto que temos o cuidado de jamais estabelecer
concepções pessoais em assuntos de Espiritismo. Certa da nossa fragilidade,
renunciámos bem cedo à vaidade das opiniões próprias, para nos achegarmos
aos mestres e grandes vultos da Doutrina e junto deles buscar o ensinamento
seguro, aceitando igualmente o que o Invisível espontâneamente nos revela,
quando concorde com os ensinamentos básicos, revelações que, algumas vezes,
têm contrariado mesmo as ideias que havíamos feito sobre mais de um assunto.
Temos sido, portanto, tão somente um veículo transmissor das idéias e do
noticiário do Espaço, e, a mercê de Deus, empenhamo-nos esforçadamente em
ser passiva aos dedicados amigos invisíveis, ao se valerem da nossa faculdade.
E, por isso mesmo, o que aqui se afigura escrito por nossa pena mais não será do
que o murmúrio das vozes de amigos espirituais que nos dirigem o cérebro e
impulsionam o lápis, depois de haverem arrebatado o nosso Espírito a giros
instrutivos pelo Mundo Invisível, as mais das vezes.
*
**
Desde o advento da Doutrina Espírita, os nobres habitantes do mundo espiritual
que se têm comunicado com os homens, através de grande variedade de
médiuns, afirmam ser a Terra um pálido reflexo do Espaço. O Livro dos Médiuns»,
de Allan Kardec, no belo capítulo VIII — «Do Laboratório do Mundo Invisível» — é
fecundo em explicações que oferecem base para estudos e conclusões muito
profundas quanto à vertiginosa intensidade do plano invisível, a possibilidade de
realizações, ali, por assim dizer, «materiais», que as entidades desencarnadas
sempre afirmaram e que nos últimos tempos
DEVASSANDO O INVISÍVEL 11
12 DEVASSANDO O INVISIVEL
dão lugar aos fenômenos peculiares ao mundo invisível. Dentro da relatividade de
tudo, esses fluidos têm para os Espíritos, que também são fluídicos, uma
aparência tão material, quanto a dos objetos tangíveis para os encarnados, e são,
para eles, o que são para nós as substâncias do mundo terrestre. Eles os
elaboram e combinam para produzirem determinados efeitos, como fazem os
homens com os seus materiais, ainda que por processos diferentes.»
Os próprios Espíritos ditos sofredores, até mesmo os criminosos, que se
costumam apresentar em bem dirigidas sessões práticas, narram acontecimentos
reais, positivos, que no Invisível se sucedem, um modo de viver e de agir, no
Espaço, muito distanciado daquele estado vago, indefinível, inexpressivo, que
muitos entendem seja o único verdadeiro, quando a Revelação propala, desde o
início, um mundo de vida intensa, mundo real e de realidades, onde o trabalho se
desdobra ao infinito e as realizações não conhecem ocasos. Nas entrelinhas de
grandes e conceituadas obras doutrinárias, existem claras alusões a sociedades,
ou «colônias», organizadas no Além-Túmulo, onde avultam cidades, casas,
palácios, jardins, etc., etc. Na erudita e encantadora obra «Depois da Morte», do
eminente colaborador de Allan Kardec, Léon Denis, o qual, como sabemos, além
de primoroso escritor foi um grande inspirado pelos Espíritos de escol, à página
235 da 7ª edição (FEB), Cap. XXXV, a exposição dessa tese não somente é
fecunda e expressiva, como também mesclada de grande beleza, como tudo o
que passou por aquele cérebro e aquela pena. Diz Léon Denis, na citada obra:
«O Espírito, pelo poder da sua vontade, opera sobre os fluidos do Espaço,
combina-os e os dispõe a seu gosto, dá-lhes as cores e as formas que convêm ao
seu fim. É por meio desses fluidos que se executam obras que desafiam toda
comparação e toda análise. Construções
DEVASSANDO O INVISÍVEL 13
aéreas, de cores brilhantes, de zimbórios resplandecentes: circos imensos onde
se reúnem em conselho os delegados do Universo; templos de vastas proporções,
donde se elevam acordes de uma harmonia divina; quadros variados, luminosos:
reproduções de vidas humanas, vidas de fé e de sacrifício, apostolados dolorosos,
dramas do Infinito (1). Como descrever magnificências que os próprios Espíritos
se declaram impotentes para exprimir no vocabulário humano? É nessas moradas
fluídicas que se ostentam as pompas das festas espirituais. Os Espíritos puros,
ofuscantes de luz, se agrupam em famílias. Seu brilho e as cores variadas de seus
invólucros permitem medir a sua elevação, determinar os seus atributos. » (Os
grifos são nossos.)
E ainda outros trechos desse belo volume trazem informações a respeito do
assunto, bastando que o leiamos com a devida atenção, bem assim vários
capítulos de outra obra sua — «O Problema do Ser, do Destino e da Dor».
Em outro magnífico livro do grande Denis — «No Invisível» —, à página 470, no
cap. XXVI, da 3ª edição (FEB), há também este pequeno trecho,
profundocomplexo, sugestivo, descortinando afirmações grandiosas:
«Dante Alighieri é médium incomparável. Sua «Divina Comédia» é uma
peregrinação através dos mundos invisíveis. Ozanã, o principal autor católico que
já analisou essa obra genial, reconhece que o seu plano é calcado nas grandes
linhas da iniciação nos mistérios antigos, cujo princípio, como é sabido, era a
comunhão com o oculto.» (Os grifos são nossos.)
Assim se expressa o grande inspirado Léon Denis,
(1) São essas reproduções de vidas humanas que os Instrutores Espirituais dão a
ver aos médiuns, no Espaço, durante o sono letárgico, ou desdobramento, e dos
quais se originam os romances mediúnicos, sempre tão atraentes. Vêde capitulo
VI.
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em suas obras, e, se mais não transcrevemos aqui, será por economia de espaço,
que precisaremos atender. Do exposto, no entanto, deduziremos que a «Divina
Comédia» não apresenta tão somente fantasias, como imaginaram os próprios
eruditos, mas ocorrências reais do Além-Túmulo, que o poeta visionário mesclou
de divagações, talvez propositadamente, numa época de incompreensões e
preconceitos ainda mais intransigentes que os verificados em nossos dias (2).
Os preciosos volumes escritos pelo sábio psiquista italiano Ernesto Bozzano,
produto de severa análise científica, são férteis em apontar esses mesmos locais
do Invisível, revelados por Espíritos desencarnados de adiantamento moral-
espiritual normal, cujas comunicações, psicografadas por vários médiuns
desconhecidos uns dos outros, alguns até completamente alheios ao Espiritismo,
foram examinadas e cientificamente analisadas por aquele ilustre autor. Ser-nos-á
impossível transcrever, aqui, muitos trechos de Bozzano a respeito, visto que em
suas obras encontramos fartas observações em torno da tese em apreço. Limitar-
nos-emos a citar alguns trechos do interessante livro «A Crise da Morte», onde
substancioso noticiário encontraremos sobre o assunto, além de alguns «detalhes
fundamentais» da sua análise sobre comunicações com Espíritos desencarnados.
Assim é que, no «Décimo-quarto caso», analisando uma das comunicações
inseridas no mesmo volume, Bozzano observa que
— «a paisagem «astral» se compõe de duas séries de
(2) Dante Alighieri —Ilustre poeta e pensador italiano, nascido em 1265 e falecido
em 1321, autor do poema épico “Divina Comédia”, considerado “uma das mais
altas concepções do espírito humano”. Esse poema contém as ideias e a filosofia
da Idade Média e se divide em três pontos: o Inferno, o Purgatório e o Paraíso, e
figura uma viagem do poeta ao Mundo Invisível. Pode-se acrescentar que essa
obra imortal criou a poesia e a linguagem italianas.
DEVASSANDO O INVISIVEL 15
objetivações do pensamento, bem distinta uma da outra. A primeira é permanente
e imutável, por ser a objetivação do pensamento e da vontade de entidades
espirituais muito elevadas, prepostas ao governo das esferas espirituais inferiores;
a outra é, ao contrário, transitória e muito mutável; seria a objetivação do
pensamento e da vontade de cada entidade desencarnada, criadora do seu
próprio meio imediato. » (3) (Os grifos são nossos.)
À página 153 da referida obra, nas «Conclusões» relativas ao último caso,
leremos o seguinte, no «detalhe
fundamental» n9 6:
«Terem-se achado (os Espíritos recém-desencarnados) num meio espiritual
radioso e maravilhoso (no caso de mortos moralmente normais), e num meio
tenebroso e opressivo (no caso de mortos moralmente depravados).»
No «detalhe» n9 7:
(3) Certa vez, durante um transporte em corpo astral, tivemos ocasião de visitar,
no Espaço, conduzida pelo Espírito de nossa mãe, uma tia falecida havia três
anos, Sra. Ernestina Ferraz, de quem fôramos muito amiga e de quem
recebêramos, sempre, muitas provas de dedicação e ternura maternal, sobre a
Terra. Recebeu-nos em “um meio imediato”, segundo as expressões de Bozzano,
criado por ela própria, pois havia um salão de visitas idêntico ao de sua antiga
residência terrena, com o velho piano de carvalho que fora seu (ou a sua
reprodução fluidica), e que, presentemente, se encontra em nosso poder. Aberto,
com a partitura no local devido, o piano fluídico era dedilhado por sua irmã caçula,
Luísa, também já falecida, a qual ela própria educara, inclusive ensinando-lhe
música. Tal a realidade da criação que, talvez perturbada com a situação frisante,
exclamámos, algo vexada:
— Oh, titia! O seu piano está necessitado de um reparo.., está desafinado.., mas
prometo que o mandarei consertar.
E ela, prontamente:
— Não te incomodes, minha filha, com este meu piano...
Presentemente, o piano, devidamente conservado, é mantido como recordação da
boa amiga que tanto nos serviu.
16 DEVASSANDO O INVISIVEL
«Terem reconhecido que o meio espiritual era um
novo mundo objetivo, substancial, real, análogo ao meio
terrestre espiritualizado. »
No «detalhe» n9 8:
«Haverem aprendido que isso era devido ao fato de que, no mundo espiritual, o
pensamento constitui uma força criadora, por meio da qual todo Espírito existente
no mundo «astral» pode reproduzir em torno de si o meio de suas recordações.»
No «detalhe» n’ 12:
«Terem aprendido que os Espíritos dos mortos gravitam fatalmente e
automàticamente para a esfera espiritual que lhes convém, por virtude da lei de
afinidades.» (Os grifos são nossos.)
E ponderamos nós: Se os Espíritos dos mortos fatalmente e automàticamente
gravitam para a esfera espiritual que lhes convém, é que tais esferas existiam
mesmo antes de eles para lá gravitarem, criadas, certamente, por outros Espíritos,
com os quais passarão a colaborar, na medida das próprias forças. Com efeito. No
«detalhe secundário» 11’ 4, do mesmo caso, Bozzano analisa:
«Acham-se de acordo (as almas dos mortos) em afirmar que, embora os Espíritos
tenham a faculdade de
criar mais ou menos bem, pela força do pensamento, o
que lhes seja necessário, todavia, quando se trata de
obras complexas e importantes, a tarefa é confiada a
grupos de Espíritos que nisso se especializaram. »
Dentre as comunicações analisadas por Bozzano, ressaltaremos as concedidas
pelo Espírito do inesquecível artista cinematográfico Rodolfo Valentino, falecido
em Agosto de 1926, à sua esposa Natacha Rambowa, nas sessões realizadas em
Nice, na França, e consideradas cientificamente muito importantes, nas quais são
citados pormenores desse mundo espiritual, e que muito edificam os estudiosos.
Não nos furtaremos ao prazer de
DEVASSANDO O INVISIVEL 17
oferecer ao leitor um substancioso trecho das mesmas comunicações. Assim se
expressa o Espírito do célebre «astro», através da psicografia do médium norte-
ameri cano, Jorge Benjamim Wehner, dirigindo-se à sua esposa:
— «Aqui, tudo o que existe parece constituído em virtude das diferentes
modalidades pelas quais se manifesta a força do pensamento. Afirmam-me que a
substância sobre que se exerce a força do pensamento é, na realidade, mais
sólida e mais durável do que as pedras e os metais no meio terrestre. Muitas
dificuldades encontrais, naturalmente, para conceber semelhante coisa, que,
parece, não se concilia com a ideia que se pode formar das modalidades em que
devera manifestar-se a força do pensamento. Eu, por minha parte, imaginava
tratar-se de criações formadas de uma matéria vaporosa; elas, porém, são, ao
contrário, mais sólidas e revestidas de cores mais vivas, do que o são os objetos
sólidos e coloridos do meio terrestre... As habitações são construídas por Espíritos
que se especializaram em modelar, pela força do pensamento, essa matéria
espiritual. Eles as constroem sempre tais como as desejam os Espíritos, pois que
tomam às subconsciências destes últimos os gabaritos mentais de seus desejos. »
(Os grifos são nossos.)
Um livro ainda mais antigo do que as obras de Bozzano — «A Vida Além do Véu»
— obtido também mediiinicamente pelo pastor protestante Rev. G. Vale Owen,
tornou-se célebre no assunto, pois que o Espírito da genitora do próprio médium
narra ao filho, em comunicações periódicas, as mesmas construções fluídicas do
mundo espiritual, isto é, jardins, estradas pitorescas, habitações, cidades, etc.
Semelhante médium é, certamente, insuspeito, visto que, como protestante,
seriam bem outras as ideias que alimentaria quanto à vida espiritual. Tais
comunicações, em sua maioria, datam do ano de 1913. Convém deliciarmos,
ainda, as nossas almas
18 DEVASSANDO O INVISÍVEL
com alguns pequenos trechos de tão interessante livro:
— «Pode agora fazer-me o favor de descrever sua casa, paisagens, etc. ?
pergunta o Rev. Vale Owen
ao Espírito de sua mãe.
E este responde:
— «E’ a Terra aperfeiçoada. Certo, o que chamais quarta dimensão, até certo
ponto existe aqui, mas não podemos descrevê-la claramente. Nós temos montes,
rios, belas florestas, e muitas casas; tudo foi preparado pelos que nos
precederam. Trabalhamos, atualmente, por nossa vez, construindo e regulando
tudo para os que, ainda durante algum tempo, têm que continuar a sua luta na
Terra. Quando eles vierem, encontrarão tudo pronto e preparado para recebê-los.
»
— «O tecido e a cor do nosso vestuário tomam a sua qualidade do estado
espiritual e do caráter de quem o usa. (O grifo é nosso.) O nosso ambiente é parte
de nós mesmos e a luz é um importante componente do nosso ambiente.
Entretanto, é de poderosa aplicação, debaixo de certas condições, como
poderemos ver naqueles salões .
«Não teriam de ser demolidas (as edificações), para aproveitar-se depois o
material em nova construção. Seria ele aproveitado com o prédio em pé. O tempo
não tem ação de espécie alguma sobre as nossas edificações. Elas não se
desfazem nem se arruínam. Sua durabilidade depende apenas da vontade dos
donos, e, enquanto eles quiserem, o edifício ficará de pé, podendo ser alterado ou
modificado consoante seus desejos.
— «...porque estas esferas são espirituais e não materiais.» (Grifo nosso.)
E o livro todo assim prossegue, em revelações belas e simples, lógicas e
edificantes, o que confirma o noticiário de muitos médiuns, que também chegam a
verificar tais realidades do mundo invisível durante seus desdobramentos em
espírito.
DEVASSANDO O INVISÍVEL 1
Mas não é só. Um livro encantador, «No Limiar do Etéreo», publicado em 1931, de
autoria do ilustre Dr.
J. Arthur Findlay, pesquisador dos fenômenos espíritas na erudita Inglaterra, que
tantos excelentes investigadores do Psiquismo concedeu ao mundo, conta, no
capítulo X — Noites de Instrução» —, o diálogo mantido, du- rante uma sessão
íntima com o célebre médium Sloan, com um Espírito que lhe respondia através
do fenômeno da voz direta e do qual destacamos os seguintes trechos:
— «Poderá dizer-me algo com relação ao vosso mundo?
— Todos os que estão num mesmo plano podem, como já disse, ver e tocar as
mesmas coisas. Se olhamos para um campo, é um campo o que todos vemos.
Cada coisa é a mesma para os que se acham nas mesmas condições de
desenvolvimento mental. Não é um sonho. Tudo é real para nós outros. Podemos
sentar-nos juntos e gozar da companhia uns dos outros, precisamente como
fazeis na Terra. Temos livros e podemos lê-los. Temos as mesmas sensações que
vós. Podemos dar longos passeios por uma região e encontrar um amigo a quem
não víamos desde muito tempo. Das flores e dos campos aspiramos os aromas,
como vós aí. Apanhamos flores, como o fazeis. Tudo é tangível, porém num grau
mais alto de beleza do que tudo na Terra.
— Assemelha-se à nossa a vossa vegetação?
— De certo modo, mas é muito mais linda.
— Como são as vossas casas?
— São quais as queremos. As vossas aí são primeiro concebidas em mente,
depois do que se junta a matéria física para construí-las de acordo com o que
imaginastes. Aqui, temos o poder de moldar a substância etérea, conforme
pensamos. Assim, também as nossas casas são produtos das nossas mentes.
Pensamos e cons
DEVASSANDO O INVISÍVEL
truímos. E’ uma questão de vibração do pensamento e, enquanto mantivermos
essas vibrações, conservaremos o objeto que, durante todo esse tempo, é objetivo
para os nossos sentidos. »
Tão explicativo esse X capítulo de «No Limiar do Etéreo», que temos pesar de não
ser possível transcrever mais alguns trechos para as nossas páginas, os quais,
acreditamos, edificariam os leitores, se se tornassem conhecidos. Também os
livros recebidos pela médium Zilda Gama, ditados pelo Espírito de Vítor Hugo,
num total de cinco boas obras, referem os mesmos noticiários, não obstante o
fazerem mui discretamente, destacando-se, dentre todos, um que já se tornou
célebre, porque editado em Esperanto pela FEB (tradução do Prof. Porto Carreiro
Neto) e correndo o mundo inteiro: «Na Sombra e na Luz».
Não relataremos aqui, por muito conhecidas dos leitores, as obras ditadas pela
entidade desencarnada André Luiz, e tão-pouco «Memórias de um Suicida», onde
o assunto é pormenorizado com as maiores franquezas. Fica ao leitor o cuidado
de estudar, portanto, as obras básicas, em geral, e as comunicações isoladas,
mesmo as provenientes de entidades sofredoras, com atenção e amor, meditando
e refletindo sobre tudo, sem espírito de prevenção, porque nas suas entrelinhas e
nos seus detalhes encontrará referências positivas sobre o interessante assunto.
E vale, ainda, declarar que não deveremos julgar sejam tais revelações realidades
existentes em outros planetas. Não! Os termos dos Espíritos são categóricos:
trata-se de esferas fluídicas do mundo invisível. Ao contrário, aos médiuns
inclinados a acreditarem que aquelas descrições traduziriam a vida em diferentes
planetas, os próprios Espíritos instrutores advertiram, chamando-
-lhes a atenção para o fato de que não se tratava de planetas materiais e sim do
Mundo Espiritual, a verdadeira pátria do Espírito.
DEVASSANDO O INVISÍVEL 21
Costumam alegar, os contraditores, que as obras ditadas mediinicamente,
contendo tais conceitos, seriam mistificações (o eterno recurso, ou o escudo de
que se servem aqueles que se sentem contrariados, sempre que assuntos novos
e, sobretudo, inéditos, são apresentados), ou «fantasias do cérebro de médiuns
ignorantes», como se expressam alguns, em oratórias entusiastas. Lembraremos,
porém, que as obras de Léon Denis estão recheadas dessas informações, e Léon
Denis, o grande continuador de Kardec, foi um filósofo, um escritor grande- mente
inspirado pelas forças superiores do Alto, e não um ignorante; que Ernesto
Bozzano afirmou, cientificamente, a mesma coisa, após suas admiráveis análises,
e Bozzano era um sábio, dos mais ilustres psiquistas do século XX; que o Rev.
Vale Owen, obtendo do Espírito de sua veneranda mãe as mesmas revelações,
não poderia ser um «médium ignorante», cujo cérebro criasse extravagâncias,
porque, como pastor protestante inglês, teria curso brilhante de algum seminário e
nem seria espírita; que o Sr. J. Arthur Findlay era um cérebro vigilante, eminente e
idôneo perquiridor do Psiquismo experimental, escritor e intelectual de renome,
não podendo, portanto, ser tachado de ignorante; que Zilda Gama, em cujas obras
encontramos as mesmas revelações, conquanto mais discretas, é uma professora
assaz culta e não um «médium ignorante» que Francisco Cândido Xavier não é
douto, mas tem dado a público livros de valor incontestável, que honrariam a
memória de muitos doutos, se estes pudessem escrever coisas semelhantes; e os
dois Espíritos — Emmanuel e André Luiz — que a esse médium ditam as obras,
têm dado testemunhos de muita lucidez e sabedoria, abordando teses variadas,
sempre analisadas por pessoas cultas e muito capazes, para serem tachados de
mistificadores. . . E que os próprios livros de Allan Kardec, oferecendo, à farta,
base para todas essas revelações e noticiários, conforme ci-
22 DEVASSANDO O INVIStVEL
támos linhas atrás, jamais foram considerados frutos de
mistificações.
De outro modo, se um médium que ama a Doutrina Espírita e por ela se sacrifica,
sem outro interesse senão o de servi-la; que a tudo no mundo renuncia, a fim de
conservar sua independência, para melhor se dedicar aos deveres que ela impõe,
até mesmo as mais santas aspirações do coração; se um médium que
moralmente se renova para Deus, através das mais duras provações e
humilhações diárias, sofrendo ataques de adversários até no seio da própria
Doutrina e padecendo, não raro, perseguições e vitupérios dentro do próprio lar;
se um médium, que morreu para si mesmo, a fim de melhor ressurgir para Deus e
tornar-se digno de se comunicar com os Espíritos iluminados, no intuito de bem
servir ao próximo e à Causa, não obtiver do seu Mestre Jesus -Crist e dos bons
Espíritos, a quem procurou honrar, senão mistificações de tal vulto, será melhor a
todos os adeptos do Espiritismo fechar os códigos da Doutrina e cuidar de vida
nova! Atribuir as revelações sobre a realidades do mundo invisível a mistificações
de entidades inferiores é desconhecer que, presidindo ao movimento do
Consolador neste mundo — como tão bem esclareceu Allan Kardec — há um
Espírito Celeste, a quem o Criador outorgou direitos sacrossantos sobre a Terra, o
qual não seria capaz de consentir, certamente, que essa Humanidade, pela qual
ele próprio se imolou em suplício numa cruz, fôsse tão grosseiramente iludida por
tanta gente, deste e do outro mundo... quando, afinal de contas, o Consolador, em
si mesmo, é fruto tão só da mediunidade.
Prosseguiremos, portanto, visto que o tema é profundo, prestando-se a
desdobramentos.
*
**
DEVASSANDO O INVISÍVEL 23
Quem, dentre nós, já assistiu aos últimos momentos de um moribundo poderá,
muitas vezes, observar os fatos aqui ventilados. O decesso de uma criatura que
retorna à verdadeira pátria — a espiritual —, tais sejam as circunstâncias, oferece
lições tão elucidativas quanto comoventes e belas. Durante o nosso longo trabalho
de assistência a enfermos e moribundos, tivemos ocasião para as mais edificantes
observações. Os tuberculosos, principalmente, que comumente expiram em plena
consciência dos seus últimos momentos sobre a Terra, apresentam vasto cabedal
para estudo.
Durante o período da agonia, eles como que desmaiam. Será o chamado estado
de coma. Um tênue fio fluídico os prende, ainda, ao fardo material que vai ser
abandonado. Foge-lhes a pulsação mantenedora da vida orgânica. Palidez
impressionante recobre suas feições, que descaem e se enrijecem. As pálpebras
cerradas encobrem os olhos, que as nuanças da morte já velaram de um
embaciamento significativo, mas suores abunda.ntes e fugitivo pulsar do coração
avisam que não foi ainda de todo libertada a pobre alma cativa naquele corpo. Ali
estão, porém, à beira do leito mortuário, a mãe angustiada, o pai acabrunhado, a
esposa lacrimosa, o filho inconsolável... Um choro violento, um brado de dor
pungente, a grita atormentada dos que ficam, sem poderem reter o ser amado que
se vai, quebra o silêncio augusto que deve presidir à cena patética de uma alma
que entrou em trabalho de libertação para a verdadeira vida. Então, o agonizante,
a custo, descerra as pálpebras. Volta-lhe a pulsação, volta-lhe até mesmo a
palavra. Um impulso de vontade e apego aos que lhe fora.m caros ao coração fá-
lo reviver, por instantes, num corpo que se achava quase definitivamente
abandonado. Com voz sussurrante, débil, balbucia:
— Oh! Porque me chamaram?... Eu estava tão bem.., num lugar tão belo!...
24 DEVASSANDO O INVISÍVEL
Foram as frases que pronunciou, certa vez, uma jovem agonizante de dezoito
primaveras, a cuja cabeceira
nos postávamos em prece, quando sua mãe, inconsolável,
e as irmãs se debulhavam em pranto desesperado... Ouvindo-a, perguntámos-lhe,
baixinho, enquanto rogávamos
a assistência dos seus tutelares, para que a ajudassem
a desprender-se dos pesados liames carnais: (4) Em que lugar te encontravas,
minha filha?...
Como era esse local?
Ela respondeu naturalmente, como se não fora uma
agonizante:
— Ah! Mas era um jardim delicioso e fresco... Cheio de flores lindas e
perfumosas... como nunca havia visto iguais... Um luar azul coloria-o todo...
— Viste alguém?
Sim... Umas sombras vaporosas me rodeavam...
Quem eram?
— Não pude reconhecê-las.., eu dormitava.., estou com tanto sono...
— Estavas sentada, caminhavas?
— Não, estava deitada, assim.., sobre a relva dos canteiros... E’ um jardim tão
lindo.., estou tão cansada...
Cerrou novamente os olhos e silenciou. Alguns minutos depois, expirava, serena e
docemente, sob nossas preces, sem que ninguém mais da família se animasse a
perturbá-la na sua consoladora paz.
Na década de 1930, as revelações sobre as realidades do mundo espiritual já
eram conhecidas dos adeptos
(4) Srta. Aldacira Figueiras, falecida na cidade de Barra do Pirai, Estado do Rio de
Janeiro, no ano de 1942, filha do Sr. Sebastião Figueiras, antigo Comandante da
Força Pública local, também já falecido.
DEVASSANDO O INVISIVEL
mais estudiosos da Doutrina Espírita, visto que elas foram concedidas aos
homens, como vimos, desde muito. André Luiz, porém, a eminente entidade
espiritual que tão substanciosos esclarecimentos nos vem ministrando através da
mediunidade de Francisco Cândido Xavier, não aparecera ainda com as
minudências explicativas da vida em Além-Túmulo. Guardávamos, pois,
desencorajada de apresentá-las a público, três das nossas obras já hoje editadas
(5), e isso em virtude de, na época em que foram as mesmas psicografadas,
conhecermos poucos livros doutrinários, não tendo ainda meditado satisfatà
riament
nem mesmo sobre as obras de Allan Kardec, como posteriormente os próprios
instrutores espirituais nos levaram a fazer. Receávamos que as revelações nelas
contidas fôssem fruto de lamentável engano, e nos detínhamos, conservando as
ditas obras no esquecimento, mas desencorajada de destruí-las. Também nós
acreditávamos a vida espiritual abstrata, indefinível, e quando nosso Espírito era
arrebatado, constatando a vida intensa dos planos espirituais, e suas belezas
ambientes, supúnhamos haver gravitado para um planeta melhor, um mundo
material, tais como Saturno, Júpiter ou outro qualquer, ignorando, pela época,
quão difícil é isso, tanto para um encarnado como para um desencarnado, não
obstante as suposições em contrário. Nossos amigos espirituais, porém, corrigiam
nosso entusiasmo interplanetário, se assim nos podemos expressar, e diziam, sem
serem por nós acatados em tais asserções durante mui-
to tempo:
— Não se trata de ambientes planetários... São realizações fluídicas do próprio
Espaço. . . Não saíste dos ambientes terrenos. . Procura aprender. . . Estuda,
estuda..
25
26 DEVASSANDO O INVISIVEL
Ora, no mês de Julho de 1935, esposando nós ainda a mesma ideia, de que
visitávamos outros planetas durante o fenômeno do desdobramento espiritual,
tivemos a mão sàbitamente acionada pelo Espírito daquele que fora o nosso pai
terreno, antigo médium de boas faculdades curadoras, mas cuja instrução
doutrinária não passara da leitura de «O Livro dos Espíritos» e do Evangelho
segundo o Espiritismo», ambos de Allan Kardec. Havia ele falecido a 25 de
Janeiro do mesmo ano, e era a primeira vez que se comunicava mais
demoradamente, tudo indicando que assim fazia no intuito de esclarecer
justamente aquilo em que nos reconhecia equivocada.. Dizia ele,
psicogràficamente, descrevendo as impressõe5 vividas durante a rápida agonia
que teve, e depois as estranhezas no Além-Túmulo:
— «. . . Acabei por perder mesmo os sentidos ou adormecer, não sei ao certo... e
não pude ver mais nada... Quando despertei, já não me encontrava deitado em
meu leito, o que me surpreendeu, pois não me lembrava de tê-lo abandonado
antes. Fui despertando com lentidão. Eu ouvia e percebia muita coisa, mas
confusamente, e não me podia mexer nem abrir os olhos, e sentia frio. Parecia
antes um entorpecimento, que se desfizesse ao poucos, em vez do despertar de
um sono, o estado em que me encontrava. Sentia-me sentado numa cadeira de
balanço e compreendia que fora transportado para local muito aprazível, fresco,
ameno. O dia estava lindíssimo, com um céu muito claro, sol faiscante, e suave
brisa baloiçava uns galhos de flores trepadeiras, que eu vaga- mente percebia
junto de mim, os quais cheiravam muito agradàvelmente, pois me encontrava
numa espécie de varanda orlada de trepadeiras floridas, em uma casa igualmente
aprazível, mas desconhecida para mim. Fazia muito silêncio e eu me encontrava
só. O único rumor partia do orquestrar longínquo de uns pássaros, verdadeira
melodia que ressoava aos meus ouvidos com delicadeza e
-
DEVASSANDO O INVIStVEL 27
ternura (6). A princípio, imaginei encontrar-me em casa de minha cunhada
Ernestina, onde havia também uma varanda e pássaros cantadores presos em
gaiolas. Posteriormente, porém, verifiquei tratar-se de uma residêneia fluídica de
Além-Túmulo, onde morava minha mãe e onde eu próprio iria residir como
desenca.rnado...»
Mais adiante, continuava a narrativa, recordando as
primeiras impressões de recém-liberto:
— «Não compreendia bem o que se passava. Espreguicei-me muito, pois sentia
os órgãos (do perispírito) meio entorpecidos. Bocejei e tossi com estrondo, como
habitualmente fazia, e fumei um cigarro (7). O dia era tão lindo, com a atmosfera
mesclada de azul, que me levantei, reanimado, e debrucei-me à varanda, a fira de
apreciar a paisagem. Sentia-me bem de saúde, nenhum mal-estar físico me
importunava. Procurei ver os pássaros, que continuavam a cantar, mas não
consegui avistá-los. Aspirei os perfumes das flores trepadeiras e pus-
-me a assoviar minhas melodias preferidas. Sentia-me satisfeito e não pensava
absolutamente nada. Dir-se-ia que minha mente repousava. Li, depois, um jornal,
ali mesmo, na varanda, e tomei uma xícara de café, como de hábito. Penso que
me encontrava assaz abstraído, pois não percebi quem me servira o café e me
obsequiara com o jornal... Resolvi, então, fazer um passeio, o que havia muito não
me era permitido. Mas, si’ibitamente, lembrei-me de que não deveria fazê-lo,
porque me encontrava debilitado, doente... Pus-me a relembrar de tudo o que se
passara comigo mesmo, nos últimos tempos, e a confusão estabeleceu-se.., e
terminei desconfiando que algo irremediável, mas muito importante, adviera em mi
(6 A entidade comunicante amava os pássaros e costumava deter-se longo tempo
a ouvir o cântico dos canárlos
que possuía, quando encarnada.
(7) Vêde “O Livro dos Médiuns”, Cap. VIII — “Laboratório do Mundo Invisível”.
28 DEVASSANDO O INVISIVEL
nha vida... A morte é tão simples, tão pouco diferente da vida, que opera essa
confusão... Em geral se espera encontrar, depois da morte, coisas fantásticas,
imaginárias, impossíveis e pouco lógicas, ao passo que, em verdade, o Além-
Túmulo nada mais é que a continuação da vida que deixámos... Pelo menos,
assim o foi para mim. O senso da responsabilidade, o exame angustioso dos de-
méritos, assim como o reconforto do dever que se observou, sàmente advêm mais
tarde. . . »
Alongam-se os detalhes, narrando a presença de entidades amigas, que de início
não reconheceu, e conclui:
— «Então, surpreendido, vi mamãe aproximar-se de mim, caminhando ao longo
da varanda. Trajava longo vestido branco e achei-a bonita e rejuvenescida, tal
como na época em que enviuvara, isto é, nos seus vinte e cinco anos de idade.
Curvou-se afetadamente diante de mim, para cumprimentar, como se desejasse
brincar, e exclamou, risonha: — «Louvado seja Deus, meu filho! Que boa
surpresa, você poder vir para junto de sua mãe!. . . » Sàmente então, caindo em
mim, recebi um como choque de espanto, como quem despertasse de um
marasmo metal, e compreendi o que se passava. Em rápido rememorar, deslizou
à minha imaginação tudo quanto ocorrera, tal se uma faixa luminosa reproduzisse
diante dos meus olhos as cenas que eu necessitava ver para meu esclarecimento:
meu corpo inerte dentro de um caixão mortuário, vocês chorando por mim, meu
enterro, humilde e pobre, e minha sepultura coberta de flores ainda frescas. Havia
três dias que se dera o decesso. Então, eu chorei também, comovido e
amedrontado...
.0 lugar onde vivo é uma pequena «cidade», pobre, mas pitoresca. Muito
aprazível, sossegada, indicada para a convalescença daqueles que, como eu,
atravessaram uma existência de penúrias e provações, e convidativa para a
meditação e a reorganização das ideias para as futuras tentativas espirituais e
terrenas. Há, aqui,
DEVASSANDO O INVISIVEL 29
jardins, lagos e rios muito belos e muito azuis, como refletindo o céu, tal como os
daí. Tenho observado, no entanto, que nem os rios nem os lagos serão
prôpriamente formados pela água, como aí. Dir-se-ia tratar-se de gases
singulares, de líquidos fluidificados que imitariam ou equivaleriam às águas
terrenas. Silêncio constante, só quebrado pelo cântico de mil pássaros, que não
se deixam ver. Como ainda não trabalho, pois sou convalescente de uma
existência de sofrimentos e amarguras intensas, faço passeios e admiro as
belezas do ambiente, o qual, não obstante modesto, é a que de mais agradável eu
poderia aspirar. E’ uma coisa tão linda e singular que me faltam palavras para
descrevê-la... Não pensei, quando «vivo», pudesse alguém residir em local assim,
depois de desencarnado, e ainda não compreendi bem como pode ser tudo isso...
Mas o Dr. Carlos (8) diz que farei um estudo sobre todos esses assuntos e os
compreenderei integralmente, muito breve, porquanto este ambiente em que vivo
é espiritual e não planetário...»
Presentemente, esse Espírito, que em 1935 assim se expressava, encontra-se
internado em um «Reformatório» do Invisível, para fazer um curso, ou
aprendizado, de cuja natureza não fomos informada, mas tendo em vista uma
próxima encarnação, em que grandes responsabilidades lhe caberão.
Um raciocínio sereno, ponderado, isento de prevenções, levar-nos-á a concluir,
por tudo isso, que o Mundo Invisível não poderia, mesmo, ser uma abstração, o
vácuo onde nada existisse, pois semelhante hipótese seria a negação do próprio
Poder Divino, seria quase o «nada» dos negativistas, depois da morte. A própria
qualificação «Mundo Invisível» está a indicar que algo
(8) A entidade espiritual Charles, Espírito-guia da família.
30 DEVASSANDO O INVISÍVEL
existe, sim, mas que os olhos carnais do homem são impotentes para contemplar.
De outro modo, declarando os Espíritos esclarecidos, como sempre o fizeram, que
a vida de Além-Túmulo é intensíssima, real; que lá as entidades desencarnadas (e
até as encarnadas, com especialidade as almas aplicadas a um desejo de
progresso mais rápido ou a um ideal a favor da Humanidade) fazem aprendizados,
estudos variados, realizam tarefas e missões em torno de causas nobres e a bem
do próximo; que existem regiões no Espaço (esferas) (9) interditadas a entidades
inferiores, pontos onde se aglomeram Espíritos de sábios, e ainda outros onde se
reúnem artistas, etc., necessàriamente estarão afirmando, em essência, que na
vida espiritual existirá tudo o que necessitaremos para a realização dos mesmos
aprendizados, estudos, tarefas e missões. E se tudo isso existe, porque não
existirão as demais realidades que vêm sendo reveladas desde sempre?... Ao
demais, todos os Espíritos que se referem à vida do Além asseveram não
encontrar palavras bastante expressivas para descreverem não só a intensidade,
como a harmonia e a beleza do mundo espiritual. Suas palavras, as descrições
que fazem desses locais, ou criações do Invisível, e que dão a ver aos médiuns,
estes só poderão transmitir empalidecidas pelo constrangimento da palavra
humana, tão pobre e imperfeita que até mesmo as regiões mais simples do plano
astral não são descritas a contento.
Para transmitirem o que até hoje há sido trazido às criaturas pelos Guias
Espirituais, é-lhes necessário criar imagens para os médiuns, imagens estas
subordinadas ao grau de concepção e poder assimilativo dos mesmos, o que
obrigará à própria faculdade mediúnica uma operação mental, um jogo de
tradução, se de tal expressão nos poderemos servir, que nem sempre reproduzirá
com
(9) “O Livro dos Espíritos” — Perguntas 87 e 402.
DEVASSANDO O INVISÍVEL
fidedignidade as informações e os esclarecimentos que o Espírito comunicante
pretende prestar. Ainda assim, para que tais coisas se façam, verdadeiras torturas
serão necessárias ao médium e ao seu Instrutor Espiritual. Em primeiro lugar, o
médium deverá redobrar esforços no sentido de renovar-se, moral e mentalmente,
durante o período de adestramento das faculdades, a fim de, na época oportuna,
conseguir fácil intercâmbio com a Espiritualidade mais alta, comunhão que terá de
ser constante, permanente, através dos atos cotidianos e não sômente às horas
de trabalho objetivo, de modo a que a permuta de vibrações o prepare
satisfatôriamente para o melindroso ministério e o conserve unido a seus
dedicados mentores espirituais.
Tal como esclarecem os códigos da Doutrina Espírita e a prática da mediunidade
confirma, suas vibrações, suas faculdades em geral, no momento do intercâmbio
mediúnico, terão de ser potenciadas ao máximo que sua natureza física, psíquica
e mental suportarem, o que para ele equivalerá a uma operação transcendental
algo torturante, enquanto a entidade instrutora comunicante deverá rebaixar suas
próprias vibrações e demais faculdades, até equipará-las, ou harmonizá-las, com
as do médium, o que, igualmente, para aquela entidade, será como tortura e uma
abnegação dignas do nosso respeito e da nossa veneração. Em tais ocasiões, o
médium poderá entrever o mundo invisível. Frequentemente ele o percebe.., e o
que aí enxerga ou apreende não consegue explicar integralmente, porquanto não
dispõe o cérebro humano dos necessários recursos para uma transmissão
perfeita. Durante suas fugas em corpo astral, pelo Espaço em fora, o que ele vê e
presencia, com seus Guias, não é, de forma alguma, um aglomerado de sombras,
o vácuo ou o invisível inexpressivo (10). É, sim, uma
(10) Em muitas reuniões de experimentação, é frequen
32 DEVASSANDO O INVISIVEL
vida intensa, real, ativa, superior, espiritualizada, onde o que existe é
superlativamente melhor e mais belo do que o existente na Terra, referência feita
aos planos felizes do mesmo Invisível. Está acima de tudo quanto o seu cérebro
pudesse inventar, pois não percamos de vista o fato de que, geralmente, os
médiuns não têm cultura intelectual tão sólida para poderem criar, por si mesmos,
assuntos dos quais, às vezes, jamais ouviram falar, senão vasto cabedal psíquico
armazenado, em sua subconsciência, desde passadas existências, fáceis de seus
Guias-Instrutores acionarem, a fim de poderem transmitir, ou compreender, o que
vêem.
De tudo quanto a respeito observamos, e do que a Revelação Espírita nos
participa, chegaremos, pois, às conclusões seguintes, as quais, para a maioria dos
adeptos do Espiritismo, não serão, certamente, surpreendentes novidades:
As construções do meio invisível são edificadas com
as essências disseminadas pelo Universo infinito, para a
te o médium que obtém a comunicação, ou outros que a elas assistem,
distinguirem o panorama ou os ambientes mentais que circundam o Espírito
comunicante. Recentemente, em certa sessão para cura de obsessões, realizada
num Centro Espírita do Méier, E. da Guanabara, durante a manifestação do
Espírito de um infeliz ébrio, que atuava sobre um pobre homem, chefe de
numerosa família, impelindo-o à embriaguez, foram vistos, pelos médiuns
presentes, um barril de aguardente e um cenário como de taverna, enquanto forte
cheiro de álcool, percebido por todos os presentes, se derramava pela sala. Na
cidade de Pedro Leopoldo, em uma sessão do Grupo “Meimei”, na qual tomava
parte o conceituado médium Francisco Cândido Xavier, em Março de 1956,
comunicava-se, por um dos médiuns presentes (Geraldo Rocha), o Espírito de um
bispo católico. Essa entidade não só se deixou ver, por várias das pessoas
presentes, envergando trajes sacerdotais, como também o ambiente em que vivia
como desencarnado: um belíssimo recanto de Catedral, com os vitrais fluindo
luzes multicores de grande efeito.
DEVASSANDO O INVISIVEL 33
realização dos desígnios da Providência a nosso respeito, isto é, para a criação de
quanto seja útil, necessário e agradável ao nosso Espírito, quer se encontre este
sobre a Terra, reencarnado, ou fruindo os gozos da Pátria Espiritual; trata-se do
fluido cósmico universal, ou de certas modificações deste, de que se origina o
fluido espiritual; do éter fecundado, fonte geradora de tudo quanto há dentro da
Criação, inclusive os próprios planetas materiais e o nosso perispírito.
Daremos a essas realizações espirituais o nome que quisermos, ou que a pobreza
da nossa linguagem puder interpretar. O certo é que tais essências, tais fluidos, ão
tão reais, tão concretos para os desencarnados como os elementos do mundo em
que vivemos o são para nós. Ünicamente, os desencarnados construirão, no
mundo espiritual, de maneira bem diversa daquela que empregamos na Terra. No
Espaço, como, aliás, na Terra, a vontade é soberana, o pensamento é motor, é
produtor, é criador. Reúne-se, por exemplo, um grupo, uma falange de Espíritos
evoluídos, que resolvem criar uma comunidade social no Espaço, destinada a
acelerar seus trabalhos e iniciativas em prol do progresso e do bem comum. São
espiritualmente homogêneos, dotados de elevadas capacidades morais,
intelectuais e artísticas, além de serem técnicos no assunto. Seus pensamentos
vibram uníssonos, do que resultam irradiações e movimentações poderosas,
coordenadoras, intensas até ao deslumbramento e ao incompreensível para nós
outros, os mortais inferiores. Eles já teriam programado o que desejavam produzir:
uma escola para a reeducação geral de Espíritos frágeis que delinquiram nas
experiências terrenas; um asilo ou reformatório, um hospital para o reajustamento
mental ou vibratório de pobres sofredores que partiram da Terra envoltos em
complexos deploráveis; um palácio para reuniões solenes, uma cidade. A força
motora dos seus pensamentos poderosamente associados
2
34 DEVASSANDO O INVIStVEL
e disciplinados, irradiando energias cuja natureza o homem ainda não poderá
conceber, agirá sobre aqueles fluidos e essências e edificará o que antes fora
delineado e desejado. Comumente, esse trabalho é lento e requer perseverança
para o seu aperfeiçoamento. Será tanto mais rápido quanto maiores forem as
potências mentais criadoras reunidas. Essas criações, tais como forem
— belas, artísticas, verdadeiros trabalhos de ourivesaria fluídica, deslumbrantes,
mesmo, por vezes — obedecerão, no entanto, às recordações ou gosto estético
dos opera- dores, razão por que se parecem com as da Terra, sem que as da
Terra se pareçam com elas, como afirmou algures a ilustre entidade espiritual
André Luiz, pois que muito mais perfeitas são elas do que os homens julgam.
Não obstante, somos levada a julgar, graças às mesmas observações a que nos
conduz a Revelação, que essas edificações não serão permanentes nem fixas
numa determinada região. Serão antes móveis, transplantando-
-se para onde se faça necessária a presença da falange que as criou. Serão
passíveis de se dissolverem sob o desejo dos seus criadores, ou de se
modificarem segundo as conveniências. Se essa falange receber em seu seio
discípulos e pupilos, estes poderão tornar-se cooperadores, exercitando os
próprios poderes mentais na criação de detalhes, sujeitos ao veredicto dos
mestres, e assim progredirão em saber, desenvolvendo forças latentes, evoluindo
e se engrandecendo, pois tudo isso é caminhar para a perfeição.
Tratando-se de entidades inferiores, dá-se idêntico fenômeno de criação mental,
não obstante a diferença impressionante na direção criadora, uma vez que estes
operadores ignoram sejam os ambientes que os rodeiam criações de suas
próprias mentes, pois que o feito também se poderá operar à revelia da vontade
premeditada e intencional, sob o choque emocional da mente exacerbada,
bastando apenas que seus pensamentos trabalhem
DEVASSANDO O INVISÍVEL
ou se impressionem com imagens fortes, como acontece com os suicidas, que
vivem rodeados de cenas macabras de suicídio. Certamente que, deseducadas,
criminosas, muitas vezes dadas ao mal, com suas irradiações mentais
contaminadas pelo vírus de mil prejuízos, essas entidades se cercarão, no Além-
Túmulo, de criações grosseiras, dramáticas, mesmo trágicas, que a elas mesmas
horrorizam, pois que eivadas de todas as artimanhas e ciladas oriundas dos
pensamentos inferiores. E, reunidos tais Espíritos em grupos e falanges, em
virtude da lei de similitude, que os leva a se atraírem uns aos outros, terão criado,
então, seus próprios infernos, suas próprias prisões, seus antros ignóbeis, a que
nada sobre a Terra poderá assemelhar-se. E os criam servindo-se das mesmas
forças motoras do pensamento, agindo sobre as mesmas essências, os mesmos
fluidos, as mesmas ondas vibratórias do éter. Tais, porém, sejam as necessidades
de interesse geral, essas regiões, e com elas os Espíritos inferiores seus
criadores, serão localizadas num ponto ermo do Invisível ou da Terra mesma,
temporàriamente, a fim de que eles se não imiscuam com os homens e
vislumbrem, na forja dos sofrimentos, o imperativo de regeneração e progresso. E’
a isso que os instrutores espirituais denominam «Invisível Inferior», porque nós
outros precisaremos de alguma expressão, de um vocábulo para nos apossar dos
ensinamentos fornecidos pelo Espaço.
Nós mesmas, as criaturas encarnadas, estaremos dentro de «regiões» criadas
pelo nosso pensamento, além de permanecermos na crosta do planeta. Nossos
pensamentos estarão estereotipados, concretizados pelo poder motor das nossas
energias mentais atuando sobre os fluidos sublimes em que mergulha o Universo
criado pelo Todo-Poderoso, embora não se trate de movimento tão intenso nem
tão real como os de um desencarnado. Mas, ainda assim, é devido a isso que os
desencarnados
35
y
44
—
T
36 DEVASSANDO O INVISIVEL
surpreenderão o que pensamos, o que são o nosso caráter e o nosso sentimento,
as nossas intenções e tendências, pela natureza das «edificacões» mentais que
nos acompanham. «O reino de Deus está dentro de vós, asseverou o Cristo. E
nós outros certamente poderemos acrescentar: «E também o nosso inferno!
Eis porque nossos Guias Espirituais, tal como a advertência invariável das
filosofias religiosas, nos aconselham a educar nossas mentes, impelindo-as para
as nobres e elevadas expressões da alma. E’ que visam a guiar-nos para um
estado vibratório futuro, no Além-
-Túmulo, que nos abrigue de desditas e vexames. A tese, como bem se percebe, é
complexa, intensa até à vertigem... pois tudo o de que tratamos aqui se desdobra
em modalidades e matizes infinitos, e não será em uma crônica ligeira que a
poderemos desenvolver perfeitamente, muito embora o façamos sob orientação
dos mentores espirituais.
Ora, foi-nos dito pelo Divino Mestre que éramos
deuses...
Sim, somos deuses! Possuímos, sim, em modesta dinamização, mas passível de
se desenvolver, pela ação do
progresso, o gérmen de todos os atributos que o Ser Todo-Poderoso possui em
grau supremo e infinito. Aí está um desses atributos — o poder mental criador —
que há passado despercebido a muitos de nós! Nosso pensamento é, pois,
criador, porque é centelha do Pensamento Supremo; por conseguinte, cria, em
torno de nós mesmos, pequenos universos e mundos para nossa ventura,
necessidade ou desdita, enquanto não aprendermos a utilizar as energias
superiores para fins sublimes. Nas próprias ações e realizações meramente
terrenas, não é o pensamento o primeiro a tudo planejar mentalmente, para em
seguida edificar objetivamente?... Porventura, quando um grupo de homens
resolve construir um palácio ou uma cidade, ou ainda qualquer empreendimento
gran
dioso, não foi a sua mente que primeiro agiu e esboçou a obra, sob a ação da
própria vontade? Quando a lavoura do linho ou dos cereais triunfa, dando-nos
seus primorosos produtos, sustentando a vida do homem, não se serviu este,
primordialmente, da sua mente, para conseguir a grande vitória? E quando, no
Além-Túmulo, falanges de Espíritos elevados se reúnem para criar, com as forças
mentais, essas «colônias», que fazem?.
Estudam, habilitam-se, exercitam-se em aprendiza- dos sublimes, através dos
tempos. .. Até que, um dia, Espíritos imortais, já glorificados pelo domínio de
excelsas virtudes, sejam capazes de criar também um planeta, uma habitação
para as experiências redentoras de uma Humanidade em marcha para o
progresso — tal como Jesus em relação à Terra, no princípio das coisas deste
mundo, dentro das leis e da orientação da Criação
Suprema.
**
DEVASSANDO O INVISÍVEL
37
38 DEVASSANDO O INVISÍVEL
fim de que a Verdade se patenteie, para proveito de todos, imitando os
verdadeiros sábios e psiquistas, como Allan Kardec, Willia.m Crookes, Frederico
Myers, Léon Denis, Ernesto Bozzano, Roberto Dale Owen, J. Arthur Findlay, César
Lombroso, Alexandre Aksakof e tantos outros luminares de coração simples, aos
quais o orgulho não cegou...
CAPITULO II
“Os fluidos espirituais, que constituem um dos estados do fluido cósmico universal,
são, a bem dizer, a atmosfera dos seres espirituais; o elemento donde eles tiram
os materiais sobre que operam; o meio onde ocorrem os fenômenos especiais,
perceptíveis à visão e à audição do Espírito, mas que escapam aos sentidos
carnais, impressionâveis sômente à matéria tangível; o meio onde se forma a luz
peculiar ao mundo espiritual, diferente, pela causa e pelos efeitos, da luz ordinária;
finalmente, o veículo do pensamento como o ar o é do som. Os Espíritos atuam
sobre os fluidos espirituais, não os manipulando como os homens manipulam os
gases, mas empregando o pensamento e a vontade. Para os Espíritos, o
pensamento e a vontade são o que é a mão para o homem. Pelo pensamento,
eles imprimem àqueles fluidos tal ou qual direção, os aglomeram, combinam ou
dispersam, organizam com eles conjuntos que apresentam uma aparência, uma
forma, uma coloração determinadas; mudam-lhes as propriedades, como um
químico muda a dos gases ou de outros corpos, combinando-os segundo certas
leis. E’ a grande oficina ou laboratório da vida espiritual.”
j
-‘, :
40 DEVASSANDO O INVISÍVEL
ção, movida pela chamada Santa Inquisição, na França, um dos seus mais
encarniçados verdugos, ou juíes, justamente o Bispo de Beauvais, fêz-lhe esta
pergunta ardilosa, tentando confundi-la:
— «São Miguel te aparece desnudo?.. .» pois sabe-se que um dos Espíritos que a
assistiam era por ela mesma considerado como sendo aquele santo da Igreja
Católica, uma das imagens que ela se habituara, desde a infância, a ver e a
venerar na pequena igreja da aldeia de Domremy, seu berço natal.
Prontamente respondeu a donzela com outra interrogação, mas tão profunda, tão
sutil e complexa que não a poderia ter compreendido a crueldade do estreito
cérebro dos seus algozes, mas que a posteridade, nos dias atuais, devidamente
compreende e explica à luz dos estudos transcendentais feitos pela Terceira
Revelação, ou
Espiritismo:
— «Pensas que Deus não tem com que vesti-lo?. . »
— respondeu Joana.
Sim! Deus, o Criador Onipotente, o Artista inimitável, Senhor da Beleza Suprema,
possui, espalhados pela sua criação infinita, até dentro das próprias possibilidades
psíquicas-vibratórias-mentais de seus filhos, os elementos e as energias que lhes
permitem ataviar-se, uma vez desencarnados, consoante os seus próprios gostos
artísticos ou simplesmente práticos, tais quais os encarnados. A Revelação
Espírita fornece as bases necessárias à compreensão do atraente fato, pois tanto
nas obras de Allan Kardec como nas do seu eminente colaborador Léon Denis
encontraremos fartos esclarecimentos quanto à possibilidade da confecção
espiritual de um traje, deste ou daquele «figurino», usado pelos habitantes do
mundo invisível. Citaremos alguns desses trechos esclarecedores, apenas, visto
ser impossível citar todos eles, dada a variedade do que poderemos a respeito
encontrar. Além
DEVASSANDO O INVISÍVEL 41
dos parágrafos de «A Gênese», citados acima, leremos,
ainda, no 3° do mesmo capítulo:
«No estado de eterização, o fluido cósmico não é uniforme; sem deixar de ser
etéreo, sofre modificações tão variadas em gênero e mais numerosas talvez do
que no estado de matéria tangível. Essas modificações constituem fluidos distintos
que, embora procedentes do mesmo princípio, são dotados de propriedades
especiais e dão lugar aos fenômenos peculiares ao mundo invisível. Dentro da
relatividade de tudo, esses fluidos têm para os Espíritos, que também são
fluídicos, uma aparência tão material quanto a dos objetos tangíveis para os
encarnados, e são, para eles, o que são para nós as substâncias do mundo
terrestre. Eles os elaboram e combinam para produzirem determinados efeitos,
como o fazem os homens com os seus materiais, ainda que por processos
diferentes.
No Cap. VIII de «O Livro dos Médiuns» (Do Laboratório do Mundo Invisível), existe
longa e substanciosa revelação da força criadora dos Espíritos desencarnados, os
quais, utilizando-se da matéria própria do Invisível, ou seja, do fluido cósmico que
enche os espaços sem fim, a este manejam de sorte a construírem o que bem
desejarem, com o poder que o pensamento e a vontade lhes concedem.
O assunto das citadas revelações se refere a uma aparição masculina, que trazia
nas mãos uma caixa de rapé. Dentre a copiosa contribuição, que servirá de base
para a nossa exposição, destacaremos os trechos seguintes, das perguntas feitas
por Allan Kardec e das respostas fornecidas pelo Espírito de São Luís, um dos
iluminados reveladores dos códigos do Espiritismo:
_ fl,_
DEVASSANDO O INVISIVEL
— «Dizes que era uma aparência — pergunta AJlan Kardec —; mas, uma
aparência nada tem de real, é como uma ilusão de óptica. Desejaríamos saber se
aquela caixa de rapé era apenas uma imagem sem realidade, ou se nela havia
alguma coisa de material?»
Resposta de São Luis:
— «Certamente. E’ com o auxílio deste princípio material que o perispírito toma a
aparência de vestuários semelhantes aos que o Espírito usava quando livo.» (O
grifo é nosso.)
Segue-se o comentário de Allan Kardec, elucidativo e oportuno, para o qual
remetemos o leitor, e depois encontraremos o prosseguimento da lição, com nova
pergunta do Codificador:
— «Dar-se-á que a matéria inerte se desdobre? Ou que haja no mundo invisível
uma matéria essencial, capaz de tomar a forma dos objetos que vemos? Numa
palavra, terão estes um duplo etéreo no mundo invisível, como os homens são
nele representados pelos Espíritos?»
Resposta:
— «Não é assim que as coisas se passam. Sobre os elementos materiais
disseminados por todos os pontos do espaço, na vossa atmosfera, têm os
Espíritos um poder que estais longe de suspeitar. Podem, pois, eles concentrar à
sua vontade esses elementos e dar-lhes a forma aparente que corresponda à dos
objetos materiais.» (Grifo nosso.)
— «Formulo novamente a questão, de modo ca 7
A
43
44 DEVASSANDO O INVISÍVEL
— «Se o quiser. Baseado neste princípio foi que respondi afirmativamente às
perguntas anteriores. Tereis provas da poderosa ação que os Espíritos exercem
sobre a matéria, ação que estais longe de sus. peitar, como eu disse há pouco.»
(Grifo nosso.)
E assim prossegue a lição, num encadeamento atraente, que conviria o leitor
apreciar. Ainda no volume «A Gênese», também no Cap. XIV, parágrafo 14,
veremos o seguinte:
«Algumas vezes essas transformações (dos fluidos espirituais) resultam de uma
intenção; doutra, são produto de um pensamento inconsciente. Basta que o
Espírito pense numa coisa, para que esta se produza, como basta que modele
uma ária, para que esta repercuta na atmosfera. E’ assim, por exemplo, que um
Espírito se faz visível a um encarnado que possua a vista psíquica, sob as
aparências que tinha
nados. As entidades espirituais Charles e Frederico Chon se revelam pelo perfume
de violeta, com certo detalhe que torna inconfundível um perfume do outro, ou
seja, a presença de um desses Espíritos da presença do outro, tal se se tratasse,
antes, de particularidades de vibrações. O Espírito “Scheilla”, ex-enfermeira
alemã, morta em uni bombardeio aéreo, durante a guerra mundial, e que se
comunica com o médium Francisco Cândido Xavier, revela-se por um forte e muito
materializado cheiro de éter, lembrando a sua profissão, em cujo exercício
desencarnou. Espíritos sofredores e inferiores costumam fazer-se notados pelo
cheiro de bebidas alcoólicas, de fumo, de podridão e até de decomposição
cadavérica. E aqueles vitimados em desastres, e que vêm a morrer durante a
estada nos hospitais, costumam desprender o cheiro do iodofórmio, do iodo, do
formol, etc. E não é muito raro um Espírito amigo, familiar, dar ao seu médium o
perfume que sabe este aprecia, o que representa uma das muitas formas de
afetividade e carinho com que tão bondosos amigos brindam seus aparelhos
mediúnicos.
DEVASSANDO O INVISIVEL 45
quando vivo na época em que o segundo o conheceu, embora haja ele tido,
depois dessa época, muitas encarnações. Apresentam-se com o vestu,rio, os
sinais exteriores — enfermidades, cicatrizes, membros amputados, etc. — que
tinham então.» (O grifo é nosso.)
Nas obras de Léon Denis vamos encontrar o precioso argumento a cada passo,
confirmando tudo quanto os videntes têm revelado sobre o vestuário dos Espíritos.
No capítulo XX de «No Invisível» — «Aparições e materializações de Espíritos» —
é farto e encantador o noticiário a respeito, desenvolvendo explicações sobre o
modo por que operam as entidades desencarnadas, ao desejarem criar algo, e
dos elementos, ou matérias sutis, de que se servem para tanto. Citaremos
pequenos trechos, convidando o leitor a uma consulta a todo o belo capítulo:
«As próprias nebulosidades, agregados de matéria cósmica condensada, germens
de mundos, que na profundeza dos espaços nos mostram os telescópios, vão
reaparecer na primeira fase das materializações dos Espíritos. E’ assim que a
experimentação espírita conduz às mais vastas consequências. A ação do Espírito
sobre a matéria nos pode fazer compreender de que modo se elaboram os astros
e se consuma a obra gigantesca do Cosmos. »
Mais adiante, destacaremos:
«Numa sessão, o Espírito de Lélia forma com um sopro, aos olhos dos
assistentes, um tecido levo de gaze branca, que se estende pouco a pouco e
termina por cobrir todas as pessoas presentes. E’ um exemplo de criação pela
vontade, que vem confirmar o que dizíamos no começo deste capítulo. »
E mais além ainda:
li
46 DEVASSANDO O INVISIVEL
«Recordamos também o caso de Emma Hardinge, assinalado pelo Sr. Colvilie:
apareceu ela com o vestido de rainha das fadas, que trouxera muito tempo antes,
em sua mocidade. Nesse caso, como em alguns outros, a aparição parece não ser
mais que simples imagem mental exteriorizada pelo Espírito, e que adquire
bastante consistência para ser percebida pelos sentidos.» (O grifo é nosso.)
«Não sômente o Espírito domina os elementos sutis da matéria, de modo a
impressionar a placa sensível e os órgãos dos videntes, mas nas aparições
visíveis para todos pode ainda reproduzir, pela ação da vontade, as formas que
revestiu e os trajes que usou na Terra e que lhe permitem fazer-se reconhecer.
Esse é, com efeito, o objetivo essencial de tais manifestações. Daí as roupagens,
vestes, armas e acessórios com que se apresentam as aparições.»
Na excelente obra «O Problema do Ser, do Destino e da Dor», capítulo XX — «A
Vontade» — também de Léon Denis, encontraremos este pequeno trecho, além
de outros favoráveis à nossa tese e que seria fastidioso citar:
«Em todos os domínios da observação achamos a prova de que a vontade
impressiona a matéria e pode submetê-la a seus desígnios. Esta lei manifesta-se
com mais intensidade ainda no campo da vida invisível. E’ em virtude das mesmas
regras que os Espíritos criam as formas e os atributos que nos permitem
reconhecê-los nas sessões de materialização . »
Ora, assim sendo, sentindo-nos à vontade sobre tão sólidas bases para descrever
o que desejamos, não recorreremos aqui a Ernesto Bozzano, nem a William
Crookes ou a Aksakof, embora certa de que também em suas
DEVASSANDO O INVISÍVEL
**
nosso estado normal, quer quando nos há sido possível penetrar o mundo
invisível, levada em corpo espiritual (perispírito) pelos Guias e Instrutores que nos
deferem essa honra, grande número de Espíritos temos visto, e até com eles
convivido, se deste modo nos podemos expressar, de variada gradação moral e
intelectual, e apenas uma vez nos recordamos de ter percebido um intei rament
desnudo. Contràriamente, o que temos presenciado nos confere o direito de
categàricamente afirmar que — sim! — os Espíritos se trajam e modificam a
aparência das vestes que usam conforme lhes apraz, exclusão feita de alguns
muito inferiores e criminosos, geral-
mente obsessores da mais infima espécie, cuja mente não possui vibrações à
altura de efetuar a admirável
11
50 DEVASSANDO O INVISTVEL
Certa vez, o Espírito de um jovem, que aparentava 18 ou 20 anos de idade,
apresentou-se à nossa visão, todo envolvido em ataduras de gaze, da cabeça aos
joelhos, braços, mãos, rosto. Chorava; e um cheiro forte de iodofórmio anunciou
sua presença antes mesmo da materialização. Compreendemos que seu
trespasse se efetivara por uma explosão e que falecera no hospital; pois o
panorama dos acontecimentos relacionados com a desencarnação da entidade
comunicante, ou mesmo passagens de seu drama íntimo, são revelados ao
médium através das suas próprias irradiações (ou de sua aura), o que produz
intuições quase instantâneas, espécie de conversação telepática, ou vibratória,
que desvenda as cenas e enseja esclarecimentos para o que se há-de tentar, a
fim de minorar a sua aflição. Como sempre, em presença desse Espírito,
procurámos fazer leitura amena e esclarecedora, convidando-o a ouvi-la, o que fêz
com grande respeito e atenção. Orámos juntos e conversámos depois, embora
ligeiramente. E tivemos a satisfação de vê-lo sorrir e agradecer, ao se afastar.
Nenhuma conquista humana, nenhum prazer ou alegria deste mundo se poderá
comparar à felicidade de um médium que já se viu envolvido em tarefa desse
gênero. O consolo que ele próprio recebe, se sofre, a doçura inefável de que se
sente invadir, ao verificar que conseguiu auxiliar um desses pequeninos a quem
Jesus ama e recomenda, ultrapassa todas as venturas e triunfos terrenos. E’ como
se ele próprio, o instrumento mediúnico, houvesse mergulhado em vibrações
celestes, através das lágrimas do sofredor do Invisível, as quais procurou enxugar.
DEVASSANDO O INVISÍVEL 51
mesmo quando acharem o médium em condições vibratórias adequadas para o
feito. Parece que o médium, então, é imunizado de perigos por processos que
escapam à nossa compreensão, o que indica não dever ele jamais desejar ou
provocar semelhantes experiências. Ao demais, antes que tais labores sejam
confiados à responsabilidade de um aparelho mediúnico, será necessário que ele
se tenha preparado longamente através de um tirocínio ininterrupto, que se tenha
desprendido, muitas vezes, do mundo e de si mesmo, através de renúncias e
dolorosos testemunhos, de forma a que o coração, ferido por dores inconsoláveis
na Terra, esteja preparado para a compreensão exata das lides do invisível.
Muitas dessas entidades, porém, se debruçam sobre o nosso ombro e lêem
conosco, interessadas, naquilo que estudamos, o que testemunha ser a vida
espiritual sim- pies como a nossa própria vida, a continuação desta, tão sômente.
Temos observado que algumas de tais entidades colocam os óculos a que
estavam habituadas, quando encarnadas, para lerem melhor, conosco... Ge-
ralmente são, como ficou dito, leituras escolhidas as que fazemos, ou do
Evangelho, que projetem com vigor a personalidade e os feitos do Cristo, ou de
obras espíritas que melhor toquem o coração. Assim sendo, esses pequeninos e
sofredores se afeiçoam ao médium que os ajudou nos dias difíceis e se tornam
amigos fervorosos para todo o sempre, estabelecendo-se, então, indissolúveis
elos de fraternidade.
Há cerca de um ano, pela madrugada, estando nós ainda desperta, apresentou-se
à nossa visão um Espírito cujo decesso carnal se teria dado entre os seus trinta e
oito ou quarenta anos de idade. Trajava-se pobremente, com terno azul-marinho,
já usado, camisa branca também bastante usada, gravata preta, atada com certo
desleixo. Esquálido e abatido, infinitamente triste, mas
‘:• 1
DEVASSANDO O INVISÍVEL
já resignado à própria condição, colocou a mão sobre a nossa, num gesto fraterno,
e disse:
— Venho agradecer-lhe os votos feitos, em minha intenção, à bondade de Deus...
Suas preces me auxiliaram tanto que até minha família, que deixei na Terra, foi
beneficiada... Chamo-me Joaquim... e meu nome está no registo do seu caderno
de apontamentos...
Constatámos, então, que esse visitante fora suicida... e, materializado, pudemos
observar que havia terra em sua indumentária, isto é, impressões da porção de
terra em que fora sepultado, assim como sua mente permanecia afeita ao
vestuário que habitualmente usava quando vivo, e com o qual fora também para a
sepultura. Como, efetivamente, possuímos um caderno onde registamos nomes
de suicidas e pessoas falecidas em geral, conhecidos ou colhidos dos noticiários
dos jornais, procurámos verificar se realmente existia nos ditos apontamentos
aquele singelo nome. E encontrámos, de fato, entre os suicidas, um Joaquim
Pires; tratava-se, portanto, de um dos destacados dos noticiários dos jornais,
recomendado para as preces e as leituras diárias. E estamos certa de que será
um bom amigo, cuja afeição nos acompanhará pelo futuro afora...
**
Até o momento presente, os Espíritos mais bem «trajados e mais belos que
tivemos ocasião de observar através de materializações, durante a vigília e
também no mundo invisível, por ocasião do desdobramento do corpo astral, foram
os que passamos a citar. A entidade que se denomina Charles, martirizado por
amor ao Evangelho, no século XVI, na França, durante a célebre matança de São
Bartolomeu, comumente se deixa ver em trajes de iniciado hindu, tendo-se
mostrado, uma única
52
DEVASSANDO O INVISWEL 53
vez, em trajes de príncipe indiano, visto que no século XVII foi soberano na India.
Frederico Chopin, que já variou a indumentária quatro vezes em suas aparições,
deixando-se perceber, em duas delas, apuradamente trajado à moda da sua
época (reinado de Luís Filipe, na França), mas todo envolto num como luar azul
trans- lúcido, como neblina. Vítor Hugo, a quem só pudemos distinguir o busto,
também envolto em neblinas lucilantes, argênteas, com reflexos azuis
pronunciados, sem que pudéssemos destacar o «feitio» dos trajes. A falange de
iniciados hindus, de que somos pupila espiritual, com todos os seus integrantes
esforçando-se por serem contemplados em seu «uniforme» característico, as
gemas do anel e do turbante inclusive, envoltos em neblinas lucilantes, com
reflexos azuis. Lázaro Zamenhof, o criador do Esperanto, vaporoso mas muito
humanizado em seu terno do século XX, circundado de um halo como que
formado de ondas concêntricas, que indicaria o elevado trabalho intelectual
(detalhe também observado em Vítor Hugo), e esbatida a sua configuração
perispiritual por um jacto de luz radiosa, verde-claro, igualmente de forma
concêntrica. E, finalmente, um vulto muito nobre, observado no ano de 1930, cuja
identidade ignoramos, mas a quem denominámos Anjo Guerreiro, pelas
particularidades do quadro em que se deixou contemplar. Acreditamos, porém,
tratar-se de algum integrante da legião protetora do Brasil, ou do movimento
espírita no Brasil. O certo era que trajava uma túnica grega, curta, atada por um
cinto dourado; um diadema discreto, um simples friso de ouro, à cabeça, e
guiando uma biga romana como que construída de alabastro. Com a destra,
empunhava as rédeas, sem que, todavia, aparecessem os cavalos, e, com a
sinistra, uma flâmula de grandes dimensões, alvinitente, onde se lia — Salve,
Brasil imortal!»
Estampava-se visivelmente, nessa entidade, assim
DEVASSANDO O INVISÍVEL
materializada, o tipo oriental, o árabe, evocando também o tipo brasileiro muito
conhecido no Estado de Goiás. Era jovem, belo e sorridente, e um luzeiro cor-de-
rosa envolvia-o, espraiando-se em torno e se estendendo longamente sobre uma
multidão que cantava hosanas e empunhava pequenas flâmulas, multidão que
seguia em cortejo atrás da biga. Não nos estenderemos em particularidades
quanto a essa visão, por não julgá-la interessante para estas páginas. No entanto,
jamais fomos informada da identidade de tão formoso Espírito. Acrescentaremos,
apenas, que sua aparição assinalou etapa definitiva em nossa vida e em nossos
labores espíritas.
*
**
Comumente, os Espíritos se nos apresentam trajados conforme o fizeram durante
a existência carnal: os homens, com o terno que habitualmente usavam,
acentuando este ou aquele detalhe que melhor os identifique; as mulheres, com
os vestidos que, igualmente, de preferência usavam. Mais raramente, alguns se
deixam ver com a indumentária com que foram sepultados, e ainda outros com os
trajes que desejariam possuir, mas que não chegaram a usar. Dois meses após o
falecimento de nossa mãe, nós e mais três pessoas da família vimo-la, assistindo
a uma reunião de preces em sua intenção, trajando um costume de gabardine
azul-marinho, com um «cachecol» de seda quadriculada branca e preta, vestes
por ela preferidas para as viagens que fazia em visita aos filhos, nos últimos
meses que viveu. Uma tia nossa, a Sra. C. A. S., falecida no interior do Estado de
São Paulo, em 1950, cerca de vinte dias após o trespasse apresenta-se à nossa
visão, no Rio de Janeiro, dizendo ter vindo visitar-nos, pois se sentia saudosa.
Vestia um costume preto, e um véu de rendas negras cobria-lhe
DEVASSANDO O TNVIStVEL
55
1’
56 DEVASSANDO O INVISÍVEL
teve o dom de reanimar e consolar os desolados pais da jovem falecida, que se
mantinham sucumbidos ante a acerba provação. Referir-nos-emos ainda ao
mesmo fato, em capítulo posterior.
De outro modo, Espíritos plenamente espiritualiza-
-dos, como Adolfo Bezerra de Menezes e Bittencourt Sampaio, foram por nós
distinguidos envergando longa túnica vaporosa, nívea, cintilante, levemente
esbatida de azul, O primeiro costuma deixar-se ver, também, trajando avental de
médico, com barrete, ao passo que o segundo, isto é, Bittencourt, a quem uma
única vez vimos, em dia de grande provação, há muitos anos, talvez pela sua
qualidade de «poeta do Evangelho», trazia uma coroa de louros, ou de mirto ou
carvalho, como os antigos intelectuais gregos e latinos,
*
**
Alguns adeptos do Espiritismo, talvez demasiadamente ortodoxos, talvez pouco
observadores, dogmatizan do um ensino que, sabemos, ainda não foi
completamente revelado, pois o próprio Codificador afirmou seria evolutivo, alguns
adeptos, dizemos, combatem tais relatórios mediúnicos, afirmando que assim não
deverá ser, porque Espíritos não precisam vestir-se.
Ora, se os próprios Espíritos afirmaram a Allan
Kardec que o perispírito é semimaterial, que é a forma,
o modelo onde se esboça o corpo carnal, e, portanto,
é um corpo, seria o caso de relembrarmos a impertinêneia astuciosa do Senhor de
Beauvais para com a donzela
de Orleães:
— «São Miguel te aparece desnudo?. . . — ou seja:
Eles, os Espíritos, com os seus perispíritos semimateriais, como são, e, portanto,
tratando-se de um corpo,
aparecerão desnudos aos médiuns?.
L
DEVASSANDO O INVISÍVEL 57
Teríamos que responder, visto que o dever de um
médium é revelar com sinceridade, com a consciência
voltada para Deus, o realismo do mundo invisível.
— Sim, há Espíritos desencarnados, aqueles que fo-’ ram homens ou mulheres de
baixa condição moral, que se arrastaram em existências consagradas aos
excessos carnais, à devassidão dos costumes, que podem, com efeito, aparecer
desnudos aos médiuns, revelando mesmo, em cenas degradantes, que lhes foram
habituais no estado humano, a degradação mental em que ainda permanecem. E
o vidente, cujo compromisso é exatamente esse, de se tornar intermediário entre
os dois planos da Vida, há-de contemplar e revelar, embora estarrecido e
contrafeito, o realismo que seus instrutores espirituais lhe permitem surpreender
no Além-Túmulo, para satisfazer àqueles que desejarem informações sobre o
palpitante assunto. Todavia, o comum é se apresentarem os desencarnados sob
as aparências que mais lhes agradem. Os fatos mais antigos aí estão, espalhados
pelos séculos, atestando que, seja de fluido cósmico universal, de éter sublimado
ou de fluido espiritual, de matérias quintessenciadas, de gases ou de
vaporizações, ou simplesmente como decorrência de força mental projetada sobre
as fibras supersensíveis do perispírito, o certo é que a maioria dos habitantes do
Além se deixa ver com roupagens que variam do belo esplendoroso ao miserável
e ao horrível.
Também os médiuns espíritas supunham que os desencarnados não se
vestissem. Mas, diante do que a sua própria visão constata, que deverão eles
afirmar senão o que lhes dão a ver do mundo invisível? Isto é, que vêem os
Espíritos «trajados» de vários modelos, e que isso é o comum no plano espiritual?
E, por vezes, até muito artística e suntuosamente trajados? Lembremo-nos, então,
da admirável resposta de Joana d’Are aos seus juízes, tratando de São Miguel,
compreendendo
58 DEVASSANDO O INVISÍVEL
que ela, há cinco séculos, não ignorava o que hoje a
Doutrina Espírita expõe:
— «Pensas que Deus não tem com que vesti-lo?. . . »
Ou seja:
Sim! Os Espíritos podem vestir-se, servindo-se dos ricos elementos esparsos pelo
Universo, aos quais acionam voluntária ou insensivelmente, valendo-se das forças
do pensamento e da própria vontade!
Ora, de tudo o que acabámos de observar, e atentos ao que expõem Allan Kardec,
Léon Denis, Ernesto Bozzano, William Crookes, e outros, bem ao que os próprios
desencarnados são incansáveis em confirmar, extrairemos as seguintes
deduções:
— Que a mente do Espírito desencarnado cria para a sua configuração individual
a indumentária que deseja, valendo-se da própria vontade, segundo o próprio
gosto artístico, a necessidade, a singeleza dos hábitos, a humildade do caráter e o
grau de elevação moral-mental-espiritual, pois o Espírito possui liberdade e
aptidões naturais para assim se conduzir.
2° — Que a mente do desencarnado também poderá evocar os hábitos e usos
passados, conservar as imagens dos trajes que preferiu, mesmo em existência
remota, e imprimi-las na sensibilidade plástica do perispírito, e assim se
apresentar aos seus iguais de Além-Túmulo, como aos médiuns, em
materializações espontâneas e individuais, ou provocadas para visão coletiva.
3° — Que o Espírito do recém-desencarnado poderá padecer o fenômeno de
repercussão vibratória dos acontecimentos verificados no corpo carnal, durante a
crise do lento desligamento das energias fluídicas que o prendiam àquele, por
ocasião do desenlace, sobressaindo no dito fenômeno o detalhe assaz
impressionante da natu
DEVASSANDO O INVISÍVEL
L
—
59
60 DEVASSANDO O INVISÍVEL
concretas (como realmente o são para o mundo espiritual), estruturadas em raios
luminosos ou em vaporizações cintilantes.
Os homens, por sua vez, não se trajam, igualmente, com os produtos da própria
mente? Porventura a lavoura do linho e do algodão, como a produção da seda; a
maquinaria das fábricas que tecem os seus fios, transformando-os em vistosos
brocados e rendas custosas, não foram antes criações mentais para, em seguida,
se concretizarem em vestuários ricos e suntuosos? Quando o homem deseja
alindar-se, não é a sua mente a primeira a criar aquilo que ele desejou, para
depois ele próprio concretizar esse desejo, na matéria de que dispõe no plano
terreno?. . . E o Universo Infinito, concreto, estável, eterno, não é o produto da
Mente Divina? E não herda a Humanidade, do seu Criador, parcelas da Sua
Superioridade?...
Trabalhemos, pois, e vigiemos, para que um dia o
produtos da nossa força mental nos possam glorificar
em vestes de luz, na realidade da vida espiritual...
CAPITULO III
Frederico Chopin, na Espiritualidade
“— Durante o sono, a alma repousa como o
corpo?
— Não, o Espírito jamais está inativo. Durante o sono, afrouxam-se os laços que o
prendem ao corpo e, não precisando este então da sua presença, ele se lança
pelo Espaço e entra em relação mais direta com os outros Espiritos.”
(ALLAN KARDEC — “O Livro dos Espíritos”, Cap. VIII. Pergunta 401.)
No importante livro «Fatos Espíritas», de WilIiam Crookes, o sábio investigador
das personalidades invisíveis, existem estes dois tópicos: o primeiro referente a
aparições de «mãos luminosas visíveis à luz ordinária», o segundo tratando das
célebres materializações do Espírito Katie King. Transcrevemos ambos no início
da presente crônica, porque os julgamos testemunhos adaptáveis a outras
materializações que hemos presenciado, não obstante serem estas
categàricamente espontâneas, e não provocadas, como as primeiras:
«Nem sempre ela (a mão) é uma simples forma, pois algumas vezes parece
perfeitamente animada e graciosa: os dedos movem-se e a carne parece ser tão
humana quanto a de qualquer das pessoas Presentes.» (Página 42, da 5 edição
da FEB.)
«Katie nunca apareceu com tão grande perfeição.
Durante perto de duas horas passeou na sala, conversan
**
Sendo a faculdade mediúnica o meio de que a cria-. tura encarnada dispõe para
se tornar intérprete do mundo espiritual, e estando tal faculdade prevista nas leis
da Natureza, não será impossível, dentro de certo limite, a um médium que se
haja dedicado convenientemente ao exercício da faculdade, comunicar-se com
este ou aquele Espírito, que tanto poderá ser entidade normal e es-clarecida como
inferior e obsessora. Ernesto Bozzano, sábio psiquista itAllano, que os espiritistas
estudiosos tanto acatam, em uma de suas admiráveis obras (12) declara que,
entre as entidades inferiores, talvez sõmente os chamados «réprobos» jamais
possam comunicar-se com os médiuns, o que nos induz a concluir que tais
Espíritos, os réprobos, portadores de vibrações viruladas por múltiplos prejuízos,
tão contagiosas quanto a mais perigosa peste, poderiam, com sua presença, no
fenômeno de incorporação, quando é franca a permuta de vibrações, levar os
médiuns a enfermarem gravemente ou até mesmo a morrer. Os grandemente
iluminados lutariam, de seu lado, com dificuldades para plena harmonização com
o médium, dada a inferioridade moral-
-vibratória deste.
Não obstante, possuem eles tantos meios, que os homens ignoram, de transmitir
seus pensamentos e ideias,
suas influenciações se infiltram tão sutilmente e de for-
(12) “A Crise da Morte” — XVI Caso.
62 DEVASSANDO O INVISÍVEL
1
/
DEVASSANDO O INVISÍVEL 63
ma tão variada nos meandros de uma faculdade mediúnica, que frequentemente
os homens recebem lições e conselhos dessas entidades grandiosas, ignorando
que sejam delas, pois, de regra, individualidades espirituais dessa categoria,
sobretudo aqueles cujos nomes foram conhecidos na Terra, tomam pseudônimos
a fim de se fazerem acreditados, visto que a verdadeira identidade seria posta em
dúvida ou causaria escândalo, ao mesmo tempo que acarretaria dissabores ao
médium, o que um Espírito elevado sempre costuma evitar.
Camilo Castelo Branco, o eminente escritor lusitano, amplamente conhecido, um
dos nossos mais antigos amigos espirituais, que desde os nossos doze anos de
idade nos aparecia em visões nítidas, queixava-se amargamente, como Espírito,
de se ver, com frequência, corrido de junto dos médiuns, com quem gostaria de se
comunicar, enxotado dos Centros Espíritas, sob acusação de mistificador, apenas
porque o seu maior prazer seria testemunhar ao mundo a própria imortalidade e o
noticiário copioso do Além, o que o levava, necessàriamente, a se apresentar com
a sua verdadeira identidade. No entanto, aceitavam-no, sem objeções, quando
ele, no desejo de falar com os mortais, passava a mentir e enganar, afirmando
chamar-se Camilo da Silva aqui, José Camilo Botelho ali, e mais além Camilo da
Fonseca, pobre professor português que tivera a desdita de se suicidar por motivo
de dificuldades financeiras.
Mas, porque não aceitavam Camilo, o escritor? Porque o grande Camilo não se
poderia comunicar com qualquer médium, em qualquer Centro Espírita, para falar
aos seus irmãos de humanidade, como tanto desejava, se, como Espírito
desencarnado, não passava de entidade sofredora, carente de consolo e estímulo
para a reabilitação, embora na Terra houvesse sido mestre da língua portuguesa,
romancista emérito? Pois sabemos que o talento, o saber, os títulos honorificos
conferidos pela
DEVASSANDO O INVISÍVEL
Terra, a um cidadão desprovido dos dotes morais e qualidades honrosas do
caráter e do coração, nada representam na Pátria Espiritual, e até que, na maioria
das vezes, sômente servem para confundi-lo e sobrecarregá-lo de
responsabilidades, porquanto justamente os cérebros mais burilados de cultura
são os que deveriam conhecer melhor as leis do Bem e da Justiça, únicas moedas
valorizadas no Além-Túmulo. Por isso mesmo, o amigo Camilo Castelo Branco,
Espírito necessitado de aprendizado rigoroso, ansioso por servir à causa da
Verdade entre os homens, buscando lenitivo para suas muitas dores nas
narrativas e lições que, extraídas da própria experiência, sempre desejou oferecer
aos encarnados, a fim de aplanar caminhos para os seus resgates futuros, não
conseguiu nem médiuns nem Centros Espíritas que lhe aceitassem a palavra,
porque os homens o endeusaram tanto, graças a sua copiosa literatura, que até
mesmo os espíritas esqueceram que ele, espiritualmente, não passava de
entidade vulgar, pela situação moral que seus desacertos terrenos lhe acarretaram
no mundo invisível. Muito mais radiosos e sublimes serão Bezerra de Menezes e
Emmanuel, almas peregrinas, cuja inefável bondade e elevação de vistas as
tornam angelicais por excelência, podendo mesmo asseverar-se que são das
individualidades espirituais mais elevadas que se têm comunicado iltimamente
com a Terra. E, no entanto, aí estão, sem se diminuírem ao se comunicarem
conosco. E todos nós os aceitamos, com raríssimas exceções.
Assim pensando e refletindo é que nos propomos a tratar da individualidade
espiritual Frederico Francisco Chopin, um dos maiores gênios da Música que a
Terra há tido a honra de hospedar, o que se dá sempre que necessitam as
gerações de um vigor novo, de nova seiva para a expansão do Belo entre os
homens. Esse encantador Espírito, não obstante nossa insignificância pes
—.
1•
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‘4
DEVASSANDO O INVISIVEL
65
soai — tal como Camilo Castelo Branco, Bezerra de Menezes, Léon Denis,
Charles, Leão Tolstoi, D. Pedro de Alcântara, Vítor Hugo, Padre Vítor, Dr. Augusto
Silva, Inácio Bittencourt, César Gonçalves e outros, inclusive suicidas, alguns
muito conhecidos pela nossa sociedade, obsessores, criminosos, etc. —, tem sido
um dos mais ternos amigos que adquirimos através da mediunidade. E se, como
os primeiros, não nos concedeu, até agora, mensagens literárias escritas,
concede-as verbalmente, em aparições e materializações edificantes, e ainda
porque, em vez de escritor ou beletrista, foi músico; daí — afirma ele próprio —,
sômente saberá bem expressar-se por música, ao passo que nós, como médium
que somos e não musicista, não estamos preparada para que ele venha ditar, ao
em vez de romances ou livros doutrinários, prelúdios e noturnos, valsas ou
«polonaises», visto a psicografia musical ser obra mediúnica infinitamente mais
melindrosa e difícil que a literária, requerendo, mesmo, da parte do médium, uma
boa dose de cultura musical. Entretanto, tem ele endereçado páginas carinhosas,
como cartas, a alguns amigos que dele solicitaram, por nosso intermédio,
conselhos e sugestões sobre música. Assim sendo, e não se tratando, a nossa
afinidade com o Espírito Frederico Chopin, de atração motivada pela música, mas
simplesmente questão pessoal, nenhuma admiração ou estranheza deverá causar
a notícia de que entidades como ele próprio, e mais Camilo Castelo Branco, Vítor
Hugo ou Castro Alves e Bilac, se dirijam a este ou àquele médium, com quem
sentiram afinidades, as quais também podem não ser literárias ou artísticas, mas
sentimentais e afetivas, para uma confabulação amistosa, amorável, sobretudo
quando o fruto que apresentarem esteja à altura daquilo que deixaram ao partirem
para o Além. Os Espíritos gostam de ser amigos e de serem amados pelos
homens, e a grandiosidade da Doutrina dos Espíritos é justamente esta: per
ç
r
66 DEVASSANDO O INVISÍVEL
mitir que se derruam as barreiras da morte, para que os
homens e os Espíritos se entendam, num intercâmbio glo rios de afetos e labores.
Geralmente, os Espíritos se apresentam aos médiuns
voluntàriamente, e gostam de contar-lhes o que sentem,
14 o que fazem, como vivem, as primeiras impressões e de sapontamento que os
surpreenderam, o que sofrem e o
rque pretendem, seja no intuito de instruírem os homens,
ajudando-os no progresso a realizar, seja testemunhando
H a própria imortalidade ou visando a se tornarem lem brado dos seres queridos
aqui deixados, amigos e admi radores ou, ainda, fiéis aos labores de um resgate
ne cessári à sua honra espiritual. Alguns, como o próprio
Chopin, gostam da Terra, visto que é sempre vivamente
atraído para os planos terrestres por forças telepáticas
poderosas. Ele próprio afirma, em confabulações com
que nos tem honrado, em ocasiões encantadoras para a
nossa sensibilidade mediúnica, que aqui, no Brasil, exis tem reencarnadas,
personalidades que lhe foram muito
caras no passado, e que, no momento, lhe é muito grato
enviar notícias aos homens. Interessa-se profundamente
pela Doutrina dos Espíritos, pois confessa que, em suas
existências passadas, não chegou a se dedicar fielmente
a nenhum credo religioso, não obstante estivesse conven cid da ideia de Deus, da
imortalidade da alma e da eter nidad e imutabilidade das leis divinas. Sua religião
tem
sido, através dos milênios, as Artes, pois afirma ter vi vid em várias épocas sobre
a Terra, sempre como artista
destacado. Ele serviu mesmo, como gênio inesquecível,
as Belas Artes, a Arquitetura, a Pintura e finalmente a
Música, que parece ser o ponto culminante das Artes em
nosso planeta, o ápice da sensibilidade que um gênio da
Arte pode galgar no estado de encarnação. Interessa-se
igualmente, enternecido, pelo Esperanto, cuja perspectiva
abrange numa visão futura deslumbradora, ainda porque
se sensibiliza com o fato de haver sido polonês o gênio
DEVASSANDO O INVISÍVEL
criador do brilhante idioma, Lázaro Zamenhof, seu compatriota, pois Frederico
Chopin, apesar de ser entidade evoluída, conserva ainda certos preconceitos
muito humanos, como, por exemplo, a reminiscência do seu amor pelo berço
natal, a Polônia, sempre que paira pelas atmosferas terrenas, o que nos leva a
confirmar o esclarecimento contido nas obras doutrinárias, de que um século
seria, para um Espírito desencarnado, como algum pouco tempo para nós. E não
será o grande músico um caso isolado. Léon Denis, considerado apóstolo do
Espiritismo, é tão patriota como Espírito como o foi em vida terrena, e o nosso
Bezerra de Menezes revela visivelmente a sua predileção pelas coisas do Brasil,
sempre que possível.
No entanto, seria erro supor que artistas geniais, só pelo fato de o serem, se
santificassem ou se tornassem espiritualmente superiores, após o decesso
corporaL Como homens, eles cometeram, muitas vezes, deslizes graves,
rastejaram pelas camadas inferiores da moral, o que os fêz sofrer, no Espaço,
períodos críticos, humilhações e vexames, de que estariam isentos se, a par do
ideal superior que abraçaram, como veros artistas, cultivassem também sólida
crença em Deus, respeito por suas leis e moral elevada. Basta retrocedermos ao
passado, examinando a vida de sofrimentos e provações que a maioria dos
artistas geniais houve de enfrentar neste mundo, para aquilatarmos do grau dos
seus deslizes anteriores, muito embora fôssem gênios consagrados à Arte, desde
períodos milenares, talvez, através das reencarnações. Referindo-se a artistas
geniais, assim se expressa Léon Denis no Cap. XXVI da sua obra «No Invisível».
«São homens, sim, em tudo que têm de terrestre, por suas fraquezas e paixões.
Padecem todas as misérias da carne, as doenças, as necessidades, os desejos
materiais, O que, porém, os faz mais que homens, o que neles constitui o gênio, é
essa acumulação dos tesouros
67 u
DEVASSANDO O INVIStVEL
do pensamento, essa lenta elaboração da inteligência e do sentimento através de
inumeráveis existências, tudo fecundado pelo influxo, pela inspiração do Alto, por
unia assídua comunhão com os planos superiores do Universo. O gênio, sob as
mil formas que reveste, é unia colaboração com o Invisível, unia assunção da
alma humana à divindade.,,
Por isso mesmo, muitos deles retornaram a reencarnações obscuras na própria
Terra, após curto estágio no Além, assim acontecendo ao próprio Chopin,
considerado «suicida inconsciente» na Espiritualidade, o qual se submeteu a uma
nova existência, curta, humilde e apagada, mas triunfante e meritória para si
próprio, depois da glória imortal com que presenteou o mundo. No momento,
porém, podemos afirmar, convincentemente, graças a um convívio assíduo e
fecundo com beneméritos amigos invisíveis, que os nobres artistas do passado,
exceção feita de alguns poucos, se encontram reunidos na Pátria Espiritual, onde
progridem e se habilitam para. em ocasião oportuna, voltarem em falanges
brilhantes, a fim de viverem nas sociedades terrenas servindo à Arte, a qual,
então, alcançará um inconcebível fastígio, como ao Amor, a que não serviram
ainda, pois eles próprios têm feito tais confissões sempre que lhes é permitido
confabular com os médiuns. Confessam, outrossim, o grande desgosto que os
acompanha quando reconhecem que, no estado de encarnação, arrebatados pela
Arte, esqueceram os caminhos luminosos conducentes à redenção espiritual, o
que nos leva à conclusão de que a Arte, por si só, não redime ou santifica o
artista. Ele necessitará, além dela, do cultivo do amor a Deus e ao próximo, da
excelência de uma fé inquebrantável nos princípios divinos, pois a lei que do Todo-
Poderoso emanou, para orientar o trajeto evolutivo das criaturas, não foi diferente
para os artistas. Foi, sim, a mesma, invariá 68
vel, eterna: Amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo Como a si mesmo.
Não obstante, é fato observado que o verdadeiro artista, o artista enamorado do
ideal da perfeição no Belo, ou gênio, e não apenas o artista mercenário, jamais
carrega perversidade nos próprios atos. Naturalmente bondosos, parece que a
comunhão constante com o Belo isenta-os da prática de perversões contra o
próximo, e seus infortúnios, muitas vezes acres, e a dedicação ao grande ideal
que alimentam, são levados em conta na Espiritualidade, concedendo-lhes méritos
apreciáveis, sendo que a subsequente existência que alguns deles tiveram,
escolhida voluntàriamente e não imposta, conquanto obscura, não chegou a
estabelecer expiação ou provação, mas testemunho honroso de um caráter leal a
si mesmo, cuja consciência se inquietara pela falta do cumprimento de uns tantos
deveres, de que se descuraram como gênios da Arte que foram, pois tudo indica
que a Arte tanto empolga e arrebata o seu cultor que frequentemente o aparta dos
caminhos da redenção, ou do amor a Deus e ao próximo.
*
**
Confessamos que sômente começámos a nos interessar verdadeiramente por
esse inconfundível gênio da Arte, que foi Frederico Chopin, depois que, através da
mediunidade, nos vimos surpreendida pela sua presença espiritual. E’ bem
verdade que, desde nossa infância, certas composições dele, ouvidas de quando
em vez, reproduzidas em pianos da vizinhança, exerciam sobre nossa
sensibilidade fortes impressões, extraindo da subconsciência algo comovente, que
provocava as lágrimas do coração, a ansiedade singular de regressar a um local
ignorado, cuja lembrança as barreiras corporais obsta-
A’
DEVASSANJyj o JNVIS!VEL
69
70 DEVASSANDO O INVISÍVEL
vam vir à superfície das recordações prôpriamente ditas, ansiedade que, algumas
vezes, se transformava em verdadeira inquietação.
Pelo ano de 1931, entretanto, na noite de 30 de Junho, médium já desenvolvida,
com a particularidade de nos afastarmos do cárcere corporal com muita lucidez,
vivendo, assim, muito da vida espiritual, e dela nos recordando, por vezes, ao
despertar do transe, deu-se o nosso primeiro encontro com a entidade
desencarnada Frederico Chopin. Nosso Espírito familiar Charles, que afirma ter
vivido sua última existência terrena na época do grande artista (reinado de Luís
Filipe, na França, na mesma época de Vítor Hugo, Allan Kardec e outras
eminentes figuras da Literatura, das Artes e da Filosofia), Charles deu-nos a
conhecer, na data mencionada, um pungente drama a que assistira à mesma
época, em Paris. Esse drama, iltimamente escrito pelo próprio Charles através de
nossa faculdade mediúnica, foi dado a público, pela FEB, sob o nome de «Amor e
Õdio». No ambiente espiritual inesquecível a que então fomos transportada,
encontravam-se várias personagens, além do próprio Charles e da entidade
«Gaston d’Aberville», figura principal daquela obra, a quem Charles conhecera
pessoalmente em Paris; destacavam-se dentre elas Vítor Hugo e Frederico
Chopin, que se deixara ver tocando em um piano de dimensões mais avantajadas
do que o comum dos pianos que conhecemos.
Observámos que o grande músico se apresentava elegantemente trajado, como
para um concerto, e sua aparência, inteiramente humanizada, porque
materializada, prestava-se à observação, impressionando a memória como sói
acontecer na Terra, onde guardamos a recordação da indumentária usada pelos
nossos amigos e comparsas da sociedade. Assim sendo, recordamo-nos de que
as calças que trajava eram diferentes, no tom do colorido, da casaca, pois
acusava nuança de azul mais
——
DEVASSANDO O INVISÍVEL 71
pálido, estando como que salpicada por gotas de orvalho,
traduzindo, toda a indumentária, a delicadeza característica
do plano espiritual, isto é, era visivelmente
fluídica, ao passo que sobre toda a configuração do artista
incidia um luzeiro azul, impressionante e lindo.
À volta dele, enquanto tocava, tudo se transformava:
em vez do local azul, florido, paradisíaco, em que nos
achávamos a princípio, começaram a se esboçar, lenta-
mente, até dominar toda a paisagem em derredor, pobres
árvores da Terra, estradas tristes quais as que nos são
comuns, campos de cultura de cereais, nostálgicos, como
pincelados de tons amarelos e rústicos, destituídos daquela
fecundidade vibratória própria dos ambientes fluídicos
do Espaço, bosques torturados por algo indefinível,
como contundidos vibratôriamente pelos malefícios terrestres,
e casario modesto, lembrando pequena aldeia de
padrão europeu. Tivemos a impressão de que fôramos
insensivelmente transportada de regresso à Terra e que
nos encontrávamos em local desconhecido.
Tão intensamente se impunha esse panorama à nos- W sa perspectiva, que
tivemos a sensação de caminhar por
uma estrada que — tínhamos certeza — iria findar em
local determinado. Era como a perspectiva apresentada
num filme cinematográfico, com a particularidade, porém,
de sugerir ao observador que ele se encontrava
dentro da paisagem, em vez de a estar apreciando externamente.
Notando nossa estranheza, ou desejando, mais provàvelmente,
proporcionar elementos para estudos e meditações,
Charles explicou:
«São paisagens da antiga Polônia, que ele gosta
de recordar e reter, tornando-a presente, aprofundando-
-se mentalmente pelo passado... pois ainda é sensível à
lembrança da casa paterna, ao seu antigo berço natal...
Ele gosta da Terra. . . » — o que mais uma vez indicará
que os cenários fluídicos são realizações da mente de
4
‘1
DEVASSANDO O INVISÍVEL
72
DEVASSANDO O INVISÍVEL
DEVASSANDO O INVISÍVEL 75
isso recebeu ele o dom de intérprete do Mundo Invisível; do contrário não os
citaríamos aqui, máxime por ser o manifestante um vulto que mais amado se torna
quanto mais recuada fica a data em que viveu sobre a Terra.
Como de hábito, independente sempre da nossa vontade, tivemos o espírito
arrebatado para um voo pelo Espaço, cuja finalidade se manteve velada ao nosso
entendimento terreno até hoje, pois de coisa alguma conseguimos recordar-nos ao
despertar. Apenas pudemos perceber que fôramos atraida sob as injunções de
Charles, pois que o víramos aproximar-se, distintamente, antes de lançar a
descarga fluídica que nos levou a adormecer magnèticamente, no transe que se
seguiu. Ao regresso, porém, mal despertávamos, notámos estar acompanhada
também por outra entidade, além de Charles, reconhecendo tratar-se de Frederico
Chopin, já nosso conhecido desde o ano de 1931. Totalmente desperta, mas ainda
imobilizada sob a dormência da letargia, compreendemos que se acentuava a
materialização das duas individualidades em apreço, pois jamais os amigos
espirituais abandonam seus médiuns antes que se desfaça a ação melindrosa de
um transe dessa natureza. Ao contrário, trazem-nos sempre até ao aposento onde
se encontra o corpo semimorto, ajudando-os na operação penosa de se
reapossarem definitivamente do mesmo. No entanto, o amigo Chopin, sentando-
se numa cadeira colocada em frente ao nosso leito, deixou-se materializar tão
perfeitamente que apresentou todas as caracterísücas humanas, enquanto, de pé,
fluídico e transparente, levemente lucilante, com a sua indumentária de iniciado
hindu, Charles como que assistia, ou presidia, o fenômeno, pois os iniciados
gostam de provocar sempre, para os seus médiuns, fenômenos empolgantes, a
fim de instruí-los, preferindo, contudo, as manifestações tipicamente espirituais.
4pj
76
DEVASSANDO O INVISÍVEL
Chopin entrou a narrar, então, os sofrimentos por que passou desde que se
reconheceu irremediàvelmente doente, atacado pela tuberculose. Disse da
desolação que o dominou ante a impossibilidade de se dedicar aos trabalhos que
pretendia levar a efeito, e aludiu às dificuldades financeiras que o afligiram, às
humilhações e desgostos daí decorrentes, sem se referir, jamais, à sua grande
amiga George Sand. Mas, à proporção que narrava, evocando o próprio passado
terreno, revivendo-o, em si mesmo, transformava-se: voltou àquela fase da sua
existência, mostrou-se enfermo, tuberculoso, abatido, rouco, os olhos profundos e
pisados, o peito arquejante, cansado pelo esforço da conversação. Vimo-lo tossir
dolorosamente, expectorar, levar o lenço à boca, ter hemoptise! Vimo-lo suar e
enxugar a fronte e o rosto, com o lenço, e sentimos o seu hálito de doente do peito
sem o devido trato! Não mais um Espírito desencarnado, mas um homem
gravemente enfermo, com todos os complexos do estado de encarnação!
Chorava, revelando grande sofrimento moral, além do físico.
Assaltada, então, por um intenso e indefinível sentimento de angústia e
compaixão, mas ainda meio atordoada pelas últimas gradações do transe,
levantámo-nos do leito, ajoelhámo-nos diante dele e nos pusemos a chorar
também, pois o médium canaliza para si todas as impressões da entidade com
que se comunica - Então, tínhamos os braços apoiados sobre seus joelhos e as
mãos cruzadas como em prece, e ele nos pareceu tão sólido e material como
qualquer ser humano - Dizia sentir febre e tocou nossas mãos com as suas,
provando o que dizia:
sentimos, com efeito, que aquelas mãos estavam quentes e húmidas, acusando
temperatura elevada - Queixou-
-se de que tinha o estômago e os intestinos inchados e doloridos, devido à
doença, a qual àqueles órgãos também afetara, e, ao dizê-lo, comprimia-os com
as mãos.
O sofrimento que nas atingia era intenso e insupor
DEVASSANDO O INVISIVEL 77
tável. Charles interveio, levantando-o docemente e furtando-o, e a si próprio, de
nossa visão. Mas, antes que se desfizesse de vez o fenômeno, tomámos de suas
mãos e beijámo-las, exclamando: «Adeus, Fred!», pois esse é o tratamento que
lhe damos sempre, durante os transes dessa natureza. Esse fenômeno deixou-
nos entristecida e abalada durante muitos dias.
De outra feita, isto é, a 10 de Março de 1958, materializado plenamente à nossa
frente, recordando seu estado humano, deixou-se contemplar muito agasalhado
com roupa de lã e envolvido num pequeno cobertor, ou manta, que lhe tomava a
cabeça e os ombros, emprestando-lhe aspecto feio. Dizia passar mal durante o
jnverno e no período das chuvas, e mostrou os pés, que estavam inchados, coisa
difícil de um médium poder observar, os pés, numa entidade desencarnada,
mesmo quando materializada. Observámos novamente que suas calças eram de
«tecido de lã azul», com a particularidade de mostrar pequenos pontos reluzentes
em alto relevo, como gotas de orvalho, as meias também eram de lã, de cor
branco marfim, quase creme, e que usava chinelos muito grandes, arrastando-os
ao caminhar, parecendo que não lhe pertenciam. Essa materialização, tão perfeita
quanto a antecedente, fêz-nos vê-lo sentar-se ao nosso lado, num divã. Sentimos
o contacto da sua presença, a impressão do calor natural a um corpo carnal, como
se, realmente, se tratasse de uma pessoa humana que nos visitasse. Não nos
recordamos, porém, de ne nhuma conversação substancial, ou doutrinária, que
tivéssemos. Jamais lhe perguntamos algo, e nunca somos a primeira a falar, o
que, de igual modo, acontece sempre que nos comunicamos com outros Espíritos.
Note-se que a conversação assim realizada nunca se processa através da palavra
enunciada, mas telepàticamente, o que é tanto ou mais eficiente do que o verbo
falado, a tal ponto que o médium distingue as vibrações de todos
79
rituais seculares), capaz de executar missões dessa na-
*
**
Na Espiritualidade prôpriamente dita, Frederico Chopin se apresenta assaz
diferente da forma por que se deixa ver nas pesadas paragens terrenas. Tal como
é ali, ou seja, no seu estado normal de Espírito, fluídico, leve, não se poderá
mostrar na Terra. Será necessário então que o médium, em espírito, durante um
desdobramento, possa ir até ele, desde que auxiliado ou «preparado» por seus
Guias espirituais. Esse fenômeno, conquanto difícil, não será impossível a
qualquer médium, desde que se haja desprendido razoàvelmente das atrações
humanas para aliar vibrações com certos estados especiais do Invisível.
Char]es proporcionou-nos, há cerca de dois anos, um desprendimento dessa
categoria. Então, pudemos entre- ver o amigo Chopin «na glória do seu triunfo
espiritual», como se expressam os instrutores do Mundo Invisível. Tivemos a
impressão de nos encontrarmos, então, diante de um anjo, tal o encantamento
que de sua individualidade irradiava. Lucilante, angelical, todo envolvido em jactos
de luz azul feérica, pudemos contemplá-lo na plenitude da sua candura pessoal,
da sua formosura morai:
terno, afável, preocupado em ser amável, mas tímido e tristonho sempre, simples
até ao enternecimento. Diante de tão fulgurante visão espiritual, nosso espírito
naturalmente curvou-se de joelhos e se desfez em lágrimas, pois nenhum médium
contemplaria com indiferença um Espírito no seu verdadeiro elemento espiritual.
Contudo, ele estava, ainda, trajado, e por mais que tal revelação contrarie o leitor,
não nos será possível afirmar outra coisa, porquanto aqui nos propusemos revelar
o que nos
DEVASSANDO O INVIStVEL
tureza.
1.
DEVASSANDO O INVISÍVEL
sa faculdade mediúnica tem captado no Além-Túmulo, e foi isso, e não outra
coisa, que conseguimos entrever. Notámos, pois, que se trajava como um
elegante fidalgo do século XVIII: calções de seda azul até aos joelhos,
rebrilhantes, salpicados de gotas de orvalho; blusa de mangas amplas, ajustadas
nos punhos, de cetim brai co, brilhante, mas sem trazer o casaco clássico, da
época. Não vimos os pés, porque o luzeiro azul que o envolvia como que os
encobria. Compreendemos, então, que ele tivera uma existência ao tempo da
Regência, na França, ou de Luís XV, na qual pertencera à nobreza, existência que
lhe fora muito grata. Todo o seu aspecto irradiava vibrações reveladoras de um
grande poeta, de um profundo pensador. Beijámos-lhe, como sempre, as mãos,
que ele não negou estender, e de joelhos, e em lágrimas, despedimo-nos, como
da primeira vez: «Adeus, Fred!»
Ainda na mesma oportunidade, afirmou o instrutor espiritual Charles que Frederico
Chopin seria a reencarnação do poeta romano Ovídio (13), que viveu cerca de
quarenta anos antes do Cristo, falecido no ano 16 da nossa era, e do pintor
itAllano Rafael Sanzio (14), pois que o intelectual, o artista, na sua evolução pelo
roteiro do Saber, dentro da Arte, há-de passar por todas as suas facetas,
sublimando-se até à comunhão com o Divino. E que Espíritos como Chopin,
Beethoven, Mozart, Beluni, Rossini, etc., naturalmente bondosos, embora ainda
não santificados ou plenamente redimidos, não têm gran (13 Públio Ovidio Naso
— poeta latino, fácil e brilhante, amigo de Vergilio e de Horácio. (43 a. .7. O.)
(14) Rafael Sanzio — pintor, escultor e arquiteto itilano, 1483-1520. O seu gênio
reunia todas as qualidades: perfeição do desenho, vivacidade dos movimentos,
harmonia das linhas, delicadeza do colorido. Deixou grande número de obras-
primas. E’ considerado o poeta da Pintura, como Ovídio foi considerado o músico
da Poesia e como Chopin é considerado o poeta da Música.
80
DEVASSANDO O INVISÍVEL
que, por essa razão, não tem visitado a Terra com frequência, àltimamente.
Ouvindo-a, perguntámos-lhe, então, com toda a naturalidade, como sói acontecer
quando conversamos com qualquer amigo do mundo invisível:
mente
81
82 DEVASSANDO O INVISIVEL
Porque não poderei aliar as duas qualidades, se os artistas, muitas vezes, não
passam de médiuns?... O problema estará na boa orientação da faculdade que se
disponha... Nada me impede, entretanto, de continuar como artista nas
reencarnações vindouras, pois não profanei as Artes nem cometi quaisquer
deslizes nesse setor. Dependerá, apenas, do meu livre arbítrio... Mas, no
momento, o que me preocupa mais é o desejo de servir aos pequeninos e
sofredores, aos quais nunca protegi. Em minhas passadas existências, apenas
servi aos grandes da Terra. Futuramente, porém, será a vez dos humildes... E não
desejo nem mesmo auferir proventos monetários, pessoais, da Música. As Artes,
em geral, deverão ser praticadas gratuitamente, com amor e unção religiosa...
A nós própria admirou a notícia inesperada e sugestiva, que não seria possível
calar nestas páginas. Ele próprio, Frederico Chopín, autorizou sua revelação,
visitando-nos enquanto fazíamos o presente trabalho. E suas palavras foram,
textualmente, as acima citadas.
Eis, pois, o que espontâneamente — pois, repetimos, jamais solicitámos algo — o
Invisível nos concedeu acerca de Frederico Chopin, além de mais algumas
informações que não julgamos interessantes para estas páginas. Não poderemos,
é certo, provar com fatos concretos o noticiário de que nos vemos intérprete, visto
tratar-se de assunto transcendental, que atinge a categoria de revelação. Mas a
Deus tomando por testemunho da sinceridade com que aqui nos externamos,
deixamos aos nobres pesquisadores da Revelação o labor sagrado de obterem a
confirmação lógica e insofismável do que fica exposto. Aliás, cumprimos apenas
um dever de consciência, pois, se, como sabemos, a função da mediunidade é
desvendar os segredos da morte, transmitir notícias do mundo invisível ao mundo
terreno, nada mais fazemos, com efeito, do que desincumbir-nos de um de-
DEVASSANDO O INVISIVEL 83
ver, não guardando, avaramente, fragmentos da vida espiritual, a nós revelados,
de um vulto que ao passar pela Terra a encantou com o seu gênio de artista e cuja
imorredoura lembrança faz vibrar, ainda, o coração de quantos sintam na alma
inclinações para as arrebatadoras expressões do Ideal sublimado no Belo.
CAPÍTULO IV
Nas Regiões Inferiores.
“Pergunta — Então, poderia também (o Espírito) fazer uma substância alimentar?
Suponhamos que tenha feito uma fruta, uma Iguaria qualquer: se alguém pudesse
comer a fruta ou a Iguaria, ficaria saciado?
Resposta — Ficaria, sim; mas não procures tanto para achar o que é tão fácil de
compreender. Um raio de sol basta para tornar perceptivais aos vossos órgãos
grosseiros essas partículas materiais que enchem o espaço onde viveis. Não
sabes que o ar contém vapores d’água? Condensa-os e os farás voltar ao estado
normal. Priva-
-as de calor e eis que essas moléculas impaipáveis e invisíveis se tornarão um
corpo sólida e bem sólido, e, assim, muitas outras substâncias de que os químicos
tirarão maravilhas ainda mais espantosas. Simplesmente, o Espírito dispóe de
instrumentos mais perfeitos do que os vossos: a vontade e a permissão de Deus.”
(ALLAN KARDEC — “O Livro dos Médiuns”. Cap. VIII — Do Laboratório do Mas-
do Invisível, 13’ pergunta.)
Nem sempre será dado ao médium, durante o desdobramento da sua
individualidade espiritual, visitar as formosas estâncias fluídicas onde a paz e a
beleza, a fraternidade e a luz, o consolo e a alegria revigoram o seu espírito para o
prosseguimento da marcha terrena. Os deveres da mediunidade também o
requisitam para os locais inferiores, antros de miséria e degradação loca-
DEVASSANDO O INVISÍVEL 85
lizados, às vezes, nos próprios perímetros terrenos, como nas suas regiões
atmosféricas, onde se aglomeram entidades ainda inferiorizadas pelo erro e a
materialidade, e aos quais, por isso mesmo, chamaremos regiões inferiores.
Nesses locais, de que os bairros miseráveis de uma grande cidade darão ideia
aproximada, exercerão os médiuns, acompanhados sempre de seus Guias e
Instrutores espirituais, tarefas melindrosas nos setores da legitima fraternidade,
podendo-se, mesmo, asseverar que nesse delicado exercício espiritual é que se
acentua a significação da sua qualidade de médium, ou intermediário.
Esses agrupamentos de entidades desajustadas, aos quais se têm denominado
regiões Inferiores, por não se conhecer outro vocábulo que melhor os defina e
retrate, tanto poderão existir no Espaço, dentro da densidade atmosférica, como
na própria Terra, pois estarão sempre onde se encontrarem as entidades que os
compõem, o que quer dizer que sua configuração poderá ser móvel. Suponhamos
uma das favelas de má fama, aqui no Rio de Janeiro, cujos habitantes se
mudassem, ora para Copacabana, ora para a Cinelândia, ora para Jacarèpaguá
ou para o Pão de Açúcar. Todos esses locais nada mais passariam a ser senão a
região trevosa criada pelos hábitos inveterados dos favelados, por sua educação
ínfima ou deficiente e suas vibrações e atos viciados, pois é sabido que cada um
de nós carrega consigo próprio o seu inferno ou o seu paraíso. De forma idêntica
serão as regiões inferiores do Mundo Invisível: criações mentais coletivas de
entidades afins, que praticarão, além da morte, os mesmos hábitos e os mesmos
atos a que se arraigaram no estado humano. E todos esses locais, assim
construídos, ainda que se estabeleçam nos âmbitos da Terra, pertencerão sempre
ao Invisível, mas não pràpriamente à Espiritualidade, pois esta implica a
emancipação do Espírito das atrações da matéria, o domínio
DEVASSANDO O INVISIVEL
mental elevado ou superior, a ascensão a planos transcendentes do Infinito.
A essas regiões, portanto, as inferiores, impulsiona- dos pelos obreiros da Verdade
incumbidos da missão do momento, servindo-lhes de porta-voz, representando-os,
mesmo, porque ínterpretando-os para outrem, hão-de os médiuns, para lá
transportados em corpo espiritual, levar o consolo e a esperança, o
esclarecimento e o estímulo às almas aflitas, mergulhadas no desalento ou no
ostracismo, levantar-lhes o ânimo, expondo ao entendimento de cada uma as
doçuras da Boa-Nova do Cristo; reanimar-lhes a coragem, ao influxo do
entusiasmo que transborda dos seus próprios corações de crentes da verdade
eterna, da ciência do Espírito, as quais a eles mesmos, médiuns, têm amparado
diàriamente, nos fogos dos testemunhos terrenos, pois que o fato de ser médium,
de conviver com as entidades desencarnadas e conhecer certos segredos do
Invisível, não exclui o imperativo das provações para que reencarnaram. De outro
modo, ser médium não implica tão sômente obter manifestações ostensivas de
entidades elevadas ou inferiores do Invisível, no recinto de uma agremiação de
experimentações espíritas, transmitir receituário e passes ou escrever belas
páginas, para edificação geral, sob impulsão do Alto. Sua aptidão lhe confere
também o dever de se consagrar a tarefas quiçá mais amplas e melindrosas,
durante as horas de emancipação do seu espírito, através do sono natural, ou do
letárgico, que seus Guardiães gostarão de provocar, para que mais eficientes se
tornem a liberdade e a desenvoltura indispensáveis à movimentação a realizar-se.
Em geral, os médiuns se prestam a tais operações psíquicas, seja voluntàriamente
ou obrigados pelo império da irresistível lei a que se subordina a faculdade
mediúnica, conquanto sejam preferidos, pelos Instrutores e Guias, os que acusam
maior energia de caráter, adquirida e retemperada
DEVASSANDO O INVISÍVEL 87
nas retortas das experiências, através do sofrimento. Todavia, é comum não se
lembrarem de nada, ao despertar, a não ser que a pressão magnética elucidadora
dos próprios Guias a tanto os habilite, e, é claro, sempre para fins de utilidade
geral.
Como os demais médiuns, portanto, desde nossa primeira juventude vimos
exercendo tarefas mediúnicas nas «regiões inferiores» do Invisível, onde a
desgraça e a dor, a desordem e o vício, o opróbrio e a miséria, a maldade e o
remorso, o ódio e a vingança, e até a licenciosidade e o crime lavram
desequilíbrios mentais-vibratórios impossíveis de ser relatados a rigor, os quais,
de tão intensos, se afigurariam inacreditáveis às mentalidades pouco afeitas a
análises profundas sobre assuntos transcendentais. E porque os desprendimentos
espirituais peculiares às nossas faculdades, através do transe letárgico, trazem a
singularidade de permitir lembranças, por vezes minuciosas, do que nos é dado
presenciar no Espaço, procuraremos descrever, nestas páginas, algo de nossas
experiências, já que o fazemos ao sabor das intuições dos amigos espirituais que
nos assistem e cumprindo, por sinal, suas próprias determinações.
**
Geralmente é a entidade radiosa Adolfo Bezerra de Menezes, o coração fraterno e
generoso do médico que ainda hoje, na Espiritualidade, prefere clientela obscura e
sofredora, quem nos arrebata o espírito para operosidades de ordem espiritual em
torno de desencarnados, de mnfima classe, das sociedades invisíveis. Os
mentores hindus preferem levar seus pupilos, geralmente discípulos espirituais, a
regiões paradisíacas do Espaço, onde lhes proporcionam visões e panoramas de
arrebatadora beleza, a título de estímulo para o progresso e lições
88 DEVASSANDO O INVISfVEL
a
preciosas, muito embora, para tais realizações, lhes exijam disciplinas tão severas
que recordam o preparo austero da iniciação antiga. Não sabemos, no entanto, se
tão dedicados amigos, ao se servirem dos médiuns encarnados para tais labores,
têm como único intuito a instrução dos homens em geral e o auxílio ao progressõ
do próprio veículo mediúnico, o qual, desse modo, se beneficiaria de inestimáveis
cabedais. Sabemos é que, frequentemente, somos levada a verdadeiros antros de
trevas, para serviços de esclarecimento em torno de pobres entidades sofredoras
e endurecidas; que os Instrutores sobre nós projetam intuições vigorosas, para
distribuirmos o devido socorro, e que por essa forma transmitimos doutrinação,
conselhos, advertências e até passes.
Há cerca de um ano, fomos arrebatada em espírito para visitação a entidades
desencarnadas obsessoras, já em vias de arrependimento. Porque fôsse muito
pronunciada a emancipação de nosso ser espiritual, pudemos observá-las, e ao
panorama que as rodeava, com clareza suficiente para permitir o presente estudo.
Detalhe importante: o médium jamais se admira, se assusta ou se perturba, ao
penetrar a vida espiritual. Tudo se lhe afigura, então, natural, familiar, comum,
como se habituado se encontrasse, de longa data, ao que vê, ao que faz e ao que
assiste, o que vem provar que o Invisível é, com efeito, a verdadeira pátria de
todos nós. Aquelas entidades visitadas, porém, se encontravam apavoradas ante
as consequências do longo percurso pelos canais do crime, por elas vislumbradas
em suas intuições, pois vinham todas, desde época recuada, servindo ao mal, não
apenas no estado humano, terreno, mas ainda durante o estágio no plano
invisível. Eram da mais horripilante categoria. E, defrontando-as, tivemos a
imprsão de que nos encontrávamos em presença de criaturas
—
DEVASSANDO O INVISÍVEL 89
fantasiadas com «dominós» inteiramente negros (15), com o respectivo capuz. De
seu aspecto geral se desprendiam fealdade, baixeza de sentimentos e vibrações,
grosseria, inferioridade, incapazes, todos, de impulsos voluntários para o
progresso, mendigos espirituais, na absoluta dependência dos obreiros da
Caridade, os quais, dominando a repulsa que poderiam sentir em presença de tão
extrema miséria, os auxiliavam de boamente, revigorando-lhes as forças para
novas tentativas de recuperação e progresso. Verificamos que, em tais ocasiões,
somos sempre vista e compreendida por essas entidades, mas que os Instrutores,
sob cuja tutela nos encontramos, jamais o são. Nós mesma, nessas emergências,
a estes entrevemos com dificuldade, certificando-nos de sua presença não tanto
pela visão, mas através das vibrações por eles emitidas, à guisa de palavreado
sonoro, a fim de recomendar os trabalhos a desenvolver, e por um sentimento
indefinível de confiança e felicidade, uma sen. sação singular, espécie de intuição
poderosa, que substitui a visão prôpriamente dita.
Eram cerca de dez as entidades então visitadas. Encontravam-se como
aprisionadas em pequeno e miserável compartimento, em promiscuidade
chocante. Haviam sido homens quando encarnados, conservando os seus
Espíritos, agora, por isso mesmo, os característicos masculinos. Vibratàriamente,
encontravam-se muito fracas, como alguém em convalescença de grave
enfermidade, apavoradas, desencorajadas para o recurso da oração, porque ainda
ímpios os seus sentimentos; temerosas de se verem em presença de Deus,
porque certas da própria culpabilidade, atormentadas pelas visões alucinatórias
dos crimes praticados. Essas visões, frutos das suas vibrações mentais, nós as
víamos tão bem quan (15 Espécie de túnica ampla, comprida, que antigos
carnavalescos usavam durante os folguedos do Carnaval.
90 DEVASSANDO O INVISÍVEL
to elas próprias, infestando o perímetro em que permaneciam. Eram dramáticas:
contendas, lutas corporais, assaltos, seduções de menores, roubos, assassínios,
obsessões, suicídios! Ou obscenas, sórdidas, vis, maléficas, atrozes!
Desesperados, esses infelizes se debatiam, encobrindo os olhos com as mãos ou
ocultando a cabeça com os braços, ou com os trapos que sempre encontravam ao
alcance, na ingênua suposição de que, assim agindo, se furtariam ao horror das
próprias ações passadas, a ecoarem nos refolhos da consciência, como se
pirogravadas estivessem nas suas sensibilidades mentais; estiravam-se,
chorando, em tumultuoso vozerio, sobre um como tablado imundo, em
promiscuidade repulsiva; refugiavam-se por entre coberturas esfarrapadas, aos
gritos e uivos de revolta e horror, quais verdadeiros loucos em momento de
aflitivas crises; levantavam-se em seguida, sem jamais lograrem repouso, os olhos
em fogo, dilatados como se tocados de assombro, os cabelos eriçados, o corpo
(perispírito) tremente, como sacudido por violento nervosismo, os dentes cerrados
como se dolorosos ataques epilépticos se anunciassem, irremediáveis. Quanto às
«vestes)>, quando não se apresentassem com os já meucionados «dominós»
negros, eram rotas e imundas: empapadas de sangue ou de lama, a exibir as
fases da putrefação cadavérica, ou de matérias asquerosas como o pus e o
sangue putrefato. Um fétido nauseabundo e pestilento tresandava deles,
repugnando também a nós outra, de início, para desaparecer, depois, da
sensibilidade do nosso olfato. O solo do compartimento em que se detinham,
espécie de quarto ou sala, de mui pequenas dimensões, com uma janela
gradeada à esquerda e urna porta à direita, era tão imundo quanto eles próprios,
igualmente empapado de sangue e humores fétidos, a tal ponto que os infelizes se
horrorizavam de si mesmos, sentindo-se tolhidos, amesquinhados, incapazes de
reagir
DEVASSANDO O INVISÍVEL 91
contra tão miserável estado de coisas. A porta deitava para um pequeno terreno e
permanecia aberta, permitindo passagem aos prisioneiros, caso desejassem sair.
Ocorria, no entanto, um fato curioso: os pobres voluntàriamente permaneciam
naquele covil, presidiários de si mesmos, isto é, do próprio passado!
O terreno acima citado dividia-se em dois por uma cerca, que se nos afigurou
construída em arame farpado. No trecho à esquerda, para o qual deitava a porta,
erguia-se uma cobertura tosca, espécie de pequeno galpão, muito sólido aos
nossos olhos, onde uma mulher de cor negra (Espírito desencarnado,
voluntàriamente materializado, em serviços de resgates ou beneficência),
lembrando o tipo das antigas escravas africanas, ao tempo do Império, sorridente
e simpática, deixando entrever certa luminosidade no seu envoltório perispirítico,
parecia «cozinhar» para os «habitantes locais». Sentimos o aroma apetitoso da
comida e espionámos: preparada em grandes tachos de cobre, como os que se
usavam outrora para o fabrico doméstico da goiabada, afigurou-se ao nosso
entendimento tratar-se de leguminosas e hortaliças, as quais se nos desenharam
à visão como alfaces, tomates, cenouras, batatas, azeitonas, cebolas, em salada
(16). Esse local era agradável pela presença da negra, em quem, com efeito,
reconhecemos Espírito ope (16 Evidente é que, no panorama fluídico dessa
cozinha, existia o trabalho mental realizado pela vontade da entidade espiritual
responsável pela vigilância das entidades sofredoras, a qual teria sido, quando
encarnada, alguma escrava ou serviçal encarregada de cozinhas terrenas. Pela
ação da vontade sobre os fluidos e as matérias essenciais do mundo invisível, ela
teria criado o panorama citado, para a caridosa assistência aos seus pupilos em
precário estado de materialidade, pois é sabido que o Espírito possui liberdade de
ação, no Além-Túmulo, para as tentativas em torno da recuperação dos infelizes
desajustados das normas ou leis espirituais.
92 DEVASSANDO O INVISIVEL
roso, pelos labores de vigilância a favor dos delinquentes confiados à sua guarda,
como pela visão das iguanas, que nos pareceram saborosas. O quintal da direita,
p0- rém, dir-se-ia tétrico e singular cemitério, pois que do solo fétido e lodoso
emergiam mãos humanas súplices, cabeças desgrenhadas, de olhos
aterrorizados, bradando por socorro e piedade, cadáveres estirados, a se
desfazerem em sangue e matérias putrefatas, que encharcavam a terra, e braços
e pernas humanos dispersos por aqui e por ali; visão macabra, que perturbaria a
mente do vidente, se para tais serviços o médium não fôsse prèviamente
fortalecido por assistência especial.
Ora, conhecedores da existência desse extravagante cemitério, os criminosos,
apesar dos remorsos alucinadores, preferiam a permanência indefinida no
pequeno compartimento a tentarem a fuga, pois sabiam que teriam de cruzar o
cemitério e divisar, naqueles impressionantes despojos, as vítimas da sua
maldade de homicidas e obsessores que haviam levado, igualmente, tantas
criaturas incautas à prática de homicídios e ao suicídio.
À nossa chegada, um dos prisioneiros, exatamente daqueles trajados de «dominó
negro, aproximou-se, como que nos recebendo. Notámos que esse já não trazia
capuz, sinal de melhoria de vibrações. Seu semblante, muíto visível à nossa
observação, indicaria um homem que houvesse falecido aos cinquenta anos de
idade, e mostrava-se branco marmóreo e infinitamente triste, como marmóreas se
apresentavam também as mãos, largas e compridas. Compreendemos que ele
absolutamente não distinguia Bezerra de Menezes, mas sômente a nós. Nenhum
pavor ou sobressalto perturbou nossa confiança Sentimo-nos antes possuída de
grande compaixão e desejo de auxiliar. Ele, porém, falou, com voz e modos rudes
e impertinentes, como pessoa de pouca educação:
— Tenho fome! Porque não me trazem um verdadeiro almoço?. . Oh! Há quanto
tempo não posso comer!
DEVASSANDO O INVISÍVEL
93
1
—‘
DEVASSANDO O INVISIVEL
auto-sugestão, que já descambou para uma desconcertante auto-obsessão. Todo
o ambiente que distingues aqui, minha irmã, excetuando-se a cozinha, é criação
mental vibratória destes dez criminosos, cujo caráter começa a ser desafogado
das ondas da perversão, através das dores do remorso! Não existe aqui cemitério
nem prisão, como não há imundícies, na expressão formal do termo, tal como os
entendem os encarnados. Eles, porém, criam e mantêm tal ambientação,
concretizando-a, sem o saberem, com as próprias forças mentais, na retrospecção
de atos passados, e vivem nela, dentro da mais positiva realidade, sem mesmo
saberem avaliar a profundidade e importância do fenômeno que se estabelece. A
própria fome que os tortura nada mais representa do que o estado de suas
consciências feridan pelos atos passados: estes pobres sofredores de hoje,
quando encarnados, assassinaram pais de família para roubar, e, como
obsessores, uma vez desencarnados, levaram outros tantos ao suicídio, ao
homicídio, etc. Ora, muitas das suas vítimas deixaram viúvas e órfãos na miséria,
padecendo necessidades extremas. Eles sabem disso.
e, recordando os órfãos famintos, sentem o reflexo consciencial e padecem mil
torturas e ultrajes, a fome inclusive, enquanto vêem, em visões macabras, os
despojos que suas armas assassinas levaram ao túmulo... A si próprios castigam,
pois, com uma severidade satânica, uma justiça implacável! Porque foram
obsessores, habituados a criarem sugestões infernais para atormentarem o
próximo, viciaram a própria mente em criações macabras e agora obsidiam a si
próprios, originando, com toda a força mental própria do Espírito, este tétrico
panorama, resultado do reflexo dos atos passados nas próprias vibrações da
consciência. Enredaram-se de tal forma nos delitos cometidos que agora vêem,
sentem e como que descobrem tudo quanto possa evocá-los e revivê-los! Não!
Ninguém os castiga a não ser a consciência deles
:e
94
DEVASSANDO O INVISIVEL
1.
96 DEVASSANDO O INVISÍVEL
E’ raro que um médium, nessa situação, possa falar ao seu Guia ou interrogá-lo, e
ainda menos resistir às suas ordens. Geralmente, ele se conserva silencioso e
passivo, a tudo obedecendo de boamente e agindo como sob o efeito da hipnose.
Acreditamos, mesmo, residir aí o segredo de certas atuações audazes dos
médiuns, no estado letárgico e até mesmo em vigília: o seu Guia Espiritual impõe-
lhe a hipnose e o leva a agir com oh’diência passiva, tal como no fenômeno, tão
conhecido entre nós, em que o magnetizador dá uma ordem ao «sujet» e é
obedecido, às vezes, um mês, ou mais, após o comando transmitido no transe
hipnótico. Será, pois, o médium, principalmente no estado letárgico, um autômato,
servindo ao verdadeiro servo do Amor; é uma vontade dominada por outra
vontade maior, um ser confiante que nada teme e cujas impressões de felicidade
espiritual são indescritíveis e indefiníveis. Todavia, assustada pela ideia de falar a
um obsessor de tal natureza, os quais geralmente odeiam os médiuns, porque são
estes que os desmascaram, ousámos interrogar o nobre instrutor:
— Que lhe direi?...
Não sabemos se o Guardião respondeu à nossa impertinência, pois não nos
recordamos da resposta. Talvez a pergunta fôsse dirigida a nós mesma e não a
Bezerra de Menezes. Sabemos sàmente que nos aproximámos,
Çconfiante, do infeliz culpado, que descansámos a mão so br sua cabeça, e o
interpelámos:
— Porque choras, filho?...
Sincera compaixão invadia nossa alma. Sentíamo-nos
envolvida por singular doçura, e todo o nosso ser era uma
‘ terna vibração de fraternidade. Aquele ser, tão desa gradáve pelos próprios erros,
afigurou-se-nos, de súbito,
um irmão muito querido, uma criança ignorante e infeliz, a quem devíamos
proteção e amor Mas, estamos
convencida de que tais sentimentos e impressões mais
DEVASSANDO O INVISIVEL 97
não seriam do que os amorosos reflexos da superioridade moral do dedicado
instrutor, que de nossas faculdades se utilizava para destilar o consolo e a
esperança no ânimo apoucado do pecador. Ouvindo-nos, voltou-se aquele e
respondeu, já agora com humildade e desânimo:
— Tenho fome.., mas não posso comer.., e sofro muito...
— Isso prova, meu amigo, que o alimento de que careces não será bem esse,
mas, um outro, de natureza diversa, que esqueces de desejar e solicitar. . . E’ a
prece! O pão do Céu, que descerá, até as tuas necessidades, do amor generoso
de Jesus-Cristo, a fim dc te reconfortar, saciando as ânsias do teu desespero...
— Não! Esse pão eu não posso desejar! Sou um miserável, desgraçado de mais
para elevar tão alto os meus desejos. . . e a mim, certamente, seria negado esse
pão...
— Mas.., foi para os pecadores como tu, de preferência, que Jesus se apresentou
em nosso círculo de progresso, ou seja, em nosso mundo. . . O pecadores e os
réus obterão de sua complacência todo o auxílio possível para se reerguerem em
demanda dos caminhos do dever, bastando que, para tanto, o invoquem através
da oração bem sentida, demonstrando boa vontade para a regeneração...
— Como poderei serenar-me, para algo tentar em meu próprio benefício, se me
sinto completamente subjugado por estas malditas visões, que esvoaçam ao redor
de mim quais vampiros em torno de detritos?... Oh! Estarei condenado a este
inferno eterno! Para os meus crimes não existirá perdão na lei de...
— . . . de Deus, dize, confiante! Pronuncia sem temer o nome sagrado!
— Não posso pronunciá-lo! Tenho medo! Tenho medo! — bradou o infeliz,
recomeçando a chorar convulsivamente.
4
fl\
E-
98 DEVASSANDO O INVISÍVEL
— Como assim!? — ressoaram as, advertências do amigo presente, obrigando-
nos ao entendimento com o mísero delinquente. — És filho de Deus e não queres
reconhecer sua paternidade, voltando-te para Ele, a lhe solicitar socorro? És
criação d’Ele, herdeiro do seu amor, destinado a um esplendoroso porvir no seio
da Eternidade, e não te animas a elevar o pensamento ao teu Criador, sequer
através de uma singela homenagem de respeito? Não queres, porventura, o seu
amor, o seu perdão? Sim! Sim! Eleva teu coração numa. súplica de proteção, para
retornares ao dever.., e Jesus, que é o Mestre da Humanidade, investido, por
Deus, de plenos poderes para o auxílio à nossa redenção, saberá enviar-te os
recursos que te afastarão desse tremedal de trevas em que te sufocas...
O recalcitrante prostrou-se de joelhos, abatido por lágrimas cruciantes, que
ecoavam em nossa sensibilidade mediúnica com o travo de um arrependimento
inconsolável, angustiando-nos penosamente:
— Não posso, não ouso! Sou um zéprobo, que não merece a graça do perdão!...
— Meu amigo! Compreendo que fazes uma falsa ideia do perdão que Deus
concede às suas criaturas, para retirá-las dos despenhadeiros do erro e do
sofrimento. Entretanto, esse perdão, pelo Eterno concedido aos pecadores, que
somos todos nós e não sômente tu, encontra-se no ensejo, na oportunidade, que
suas Leis apresentam ao delinquente, de reparar o mal praticado no passado,
através da prática do verdadeiro bem nos dias do futuro. Nos trabalhos de
reparação, realizados por ti mesmo a benefício do teu próximo, portanto a teu
próprio beneficio, poderás reabilitar-te do estado pecaminoso e deplorável em que
te encontras! Não se trata de um perdão gracioso, que não te expungiria as culpas
da consciência, mas sim de uma ocasião, uma oportunidade de reparares teus
maus atos, com ações nobres e
—F--
DEVASSANDO O TNVISfVEL
**
(17) Quando, no estado letárgico, o médium recebe uma ordem do seu Instrutor
Espiritual, verifica-se a sugestão hipnótica, que ele será levado, fatalmente, a
executar, uma vez desperto. Agindo ao influxo do comando recebido, como no
caso presente, o médium escreverá posteriormente, mas o trabalho será
mediúnico, de qualquer forma, visto que já lhe imprimiram no ser o que deveria
escrever, embora não haja prôpriamente a psicografia. Esta faculdade mostra-se,
por isso mesmo, assaz delicada, e mesmo perigosa, pois, quando a hipnose é
exercida por entidades mal intencionadas, ou obsessoras, o “passivo” poderá
cometer desatinos variados, como até mesmo o assassinio e o suicídio, sem que
jamais se saiba que ele agiu por uma ordem estranha. O conhecimento do
Espiritismo, porém, bem assim o cultivo das faculdades mediúnicas à luz de
ensinamentos sólidos de moral, evitarão tais desarmonias, pois, reeducando o
adapto, coloca o médium na situação de um agente lúcido, responsável pelas
DEVASSANDO O INVISIVEL
49 Que assim se arrastarão até que suas condições gerais lhes granjeiem valores
pessoais bastantes para as responsabilidades das realizações, quando, então,
entrarão a construir no sentido do bem, refazendo o que destruíram e aviltaram,
conluiados com o mal.
50 — Que tais dramas, comumente, terão por palco a própria Terra, visto que, se
em seus âmbitos sobrevie ra
as quedas para o mal, igualmente aí se efetivará a
ascensão para o melhor, por mais fácil a tarefa para o
culpado e menos penosa a assistência a ele devida pelos
seus tutelares, pois que as leis divinas aplicam, quanto possível, a sua
misericórdia nesses lamentáveis caaos.
101
DEVASSANDO O INVISÍVEL
102
CAPITULO V
Mistificadores — Obsessores
— “O invólucro semimaterial do Espírito tem formas determinadas e pode ser
perceptível?
— Tem a forma que o Espírito queira. E’ assim que este vos aparece algumas
vezes, quer em sonho, quer no estado de vigília, e que pode tomar forma visível,
mesmo palpável.”
(ALLÁN KARDEC — “O Livro dos Espíritos”. Pergunta nG 95.)
Tão variada é a classe das entidades mistificadoras desencarnadas, que chega a
haver confusão com a das entidades obsessoras, tornando-se difícil, em
determinados casos, separar uma da outra. Procuraremos tratar aqui de uma
modalidade de mistificadores que poderá também ser considerada especialidade
de obsessores, visto que participa de uns e de outros.
Mistificar é, na palavra dos dicionários, o ato de
— enganar, iludir, lograr, abusar da credulidade de alguém, engodar —, valendo-
se de ardis e subterfúgios, malícia e mesmo maldade. Existem os mistificadores
inofensivos, brincalhões apenas, que levam o tempo alegremente, se bem que
também levianamente, cujas ocioidades e futilidades só a si mesmos prejudicam,
e que todos consideram irresponsáveis quais crianças travessas, e a quem
ninguém levará a sério. Na Terra como no Espaço, eles proliferam, sem realmente
prejudicar senão a si próprios. Existem os hipócritas, perigosos, portanto,
104 DEVASSANDO O INVISÍVEL
que sabem enganar porque se rodeiam de falsa seriedade, a qual mantêm,
apoiados em certa firmeza de lógica, e a quem sômente observadores muito
prudentes saberão descobrir. Na Terra como no Espaço, proliferam também
esses, quer encarnados, como homens, quer como Espíritos já desencarnados,
causando no seio das duas sociedades sérios desequilíbrios e danos vultosos,
não raro desorganizando a vida e os feitos dos incautos que se deixam embair
pelas suas atitudes dúbias. Dentro do Espiritismo, costumam estes, os
desencarnados, causar sérios prejuízos aos médiuns orgulhosos e insubmissos à
disciplina em geral, que a boa prática da Doutrina recomenda, e também entre
diretores de organizações espíritas pouco competentes, moral e intelectualmente,
para o importante mister. Suas atitudes mistificadoras, porém, serão fàcilmente
observadas e desmascaradas por um adepto prudente, bom conhecedor do
terreno prático da Doutrina, como da sua filosofia, e, acima de tudo, por alguém
que, portador de qualidades morais elevadas, se haja tornado bem inspirado e
assistido pelos planos superiores do Invisível, pois de tudo isso mesmo nos
adverte o estudo da Doutrina Espírita. Muito conhecidas são ambas as classes de
mistificadores para que nos ocupemos a repetir o que todo aprendiz do Espiritismo
conhece.
Há, todavia, ainda uma terceira classe, a mais impressionante que se nos tem
deparado no longo exercício da nossa mediunidade, a mais perturbadora,
perigosa e difícil de ser combatida, porque geralmente ignorada sua existência
pelos próprios adeptos do Espiritismo, e a qual age de preferência nas próprias
paisagens invisíveis, em torno de entidades desencarnadas não devidamente
moralizadas, mas também podendo interferir na vida dos encarnados,
prejudicando-os e até os levando aos estados alucinatórios ou mesmo ao estado
de obsessão, pelo simples prazer de praticar o mal, divertindo-se.
*4
falanges, cujo assalto lhes agrava, no pélago de males para onde o suicídio os
atirou, o seu já insuportável suplício. E nas sessões práticas, ou mediúnicas, da
Doutrina Espírita, quando bem organizadas e dirigidas, não é difícil ouvirem-se
queixas idênticas da parte de Espiritos comunicantes muito inferiores, ou ainda de
suicidas.
Que aspecto mostrariam essas entidades, porém, para serem consideradas tão
feias e repulsivas, por tod’#s quantos a elas se referem, revelando-as aos
homens?... Que espécie de deformidades, para torturarem até à loucura um
recém-desencarnado ou a um homem, a este, porém, perseguindo de preferência
no estado de sono,
até ao extremo de uma obsessão?... Confessamos que tais cogitações jamais nos
preocuparam e, por isso, nossa atenção não se voltaria para o assunto se nossos
próprios Guias Espirituais para ele não nos despertassem o interesse, embora já
tivéssemos notícias da sua existência no mundo invisível. Ora, foi uma dessas
falanges estranhas, surpreendentes, extra-
vagantes, que nosso instrutor espiritual Charles nos levou a conhecer e examinar
durante certo desprendimento sob a ação letárgica, em memorável lição, que aqui
tentaremos descrever por sua ordem e sob suas intuições vigorosas, em a noite
de 18 de Março de 1958.
106
DEVASSANDO O INVISÍVEL
*
**
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r
108 DEVASSANDO O INVISÍVEL
mento sincero, porém, levou-a, a tempo, a se retrair das mesmas, e desejar
encaminhar-se para melhores planos. E’ médium, ou antes, possui faculdades
mediúnicas, que futuramente poderão frutificar generosamente, a serviço do
próximo, se bem cultivadas. Os antigos companheiros do Invisível assediam-na,
tentando reavê-la para o sabor de velhos conluios. Conheceis o remédio para tais
desarmonias. Aplicai-o !»
Sim! O remédio único seria o traba!ho de reeducação da menina à base do
Evangelho, preces, paciência, vigilância, amor, disciplina rigorosa, sem
concessões que redundassem em cumplicidade com caprichos prejudiciais,
fraternidade e caridoso interesse para com os infelizes sedutores desencarnados.
Na noite de 18 de Março de 1958, no entanto, encontrando-nos, durante uma
temporada, na resi&ncia daqueles nossos familiares, eis que a figuração espiritual
de Charles, envolvida na sua luminosa e bela roupagem de iniciado hindu,
apresentou-se à nossa visão e, adormecendo-nos em sono magnético, como
habitualmente, arrebatou nosso espírito, deixando o corpo carnal imerso em
letargia. Passado o primeiro atordoamento, fenômeno invariável nesse gênero de
desprendimento, nós nos reconhecemos no recinto da própria residência da
paciente, sem alçar ao Espaço, acompanhada pelo nobre amigo, mas rodeada de
seres disformes, extravagantes, feios, grotescos, repulsivos. E Charles
apresentava-os:
— «São estes os antigos companheiros da menina B..., durante seu estágio no
Invisível, antes da reencarnação presente. Pertencem a uma classe especial de
mistificadores, a qual descai para a de obsessores... Não são inimigos dela,
segundo a terminologia humana, e nem se vingam, porque ela nenhum mal
cometeu contra eles... Porém, não são também amigos, porquanto não o são de
quem quer que seja, visto que ainda não adquiriram
o senso da fraternidade nem a favor de si próprios...
L
.1
110
DEVASSANDO O INVISÍVEL
DEVASSANDO O INVISÍVEL
obsessão, através do pavor e da alucinação que infundem, que, depois, quando
percebem a conveniência de se deterem, porque prejudicam a si próprias, já não
conseguem forças para se refazerem e voltarem ao natural.
Não é em vão que se abusa das leis gerais da Criação, na Terra como no Espaço,
e, por isso mesmo, esses infelizes assim permanecerão, sob sua inteira
responsabilidade e por livre e espontânea vontade: contundidos pela mente,
feridos pelos choques desarmoniosos das próprias vibrações dirigidas a atos
contrários ao alvo estabelecido pela Divindade Suprema. E, tais como se
encontram, serão encaminhados para a reencarnação, como infratores da ordem
pública o seriam para um presídio, único recurso da atualidade — a reencarnação
— para, lentamente, reequilibrá-los na harmonia geral, visto que as formas
pesadas da matéria carnal serão como que fôrmas ortopédicas necessárias à
minoração de tais enfermidades vibratórias, de origem moral-consciencial. Mas,
como fàcilmente se compreenderá, os pobres folgazàos, inconsequentes e
malvados, renascerão doentes f’isicarnente, já que doentes graves são como
Espíritos, arrastando o corpo intermediário, ou perispírito, brutalizado como vês...
Serão, portanto, enfermiços, raquíticos, retardados, vítimas de males
incompreensíveis, que a Medicina terrena diagnosticará como de origens sifilíticas;
serão feios, tristes, doloridos, tardos de movimento e ação, porque tardos de
vibrações, sofredores e até dementes, tolos, medíocres... causando, muitas vezes,
repugnância e compaixão a quem os conhecer. A sentença cristã — A cada um
segundo as próprias obras — é artigo mais elástico do que os homens têm
imaginado. Esses infelizes que aí vês, ferindo, atraiçoando, mentindo, perseguindo
seus irmãos de Humanidade, na Terra como no Invisível, a si próprios feriram,
atraiçoaram, mentiram, perseguiram. . - E assim sendo, as más ações,
engendradas por suas mentes desorganizadas, reduziram-nos a sofredores em
luta
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115
1
CAPfTULO VI
Romances mediúnicos
“A primeira condição para se granjear a benevolência dos bons Espiritos é a
humildade, o devotamento, a abnegação, o mais absoluto desinteresse moral e
material
“A mediunidade é coisa santa, que deve ser
praticada sensatamente, religiosamente.”
(ALLAN KARDEC — “O Evangelho segundo o Espiritismo”, Cap. XXVI, 8 e 10.)
Frequentemente, amigos nossos, igualmente afeitos às lides espiritas, solicitam-
nos esclarecimentos sobre o modo pelo qual são ditados, do Além, os romances
sempre tão atraentes, da já vasta bibliografia espírita.
— Tomarão, os autores espirituais, da mão do seu aparelho mediúnico, tão
sômente? — indagam aqueles observadores. — Atuarão também sobre o cérebro
do seu intérprete, seguindo a linha conhecida da faculdade psicográfica? Servir-
se-ão da audição, porventura? Talvez tia intuição? - - -
De princípio, afirmaremos que dependerá, racional- mente, da classificação do
médium, tal como no-la explicam as obras básicas da Doutrina, podendo, portanto,
um romance provir do Além através de qualquer daquelas vias mediúnicas e
também pela inspiração, e até pela incorporação, para que alguém escreva
enquanto o aparelho receptor, ou o médium, dita, sob impulso do ser comunicante
- Não obstante, acrescentaremos que, além
DEVASSANDO O INVISÍVEL
médium literário do momento, portanto, teria sido escritor em vidas pregressas ou,
pelo menos, um intelectual inclinado às letras e ao Belo, razão pela qual, na atua-
lidade, possuirá aptidão para obter do Espaço obras supcriores aos seus próprios
conhecimentos do presente.
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120
DEVASSANDO O INVISÍVEL
cliente ao escritor espiritual. Isso, porém, não é tudo, pois, como ficou dito, sem
um ressurgimento de valores pessoais no íntimo do próprio médium, nada se
conseguirá de apreciável, por não se haver ele ajustado às faixas vibratórias aptas
ao feito. Seria igualmente errôneo o julgamento de que pessoas muito ilustradas e
doutas seriam melhores instrumentos para um escritor da Espiritualidade do que
um simples estudioso, um autodidata, destituído de títulos e diplomas. Não!
Sabemos, porque ficou dito pelos maiores do Espiritismo, que o cérebro menos
assoberbado de teorias e sistemas preconcebidos se presta melhor aos ditados
espíritas mediúnicos, não só por positivar o fato mais concludentemente, como
também porque, graças à sua singeleza, não seria interceptada, ou desfigurada,
com ideias pessoais, alguma revelação nova que adviesse em contraposição a
teorias que devessem ser renovadas, antes a traduziria sem mesclas nem
preconceitos, porque, assim, não possuiria barreiras mentais capazes de
impugnar um noticiário que fôsse contrário às opiniões já implantadas pela cultura
daquele que muito se demorou no recesso das Academias.
**
—-------
...
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123
126
DEVASSANDO O INVISIVEL
lizar o feito. Daí o porquê de um instrumento mediúnico obter obras de poucos
autores, pois o trabalho é sempre melindroso e difícil, exigindo o máximo de
qualidades harmoniosas de um e de outro, tais como amor à causa, vontade,
pureza de intenções, humildade, paciência, perseverança, desinteresse de toda e
qualquer natureza, mormente o desinteresse monetário, renúncia e até mesmo
espírito de sacrifício, o que deixa entrever não ser fácil a um encarnado assim
comungar, tão intensamente, com entidades elevadas da Espiritualidade.
Existem ditados mediúnicos, mesmo romances e poderíamos citá-los —
considerados imitações por muitos observadores, porque não trazem o
característico do estilo literário daquele que espiritualmente o concedeu. No
entanto, sabemos que a obra, realmente, é daquele cujo nome figura no volume.
O que se passa é que transmitir o estilo integral é uma tortura para certos
médiuns, como trabalho exaustivo para o autor, razão por que nem sempre este
obrigará seus medianeiros ao penoso labor, visto o intento de uma obra espírita
ser a sua finalidade moral-educativa-doutrinária e não pràpriamente a simples
realização literária. De outras vezes, porque o médium não apresente os recursos
necessários, dá-se uma como tradução no seu pensamento. Este, o médium,
recebe o ditado e transmite-o para o papel empregando sua própria linguagem, o
que resulta na desfiguração do estilo literário do escritor comunicante, se se tratar
de literato conhecido na Terra. Alguns, devido a tais fatores, adotam pseudônimo,
encobrindo o próprio nome até mesmo de seu instrumento mediúnico. Todavia, o
pensamento foi do escritor e não do médium, e por isso a obra deveró ser
considerada mediúnica. Muitas vezes, desde que não se positive o fenômeno
espírita pràpriamente dito, será mais conveniente que tais trabalhos apareçam a
público sob o nome do próprio médium, visto que, destituídos do estilo do escritor
conhecido, a quem
DEVASSANDO O INVISÍVEL
do idioma português, não fazem, em absoluto, questão de que o seu antigo vigor
literário se reproduza, integralmente, através de um cérebro mediúnico. O que
querem é se desincumbir de tarefas que lhes desanuviem a consciência das
sombras dos deslizes passados, reabilitando-
-se, pela literatura de Além-Túmulo, da antiga feição ociosa ou nociva da literatura
cultivada no estágio terreno. E’ o resgate, pois, que se verificará. Preferentemente,
tais escritores tomarão pseudônimo, encobrindo-se do próprio médium, que
poderá não guardar o devido segredo, entusiasmando-se com o próprio feito de
que foi instrumento. Outros, como Léon Denis, preferirão não ditar obras
mediúnicas a vê-las desfiguradas no seu estilo pessoal. O que querem é a prova
insofismável do fenômeno espírita. Continuam, no Além, as pesquisas e
experiências encetadas na Terra.
Um mesmo Espírito poderá ditar uma obra dando a ver ao médium as cenas antes
ou no momento do ditado, e poderá ditar outra, ainda pelo mesmo médium,
valendo-se tão sàmente da psicografia, sem que o intermediário veja coisa
alguma, ou, pelo menos, sem que este se recorde do que viu, pois pode dar-se o
fato de ele ter presenciado o drama, posteriormente psicografado, durante um
desdobramento, e de nada se recordar em vigília. De outro modo, o fato de
recordar será uma disposição particular do aparelho mediúnico. Vimos que
127
DEVASSANDO O INVIStVEL
(24) Mediunidade pelo sonho. Revelações através do sonho. A Bíblia está repleta
de informações a respeito.
128
DEVASSANDO O INVISÍVEL
é operada sob sua desvelada direção. Vimos e falámos
a varias delas, enquanto trabalhávamos naquela obra.
Entrementes, as visões do drama que então nos eram fornecidas decorriam em
ambiência branca, lucilante, mesclada de tons dourados, como se raios de sol
puríssimos iluminassem a transparência branca, efeito, ao que julgamos, inédito
sobre a Terra, a nós outra impossível de descrever, e como se todas as cenas e
panoramas fôssem desenhos delicadíssimos, a se movimentarem em cenários
celestes. No entanto, em «Uma história triste», que integra o volume «Nas Telas
do Infinito», o drama se desenrolou em suave ambiente azul, levemente esbatido
de nuanças brancas lucilantes, quais neblinas tenuíssimas, enquanto que em
«Leonel e os Judeus», obra ainda inédita, do mesmo autor, a história se desenrola
sob colorações fortes, mas com algumas cenas muito sombrias, tais como salas
de suplícios da Inquisição, em Portugal, e outras muito nítidas, como o rumor das
águas de um repuxo de jardim, ao se despenhar no tanque, o brilho de
candelabros de prata sob a luz das velas e o som da cítara com que uma
personagem se acompanhava, entoando salmos de David.
Não obstante, nem sempre o médium consegue transcrever na íntegra o que
avista no Espaço, concedido por seus mestres instrutores. Parece, mesmo, que
cenas belissimas, admiráveis pela perfeição, deixam de ser psicografadas no
decurso da obra, porque assim o determinaria o próprio autor, visto que a escrita
não reproduziria fielmente o encantamento que a visão espiritual alcançou. Na
obra «Nas Voragens do Pecado», por exemplo, a entidade «Charles», Espírito que
sabemos ser o de um completo artista, e que no-la havia mostrado
magistralmente, durante um arrebatamento do nosso espírito, por ele mesmo
provocado, deixou de escrever uma cena das mais belas, que nos fora dado a
apreciar na ocasião precisa:
129
—1
132 DEVASSANDO O INVISÍVEL
parque ou jardim, artisticamente delineado, verdadeiro cenário celeste, onde
nenhum traço de beleza faltava, percebendo-se até mesmo a melodia de pássaros
e mil cativantes perfumes de flores. Todo o conjunto se esbatia de um como luar
azul matizado, lembrando os coloridos de Rembrandt, isto é, partindo de tons mais
fortes, como sombreados, para decrescerem de coloração gradativamente, até ao
branco cintilante, pois essas nuanças são luminosas, como neblinas que se
iluminassem por lampadários inteligentes, caprichosos.
Nessa encantadora estância encontravam-se Vítor Hugo e Frederico Chopin (25).
Vendo-os, nenhuma surpresa nos assaltou, pois não temos memória de quaisquer
surpresas que nos assaltassem durante tais escapadas espirituais. Presente
estava igualmente a entidade «Gaston ,, que figura na obra como a sua
personagem central. Acreditamos que, nos ambientes esclarecidos do Espaço,
quando um dos seus habitantes, ou componentes, se prepara para a
reencarnação, os que ficam lhe oferecem festividades de despedida, homenagens
que dão em resultado essas solenidades espirituais, onde o Belo atinge
proporções inconcebíveis à mente humana, por mais artisticamente dotada que
seja, visto que o Belo, no Invisível, é apanágio do virtuoso, do moralizado, do
coração humanitário e fraterno, já identificado com as vibrações inerentes ao
verdadeiro bem.
A pura intelectualidade, desacompanhada de princípios excelentes, que sômente
as verdadeiras qualidades do coração produzem, assim como a Arte, por si só,
com o séquito da vaidade, do orgulho, da falta de boa moral,
(25) E’ possível que nosso Espírito não atingisse realmente a dita região, e sim
tudo contemplasse através de quadros a distância. Tão sugestivos e intensos
esses quadros (espécie da nossa televisão, muito aperfeiçoada), que o médium
mantém a impressão de que realmente está presente em tudo o que vê.
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44
DEVASSANDO O INVISÍVEL
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tão belas, esmeradas so espírito m que nos desenvol.tilante, ao tos de luz luadros
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DEVASSANDO O INVISÍVEL
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139
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encerraremos o capítulo sem narrar o mais
“urioso fenômeno ocorrido na mencionada ocasião.
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Í
DEVASSANDO O INVISÍVEL
143
grande escritor, que nos agraciara com uma peça literária, como sói fazer-se na
Espiritualidade. Compreendemos que aquele amigo nos apresentava como
possível instrumento para transmissão da história aos homens, no feitio educativo
de moldes espíritas. Vítor Hugo fitou-nos com olhar profundo, perscrutador, como
que devassando todos os escaninhos das nossas possibilidades psíquicas.
Depois, voltou-se para Charles:
— «Haveria muito trabalho em prepará-la a meu gosto... Escreve tu, através dela,
pois conheces os fatos expostos, és intelectual, conheces a Filosofia e a Moral
espíritas e possuia ascendência sobre ela, a médium... Tece o enredo à tua
vontade, adaptando-o à Filosofia que esposamos. .
Alguns dias mais e Charles traçava, através da psicografia, a exposição romântica
do citado drama, sem conclusões morais e filosóficas. E advertiu, em seguida:
— «Guarda o trabalho. Posteriormente obterás instruções. .
Vinte e cinco anos mais tarde, isto é, ao findar o ano de 1955, apresentou-se
novamente esse amigo, com as prometidas instruções:
— «Fui incumbido de escrever definitivamente a história de Gaston... Ele se
encontra reencarnado desde o ano de 1931... e certamente lerá a própria história
nesse livro, porquanto também milita nas hostes do Consolador, já que, graças
aos Céus, perseverou no ideal espírita, uma vez reencarnado. . . »
Com efeito, ràpidamente, Charles reviveu o enredo romântico, adaptando-o à
Doutrina Espírita.., e o drama, assim desenrolado no Além, como num teatro
modelar, durante um arrebatamento do nosso espírito, narrado pelo talento de um
escritor genial, e escrito pelo instrutor espiritual Charles, intelectual e artista de
grandes possibilidades, através da psicografia mediúnica, foi
io corpo,
DEVASSANDO O INVISIVEL
publicado pela FEB para homenagear o Centenário da Codificação, sob o nome
de «Amor e Ódio».
Quando, terminada a leitura do livro já impresso,
nós o colocávamos em nossa humilde estante, amargo
desapontamento adveio e murmurámos tristemente:
— «Não transmiti fielmente o que os nobres expositores espirituais desejaram
dizer aos homens! A obra escrita ficou muito aquém da realidade que me deram a
presenciar no Espaço. Meu Deus! A palavra dos Espíritos, seus recursos criadores
são poderosos demais, demasiadamente intensos e lindos para que nós, pobres
seres humanos, possamos realmente traduzi-los para a nossa imperfeita e tão
rude linguagem terrena. »
144
itenário da
impresso,
e, amargo
nente:
bres expo s
A obra CAPITULO VII
me deram
dos Es- O amigo beletrista
)S demais,
ós, pobres “De novo subiu o diabo a um monte muito
Ds para a alto, e lhe mostrou os remos do mundo, e a gló ria deles. E lhe disse: —
Tudo isto te darei, se
prostrado me adorares. Então lhe disse Jesus:
— Vai-te, Satanás! Porque escrito está: — Ao
Senhor teu Deus adorarás, e só a ele servirás.
Então, o diabo o deixou; e eis que chegaram os
anjos e o serviram.” (27)
(MATEUS, 4:2 a 11.)
Os mais ásperos testemunhos costumam ser exigidos dos médiuns antes que eles
se decidam a assumir a tarefa, prestando-se a trabalhos de grandes
responsabilidades, se é que nos labores mediúnicos existirão desempenhos de
responsabilidades menores. A famosa iniciação, outrora exigida nas escolas de
Doutrinas Esotéricas, para se formarem os oráculos, os profetas, as sacerdotisas,
etc., não seria, certamente, um mito, mas necessidade que nos dias presentes
parece clamar pelas atenções gerais, a fim de que o intercâmbio entre a Terra e o
Invisível se exerça ainda com maior segurança e facilidade.
(27) Poética alegoria evangélica, tão do gosto da literatura oriental, noticiando as
prováveis insistências dos admiradores do Nazareno para que aceitasse o trono
de Israel e se tornasse rei. Indicam, ainda, as tentações com que o mundo rodeia
todos aqueles que se derem aos labores dos ideais divinos.
DEVASSANDO O INVISÍVEL
Não ignoramos que a Codificação espírita não trata dessa iniciação, pois que
popularizou a possibilidade do intercâmbio espiritual, declarando mesmo,
taxativamente, que, para se comunicar o homem com os Espíritos — «não há
necessidade alguma de preparo ou iniciação» (28).
Realmente, para nos comunicarmos com os Espíritos não será necessário senão
possuir dons mediúnicos. Todavia, os fatos e a experiência testemunham que,
para a mediunidade apresentar bons frutos, será preciso algo que poderemos
classificar de iniciação. Os Instrutores Espirituais, por sua vez, assim como os
demais ensinamentos firmados pelos colaboradores de Allan Kardec, são
incansáveis em advertir os médiuns quanto a uma elevação de vistas, no exercício
da faculdade, uma renovação cuidadosa do próprio caráter, um critério e uma
reeducação à base do Evangelho, que outra coisa não seriam senão uma
iniciação, conquanto efetivada à revelia de imposições acadêmicas e inteiramente
subordinada à boa vontade, ao esforço e ao discernimento do próprio médium,
sem sequer o afastar da sua vida comum de relação, o que parece mais meritório
e honroso do que as antigas iniciações realizadas sob o jugo férreo das
Academias de Doutrinas Secretas.
Desconhecemos se com os demais médiuns se passarão os fatos que conosco se
passaram, marcando o estabelecimento definitivo de nossas tarefas niediúnicas.
E’ possível, porém, que, pertencendo, como espírito, a uma falange de iniciados
orientais (hindus e egípcios), como pupila e aprendiz, que se reeduca sob sua
assistência espiritual, nada mais se verificasse do que a tradição esotérica da
iniciação, não obstante feita à sombra do Consolador e fora do seio de academias.
. . pelo menos de academias terrenas, pois poderemos, sim, pertencer a Es (28 “O
Céu e o Inferno”, de Allan Kardec, Cap. X, Primeira Parte, n. 10.
146
66 6 1
1; :
6 4 d4
DEVASSANDO O INVISIVEL
151
?m do Espaço , para possírio no «Posto serviço que, nossa visão mais se asserno
a um haodeios, haver e ter desen •anto a declitado a fineza não gostamos
obstante, de- e que, então, es desejos de ito, descobrile outros Esreciosos para [e
grande ins, a segui-lo, rimeiro caso, rmédio, visto pessoa e saescrever um rá-lo de
«viva do psicográ‘m a própria mo entrecho escrita, quer .ieno impulso êssemos
bem já se eneon)5 principais, o cérebro, à cena ou pa
discurso interessou-nos, e não só o considerámos bonito como até lógico. Não
obstante, orámos, confiando-nos fervorosamente à assistência dos mentores
espirituais, pedind mesmo seu auxílio, porquanto sômente nos interessariam
acontecimentos mediúnicos que se pautassem pela obediência às leis da Verdade
e fôssem do agrado deles próprios, os Guardiães. Aquiescemos, pois, em atender
ao visitante, seguindo-o em corpo astral, desde que os Guias não impedissem o
intento; porém, só- mente o faríamos na noite seguinte. Entretanto, nenhuma
intuição, nenhum conselho nos aclarava a indecisão. Os instrutores não
desejavam intervir. . . e compreendemos, então, ser o assunto pertinente ao nosso
livre arbítrio...
Na noite seguinte, dormimos sossegadamente o primeiro sono, sem que nenhuma
anormalidade sucedesse, como sói acontecer, dado que o desprendimento
apenas se verifica achando-se o médium desperto, condição para que se
processe o sono magnético. Poucos minutos depois da meia-noite, porém,
havendo despertado naturalmente, distinguimos à beira do nosso leito o Espírito
que se apresentara na véspera, ao qual chamaremos «Beletrista», à falta de um
nome que melhor o qualifique. e, em seguida, caímos em transe letárgico, num
«arrebatamento do espírito» para o plano invisível. O processo para o
desdobramento verificou-se exatamente como se dá sob a direção de Charles,
dos hindus ou de Bezerra de Menezes, o que leva a crer tratar-se de mecanismo
próprio da faculdade em si mesma, que independe de agentes superiores para
seu exercício. De outro modo, acreditamos que a vigilância daqueles excelentes
amigos se verificava em torno do caso, sem, contudo, tornar-se suspeitada sequer
pela intuição, pois assim mesmo deveria ser, uma vez que se tratava de prova de
responsabilidade, um testemunho cuja gravidade o próprio leitor avaliará dentro
em breve.
DEVASSANDO O INVISIVEL
Afastado nosso espírito do corpo carnal, foi-nos possível examinar melhor a
configuração desse habitante do Invisível, que tão atenciosamente nos procurava
para um trabalho no seio da Doutrina por nós esposada. Compreendemos,
imediatamente, tratar-se de entidade não evoluída moral-espiritualmente,
conquanto não fôsse igualmente nociva, ou uma individualidade de ordem muito
inferior. Moralmente, apresentava-se medíocre, visto não ser evangelizada, não
estar espiritualizada. Intelectualmente, seria adiantada, dado que fora um escritor,
um homem douto, pois que fora também médico na Terra, inteirando-nos nós
desta particularidade, não porque ele, o Espírito, no-la revelasse, mas graças ao
anel de grau que lhe cintilava no dedo anelar da mão esquerda. Espiritualmente,
porém, vulgaríssimo, necessitado de tudo, visto que estávamos já no ano de 1930
e ele confessava haver deixado o fardo carnal em 1911, sem, no entanto, ter
abandonado ainda os perímetros terrenos, o que, aliás, se deduzia de sua
aparência fluídica pesada.
Uma vez completado o desprendimento, ofereceu-nos ele, gentilmente, o braço,
cavalheiro fino que parecia ter sido quando encarnado, e pusemo-nos a caminhar.
Nós nos sentíamos tranquila, compreendendo em nós mesma bastante vigilância
para não nos deixar arrastar a nenhuma aventura espiritual que redundasse em
domínio obsessor, pois confiávamos nos Guardiães, aos quais soucitáramos
assistência para o caso, na véspera, embora no momento não lográssemos
descobrir nenhum deles à testa dos acontecimentos.
Caminhávamos por uma estrada ou rua sem calçamento, mas de terreno muito
batido, polvilhada de uma substância fina, de cor creme brilhante, qual areia
dourada, e notámos que subíamos ligeira inclinação, durante todo o percurso.
Quanto tempo levou o trajeto não poderíamos precisar. Jamais se poderá medir o
tempo nessas circunstâncias, ainda que se trate de poucos mi-
152
ii
154
DEVASSANDO O INVISÍVEL
comuns à maioria dos suicidas, conquanto hajam de arrostar a responsabilidade
dos atos que tenham dado origem ao grande desequilíbrio nervoso por que se
deixaram vencer.
Profunda afinidade espiritual resultou desse colóquio, durante o qual nos sentimos
invadir de sincera compaixão pelo irmão que tão gentilmente nos procurava,
confiante, para desabafo do coração torturado pelos infortúnios. E foi com o
máximo prazer e um devotado interesse pela sua causa que nos dispusemos a
ouvir, ou antes, a «ver» a narrativa do romance que ele desejava ditar aos homens
por nosso intermédio.
Chegáramos, no entanto, ao término do giro encetado. Disse «Beletrista»:
— «Criar a ambientação para a minha história, consolidá-la, mantê-la, para que o
médium a compreenda como uma realidade, será para mim dificílimo, conforme já
expliquei. Poderia fazê-lo, porém, imperfeitamente. Meu pensamento, pouco
adestrado, mostraria intermitências, vacilaria, produzindo cenários escassos,
indecisos, defeituosos, conforme estou habituado a observar aqui, entre
companheiros de infortúnio que se propõem narrar as próprias desgraças, uns
para os outros. Prefiro reconhecer que se trata de talento psíquico de ordem
moral-intelectual elevada, que não possuo.. . e nem sei se o possuirei algum dia...
Narrar a história-recordação, porém, sômente os fatos que realmente se
desenrolaram, evocando-a detalhadamente, no próprio ambiente ou cenário em
que se passaram, sim, ser-me-á possível... Ela vive em mim, a história, dentro do
meu ser! E’ a própria força do meu sentir, o meu drama íntimo, o sentimento de
que se impregnou todo o meu ser moral, e minhas vibrações totais estão deles tão
saturadas que eu mesmo não compreendo como V. Exa. (tratava-nos finamente, a
prezada entidade) não está percebendo cenas das recordações queridas e
dolorosas que esvoaçam
155
DEVASSANDO O INVISÍVEL
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DEVASSANDO O INVISÍVEL
conceito. . . »
— «Essa honra, minha senhora, ainda não me foi dado alcançar, depois da
morte... Disseram-me ser necessárias tantas e tantas qualidades pessoais, para
que tal seja permitido... Renovações, renúncias.., e eu não me sinto ainda
bastante forte para um novo curso de Medicina, todo especial, neste lado da
Vida... Aliás, vivo ainda na Terra, mesmo como Espírito, e não prôpriamente no
Além-Túmulo... Prendo-me a um passado que me tortura e me encanta, que me
desola, mas que também é a única recordação consoladora que me resta... E para
suavizar tantas amarguras e tanta solidão foi que procurei V. Exa., a fim de
escrever algo que me distraia e ajude a esquecer.. . »
— «E como soube que existo?... Como me pôde
descobrir?. . . »
— «Se eu fôsse um homem, responderia como tantas vezes ouvi, outrora, em
nossa gíria nacional: «Força de simpatia!. . . » Mas, um Espírito, um médico, dirá:
a afinidade dos sentimentos e ideais impelem e atraem as almas umas para as
outras.., tal como, na Química, duas substâncias se atraem e unificam para uma
realização concludente. . .
Compreendemos que «Beletrista» necessitava de tudo e, também, que seu
esclarecimento não seria, certamente, serviço para nossas possibilidades, mas
resultado dos esforços dele próprio, através do tempo e da boa vontade que
desejasse mobilizar a benefício do próprio progresso. Silenciámos, portanto,
dispondo-nos a atendê-lo
teesIas eh-
157
erdo
um
ontos
desso
ouLalnesse
pois
ta,
iue
,e
di)Side
raaar
cer
rata
duzido, pela palavra espiritual da entidade, com todas as minúcias da boa forma
literária terrena, não obstante muito deixasse a desejar como literatura espiritual.
E, assim agindo, nada mais fazemos do que observar ordens dos mentores
espirituais, pois a dita história, sofrendo a rejeição desses vigilantes amigos,
conquanto se apresentasse dramática, profunda e comovente, não poderia ser
apresentada ao público sob os auspícios da Doutrina Espírita. Diremos, todavia, a
título de curiosidade, para observação e meditação do leitor, que o exposto por
zBeletrista», como sendo o seu drama pessoal, é a história de uma jovem terna e
sonhadora, abandonada pelo marido no segundo ano dos esponsais, o qual a ela
preteriu pelas aventuras incertas de uma vida sem responsabilidade; a quem um
sedutor, após, impele a faltar com os deveres de dignidade pessoal, e que, em
consequência, se torna mãe de uma linda criança, que era o seu enlevo e o
consolo das amarguras diárias provindas da lamen táve
situação. Mas, esse primeiro amante, brutal e tirano, torna-lhe a vida infeliz e
tormentosa e a separação se impõe como necessidade inadiável. Surge, então,
tBeletrista», amoroso e sentimental, amando-a devotadamente pelas suas
próprias desditas, qual generoso e romântico salvador.., mas, a quem ela não
poderá desposar, porque as leis civis, no Brasil, não o permitem, visto ser casada
e não ser admitido o divórcio em nossas sociedades... Amam-se, entretanto, e a
felicidade embala seus corações, durante algum tempo... pois que, em breve,
ressurge o espectro do passado, na pessoa do primeiro amante, que entra em
lutas despeitadas e tentativas violentas para desunir o casal e arrebatar-lhes a
criança... Arrebata-a, com efeito, depois de mil proces.
aos angustiosos, muito embora não consiga destruir a terna afeição que une os
dois apaixonados... Mas, Maria Elisa, não suportando a dor de viver sem o filho
querido, exausta de tantos desgostos e desilusões, impacienta.
160
DEVASSANDO O INVISIVEL
DEVASSANDO O INVISÍVEL
mo, imenso júbilo em ser-lhe útil, de alguma forma... Porém, tenho
responsabilidades que talvez o amigo desconheça... as quais me impedem
atendê-lo no presente caso... Para que pudesse ser patrocinado pela Doutrina
Espírita, seu drama precisaria reportar-se ao passado espiritual das personagens
nele revividas, avançar pelo Invisível a dentro, investigando as consequências
espirituais das delinquências cometidas... acentuar a catástrofe que se abate
sobre o Espírito infeliz que praticou o suicídio... Suas páginas, meu irmão,
deveriam conter conceitos que consolassem o leitor, sujeito sempre a múltiplos
infortúnios, e que se desespera ou desanima ante as lutas cotidianas, conceitos
sorvidos nos Evangelhos do Divino Mestre, que lhe apontassem, ainda, alvitres
felizes do Consolador prometido, ou Espiritismo, para remediar suas próprias
tribulações... ao passo que observei ontem, em sua longa exposição, que nem
uma só vez o nome de Deus foi pronunciado! Por tudo isso, com a leitura do seu
drama, tal como foi narrado, as criaturas colocadas em situação melindrosa, na
vida de relação, sômente encontrariam, em suas páginas, o desânimo. o
desespero, ocasionando o suicídio, a inconformidade e a paixão incontrolável,
gerando a neurastenia e a descrença, que igualmente conduzem à morte
prematura. . . »
A entidade visitante bateu com força, com o punho fechado, sobre a mesa onde
trabalhávamos, e onde o Evangelho do Senhor se encontrava exposto, e retrucou,
contrariada:
— «Mas... a obra será boa, na sua estrutura realista, será comovente, dirigida por
um coração que sofre a outros corações que também sofram, para que se
reconfortem na certeza de que não são os únicos a sofrer!. . E será bem escrita,
garanto-lhe! Já disse que fui apreciado beletrista!. . . »
— «Não duvido, meu irmão, mas isso não será bastante! Nas obras literárias de
caráter espírita será ne /
lbi
DEVASSANDO O INVISIVEL
reeducados no desinteresse dos bens temporais. .. Todavia, tenho uma coisa para
lhe dizer.. .>‘
— «Diga-a...»
— «Porque não inspira os beletristas terrenos, não espíritas, que desejariam
glórias e fortunas?... Partindo do princípio psíquico de que todos os homens são
influenciáveis pelo mundo espiritual, talvez esse alvitre viesse ao encontro dos
seus desejos, visto não desejar aparecer como o verdadeiro autor dos trabalhos a
serem escritos. .
A resposta foi viva, peremptória:
— «Não, não quero! Esses não me servem! Desfigurarão com suas próprias ideias
e conceitos pessoais o que eu desejaria expor... Já o tentei várias vezes... mas
deturparam quanto lhes soprei aos ouvidos... O trabalho tornou-se ridículo,
detestável. . . »
— «Permite, então, um conselho?. . . »
— «Que importa meu destino, para que me deseje aconselhar?... Pois se me nega
o favor de. . . »
— «Importa-me muito profundamente o seu destino! A Doutrina que professo exige
do seu adepto o fraterno interesse pela sorte de todas as criaturas, as quais
passamos a considerar irmãs muito queridas. . . Quero, por isso mesmo, vê-lo
feliz, meu irmão, recuperado, primeiramente, para Deus e para si próprio, e depois
para as Belas-Letras e a sua Maria Elisa. . . »
— «Oh! Crê, então, que, um dia, reencontrarei Maria Elisa?. . . »
— «Certamente que a encontrará! Depois que ambos se reajustarem aos rígidos
princípios do dever e após resgatardes os débitos contraídos durante os desvarios
das paixões, oriundas da descrença em Deus! Encontrá-la-á, novamente, sim, que
dúvida! desde que seu sentimento foi sincero, apesar de infeliz e
desequilibrado. . . »
«Aconselhe-me. ..»
165
nome
• NinPopara a ftculdapiração da liteos Estáveis, e isso ie connome ngeiro,
167
DEVASSANDO O INVISÍVEL
servou-se respeitoso, durante a prece para encerramento do receituário. Retirou-
se vagarosamente, e por alguns instantes ainda nossa visão espiritual distinguiu-o,
caminhando ao longe, por ama estrada ligeiramente inclinada, polvilhada de uma
substância creme e meio cintilante
E pareceu-nos que chorava...
*
Não mais tornámos a ver essa individualidade espiritual, ou sequer tivemos
notícias dela. Não indagámos, jamais, do seu paradeiro aos instrutores espirituais
que nos assistiam. Mas, não a esquecíamos. Orávamos em sua intenção, durante
nossos trabalhos, e a convidávamos a acompanhar-nos nos estudos diários das
obras espíritas, que sistemàticamente fazemos até hoje. Não mais pressentimos
sua presença, nem qualquer intuição informativa a seu respeito. Quatro anos
depois da sua visita, no entanto, ou seja, pelo ano de 1934, fazíamos a secção
Sociais» para um jornal semanário do interior, de propriedade de um dos nossos
irmãos. No momento de empunhar a caneta para traçar as primeiras linhas
daquele noticiário, alguém do Invisível, que não conseguíamos identificar,
arrebata-nos o braço, atira a caneta para o lado, toma do lápis e traça velozmente
uma pequena novela, intitulada «Deodato», posteriormente publicada, em
folhetins, por um conhecido jornal espírita do Rio de Janeiro. Esse trabalho, com
todos os característicos dos ditados mediúnicos, recebido em momento impróprio,
sem que nos houvéssemos preparado sequer com uma prece, sem que ao menos
tivéssemos pensado em qualquer categoria de Espíritos, foi traçado tão
ràpidamente que não pudemos interrompê-lo senão para trocar de lápis, e
quando, finalmente, a entidade comunicante modelou a última frase, e exclamou,
como de hábito em trabalhos congêneres:
— «Ponto final! »
IL
168
DEVASSANDO O INVISiViL
Não apôs assinatura. Certa de que, absolutanieiite, não seria de nossa lavra a
produção literária que acabávamos de compor, pois que sàmente escrevemos sob
influência dos Espíritos, ainda quando o trabalho se afigure nosso, como acontece
com o presente volume, rogámos à entidade, enternecida, sentindo ainda a sua
presença e a ternura que nos invadiu, dulcificando nosso coração:
— «Querido irmão, muito agradeço a benevolência da vossa presença... com a
mimosa dádiva literária com que me presenteais... Que o Senhor vos ilumine e
abençoe, tornando-vos feliz na Espiritualidade. . . Tende a bondade de assinar o
vosso trabalho. . . »
Esperávamos, mas a entidade quedava-se silenciosa
e esquiva. Repetimos a súplica:
— «Tende a bondade de assinar... Um trabalho anônimo, de Além-Túmulo, não
tem valor.., e não poderá ser publicado. . . »
Então o visitante «falou>’, docemente, e confessamos que, de certo, um
embotamento singular nos obscurecia as intuições, até o momento presente, em
que escrevemos estas páginas, impedindo-nos reconhecer o Espírito que então
nos visitava, pois que, realmente, apenas neste momento somos informada,
quando o é também o leitor, de que o autor espiritual da novela «Deodato», escrita
em 1934, fora o amigo «Beletrista». Respondeu-nos ele, porém, naquela época,
sem que o identificássemos:
— «Assina tu mesma... Presentejo-te com ela... Eu não desejo aparecer. . . »
Ora, chegando a esta altura do presente capítulo, que nos está surpreendendo
mais do que ao próprio leitor, eis que o venerável Espírito do Dr. Bezerra de
Menezes, um dos patronos espirituais do Centro Espírita de Lavras, pela época
em que lá militávamos, e onde, pela primeira vez, falámos ao amigo «Beletrista»,
irradia até nós seus pensamentos, avisando-nos de que dirá algo a
45
é meu pu‘preparo e
Fdamente,
entes ao acontecismissor da pretensão,
mano, não
, antes de
e que lhe Não ignovos os tra Mas, os nheiros de ua própria es temunho res para a
seria um
que inicia-
e precisava
iue nos sou o curso stemunhos, o Espírito. imeira vez, itos, ofereatendido, ti
mesma, ois que teo são, às esses munlivre arbíe situações pela época,
sempenhar Vejo, p0-
DEVASSANDO O INVISÍVEL
171
DEVASSANDO O INVISÍVEL
vida imortal!»
**
uma reencarnação que me leve a esquecer esse nome... e até a minha própria
personalidade atual... Como que-
172
CAPITULO VIII
Sutilezas da Mediunidade
“Para conhecer as coisas do mundo visível e descobrir os segredos da Natureza
material, outorgou Deus ao homem a vista corpórea, os sentidos e instrumentos
especiais. Com o telescópio, ele mergulha o olhar nas profundezas do espaço, e,
com o microscópio, descobriu o mundo dos infinitamente pequenos. Para penetrar
no mundo invisível, deu-lhe a mediunidade.”
(ALLAN KARDEC — “O Evangelho segundo o Espiritismo”, Cap. XXVIII, n9 9.)
Acreditamos sinceramente que a mediunidade, nas suas profundidades e
verdadeiras potencialidades, ainda é desconhecida dos estudiosos espíritas. O
próprio médium não a compreenderá, não obstante sofrer suas influências e ser
acionado ao seu influxo, até mesmo no desdobramento da vida prática. Basta ser,
a mediunidade, o resultado de um jogo transcendente de sensações e
percepções, uma indução de forças intelectivas sobre outras forças intelectivas e
também perceptivas, para compreendermos que se trata de uma faculdade
profunda, complexa, vertiginosa, em suas possibilidades singulares. Se todas as
faculdades, ou atributos da alma — a que Léon Denis denomina «Potências» —,
conhecidas dos homens, estão como que interligadas entre si, dependendo umas
das outras na contextura que realiza a individualidade integral, completando-se,
harmonizando-se, a mediunidade, como participante desse conjunto de «Po
— .—
DEVASSANDO O INVISÍVEL 175
tências», igualmente estará tão integrada na estrutura
psíquica das criaturas quanto as demais, fazendo parte,
como vemos, do potencial anímico global que traduz a
individualidade imortal, razão pela qual ficou dito que —
todas as criaturas possuem mediunidade.
Tais «Potências», ou forças, são, segundo sabemos
até o momento (possuimos, além dessas, outras preciosas
faculdades, que não se revelarão no estado de encarnação
[e ou no d2 evolução espiritual medíocre), e conforme de nominaçã
-i Psicologia moderna, as «funções conscien ciais»
que poderemos agrupar em quatro categorias bá iO
sicas, a saber: funções intelectivas, funções sensoriais,
funções afetivo-emocionais e funções perceptivas, das
do quais se salientam, então, a Memória, a Razão, o Dis cernimento
a Atenção, o Pensamento, a Vontade, o Sen timento
a Imaginação, etc., etc. E se as possibilidades
desse agrupamento de forças imortais se desdobram ao
infinito, também a mediunidade, como participante dessas
as funções (sensoriais e perceptivas, ao que a observação
da indica), possuirá possibilidades de ação e sutilezas ain d
desconhecidas dos estudiosos atuais. Muitos médiuns
sabem disso, embora sem compreenderem bem o que com
eles se passa. Muitas vezes, receoso de não ser acredi tad
pelos amigos mais íntimos, e temendo ver-se con e
siderado ridículo ou pretensioso, guarda o médium o
re segredo das mais belas revelações que lhe são facultadas
ra por vontade exclusiva dos mentores espirituais, ou por
ação mecânica da própria faculdade, que naturalmente
desencadeia os acontecimentos, mesmo à revelia do mé
dium. Geralmente, perseguido, criticado sem piedade até
as dentro do próprio lar, e também pelos adeptos da pró pri
Doutrina, enche-se ele de complexos e timidez, que
fl 1 tendem a perturbar, quando não impossibilitam, mui to
fenômenos que poderiam realizar-se para edificação
‘o- geral. O Espiritismo — a Terceira Revelação de Deus
aos homens — é obra da mediunidade; será bom que de
DEVASSANDO O INVISÍVEL
tal não se esqueçam aqueles que preferem ver charlatães e intrujões nessas
pobres almas que, para conseguirem do Além o que vem dar corpo à Doutrina
Espírita, têm de morrer para si mesmas, sacrificando-se durante a vida inteira e
chorando lágrimas de testemunhos acerbos, visto que nenhuma criatura, qualquer
que seja, se afinará plenamente com a Espiritualidade, para o feito mediúnico, por
entre risos e alegrias e modo de viver dispil cent
e cômodo
176
.——..——
DEVASSANDO O INVISÍVEL 17T
harlatães de Joana, mas de todos os Espíritos desenearnados, que
seguirem desejem apresentar-se ornamentados, são tecidas com
Lrita, têm o poder do Pensamento e da Vontade, agindo sobre o
te a vida fluido universal; e que essas roupagens, por vezes belís rbos
vis- simas, com que os médiuns costumam vê-los, são divisa-
afinará das quer em vigília, quer durante os transes a que estes
o mediú- forem submetidos. Entendemos que a resposta de Joa
displi- na ao Bispo de Beauvais assume grande valia nos dias
atuais, quando a ciência transcendental já nos levou a
encobrir compreender o que Deus possui para vestir os habitantes
velações do mundo espiritual, ou seja, os elementos fluídicos,
LU1O que, material» sobre que agem o Pensamento e a Vontade
mo, afir- dos desencarnados. Assim sendo, não desprezaremos
rn obtém anotar pequenos detalhes da mediunidade que, mais tar ara
aos de — quem sabe? —, como acontece no presente à res
se so- posta de Joana ao seu algoz (resposta que só após cm riuit
do co séculos foi devidamente compreendida), poderão ser
mos im- também de utilidade para esclarecimento do leitor, e
algo de servir, outrossim, de ponto de partida para estudos e
ricoberto meditações em torno de tão magnífico assunto.
que um
fundos, 1
tantíssi l
Espi- No ano de 1915, no correr de memorável sessão a
que assistiram nossos pais, em seu próprio domicílio, na
ais, du- cidade de São João Dei-Rei, em Minas Gerais, e na qual
se São servia o médium Silvestre Lobato, já falecido — o me amente
lhor médium de incorporação por nós conhecido até hoje
e Deus —, o Espírito do Dr. Bezerra de Menezes anunciou o
morte advento do Rádio e da Televisão, asseverando que este
darem, último invento (ou descoberta) facultaria ao homem,
ediúni- mais tarde, captar panoramas e detalhes da própria vida
flOs os no Mundo Invisível, antecipando, assim, que a Ciência,
tos do mais do que a própria Religião, levaria os espíritos mui-
no não to positivos a admitir o mundo dos Espíritos, encami s-Guia
nhando-os para Deus. A revelação foi rejeitada pelos
DEVASSANDO O INVISÍVEL
179’
Afina-se com o caráter deste e recebe suas ordens ou sugestões, tal como o
sonâmbulo às ordens do seu magnetizador. Ao despertar, reproduz, mais tarde,
em ações da sua vida prática, as ordenações então recebidas, as quais poderão
levá-lo até mesmo ao crime e ao suicídio. Será prudente que a oração e a
vigilância sejam observadas com assiduidade, particularmente antes do sono
corpóreo, a fim de proteger o médium contra esse terrível perigo, pois que isso
favorecerá uma como harmonização de sua mente com as forças do Bem, o que
evi- tará o desastre. O Mundo invisível é intenso, e nem
tudo ali será beleza, espiritualidade, fraternidade, fio— res... Também a inveja, o
ódio, o despeito, o ciúme, o crime e até o sensualismo existirão no Invisível,
rodeando nossas almas e tentando-as, durante a emancipação concedida pelo
sono natural. Os atributos da alma, por sua vez, são profundos, complexos e
poderosos, e, quando mal orientados, poderão ocasionar calamidades ao.
DEVASSANDO O INVISÍVEL
DEVASSANDO O INVISÍVEL
lhas que os homens não concebem, mas que o Espírito, principalmente o
desencarnado, em estado normal vibratório elevado, desfruta a longos haustos. O
verde das nossas folhagens, a policromia das nossas flores são, assim, mais
brilhantes e mais formosos, e dir-se-ia que tudo o que nos cerca se mostra sob
uma «quarta-dimensão», pois que tudo quanto nossa visão possa abranger,
durante esse transe, como que se destaea da própria atmosfera, tornando-se em
magnífico alto relevo. Não encontramos vocábulos apropriados para poder bem
descrever o que então se passa. Mas, o que é bem certo é que, contemplada
pelos olhos espirituais, ou pela visão mediúnica levada a esse gênero de transe, a
Terra é profundamente mais bela e aprazível do que se apresenta à visão física-
material comum, O mesmo fenômeno observámos quando nossos Guias, ao
prepararem o volume «Memórias de um Suicida», nos levaram à cidade do Porto,
em Portugal, em corpo astral, fazendo-nos contemplar o Cais da Ribeira, com sua
movimentação típica, e o rio Douro, com a magnífica ponte D. Luís, cuja existência
ignorávamos. No Porto, no entanto, os coloridos eram mais vivos do que os
entrevistos no Rio de Janeiro.
Em ocasiões tais, alterações significativas se dão em nossa personalidade. As
criaturas humanas nos aparecem como meras sombras. Seremos capaz, porém,
de reconhecer amigos e conhecidos. Mas, tememos eneon- trá-los, acometida do
singular terror de que nos cumprimentem e nos falem, pois não poderíamos
corresponder-lhes. Temos a impressão de que, se nos falassem, terrível choque
adviria, causando-nos grande mal. Vemos, no entanto, nitidamente, os Espíritos
desencarnados e lhes falamos longamente. Quantas vezes, sob esse estado,
temos perlustrado as ruas do Rio de Janeiro, ouvindo o que nos dizem Charles,
Chopin, nossa mãe e outros amigos espirituais, cujos nomes ignoramos em vi-
181
DEVASSANDO O INVISÍVEL
gília, mas que sabemos gravados ternamente em nosso coração espiritual! Essas
conversações, no entanto, jamais são recordadas ao findar do transe.
Esquecemo-las completamente, para nos lembrarmos apenas de que fruímos feliz
convívio com os bons amigos do Além, cuja solicitude nos reanima para novas
etapas terrenas. Todavia, tais estados nos causam profundo abatimento físico e
uma como sonolência deprimente, enquanto nossas feições endurecem e nossos
dentes se cerram como se nos ameaçasse o fenômeno cataléptico.
Mas . . estarão eles, realmente, os bons amigos, caminhando conosco pelas ruas,
uma vez que o fenômeno
se verifique durante algum giro que fazemos?
Será mais provável que não! Estarão além, com os pensamentos e as irradiações
voltados para nós, enquanto que a sutileza da nossa própria faculdade,
igualmente distendida à sua procura, se prestará ao extraordinário feito. E nem se
suponha que haverá perigo para nossa vida, ao atravessarmos a via pública, por
mais movimentada que seja, porque, em tais circunstâncias, sentimos maior
segurança ao nosso redor e dispomos de maiores recursos, para nossa própria
vigilância, do que no estado normal.
não obstante tratar-se de um estado algo penoso, pois são as duas vidas que se
entrecruzam, num panorama
DEVASSANDO O INVISÍVEL
seres vivos que são, são os mesmos que penetram os homens, onde estes se
agitam. Daí essa correspondência vibratória, que faz o ser espiritual do homem
compreender o ser do animal, senti-lo, assim como aos demais remos da
Natureza. . . pois será bom não esquecer que somos essência de Deus e, como
tal, possuiremos, todos, essa capacidade, para aplicação da qual apenas nos será
necessário certo desenvolvimento vibratório, ou psíquico. Ora, aqueles animais,
por nós sentidos e compreendidos no estado de semidesprendimento espiritual, se
afiguraram ao nosso entendimento e à nossa razão quase como seres humanos,
sentindo nós, por eles, viva ternura e até profunda compaixão. Um deles, o boi,
chegou mesmo a ver o nosso fantasma, pois se assustou quando nos achegámos
a ele e lhe acariciámos a enorme cabeça. Nossos mestres hindus, que têm
predileção pelos estudos da Natureza e pelas pesquisas sobre a evolução da
alma, levam-nos, às vezes, a visitar matadouros de gado. E o sofrimento que aí
contemplamos envolvendo os pobres animais, as impressões dolorosas de
surpresa, de terror e de angústia que eles sofrem, e que se infiltram pelos
meandros da nossa própria alma, não seriam maiores nem mais penosas, talvez,
se se tratasse de simples seres humanos. Quanto a outros animais, aos vegetais
e à matéria inanimada, nada adiantaremos, uma vez que não temos lembrança de
os ter «visitado». Mas, a impressão que guardámos das quatro espécies citadas
foi profunda e enternecedora, como de semelhantes nossos Desses exames, o
menos agradável às nossas recordações foi o do gato, cujas vibrações traduziam,
ao nosso entendimento psíquico, «sentimentos» bem mais inferiores do que os
outros.
Parece que tais estudos, transcendentes e de pouca aceitação sobre a Terra, a
par da Cosmologia e outros, empolgantes, profundos, como a Astronomia, a
Arqueologia, etc., fazem parte da iniciação superior a que so 190
DEVASSANDO O INVISÍVEL 191
mos chamados, e que tanto serão permitidos ao Espírito desencarnado como ao
encarnado, durante o sono, dependendo apenas da sua aplicação ao estudo e da
vontade de progredir, daí advindo, então, as descobertas que, de quando em vez,
surpreendem o nosso Globo.
*
.* *
Cuidaremos, a seguir, da «Psicometria de ambiente», a qual, à revelia do
sensitivo, lhe permite rever, em um ambiente qualquer, as ocorrências ali
verificadas muito antes, às vezes mesmo há séculos.
Visitámos, certa vez, uma amiga de nossa família, cuja residência, muito antiga,
de aparência senhorial, datava do Segundo Império. Tratava-se de uma chácara,
já arruinada, localizada em adiantado subúrbio do Rio de Janeiro. Nossa visita,
que se estendeu por seis dias consecutivos, necessàriamente nos obrigou a
pernoitar na dita residência outras tantas noites. Não nos foi possível, porém,
conciliar o sono na primeira noite ali passada, enquanto que nas subsequentes
apenas pela madrugada repousávamos ligeiramente, o que nos debilitou,
alterando a saúde. E’ que o que ali acontecera durante a escravatura, pelos
meados do Segundo Império, nos foi revelado pela própria ambiência onde os
fatos ocorreram, fotografando-se as imagens, provàvelmente, nas ondas etéricas
de que trata o Sr. Myers.
A chácara fora uma fazenda de escravos. Assistimos ali, então, a cenas típicas da
escravatura: desapareceram as ruas atuais que estruturam o bairro, a paisagem
que compõe o panorama do momento. Às nossas percepções espirituais
(estávamos em vigília, o que víamos não era como em sonho nem durante os
transportes, mas em nosso estado natural, embora estando já recolhida), se
delineara a fazenda antiga, as senzalas, os milharais,
ou
Om poi
iciáni
ituai,
razão
por eles, viva
deles, o boi, chese assustou
Ds a enorme
predileção pelos
nhre a evolução
de
Lplamos envolvendo orosas de surpresa,
rn, e que se infilseriam
de sim vegeliantaremos uma vez «visitado». Mas, a
o espécies citadas foi
semelhantes nossos.
às nossas recordatraduziam, ao nosso
i bem mais inferio endente
e de pouca Dosmologia e outros, tronomia, a Arqueo superior a que so
CAPrrULO IX
As virtudes do Consolador
“...pois que a morte é a ressurreição, sendo a vida a prova buscada e durante a
qual as virtudes que houverdes cultivado crescerão e se desenvolverão como o
cedro.”
“Venho instruir e consolar os pobres deserdados. Venho dizer-lhes que elevem a
sua resignação ao nível de suas provas, que chorem, porquanto a dor foi sagrada
no Jardim das Oliveiras; mas, que esperem, pois que também a eles os anjos
consoladores lhes virão enxugar as lágrimas.”
(ALLAN KARDEC — “O Evangelho segundo o Espiritismo”. Comunicações do
Espírito de Verdade, Cap. VI.)
“Não digo que isto é possível; digo: isto é real!”
WILLIAM CROOKES
No seu encantador livro «Joana d’Arc, Médium», que integra urna série magnífica
de exposições sobre o Espiritismo, Léon Denis, o inconfundível poeta da Terceira
Revelação, diz que — «Numa conferência que fêz no Instituto Geral Politécnico, o
Dr. Duclaux, diretor do Instituto Pasteur (Paris), se exprimia nos seguintes termos:
«Esse mundo (o espiritual), povoado de influências que experimentamos sem as
conhecer, penetrado de um «quid divinum» que adivinhamos sem lhe perceber as
minúcias, é mais interessante do que este outro em que até agora
que
de um «quid as minúcias, iue até agora
200 DEVASSANDo o 1.NVISIVEL
cie de uma visão toda especial, percepções que, em determinadas circunstâncias,
o levam a apreender não só algo do pensamento e das intenções alheias como
até mesmo as vibrações existentes nos locais visitados, permitindo-lhe captar
também detalhes que se relacionem com as passadas existências das
personalídades que neles vivem. Assim foi que, penetrando, pela primeira vez, o
solar da família Santos, edificação graciosa, em estilo colonial português, sem
conhecer qualquer dos seus membros e nada, absolutamente, que com estes se
relacionasse, nossas percepções mediúnicas, em vez de uma residência em estilo
colonial português, fizeram-nos entrever e sentir um estranho ambiente artístíco,
suntuoso e evocativo, mas no estilo da velha Tndia e não de Portugal, o qual nos
envolvia e penetrava como se o distinguíssemos através de quadros sugestivos
que outra vontade, independente da nossa, nos decalcava no íntimo do ser.
Sob tal injunção, cercavam-nos, não os aposentos confortáveis, modernos, que se
vêem no solar, mas velhas arcadas de estilo oriental, portas rendilhadas, como
jóias de filigranas, varandas com formosos balaústres, tetos esculpidos com altos
relevos reluzentes, como pintados a ouro, salões dourados com reposteiros
flexíveis, enfim, panorama íntimo tipicamente hindu, aristocrata, refinado. Uma
como vertigem engolfou nosso espírito; nossas energias mediúnicas, nos
primeiros momentos, se abalaram, premidas pela força vibratória do fenômeno,
alheando-nos do que em derredor se passava e impossibilitando-nos de
compartilhar a conversação durante os primeiros minutos. Refazendo-nos pouco a
pouco, não sem estranhar, porém, a singular visão que nos fora dado distinguir
através do sexto sentido, lembrámo-nos de que o Sr. Santos era português nato,
seus filhos brasileiros e sua esposa igualmente brasileira, descendente de
portugueses, não existindo, portanto, quaisquer razões que
da casa:
«Como se chamava a sua filhinha, minha se-
nhora?..
202
DEVASSANDO O INVISIVEL
DEVASSANDO O INVISÍVEL
e miserável, como da criança, era o que de mais intenso se poderia imaginar, mais
doloroso e cruel do que em
208
DEVASSANDO O INVISIVEL
**
210
DEVASSANDO O INVISIVEL
canta. .
Então, o jovem doutorando ouviu a irmã cantar lin 211
DEVASSANDO O INVISÍVEL
da e intraduzível melodia, como jamais ouvira, e, comovido, repetia-a, como
levado por impulso mediúnico. Mas, repetia-a em lágrimas, invadido por uma
comoção que transcendia sua habitual força de vontade, impossível de conter ante
a delicadeza daquelas vibrações. Sua irmã Zinda encontrava-se pelas imediações
da sala. Ouviu o irmão cantar uma canção singular, ao mesmo tempo que
chorava, e desejou saber o que se passava. . .
Aqui termina o relatório do Sr. Santos. Mas, nós outros, estudiosos dos fenômenos
espíritas, temos o dever de algo meditar sobre a narração acima transcrita. E o
faremos, com o constante objetivo de colher instruções em quaisquer
acontecimentos relacionados com o Além-Túmulo.
E’ possível que o Espírito de «Betinha» se materializasse ali, diante do irmão, ou,
pelo menos, que o tentasse faser. Como o fato, porém, não foi suficientemente
constatado pelo vidente, que sentiu dúvidas em afirmar se realmente vira a
imagem da morta ao lado do retrato, passaremos por alto sobre a materialização.
Talvez a própria repulsa do jovem médico às coisas espintas o impedisse de
averiguar o fato, que seu preconceito científico antes consideraria «impressão» ou
«alucinação». De qualquer forma, porém, o fenômeno realmente não se poderia
realizar com visos de certeza, dado que a sala, profusamente iluminada,
dificultaria a condensação dos elementos fluídicos necessários ao Espírito para
mostrar-se com toda a clareza, já que ele necessita de penumbra para tornar
visível a própria imagem astral (31). O que é certo, no entanto, é que as névoas
(31) Os mestres das pesquisas espíritas, no setor de materializações das almas
desencarnadas, como Wifliam Crookes, Roberto Dale Owen, Alexandre Aksakof e
outros, conseguiram materializações à própria luz do gás, ou à claridade da
lâmpada a querosene, o que Indica não ser indispensável
212
DEVASSANDO O INVISÍVEL
terna entre os que choram e sofrem nas provaçõc. terrenas.., e também para o
mérito inconcusso daqueles a quem amou sobre a Terra como pais e irmãos, os
quais, exercitando as leis da Caridade, vão, a cada passo, se laureando em
presença d’Aquele que proclamou o Amor ao próximo como eterno tema de
redenção...
214
[SIVEL
a nas provaçõe. tericoncusso daqueles a
e irmãos, os quais,
, a cada passo, se
proclamou o Amor
edenção.
CAP!TULO x
Os grandes segredos do Além
— “Influem os Espíritos em nossos pensamentos e em nossos atos7
— Muito mais do que imaginais. Influem a tal ponto, que de ordinário são eles que
vos dirigem.
— Como distinguirmos se um pensamento sugerido procede de um bom Espírito
ou de um
Espírito mau?
— Estudai o caso. Os bons Espíritos só para o bem aconselham. Compete-vos
discernir.
— Pode o homem er,imir-se da influencia dos Espíritos que procuram arrastá-lo ao
mal?
— Pode, visto que tais Espíritos só se apegam aos que, pelos seus desejos, os
chamam, ou
aos que, pelos seus pensamentos, os atraem.
— Renunciam às suas tentativas os Espíritos cuja influencia a vontade do homem
repele?
— Que querias que fizessem? Quando nada conseguem, abandonam o campo.
Entretanto, ficam à espreita de um momento propício, como o gato que tocaia o
rato.”
(ALLAN KÂRDEC — “O Livro dos Espíritos”, Cap. IX, 2’ Parte. — Perguntas 459,
464, 467 e 468.)
Desejávamos terminar este volume com uma tese que ventilasse algum assunto
alvitrado pelas preocupações de estudiosos e companheiros de ideal.
Conversando com alguns amigos, vários pontos de Doutrina foram lembrados,
interessantes e profundos. Aceitámos alguns e pr&
DEVASSANDO O INVISÍVEL
rente daquela que esperávamos, não atendendo à súplica formulada nem
agitando o nosso lápis, acionando nosso braço ou povoando nossos
pensamentos. Forneceu-a ao vivo, levando-nos, em espírito, ao mundo invisível
situado nas camadas terrenas, e autorizando nossas observações em torno de
impressionantes aspectos da existência extraterrena e seus reflexos nas ações
cotidianas dos homens comuns, ou na massa popular. Isso quer dizer que
visitámos antros sórdidos da vida invisível, onde a ignominha generalizada
prolifera, subtraida à vista das criaturas humanas pelo segredo da morte. E o
resultado dessa estranha reportagem, que passamos para estas páginas, toma o
lugar do tema que buscávamos.
*
**
Dissemos, em páginas anteriores, que a entidade Adolfo Bezerra de Menezes é
quem mais frequentemente nos faculta visitas a locais onde a miséria moral-
espiritual se acentua. Sua grande bondade de coração, que o leva a partir em
busca dos infelizes e transviados do beni, a fim de socorrê-los; o desejo, nunca
desmentido, que ele tem de ajudar o próximo, certamente deveres imperiosos
assumidos com a Espiritualidade, constantemente o impelem aos locais onde a
maldade e o vício, o atraso e a delinquência cavam rastros calamitosos, cujas
consequências serão, talvez, séculos de lágrimas para aqueles que se
abandonam às suas sugestões.
Não nos foi jamais possível concluir, categôricamente, se esses antros invisíveis,
por nós visitados com nossos instrutores, são localizados na ambiência terrena ou
no Espaço prôpriamente dito. Supomos, entretanto, que, embora invisíveis a olhos
humanos, alguns deles, pelo menos, existem em qualquer local da própria
sociedade terrena, onde quer que se aglomerem os desencarnados
217
para o próprio
nos!
[nvite-
NDO O INVISÍVEL
comuns, como tantos que vemos alinho, rotas, imundas, pés des[onomias
torturadas pela miséria indos, como que sem vida, traindos estragos que a
putrefação ais, no fundo dos túmulos, prorajada pelo cadáver. Refletin,
impressionando-lhes a mente, ões, essa repercussão dava em das com que nossa
visão os via ficavam pelo mesmo baixo nível diferentes posições sociais que ado
na Terra.
saudaram-nos com alegria e supondo-nos uma parceira, ou aturalmente,
recusámos, como de encarnados. Fizemo-lo, poendo a atenção. Um deles, que
bre a mesa que os demais roscansados sobre o assento da r sentado, e
sapateando sobre imborilava com os dedos numa nhar na cantiga que entoava,
udo, dirigindo-se a nós mesma:
sua» idiota, que vieste fazer ha-prazeres», antes que eu te um soco... Vai-te, vai-
te!.
braço ou a perna, com um euanto faz. . . »
egura como estávamos da prenão mais víamos, mas sentíaá-Ios, pois somos
irmãos à face
rios, com serenidade.
acreditamos que tudo quanto D de doutriná-lo seria em vão.
DEVASSANDO O INVISÍVEL
225
jade, portanto,
sponsabilidade, que desejaram entos que aliconduziram...
res, tais como se acumpliciariam suas au- tão não sabes
ponto de en o fenômeno, tudo e adversses em certa rão fora isso, Lnhã sofrerias
vez mesmo o
• Eles sabem , porventura
o homem se
— «A quem?. .
«Aos obsessores...,,
«A lei do progresso certamente agirá sobre eles... Mas, tal como se encontram no
momento, não aceitariam a palavra da Verdade... Será necessária a ação do
tempo, o trabalho da consciência, a dor consequente ao desequilíbrio em que
vivem, provocando o arrependimento, para que se decidam à emenda... Vós,
espíritas e médiuns, trazeis convosco forças magníficas para o trabalho de auxílio
aos vossos guardiães espirituais, na catequese desses irmãos.. . Se os vossos
núcleos de trabalhos espíritas, pela sua idoneidade, pela respeitabilidade e
proficiêneia dos trabalhos a realizar, cativaram a confiança dos vossos instrutores
da Espiritualidade, poderemos até mesmo detê-los na sede dos mesmos, para
que aproveitem do vosso labor doutrinário, recebendo instruções diárias
convosco... A dificuldade residirá na decisão para os sacrifícios a praticardes
durante os trabalhos indispensáveis, sacrifícios que implicarão grande série de
renúncias, devotamento incansável, renovação diária do vosso próprio caráter,
que deverá, tanto quanto possível, elevar-se à altura do discípulo da Revelação,
que exige dos seus adeptos uma extensão de vistas, ou princípios,
verdadeiramente heróica! Ao vos reunirdes em preces e estudos, se vos
lembrardes de dirigir a esses tais um
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pensamento amoroso, através da exortação da prece; se lerdes páginas
conselheirais e educativas em sua homenagem, a sós ou reunidos, e se as
comentardes após, carrearemos vossos pensamentos, vossas palavras e vossa
imagem até onde eles se encontrem. Eles vos enxergarão e ouvirão, a despeito da
lonjura em que se acharem. Se, pelos predicados já por vós adquiridos,
suportardes a responsabilidade da sua presença, poderemos até mesmo trazê-los,
momentâneamente, para junto de vós, pois vossas virtudes serão poderosos
estimulantes para a reação que necessitam aplicar a si próprios, visando a se
recuperarem para o arrependimento... Ainda que contra a própria vontade, serão
obrigados a vos ver e ouvir, pois este fenômeno está na lei natural, é tão normal e
comum como as chuvas caírem no verão, as quais alegrarão a alguns e
aborrecerão a outros, mas que todos terão de suportar, porque se trata de um fato
natural, inevitável... Com o tempo, se fordes perseverantes na vossa atitude de
amoroso auxílio, o efeito será satisfatório. Nossa dedicação, conjugada com a
vossa, beneficiará de tal forma os pobres delinquentes, que a boa vontade para a
emenda bem cedo raiará... Nova encarnação se delineará para eles, oferecendo-
lhes meio mais rápido de expurgos conscienciais... e, daí para o futuro, não será
tão difícil a caminhada para a regeneração total...»
— «Podereis explicar-nos, agora, qual a razão pela qual alguns irmãos
desencarnados passam, às vezes, séculos supondo-se vivos, ou antes,
habitantes, ainda, da Terra, num corpo carnal? Onde reside o mecanismo de tal
fenômeno ?»
Sem parecer admirado de tal pergunta, o guardião
respondeu, com naturalidade:
— «Em primeiro lugar, o fato ocorre porque suas ideias, quanto ao mundo
espiritual, eram bem diferentes
daquilo que os cerca após a morte, ao passo que se seu-
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, .
.
,
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INVISIVEL
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pessoa do próximo, traresultado ser o fato inso perispírito pelo acervo rno a mente
é criadora. ibilidades de impor qualdação, onde quer que o no fundo de um poço.
a trepidação do comboio, is sensibilidades mentais, te, as impressões da viaegado
ao destino? Não que foram contempla- os rumores do veículo, como se
estivésseis no dia seguinte, após sono to do trauma nervosotrossim, que as
impressamente mais intensas aturas humanas. Assim io inveterado (espécie 1), a
vingança e até o mômenos, e o seu meural da mente, na vonda própria
consciência, pois tudo isso resulta
is.
nições morais e mentais s a entender tal «me- a longe de compreendas
impressões de um )oder mental. Existem errena há séculos, inclinações
apaixonadas, as fortes, como o fiveis A vontade que sto e do poderio e a