Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
MISTÉRIO DA
SANTA CONFISSÃO
PE. PAÍSIOS
2023
NOTA
1
SUMÁRIO
PREFÁCIO.......................................................................................................................... 5
INTRODUÇÃO AO MISTÉRIO DA SANTA CONFISSÃO..........................................7
Por que arrepender-se?...................................................................................................7
Arrependimento e Confissão.......................................................................................... 8
O que é a Confissão?.......................................................................................................9
Salvação e Confissão.................................................................................................... 10
O que é o pecado............................................................................................................11
OS DEZ MANDAMENTOS............................................................................................. 13
1. “Não terás outros deuses além de mim.”................................................................13
2. “Não farás para ti nenhum ídolo (...)”.....................................................................13
3. “Não tomarás em vão o nome do Senhor (...)”........................................................ 14
4.“Lembra-te do dia de sábado, para santificá-lo.”.................................................... 14
5. “Honra teu pai e tua mãe (...)”................................................................................ 14
6. “Não matarás.”.........................................................................................................14
7. “Não adulterarás.”................................................................................................... 14
8. “Não furtarás.”.........................................................................................................14
9. “Não darás falso testemunho contra o teu próximo.”............................................ 15
10. “Não cobiçarás a casa do teu próximo.(...)”...........................................................15
AS BEM-AVENTURANÇAS............................................................................................16
1. Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos Céus;........... 16
2. Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados;.......................... 17
3. Bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra;................................. 18
4. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão saciados;...
20
5. Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia;........ 21
6. Bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus;...................... 22
7. Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus;.24
8. Bem-aventurados os que sofrem perseguição por causa da justiça, porque deles é
o Reino dos Céus;.......................................................................................................... 25
9. Bem-aventurados sois vós, quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo,
disserem todo o mal contra vós por minha causa....................................................... 27
O LAMENTO DE SÃO BASÍLIO, O GRANDE............................................................30
SÃO NICODEMOS DO MONTE ATHOS E O SEU "EXOMOLOGETARION"....... 35
Os três modos de ofender a Deus através do pecado.................................................. 35
As três consequências do pecado no homem............................................................... 36
A prática e a preparação.............................................................................................. 37
Como os pecadores devem confessar (...)..................................................................... 38
CONCLUSÃO & APONTAMENTOS FINAIS..............................................................41
APÊNDICE........................................................................................................................44
2
PREFÁCIO
Este pequeno livro é fruto de uma necessidade. Ser Ortodoxo é mais do que
a adesão cega a uma confissão cristã entre tantas outras. A Igreja Ortodoxa
é o Corpo Místico de Cristo, a Fé Verdadeira, a Igreja fundada no
Pentecostes, aquela onde nem "as portas do inferno prevalecerão."
Sabemos disso, discutimos muito sobre este tema ao ponto dele ser familiar
a todos. Porém, é uma grande questão se essas verdades superam no
homem o nível puramente intelectual e descem ao seu coração. Muito do
homem contemporâneo é erguido sobre suas palavras e quase nada sobre
suas ações. Precisamos lutar para corrigir isso. É uma questão de vida ou
morte.
Mas qual o efeito de ser Ortodoxo na vida de um fiel?
Teologicamente, eu diria que é a possibilidade real de união com Deus. Se
eu pudesse destacar um efeito prático disso, eu diria que é a possibilidade
de cura do homem. Porém, se eu tivesse que simplificar ao extremo? Se eu
tivesse que responder isso a alguém que acabou de entrar na Igreja pela
primeira vez, ou ainda está tateando a fé como um bebê? Eu diria, sem
medo algum de errar e sem prejuízo algum da Verdade, que ser Ortodoxo é
buscar o arrependimento dia e noite, até que nossos corpos encontrem a
sepultura. Ser Ortodoxo é arrepender-se.
Cristo, em Sua infinita misericórdia, nos deixou uma possibilidade de
experimentar a Sua Graça Divina através do nosso sincero arrependimento.
Ele converteu essa necessidade básica, esse momento onde nosso coração é
esmagado pelo peso dos nossos pecados, em uma possibilidade de
santificação através da Graça que flui livre dentro da Igreja. Essa
possibilidade, meus irmãos, é a Santa Confissão.
Nestas poucas páginas, esse Santo Mistério da Igreja lhes será
apresentado. O básico lhes será fornecido para que possamos chamar esse
empreendimento de "guia". Ainda que a Confissão seja aprendida na
prática, na arena da luta espiritual, devemos saber em que direção ordenar
os nossos esforços.
3
Nas primeiras páginas, vocês encontrarão uma introdução a alguns
dos conceitos-chave neste tema, como o "pecado", o "arrependimento", a
"cura" e a própria "confissão" em si. Porém, é com Cristo e Suas
Bem-aventuranças que verdadeiramente seremos alimentados e
introduzidos na dimensão mais profunda desse Mistério. Veremos a
condição prática do arrependimento nas palavras de Seus Santos e, de
espírito nutrido, já nas últimas páginas, seremos guiados por São
Nicodemos na prática verdadeiramente dita: quando e como se confessar.
Posso afirmar categoricamente que não existe cura sem luta ascética,
e não existe luta ascética sem a confissão dos pecados. Arrependendo-se,
confessando, adentrando verdadeiramente o abismo escuro de nossas almas
- acompanhados de nossos pais espirituais e na esmagadora presença de
Cristo - a Ortodoxia deixa de ser para nós uma marca de nosso intelecto,
para se tornar uma disposição verdadeira de nossos corações.
Espero que estas pobres linhas lhes sejam úteis em alguma coisa.
Arrependam-se. Confessem.
4
INTRODUÇÃO AO MISTÉRIO DA
SANTA CONFISSÃO 1
1
Todas as traduções do presente texto foram realizadas pelo autor, de modo livre, exceto
quando indicado.
5
impulsionada pelas imperecíveis palavras de Cristo, é o selo de todo o bom
cristão Ortodoxo, que sabe que o mundo é um vale de sofrimentos, mas tem
o bom ânimo renovado diariamente por Aquele que venceu esse mundo.
ARREPENDIMENTO E CONFISSÃO
6
O QUE É A CONFISSÃO?
7
tratamento maravilhoso, e isso nada mais é do que o Mistério da Sagrada
Confissão.”
Novamente Jesus disse: "Paz seja com vocês! Assim como o Pai me
enviou, eu os envio". E, com isso, soprou sobre eles e disse: "Recebam o
Espírito Santo. Se perdoarem os pecados de alguém, serão perdoados; se
não os perdoarem, não serão perdoados". (João 20:21-23). Porém, é
importante esclarecer que, ainda que nos confessemos na presença de um
Sacerdote, a Confissão é feita diante de Deus.
SALVAÇÃO E CONFISSÃO
8
arrependimento, para nossos Santos Padres, também está atrelado ao Juízo
Final: “não seremos julgados por nossos pecados, mas porque não nos
arrependemos" (São Theognostos).
O QUE É O PECADO
9
Essa terapia, essa cura, é mantida e ministrada integralmente em Seu Corpo
Místico, a Santa Igreja Ortodoxa.
Neste ponto, é primordial que nos livremos das noções vindas das
influências ocidentais: a visão legalista, emprestada dos tribunais, não
procede de uma mentalidade Ortodoxa. A Ortodoxia trata a questão do
pecado de um ponto de vista terapêutico. Os Santos Padres, não raramente,
tratam as paixões humanas como enfermidades. Sendo assim, a Ortodoxia
em si é ela mesma uma ciência terapêutica. O Sacerdote tem um papel
análogo ao de um médico, com um agravante: ao exercer a paternidade
espiritual, ele conduz o fiel Ortodoxo na sua luta em direção à semelhança
perdida com o Criador, oferecendo não só consolo, mas a medicina
apropriada para cada enfermidade.
Levando tudo isso em conta, concluímos que esse tema não é apenas ético e
moral, mas essencialmente teológico. “O pecado é, na verdade, a queda, o
amortecimento, o escurecimento e o cativeiro da mente (νοῦς) do homem”.
(Metropolita Hierotheos de Nafpaktos)
Como podemos, então, identificar esses pecados e nos preparar para esse
Mistério de modo adequado? Sem dúvida, tudo começa com um autoexame
sincero dos próprios pecados e do próprio estado espiritual. O homem
inicia esse processo, o livre-arbítrio é respeitado aqui (lembremos que
mesmo nossos Ancestrais usaram da plenitude de seu livre-arbítrio para
transgredir o mandamento de Deus). Para não corrermos o risco de cair em
ilusão ou histeria neste processo de exame, já que nossa mente está
obscurecida pelas paixões, os parâmetros corretos devem ser encontrados
nas Escrituras e na Santa Tradição. Vamos a alguns deles.
10
OS DEZ MANDAMENTOS
Os Dez Mandamentos, a Lei dada por Deus a Moisés no Sinai, são
claramente dispostos e verdadeiramente emblemáticos. Todo penitente
sincero, todo fiel que deseja arrepender-se, deve ter contato com essa lei
instituída por Deus. De modo breve e prático, visando uma reflexão
pré-Confissão, observaremos cada um deles:
11
Eu fiz de uma ideia, filosofia, interesse, um ídolo que rivaliza com Deus em
minha vida?
5. “Honra teu pai e tua mãe, a fim de que tenhas vida longa na
terra que o Senhor, o teu Deus, te dá.”
Amei e respeitei meus pais? Eu os negligenciei e não os ajudei quando
necessário? Eu os desonrei, os enganei ou lhes causei dor por minhas
palavras ou ações?
6. “Não matarás.”
Causei o ferimento ou a morte de alguém? Desejei a morte de alguém?
Celebrei a morte de alguma pessoa? Abortei um filho em meu ventre?
7. “Não adulterarás.”
Cometi algum ato indigno sozinho ou com outras pessoas? Fiz com que
outras pessoas cometessem adultério, atos imorais ou indignos? Dei lugar a
pensamentos, palavras ou ações impuras?
8. “Não furtarás.”
Roubei alguma coisa ou desejei fazê-lo? Tomei para mim algo que não me
pertencia? Doei aos pobres na medida de minhas condições? Não paguei
minhas dívidas? Vivi de modo extravagante, para além de meus meios e
necessidades?
12
9. “Não darás falso testemunho contra o teu próximo.”
Dei falso testemunho contra alguém? Já contei mentiras, acrescentei ou
subtraí a verdade? Fiz declarações descuidadas ou falei mal de alguém?
Fofoquei sobre alguém ou prejudiquei sua reputação? Minha língua foi uma
ferramenta de destruição contra o próximo?
13
AS BEM-AVENTURANÇAS
As palavras de Cristo, o Deus-homem, como não poderia deixar de ser, são
definitivas. Olhos atentos encontram Cristo em todo o depósito da fé
Ortodoxa. Não seria diferente quando tratamos dos Mistérios como um
todo, ou de qualquer um deles isoladamente. Não é diferente na Santa
Confissão.
(Ancião Athanásios)
(Mateus 5:3)
“Quem, então, são esses pobres? São aqueles que têm a percepção e o
sentimento de sua insuficiência espiritual e ética, claro que de um ponto de
vista a da fé e não intelectual! Estes seriam os que aceitariam o Evangelho.
14
Este é o posicionamento fisiológico. Eles aceitariam o Evangelho
simplesmente porque são humildes.” (Ancião Athanásios)
Humildade: é desta rica pobreza que se trata. São Basílio, o Grande, diz que
a humildade é “despir-se da conduta vaidosa, arrogante e presunçosa e
voltar ao que você realmente é e vale.” Ou seja, o conhecimento de si
mesmo, que é empreendido também pela Confissão.
“Não diga ‘não fiz nada de errado na minha vida, sou uma pessoa
importante e um homem muito ético’. Há quem pense e diga isto...
que desgraça!”
(Ancião Athanásios)
(Mateus 5:4)
A maioria das traduções se refere “aos que choram”, mas, o correto seria
aos “enlutados” (πενθούντες). Porém, deixando isso de lado, sendo choro
ou luto, como isso seria motivo de bem-aventurança? O luto-choro aqui
descrito não são as lágrimas derramadas por questões puramente
mundanas: sonhos não realizados, dificuldades financeiras, planos
frustrados, etc. A tristeza, o luto e o choro que nascem destas questões
mundanas brotam também do orgulho ferido e do egoísmo contrariado, e
podem nos causar danos físicos (neuroses e outros) e espirituais. O luto, o
choro, a que se refere Nosso Senhor, vem da percepção, da sensação e do
sentimento de nossa pecaminosidade. Ou seja, aqueles que choram pelos
15
próprios pecados, pelo próprio estado caído, é que são chamados de
bem-aventurados. De fato, esse luto, essa tristeza, é a mesma que foi
sentida pelo Santo Apóstolo Pedro (Lucas 22:62) e pelo Filho Pródigo. Foi
essa “tristeza” que salvou o Apóstolo e que trouxe o filho de volta aos
braços do Pai. Vale lembrar que esse choro pelos próprios pecados é a
antessala da cura, pois é a expressão genuína de nosso arrependimento.
Compadecer-se de seus irmãos, enlutar-se pelos seus pecados (não em
julgamento, mas em profundo desejo de que todos se salvem) também faz
parte dessa bem-aventurança. Lembrando que os extremos devem ser
evitados. A tristeza e autocondenação de Judas o levaram ao suicídio,
enquanto o luto de Pedro o levou ao arrependimento que conduz a
salvação. O limite desse luto, desse choro, é o reconhecimento da
Misericórdia divina.
E você, meu amado irmão? Chora pelos seus pecados? Sente tristeza
profunda pelas suas quedas? Chora e se enluta pelos pecados e pela
cegueira de seus irmãos, pois deseja a sua salvação e não o seu julgamento?
“O primeiro fruto que (esse luto) traz é a paz. Um coração confortado por
Deus tem paz, a paz irredutível de Deus que nada pode tirar.” (Ancião
Athanásios)
“Nunca seremos julgados por não realizarmos milagres, mas devemos nos
arrepender por não chorar incessantemente por nossos pecados.” (São João
Clímaco)
(Mateus 5:5)
16
“Uma vez perguntaram a um homem espiritual como ele reconheceria um
santo, e ele respondeu: ‘Por sua mansidão!’ Na verdade, a brandura é fruto
das duas bem-aventuranças anteriores.”
Qual é a terra herdada pelos pacíficos? Esta terra é o Reino de Deus, que
será herdado pelos pacíficos. São Basílio, o Grande dizia: “porque aquela
terra, a Jerusalém celeste, não se tornará espólio para os que fazem guerra
17
para arrebatar um metro de terra a outro, mas será uma herança para os
homens tolerantes, magnânimos e pacíficos.”
(Mateus 5:6)
18
O peso devido, aplicado de modo correto, essa é a justiça em um primeiro
ponto. Somos justos diante de Deus quando aceitamos Sua vontade,
acatamos e lhe entregamos o que Lhe é devido. Tudo pertence a Ele, e a Ele
tudo devemos oferecer. Aplicamos a justiça a nós mesmos quando
buscamos a santidade, que é o objetivo para o qual fomos criados.
Aplicamos a justiça ao próximo quando o tratamos como um ser criado à
imagem e semelhança do Criador. Pensemos no peso dessas palavras.
Abusamos de nossa autoridade diante de um homem que sabemos ser
criado à imagem e semelhança de Deus? Caluniamos esse homem?
Odiamos, atacamos, pisamos, sufocamos?
E você, meu amado irmão? Abusa de sua posição, pisoteia seu irmão,
oprime, afunda, desonra? Não lhe dá a justiça devida? Entrega para Deus
uma parcela de sua existência que lhe é devida? Busca a santidade?
Acredita em “justiça social” e no Reino dos Céus ideológico?
(Mateus 5:7)
19
uso deles, e assim partilha do que é, da sua própria existência, e seu irmão
não passa em branco diante dos seus olhos. Ancião Athanásios descreve
lindamente nossa condição aqui: “(...) quando o Senhor nos julgar no Dia
do Juízo, e usar o mandamento da misericórdia como critério, Ele não nos
dirá ‘eu estava na prisão e você não me liberou para pagar as despesas’,
nem que ‘Eu estava doente e você não pagou o médico e os remédios para
me curar’. Não, Ele não dirá essas coisas, mas: ‘Você não me visitou’”.
Estes, que não tem o que oferecer, mas oferecem seu próprio coração,
esforço, compreensão e amor sacrificial, alcançarão a misericórdia divina.
(Mateus 5:8)
20
carnal se movem um pouco mais rápido quando a alma sente alegria.
Quando a alma sente culpa, ódio, inveja, ressentimento ou agonia, esse
coração também bate um pouco mais rápido. Assim, nosso coração torna-se
o espelho de nossa psique-alma, pois expressa em nosso rosto nossa forma,
as diversas situações e reações.” (Ancião Athanásios).
Cristo confirma esse movimento: “Por que estais perturbados, e por que
sobem tais pensamentos aos vossos corações?” (Lucas 24:38). Porém, o
coração,quando está em seu saudável funcionamento espiritual, aponta para
nossa correta relação com Deus: “Amarás, pois, ao Senhor teu Deus de
todo o teu coração.” (Marcos 12:30)
E você, meu amado irmão? Polui seu coração com a impureza dos maus
pensamentos? Transforma seus sentidos em um receptáculo da sujeira
21
mundana, adoecendo seu coração? Odeia, blasfema, mente e coloca a sua
vontade e disposição somente a serviço de suas paixões? Estimula as
sensações através de conteúdo gráfico explícito, fazendo com que seu
coração se submeta a essas sensações?
Rezemos, meus amados, de toda a nossa alma e mente, para que Deus “crie
em nós um coração puro e para que Ele renove em nós um espírito reto”.
(Salmo 50)
(Mateus 5:9)
Que paz é essa? Qual o modelo desses pacificadores, de onde vem a paz
que eles preservam? Primeiro devemos entender que essa paz não é apenas
o que entendemos como a manutenção e a estabilidade do convívio social,
geralmente em torno de um objetivo comum. Se a paz se resumisse a essa
estabilidade mundana, poderíamos dizer que um grupo de ladrões,
mercenários, ou assassinos, que trabalha em harmonia por um objetivo em
comum, encontrou a paz e a mantém em seus corações. Sabemos que não é
assim.
O homem que pensa que a paz está relacionada a um simples estado nos
quais são encerrados conflitos e guerras, permanecerá abalado
espiritualmente até o fim dos seus dias, pois o mundo está em constante
combustão e angústia. Quando a paz é ambicionada longe da santidade e da
união com Deus, e é colocada unicamente como um fruto dos esforços
humanos, ela se torna parte da teologia do anticristo. Esse pensamento
autônomo do homem em relação à paz é, segundo o Ancião Athanásios, “o
cerne do tema do Anticristo e sua aceitação”. A paz verdadeira é a paz do
homem com Deus. Assim, ele obtém a paz consigo mesmo e com o
próximo e pode ser chamado de pacificador à medida de Cristo. Este será
chamado filho de Deus.
E você, amado irmão? Busca a santidade, para que a paz de Deus possa
reinar em seu coração? Ou pensa que a paz é um assunto puramente moral,
retirando de Deus a autoridade sobre os corações pacíficos e transmitindo
essa autoridade para alguma ideologia ou filosofia? Fere a si mesmo com a
ira, impaciência e agressividade? Leva o espírito de divisão aos seus
irmãos?
“Nenhum outro desejo foi encontrado na alma humana que seja tão
profundo quanto o desejo de paz. E a perspectiva dos pacificadores é
reconciliar os homens com Deus, conduzindo-os de volta a Ele.
Homem, por que você se afastou de Deus? Volte, não peque."
(Ancião Athanásios)
23
8. BEM-AVENTURADOS OS QUE SOFREM PERSEGUIÇÃO POR
CAUSA DA JUSTIÇA, PORQUE DELES É O REINO DOS CÉUS;
(Mateus 5:10)
24
A covardia deve ser extirpada de nossa vida. A bravura espiritual,
enraizada em Cristo, deve crescer em nós. A firmeza e a estabilidade em
nossa fé Ortodoxa são abençoadas por Deus, sobretudo quando mantidas
diante da perseguição do mundo. Não devemos ter vergonha de nossa fé e
de nossa luta pela santidade. O mundo nos perseguirá e irá nos
ridicularizar, mas “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” (Romanos
8:31)
(Mateus 5:11)
25
“O mundo se opõe àqueles que confessam o Senhor nas três maneiras que o
Senhor nos explicou na nona bem-aventurança. A primeira forma é a
zombaria, ou seja, eles vão zombar, zombar ou rir de você. A zombaria é a
ironia, ou seja, uma arma muito boa nas mãos dos mundanos, uma arma
maligna, vil, artística, psicológica e eficaz.
Existe uma terceira via e é vil, má. Atenção a isso. Os oponentes entram em
qualificações muito vis, malignas e caluniosas. Calúnia é a falsa acusação.”
(Ancião Athanásios)
“(...) haverá aquela grande glória pela infâmia ou desgraça que estes justos
sofreram aqui na terra, porque o Senhor também diz: "Então os justos
brilharão como o sol na realeza de seu Pai" (Mateus 13:43). É a Luz
Incriada pela qual os confessores serão preenchidos.” (Ancião Athanásios)
26
definitivamente no caminho de nossa cura. Aquele que tomou nossa
natureza caída e a ergueu do abismo da morte e do pecado, nos deixou essa
lei divina.
27
O LAMENTO DE SÃO BASÍLIO, O
GRANDE
Os Santos são os frutos do Evangelho. Pequenos ícones de Cristo, os
Santos de nossa Igreja iluminam as trevas do mundo com o seu testemunho
(μαρτύριο). Cristo manifesta a Sua grandeza nos Seus Santos e a Igreja
Ortodoxa, lar destes homens e mulheres, atesta a Verdade de sua Fé através
da existência ininterrupta desses Santos. Portanto, devemos levar em
consideração cada uma de suas palavras.
“Chore por seu pecado: ele é uma doença espiritual; é a morte de sua alma
imortal; merece lágrimas e lamentos incessantes e intermináveis; deixe que
todas as lágrimas fluam por ele e que os suspiros brotem sem cessar das
profundezas de seu coração.
28
evidentes, grandes e pequenos, cometidos por palavras e ações, em
pensamento e intenção, dia e noite, a cada hora e minuto de minha vida.
Derramo lágrimas, mas que lágrimas posso encontrar para uma maneira
digna e adequada de chorar por todas as ações de minha vida malfadada;
por minha imensurável e profunda inutilidade? Como posso revelar e
expor, em toda a sua nudez, cada um de meus pecados, grandes e pequenos,
29
voluntários e involuntários, conscientes e inconscientes, evidentes e
encobertos, cada hora e minuto de pecado? Quando e onde devo começar
meu lamento penitencial que produzirá frutos adequados? Talvez em breve
eu tenha que enfrentar a última hora de minha vida; minha alma será
dolorosamente separada de meu corpo pecaminoso e vil; terei que me
apresentar diante de terríveis demônios e anjos radiantes, que me revelarão
e atormentarão com meus pecados; e eu, com medo e tremendo, estarei
despreparado e incapaz de dar-lhes uma resposta; a visão e o som dos
demônios que gritam, seu desejo violento e ousado de me arrastar para o
abismo sem fundo do inferno encherão minha alma de confusão e terror.
Então, os anjos de Deus levarão minha pobre alma para se apresentar diante
do temível tribunal de Deus. Como responderei ao Rei Imortal, ou como
ousarei, pecador que sou, olhar para o Meu Juiz? Ai de mim, que não tenho
uma boa resposta a dar, pois passei toda a minha vida na indolência e no
pecado, todas as minhas horas e minutos em pensamentos, desejos e
anseios vãos!
30
Quantas vezes, afetado pela beleza, alimentei minha mente, minha
imaginação e meu coração com sensações voluptuosas e satisfiz de forma
não natural os desejos da carne em fantasias! Quantas vezes minha língua
proferiu coisas vergonhosas, vulgares e blasfemas sobre os desejos da
carne!
Quantas vezes ansiei por poder e fui glutão, saciando-me com iguarias,
comidas e vinhos saborosos, variados e diversificados; por causa da
intemperança e da falta de autocontrole, quantas vezes fui saciado além do
ponto de saciedade, faltei com a sobriedade e me embriaguei, fui
intemperante na comida e na bebida e quebrei os jejuns sagrados!
Quantas vezes entrei na Casa de Deus sem temor e tremor, fiquei ali em
oração, frívolo e distraído, e saí de lá com o mesmo espírito e disposição!
E, na oração em casa, tenho sido igualmente frio e indiferente, orando
pouco, com preguiça e indolência, desatento e impiedoso, e até mesmo
omitindo completamente as orações designadas!
Meu Deus, meu Deus! Por que me abandonaste? Faça-se em mim segundo
a Tua vontade, Senhor! Se me concederes luz, que seja abençoado; se me
concederes trevas, que seja igualmente abençoado. Se me destruíres
juntamente com a minha iniquidade, glória ao Teu justo julgamento; e se
não me destruíres juntamente com a minha iniquidade, glória à Tua infinita
misericórdia!” (São Basílio, o Grande)
32
SÃO NICODEMOS DO MONTE
ATHOS E O SEU
"EXOMOLOGETARION"
Agora podemos dizer que, através de um certo esforço, estamos aptos a
identificar alguns dos pecados e paixões que nos escravizam: fomos
instruídos através das Escrituras e de nossos Santos. Neste ponto, portanto,
devemos aprender a assimilar essas informações e colocá-las a serviço de
nossa Confissão.
Para isso escolhemos seguir com São Nicodemos do Monte Athos e o seu
Exomologetarion. Neste livro, esse grande pai espiritual Ortodoxo trata de
diversos pontos práticos sobre o Mistério da Confissão. São apontamentos
preciosíssimos, que enriquecem o nosso entendimento sobre este Santo
Mistério e nos preparam corretamente para uma boa prática.
33
O Segundo, a ingratidão: o Deus que “que te amou antes dos séculos, não
por merecimento algum, mas apenas por causa de Sua bondade Ele decidiu
em Sua mente divina criar você, quando Ele poderia ter criado outros em
vez de você.” (p. 163). Ele lhe deu vida, vida verdadeira. Ele foi a Cruz por
você, Ele o tirou das trevas da não existência. E, mesmo assim, insistimos
em retribuir com indiferença, indolência, transgressão.
Sobre estes três pontos, São Nicodemos diz: “Ó meu irmão, se considerares
bem estas três lanças com que feriste Deus pelo pecado, estou certo de que
rugirás e rosnarás como um leão por causa dos teus suspiros (Sl. 37,8), e
odiarás e terás nojo do pecado, e o teu coração será quebrado em mil
pedaços, mesmo que seja calejado e duro como uma rocha, e você o fará
derramar lágrimas de sangue. Portanto, tanto quanto possível, concentre-se
e medite sobre esses três pontos”.
Sobre esse tópico, São Nicodemos diz que, após levarmos em conta o que o
pecado causa em nossa relação com Deus e como ofendemos a Ele por isso,
também devemos considerar quão prejudicial o pecado é para nós
pessoalmente. O santo continua dividindo esses malefícios em três pontos.
34
Segundo: o pecado faz com que você perca eternidade na presença de
Deus, na companhia dos Santos e da Santíssima Mãe de Deus. O homem
perde o Reino dos Céus, perde tudo que Deus preparou para os que O
amam e desejam a união com Ele. “Os pecados fizeram com que você
trocasse todas essas coisas boas por um prazer pequeno, amargo e
confuso.”
Terceiro: o homem perde o Paraíso, mas não fica de “mãos vazias”. Ele,
pelo pecado, recebe o inferno: “considere como os pecados fizeram com
que você ganhasse uma eternidade dos infinitos tormentos do inferno, em
que um único momento é, mesmo depois de milhares de anos, como a areia
do mar, ou como as estrelas do céu, ou como as gotas da chuva, ou como as
folhas das árvores, ou como os átomos no ar, e esse momento nunca, jamais
passará”.
“Considerando essas coisas por uma segunda razão, amado, seu coração
certamente será picado pela compunção e você adquirirá a aflição
mencionada acima, sofrendo por nenhuma outra razão a não ser pelo fato
de que, por causa de seus pecados, você sofreu uma perda infinita, um dano
que nem mesmo todos os reinos do mundo são dignos de recompensar na
menor medida. Ai de mim!”
A PRÁTICA E A PREPARAÇÃO
“Assim como você se sentaria e contaria seu dinheiro depois de uma certa
transação comercial, da mesma forma, vá a um lugar específico, meu
irmão, e duas ou três semanas antes de ir ao Pai Espiritual que você
encontrou – especialmente no início dos quatro períodos de jejum do ano –
sente-se nesse lugar de quietude e, inclinando a cabeça, examine sua
consciência. Considere também quantos pecados você cometeu em atos,
35
palavras e pensamentos, depois da última vez que se confessou, contando
os meses, as semanas e os dias. Lembre-se das pessoas com as quais pecou
e dos lugares onde pecaram, e reflita diligentemente sobre essas coisas a
fim de encontrar cada um de seus pecados. É assim que, por um lado, o
sábio Sirach aconselha dizendo: "antes do julgamento, examine a si
mesmo" (Sir. 18:20) e, por outro, Gregório, o Teólogo, diz: "examine a si
mesmo mais do que ao seu próximo. A conta das ações é superior à conta
do dinheiro. Pois o dinheiro está sujeito à corrupção, mas as ações
permanecem.”
2. A Confissão deve ser totalmente voluntária: ela não pode ser feita
mediante coação, hipocrisia, necessidade qualquer que não seja o
36
arrependimento e a urgência dos pecados serem absolvidos. Quem se
confessa age em posse de seu livre-arbítrio.
6. Não tenha vergonha ao confessar: essa vergonha que você sente por ter
pecado é lícita e desejável, desde que ela não impossibilite sua confissão
honesta. A vergonha que impede a Confissão é uma artimanha do demônio.
A vergonha que impulsiona a Confissão é a “vergonha que te liberta da
vergonha futura do temível dia do Julgamento”. O demônio inverte essa
ordem.
37
acaba suprimindo a absolvição dos outros pecados confessados naquele
momento, pois “você também acrescenta outro pecado a si mesmo, o de
sacrilégio, por causa dessa ocultação”.
38
CONCLUSÃO & APONTAMENTOS FINAIS
4. Não detalhe seus pecados carnais, ainda que pecados de ordem carnal
devam ser confessados pois escravizam a alma, afastam o homem de Deus
e necessitam de absolvição (homossexualismo, masturbação, adultério,
etc.). A menção do pecado e o arrependimento sincero é o suficiente neste
ponto. “Não entre em detalhes ao confessar atos carnais, para não se tornar
um traidor de si mesmo.” (São João Clímaco)
5. Cânones podem ou não ser aplicados pelo seu Pai Espiritual (ἐπιτιμία).
Aceite a medicina imposta, sem expectativas criadas por puro
sentimentalismo ou em comparação com a confissão de outros irmãos. A
saúde da relação pai-filho espiritual depende muito disso.
39
pode ser alimentada por um tipo específico de música, a luxúria por um
tipo de ambiente frequentado e assim por diante.
40
“A confissão deve ser sincera, profunda e completa.” (São João de
Kronstadt)
41
APÊNDICE
PALAVRAS DOS SANTOS E ANCIÃOS
“Na Confissão, tente ser específico. Não basta fazer uma lista de seus
pecados durante a confissão - por exemplo, "eu invejo, fico com raiva" etc.
Para receber ajuda, você precisa confessar suas falhas específicas. Ao
deixar de fazer uma confissão concreta/específica, a pessoa zomba de
Cristo. Se alguém não confessa a verdade ao seu pai espiritual, não revela
seu pecado a ele, para que o pai espiritual possa ajudá-lo, ele se prejudica
seriamente, como uma pessoa doente que prejudica sua saúde ao esconder a
doença do médico.” (São Paísios do Monte Athos)
42
"Se a serpente, o demônio, morde alguém secretamente, ele infecta essa
pessoa com o veneno do pecado. E se aquele que foi mordido se cala e não
faz penitência, e não quer confessar sua ferida (...) então seu irmão e seu
pai, que têm a palavra [da absolvição] que o curará, não pode ajudá-lo
adequadamente" (São Jerônimo)
“Os sacerdotes receberam um poder que Deus não concedeu nem aos anjos
nem aos arcanjos. Foi-lhes dito: ‘Tudo o que ligardes na terra será ligado
no céu; e tudo o que desligardes será desligado’. Os governantes temporais
têm, de fato, o poder de amarrar, mas só podem atar o corpo. Os sacerdotes,
por outro lado, podem ligar com um vínculo que pertence à própria alma e
transcende os próprios céus. Não lhes deu [Deus] todos os poderes do céu?
'A quem perdoardes os pecados', diz ele, 'ser-lhes-ão perdoados; a quem
retiverdes os pecados, ser-lhes-ão retidos'. Que poder maior existe do que
esse?” (São João Crisóstomo)
“Aqui está o que se deve ter cuidado em ter em mente: na Confissão, não se
deve procurar justificar a si mesmo. Alguém que durante a Confissão se
entrega à autojustificação não recebe consolo interno, não importa o quanto
ele possa pisar em sua consciência. As autojustificativas com as quais ele
se esconde durante a Confissão se tornam um fardo que repousa sobre sua
consciência.” (São Paísios do Monte Athos)
43
em que estamos conscientes de nossos pecados, precisamos confessá-los,
para não carregá-los conosco após a morte. Enquanto o homem estiver
vivo, há esperança de sua recuperação. Mas ainda não sabemos o que
acontecerá após a morte. Nossa saída deste mundo poderia ser comparada a
algo que agora se tornou concebível no plano material: uma massa, sujeita
a um impacto suficientemente poderoso, rompendo a esfera de gravidade
da Terra, pode, teoricamente, viajar eternamente a uma velocidade incrível
no espaço ilimitado do universo. Da mesma forma, penso que a alma
humana, após sua partida, será atraída ou para a alegria imensurável do
amor eterno ou para o sofrimento sem fim do estado oposto ao amor. Pois o
pecado, em sua essência, nada mais é do que a transgressão da lei do amor
divino. Se considerarmos esse amor em sua plenitude, nunca pareceremos
puros ao lado dele. Portanto, se o homem realmente deseja alcançar a
permanência imutável com Deus, ele deve se purificar, porque 'o Senhor é
puro'.” (São Sofrônio de Essex)
44