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Introdução
516 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
como já se salientou, por sua capacidade de absorção de mão-de-obra, mas
também pelas características populistas das políticas públicas. Como será
visto, o componente migratório é, portanto, elemento decisivo, particularmente
quando se observam os bairros populares do município. Neste sentido, além dos
condicionantes anteriores, constata-se também que, no processo migratório
envolvendo Paulínia, concorrem também, por via de regra, as redes sociais ou
de parentesco que terminam por incrementar ainda mais o fluxo para estas
áreas, podendo inclusive, reduzir a vulnerabilidade dos recém-chegados a
partir do incremento de seu capital social.
A análise de que se apresenta a continuação, além do uso dos censos
demográficos, como é a ótica deste livro, também se apropria de uma outra
pesquisa realizado em 1998, pelo Nepo, no município. Complementarmente aos
dados do IBGE, as informações obtidas do Levantamento Domiciliar Universal
de Demandas (LEDUD),1 permitirão melhor compreender as relações entre
crescimento e expansão da cidade, o efeito dos deslocamentos populacionais
e suas possíveis relações com as políticas públicas – uma “marca registrada”
do município – e as redes sociais.
Desta forma, este trabalho pretende realizar uma contribuição para o
conhecimento do processo de constituição do espaço urbano do município de
Paulínia, examinando três elementos fundamentais: a migração, suas relações
com as políticas públicas e as redes sociais. Espera-se com isso, não apenas
melhor compreender os meandros da formação de um município metropolitano
com características tão peculiares, mas também apresentar reflexões para
a continuidade da pesquisa maior da qual este estudo faz parte, particular-
mente sobre o papel e o significado da mobilidade intramunicipal e das redes
na expansão da cidade.
1
Esta pesquisa foi realizada com dois tipos de questionário: um aplicado a toda a população, e outro
aplicado a uma amostra representativa ao nível das RPGs. Este último contempla a maior parte das
questões qualitativas referentes ao processo migratório.
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cerca de 97% das rendas municipais eram provenientes da arrecadação do ICM
(imposto sobre circulação de mercadorias) da companhia.
Neste mesmo período, particularmente desde 1960, pequenas indústrias
familiares e de produção tradicional instalaram-se no município. Porém estas
empresas atendiam localmente, sem muita perspectiva de crescimento, devido
ao pequeno capital investido e ao mercado restrito do município. Já no fim da
década de 60, empresas modernas dos ramos de papel e papelão, material de
transporte e mineral não metálico foram instaladas no município, chegando a
utilizar 32% da mão-de-obra ativa nas atividades industriais.
Este crescimento ocorreu principalmente em decorrência da decisão de se
implantar a Replan no município de Paulínia. Neste período, o município foi tomado
por uma onda de otimismo e esperança de que haveria um aumento no número
de empregos e uma melhoria das condições de vida da população. Segundo
Covian (1976), Paulínia começa a se destacar como município nos primeiros cinco
anos da década de 70, período do milagre econômico, passando por um rápido
processo de diversificação da economia local. Essa diversificação ocorria a partir
do desenvolvimento do pólo petroquímico, o qual estava desvinculado da reali-
dade local, devido ao tipo de indústria instalada, às características da produção,
à tecnologia e à mão-de-obra empregadas, fazendo com que se formassem dois
tipos de comunidade distintas: a local e a do parque industrial emergente.
Por conseguinte, o novo município, ainda com características de vila,
teve de se adaptar a uma nova dinâmica e organizar-se como um município
urbano-industrial, exigindo, assim, a infra-estrutura requerida para esta rápida
transformação. Neste sentido, a atuação do governo federal foi fundamental,
já que o poder municipal não conseguiria arcar com toda a implementação
de infra-estrutura em um curto espaço de tempo.
A formação do parque industrial trouxe um grande fluxo migratório para o
município. Estes migrantes vinham em busca de trabalho e melhores condições
de vida; porém este contingente populacional não foi totalmente absorvido pelo
mercado local, por não atender à exigência requerida pelas indústrias locais,
que era de uma mão-de-obra especializada, já que esses migrantes vinham,
geralmente, do ambiente rural. Segundo os dados de 1986, da Prefeitura de
Paulínia, do total de trabalhadores das indústrias, 71,36% não residiam no
município, sendo que a Rhodia e a Replan eram as principais responsáveis
por essa atração de mão-de-obra externa. Este dado revela que Paulínia não
contava, entre a população, com o perfil de trabalhador exigido por essa em-
presas. No entanto, os dados de mobilidade pendular2 obtidos no LEDUD, em
2
Define-se como mobilidade pendular o movimento diário e rotineiro de pessoas que deixam o seu
município de residência para exercerem suas atividades (de trabalho ou estudo) em outra localidade.
O LEDUD capta essa informação para todos os residentes em Paulínia maiores de 10 anos, permitindo
ainda distinguir entre trabalho e estudo.
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seja maior que o de 1991-2000, o que pode indicar que o crescimento de-
mográfico do município, no final da década de 90, sofreu um incremento ainda
maior. De qualquer forma, os dados são indiscutíveis quanto à continuidade
do crescimento demográfico elevado do município.
Como será mostrado mais adiante, a dinâmica populacional de Paulínia
e seu ritmo de crescimento estão fortemente ligados aos fluxos migratórios
que se dirigem ao município, não apenas por suas condições para o mercado
de trabalho, mas também, pelos serviços públicos oferecidos. Este processo,
a despeito da grande geração de riqueza nestas áreas, implicou que a cidade
tivesse uma composição de estratos sociais muito concentradas na população
de baixa renda.
De fato, como se percebe na Tabela 2, mesmo apresentando percen-
tuais de população com baixa renda (sem rendimentos e ganhando até um
salário mínimo) muito próximos da RMC e do município-sede, percebe-se sua
condição de área de concentração da pobreza, pelo baixo percentual de chefes
de famílias com rendas mais elevadas.3
Tabela 2
Chefes de família, segundo categorias de renda per capita familiar
Paulínia, Campinas e Região Metropolitana, 2000
3
Vale lembrar que, no final dos anos 90, o município de Paulínia iniciou mudanças em seu zoneamento
de maneira a dificultar a instalação de população de baixa renda. Embora não se tenham dados
atualizados, basta circular pela cidade para observar que novos empreendimentos imobiliários para
os estratos de mais alta renda têm sido implantados.
4
Mesmo reconhecendo que essa classificação não é a mais adequada para expressar estratos
socioeconômicos, optou-se por recuperar esse indicador sintético disponível no questionário do
LEDUD simplesmente como indicação da estrutura socioeconômica da população de Paulínia.
Mapa 1
Distribuição dos chefes de família por renda per capita,
segundo Regiões de Planejamento e Gestão
Paulínia, 2000
5
Este mapa mostra as áreas urbanas residenciais, divididas nas regiões de Planejamento e Gestão
vigentes em 1998.
522 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
mostra a segregação territorial existente. Observa-se, por exemplo, que a
grande maioria dos chefes de famílias com rendimentos per capita maior
que dez salários mínimos residiam nas regiões centrais da cidade RPGs I e
II, enquanto aqueles de baixa renda (0 a 2 SM) encontravam-se nas áreas
mais periféricas.
6
Para maiores detalhes sobre esta questão, ver também o capítulo 12 deste livro.
7
Na verdade, embora seja verdadeiro que Campinas apresenta alguns comportamentos similares,
em termos migratórios, aos de outras regiões metropolitanas, neste caso é visível o menor peso da
migração intra-regional, o que se explica tanto pelas restrições de uso e ocupação no município-
sede como pelo papel das redes que contribuem para direcionar os movimentos originários externos
á região diretamente para as periferias. Para um discussão deste tipo, ver Cunha e Baeninger
(1994).
524 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
intrametropolitana era maior do que o apresentado nos anos 90, quando os
movimentos externos ganham importância relativa, fato que sugere que a
ampliação do espaço metropolitano coincide também com uma maior ampli-
tude dos espaços de migração na região.
No que se refere à imigração interestadual, vale a pena ressaltar que,
segundo a tendência regional, a procedência tem sido, em todos os períodos
considerados, Minas Gerais e Paraná. Contudo, foi do próprio estado de São
Paulo que veio a maior parte dos migrantes recebidos, o que reflete transfe-
rências significativas do interior e, principalmente, da RM de São Paulo.
Na verdade, essa maior importância de migração externa reflete uma
realidade regional que tende a diferenciar a região metropolitana de Campinas
daquelas mais consolidadas, como São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro,
nas quais o papel dos movimentos intra-regionais foi mais importante, em
detrimento do interestadual. Tal situação, provavelmente, poderia ser expli-
cada pelo fato de a Região de Campinas apresentar um grau de centralização,
com relação ao município central, muito inferior àquelas regiões, ou seja, a
migração de origem externa tende a concentrar-se menos na cidade central
que, por sua vez, não se configura como a única e principal porta de entrada
dos migrantes que se dirigem para a região.8
Se, por um lado, a própria morfologia dessa área metropolitana e a
localização das atividades industriais, induzida em grande medida por uma
importante via de transporte (Via Anhangüera), poderiam ajudar a entender
a reduzida primazia da cidade central, no que se refere aos movimentos
migratórios, por outro lado, não há dúvidas de que as maiores restrições
urbanísticas lá existentes também ajudariam a explicar o fenômeno.
Contudo, não restam dúvidas de que os atributos do município, em ter-
mos da renda gerada, das possibilidades de inserção produtiva e, por que não,
dos seus atrativos de ofertas habitacionais e serviços públicos apenas poten-
cializam a tendência a uma maior diversificação das origens da migração.9
Talvez uma característica revelada pela pesquisa LEDUD ajude a revelar
o papel de Paulínia no contexto metropolitano. Como se observa na Tabela
6, quase 65% dos chefes migrantes com menos de dez anos de residência
chegaram acompanhados de suas famílias, fossem elas completas ou não.
Na verdade, tal característica sugere, mais uma vez, o caráter peculiar de
8
Essa situação foi constatada no Projeto Metropolização e Transição Migratória: Impactos dos
Novos Padrões de Mobilidade Populacional nas Regiões Metropolitanas de São Paulo e Campinas,
cujo relatório está disponível no Nepo, embora não tenha sido publicado. Parte destas conclusões
encontram-se no estudo de Cunha e Baeninger (1994).
9
Na verdade, parte dos movimentos intra-regionais são derivados de movimentos interestaduais ou
intra-estaduais prévios. Os dados do LEDUD mostram, por exemplo, que, entre os primeiros, cerca
de 21% eram nativos dos outros estados. Esse fato não desqualifica a diferenciação dos movimentos
migratórios, já que se pode pensar que os intra-regionais seriam, em muito sentidos, diferentes
daqueles que chegam à região e rumam diretamente para Paulínia.
10
Para maiores detalhes,ver capítulo 12 deste livro.
526 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
análise,11 os dados levantados no LEDUD foram muito úteis para se avançar
sobre esta questão. Este ponto será tratado a seguir.
11
Para maiores detalhes sobre as potencialidades e limitações do censos demográficos para estudos
migatórios, ver Cunha (2005).
12
Seis regiões de planejamento de governo (RPG) compunham, no momento do levantamento
LEDUD, a divisão regional oficial utilizada pela Prefeitura Municipal de Paulínia. A amostra do censo
realizado foi representativa a este nível.
13
Deve-se considerar que o percentual considerável apresentado pelos naturais poderia estar
refletindo mudanças de residência em decorrência da fragmentação da família, em função de ciclos
vitais como casamento de filhos, entre outros.
528 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
de sua residência. Quando desagregados por condição migratória, os dados
são ainda mais contundentes: para aqueles com tempo de residência entre
cinco e dez anos, a questão habitacional respondia por mais de 58%, com
38% por compra ou construção; para os mais antigos, registrou-se uma cifra
semelhante ao total, muito embora 47% deles tenham declarado a compra
ou construção como principal motivo.
Tabela 8
Chefes de domicílio segundo condição de ocupação do domicílio
Paulínia, 1998
*
Exclui não declarados.
Fonte: Levantamento Domiciliar de Demanda – Prefeitura Municipal de Paulínia e Nepo/Unicamp.
14
O único desvio foi observado para os migrantes com tempo de residência entre cinco e dez anos,
cujo percentual de motivos ligados ao trabalho foi um pouco maior, 54%.
15
A “cidade legal” consiste na parte reconhecida e passível do olhar governamental e social, enquanto
a cidade real “não passa de uma referência longínqua e abstrata” de loteamentos e construções
ilegais, muitas vezes informalmente consentidos e até mesmo incentivados, localizados na periferia,
onde mora população que não tem condições de ter acesso à terra e à cidade. Estado e sociedade
criam estratégias para conviver com a ocultação da cidade real.
530 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
do ponto de vista do planejamento local, a comprovação dessa suspeita não
apenas ajudaria a entender os motivos do crescimento demográfico superior
à expansão da área urbana, mas também seria de importância ímpar para
se conhecer a real demanda habitacional no município. De fato, a pesquisa
mostrou que pelo menos 25%16 do total de domicílios particulares permanentes
da cidade pertenciam a essa categoria de construção.
Tendo em vista a dimensão deste fenômeno, pode-se entender um
pouco melhor o motivo da intensidade dos deslocamentos intramunicipais,
já que o setor imobiliário, até onde se sabe, tem tido pouca influência sobre
o processo de ocupação de Paulínia, que tem sido muito direcionado e con-
trolado pela ação pública.17 Além disso, poder-se-ia pensar que esse tipo de
estratégia, ao resolver, provisória ou definitivamente, a questão habitacional
de muitas famílias, acaba reduzindo o impacto desse défice de moradia sobre
a expansão da cidade.
Outro aspecto que colabora na compreensão do processo de ocupação e
expansão do município de Paulínia refere-se ao papel das redes sociais, que, se
não explicam, ao menos devem ser consideradas como fatores intervenientes
que ajudam a direcionar e aumentar o volume da migração.
A partir da decisão de migrar, o migrante procura lugares em que dis-
ponha de algum conhecimento, muitas vezes originário, de relações pessoais
e familiares, que funcionam como um ponto de apoio e assistência social e
financeira (BOYD, 1989).
[...] a grande maioria dos migrantes potenciais de longa distância [...]
selecionam informações dos seus chefes de família para as decisões
migratórias [...] das relações entre as pessoas dos membros da família e
suas redes inter-pessoais, e confiam nessas redes para sua assistência tanto
na movimentação como no estabelecimento em seu destino. Essa atividade
é reproduzida e estendida para suas próprias redes, especialmente para as
áreas de migração em que eles adquirem a possibilidade, e obrigação, de
fornecer informações e ajudar os potenciais migrantes. A partir de suas redes
pessoais, os migrantes potenciais desistem de considerar vários destinos
teoricamente disponíveis e concentram seus esforços naquelas poucas
localidades que possuem laços fortes [...] (TILLY, 1990).
16
Este dado apresentou problemas de interpretação no momento da coleta, podendo estar
subestimado.
17
Apenas recentemente, começaram a aparecer loteamentos para serem adquiridos sem construções
prévias.
18
Este, aliás, constitui um dos objetivos centrais do Projeto Vunerabilidade, do qual o presente livro
é um dos subprodutos.
532 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
através das quais a maioria da população migrante obtém o suporte necessário
para a estabilização dentro da nova cidade. Esta ajuda refere-se tanto a in-
dicação de emprego como de moradia, ou mesmo à apresentação do novo
morador à comunidade à qual irá pertencer.
Em seu estudo sobre a migração rural-urbana, Eunice Durham (1973)
argumenta que os migrantes partem de seu lugar de origem com uma
qualificação diferente da exigida no lugar de destino, dificultando, assim, sua
interação no sistema econômico industrial de uma grande cidade. Porém, a
partir do momento em que se constitui uma “tradição”, a migração funcionará
como válvula de escape para aliviar as “tensões características do próprio
funcionamento ‘normal’ da vida tradicional” (p. 125).
A primeira mostra da importância das redes sociais na constituição da
migração para Paulínia pode ser encontrada na avaliação do quesito do LEDUD
referente à informação prévia sobre a cidade. Questionados sobre como
souberam da existência de Paulínia, a grande maioria dos migrantes (76%)
respondeu ter obtido a informação de parentes ou amigos (Tabela 9), sendo
que um percentual parecido foi registrado considerando apenas a migração
mais recente (com menos de cinco anos de residência).
Tabela 9
Total de chefes de família não naturais de Paulínia, por tipo de informação,
segundo o local da primeira moradia
Paulínia, 1998
Considerações finais
534 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
Assim, além das tradicionais análises sobre o impacto da migração na
dinâmica demográfica e de sua natureza, os dados considerados também
foram úteis para ajudar a entender o processo de expansão da cidade a partir
da captação de elementos relativos à sua dinâmica redistributiva interna. Os
resultados para Paulínia mostraram, por exemplo, a importância dos desloca-
mentos internos no crescimento de certas áreas periféricas do município.
Além disso, esse estudo também apresentou bons indícios sobre o papel
das ações do poder público no processo de atração e fixação, tanto da popula-
ção migrante como da não migrante. Assim, mesmo que de maneira indireta,
pode-se mostrar a forte relação entre as ofertas habitacionais – propiciadas
por uma política dirigida para atender a população de baixa renda – e o pro-
cesso de ocupação e realocação da população na cidade.
Da mesma forma, os dados analisados permitiram uma reflexão sobre a
importância das redes sociais sobre o processo migratório que envolve Paulí-
nia. Os elementos levantados foram muito sugestivos, no sentido de mostrar
o impacto que tais redes parecem ter tido para se entender o crescimento
demográfico do município, sustentado ao longo de mais de 30 anos. Neste
particular, ainda que de maneira ainda muito preliminar, esta análise indica o
peso desta fonte de capital social sobre a fixação dos migrantes e, portanto,
da população de mais baixa renda no município.
Como subsídio para o projeto maior do qual este estudo faz parte, esta
incursão aos dados do LEDUD mostrou, por um lado, o potencial que a análise
do capital social tem para se entender não apenas o grau de vulnerabilidade
da população, mas, em particular, seu papel nos resultados do processo mi-
gratório. Por outro lado, deixou clara a importância que os processos intra-
municipais têm para o entendimento da dinâmica metropolitana observado
até agora, por conta das limitações dos dados normalmente disponíveis, em
geral, sob a ótica das dinâmicas municipais e intermunicipais.
Este tipo de olhar revelou o grande potencial analítico que, juntamente com
outros enfoques, como, por exemplo, o da vulnerabilidade social e o da segrega-
ção socioespacial, podem jogar novas luzes para o entendimento e, quem sabe,
até para o equacionamento dos problemas municipais e metropolitanos.
Como se disse, Paulínia constitui-se, em muitos sentidos, um exemplo
especial de município metropolitano, razão pela qual o conhecimento desta
realidade trouxe e continuará trazendo novos elementos para o complexo
mosaico que se delineia em uma região metropolitana que, embora com
grandes problemas, ainda apresenta dimensões manejáveis e, portanto, boas
possibilidades de melhoria das condições de vida de sua população.
Quanto ao sugerido no título deste ensaio, a tentativa de relacionar
migração com as redes sociais e políticas públicas, acredita-se que se logrou
um avanço. Considere-se este um bom começo.
536 MIGRAÇÃO, REDES SOCIAIS, POLÍTICAS PÚBLICAS E A OCUPAÇÃO DOS ESPAÇOS METROPOLITANOS PERIFÉRICOS
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