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É muita coisa. Além dos projectos, há coisas que fui guardando do meu
currículo, documentos, recortes dos jornais, fotografias... Muita coisa, que
está a ser classificada por uma senhora da fundação. Quero chegar ao fim e
saber quantos são os projectos. Alguns não foram concretizados, e outros não
passaram do estudo prévio. Estou-me a lembrar, por exemplo, de um
concurso para uma Pousada do Vinho do Porto na Régua, que ganhei, mas
não passou do papel. As pessoas que me estão a ajudar no levantamento, e
que já me tinham ajudado na publicação do livro [a monografia J. Carlos
Loureiro. Arquitecto, editada pela Caleidoscópio em 2012], dizem que serão
para aí umas 400 obras.
Eu era um modesto estudante - o tempo da guerra era difícil, e o meu pai deve
ter feito sacrifícios para me mandar estudar no Porto - e, a certa altura,
quando estava para casar, inscrevi-me na cooperativa O Problema da
Habitação. Fui pagando as quotas com uns dinheiritos que ganhava a
trabalhar umas horas nos ateliers e, passados quatro anos, a cooperativa
disse-me: "Você, se quiser, tem vez de construção". Comecei à procura de
terreno, e os meus sogros, que viviam numa quinta em Valbom, disseram-nos:
"Se quiserem, façam a casa aqui, num cantinho da quinta". Até nisso tive
sorte, que tenho aquela vista sobre o Douro. A quinta podia ser num buraco
em São Pedro da Cova...
Tem noção de que é o arquitecto que mais construiu na cidade do
Porto, numa dinastia que passa por Nasoni, Marques da Silva,
Arménio Losa?
Eu fiz muita coisa, de facto. Mas não terei essa qualidade. Houve
uma altura em que era, de facto, o arquitecto que tinha mais
trabalhos.
Isso aconteceu por que razão? Por exemplo, Álvaro Siza sempre
teve grande dificuldade em construir no Porto...
Não só. Estou a ver por trás de si fotografias do Instituto Superior da Maia
[ISMAI, 1995-2011]. Tem aí a imagem do hall, o grande espaço que criei para
os estudantes ficarem dentro da escola. Porque esse corredor, com essa luz,
não é um espaço anónimo. É um corredor que emociona as pessoas pela luz,
pelo desenvolvimento em curva, por uma certa subtileza que o espaço tem.
Sempre me preocupei com isso. E não foi só na habitação. Posso referir-lhe
outros edifícios. A minha atenção pelas pessoas é permanente.
Não sei. O projecto era uma encomenda da Associação Industrial [do Porto].
Cheguei a trabalhar com o Artur Andrade nesse projecto, muito pouco tempo,
mas não sei por que é que o projecto dele não foi para a frente.
Não lhe sei dizer. De facto, foi inovadora. É curioso que, alguns anos depois,
em 1959, um grande arquitecto e engenheiro italiano, Pier Luigi Nervi, fez em
Roma um pavilhão deste género.
Já na altura defendi que o pavilhão devia ser feito noutro sítio, mas são coisas
que nos ultrapassam. O Palácio de Cristal tinha tremendos problemas de
conservação, por ser uma estrutura em ferro. Estava a apodrecer. E as suas
dimensões tinham-se tornado escassas para o que se pretendia. Estas coisas
motivam sempre paixões e questões políticas. O belíssimo solar de Aviz, em
frente ao Café Aviz, também foi demolido para se fazer o Hotel Infante de
Sagres, mas ninguém fala nisso. E a Estação de S. Bento implicou a demolição
do Convento de S. Bento de Avé Maria. Só com o Palácio é que se continua a
fazer barulho.
São dois grandes arquitectos, com quem me dou muito bem. O Siza foi meu
aluno, o Souto de Moura já não. Na altura, o Siza era um aluno tímido, mas
começou a desabrochar e é, de facto, um grande arquitecto.
A arquitectura não pode ser nem para a fotografia, nem só para a satisfação do
ego de cada um. A arquitectura é um serviço.
Não gosto muito, devo confessar. É um pouco a mesma coisa que o Gehry.
Aquela forma, podem dizer-me que é simbólica. Mas por que raio é que um
edifício deve parecer-se com um diamante? Depois, tem coisas graves do
ponto de vista da segurança, como as escadas, onde já caíram pessoas. E não
sei como é que aquilo se vai comportar com o tempo.
Conheço mal. O que acho é que talvez não fosse preciso. É por isso que
estamos de tanga. Por que é que se gastaram ali não sei quantos milhões?
Ainda há dias vi na televisão o antigo Museu dos Coches, que até é bonito. Por
que é que vão mudar?...
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