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Valdir Verona: a essência da viola que se toca no sul do País

VIOLAO
Ano 3 - Número 23 - Julho 2017
www.violaomais.com.br

Alessandro
Penezzi
Ampliando horizontes

E mais:
Baixarias em tonalidades menores
Pulgar e Alzapúa no Flamenco
Iniciação ao toque sem apoio
Interfaces de áudio para home studio
A vihuela e seu repertório
Machete ou braguinha?
“Lamento Sertanejo” para você tocar

Gravação de CD: Conrado Paulino e Swami Jr. contam tudo


editorial
Seguindo para completar dois anos!
Logo estaremos completando dois anos no ar! É bastante coisa, não? Nosso compromisso,
aqui, é com você e com a música, com o violão e seus parentes de cordas dedilhadas.
Mas é mais, bem mais. É um compromisso com a verdade, com a qualidade e com a
honestidade. Por isso, esperamos que a revista esteja à altura de tão elevada missão.
Em nossa capa, o grande virtuose do violão instrumental brasileiro moderno: Alessandro
Penezzi, o garoto de Piracicaba, multi-instrumentista das cordas, apaixonado pelo violão,
pela música sem fronteiras, pelo encontro com outros músicos e influências. Nas nossas
páginas, ele conta um pouco dessa trajetória, que saiu de um virtuosismo erudito e foi
cair nos braços do choro moderno, com pitadas do flamenco e outros tantos ritmos. Em
Retrato, outro batalhador pela nossa música, com uma missão importantíssima: resgatar
a viola na música do sul do país. Valdir Verona é um craque na viola e no violão, mas não
só isso: é craque em pesquisar, em gravar, em passar o bastão para as novas gerações.
Nossa matéria Especial fala sobre o sonho do músico de gravar o seu projeto, mas que,
em geral, não tem a exata noção do trabalho que isso dá e dos cuidados que deve ter.
Por isso, chamamos os craques Conrado
Paulino e Swami Jr. Nossas colunas
estão de arrasar! Fizemos questão de
trazer de volta uma coluna de sucesso
na Violão+, o Flamenco, por meio de um
italiano brasileiríssimo, o violonista Diego
Salvetti. Bem-vindo ao time! No espaço
aos talentos que precisam de espaço,
Wellington Silva, nos trazmais do choro
moderno com seu 7 cordas. Tudo feito com
muito carinho, num compromisso com a
música boa, com os nossos instrumentos
e instrumentistas, com a verdade. E, antes
de tudo, com você.

Luis Stelzer
Editor-técnico

VIOLAO Ano 3 - N° 23 - Julho 2017


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Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus
autores. É permitida a reprodução dos conteúdos publicados aqui
Editor-técnico
Luis Stelzer
editor@violaomais.com.br

Colaboraram nesta edição


Dagma Eid, Diego Salvetti, Eduardo Padovan,
Fabio Miranda, Felipe Coelho, Luisa Fernanda
Hinojosa Streber, Reinaldo Garrido Russo, Ricardo
desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado Luccas, Samuca Muniz, Saulo Van der Ley, Valéria
para nossos arquivos. A revista não se responsabiliza pelo conteúdo Diniz e Thales Maestre
dos anúncios publicados.
índice

4 24
Você na V+ Alessandro
Penezzi
6
Em Pauta

67
Como Tocar

70
Filosofia

10 36 60 72
Especial Mundo De Ouvido Viola Caipira

18 38 64 74
Retrato História Sete Cordas Flamenco

44 81
Tecnologia Em Grupo

56 84
Siderurgia Coda

Publisher e jornalista responsável Foto de capa


Nilton Corazza (MTb 43.958) Kika Fragatte
publisher@violaomais.com.br
Publicidade/anúncios
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você na violão+

Duo Assad
Adorei a entrevista com o Duo Assad.
Saber que músicos desse gabarito
iniciaram de maneira tão curiosa nos
inspira a continuar buscando a perfeição.
Parabéns! (Gustavo Adorno, por e-mail)
Samuca Muniz
Parabéns! Melhor aula do Youtube.
Muito obrigado por estar nos ajudando.
(Nelson Lima, em nosso canal no
Youtube)
Boa Samuca! Sempre mandando ótimos
vídeos! (Felipe Agnoli, em nosso canal
no Youtube)
Legais as dicas...valeu! (Fernando
Petrauskas, em nosso canal no
Youtube)

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direito a entrevista e publicação de release e contato.

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4 • VIOLÃO+
você na violão+

NOVA GERAÇÃO
A nova geração do choro está se garantindo Rogério Caetano, Ulisses Rocha, Guinga
muito bem! O 7 cordas é uma febre. Que e Toninho Horta. Gilberto Gil, Toquinho,
continue assim! E há jovens já com muita Yamandu Costa, Mônica Salmaso, Fabiana
experiência. Violonista, educador musical, Cozza, Arthur Moreira Lima são alguns
compositor, arranjador e regente coral, dos artistas com quem já se apresentou,
Wellington Silva tem atuado em diversas em palcos como Sala São Paulo, Teatro
formações instrumentais, acompanhando Municipal, Memorial da América Latina,
cantores, além de seu trabalho como Biblioteca Nacional de Brasília, Teatro da
instrumentista solo. Obteve formação Aliança Francesa, Auditório Ibirapuera e
complementar com alguns dos grandes Museu da Casa Brasileira. Se percebe a
nomes do violão brasileiro, como Marco experiência na tocada segura e no timbre
Pereira, Mauricio Carrilho, Paulo Aragão, realmente bonito que tira do instrumento.

VIOLÃO+ • 5
EM PAUTA

FESTIVAL GIÁCOMO BARTOLONI


O festival em homenagem ao colaboradores da revista Violão+,
violonista, compositor e professor inclusive o editor. O evento acontece
Giácomo Bartoloni - que em 2017 no Teatro Maria de Lourdes Sekeff, no
completa 60 anos de idade e 40 de Campus Barra Funda do IA/UNESP,
carreira - oferece concertos, master- de 9 a 11 de agosto e tem entrada
classes, palestras e debates. Entre os franca. Mais informações podem ser
convidados, estarão presentes vários obtidas por e-mail.

© Mikhail Sergeev

6 • VIOLÃO+
EM PAUTA

Hereditariedade
O cantor, compositor e violonista paulista Chico Teixeira, acaba de lançar seu terceiro
álbum de estúdio, Saturno, uma homenagem ao irmão João Lavras, falecido em
2014. Chico Teixeira é dessa nova geração que vai “tocando em frente”, com estilo
próprio e qualidade musical, e que traz na origem a influência de seu pai, Renato
Teixeira. As parcerias de “Saturno” são enriquecidas pela participação especial de
João Carreiro, Roberta Campos, Irene Atienza e Carolina Delleva.

Seminário de Violão de Itajaí


A décima edição do Seminário de Violão irá reunir artistas de grande relevância
nacional entre os dias 27 e 30 de julho em Itajaí, Santa Catarina. Organizado
pela Associação de Violão da cidade, o evento irá oferecer ao público oficinas,
conversas, palestras, masterclasses e shows, com o objetivo de debater e
discutir sobre este tema no SESC Itajaí. Uma das atrações é o Duo Siqueira
Lima, de São Paulo. Além deles, estarão na cidade Felipe Coelho (Florianópolis/
SC), Edson Lopes (Tatuí/SP), Orlando Fraga (Curitiba/PR), Quarteto de Violões
de Blumenau (Blumenau/SC) e Ricardo Novais (Belo Horizonte/MG). Mais
informações sobre o evento podem ser obtidas aqui!
VIOLÃO+ • 7
EM PAUTA

Viola e Violão
em Terras de São Sebastião
Nesta aula-espetáculo Marcia Taborda apresenta uma
visão muito própria da trajetória da viola e do violão
na sociedade brasileira. A autora recua no tempo para
localizar os antepassados das nossas violas e chega até
os anos de 1950, abordando um percurso histórico que
se deu em um cenário absolutamente privilegiado: os
contornos da cidade do Rio de Janeiro. Estão presentes
os grandes violonistas, e claro, a arte que produziram
- as canções e os diferentes gêneros instrumentais de
nossa música. Para adquirir, clique aqui.

C O N C E R TO S
BRASILEIROS
A ACTC - Casa do Coração dá
continuidade à terceira edição da série
Concertos Brasileiros 2017 no dia 22
de agosto, quando recebe o violonista
Yamandu Costa. Com seu violão de
sete cordas em punho, o músico traz
uma nova formação, com Guto Wirtti no
baixolão e Ernesto Fagundes no bombo
leguero. A afinidade entre as cordas de
Yamandu e Guto pode ser constatada
no primeiro álbum da dupla, Bailongo.
Amigos de infância e confidentes
instrumentais desde sempre, os dois têm
forte influência latino-americana não só em suas composições, mas na maneira
de tocar. Já Fagundes tem dividido o palco com Yamandu em apresentações com
orquestras no Brasil e no exterior, dando ritmo ao “Concerto Fronteira”. O show
vai reunir canções da parceria entre Yamandu e Guto, além de composições
individuais, relembrando tangos, milongas e choros, entre outros estilos. Trata-
se de uma homenagem aos bailes brasileiros, principalmente os do sul do Brasil,
terra natal dos três guris. A apresentação ocorre no Teatro CETIP, em São Paulo,
e os ingressos já estão à venda. A renda obtida na bilheteria será integralmente
destinada a subsidiar parte das despesas da associação.

8 • VIOLÃO+
EM PAUTA

Clube do Choro
De homenagens a compositores como Anacleto de Medeiros, Chiquinha Gonzaga e
Ernesto Nazareth a obras autorais, o Sesc Ipiranga abriga, durante o mês de julho, o
chorinho, estilo genuinamente brasileiro, em apresentações gratuitas. O festival se
encerra no dia 21 de julho, com a dupla Alexandre Ribeiro (clarinete) e Swami Jr.
(violão), dois dos músicos mais requisitados da música instrumental brasileira, que
levarão ao público um repertório de celebração ao choro, com canções de autores
como Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth, além de composições próprias. Mais
informações podem ser obtidas aqui!

Festival de Violão Fito


O município de Osasco irá receber em julho o Festival de Violão, que contará com
o XII Concurso de Violão do Conservatório Villa-Lobos da Fito (Fundação Instituto
Tecnológico de Osasco), aberto para escolas de música e professores particulares.
Será realizada uma única prova para todos os participantes no dia 29 de julho a
partir das 10 horas na Sala de Recitais Edna Baldassi do Conservatório, no Jardim
das Flores, Osasco. Ao final da disputa, haverá distribuição de prêmios, dentre eles,
medalhas, certificados e participação em um recital. Além do XII Concurso, o evento
terá outras atrações para os convidados, como palestras, workshops e concertos. A
inscrição deverá ser realizada por e-mail após preenchimento da ficha disponível no
site, impreterivelmente até o dia 22 de julho de 2017.
VIOLÃO+ • 9
Especial Por Luis Stelzer

A gravação de um
CD, passo a passo
Um sonho comum à grande maioria dos músicos
é o de registrar o seu trabalho em uma gravação
de qualidade, de preferência, que possa ser
comercializada. Sabe-se, também, que o custo para
tudo isso não é brincadeira, embora, atualmente,
os home studios conseguem resultados bem
interessantes. Mesmo assim, existe uma série de
passos que, muitas vezes, nem passam pela cabeça
do instrumentista, independentemente de o trabalho
ser autoral ou não. Para elucidar uma parte destas
questões, entramos em contato com dois feras,
envolvidos atualmente num projeto de gravação
de CD: Conrado Paulino e Swami Jr, um como
instrumentista, e outro nos bastidores, produzindo.
Os dois toparam a ideia de fazer um bate-papo
sobre esse processo, seus caminhos e percalços,
logicamente, no calor do trabalho que estão realizando
agora, o álbum A canção brasileira. E, justamente
por ser no meio de uma grande crise, fica mais
interessante ainda ver quais os caminhos, estratégias,
para conseguir esse feito.

Swami – Estamos aqui, já no quarto Esse convite foi muito bacana. Eu já


dia de gravação! O Conrado me conhecia o Conrado de outros carnavais
chamou para fazer esse trabalho por e gostava muito do trabalho dele. Então,
me conhecer, da experiência que tenho basicamente, é isso: estamos cuidando
com o instrumento, por ser violonista do som, microfonação, os prés, posição
também, por ter produzido nomes como na sala. Os arranjos são bem legais,
o Marco Pereira e outros. Então, me com coisas violonísticas muito bem
chamou para ajudá-lo nesta aventura. elaboradas... Estamos aqui, neste
Viemos aqui para a Gargolândia, um artesanato, neste trabalho paciente de
estúdio na fazenda do Rafael Altério, captar todo o material para termos uma
que tem grande qualidade. Estamos coisa bonita, que vamos finalizar em
quase terminando a fase de gravação. São Paulo.
10 • VIOLÃO+
especial

Conrado Paulino

VIOLÃO+ • 11
Especial
Como é esse negócio de escolher o violonista, o violão, o tipo de
microfones, ter ficar em algum repertório, enfim... Aqui, no estúdio do
lugar específico da sala, um lugar Garga (Rafael Altério), que já conheço
que funciona melhor e outro pior, melhor, pensei na sala grande, com um
as pessoas em geral tem muita posicionamento que eliminasse algumas
dificuldade de entender isso. Você reflexões do som não desejadas,
pode nos explicar como é isso, no porque há uma sala de bateria com
que isso influencia na gravação? vidro ali. E fechei um pouquinho com
Swami – Essa questão dos microfones, os biombos. Gosto de fechar com eles
principalmente no trabalho com violão porque a sala é realmente grande e
solo, é muito importante. É claro que você tem, às vezes, uns sons de sala
depende muito do projeto, do violonista um pouco indesejáveis. Testamos várias
que está tocando, das características possibilidades. Eu adoro os DPAs 4011,
do instrumentista e do instrumento, tipo que são microfones maravilhosos para
de violão, enfim, várias coisas. Não violão, que já usei em vários discos do
existe um preset básico, aliás, não gosto Marco Pereira. Não é exatamente o
nada de formatos. A gravação é uma que uso sempre, mas é uma coisa que
história que depende da sala. O tipo de funciona muito bem. No caso, usamos
sala em que você está interfere muito, os DPAs em XY com o Millennia, um
assim como todos esses parâmetros, pré de que gosto bastante, macio...

12 • VIOLÃO+
especial

Também testamos com os KMs, usamos bancar o sou trabalho. Antigamente,


até em uma música, o que também é existia uma gravadora. Na época de
uma possibilidade. Acabamos optando ouro da música instrumental brasileira,
pelo DPA, um microfone muito veloz a gravadora bancava toda a produção
que tem uma transparência bem legal. e lançava com certo destaque. Eu
Para o que o Conrado ia fazer, funcionamesmo comprava vinil de gente boa pra
muito bem. Então, é por aí: posição da caramba...mas tudo isso acabou. Quem
sala, saber o quanto fechar e o quanto tem grana, consegue se bancar. Há
abrir, características do violonista e do
uma pequena parcela de pessoas que
violão que está usando, às vezes um consegue recursos por meio de editais,
instrumento de som um pouco mais Funarte, Proac, mas são poucas as
brilhante ou um pouco mais escuro, opções e é difícil conseguir. É preciso
tudo isso conta muito. É legal ter tudoescrever muito bem o projeto, passar por
isso para escolher, mas não existe um comissões... e agora estão diminuindo
preset que vá funcionar sempre. muito esses projetos, está mais difícil
ainda. Tentei algumas vezes esses
Conrado, como foi feita a captação editais e não consegui. Muitos colegas,
de recursos para o CD? da pesada, também não conseguiram.
Conrado – Vamos falar do crowdfunding. Então, minha única saída era fazer o já
A gente sabe que não há muitas famoso crowdfunding. No meu caso, fiz
alternativas para o artista conseguir pela Kikante. Existe também a Catarse,
VIOLÃO+ • 13
Especial
que faz o mesmo serviço. menor, mesmo assim tem que fazer o
E há muitas opções de financiamento? projeto, ou devolver o dinheiro para
Conrado - Me arrependi de ter feito a todos os que contribuíram, um por um.
opção de financiamento flexível. Há o E tem mais: a empresa fica com uma
flexível e o Tudo ou Nada. No Tudo ou boa porcentagem do valor que você
Nada, você tem um mês para captar arrecadou, no meu caso, mais de 17%.
exatamente o que você pretende: se Na outra modalidade, a porcentagem é
você falar R$ 30 mil, tem que ser R$ 30 bem menor, também, algo em torno de
mil ou um pouco mais. Mas se capta R$ 12%.
19.200, não dá. O projeto é cancelado
e o site devolve o dinheiro para a Então, você recomenda a modalidade
pessoa. O meu raciocínio inicial foi que “Tudo ou Nada”?
um mês seria muito pouco tempo. Na Conrado - Eu recomendo. O risco é
outra forma, que foi a que fiz, tem dois bem menor, se dá errado, não acontece
meses. Acontece que, quando só se nada, a exposição também é menor, um
tem um mês, você corre, as pessoas mês, só. O prazo ser curto ajuda todo
entendem que é para já e logo se mundo, pressiona mais o público que
decidem se contribuem ou não. Com pode colaborar e pressiona o artista a se
dois meses, você relaxa, as pessoas mexer. Eu acho melhor. Como optei pelo
relaxam. E, se você consegue um valor flexível, fui parcialmente bem sucedido,

14 • VIOLÃO+
especial
consegui levantar dinheiro suficiente
para tocar o projeto, mas longe do
valor que eu tinha pedido, que previa
originalmente vídeo, capa do CD mais
trabalhada. Como entrou bem menos
dinheiro que o previsto, o orçamento
ficou bem apertado. Como ainda está
em processo, é bem provável que eu
tenha que completar com dinheiro do
meu bolso. O que consegui levantar
não vai pagar todos os custos, tenho
certeza.

Na sua pesquisa antes de contratar, as


diferenças entre os sites de crowdfunding
era muito grande?
Conrado - Basicamente, valores muito
próximos. Algumas pessoas que
conheciam mais o assunto, por já terem
usado, me recomendaram a que escolhi.
Mas parece que elas se assemelham.

E a preparação para gravar o CD?


Como foi?
Conrado - Foi meio estranha, falei com de erro razoável, só que, no concerto,
o Swami a respeito disso. Fiquei meio prevalece a musicalidade, a expressão,
perdido, para falar a verdade. Porque a comunicação com o público. Saem
sempre gravei os discos lentamente, erros que as pessoas nem percebem.
até pela falta de grana para fazer de Agora, na gravação, qualquer errinho
uma vez, e também para ir encaixando que passaria ao vivo, fica algo gritante.
na programação do estúdio e dos E o violão é muito ingrato. A chance
músicos. CD de violão solo, gravava de você esbarrar numa corda que está
duas músicas em cada sessão. Cada soando, não apertar direito, é muito
sessão tinha pelo menos uma semana. grande. Especialmente para um cara
Eu gravava, teoricamente, toda sexta- como eu, que não fiz escola erudita e
feira, mas muitas vezes o estúdio sou de uma geração mais velha. Estava
desmarcava. Tinha muito mais tempo falando com o Swami sobre os músicos
para me preparar e eu focava apenas mais novos, que conseguem ter a
em duas músicas por vez. Desta vez, técnica do erudito, som limpo, projeção
tive que tocar 12 músicas em quatro de som legal e suingue, musicalidade.
dias! Tocar 12 músicas em um concerto Temos vários exemplos hoje no Brasil
é uma coisa, você tem uma margem de uma moçada que eu acho ótima, que
VIOLÃO+ • 15
Especial
adoro. Da minha geração, é mais difícil. estar pronta. Mas é um projeto que já
Foi um desafio gravar tantas músicas estava muito concebido musicalmente
em tão pouco tempo. O conselho que por ele. Eu só estou aqui para fazer o
eu dou é que a pessoa se prepare barco andar, cuidar da parte técnica,
muito, estude demais, chegue com tudo garantir um bom som, qualidade, dirigir
pronto, não existe mais essa de fazer a as seções de gravação. Esse é o papel
coisa acontecer no estúdio! do produtor, na minha opinião.
Conrado – O que o Swami diz em
Swami, Até onde vai o seu trabalho relação à produção é verdade. Eu já
de produção? Você acompanha todas tinha as músicas escolhidas, os arranjos
as etapas? feitos. Mas o que eu mais queria na
Swami – No trabalho com o Conrado, presença dele era justamente o lado
não tive trabalho de direção musical. O musical, de um cara que toca bem.
Conrado tinha os arranjos todos prontos, Ele reúne as condições ideais: toca
dei só alguns palpites, mas os arranjos muito bem, conhece a praia de música
são dele. O repertório também foi ele brasileira, tem a linguagem, tem o bom
quem escolheu, eu só estou fazendo a gosto também. Eu poderia pegar um
coisa acontecer, a parte de produção, que cara muito bom, mas tradicionalista, ou
é acompanhar tudo, gravação, depois muito moderno, mas o Swami era o cara
edição, mixagem, até o final da master mais indicado. As dicas que ele deu de

16 • VIOLÃO+
especial
direção musical, fraseado, ralentando,
andamento, dinâmica, foram muito
legais, funcionaram muito. Ou seja, não
era somente a parte técnica, a parte
musical também me ajudou muito. E era
justamente o que eu queria: alguém que
fale a verdade, critique o que não está
bom, que ajude a chegar no ideal, que
olhe de fora e traga uma contribuição.
Quando a gente grava, acaba ficando
meio sem referências, achando tudo
ruim. Depois, acaba gostando. No meu
CD anterior de solos de violão, fiz sem
produtor, e foi bem mais difícil. Tem que
ter um produtor! Se o Marco Pereira,
que é um monstro no violão, chama o
Swami para produzir, como que eu vou
querer fazer sozinho? E gostei muito
do que ele me disse. Realmente, eu já
estava com tudo pronto, repertório e
arranjos definidos. Mas ele me ajudou
demais.

Então, a direção musical do Swami


foi decisiva, também! muita coisa. Um cara como o Swami
Conrado – Claro! Some isso com as tem muita experiência. Em outras vezes
questões técnicas: ele sabe muito sobre que gravei, obedeci rigorosamente o
os microfones, colocação, utilização, que o técnico de som queria. Tem cara
que tipo de som vai ficar e, como ele que é dono do processo todo, sabe tudo
mesmo disse, não há um padrão, tem e exige do jeito que ele quer. Eu não
uma série de ideias do cara que fazem tenho esse conhecimento. O produtor
parte da experiência dele. A vantagem é exatamente para isso. O meu CD, se
do Swami é que, além dele conhecer os chama A canção brasileira. A diferença
microfones, as posições e tudo mais, entre esse e o outro que já gravei, é
ainda por cima conhece os estúdios, que esse está mais comportado, tem
sabe qual sala fica melhor e em que menos improviso. Improvisei neste
lugar da sala fica melhor. Isso faz também, mas bem menos. Este CD
muita diferença. Resumindo: tem que está mais próximo do erudito, embora
ter um produtor, e um bom! A maioria eu não tenha essa técnica, mas pela
dos músicos não tem o conhecimento coisa mais fechada, mais certinha,
necessário dos sistemas de gravação, menos improvisada. Deve ser porque
microfones, posicionamentos, prés, é estou ficando velho (risos).
VIOLÃO+ • 17
RETRATO Por Luis Stelzer

A viola no sul
do País
Com suas gravações, shows, aulas e métodos, Valdir
Verona vai passando para alunos e mais alunos, violeiros
e mais violeiros, a essência da viola que se toca no sul

A viola, diz Valdir Verona, chegou ao sul a maioria de violão. Isso acabou me
do País antes do acordeon, ou gaita, influenciando, eu ficava olhando o que
como se chama por lá. Aos poucos, faziam e tentava imitar. Depois passei
o fole tomou o lugar como principal a estudar com os primeiros métodos. O
instrumento da região. O violão, como primeiro, se não me engano, do Canhoto
sempre, tem seu espaço garantido, (Américo Jacomino), onde aprendi os
como em todo o País. De uns tempos primeiros acordes. Também apareceu
para cá, a viola começou um caminho um daqueles métodos que o meu irmão
muito interessante, resgatando um comprou por correspondência, que
espaço que parecia irremediavelmente vinha com um disquinho gravado e um
perdido. Seu estudo está mais manual de ritmos.
sistemático, atingindo conservatórios
e até universidades. Aqui, um pouco Nesse começo quais foram as
da história desse pesquisador, que primeiras referências de músicos,
transmite e resgata a essência da viola. além do pessoal que você ouvia
tocar e cantar? Algum violonista
Como você iniciou na música? em especial, que tenha chamado
Como aconteceu o fato de você se atenção?
desenvolver tanto como violonista Os violonistas que me influenciaram
quanto como violeiro? vieram depois, eu não conheci na época,
Comecei no lugar em que nasci, no interior só mais tarde, quando fui realmente
de Caxias, esses lugares afastados estudar violão. Como a gente ouvia
do mundo. Na verdade, mais perto de muito rádio de pilha, principalmente
Gramado e Canela do que de Caxias, à noite, o que chegava para nós era
um lugar bastante bonito, interessante, a música mais do Centro do País, as
mas que não tinha nem luz elétrica. duplas caipiras. Lembro, e cito como
Comecei pelo violão. Lembro que lá referência até hoje, de Rolando Boldrin
tinha muitos tocadores de violão e viola, a Tião Carreiro.
18 • VIOLÃO+
RETRATO

Valdir Verona

© Marcelo Ribeiro

VIOLÃO+ • 19
RETRATO

© Mazzochi Fotografias
Como é essa história de você e Villa-Lobos. Alguma coisa de Bach
começar num lugar muito simples, também. Toda essa bagagem acaba
ir avançando, até chegar a ser uma fazendo parte da minha história antes
referência no violão e na viola no sul da viola. Também estudei harmonia
do País e até no país inteiro? e improvisação, com estudos mais
Na década de 1980, nossa família saiu voltados para a MPB. Na década de
do interior e veio morar na cidade. Eu 1990, lá para 1994, 1995, estava
passei a estudar música em 1987, trinta preparando o meu primeiro disco solo.
anos atrás. Primeiramente, acabei Um dia, encontrei uma viola numa loja
conhecendo um movimento que já e, por uma questão de memória do que
estava acontecendo no Rio Grande do já tinha ouvido na infância, comecei
Sul, mais próximo à fronteira e também a tocar. Aquilo me chamou atenção:
na capital, chamado movimento estava querendo colocar algum som
nativista, que acabou me influenciando diferente no disco, então comprei a
bastante. Em seguida passei a estudar viola, e a primeira composição para
violão erudito, todos aqueles grandes esse instrumento, “Grotas”, saiu
nomes, Sor, Carcassi... Também logo. O nome é uma homenagem ao
gostava muito de peças brasileiras, de lugar em que nasci, cheio de serras e
Paulinho Nogueira, João Pernambuco montanhas. Nessa época, o trabalho
20 • VIOLÃO+
RETRATO
do Almir Sater estava aparecendo. outras. Fundamos a Teclas e Cordas,
Também conheci o trabalho do Tavinho da qual fui sócio durante 15 anos. Lá,
Moura, com harmonia sofisticada. formamos o Ária Trio. Participei do
Mas era para a viola ser o segundo primeiro CD, que era dos professores
instrumento. Em 1998, fui para Curitiba da escola. Atualmente trabalho com
fazer uma oficina de música com o aulas e oficinas particulares.
Roberto Correia, que foi fundamental.
A partir daí, decidi que iria batalhar Fale um pouco sobre a sua discografia,
pelo resgate da música do Rio Grande CDs, DVDs, seus métodos, tanto para
do Sul com o instrumento, trabalhando violão como para viola.
nossos ritmos. A viola chegou aqui no São quatro trabalhos solo: o primeiro
Rio Grande do Sul bem antes que o foi Acordes ao vento, na fase em que
acordeon - aqui, mais conhecido como eu era mais violonista, mas já gravei
gaita -, o instrumento mais tocado no a faixa “Grotas”, minha primeira
Sul. Hoje, tem muito violonista também, composição para viola. As demais são
mas violeiro tem pouco, embora esteja várias peças que registrei com um
melhorando. Aí, voltei bem decidido a único violão, algumas com dois violões,
mexer com isso, ajudar a ampliar esse gravando o próprio acompanhamento.
mapa do Brasil violeiro, até então um Gravei minhas primeiras composições
pouco desconhecido, de trabalhos com e regravei um estudo do Fernando Sor e
a viola na música do Sul. um prelúdio do Villa-Lobos. Depois veio
o Tons da Terra, um CD misto, de viola e
E o Valdir Verona professor? Você violão. Saiu cinco anos depois, lá pelos
gravou bastante com colegas seus anos 2000. É um CD de transição. Só fui
de escolas da música. Como se deu a gravar de novo dez anos depois, o CD
sua passagem para o lado do ensino? Uma viola ao Sul, quando decidi voltar
Esse processo de ensino musical também a cantar. Canto desde criança,
aconteceu bem rápido. Quando comecei mas tinha dado prioridade à música
a estudar música, já tocava há oito instrumental. Em 2013, lancei o CD Na
anos. O aprendizado foi bem rápido, estrada. Nesses dois últimos, a viola já
eu procurava associar principalmente a é o instrumento de frente. Além desses
teoria musical com aquilo que já estava
fazendo. O entendimento foi bem rápido.
Comecei a estudar em 1987, e, em 1989,
comecei a dar algumas aulas, mais à
noite, sábados pela manhã. Em 1990,
larguei minha outra profissão e passei a
trabalhar exclusivamente com música,
mais aulas do que apresentações.
© Tatieli Sperry

Depois esse processo se inverteu.


Comecei trabalhando na escola em que
estudava, depois trabalhei em várias
VIOLÃO+ • 21
RETRATO
CDs solo, tenho outros em parceria. Um tanto de estrada nessa área da música
em parceria com o acordeonista Rafael do Sul. Então, o primeiro trabalho que
de Boni, juntando os dois instrumentos saiu, embora eu já estivesse focado na
do Sul. A viola, que chegou antes, nos viola, foi para violão, de que eu tinha
primórdios da formação do Estado, uma quantidade maior de alunos. Eles
com o acordeon, que talvez seja o foram me ajudando a desenvolver,
maior símbolo da música gaúcha. No foram revisores naturais. Compus uma
duo, a gente procura fazer música série de estudos chamada “14 Estudos
contemporânea baseada em ritmos do para violão campeiro”. Seriam 12, mas
Sul, não só do Rio Grande do Sul, mas da quando estava para terminar, percebi que
região do sul da América. Por estarmos faltava um ritmo chamado Bugio, muito
próximos das fronteiras com Argentina e característico do acordeon, e acabei
Uruguai, a gente trabalha músicas dessa fazendo mais dois estudos. Esse método
região. O duo já produziu dois CDs e um deu um resultado imediato: até hoje são
DVD. Também gravei com o Ária Trio, as minhas peças mais tocadas. Tem
montado na Teclas e Cordas, lançado muita gente tocando, o que comprova
em 2009, onde toquei viola e violão, a necessidade que a gente tinha de ter
justamente os dois cursos em que eu material nessa área. Automaticamente,
trabalhava na escola. Também lancei, fui cobrado para criar um outro método,
recentemente, o CD O violeiro e o poeta. com as levadas de mão direita. Surgiu
Participei de muitos festivais de poesia um livro com material específico de
aqui no Rio Grande do Sul, ganhando levadas de mão direita, mas eu não
alguns prêmios como melhor trilha de queria que só ficasse na mão direita,
fundo. Num desses festivais, conheci um mas que contasse também a história de
poeta da região sul do Estado, Juarez cada ritmo. Esse método, infelizmente,
Machado de Farias. Fizemos esse CD está esgotado. Acabei criando uma
em parceria, juntando música e poesia. versão mais prática, chamada “Ritmos
Quando voltei de Curitiba, onde tinha feito campeiros do Rio Grande do Sul”.
a oficina com o Roberto Correia, achei Estou devendo muita coisa para a viola
muito interessante a forma com que ele em matéria de produção de materiais,
abordava os assuntos, e eu tinha já um mas criei a versão para viola dessas
levadas na viola de dez cordas. Então,
saiu o livro “Ritmos campeiros do Rio
Grande do Sul – Viola Brasileira”. São
doze temas do folclore gaúcho e a gente
gravou em duas partes para reforçar a
parte didática. É muito importante ter
a música de referência. A levada pode
ser similar em outra cultura musical.
© Tatieli Sperry

Portanto, se você não dá uma ideia


melódica nem harmônica, pode não ter
o entendimento total da coisa. A levada
22 • VIOLÃO+
RETRATO
de mão direita é apenas uma parte de
um gênero musical.

Temos reparado na evolução da escola


da viola caipira. Até há pouquíssimo
tempo, não encontrávamos métodos
com o cuidado e o aprofundamento
como já temos há mais de um século
no violão. O que você acha disso?
Concorda que está havendo uma
evolução ou, por outro lado, pode
estar se perdendo um pouco da
tradição, do passar de pai para filho,
de violeiro para violeiro. Como vê
a modernização da escola da viola
caipira no Brasil?
Eu vejo isso de maneira muito positiva. Os
autores dos novos métodos foram muito
felizes em manter um pé na parte formal,
de como desenvolver uma metodologia
própria para o instrumento, a exemplo do
que já existe, como você disse, há muito
tempo no violão. Eu citaria os professores E sobre seus projetos?
Roberto Correia, o Ivan Vilela, também Estou trabalhando num projeto, o viola
outros que vieram depois deles, como de 9 cordas. Acabei criando, junto
pessoas que têm essa visão de trabalhar com um luthier da cidade, uma viola
para que a viola seja estudada de diferente. Se a gente olhar as violas
maneira mais formal, mas trazendo com brasileiras, as nordestinas têm várias
isso todo o contexto histórico, a questão cordas simples e têm até uma tripla.
da cultura popular onde ela é inserida. Na viola de fandango, do Paraná, são
Isso é muito importante. Eles não são várias cordas simples, uma dupla e
apenas professores, são pesquisadores outra só em cima do tampo, chamada
também. Acredito que a viola está sendo de cantadeira ou periquita. Outro dia
estudada, mas também está sendo peguei um violão de 12 cordas e tirei
pesquisada para que certas culturas se 3. Para mim era muita corda num
mantenham. Acho que quem começou instrumento só, o braço era muito estreito
esse processo de ensino já se preocupou e eu não conseguia tocar direito. Tirei
com isso. Vejo o violeiro, hoje, pelo as duas que são repetidas, as duas
menos boa parte deles, consciente da primeiras, e retirei a corda oitavada da
responsabilidade que é mexer com esse 6a. ordem. Deu um resultado do qual
instrumento, que tem uma história muito gostei muito. Estou trabalhando neste
bonita no país. projeto, chamado “Viola de 9”.
VIOLÃO+ • 23
matéria de capa

Alessandro Penezzi
Por Luis Stelzer

Ampliando
horizontes
Um dos maiores violonistas
do Brasil e do mundo, que
não perdeu sua simpatia, sua
simplicidade e seu sotaque do
interior - nem seu infinito talento
- fala sobre a carreira e os
projetos mais que ecléticos
matéria de capa

A primeira vez em que a gente encontra vazio, pouquíssima gente. O dono tinha
um talento fica marcada, por mais razão: teríamos prejuízo naquela noite,
estranha que seja. Uma vez, fui tocar num o que ganharíamos nem pagaria a
barzinho maravilhoso em Piracicaba, viagem. Mas tocamos. O grande lucro
cidade na qual toquei muito nos anos da noite estava lá, quietinho, assistindo
1990, quando fazia parte de um trio de a tudo. Antes da nossa terceira e última
música flamenca (que depois virou duo). entrada, o dono do bar pediu para eu dar
Era um show de MPB, voz e violão, com espaço a um jovem garoto, que estava
Selma Buso, cantora que acompanhei arrebentando no violão naquela época.
muito nessa época. Embora o dono do Seu nome era Alessandro. Deixei, claro.
bar tenha insistido em fazer esse show Pois o rapaz pegou e “comeu” o violão,
numa segunda-feira – segundo ele, o dia ficou mais de uma hora tocando. Albeniz,
mais “forte”, por conta do movimento, Barrios, Villa-Lobos, Paco de Lucía,
com alunos das universidades – insisti João Pernambuco, todos passaram ali,
para que fosse num sábado. E lá fomos um atrás do outro, quase sem respirar.
nós, uma trupe com dois carros, até Fiquei sem palavras. Foi difícil fazer a
Piracicaba. Encontramos o bar quase última entrada. O som do garoto estava
26 • VIOLÃO+
matéria de capa
na minha orelha, na minha mente. Nunca Eu tinha um padrinho, o dr. Paulo, que
conversei com ele, depois, sobre isso. ajudava a gente, éramos pobres. Ele me
Nem sei se ele se lembra daquela noite. incentivou muito, comentou com minha
Agora o entrevisto, vinte anos depois. É mãe: tem que colocar ele para estudar
um violonista conhecido, um dos maiores música mesmo. Surgiu o nome do Sérgio
do Brasil e do mundo. Não perdeu sua Belluco, o grande professor de violão de
simpatia, sua simplicidade, seu sotaque Piracicaba. Ensinava o violão clássico,
do interior. Nem seu infinito talento. como a gente dizia. Minha mãe me levou
para estudar com ele quando eu tinha
Como você começou, em Piracicaba? dez anos, mas ele me achou muito novo
Vomo o violão, a música clássica e o e falou para me trazer quando eu tivesse
choro surgiram na sua vida? doze. Ela me levou no ano seguinte e
A música surgiu, de forma geral na ficou por isso mesmo.
minha vida, por influência da minha
família, mais precisamente minha mãe, a E como foi essa experiência?
primeira pessoa que vi tocando violão. Eu Ele me abriu o mundo! Eu via nele, além
devia ter três, quatro anos, e me marcou do mestre, uma figura paterna. Era muito
bastante. Meu pai tocava um pouquinho acolhedor, um educador mesmo, foi
também, mas eram separados, então vital na minha formação. Ele não só me
eu via mais a minha mãe. Da família ensinava, mostrava as coisas de música,
dela tinha a tia Rosa, que também pedia uma fita cassete virgem para que
tocava violão, me incentivava muito, me gravasse coisas para eu ouvir. Na época,
mostrava sempre o instrumento. Tinha nem vitrola a gente tinha em casa, só
uma tia que tocava sanfona, eu adorava. um rádio. O meu fornecimento musical
Quando tinha qualquer coisa musical, vinha todo do Sergio Belluco. Logo na
eu ficava em cima deles. Tia Rosa primeira fita, gravou Segóvia, falando,
comentou com minha mãe que eu tinha tocando... Para mim, foi um mundo
jeito, para me colocar para fazer aula. As novo, maravilhoso. Nesse ínterim, pedi
primeiras foram com uma professora de para meu padrinho um cavaquinho, pois
bairro, eu tinha uns sete anos, mal tinha tinha influência de uma escola de samba
começado a aprender a ler. Aprendia perto de onde eu morava. Gostava de
acordes, cifras, naquele modo à antiga, ver e ouvir aqueles batuques. Um dia,
prático: 1a. de Dó, 2a. de Dó... Fiquei ouvi uma música que não tinha canto,
nisso até oito, nove anos, quando minha e me pegou de um jeito... Perguntei o
tia sugeriu que minha mãe me colocasse que era e me disseram: chorinho. Fiquei
para estudar com o professor Antonio maluco. E vi na TV uma propaganda
Carlos Coimbra, o famoso Carlinhos do disco ‘Choro no Céu’. Incomodei a
Coimbra de Piracicaba, um grande minha mãe até ela me dar uma fita! Pedi
violonista no estilo popular. Fiz aula o cavaquinho para meu padrinho, ele
com ele e com o filho dele durante um me deu, e comecei a tirar os choros. E
ano, mais ou menos. Tirei várias coisas, a coisa foi aumentando, tirei essa fita
‘Sons de Carrilhões’, ‘Abismo de Rosas’. inteira, me enchi de coragem e contei
VIOLÃO+ • 27
matéria de capa
pro Sergio Belluco que eu gostava de D’Alma. No meio dessa fita tinha Paco
choro. Perguntei sobre a afinação do de Lucía. Fiquei extasiado! Como é que
bandolim, porque minha mãe tinha um acontecia aquilo? Quando eu ouvia a
que era do meu avô. Foi uma referência rumba dele, o “Entre dos Aguas”, aquela
musical, mesmo tendo falecido antes de frase feita de picados, era assombroso.
eu nascer, só pelas histórias que minha Procurei descobrir como fazia aquilo. Eu
mãe e tias contavam, que tocava vários não tinha acesso a nenhuma partitura
instrumentos. Era o meu herói da infância.
dele, nenhum vídeo, não tinha Youtube,
Veio esse bandolim, eu tentava colocar nem videocassete em casa. Soube que
corda, não conseguia, arrebentava. o Ronoel Simões, grande pesquisador,
Perguntei para o Sérgio a afinação, que morava em São Paulo, tinha algumas
ele me explicou e entrou no assunto, partituras e vídeos do Paco de Lucía.
perguntou se eu gostava de choro e eu Marcamos uma viagem para São Paulo,
disse que sim. Ele me convidou para para assistir a esse negócio. E foi o Jair
ensaiar com ele, já visando me colocar que intermediou, eu não ia chegar na
para tocar no seu grupo. Eu ia fora do casa do seu Ronoel e pedir... Antes de
horário da aula na casa dele, ficávamos assistir, tentei descobrir por mim mesmo
treinando, ele me ensinava as músicas, como ele fazia aquilo. Quando estudei
dizia onde estava errado. Era um trabalhocom o Carlos Coimbra, com uns nove
à parte, de percepção: eu tirava todas asanos de idade, ele me ensinou a tocar
músicas de ouvido e mostrava para ele, escalas com três dedos, tudo o que eu
que me corrigia. Passou a gravar uma tocava era com três dedos. O argumento
fita de choros por semana para mim. dele era o seguinte: violonista bom toca
com todos os dedos, esse era o bordão
Nessa primeira fase, você lembra dele. Quando eu ouvia o Paco de Lucía,
quais foram suas influências? Você imaginava que só assim ele poderia
tem um toque que transita entre o tocar aquilo tudo naquela velocidade e
choro, o erudito e o flamenco. Como precisão. E comecei a treinar desse jeito.
aconteceu essa mistura? É como se fosse a técnica do trêmulo,
As primeiras influências vieram da fonte dedos a, m, i. Comecei a praticar,
chamada Sergio Belluco: Dilermando praticar, praticar, foi melhorando a coisa.
Reis, Carlos Coimbra, Segóvia. Raphael Na viagem para a casa do seu Ronoel,
Rabello foi um impacto muito grande, para assistir ao famigerado vídeo
não só pelo vigor, mas pela perfeição: do Paco de Lucía, eu vi que ele fazia
ele sabia muito bem o que estava tudo aquilo com dois dedos... Foi uma
fazendo, tudo muito bem explicadinho frustração, eu estava fazendo errado.
ali. É uma grande influência, tentei Mas depois assumi essa coisa dos três
imitá-lo. Depois, estudei uns três anos dedos. Também confirmei que o Raphael
em Tatuí e, com o professor Jair de Rabello era muito influenciado por ele.
Paula, consegui uma fita na qual gravou O Raphael começaou a mistura entre
guitarristas flamencos, violonistas como flamenco e choro quando passou a ser
Ulisses Rocha, Heraldo do Monte, Grupo solista, não esquecendo que antes teve
28 • VIOLÃO+
matéria de capa
uma grande carreira de acompanhador. vez pude ficar perto de um violonista que
No seu trabalho de solista, colocou fazia exatamente aquilo que eu queria
vivamente a influência do Paco de Lucía, aprender e tocar. Ele me ajudou muito,
do flamenco, rasgueios, golpes de me deu conselhos muito úteis, que uso
unha no tampo do violão, faz alzapúas, até hoje.
aqueles arpejos típicos do flamenco. E
eu, na minha coisa de adolescente, de Mas quem lhe chamou atenção para
ficar imitando, também tentava fazer, a Unicamp? Você achou importante
da minha forma. Nunca estive perto de a faculdade?
alguém para me orientar nessa técnica. A minha ida à Unicamp foi por causa
Ia tirando do meu jeito, mesmo. do Marcos Cavalcante (Marquito), um
músico muito bacana. Todo mundo
E a faculdade de música? falava dele em Piracicaba, mas
Quando fui para a Unicamp, tive contato morava nos Estados Unidos, fazendo
com o Ulisses Rocha, um dos violonistas mestrado. Um dia, avisou que vinha
que o seu Jair me mostrou. O Ulisses para o Brasil e ia dar um seminário de
tem uma grande técnica. Pela primeira jazz em São Paulo. Eu devia ter uns

© Kika Fragatte

VIOLÃO+ • 29
matéria de capa
dezessete anos. Fiz amizade com o Eu não tinha muita noção do mercado,
Marquito, que tocava jazz pra caramba, da realidade musical. Tive contato com
mas tocava choro também. Esse foi o grandes professores, tive aula de violão
nosso ponto de ligação. Gostou muito com o Ulisses Rocha! O Marquito dava
de me conhecer e começou a botar aula de guitarra jazz, embora eu nunca
“coisas” na minha cabeça, do tipo: você tenha me dedicado a isso (poderia
tem que estudar! Fiz essa amizade ter aproveitado mais!). Mas colei no
com ele, que voltou para os Estados Ulisses Rocha! É um dos maiores fatos
Unidos. A gente se correspondia por da minha história: eu lembro que o Jair
carta. Pedi conselhos do que fazer e de Paula, professor de Tatuí, tinha me
me respondeu: se prepare para fazer mostrado uma videoaula do Ulisses,
vestibular na Unicamp, eu vou dar fiquei impressionadíssimo. Poder ter
aulas lá em breve. Fui atrás de tudo, contato com ele foi muito legal. Por
cursinho... Prestei a primeira vez, não meio dele e de outros nomes, conheci o
deu, mas na segunda passei. Comecei Yamandu Costa, que já estava em São
a ter aula com ele mesmo. Essa entrada Paulo. Na faculdade tive contato com
na Unicamp abriu muito a minha cabeça. outras matérias, isso ajudou a abrir a

30 • VIOLÃO+
matéria de capa
cabeça, ter outro tipo de formação, um Nessa época você gravou o seu
lado mais acadêmico. primeiro disco, não é mesmo?
Sim, foi ainda em Piracicaba, eu tinha uns
E como foi a sua transição para São 21 anos. Chama-se Abismo de Rosas.
Paulo, encontrar a turma do choro, o Tinha texto do Guinga, do Poyares. Fiquei
Zé Barbeiro e sua turma? por Piracicaba ainda um bom tempo. E
Vou mais longe no tempo para explicar estava lá, tranquilo, quando me ligou
melhor. Eu tocava com o regional uma pessoa de Sorocaba, a dona Mazé,
do Sérgio Belluco, com uns dezoito, que fazia rodas de choro na casa dela.
dezenove anos. A gente acompanhou O marido dela, o Angelo, fazia parte de
vários artistas, o Sílvio Caldas foi um um regional e era amigo do pessoal de
deles. O show foi em Santa Bárbara São Paulo. Ela falava: olha, eu quero
d’Oeste, pertinho de Piracicaba. Só trazer aquele rapaz de Piracicaba pra
que ele levava um violonista junto, que cá. Colocou isso na cabeça do pessoal
conhecia todo o repertório. Era o João que ia na casa dela, a Roberta Valente,
Macacão, um dos grandes mestres do o Zé Barbeiro, o Rodrigo Y Castro
choro de São Paulo. O João adorou da flauta. Um belo dia, ela me liga e
a gente, viu que eu tocava um monte diz: você não quer vir para a roda de
de choro, fizemos uma “amizadona”. choro? Falei: claro! Lá encontrei esse
Quando o Miltinho (Mori) não podia tocar, povo. O Zé Barbeiro, eu já conhecia. A
ele começou a me chamar, num lugar gente começou a estreitar os laços. Eu
chamado Bingo Cruzeiro do Sul. Eles estava querendo mesmo sair, ampliar
faziam um regional lá, o João, o Tigrão, os ares, já estava na Unicamp na época
o Joãozinho do Cavaco e o Miltinho e ficava na rota Piracicaba, Campinas
solando, o Regional Paulistano, se não e, às vezes, São Paulo, para dar canja
me engano. Eu pegava o ônibus e ia no Bar do Cidão. Com a aproximação
lá tocar com eles. Levava o bandolim, do Zé Barbeiro, a Roberta e o Rodrigo,
às vezes o violão tenor. Na realidade, ficou mais tranquilo. Quando ia para
encontrei com o Miltinho, pela primeira São Paulo, ficava hospedado na casa
vez, quando tinha doze anos. O Sérgio da Roberta. Eles me convidaram para
vinha para São Paulo comprar violões na tocar no Ó do Borogodó. Topei na hora.
Del Vecchio, e eu fui numa vez, quando já Passei a tocar com eles toda terça-feira,
tocava um pouco de bandolim. Conheci e fui ficando. Dividia apartamento com
o Evandro do bandolim, e o Miltinho um amigo. Não ficava a semana toda
estava também. Ele me ajudou, corrigiu em São Paulo, mas uns três dias, pois
a postura da minha mão esquerda, foi estava na graduação. Isso foi muito
muito legal. Voltando ao bingo: nessas legal, fazer aos poucos essa transição,
de tocar lá, virava e mexia vinha outro até o momento de residir em São Paulo,
músico. Conheci o Ventura Ramirez, o Zé mesmo.
Barbeiro, a Dona Inah. Quem também ia
muito a Piracicaba era o Carlos Poyares. Como é a sua história fonográfica,
Fiz amizade com ele também. como você gravou os seus discos e
VIOLÃO+ • 31
matéria de capa
participações? me ajudou muito, eu não tinha grana,
Minha primeira gravação não saiu em vinha me buscar de carro. Eu ficava o
disco, mas em fita e gravada em estúdio dia todo no estúdio, gravei violão de 7,
e tudo mais. É do grupo Som Brasileiro, cavaco, violão solo, pandeiro, flauta.
do Sérgio, em que toquei bandolim, E tive participações neste disco, do
cavaquinho, flauta e violão tenor. Meio Ulisses Rocha e do Hercules Gomes,
que produzi tudo, eles tocaram. Fiquei pianista, só que o Ulisses fez sua parte
também na técnica, ajudando a produzir, na casa dele. Depois gravei com o
acho que foi em 1997. Teve um disco Quintessência, também no estúdio do
anterior, do Grupo Oitava Cor, um grupo Geleia. Esses dois discos saíram pelo
de samba do qual fazia parte, em 1996. selo Allegretto. Depois, foi o disco do
Nesse, toquei tudo! Cavaco, cavaco- Choro Rasgado, se não me engano, em
banjo, violão de 7, violão de 6, flauta, 2004, com composições minhas e do Zé
gaita, violão tenor, esses instrumentos Barbeiro. A gente gravou em São Paulo,
de roda de choro, e alguma coisinha com participação do Laércio de Freitas,
de percussão. Depois vem o meu do Caíto Marcondes e do Toninho
disco, Abismo de Rosas, gravado num Ferragutti. Depois, um disco com o
estúdio em Piracicaba, do Cristiano Laércio de Freitas, que me convidou para
Bortolazzo (Geleia), que foi técnico de participar, em homenagem ao Jacob do
som dos Mamonas Assassinas. Ele Bandolim, onde fiz solos no violão, e ele,
no piano. Saiu pela Maritaca em 2005.
A gente improvisava também. Participei
do projeto Violões do Brasil, com toda a
nata dos violonistas, Duo Assad, acho
que em 2005 também. O projeto é da
Myriam Taubkin. Toquei “São Braz”,
uma polca minha, e também “Arranca
toco”, do Meira. Fiz um disco em 2006,
que se chama Alessandro Penezzi.
É independente, e tem um monte de
participações: Yamandu Costa, Arismar
do Espírito Santo, Miltinho Mori, Beth
Carvalho, Quinteto em Branco e Preto,
Charles da Flauta, Amélia Rabello
(irmã do Raphael Rabello). Tem o
disco Sentindo, metade solo e metade
em trio, com o Cisão Machado o Alex
Buck. Aí, começa a minha parceria
com o Capucho, produtor, com quem
© Kika Fragatte

fiz alguns discos. Além do Sentindo, fiz


um com o Alexandre Ribeiro, em 2009,
Cordas ao Vento, gravado em estúdio.
32 • VIOLÃO+
matéria de capa

Depois desse, fizemos uma turnê pela para o Prêmio da Música Brasileira,
Europa e tocamos na 30ª edição do outros fizemos SescTV, rodamos muito
Spokje Jazz Festival, na Macedônia, trabalhando. Agora vem o Quebranto,
onde abrimos para o Wayne Shorter. Um com o Yamandu Costa. Espero não ter
show foi na Bimhuis, uma casa famosa esquecido nenhum (risos).
em Amsterdam. E eles gravam o áudio
e deram pra gente a gravação. Fomos Você lançou recentemente seu curso
ouvindo no carro, achamos bom o som. de violão pela internet. Essa ideia
Fizemos um CD ao vivo. Aí vem o Dança surgiu como? Dá muito trabalho
das Cordas, meu disco de violão solo, montar um curso desses? Quais são
gravado no estúdio Acari, no Rio de os seus objetivos com o curso?
Janeiro, com direção do Mauricio Carrilho. Em São Paulo, a gente fica refém da
Todos esses discos foram pela Capucho. logística, o trânsito, essas coisas, que
A partir de 2006, quase tudo o que gravei complicam. Depois que mudei para o
foi autoral. Ainda tem o Velha Amizade, Butantã (bairro da zona oeste de São
com o Proveta, gravado em São Paulo. Paulo, próximo à USP) – mais para
Alguns desses discos tiveram indicação Taboão da Serra que Butantã –, nem
VIOLÃO+ • 33
matéria de capa
todo mundo se dispõe a ir, principalmente que deixar a coisa muito bem preparada.
porque tem uma ponte que é um Algumas vezes, tentei fazer sem ter um
problema, dependendo da hora. Passei a roteiro, mas fica ruim. Tenho mania de dar
fazer aulas por videoconferência, Skype, muitas voltas e isso prejudica, fica uma
essas coisas. A primeira experiência foi aula muito comprida. A gente aprende
com uma aluna do Paraná, que queria a fazer um roteiro antes, preparar o
fazer aula comigo de qualquer jeito, mas material. Também tentamos fazer e
numa época que não tinha uma boa depois transcrever o material. Muito
tecnologia, era por chat. A gente falava mais difícil! Agora, preparo tudo antes e,
por ali, eu ia escrevendo, a metodologia mesmo assim, dá muito trabalho. Sem
era por tablatura, era bem complicado. contar que nem sempre a gente está
Com o Skype, a gente passou a fazer de com o pessoal da produção à disposição
uma forma melhor e passei a dar aula para para fazer os vídeos. Então, o que é mais
pessoas de outros países. Tive alunos na simples passei a fazer em casa. O que
Alemanha, nos Estados Unidos, tenho, isso significa: tive que passar a entender
até hoje, no Japão. Funcionou. Mas tinha minimamente de filmagem, programas
a questão do horário, você fala por uma de gravação, edição dos vídeos. Você
hora, tudo mais. E sempre fazia material começa a fazer mil coisas que não são
para os alunos, um monte de material tocar violão. Tem que entender mais
espalhado pelos cadernos, chats, Skype até do Word, onde faço as apostilas, do
dos alunos. A ideia foi juntar isso tudo, Sibelius, que é o editor de partituras. Está
comercializar, seria muito mais fácil: faz sendo um grande aprendizado, revisar
uma vez só e está pronto. Desenvolvendo assuntos, para falar corretamente até
essa ideia, aparece um parceiro, o aprender aquilo que achava que sabia,
Thiago, que propôs de eu fazer um mas não sabia.
curso online. Topei! A gente começou a
traçar a coisa, mas para entender como Além de assistir às suas aulas, o que
ia ser montado demorou bastante, foi a um violonista inexperiente pode fazer
primeira dificuldade. Depois pensamos para começar a frequentar rodas de
num curso abrangendo todos os níveis, choro? Falo por experiência própria.
o que foi outra grande dificuldade. Adoro choro, mas não toco choro.
Imagina você falar dos assuntos que vão Tenho vontade de tocar, mas também
abranger o violão brasileiro, o mote do muito receio, porque o pessoal
nosso curso, para todos os níveis. Claro que já toca parece muito firme no
que o curso é voltado para aquilo que repertório. Sinto que a roda não é o
faço. Não toco música flamenca, então lugar ideal para começar a aprender,
não vai ter isso lá, embora eu tenha nem sempre haverá paciência com
essa influência. Tenho influência da que está começando.
música gaúcha, mas não toco, não sou Esse negócio de roda depende muito de
especialista, não abordei assuntos que quem se trata: às vezes é uma roda de
não conheço o suficiente. É um negócio choro de amigos. Esta é uma boa receita:
muito difícil, porque no vídeo você tem se o cara tem algum amigo que toca
34 • VIOLÃO+
matéria de capa
mais que ele, o ideal é que comecem a
com o Yamandu Costa... fale um pouco
tocar juntos. Se isso não for possível, o
dele e de outros projetos.
ideal é que ele tenha gravações de choro
A gente acabou de fazer esse trabalho.
e tente tocar junto. Hoje, é muito fácil
Vamos trabalhar com ele, tentar rodar
conseguir as partituras, então, ele pode
um pouco com o show do CD, e isso faz
seguir pela partitura, que é uma forma de
estacionar um pouco outros projetos.
aprendizado. Vai saber do que se trata,
Mas tenho vários. Fazer um disco com
a cifra, vai ter o pré-requisito de ler cifra,
as canções que fiz com o Paulo César
conhecer minimamente leitura musical.
Pinheiro... Já tem material para isso. E
O que aconteceu comigo: eu tinha asestou pensando seriamente em gravar
gravações e os instrumentos. Tive que
cantando! São vários ritmos, samba,
tirar tudo sozinho. Esse caminho ainda
canção, baião, xaxado, está bem legal.
é a melhor forma de aprender, porque o
Outra coisa que quero fazer, mas acho
que se aprende desse jeito, dificilmente
que vai ser para o ano que vem, é um
se esquece. disco com o Zé Barbeiro, que a gente se
promete há muito tempo. Quem sabe,
Esse CD que saiu agora, Quebranto, no ano que vem?

VIOLÃO+ • 35
mundo Por Luisa Fernanda Hinojosa Streber

Machete ou
luisahinojosa@yahoo.com.br

braguinha?
É indiscutível a virtude dos artesãos que deram
forma, voz e cor ao instrumento que se espalhou por
toda a Macronésia entre 1844 e 1910

O machete era usado tanto para as e compositor Candido Drumond de


músicas eruditas quanto para as Vasconcelos (1841-1985), pesquisador
populares, em um lugar que era a ponte da música dos mais antigos romances
entre o velho e o novo mundo. madeirenses que temos conhecimento,
Em um lugar entre o permitido e o além de Manuel Monteiro Cabral (1801-
proibido, entre a certeza e a aventura, 1860), compositor que adaptou um
crisol de culturas, se formavam soireés, repertório imenso e variado, que teve
primeiro em casas particulares de alta a honra de ser citado em pelo menos
sociedade, depois em lugares públicos. um relato oitocentista de Antonio José
Também tinha quem chegava à ilha para Barbosa (1822-1899).
se curar da tísica, a doença da época. Assim nasceu um instrumento quase
Esses saraus podiam ser unicamente insignificante, porém base para muitos
musicais, onde se tocavam modinhas, outros, que conseguiu abrigar entre
ou se praticava a arte da conversa e o suas cordas as músicas de todo tipo de
jogo de cartas. estrangeiros, a disseminar romances e
Entre estâncias, conversas, esperas de coplas britânicas, escocesas e alemãs,
partidas de navios para os mais diversos entre outras. Muito provavelmente se
destinos, sobrava tempo ali, se estudava perderam no espaço e na imensidão
música com os mestres violeiros de do mar incríveis canções, por conta
toda sorte (violas francesas, guitarras, da falta de escrita musical na época
rabecas, rabecões, cavaquinhos e, é dos viajantes.
claro, machetes).
Sendo assim, o machete, que mais se Afinação e morfologia
adaptava para a música culta, popular O machete é um cordófono pulsado e
e domiciliar, teve o hábil machetista pertence à grande família das violas
36 • VIOLÃO+
mundo

de mão quinhentistas. Sob essa do cravelhame é de til ou pau-santo; o


designação, o instrumento é usado em cavalete usa madeira dura, como pau-
Portugal desde os finais de 1700. Tem santo (Guáiaco ou outra da mesma
a forma de um oito, de 12 a 17 trastes família) ou til; escala de pau-santo ou
e quatro cordas. Seu tampo é muito til; as cravelhas de pau-santo, til ou
elaborado, trabalhado em marchetaria buxo (Buxus sempervirem) escurecido.
típica da ilha de Madeira. As afinações, tecnicamente, são Re,
As madeiras usadas na construção Sol, Si, Mi ou Re, Sol, Si, Ré, porém
do machete madeirense são (quando existe a prática de se trocar a afinação
possível) as endêmicas: para o tampo de alguma corda, situação típica nos
harmônico (feito de duas peças) o “pinho cordófonos, ou afinar por quintas,
de Flandres” ou de “Veneza” (nomes como violino.
genéricos para as resinosas Epicea
excelsa e Epicea abies); as ilhargas e
fundo, normalmente de uma só peça
(se bem que também se construam em Curiosidades
duas metades) de cedro (Juniperus • A princesa Sissi tocava machete.
oxicedrus), cedro da ilha (ou da terra) • A palavra machete significa magro,
ou til preto (Ocotea foetens), o vinhatico delgado, também é chamado de
(Phoebe indica) e, mais raramente, o Braguinha, porque os tunantes que
plátano; no tampo harmônico pode ou tocavam o instrumento usavam
não ser-lhe embutida um reforço para bragas, que são uma espécie de
o seu rebordo; o braço é de castanho, calças que tem bolsos grandes,
cedro, vinhático ou mogno (nos onde podem ser transportados
instrumentos mais recentes); o espelho estes pequenos instrumentos.
VIOLÃO+ • 37
história Por Dagma Eid
dagmaeid@hotmail.com

Vihuela
Depois de comentar nas edições anteriores sobre o alaúde renascentista,
o alaúde barroco e os arquialaúdes, nesta serão abordadas algumas
características do instrumento precursor direto do violão

A vihuela foi o instrumento preferido encontram na Igreja da Companhia de


na Espanha do século 16 e está Cristo de Quito (Equador), no museu do
diretamente ligada à criação de um dos Conservatório de Paris e a quarta está
mais importantes repertórios de música no museu da Royal College of Music de
instrumental do Renascimento. Fontes Londres, também de Belchior Dias.
da época se referem a vários modelos A vihuela do século XVI possui 6 pares
de vihuela, classificados de acordo de cordas (ordens), 10 trastes e caixa
com sua afinação. Juan Bermudo, de ressonância em forma de oito,
em seu Libro Llamado Declaración dando origem à evolução da família
de Instrumentos Musicales, de 1549, de guitarras. Seu repertório está
descreve pelo menos sete vihuelas escrito sobre uma pauta de 6 linhas
de diferente tessituras. Temos (tablatura). O princípio de utilização das
apenas quatro exemplares de vihuela tablaturas é o mesmo nos instrumentos
conservadas em museus e em uma de cordas dedilhadas, cada qual com
igreja. Uma delas se encontra no museu sua afinação e número de ordens
Jacquemart-André, em Paris – a vihuela (em edições anteriores de Violão+, já
de Guadalupe, fabricada pelo violeiro falamos sobre o alaúde renascentista e
português Belchior Dias. Trata-se de um explicamos brevemente como podemos
instrumento de tessitura grave, devido ler tablaturas). No caso da vihuela, a
ao tamanho da caixa de ressonância tablatura mais usada é a italiana, que
(58 cm) e comprimento de cordas (80 utiliza números. Na tablatura italiana, a
cm). Embora não existisse um padrão linha superior representa a sexta corda
de construção da vihuela, este exemplar e a linha inferior, a primeira. Os números
de tamanho maior pode ser considerado 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e X representam
desproporcional aos instrumentos os 10 trastes do instrumento. O
da época. Se a compararmos com as 0 (zero) representa a corda solta
ilustradas nos livros originais, notamos (recomendamos ao leitor a aprender
que esta possui características atípicas, este sistema de leitura, que é muito
como por exemplo o número de rosetas simples, pois proporciona a pesquisa
no tampo. As outras vihuelas se das fontes originais de vihuela).
38 • VIOLÃO+
história

Vihuela Guadalupe Vihuela Guadalupe (detalhe do fundo)

VIOLÃO+ • 39
história
Afinação parte do repertório para vihuela consiste
A afinação padrão a partir da primeira de música intabulada. Tecnicamente
corda é: 4ª. justa, 4ª. justa, 3ª. maior, falando, o estudo dessas obras é
4ª. justa e 4ª. justa. Se abaixarmos a essencial para o violonista desenvolver
terceira corda do violão moderno em Fá principalmente suas habilidades de mão
sustenido, obteremos a mesma afinação. esquerda.
Assim, o estudo do repertório de vihuela A execução da polifonia em um instrumento
é facilmente realizado ao violão. O harmônico exige muita atenção por
primeiro violonista e musicólogo que parte do intérprete, pois a indicação
voltou sua atenção para esse repertório rítmica nas tablaturas mostra apenas o
foi Emilio Pujol (1886-1980), que publicou tempo de ataque das notas e não sua
transcrições para violão das obras de duração. Bermudo, em sua Declaración,
Narváez e Mudarra. Em sua Escuela recomenda iniciar o estudo fazendo
Razonada de la Guitarra, volume 1, arranjos de obras vocais, primeiramente
fornece dados sobre alguns intrumentos a duas vozes, e posteriormente a três ou
históricos, incluindo a vihuela do século mais, para o desenvolvimento simultâneo
16. Trata-se de uma publicação muito útil de técnica instrumental e conhecimentos
para quem deseja dar início à pesquisa musicais. Luís de Narváez, assim como
do repertório de cordas dedilhadas outros vihuelistas, recomendava ao
históricas. instrumentista ter conhecimento prévio
A hegemonia da música vocal na Europa de canto harmônico a fim de conduzir as
Ocidental resultou na importante prática vozes do contraponto adequadamente.
de arranjar obras polifônicas num único Um bom exemplo desta prática é sua
instrumento harmônico. Tal prática ficou obra Canción del Emperador – uma
conhecida como intabulação – passar as intabulação da obra vocal Mille Regretz,
partes vocais para a tablatura. A maior de Josquin des Prez (1440-1521).

Canción del Emperador de Luis de Narváez em notação


Cancion del Emperador de Luis de Narváez em tablatura. convencional.

40 • VIOLÃO+
história

Tablatura da Pavana I de Luis Milán. Pavana I de Luis Milán em notação convencional.

Repertório
Como descrito anteriormente, a vihuela canto. Apesar das publicações para
teve todo o seu repertório publicado em vihuela serem poucas, as informações
tablatura italiana. A exceção é o livro contidas nesses sete livros podem
de Luys Milan, que utiliza a tablatura ser consideradas inovadoras. Neles,
napolitana, que inverte a ordem das surgem as primeiras indicações de
cordas (a 1ª. linha representa a 1ª. andamento, a canção acompanhada e
corda). Outra particularidade da escrita a organização da técnica de variações
para vihuela é a notação da parte (diferencias). Os autores organizavam
vocal nas intabulações, que aparece seu material de maneira racional, em
em destaque, em vermelho. A intenção ordem de dificuldade das peças (D=
desta notação é principalmente didática difícil, F= fácil, no caso de Milán), em
e não de sugerir a performance do modos (tonalidades) ou gênero musical.

Acervo
Os livros publicados estão listados abaixo, em ordem cronológica. O repertório
desses livros consiste, principalmente, de arranjos de música vocal, prática em
voga neste período.

Luís de Milán - El Maestro (1536)


Luís de Marváez - Los seys libros del
Delphin (1538)
Alonso Mudarra - Tres Libros de Música
en cifras para vihuela (1546)
Enriquez de Valderrábano – Libro de
Música de vihuela intitulado Silva de
Sirenas (1547)
Diego Pisador - Libro de música de
Vihuela (1552)
Miguel de Fuenllana - Orphenica Lyra
(1554)
Pavana I de Luis Milán em notação convencional.
Esteban Daza - El Parnaso (1576)
VIOLÃO+ • 41
história
Quer aprender a
Por meio dos poucos dados biográficos dois livros de música para vihuela de

tocar blues?
dos vihuelistas espanhóis e pelas Francesco da Milano – Intavolatura de
características do repertório, podemos viola o vero lauto, volumes 1 e 2, de
concluir que a vihuela era um instrumento 1536. Os livros de vihuela também citam
muito apreciado pela sociedade culta a guitarra de quatro ordens (chitarrino).
na Espanha do século 16. Seus autores Fuenllana incluiu obras para “vihuela
faziam parte dos círculos de cortesãos, de quatro cordas que é chamada de
eclesiásticos e universitários. Além de guitarra”. O livro de Mudarra contém
CD com método digital + 61 pistas de áudio
sete livros publicados entre 1536 e 1576 música para esse instrumento menor
(veja box na página anterior), existe(solos/Play Along) mas de características
que a vihuela,
também um manuscrito anônimo, de bem semelhantes.

R$ 49,90
1593, chamado El ramillete de flores, com O livro de Fuenllana também contém
música para vihuela de vários autores; música para a guitarra de cinco ordens.
mais dois livros publicados na Espanha: emEmaté 12 x no cartão
1580, a guitarra de cinco ordens e
Luís Venegas de Henestrosa – Libro de seu estilo de música popular começa a
cifra nueva para tecla, arpa y vihuela suplantar a música culta ligada à vihuela.
(1557); Antonio de Cabezón – Obras Surge então uma nova estética musical,
de música para tecla, arpa e vihuela cujas características comentaremos
Mauricio Pedrosa
(1578). Fora da Espanha, temos tambémwww.teclaseafins.com.br
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VIOLÃO+ • 43
tecnologia

Pequena história
da gravação
Saulo Van der Ley
saulowan@icloud.com

E aqui estamos para entender melhor o que é esse tal de


home studio, do que se compõe, como funciona e para
que serve. Historiando um pouco, vamos entrar no túnel
do tempo e voltar à época em que só havia um microfone
disponível para gravar o cantor e seus acompanhantes,
toda a banda ou mesmo uma orquestra inteira. E olhe que
tem muita gente que mesmo nos dias de hoje começa com
um microfone só...
Em se tratando de uma canção – poema musicado –, o mais
importante era quem cuidava do vocal, que ficava mais
perto do microfone. Em seguida, por ordem de distância,
vinham os instrumentos de som delicado e baixo volume,
que por isso mesmo precisavam ser gravados mais de
perto. À medida que os instrumentos fossem mais cheios
de volume, eram colocados mais à distância do microfone.

IRig Pro I/O


Resolução de 24 bits / 96 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
Conexão lightning USB
Uma entrada / uma saída.
Áudio e MIDI (mini-DIN)
Preço médio: R$ 1.100

44 • VIOLÃO+
tecnologia
Talvez isso explique por que os bateristas são seres algo
distantes e solitários.
Todos eram gravados ao mesmo tempo. Por isso, os
ensaios eram primordiais, tanto os individuais como
os coletivos. Gravar um show ao vivo era um exercício
um tanto impossível, mas há registros dessas proezas,
certamente feitas por um técnico audacioso. Vale lembrar
que – por mais que alguns músicos ainda se oponham –,
ensaiar faz parte da produção musical, não é uma etapa a
ser realizada dentro do estúdio, o que ainda acontece com
frequência.
E foram se sucedendo as invenções, desde mais de um
microfone, gravadores diversos, desde os que gravavam
no sulco de uma matriz de disco, gravadores de fita
magnética, até chegar nas gravações digitais feitas em
fita magnética – como o Digital Audio Tape (DAT) –, até
o uso dos discos rígidos dos computadores. O precursor
do home studio talvez tenha sido o “portastudio”, um
gravador de quatro canais do fim do século passado. Era
um gravador de fita cassete, com controles para gravar
quatro canais ao mesmo tempo, que, depois, podiam ser
resumidos em um só canal, ao qual se somavam os outros
IRig Pro DUO
Resolução de 24 bits / 96 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
Conexão lightning USB
Duas entradas / duas saídas.
Áudio e MIDI (mini-DIN)
Preço médio: R$ 1.500

VIOLÃO+ • 45
tecnologia
três para regravar mais instrumentos, e assim por diante.
Um banda chamada The Beatles usou muito esse recurso
em seu começo. Já não era necessário gravar todo mundo
ao mesmo tempo, e começou a ficar mais fácil gravar de
forma mais elaborada.

E a placa emplacou
A meta seguinte seria melhorar a qualidade das gravações,
desde o uso de microfones mais sofisticados até o
armazenamento das gravações. Uma vez resolvidos esses
problemas, começou-se a pensar na qualidade do som
gravado. Pré-amplificadores, efeitos, e todo um caminho
entre a captação do som e seu armazenamento e depois
a reprodução. Tinha chegado o momento de colocar algo
entre o microfone a as caixas de som, o que já tratamos
nas outras edições.
Um simples amplificador, com seus estágios de pré-
amplificação e potência, já era pouco. Ao mesmo tempo,
os gravadores foram cedendo lugar a outras formas de
armazenar o som, que começaram a ser guardados em
discos rígidos, vários tipos de disquetes e outros dispositivos
digitais. A informática e sua linguagem passou a dialogar
com a eletrônica, e o tradutor dessa conversa musical foi
a interface, popularmente conhecida como “placa de som”.
A princípio eram placas “espetadas” na placa principal dos
computadores – as “placas-mãe” – com suas entradas
e saídas para microfone, sinal de áudio, fones de ouvido

Behringer UCA 202


Resolução de 24 bits / 48 kHz
USB
Saída para fones de ouvido
Saída ótica
Duas entradas / duas saídas RCA
Só áudio
Preço médio: R$ 300

46 • VIOLÃO+
tecnologia
ou dispositivos que amplificassem o som e o recebessem.
Mais tarde as placas começaram a ser externas, envoltas
em vários tipos de estruturas, em formatos diversos. Com
a portabilidade, podiam viajar com seus usuários, que não
mais precisaram levar junto todo o computador.
Marcas e modelos começaram a procriar como coelhos.
Linhas e séries com nomes criativos – desde os de ilhas
do Caribe até nomes de espaçonaves – brigavam nas
prateleiras das lojas de áudio e eletrônica. Os preços
proibitivos começaram a dar lugar a modelos populares, e,
até hoje, a questão principal é a quantidade de entradas e
saídas que uma interface oferece, além dos recursos, os
mais diversos, que acompanham os produtos.

Behringer UMC 202 HD


Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador Midas
USB
Saída para fones de ouvido
Duas entradas / duas saídas
Só áudio
Preço médio: R$ 500

Behringer UMC 204


Resolução de 24 bits / 96 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Duas entradas / duas saídas
Áudio e MIDI
Preço médio: R$ 700

VIOLÃO+ • 47
tecnologia
Tipos de conexão
As interfaces precisam ser ligadas ao computador
e seus periféricos por meio de um cabo. Com este e
seus plugues apareceram diversas formas de enviar o
sinal, os chamados protocolos. Cronologicamente, eles
aumentam a velocidade do sinal, medida por Megabytes
por segundo (Mbps), sendo os mais conhecidos os
chamados Universal Serial Bus (USB), em suas versões
1 (12 Mbps), 2 (480 Mbps) e 3 (até 5 Gbps), o Firewire
(até 800 Mbps) e o Thunderbolt (10 Gbps). Cada um tem
plugue exclusivo, que permite reconhecer pelo formato
qual protocolo está em uso.
Mais recentemente tivemos o aparecimento de uma
tecnologia que permite passar o sinal através de cabos de
rede Ethernet (aqueles azuis usados para ligar modems)
em alta velocidade, capazes de conduzir muitos canais
simultaneamente. Para escolher a sua interface você terá
de verificar quais entradas/saídas tem o seu computador.
PCs rodando Windows geralmente usam USB, Macs usam
USB, Firewire, e os Macs mais recentes, Thunderbolt.
Adaptadores existem, mas não os recomendo.
A maioria das interfaces mais acessíveis aos iniciantes usa
o protocolo USB, aquele mesmo que liga sua impressora,
HDs externos e outros itens ao computador, e há inclusive
microfones razoáveis que se conectam via USB. A versão
mais nova é a 3; então, uma interface com USB 2 terá menor
velocidade. Neste momento, entramos em um polêmico
assunto: a obsolescência programada das interfaces,
que atinge também outros itens de home studio, gerando
Focusrite Solo
Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Uma entrada / uma saída
Só áudio
Preço médio: R$ 850

48 • VIOLÃO+
tecnologia
reclamações dos usuários.
A interface precisa ser compatível com o sistema operacional
que você está usando no computador. Entre as versões do
Windows 7, 8 e 10 há muitas interfaces, que funcionam
ou não. O mesmo acontece entre os sistemas da Apple -
OS X - 10.9, 10.10, 10.11 e 10.12. O cidadão compra uma
interface, o sistema operacional é atualizado e o fabricante
não tem o driver – pequeno aplicativo que faz funcionar a
interface - atualizado. Ou pior: resolve não produzir mais o
driver e avisa explicitamente sua opção.
Para ficar em um só exemplo, a marca M-Audio sempre
produziu boas interfaces USB e Firewire. Mas foi vendida
por duas vezes para outros conglomerados empresariais,

Focusrite Scarlett 2i2


Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Duas entradas / duas saídas
Só áudio
Preço médio: R$ 1.000

Focusrite Scarlett 2i4


Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Duas entradas / duas saídas
Áudio e MIDI
Preço médio: R$ 1.300

VIOLÃO+ • 49
tecnologia
que resolveram descontinuar o desenvolvimento dos
drivers, deixando os consumidores a ver navios, inclusive
este que vos escreve neste momento. Outro caso clássico
é a atualização dos sistemas da Apple, anuais, que vão
deixando os usuários em apuros, principalmente quanto ao
uso de interfaces. Os últimos Macs simplesmente aboliram
as entradas Firewire de sua linha.
Para quem está começando, aconselho as interfaces USB
básicas, quase todas com apenas dois canais de entrada,
uma saída para a amplificação – monitores amplificados
ou amplificadores e monitores passivos (ver artigo na
edição 22 de Violão+) –, uma saída para fones de ouvido,
algum tipo de pré-amplificador, circuito Phanton Power
para microfones condensadores (ver artigo na ediçao 21
de Violão+) e controles de volume de entrada e saída.
Geralmente, uma entrada é para microfone e a outra para
um instrumento musical.
Isso não significa que você só poderá gravar voz e
guitarra, por exemplo. Simultanemente sim, mas com o
uso do programa de gravação – as chamadas Digital Audio
Workstations (DAWs) – poderão ser gravados inúmeros
canais, sempre usando apenas uma entrada. Logo,
interfaces mais simples ainda, com apenas uma entrada,
também servirão. Há modelos bem baratos, que podem
ser usados até que, naturalmente, você continue a equipar
melhor o seu home studio. Consulte a parte do texto “O
que temos no mercado nacional” com os preços.

Focusrite Scarlett 18i8


Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Quatro entradas / quatro saídas
Áudio e MIDI
Preço médio: R$ 2.500

50 • VIOLÃO+
tecnologia
Roland UA 1010 Octa Capture
Resolução de até 24 bits / 192 kHz
Phanton Power
Pré-amplificador
USB
Saída para fones de ouvido
Oito entradas / oito saídas
Áudio e MIDI
Preço médio: R$ 3.700

Áudio & MIDI


Outra dúvida comum é se você vai precisar de uma interface
apenas de áudio, ou uma que também tenha entradas e
saídas Musical Instruments Digital Interface (MIDI). Este é
outro protocolo, criado nos anos 1980, que permite o uso
daqueles instrumentos virtuais, geralmente disparados
por um teclado, e, mais recentemente, pelas guitarras e
violões com captadores MIDI. Eu recomendo uma interface
de áudio e MIDI, pois bons recursos de criação estarão
disponíveis usando gravações MIDI em conjunto com os
áudios gravados.
Você pode, por exemplo, criar uma bateria, baixo e teclado
MIDI, inserindo notas com o mouse ou usando o teclado
comum de digitação do seu computador de mesa ou
notebook, sem o uso de um teclado MIDI. Terá, então,
uma espécie de “playback” para gravar seu violão ou
outro instrumento real. Nos dias de hoje, a qualidade dos
instrumentos virtuais é muito satisfatória, e muitos ouvintes
espertos costumam ser enganados, tomando como real o
que é virtual, até mesmo um saxofone tocado via guitarra
MIDI.
Se reconhecem as interfaces com MIDI pelas entradas
e saídas de forma redonda, com cinco furinhos, onde se
conectam os cabos MIDI, com plugues de cinco pinos.
Curiosamente, esse tipo de conexão era usado nos antigos
gravadores de fita cassete Philips para o áudio. Foi a
contribuição da empresa para a criação do protocolo MIDI
– em hardware e software – quando ela, Roland, e outras
empresas se reuniram para a sua criação, deixando
de lado a concorrência e beneficiando o usuário. Bons
tempos que poderiam ter feito escola, mas...
VIOLÃO+ • 51
tecnologia
Feita a escolha entre interface apenas de áudio ou
também com MIDI, o que encarecerá um pouco esta
última opção, resta saber a quantidade de entradas e
saídas de que você vai precisar. Quanto mais entradas
e saídas, mais cara a interface. Mas há uma grande
quantidade de pequenas interfaces com duas, quatro,
seis e oito entradas e saídas, que podem ser uma opção
para, desde o início, você ter possibilidades de gravar
simultaneamente sua banda com qualidade. A partir de
mais entradas e saídas, chegamos na praia das interfaces
semi, ou profissionais.
Outro parâmetro de medição da qualidade das interfaces
é a proporção bits / kHz (bits por kilohertz, ou 1.000
Hertz). Um CD tem 16 bits / 44 kHz, mas há interfaces
que suportam 24 bits / 48 kHz, ou 24 bits / 96 kHz, ou
24 bits / 192 kHz. Vamos entrar nesse assunto mais
complexo em outras edições. Mas números maiores nem
sempre indicam que o som estará melhor ou, ainda, se
o seu ouvido vai perceber alguma diferença entre esses
valores. Parta do princípio de que uma interface de 24
bits / 96 kHz é uma ótima escolha.

Behringer Xenyx 302 USB

52 • VIOLÃO+
tecnologia
O que temos no mercado nacional
Muita gente começa a ideia de montar um home studio a
partir de um tablet ou mesmo um smartphone. E muita gente
tem feito até gravações de trabalhos profissionais usando,
por exemplo, um iPad, e eu me incluo nessa turma. Então,
enumeramos nesta matéria dez interfaces, de um a oito
canais, como sugestão para quem está começando. As
primeiras são interfaces extremamente portáteis, cabem
no bolso, têm uma qualidade de áudio e MIDI que nada
deixa a desejar e funcionam com iPhones e iPads, além
de PCs e Macs.

2 em 1, 3 em 1
Atento à expansão dos home studios, o mercado sempre
procura oferecer produtos simplificados, desde a invenção
dos famosos aparelhos de som “ três-em-um”, que
reproduzem rádio, discos e fitas. Hoje já temos interfaces
embutidas em mixers – pequenas mesas de som –,
também muito usadas nos home studios. Recentemente,
os mixers pequenos, ou mesmo os grandes, passaram a ser
encontrados também no formato de software, até mesmo
em telas de toque. Para o amor ou o ódio dos técnicos de

Yamaha MG10XU

VIOLÃO+ • 53
tecnologia
som que adoram girar botões ou puxar faders.
Por módicos R$ 400 (preço médio), a Behringer oferece
um pequeno mixer equipado com interface USB, cinco
entradas – quatro com plugues RCA e uma P10/XLR –,
saídas para fones e/ou headsets (mic e fone separados) e
ajuste de ganho: Xenyx 302 USB. É uma opção para quem
vai trabalhar com podcasts ou para economizar algum –
com qualidade compatível com o custo-benefício – no
início da montagem do primeiro home studio.
Por R$ 1.300 (preço médio), a Yamaha oferece um belo
mixer de dez canais, com efeitos FX e uma interface USB
de 24 bits / 192 kHz, com duas entradas e duas saídas,
quatro entradas de áudio com pré-amplificadores.
Se tiver algum amigo voltando da Europa, peça para lhe
trazer um mixer/interface/controlador , o três-em-um do
momento na Inglaterra, onde custa apenas US$ 579,
reunindo entradas e saídas de áudio e MIDI espertas.
A interface é o coração do seu home studio. Por ela são
bombeados os sinais de entrada e saída dos sinais de áudio
e MIDI, fazendo-os ir de suas origens aos seus destinos
com pressão adequada, mas também sujeita a variações
inadequadas, se o operador abusar da alimentação,
excesso de sedentarismo etc. Na próxima edição vamos
abordar o cérebro do seu home studio, que pode tornar
você um gênio ou um louco: as Estações de Trabalho de
Áudio Digital (DAWs).

MIDI K-Mix Keith Mc Millen

54 • VIOLÃO+
VIOLÃO+ • 55
siderurgia

“Lamento
Sertanejo” Eduardo Padovan
edupadovan@gmail.com

Olá, leitores de Violão+! Neste mês, o arranjo que trago


para a nossa coluna é da canção “Lamento Sertanejo”,
composta por Dominguinhos e Gilberto Gil. Nele, há uma
diferença de estrutura entre os demais publicados nesta
coluna: a existência de uma seção de improviso no meio
do arranjo, antes de repeti-lo e encerrá-lo.
Encontrei na música “Lamento Sertanejo” a atmosfera
musical do Nordeste brasileiro, com melancolia em sua
melodia e cheia de riquezas harmônicas, algo fácil de
encontrar nas obras de compositores da região. Recomendo
a escuta não só desta música, mas dos vários discos de
Gil e de Dominguinhos.
Minha intenção foi trabalhar com diferentes texturas durante
a peça. Perceba que, em alguns trechos, são tocadas quatro
vozes (notas) simultaneamente, e, em outros momentos,
apenas uma nota sola a melodia. Isso não tem relação com
pensamento algum relacionado à técnica de violão, mas
sim com a vontade de reforçar a mensagem que a letra e
a música me passam. Outra curiosidade neste arranjo é
a aparição de um improviso entre as duas repetições da
melodia.
A improvisação é um assunto muito rico, que ainda não
foi tratado nesta coluna. Muitas vezes, é utilizada como
desenvolvimento da melodia original ou criação espontânea
de novas melodias, utilizando a forma e as progressões
harmônicas da música em questão.
Foi pensando em criar novas melodias sobre a forma
e a progressão de “Lamento Sertanejo” que realizei o
meu improviso. Para que você possa fazer o mesmo,
no momento em que deve acontecer o improviso, deixei
escrito na partitura a progressão dos acordes que servirão
como referência para a sua criação espontânea. Espero
que aproveite!
Grande abraço!
56 • VIOLÃO+
siderurgia
Lamento
Lamento Sertanajo
Sertanajo
Lamento
“Lamento
arr.
Lamento Sertanajo
Sertanejo”
Eduardo
arr. Eduardo
Padovan
Sertanajo
Padovan Dominguinhos e Gilberto Gil
Dominguinhos e Gilberto Gil
arr. Eduardo Padovan
= 50 arr.
Gm7Eduardo Padovan
C7/ G Gm7 C7/G Gm7
Dominguinhos e Gilberto Gil
Arranjo: Eduardo Padovan = 50 Gm7 C7/ G Gm7 Dominguinhos
C7 e Gilberto
Gm7
Dominguinhos
/G Gil Gil
- Gilberto
= 50 Gm7 C7/ G Gm7 C7/ G Gm7
= 50 Gm7 C7/ G Gm7 C7/ G Gm7
Violão acústico
Violão acústico
Violão acústico
Violão acústico

6 5 3 3 1 3
Violão acústico 63 35 33 3 3 31 3 33 3
5 53 33 3 23 2 33 3
Violão acústico 635 55 33 3
3 3 2131 2
3 33 3
3
Violão acústico 3 63 3 35 3 3 3 3 3 3 3 3 3
Violão acústico 3 35 3 35 3 33 3 3 233 3 2 3 33 3 3 3
5 5 3 3 2 2 3 3
3 3 3 3 3 3 3 3
3 3 3 3 3 3 3 3
C 7/ G Gm7 C 7/ G Gm7
3 C 7/ G Gm7 C 7/ G Gm C 7/ G Gm7
3
C 7/ G Gm7 C 7/ G Gm C 7/ G Gm7
3 C 7/ G Gm7 C 7/ G Gm C 7/ G Gm7
Viol. 3 C 7/ G Gm
Viol.
Viol.
Viol.

6 5 3 3 1 6 5 3 3
Viol. 63 35 33 3 3 31 3 0 63 35 33 3 3
5 53 33 3 23 2 00 5 53 33 3
Viol. 635 55 33 3
3 3 2113 2
3
001 635 55 33 3
3 3
Viol. 63 3 53 3 33 3 3 3 3 3 63 53 33 3 3
Viol. 53 53 33 3 3 233 2 3 031 3
53
3
53
3
33 3 3
5 3 5 3 3 3 2 3 2 031 3 5 3 5 3 3 3
3 3 3 3 3 31 3 3 3 3
3 3 3 3 3 3 3 3 3 3

6 C 7/ G Gm7 C7G C 7/ G Gm7


6 C 7/ G Gm7 C7G C 7/ G Gm7 3
C 7/ G Gm7 C7G C 7/ G Gm7 3
Viol.
6
6 C 7/ G Gm7 C7G C 7/ G Gm7 3
Viol. 3
Viol.
Viol.

1 3 6 5 3 3 1
Viol. 31 3 33 3 63 35 33 3 3 31 3 0
23 2 3 33 3 3 5 53 33 3 23 2 3 00
Viol. 2131 2 33 3 3 635 55 33 3
3 3 2131 2 3 001
Viol. 3 3 3 33 3 63 3 35 3 33 3 3 3 3
Viol. 233 3 3 3 3 3 35 35 3 3 233 3 031 3 2
2 3 22 33 3 5 3 5 3 33 3
3 2 3 22 031 3 2
3 3 3 3 3 3 3 3 3 13 3 2
3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 2
3
9 Gm/ F Em7♭5 E♭ D7 Gm7 3
9 Gm/ F Em7♭5 3 E♭ D7 Gm7 3
Gm/ F Em7♭5 3 E♭ D7 Gm7
Viol.
9
9 Gm/ F Em7♭5 3 E♭ D7 Gm7
Viol. 3
Viol.
Viol.

3 1 1 3
Viol. 3 3 1 1 3 0 0 0 3 2 5 3 3 2 2 3 3
3 3 1 1 3 0 2 0 2 2 0 53 2 45 5 53 5 3 2 5 23 3
Viol. 2 0 2 2 0 65 54 5 55 5 5 5 3
Viol. 1 33 3 1 1 33 00 0 6353 2 55 3353 3 3 2 23 35 63
Viol. 1 0 2 0 2 2 0 2 45 5 53 5 3 3 2 5 23 3
6
2 2 2 65 45 5 5 5 5 3 5
1 0 6 5 35 3 5 6
1 0 3 3 3 6
3
3 VIOLÃO+ • 57
3
siderurgia
C m7
14 F♯dim F7sus4 F7 B♭maj7 3 3 B♭7

Viol.
3 3

3 3 6 5 3 1 3
4 4 4 4 4 1 4 3 3 3 6 4 3
Viol. 3 5 3 2 2 2 3
4 3 3 3 3 3
3 1 1
6 5 4

3 3 3 3

18 E♭ Em7♭5 3 B♭/ F Gm7 Gm/ F Em7♭5

Viol.

3 3

3 3 8 6 5
Viol. 3 3 3 5 5 7 10 9 7
5 5 5 5 5 5 8 5 5 8 7 8 5
6 6 7 8 10 8 7 10

3 3 3

E♭ D7 Gm7 C 7/ G Gm7 C7/ G


23

Viol.

1 0
3 3 1
Viol. 3 2 2 2 5 3 3 3 3 3 3 3
5 4 5 5 5 5 5 5 5 3 3 2 2
6 5
3 3 3 3 3 3

Gm7 C 7/ G C 7/ G Gm7 C7/ G


26
Gm7

Viol.

1 0 1 0
3 3 3 1
Viol. 3 3 3 3 3 3 3 3 0 3 3
3 3 5 5 3 3 2 2 0 5 5
1
3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3

58 • VIOLÃO+
siderurgia
Gm7 C7/ G Gm7 C 7/ G Gm7 C 7/ G Gm
29
3
Viol.

1 0
3 3 1 3 3 3 1
Viol. 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 0
3 3 2 2 3 3 5 5 3 3 2 2 0
1
3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 2

1.
33 Gm/ F Em7♭5E♭ D7 Gm7 % Cm7 F7 B♭maj7B♭7 E♭ Em7♭5 B♭/ F

Viol.
(Improviso sobre
a harmonia acima)

Viol.

2.
45 Gm7 Gm/ F Em7♭5 E♭ D7 Gm

Viol.

5
3 3 3 3 6
Viol. 3 3 3 5 3
1 5 0 4 5
3 1 0 3

VIOLÃO+ • 59
3
de ouvido

O universo
rítmico Parte 2 Reinaldo Garrido Russo
www.musikosofia.com.br
duemaestri@uol.com.br

Nesta edição, daremos continuidade à didática história


dos alunos e à escrita musical no estádio esportivo. Mas,
antes de qualquer coisa, devo deixar um depoimento
importante. Perceber com consciência e entender a
pulsação dentro de um discurso musical é o ponto mais
nobre para desenvolver a escrita rítmica. Entre os livros
que estudei sobre o aspecto rítmico, os mais importantes
foram os mais simples: ‘Guia teórico e prático – partes I
e II, de Pozzoli, e ‘Treinamento elementar para músicos’,
de Paul Hindemith. O primeiro é mais didático do que
parece ser e deve ser extremamente treinado após as
explanações desta e das próximas quatro edições da
revista. Criei muitos exercícios para serem utilizados
com o conhecido Pozzoli, e os mostrarei gradativamente.
O segundo livro é para ser explorado com a supervisão
de um professor bem capacitado em ritmo e melodia.
O leitor constatará coincidências entre a metodologia
e os números usados por mim e por Pozzoli, o que não
é à toa. Nesses anos, consegui identificar processos
de pensamentos bem diferentes entre os vários tipos
de alunos, e muitos deles apresentavam dificuldades
rítmicas porque não havia a devida introjeção dos
conceitos de pulsação e andamento. As dificuldades
apareciam quando células rítmicas se apresentavam
mais complexas ou o andamento variava. É óbvio que
esses fenômenos quase não ocorrem em canções
infantis ou folclóricas brasileiras. Não poderia garantir
a mesma facilidade em canções folclóricas de outros
países, como Bulgária e Hungria, por exemplo. Por isso
recomendo acuracidade na escolha da canção.

As anotações das ocorrências musicais no Jogo de


Voleibol - Continuação
Com toda confusão sonora no estádio, o grupo mantinha-
se sereno para fazer as devidas anotações, criando cada
60 • VIOLÃO+
de ouvido
um o seu jeito de escrever as ocorrências. De repente,
grande emoção tomou conta dos argentinos. Era a equipe
convidada, que adentrava à quadra. A primeira jogadora
a entrar foi a capitã Ana e, como num passe de mágica,
boa parte dos brados de “Ar-gen-ti-na, Ar-gen-ti-na’” foram
substituídos por “A-na, A-na”, com sílabas distribuídas no
tempo e no contratempo, igualmente como fizemos com
“Bra-sil”, encobrindo o canto brasileiro. Fez-se uma guerra
sonora entre A-na e Bra-sil, como mostra a figura seguinte:

Houve uma explosão de gritos e assobios quando o time


da casa, supercampeão, entrou em quadra com samba
no pé, graça, beleza e disposição. A torcida inflamou-se
e homenageando de pronto: Carolina* – nossa capitã
– líder e jogadora exemplar. Nesse momento a torcida
adversária teve que se conter nos gritos, pois cada sílaba
do nome ‘Ca-ro-li-na’ foi distribuída intuitivamente entre
uma pulsação e outra em quatro partes exatamente iguais,
dobrando a densidade sonora no estádio, ficando assim:

Pedi ao grupo para que criasse um símbolo que representasse


a localização das sílabas intermediárias, situadas entre o
tempo e o contratempo e entre o contratempo e o tempo
seguinte. Não foi minha surpresa quando o jovem autor da
notação preferida, mostrou sua nova ideia: uma simples
vírgula. Para melhor mostrar a ocorrência sonora, vamos
escrever apenas duas pulsações.
VIOLÃO+ • 61
de ouvido

Antes de avançar na leitura deste texto, reflita um pouco


sobre em que instantes ocorrem as sílabas de A-na e
Ca-ro-li-na. Tente observar quais sílabas coincidem no
tempo e no contratempo e quais sílabas estão solitárias
dentro do lapso de tempo.
Agora, o meu conselho ao leitor é gravar a voz da torcida
argentina e executar a voz da torcida brasileira. Se possuir
um app no celular para quatro vozes independentes,
tornará tudo mais fácil. Recomendo o Four Track Recorder,
que é gratuito. Nada melhor do que vivenciar a própria
experiência. Até a próxima edição.
* Ana Carolina é o nome de minha afilhada querida, que se
encaminha para ser mais artista do que já é.

Histórias do mestre
Não é possível escrever sobre o maestro sem passar pela famosa ‘Carta aberta
aos músicos e críticos do Brasil’. Na passagem de 1950 para 1951, o incêndio
que provocou no ambiente artístico tornou-se um marco na História da Música
Brasileira. Mas, antes de contar o ocorrido, devo dissertar sobre a época em
que o compositor Camargo Guarnieri1 a publicou.
Antes, na década de 1920, o país se deparou com o movimento liderado
por Mário de Andrade2, que tinha o intuito de fazer do Brasil um país com
pensamento artístico próprio e assim desvencilhar-se dos ditames europeus
que impressionavam sobremaneira o pensamento e a mente artística dos
críticos, diretores de escolas e artistas brasileiros. Tudo o que havia em matéria
de concertos era europeu: a música tonal e cromática – predominante – e a
música modal, em salas menores. Camargo Guarnieri teve sua mente cultural e
musical formada por seu mestre Mário de Andrade, músico e musicólogo, além
de ser portador de todo o cabedal que conhecemos na literatura. Seu maior
objetivo era explorar o que havia de melhor nas pequenas culturas espalhadas
por nosso país.
62 • VIOLÃO+
de ouvido
Na Europa, os compositores faziam a vanguarda com
a Música Dodecafônica, criada pelo compositor Arnold
Schöenberg3 e acatada por seus discípulos Alban Berg4 e
Anton Webern5. A composição, fundamentalmente mental,
tinha como base a arte pela arte – imposição do próprio
sistema de doze sons, que exigia critérios composicionais
de forja intelectual.
Na década de 1930, a técnica caiu como uma luva para os
compositores brasileiros que pretendiam fazer vanguarda
e não queriam ficar atrelados às regras estéticas
aconselhadas – e não impostas, como pensava Guarnieri – por Mário de Andrade.
Koellreutter incentivava a mente criativa, o novo, e era adepto do dodecafonismo
somente porque era o que havia de mais ousado na época.
Alguns trabalhos de pesquisa fazem relação da música tonal com as organizações
monárquicas. Entenda isso: o primeiro som da escala, a rainha Tônica, regendo
seus súditos – os graus restantes – e tendo como parceiros-ministros os Condes de
Dominante e de Subdominante. O movimento cromático, como o exerceu Richard
Wagner, utilizou e abusou dos meios tons na tentativa de descambar o totalitário
tonalismo.
O sistema dodecafônico* (doze sons ou doze notas) abriga a simples ideia de que
todos os sons são iguais em valor expressivo e composicional. Não se trata apenas
de uma escala dodecafônica, pois esta podemos tomar como a escala cromática
utilizada no tonalismo, mas é a serialização das notas dessa escala que tem o
valor maior para a composição. Isso equivale a dizer que todas as notas numa
composição podem ter o valor do repouso de uma tônica, e podemos, assim, fazer
valer a relação com o socialismo, ou mesmo o comunismo, tal qual o fizemos sobre
o tonalismo e a monarquia.
O Partido Comunista do Brasil (PCdoB), após o término da Segunda Grande Guerra,
tem papel fundamental nessa história quando acata as ordens vindas do Partido
Comunista Soviético na tentativa de destruir a vanguarda, fazendo uma cortina
de ferro para abrigar o folclore e os valores nacionais. Tudo isso acontecendo,
fervilhando e explodindo no início dos anos 1950.
Nossa história vai parar por aqui, porque além de ser empolgante demais, se tornará
muito complexo vislumbrar o que ocorria nas artes, especialmente na música, se
não fizermos, do todo, capítulos de uma novela. Ficará mais fácil assim, garanto.
Então, encerro o final do capítulo e até a próxima edição!

¹ Camargo Guarnieri, paulista, de Tietê (1907-1993).


² Mário de Andrade, paulista (1893-1945).
³ Arnold Schöenberg, vienense (1874-1951).
4 Alban Berg, vienense (1885-1935).
5Anton Webern (1883-1945).
* Para que entendamos o que vem a ser a música dodecafônica é preciso entender o que vem a ser a serialização dos
elementos musicais. A explanação disso virá na próxima edição.

VIOLÃO+ • 63
sete cordas

Violão 7 cordas:
primeiros passos Samuca Muniz
muniz.samuca@gmail.com

Parte 2

Nesta edição, daremos continuidade à matéria anterior,


falando sobre os primeiros passos para a criação de
frases no violão 7 cordas. A repercussão da matéria foi
muito boa; recebi e-mails perguntando como aplicar algo
parecido em uma tonalidade menor. Então, vamos lá!
Assim como na tonalidade maior, percebi que, quando
apareciam acordes como Dm7(b5), G7 e Cm (ou, como
costumamos dizer, II-V-I), eu poderia utilizar a escala de
Dó menor harmônica (Dó, Ré, Mib, Fá, Sol, Láb, Si) –
mesmo sabendo que as possibilidades de criação são
amplas. Mas, para o iniciante, é necessário simplificar os
caminhos. Dessa maneira, eu poderia fazer uso da mesma
escala em todos os exemplos, devendo, então, elaborar
pontos de partida e de chegada, deixando o fraseado
mais musical. Utilizei o cromatismo, quando necessário,
para solucionar a dificuldade de assimetria: temos sete
notas musicais e, geralmente, costumamos tocar grupos
de notas em números pares.

64 • VIOLÃO+
sete cordas

VIOLÃO+ • 65
sete cordas

Nos sete exemplos musicais acima, sempre utilizei


a escala de Dó menor harmônica. Fiquem atentos
e observem os pontos onde foi necessário o uso do
cromatismo para ganhar uma semicolcheia de tempo –
chegando, então, à nota desejada.
Bom estudo!

66 • VIOLÃO+
COMO TOCAR

Estudo 14 Op.60,
Matteo Carcassi
Ricardo Luccas
rnluccas@gmail.com

Nesta edição, vamos trabalhar e explicar a mecânica do


“Estudo 14” dos 25 Estudos Melódicos e Progressivos Op.
60, de Matteo Carcassi.
Quem quiser acompanhar em uma edição digitada e revisada
da obra, sugiro o livro do professor Henrique Pinto que faz
referência aos “25 Estudos Melódicos e Progressivos”.
Quem quiser acessar a partitura que usei, livre dos meus
rabiscos e anotações, está disponível gratuitamente aqui
(apenas modifiquei a diagramação para obter espaços de
anotação) e na internet.
O “Estudo 14” está na tonalidade de D, Ré maior. É uma
peça em que utilizamos bastante alternância entre os dedos
I e M (indicador e médio, da mão direita). Na mão esquerda
temos alguns saltos; fora isso não é muito complexa. A
velocidade é uma questão a ser trabalhada. Como sempre
digo, a digitação apresentada é uma sugestão. Se alguém
quiser propor outra, este é o canal, será muito bem-vindo.

Mecânica das mãos


Com relação aos códigos que usamos para estudar a
mecânica das mãos direita e esquerda presente nesta peça,
temos:
• Os números no início de cada linha da pauta se referem
ao número do compasso;
• O número 0 é indicação de corda solta;
• Os números 1, 2, 3 e 4 se referem aos dedos da mão
esquerda;
• O número dentro de um círculo representa a corda a ser
tocada;
• Os algarismos romanos representam a posição do dedo 1
da mão esquerda em relação à casa no braço do instrumento;
• A letra C na digitação representa cejilla – pestana. O C,
quando cortado, representa meia pestana (em geral até a
3ª ou 4ª corda). Ela aparece acompanhada de um número,
que se refere à casa;
VIOLÃO+ • 67
COMO TOCAR
• AL – ataque longitudinal da mão esquerda em relação ao
braço do instrumento (os dedos ficam paralelos e de frente
ao braço);
• AO – ataque oblíquo da mão esquerda em relação ao
braço do instrumento (os dedos ficam oblíquos em relação
ao braço do instrumento e o cotovelo se posiciona mais
aberto ou mais fechado do que na posição em AL);
• Aprox. – aproximar o dedo de determinada corda; em geral
esse dedo está livre;
• Prep. – preparar o dedo que vai entrar em ação, normalmente
se refere a um dedo em uso até o último momento antes da
mudança;
• ¨ Quadrado – o quadrado desenhado em determinada
nota de corda solta deve ser usado para marcar o salto, a
mudança de posição;
• s Triângulo invertido – indica a mudança de eixo, a
rotação em torno de determinado dedo, conforme anotação
do número do dedo sobre o triângulo;
• Traço (-) – indica dedo guia; a movimentação da mão se
dará em função do dedo, por exemplo, 1 - 1;
• Traço (-) – também indica alargamento de posição quando
o traço aparece entre números diferentes, ou seja, dedos
diferentes, por exemplo, 1 - 2: se o dedo 1 estiver na 1ª
casa o dedo 2 tocará na 3ª casa.
• Cruz – indica movimentação de dedo com indicação de
cruzamento no movimento, por exemplo, em determinada
posição o dedo 2 está na 4ª corda casa 5, e o dedo 3 logo
abaixo na 3ª corda e casa 5; na próxima posição o dedo 3
estará na 4ª corda casa 5, e o dedo 2 estará na 3ª corda casa
4, gerando cruzamento de dedos na mudança de posição.
• As letras P, I, M e A se referem aos dedos polegar, indicador,
médio e anular da mão direita. Nesta peça, todas as notas
com a haste para baixo devem ser tocadas pelo polegar;
• CO – mão direita com colocação oblíqua; o “Estudo 3” é
uma peça em arpejos, e a mão direita estará sempre em
colocação oblíqua;
• CL – mão direita com colocação lateral.
• A mão direita deve estar “imóvel” quando movimentamos
os dedos; o movimento não deve surgir da mão.

O desafio continua: escolha uma peça que esteja estudando


e solicite a análise mecânica e dicas para execução.
68 • VIOLÃO+
COMO TOCAR

VIOLÃO+ • 69
VIOLÃO & FILOSOFIA

Equilíbrio
Felipe Coelho
Nesta edição trago uma questão filosófica de notável coelhoexperiment@gmail.com
importância para quem toca música profissionalmente,
pois, uma vez que refletirmos sobre tal assunto, certamente
teremos uma abordagem mais consciente e eficaz para
nosso desenvolvimento: o músico deve tocar música para
si mesmo ou para os outros?
É uma pergunta clássica, a qual já ouvi diferentes
respostas. Talvez, de fato, a resposta possa ser diferente,
dependendo de sua intenção e sua relação com a música.
Por isso esclareço, antes de apontar o que creio ser a
melhor resposta, que minha perspectiva serve àqueles
que almejam uma relação profissional e artística com a
música, que buscam o crescimento e desenvolvimento de
suas carreiras de forma saudável.
A resposta é o equilíbrio. Se tocamos pensando no público,
percebemos que a maior parte dele tende a gostar apenas
daquilo que já conhece. Aí, caímos na armadilha do “cover”:
agradamos a todos, porém não há desenvolvimento,
desafio, criatividade ou expressão original verdadeira,
tampouco exploração de seus mais profundos potenciais.
Se compusermos música buscando os moldes mais
populares, além das limitações acima citadas, também
cairemos na “guerra dos clones”: músicos que acreditam
estarem prestes a “estourar” com um hit, investindo
grandes quantias em produção e comerciais na internet,
sem perceber serem apenas mais um em um milhão.
Se o músico toca apenas para si, esquece que o primeiro
fundamento da música é que ela existe para ser ouvida,
entreter e agradar. Quem não considera o público também
vai vender menos. Entra numa espiral egoísta de desafiar
os próprios limites frente ao público, desrespeitando os
ouvidos de quem foi ali buscando um momento de lazer. Isso
é comum, principalmente, com a música instrumental e o
jazz: o músico assume que a mesma, por ser instrumental, é
naturalmente boa, tratando-a sem o menor cuidado, testando
suas capacidades ao limite, errando mais do que acertando.
Apenas engana a si mesmo e aos que compram sua atuação
dramática. A boa música dali já foi embora há tempo.
70 • VIOLÃO+
VIOLÃO & FILOSOFIA
O bom artista é um equilibrista: um bom observador do
mundo, que sabe se colocar na visão do outro, até mesmo
do leigo, enquanto também olha para dentro. Busca estar
antenado em relação a suas escolhas de repertório e
execução, explorando o próprio potencial enquanto discerne
o agradável do desagradável. Respeita o público, que lhe
doou tempo e ouvidos, buscando passar emoções, só
garantidas no fraseado certeiro, garantindo a construção de
seu público. Permite que sua criatividade e personalidade
venham à tona e usa sua técnica com consciência de onde
deve parar, antes de machucar o som, e, consequentemente,
os ouvidos de quem o escuta – assim como o motorista de
um carro que faz uma curva sem perder o controle. Equilibra
a complexidade com a simplicidade, apenas usando artigos
teóricos quando se traduzem em prazer sonoro.
Por fim, reitero que minha resposta serve para profissionais
da arte. Já para aqueles que apenas queiram curtir uma
melodia em casa, tocar para si é delicioso. E para aqueles
que queiram tirar um trocado e aparecerem bonitos num palco
iluminado, tocar só para o público pode ser divertido.

Quer aprender a
tocar blues?
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(solos/Play Along)

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Mauricio Pedrosa www.teclaseafins.com.br VIOLÃO+ • 71


VIOLA caipira

Violasssss...
Fábio Miranda
Quando se fala em viola www.fabiomirandavioleiro.com
fabiosouzamiranda@gmail.com
Logo vem na minha mente
Um pinho chei de corda
Esticada e reluzente
Lá vem o cheiro do mato
Do sertão e do repente
Da palhoça do mangueiro
Das festas do povo crente
Só im pensá na tar da viola
O pensamento vai-se embora
E o coração fica sorridente

Se engana redondamente
Quem pensa que viola é uma só
Viola é só o nome
A verdade é bem maió
Tem tudo tipo de viola
É só olha nos arredó
Tem viola de dez corda
E viola de uma corda só
A viola é bem variada
Porque ela foi inventada
Pra trás dos tempo das avó

Viola já quer ser gente


Sente frio e sente fome
Tem viola que é muié
Tem viola que é home
Viola também tem medo
De saci e lobisome
Quando tá entristecida
o som baixa que até some
vocês tudo pode crê
toda viola quer tê
o seu próprio sobrenome

72 • VIOLÃO+
VIOLA caipira

Viola de cocho ou de buriti Viola de cocho


de fandango ou nordestina
viola é de arame Viola de machete
antes era de tripa
de machete, de cabaça
descende das velhas lira Viola de fandango
todo lugar tem viola
e viola também respira Viola nordestina
o pinho brotou do chão
floreceu lá no sertão
Viola caipira
e ficou bem caipira

VIOLÃO+ • 73
fLamenco

Introdução ao
flamenco
Diego Salvetti
dgsalvetti@gmail.com

Olá pessoal! Que prazer poder escrever nesta maravilhosa


revista. Agradeço ao Luis Stelzer pelo convite e por ter
pensado em mim para poder retomar a coluna de flamenco
em Violão+.
Sou violonista e compositor, italiano, radicado no Brasil há
pouco mais de dois anos. Atualmente, toco com violão de
8 cordas e tenho um projeto de músicas autorais em solo
e grupo. Minha formação acadêmica vem do violão erudito:
estudei e me formei em violão clássico na faculdade musical
G. Donizetti, de Bergamo, na Itália. Depois dos estudos
eruditos, comecei a me aprofundar no flamenco (que desde
pequeno foi a minha paixão principal) e em música brasileira.
Hoje, tento misturar essas influências de estilos dentro de
minhas músicas, buscando sempre fazer algo original.
Não me considero violonista de flamenco tradicional: dentro
dessa visão me sentiria um pouco restrito. Digamos que
utilizo as técnicas e os ritmos flamencos a favor do simples
fato de fazer música, sem querer me agarrar a um estilo
especifico. Inclusive, estou escrevendo um livro de técnica
e peças para violão clássico e flamenco, onde o objetivo
principal é justamente o de mostrar pontos em comum entre
as duas maneira de tocar e pensar o violão (pretendo acabar
até o fim desse ano!).
Mas o convite, aqui na revista, é de escrever especificamente
sobre flamenco, trazer um pouco de história e alguns
exercícios práticos específicos da técnica e do estilo. Então,
vamos lá!

As raízes do elemento gitano


O violão flamenco - e em geral a arte flamenca - está ganhando
cada vez sempre mais espaço no panorama mundial. Aqui
no Brasil, por exemplo, vários festivais nasceram nesses
últimos anos e sempre mais pessoas se apaixonam por
essa linguagem artística tão fascinante.
Historicamente falando, as primeiras noticias desse novo
74 • VIOLÃO+
fLamenco
gênero musical chamado flamenco, nascido na Andaluzia
(região localizada na parte meridional da Espanha), surgem
somente entre 1830 e 1850. Características estéticas e
musicais particulares fazem que o flamenco se diferencie
claramente da tradição folclórica andaluz que estava já
presente naquela região.
O termo flamenco vem da união das palavras “felag”
(cultivador) e “mengu” (nômade, foragido) e entra no uso
linguístico como sinónimo de Gitanos no século 18.
O flamenco é uma arte popular que nasce em um contexto
que pertence a classes sociais populares. Embora seja
“popular”, ele é seletivo e não acessível à maioria da
população. É uma arte complexa, virtuosa e, às vezes, difícil
de entender e até mesmo de criar. É uma arte que nasceu
e se desenvolveu nas cidades e não de origem rural, como
o folclore.
Por causa da sua particular origem, o flamenco é um gênero
musical emblemático de uma das principais funções da
música: ser veículo e memória da cultura, da tradição e da
história de um povo.
O lugar de origem dos gitanos é situado no atual Paquistão,
chamada Sind, de onde foram exiliados em seguida a uma
série de conflitos e invasões. A começar desse momento,
começou uma longa história de nomadismo, passando

VIOLÃO+ • 75
fLamenco
por Egito, República Checa, Eslováquia e, enfim, durante
o século 15, a formação de três grupos de nômades mais
estáveis nos Balcãs, na Itália, na França e na Espanha.
De fato, somente a partir do século 15 começamos a dispor de
documentos sobre a chegada das tribos gitanas à Espanha.
Mesmo esses documentos testemunham a chegada no país
através do Reino de Aragão, mas não podemos descartar a
hipótese da chegada através do Reino de Granada, do Norte
África, antes que fosse conquistado pelos reis católicos em
1492. Durante a conquista do Ocidente, os gitanos seguiram
pelo menos duas grandes rotas: uma através da Europa e a
outra pelo Oriente Médio e o norte da África, passando pelo
Egito. Por isso o apelativo aegiptanos-giptanos-gitanos, e o
contato direto com os países de cultura árabe.
A Andaluzia, região com uma tradição cultural e científica

76 • VIOLÃO+
fLamenco
multiétnica , entre todos, foi o lugar em que a tradição gitana
encontrou as melhores condições para a sua integração.
Ali, os gitanos adaptaram a cultura deles, latinizando os
nomes, mesclando a língua deles com o castelhano e se
integrando com a sociedade, por meio de um difícil processo,
que durou vários séculos. Durante os séculos 15 a 17, os
gitanos foram vitimas, junto aos árabes e aos hebreus, de
intensas persecuções católicas. Foram proibidos de falar
a língua deles. Muitos se refugiaram nas montanhas para
fugir da conversão religiosa.
Foi nessa fase histórica que a cultura musical se mescla com
a árabe e a hebraica e se torna expressão de uma rebelião
escondida. Os cantaores de flamenco eram convidados nas
cortes dos aristocráticos como “menestréis” e denunciavam
as opressões nos textos das músicas em língua Caló (dialeto
dos gitanos) na frente dos mesmos perseguidores, que,
obviamente, não entendiam o significado.

Alzapúa (técnica do polegar): aqui tudo começou!


Fiz questão de começar de onde tudo começou. Então vou
passar três exercícios para polegar e alzapúa.
Geralmente, em sala de aula ou em vários workshops
que já ministrei, percebo como os violonistas ficam muito
interessados por essa técnica tão específica do flamenco.
Mesmo alguns que não tocam flamenco a conhecem, a
tocam e a aplicam.
É uma técnica que, historicamente falando, vem do abandono
da utilização da pua, palheta típica do alaúde árabe, para
poder tocar com os dedos (neste caso, com o polegar).
Sabemos que o uso do plectro na música da antiguidade
esteve presente também na música popular, mas a sua
utilização era sujeita à impossibilidade de execução de
repertórios mais completos do ponto de vista polifônico,
onde era preciso tocar mais notas do acorde de maneira
simultânea (isso sobretudo a partir do momento em que os
instrumentos musicais foram gradativamente introduzidos
na liturgia das igrejas). Também por isso, a necessidade de
se tocar com os dedos.
Por isso, a alzapúa foi uma das primeiras técnicas de guitarra
flamenca que nasceu. Consiste em fazer o movimento do
polegar não somente de cima para baixo, mas de baixo para
cima também. Daí o nome de ‘alza-pua’.
VIOLÃO+ • 77
fLamenco

Exercício 1 - Pulgar
Diego Salvetti

78 • VIOLÃO+
fLamenco

Exercício 2 - Alzapúa
Exercício
Exercício 22
Exercício
(alzapúa) 2
Exercício
(alzapúa) 2
Exercício
(alzapúa) 2
(alzapúa)
DiegoSalvetti
Diego Salvetti
Diego Salvetti
Diego Salvetti
(alzapúa) Diego Salvetti
Diego Salvetti

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0 7 5 4 0 5 5 4 0 5 7 4 0 7 5 4 0 5 3 2 0 3 5 2 0 5 3 2 0 3
5 4 5 7 4 7 5 4 5 5 4 5 7 4 7 5 4 5 3 2 3 5 2 5 3 2 3

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3 2 0 3 5 2 0 5 3 2 0 3 2 1 2 2 3 1 2 3 2 1 2 2 0 1 2 0 3 1 2 3 2 0 1 2
3 2 3 5 2 5 3 2 3 2 1 2 3 1 3 2 1 2 0 1 0 3 1 3 2 0 1 2

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2 2 2 2 2 2 2 2 2 2 7 5 0 7 9 5 0 9 7 5 0 7
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3 2 2 3 2 2 2 2 0 2 2 0 3 2 2 3 2 2 2 2 7 5 7 9 5 9 7 5 7
3 2 2 3 2 2 2 2 0 2 2 0 3 2 2 3 2 2 2 2 7 7 9 9 7 7

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7 5 7 9 5 9 7 5 7 5 4 5 7 4 7 5 4 5 5 4 5 7 4 7 5 4 5
7 5 7 9 5 9 7 5 7 5 4 5 7 4 7 5 4 5 5 4 5 7 4 7 5 4 5
7 7 9 9 7 7 5 5 7 7 5 5 5 5 7 7 5 5

VIOLÃO+ • 79
fLamenco

Exercício 3 - Alzapúa por buleria


Diego Salvetti

80 • VIOLÃO+
em grupo

Iniciação ao
toque sem apoio Thales Maestre
thalesmaestre@gmail.com

Nesta edição, farei uma breve descrição de como oriento


minhas classes de violão na iniciação do trabalho técnico de
mão direita com toque sem apoio. Em um ambiente coletivo
de aprendizagem, é importante tratar as questões técnicas
de forma padronizada, com a finalidade de estabelecer
objetivos claros, sobre os quais os alunos deverão pensar
no momento do estudo. O padrão baseia-se em princípios
elementares, norteadores do trabalho técnico, tais como
relaxamento, colocação de mão, forma, ou seja, diretrizes
comuns por meio das quais cada aluno construirá sua
técnica, respeitando suas características individuais.
Embora eu proponha um padrão, sabemos que não é
possível que todos os alunos de uma mesma classe toquem
da mesma forma. Características anatômicas e aspectos
do desenvolvimento psicomotor diferem de um aluno para
o outro, e tais elementos devem ser considerados para que
tomem consciência de seu corpo e criem condições para a
aquisição de uma técnica adequada. Cabe ao professor o
papel de mediador desse processo, ciente de que, mesmo
no ambiente coletivo, deve-se avaliar as necessidades do
aluno de maneira individualizada.
A sequência didática que proponho aqui é um complemento
da exposta na edição 19 de Violão+, na qual abordei a
construção da forma dos acordes – quando já se espera
que o aluno tenha conquistado o domínio técnico do que
proponho agora.

Passo a passo
1. Pedir para que os alunos memorizem quatro palavras:
a) forma;
b) posicionamento;
c) contato;
d) toque;
VIOLÃO+ • 81
em grupo
2. Refletir sobre memorização e aprendizado: memorizar
nem sempre significa aprender, portanto, é preciso saber
pensar o significado de cada palavra memorizada em
relação ao trabalho técnico proposto. Procure colocar
ideias claras sobre cada palavra, associando-as a dicas
que serão úteis no momento em que o aluno estiver
praticando sozinho, pois, se souber pensar sobre o que
está fazendo e quais são os objetivos, mais efetivo será
o seu estudo.
Exemplos:
a) Forma – imaginar que está segurando uma bola de
tênis na mão direita; a mão fica arredondada.
b) Posicionamento – posicionar a mão direita de modo
que os “ossinhos” (mostrar o osso da região da base das
falanges proximais) fiquem próximos da região (corda)
que será tocada;
c) Contato – é onde existe o ponto de contato do dedo
com a corda, que se dá por baixo da mesma.
d) Toque – o professor poderá mostrar o movimento do
dedo indicador com a mão suspensa, distante do violão, e
pedir para que os alunos descrevam o que estão vendo, até
que reúnam observações que servirão como boas dicas:
o dedo move-se inteiro; “para dentro”; não mobilidade da
mão (somente do dedo).
Para mostrar o movimento do toque sugiro recorrer ao
exagero. O exagero consiste em realizar um movimento
de dedo inteiro, para dentro, fazendo com que a ponta do
dedo encoste na palma da mão. O movimento exagerado
ajuda o aluno a assimilar a ideia de como movimentar o
dedo inteiro, desde a base. Esse movimento, aplicado
na corda de forma relaxada e por meio de um ataque
preciso, faz que a projeção sonora seja satisfatória, pois
tira-se proveito do peso do dedo. Eis que entra o próximo
passo: aplicar as ideias no instrumento.

3. Repassar, de maneira prática, cada uma das etapas


descritas anteriormente. É a hora de a turma experimentar
no instrumento, com o direcionamento do professor.
a) Escolha o dedo indicador para tocar a corda 3;
b) Repasse cada etapa descrita acima até chegar no
“contato”;
c) Finalmente, ocorrerá o toque.
82 • VIOLÃO+
em grupo
4. O professor notará diferenças nas respostas dos
alunos no que se refere à ação pós-toque, que deve ser
o relaxamento do dedo. Muitos alunos mantêm o dedo
flexionado, acumulando tensão. Nesse momento, cabe
uma análise profunda, fragmentando em três ações –
contato, ataque e relaxamento – o que ocorre no instante
em que tocamos. Realizar cada ação, obedecendo a
uma pulsação pré-determinada tornará consciente cada
movimento. Exemplo:
a) 2 tempos para cada ação:
Contato: inicia-se na cabeça do tempo 1 – com duração
até o tempo 2.
Ataque: na cabeça do tempo 1 – e o dedo tensionado
no tempo 2 (para tornar consciente que houve a tensão
natural do dedo que trabalhou, que foi flexionado para
dentro em decorrência do ataque.
Relaxamento: relaxar o dedo no tempo 1 – com duração
até o tempo 2.
b) fazer o mesmo processo com um tempo para cada
item;
c) fazer o toque sem a fragmentação em tempos; contato
e toque se dão praticamente ao mesmo tempo, seguidos
de imediato relaxamento.

5. Assimilado o mecanismo, o professor deve associar os


objetivos técnicos com os musicais. Um estudo de técnica
pura de mão direita em cordas soltas deve objetivar:
a) Regularidade rítmica;
b) Regularidade de intensidade (máximo de som com
máximo de beleza);
c) Matização de timbres.
Esses objetivos musicais farão que o aluno associe o
trabalho mecânico a algum objetivo sonoro. A grande meta
será produzir um som igual ao outro (mesma duração-
corpo-cor).

6. Realizar o exercício com indicador, médio e anular nas


cordas 3, 2 e 1, respectivamente, obedecendo as etapas
descritas.

Acesse o vídeo, que auxiliará a compreensão dessa


sequência didática! Até a próxima!
VIOLÃO+ • 83
coda

Inspiração
Luis Stelzer

Há dias que são muito difíceis, não é mesmo? As coisas


não vão bem, parece que nada está no lugar nessa vida,
nada é como deveria ser. Para você, acontece a mesma
coisa? Pois é, para mim, tem dias que são assim, do
começo ao fim

Alguns momentos são bem difíceis. página final de uma revista que fala
Outros, inexplicáveis. Fico me de coisas tão boas, que é tão bonita,
perguntando, num momento como o que traz um mundo de informações
que vive nosso País atualmente, no prazerosas? É meio que para dar um
que vale a pena. Essa instabilidade recado. Mais precisamente, para fazer
política extrema, essa roubalheira sem um pedido.
fim, esse abandono às classes menos Você que é amante da música, que
favorecidas, essa subserviência de produz música, toca, compõe, arranja.
quem deveria brigar Você que escuta,
pelos seus direitos, que se emociona.
intolerância, não Música é reflexão. Estamos Você que ensina
acolhimento, fazendo bem isso? Ou música, que
ânimos à flor da compartilha. É,
pele. As redes
estamos nos deixando tomar você mesmo: não
sociais, poderosa por essa nuvem de tristeza, deixe, nunca, de
ferramenta
pode servir para
que
de sentimentos ruins, de fazer isso! E faça
cada vez mais,
o encontro, tem intolerância, de radicalismo cada vez melhor,
amplificado muito exacerbado, de falta de escuta para cada vez
esse debate raso, mais pessoas. A
essa loucura. ao próximo? música é ponto
Briga-se em política de encontro, de
tão irresponsavelmente quanto num alegria, de sentimentos profundos.
jogo de futebol, a torcida de cá versus Música é reflexão. Estamos fazendo
a torcida de lá. Escuta, profundidade, bem isso? Ou estamos nos deixando
evolução, xi, esquece! A economia, tomar por essa nuvem de tristeza, de
parada, mandando nos humores das sentimentos ruins, de intolerância, de
pessoas. Violência. radicalismo exacerbado, de falta de
Mas o que isso tem a ver com uma escuta ao próximo?
84 • VIOLÃO+
coda
Nos lembremos que a diferença é a raiz usada, em momentos tão agudos como
do debate. Que o debate é forma de o que estamos vivendo, como ponto de
crescimento humano. Que o encontro encontro, de reflexão, de debate sadio,
pode e deve ser uma coisa que emane de união. De acolhimento a quem está
prazer. O ato de levar um violão a precisando, ou mesmo a quem não
um encontro entre amigos já muda esteja precisando, porque, de verdade,
o ambiente. Lógico, vai ter sempre o todo mundo precisa. Seja no gênero que
chato que vai torcer o nariz e dizer: for, tocada ao vivo ou mecanicamente,
lá vem aquele metido do violão... numa orquestra ou num celular. Não
Paciência! Chato existe em todo lugar, importa. O convite é simples: vamos nos
não é mesmo? entender, nos divertir, chegar a um lugar
Gosto muito de encontrar velhos amigos. melhor do que estamos? Vamos usar a
Novos também, mas os velhos amigos música, a viola, o violão, o cavaquinho,
dão aquele ar de cumplicidade. Tenho a voz, para nos ajudar?
a felicidade de conviver com várias
turmas, de conversar com pessoas
muito diferentes de mim. E achar isso
bom! E o violão se torna, muitas
vezes, ponte para que esse
encontro flua bem.
A música, através dos séculos, já serviu
muito às guerras, é verdade. Mas tem um
poder tão grande, que pode e deve ser

VIOLÃO+ • 85

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