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L E I N° 9.610, D E 19 D E F E V E R E IR O D E 1998.(Legislação de Direitos Autorais)
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PUC-SP
Reitor: Antonio Carlos Caruso Ronca
Vice-Reitora Acadêmica'. Sueli Cristina Marquesi

EDUC - Editora da PUC-SP


Conselho E ditorial: Ana Maria Rapassi, Bernardete A. G atti, Dino
Preci, José Roberto Pretel Pereira Job, Maria do Carmo Guedes,
Maura Pardini Bicudo Véras, Onésimo de Oliveira Cardoso, Scipione
Di Pierrô Netto, Sueli Cristina Marquesi (Presidente).

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Maria de Lourdes Bara Zanotto

FO RM AÇÃO DE PROFESSORES:
a contribuição da análise do comportamento

UFBA - Fúcuidode de Educação


■Biblioteca Anísio Teixeira

CÔí-tlTt OGS
PfiOOÜTOHESOA.
CftfQRkW
ÇÀO
EDUCAC«MMt edte 0JAPBSP
São Paulo
2000

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© A u ro ra , D ire ito s de reprodu ção: E D U C


Feito o d e p ó sito le g a l
Ficha C atalogcáfica e lab o rad a pela
B ib lio te c a R eito ra N ad ir G o u v ê a K fo u r i — P U C -S P

Zanotto, Maria dc Loudes Bara


Formação de professores: a contribuição da análise do comportamento /
Maria dc Lourdes Bara Zanotto — São Paulo : EDUC, 2000.
183 p. ; 21 cm
Bibliografia,
ISBN 8 5 -2 8 3 -0 2 2 9 -6
1. Skinner, Burrhus Frederic, 19 0 4 -1 9 9 0 . 2. Profe$sores-Forma-
ção. 3. Ênsíno. 4, Comportamento. I. Tífuio.
Originalmente apresentado para obtenção de grau de Doúcor em
Psicologia da Educação — PUC-SP.
CD D 370.7 L
371
________ _________ _____________________ ___________150_________

EDUC —Editora da PUC-SP


Direção ■
Maria do Carmo Guedes
Maria Eliza Mazzilli Pereira
Produção Editorial
Maria Eliza Mazzilli Pereira
Preparação
Paulo Sergio de Carvalho
Revisão
Sotiia Rangel
Editoração Eletrônica
Elaine Cristine Fernandes da Silva
Capa
Realização: Waidir Antoniq Alves

e d u c - Editora da PUC-SP
Rua Ministro Godói, 1213
CEP 0501.5-001 - São Paulo - SP
Telefax.: (011) 3873-3359/3672-6003
E mail: educ@pucsp.br

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Ao Sergio Vasconcelos de Luna e


à M aria Eliza Mazzilli Pereira.

Pelas m uitas lições de solidariedade

o meu maior respeito,


o meu melhor afeto.

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PREFÁCIO

Recentem ente, tive a oportunidade de refletir sobre as


contribuições de Skinner para a educação nos últimos 3 0
anos. O texto resultante continha um a introdução que jul­
go bastante oportuna para os propósitos de apresentaçào tan­
to de Skinner quanto da obra d a professora M aria de Lour-
des Zanotto. Por esta razão, peço licença para reproduzir
um pequeno trecho daquela introdução.

Recuperar 30 anos da contribuição de Skinner para a educa­


ção é uma tarefa no nunimo peculiar Suas principais «mri-
buições para a psicologia consistiram em propor e ap imorar
a filosofia de uma ciência —o behaviorísmo radical —e es­
tabelecer as bases desta ciência —que ele denominou aná­
lise experimental do comportamento. Nesta trajerória, ele
analisou quase todos os grandes problemas relacionados ao
homem, naquilo que diz respeito à psicologia, fosse como
compromisso pessoal/profissional, fosse como maneira de
• testar a adequaçao do sistema de análise, fosse ainda como
resposta a seus críticos. Entre estes problemas, certamente,
inclui-se a educaçao, mas isto não o torna um psi .ólogo
educacional e nem mesmo é possível dizer que ele tenha
trabalhado sistematicamente nesta área. Assim sendo falar
da contribuição de Skinner para a educação significa falar
das bases que ele estabeleceu ào estender sua filosofia aos pro­

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FORM AÇÃO DE PROFESSORES

blemas educacionaii, das interpretações que ele fez dos


problemas educacionais com base nos princípios estabele­
cidos pela pesquisa em análise experimental do comporta­
mento (neste caso, compondo a que veio a ser chamado
anáhse do comportamento).

A leitu ra corrida dos vários texcos de Skinner sobre a


educação evidencia peculiaridades bastante in téressantes e
que falam da coerência de suas análises. Os temas abordados
são, ao longo dos anos, ampliados ou dissecados, m as p e r­
m anecem basicam ente os m esm os. Do ponto de vista do
aluno: a ênfase na sua atividade, a necessidade de se res­
peitarem seu ritm o próprio e sua história de vida, um p la ­
nejam ento capaz de, por um lado, tornar a aprendizagem
algo reforçador (aí im plicada a elim inação de todo e q u a l­
quer uso de contingências aversivas) e, de outro, g aran tir
un ensino que .promova, um indivíduo cada vez mais capaz
de geren ciar sua aprendizagem e de prescindir de in te r­
m ediários. Do ponto de vista do professor, a ênfase foi sempre
a de conceber sua advidade como planejada com base em ,
orientada por e reavaliada em função do aluno FínalmeiV-
te, Sk nner não descuida da consideração da educação como
parte de um com plexo sistem a, influenciando todas as d e ­
m ais in stân cias.
Esta constância nr p roblem áti:a e n fa d a d a por Skinner,
ao longo dos anos, poderia soar como estagnação, não fosse
um a segunda peculiaridade constatada em sua obra sobre
a educação: a atualidade dos problem as discutidos em suas
análises. Por m ais desalentador que isto possa ser, os textos
de Skinner são fartos em exemplos e em explicações do caráter
crônico dos problemas educacionais.

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PREFÁCIO 9

Finalmente, o conjunto de sua obra evidencia que a


grande maioria de suas análises transcende o caráter locai
do contexto (norte-am ericano) no qual ele se baseia, A pro­
blem ática enfatizada, em geral, vale, ponto por ponto, p ara
aquela com a qual nos defrontamos dentro do.sistem a e d u ­
cacional brasileiro.
Este caráter quase atemporal das análises de Skinner
e a generalidade que se evidencia em suas análises não sáo
circunstanciais, não decorrem do acaso. Ao contrário,, são
fruto da maneira pela qual ele aborda a questão educacional
(por sinal, a m esm a que ele sempre usou em outras a tiv i­
dades Inumanas). Valendo-se de um conjunto de pressupos­
tos macrossociaís (a educação, por exem plo, é vista como
um dos fatores imporcantes na análise e no planejam ento
d a sobrevivência, d a cultura) e de um conjunto de princípios
estabelecidos com base em pesquisa sobre o ensino-apren-
dizagem , Skinner passa a analisar o com portam ento da e s­
cola em geral, e do professor em p articu lar, naquilo q u e
ambos cêrn de responsabilidade m aior: responder efetiva­
m ente pela transform ação do aluno em direção a um in d i­
víduo com petente e autônomo, pronto para responder às
transformações que virá a enfrentar (o que ele cham a d e
educar para o futuro). Nesta visão, não cabe culpar as con­
dições adversas ao ensino e à ap rendizagem ; cabe, sim ,
aprender a lidar com elas como parte das condições sob as
quais o aluno precisa ser ensinado.
Cada um destes aspectos é analisado e discutido n a
obra da professora M an a de Lourdes, que tenho a honra d e
prefaciar. M ais do que comentar aspectos específicos do l i ­
vro, pretendo m arcar um aspecto dele que considero d a
m aior im portância: a preocupação em conduzir o leitor —
de forma clara, m as não barateada —aos argum entos e an á-

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10 FO RM AÇAO l>E PROFESSORES

lises de Skmner sobre o papel central do professor no desen­


volvim ento da educação. A inda que o alvo centrai seja o
aluno, cada capítulo do livro tem por trás a responsabili­
dade do professor.
Note-se que a autora respeita e acom panha um a ten­
dência (nunca exphc-tada) de Skinner nesta trajetória. T ra­
tando-se de um a abordagem psicológica (e não pedagógica,
em seu sentido estrito), não cabe estabelecer conteúdos,
nem pontificar sobre procedimencos didáticos específicos.
O que é sempre enfatizado é de onde o professor pode/deve
p a rtir (onde o aluno está em relação ao ponto em que pre­
cisa chegar); que condições precisam ser oferecidas/criadas
nesta trajetória; quando e o que deve ser avaliado; e a im ­
portância de se considerar a avaliação como feedback para
o replanejam ento da educação. Estas e outras im portantes
atividades do professor sáo cuidadosam ente t<vi :as ao lon­
go dos vários capítulos.
A contribuição mais im portante da áutora, por^m,
evidencia se no últim o capitulo, no qual são lançadas as ba­
ses para um program a de formação de professores a partir
da proposta de Skinner. Deste ponto de vista tta t se gle
um 1 vro que não pode ser : jnorado em um mòrtiento em
que poliricas nacionais centram fogo no crucial problem a
da formação de professores.

Sergió Vasconcelos de Luna


novem bro de 2 0 0 0

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/■

SU M Á R IO

I n t r o d u ç ã o ......................... ....................................................... 13

1. En s in a r so b a ó t ic a
DA AN Aí. IS E DO COM PORTAM ENTO................................ 2L

2 . “ En s i n a r é a r r a n j a r c o n t i n g ê n c i a s
DE REFORÇO..."............................................................................. 41

3. O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO E N SIN O ___ 61

4 . S o b r e o q u e d eve s e r e n s in a d o ............................ 93

5 . E n s i n a r p a r a q u ê ? ........................................................... 117

6. O pr o fe sso r n a p r o p o s t a s k in n e r ia n a
DE E N SIN O ................................................................................. 121

7 . Pa r a além d as
c o n t in g ê n c ia s in s t r u c io n a is .............................. 137

8. Elem entos p a r a u m a p r o p o st a d e f o r m a ç ã o
DE PROFESSORES NA PERSPECTIVA SKINNERIANA . 1 57

' R e f e r ê n c i a s b i b l i o g r á f i c a s ............................................. 179

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INTRODUÇÃO

Quando nos decidim os pela realização do presente tra­


balho, queríam os identificar se havia um a contribuição a
ser oferecida p ela analise compor^amencal do ensino, tal
como realizada por Skinner, à formação de professores e,
em caso afirm ativo, em que consistia tal conrribuiçao.
À m edida que fomos elaborando nossa análise e reor­
ganizando os aspectos abordados por Skinner em seus tex-
.í.Qí educaçionais, foran ficando nítidas a .m possibiudade de
dissociar suas proposições relativas ao ensino de sua análise
mais global d? educação e a im portância atribuída por ele
à agência educacional na construção de u m a cultura com
m aiores chances de sobrevivência.
N ão é possível entender de modo restrito as form ula­
ções de Skinner, tom ando-as apenas como a proposta de
um a tecnologia para u m ensino eficiente, sem ter em conta
que ta l proposta só g ao h a sentido se considerada à lu 2 de
outros aspectos fundam entais envolvidos no ensinar — o
que ensinar, p ara q uem ensinar, p ara que ensinar e quem
ensina —contem plados en ia análise e indispensáveis para
o p lan e am ento do como ensinar.
N a perspectiva de Skinner, a busca de solução para os
problem as do ensino nao pode prescindi; d a análise rigo-

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14 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

rosa da complexa estrutura social que lhes dá contexto c


dos com portam entos dos diversos agentes educacionais
que, direta ou indiretam ente, interferem no processo de en-
sino-aprendizagem que professor e aluno constroem na sala
de aula.
Parece-nos possível situar, nesse duplo movimento, a
im portância de sua contribuição. U m a contribuição que,
sem dispensar análise globais, a elas não se restringe e, ao
mesmo tempo, sem se lim itar a análises pontuais e espe­
cíficas de aspectos, do ensino, tem m uito a dizer sobre eles.
Dito de outro modo, Skinner constrói um a análise que
tom a como foco prioritário a questão do ensino e busca a
formulação de um método, com base em princípios p lau ­
síveis e em procedim entos rigorosos, p ara superar os pro­
blemas relativos ao ensinar; entretanto, em nenhum mo­
m ento o autor considera o método de ensino como um as­
pecto eni si mesmo, isolado de outros elementos fundamentais
relacionados à p rática pedagógica, nem o vê de modo des-
contextualizado, separado de seus determ inantes mais g e ­
rais e in dep endente dos indivíduos q u e o constroem ou
executam .
É essa constatação que nos leva a av aliar como pro­
fícuas as contribuições que tal análise pode trazer ao en-
frentamento das questões educacionais, em especial daque
las relativas à form ação de professores.
No entanto, iióssá âvâlíáÇãõ não é partilh ada por pro­
fissionais e pesquisadores em educação, que vêem, na aná
lise skinneriana do processo de ensinar e no método de en ­
sino dela decorrente, um a lim itação ao pleno desenvolvi­
mento das potencialidades humanas. Tomemos como ilustração
algum as considerações feitas por L uckesi (1980). Afirma
ele que:

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INTRODUÇÃO 15

Enquanto a educação, no seu sentido fundamental, está


a exigir capacitação, a tecnologia educacional, hoje, está a
propor com portam entaiização dos indivíduos para responde­
rem a estímulos definidos e padronizados. (...) Aquilo que
temos, hoje, como tecnologia não pode ser, significativa­
mente, denominado tecnologia educacional (modo prático
de possibilitar ao educando a transformação de suas poten­
cialidades em capacidades), mas sim tecnologia instrucio-
nal (meio de modelat comportamentos) (...) Educar não é
instruir! Instruir é tão-somente condicionar o comporta­
mento do educando a um padrão pré-esrabelecido. (...)
Para promover realmente a educação, a atual tecnologia,
utilizada e desenvolvida no âmbito educacional, deve d ei­
x ar de ser in stru cio n a l p a ra ser ed u ca cio n a l, pois que esta úl­
tima garante o crítico, O questionamento, a maturação in­
terna de capacidade e valores e não a imposição externa de
modos de comportar-se. (p. 4)

Acreditamos que a descrição das principais caracterís­


ticas das propostas de Skinner em relação aos conteúdos a
serem ensinados e aos procedim entos de ensino a serem
planejados, bem como suas concepções de educação e de
com portam ento hum ano, que explicitarem os neste traba­
lho, fornecem parâmetros para discutir a afirmação de Luckesi.
No entanto, mesmo que não identifiquemos as marcas das
concepções skinnerianas nos aspectos por ele criticados, não
podemos desconsiderar a gravidade das críticas.
Especialm ente porque são essas m esm as críticas que
reaparecem quando a discussão se passa no cam po da for­
m ação de professores, expressando-se, agora, pela rejeição
às cham adas alternativas técnicas para a solução dos pro­
blem as da formação docente, apresentadas sob a forma de

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16 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

creinam ento de professores. O próprio term o trein a m en to ,


em bora tenha sido, c continue sendo, m uito utilizado na
área de form ação hum ana, é hoje alvo de críticas. Hm ar­
tigo no qual apresenta algumas reflexões sobre a term ino­
logia referente à formação continuada de profissionais da
educação, M arm ( 1 9 9 5 ) afirma que o term o tr e in a m e n to , en­
tendido corno a d estram en to ou m odelagem , pode rep re­
sen tar um a restrição perigosa da ação h u m an a a auto-
m atism os e ações prefixadas, em bora considere que, para
algum as situ ações (o exem plo dado pela a u to ra refere-se
à form ação c o n tin u a d a de profissionais da área de educa­
ção física), certos autom atísm os sejam necessários. Diz a
autora:

Penso que, em se tratando de profissionais da educação, há


inadequação era tratarmos os processos de educação con­
tinuada como t rei na me nr os quando desencadearem apenas
ações com finalidades meramente mecânicas. Tais inade­
quações são tanto maiores quanto mais as ações forem dis­
tantes das manifestações inteligentes, pois não estamos, de
modo geral, meramente modelando comportamentos ou
esperando reãções padronizadas, estamos educando pessoas
que exercem funções pautadas pelo uso da inteligência e
nunca pelo uso de seus olhos, seus passos ou seus gestos,
(p. 15.)

O conceito de modelagem, no sistem a de Skinner, não


tem a ver com autom atísm os e acom plexidade do compor­
tam ento hum ano, tal conft> é explicado pela análise com-
portam ental, não pode ser reduzida a movimentos muscula­
res. A divergência fundam ental entre as posturas de Skinner
e de M arin — exp licitad a pela afirmação da auto ra de que

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INTRODUÇÃO 17

as ações hum anas são manifestações da inteligência - não


justifica o tratam ento simplista dado ao term o modelagem ,
atribuindo a ele um sentido diverso daquele proposto por
Skinner.
Se, como afirm am pesquisadores em educação1, essa
área tem se m arcado por uma postura de adesão acrítica a
modelos teóricos, parece-nos lícito supor, diante da natu­
reza das críticas m encionadas, q u e a análise do comporta­
m ento pode ter sido objeto de um m ovim ento inverso, que
poderíam os identificar como descarte acrítuo.
Não obstante a veracidade de nossa suposição, cabe a
nós, analistas do com portam ento, avaliarm os cuidadosa­
m ente as condições que estamos criando para gerar e man­
ter com portam entos tão fortemente contrários às possíveis
contribuições que a análise do com portam ento tem a ofe­
recer aos profissionais e pesquisadores da educação. E cabe,
principalm ente, explicitarm os tais contribuições. Ê este o
objetivo do presente livro, nu que se refere à formação de
professores .
Embora Skinner não tenha — estritam ente falando —
u m a proposta p a ra a formação d e professores, a leitura de
seus vários textos m ostra que ele explicitou a m aioria dos
tópicos que deveriam fazer parte de um program a de for­
m ação de professores. A análise e reorganização destes tó­
picos, de modo a avançar em direção a um a proposta de
formação, constitui o escopo deste trabalho.
Para isto, foi analisado um conjunto de textos de Skinner
voltados declaradam ente para as questões educacionais.
U m outro conjunto de textos, cujo conteúdo servia para

1 Como Gatri (1983) e Warde (1990), por exemplo.

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18 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

dar contexto às questões mais am plas relativas à educação,


foi tam bém utilizado , compondo um total de vinte textos.
O título de cad a um deles, bem como sua fonte, aparecem
abaixo relacionados.

The Technology of Teaching (1968)


. The etym ology of teaching
. The science of learning and the art of teaching
. T each in g machines
. The technology òf teaching
. W h y teachers fail
. T each in g thinking
. The m otivation of the student
. The creative student
. D iscip lin e, ethical behavior and self-control
. A review of teaching
. The behavior of the establishm ent
...... •
Cumulative Record (1972)
. T eaching science in high school
. C ontingency m anagem ent in the classroom

Reflections on Behaviorism and Society (1978)


. Some implications of making education more efficient
. The free and happy student
. Designing higher education

Upon Further Reflection ( 1987) "


. C ognitive science and behaviorism
. The sh am e of am erican education

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INTRODUÇÃO 19

R ecen t h su es in th e A n a ly sis o f B e b a v io r (1 9 8 9 )
. The school of the future
. Programm ed instruction revisited

Tomamos como referência para a construção da se­


qüência dos capítulos, a ênfase d ad a pelo próprio Skmner
aos problem as relativos ao ensinar. Sem se exim tr de con-
textualizar tais problem as no quadro mais g eral das ques­
tões educacionais e do pap êl sociál da educação, Skinner ni­
tidam ente enfatiza um a análise sistem ática dos problemas
do ensino e a elaboração de propostas para sua solução. E,
pois, esse caminho — dos problem as específicos do ensinar
à discussão do papel social da educação —que tentam os tri­
lhar em nossa descrição'. N o entanto, referências à análise
e às propostas do autor relativas ao ensino pareceram-nos
dever ser precedidas p ela explicitação de alguns conceitos
básico s form u lados por e le a p a r tir de su a p e rsp ec tiv a
cien tífica sobre o com portam ento humano, já que a análise
skinneriana do ensinar neles se sustenta.
T am bém nos pareceu necessária a referência a algu ­
m as formulações gerais de Skinner sobre o processo de
aprender, dadas as suas decorrências para as proposições re­
lativas ao ensinar.
Assim , os capítulos que se seguem apresentam a des­
crição dos dados resultantes da análise do prim eiro conjun­
to de textos de Skinner, organizados na seguinte seqüência:
alguns conceitos básicos do sistem a explicativo de Skinner

2 Eventuais referências foram feitas, ao longo da descrição, a outros tex­


tos de Skinner, além dos 20 arrigos analisados, ou a texros de outros
autores sempre que aos pareceram úteis para esclarecer aspectos em
discussão.

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20 FORMAÇÀO DE PROFESSORES

sobre o com portam ento hum ano, sua concepção de apren­


dizagem , sua concepção de ensino, o planejam ento sistem á­
tico do ensino, o que deve ser ensinado, para que ensinar
e o professor na proposta skinneriana de ensino.

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Capítulo 1

E n s i n a r s o b a ó t ic a d a
ANALISE DO COMPORTAMENTO

ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS DO


SISTEMA EXPLICATIVO DE SKJNNER

Neste subtítulo abordamos alguns conceitos que mar­


cam a proposta de Skinner de construção de uma ciência do
com portam ento hum ano: o com portam ento operante, as
contingências de refo go e o modelo de causalidade de se­
leção pelas conseqüências.
Abordar o ensinar na perspectiva da análise do compor­
tamento significa adotar uma postura científica no tratamento das
questões do ensino, em consonância com a perspectiva adotada
por Skinner para a explicação do comportamento humano:

J á passou o tem po em que se podia esperar a melhoria do en-


- sino pela simples aplicação de u m a teoria d o comportamento
hum ano de senso-com um . ( 1 9 6 8 , p. 2 2 6 ; 19 7 2 a , p. 215)'

1 Nas citações referentes ao livro The TeíLrwügy o f Teaching, as datas se re­


ferem, respectivamente, à publicação origioal e à edição brasileira, e as pá­
ginas indicadas correspondem, na ordem, a cada uma das publicações. Isco
porque no momento das d rações o texto original foi consultado, o que
pode ter gerado traduções levemence diferentes da edição brasileira.

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22 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Em oposição a um a “teoria do bom senso" ou a ex­


plicações que considera “ficções explanatórias", Skinner
defende a construção de uma ciência do comportam ento
hum ano que possibilite um a compreensão rigorosa da na­
tureza hum ana. Tom ar o comportamento como objeto de
estudo científico pressupõe que “o comportamento é or­
denado e determ inado” (Skinner, 1974, p. 13), sendo pos­
sível descobrir e especificar os fatores que o determ inam .
E a relação entre o homem e o ambiente que deve se
constituir como objeto de estudos para psicólogos. O autor
se opõe, assim, claramente, às posturas mentalistas e às ex­
plicações que recorrem a causas internas para explicar a ação
humana. Termos como mente, intenção e pensamento são
considerados por Skinner como “simples sinônimos para com­
portamento” (1978, p. 100).
Para Skinner, o problem a do m entalism o não está na
suposição.da existência de estados m entais ou de senti­
m entos, mas na atribuição a eles de um status causal. D i­
ferentem ente dos behavioristas metodológicos, Skinner
não coloca o m undo interno, de sentimentos e estados
m entais, fora do alcance da ciência; apenas o nega como
origem , início ou causa do comportamento e o explica,
quer enquanto estados corporais, quer enquanto com por­
tam ento, a partir de condições existentes fora do hom em ,
no am biente com o qual ele se relaciona.
D iferentem ente de álguns de seus leitores, que vêem
como sim plista e reducionista a proposta skinneriana de
um a ciência do com portam ento, o autor parece ter clareza
d a dificuldade colocada por esse objeto de estudo;

O comportamento é uma matéria difícil, não porque seja


inacessível, mas porque é extremamente cõmplexo. Desde

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ENSINAK SOB A ÓTICA D A AN ÁU SE DO COMPORTAMENTO 23

que é um processo, e a io uma coisa, nao pode scr facil-


mente imobilizado para observação. É mutável, fluido,
evanescente e, por esta razão, faz grandes exigências téc­
nicas à engenhosidade c energia do cientista. Contudo, não
há nada essencialmente insolúvel nos problemas que sur­
gem deste fato. (Skínner, 1974, p. 17)

Ao se referir à natureza processual e ao caráter mu­


tável e fluido do com portam ento, ele não está afirmando
sua indeterm inação. Ao contrário, como já foi dito, Skínner
busca determ inantes dem onstráveis para explicar o com­
portam ento e, coerente com sua postura não mencalista,
busca-os no am biente. No entanto, não se lim ita a tomar
como determ inantes dem onstráveis do com portam ento os
aspectos do ambiente ou estímulos que o antecedem. Skínner
considera omissas as explicações do com portam ento em
term os de estím ulo-resposta e afirm a que:

Nenhuma descrição do intercâmbio entre organismo e


meio ambiente estará completa enquanto não incluit a
ação do ambiente sobre o organismo depois da emissão da
resposta. (19 8 0, p. 178)

Seu foco de interesse esrá “no com portam ento que


produz algu m efeito no m undo ao redor” (1 9 7 4 , p. 40), o
qual é denominado com portam ento operante p ara enfatizar
o fato de que “o comportamento opera sobre o ambiente para
g erar conseqüências" (p. 44). Essas conseqüências refroagem
sobre o organismo, alterando a probabilidade de ocorrência fu­
tura de comportamento semelhante ao que as produziu. Se­
gun do M icheletto e Sério (1993),

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24 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Desde o início [de sua obra], Skinner caracteriza o compor­


tamento que compõe a relação operante como aquele que
produz conseqüências e exatamente por isso tais conse­
qüências nào poderão ser nunca “incidentais-' (1935). A
importância desta caracterização está no termo produzir;
ele indica que o comportamento é indispensável porque ele
é que produzirá aquilo que passará a fazer parte de seus de-
r terminantes. Dito de outra maneira, a conseqüência de­
pende do comportamento e o determina, (p. 13)

É Skírtner quem afirm a: "não mais olhamos para o


com portam ento e o am biente como coisas ou eventos se­
parados, m as para a ínterrelação entre eles. Olhamos para
as contingências de reforço" ( 1 9 8 0 , p. 182).
P ara explicitar o senrido da expressão contingências de
reforço é necessário ter em conta que, para Skinner, a for­
m ulação adequada da interação organism o-am biente deve
sempre especificar á õcásião ha qual unia resposta ocorre,
a própria resposta e as conseqüências por ela produzidas. As
relações entre esses três eLementos constituem as contingências
de reforço, assim denominadas devido ao provável efeito da
conseqüência de aum entar a probabilidade de em issão de
um a resp o sta 2 sem elhante àq u ela que prod u ziu o apare­
cim ento ou desaparecim ento de u m a d ada conseqüência.
Não nos parece dem ais enfatizar que, nesta perspectiva,

não é correto dizer que o reforçamento operante "fortalece


a resposta que o precede". A resposta já ocorreu e não pode

2 Sem nos aprofundarmos na distinção feita por Skinner entre resposca


e classe de respostas, cabe lembrar que, para ele, “um operanre é uma
dasse, da qual uma resposca é ura caso ou membro" (1.980, p. 269)-

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ENSINAR SOB A ÓTICA D A ANÁLISE DO COMPORTAMENTO 25

ser mudada. O que muda é a probabilidade futura de res­


posta da mesma classe. E o operante como classe de com­
portamento, e não a resposta como caso particular, o que
é condicionado. (Skinner, 1974, p. 57)

Claram ente distante das posturas m entalistas, essa


concepção de comportamento distancia~se, tam bém , do
modelo de causalidade da mecânica clássica e rejeita a bus­
ca de agentes criadores, de estruturas geradoras ou de me­
canismos arm azenadores de informações como causas do
com portam ento.
Tomando como modelo causal a explicação darwinista
da evolução das espécies, através da seleção natural, Skinner
propõe um m odelo de seleção pelas conseqüências, a partir
do qual an alisa três níveis de v ariação e seleção respon­
sáveis pela história do comportam ento humano: a própria
seleção natural, o condicionamento operante e a evolução
da cultura.

Podemos atribuir uma pequena parte do comportamento


humano e uma parte muito maior do comportamento de
outras espécies à seleção natural e à evolução das espécies,
mas a maior parte do comportamento humano deve ser
atribuída a contingências de reforçamento, especialmente
às contingências sociais muito complexas a que chamamos
culturas. Apenas cjuando consideramos essas histórias po­
demos explicar por que as pessoas se comportam do modo
como o fazem. {Skinner, 19 8 9, p. 24)

O processo de seleção natural responsável pela evolu­


ção das espécies possibilita aos organism os de um a dada es­
pécie a aquisição, via processo reprodutivo, de um conjunto

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26 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

de características e de padrões com portam entais que os


prepara para sobreviver em uni m undo semelhante àquele
em que a espécie evoluiu.
Neste prim eiro nível, variações ocorridas aleatoria­
mente nos genes podem possibilitar, aos organismos deles
portadores, habilidades importantes para enfrentar ambien­
tes diversos, aum entando, assim, suas chances de sobrevi­
vência. Operando sobre variações aleatórias que ocorrem em
organismos individuais, essas contingências de seleção natural
podem resultar na sobrevivência ou não da espécie.
Um segundo nível de variação e seleção, então, em er­
ge, o qual prepara os indivíduos para se comportarem em
ambientes em m udança: o condicionam ento operante. E o
condicionam ento operante que g aran te, a partir de varia­
ções tam bém aleatórias nas respostas do indivíduo durante
sua história de vida, que novos com portam entos sejam se­
lecionados, possibilitando a ele a aquisição de um repertó­
rio com portam ental apropriado a novos ambientes.
Como afirm a Skinner (1990), é através do condiciona­
m ento operante que ........

variações no comportamento do indivíduo são selecionadas


par aspectos do ambiente que não são estáveis o suficiente
para terem um papel na evolução. No condicionamento ope­
rante, o comportamento é reforçado, no sentido de ser for­
talecido ou ter- se tornado mais-provável de ocorrer, por certos
tipos de conseqüências que adquiriram, inicialmente, o poder
de reforçar por meio da seleção natural, (p. 1206)

D iversam ente das contingências de seleção natural, o


condicionam ento operante perm ite a em ergência de um re­
pertório in d ivid u al e, por isso, m ais flexível, m ais m aleável,

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ENSINAR SOB A ÓTICA DA ANÁLISE DO COMPORTAMENTO 27

mais adaptado a um am biente em m udança. Essa relação


do indivíduo com o am biente acelera as m udanças tanto no
am biente quanto no indivíduo, tornando difícil a aquisição,
no espaço de um a vida in dividual, de todo o repertório
com portam ental necessário à sobrevivência do indivíduo.
Outros indivíduos passam a ser, por isso, parte im portante
do am biente. É a partir do com portam ento de outras pes­
soas que o indivíduo pode adquirir novos comportamentos
a serem reforçados. Tem -se, então, as condições para a
em ergência do- terceiro nível de variação e seleção: a evo­
lução dos am bientes sociais, as culturas.
T am bém nesse terceiro nível, variações aleatórias nas
práticas culturais são selecionadas por suas conseqüências.
O que garan te a evolução de uma cultu ra, entendida como
o conjunto das contingências sociais, é a ocorrência de prá­
ticas cujas conseqüências contribuem para o sucesso do
grupo e não de seus m em bros individuais. Na em ergência
desse terceiro nível de variação e seleção, o desenvolvim en­
to do com portam ento verbal é fundam ental, pois possibi­
lita a acum ulação e a transm issão d e conhecim entos, pro­
cessos indispensáveis para a sobrevivência dos indivíduos
enquanto participantes de um a d ad a cu ltu ra. Segundo
Skinner (1 9 8 7 ):

Comportando-se verbalmente as pessoas cooperam com


mais sucesso em empreendimentos comuns. Aceitando
conselhos, considerando avisos, seguindo instruções e ob­
servando regras, as pessoas se beneficiam daquilo que ou-
rros já aprenderam. Práticas éticas são fortalecidas por se­
rem codificadas em leis e técnicas especiais de autogeren-
ciamento ético e intelectual são planejadas e ensinadas.*

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28 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

Auto-observação ou consciência emerge quando uma pes­


soa pergunta a uma outra questões tais como "O que você
vai fazer?" ou "Por que você fez aquilo?", (p. 54)

O complexo conjunto de interações do homem com


seu am biente, com características comuns e peculiares aos
três níveis mencionados, constitui, portanto, o contexto no
qual ele aprende a se comportar e sobrevive enquanto es­
pécie, indivíduo e participante de um a cu ltu ra. Dois modos
fundam entais de aprender decorrem dessas interações: o
com portam ento é diretam ente m odelado e m antido por
determ inadas contingências de reforçamento ou é “gover­
nado por regras”, isto é, por descrições verbais das contin­
gências, tais como instruções, conselhos, m áxim as, leis, etc.
A análise skinneriana das questões educacionais traz im plí­
citos essa explicação da evolução do com portam ento hum a­
no e esses modos de aprender, cabendo ao ensino formal —
tal como Skinner o concebe —, nesse processo, cum prir um
im portante papel.

A l g u m a s f o r m u l a ç õ e s g e r a is s o b r e
A APRENDIZAGEM COMO CONDIÇÃO
PARA ANALISAR O ENSINAR

São apresentados--neste subtítulo a concepção de


aprendizagem e os princípios que explicam esse processo,
na perspectiva de Skinner, em oposição às perspectivas de
aprendizagem como ato espontâneo ou de aprendizagem
como ato cognitivo. É apresentado, tam bém , o conceito de
m otivação, diretam ente relacionado ao conceito de apren­
dizagem , ta l como é revisto pela le itu ra skinneriana.

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ENSINAR SOB A ÓTICA DA AN ÁU SE DO COMPORTAMENTO 29

Dos conceitos brevemente apresentados no item ante­


rior decorre a noção de que, na sua relação com o am bien­
te, o homem aprende, muda seu com portam ento. O ho­
mem aprende com as conseqüências de sua ação, mesmo
sem estar sendo formalmente ensinado.
O mesmo processo pode ocorrer no ambiente escolar
institucional. “Entregue a si m esm o em um dado ambiente,
o aluno aprenderá mas não terá, necessariam ente, sido en­
sinado" (Skinner, 1968, p. 5; 1972a, p. 4).
Tal afirm ação poderia nos levar a supor, em Skinner,
a defesa, no âm bito das instituições educacionais, de um a
aprendizagem espontânea, de um '“aprender com a vida".
No entanto, seu questionamento de certas noções sobre o
processo de aprendizagem , bem como sobre o processo de
ensino delas decorrentes, perm ite-nos um a melhor com­
preensão da sua postura.
Em m uitos dos artigos analisados, Skinner faz referên­
cia a experiências educacionais baseadas na noção de que o
estudante aprende na escola do m esm o modo como apren­
de no contato com o mundo, m ovido por um a curiosidade
natural e pelo prazer da descoberta, e de que não cabe ao pro­
fessor ensinar, m as apenas ajudar — e ainda assim não muito
—o aluno a aprender. Ao explicar a duração efêmera de tais
experiências, Skinner (1978) afirm a que:

Uma explicação (...) é que o mundo real não é um professor


eficiente. Crianças não aprendem muito do ambiente natural
(...). Um ambiente físico gera comportamentos inconve­
nientes, perigosos e supersticiosos e um ambiente social
g-eta tanto comportamento hostil quanto amistoso, tanto
egoísta quanto generoso. O que parece demonstração
bem-sucedida de salas de aula “livres” deve ser atribuído

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30 FORMAÇÃO. DE PROFESSORES

a habilidades não analisadas em lidar com pessoas e a di­


ficuldade é que, por não terem sido analisadas, não podem
ser transmitidas (...). Cada vez menos é ensinado, por de­
finição, à medida que a aprendizagem é deixada ao am­
biente natural, mas a isso é preciso acrescentar que cada
vez menos é aprendido, (p. 131)

Trazer o m undo real para a sala de aula com o form a


de despertar o interesse do aluno e m otivado para aprender
tem esbarrado em limites práticos, pois

Apenas uma pequena parte do mundo real pode ser trazida


para a sala de aula, mesmo com o auxílio de filmes, gra­
vadores e TV, e apenas uma pequena parte do restante
pode ser visitada fora. (...) Infelizmente, o aluno não apren­
de simplesmente quando coisas lhe são ditas ou mostradas.
Algo essencial à sua curiosidade natural ou desejo de
aprender está faltando na sala de aula. O que falta, tecni­
camente falando, é reforçamento positivo. (Skinner, 19 6 8,
p. 103, 1972a, p. 99)

T am bém ao se opor a explicações cognitivistas do pro­


cesso de aprendizagem , Skinner nos revela aspectos im por­
tantes de seu próprio posicionam ento. N a sua opinião, ao
pressuporem que o homem é dotado de habilidades co gn i­
tivas que o capacitam a realizar atividades intelectuais com­
plexas, dentre as quais aprender, os cognidvistas voltam a obs­
curecer, pelo recurso a variáveis intervenientes, a q uestão de
como o aluno aprende, sob a nova roupagem do modelo
com putacional de processamento de informação. A ssim , ele
afirm a que:

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ENSINAR 5 0 B A ÓTICA D A A N Á U SE DO COMPORTAMENTO 31

O computador oferece uma simplificação interessante de al­


guns velhos problemas psicológicos. Sensação e percepção são
reduzidas a input\ aprendizagem e memória, a processamento,
armazenagem e recuperação de informação, e ação, a output.
E muito semelhante à velha fórmula estímulo-resposta re­
mendada com variáveis intervenientes. Dizer que os alunos
processam informação é usar uma duvidosa metáfora c como
eles processam informação é, ainda, a velha questão de como
eles aprendem. (Skinner, 1987, pp. 118-119)

insistindo no caráter metafórico da explicação dos


cognitivístas para as m udanças no que denom inam "de­
sempenho do aluno”, Skinner (1972b) conclui que "sua
m ais séria falha é que não dizem ao professor o que fazer
para gerar m udanças em seus alunos nem lhe oferecem
q u alq u er meio satisfatório para saber se fez isso" (p. 2 1 6 ).
N ão dizem , portanto, ao professor, como ensinar, nem lhe
dão condições de avaliar se e como ensinou.
Para ele, apenas um a explicação dos processos de
aprendizagem e ensino fundada em conhecimentos rigo­
rosa e sistem aticam ente construídos sobre as complexas
relações entre o com portam ento hum ano, as condições de
sua ocorrência e suas conseqüências, torna possível uma
revisão global das práticas educacionais:

Um planejamento efetivo [das práticas educacionais] pre­


cisa se basear na compreensão de processos compottamcn-
tais. As questões básicas são as seguintes: por que uma
pessoa deveria etisiaar e pôr que uma pessoa deveria apren­
der? Essas são questões sobre comportamento humano e
avanços recentes na análise do comportamento são úteis
para respondê-las. (Skinner, 1978, p. 151)

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32 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Tais conhecimentos são úteis porque, ao permitirem a aná­


lise e o planejamento das ações dos envolvidos no processo edu­
cacional (não só alunos c professores, mas também administra­
dores, gerenciadores e pesquisadores), possibilitam tornar
públicos os procedimentos adotados e a avaliação de seus
efeitos, bem como o replanejam ento do curso das ações.
Preserva-se, assim, a natureza social da atividade educacio­
nal pela possibilidade de validação social de suas práticas e de-
seus resultados.
C abe, pois, considerar inicialm ente, em consonância
com os princípios da análise com portam ental, algum as
formulações de Skinner sobre o processo de aprendizagem .
U m dos aspectos abordados pelo autor refere-se ao
papel ativo do aluno no processo de aprender, já que ele,
“como qualq u er organismo, precisa agir antes que possa
ser reforçado ’1 (Skinner, 1968, p. 143; 1972a, p. 135). Opon-
do-se a um a concepção de aluno como receptor passivo de
conhecim entos, o autor, no entanto, não se alinha com os
que defendem que o aluno aprende fazendo. Diz ele:

Mas o aluno não aprende simplesmente ao fazer. Embora


seja provável que ele venha a fazer coisas que já fez antes,
não aumentamos a probabilidade de que faça algo uma se­
gunda vez pelo fato de o levarmos á fazê-la a primeira
{vez} (...). Se houver aprendizagem nessas circunstâncias é
porque outras condições foram inadvertidamente arranja­
das. (...). A execução do comportamento pode ser essencial
mas não garante que a aprendizagem ocorra. (Skinner,
1968, p. 5; 1972a, p. 5)

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e n s in a r so b a ó t i c a d a a n á u s e do com portam en to 33

Também não basta que o aluno absorva passivam en­


te informações. “Ele deve responder e suas respostas devem
ser imediatamente avaliadas de modo que as respostas bera
sucedidas sejam reforçadas" (Skinner, 1978, p. 155).
Mesmo que ao aluno seja dada a oportunidade de
repetir com freqüência o seu fazer, de praticar, de exerci­
tar, ainda assim, segundo Skinner, essas condições não as­
seguram que ele aprendeu a ação repetida ou a habilidade
exercitada. A ação do aluno, em itid a sob certas circuns­
tâncias, só será aprendida em função das conseqüências
que a ela se seguirem . O autor explicita sua posição quan
do afirma que

o comportamento é, dc fato, modificado por suas conse­


qüências, tanto recompensadoras quanto punitivas, mas o
que é importante é o modo pelo qual a conseqüência é
contingente ao comportamento. (Skinner, 1978, p. 154)

E em outra passagem, quando mais detalhadam ente diz que:

As “razões'- pelas quais os homens se comportam devem ser


encontradas entre as conseqüências do seu comportamen-
ro.(...) E essas foram cuidadosamente estudadas. O compor­
tamento que age sobre o ambiente para produzir conseqüên­
cias —comportamento “operante” —foi experimentalmen­
te analisado com grande detalhe. Certos tipos de
conseqüências chamadas reforçadores (entre eles, as coisas
que o leigo chama “recompensas”) são tornados contin­
gentes ao que o organismo está fazendo e às circunstân­
cias sob as quais está fazendo. Mudanças no comporta­
mento são então observadas.
As contingências, mais do que os reforçadores, são as coisas
importantesr (Skinner, 1972b, p. 227)

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34 FORMAÇÃO Db PROFESSORES

O modo d a anaiise com portam ental abordar a apren­


dizagem requer, em comparação com outras posturas, um a
m aneira nova de tratar a questão da motivação, conceito
tradicionalm ente associado ao aprender e a.o ensinar.
Para as concepções clássicas, a motivação equivale a
um im pulso que move o homem a se com portar. Falar en:
aluno m otivado, nessa perspectiva, significa atribuir a ele
aspirações, vontades, interesses ou desejo de aprender ou uma
atitude favorável ante a aprendizagem que o mantem atuan ­
do, estudando e trabalhando diligentem ente.
Para a análise com portam ental, a motivação é um
conceito a posteriori. Só podemos inferir a "m otivação” de
um aluno a partir da relação entre dois aspectos: as ope-
raçoes que têm como efeito estabelecer o valor reforçador
de um a classe de estímulos (por exemplo, im pedir por certo
tempo um aluno de reauzar atividades físicas é um a ope­
ração que au m en ta o valor reforçador da realização dessas
.Ltiv dac s) | o repertório com portam ental do indivíduo,
que posiib it a que ele se comporte de modo a ser reforçado
p ela referida classe de estím ulos. A presença de apenas um
desses aspectos nao é suficiente para explicar o com porta­
m ento “m otivado”.
Diferentemente da explicação de comportamento m oti­
vado com base em agentes causadores antecedentes, a ex­
plicação da análise com portam ental se sustenta, mais um a
vez, nas contingências de reforçamento. Nessa perspectiva,
e possível sob certas concingências, criar e m ànter a “m o­
tivação” do aluno, isto é, .criar condições para que ele
apresente e continue a apn-sentar, de forma d iligen te e
produtiva, os com portam entos que dele se espera. O pro­
cedim ento que torna isso possível requer expor o aluno a
contingências de reforçamento de ta l modo esquem atiza-

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ENSINAR SOB A OTICA DA ANALISE DO COMPORTAMENTO

das que um com portam ento aprendido se m antem com


um dado estado de força por longos períodos de tempo,
em funçao de reforçamento pouco freqüente. Como de­
m onstram as pesquisas em análise experim ental do com­
portam ento, esquemas de reforçamento interm itente sáo
responsáveis pela m anutenção da força de um com porta­
m ento. Sua utilização na situação educacional pode con­
trib u ir para m inim izar o uso bastante com um que se faz
do controle aversivo 1 para m anter o aluno trabalhando na
sala de aula. Referindo-se a programas de ensino que vi­
sam a manutenção de com portam entos por meio de re­
forçamento pouco freqüente, Skinner afirm a que:

Manter um elevado nível de atividade [do aluno] é uma


das real zações mais impoteantes da programação. Repeti­
damente em sua histór a, a educação fez uso do controie
aversivo para manter os alunos trabalhando. U m entendi­
mento correto dos esquemas de reforçamento pode levar,
finalmente, a uma melhor solução desse problema. (1968,
p. 79; 1972a, p. 77)

Transposta para a situaçáo formal de a p re n d i’.agem,


esta perspectiva requer a análise cuidadosa de três aspectos:
os reforçadores, disponíveis ou a disponibilizar por meio de
operações apropriadas; o repertório com portam ental do aluno
e as contingências de reforçamento mais adequadas, com vis­
tas a possibilitar a aquisição e o fortalecimento de comporta­
m entos compatíveis com os objetivos pretendidos.

3 Caracteriza o controle aversivo o uso de contingências de punição e


de reforçamento negativo.

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36 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

D adas as im plicações, para o planejam ento do ensino,


do modo como a análise comporcamental explica a m oti­
vação, este aspecto será retom ado no capítulo 3 .
Cabe, finalm ente, acrescentar às considerações gerais
sobre o processo de aprendizagem até aqui apresentadas,
um últim o aspecto que m arca a postura skinneriana sobre
o aprender. T rata-se da defesa que o autor faz de um
aprender (e, conseqüentem ente, como veremos, de um en­
sinar) em que seja possível a cada aluno cam inhar em seu
próprio ritm o, condição necessária para que as conseqüên­
cias reforçadoras sejam "im ediatas, claras e freqüentes".
Assim ele se refere ao problem a da diferença na velocidade
com que alunos aprendem :

Um aluno que é forçado a ir rápido demais perde muitas


conseqüências reforçadoras e, dc fato, perde mais e mais re­
forçadores à medida que vai ficando para crás. Um aluno
que pode caminhar mais rápido^mas que é retido atrás, não
recebe reforçamentos que estào a seu alcance. (Skinner,
19 7 8, p. 155)

A defesa do que denom ina "princípio, do ritm o indi­


vidual", válido para diferentes níveis de ensino, é com pa­
tível com a preocupação de Skinner com o planejam ento de
contingências que m axim izem o efeito dos reforçadores d is­
poníveis na situaçãp de ensino, evitando os perigosos sub­
produtos do reforçam ento negativo e da punição, a inefi­
cácia de certos reforçadores positivos arbitrários e os lim ites
de uso de certos reforçadores naturais4..
Br

4 São reforçadores naturais ou intrínsecos aqueles em que o evenco re­


forçador é produzido pela própria resposca. São reforçadores arbitrá-

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ENSINAR SOB a ÓTICA DA AN AU SE D O COMPORTAMENTO 37

É essa m esm a preocupação q u e leva Skmner a argu ­


m entar a favor de um a aprendizagem em que o erro seja
minimizado e a identificar problem as em relação às postu
ras que defendem a chamada ap rendizagem por ensaio e
erro. Para o autor, essas abordagens, embora tenham a
vantagem , em comparação com o u tras concepções, de levar
em conta as conseqüências do com portam ento, descrevem
de modo inadequado o papel dessas conseqüências, nas con­
tingências de reforçamento:

Sem dúvida, freqüentemente aprendemos com os nossos


etros (pelo menos, podemos aprender a não cometê-los ou­
tra vez), mas o comportamento correto não é apenas o que
permanece quando o comportamento incorreto é elimina­
do. (Skinner, 1968, p. 7; 19 7 2a , p. 7)

Contingências podem ser program adas para levàr o indi­


víduo a em itir comportamentos progressivam ente próxi­
mos do com portam ento final esperado, sem que para isso
ele precise com eter erros.
N ovam ente, Skinner parece ch am ar a atenção para a
necessidade de considerar a m arca essencial das contingên­
cias de reforçamento —a relação e n tre as condições em que
o com portam ento ocorre, o próprio com portam ento e as
conseqüências por ele produzidas — sob pena de, pela om is­
são de um de seus termos, chegarm os a formulações incom ­
pletas e inadequadas sobre o ap ren d er e, conseqüentem en­
te, sobre o ensinar.

rios ou extrínsecos aqueles em que o evento reforçador não é produzido


pela própiia resposta, mas é mediado por um agente controlador.

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38 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

A apresentação, ainda que não exaustiva, de algum as


formulações sobre o processo de aprendizagem , na perspec­
tiva skinneriana, possibilita a colocação de um referencial
inicial para a discussão do ensino, entendido não mais como
um a arte de lid ar com pessoas, mas como um a atividade es­
pecial, cuja eficácia depende da fundam entação em um a
análise rigorosa de processos com portam entais básicos.
Concordamos com Skinner quando afirm a que

o professor que realmente entende as condições sob as


quais a aprendizagem ocorre será mais eficiente não só no
ensino da matéria mas também no gerenciamento da sala
de aula. (19 6 8 , p. 54; 1972a, p. 53)

O autor insiste, em vários textos, em nos alertar para


o perigo de lim itarm os a análise e as propostas de um en­
sino eficiente às práticas de alguns poucos professores que
realizam adequadam ente se:u trabalho ou a ç desempenho
de alguns poucos alunos que aprendem “sem ser ensina­
dos”, acreditando que "o que um bom professor pode fazer,
qualquer outro pode” e que “o que um bom aluno pode
aprender, q u alq u er um pode” (Skinner, 1968, p. 112,
1972a, p. 107). Skinner denom ina essas crenças, respecti­
vamente, “ídolo do bom professor” e “ídolo do bom aluno”,
em analogia à denom inação dada por Francis Bacon às fal­
sas crenças. D iz ele:

Por razões que ainda estão por analisar, professores são al­
gumas vezes extraordinariamente eficientes, mesmo quan
do seus alunos não são notáveis, e alunos algumas vezes
aprendem muito, mesmo sem a ajuda de bons professores.
Uma combinação de bom professor com bom aluno pode

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ENSINAR SOB A ÓTICA D A ANÁLISE DO COMPORTAMENTO 39

ter resultados quase milagrosos. Nada mais precisa ser fei­


to em relação ao ensino (...) quando essas condições pre­
dominam, mas nós precisamos não esquecer o grande núme­
ro de professores comuns que não podem se beneficiar da se­
leção de bons alunos, ou o grande número de alunos comuns
que não têm bons professores. Para eles, práticas educa­
cionais efetivas precisam ser planejadas. (19 7 8 , p. 151)

Um ensino fundado em noções construídas 3. partir dç


um a análise científica do com portam ento hum ano, que
possibite aa d o ç ão de critérios explícitos para seu planeja­
m ento, execução e avaliação é a altern ativ a possível para a
construção de um a escola em que não precisemos mais se­
lecionar aquela m inoria de professores que ensina sem ter
aprendido nem os poucos alunos q ue aprendem sem ser en­
sinados. Uma escola em que não precisem os m ais procurar,
quer entre os alunos, quer entre os professores, os culpados
pela ineficácia do trabalho educacional desenvolvido.

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Capítulo 2

“ENSINAR É ARRANJAR
CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO...’'

A p a rtir de definições d e ensino form uladas por


Skinner, são enfatizados o seu caráter de atividade plane­
jada e “in ten cional”.
Tomamos como ponto de partida para caraterizar o en­
sinar, na perspectiva d a análise com portam ental, algumas de­
finições-apresentadas por.Skinner. Diz ele que« ensino pode ser
definido como um arranjo de contingências de reforçamento
sob as quais o comportamento m uda" (1 9 6 8 , p. 113; 1972a,
p. 108), e:

Ensino é o arranjo de contingências de refotçamento que


agilizam a aprendizagem. Aprendizagem ocorre sem en ­
sino, felizmente, - ra-a contingências melhoradas acele­
ram o processo e podem mesmo gorar comporcam.en.to
que, de outro modo, nunca apareceria. ( ..) Não podemos
simplesmente esperar que nosso aluno se comporte d ç ,
um dado modo (...) pata reforçá-lo. De um modo ou de
outro, nós precisamos levá-lo a se comportat (SI aner,
1972b, p. 218)

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42 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Falar cm "arranjo de contingências" é afirmar o caráter


planejado do ensino, questionando-se, como Skínner já o fez
em relação à aprendizagem, alternativas que defendam a na­
tureza espontânea, natural e assistemática desse processo. O
ensino formal e cuidadosamente programado possibilita agili­
zar e maxim izar as mudanças comportamentais pretendidas,
as quais, se se as deixar ocorrer naturalmente, podem ser bas­
tante demoradas ou até mesmo não ocorrer.

A educação formal fez uma grande diferença quanto à ex­


tensão das habilidades e conhecimentos que podem ser ad­
quiridos por uma pessoa dutante o tempo de uma vida in­
dividual. (Skmner, 1978, p. 144)

Mas contingências só podem ser arranjadas quando


se tem clareza das m udanças com portam entais que se
quer obter. Por isso, falar em "arranjo de contingências"
é tam bém afirm ar o caráter intencional do ensino. Embora
inadequado em um a análise com portam ental, o term o “in­
tencional" (tão freqüentem ente usado em algum as abor­
dagens educacionais), aqui, significa que quem ensina o
faz para que alguéni aprenda algum a coisa de modo eficien­
te. Ou, como diria um analista comportamental, quem en­
sina deve ficar sob controle do que quer ensinar, de quem
está sendo ensinado e das condições disponíveis na situação
de ensino. Falar em "m udar” ou “gerar" comportamento ou
em levar alguém a se “comportar de um certo modo” indica
a existência de um objetivo que se pretende atingir. Não se
ensina se não se sabe o que se quer ensinar e se não se criam
as condições necessárias para ensinar o que se pretende.
R etom am os, assim, um aspecto já discutido quando
da referência à aprendizagem . Se aprender sem ser ensina-

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"F.NSINAR É ARRANJAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO..." 43

do não é a forma m ais eficaz nem mais rápid a dc aprender,


assim também ensinar sem saber o que c a qu^em ensinar,
e sem arranjar, de form a adequada, as condições necessárias
para que o ensino ocorra, não é a forma m ais eficiente de
ensinar. Um ensino assistem ático e não planejado impede
a identificação de suas próprias falhas, im possibilita a crí­
tica e a revisão do que é feito sob o nome de ensino e gera
perigosos subprodutos, como a atribuição de culpa ao alu ­
no e a falta de responsabilidade daquele que ensina em re­
lação ao processo e ao produto de seu trabalho.
É o professor, na concepção de Skinner, o responsável
por planejar as cham adas contingências instrucionais sob as
quais os alunos aprendem . A dificuldade da tarefa tem se
evidenciado, quer pelo uso abusivo de controle aversivo na
educação, quer pela insistência na utilização d e reforçadores
naturais em sala de au la, práticas reveladoras de uma in­
compreensão da natureza da atividade de ensino.
........ .... ............................. .................. •« •

O USO DE CONTROLE AVERSIVO NO ENSINO:


UMA DIFICULDADE A SER SUPERADA

Neste subtítulo são analisadas as decorrências do uso


de controle aversivo no ensino e seu uso inapropriado como
form a de ensinar, agravados pela desinform ação do profes:
sor e pela geração de condições tam b ém aversivas para o
desenvolvim ento do trabalho docente.
O controle aversivo, caracterizado pelo uso de refor-
çam ento negativo ou d e punição, é in sistentem ente abor­
dado por Skinner, em vários textos, como u n i dos aspectos
problem áticos do sistem a educacional em seus vários níveis,
inclusive o ensino superior.

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44 FORMAÇÁO DE PROFESSORES

Identificado, nos primórdios da educação, pelo uso do


castigo corporal, o controle aversivo ganha, ao longo das
reformas educacionais, características mais sutis, embora
não m enos graves quanto aos efeitos que gera.

O ridículo (hoje amplamente verbalizado, mas antes sim­


bolizado pelas orelhas de burro, por forçar o aluno a sen-
tar-se de frente para a parede, ou pelo ficar de pé no can­
to), descomposturas, sarcasmo, crítica, encarceramento
(“ficar depois da aula”), tarefas extras em classe ou para
casa, perda de privilégios, trabalhos forçados, ostracismo,
ser posco no gelo e multas —são alguns dos artifícios que
têm permitido ao professor poupar o bastão sem estragar
a criança. (Skinner, 1968, p. 96; 1972a, p. 92)

So licitar que os alunos façam tarefas adicionais — iro­


nicam ente, um a das formas inventadas pelos próprios pro­
fessores para punir seus alunos —é revelador do caráter coer­
citivo 1 do que se faz na sala de aula. "O aluno passa grande
parte do seu dia fazendo coisas que não quer fazer. A edu­
cação é; em mais de um sentido, compulsória" (Skinner,
1968, p. 9 6 ; 1972a, p. 92).
R espaldado pelos pressupostos e resultados de pesqui­
sa d a análise experim ental do com portam ento, Skinner ex­
plica o uso do controlfe âVéfstvõ jpêlo'professor e alerta para
os graves efeitos que provoca na situação escolar.

1 Sidman (1995) utiliza o termo coerção para caracterizar o concrole


aversivo, que envolve, segundo o autor, punição, reforçamenco ne­
gativo e privação socialmence imposta, presente nas interações dos
homens entre sL e com a natureza.

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/

"ENS[NAR É ARRAN JAR CONTINCÊNCIAS DE REFORÇO..." 45

Refere-se a contingências de reforçamento presentes


na sala de au la, na escola e na sociedade para explicar como
os professores adquirem e m antêm formas de atuação pu­
nitivas e restritivas em relação aos alunos.
As interações pouco am istosas, as criticas constantes,
mesmo que de intensidade pouco severa, os pequenos cas­
tigos, as ameaças e cobranças e o recurso a notas e a outros
temidos mecanismos de avaliação, são .práticas disseminadas
nas salas de aula, que se instalam e se mantêm na medida em.
que são reforçadas por seu efeito im ediato nítido: a redução na
freqüência do comportamento indesejado do aluno.
D esinformado em relação ao caráter temporário desse
efeito do controle aversivo na dim inuição da força da res­
posta e na supressão do com portam ento em questão, já
descrito pelas pesquisas cm an álise do comportamento, o
professor continua a defender e a adotar práticas aversivas
como forma de lid a r com os “problem as" disciplinares e pe­
dagógicos de seus alunos.
Referindo-se de modo m ais explícito ao uso da puni­
ção, Skinner considera que, ao supor, incorretamente, que
a punição seja o inverso do reforçam ento positivo e que seu
efeito seja, sim plesm ente, a elim in ação do comportamento
punido, o professor acaba por fazer um uso errado de prá­
ticas punitivas e por contribuir, inadvertidam ente, para o
fortalecim ento do com portam ento indesejado. Avisar que
vai punir posteriorm ente, pu nir só quando o comporta­
m ento indesejado atingiu grau m aio r de gravidade ou pu­
nir inconsistentem ente o m esm o comportamento são
exemplos mencionados por Skinner do uso incorreto da pu­
nição na sala de aula, que acab am por gerar um efeito in­
verso ao pretendido pelo professor.

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46 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A longo prazo, o insucesso de tais práticas, aliado à


gravidade dos subprodutos que geram, mantêm o professor
apegado a posturas que explicam o comportamento do aluno
como decorrência de atributos que lhe são inerentes e não
como efeito de circunstâncias identificáveis e m anipuláveis,
das quais o com portam ento do próprio professor faz parte.
Além do controle exercido sobre o professor pelas con­
tingências imedia.tas da sala de aula, Skínner tam bém atri­
bui à cultura, a contingências sociais para além da sala de
aula, as razões do-uso de controle aversivo pelo professor.
Diz ele que:

Não t difícil explicar o uso do controle aversivo. O profes­


sor pode arranjar facilmente contingências aversivas; sua
cultura já lhe ensinou como fazê-lo. (...) O controle aver-
. sivo é, sem dúvida, sancionado em parte porque é compa­
tível com as filosofias de governo e religião prevalecentes.
(Skinncr, 1968, pp. 1 0 1 -1 0 2 ; 1972a, pp. 96-97)

Tais filosofias defendem que o sucesso depende de es­


forço pessoal, que cabe punir aqueles que falham no cum-
p im ento de suas .obrigaçoes e que uma autoridade é ne­
cessária para garan tir a aplicação da punição. Transpostas
para a educação, essas idéias se expressam por m eio de prá­
ticas de ensino tais como aq u ela que Skinner denon..na
“método riKándè e í e verifique","dê^'"uso feàstan' i gen erali­
zado no ensino superior. F, um “m étodo” em que, segundo
ele, o aluno é solicitado a fazer atividades, ler, fazer rela­
tórios e responder questões e sobre>»o qual afirm a:

O professor não ensina; ele simplesmente atribui ao aluno


a responsabi idade de aprender. O estudante deve ler li­

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"ENSINAR É A R RAN JAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO..." 47

vros, escudar textos, realizar experimentos, freqüentar


aulas e fica responsável por fazê-lo no sentido de que, se
não relatar corretam ente o que viu, ouviu ou leu, so­
frerá conseqüências aversivas. (Skinner, 19 6 8 , p. 99;
1972a, p. 95)

Tais filosofias expressam-se, tam b ém , por contingên­


cias presentes na. situação de trabalho do professor,, sob as
quais, na interação com os pais d e áluhos, com seus pró­
prios colegas e com outros profissionais (em geral, seus su­
periores hierárquicos), o professor exigente, que mantém
sua classe trabalhando sob rígida disciplina, é reforçado. A
im agem do 'bom professor" como ‘ professor que reprova”,
infelizm ente ainda é partilhada por alguns educadores e
pais. Como afirm a Skinner:

O professor tem medo de enfraquecer a ameaça sob a qual


seus alunos trabalham, O professor é julgado por seus su­
periores e colegas pela severidade da ameaça que impõe:
sera um bom professor se fizei com que seus alunos traba-
.... lherrj duro, pouco impor candc como o professor faz isso e
quanto ele ensina seus alunos ao fazê-lo. Eventualmente ele
passa a avaliar-se da mesma maneira; se tenta mudar para
métodos não aversivos, pode descobrir que resiste em tor­
nar as coisas mais fáceis como se isso necessaçiamentè signi­
ficasse ensinar menos. (1968, p. 100; 1972a, p. 95)

O uso generalizado de controle aversivo, que tem


m arcado as interações entre professores e aíuaos na escola
e, mais am plam ente, as interações en tre os homens em suas
relações sociais, g e ra como grave subproduto os comporta­
mentos identificados p ela análise d o com portam ento como

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48 FO R M AÇ ÃO DE PROFESSORES

fuga e e s q u iv a Esses comportamentos têm como marca ca­


racterística a estereotipia e a rigidez. Ao aprender formas
de elim inar 0 1 1 atenuar o evento aversivo de seu ambiente,
o indivíduo parece evitar, pela repetição do comportamen­
to, a despeito de mudanças nas circunstâncias, os riscos de
ser novam ente submetido à aversividade d a situação.Viver
fugindo/esquivando-se, viver sob circunstâncias nas quais
constantem ente atua para remover ou atenuar os eventos
aversivos, acaba por tornar o indivíduo um ser passivo e
sem ação. Andery e Sério (1995) assim se referem a esse
efeito do controle aversivo:

Num mundo pleno de estímulos aversivos, a esquiva e a


fuga são as únicas alternativas. Toda energia que temos é
dirigida para a fuga e a esquiva. O uso de controie aversivo
produz sujeitos quietos, passivos, que fazem o mínimo ne­
cessário, que desgostam do ambiente em que vivem e o te­
mem; e que, assim que pudetem, fugirão ou se esquivarão,
(p- 7)

Não é difícil identificar, na situação escolar, exemplos_


de com portam entos de fuga/esquiva: ch egar atrasado, ca­
bular aulas ou simplesmente abandonar a escola são formas
explícitas de fuga/esquiva; de modo m ais su til, mesmo es­
tando presente na sala de aula, o aluno pode fugir/esqui-,
var-se do controle aversivo ali instalado é o faz ficando de­
satento, não respondendo quando perguntado , não partici-

Fuga e esquiva descrevem contingências de reforçamento negativo. No


caso da fuga, é fortalecida a resposta que elimina ou atenua o estí­
mulo aversivo. No caso de esquiva, é fortalecida a resposta que adia
ou evita o estímulo aversivo. ’

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"ENSINAR É AR RAN JAR CO N71NCÊNCIA5 DE REFORÇO-.. 49

pando das atividades ou colando” nas provas. M antido


constantem ente sob tais circunstâncias, pode tornar-se apá-
t í c o , acom odando-se à situação sem reagir o u reclamar.

Deststír definitivam ente da escola é o elo final dessa cadeia


de fugas.

O aluno toma-se taciturno, teimoso ç inabordável. Fica


“bloqueado”. Recusa-se a obedecer. A inação é algumas ve-
. zes uma fotmá de fuga (em vez de realizar a tarefa, o aluno
simplesmente aceita o castigo como rnal menor) e, algumas
vezes, uma forma de ataque, cujo objetivo é enfurecer o pro­
fessor, mas é também, de per si, um efeito previsível do con­
trole aversivo. (Skinner, 1968, pp. 98-99; 1972a, p. 94)

Por não especificarem o com portam ento final espera­


do, contingências aversivas —especialm ente as d e punição
—não são adequadas para ensinar. Punindo um com porta­
mento indesejado não garantim os a ocorrência do compor­
tamento desejado:

Não se faz com que um aluno seja aplicado punindo a pre­


guiça, ou corajoso, punindo a covardia, ou interessado no
trabalho punindo a indiferença. Não o ensinamos a aptea-
der rapidamente, punindo-o quando aprende devagar, ou a
lembrar o que aprendeu puníndo-o quando esquece, ou a
pensar logicamente punindo-o quando não raciocina. Em tais
condições o aluno pode ocasionalmente descobrir por si mes­
mo como prestar atenção, como ser aplicado, como apren­
der e lembrar, mas nada disso lhe terá sido ensinado.
(Skinner, 1968, p. 149; 1972a, p. 141)

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50 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

Por desconhecer os efeitos do controle aversivo e sua


ineficácia em possibilitar a aquisição de comportamentos
adequados, o professor pode dispender boa parte de seu
tempo estabelecendo com seus alunos interações pouco produ­
tivas no sentido da emissão de novos comportamentos.
Finalm ente, outro grave efeito do uso de contingên­
cias aversivas refere-se à aquisição e m anutenção de com
portam entos dentiflcados como contracontrole, caracteri­
zados, em geral, pelo contra-ataque, verbal ou não-verbal,
à(s) fonte(s) de estimulação aversiva. Segundo Sidm an
(1-995, p. 224): "Se as pessoas não podem fugir ou esqui­
var-se, elas descobrirão uma outra m aneira de acabar com
punições ou am eaças de punição; elas aprenderão como
controlar seus controladores". No contexto educacional, o
contracontrole aparece, muitas vezes, sob a forma de con­
tra-ataques do aluno dirigidos ao professor, à escola ou até
à educação como instituição. E assim que a análise compor
tam en tal explica os comportamentos de alunos que se re­
lacionam com seus professores de forma indelicada, irreve­
rente e até m esmo rude, chegando, em algum as situações, "
a' serem violentos, que praticam atos de vandalism o contra
prédios escolares, que criticam aberta ou veladamente o tra­
balho ali desenvolvido, chegando alguns a adotar um a postura
que Skinner denomina "antt-intelectualismoV^um ataque ge­
neralizado a tudo o que a educação representa” ( 1 9 6 8 , p. 98;
1972a, p. 94). É o controle aversivo gerando mais controle
aversivo e tornando o espaço educacional, tam bém para o
professor, um espaço marcado pela aversividade.
Resultados de pesquisas feitas com anim ais m ostram
a grave dim ensão do problem a. Segundo Matos (198 1):

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"ENSÍNAR É ARRAN JAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO.. 51

Ha coda uma série de estudos mostrando a facilidade com


que se pode obter comportamenco de ataque e luta violen­
ta entre ratos e macacos, bastando que para isso os animais
envolvidos recebam fortes choques elétricos simultanea­
mente. Animais nesta situação atacam e estraçalham ob­
jetos variados, bem como animais da mesma espécie e de
espécie diference, (p. 7)

Não há indícios de que com o hom em seja diferente


e, se a sociedade tem incentivado a construção e perpetuação
de práticas coercitivas, a escola, lam entavelm ente, tem
contribuído cotn a realização de p a rte dessa tarefa.

N A T U R A LID A D E OU ARTIFICIALID AD E D AS
CONTINGÊNCIAS DISPONÍVEIS PA R A O ENSINO FORMAL
....... ................ • •
O subtítulo trata das alternativas ao controle aversivo
no ensino, apontando os lim ites do aso de reforçadores na­
turais e as dificuldades no uso de reforçadores arbitrários e
freqüentes. A análise apresentada indica a necessidade de se
construírem situações de ensino que possibilitem que o aluno
aprenda de modo a continuar assim se comportando quando
não maís~es'tlver sob as contingências do ensino formal.
Em um cotidiano marcado p e la presença, cada vez
m ais freqüente e am pliada, de interações tipicam ente coer­
citivas, essas acabam por nos parecer naturais e Yhevitáveis.
Acostum ados a ag ir desse modo e a conviver com esse co­
tidiano, passamos a não perceber seus lim ites e perigos e
nos exim im os de buscar alcernativas de ação Talvez por

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52 FORMAÇÀO DE PROFESSORES

isso seja comum encontrarm os muitos professores atuando


de modo coercitivo sem clareza ou crítica quanto aos efeitos
de sua atuação.
No entanto, se questionados, os professores tendem a
revelar um a insatisfação com seu trabalho, mencionando,
como algum as das razoes de seu desagrado, a sua pouca ha­
b ilid ad e no domínio da sala de aula e na com preensão de
aspecços psicológicos dos alunos .5 Referindo-se a um a insa­
tisfação mais específica em relação às práticas aversivas,
Sk in n er (1972b)-afirm a que:

poucos professores estão feiízcs com métodos punitivos


(a maior parte deles gostaria de ser amigo de seus alunos),
mas alternativas raramente se mostraram frutíferas, (p. 225)

U rna breve análise, na perspectiva da análise compor-


tam en tal, das alternativas possíveis ao controle aversivo,
parte d a constatação de que existe uma concordância, tácita
ou explícita, entre a maior parre dos educadores: a de que
“um sistem a no qual os alunos estudam principalmente para
evitar as conseqüências de não estudar não é um -sistema
hum ano e nem produtivo” (Skinner, 1978, p. 143).
T entativas de abandonar a punição c os procedim en­
tos coercitivos, embora louváveis, têm dado lu g ar a pos­
turas que defendem a liberdade do aluno aprender sem a
necessidade de interferências e sanções. O aluno deve es­
tu d ar porque gosta, quer ou tem interesse e estudará tão
logo sejam abandonadas as práticas punitivas. Aò analisar

3 Ver, a respeico, recencc pesquisa de Gacti, Esposito e Silva (1994),


sobre o perfil e expecracivas do professor dc Io grau do Brasil.

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"ENSINAR É ARRANJAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO.. 53

tal alternativa, Skinner cham a a atenção para um aspecto,


já com entado no capítulo 1 , quando das críticas do autor
à aprendizagem natural e espontânea, e sobre o qual afir­
m a que: “Abandonar sim plesm ente a punição e perm itir
aos alunos que façam o que bem entenderem é abandonar
os objetivos da educação" (Skinner, 1972b, p. 225).
Abrir mão de procedimentos de ensino de caráter aver­
sivo não pode significar o abandono de todo e qualquer pro­
cedimento de ensino. Considerar que a mera eliminação do
controle aversivo possibilita o surgimenco do interesse e da
curiosidade naturais do aluno em aprender c, na visão do
autor, um dos graves erros de alguns educadores.
A alternativa de um ensino n atu ral funda-se, segun­
do Skinner, em um a concepção equivocada de liberdade, por
desconsiderar a existência de condições ambientais que inter­
ferem no comportamento do aluno, independencemente das
condições criadas pelo professor. Diz ele que:

O erro —um erro clássico na Literatura sobre liberdade —é supor


que eles farão isso [estudar] tão iogo paremos de puni-los. Alunos
não estio literalmente livres quando estiverem livres de seus pro­
fessores. Eles estarão, então, simplesmente sob controle de outras
coridições e precisamos olhar para essas condições e seus efeitos
se queremos melhorar o ensino. (Skinner, 1978, p.i43)

D efender que cabe à educação contribuir p a ra a pro­


moção da liberdade do indivíduo significa, para o autor,
defender um ensino cuidadosam ente planejado, que pos­
sibilite reduzir as caracterísitcas aversivas do am biente e
que prepare o aluno, pelo ensino d e técnicas de autogo-

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54 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

verno, p ara lidar eficientemente com seu am biente. Um


aprofundam ento sobre o ensmo do autogoverno é apre­
sentado no capítulo 4.
Assim , para Skinner, a possibilidade de superação das
práticas aversivas se dá pela program ação de novas con­
tingências, pelo planejamento rigoroso de práticas altern a­
tivas, pelo cuidado atento com o método de ensinar.
C ircunstâncias que facilitam a ocorrência de com por­
tam entos inadequados podem ser alteradas ou suprim idas,
de modo a tornar menos. provável que os alunos neles se-
engajem, quer esses comportamentos se caracterizem como
"problemas de disciplina", quer como “problemas acadêmi­
cos”. Circunstâncias que propiciem a emissão e a manutenção
de comportamentos incompatíveis com os inadequados tam ­
bém podem ser criadas. Cabe ao professor planejar e cons­
truir esse espaço de ensino, caracterizado pela ausência de pu­
nição e pela presença de condições capazes de gerar e m anter
com portam entos bem-sucedidos de seus alunos.
P ara enfrentar a tarefa de arran jar conseqüências re­
forçadoras na sala de aula, o professor pode contar com
um reforçador poderoso e disponível na situação de aprendi­
zagem —o sucesso —, dando ao aluno mais oportunidades de
acertar e permanecendo atento aos acertos e aos comporta­
mentos adequados dos alunos. Como. afirma Skinner (1978):

O professor pode freqüentemente trocar a punição pelo re-


forçamento positivo de modo surpreendentemente simples
—respondendo ao êxito do aluno em vez de responder às
suas falhas. Professores, muito freqüentemente, têm su­
posto que seu papel é apontar para o que os alunos estão
fazendo de errado, mas apontar o que eles estão fazendo

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•'ENSINAR É AR RAN JAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO..." 55

de certo fará, freqüentemente, uma enorme diferença para o


clima da sala de aula e para a eficiência da instrução, (p. 145)

Esta m udança requer que ao professor seja dada a


oportunidade d e aprender sobre a relação entre as suas
ações e as ações de seus alunos.
Vistas na perspectiva da análise com portam ental, nos­
sas salas de aula são pobres em reforçamento positivo, mas
plenas de condições facilitadoras de com portam entos inde­
sejáveis. isto pode e deve ser alterado.
Entretanto, a alteração precisa te r em conta algum as
características peculiares do processo de ensinar e alguns
cuidados especiais delas decorrentes.
Assumido como instrução formal e planejada e enten­
dido como arran/o de contingências p a ra agilizar a apren­
dizagem , o ensino tem , necessariam ente, um a dim ensão de
arbitrariedade.
Parte significativa dos eventos reforçadores usados nas
contingências de ensino é arbitrária e tip icam en te associada
às atividades educacionais institucionais. N ota, promoção e
diplom a são exem plos desses reforçadores educacionais ar­
bitrários ou extrínsecos mencionados por Skinner, criados,
provavelm ente, p a ra ultrapassar os lim ites colocados pelo
uso de reforçadores naturais.
Um desses lim ites, já mencionado quando d a apresen­
tação d a crítica de Skinner à aprendizagem n atural, diz res­
peito à im possibilidade de tra 2 er para a sala de aula tudo
aquilo que se passa na vida cotidiana. A escola constitui-se
em um am biente construído e contingências com paráveis à
m aioria das contingências que vigoram no am biente natu­
ral não estão ali presentes.

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56 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

A dificuldade em tornar certos reforçadores naturais


contingentes aos comportamentos que se quer instalar c
m anter é um outro lim ite. A ocorrência do reforçador na­
tu ral pode ser tão dem orada que ele perde sua eficácia.

Nenhuma criança aprende a planear uma semente porque


c reforçada pela colheita que dela resulta, ou a 1er porque
então se diverte com livros interessantes, ou a escrever por­
que assim pode mandar recados ao vizinho, ou a náo que­
brar vidraças potque, senão, a sala fica fria. (Skinner, 1968,
p. 154; 1972a, p. 146)

Este parece ser, na opinião de Skinner, um problema


fundam ental: a relação de contingência entre o com porta­
m ento a ser ensinado e a conseqüência que ele produz. N a­
turais ou arbitrários, os reforçadores disponíveis devem ser
planejadam ente arranjados em sua relação com o compor­
tam ento i Para Skinner “ao melhorar o ensino, é menos im ­
portante encontrar novos reforçadores do que planejar m e­
lhores contingências usando os reforçadores já disponíveis"
(1968, p. 155; 1972a, p. 147). Ou, como afirma em outra
passagem: "o importante não são apenas as coisas reforçadoras
que o aluno consegue, mas os modos pelos quais elas são con­
tingentes a seu comportamento” (Skinner, 1978, p. 135).
Ainda preocupado com as contingências aversivas, o au­
tor defende que cabe ao professor decidir dentre os reforçado­
res disponíveis aqueles a usar, “desde que não gerem subpro­
dutos nocivos" (Skinner, 1968, p. 155; 1972a, p. 147).
Poderíamos, neste ponto, concluir que, de acordo com
sua concepção de ensino, Skinner defende que é possível
evitar o uso do controle aversivo em sala de aula e m axi­
m izar o uso de contingências de reforçam ento positivo,

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■'ENSINAR É ARRAN JAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO...' 57

quer pelo uso dos reforçadores naturais disponíveis, quer pela


construção de reforçadores arb itrário s, garantindo-se a
irnedtatidade, clareza e freqüência do reforçamento.
Skinner ilustra a sua concepção com um exem plo so­
bre o com portam ento de ler livros:

Um aluno continuará a ler um livro se houver evidência de


que ele passa por uma mudança significativa, de que se tocna
muito mais capaz de fazer ou dizer coisas, de que ele progride
em direção à conclusão do livro ou do curso do qual o livro
faz; parte ou do currículo do qual o curso faz parte. Para
alunos cujo comportamento não é assim reforçado, outros
reforçadores precisam ser encontrados, mas, em geral, alu­
nos podem ser induzidos a ler —atentamente e com prazer
—garantindo-se que as conseqüências sejam imediatas, cla­
ras e freqüentes. E o que vale para a leitura vale para ou­
tras partes da tarefa educacional. (Skinner, 1978, p. 155)

Em resposta às críticas de que o recurso a reforçadores


^arbitrários — símplistamence identificados, inclusive por
muitos professores, como uma recompensa extrínseca ao com­
portamento — não educa pois oferecer “prêmios" destrói os
efeitos das conseqüências naturais, Skinner afirma que:

A objeção a reforçadores arranjados tem origem em um


mal-entendido sobre a natureza do ensino. O professor fa­
cilita a aprendizagem arranjando contingências especiais de
reforço que podem não se assemelhar às contingências sob
as quais o comportamento será eventualmente útil. ( 1 9 ^ 8 ,
p. 85; 1972a, p. 82)

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58 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

R eafirm a, em sua resposta, e coerentem ente com a


m aneira como entende a natureza da atividade de ensinar,
a defesa do uso de reforçadores arbitrários; mas acrescenta,
na m esm a afirmação, um oucro aspecto característico do
ensuiat que traz implicações diretas para suas propostas de
planejam ento da educação.
P ara Skinner, como para muitos outros educadores, o
ensino é entendido como atividade que deve preparar o
aluno para o futuro, possibilitando o desenvolvim ento de
habilidades e a aquisição de conhecimentos sobre o mundo
e sobre si mesmo, necessários à sua sobrevivência como
m em bro da espécie, como indivíduo e como participante de
um a cultura.
A eficácia do ensino é, portanto, avaliada por resu lta­
dos de longo prazo, em função da utilização, pelo indivL-
duo, daquilo que lhe foi ensinado, em situações da vida co­
tidiana nas quais não escá mais sendo form al e planejada-
m çiit ensinado, iegundo p. autor,

o comportamento que é facilitado pelo processo de ensino se­


ria inútil se não fosse eficaz .ao rnimdt em gerai n? ausênci
de contingências instrucionai?. (1968, p. 86; 1972a, p. 83)

A questão que se coloca para os professores, em de­


corrência de tal concepção, rcferer a, comn ç o que en­
sinar hoje, sob contingências artificialm ente planejadas, de
modo que o aluno aprenda com portam entos que possam
ser úteis num tempo futuro, sob contingências naturais.
Como preparação para o futuro e para situações a i-
versas daquelas presentes na escola, o ensino form al parece
n -o poder se .restringir ao uso de reforçadores artificiais,

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ENÜIMAR É ARRAN JAR CONTINGÊNCIAS DE REFORÇO..." 5|

sob pena de dificutcar ou impedtr q u e o aluno use o que


aprendeu quando não mais estiver se comportando sob as
contingências instrucionais. Por outro lado, se se restringir
ao uso de reforçadores naturais, o professor pode não dar conta
de ensinar o que precisa ser ensinado. O professor parece
estar colocado diante de um impasse. E preciso preparar o
aluno, a partir das contingências arbitrárias da sala de aula,
para enfrentar, no fuairo, as contingências naturais da vida co­
tidiana. Como fazer isso? Skinner assim explicita o problema:

A questão real é saber se o professor prepara o aluno para os


reforçadores naturais que substituirão os refoiçadores arbitrá­
rios usados no ensino. (Skinner, 1 9 6 8 , p. 8 6 ; 1972a , p. 82)

H á uma form a com uraeate usada como tentativa de


solução para o problem a. Professores (assim como pais)
insistem em inform ar o aluno sobre a im portância e o va­
lo r futuro do que lhe está sendo enãi àdc e dèsi rever
as circunstâncias favoráveis ou desfavoráveis sob as quais
ele estará vivendo, por ter ou não aprendido o que a es­
cola quer lhe ensinar. Esperam, com essas descrições ver­
bais de contingências, sob forma de conselhos, de avisos
ou mesmo de advertências, que o aluno passe a apresentar
hoje os com portam entos desejados, em função do conhe­
ci mento das conseqüências naturais q u e advirão em futuro
remoto. Embora se constituam em u m a das forraás pelas
quais a aprend zagem ocorre, essas descrições, denomina­
das genericam e te_ egrãs, são, no entanto, limitadas
quanto à sua eficácia para m udar o comportamento do
aluno, por se referirem a conseqüências bastante distantes
d a sua realicade atual. Não resolvem, o im passe colocado.

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60 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

A.lém de preparar o aluno para as contingências na­


turais futuras, é preciso, tam bém , prepará-lo para a escas­
sez e não im ediatidade dos reforçadores que estarão dis­
poníveis nas situações da vida cotidiana.
Por isso, outras soluções, diversas da mencionada,
precisam ser propostas de modo a garan tir, ainda na si­
tuação formal de ensino, que os comportam entos apren­
didos pelo aluno passem a depender, aos poucos e cada
vez menos, de reforçadores artificiais; e que continuem
sendo emitidos, depois de aprendidos, independente da
ocorrência de reforçamento im ediato e freqüente. Essas
duas condições tornam a situação de ensino mais seme­
lhante à situação real em que tais comportamentos deve­
rão continuar ocorrendo. Mas são m udanças que tam bém
precisam ser planejadas e procedimentos especiais podem
ser propostos para levar o aluno a se com portar de modo
a prescindir, cada vez mais, de artifícios e regras impostas
e de reforçadores freqüentes.
As abordagens tradicionais em educação referem-se a
esse processo como "aprender a aprender” e a seu produto
como “aluno autônom o".
Trata-se, na perspectiva com portam ental, de ensinar
de modo a tom ar o aluno, progressivam ente, inde­
pendente do próprio ensino. "Q uanto m elhor o professor,
.mais im portante é que ele liberte o aluno da necessidade
de auxílio in stru cio n al” (Skinner, 1968, p. 144; 1972a,
p. 136). A análise com portam ental fornece, como vere­
mos, instrum ental p ara isso.

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C apítulo 3

O PLANEJAM ENTO SISTEM ÁTICO


DO ENSINO

O presente capítulo aborda tan to os passos prelim ina­


res, quanto o planejam ento dos procedim entos para um en­
sino eficaz.
A contribuição de Skinner p a ra a explicação do com
portamento hum ano ultrapassa os lim ites da descoberta de
princípios e da elaboração de conceitos teóricos. Há um a
preocupação, evidente do autor com a construção de um a
ciência que, a p artir da identificação dos determ inantes do
com portam ento, possibilite a transform ação das condições
responsáveis por sua ocorrência.
O trabalho produzido pelo au to r na área de educação
reflete essa preocupação. Aplicando à análise das questões
educacionais os conceitos explicativos da ciência do com ­
portamento hum ano, Skinner constrói u m a proposta, que
denomina tecnologia do ensino, p ara o enfrentam ento dos
problemas relativos ao ensinar.
Não se trata, no entanto, d e um a proposta pronta,
nem de um conjunto de regras e m edidas a serem rapida
e facilm ente transpostas para e aplicadas m ecanicam ente
em qualquer situação. Trata-se, situ, d a explicitação de
procedimentos, a p artir do conhecim ento científico acurau-

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/
62 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

lado sobre o com portam ento hum ano, que possibilitam um


ensino eficaz mas que requerem dos envolvidos1 u m a aná­
lise cuidadosa da situação a ser enfrentada. Provavelm ente
por isso é possível identificar, nos escritos de Skinner, além da
explicitação desses procedimentos, alguns passos que devem
anreceder o seu planejamento. Talvez também por isso seu
trabalho ultrapasse os limites espaço-temporais de sua produ­
ção e perm aneça, em nossa avaliação, atual e relevante.

P a s s o s in ic ia is d e p l a n e ja m e n t o

O planejam ento de procedimentos de ensino que ve­


nham a solucionar os problemas com os quais os professo­
res se defrontam na sala de au la deve ser precedido pela ex­
plicitação precisa daquilo que se quer ensinar, por um co­
nhecim ento, m esm o que parcial, sobre quem vai ser
ensinado e p ela caracterização de alguns aspectos do am ­
biente em que o ensino se processa e que podem contribuir
com ou d ificu ltar o trabalho de ensinar. ....... — -----
Realizar os três passos mencionados utilizando o referencial
da análise com portam ental possibilita uma identificação
mais precisa do problem a a ser enfrentado na situação de
ensino e um planejam ento m ais adequado de propostas
para sua solução.

1 Skinner idenrifica como responsáveis peia educação: “quem ensina,


quem se empenha na pesquisa educacional, quem administra escolas
e faculdades, quem estabelece a política educacional e quem mantém
a educação" (1968, p. 227; 1972a, p. 217).

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o PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 63

SOBRE O QUE SE QUER ENSINAR

As vantagens da explicitação d e objetivos de ensino


em termos com portam entais, em com paração com formu­
lações cognitívistas, são abordadas neste subtítulo.
A explicitação do que se quer en sin ar se faz, no pro­
cesso formal de ensino, por meio da colocação de objetivos
e é em geral cousiderada um a das tarefas prim ordiais em
educação. Sob variadas perspectivas teóricas, fundadas em
pressupostos de diferentes filosofias d a educação, a coloca­
ção de objetivos finais é mencionada como etapa im portan­
te do processo de ensinar.
Há, porém , um a diferença fundam ental entre a persv
pectiva de Skinner e outras posturas em educação, em re­
lação a tais objetivos, e as implicações decorrentes dessa d i­
ferença são significativas.
Para Skinner, os objetivos do ensino devem ser expres­
sos em term os de comportamentos do aluno, o que sign i­
fica, de acordo com a definição de com portam ento assum i­
da por ele, que devem conter, em su a formulação, a expli­
citação das ações a ocorrer, de m odo a possibilitar o
estabelecim ento das condições que as propiciam , bem
como das conseqüências produzidas pelas próprias ações.
Compete ao professor formular os objetivos e dispor as con­
dições necessárias para que o alu n o se comporte em
consonância com o que é proposto e de modo a produzir
conseqüências que contribuam para a m anutenção do com­
portam ento em itido. “Apenas definindo o com portam ento
que queremos ensinar podemos com eçar a pesquisar as
condições das quais ele é função e a p la n e ja r um ensino efe­
tivo” (Skinner, 1968 , p. 184; 1972a, p. 173). É a descrição
nítida do com portam ento-que se q u er ensinar que possibi-

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64 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

lita ao professor planejar procedimentos de ensino eficazes.


D ecidir o que fazer na sala de aula, escolher m aterial ade­
quado, propor atividades pertinentes, acom panhar e orien­
tar o trabalho dos alunos e avaliá-los são tarefas que o pro­
fessor realiza m ais facil e adequadam ente quando tem claro
o que quer ensinar.
O professor pode, sob tais condições, ter acesso a in­
formações mais significativas e precisas sobre o ocorrido na
situação de ensino, de modo a verificar não apenas se o alu­
no aprendeu, mas. tam bém se ele, professor, ens-nou. “Uma
especificação do com portam ento term inal {do aluno] con­
duz de m aneira mais d ireta a práticas explícitas e possibilita
verificar se são eficazes" (Skinner, 1968, p. 2 5 6 ; 1972a,
p. 2 4 4). Pode-se, com essa alternativa, dim inuir um a ten­
dência, bastante com um , de atribuir ao aluno o insucesso
da escola, e fornecer ao professor condições de avaliar e re­
ver a sua prática.
Essa possibilidade depende, no entanto, de que o pro­
fessor ad m ita a explicação do com portam ento como relação
operante e identifique o seu próprro comportam ento como
parte das condições necessarias para entender e m udar o
com portam ento do aluno. ......................*--------- ^
N ão querem os, com isso, afirm ar que as razões do in­
sucesso d a educação se devam exclusivam ente ao professor.
O processo educativo é complexo o suficiente, e envolve
um a variedade d e agentes, p ara ser entend <:*o com base em
apenas u m de seus com ponentes. Mas d ada a notória ne­
g lig ên cia em relação ao método de ensino, propostas que
forneçam parâm etros p ara avaliar e rever as ações do~'p o-
fessor e os procedim entos por ele adotados ao en: nar p a­
recem -nos recolocar o foco da discussão em um a direção re­
levante.

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o PI.ANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 65

Tam bém a avaliação do aluno pode ser aperfeiçoada,


dado que é possível identificar precisam ente, a partir do
objetivo estabelecido, o que o aluno fez e a o que está, ain­
da, por ser feito.
Na defesa de sua posição, Skinner vem, mais um a vez,
revelar sua divergência em relação às perspectivas mentalistas
e cognitivistas e às suas implicações para o ensino.
Form ular objetivos em tefmos cognitivos ou mentais
impede a identificação das m udanças que devem ocorrer 110
aluno como indicação de que houve aprendizagem . O autor
refere-se a esse aspecto quando afirm a que:

Se o professor deve “transmitir conhecimento", “cultivar ha­


bilidades", “evocar idéias" ou “mudar atitudes”, nem ele, nem
o aluno provavelmente terão qualquer evidência clara de que
uma mudança ocorreu. (Skinner, 1978, p. 133)

Im pede, tam bém , a alteração dos fatores que, identi­


ficados com o responsáveis pela suposta m udança no aluno,
são, no entanto, inacessíveis ao professor.
Por isso, Skinner considera q u e propostas concretas
para o ensino, em bases cognitivas, ficam dificultadas e aca­
bam por não produzir melhoras significativas. Segundo ele,
objetivos de ensino expressos com term os de natureza m en­
tal ou cognitiva correspondem, coerentem ente, à defesa de
posturas que afirm am a im possibilidade de o professor en­
sinar, restringindo seu papel a aju d ar o aluno a descobrir
sozinho. Correspondem , tam bém , a propostas que transfor­
mam o ensino na realização de exercícios, os quais, supÕe-
se, perm item aos alunos desenvolver e aperfeiçoar suas h a­
bilidades m entais. Podem, ainda, significar, a p a rtir da
pressuposição da existência de traços de caráter ou de ca-

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66 FO RM AÇÃO DF.. PROFESSORES

racteiísticas do indivíduo, quê se distinguem “por sua im ­


penetrabilidade incrospectiva”, a im possibilidade de sua ab
teraçáo por procedimentos de em ino. Referuido-se à cria­
tividade como um dos com portam entos passíveis de exp li­
cações m entahstas, Skinner nos dá um exemplo dos liinites
de tal explicação paia a construção de propostas de ensino.
Diz ele que:

Nada se ganha em afirmar que um aluno se comporta


criativam ente porque possui algo chamado criatividade.
Talvez se possa medir a característica, comparar pessoas
em relação a ela, testar a presença de características as­
sociadas; mas não se pode alterar a própria criatividade.
Os que adotam essa abordagem ficam condenados a sele
cionar em vez de ens nar. (Sk;nner, 1968, p. 170; 1972a,
P- 1 5 9 )

................ .............................. ........... ..... •


Cabe, ainda, considerar, a respeito da necessidade de
explicitação de objetivos com portam entais para o ensino,
que a proposta é defendida pelo auto r, que; p. professor _se
proponha a transm uir conhecim entos, quer se proponha a
ensinar habilidades, das mais sim ples, como certas h ab ili­
dades motoras e perceptuais, às m ai complexas, como aquelas
que, segundo algum as abordagens^ requerem o recurío a pro­
cessos m entais ou a faculdades cognitivas como pensamento e
criatividade. Isto porque, do ponto de vista de Skinner, co­
nhecim entos e habi dades tam b ém são comportam entos e
podem, por isso, ser descritos, nos objetivos de um plano
dc ensino, em term os de com portam entos a serem ensina­
dos aos alunos. A esse respeito, ele assim se expressa:

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o PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 67

Nós não ensinamos habilidades que se diz que os alunos


demonstram quando se comportam de forma habilidosa,
nós lhes ensinamos comportamento habilidoso. Nós não
transmitimos conhecimento; nós geramos comportamento
do qual se diz que mostra a posse de conhecimento. Nós
não melhoramos habilidades ou fortalecemos poderes ra­
cionais. Nós tornamos mais provável que o aluno mostre
o comportamento do qual habilidades e poderes são infe­
ridos. (Skinner, 1972b, p. 229)

A m aneira como a análise do com portam ento define


esses conteúdos do ensino é tratada no capitulo 4.
Embora seja um a atividade que exige um nível de co­
nhecimento relativam ente complexo e específico, a descri­
ção de objetivos de ensino em term os de comportamentos
deve ser realizada pelo professor. A s v an tag en s, já m en­
cionadas, dessa prática para a m elhoria do ensino parecem-
nos suficientes para ju stificar que o professor ap ren d a a
realizá-la.

SOBRE QUEM VAI SER ENSINADO

O subtítulo aborda a necessidade de o professor co­


nhecer o repertório com portam ental d e seus alunos e a sua
suscetibilidade aos reforçadores disponíveis na situação,
para planejar procedimentos de ensino que con: íderem a
individualidade de cada aluno.
Ao at ribuir um papel ativo ao ilu u o no processo de
aprender, já que ao ag ir ele produz as conseqüências que
acabam por determ inar seu próprio com porram ento, e ao
atrib uir ao professor a tarefa de p lan ejar e dispor as con­
dições que tornem prováveis os com portam entos que quer

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68 FORMAÇÀO DE PROFESSORES

ensinar ao aluno, a perspectiva com portam ental acaba por


colocar um a condição adicional para o planejam ento eficaz
do ensino; o conhecim ento, ainda que parcial, pelo profes­
sor, de cada um de seus alunos e das diferenças mais signi­
ficativas en tre eles, no que diz respeito aos comportamen­
tos possivelm ente já aprendidos e às variações na susceti-
bilídade aos reforçadores disponíveis na situação de ensino.
Consideramos "diferenças mais significativas’’ aquelas que jus­
tificariam o planejam ento de condições adicionais ou especiais
de ensino. “A não consideração das diferenças entre os alunos
é, talve 2 , a maior fonte isolada de ineficiência na educação"
(Skinner, 1968, p. 242; 1972a, p. 231).
Conhecer cada aluno e as diferenças entre alunos não
quer dizer que o professor precisa conhecer todos os com­
portam entos que cad a um de seus alunos é capaz de emitir.
O núm ero de alunos nas salas de aula e a variedade e com­
plexidade dos repertórios com portam entais inviabilizam tal
ra re fa ............................. .............. .................................
Quando falam os em conhecer cada aluno e as diferen­
ças entre eles, do ponto de vista com portam ental, referimo-
nos à identificação de comportamentos já disponíveis nos
repertórios dós alunos e que podem servir de ponto de p ar­
tid a para o ensino de novos com portam entos. Possibilitar
que os alunos apresentem um com portam ento que, sabida­
m ente, conseguem em itir e cuja probabilidade de ser bem
sucedido é alta —já que-há contingências em vigor que ex­
plicam sua m anutenção —pode se constituir em um a con­
dição adicional p ara o professor planejar situações em que
um novo com portam ento venha a ser ensinado de maneira
eficaz e em que os alunos o aprendam adequada e até fa­
cilm ente. A educação tem denominado essas condições
“pré-requisitos”, m as não as tem tratad o como comporta-

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o PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 69

mentos, no sentido definido pela análise com portam ental.


Diferenças en tre os alunos em relação aos com portam entos
já aprendidos podem significar diferenças nas condições a
serem criadas para que eles continuem aprendendo, e o
professor precisa ter clareza disso.
Conhecer os alunos a quem v a i ensinar e as diferenças
entre eles significa, tam bém , que o professor deve ser capaz
de identificar as suscetibilidades peculiares de seus alunos
aos reforçadores, naturais ou arbitrários, positivos ou nega­
tivos, disponíveis na sala de aula. U nia pequena parte des­
sas diferenças pode ser atribuída à variedade genética, mas
a maior p arte se deve a histórias variadas de reforçamento
dos indivíduos, ou seja, à diversidade de suas histórias de
vida. Em q u alq u er dos casos, no entanto, as diferenças de­
vem ser consideradas no planejam ento do ensino, se o pro­
fessor quiser que todos os seús alunos tenham oportunida­
des equivalentes de aprender. Com o afirm a Skinner "A
questão p rática não é tanto se essas dif<?renças são genéticas
ou am bientais mas se podem ser planejadas contingências
am bientais p a ta reduzir sua extensão" (1 9 6 8 , p. 241;
1972a, p. 230).
Interpretações críticas da proposta de Skinner apon­
tam, como u m a de suas m arcas, a desconsideração das ca­
racterísticas e interesses individuais, expressa por um tra­
tam ento hom ogeneizado de todos os alunos e p ela aplica­
ção de program as de ensino, d e forma m assíficada, a
muitos alunos. Segundo a crítica feita, um a concepção de
ensino como arranjo de contingências para m udar compor­
tamentos de alunos, a p artir de objetivos predefinidos, cons­
tem a negação d a diversidade e d a individualidade desses
alunos. T a l crítica, no entanto, parece-nos im procedente.
Mais do que sim plesm ente declarar seu respeito à indivi-

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70 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

dualidade e à singularidade de cada aluno, a proposta skin-


nenana de ensino, a nosso ver, expressa de modo concreto
esse respeito ao tratar, como comportam entos a serem en­
sinados a todos os alunos, certas características — a criati­
vidade, por exemplo — geralm ente tomadas como traços
peculiares e distintivos d a singularidade de alguns alunos,
e adotadas como critério para selecionar aqueles que supos­
tam ente as possuem.
A nosso ver, a posição de Skinner não poderia ser ou­
tra. Sustentado em' uma visão que concebe o hom em como
produto e produtor de histórias genética, am biental e cul­
tural, nas quais os princípios de variação e seleção atuam
de modo a garantir a evolução, o autor, coerentem ente,
constrói um a proposta de ensino que possibilita, pelo m e­
nos em parte, a produção da variação e da diversidade
como condição para a seleção. Diz ele:

Uma tecnologia do ensino pode resolver muitos dos pro­


blemas criados pelas diferenças entre os estudantes, suple­
mentando histórias ambientais deficientes e assegurando-se
de que as contingências inscrucionais são completas e efi­
cazes. Não reduzirá, enttetanto, todos os alunos a um só
padrão. Ao contrário, descobrirá e valorizará as diferenças
genéticas genuínas. Se for baseada em uma sábia política,
será capaz de planejar contingências ambientais que darão
lugar à mais. promissora ,diversidade. (Skinner, 1968,
p. 24 3; 1972a, p. 232)

Temos ciência de que, nas circunstâncias etn que reali­


zam seu trabalho, é difícil para m uitos professores identi­
ficar e an alisar os repertórios com portam entaís de seus alu ­
nos e as diferenças significativas entre eles. Mas a dificul­

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO. 71

dade da tarefa não a faz dispensável. Condições precisam


ser criadas para que o professor aprenda a fazer esse tipo
de análise e para que ele possa realizá-la de modo útil em
sua sala de aula. Tanto quanto a colocação de objetivos em
termos com portamentais, o conhecim ento dos alunos e de
suas diferenças, ao possibilitar uma m elhoria nas condições
de aprendizagem do aluno, certam ente tam bém contribui
para m udar as condições de trabalho do professor. Coloca­
do, mais freqüentem ente, em situações em que vê seus alu­
nos aprendendo m ais e com m enos esforço, o professor,
provavelm ente, ensinará melhor e co m mais satisfação.

SOBRE A SITUAÇÃO DE ENSINO

N este su b títu lo são apontados os cuidados necessá­


rios ao uso dos reforçadores disponíveis na sala de aula, em
especial os reforçadores pessoais; re to m a-se , e iji alg u m a
m edida, a q u estão do uso de reforçadores n atu rais ou ar­
bitrários.
.......... Para que o professor seja capaz d e arranjar, com peten­
temente, as contingências para o ensino dos comportamentos
descritos nos objetivos, a alunos cujos repertórios comporta-
metitais m inim am ente conhece, é necessário que ele identifi­
que, dentre os variados reforçadores existentes na escola,
aqueles acessíveis ao seu controle e m an ip u lação e disponí­
veis aos alunos pelo arranjo de contingências.
Embora o próprio Skinner afirm e, como já m enciona­
mos anteriorm ente, que as relações d e contingência estabe­
lecidas entre o com portam ento e suas conseqüências sejam
mais im portantes do que a natureza dos reforçadores utí-

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72 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Jizados, alguns comentários sobre os reforçadores disponí­


veis ao professor e sobre os cuidados necessários ao seu uso
parecem -nos necessários.
O recurso aparentem ente simples aos reforçadores na­
turais, em situações cotidianas, se vê lim itado na situação
formal de ensino, dada a inucilidade de alguns de seus mais
poderosos tipos. Sobre eles, Skinner afirm a:

Nem todos os reforçadores naturais são úteis. A maiotía


dos que têm óbvio significado biológico, como alimento e
dano, não é naturalmente contingente ao comportamento
em um currículo padrão. (1968, p. 153; 1972a, p. 145)

Outros reforçadores naturais, que são prim ários ou in-


condicionados2, tais como a afeição, a atividade, a novidade
e a exploração do am biente, têm sido mais comumente
«usados de modo assistem ático e não como parte de um cui­
dadoso planejam ento de contingências.3 A cabam , assim,
por corresponder, na p rática, a uma omissão do professor
quanto a seu papel de ensinar. Eventos reforçadores desse
tipo têm m aior probabilidade de gerar com portam entos in ­
com patíveis com o trabalho na sala de aula. U m a breve ob­
servação de um recreio escolar ilustra esse efeito. Privado

2 Estamos considerando como reforçadores primários aqueles de óbvio


valor biológico.
3 Referindo-se a alguns desses reforçadores naturais que são primários ou
úicondicíonados, Millenson (ríJJ5) afirma que: "a importância de alguns
desses reforçadores pFímários foi reconhecida apenas recentemente. Em
muitos casos, ainda temos muico o que descobrir sobre as operações que
determinam suas forças reforçadoras. Em outros casos, tais como explo­
ração, novidade e afeição, a especificação real da classe de estímulos
reforçadores escá loage de ser estabelecida” (p. 371).

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o PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 73

de com portar-se de modo ativo durante o tempo de aula, o


aluno passa a maior parte do tempo de recreio correndo, pu­
lando e com portando-se ativam en te. No entan to, os efei­
tos reforçadores produzidos po r esses com portam entos
não são, em geral, adequados com o conseqüências para as
atividades que ocorrem na sala de aula, onde o aluno é
solicitado a ficar sentado, parado e quieto.
. Por produzirem efeitos a longo prazo, reforçadores na­
turais são pouco eficazes em situações de ensino form al, nas
quais m udanças com portam entais obedecem a ritmos di­
versos daqueles das situações naturais. D evem , pois, ser
substituídos por reforçadores arbitrários que possam gerar
os com portam entos a serem ensinados. Mas o recurso a re­
forçadores arbitrários tam bém requer cuidados.
D entre os reforçadores arbitrários, Skínner cham a a
atenção, em especial, para os poderosos reforçadores
pessoais e aponta algum as dificuldades de seu uso. Dada
a sua disponibilidade, os reforçadores pessoais, positivos óu
negativos, sob a forma de atenção e aprovação do professor,
ou sob a form a de não-atençao e repreensão, usados em de­
m asia levam alguns alunos a estabelecerem um a pouco efi­
caz relação de dependência do professor. O planejam ento
de contingências que fazem uso d e reforçadores pessoais é
dificultado pela instabilidade que os caracteriza. Provavel­
m ente em razão de sua história pessoal, professores recor-.
rem de modo inconsistente aos reforçadores pessoais. Skinner
relata exem plos que nos parecem fam iliares:

Contingências pessoais são instáveis. O professor pode re-


cer sua aprovação para incentivar o aluno a se esforçar
mais, mas depois aprova-o depressa demais quando ele dá
sinais de extinção (desânimo). Pode reter a ajuda para que

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74 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

o aluno receba todo o mérito, c depois ajudar demais para


evitar que ele passe vergonha. Alunos comumeme quei­
xam-se de favoritismo e hostilidade, nem sempre sem ra­
zão. (19 6 8 , p. 15 2 ; 1972a, p. 144)

O professor, tam b ém controlado por reforçadores pes­


soais tornados disponíveis por seus alunos, pode acabar,
inadvertidam ente, reforçando aqueles alunos que° compor­
tando-se de modo inadequado, acabam chamando sua aten­
ção. Alunos que se engajam em comportamentos de bajulação
ao professor são u m exemplo do que contingências de refor-
çamento pessoal m al administradas podem produzir.
A eficácia d e m uitos dos reforçadores arbitrários usa­
dos na sala de a u la depende de seu valor reforçador para
o aluno e de sua utilização, de modo sistem ático, em con­
tingências p lan ejad as de reforçamento. As notas são um
bom exem plo. Seu valor reforçador depende de estados de
privação qwe p recisam ser planejados: ‘‘nem todos podem
gan h ar prêm ios e se alguns alunos devem gan h ar notas a l­
tas, outros p recisam tirar notas baixas" (Skinner, 1968,
p. 150; 1972a, p. 142). Além disso, raram ente o aluno
tem acesso ao resu ltad o de seu trabalho, expresso em nota,
tão logo o ten h a realizado.
Muitos dos reforçadores arbitrários, positivos ou nega­
tivos, usados na escola — notas, promoções, honras e cas­
tigos — são p ro b lem ático s não porque são artificiais, mas
porque são artificial e inefetivamente contingentes a com­
portam entos.
A solução desse problem a não esfa, como vimos, no
retorno aos reforçadores naturais, a pretexto de preparar
m elhor o aluno p a ra se comportar em função de conse­
qüências rem otas. Segundo a análise com portam ental, é

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O PLANEJAMENTO SfSTEMÁTICO DO ENSINO 75

possível, por meio de procedimentos d e ensino adequada­


m ente planejados, produzir reforçadores que acuem como
mediadores entre o comportamento a tu a l do aluno e as
conseqüências rem otas. Sob certas condições, o aluno pode
ser ensinado a identificar padrões aceitáveis de com porta­
m ento e a em iti-lo s de modo a g erar, au to m ática e im e­
diatam ente, eventos reforçadores para si mesmo. T rata-se
de um processo em que ocorre uma m u d an ça no tipo de
evento reforçador que controla o com portam ento do aluno,
substituindo-se os reforçadores arbitrários, arranjados pelo
professor, por reforçadores autom aticam ence gerados pelo
próprio aluno ao se com portar. Esses reforçadores autoge-
rados são fundam entais para liberar, paulatinam ente, o
aluno dos reforçadores artificiais do ensino.
Ao analisar as possibilidades e lim ites dos reforçadores
disponíveis no ensino e ao propor um a estratégia para sua
utilização, Skinner expressa um a confiança nas contribui­
ções da análise com porcam ental para a elim inação do con­
trole aversivo e para a construção de procedim entos de en­
sino isentos de seus perigosos subprodutos. Permttimo-nos
citar um a passagem mais longa de Skinner, que nos parece es­
clarecedora a esse respeito, sem nos preocuparmos em retomar
a análise skinneriana do controle aversivo, a nosso ver já ex­
plicitada na p. 43, no item “O uso de controle aversivo no en­
sino: um a dificuldade a ser superada”. Diz èle que:

Estão agora disponíveis técnicas de reforçamento que po­


dem substituir as técnicas aversivas que dominaram a edu­
cação por milhares de anos. Podemos ter alunos que pres­
tam atenção não porque temem as conseqüências de não
fazê-lo ou porque estão atraídos por características fasci­
nantes, ainda que vulgares, mas porque prestar atenção

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76 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

provou ser proveitoso. Podemos ter alunos que estao inte­


ressados em seu trabalhe não porque o trabalho foi esco­
lhido por ser interessante ou porque sua relação com coisas
interessantes foi ressaltada, mas porque o complexo com­
portamento que denominamos “ter interesse" foi fartamen­
te reforçado. Podemos ter alunos que aprendem não por­
que serão punidos por não aprender, mas porque come­
çaram a sent_: as vantagens naturais do conhecimento
em oposição à ignorância. Podemos ter alunos que con­
tinuarão a se com portar efetivam ente depois do ensi­
no ter term inado potque as contingências que foram
usadas por seus professores encontram contrapartida
na vida d á ria . Acim a de tudo, podemos ter alunos de­
dicados que se tornarão homens e mulheres dedicados.
(1972b , pp. 221-2 2 2 )

Sem dúvida o caminho proposto pelo autor é comple-


:o e requei do professor conhecimentos e condições para
percorrê-lo.
Cabe ao professor tom ar desde as mais simples m ecí-
das de organização física da sala de au la e da escola, tor-
nando-as am bientes estim ulantes que atraíam p r ;sétiça
do aluno, passando pela criação de reforçadores arbitrários
explicitam ente contingentes aos com portam entos que pre­
tende ensinar, até chegar às m edidas mais complexas que
possibilitem a passagem -para .ontingéneias mais *utis e,
eventualm ente, para con. ingéneias inerentes ao ambiente físi­
co e social da vida diária do aluno” (Skinner, 1972b, p. 221).
As dificuldades e a com plexidade que caracterizam
esse processo só podem ser superadas com procedimentos
criteriosam ente planejados, sem perder de y ísta a m arca ca­
racterística do trabalho educacional: passar dos reforçadores

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o p l a n e ja m e n t o s is t e m á t ic o d o e n sin o 77

arbitranos imediatos para os reforçadores autogerados, de


modo a preparar o aluno para as conseqüências naturais,
raram ente im ediatas, que os substituirão quando eíe não
mais estiver sendo ensinado.
Os principais procedim entos de ensino propostos por
Skm ner, a partir desta análise, são apresentados a seguir.

PROCEDIM ENTOS PARA UM ENSINO EFICAZ

São retomados os conceitos de ensino e com portam en­


to operante, a partir dos quais são estabelecidos os critérios
para a proposição de diferentes procedimentos de ensino.
Os procedimentos de ensino propostos pelo autor re­
produzem , dentro de limites peculiares à situação educacional,
alguns dos procedimentos básicos descritos péla análise do
comportamento para explicar o comportamento humano.
R evela, pois, em su a ló gica, um a coerência com o
referencial sistem atizado posteriorm ente por Skinner para
explicar a evolução do com portam ento hum ano, com base
nos princípios de variação e seleção/
Q uando falamos em um ensino eficaz, em linguagem
leiga, referimo-nos ao processo que visa, em tese, ensinar
ao alu n o algo novo, que ele desconhece ou que conhece de
fornia incorreta ou incom pleta.
Essa afirmação, transposta para a term inologia da
análise do com portam ento, poderia ser assim enunciada: ao
ensinar queremos que o aluno aprenda comportamentos
novos q u e ele não possui em seu repertório, ou que possuí

4 Conforme capículo 1.

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/
78 FOR, ÍA Ç Ã O DE PROFESSORES

sob formas inadequadas. Mas a afirm ação poderia ser, ain ­


da, com pletada: o aluno aprende com portam ento novo
quando aprende a em itir, pela prim eira vez, um a resposta
que não possui em seu repertório ou a em itir formas de res­
postas diferentes das que já possuí; quando aprende a em i­
tir respostas diferenciadas, sob condições variadas e, tam ­
bém, quando contínua mantendo a resposta aprendida
mesmo quaudo ela produz conseqüências diferentes das pro­
duzidas originalm ente. ■ ■ ■
Preserva-se nessa explicitação a definição proposta por
Skinner segundo a q ual comportamento [operante] é a re­
lação entre um a resposta, as condições propícias à sua em is­
são e as consequências por ela produzidas. Mudanças em
qualquer um dos term os dessa relação significa com porta­
m ento novo.
E se ensinar é arranjar contingências de reforço, os pro­
cedimentos de ensino propostos por Skinner referem-se, exa-
am í nte, a interferências piam :jadas ém qualquer um dos ele­
mentos que compõem tais contingêm ias. Diferentes procedi-
mencos podem interferir, prioritariamente, em um de seus
componentes, mas alteram a relação como um todo.
São apresentados, a seguir, os diversos procedimentos, na
segt ’nte sequência: os que atuam diretam ente sobre as respos­
tas, os que atuam sobre as condições antecedentes e os que
atuam sobre as conseqüências das respostas.

PROCEDIMENTOS DE ENSINO QUE ATUAM


SOBRE AS RESPOSTAS EMITIDAS

A m odelagem por reforçamento diferencial de respos­


tas que g rad u alm en te se aproximam d a resposta esperada
é o procedim ento básico apresentado neste subtítulo.

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 79

Para que um a nova resposta seja ensinada (ou porque


não existe no repertório do aluno ou porque, m esm o exis­
tindo, precisa ser m elhor executada), o professor deve, par­
tindo de outras respostas já aprendidas pelo aluno, adotar
um procedi mento que possibilke construir um a nova resposta.
Se não o fizer, o professor pode ter que aguardar por muito
tempo até que a resposta esperada ocorra, o que, em alguns
casos, pode ser bastante demorado, se não impossível.'
U m procedimento mencionado por Skinner, para g a ­
ran tir mais rapidam ente a emissão de um a nova resposta
a ser reforçada, consiste em “forçar fisicam ente o compor­
tam ento", quer de modo explícito (como quando o profes­
sor segura e move a mao do aluno para que ele aprenda a "es­
crever" as letras), quer de modo sutil (como quando o aluno
trabalha com m aterial que estabelece o lim ite físico do traçado
que ele deve fazer). Esse procedimento, de uso restrito a pou­
cos com portam entos, tem , em qualquer dos exemplos ci­
tados pelo autor, o inconveniente de colocar o aluno em
um a situação caracteristicam ente aversiva.
U m procedim ento m ais adequa.do para ag ilizar a ocor­
rência de um a nova resposta consiste em to m ar como pon­
to de p art da respostas em itidas pelo aluno e reforçá-las di-
ferencialm ente. isto é, reforçar algum as respostas e não re­
forçar outras. As respostas reforçadas são aquelas que se
aproxim am , cada vez m ais, do com portam ento que se quer
en jín ar. Ã decisão de quais respostas reforçar requer do
professor habilidade não só em distingu ir as pequenas al­
terações nas respostas em itidas pelo aluno, m as, tam bém ,
em estabelecer critérios segundo os q uais reforçar ou não
certas respostas.
O procedim ento não consiste de u m conjunto de pas­
sos previam en te definidos a serem executados pelo profes-

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80 FORMAÇÃO DE PKOFESSORES

sor em qualquer situação. Este precisa cer clareza quanto ao


comportamento final que quer ensinar ao aluno; precisa, tam ­
bém, reconhecer que comportamentos complexos têm uma
natureza concínua e que sua unidade é construída "por uni
processo contínuo de reforçamento diferencial a parcir de
com portam ento indiferenciado” (Skinner, 1974, p. 60).
Fazendo um a analogia com o trabalho do escultor que
modela a argila em estágios sucessivos até o produto final,
sem que haja um ponto em que esse produto repentina­
mente apareça, Skinner afirm a: “No mesmo sentido, um
operante não é algo que surja totalm ente desenvolvido no
com portam ento do organism o. E resultado de um contínuo
processo de m odelagem " (1974, p. 59)
É, pois, esse procedimento, denom inado modelagem,
em que o professor atua reforçando diferencialm ente res­
postas do aluno de modo a, grad u al e sucessivamente,
construir a resposta final que quer ensinar, o procedimento
que possibilita partir de respostas indiferenciadas e construir
um a nova classe, pela m udança grad u al de propriedades
das respostas que a definem.
A im p o rtân cia atrib u íd a por Sk in n er ao p ro ced i­
m ento de m o d elag em pode ser ilu strad a com a segu in te
afirm ação:

Focmas bastante complexas de comportamenco podem ser


geradas, freqüentemente com uma surpreendente rapidez,
por meio de uma série de estágios que levam às especifi­
cações terminais. É possível realmente, “ver a aprendiza­
gem acontecer" e a visibilidade é importante. (...) A pes­
quisa tradicional em aprendizagem raramente foi muito
útil em educação e isso, em parte, porque ela negligenciou
o processo de modelagem. (1972b, p. 228)

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o PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 81

PROCEDIMENTOS DE ENSLNO QUE ATUAM


SOBRE OS ESTÍMULOS ANTECEDENTES

São discutidas as possibilidades e cuidados no uso de


modelos a im itar ou de instruções que induzem o aluno a
em itir um a resposta, enfatizando-se a necessidade de reti­
rada gradual desses estímulos indutores, de modo a possi­
bilitar que outros estímulos passem a produzir a.resposta
em itida inicialm ente por indução.
Ao produzir, deliberadam ente, alterações nos eventos
que antecedem a ocorrência de u m a resposta, o professor
também está possibilitando que seu aluno aprenda de
modo mais fácil um novo com portam ento e está, portanto,
ensinando.
Pode fazer isso tomando como m odelo ou comporta-
mentos adquiridos por outros organism os ou produtos des-,
ses com portam entos e usando-os p a ra induzir o atuno a
agir de modo a reproduzir aqueles comportamentos ou
aqueles produtos.
......... Esse processo, denominado imitação, foi, na análise de
Skinner, crucial para a evolução do com porcam ento huma­
no pois possibilitou ao homem

(...) tirar proveito de' comportamentos já adquiridos por


outtos. [A imitação] freqüentemente coloca o imitador em
contato com as consequências reforçadoras responsáveis
pelo comportamento imirado. O comportamento do imi­
tador é “iniciado" no sentido de ter sido ptoduzido pela
primeira vez e, usualmente, quando é provável que seja re­
forçado. {19 9 0 , p. 1206)

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82 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O professor pode construir situações dc ensino nas


quais fornece ao aluno um modelo, quase sempre o próprio
professor, cujo com portam ento o aluno deve im itar para ser
reforçado. O que mduz o aluno a agir é um estím ulo de­
liberadam ente presente na situação e a resposta esperada
do aluno, para ser reforçada, deve ser igual ao estím ulo que
a induz.
O professor pode, tam bém , oferecer como modelo a
ser im itado, os resultados produzidos pelo com portam ento
de outro agente, N este caso, o que leva o aluno a agir é
o produto de um com portam ento; o com portam ento do
aluno será reforçado se apresentar o mesmo produto.
Tais procedim entos, denominados por Skinner, res­
pectivam ente, contingência de duplicação de movimento e contin­
gência de duplicação de produto, requerem que as respostas do
aluno sejam diferencialm ente reforçadas, de m odo a levá-lo
a identificar com precisão, isto é, a discrim inar, os aspectos
sutis do com portam ento ou do produto a im itar. Reque­
rem , tam bém , que tanto o com portam ento do modelo
quanto o do aluno, no prim eiro caso, bem como o produto
apresentado e o produto realizado pelo aluno, no segundo
caso, sejam tornados claros e visíveis.
A dequada para induzir a ocorrência de um novo com ­
portam ento, a utilização acriteriosa dessas contingências
pode levar o aluno a u m a reprodução de com portam entos
irrelevantes e à generalização indevida do com portam ento
de im itar, para situações em que esse com portam ento não
é cabível
Mtmos professores usam estratégias de ensino que po­
d eriam ser id en tificad as com as co n tin gên cias descritas.
É b astan te provável, porém , que, por desconhecim ento de
suas características e lim ites, os professores acabem por

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 83

sub-utilizá-las ou por incorrer em usos não apenas pouco ade­


quados, como incompatíveis com objetivos educacionais que
propõem form ar indivíduos autônom os e originais.
O utra estratégia de ensino, diversa das anteriores, mas
tam bém utilizada para induzir a ação do aluno, consiste em
tornar explícito, por meio de com portam ento verbal de al­
guém, em geral o professor, o que o aluno deve fazer. Nes­
te caso, não se m ostra ao aluno nem o com portam ento a
ser em itido nem o produto do com portam ento a ser repro­
duzido. O professor, com portando-se'verbalm ente, produz
como conseqüência de seu com portam ento a m udança no
com portam ento, verb al ou não verb al, do aluno, mudança
essa que corresponde à emissão d o novo com portam ento.
Aqui, tam bém , parece-nos possível identificar, no p ro ­
cedim ento proposto, as marcas da análise feita por Skinner
sobre a evolução do com portam ento hum ano, segundo a
qual o a u tor atribui o aum ento na possibilidade de m udan­
ça que um indivíduo exerce sobre o com portam ento de ou­
tro a um a transform ação evolutiva fundam ental, identifica­
da por ele com o “controle operante da m usculatura vocal”:

As espécies experimentaram uma outra mudança evolucioná­


ria única quando sua musculatura vocal ficou sob controle
operante e quando o comportamento vocal começou a ser
modelado e mantido por suas conseqüências reforçadoras.
As pessoas puderam, então “indicar" (to p r i m e f o compor­
tamento de outros dizendo-lhes o que fazer (...). (Skinner,
1 9 9 0 , p. 1 2 0 6 )

5 Por não haver correspondência precisa em português, mantivemos,


junto à tradução utilizada, o termo original.

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/

84 FOKM AÇÀO DE PROFESSORES

A evolução do comportam ento verbal possibilita que


os homens cooperem entre si e se beneficiem do que outros
já aprenderam . Segundo Cacama (1992),

um a das principais realizações do com portam ento verbal é


p e rm itir que o com portam ento seja controlado p o r descri­
ções das contingências via com portam enro verbal de outros
bem c o m o .via contato d ireto .co m as próprias c o n tin g ê n ­
cias. (p. 1 6 5 )

H com um , na situação de ensino, o recurso a um a im ­


portante classe de comportamento verbal denominada instru­
ção, que se caracteriza pela substituição de contingências na­
turais por estímulos discriminativos verbais capazes de “indi­
car” {to prime) o comportamento, seja verbal seja não-verbal,
do aluno. Por induzirem o aluno a se comportar substituindo
as contingências naturais por estímulos verbais, as instruções"
são eficazes em situações còmo as de ensino, em que as con­
seqüências naturais são demoradas ou ineficientes.
A eficácia das instruções pode ser maior do que a das
conseqüências naturais. Acabam , assim , gerando com porta­
mentos não sensíveis às conseqüências naturais e levando o
aluno a àg ir e a ser reforçado apenas pelo próprio fato de
seguir as instruções. Uma situação de ensino m àrcada pelo

6 Sobre a instrução como importante dassc de comportamento verbal,


Caratiia (1999) afirma: "Algumas intruções aferam o comportamento
não-verbal (...); outras afetam o próprio comportamento verba] {...).
A função mais ampla da linguagem é a instrução: dizemos uns aos
outros o que fazer e o que dizer. A linguagem não é um instrumento
da razão ou um veículo da verdade; essas propriedades são apenas
corolários de sua função primária, a mudança do comportamento do
ouvinte" (p. 275).

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 85

recurso constante a instruções pode contribuir para tornar


os alunos dependentes do que Lhes é dito ou ordenado e
submissos à autoridade que instrui ou ordena.
Referindo-se ao uso inadequado, quer dos modelos a
serem im itados, quer das instruções, Skinner afirm a que:

Os repertórios “indicados" (p rim in g ) estão sendo mal em­


pregados quando o professor accita a simples execução do
comportamento como um objetivo, pouco importando se
o aluno tende a se comportar do mesmo modo depois que
os “indicadores" (primes) tenham sido retirados. (1968,
p. 2 1 1 ; 1972a, p. 200)

De modo mais radical, o autor considera que proce­


dimentos propostos para induzir o aluno a se comportar
podem não ensinar. Apenas criam condições para que, uma
vez emitidos, os comportam entos possam vir a ser coloca­
dos, por rnéiò de outros procedimentos, sob o conrrole c&
novas variáveis. Como afirma Skinner, “a aprendizagem
não ocorre porque o com portam ento foi ‘indicado’ (primed)\
ocorre porque o comportamento, 'indicado' (primai) ou não, é
reforçado” (1968, p. 212; 1972a, p. 202).
O recurso a “indicações" (primes) p ara induzir o com­
portam ento do aluno não garante que o com portam ento
em itido passe a ser controlado por outros estím ulos, diver­
sos do estim ulo indutor. É necessário alte rar gradualm ente
os estím ulos sob os quais o aluno é induzido a se compor­
tar, reforçando diferencialm ente as respostas a proprieda­
d es cada vez m ais tênues desses estím ulos, de modo que os
com portam entos aprendidos possam vir a ocorrer sob con­
dições diversas. Cabe ao professor, tendo em vista objetivos
de longo prazo, construir estratégias de ensino p ara tornar

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86 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

o estim ulo in du tor cada vez mais fraco, até torná-lo desne­
cessário como variável controladora do com portam ento do
aluno.
Um a vez em itido o novo com portam ento, ajuda adi­
cional fornecida pelo professor pode, ainda, set necessária
para que a resposta induzida continue a ocorrer. Tam bém
esse tipo de ajuda deve ser usada com cuidado pelo profes­
sor. Sobre ela, Skinner afirma- que: . - -

E pre< iso fazer uma distinção entre dois tipos de auxílio.


O professor auxilia o aluno a responder em uma dada oca­
sião e ajuda-o dc modo que responda a situações similares
no futuro. Precisa, com freqüência, dar ao aluno o primeiro
tipo de ajuda, mas só está ensinando quando lhe oferece o
segundo tipo. (1968, p. 216; 1972a, p. 205)

Quer a preparação para a er issão le m novo coni


portamento, quer r ajuda para que ele se fortaleça, segundo
o autor, “devem ser (...) cuidadosamente esvanecidos até que
o comportamento ocorra sem ajuda" (Skinner, 1987, p. 124).
E difícil para o professor ver seu aluno ansiosamente
tentando acertar. A aversividade dessa situaçao pode fazer
com que o professor se m antenha ofereçcp lo ijuda, sem se.
d spor a testar a possibilidade de m inim zá-la. Ao fazê-lo,
o professor continua a ensinar o aluno a se com portar ape­
nas sob ás condicões específicas presentes n a situação de en­
sino, dificultando a aquisição de u m repertório variado e
versátil, que p o sjibílite ao aluno lidar de modo eficiente
com seu cotidiano futuro.

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO 87

PROCEDIMENTOS DE ENSINO QUE ATUAM


SOBRE AS CONSEQÜÊNCIAS

A preocupação de Skinner com a manutenção do


com portam ento aprendido é expressa pela defesa da u tili­
zação, no ensino, de enquemas de reforçamento in term iten­
te. O conceito de motivação é retom ado neste subtítulo e
são indicadas as dificuldades no uso d e reforçamento inter­
m itente.
Os procedim entos de ensino até aqui apresentados vi­
sam g aran tir que o aluno adqu.ra com portam entos novos
e bem executados e/ou que seja capaz de assim se compor­
tar, mesmo sob circunstancias diferentes daquelas em que
os adquiriu.
M as, coerente com suas concepçóes de com portam en­
to e de ensino, Skinner não se restringe a tais procedim en­
tos. H á, na perspectiva por ele adotada, a necessidade de
propor um terceiro tipo ic 1 >cedin e it< jue acuz c ri -
ritariam ente, sobre o uitim o term o d a relação operante —
as conseqüências —de modo a possibilitar um ensiuo eficaz.
Problernaj relativos à natureza dos reforçadores u tili­
zados na situação de ensino já nos parecem suficientem ente
expli< itados. C abe, a nosso juízo, aprofundar um aspecto,
ali apenas m encionado, relativo a freqüência com que o
eventc reforçador é tornado co ntingente á resposta que o
produz. Reafirmamos, asiim, nossa concordância com Skinner,
quando diz que “para m elhorar o ensino é menos im por­
tante encontrar novos reforçadores do que planejar m elho­
res co n tin gên cia? usando os já disponíveis” (196 8 , p. 155;
1972a, p. 147).
A ênfase no planejam ento de “m elhores contingên­
cias" de ensino tem como objetivo possibilitar ao aluno não

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88 FORMAÇ a O de p r o f e s s o r e s

só a aquibíção de novos comportamentos, mas sua m an u ­


tenção em situações novas. O autor difere assim, segundo
sua própria avaliação, de outras posturas na explicação da
aprendizagem . Afirma ele que:

Estudos de reforçarnento operante diferem de estudos an­


teriores iobre aprendizagem ao enfatizarem a manutenção
assim como a aquisijão do comportamento. A aquisição é
a mudança visível trazida a efeito pelo reforçarnento, mas
a manutenção do comportamento em um dado estado de
força é um efeito igualmente importante. Um bom progra­
ma reforça o aluno abundantemente e exatamente nos m o­
mentos corretos. Ele modela novas formas dc comporta­
mento sob o controle de estímulos apropriados, mas a coisa
importante é que ele mantém o comportamento do aluno.
Ele ptende sua atençao. Ele o mantém, trabalhando
' (Skinner, 1972b, p. 229)

E na m aneira pela qual as conseqüências reforçadoras


são tornadas condngentes ao conjportamento do alunc c u e
está a possibi idade de enstaá -lo de modo a aum entar a
probabilidade de que comportamentos aprendidos se m an ­
tenham fortalecidos.
Faz se necessário rei .marrnos, aqui, o cpnceitp dc m o­
tivação, ao qual nos eferimos anten' jruiente, quando tratamos
da noção de aprendizagem na perspectiva skinneriana.
N aquela oportunidade procuramos indicar que, vir.ta
sob a ótica d a análise comportamental a motivação não é um
determinante de comportamento dii gente, mas é, ela própria,
a explicitação, em termos comportamentais, de contingências

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O PLANEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ENSINO ........................ 89

de reforçamento capazes de m anter uni comportamento


aprendido, em um dado estado de força, por longos períodos
de tempo, com reforçamento pouco freqüente.
As contingências que produzem tais padrões compor-
cam entais são aquelas em que a relação entre a resposta e
sua conseqüência é colocada sob um esquem a ntermitente,
isto é, um esquema em que a cada resposta não se segue, ime­
diata e consistentemence, o evento-reforçador Este é progra­
mado para estar disponível ou após um certo número de
respostas ou após a p á m e ira resposta depois de decorrido
um certo tempo desde a últim a resposta reforçada.7
Segundo fl m ner “a esquem atização eficiente de refor­
çam ento é um im portante elem ento no planejam ento edu­
cacion al” (1968, p. 78; 1972a, p. 76), e m uitos compor­
tam entos, coraum ente atribuídos à “m otivação”, .identifica­
dos como “dedicação” e “interesse" são decorrência de
Situações de ensino em que ilu n c é exposto a esquemas
de reforçamento interm itente.
Skinner dedica especial atenção às possibilidades de
uso, em procedimentos de ensino cuidadosam ente planeja­
dos. d e esquemas que adotam como critério de reforçamen­
to o número de respostas do aluno, nos quais o professor
v a i3 gradualm ente, aum entando a exigên cia quanto ao nú­
mero de resposcas necessárias para que o reforçamento ocorra.
Sob tais condiçoes ‘ e possível atingir-um estágio em que o
com portam ento é m am .do indefinidam ente por um núme-

7 Os eiquemas intermitentes são denominados, respectivamei.ce, esque­


ma de razão e esquema de intervalo, podíado cada um deles, adicio­
nalmente, ser fixo ou variável, cm rar.ão da imobilidade ou mobilidade
do critério estabelecido para que o 'eforço seja liberado.

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90 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

ro espantosamente pequeno dc reforçamentos" (1968 p. 159;


1972a, p. 150), fortalecendo de modo significativo o compor­
tamento do aluno.
Novamente, como nos casos dos demais procedimentos
de ensino, o autor alerta para as dificuldades do seu uso.
Por um lado, é reforçador para o professor, interagindo
com seu aluno, vê-lo acertar, o que torna mais provivel que
ele o reforce tào logo a resposta esperada c corra e tenha di­
ficuldade em trabalhar com reforçamento intermitente.
Por outro lado, o professor tende a náo ser reforçado
por respostas de alunos cuja qualidade esteja abaixo de um
padráo preestabelecido; controlado por esse padrão, o pro­
fessor pode ser levado a aum entar, às vezes m uito rapida­
mente para as condicões de certos alunos, o nível de exi­
gência. A pressão de pais ou de instâncias educacionais às
quais está submetido pode, tam bem , levar o professor a
criar, para alguns de seus alunos, um a situação de tal exi­
gência que acaba por “desm otiva ios".
Estudos revelam que exigir de um indivíduo que res­
ponda num patam ar acim a dc suas possibilidades pode pro­
duzir efeii;os problem áticos. A quantidade de leitu ra pro
gramada pelo professor é um exem plo com um de so licita­
ção que pode colocar, para alguns alunos, um a exigência,
superior àquela que podem atender.

Para um dado organismo e uma dada quantidade de refor­


ço, há uma razao limite, além da qual o comportamento
não pode ser tnantid: Ulcrapassar essa razão resulta em
um gtau extremo de extinção do tipo que denominamos
abuii . Longos períodos de inatTvidadc começam a aparecer
entre conjuntos separados de razão. (Skinner, 1974, p. 66)

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O P A.NEJAMENTO SISTEMÁTICO DO ,‘NSINO 91

A constatação nos parece bastante plausível, se consi


derarmos as condições de ensino oferecidas em nossas salas
de aula e a m aneira como certos alunos a elas reagem.
As estratégias para equacionar o problem a da m anu­
tenção do com portam ento aprendido pelo aluno revelam
um a grande com plexidade, adm itida pelo próprio autor
quando Lfirrna que:

Programas eficazes dependem de- reforçadores um canto


imprevisíveis e é difícil avaliar a força do comportamento
do aluno e daí saber quando aumentar a razão. Talvez um
programa ótimo seja sempre, até certo ponto, um aciden­
te; não obstante, e importante o princípio geral de passar
do reforço frequente para o raro. (Skinnet, 19<$8, p. 166;
1972a, p. 157)

Talvez não seja, mesmo, possível ao professor criar to


das as condições necessárias para g aran tir a m anutenção do
com portam ento do aluno, apenas p o r méio d í roceditr en -
tos de ensino adequados. Outras m udanças no processo de
ensinar precisam ser im plem entadas com vistas a contribuir
pãra a concretizaçao do principio enunciado.
É na sua proposta relativa aos conteúdos a ensinar, em
especial na defesa do ensino do autogoverno, que o autor
explicita, a nosso ver, um a outra contribuição possível na-

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C apítulo 4

SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO

A ÊNFASE NA TRAN SM ISSÃO DE CONHECIMENTOS

São apresentados, neste subtítulo, os argumentos de


Skinner em defesa do ensiao como transm issão de conhe­
cim entos, em contraposição à ênfase nas descobertas feitas
pelo aluno, exp licitan do -:e sua concepção de conhecimento
como com portam ento verbal.
As c ntribuições de Skii .fter para a área da educação,
expressas pela proposição de um a m etodolog:' i para um en­
sino mais eficaz e menos árduo, q u er p ara os alunos quer
para os professores, não poderia se ab ster de abordar a
quCstão relativa ao que deve ser ensinado, j i que tal aspec­
to, longe de se constituir em um m ero apêndi' :e da analise
e da proposta, e delas parte inerente.
Movido p ela concepção de educação como preparo do
aluno para um m undo existente esp aciaim en te fo a e tem -
poralm ente distan te d a escoia, S k in n er defende a necessi­
dade de um ensino que possibilite ao aluno construir um
extenso repertório com portam ental, que inclua a variedade
de com portam entos necessários p a ra produzir efeitos sobre
a realidc.de e sobre si mesmo, g aran tin d o sua sobrevivência
individual e a do grupo social.

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94 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A construção de um repertório com portam ental rele­


vante não pode prescindir, segundo o autor, do ensino dos
conhecim entos produzidos pela hum anidade a respeito da
realidade, bem como dos conhecimentos já produzidos em
relação ao próprio homem.
Ao elaborar um a proposta de ensino com ênfase na
transmissão do conhecimento socialmente acumulado, Skinner
expressa um a concepção de educação segundo a qual o p a­
pel fundam ental dessa instituição social é contribuir para a
transm issão e sobrevivência de uma cultura. Diz ele que:

Uma cultura não é superior.à sua capacidade de transmitir


a si própria. Deve partilhar com seus novos membros um
acúmulo de habilidades, de conhecimentos e de práticas
éticas e sociais. A instituição educacional destina-se a servir
a este propósito. (Skinner, 1968, p. 110 ; 1972a, p. 105)

A firm ar: que à educação compete capacitar os novos


m em bros de um grupo a “aprender o que outros já sabem"
(1 9 7 8 , p. 149), realizando, assim, sua função prim ordial de
tran sm itir a cultura, leva o autor a se posicionar contra as
concepções que priorizam , no processo de ensino, a desco­
berta feita pelo aluno.
Segundo Skinner, é falsa a suposição de que é possível,
negando ao aluno o acesso ao conhecimento já produzido
a respeito da natureza e do próprio homem, levá-lo a des­
cobrir, de novo e sozinho, aquilo que a espécie hum ana
vem há séculos construindo. Ao enfatizar a descoberta, em
detrim ento da transm issão, ' negamos- ao aluno o acesso a
um im enso mundo que existe fora de seu alcance im ediato"
(1 9 7 8 , p. 158).

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 95

Não se trata, porém , de desconsiderar a possibilidade


de que o aluno faça descobertas sozinho e aprenda a pensar
de m odo original, a ter idéias e a encontrar soluções para
novos problem as. Skinner ( 1 9 8 7 ) adm ite que:

descobrimos muitas coisas no mundo ao nosso redor e isso


é usualmente muito melhor do que nos contarem sobre
elas, mas, como indivíduos, podemos descobrir apenas uma
parte muito pequena do mundo. (p. 125) ■

O que o autor defende, porém, é que tais habilidades


não são faculdades m entais ou expressão de processos cog­
nitivos, mas são com portam entos e podem , assim , ser en­
sinados. Mais que isso, Skinner dá especial atenção à análise
de alguns desses com portam entos, denom inados por ele
comportamentos precorrentes, cujo efeito é alterar outros com­
portam entos do indivíduo, e defende que tais com porta­
mentos precisam ser ensinados.
Do mesmo modo, ensinar o aluno a conhecer a realidade
não significa fornecer-lhe inform ações a serem processa­
das, arm azenadas e, posteriorm ente, lem bradas. T rata-se
de ensinar ao aluno, com base no saber já existente, com­
portamentos que produzam efeitos eficazes no ambiente.
Skinner vê com cau tela as propostas que se opõem à
transm issão de conhecim entos. De u m lado, u m a situação
de ensino que n ega o vaíor d a transm issão do saber acu­
m ulado sobre os fatos da realidade, reputando-a im posidva
e restritiva, pode levar o aluno a u m a supervalorização de
seu poder de descoberta e daquilo que consegue descobrir,
dando-lhe a falsa im pressão de que dom ina as informações
necessárias à sua sobrevivência e à preservação do grupo.
De acordo com Skinner:

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96 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

C perigoso sugerir ao aluno que está abaixo dc sua digni­


dade aprender o que outros já sabem, que há algo ignóbil
(e mesmo destrutivo dos "poderes racionais") em memori­
zar faros, codigos, fórmulas ou trechos dc obras literá­
rias, e que para ser admirado ele deve pensar de maneira
original. É igualmente perigoso deixar de ensinar facos e
princípios importantes para dar ao aluno a oportunidade
de descobridos por si próprio. (Skinner, 1968, p. 110 ;
1972a, p. 106)

De outro lado, um a situação de ensino em que o pro­


fessor abre m ào de ensinar as formas de pensar já apren­
didas por outros homens, por considerá-las decorrência de
processos de descoberta pessoais e intransferíveis, pode, na
visão de Skinner, tornar o aluno "quase indefeso(s) contra
a lógica incorreta, a superstição, o ab surdo.(nonsense) m ís­
tico e a dem agogia" (1978, p 150;
C om pete, portanto, à instituição educacional a função
de tran sm itir conhecimentos pelo ensino de um complexo
repertório com portam ental, que inclu tanto os com porta­
mentos que possibilitem ao aluno produzir efeitos,.sobrsuc
am biente q u an to produzir efeitos sobre si mesmo, de modo
a g aran tir su a sobrevivência e a sobrevivência de um a dada
cultura
Skinner faz um a distinção, em relação ao repertório
çom portam encal a ser ensinado, entre comportamentos
verbais e não-verbais, sendo possível perceber, no entanto,
ao longo dos textos analisados, a diferença na ênfase por ele
dada aos vários conteúdos do eusino.
D etendo se pouco na discussão específica do ensino de
com portam entos não verbais, o autor lim ita-se a m encionar

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iCÔ RE O Q'l!E DEVE SER ÊNSINADO 97

alguns tipos de - habilidades motoras e perceptuais como


exemplos de comportamentos não-verbaís que podem ser
ensinados com o recurso à tecnologia por ele proposta.
Em razão d a ênfase dada pelo próprio autor, expressa
p ela afirmação de que na educação o comportam ento a ser
m odelado e m antido é geralm ente verbal e deve ser posto
sob controle dc estím ulos tanto verbais quanto não-ver-
b ais” (Skinner, 1968, p. 33; 1972a, p. 31), abordamos em
nossa análise apenas o ensino dos com portam entos verbais,
tom ando como referência a definição d ad a pelo próprio au­
tor: “com portam ento verbal (...) [é o] comportamento re­
forçado pela mediação de outras pessoas” (1957, p. 2).

O ENSINO DE CONHECIMENTOS
SOBRE A REALIDADE

yk'- abordôdas, neste subtítulo, s características e di­


ficuldades d a transm issão de conhecim entos sobre a reali­
dade, entendida como ensino de com portam ento verbal.
Aquilo que é com um ente nom eado como conhecimento
ou saber sobre,-ç, qüe é geralm ente proposto como objeto do
ensino nas escolas, é tratado por Skinner como comporta­
m ento verbal.
O autor chama' a atenção para um equívoco coirum
de.se definir d com porta íento v erb al pelo fato de ser võcal
ou por qualquer o u tra topografia, e reitera sua concepção
de com portam ento operante, no caso, verbal, como a rela­
ção entre o estím ulo antecedente, a resposta e a consêqüên~
cia por ela produzida.
Se ao ensinar o com portam ento verbal/conhecimento,
o professor se restrin gir a transm itir u m a form a de respos-

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98 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

ta, a aprendizagem do aluno pode se lim itar a um a simples


repetição, ainda que form alm ente correta, d&quilo que lhe
foi dado a conhecer. D iz Skinner:

Desconfiamos da mera topografia. O comportamento ver­


bal, rransmitido como mera forma da resposta, parece dei­
xar para trás o conhecimento. Alguém pode repetir corre­
tamente o que outro acabou de dizer, ou ler o que alguém
escreveu, ou recitar o que aprendeu, sem saber o que está
dizendo. (19 6 8 , p. 202; 1972a, p. 192)

E com pleta; “A despeito das afirmações em contrário,


um a ciência do com portam ento não é o estudo de contra­
ções m usculares” (1 9 6 8 , p. 203, 1972a. p. 193).
Isso significa que a preocupação do auto r não se centra
na especificação d a form a da resposta, mas na busca dos fa­
tores que podem e star assoe ades à sua em issáo e à sua m í-
nútenção.
Nem se p au ta, como temos insistentem ente afirmado,
pelo recurso a conceicos como arm asenagem e m em oriza­
ção para explicar a aprendizagem de conhecim entos. Em
resposta a um a possível leitura cognitivista de sa a expli.íá-
ção, Skinner afirm a q u e:

Um organismo muda quando exposto a contingências de


reforço e sobrevive como um organismo mudado. (...) mas
as contingências que modificaram um orgr.nismo não sáo
armazenadas dentro do organismo. (1968, pp. 204-205;
1972a, p. 194)

O que ocorre, na perspectiva com portam ental, é que


u m a resposta in icialm en te evocada por estím ulos específi­

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 99

cos, um a vez aprendida, pode passar a ocorrer na presença


de outros estím ulos, O problema para quem ensina é iden­
tificar e estabelecer quais são os estím ulos relevantes.
No caso do ensino do com portam ento verbal, identi­
ficado como conhecimento ou saber sobre, ò problem a se corna
m ais com plexo. Planejar contingências para ensinar tal
com portam ento é um a tarefa difícil, pois, como afirm a o
próprio Skinner, “quando se traca (...) de saber sobre as coi­
sas não' é tão fácil igualar ò conhecim ento com o compor­
tam ento" (1 9 6 8 , p. 201; 1972a, p. 191).
As respostas a serem ensinadas não podem ser resu­
m idas a um a sim ples sequência ló gica de “pontos” de uma
m atéria; nem pode seu ensino ser restrito a um escalona
m ento de assuntos por critérios de dificuldade ou tamanho.
O estabelecim ento das respostas a ensinar, bem como o
planejam ento dos fatores mais adequados para g aran tir sua
emissão (as cham adas variáveis de controle), requer do pla­
nejador o dom ínio dos “pontos” e dos “assuntos"* de modo
a possibilitar sua releitura em um a perspectiva comporta-
m ental. A seqüência do ensino passa a ser, então, um a se­
qüência com portam ental e as atividades propostas passam
a ser condições para ensinar tal seqüência e não para sele­
cionar quem já a domina.
A com plexidade da tarefa é, possivelm ente, a razão
p ela q ual Skinner se posiciona contra propostas que defen­
dem caber ao aluno, a partir de seus intereses, definir o que
deve ser ensinado. Diz Skinner (1 9 7 8 ) que:

Seus interesses acuais deveriam ser fonte de uma política


educacional eficiente. Certamente esses interesses refletirão
suas idiossincrasias, e isso é bom, mas quanto pode o aluno

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100. FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

saber sobre o mundo do qual irá tomar parte? As coisas nas


quais eie esta "naturalmente'1 curioso são de interesse m o­
m entâneo e freqüentemente temporário, (p. 146)

O autor vê, tam bém , com reservas a ação do profes­


sor e de outros profissionais da educação na realização dessa
tarefa, dadas certas contingências vigentes na situação ed u ­
cacional e que têm mantido práticas inadequadas na defi­
nição do conteúdo do ensino. Para ilustrar sua posição, per-
m itim o-nos, novam ente, a citação de um trecho mais lon­
go, poc considerarm os que as referências nele feitas por
Skinner ilu stram contingências que nos são familiares e
que, infelizm ente, não são poucas. Diz ele que:

Grande parte do que é ensinado atualmente não decorre dc


uma política explícita. As escolas muitas vezes oferecem
ensino em matérias que os.profv.ssore d sponí eis pod :rn
ensinar. Eles tendem a ensinar com os métodos disponíveis,
nas condiçòes disponíveis, com os livros e material didático
disponíveis. (...) Quando os metodos mudam,(...) modiíica-
ções subs;anciais sao introduzidas no que t ensinado :J m
professor continua a ensinar as coisas que pode ensinar efi­
cientemente e tende a descartar outras; como resultado,
mod fica-se o conteúdo de um curso. (...) Quando têm li­
berdade de fazê-lo, os rofessores eusi \ajn >s „as.suptos de
que gostam e os técnicos que determinam a poLtíca [edu­
cacional] seguem, também, as suas próprias predileções.
(...) O que é ensinado, fr&qiientemente, tende a set o que
pode ser m cddo por testes e exames. O comportamento
que não pode ser facilmente submetido a mensuração é ne­
gligenciado porque não impressiona as agências de ínspe-

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 101

ção ou outros que julgam a instituição. Muitos desses de­


terminantes adventícios da políúca educacional mantem o
status quo. (Skinner, 1968, pp. 234-235; 1972a, p. 224)

A definição do conteúdo do ensino parece se caracte­


rizar, na perspectiva do auror, como um trabalho coletivo,
do qual devem participar oucros profissionais, alétn do pro­
fessor. Especialistas em áreas do conhecimento podem con­
tribuir para a correta especificação dos comportamentos fi­
nais, de modo a g aran tir que expressem o que de mais re­
levante há paca ser ensinado. No entanto, Skinner também
vê lim ites nessa contribuição por considerar que falta ao es­
pecialista o domínio de alguns conhecimentos, de compe­
tência do professor. Diz Skinner que:

A menos que [o especialista] seja também um professor,


pode não saber, o que pode ser ensinado no tempo dispo
nível, nem como um assunto pode ser ensinado, junto com
outro ou em seqüência, em um currículo viável. (1968,
p. 206; 1972a, p. 195)

Ao fazer referência, em uma única e breve passagem,


à necessidade de construção de u m a “epistem ologia com-
portam ental" (1 9 6 8 , p. 2 0 6 ; 1972a, p. 196), que consis­
tiria de um a com pleta e exaustiva análise com portam ental
dos conhecimentos a serem ensinados ao aluno, a partir do
estudo do próprio enstno, Skinner, a nosso ver, parece de­
fender que cabe ao an alista do com portam ento oferecer,
tam bém , parte dessa contribuição. Em bora não explicitada
pelo autor, quando aborda a tem ática da construção dé

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.1.02 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

uma "epistemologia. com portam ental”, nossa suposição en­


contra respaldo em oucros trechos de seus ari gos, dos quais
citamos dois. Diz Skm ner que:

Só uns poucos cientistas estão interessados na metodologia


científica ou na lógica e filosofia da ciência, assim como só
alguns historiadores estáo interessados na natureza do pensa-
menco histórico. Obviamente, só uma pequena porcentagem,
dos que sabem ler e esctever pode dizer o que são a leitura
e a escrita. (1968, p. 206; 1972a, p. 196).

Não obstante, ao reconhecer os erros que foram cometidos


no passado na especificação do que os alunos deveriam apren­
der, nós não nos desobrigamos da responsabilidade de esta­
belecer uma política educacional. (1978, p. 147)

Uma proposta com este teor traz implicações que ex­


trapolam os limites da ação do professor em sala de aula,
afetandó mais am ílàm èttíé . rgáiiizáção dó trabalhe edu­
cacional.
Sua viabilização depende de uma am pla alteração das
contingências que têm. caracterizado esse t abàlhó é qué
são, em últim a analise, responsáveis pela m aneira como
tem sido tratada, pelos atuais agentes envolvidos —profes­
sores, administradores, pesquisadores, planejadores da po­
lítica educacional e mantenedores a defuuça dos conteúdos
a ensinar.

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 103

O ENSINO DO AUTOGOVfcRN O

Com plem entando a proposta de ensino como trans­


missão de conhecimentos, o subtítulo se refere ao ensino de
com portam entos que, identificados como autogoverno, pos­
sib ilitam ao aluno o desenvolvim ento d a autonom ia e da
originalidade,
A proposta de ensino d a análise do comportam ento
estaria incom pleta e contrariaria seus fundam entos, se as
referências, ao conteúdo a ser ensinado se restringissem à
preocupação de definir e transm itir, ainda que de modo
cuidadoso, os conhecimentos sobre a realidade. Pareceriam
pertinentes, nesse caso, as crí iças que identificam a pro­
posta como adequada, apenas, para o ensino de conheci­
m entos e habiíidades sim ples e como um a am eaça à indi­
vidualidade e à liberdade do aluno, n a qual não haveria es­
paço p a ra o com portam ento original e criativo. Skinner se
posicions. diante dessas críticas dizendo que:

O ensino, como arranjo de contingências de reforço que


P(!fi— controlam o comportamento do aluno parece ser, pela sua
própria natureza, inimigo da liberdade, da pesquisa e da
originalidade. (...) Não há nada, entretanto, em uma po­
sição determinista que ponha em dúvida a absoluta singu­
laridade de um homem. Cada ser humano é produto de
um a herança genética e de uma história ambiental que são
caracteristicamente dele. A educação poderia, concebivcl-
mente, acrescentar uma história ambiental comum predo­
minante que tornaria os alunos muito parecidos, mas não
é necessáro que seja assim. Nós veremos que o que é con­
siderado liberdade e originalidade tambem pode set respei­
tado. (1968, pp. 170-171; 1972a, p 160)

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/

104 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Para Skinner, a transmissão do saber não representa,


necessariam ente, um obstáculo ao ensino de respostas no­
vas e originais, do mesmo modo que a descoberta espon­
tân ea do aluno nao g aran te, necessariam ente, novidade
e o rig in alid ad e. Segundo ele: “(...) aluno terá m aior
p ro b ab ilid ad e dé resolver os problem as apresentados por
um novo am biente se já conhece, tanto quanto possível,
soluções anteriores" (Skinner, 1968, p 175; 1972a, p. 164).
D eixar o aluno descobrir sozinho é “abdicat de ser profes­
sor” (1978, p. 159).
Ao adm itir como conteúdo do ensino a transm issão
do saber acumulado, Skinner não está, portanto, defen­
dendo a replica do passado, a m era repetição e a unifor­
m idade como m etas de seu projeto educacional, posto que
seriam m etas incompatíveis com seu sistem a explicat .vo
do com portam ento hum ano e com sua proposta em rela­
ção ao papeí social da educação. r
Cabe lem brar que, ao asii n r o modelo da seleção
pelas conseqüências para explicar a evolução do compor­
tam ento humano e da cultura, Skinner adm ite .o: princí­
pios d a variação e da seleção como fundam entais para g a ­
rantir a evolução. A flm ia ele que “um a cultura deve p er­
m anecer razoavelmente estável, mas deve tam bém m udar
se quiser aum entar suas :hances de sobrevivênda’ ( 9 6 8 ,
p. 171; 1972a, p. 161).
Baseado nesse m adelo; Skinne- atribui à educação
form al o papel de contribuir para a evolução d a cultura, le­
vando os alunos a constru rem repertório*; comportamentais
que, sem abrir mão do conhecimento acum ulado, possibi­
litem comportam entos novos*e originai? Afirm a ele que:

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 105

(...) uma política educacional concebida para maximizar a


força de uma cultura deve encorajar a novidade e a diver­
sidade. (...) Aqueles que encorajam o aluno a pesquisar, a des­
cobrir por si próprio e a ser original de outros modos, estão
ampliando o estoque de mutações que contribuem para a
evolução de uma cultura. Embora algumas mutações sejam
inúreis ou mescno prejudiciais," a diversidade é essencial.
(Skinner, 1968, p. 235; 1972a, p. 225)

A questão que se coloca é como com patibilizar a pers­


pectiva de análise adotada pelo au to r e sua ênfase no ca­
ráter planejado do ensinar, com a proposta de um ensino
em que o aluno aprenda, ainda na escola, a produzir ideias
e a solucionar situações problem áticas de modo original e
autônomo, preparando-se, assmi, p ara se comportar eficaz­
m ente no futuro, quando nào m ais estiver na presença do
professor.
Em resposta à questão, Skinner dem onstra, a nosso
ver à ■os3ib ilida de de compatibilização, ao defender que o en­
sino de tais comportamentos deve ser assumido como função
da escola e ao propor, para sua viabilização, procedimentos
consistentes com um a análise com portam ental.
O ensino de tais com portam entos consiste no que
Skinner denom ina ensino do autogoverno, podendo ser iden­
tificadas, em séus tex to ^ referências a três modalidades de
autogoverno a serem ensinados p e la escola o autogoverno
in telectual, o autogoverno da m otivação e o autogoverno
ético.

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106 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O ENSINO DO AUTOGOVERNO LNTELECTUAL

O autor funda sua proposta de ensino do autogovei^no


intelectual na análise operante de situações em que o indi­
víduo não tem disponível o comportamento cuja emissão
seria reforçada. Em tais situações, denominadas por Skinner
como situação problemática, o indivíduo precisa promover al­
terações em si mesmo e na situação, de modo a propiciar
a ocorrência da resposta que não estava, até então, dispo­
nível para ser reforçada. As alterações que provoca, em si
mesmo e na situação são comportamentos identificados
como preliminares ou precorrentes, que tornam possível a
emissão de um comportamento eficiente, não disponível.
Nas palavras do autor.

Deparando-nos com uma situação na qual não há compor­


tamento eficiente disponível (na qual não podemos emitir
uma resposta que seja provavelmente reforçada), compor­
tamo-nos de maneiras que tornam possível o comporta-
mento eficiente (melhoramos nossas chances de reforço).
Ao fazê-lo, tecnicamente falando, executámos" ümà réspòs--
ta "preliminar" que muda ou o ambiente ou a gente mes­
mo, de forma tal que o comportamento “consumatório"
ocorra. (Skinner, 1968, pp. 12 0 -12 1; 1972a, p. 114)

A alteração que o comportamento prelim inar ou pre-


corrente, emitido por um Indivíduo, provoca nele mesmo
ou na situação consiste na produção de sinais (chamados es­
tím ulos discriminativos) que indicam a possibilidade ou não
de reforçamento. Segundo Skinner, "é m uito mais fácil
construir estímulos discriminativos úteis na 'form a verbal”

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SOBRE-O QUE DEVE SER ENSINADO 107

(1980, p. 274), construindo enunciados que expressem as


relações entre os estímulos e as conseqüências reforçadoras
a serem produzidas pelas respostas a tais estímulos.
Além de facilitar a discrim inação e possibilitar sua re­
tenção por um tem po, com portam entos precorrentes, sob
a forma de respostas verbais que descrevem o comportamento
bem-sucedido, têm a vantagem de afetar outras pessoas e po­
dem ser transform ados em instruções úteis.
J á mencionamos o uso que o professor pode fazer de
descrições desse tipo quando recorre, no processo de ensi­
no, a instruções que sinalizam para o aluno o comporta­
m ento a ser reforçado.
Trata-se, agora, de ensinar o aluno a construir para si
próprio essas descrições. Isto é, trata-se de ensinar ao aluno
com portam entos precorrentes que possibilitem que ele
apresente, em situações problem áticas, comportamentos
originais.
Skinner analisa algu n s tipos de com portam ento pre­
correntes, tradicionalm ente identificados com pensar, que
precisam ser ensinados se se quer ensinar ao aluno o auto­
governo intelectual.
Prestar atenção é um desses com portam entos.1 O pro­
fessor pode levar o alun o a prestar atenção recorrendo a es-
- tím u lo s facilm ente perceptíveis, coloridos ou ruidosos, por
exem plo, ou pode fornecer-lhe modelo ou instruções para
que em ita o com portam ento de prestar atenção. Como o
com portam ento de p restar atenção é um comportam ento

1 Não nos dereremos nos mecanismos genéticos que afetam díferedal-


menre nosso comporcamento de piescar arenção.

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108 FORN4AÇÀO DE PROFESSORES

que antecede a emissão de outro com portam ento, é o re-


forçamento do comportamento posterior à resposta de
prestar atenção que a fortalece. Segundo Skinrier,

Estabelecemos tarefas que exigem atenção c reforçamos o


aluno quando é bem sucedido ou o punimos quando não
é, presumivelmente porque prestou ou não atenção. Dei­
xa-se que o aluno descubra por si mesmo coma prestar
atenção. (1968, p. 122; 1972a, p. 115)

Embora esse procedimento possa levar, a longo prazo,


o aluno a aprender a prestar atenção, Skinner defende que
o mais adequado é ensinar diretam ente esse com portam en­
to precorrente, reforçando as próprias respostas que in d i­
cam que o aluno está prestando atenção (como, por exem ­
plo, olhar p ara o estímulo relevante) ou reforçando respos­
tas que levam à construção de estím ulos suplem entares ao
estímulo relevante (como, por exem plo, acom panhar com
o pé a m arcação de uni compasso). Segundo o autor,

(...) muito da delicada arte de ver e ouvir não pode ser en­
sinada apenas reforçando o aluno quando responde de ma­
neira a mostrar que previamente viu e ouviu cuidadosa­
mente. É necessário ensinar diretamente. (Skinner, 1968,
p. 123; 1972a, P. 116)

O utro com portam ento precorrente a ser ensinado pela


escola é o com portam ento de estu d ar, com um ente denom i­
nado “aprender a aprender”. T am bém em relação a esse
com portam ento, Skinner identifica que a prática geral é en­
siná-lo indiretam ente. A situação m ais característica de “ensi­
no" do comportamento de estudar pode ser assim descrita:

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/

SOBRE O QUE DEVE SER ENSiNADO 10 9

U m a tarefa é seguida de u m a prova; os alunos que se saem


bem, presumivelmente porque estudaram eficientemente,
são reforçados, e os que não se saem bem, presumivelmen­
te porque não sabem como estudar, são punidos ou "re­
provados". O aluno lê cuidadosamente como uma forma
de esquiva. Estuda para e vita r o não-saber. (Skinner,
1968, p. 12 8 ; 1972a, p. 1 2 1 )

O utra situação comum é u tiiizar m aterial didático su-.


postam ente planejado para ensinar a “ler com com preen­
são", que consiste de um texto acom panhado de questões
a serem respondidas. Este tipo de m aterial pode levar o
aluno a descobrir como estudar, m as não está ensinando a
ele este com portam ento.
Ensinar o comportamento precorrente de estudar é
ensinar ao aluno técnicas “que aum entem a probabilidade
de que o que fox visto ou ouvido seja lem brado” (Skinner,
1968, p. 129, 1972a, p. 122). O que caracteriza o uso de
tais técnicas é que o estudar deve ser em itido de modo a
enfraquecer, aos poucos, o estím ulo gerador do com porta­
mento. Referindo-se ao estudo d e um texto, a ser lem brado
palavra por palavra, Skinner afirm a que: “a eficiência da
p ágin a como um estím ulo deve ser progressivam ente redu­
zida à m edida que a resposta de ‘lê-la em sua ausência’ g a­
nha força” (1 9 6 8 , p. 129; 1972 a, p. 122).
H á vários modos pelos q uais se pode enfraquecer o
controle exercido por um estím ulo: esperando um tempo
antes de repeti-lo ou reduzindo su a clareza, duração ou ex­
tensão.
Quando se trata de estudar p ara aprender o conteúdo
de todo um texto, as técnicas são diferentes. O aluno deve
ser ensinado a produzir, à partir do texto, “dicas tem áticas”

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no FORMAÇÃO DE PROFESSORES

que o auxiliam no estudo do m aterial e pode fazê-lo, por


exemplo, “sublinhando estím ulos tem áticos im portantes e
dispondo-os em esquem as ou resumos" (Skinner, 1968,
p. 131; 1972a, p. 124).
Dada sua principal característica — criar condições
para a ocorrência de um outro com portam ento a ser refor­
çado —, os com portam entos precorrentes podem ser em iti­
dos e reforçados no nível não público. Falamos com nós
mesmos e somos reforçados ou porque o que é dito é auto­
m aticam ente reforçador, ou porque leva a um a condição
reforçadora. N ada disso precisa ocorrer publicam ente. Mas
a decisão de ensinar diretam ente tais com portam entos re­
quer que eles ocorram , pelo menos enquanto estão sendo
ensinados, de modo público. Como exem plifica Skinner

Embora uma criança eventualmente fale consigo mesma si­


lenciosamente, nós a ensinamos a falar reforçando diferen-
cialmente seu comportamento audível. Embora, mais jçar-
de, ela leia livros e recite trechos silenciosamente, o ensino
se faz pela leitura c recitação em voz alta. (19 6 8, p. 125;
1972a, p. 118)

Parece-nos exaustivo e desnecessário continuar expli­


citando a análise, feita pelo autor, de outras modalidades
de comportamentos precorrentes, já que m an têm as m es­
mas características até aq u i m encionadas. Aò se referir aos
comportamentos de “solucionar problem as” ou “ter idéias",
Skinner continua afirm ando a necessidade de ensinar dire­
tam ente o aluno a e m itir esses com portam entos, por meio
do ensino de técnicas q u e possibilitem ao aluno produzir,
em si mesmo e no am bien te, m udanças que os alterem . A
produção de novos estím ulos e seu g rad u al esvatiecimetLto

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 111

são as m arcas dessas técnicas. Para ensiná-las, o professor


precisa identificar as condições relevantes a serem alteradas
p ara produzir a m udança requerida, já que são as mesmas
que ele, o aluno ou qualquer outra pessoa alterariam para
produzir o novo com portam ento. M ais do que adotar pro­
cedim entos que propiciam a criação de tais condições, o
professor precisa construir outros, que levem o próprio alu­
no a realizar essa função. Não se trata de substituir o.pro­
fessor pelo aluno. T rata-se, pelo contrário, de esclarecer e
fortalecer o papel do professor. . -

O ENSINO DO AUTOGOVERNO DA MOTIVAÇÃO

Se é possível ensinar ao aluno como alterar as condições


responsáveis pela emissão de um comportamento requerido, é
tam bém possível ensiná-lo a construir reforçadores que res­
ponderão pela m anutenção de seu com portam ento.
T al como no ensino do autogoverno intelectual, os
m esm os passos dados pelo professor para resolver o proble­
m a d a m otivação do aluno podem ser ensinados para serem
dados pelo próprio aluno, garantindo a transição dos refor­
çadores arbitrários aos naturais, dos im ediatos aos media­
tos, dos freqüentes aos raros.
Skinner faz referência à existência d e técnicas que pos­
sib ilitam ao aluno procurar ou arran jar condições sob as
quais seu com portam ento seja reforçado, ilustrando-as com
exem plos. Assim, segundo ele, o aluno pode

(...) criar eventos reforçadores, como ao verificar a resposta


de um problema. Pode parar de em itir respostas não re­
forçadas ein uma situação desfavorável, de modo que a ex­

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/

112 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

tinção não se generalize para outras situações - por exem­


plo, pode aprender a não Ler livros que sejam muito difíceis
para ele de modo que a sua mcímação a ler outros livros
não seja prejudicada. Pode aprender discriminações sutis,
que melhoram as contingências de reforçamento, quando
ouve a própria pronúncia de uma língua estrangeira. Pode
clarificar as conseqüências reforçadoras — por exemplo,
pode amplificar mecanicamente pequenos movimentos ao
aprender uma resposta de topografia sutil (...). (Skinner,
1968, p. 167; 1972a, pp. 157-158)

Do mesmo modo como no autogoverno intelectual, as


respostas do autogoverno da m otivação ocorrem, em geral,
cm um nível privado. Dado que não é comum vermos pes­
soas controlando-se a si próprias, de modo a interferir nos
eventos que reforçam seus comportamentos, torna-se difícil
ensinar o autogoverno da m otivação por meio de procedi­
mentos de im itação de modelos. Se queremos que o aluno
aprenda, devem os ensmá-lo diretam ente, com procedim en­
tos específicos, em que tais respostas sejam tratadas em um
nível público.
Segundo Skinner “a educação nunça ensinou efetiva­
mente o autogoverno da m otivação. Raram ente tentou”
(1968, p. 167; 1972 a, p. 158). Tem-se lim itado a explicar
o desinteresse dos alunos tom ando como causas fatores
como falta de vontade, de consciência ou de valores, sem
se dar conta de que, tanto quanto o desinteresse dos alu ­
nos, as supostas causas são, tam bém , decorrência das con­
tingências em vigor na escola e fora dela:

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSfNADO 113

O ENSINO DO AUTOGOVERNO ÉTICO

A necessidade de enfrentaniento da questão do ensino


do autogoverno ético coloca-se, no conjunto das propostas
de Skinner, como decorrência d e sua análise de como têm
sido tratados, pelo professor, os cham ados problemas dis­
ciplinares.
O recurso abusivo a contingências aversivas tem sido
a m aneira p ela qual a escola cem lidado com comporta­
m entos tidos como socialm ente inadequados, revelando sua
dificuldade em arranjar contingências para o ensino do
com portam ento social eficiente.
A alternativa mais com um ente adotada pelo professor
é recorrer a descrições de contingências para ensinar tais
com portam entos. Assim, segundo Skinner, "em vez de
aprender a com portar-se bem, a criança aprende regras que
deve seguir para se com portar b em ” (196 8 , p. 192; f972a,
p. 181). M esm o ensinando o alu no a repetir a regra para
si mesmo, o professor não estará, necessariam ente, aum en­
tando a chance de que ele venha a se com portar de acordo
com a regra. Só o fará se ensinar o aluno a pôr em prática
o que a regra enuncia, se ensiná-lo a com portar-se em con­
sonância com ela.
N a visão do autor, há um a tendência acuai de que o
ensino de regras éticas seja assum ido por outras agências
sociais que não a escola. A firm a ele que:
t f

Preceitos úteis ao autogoverno foram, em algumas épocas,


parte explícita da política educacional. Hoje tendem a ficar
aos cuidados da família e das Instituições religiosas e go-

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114 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

vernamenrais, especialmente quando tratam das conse­


qüências punitivas que podem advir de tais fonres. (Skinner,
1968, p. 19 3 ; 1972a, p. 182)

Em nosso enten d er, no entanto, o autor parece não


abrir m ão de a trib u ir à agência educacional a realização,
pelo menos em p arte, dessa tarefa, de m odo a bu scar cada
vez mais, a superação das práticas aversivas.
É, pois, no ensino do autogoverno, em suas diversas
m odalidades, nos m oldes propostos pela análise com porta-
m ental, que se cen tra a defesa de Skinner da possibilidade
de form ação de indivíduos autônomos, capazes de respon-
der de form a nova e original às situações com as quais se
defrontarão quando deixarem o espaço escolar.
Parece-nos necessário, com vistas a com pletar esta
análise, fazer algu m as considerações finais sobre o modo
como o autor ab orda as questões da liberdade e da origi­
nalidade.
P ara Skinner, a educação promove a liberdade do alu ­
no ensinando-o a lid ar eficientemente com seu am biente e
a agir por si próprio, tornando-se independent' de outros
que lhe d ig am o q ue deve fazer. Segundo o autor, "o aluno
que pode fazer as'coisas por si próprio é independente dos
outros e quanto m aio r e m iis eficiente for o seu repertório,
tanto m ais livre será" (1968. p. 173; 1 9 ?‘2? p L63). Ao
conceber desse m odo a liberdade, Skinner não está fazendo
concessão a nen h u m a forma de indeterm inaçao do compor­
tam ento; está, apenas, afirmando a possibilidade de o aluno
agir eficientem ente, som que seja necessár' ) que alguém d i­
rija a sua ação. Isso significa que é possível, pelo ensino do
autogoverno, levar o aiuno a passar de u m a situação de d e ­

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SOBRE O QUE DEVE SER ENSINADO 115

pendência em relação a outras pessoas, para um a situação


na q u al seu com portam ento passa a ser determ inado pelos
efeitos das interações com as suas conseqüências naturais.
É pelo contato com esse m undo das coisas que o aluno
consegue em itir com portam entos originais, já que tais
com portam entos, nao sendo adquiridos de outras pessoas,
acabam por refletir a novidade e a variedade do próprio
m undo.
Aprendendo a alterar os facores determ inates de seu
com portam ento, estabelecendo condições que fogem aos
padrões pré-estabelecidos, o aluno aprende a reagir a aspectos
cada vez mais sutis do mundo e a em itir respostas que são co-
m um ente caracterizadas como originais E pelo ensino do
autogoverno que essa possibilidade se concretiza.

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Ca p ít u l o 5

E N S IN A R PARA QUÊ?

Definidos os princípios e conceitos básicos que susten­


tam a proposta skinneriana para u m ensino eficiente, e des­
critos os procedim entos e conteúdos que a compõem, cabe
analisar, sob a ótica do autor, o p ap el que o ensino e, mais
am plam ente, a instituição educacional exercem no contex­
to social em que se inserem.
U m a an álise m ais com pleta dessa discussão, em
Skinner, dem andaria enveredar por um am plo e complexo
conjunto de análises e proposições do autor, especialmente
no que tange à sua proposta de organização d a cultura, que
—se-constituiriam , por si só, a nosso ju ízo , em tem a para um
am plo trabalho de pesquisa e reflexão.
Por essa razão, limitamo-nos à análise de alguns as­
pectos básicos que caracterizam a pro p o sta do autor sobre
esse tem a, por nos parecerem, neste m om ento, os mais re­
levantes a destacar, considerando os propósitos que nos
norteiam .
A lgum as passagens já m encionadas evidenciam que,
p ara o autor, cabe à educação contribuir p ara a sobrevivên­
cia da cu ltu ra e deve fazê-lo a p a rtir d e um planejam ento
explícito. Diz ele que:

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118 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Práticas acidentais e práticas planejadas por razões irrele­


vantes têm valor de sobrevivência, mas a planificação ex­
plícita de uma política educacional a respeito da força de
uma cultura é mais promissora. (Skinner, 1968, p. 2 3 3;
1972a, p. 222)

Em várias passagens, o autor revela sua confiança no


planejam ento d a educação, com base em uma ciência do
com portam ento hum ano, como a possibilidade de evolução
da cultu ra. A brir m ão de ta l conhecimento e da tecnologia
de ensino dele decorrente significa, para Skinner, por em
risco a transm issão e a sobrevivência de uma dada cultura.
Ele insiste em afirm ar que a defesa de um planejam en­
to educacional, com vistas a um planejam ento cultural, não
representa a desconsideração da liberdade e da dignidade
hum anas. Ao contrário, considera que:
...... ♦
A sala de aula é um tipo de comunidade, com uma cultura
própria e nós podemos planejar tal cultura, ao mesmo tem ­
po que respeitamos os padrões de dignidade"e liberdade
que valorizamos no mundo còmo um todo. A tarefa é im ­
portante porque, a longo prazo, a educação deve tomar o
seu lugar como o método de escolha em todas as formas
de controle social. Ela-deve substituir as sanções aversivas
do governo, tanto internacional quanto doméstico, e as
sanções econômicas, indevidamente obtidas à força, dos
negócios e àg, indústria.(...) Quanto mais cedo encon­
trarmos meios efetivos de controle social, mais cedo pro­
duziremos um a cultura na qual o potencial do homem
seja compieraraente realizado. (Skinner, 1972b, p. 235)

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ENSINAR PARA QUÊ? 119

A relevância atrib uíd a por Skinner à educação, eviden­


ciada quando afirma considerá-la “uma importante função da
cultura —possivelmente, a longo prazo, sua mais importante
ou única função" (1978, p. L32), ganha ênfase em suas con­
siderações sobre o planejam ento da cultu ra.
Ao recuperar as respostas do autor à questão sobre as
possibilidades de sobrevivência da cultura, A ndery (1993)
afirm a que:

A resposta de Skinner (...) aparencemente se'mantém es­


sencialmente a mesma desde a década de 40. A possibili­
dade de se garantir a sobrevivência da espécie está intrin­
secamente relacionada à possibilidade de desenvolver uma
cultura plena de contingências de reforçamento que pos­
sam colocar o comportamento nãò apenas sob controle das
suas conseqüências imediatas, mas também de conseqüên­
cias de longo prazo. (p. 24)

Parece-nos ser exatam ente isso o que Skinner propõe


como u m a marca fundam ental do trabalho educacional, ao se
. referir ao ensino como o processo de facilitar a aprendizagem
de com portam entos que serão eficazes em u m tempo futu­
ro, na ausência das contingências instrucionais.
Sob determ inadas condições, em especial quando con-
flita com contingências de reforçamento poderosas, a so­
brevivência da cultura pode não ser im po rtan te para o in­
divíduo. Ainda assim, ele afirm a que:

Se a sobrevivência não é um valor conveniente é, não obs­


tante, um vaior inevitável. A cultura que predisser mais
exatamente os problemas que irá encontrar e que identi­
ficar mais eficazmente o comportamento que com maior

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120 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

probabilidade os resolverá, fará possivelmente o melhor uso


de uma tecnologia do ensino. (Skinner, 1968, p. 233;
1972a, p. 222)

U m planejamento educacional que dê conta, nao só de


aum entar as chances de unia cultura enfrentar seus problemas
e garantir sua sobrevivén xa, mas, especialmente, de torná-la
capaz dc antecipar as condições relevantes para soluciona-los,
demanda, segundo Skinner que saibamos quais são os proble­
mas a serem enfrentados pela cultura, que com portam entos
contribuirão para sua solução e, finalmente, qual o ensino
necessário para gerar tais comportamentos.
Evidentemente, a com plexidade de tal tarefa não pode
ser enfrentada por um unico profissional, nem por profis­
sionais de um a única área. É tarefa a ser assum ida coleti­
vam ente, por especialistas dos m ais variados campos do co­
nhecim ento, por pesquisadores e profissionais d a área de
educàçáo, in«:Iuid< s aí o rnántéh lorc , ac iistr io :s
definidores da política educacional e, em especial, por an a­
listas do comportamento a quem compete a descrição do
problem as e de suas soluções, cm termos de contingências
de reforçam ento passíveis de serem planejadas e .nstala-
das. N esse processo coletivo, Skinner ati íbui ao professor
um p ap el especial, já que, em contato direto com o aluno,
é ele o responsável por p lan ejar e fazer vigorar as co n tin ­
gências de reforçamento sol- as quais o aluno aprenderá.
“Se ele falh l, í.odo o sistema fracassa” (Skinner, 1968, p. 249;
1972a, p. 238).
«»■Cabe, pois, .analisar q uem é o professor, no sistem a de
ensino proposto por Skinner para, a partir d a descrição de
suas funções, estabelecer parâm etros para a discussão sobre
sua formação.

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C a p ít u l o 6

O PRO FESSO R NA
PR O PO ST A SK IN N E R IA N A DE ENSINO

Sáo analisadas neste cap ítu lo as proposições de


Skinner relativas às funções do professor, aos conhecim en­
tos e formação necessários para o enfrentam ento dos pro­
blem as do ensino e às contingências que explicam seu com­
portam ento.
................. *

F u n çõ e s d o pr o f e sso r

A explicitação de objetivos educacionais em termos


comportamentais, o planejamento e a execução de proce­
dimentos de ensino e a avaliação dos processos de ensino
e de aprendizagem, como condição p ara novos planejamen­
tos, são apresentados como funções do professor.
O papel atribuído por Skinner ao professor, no pro­
cesso de ensinar, está diretamente relacionado ao tratam en­
to científico dado por ele às questões relativas ao ensino,
entendido como arranjo planejado de contingências, e à sua
oposição a uma concepção de aprendizagem como processo
natural e espontâneo.

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122 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Visando identificar as funções que caracterizam o tra­


balho docente, dentro da proposta de ensino de Skinner,
tom am os como referência inicial a seguinte afirmação do
autor:

Os homens aprendem uns com os outros sem serem ensi­


nados. Um homem pode ter aprendido uma vez a usar
uma enxada vendo outro usá-la, mas nem por isso o lavra­
dor foi um professor. Apenas quando a maior eficiência do
aprendiz se tornou importante para o lavrador é que ele se
tornou um professor e mudou seu próprio comportamento
para facilitar a aprendizagem — movendo-se mais devagar
ou exagerando seus movimentos de modo que pudessem
ser mais facilmente imitados, repetindo alguma parte de
uma ação até que fosse eficientemente copiada, reforçan­
do bons movimentos com a enxada com sinais de apro­
vação, arranjando raízes de forma que pudessem ser fa­
cilmente cavadas. (Skinner, 1968, p. 2 5 1; 1972a, p. 239).

Ao afirm ar que u n i indivíduo passa a atuar como pro­


fessor “apenas quando a m aior eficiência do aprendiz se ioc--
nou- im portante para ele", Skinner parece identificar um
prim eiro aspecto relevante para a definição da função do
professor. D iferentem ente de um lavrador com um , um la-
vrador-professor é aqueie que, conhecendo os modos mais
adequados de usar a enxada, toma-os com referência para
provocar m udanças no aprendiz, de forma a levá-lo a se
com portar da manei ra'-m ais eficiente, diversa d a m aneira
o?

como se comportava antes de ser ensinado. U m lavrador-


professor é tam bém aquele que, conhecendo as possibilida­
des do aluno, em term os com portam entais, leva-as em con-

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O PROFESSOR N A PROPOSTA SKINNERIANA DE ENSINO 123

sideração para planejar as condições adequadas para um a


aprendizagem eficiente e sem dificuldades desnecessárias
para o aluno.
Por considerar que cabe ao professor alterar seus com ­
portam entos como condição para produzir m udanças com-
portam entais no aluno, Skinner defende a necessidade de
que o professor estabeieça quais são as m udanças relevantes
a obter no com portam ento do aprendiz. Em outras p ala­
vras, cabe ao professor definir, de m odo explícito e claro,
os objetivos do processo de ensino, em term os de alterações
a serem planejadam ente produzidas no com portam ento do
aluno. A realização dessa função requer que o professor do­
mine os conhecim entos que constituem o conteúdo ensina­
do pela escola.
A explicitação de objetivos de ensino em termos com-
portam entais possibilita ao professor identificar, de m anei­
ra mais precisa, as m udanças ocorridas em seus alunos, av a­
liar o quanto eles aprenderam e o que falta para ser apren­
dido. Perm ite, ainda, esclarecer ao próprio professor a sua
tarefa, dando-lhe m elhores oportunidades de reconhecer e
responsabilizar-se por acertos e erros de sua atuação como
professor. Como afirm a Skinner, “a especificação do com ­
portam ento term inal conduz, mais diretam en te, a práticas
explícitas e torna possível verificar se são efetivas” (1968,
p. 2 5 6 ; 1972a, p. 244).
Cabe lem brar que, para ele, faz p arte da função do
professor não só o ensino dos com portam entos relativos à
transm issão de conhecim entos, mas ta m b é m o ensino dos
com portam entos identificados como autogoverno. Sobre esse
aspecto, ele afirm a que:

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124 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Em'escolas primárias e secundárias (e até certo ponto em


outros níveis), um professor não apenas ensina, ele tem a
custódia de seus alunos por uma parte apreciável do dia,
O comportamento dos alunos na saía de aula, além do que
estão aprendendo, é parte da tarefa do professor. Vir para
a sala de aula, comportar-se bem em relação aos outros
alunos, prestar atenção ao professor, participar de discus­
sões, estudar —essas coisas são tão essenciais para ar edu­
cação quanto o que está sendo aprendido e aqui o professor
tem um papel diferente. Ele não é uma fonte de conheci­
mento ou um avaliador do que o aluno sabe; ele é, num
certo sentido, o governante de uma comunidade. (Skinner,
1972b, p. 230)

Pautado por esse conjunto de objetivos especificados


em termos de com portam entos, o professor pode executar,
m ais adequadam ente, um a outra função fundam ental: criar
as condições necessárias a uma aprendizagem ágil e eficiente
do aluno. Incluem -se, dentre essas condições, as mudanças
no com portam ento do próprio professor. Assim, de posse
dos conhecim entos produzidos pela análise com portam en-
tal, com pete ao professor planejar e exècutãrp rocêdim én-
tos de ensino, sob a forma de contingências de reforçamen-
to, que possibilitem ao aluno um a aprendizagem produtiva
e prazerosa, sem os inconvenientes das práticas aversivas,
tão 'freqüentes nas saias de au la, ...
T anto quanto a explicitação de objetivos com porta-
m entais, o planejam ento e a im plem entação de procedi­
m entos de ensino, segundo os parâm etros .fornecidos pela
análise com portam ental, colocam o professor em condições
m ais adequadas para avaliar o processo de aprendizagem
do aluno, bem como 0 próprio processo de ensinar. A ava-

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O PROFF.SSOR N A PROPOSTA SKINNERFANA DE ENSINO 125

liação do aluno feita pelo professor passa a ter um sign i­


ficado peculiar. Avaliar o aluno requer avaliar as condições ofe­
recidas a ele para aprender, inclusive o comportamento do
próprio professor, passando a avaliação a se constituir, ela mes­
ma, como um a condição adicional que possibilita ao professor
rever e replanejar as contingências de ensino disponíveis.
Ao atrib uir ao professor essas funções, e ao propor que
ele as realize com base nos princípios e conceitos da análise
com portam ental, Skinner parece reconhecer no professor
um agente fundam ental na melhoria do ensino, chegando a
identificá-lo como “um especialista em comportamento hum a­
no, cuja tarefa é produ 2 Ír mudanças extraordinariamente
complexas em um m aterial extraordinariam ente com plexo”
(Skinner, 1968, p. 255; 1972a, p . 244).
A com plexidade da tarefa do professor se agrava, na
visão de Skinner, quando se considera o desgaste a que está
subm etido n a realização de seu trabalho, por ter que dar
conta, de m odo repetitivo e m ecânico, de tarefas que po­
deriam ser realizadas de outras form as e com outros recur­
sos. A passagem que se segue exem plifica o modo como o
autor vê este problem a. Diz ele q u e:

Ficar corrigindo exercícios ou problemas de aritmética —


“Cerro, nove e seis são quinze; não, não, nove e sete não
são dezoito*' —está abaixo da dignidade de qualquer pessoa
inteligente. Há trabalho mais importante a ser feito, no
qual as telações da professora com o aluno não podem ser
duplicadas por um aparelho mecânico. (Skinner, 1968,
pp. 26-27; 1972a, p. 25)

O recurso a um a tecnologia de ensino, concretizada,


no lim ite, em m ateriais program ados e em m áquinas de

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126 FORM AÇAO DE PROFESSORES

ensinar, pode m in im izar para o professor o peso dessas ta­


refas e criar condições para o aprim oram ento da dimensão
m ais relevante de seu papel — a dim ensão hum ana —, di­
m inuindo a ocorrência de situações aversivas e estimulando
o estabelecim ento de contatos mais fecundos entre o pro­
fessor e seus alunos, "contatos intelectuais, culturais e emo­
cionais daquele tipo especial que atestam à professora o status
de ser hum ano” (idem , p. 27; p. 25).
Mas Skinner tom a o cuidado de não estabelecer este
ou aquele procedim ento de ensino como' o modelo adequa­
do a ser adotado em qualquer situação. Coerente com sua
análise, o autor considera que, ao definir a estratégia a ado­
ta r e ao decidir o recurso a utilizar, o professor deve se pau­
ta r pelo objetivo que pretende atingir e pela análise do
com portam ento que quer ensinar, evitando, assim, a ade­
são acrítica a fórm ulas e receitas. O autor expressa sua visão
ao afirm ar que: .......

Uma perda no contato pessoal entre aluno e professor não


é necessariamente um a desvantagem em alguns campos da
aprendizagem. O aluno não precisa de uma pessoa para lhe
dizer se ele traduziu corretamente uma frase específica ou
resolveu um problema. (...) Antes de lamentarmos a perda
de contato pessoal deveríamos olhar os tipos, de contato
que hoje predominam nas salas de aula. (...) Em testes de
m últipla escolha e em alguns tipos de material programa­
do, os alunos apenas assinalam sentenças que foram com­
postas por outras pessoas. Eles não têm chance de aprender
a compor eles próprios as sentenças. Materiais programa­
dos podem ensinar composição «efetiva, mas a flexibilidade

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O PROFESSOR NA PROPOSTA SK1NNERIANA DE ENSINO 127

característica do discurso social exige um professor como


figura essencial porque troca verbal é quase necessariamen­
te individualizada (Skinner, 1978, p. 139).

Em oposição ao apontado por seus críticos, Skinner


demonstra, a nosso ver, um a valorização do professor que,
liberado de tarefas mecânicas e repetitivas, pode acuar
como "figura essencial” na interação individual com o alu ­
no, possibilitando a este- a aprendizagem de com portam en­
tos verbais socialm ente relevantes. A firm a ele que:

Há muitas coisas que só o professor pode fazer e ele pode


fazê-las na medida em que for liberado de tarefas desne­
cessárias. Algumas das coisas que ele pode fazer é falar com
os alunos, ouvi-los e ler o que eles escrevem. Estudo recen­
te mostrou que os professores respondem ao que os alunos
dizem durante apenas 5% do dia escoLar. Se é assim, não
surpreende que uma das maiores queixas contra nossas es­
colas seja a de que os alunos não aprendem a se expressar.
Se houver oportunidade, professores também podem
ser companheiros solidários e interessantes dos alunos.
(Skinner, 1987, p. 126)

Do m esm o modo como a definição dos objetivos do


ensino requer do professor um conhecim ento dos assuntos
ou m atérias a ensinar, o planejam ento de procedimentos
eficientes de ensino, adequados aos objetivos propostos,
também coloca, na concepção de Skin n er,*■&necessidade de
aquisição, pelo professor, de determ inados conhecimentos
sobre os processos de aprender e de ensinar, com im plica­
ções específicas para a sua formação.

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128 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Sa b e r e s e f o r m a ç ã o n e c e s sá r io s a o p r o f e s s o r

O subtítulo apresenta a posição do autor quanto à n e­


cessidade de o professor conhecer o conteúdo a ser ensinado
e, principalm ente, dom inar conhecimentos relativos ao como
ensinar. Apresenta, tam bém , aspectos abordados pelo autor
acerca da formação do professor.
O conhecimento, pelo professor, dos assuntos ou m a­
térias a serem ensinados tem , para Skinner, a função de
po ssib ilitar a explicitação de objetivos de ensino atuais e re­
levantes, em consonância com o desenvolvim ento da área
de conhecimento a que estão afetos. No entanto, como já
m encionam os, a dificuldade de definição dos objetivos de
ensino em termos comportamentais pode colocar ao professor
a necessidade de recorrer à ajuda de especialistas das diversas
áreas de conhecimento, inclusive os analistas do comporta­
m ento, para a realização desse trabalho, cabendo a ele, pro­
fessor, as decisões relativas ao como ensinar tais conteúdos.
Ao explicitar essa posição, Skinner parece discordar da
concepção de que o professor competente é aquele que sim ­
plesm ente conhece o assunto e está nele interessado. M es­
mo considerando adequado que o professor tenha um co­
nhecim ento específico sobre o que ensina, ele acaba por de­
fender que:

Os professores precisam set, com fteqüêficiav designados a


ensinar em áreas nas quais não sáo especialistas. Nem to­
dos os colégios podem ter um professor de matemática ca­
paz de acompanhar algum aluno excepcional ocasional, e
mesmo colégios grandes não podem ter especialistas em
todos as áreas nas quais os alunos podem desenvolver in­
teresses. (Skinner, 1968, p. 258; 1972a, p. 246)

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O PROFESSOR NA PROPOSTA SKINNER1ANA DE ÇNSINO 129

N a avaliação do autor, o dom ínio, pelo professor, de


conhecim entos especializados sobre as m atérias a serem en­
sinadas, não garante a qualidade do ensino. Conhecimentos
de outra natureza são necessários para que o professor seja
bem -sucedido em seu trabalho de ensinar. Ao defender essa
posição, Skinner parte de uma avaliação segundo a qual
muitos dos problemas educacionais decorrem de “um a ex­
traordinária negligência de m étodo” (Skinner, 1968, p. 93;
1972a, p. 89) e devem ser enfrentados pelo exam e dos pro­
cessos básicos —de ensino e de aprendizagem —que cons­
tituem a educação.
Por isso, ele defende, como fundam ental ao exercício
eficiente das funções docentes, q u e o professor conheça Pe­
dagogia, entendida como “um a verdadeira tecnologia do
ensino" (1 9 6 8 , p. 9 4 ; 1972a, p. 9 0 ). Reconhece, porém, o
desprestígio do termo e atrib ui aos psicólogos educacionais
parte da cu lp a pela negligência em relação aos métodos de
ensino. Diz ele que: *

Pedagogia não é uma paiavra de prestígio. Seu baixo sta-


tus pode ser atribuído em parte ao fato dc* que, sob o fas­
cínio dos métodos estatísticos, que prometiam uma nova
espécie de rigor, os psicólogos educacionais passaram meio
século avaliando os resultados do ensino, mas negligenciando,
ao mesmo tempo, o próprio ensino. Compararam diferen­
tes "métodos de ensino em grupos homogeneizados e pu­
deram freqüentemente dizer que um método era nitida­
mente superior ao outro, mas os métodos que comparavam,
jiã o ef3m, em geral, tirados de suas próprias pesquisas,
nem mesmo de suas próprias teorias, e os resultados ob­
tidos raramente geravam novos métodos. (Skinner, 1968,
p. 94; 1972a, p. 90)

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130 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

Ao defender a necessidade de ensinar ao professor os


princípios e form ulações básicas de u n ia teoria científica do
ensmo, e a tecnologia dela decorrente, Skinner tem como
perspectiva a m elhoria da qualidade do trabalho do profes­
sor, bem como das condições sob as quais ele o realiza. So­
bre isso, ele afirm a que:

A longo prazo, uma tecnologia do ensino ajuda mais au­


mentando a produtividade do professor. Simplesmente,
permite que ensine màLs —mais em determinada matéria,
mais matérias, a mais alunos. Não se trata de um ‘'alarga­
mento" industrial, pois ser mais produtivo não significa
trabalhar mais. Ao contrário, Significa trabalhar em melhores
condições e com melhor retorno. (Skinner, 1968, p. 258;
1972a, p. 246)

É por m eio do ensino explícito dessa tecnologia que o


professor pode aprender a se com portar de modo eficaz na
sala de aula. Ao defender essa posição, ele considera “pre­
judicial a suposição de que ensinar pode ser adequadamente
discutido em linguagem cotidiana” (Skinner, 1987, p. 121) e
rejeita os apelos ao senso comum no tratam ento das ques­
tões do ensino. Explicitando aspectos de sua posição quanto
à formação do professor, ele afirm a a necessidade de cursos
que preparem explicitam ente o professor para o exercício
de sua profissão e m anifesta sua oposição à defesa da ex­
periência cotidiana como fonte de sabedoria para o fazer
docente. A firm a ele que:

Não se encontrará nada como uma escola médica, ou uma


escola de direito ou uma escola de administração para
aqueles que querem ‘ser professores de faculdade. Não se

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O PROFESSOR NA PROPOSTA SKINNERlANA DE ENSINO 131

sente que qualquer treinamento profissional seja necessá­


rio. A preparação para ensinar na escola primária e secun­
dária é muito pouco mais explícita. As escolas de educação
não mais promovem ativamente a pedagogia ou o método
como prática formalizada. Em vez disso, o professor ini­
ciante funciona como um aprendiz. Ele observa outros pro­
fessores e aprende a comportar-se como eles se comportam
e, eventualmente, pode se beiieficiar de sua própria expe­
riência de sala de aula. No longo prazo, professores'secun­
dários, da mesma forrna como professores de faculdade,
ensinam como eles mesmos foram ensinados, como vêem
outros ensinarem ou como a experiência dita. (Skinner,
1972b, p . 209)

Ao avaliar a experiência de sala d e au la como fonte li­


m itad a de sabedoria educacional, Skinner parece reprodu­
zir, em relação à aprendizagem do professor, a m esm a pos­
tu ra defendida em relação à aprendizagem do ala.no. Não
cabe deixar que o professor aprenda a ensinar apenas com
base em sua experiência pessoal ou m esm o em experiências
alheias. Aprender errando ou aprender espontânea e natu­
ralm en te são m aneiras lim itadas e custosas de aprender,
podendo, sob certas condições, não levar a aprendizagem
algu m a. Da mesma form a, aprender com a experiência
alh eia, por im itação de modelos, tam b ém tem lim ites (já
apontados quando d a discussão dos procedim entos de en­
sino), podendo levar o professor a reproduções precárias do
m odelo seguido ou a repetições m ecânicas de práticas já co­
nhecidas. Não é raro, porém , encontrar professores, em iní­
cio de carreira, ensinando da m esm a form a como foram en­
sinados. Em oposição a essa prática, Skinner defende que

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132 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

“a alternativa para a experiência de sala de aula, direta ou


in direta, é a instrução explícita de como ensinar —em uma
palavra, a pedagogia" (196 8, p. 255; 1972a, p. 243).
Defendendo que professores precisam aprender como
ensinar e que precisam ser ensinados por escolas de educa­
ção, Skm ner acaba por propor a revisão das teorias psico­
lógicas que estão sendo ensinadas aos futuros professores
nos cursos de educação. Em sua concepção, é necessário ga-
tan tir aos professores o conhecimento de princípios básicos
da aprendizagem que os capacitem a "analisar contingên­
cias que surgem em suas classes e planejar e estabelecer
versões m elhoradas” (Skinner, 1972b, p. 233), livres dos
subprodutos das práticas aversivas. Para o autor:

O professor que compreende sua tarefa e está familiarizado


com os processos comportamentais necessários para reali-
« zá-la, pode ter alunos que não só se sentem livres e felizes,
enquanto estão sendo ensinados, mas que continuarãp a se
sentir livres e felizes quando sua educação formal chegar ao
fim. (...) Possivelmente, a mais importante consequência é
que o professor irá, então, também se «erttir livre crfeliz;
(Skinner, 1978, p. 147)

G arantir ao professor o acesso aos saberes relevantes


à sua prática, por m eio de u m a formação adequada, não é,
no entanto, suficiente para m udar a sua ação e alterar o
m étodo segundo o qual ele tem , de modo árduo e nem
sem pre bem-sucedido, se proposto a ensinar. M udanças nos
com portam entos do professor, ao ensinar, só podem ser ob­
tidas se contingências forem adequadam ente planejadas
p ara isso.

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O PROFESSOR N A PROPOSTA SKINNERIANA DE ENSINO 133

Um a compreensão das atuais contingências sob as


quais o professor atua, e que são responsáveis por mantê-lo
ensinando do modo como faz, pode fornecer informações
relevantes para o planejam ento de novas contingências de
ensino.

C o n t in g ê n c i a s q u e e x p l i c a m
O COMPORTAMENTO DO PROFESSOR

A análise do autor sobre a influência das contingências


presentes na sala de au la —em especial, o comportamento
do aluno —sobre o com portam ento do professor é apresen­
tad a neste subtítulo.
Em sua análise dos com portam entos que o professor
apresenta na situação de ensino, Skinner destaca a impor­
tân cia das contingências presentes na sala de aula, identi­
ficando-as como contingências com plexas em que professor
e aluno reforçam se reciprocam ente, tanto positiva quaato
negativam ente. É na interação com o aluno, e em função
do efeito de seu com portam ento sobre o comportamento
do aluno, que os com portam entos do professor são altera­
dos ou m antidos.
O uso freqüente de contingências aversivas na educa­
ção, que m arca o modo como m uitos alunos têm sido le­
vados a aprender, m arca, tam bém , a maneira como muitos
professores têm sido levados a ensinar. Controlado pela al­
teração im ediata do com portam ento do aluno., ob tid a pelo
controle aversivo, o professor se m antém atuando coercíti-
vam ente. A longo prazo, porém , devido ao contracontrole
exercido pelo aluno, o professor passa a trab alh ar tam bém
sob coerção, vivendo cotidianam ente situações marcadas

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134 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

por emoções negativas e por insatisfação pessoal e profis­


sional. Não é dc estranhar que muitos professores, tal como
alunos, encontrem alternativas para fugir ou se esquivarem
de seu am bien te de trabalho (o número de licenças médicas
entre professores d a rede pública de ensino parece-nos um
exemplo significativo), chegando alguns deles a desistir de­
finitivam ente de se comportar sob aquelas condições.
Além do controle aversivo, contingências de reforça-
mento positivo caracterizam a interação do professor com
o aluno e explicam a manutenção do com portam ento do
professor. Ver o aluno acertar, levá-lo a esclarecer um a dú­
vida, m anter com. ele uni relacionamento amistoso são
exemplos de experiências extrem am ente reforçadoras para
um professor que, tendo sido reforçado por tais ações em
sua história de vid a, tenha aprendido a ser controlado pelo
bom desem penho do aluno.
Q uer no uso de contingências de reforçamento posi­
tivo, quer no uso de controle coercitivo, o que parece influen­
ciar o comportamento do professor é o efeito imediato que sua
ação provoca no comportamento do aluno. A recíproca tam ­
bém é verdadeira. Assim, o com portam ento do professor e
o com portam ento do aluno ficam sob controle das contin­
gências que se estabelecem nessa interrelação.
No entan to, cham a a atenção o fato de o professor
atuar, m uito m ais freqüentem ente, sob controle dos erros
e dos com portam entos inadequados dos alunos, do q u e de
seus acertos e adequações, o que explica o clim a hostil de
m uitas salas de aula.
Os rápidos efeitos produzidos sobre o com portam ento
do aluno pela punição, em comparação com os efeitos do
reforçamento positivo, parecem-nos ser apenas parte d a ex­
plicação p a ra seu uso m ais freqüente.

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O PROFESSOR N A PROPOSTA SKINNERJANA DE ENSINO 135

Cham a ainda m ais a atenção o fato dc que, muitas ve­


zes, o professor não parece ficar sob controle do compor­
tam ento do aluno concreto, com o q u a l está interagindo.
O com portam ento do professor parece ocorrer em função
de outras contingências, que não aq u elas específicas que
constituem as relações pedagógicas que ele estabelece com
seus alunos em sala de aula.
Essas duas situações — a preponderância das contin­
gências aversivas e a possível existência de outros fatores
controladores do comportam ento do professor —colocam a
necessidade de am p liar a análise da situação de ensino, bus­
cando a identificação de outros fatores que, ocorrendo fora
da sala de aula, acabam por interferir nas contingências ali
presentes.
Embora nos textos até aqui analisados Skinner faça re­
ferência à presença de outros agentes — adm inistradores,
planejadores da p o lítica educacional, pesquisadores e m an­
tenedores —no sistem a educacional, cuja ação interfere di­
retam ente no processo de ensinar e afirm e a necessidade de
se analisarem as contingências que ex p licam os comporta-
_m en to s.d e tais agentes, Skinner se detém pouco em tal
análise.
Por isso, buscam os em alguns outros textos do autor
e, eventualm ete, de outros analistas do com portam ento, o
referencial necessário à identificação d e Contingências sociais
m ais am plas1, que expliquem o com portam ento do profes­
sor. A concepção de educação como um a das agências so­
ciais de controle do comportamento hum ano e a análise de

1 Para se referir a tais contingências, Glenn (1986) cunhou o termo me-


tacontingéncias.

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136 FORMAÇÃO D£ PROFESSORES

como certas práticas culturais, características da sociedade


ocidental contem porânea, interferem nas contingências por
meio das quais essas agências atuam , constituem esse
referencial.

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Ca p ít u l o 7

P a r a a lé m d a s
CONTINGÊNCIAS INSTRUCIONAIS

Já em 195 3, na publicação o rig in al do livro Ciência e


comportamento humano, Skinner ap resen ta a educação, ta l
como o governo, a religião, a psícoterapia e a economia,
como um dos cam pos em que agên cias sociais respondem
tam bém pelo controle do com portam ento humano. Segun­
do sua concepção, é fundam entalm ente por meio dessas
agências <fue o grupo social exerce controle sobre seus
membros, reforçando os com portam entos tidos como cer­
tos ou punindo os errados. A definição de com portam ento
certo tom a como parâm etro o que é reforçador para outros
membros do grupo social e não apenas para o indivíduo.
Selecionados por suas conseqüências, esses com portam en­
tos garan tiram , até o presente, a sobrevivência d a espécie
e da cultura.
A possibilidade de um a agên cia social, tal como o rga­
nizada em sociedades como a nossa, operar exercendo con­
trole sobre os com portam entos d aq u eles que dela p artici­
pam d eco rre d a e x istê n c ia de a c e sso d iferen ciad o dos
in d iv íd u o s aos even tos am b ien tais q u e afetam tais com­
portamentos. Isto é, apenas alguns dos indivíduos que com ­
põem essas agên cias têm poder de m an ip u lar as variáveis

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138 FORM AÇÃO DF. PROFESSORES

que a agência u tiliz a no controle do com portam ento dos


dem ais. Essas a g ê n c ia s constituem -se, pois, como formas
institucionais de exercício do poder, por meio de um sis­
tem a estratificado de controle do com portam ento humano.
Na obra citad a, Skinner realiza um a análise compor-
tam ental de cada u m a das cinco agências então identifica­
das, caracterizando o tipo de controle por elas exercido, por
meio das ações d aqu eles de seus membros que têm acesso
áos eventos controladores e poder de alterá-los. Analisa, tam ­
bém, os efeitos — inclusive as possibilidades de contracontrole
— que tal controle g e ra sobre os controlados.
De tal análise, é possível depreender que a educação,
sem elhante em suas características gerais às demais agên­
cias de controle do com portam ento do indivíduo, tem, no
entanto, sua especificidade ao responder pelo “estabeleci­
m ento de com portam entos que serão vantajosos para o
indivíduo e para outros em algum momento futuro"
(Skinner, 1974, p. 2 2 6 ). Cabe à instituição educacional
produzir um efeito a longo prazo, o que a torna um a agên­
cia social que se d istin g u e das dem ais, não pela natureza
dos fatores que m an ip u la no controle do com portam ento
dos indivíduos que d e la participam , m as pelo modo como
os usa. Ele ilu stra esse aspecto ao afirm ar que:

Há uma diferença entre o uso do poder econômico para in­


duzir o aprendiz a trabalhar, e para induzi-ío a adquirir for­
mas eficientes de comportamento; entre o uso da ameaça de
punição para induzir um soldado a lutar e para induzi-lo
a lutar eficientemente; e entre o uso do poder peculiarmen­
te disponível para as agências religiosas para reforçar o
comportamento piedoso e para ensinar o catecismo. (Skinner,
1974, p. 227)

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PARA ALÉM DAS CONTINCÊNCIAS iN STRÜCtO N AlS 139

Essa especificidade da educação traz algum as conse­


qüências para sua compreensão como ag ê n cia social de con­
trole do com portam ento humano, quando com parada com
as demais agências.
Embora o controle do com portam ento dos indivíduos,
tal como as agências sociais o exercem, ten h a possibilitado
a aquisição de repertórios com portam entais que, seleciona­
dos, promoveram até o presente, a sobrevivência dos indi­
víduos e da cultura, nãó são poucos n em irrelevantes os
problem as que põem em risco, hoje, essa sobrevivência.
Enfrentar tais problem as, do ponto de vista da análise
com portam ental, significa desenvolver um a cultura

em que seus membros mantêm fortes relações interpessoais


garantindo assim um controle maior por contingências de
reforçamento do que por regras mediadas por instituições
sociais. (Andery, 1993, p. 26)

Do conjunto de princípios que, se g u n d o Skinner, de­
veriam ser garantidos quando pessoas governam pessoas,
..destacam-se a substituição do controle aversivo pelo refor­
çamento positivo e a superiondade das contingências, em
comparação com as regras, no controle do comportamento dos
indivíduos. E no contexto da discussão desses princípios que
Skinner, referindo-se à extensão na qual u m a cultura prepara
seus membros para responder às suas contingências, afirma:

Um ambiente social é extraordinariamente complexo e no­


vos membros de um grupo, ao serem, nele admitidos, não
apresentam comportamento apropriado. U m indivíduo foi
primeiramente iniciado em uma cultura por programas
instrucionais naturais, na presença de modelos favoráveis.

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140 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Estes nâo mais constituem parte importante da iniciação e


um controle mais explícito é agora necessário. Seqüências
programadas de contingências, nas mãos de professores c
counselors hábeis, podem gerar eficientemente repertórios
complexos exigidos por um ambiente social. (1978, p. 13)

Parece-nos, pois, que o autor atribui à educação um


papel de destaque e vê, na atuação dessa agência, a possi­
bilidade de um a contribuição significativa na preparação,
form alizada e sistem ática, de indivíduos aptos a construir
uma cu ltu ra com maiores chances de sobrevivência.
Com pete explicitam ente à educação a tarefa de g aran ­
tir ao aluno um a formação que lhe propicie o acesso aos co­
nhecim entos socialmente acumulados e a aquisição dos
com portam entos de autogoverno, capacitando-o a atuar
sob novas contingências e a ag ir com sucesso em relação ao
m undo, em um tempo futuro. Assim, dada a sua própria
natureza, a educação, de modo diferente de outras ag ên ­
cias, constitui-se como um a instituição social que requer de
seus agentes o domínio de um vasto conjunto de conhecimen­
tos científicos sobre o mundo físico e sodal e sobre o com por­
tam ento hum ano, de modo a responder de modo eficíéhte'
pelo ensino formal e sistem ático.
T anto quanto a psicoterapia, a agência educacional
não possui como característica necessária de seu m odo de
atuar, o recurso ao controle aversivo. De modo diverso da psi-,
coterapia, e aproximando-se do govemo e da religião, a edu­
cação com o agência de controle abrange com sua açãcT um
grande núj^ero d£' indivíduos. Essa abrangência se faz, às
vezes, como no caso do governo, em caráter com pulsório.
A ssim , com características que ora a assem elham a
um a, ora a outra agência de controle do com portam ento

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PARA ALÉM D AS CONTINGÊNCIAS INSTRUCIONAIS 141

hum ano, apenas a educação parece se definir, ao mesmo


tempo, por ag ir em relação a um grande número de indi­
víduos e por responder pela tarefa de ensinar aos indivíduos
sob seu controle um repertório definido, fundado no conhe­
cim ento científico, que possibilite sua atuação eficiente, no
futuro, em outras instâncias do am biente social.
É essa especificidade da educação como instituição so­
cial que nos faz reconhecer, em Skinner, um a valorização
dessa agência na preparação de indivíduos capazes de lidar
de modo eficiente com o controle exercido pelas demais
agências e na produção da variação necessária à sobrevivên­
cia da cultura.
A lgum as considerações feitas por Skinner, ao se referir
aos graves problemas do m undo atu al e ao explicar, por
meio da análise de contingências, porque pouco tem sido
feito p ara resolvê-los, parecem d ar sustentação à nossa su­
posição. Referindo-se à incongruência entre o futuro da es­
pécie e o futuro das agências de controle, o autor menciona,
especificam ente, o governo, a religião e a economia, e ex­
clui a educação e a psicoterapia dessa análise. Afirma ele que:

Se os futuros dos governos, religiões e sistemas capitalistas


fossem congruentes com o futuro da espécie, nosso proble­
ma estaria resolvido. Quando um certo comportamento
fosse considerado como perigoso para a espécie, as institui­
ções o decLarariam, respectivamente, ilegal, pecaminoso ou
custoso demais, e mudariam as contingências que elas im­
põem. Infelizmente, os futuros são diferentes. (...) Gover­
nos,religiões e sistemas capitalistas, sejam públicos ou pri­
vados, controlam a maior parte dos reforçadores da vida
cotidiana; eles precisam usá-los, como sempre o fizeram,
para seu próprio engrandecimento e nada têm a ganhar

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142 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

por abrir mão do poder. Essas instituições são a corporifi-


cação das práticas culturais que adquiriram existência
através tia seleção, mas as contingências de seleção estão
em conflito com o futuro da espécie humana. (Skinner,
1987, p. 7).

Ao considerar a possibilidade de planejar um modo de


vida que tenha m aiores chances de sobreviver no futuro,
Skinner m enciona a atuação daqueles que identifica como
“os não-com prom etidos com governos, religiões e capital"
(198 7, p. 8), capazes de tomar o futuro mais remoto como
parâm etro para as contingências a estabelecer, de modo
a garantir a sobrevivência da espécie. Atribuindo à ciência
e aos cientistas um papel fundam ental nesse processo,
Skinner acrescenta: “O poder dos não-comprometidos está
não apenas na ciência, mas na educação e no aconselha­
m ento” (p. 12).
Isso posto, parece-nòs que olhar para á educação na
perspectiva da an álise do comportamento —como agência
de controle com plexa em si mesma e na sua relação com
as demais agências — requer que olhemos para além dâ sala
de aula, para as condições am bientais que possibilitam en­
tender o com portam ento do professor na sua relação com
os demais profissionais/agentes que atuam na instituição
educacional e no contexto das relações sociais mais globais
em que se insere a educação.
Concordamos com Holland (197 7) quando afirma, que
a análise com portam éntal, alérg, de possibilitar a explicação
do com portam ento de um indivíduo particular, “fornece
meios para an alisar as estruturas, o sistem a e as formas de
controle social” (p. 163).

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PAR A ALÉM D A S CONTINGÊNCIAS ÎNSTKÜCIONAIS 143

Por isso, buscamos respaldo, p ara as considerações que


aqui fazemos, nos textos de Skmner que compõem a Parte
I ("Problem as G lobais"), do livro Upon Further Refletion, de
1987, em que o autor se dedica a análises dessa natureza,
em especial o capítulo 2 (“W hat is wrong w ith daily life
in the W estern w orld”).
No referido capítulo, o autor tom a como ponto de
partid a para sua reflexão alguns problem as que atualm ente
afetam a sociedade ocidental e os an alisa como efeitos de
práticas culturais que evoluíram e acabaram por produzir
contingências que com prom etem , a longo prazo, a sobre­
vivência d a espécie e da cultura, e tornam , a curto prazo,
a vid a hum ana menos feliz.
A nosso ver, m uitas dessas p ráticas analisadas por
Skm ner estão presentes na agência educacional e caracte­
rizam os com portam entos dos agentes que nela atuam , seja
o professor na sa la de au la, sejam outros profissionais da
educação que atuam nas instâncias superiores de poder,
respondendo pelo planejam ento, m anutenção e adm íntstra-
— ção d a educação.
O autor toma como ponto de partida de sua análise uma
im portante noção de seu sistema explicativo do comporta­
mento hum ano —a nosso ver pouco mencionada por estudio­
sos de Skinner —, a de que o reforçamento produz dois efeitos
básicos: o efeito de prazer e o efeito de fonaledm ento.
A referência ao efeito de prazer é expressa, comumente,
pela associação do reforçamento operante a sendmentos.

Assim, nós dizemos que coisas reforçadoras nos agradam,


que gostamos delas, que elas dão boa sensação. A associação

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144 F-ORMAÇAO DE PROFESSORES

de reforçamento com sentimento é tão forte que há muito


se tem dito que coisas reforçam porque dão boa sensação ou
dão boa sensação porque reforçam. (Skinner, 1987, p. 17)

P ara o autor, no entanto, a expWcação do por qUê as


coisas são boas e reforçam deve ser buscada na história evo­
lutiva d a espécie.
Diverso do efeito de prazer, o efeito de fortalecimento
ocorre em momento diferente e produz um sentim ento
tam bém diferente. Comparando-os, ele afirma que:

Quando nos sentimos satisfeitos, não estamos necessaria­


mente sentindo uma maior inclinação a nos comportarmos
do mesmo modo. (...) Por outro lado, quando repetimos o
comportamento que foi reforçado, não sentimos o efeito
prazeroso que sentimos no momento em que o refotça-
mentp ocorreu. Prazeroso parece ser a palavra do cotidiang
que é mais próxima a reforçador, mas ela cobre apenas me­
tade do efeito. (Skinner, 1987, p. 17)

N a história da hum anidade, não obstante, evoluíram


e se m antêm até hoje certas práticas culturais que enfati­
zam "apenas m etade do efeito" —o efeito de prazer — em
detrim ento do efeito de fortalecimento, alterando (Skinner
diz '‘corroendo”) as contingências de reforçamento de tal
modo que acabam por produzir uma relação problem ática
entre o hom em e o am biente.
Abordam os a seguir três dessas práticas pasa, a partir
de sua caracterização, identificar o modo como se expres­
sam na educação, interferindo nas contingências que cons­
titu e m a situação de trabalho do professor.

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P A R A ALÉM DAS CONTINCÊNCIAS [NSTRUCfONAIS 145

U m a dessas práticas cultu rais que corrói o efeito for­


talecedor do reforçamento refere-se à forma como se dá a
relação entre o trabalhador e a conseqüência de seu trab a­
lho e que Skinner, reportando-se a M arx, denom ina aliena­
ção. C onstituída, historicam ente, com o uma form a de o rga­
nização do trabalho calcada r»a especialização e na divisão
do trabalho, a alienação, expressa em termos com porta-
m entais, significa a separação entre o com portam ento e
suas conseqüências reforçadoras n atu rais im ediatas. Apesar
de possíveis ganhos-dessa fornia de organização do trabalho
para o processo produtivo, com efeitos satisfatórios para o
grupo social — o aum ento de produtos disponíveis para
consum o, por exemplo —, é necessário considerar, na pers­
pectiva de Skinner, quais os com portam entos que estão
sendo fortalecidos com a m anutenção de tal p rática cultu ­
ral. Do ponto de vista do trab alh ad o r individual, o trab a­
lho parcelado e especializado, realizado em um ritm o e se­
gundo um controle impostos d e fora sobre o indivíduo, le­
vam -no a com portar-se de m odo m ecânico, realizando
tarefas repetitivas, cansativas e pouco originais. Sem pos­
sibilidade de acesso à totalidade do processo ou ao produto
de seu trabalho, o trabalhador passa a ter seus com porta­
mentos controlados por contingências arbitrárias — no mais
das vezes, contingências aversivas, com seus indesejáveis
subprodutos — m anipuladas, em g eral, por seus superiores
na hierarquia de trabalho. Skinner (1 9 8 7 ) refere-se a esses
trabalhadores, e aos sentim entos neles gerados p ela alien a­
ção, afirm ando que:

Trabalhadores dos quais se diz que se sentem impotentes nãó


têm nada a mostrar por seu trabalho a não ser seu salário,
nada que seja seu, do que eles fizeram. Trabalhadores dos

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146 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

quais se diz que se sentem separados da sociedade, esrão


gastando muito de seu dia sem serem afetados por contin­
gências sociais. O que significa dizer que um trabalhador
esta despersonalizado é um pouco mais díficil de explicar.
Uma pessoa ou self é um repertório de comportamento. O
repertório modelado e mantido pela vida diária é rico e va­
riado. O repertorio modelado e mantido por uma fabrica
é pequeno e viciado. Não compòe muito de uma pessoa,
(p. 37)

O autor reporta-se a um segundo tipo de prática cu l­


tu ral que corrói o efeito fortalecedor do reforçamento, ao
afirm ar que nas cu ltu ras ocidentais houve "um a g ran d e
expansão do com portam ento ‘governado por reg ras'"
(Skínn er, 1987, p. 21). Embota i nportante para a ap ren ­
dizagem hum ana, possibilitando a rápida aquisijão de um
repertório com poitam ental, o controle do com portam ento
por m eio de regras pode levar o indivíduo a ag ir apenas
porque se disse a ele que assim o fizesse.
Como descrições verbais das contingências, as regras
dem andam , p ara sua formulação prim eira, ou a exposição
às contingências descritas ou a análise do sistem a que as or­
gan iza; é tam bém possível que algum as regras sejam d eri­
vadas de outras. Quando a regra perde correspondência
com a contingência a partir da qual foi form ulada, passa a
ser, segundo Skínner, uífta rêgram ais'p ro b lem ática'd ó qué
ú til. Isso pode ocorrer porque as práticas reforçadoras de
um gru p o social nem sempre são consistentes e as co n ­
tin g ên cias são in stáveis. Embora o controle do com por­
tam en to por m eio de regras facilite a aquisição de com ­
portam entos em situações nas quais as contingências são
com plexas, pouco claras ou induzem a comportam entos

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P A R A ALÉM DAS CONTINGÊNCIAS INSTRi CIONAIS 147

não-desejáveis, o uso de regras pode afastar o indivíduo das


conseqüências naturais de seu com portam ento e fortalecer,
não o com portam ento especificado p ela regra, mas o pró­
prio com portam ento dc seguir regras. O indivíduo, assim,
não explora novas contingências e acab a por perder refor­
çadores que possivelm ente ocorreriam, caso ele se expusesse
às contingências existentes.
Compromete-se, assim, um aspecto fundamental neces­
sário à sobrevivência da cultura —a variação —já que é do con­
tato do homem com as contingências do m undo que surge a
variação. Homens que só seguem regras não produzem as va­
riações c o m p o rtam en tais necessá ias à seleção.
As leis de um governo ou as normas de um a institui­
ção podem ser entendidas como um tip o especial de regras
a controlar o com portam enro humano. Im postas aos ho­
m ens, essas regras d ificu ltam o estabeleci! le n to de relaçóes
interpessoais fortes, que garantem o controle do compor­
tam en to por contingências de reforçamento, -aspecto que,
na visão de Sk inner, é crucial para a sobrevivência da cul­
tu ra. Segundo ele: “(...) quando as pessoas se com poiiàm
b em „seguindo regras e :icas ou obedecendo as leis de um
governo ou religião, conseqüências pessoais fortalecedoras
são usualm ente m uito atrasadas" (S kin n er, 1987, p. 23).
F iralm ente, Skinner cousidera com o m ais u m a fonte
de corrosão das contingências reforçadoras naturais a exis­
tên cia de práticas cu ltu rais que, diferentem ente das ante­
riores, parecem au m en tar a freqüência de reforçamento
im ediato. A sociodade ocidental ofereçg ao hom em inúm e­
ras oportunidades de se comporfar em relação a coisas "in­
teressantes, bonitas, deliciosas, que e n tre té m e [são] exci­
tantes" (p. 23) O comportamento reforçado pela maior
p arte dessas coisas, porém , é quase sem pre um comporta-

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148 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

m ento de m ero contato com elas, em que o m divíduo passa


um longo período de tem po fazendo pouca coisa e cuja
conseqüência, embora agradável, fortalece apenas uma
am ostra m uito pequena de seu com portam ento. Skinner
(1 9 8 7 ) resum e sua análise com a seguinte ilustração:

as pessoas olham para coisas bonitas, ouvem música bonita


e assistem a dtverçimentos excitantes, rnas os únicos com­
portamentos reforçados são olhar, ouvir e assistir, (p. 25)

A conclusão que tira em relação à situação descrita


nos parece pouco anim adora:

O que há de ertado com a vida no Ocidente não é que ela


tem reforçadores demais, mas que os reforçadores não são
contingentes aos tipos de comportamento que sustentam
o indivíduo ou promovem a sobrevivência da cultura ou da
espécie. (Skinner, 1987, p. 24)

É nesse quadro m ais g e ral de análise d a educação,


com o u m a agência especial de controle inserida em um a so­
ciedade que tem m antido práticas culturais com o as descri­
tas, q ue podemos, agora, buscar elementos q u e ajudem a
entender o com portam ento do professor na sala de aula.
T anto o uso freqüente que o professor faz do controle aver­
sivo, quanto os comportamentos que emite sem estar sob con­
trole do comportamento do aluno, podem, agora, ser explica­
dos a partir de outras contingências sociais mais am plas, que
acabam por se reproduzir no interior da escola.
Como m em bro d a sociedade, o professor leva para
dentro d a sala de au la um repertório com portam ental ad­
q uirido ao longo de su a história de vida sob contingências

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PARA ALÉM D AS CONTINGÊNCIAS INSTRUCIONAIS 149

cais como as descritas. É preciso, pois, para entender os


comportamentos do professor ao ensinar, considerá-lo, ao
mesmo tempo, como indivíduo com um a história peculiar
e como participante de um a dada c u ltu ra. E preciso, tam ­
bém, fazer referência à ação de outros membros —além do
professor —que atuam na educação, já que, corno agência so­
cial, é composta por urna diversidade de indivíduos que se
comportam uns em relação aos outros. Há, ainda, a necessi­
dade de eventuais referências a outras agências de controle,
já que, por se constituírem como instituições de um a m es­
m a sociedade, produzem interferências recíprocas.
Retomemos, inicialmente, o conceito de alienação. Em­
bora em sua formulação Skínner se refira, explicitamente, ao
trabalhador na fábiíca, não nos parece impróprio aplicar este
conceito à análise do comportamento do professor, entenden­
do-o também como um trabalhador alienado.
Não é inédito o entendim ento do professor como um
trabalhador subm etido a Condições de trabalho sem elhan­
tes às dos dem ais trabalhadores sob o capital, ressalvadas
as diferenças entre trabalho in telectu al e trabalho m anual
e entre a escola e a fábrica. São inúm eros os autores1 que,
respaldados pelo referencial do m aterialism o dialético, ana­
lisaram a escola como espaço contraditório, no q ual se re­
produzem, dialeticam ente, as relações sociais características
da sociedade cap italista, em que o professor atua como tr a ­
balhador expropriado de seu trab alh o e submetido às m es­
mas relações hierárquicas típicas d o capitalism o.
4 , nosso ver, a contribuição q u e a análise de Skinner
vem acrescentar às explicações econôm icas ou sociológicas

1 Cury (1980), Arrobo (1980) e Snyders (1977) são alguns desses autores.

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150 F< tRMAÇ/vO DE . PROFESSORES

da alienação é perm itir a compreensão de tal fenômeno


pela descrição dos comportamentos dos indivíduos nela en­
volvidos e das contingências que mantêm tais comportamen­
tos. Com essa contribuição, em nosso entendimento, as con­
cepções skm nerianas ajudam a preencher lacunas exp licati­
vas, acrescentando às propostas sobre ò que fazer, Ou até sòbre
o que naú fazer, um tipo especial de conhecimento, sobre o
com portam ento hum ano e a sobrevivência da cultura, que
pern ite elaborar propostas relativas ao como fazer.
O lh ar p ara o professor como trab alh ad o r-alien ad o ,
na p ersp ectiva d a an álise co m p o rtam en tal, p erm ite-n o s
id en tificar in úm eras situações de trab alh o em que o p ro ­
fessor parece se com portar em função do controle e x er­
cido por outros p articip an tes da agência educacional que
não o aluno.
É a cham ada equipe técnica da escola, juntam ente
com o diretor, quem responde por esse controle. Situada
etn posições superiores na hierarqui. educacional e investi­
da de poder, à equipe técnica é atribuída m aior capacidade
e melhores condições para sugerir atividades a serem rea­
lizadas pelo professor, garant indo, em geral sob condições
aversivas, que ta. >atividades sejam cum pridas.
C abe lem brar que o com portam ento dos agentes su­
periores da hierarquia educacional tam bém é, evid ente­
m ente, adquirido e m antido por condições am bientais, que
podem e precisam ser analisadas e dás quais f..’ £ í parte
tanto o comp< irtam ento do professor quanto as contingên ­
cias estabelecidas pelas-esferas de poder a eles superiores,
seja d a própria hierarquia educacional seja d a hierarquia
social m ais am pla, am bas expressões de um a so< ied; ide que
sobrevaloriza o trabalho intelectual e os graus superiores de
escolaridade, em detrim ento do trabalho m an u al e dos

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PAR A ALÉM D AS CONTINGÍiNC1AS INSTKUCIONAIS 151

graus inferiores de escolaridade, adotando o discurso da


competência como critério de separação entre os indiví­
duos. Essa m esm a sociedade di:*:ingue, dentre os trabalha­
dores intelectuais, aqueles que, situados nos mais baixos ní­
veis da hierarquia educacional e identificados como os m e­
nos competentes, precisam ser controlados e supervi­
sionados de perto por seus superiores.
E por meio da equipe tècr íca e da direção da escola
que decisões tom adas em instâncias educacionais supe­
riores, externas à unidade escolar, chegam até o professor,
afetando diretam ente o trabalho a ser desenvolvido com o
aluno, quer quanto às atividades a serem realizadas, quer
quanto aos conteúdos a serem ensinados ou aos procedi­
mentos e critérios de avaliação a serem adotados. Contin­
gências arbitrárias, com uniente aversivas, são estabelecidas
de modo a m anter o professor como m ero executor desse
trabalho. Mesmo quando responde pelo planejam ento, exe­
cução t avaliação das atividades de ensino, o professor é
acompanhado de perto p ela equipe técn ica, que estabelece
formas de controle de seu trab Lho. Exemplo disso e o preen­
chimento de um caderno -diárkr, com relato das atividades
roaliradas, que o professor entrega p a ra ser vistoriado pela
coordenação pedagógica. M ais do q ue se constituir como
condição que possibilita ao professor av aliar e m elhorar a
qualidade dos procedim entos de ensino adotados, o contro­
le da equipe técnica acaba por funcionar apenas p ara m an­
ter o professor como um trabalhador alienado , dependente
de que lhe cügam o que e como fazer seu próprio trabalho.

2 Este procedimento foi descrito por Andrade (1990), a partir de estudo,


p o v ele realizado, do cotidiano de uma escola publica de Io grau.

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152 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

É possível compreender, nesse contexto, porque pro­


fessores se referem às más relações no trabalho e às m úl­
tiplas exigências extra-classe como alguns dos aspectos re­
lacionados à sua frustração na profissão e porque apontam,
como motivo de satisfação, as possibilidades que o espaço de
sala de aula oferece para um trabalho do qual se sentem do­
nos, sem interferências diretas, sem vigilância ou cobranças.5
D istanciado das conseqüências naturais de seu com­
portam ento e controlado, quer por regras, quer por contin­
gências aversivas, o professor deixa de assumir, ele próprio,
o controle de suas ações e passa a responder fugindo ou es­
quivando-se da situação.
O comportam ento do aluno, que deveria atuar como
condição fundam ental no controle do comportam ento do
professor, passa a ser cada vez menos im portante. Tornar-
se alheio, pelas contingências que estabelecem suas condi­
ções de trabalho, às conseqüências fortalecedoras im ediatas
de seu com portam ento significa, no caso do professor, tor­
nar-se alheio ao evento que deveria, prioritariamente, contro­
lar seu com portam ento: o com portam ento de seu aluno.
C ertos rituais que ocorrem na sala de aula ilustram os
com portam entos que as práticas culturais descritas têm
produzido e fortalecido no repertório de nossos professores.
Em in úm eras situações, o professor parece comportar-se,
apenas, em função do efeito de prazer que seu com porta­
m ento produz ou em funçaó de regras e normas a ele im ­
postas pelos agentes educacionais. O professor parece com ­
portar-se, m uitas vezes, sob controle do “cum prim ento do
p ro gram a” e realiza certas atividades de modo a “ficar li-

3 Conforme Gatti (1996).

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PA R A ALÉM DAS CONTINGÊNCIAS ÍNSTRUCIONAIS 153

vre” da tarefa de ensinar, a despeito de o aluno ter ou não


aprendido. Um fazer ritualístico e rotineiro se instala na
sala de aula. Sob tais condições, o aluno passa a apresentar
o m esmo padrão de com portam entos, de modo a “se livrar"
da tarefa de aprender.
Valem o-nos, aqui, como ilustração, novam ente de
descrição feita por A ndrade (1 9 9 0 ). DÍ2 ele que:

As professoras gastam grande parte dasaulas com ativida­


des preparatórias, como a oração inicial obrigatória, repe­
tição em coro de expressões como "vou ser um bom me­
nino'', "devo pedir desculpas a quem ofendo”, “olá, bom
dia, boa tarde", e a cópia do cabeçalho. (...) Outra arbitra­
riedade no controle do tempo reside na forma como algu­
mas professoras estendem certas atividades que lhes são
prazerosas. (...) Presenciamos também professoras que se
afastavam da sala para buscar material para desenvolver
atividades com seus alunos e que se demoravam por longo
tempo. A organização do grupo, na forma de advertências,
imposição de ordem e disciplina, absorve a maior parte do
tempo e da energia da professora. Ao ensino propriamente
dito é reservado um tempo bem menor. (..:) Do momento
que (os alunos] chegam ao portão da escola até a saída, o
dia escolar se converte numa seqüência de rotinas e rituais
(...)■ <P- 31)

Lida na perspectiva com portam ental, a descrição de


A ndrade nos revela as graves implicações d a alienação do
professor. Mesmo na •situação estrita da sala d e aula, da
qual o professor se “seate dono”, e na qual, segundo sua
visão, pode ag ir "sem interferências”, ele acaba p o r revelar
a precariedade de seu repertório com portam ental enquanto

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154 FO RM AÇÃO DE PROFESSORES

planejador, estabelecedor e avaliador de contingências de


ensino adequadas e relevantes. Seus comportamentos ap a­
recem como m ecânicos e estereotipados, m era sequência de
“rotinas" e de "rituais" que, sob o título de atividades ou
procedimentos de ensino, ele realiza, m uitas vezes sem sa­
ber por quê. Em resposta à aversividade que um a situação
dessa natureza representa, o professor passa a se com portar
de modo a esquivar-se dela, ou pelo exercício do contracon-
trole, tam bém aversivo, ou chegando até a criar razões ap a­
rentem ente relevantes p ara conseguir fugir de sua situação
de trabalho.
Por se co n stituir como um a situação na qual as con­
tingências que devem controlar o com portam ento do in d i­
víduo são atrasadas, o trabalho alienado requer o recurso a
regras que atuem com o m ediadoras entre o com portam en­
to e suas conseqüências naturais. Tomando como referência
a análise de Skinner sobre a expansão, em nossa cultura,
dos com portam entos governados por jegras, parece-nos ca­
bível supor que os com portam entos do professor podem
ser, em parte, explicados pela análise das regras que os go ­
vernam , quer aq u elas elaboradas pelo próprio professor em
sua história de vida pessoal e profissional, quer as que se
constituem enquanto norm as d a instituição educacional ou
enquanto leis d a nossa sociedade.
E, dado que, p a ra Skinner, as leis da ciência podem se
constituir como regras a governar o com portam ento h u m a­
no, parece-nos possível hipotetizar que outras “leis”, decor­
rentes de conhecim entos do senso com um ou de explica­
ções de natureza ideológica, podem tam bém exercer esse
papel. Estamos com isso querendo dizer que é possível e
necessário que, en q uan to analistas com portam entais, seja­
mos desafiados a an alisar o com portam ento do professor

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PARA ALÉM DAS CONTINGÊNCIAS INSTRUCIONAIS 155

para além das contingências instrucionais, buscando iden­


tificar possíveis crenças, representações, preconceitos, ex­
pectativas do professor — fatores q ue começam a ser mais
sistem aticam ente discutidos em pesquisas educacionais
como características pessoais do professor — que podem es­
tar, sob a forma de regras, controlando seus com portam en­
tos. Compete à análise com portam ental explicar tais fatores
com referência às condições am bientais que os produzem,
possibilitando a real compreensão de- como atuam e a ado­
ção de medidas que perm itam produzi-los ou alterá-los.
Cabe, finalm ente, considerar q u e se a cultura ociden­
tal, como afirm a Skinner, tem contribuído para a formação
de indivíduos corn repertórios com portam entais limitados
e repetitivos e tem enfatizado a aquisição e manutenção de
com portam entos que pouco contribuem p ara a sobrevivên­
cia da cultura, a agência educacional te m atuado na m esm a
direção, incentivando, entre seus m em bros, padrões de in­
teração marcados pela desigualdade, p e la coercitividade e
pela passividade d a m aioria. São dessa natureza as relações
que se estabelecem entre os agentes educacionais superiores
e os professores e que estes reproduzem com seus alunos na
sala de aula. São tam bém desse tipo as relações que a ins­
tituição escolar —com as atividades q u e desenvolve é os re­
cursos m ateriais que adota —têm propiciado que os alunos
estabeleçam com o m undo físico e social.
M udanças nesses padrões requerem a identificação e
análise das variadas e complexas condições am bientais que
respondem pelo controle dos com portam entos dos agentes
educacionais, ém especial, do professor, e o planejam ento
sistem ático de contingências que alte re m de modo signifi­
cativo e eficiente tais com portam entos.

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Ca p ít u l o 8

ELEMENTOS P A R A UMA. PR O PO ST A
DE FO RM AÇÃO DE PRO FESSO RES
N A PE R SPE C T IV A SK IN N E RIA N A

A análise que realizamos de alguns dos princípios e


conceitos elaborados por Skinner p a ra a explicação do com ­
portam ento hum ano, e em especial de suas formulações so­
bre a educação e o ensino, possibilita que nos dediquem os,
como etapa final do presente trabalho, a identificar possí­
veis contribuições e a discutir algu m as implicações deles
decorrentes, p ara o enfreatam ento d a questão da formação
de professores.
À despeito do fato de o próprio Skinner ter analisado,
ainda que não exaustivam ente, aspectos d a formação de
professores, e de term os a eles nos referido no capítulo 6,
algum as daquelas idéias serão aq u i retom adas, agora no
contexto específico desta discussão, tendo como referência
a caracterização de algum as gran d es marcas d a proposta
skinneriana, a saber: a explicação não-m entalista ík> com ­
portam ento hum ano, a análise com portam ental do ensino
e a concepção de educação como agên cia social de controle
do com portam ento hum ano.

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158 FORMAÇÃO d e p r o f e s s o r e s

A EXPLICAÇÃO NÃO-MENTAL ISTA DO


COMPOR AMENTO HUMANO E SUAS IMPLICAÇÕES
PARA A FORMAÇAO DE PROFESSORES

Como vinios, roda a explicação de Skinner sobre o


com portam ento hümanò funda-se na negação de causas
m entais e na objeção a mecanismos ou estruturas internas
e a estágios universais de desenvolvim ento como fatores d e ­
term inantes' da ação hum ana. .Sem negar a existência de
eventos como sentim entos ou estados m entais, que ocor ­
rem no que denom ina mundo interno ou mundo dentro da pek
do indivíduo, Skinner não atrib ui a esses eventos privados a
dim ensão de causas do com portam ento humano, en ten d en ­
do-os como estados corporais ou como com portam entos,
explicáveis —como todos —a p artir da relaçao do indivíduo
com o am biente.
Ao buscar nas condições am bientais as razões do com ­
portam ento hum ano e ao enfatizar a im portância d a análise
das com plexas relações que se estabelecem , ao longo d a h is­
tória de vida de um indivíduo, entre suas respostas e os fa ­
tores am bientais que as antecedem e que as sucedem , a
análise skinneriana se d stancia, claram ente, das d eterm in a ­
ções m entalistas.
Essa perspectiva, segundo H olland, representa m a ij
do que a m era rejeição de causas hipotéjicas, çujg valor
cie iíIco se questiona. R epresenta a crítica a um a vísao da
psicologia hu m ana que tem dado sustentação a sistem as so
ciais que exploram e perpetuam a de .igualdade entre os
homens e que adotam , como u m a de suas práticas carac­
terísticas, o culpar a vítima. Em palestra proferida em 1975,
H olland afirm ou que:

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ELEMENTOS PAR A U M A PROPOSTA DE FO R M A Ç Ã O 159

(...) o mito das causas interiores sobrevive graças ao refor-


çamenco fornecido às elires e em função de seu papel na
manutenção do sistema. E comum dizer-se que aqueles em
posições elevadas na hierarquia do poder atingiram tais po­
sições em função de seu mérito pessoal. (...) As causas in­
teriores servem como justificativa para aqueles que tiram
proveito das desigualdades.(...) Mas é até mesmo mais im­
portante para a elite que detém o poder convencer aqueles
situados abaixo que eles mesmos são os culpados por sua
própria condição.

Em consonância com esse contexto explicativo é que


se pode entender o tratam ento dado por Skinner à educa­
ção como agência social e, em especial, a cuidadosa análise
e a formulação exaustiva de propostas para o enfrentam en-
to das quescões relativas ao ensino.
É essa dim ensão não-m entalista que sustenta sua de­
finição de ensino como arranjo planejackj de contingências
e dá sentido às propostas que ele elab ora para um ensino
eficaz, quer em term os de procedim entos de ensino, quer
em termos dos conteúdos a serem ensinados.
Os problemas do ensino passam a ser analisados não mais
como decorrentes de traços e características cognitivas do alu­
no, mas das contingências ambientais, sendo os primeiros,
também , produtos da interação do indivíduo com o ambiente.
Acreditando que o sistema explicativo de Skinner
pode oferecer urna contribuição relevante à educação, dis­
cordamos dos autores que consideram a análise cogiporta-
m en tal como u m a abordagem que já exerceu forte influên­
cia nessa área e que hoje tem pouco a oferecer para a so­
lução de problem as educacionais. N ossa discordância
funda-se na hipótese de que m uitos dos trabalhos identi-

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160 FORMAÇÀO DE PROFESSORES

ficados como aplicações dos princípios da análise compor-


tam en tal, assim como m uitos dos aspectos mencionados
rias críticas feitas à abordagem aplicada à educação, não ex­
pressam , ou expressam de m aneira sim plista, os princípios
e os conceitos formulados por Skinner, nem contêm as
m arcas de suas propostas para o ensino.
O trecho que se segue, confrontado com a análise que
realizam os de alguns dos textos de Skinner, ilu stra o que
estam os querendo afirm ar. U m a citação mais longa pare­
ceu-nos justificável, neste caso, para que não corrêssemos o
risco de truncar o pensam ento da autora.

A primeira disciplina a se instituir como ciência do com­


portamento e a se qualificar de “experimentai'’ foi a Psi­
cologia. Os trabalhos de Pavlov, Titchener, W atson e
Thorndike no passado, só para citar alguns, bem como as
obras de Skinner nas últimas décadas, ilustram a orienta­
ção científica que dominou e continua dominando o campo
da Psicologia Educacional. O Behaviorismo americano,
também chamado de Teoria Esrímulo-Resposta, oferece
um modelo mecanicista para o estudo do comportamento,
pois o mesmo é visto “de fora para dentto".
Daí nos vem a teoria da aprendizagem conhecida pelo
nome de condicionamento, que explica como se processa a
formação de hábicos através da maaípulação de uni incen­
tivo que atua comõ' reforço, istò é, uma fõrmá dé pagamento
pela emissão do comportamento esperado. Daí também
nos chega a tecnologia educacional da instrução programa­
da e do uso de módulos no ensino; e é também de lá que
procedem as informações que temos sobre como "manipu­
lar” o comportamento humano —são as chamadas técnicas
de “modificação de comportamento". Não há por que me-

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/

ELEMENTOS PARA U M A PROPOSTA DE FORMAÇÃO 161

nosprczar esses conhecimentos, pois são válidos e úteis


quando no seu devido lugar. O que é indevido, está errado,
e portanto inaproptiado, refere-se à utilização indiscrimi­
nada de metodologia e técnicas behaviocistas em educação
- pois fazer uso dela.de m aneira "ingênua e irreflerida’'
significa reduzir a complexidade do processo educativo à
simples aquisição de habilidades por condicionamento ou
treinamento. (Esteves, 1984, p. 9)

Por tratar como iguais autores diferentes, a autora se


equivoca ao atribuir ao behavionsm o skinneriano caracte­
rísticas que este não possui. Esperamos ter demonstrado,
pela análise descrita em capítulos anteriores, que a expli­
cação de Skinner para o com portam ento hum ano não se
constitui como unia teoria estím ulo-resposta, que a com­
plexidade do processo de condicionam ento operante não
pode ser reduzida à descrição q u e dele é feita por Esteves,
que o reforço não é um a “forma d e pagam ento'' pela emis­
são do com portam ento esperado e que a educação, para
Skinner, é m uito mais do que a m era "aquisição de habi­
lidades pot condicionamento ou treinam en to”. Identificar
tais áspectos como características do behaviorismo skinneriano
coma insustentável a generalização que Esteves faz quando
afirma ser o behaviorismo “a orientação científica que domi­
nou e continua a dortiínar a Psicologia Educacional”.
A nosso juízo, o que "dom inou e continua a dominar
a Psicologia Educacional” são teorias psicológicas de base
m entalista.

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162 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Aurores1 que se dedicam à análise histórica do desen­


volvim ento das pesquisas na área educacional indicam
que, desde a década de 1940, procurando respaldo ceóríco
que perm itisse dar conta de explicar a com plexidade do
fenôm eno educacional e de encam inhar soluções para seus
problem as, a educação encontra em teorias psicológicas o
referencial que buscava. De acordo com Mello (198 3), é
m arcante a influencia da p^icometria, nesse período, ex­
pressa pela atenção dedicada "à mensuração dos processos
psicológicos envolvidos no ensino-aprendizagem , especial­
m ente ao desenvolvimento de m edidas do rendim ento es­
colar” (p. 68). A ênfase no desenvolvimento psicológico do
aluno, visto como fonte e instância de solução dos problemas
da educação continua a ser, nas décadas seguintes, um a m ar­
ca im portante de grande p an e da contribuição que a psico­
logia oferece à educação. Segundo Antunes (1988),

passéi-se a analisar a problemática global da educação re­


duzindo-a a fatores como dificuldades de aprendizagem,
motivação, agressividade, disciplina, etc., fatores esses de
natureza interna à criança, (p. 98)

Por olhar para o indivíduo e não para a relação entre


o indivíduo e o am biente, tais explicações, a nosso juízo,
ap o n tam como teorias psicológicas dominantes na área dá
educação, não na direção das teorias com portam entais,
m as, ao contrário, na direção das teorias m entalistas. _
N ão é de se estranhar que, vistos a partir desse referencial,
os alunos, vítim as <4e um sistem a social marcado pela de­

1 Gouveia (1971 e 1976), Gani (1983) e, mais rccenremenre, Wacde (1990).

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ELEMENTOS P A R A U M A PROPOSTA DE FORMAÇÃO 163

sigualdade e de um sistem a educacional marcado pela se­


letividade, passem a ser considerados como os culpados
por sèu insucesso escolar.
Criticada como u m a postura psicologizante, em que o
pedagógico acaba por se reduzir ao psicológico, a ênfase no
desenvolvim ento m ental do aluno e nas suas faculdades
cognitivas, como explicação para os problemas da educa­
ção, está até hoje presente nas ações de muitos educadores
e nas razões que u tiliz am para explicar o insucesso do tra­
balho que realizam . -
Dados de recente estudo, desenvolvido dentro do
Proyecto Magistério: características de la profesion maestro
(O realc-CEE-Flacso-FCC), sobre p erfil e expectativas de
professores brasileiros de primeiro .grau (G atti, Esposito e
Silva, 1994), revelam q ue os professores atribuem como a
segunda razão para o não cum prim ento de suas expectati­
vas na profissão o desinteresse das crianças (a prim eira razão
apontada são os baixos salários). E tam b ém essa falta de in­
teresse por parte dos alunos, a causa m aior, no entender dos
professores, das reprovações escolares (as outras razões
apontadas são: a falta de interesse dos pais, o excesso de faltas
dos alunos e a desintegração fam iliar).
Ilustração evidente d a prática de culpar a vítima, ex­
plicações dessa natureza im pedem o u , no mínimo, dificul­
tam a explicitação e, conseqüentem ente, a alteração dos fa­
tores que produzem a fa lta de interesse.
M unido de referências que m inim izam o papel do am ­
biente e enfatizam causas inerentes à natureza hum ana na
explicação de nossas ações, o professor tem pouco a fazer
além de culpar a vítirna.
Sem ter sido ensinado a olhar p ara as condições am­
bientais que produzem alunos desinteressados, que se es-

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164 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

quivam e fogem da escola — e, menos ainda, para as con­


dições que produzem fam ílias desinteressadas e desestrutu-
radas e professores m al remunerados — o professor não
identifica suas próprias ações como um a parte im portante
da explicação dos com portam entos dos alunos. Perde, as­
sim, a chance de alterar essas condições e de ver alterações
acontecerem em seus alunos. É provável que continue, por
isso, a acreditar que m udanças não são possíveis e que ele
não é um agente capaz de promovê-las.
Arrolam os a seguir, a título de ilustração, afirmações
feitas por professores e técnicos de um a escola pública de
São Paulo, e analisadas em nossa dissertação de mestrado
(Zanotto, 1985). Embora tem poralm ente distantes, expres­
sam, a nosso juízo, concepções e práticas que se m antêm ,
ainda hoje, entre alguns professores. D iziam eles, naquela
ocasião: “F. não consegue. É cabeça d u ra”; "Esse não vai.
Não entra nada na cabeça dele"; ‘A m aioria é im atura m es­
mo! N . fica retido direto. Não tem jeito”; “Tem uns que
sempre sabem e outros que nunca sabem. São sempre os
m esm os”; “A lguns estão pegando bem as sílabas. Os que
têm que pegar, né? J á está decidido quem v a i!”; “B. não
vai. Esse precisa fazer o prim eiro ano duas vezes. N em no
ano que vem ele vai p assar...”
Se a ruptura com concepções m entalistas deve se cons­
titu ir como m arca im portante na construção de novos m o­
dos de o professor ensinar a^eus alunos, deve^estar presen­
te, de m aneira especial, nos cursos por meio dos quais esses
professores são formados.
Se concepções m entalistas forem m antidas como fun­
dam entos de propostas p ara a formação de professores e
como critérios para a análise de sua p rática profissional,
corremos o risco de, m ais um a vez, culpar a vítima —agora

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ELEMENTOS [’ARA U M A PROPOSTA DE FORMAÇÃO

o professor —e de atrib u ir à sua incompetência, dificuldade


de compreensão, m á vontade e falta de m otivação, o insu­
cesso d a educação.
Formar professores capazes de se contrapor a concep­
ções m entalistas e sensíveis à consideração d a celação do
hom em com o am biente, requer mudanças nos referendais
psicológicos que têm sido oferecidos aos professores pelos
cursos que respondem por sua formação.

A ANÁLISE COMPORTAMENTAL DO ENSINO E SUAS


IMPLICAÇÕES PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Ao negar as perspectivas psicológicas m entalistas para


a explicação do com portam ento humano e em preender
u m a análise com portam ental dos problemas educacionais e
das alternativas propostas para sua solução, Skínner acaba
por atrib uir muitos dos problem as que ocorrem na sala de
au la, bem como as dificuldades para sua solução, ao que
identifica como um a p o stu ra de negligência sistem ática em.
relação ao método de ensino. N a com plexa e ab ran gente aná­
lise d a educação e do ensino que realiza e nas propostas que
form ula, Skínner se propõe a enfrentar a questão do método
de ensino, atribuindo p a p e l de destaque ao professor no pro­
cesso de ensinar, e afirm ando a necessidade de que o tra­
balho docente seja fundam entado em teorias científicas e
não em noções do senso com um . Propõe, assim , que o pro­
fessor seja, explícita e sistem aticam en te, ensinado a ensinar,
com base em princípios científicos sobre o com portam ento
hum ano e sobre os processos de ensino e de aprendizagem .
Ao defender que é possível e necessário ensinar o pro­
fessor a ensinar, S k in n èr expressa a m esm a posição defen-

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166 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

dida quanto às possibilidades e lim ites de um a aprendiza­


gem espontânea e natural do aluno. É possível a um pro­
fessor aprender a ensinar sem que seja para isso form alm en­
te ensinado. Mas perm anecem os riscos de um a aprendiza­
gem desnecessariam ente longa e difícil, perm eada de erros
e que pode, no lim ite, nunca ocorrer.
A perspectiva skinneriana é nitidam ente oposta àquela
de alguns autores e pesquisadores da área da educação,
para quem o trabalho docente não pode ser entendido
como um a profissão a ser ensinada. O trecho que se segue
ilustra essa postura. São afirmações feitas por Alves (1 9 8 2 )
para explicitar algum as das diferenças que estabelece entre
professor e educador e para expressar sua reflexão sobre “o
preparo do educador". Diz ele que:

Professores, há aos milhares. Mas professor é profissão, não


é algo que se define por dentro, por amor. Educador, ao
conrtário, não é profissão; é vocação. E toda vocação nasce
de um grande amor, de uma grande esperança. (...) A
questão não é gerenciar o educador. É necessário acordá-lo.
E, para acotdá-lo, uma experiência de amor é necessária.
J á sei a pergunta que me aguarda: —“E qual é a receita
para a experiência de amor, de paixão? Como se administram
tais coisas? Que programas as constroem?” E aí eu tenho de
ficar em silêncio, porque não tenho resposta alguma, (p. .26)

Por outro lado, a perspectiva skinneriana parece apro­


xim ar-se da de outros educadores e pesquisadores que,
como Saviani (198 2) e M ello, M aia e Britto (1 9 8 2 ), preo­
cupam -se com a fragilidade teórica dos cursos de formação
de professores e defendem a necessidade de form ar profes­
sores’ que possuam fundam entação teórica sólida e consis-

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ELEMENTOS PAR A UM A PROPOSTA DE FORMAÇÃO 167

tente, que lhes possibilite compreender de modo aprofundado


e sistemático o fenômeno educacional, superando as práticas
de '“bom senso”. Uma distância significativa separa, porém,
Skmner dos autores citados; a teoria psicológica tomada por
ele como referencial indispensável para fundamentar a prática
do professor, isto é, para fundamentar o ato de ensinar.
Ao definir o ensino como “u n i arranjo de contingên­
cias de reforçamento sob as q uais o comportamento
m uda", Skinner torna explícita su a postura teórica e poe
em destaque dois aspectos fundam entais do processo de en­
sino: o como ensinar (procedim entos de ensino) e o que en­
sinar (objetivos de ensino). As an álises feitas e as propostas
formuladas pelo autor em relação a esses dois aspectos
constituem parâm etros indispensáveis para equacionar a
questão da formação do professor.

Fo r m a r u m p r o f e sso r c a p a z de p l a n e ja r , e x e c u t a r e
AVALIAR PROCEDIMENTOS DE ENSINO

Ao propor como com petência do professor o plane-


- jam ento de procedimentos de ensino eficazes, sua im ple­
m entação e avaliação e ao defender a necessidade d e pre­
parar o professor para essa função, pelo ensino sistem ático
de princípios e conceitos da an álise com portam ental,
Skinner vem , a nosso ver, preencher um a lacuna q ue tem
sido observada na formação dos professores. O acesso às
mais diversas teorias da aprendizagem não tem sido con­
dição-suficiente para alterar a p rática do professor; e co­
n h ecer os princípios e conceitos fundam entais de tais teo­
rias não tem bastado para que o professor consiga trad u ­
zi-los em procedimentos de ensino eficazes. A descrição
feita por G attí (199 5) ilu stra o q u e estamos afirm ando:

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168 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Quantas vezes não ouvimos os professores, após um curso


em que se apresentou alguma teoria ou aspectos de teorias
da aprendizagem (Piaget, Vygotsky, Ferreiro, etc.), dizen­
do que compreenderam os aspectos da teoria em pauta,
mas que continuam a não saber o que fazer na sala de aula.
(...) Os acadêmicos podem estar encantados com o estudo
dos processos cognitivos, mas os professores e os futuros
professores estão sequiosos por saber o que fazer, como e
por que, em cada dia letivo, em sua escola, em sua disci­
plina. (p. 17)

Esse problem a tem sido reiteradam ente identificado


por pesquisadores e educadores como decorrência de um a
característica m arcante de cursos de formação de professo­
res: a dicotom ia teoria-prática.
N a busca de razões para explicar ta l dicotom ia, encon­
tramos em Luna um a análise que considerámos bastante
adequada. Em palestra realizada em 1996, afirm ou ele que:

A tradução de uma teoria qualquer em prática pedagógica,


não é simples, direta e, em muitos casos, nem sequer pre­
tendida, como é o caso típico da teoria piagetiana e dos es­
tudos de EmíLía Ferreiro. Supondo-se que a teoria seja mes­
mo funcional para a educação, o que os responsáveis dire­
tos pelo ensino precisam conhecer é quais são os princípios
desta teoria e de que forma eles podem se reverter em "pro­
cedimentos aplicáveis. O que lhes tem sido passado, de
modo geral, é ou o resumo da teoria ou, pior, procedimen­
tos dela derivados sob a forma de receitaSj que acabam vi­
rando fetiches. A questão é que para corrigir esta distorção

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ELEMENTOS PARA U M A PROPOSTA DE FORMAÇÃO 169

é necessário não apenas conhecer bem a teoria, como ter


uma visão clara do que ensinar, como ensinar e para quem
ensinar.

Acreditamos que a análise com portam ental do ensino,


ao enfati 2 ar a relação do indivíduo com o am biente e ao ex­
plicar por meio dos conceitos de com portam ento operante
e de contingências de reforçamento as m udanças cornpor-
tam entais do aluno, fornece um referencial teórico passível
de se “reverter em procedimentos fde ensino] aplicáveis” e dá
ao professor condições de identificar as ações necessárias para
levar o aluno a aprender, fornecendo, assim , elementos
p ara a superação da dicotom ia apontada.
Não se trata, entretanto, de sim plesm ente oferecer ao
professor, inclusive o formador de professores, um conjunto
de procedimentos de ensino. E necessário, ao contrário,
levá-lo a entender, pelo recurso à análise de contingências,
os fundam entos, possibilidades e lim ites de tais procedi­
m entos.
Conhecer o caráter tem porário do efeito do controle
aversivo na redução do com portam ento indesejado ou seus
graves subprodutos é u m exemplo de conhecim ento que a
análise com portam ental tem produzido sobre o com porta­
m ento hum ano e que pode trazer um a cotLtribuição rele­
van te ao professor em seu trabalho de ensinar.
N a mesma m edida, conhecer as características de um
procedim ento de m odelagem , os cuidados que requer em
sua execução e os efeitos que produz, exige que o professor
fique atento aos com portam entos do aluno e às sutis alte­
rações neles produzidas pela ação do professor ao reforçar
diferencialm ente as respostas do aluno, em direção ao com­

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170 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

portamento pretendido. Trata-se, pois, de formar um pro­


fessor que ap renda a pautar seu com portam ento em funçáo
do com portam ento de seu aluno.
U m professor conhecedor dos cuidados requeridos
pelo uso de instruções e modelos e ciente da necessidade de
elaborar procedim entos de ens.no em que os estímulos in­
dutores do com portam cnto do aluno, característicos de tais
procedimentos, sejam gradual e planejadam ente retirados
do am biente, é u m professor que precisa estar sob controle
do com portam ento do aluno e que pode, exatam ente pot
isso, ensinar de modo a formar alunos independentes de
modelos e instruções.
Finalm ente, um professor capaz de propor e executar
procedimentos de ensino que garantam a manutenção do
com portam ento do aluno, pelo planejam ento de contin­
gências de reforçamento em esquem as interm itentes, é um
professor que ad o ta um a postura de constante avaliação e
replanejam ento das contingências presentes na sala de aula,
em funçao dos efeitos que geram no comportam ento do
aluno.
São, pois, esses e outros procedimentos de ensino, de­
correntes dos princípios da análise com portam ental e a p li­
cáveis às diversas situações de ensino form ai, os que devem
ser adotados em cursos de formaçao de professores. A pos­
sibilidade de usá-los adequadam ente e s tá d i etam ente rela­
cionada ao conhecim ento de seus fundam entos exphcati os
e de seus Limites e à assunção de seu significado no contex­
to de um a análise mais glo b al do ensino e d a educaçao.
Preocupa-nos , por isso, que um autor como Schõn (1992),
que aparentem ente não parte dos mesmos pressupostos as -
su m d o s por Skinner, nem aceita os conceitos e procedi­
mentos da análise com portam ental ao se referrr à formaçao

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ELEMENTOS PAR A J R A PROPOSTA DE FÕRMÀÇÂÒ 171

continuada de professores, proponha o procedimento de


imitação como forma de o professor “praticar” suas ações
e aprender novos com portam entos. Um dos riscos da u ti­
lização in adequada do procedim ento de imitação, que não
tenhí. em conta uma análise de contingências, é levar a
uma generalização indevida do com portam ento de im itar.
C onsiderada à luz das condi ;ões sob as quais o professor
realiza seu trabalho, a generalização do com portam ento de
im itar pode contribu-r para a existência de professores cada
vez mais sem liciativa e sem autonom ia

Fo r m a r u m p r o f e sso r c a p a z de d e f in ir
OBJETIVOS DE ENSINO

Q uando atrib ui ao professor a funçao de planejar o en­


sino e de responder pela execução e avaliação do plano for-
■mulado, Skinner considera como tarefa fundam ental do
professor, nesse processo, a definição dos objetivos ie en­
sino em term os com portam entais T ais objetivos, segundo
o autor, devem se referir tanto aos conhecimentos a serem
-transm iti tos, quanto aos com portam entos precorrentes a
serem ensinados aos alunos, de m odo a formá-los para o
autogoverno.
H á que se assinalar, nao ob stan te, que as condições
sõb 35 o dais é formado e as contingências sob aí quais tra­
balha —como u m trabalhador alienado —têm im possibili­
tado ao professor realizar ta l ativ id ad e ou a têm tornado,
apenas, m ais um dos ritua.s por e le cum prido, sem saber
por que nem p a ra quê, ou por não d o m nar os conhecim en­
tos necessários ou por estar subm etido a mposiçoes dos
técnicos ou de outros profissionais d a hierarquia educacio­
nal. O professor perde, assim , um a oportunidade ím portan-

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172 FORMAÇAO DE PROFESSORES

te de tomar claro a sí mesmo, e até ao própno aluno, o que


se pretende ensinar e, em decorrência, de planejar proce­
dimentos de ensino eficazes e de estabelecer parâmetros em
relação aos quais avaliar e rever suas próprias ações de
modo a possibilitar ao aluno uma aprendizagem produtiva.
D uas condições parecem , pois, necessárias para que o
professor se prepare p ara o desempenho dessa função.
De um lado, o professor precisa ad q u ir.r, em sua for­
m ação, conheci nentos científicos atualizados e relevantes,
a partir dos quais deve selecionar os conteúdos , a serem
transm itidos aos alunos. Precisa, tam bém , adquirir conhe­
cimentos sobre o com portam ento hum ano, que o habilite
a planejar as contingências adequadas p ara ensinar tanto o
autogoverno quanto o conhecimento científico aos alunos.
M as a qualidade d a formação adquirida pelo professor e a
variedade do repertório com portam ental por ele aprendido,
em bora se constituam como condições necessárias para que
élè exècütè ãdeqüáciâiiíéri té süás funções, não são condições
suficientes
Um segundo tip o de condições é ain d a necessário. As
contingências que, n a situação de trabalho do professor,
têm dificultado q ue ele. efetivam ente, estab eleça e defina
os objetivos do ensino, precisam ser alterad as. A organiza­
ção do trabalho na escola nao pode continu ar reforçando e
m antendo professores que se com portam apenas seguindo
regras impostas, q u e não as uinem ó Còtit role de suas pró-
prirs ações e que não sabem o que e por que estão ensi­
nando determ inados assuntos. Mais do que saber descrever
as co n tiagên ciis, os professores precisam te r o poder de al­
tera las ou de exercer contracontrole em relação a elas. Pre­
cisam aprender, em seu processo de form ação, comporta­
m entos precorrentes q u e os preparem p a ra o autogoverno.

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/

ELEMENTOS PARA UMA PROPOSTA DE FO RM AÇÃO 173

Mais uma vez esramos considerando, na discussão


sobre a formação do professor, aspectos analisados por
Skinner ao discutir o ensino em geral. Do mesmo modo
que Skinner defende que o aluno precisa ser ensinado a
se com portar sob controle de contingências naturais remo­
tas, que ocorrerão no futuro, fora da escola, aprendendo
a não depender de um professor que lhe diga o que e
como fazer, o futuro -professor precisa, enquanto aluno de
cursos de formação,.ser tam bém assim preparado. Sua for­
mação será tão m elhor quanto m ais possibilitar a aquisi­
ção de um amplo e eficiente repertório de com portam en­
tos que o torne independente de u m outro indivíduo para
definir e controlar o que lhe com pete fazer, e que lhe g a ­
ranta a autonom ia necessária para se com portar de forma
nova e original, em situações futuras, quando não mais
estiver sendo formado.
Evidentemente; 'uma proposta desse teor supõe alte­
rações em contingências mais globais, que extrapolam os
lim ites da sala de aula e que envolvem não apenas o pro­
fessor individual, mas um conjunto diversificado de indi­
víduos cujas ãçÕes, explícita ou tacitam en te, interferem na
formação do professor e em seu trab alh o de ensinar.
É amplamente aceita, hoje, encre educadores e pesqui­
sadores da educação, a posição que afirma a impossibilidade
de equacionar as questões relativas à formação de professores
desvinculadas de condições adequadas de trabalho. A análise
comportamental do ensino aponta na m esm a direção.

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174 FORMAÇÃO DE PROFESSORES

A CONCEPÇÃO DE EDUCAÇAO COMO AGÊNCIA SOCIAL


DE CONTROLE E SUAS IMPLICAÇÕES
PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES

As propostas relativas ao papel do professor e as im ­


plicações que acarretam para a sua formação não podem ser
analisadas sem tom ar em conta um aspecto fundam ental da
análise skm neriana do ensino: sua concepção def educação
como agencia social de controle.
Em nossa interpretaçao, o trabalho do professor e,
conseqüentem ente, sua formação, tais como Skinner os
propoe, só têm sent do se considerados não apenas em sua
dim ensão técnica, m as, principalm ente, em sua dimensão
social. Essa dimensão social j i se explicita na definição de
educação como o estabelecim ento de com portam entos que
serão vantajosos, no futuro, para o indivíduo e o grupo so­
cial. É, poir,, a contr buição para a sobrevivência da espécie
e da c u ltu ra o c iterio fundam ental que perm ite avahar*a
reievancía social do trabalho educacional realizado.
A com petência do professor, ao selecionar e definir
com portam entos a serem em inados e ao planejar a-, contin­
gências m ais eficazes para que o aluno aprenda, não é ape­
nas técnica. G arantir a reievancía socinl do trabalho que
realiza requer que o professor —desde que adequadam ente
form i 1( ja ra isso — tom e eoi.io referência (ou fique sob
controle de) aquiio que antevê como perspectiva de futuro
para a sociedade. Ao fazê lo, o professor — agente funda­
m en tal d a instituição educaõ onal — pode contribuir, de
modo relevante, para o planejam ento de um futuro que au­
m ente as chances de sobrevivência da cultura. Nossa in ter­
pretação respalda-se na anál se feita por A ndery, que, to­
m ando como foco ; preocupação de Skinner com a cultura

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ELEMENTOS PA R A UM A PROPOSTA DE FORM AÇÃO 175

e a sociedade, vê na proposta do au to r para a organização


da cultura, um a m arca que denom ina impulso para o futuro.
Segundo essa autora,

(...) Skinner afirma não apenas um modelo selecionista que


aleatoriamente leva à sobrevivência de alguns, mas afirma
a possibilidade e a necessidade de se prever esta evolução
e nela interferir. É a isto que se resume, em certa medida,
o que aqui se convencionou chamar de um impulso para
o fututo. Não sç ttata de enfatizar o fututo segundo Um
modelo teleológico que prevê um a determinação inexorá­
vel e que busca encontrar nesta determinação as razões e
as alternativas de intervenção Não se ttata também de re­
viver modelos não deterministas que apoiam no acaso e na
chamada '.ivre escolha as possibilidades de intervenção, en­
fatizando tazões idealistas como alternativas de solução
para os problemas humanos. Trata-se, pelo contrário, de
resgatar um sujei, o determinado pelo ambiente —ca­
paz de conhecer os determinantes de sua açao e de assim
manipulá-los. (Andery, 1993, pp- 24-25)

É a educação, na perspectiva skinner:ana, q ue se cons­


titu i como um a agência privilegiada para preparar — pelo
eníino da ciência e do autogoverno — indivíduos capazes de
construir esse futuro. Sua eficácia no preparo de indivíduos
com petentes e autônomos p ara atu ar nas variadas instân­
cias d a realidade social está diretam en te relacionada à sua
eficácia em preparar, de m odo especial, aqueles que nela
perm anecerão para exercer aquela funçao.
O fundam ental papel so :ial da educação inviabiliza-se
quando os agentes que nela atuam náo conseguem exercer,
com com petência e autonom ia, sua funçao de ensinar. Con-

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176 FORM AÇÃO DE PROFESSORES

trolados por contingências que geram e mantêm repertó­


rios com portam entaís limitados e repetitivos, por contin­
gências coercitivas, por regras im postas arbitrariam ente ou
por regras construídas a parti* de saberes ideologizados, os
professores se m antêm desinformados, desatualizados e
afajtados dos conhecimentos que precisam adqu rir para
ensinar de modo eficiente e autônomo.
Instigados a responder, sobfe a formação requerida
para que os professores realizem um trabalho que, superan­
do as contingências presentes, tenha como marca o impulso
para c futuro, vemo-nos, novamente, diante do mesmo con­
junto de respostas. Não basta formar adequadam ente os
professores se as contingências sob as quais eles trabalham
os m antiverem — e a outros profissionais da educação —
como trabalhadores alienados. Mas é preciso formá-los ade­
quadam ente, inclusive para que interfiram e m udem as
contingências em vigor.
Formar adequadam ente um professor significa possi­
bilitar a ele o dom ínio do conhecim ento cientifico, ijto é,
dos saberes relativos às diferentes disciplinas que compõem
o currículo escolar de modo a que o professor adquira a
com petência necessária para ensinar a seui alunos aqueles
conhecimentos atuais e relevantes que possibilitam um a
açáo eficaz na realidade. Significa, tam bém , ensinar ao pro­
fessor os princípios que perm item compreender, de modo
rigoroso, o compòr\ ím éhto hum an e òs processos de e n ­
sino e aprendizagem , hal ilitando-o a planejar, executar e
avaliar um plano eficiente d e.ensino. Significa, finalm ente,
ensinar ao professor o autogoverno, levando-o.a adquirir e
m anter um repertório diversificado de comportamentos, a
superar as condições que o m antêm trab/.lhando de modo
mecânico e estereotipado e a construir a autonomia neces-

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BLKM ENTOS ['ARA LÍMA PROPOSTA DE FORM AÇAO 177

sá ria para realizar seu tiabalho sem precisar que lhe digam,
a cada semana de planejam ento, a cada reunião ou a cada
novo curso de formação, pelo resto de sua vida, o que deve
fazer na sala de aula.

i.
Éfr

s:

W
I

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