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E TI C A
I PRÁTICA
PETER SINGER
martins ~antes
seLo martins
ÉTICA PRÁTICA
ÉTICA PRÁTICA
Peter Singer
Tradução
] EFFERSON LUIZ CAMARGO
martins !="antes
seLo martins
© 2018 Martins Editora Livraria Ltda., São Paulo, para a presente edição.
© 2011 Cambridge Universiry Press.
Esta obra foi originalmente publicada em inglês sob o título Practical Ethics.
4• edição 2018
Introdução . ... .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. ... .. .. .. ... .. . ... ... .. .. ... . ... .. .. ... VII
Prefácio....................................................................... ... .. rx
1. Sobre a ética................................................................. 19
Sobre a ética
que os juízos éticos não são verdadeiros nem falsos, pois não
descrevem nada, nem os fatos morais objetivos nem os estados de
espírito subjetivos de alguém. Essa teoria poderia sustentar que
os juízos éticos exprimem atitudes em vez de descrevê-las, e di-
vergimos sobre a ética porque, ao expressarmos nossa atitude,
tentamos fazer nossos ouvintes adotarem uma atitude seme-
lhante. Essa ideia, desenvolvida por C. L. Stevenson, é conheci-
da como emotivismo. Ou talvez, como enfatizou R. M. Hare,
os juízos éticos sejam preceitos e, portanto, estejam mais estrei-
tamente ligados a ordens do que a enunciações de fatos. De
acordo com esse ponto de vista- Hare o chama de prescritivis-
mo universal, e vamos examiná-lo de perto mais adiante neste
capítulo -, discordamos porque nos preocupamos com o que as
pessoas fazem. Uma terceira opinião, defendida por J. L. Mackie,
admite que muitos aspectos da maneira como pensamos e discu-
timos a ética implicam a existência de padrões morais objetivos,
mas assevera que essas características de nossos raciocínios e ar-
gumentos nos levam a uma espécie de erro, talvez o legado da
crença de que a ética seja um sistema de leis dado por Deus, ou
talvez apenas mais um exemplo de nossa tendência a objetivar
nossas necessidades e preferências pessoais.
Desde que cuidadosamente distinguidas da forma crua de
subjetivismo que vê os juízos éticos como descrições das atitudes
de quem fala, são todas representações plausíveis da ética. Ao
negar uma esfera de fatos éticos que faça parte do mundo real,
existindo com total independência de nós mesmos, pode ser que
estejam corretas. Suponhamos que estejam: daí se segue que os
juízos éticos são imunes à crítica, que não há nenhum papel a
ser desempenhado pela razão ou pelo argumento na ética e que,
do ponto de vista da razão, um juízo ético é tão bom quanto
qualquer outro? Não creio que seja assim, e nenhum dos defen-
sores dessas posições, mencionados no parágrafo anterior, nega à
razão e ao argumento um papel na ética, ainda que não estejam
de acordo quanto à importância desse papel.
SOBRE A ÉTICA 29
que isso lhe permitiria compor ótima poesia. São esses os tipos
de argumentos que precisamos analisar para decidir qual é a
forma mais defensável de utilitarismo. Em seguida, também
temos de considerar argumentos contrários a qualquer tipo
de utilitarismo e a favor de teorias morais bem diferentes. No
entanto, trata-se de um assunto para outro livro.
Este livro pode ser entendido como uma tentativa de indi-
car de que maneira um utilitarista preferencial coerente lidaria
com uma série de problemas polêmicos. Apesar das dificuldades
mencionadas, o utilitarismo preferencial é uma teoria ética dire-
ta que exige pouquíssimos pressupostos metafísicos. Todos sabe-
mos o que são preferências, ao passo que a afirmação de que algo
seja intrínseca e moralmente errado, que viole um direito na-
tural ou seja contrário à dignidade humana recorre a conceitos
não tão palpáveis e que dificultam a verificação de sua validade.
Mas, já que o utilitarismo preferencial talvez não se revele, ao
fim e ao cabo, a melhor maneira de abordar os problemas éticos,
também levarei em consideração, em vários pontos, como o uti-
litarismo hedonista, as teorias dos direitos, da justiça, de regras
morais absolutas etc. se relacionam com os problemas discuti-
dos. Desse modo, os leitores poderão chegar às suas próprias
conclusões sobre os méritos relativos das abordagens éticas utili-
taristas e não utilitaristas e sobre o papel que a razão e o argu-
mento desempenham na ética.
2
A base da igualdade
O período que se seguiu ao fim da Segunda Guerra Mundial
tem testemunhado mudanças drásticas nas atitudes morais em
relação a questões como aborto, sexo fora do casamento, homos-
sexualidade, pornografia, eutanásia e suicídio. Por maiores que
tenham sido essas mudanças, não se chegou a nenhum consenso
novo. As questões continuaram polêmicas, e pontos de vista
tradicionais ainda têm defensores respeitados.
Com a igualdade parece ocorrer algo diferente. A mudan-
ça de atitude em relação à desigualdade- sobretudo a desigual-
dade racial - não foi menos súbita e dramática que a mudança
de atitude perante o sexo, mas foi mais completa. As ideias ra-
cistas compartilhadas pela maior parte dos europeus no começo
do século xx tornaram-se inteiramente inaceitáveis, ao menos
na vida pública. Hoje, um poeta não poderia escrever sobre
"raças inferiores à margem da lei" e conservar - quando não
melhorar - sua reputação, como Rudyard Kipling, em 1897.
Isso não significa que os racistas tenham deixado de existir,
apenas que devem disfarçar seu racismo caso pretendam que
seus pontos de vista e planos de ação tenham alguma possibili-
dade de aceitação geral. O princípio de que todos os seres hu-
manos são iguais hoje faz parte da ortodoxia ético-política
predominante. Mas o que isso significa exatamente, e por qual
motivo conta com nossa aceitação?
40 ÉTICA PRÁTICA
por que nossa sociedade- e não somente a nossa, mas quase todas
as sociedades humanas - costuma formar as crianças assim.
Segundo uma resposta conhecida, nas sociedades mais primi-
tivas e mais simples, os sexos desempenhavam papéis diferentes
porque as mulheres precisavam amamentar os filhos durante o
longo período que antecede sua emancipação. Isso significa que
as mulheres ficavam mais ligadas à casa, enquanto os homens
saíam para caçar. O resultado foi que as ·m ulheres desenvolveram
um caráter mais social e emocional, ao mesmo tempo em que os
homens ficaram mais duros e agressivos. Como a força física e a
agressividade eram as principais formas de poder nessas socieda-
des simples, os homens tornaram-se dominantes. Segundo esse
ponto de vista, os papéis sexuais que hoje existem constituem
um legado dessas circunstâncias mais simples, um legado que se
tornou obsoleto a partir do momento em que a tecnologia possi-
bilitou à mais frágil das pessoas operar um guindaste que ergue
cinquenta toneladas ou lançar um míssil que mata milhões. As
mulheres tampouco precisam ficar presas à casa e aos filhos do
jeito que costumavam ficar, pois hoje elas podem harmonizar a
maternidade com o desenvolvimento de uma carreira.
O ponto de vista alternativo afirma que, embora o condicio-
namento social tenha um papel na determinação das diferenças
psicológicas entre os sexos, os fatores biológicos também atuam
nesse sentido. Esse ponto de vista foi reforçado por um estudo
no qual mostravam a bebês de apenas um dia de vida o rosto de
uma pessoa viva ou um móbile mecânico. As meninas passavam
mais tempo olhando para o rosto; os meninos, para o móbile.
Além disso, as preferências das meninas pelas bonecas e dos
meninos pelos caminhões de brinquedo também valem, como já
se demonstrou, para os macacos-verdes! Não é de se admirar que
os pais continuem a dar aos filhos os brinquedos que as criánças
mais desejam e com os quais mais provavelmente brincarão.
Os indícios de que as diferenças sexuais quanto à agressivi-
dade têm uma base biológica foi resumida por Eleanor Maccoby
60 ÉTICA PRÁTICA
Ação afirmativa
A seção anterior sugere que a passagem para uma sociedade
mais igualitária, na qual as diferenças de renda sejam reduzidas,
é tão eticamente desejável quanto de difícil concretização. Não
sendo possível instituir maior igualdade salarial, poderíamos
ao menos tentar garantir que mulheres e minorias raciais ou
étnicas não levassem a pior onde existem importantes diferenças
de renda, status e poder em medida desproporcional à repre-
sentação demográfica dessas pessoas na comunidade como um
todo. As desigualdades entre membros do mesmo grupo étnico
podem não ser mais justificáveis do que aquelas que se verificam
entre grupos étnicos ou entre homens e mulheres; mas, quando
essas desigualdades coincidem com uma diferença óbvia entre
pessoas, como as diferenças entre afro-americanos e norte-
-americanos de origem europeia ou entre homens e mulheres,
elas contribuem mais para produzir uma sociedade dividida,
com um sentimento geral de superioridade, de um lado, e um
sentimento de inferioridade, de outro. Portanto, as desigualda-
des racial e sexual podem ter um efeito mais desagregador do
que outras formas de desigualdade. Também podem contri-
buir mais para criar um sentimento de desesperança entre os
membros do grupo inferiorizado, pois seu sexo ou sua raça não é
fruto de suas ações, e não há nada que possam fazer para mudar
esse estado de coisas.
De que modo se pode chegar à igualdade racial e sexual
em uma sociedade não igualitária? Vimos que a igualdade de
oportunidades é praticamente irrealizável e, se fosse possível
concretizá-la, talvez ainda permitisse que diferenças inatas de
72 ÉTICA PRÁTICA
Racismo e especismo
No capítulo anterior, ofereci motivos para acreditar que o
princípio fu ndamental da igualdade, no qual se baseia a ideia
da igualdade de todos os seres humanos, é o princípio da igual
consideração de interesses. Só um princípio moral básico como
esse nos permite defender uma forma de igualdade que inclua
quase todos os seres humanos, apesar de todas as diferenças que
existem entre si (as exceções são os seres humanos que não são
nem nunca foram conscientes e, portanto, não têm interesses
a serem levados em consideração, um tema a ser discutido nos
Capítulos 6 e 7). Ao mesmo tempo que o princípio da igual
consideração de interesses proporciona o melhor fundamento
possível para a igualdade humana, sua abrangência não se limita
aos seres humanos. Ao aceitarmos o princípio de igualdade para
os seres humanos, também nos comprometemos a aceitar que
ele se estende a alguns animais não humanos.
Quando redigi a primeira edição deste livro, em 1979,
alertei o leitor de que a sugestão que eu faria nesta seção poderia
parecer bizarra. Na época, aceitava-se, em geral, que a discri-
minação contra membros de minorias raciais ou contra mulhe-
res se encontrava entre as mais importantes questões morais e
políticas. Mas as questões que diziam respeito ao bem-estar dos
animais eram amplamente consideradas desimportantes, a não
ser pelas pessoas loucas por cães e gatos. Era comum presumir
86 ÉTICA PRÁTICA
O especismo na prática
Algumas objeções
Em 1973, apresentei pela primeira vez os pontos de vista
esboçados neste capítulo. Naquela época, não existia nenhum
movimento de libertação ou de direitos dos animais. Hoje existe,
e o trabalho árduo de incontáveis ativistas foi recompensado,
não só pela maior conscientização das pessoas em relação aos
maus tratos dispensados aos animais, mas também pelos benefí-
cios concretos obtidos em nome dos animais em vários campos.
A despeito dessa crescente aceitação de muitos aspectos do
argumento pela igual consideração dos interesses dos animais
e do avanço lento, mas palpável que já se fez em nome de seu
bem-estar em várias áreas, algumas objeções ainda são levanta-
das. Nesta última parte do capítulo, tentarei responder às mais
importantes dessas objeções.
Os animais comem uns aos outros, por que não deveríamos comê-los?
Esta poderia ser chamada de "Objeção de Benjamin Franklin".
Em sua autobiografia, Franklin conta que foi vegetariano durante
algum tempo, mas que sua abstinência de carne chegou ao fim
quando se pôs a observar amigos preparando-se para fritar um
peixe que tinham acabado de pescar. Quando o peixe foi aberto,
descobriu-se que havia um peixe menor em seu estômago.
"Bem", disse Franklin de si para si, "já que vocês comem uns aos
outros, não vejo por que deixaríamos de comê-los". Desde então,
voltou a comer carne.
Franklin, pelo menos, foi honesto. Ao contar essa história,
confessou que só se deixou convencer da validade da objeção
depois que o peixe já estava na frigideira e exalando um "aroma
delicioso". Observou, também, que uma das vantagens de ser
uma "criatura racional" está no fato de se poder encontrar uma
razão para tudo que se quer fazer. As respostas que podem ser
dadas a essa objeção são tão óbvias que sua aceitação, por parte
de Franklin, é um testemunho mais da fome que ele sentia na
IGUALDADE PARA OS ANIMAIS? 103
Ética e reciprocidade
Na mais antiga obra de filosofia moral que a tradição
ocidental nos legou, a República, de Platão, encontramos a
seguinte concepção da ética:
Defesa do especismo
Diante da objeção de que sua posição nos daria o direito de
tratar os seres humanos portadores de graves deficiências mentais
da maneira como hoje tratamos os animais não humanos, alguns
filósofos voltam a defender o especismo, seja porque ele tem valor
instrumental ou, no caso dos mais ousados, porque pertencer a
uma espécie seria, por si só, moralmente significativo.
A defesa instrumental do especismo recorre ao argumento
bastante difundido da "ladeira escorregadia". Alega-se que dar um
primeiro passo em certa direção nos colocaria numa ladeira escor-
regadia e não conseguiríamos evitar a queda num abismo moral.
No presente contexto, o argumento é usado para sugerir que pre-
cisamos de uma linha nítida para separar os seres com os quais
podemos fazer experiências ou que podemos engordar para comer
daqueles com os quais não podemos fazer essas coisas. A separação
entre as espécies estabelece uma linha divisória bem nítida, ao pas-
so que isso não acontece com os níveis de consciência, autonomia
ou senciência. Ainda segundo o argumento, se admitirmos que um
ser humano, por maior que seja sua deficiência mental, não tem
um status moral superior ao de um animal, já estaremos deslizando
por uma ladeira, o próximo passo seria negar direitos aos desajus-
tados sociais, e o fundo do poço seria classificar como sub-huma-
nos e eliminar todos de quem não gostamos.
Em resposta ao argumento da ladeira escorregadia, é impor-
tante lembrar que o objetivo de minha argumentação é elevar o
status dos animais, e não rebaixar o dos seres humanos. Não é
minha intenção sugerir que os deficientes mentais devam ser
forçados a ingerir corantes alimentares até adoecerem ou morre-
rem - ainda que, sem dúvida, no que diz respeito a saber se a
substância é ou não segura para os seres humanos, esse procedi-
mento nos daria indicações mais precisas do que se o teste fosse
112 ÉTICA PRATICA
eles obrigações que não temos com quem não é humano como
"nós". Esse argumento contorna a questão de quem considera-
mos que sejamos nós. Somos basicamente membros da espécie
H omo sapiens, seres basicamente conscientes ou, quem sabe, seres
basicamente sencientes? Pessoalmente, minha impressão é de
que um alienígena inteligente com quem eu pudesse comunicar-
-me e dividir sentimentos teria mais em comum comigo do que
um membro de minha própria espécie que porta uma deficiência
tão grave a ponto de ser incapaz de ter experiências conscientes,
mesmo que este se pareça muito mais comigo.
É compreensível que os seres humanos que se parecem
conosco evoquem sentimentos ternos que os alienígenas ou alguns
outros animais não evocam. No entanto, seria um erro vincu-
lar a moralidade tão intimamente às nossas afeições. É claro
que algumas pessoas podem manter, com o ser humano mais
gravemente afligido por uma deficiência mental, um relaciona-
mento mais estreito do que manteriam com qualquer animal
não humano, e seria absurdo lhes dizer que não deveriam se
sentir assim. Elas simplesmente têm esses sentimentos e não há
neles nada de bom ou mau. A questão é saber se nossas obriga-
ções morais para com um ser deveriam depender de nossos
sentimentos dessa maneira. É público e notório que alguns seres
humanos se relacionam melhor com seu gato que com seus
vizinhos. Quem associa a moralidade às afeições aceitaria que
essas pessoas estão certas quando, durante um incêndio, tentam
primeiro salvar seus gatos, e só depois os vizinhos? E, creio eu,
mesmo aqueles que estão preparados para dar uma resposta
afirmativa a essa pergunta, não desejariam concordar com os
racistas, que poderiam argumentar que, se os indivíduos mantêm
relações mais estreitas com outras pessoas que têm a mesma cor
de pele ou tipo de cabelo, e por elas sentem maior afeição, não é
errado que eles deem preferência aos interesses dessas pessoas. A
ética não exige que eliminemos as relações pessoais e as afeições
parciais, mas exige que, em nossas ações, levemos em conta as
IGUALDADE PARA OS ANIMAIS? 115
A vida humana
As pessoas costumam dizer que a vida é sagrada, o que,
quase sempre, não passa de força de expressão. Não querem
dizer, como suas palavras parecem indicar, que todas as formas
de vida são sagradas. Se quisessem, considerariam igualmente
abominável matar um porco, arrancar um repolho ou assassinar
118 ÉTICA PRATICA
tes dessa pessoa. Matar uma lesma não frustra nenhum desejo
desse tipo, pois as lesmas são incapazes de tê-los (nesse quesito,
porém, os fetos e até os recém-nascidos humanos encontram-se
na mesma situação das lesmas. As implicações serão exploradas
num capítulo subsequente).
Há que se admitir que, quando uma pessoa é morta, não
nos sobra um desejo frustrado no mesmo sentido em que tenho
um desejo frustrado quando, ao perambular por um lugar seco,
paro para matar minha sede e descubro que meu cantil está
furado. Nesse caso, tenho um desejo que não posso satisfazer e
sinto frustração e desconforto devido ao desejo contínuo e não
saciado de beber água. Quando sou morto, os desejos que tenho
para o futuro não continuam depois de minha morte e não sofro
por deixar de concretizá-los. Mas isso implica que impedir a
satisfação desses desejos não tem importância?
O utilitarismo clássico ou hedonista, como já destacamos,
julga as ações por sua tendência a maximizar o prazer ou a feli-
cidade e minimizar o sofrimento ou a infelicidade. Termos
como "prazer" e "felicidade" carecem de precisão, mas fica claro
que remetem a algo que se vivenda ou se sente: em outras pala-
vras, a estados de consciência. Portanto, de acordo com o utili-
tarismo hedonista, não há uma importância direta no fato de os
desejos para o futuro ficarem por concretizar quando as pessoas
morrem. Quando se morre instantaneamente, o fato de se ter ou
não desejos para o futuro é indiferente no que concerne à quan-
tidade de prazer ou sofrimento que se experimenta. Portanto,
para o utilitarismo hedonista, o status de "pessoa" não é direta-
mente relevante para o erro de matar.
Indiretamente, porém, a condição de pessoa pode ser
importante para o utilitarista hedonista. Essa importância
surge da seguinte maneira: se sou uma pessoa, sei que tenho
um futuro. Sei também que minha existência futura pode ser
interrompida. Se eu achar que isso pode acontecer a qualquer
momento, minha existência presente será cheia de ansiedade e,
provavelmente, menos agradável do que seria se eu não pensasse
126 ÉTICA PRATICA
por sua vez, fazem uma avaliação mais sombria de suas possi-
bilidades de viver até a idade madura ou ficam com medo de
serem assassinadas. Claro que é possível que uma pessoa venha
a ser morta em completo segredo, de tal modo que ninguém
venha a saber que um crime foi cometido. Nesse caso, essa razão
indireta e contrária ao assassinato não se aplicaria.
Deve-se, porém, introduzir uma ressalva a essa última
consideração. Nas circunstâncias descritas no parágrafo anterior,
a razão utilitarista indireta e contrária ao assassinato não se aplica-
ria se julgássemos esse caso individual. Há algo a ser dito, porém,
contra a aplicação do utilitarismo - seja o hedonista clássico ou
o preferencial- exclusiva ou basicamente a cada caso individual.
Pode ser que, em longo prazo, cheguemos a melhores resultados
- uma maior felicidade geral- se instarmos com as pessoas para
que não julguem cada ato individual com o critério de utilidade,
mas que, em vez disso, pensem em termos de princípios mais
amplos que venham a abranger todas, ou virtualmente todas,
as situações com as quais se deparem.
Várias razões têm sido oferecidas em defesa dessa aborda-
gem. R. M. Hare sugeriu uma proveitosa distinção entre dois
planos de raciocínio moral: o intuitivo e o crítico. Considerar
as possíveis circunstâncias nas quais se poderia maximizar a
utilidade matando em segredo alguém que deseja continuar
vivendo é raciocinar no plano crítico. As pessoas propensas a
refletir, fazer autocrítica ou filosofar talvez descubram ser útil
e interessante pensar nesses casos incomuns e hipotéticos. Na
vida real, em geral não somos capazes de prever todas as comple-
xidades de nossas escolhas. Simplesmente não é prático tentar
calcular, com antecedência, todas as consequências de todas as
opções que fazemos. Mesmo que nos restringíssemos às opções
mais significativas, haveria o perigo de que, em muitos casos,
fizéssemos esses cálculos complicados em circunstâncias nem
um pouco ideais. Poderíamos estar apressados ou perturbados,
furiosos, magoados ou dominados pelo espírito de competição.
Nossos pensamentos talvez estivessem distorcidos pela ganância,
128 ÉTICA PRÁTICA
nossas vidas são algo a que temos direito, e direitos não devem
ser permutados pelas preferências ou os prazeres de terceiros.
Não estou convencido de que a ideia de um direito moral
seja útil ou importante, salvo quando usada como uma forma
simbólica de remeter a considerações morais de cunho mais
fundamental, por exemplo, a concepção de que - pelas razões
oferecidas na seção anterior -, em todas as circunstâncias
normais, é melhor tirarmos completamente da cabeça a ideia de
matar pessoas que querem continuar vivas. Não obstante, como
a ideia de que temos um "direito à vida" é bastante popular,
vale a pena perguntar se existem fundamentos para se atribuir o
direito à vida às pessoas, e não a outros seres vivos.
Michael Tooley, um filósofo norte-americano contempo-
râneo, afirmou que os únicos seres que têm direito à vida são
aqueles capazes de se conceber como entidades distintas que
existem no tempo - em outras palavras, como pessoas, o termo
por nós usado. O argumento de Tooley se baseia na afirmação
de que existiria uma ligação conceitual entre os desejos que um
ser é capaz de ter e os direitos que se pode dizer que tenha.
Como diz Tooley:
Vida consciente
Existem muitos seres que são sencientes e capazes de sentir
dor e prazer, mas que, não sendo também racionais e autocons-
cientes, não são pessoas. Vou referir-me a eles como "seres mera-
mente conscientes". Se muitos animais não humanos pertencem
a essa categoria, o mesmo deve ser dito de bebês recém-nascidos
e de alguns seres humanos com deficiências mentais. Quais de-
les carecem exatamente de autoconsciência é uma questão que
vamos abordar nos capítulos seguintes. Se Tooley tiver razão, não
se poderá dizer que os seres aos quais falta a consciência de si
tenham direito à vida, no sentido pleno da expressão, mas pode-
ria ser errado matá-los por outros motivos. Nesta seção, pergun-
taremos se é errado tirar a vida de um ser meramente consciente
e, se assim for, por quais motivos.
O QUE HÁ DE ERRADO EM MATAR? 137
fazer isso seria pôr mais crianças no mundo, desde que tivésse-
mos uma expectativa razoável de que levariam vidas agradáveis,
ou criar grandes quantidades de animais em condições que lhes
assegurassem uma existência agradável. Mas seria realmente
bom criar mais prazer pela criação de seres mais satisfeitos?
Parece haver duas abordagens possíveis para essas ques-
tões desconcertantes. A primeira delas consiste, simplesmente,
em admitir que seja bom aumentar a quantidade de prazer no
mundo pelo aumento do número de vidas agradáveis, e que seja
ruim reduzir a quantidade de prazer no mundo pela diminuição
do número de vidas agradáveis. Esse ponto de vista tem a vanta-
gem de ser direto e claramente coerente, mas exige que admita-
mos que, se pudéssemos aumentar o número de seres que levam
vidas agradáveis sem piorar a situação de outros, seria bom que
o fizéssemos. Para saber se essa conclusão incomoda, talvez seja
útil examinar um caso específico. Imagine que um casal esteja
tentando decidir se vai ou não ter filhos. Suponha que, no que
diz respeito à felicidade desse casal, as vantagens e desvantagens
se anulem. Os filhos interfeririam em suas carreiras num mo-
mento crucial de suas vidas profissionais e, pelo menos durante
alguns anos, eles teriam de abrir mão de seu passatempo favori-
to, o excursionismo. Por outro lado, como boa parte dos pais,
eles sabem que ter filhos e vê-los crescer traria alegria e satisfa-
ção. Suponha que, se outras pessoas fossem afetadas, os efeitos
benéficos e nocivos também se anulariam. Por último, suponha
que, já que o casal tenha condições de dar aos filhos uma boa
educação, e que estes vão crescer como cidadãos de um país de-
senvolvido, cujo povo desfruta de um excelente padrão de vida,
é provável que as crianças venham a ter vidas agradáveis. O casal
deveria incluir o provável prazer que seus filhos teriam no futu-
ro entre as razões importantes para tê-los? Duvido que muitos
casais assim procedessem, mas, se aceitarmos essa primeira
abordagem, é o que deveriam fazer.
Chamarei essa abordagem de ponto de vista "total", pois, de
acordo com ela, deveríamos ter como objetivo aumentar a quanti-
O QUE HÁ DE ERRADO EM MATAR? 141
ser aberta com sua própria chave, que estava dentro de uma
quarta caixa fechada. Por fim, diante de Júlia havia duas caixas
iniciais, abertas e contendo, cada uma, uma chave específica.
Júlia foi capaz de escolher a chave inicial correta, com a qual
pôde abrir a caixa seguinte da série que levava, finalmente,
à caixa com a banana. Para fazer isso, ela deve ter raciocinado
de trás para frente, partindo de seu desejo de abrir a caixa com a
banana, passando para a necessidade de ter a chave que abriria
essa caixa, e depois para a chave que abriria a caixa onde estava
a outra chave, e assim por diante. Uma vez que Júlia não tinha
aprendido nenhuma forma de linguagem, seu comportamento
vem provar que os seres desprovidos de linguagem podem
pensar em moldes bastante complexos.
Não é só em experiências de laboratório que o compor-
tamento dos animais aponta para a conclusão de que eles
têm memória do passado e expectativas quanto ao futuro,
que têm consciência de si, que articulam intenções e agem de
modo a concretizá-las. Durante muitos anos, Frans de Waal
e seus colegas observaram chimpanzés que viviam em condi-
ções seminaturais em pouco mais de 8 mil metros quadra-
dos de floresta no Zoológico de Arnhem, Holanda. Tiveram,
muitas vezes, a oportunidade de observar atividades coopera-
tivas que exigiam planejamento. Por exemplo, os chimpanzés
gostavam de subir nas árvores e quebrar os galhos para comer
as folhas. Para impedir a rápida destruição da pequena floresta,
os guardas do zoológico colocaram cercas elétricas ao redor dos
troncos das árvores. Os chimpanzés superaram esse obstáculo
quebrando grandes galhos de árvores mortas (que não tinham
cercas em volta) e arrastando-os até a base de uma árvore viva.
Um chimpanzé, então, segurava o galho seco enquanto outro
subia por ele, passava por cima da cerca e chegava à árvore.
O chimpanzé que chegava à arvore dividia as folhas recolhidas
com o outro que ficara segurando o galho.
De Waal também observou um comportamento delibera-
damente enganador que revela, de modo inequívoco, a existência
TIRARA VIDA: OS ANIMAIS 155
Conclusões
Se os argumentos apresentados neste capítulo são corre-
tos, não existe uma única resposta à pergunta: "É normalmente
errado tirar a vida de um animal?". O termo "animal"- mesmo
no sentido restrito de "animal não humano" - abrange uma
diversidade de vidas cuja multiplicidade é ampla demais para
que um princípio possa se aplicar a todas elas.
Alguns animais não humanos parecem conceber a si
mesmos como seres distintos que têm um passado e um futuro,
o que nos dá uma razão direta para não matá-los, uma razão
cuja força varia na mesma medida em que o animal seja capaz
de ter desejos para o futuro. Quanto mais passamos a conhe-
cer as faculdades intelectuais de animais não humanos, mais
aumenta a quantidade de espécies às quais se pode aplicar essa
razão contrária ao abate. Há vinte anos, podíamos atribuir com
segurança a autoconsciência apenas aos primatas hominoides.
Hoje podemos incluir nessa lista não só elefantes e golfinhos,
mas também algumas aves. É difícil saber o que novas pesquisas
acabarão revelando. Devemos, portanto, conceder o benefício
da dúvida a macacos, cães, gatos, porcos, focas, ursos, vacas,
carneiros etc., e talvez até mesmo às aves e aos peixes: depende
muito de até que ponto estamos dispostos a estender o benefício
da dúvida nos casos em que a dúvida existe. Nossa discussão
colocou um enorme ponto de interrogação diante da justificabi-
lidade de um grande número de assassinatos de animais pratica-
186 ÉTICA PRÁTICA
O problema
Nos últimos quarenta anos, poucas questões éticas foram
objeto de uma discussão tão acirrada quanto o aborto, e nenhum
dos lados conseguiu modificar as opiniões de seus adversários.
Até 1967, o aborto era ilegal em quase todas as democracias
ocidentais, com exceção da Suécia e da Dinamarca. Em seguida,
a Grã-Bretanha alterou a legislação e passou a permitir o aborto
com base em premissas sociais abrangentes e, no caso Roe contra
Wade, de 1973, o Supremo Tribunal Federal dos Estados Unidos
admitiu que as mulheres têm o direito constitucional de abortar
nos primeiros seis meses de gravidez. Presidentes conservadores
alteraram a composição do Supremo Tribunal, mas este, até o
momento, continuou defendendo o âmago da jurisprudência
estabelecida pela decisão do caso Roe contra Wade e, ao mesmo
tempo, permitiu que os estados da federação restringissem o
acesso ao aborto com diversas medidas de pequeno impacto.
Nas últimas décadas, os países europeus, inclusive os católi-
cos apostólicos romanos, como a Itália, a Espanha e a França,
liberalizaram suas leis relativas ao aborto. Hoje, até mesmo a
Irlanda e a Polônia permitem o aborto em algumas circunstân-
cias. No mundo todo, apenas alguns países, principalmente os
da América Latina, proíbem totalmente o aborto.
Em 1978, o nascimento de Louise Brown - o primeiro
ser humano a nascer de um óvulo fertilizado fora de um corpo
192 ÉTICA PRATICA
Nascimento
É a mais visível das possíveis linhas divisórias e a que melhor
se ajusta à argumentação liberal. Até certo ponto, ajusta-se melhor
também aos nossos sentimentos: ficamos menos perturbados com
a destruição de um feto que nunca vimos do que com a morte de
um ser que todos podemos ver, ouvir e acariciar. No entanto, será
que isso é suficiente para transformar o nascimento na linha que
decide se um ser pode ou não ser morto? Os conservadores podem
perfeitamente responder que o feto/bebê é a mesma entidade tanto
dentro quanto fora do útero, que tem as mesmas características
humanas (possamos vê-las ou não), o mesmo grau de consciência
e a mesma capacidade de sentir dor. Sob esses aspectos, um bebê
prematuro pode muito bem ser menos desenvolvido do que um
feto que se aproxima do fim da gestação normal. Parece estra-
nho admitir que não podemos matar o bebê prematuro, mas que
podemos matar o feto mais desenvolvido. A localização de um ser
- dentro ou fora do útero - não deveria fazer tanta diferença em
relação ao erro que seria matá-lo.
196 ÉTICA PRÁTICA
Viabilidade
Se o nascimento não assinala uma distinção moral decisiva,
será que deveríamos recuar a linha divisória ao tempo em que
o feto poderia sobreviver fora do útero? Isso supera uma das
objeções em tomar o nascimento como o ponto decisivo, pois
trata igualmente o feto viável e o bebê prematuro no mesmo
estágio de desenvolvimento. Foi na viabilidade que o Supremo
Tribunal dos Estados Unidos buscou a linha divisória no caso Roe
contra Wade. O tribunal sustentou que o Estado tem o interesse
legítimo em proteger a vida em potencial e que esse interesse
se torna "inexorável" na questão da viabilidade, "pois, então,
supõe-se que o feto tenha a capacidade de levar uma vida signifi-
cativa fora do útero materno". Segundo o tribunal, portanto, as
leis norte-americanas que proíbem o aborto com base na viabili-
dade não são inconstitucionais. Mas os ministros que redigiram
o voto do pleno não indicaram por que a mera capacidade de
existir fora do útero deva fazer tanta diferença para o interesse
do Estado em proteger a vida em potencial. Afinal, se falamos
(como fez o tribunal), em vida humana em potencial, então o
feto inviável pode ser considerado um ser humano adulto em
potencial tanto quanto o feto viável (já retomarei essa questão
da potencialidade, mas trata-se de uma questão diferente do
argumento conservador que no momento estamos discutindo,
segundo o qual o feto já é um ser humano, e não apenas um ser
humano em potencial).
Há outra objeção importante ao se tomar a viabilidade
como o ponto de separação. O ponto em que o feto pode sobre-
viver fora do corpo da mãe varia conforme o estado da tecnologia
médica. Até o desenvolvimento de métodos modernos de terapia
intensiva, em geral se aceitava que um bebê nascido mais de dois
meses prematuro não tinha condições de sobreviver. Hoje, um
feto de seis meses - prematuro de três meses - consegue sobre-
viver, graças à sofisticação da tecnologia médica, conhecendo-se
casos de sobrevivência de fetos nascidos aos cinco meses e meio
de gestação.
TIRAR A VIDA: O EMBRIÃO E O FETO 197
Consciência
Na medida em que constitui um indicador de alguma
forma de consciência, poderíamos pensar no movimento como
algo dotado de uma importância moral indireta - e, como já
vimos, a consciência e a capacidade de sentir prazer ou dor têm
TIRAR A VIDA: O EMBRIÃO E O FETO 199
Um argumento feminista
O último dos três argumentos que procuram justificar
o aborto sem negar que o feto é um ser humano inocente é
o de que uma mulher tem o direito de escolher o que acontece
com seu próprio corpo. Esse argumento adquiriu notoriedade
com a ascensão do movimento feminista na década de 1970 e
foi aperfeiçoado por filósofos(as) norte-americanos(as) simpá-
ticos(as) ao feminismo. Um argumento influente foi apresen-
tado por Judith Jarvis Thomson em uma engenhosa analogia.
Imagine, diz ela, que um dia você acorda pela manhã e descobre
que está num leito de hospital, ligado de alguma forma a um
homem que se encontra inconsciente numa cama ao lado da sua.
Você é informado de que esse homem é um famoso violinista
com uma doença renal. Ele só poderá sobreviver se seu sistema
circulatório for ligado ao de uma pessoa que tenha o mesmo tipo
204 ÉTICA PRÁTICA
elevado não pode ser motivo para que se faça objeção a todos os
abortos ou aos abortos praticados simplesmente porque a gravi-
dez é inoportuna.
Suponhamos que uma mulher não veja a hora de partici-
par de uma expedição de alpinistas ao Himalaia em junho -
o alpinismo é uma de suas paixões, e essa expedição é uma
oportunidade rara de escalar montanhas de uma região que ela
nunca visitou -, mas, em janeiro, fica sabendo que está grávida
há dois meses. Ela e o companheiro conversaram muitas vezes
sobre o tipo de família que queriam ter, e os dois gostariam
de ter dois filhos nos próximos cinco anos. A gravidez só é
indesejada por ter ocorrido num momento inoportuno. Nessas
circunstâncias, os adversários do aborto provavelmente o veriam
como particularmente afrontoso, pois não estão em jogo nem
a vida nem a saúde da mãe, apenas o prazer que ela tem em
escalar montanhas. Contudo, se o aborto só é errado por privar
o mundo de uma futura pessoa, esse aborto em questão não é
errado, pois nada mais faz do que retardar a chegada de mais
uma pessoa ao mundo.
Por outro lado, repudiar o aborto porque impede seres de
elevado valor intrínseco de vir ao mundo é condenar, implici-
tamente, práticas que reduzem a futura população humana:
a contracepção, tanto por meios "artificiais" quanto pelos
"naturais", como a abstinência nos dias em que a mulher prova-
velmente está fértil e também o celibato. Esse argumento não
oferece nenhuma razão para se julgar o aborto pior do que
quaisquer outros meios de controle da população. Se o mundo
já está superpovoado, o argumento não oferece absolutamente
nenhuma razão para sermos contrários ao aborto.
O fato de termos no feto uma pessoa em potencial tem
alguma outra relevância? Paul Ramsey, ex-professor de religião
na Universidade de Princeton, escreveu que, ao nos ensinar que
a primeira fusão de espermatozoide e óvulo cria uma partícula
informacional "que nunca se repetirá", a genética moderna
nos leva à conclusão de que "toda destruição da vida fetal deve
TIRARA VIDA: O EMBRIÃO E O FETO 215
momento até por volta do 14° dia após a fertilização. Quando temos
um embrião anterior a esse ponto, não podemos saber ao certo
se o que estamos vendo é o precursor de um ou mais indivíduos.
Isso apresenta um problema para aqueles que enfatizam a
continuidade de nossa existência desde a concepção até a vida
adulta. Suponhamos que temos um embrião dentro de um
recipiente sobre a bancada de um laboratório. Se pensarmos nesse
embrião como o primeiro estágio de um ser humano individual,
poderíamos chamá-lo de Mary. Mas suponhamos, agora, que o
embrião se divide em dois. Um deles ainda é Mary, e o outro,
Jane? Se assim for, qual dos dois é Mary? Não existe nada que
os diferencie, não há como dizer que o que chamamos de Jane
se tenha separado do que chamamos de Mary, e não vice-versa.
Portanto, deveríamos dizer que Mary já não está entre nós, mas
que, em vez disso, estamos diante de Jane e Helen? Mas o que
foi que aconteceu com Mary? Morreu? Devemos lamentar sua
morte? David Oderberg, que tenta defender o ponto de vista
de que o ser humano adulto é exatamente o mesmo indiví-
duo que o zigoto ou embrião a partir do qual se desenvolveu,
sugeriu que poderíamos lamentar devidamente a perda de Mary,
mas, por sabermos tão pouco a seu respeito, está claro que não
o faríamos da mesma maneira que choramos por alguém que
conhecíamos bem. O pesar implica que há alguma coisa que
nos deixa tristes, e é difícil enxergar o que poderia causar tristeza
na formação de gêmeos ... a menos, é claro, que não quiséssemos
suportar o fardo de ter dois bebês ao mesmo tempo. A menos
que tivéssemos algum motivo para querer que o amontoado de
células que chamávamos de Mary realizasse seu potencial como
Mary, e não como Jane e Helen, que razão há para lamentar
o ocorrido um pouquinho que seja? Na verdade, agora vemos
que dar ao amontoado de células o nome de "Mary" já é supor
que se trata de um indivíduo específico, e talvez seja isso o que
nos permita pensar que ocorre a perda lamentável de um indiví-
duo. Se pensarmos na coisa como um amontoado de células,
sendo ainda desconhecida a quantidade de indivíduos que dali
TIRAR A VIDA: O EMBRIÃO E O FETO 223
Aborto e infanticídio
Permanece uma importante objeção ao argumento que
apresentei em favor do aborto. Já vimos que a força da posição
conservadora está na dificuldade de os liberais demonstrarem
a existência de uma linha divisória moralmente significativa
entre um embrião e um bebê recém-nascido. A clássica postura
liberal deve ser capaz de mostrar onde se situa essa linha, pois os
liberais costumam afirmar que é permissível matar um feto ou
embrião, mas não um bebê. Afirmei que a vida de um feto
(e, mais claramente ainda, a de um embrião) não tem mais valor
que a vida de um animal num estágio semelhante de raciona-
lidade, autoconsciência, capacidade de sentir etc., e que, não
sendo uma pessoa, nenhum feto tem o mesmo direito à vida
que uma pessoa. Ora, é preciso admitir que esses argumentos
aplicam-se tanto ao bebê recém-nascido quanto ao feto. Um
bebê de uma semana não é um ser racional e consciente de si,
e existem muitos animais cuja racionalidade, autoconsciência,
capacidade de sentir etc. são muito mais desenvolvidas do que
os mesmos atributos como os encontramos num bebê de uma
semana ou um mês de idade. Se, pelas razões que apresentei,
o feto não tem o mesmo direito à vida que uma pessoa, parece
que o bebê recém-nascido tampouco o tem. Assim, embora
TIRARA VIDA: O EMBRIÃO E O FETO 231
minha posição sobre o status da vida fetal possa ser aceitável para
muitas pessoas, as implicações dessa posição quanto ao status
da vida recém-nascida estão em desacordo com o pressuposto
virtualmente incontestado de que a vida de um bebê recém-
-nascido é tão sacrossanta quanto a de um adulto. Na verdade,
algumas pessoas parecem pensar que a vida de um bebê é mais
preciosa do que a de um adulto. Histórias medonhas de solda-
dos alemães enfiando suas baionetas em bebês belgas apareciam
com grande destaque na onda de propaganda antiteutônica que
acompanhou a entrada da Grã-Bretanha na Primeira Guerra
Mundial, e aparentemente presumia-se de maneira tácita que
essa atrocidade era pior que o assassinato de adultos.
Não vejo o conflito entre a posição que assumi e as ideias
muito difundidas sobre a santidade da vida do bebê como um
motivo que justifique o abandono de minha posição. Quando
raciocinamos em termos éticos, não devemos hesitar em contes-
tar ideias éticas quase universalmente aceitas se temos motivos
para achar que talvez não estejam tão bem fundadas quanto
parecem. É verdade que os bebês nos encantam por serem peque-
nos e indefesos, e, sem dúvida, existem boas razões de natureza
evolutiva para que instintivamente nos sintamos inclinados a
protegê-los. Também é verdade que os bebês não podem ser
combatentes, e matá-los em tempo de guerra é o mais gritante
caso de assassinato de civis, proibido por convenção interna-
cional. Em geral, como os bebês são indefesos e moralmente
incapazes de cometer um crime, faltam a quem os matam as
desculpas comumente oferecidas para o assassinato de adultos.
Nada disso mostra, porém, que a morte de um bebê seja uma
coisa tão perversa quanto a de um adulto (inocente).
Tentando chegar a um juízo ético ponderado a respeito
dessa questão, devemos deixar de lado os sentimentos baseados
na aparência indefesa, diminuta e- às vezes- graciosa dos bebês
humanos. Pensar que as vidas dos bebês têm um valor especial
porque eles são pequenos e engraçadinhos equivale a pensar que
232 ÉTICA PRÁTICA
Eutanásia voluntária
Eutanásia voluntária é a eutanásia praticada mediante
um pedido espontâneo da pessoa a ser morta que, ao fazer
esse pedido, precisa estar em pleno exercício de suas faculda-
des mentais e ter todas as informações necessárias. A eutaná-
sia pode ser voluntária mesmo quando a pessoa deixa de ter o
exercício pleno de suas faculdades mentais até o momento de
sua morte, pois ela poderia ter expresso sua vontade por escrito
quando ainda tinha saúde, especificando as condições nas quais
gostaria de morrer, caso se visse privada de suas faculdades
mentais. Ao matarmos alguém que fez tal pedido, reafirmou-o
diversas vezes e se encontra agora numa das condições descritas,
podemos perfeitamente alegar que agimos com o consentimento
de quem foi morto; portanto, seria eutanásia voluntária.
Na Holanda, uma série de processos judiciais na década
de 1980 assegurou a um médico o direito de ajudar um de seus
pacientes a morrer. Os tribunais não fizeram distinção entre
prescrever ao paciente uma dose letal de um medicamento e
aplicar no paciente uma injeção letal. Na verdade, a maioria dos
médicos holandeses prefere presenciar a morte do paciente, para
garantir que tudo corra bem. Além disso, alguns pacientes não
conseguem engolir ou manter no estômago uma dose considerá-
vel de medicamento, por isso, a preferência costuma ser a aplica-
ção de injeções.
Em 2002, o parlamento holandês legalizou a eutanásia
voluntária desde que os médicos observem certas diretrizes (que
serão descritas mais adiante neste capítulo). A Bélgica fez a mesma
coisa naquele mesmo ano. Em 2008, Luxemburgo tornou-se o
terceiro país do mundo a legalizar a eutanásia voluntária.
TIRAR A VIDA: HUMANOS 241
Eutanásia involuntária
Considero a eutanásia involuntária quando a pessoa morta
tem condições de consentir com a própria morte, mas não o faz,
seja porque não lhe perguntaram ou porque, se perguntaram,
ela optou por continuar vivendo. Admito que essa definição
engloba dois casos diferentes numa mesma categoria. Há uma
diferença significativa entre matar alguém que prefere conti-
nuar vivo e matar alguém que não consentiu em ser morto, mas
que, se perguntado, teria dado seu consentimento. Na prática,
porém, é difícil imaginar casos em que uma pessoa é capaz de
consentir e teria consentido se perguntada, mas não lhe foi feita
a pergunta. Afinal, por que não perguntar? Somente nas situa-
ções mais bizarras é que se poderia pensar num motivo para não
obter o consentimento de uma pessoa ao mesmo tempo capaz e
desejosa de concordar com a própria morte.
Matar alguém que não consentiu em ser morto só pode
ser apropriadamente visto como eutanásia quando o motivo de
quem mata é o desejo de poupar a pessoa de um sofrimento
intolerável. Sem dúvida, é estranho que alguém agindo com essa
motivação venha a desprezar os desejos da pessoa em cujo nome
e benefício a ação é praticada. Os casos autênticos de eutanásia
involuntária parecem ser muito raros.
Ricos e pobres
uma renda que, depois de prover nossas necessidades, nos deixasse um excedenre
para dar aos omros. Assim, se hoje ganho, digamos, 100 mil dólares por ano, mas
isso exige que eu gaste 30 mil dólares anuais para viver num bairro mais caro do
que talvez me coubesse, não poderia salvar mais pessoas ao me mudar para uma
área rural de baixo custo de vida se, para isso, eu tiver de aceitar um emprego que
só me pague 60 mil dólares por ano.
RICOS E POBRES 293
A obrigação de ajudar
renda da qual podemos abrir mão sem, com isso, nos privarmos
das necessidades básicas da vida, e podemos usar essa renda para
diminuir a pobreza absoluta. O quanto nos sentimos obriga-
dos a doar depende daquilo que julgamos ser de importância
moral comparável à pobreza que podemos evitar: roupas e janta-
res caros, um aparelho de som sofisticado, férias no exterior,
um carro de luxo, uma casa maior, escolas particulares para
nossos filhos ... Para um utilitarista, é provável que nada disso
tenha uma importância comparável à diminuição da pobreza
absoluta, e o não utilitarista - caso seja a favor do princípio da
universalizabilidade - certamente deve admitir que pelo menos
algumas dessas coisas têm uma importância moral muito menor
do que a pobreza absoluta que poderia ser evitada com o dinheiro
que custam. Portanto, a terceira premissa parece ser verdadeira
com base em qualquer concepção ética plausível, ainda que a
quantidade exata de pobreza absoluta que possa ser evitada antes
que qualquer coisa de importância moral seja sacrificada varie
conforme a concepção ética aceita.
Objeções ao argumento
Direitos de propriedade
Será que as pessoas têm direito à propriedade privada, um
direito que contradiz o ponto de vista de que seriam obrigadas a
dar uma parte de sua riqueza aos que vivem na pobreza absoluta?
De acordo com algumas teorias dos direitos, contanto que alguém
306 ÉTICA PRÁTICA
Mudanças climáticas
Responsabilidade histórica
Ao tratar da questão da justiça na distribuição em seu
livro Anarchy, State and Utopia [Anarquia, estado e utopia], o
filósofo Robert Nozick fez uma distinção proveitosa entre princí-
pios "históricos" e "de resultado final". Um princípio histórico
é aquele que afirma: para entender se determinada distribuição
de bens é justa ou injusta, temos de perguntar como a distribui-
ção ocorreu; temos de conhecer sua história. As partes interessa-
das têm direito - estabelecido por uma aquisição originalmente
justificável e uma cadeia de transferências legítimas - ao que
hoje possuem? Se assim for, então a distribuição atual seria justa.
Caso contrário, uma retificação ou reparação seria necessária para
produzir uma distribuição justa. Por outro lado, um princípio de
resultado final simplesmente examina a distribuição que já existe,
neste exato instante, e pergunta, com base nisso, se ela é justa.
Um princípio histórico, muitas vezes aplicado no caso da
poluição, é o do "quebrou, conserte", também conhecido como
MUDANÇAS CLIMATICAS 329
Quotas equitativas
Em uma reunião sobre mudanças climáticas da Cúpula das
Nações Unidas, o presidente de Ruanda, Paul Kagame, desta-
cou que as mudanças climáticas provavelmente terão um impac-
to mais forte na África que em qualquer outra parte do mundo.
E, no entanto, a África tem menos recursos para enfrentar essa
dificuldade. Muitos modelos das mudanças que o aquecimento
global provavelmente trará mostram que a precipitação dimi-
nuirá mais nas proximidades do equador e aumentará perto dos
polos. A chuva de que centenas de milhões de pessoas precisam
para cultivar seu alimento passará a ser cada vez menos confiá-
vel. Além disso, as nações mais pobres dependem da agricultura
muito mais do que as ricas. Nos Estados Unidos, a agricultura
representa apenas 4% da economia; em Malauí, é 40%, e 90%
dos malauianos são agricultores de subsistência; praticamente
todos eles dependem das chuvas. Padrões semelhantes de depen-
dência da lavoura e das chuvas são comuns em todo o continen-
te africano.
Também é obviamente verdadeiro que às nações mais
pobres faltam os recursos para se adaptar. No sul da Austrá-
lia, quando vários estados se viram diante de uma tendência de
longo prazo de declínio na precipitação, os governos construí-
ram caras usinas de dessalinização para garantir que as grandes
cidades não ficassem sem água. Nos Países Baixos, o governo
erigiu diques para conter a elevação do nível do mar e está proje-
tando casas anfíbias capazes de acompanhar as cheias fluviais e
flutuar, sem perder a ancoragem. Outros países não têm como
arcar com esses métodos caros de fornecer água e controlar
inundações provocadas pela elevação do nível do mar.
334 ÉTICA PRATICA
ética e lei para uma idade coletiva], e sugere o que ele chama de
Princípio da Cumplicidade:
O meio ambiente
A tradição ocidental
As atitudes ocidentais diante da natureza brotaram de uma
mistura daquelas defendidas pelos hebreus, da maneira como
são apresentadas nos primeiros livros da Bíblia, e da filosofia da
Grécia Antiga, principalmente a de Aristóteles. Em contraste
com outras tradições da Antiguidade, por exemplo, as da Índia,
as tradições hebraicas e gregas fizeram do homem o centro do
O MEIO AMBIENTE 355
As plantas existem para o bem dos animais, e estes, por sua vez,
existem para o bem do homem - os animais domésticos para o
seu uso e alimento, e os selvagens (ou seja, a maior parte deles)
para fornecer alimento e outros acessórios necessários à vida,
como as roupas e inúmeras ferramentas.
O MEIO AMBIENTE 357
Uma vez que a natureza não faz nada sem propósito ou em vão,
é inegavelmente verdadeiro que ela fez todos os animais para o
bem do homem.
As futuras gerações
Uma floresta virgem é o produto de todos os milhões de
anos que se passaram desde o início da vida em nosso planeta.
Se ela for derrubada, outra floresta pode crescer em seu lugar,
mas a continuidade seria interrompida. O rompimento dos
ciclos naturais da vida das plantas e dos animais significa que
a floresta jamais será como teria sido se não fosse derrubada.
As vantagens decorrentes da derrubada da floresta - empre-
gos, lucros comerciais, ganhos de exportação, papel e papelão
mais baratos para as embalagens - são vantagens a curto prazo.
Mesmo que a floresta não seja derrubada, mas inundada para a
construção de uma represa que gere eletricidade, é provável que
os benefícios só perdurem por uma ou duas gerações; depois
disso, uma nova tecnologia tornará esses métodos de geração de
energia obsoletos. No entanto, uma vez que a floresta é derru-
bada ou inundada, sua ligação com o passado estará perdida
para sempre. Esse é um custo com o qual terão de arcar todas
as gerações que nos sucederem neste planeta. É por isso que os
ambientalistas estão certos quando se referem às florestas como
uma "herança mundial". É uma coisa que herdamos de nossos
ancestrais e que nós devemos preservar para os nossos descen-
dentes, se quisermos que eles não sejam privados dela.
O MEIO AMBIENTE 359
Ecologia profunda
Há mais de sessenta anos, o ecologista norte-americano
Aldo Leopold escreveu que uma "nova ética" se fazia necessá-
ria, uma "ética que tratasse da relação do homem com a terra,
os animais e as plantas que nela vivem". A sua "ética da terra"
ampliaria "as fronteiras da comunidade de modo a incluir o
solo, a água, as plantas e os animais, ou, coletivamente falando,
a terra". O aumento das preocupações ecológicas na década
de 1970 levou a uma renovação do interesse por essa atitude.
O filósofo norueguês Arne Naess escreveu um artigo breve, mas
importante, em que estabeleceu uma distinção entre as tendên-
cias "superficiais" e "profundas" que se verificam no movimento
ecológico. O pensamento ecológico superficial estaria circuns-
crito à estrutura moral tradicional; seus partidários estariam
ansiosos por evitar a poluição da água para que pudéssemos
beber uma água mais pura e, na base de seu empenho em
preservar a natureza para que as pessoas pudessem continuar
caminhando por ela. Por outro lado, os ecologistas profundos
desejariam preservar a integridade da biosfera pela necessidade
dessa preservação, ou seja, independentemente dos possíveis
benefícios que o fato de a preservar pudesse trazer para os seres
humanos. Em seguida, vários outros autores tentaram desenvol-
ver alguma forma de teoria ambiental "profunda".
Nos casos em que a ética do respeito pela vida enfatiza os
organismos vivos individuais, as propostas de uma ética da eco-
logia profunda tendem a assumir algo maior do que o objetivo
372 ÉTICA PRÁTICA
Desobediência civil,
violência e terrorismo
mas não infringem a lei para tentar pôr fim a essas atividades.
Sem dúvida, alguns membros das organizações mais conven-
cionais que defendem a conservação da natureza, a libertação
dos animais e a proibição do aborto não cometem atos ilegais
porque não querem ser multados nem presos; outros, porém,
mostram-se dispostos a assumir as consequências da prática de
atos ilegais. Só não o fazem porque respeitam e acatam a autori-
dade moral da lei.
Quem está certo quanto a essa divergência ética? Teremos
alguma obrigação moral de obedecer à lei quando ela protege
e sanciona coisas que consideramos profundamente erradas?
Uma resposta clara a essa pergunta foi dada pelo radical norte-
-americano do século xrx, Henry Thoreau. Em seu ensaio
intitulado "Civil Disobedience" [Desobediência civil] - talvez o
primeiro uso dessa expressão que hoje se tornou tão corrente -,
ele escreveu:
A lei e a ordem
Se achamos que uma prática está muito errada e se temos
a coragem e a capacidade de romper com essa prática mediante
a infração da lei, de que modo a ilegalidade dessa ação poderia
oferecer um motivo ético para não cometê-la? Para responder a
uma pergunta tão específica quanto essa, devemos, primeiro,
fazer outra, mais geral: por que precisamos de leis?
Os seres humanos são sociais por natureza, mas não tão
sociais a ponto de não precisarmos nos proteger do risco de
sermos agredidos ou mortos por nossos iguais. Poderíamos tentar
fazer isso mediante a formação de organizações justiceiras que
388 ÉTICA PRÁTICA
Democracia
A esta altura, alguns dirão: a diferença entre os feitos heroi-
cos de Oskar Schindler e os atos ilegais indefensáveis da Frente
de Libertação dos Animais, de Joan Andrews, dos adversários da
390 ÉTICA PRATICA
Violência e terrorismo
Como vimos, a desobediência civil usada como meio de
chamar a atenção da população ou de convencer a maioria a
reconsiderar suas opiniões é muito mais fácil de justificar do que
a desobediência cuja finalidade seja coagir a maioria. A violência
é, obviamente, ainda mais difícil de defender. Alguns chegam
a afirmar que o uso de violência como meio, sobretudo a violência
contra pessoas, nunca pode ser justificado, por mais importante
que seja o fim.
A oposição ao uso de violência pode ser feita com base
numa regra absoluta ou numa avaliação de suas consequências.
Os pacifistas costumam ver o uso de violência como absoluta-
mente errado, a despeito de suas consequências. Essa proibição,
bem como outras do tipo "não importa o quê", admite a validade
da distinção entre atos e omissões. Sem essa distinção, os pacifis-
tas, que recusam o uso de violência quando ela for o único meio
de impedir uma violência ainda maior, seriam responsáveis pelo
recrudescimento da violência que resultou de sua omissão.
Suponhamos que temos a oportunidade de assassinar um
tirano que mata sistematicamente as pessoas que ele descon-
fie serem da oposição. Sabemos que, se o tirano morrer, muito
provavelmente será substituído por um conhecido líder oposicio-
nista que, no momento, se encontra exilado, mas que, ao voltar,
restabelecerá o Estado de direito. Se dissermos que a violência
é sempre um erro e nos recusarmos a executar esse assassinato,
não deveremos arcar com uma parte da responsabilidade pelos
futuros assassinatos cometidos pelo tirano?
Se são bem fundadas as objeções à distinção entre atos e
omissões que apresentamos no Capítulo 7, aqueles que não recor-
rem à violência para impedir uma violência maior têm de assumir
a responsabilidade pela violência que poderiam ter evitado.
Assim, a rejeição da distinção entre atos e omissões estabelece
uma diferença crucial para a discussão da violência, pois abre a
porta para um argumento plausível em defesa da violência.
402 ÉTICA PRÁTICA
Compreender a questão
"Por que devo agir moralmente?" é um tipo de pergunta
diferente daquelas que temos discutido. Perguntas como "Por
que devo tratar as pessoas de grupos étnicos diferentes em igual-
dade de condições?" ou "Por que o aborto é justificável?" são
feitas em busca de razões éticas para se agir de determinada
maneira. São perguntas que pertencem à esfera da ética e que
pressupõem um ponto de vista ético. "Por que devo agir moral-
mente?" situa-se em outro nível. Não é uma questão que parte
da ética, mas uma questão sobre a ética.
"Por que devo agir moralmente?" é, portanto, uma pergunta
a respeito de algo normalmente pressuposto. Essas perguntas são
desconcertantes. Alguns filósofos acham essa pergunta específica
tão desconcertante que a rejeitam como logicamente inadequada,
como uma tentativa de perguntar uma coisa que não pode ser
perguntada adequadamente.
Uma das bases dessa rejeição é a afirmação de que nossos
princípios éticos são, por definição, os princípios que assumi-
mos como fundamentalmente importantes. Isso significa que,
sejam quais forem os princípios fundamentais para determi-
nada pessoa, eles representam, necessariamente, seus princípios
éticos, e uma pessoa que aceite como princípio ético o dever
de doar dinheiro para ajudar os pobres já decidiu, por defini-
ção, doar seu dinheiro. Segundo essa definição da ética, uma
vez que a pessoa tome uma decisão ética, é impossível que se
coloque qualquer outra questão de ordem prática. Portanto, é
impossível conferir qualquer sentido à pergunta "Por que devo
agir moralmente?".
Poder-se-ia ver como uma boa razão para aceitar a definição
de ética como fundamental o fato de que ela nos permite rejeitar,
como desprovida de sentido, uma questão que de outra forma
seria embaraçosa. Adotar essa definição não nos ajuda, porém, a
resolver problemas concretos, pois ela causa dificuldades ainda
maiores para a determinação de uma conclusão ética. Tomemos,
por exemplo, a conclusão de que os ricos devem ajudar os pobres.
POR QUE AGIR MORALMENTE 411
Razão e ética
Há uma antiga corrente de pensamento filosófico que tenta
demonstrar que agir racionalmente é o mesmo que agir etica-
mente. Hoje, o argumento é associado a Kant, sendo encontrado
em especial nos escritos dos kantianos modernos, muito embora
remonte aos estoicos. A forma em que o argumento é apresen-
tado varia, mas a estrutura comum tende a ser a seguinte:
414 ÉTICA PRATICA
Logo:
Prefácio
Mais detalhes a respeito dos protestos que se ergueram contra as
opiniões manifestadas neste livro podem ser encontrados em "On Being
Silenced in Germany", The New York Review of Books, 15 de agosto de
1991; e Peter Singer, "An lntellectual Autobiography", em Jeffrey Schaler
(org.), Peter Singer Under Fire (Chicago, 2009).
A recomendaçáo para náo comparar seres humanos e animais foi
extraída de Ethische Grundaussagen [Fundamentos da ética], do Conselho
da Associaçáo Federal Lebenshilfe für geistig Behinderte e.V., publicado
na revista da associaçáo, Geistige Behinderung, 29, 4, 1990, p. 256.
A defesa que Bentham faz dos animais foi extraída de seu livro
Introduction to the Principies ofMorals and Legislation (1789), cap. xvm,
seção 1, nota.
Uma descrição mais pormenorizada das condições das modernas
fazendas industriais pode ser encontrada em Animal Liberation, cap. 3,
em Michael Pollan, The Omnivore's Dilemma (Nova York, 2006), cap.
17; e em Peter Singer e Jim Mason, The Ethics of What We Eat (Nova
York, 2006). De maneira similar, Animal Liberation, cap. 2, traz uma
discussão mais abrangente do uso de animais em pesquisas do que
aquela que pudemos apresentar neste livro; veja-se também Victims of
Science (Fontwell, Sussex, 1983, 2' ed.), de Richard Ryder. Os detalhes a
respeito da experiência com botox pode ser encontrada em <http://www.
hsus.org>. As experiências de isolamento de macacos, feitas por H. F.
Harlow, foram originalmente publicadas em Journal of Comparative and
Physiological Psychology, vol. 78 (1972), p. 202; Proceedings of the Natio-
nal Academy of Sciences, vol. 54 (1965), p. 90; e Engineering and Science,
vol. 33 (abril de 1970), p. 8. A respeito da continuidade do trabalho de
Harlow, veja-se Animal Liberation, 2' ed., p. 34-5.
A fonte da anedota sobre Benjamin Franklin é sua Autobiography
(Nova York, 1950). A mesma objeção foi mais seriamente examinada por
John Benson em "Duty and the Beast", Philosophy, vol. 53 (1978), p. 545-7.
Na seção "Ética e reciprocidade", a citação da República de Platão foi
extraída do livro 11, p. 358-9. Entre as declarações posteriores que expres-
sam um ponto de vista semelhante, temos: John Rawls, A Theory of]ustice
(Oxford, 1972; edição revisada, 1999); J. L. Mackie, Ethics, cap. 5; e David
Gauthier, Morals by Agreement (Oxford, 1986). Esses autores excluem os
animais do centro da moralidade, ainda que atenuem o impacto dessa
exclusão de diversas maneiras (veja-se, por exemplo, A Theory of]ustice,
p. 512, e Ethics, p. 193-5). Minha abordagem da versão mais flexível do
ponto de vista da reciprocidade se baseia em Edward Johnson, Species
and Morality, tese de doutorado, Princeton University, 1976 (University
Microfilms International, Ann Harbor, Michigan, 1981), p. 145.
Uma interpretação de uma concepção contratual da ética muito
mais favorável aos animais encontra-se em Mark Rowlands, Animal Rights:
Moral Theory and Practice (Londres, 2009, 2' ed.).
Na seção "Diferenças entre seres humanos e animais", as obser-
vações de Jane Goodall a respeito dos chimpanzés são relatadas com
simpatia em In The Shadow ofMan (Boston, 1971) e Through a Window
(Londres, 1990), e num formato mais acadêmico em The Chimpanzees of
Gombe (Cambridge, Massachusetts, 1986). Mais informações a respeito
das capacidades dos primatas hominoides podem ser encontradas em
442 ÉTICA PRÁTICA
Paola Cavalieri e Peter Singer (org.), The GreatApe Project (Londres, 1993).
A respeito do status moral relativo de animais e pessoas portadoras de defi-
ciências mentais graves, veja-se Peter Singer, "Speciesism and Moral Status",
e Eva Feder Kittay, "The Personal is Philosophical is Political: a Philoso-
pher and Mother of a Cognitively Disabled Person Sends Notes from the
Bartlefield", ambos em Eva Feder Kitray e Licia Carlson (org.), Cognitive
Disability and Its Challenge to Moral Philosophy (Malden, Massachusetts,
2010), p. 331-44 e p. 393-413.
Entre as objeções ao argumento discutido na seção "Defesa do
especismo", a afirmação de que deveríamos dar aos indivíduos o status
moral correspondente às qualidades que são normais para sua espécie é
de autoria de Stanley Benn e encontra-se em "Egalitarianism and Equal
Consideration of Interests", em J. Pennock e J. Chapman (org.), Nomos
ix: Equality (Nova York, 1967), p. 62ff; o argumento de que temos
obrigações especiais para com os seres humanos porque pensamos em
nós mesmos como humanos é de autoria de John Benson e encontra-
-se em "Duty and the Beast", Philosophy, vol. 53 (1978); os argumentos
relacionados foram apresentados por Bonnie Sreinbock, "Speciesism and
the Idea of Equality", Philosophy, vol. 53, p. 255-6 e, em maior exten-
são, por Leslie Pickering Francis e Richard Norman, "Some Animais Are
More Equal Than Others", Philosophy, vol. 53 (1978), p. 518-27. Bernard
Williams defende "The Human Prejudice" num ensaio com esse mesmo
título, republicado em Jeffrey Schaler (org.), Peter Singer Under Fire
(Chicago, 2009). No mesmo volume, encontra-se uma resposta minha e
mais pormenorizada.
demonstra que os porcos evitam apontar aos porcos mais fortes onde
está a comida é de autoria de S. Held, M. Mendl, C. Devereux e R. W.
Byrne: "Foraging Pigs A! ter Their Behavior in Response to Exploitation",
Animal Behaviour, voi 64 (2002), p. 157-66. Mathias Osvath descreveu
suas observações a respeito do chimpanzé que atirava pedras, Santino, em
"Spontaneous Planning for Future Stone Throwing by a Male Chimpan-
zee", Current Biology, vol. 19 (2009), p. R190-l. As extraordinárias facul-
dades mentais do gaio californiano foram demonstradas em Sérgio P. C.
Correia, Anthony Dickinson e Nicola S. Clayton, "Western Scrub-Jays
Anticipate Future Needs Independently o f Their Current Motivational
State", Current Biology, vol. 17 (2007), p. 856-61. A respeito desse tema
em geral, veja-se Michael Mendl e Elizabeth S. Paul, "Do Animais Live
in the Present? Current evidence and implications for welfare", Applied
Animal Behaviour Science, vol. 113 (2008), p. 357-82.
A autoconsciência nos animais e os testes diante do espelho são discu-
tidos em vários ensaios, entre eles: M. Bekoff, C. Allen e G. Burghardt
(org.), The Cognitive Animal: Empírica/ and Theoretical Perspectives on
Animal Cognition (Cambridge, Massachusens, 2002). Irene Pepperberg
descreve seu trabalho com Alex, o papagaio, em Alex and Me (Nova York,
2008). A capacidade das galinhas de exercer autocontrole são descritas
em S. M. Abeyesinghe, C. J. Nicol, S. J. Hartnell e C. M. Wathes, "Can
Domestic Fowl, Gallus gallus domesticus, Show Self-Control?", Animal
Behavior, vol. 70 (2005), p. 1-11. Culum Brown discute a vida mental dos
peixes em "Not Just a Pretty Face", New Scientist, 182 (12 de junho de
2004), p. 42. A respeito do uso inovador de ferramentas por polvos, veja-se
Julian K. Finn, Tom Tregenza e Mark Norman, "Defensive Tool Use in
a Coconur-Carrying Ocropus", Current Biology, 19 (2009), p. Rl069-70.
Mais informações a respeito da concepção de Gary Varner de que há
uma diferença entre uma pessoa, uma quase pessoa e um ser meramente
consciente encontram-se em seu livro, Personhood and Animais in the
Two-Level Utilitarianism of R. M. Hare (Nova York, no prelo). Roger
Scruton escreve a respeito da morte e de quando ela é ou não uma tragé-
dia em seu ensaio "The Conscientious Carnivore", em Food for Thought,
organizado por Sreve Sapontzis (Amhersr, Nova York, 2004), p. 81-91.
A afirmação de Leslie Srephen de que comer toucinho é uma
bondade para com os porcos vem de sua obra Social Rights and Duties
(Londres, 1896), citada por Henry Sair em "The Logic of rhe Larder",
publicado em The Humanities of Diet (Manchesrer, 1914), do próprio Sair,
e reimpresso na primeira edição de T. Regan e P. Singer (org.), Animal
Rights and Human Obligations (Englewood Cliffs, Nova Jersey, 1976).
Novas formulações do argumento podem ser encontradas em Michael
446 ÉTICA PRÁTICA
usados a cada ciclo (já que a maioria das gestações tem como resultado apenas
uma criança). Essas mesmas cifras, no caso da Grã-Bretanha, podem ser
encontradas no site da Human Fertilisation and Embryology Authority,
disponível em: <http://www.hfea.gov.uk/ivf-figures-2006.html#1276>.
No caso do estado australiano de Victoria, veja-se Victorian Assisted
Reproductive Treatment Authority, Annual Report, 2009, disponível em
<http://www.varta.org.au/www/257/1003057/displayanicle/1003573.htmb.
O tranquilizador comentário de Bentham sobre o infanticídio
foi extraído de seu livro Theory of Legislation, p. 264, e é citado por E.
Westermarck em The Origin and Development of Moral Ideas (Londres,
1924), I, p. 413n. Na úlrima parte de Abortion and lnfanticide, Michael
Tooley discute os indícios disponíveis a respeito do desenvolvimento, no
bebê, da percepção de ser um eu contínuo. Sobre esse assunto, veja-se
também Alison Gopnik, The Philosophical Baby (Nova York, 2009).
Material histórico sobre a predominância do infanticídio pode ser
encontrado em Maria Piers, Infanticide (Nova York, 1978), e W. L. Langer,
"lnfanticide: A Historical Survey", History ofChildhood Quarterly, vol. 1
(1974). Uma pesquisa mais antiga- ainda assim valiosa- pode ser encon-
trada em Edward Westermarck, The Origin and Development of Moral
Ideas, I, p. 394-413. Um interessante estudo do uso do infanticídio como
forma de planejamento familiar está em Thomas C. Smith, Nakahara:
Family Farming and Popu!ation in a ]apanese Vil/age, I7I7-1830. As
referências às concepções de Platão e Aristóteles sobre o assumo foram
apresentadas nas notas ao Capítulo 4. Com relação a Sêneca, veja-se De
ira, r, 15, citado por Westermarck em The Origin and Development of
Moral Ideas, I, p. 419. Infanticide and the Value ofLife (Buffalo, Nova York,
1978), organizado por Marvin Kohl, é uma coletânea de ensaios sobre o
infanticídio. Um fone argumento sobre as razões para as políticas públi-
cas defenderem o nascimento como o momento em que deve ser rraçada
a linha divisória pode ser encontrado (para os que leem em alemão) em
Norbert Hoerster, "Kindstotung und das Lebensrecht von Personen",
Analyse & Kritik, vol. 12 (1990), p. 226-44.
Entre os artigos que exibem alguma afinidade com a posição que
assumi, temos: Michael Tooley, ''Abortion and lnfamicide", Philosophy and
Public Affairs, vol. 2 (1972); Mary Anne Warren, "The Moral and Legal
Status of Abortion", The Monist, vol. 57 (1973); e R. M. Hare, ''Abortion
and the Golden Rule", Philosophy and Public Affairs, vol. 4 (1975).
Suma teológica, li, ii, questão 66, artigo 7. Thomas Pogge argumenta que
somos responsáveis por provocar ou manter a pobreza em seu livro World
Hunger and Human Rights (Cambridge, 2002).
Quanto à eficácia da ajuda internacional, vejam-se <www.GiveWell.
org> e minha discussão do tema em The Life You Can Save (Nova York,
2009), cap. 6.
Garrett Hardin propôs sua "ética do barco salva-vidas" em "Living
on a Lifeboat", Bioscience, out. 1974, da qual outra versão foi publicada
em W. Aiken e H. LaFollette (org.), World Hunger and Moral Obliga-
tion (Englewood Cliffs, Nova Jersey, 1977). Hardin aprofunda mais o
argumento em The Limits ofAltruism (Bioomington, Indiana, 1977). Um
argumento anterior que rejeita a ajuda internacional foi apresentado por
W. e P. Paddock em seu mal intitulado livro Famine 1975! (Boston, 1967),
mas, na história desse ponto de vista, o lugar de honra deve ficar com
Thomas Malthus e Um ensaio sobre o princípio da população (Londres,
1798). A questão da população e a quantidade de grãos que desperdiçamos
com a alimentação de animais são discutidos em Peter Singer, The Life
You Can Save, cap. 7. As estimativas das Nações Unidas para a redução
dos índices de fertilidade podem ser encontradas em United Nations,
Department of Economic and Social Affairs, Population Division, World
Population Prospects: The 2006 Revision (Nova York, 2007). A respeito da
diminuição no ritmo de declínio da fertilidade, veja-se John Bongaarts,
"Fertility Transitions in Developing Countries: Progress o r Stagnation?",
Population Council, New York, Poverty, Gender, and Youth Working
Paper no 7, 2008.
A respeito das ações da família Salwen, veja-se Kevin e Hanna
Salwen, The Power ofHalf One Family's Decision to Stop Taking and Start
Giving Back (Nova York, 2010). Sobre Zell Kravinsky, veja-se Ian Parter,
"The Gift", The New Yorker, 2 de agosto de 2004. O artigo de Susan
Wolfe, "Moral Saints", foi publicado em]ournal ofPhilosophy, 79 (1982), p.
419-39. Discute-se a possibilidade de uma posição semelhante àquela que se
defende neste livro estabelecer um padrão por demais elevado em "Sympo-
sium on Impartiality and Ethical Theory", Ethics, 101 (4), jul. 1991. Uma
defesa vigorosa da ética imparcialista contrária a essa objeção encontra-
-se em S. Kagan, The Limits ofMorality (Oxford, Clarendon Press, 1989).
Veja-se também Peter Singer, The Life You Can Save, cap. 9-10.
centemente, que a violência passiva tem de ser vista como uma forma
genuína de violência. Veja-se também o livro de Harris, Violence and
Responsibility (Londres, 1980), e o de Ted Honderich, Three Essays on
Political Violence (Oxford, 1976). O livro Ecodefense: A Field Cuide to
Monkeywrenching, de Dave Foreman e Bill Haywood, já está em sua
terceira edição (Chico, Califórnia, 1993).
A relevância da democracia para justificar a desobediência às leis é
tratada com muito mais detalhes em meu livro Democracy and Disobedience
(Oxford, 1973). Civil Disobedience and Violence (Belmont, 1971), organi-
zado por J . G. Murphy, ainda é uma coletânea proveitosa. H. A. Bedau
também organizou uma outra antologia, além daquela já citada anterior-
mente: Civil Disobedience in Focus (Londres, 1991). Uma discussão mais
recente da desobediência civil encontra-se em Kimberley Brownlee, "Civil
Disobedience", na versão on-line da Stanford Encyclopedia ofPhilosophy.
Indice remissivo
N obrigação moral
de obedecer à lei 38 3
nacionalidade Il9
de redu zir a pobreza 409
nações pobres, obrigação de ajudar as. no infa nticídi o 232
Veja-se ajuda internacional
observador ideal 33
Nações Unidas (ONU)
Oderberg, David 222
Divisão de População 339
meta de ajuda 290, 314 O gene egoista (Dawkins) 316
Naess, Arne 37I, 372 On Liberty (Mill) 202
Nagel, Thomas 417, 4I8, 4I9, 429, 434 On Nature (Mill) 24
não igualitarismo 46, 7 I Operação Salvamento 380, 38I, 383, 390,
Narveson, Jan 295 392,394,397. 399
nascimento I 9 5 orangotangos
ling uagem em 150
natalidade, índices de 3 I 2
Oregon
natureza
euta násia volun tári a no 260
apreciação da 36o
apreciação estética da 361 Organização Mundial da Saúde 323
fim da 363 Organização para a Cooperação e
na tradi ção ocid ental 220 Desenvolvimento Econômico (OCDE) 329, 332
natureza humana 70, II5, 3I5, 425 organizações anti aborto 3 84
nazistas, nazismo 203, 237, 281, 282 , 398 O peração Salvam ento 380, 381, 383, 390,
necessidade de autorrealização 426, 427 392, 394. 397· 399
Oriente Médio
necessidade de revolução 403
riqueza no 290
necessidades básicas humanas 47, 290
Osvath , Mathias I 57
necessidades, remuneração de acordo com as 70
"O último Decálogo" (Clough) 272
Newton, lsaac 56
óvulo e FIV 230
Nitschke, Philip 264
noção de tempo nos animais I5I p
Noonan, John 227, 228, 229
norte-americanos de origem chinesa,
pacifistas 401 , 404
testes de inteligência e 5I padráo (ões)
norte-americanos de origem japonesa, demas iado altos, em relação à obrigação de
testes de inteligência e 51 ajudar 315
Noruega éticos . Veja-se padrões éticos
e ajuda internacional 291 padrões éticos 30
sofrimento, capacidade de 36 5 específicos de determinad as sociedade 30
Nossa!, Gustav 274, 283 padrões morais objetivos 2 8
Nova Zelândia pais
riqueza na 290 de bebês deficientes u8
Nozick, Robert 295 , 306, 328 e infa nticídio 147
nutrição 92, 289 Países Baixos
ajuda intern acional 291
o diretri zes para a e utanás ia
voluntária nos 260
Obama, Barack 193 e aquecimento global 3 33
obrigação de ajudar e limites ao tratamento intensivo
argumento em prol da 299 neonatal 272
objeções à 303 eutanás ia nos 240, 258
ÍNDICE REMISSIVO 475
Shakespeare, William 31, 180 Summa Theologica (São Tomás deAquino) 357
Shue, Henry 340 Summers, Lawrence 40, 6r
Sibéria 327 Sundarbans 324
Sidgwick, Henry 35, 181, 419,420, 434 Supremo Tribunal 72, 79, 191, 196, 238, 255,
síndrome de Down 249, 250, 270, 271, 272, 280 270,382,390,392
sistema de limitação e comércio 336, 349 Sylvan, Richard 372
sistema nervoso 101 , 209
sistemas autorrealizadores 374 T
Smith, Adam 32 Tail!india 312, 338
sociedade talidomida 251
um indivíduo 27, 385 Tasmânia, projeto da represa no
Sociedade Humanitária dos rio Franklin na 354
Estados Unidos 385, 386 taxa de desconto 3 59
Sociedade Tasmaniana de Proteção Taylor, Paul 369, 372
à Natureza 381
tecido fetal 192, 215 , 216
Sócrates 104, 146, 147, 414, 4 20, 425
tecnologia médica
sofrimento e eutanásia 196
experiências com an im ais para o alívio do 95 e viabilidade n8, 197
meta de evitar o 28 4
tecnologia reprodutiva
meta de evitar o, nos a nima is 386
clonagem 215
meta de reduzir o 244
fertilização in virro 192, 224, 229
sofrimento, capacidade de. Veja-se dor
teologia católica sobre os primeiros
como característica que dá a um ser o di reito
sinais de vida 198
à igual consideração 372
nos animais 87, 89 teoria dos direitos 205, 206, 207, 257, 258,
295· 306
solidariedade 22, 78 , n6, 368, 377, 421, 422,
428 terrorismo V II, 289 , 379• 400, 401, 405
Sólon 123 teste do espelho r6o
Spira, Henry 435, 436 teste LD50 97
Sri Lanka, e emissões de gases do efeito estufa testes de QI e afro-americanos 50
334 The Ecological Seif(Matbews) 374
status moral IIO The End ofNature (McKibben) 363
da pessoa portadora de deficiência r II The Happiness Hypothesis (Haidt) 426
do em brião 195. 207 "The Human Prejudice" (Williams) II5
Stephen, Leslie 165, 168 The lnevitability of Patriarchy (Goldberg) 62
Steptoe, Patrick 192 The Mask ofSanity (Cleckley) 427
Stevenson, C . L. 28 The Peaceful Pill Handbook (Nitschke) 265
Stinson, Andrew II9
The Possibility ofAltruism (Nagel) 417,
Stinson, Peggy n8 418, 419
subjetivismo 27 The Psychology oJSex Differences
Suécia 191, 272, 291, 331 (Maccoby e Jacklin) 6o
Suíça 95, 237, 238 Thomson, Judith J . 203, 204, 205, 206, 207
protestos contra a eutanásia na x Thoreau, Henry 384, 385, 387, 393
suiddio 238 tirar a vida
assistido por m éd icos 238, 263 atos/omissões em 273
Sul da Ásia 330 de animais 95, 164, 185
ÍNDICE REMISSIVO 479
A filosofia e a felicidade
Philippe van den Bosch
A felicidade, desesperadamente
André Comte-Sponville
O amor a solidão
André Comte-Sponville
O ser-tempo
André Comte-Sponville
Caminhos para a liberdade
Bertrand Russell
Dicionário filosófico:
conceitos fundamentais
Regina Schopke
Ética e direito
Cha'im Perelman
Em busca de um mundo melhor
Karl R. Popper
Ensaio sobre o entendimento humano
John Locke
A favor da Terra e do humanismo
Pierre Rabhi
Por uma simplicidade feliz
Pierre Rabhi
A arte da felicidade um manual para a vida
Dalai Lama e Howard C. Cutler
ISBN : 978-85-8063-318-4
martins !="antes
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